ENTREVISTA Josenilda Lima critica a Polinter, fala sobre o assassinato de sua filha e explica o fim do Movimento Simone Pinho, que durante dez anos ajudou a localizar pessoas na capital baiana
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CAPA Como é feita a procura por cidadãos e por que o desaparecimento é tratado como um fato corriqueiro pelo poder público sem estrutura, que transfere a responsabilidade das buscas
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PERFIL A menina Alice e o jovem Glauber, dois casos que mergulharam a vida de suas famílias em profundo sentimento de perda, prolongando um luto indefinido
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Vidas Suspensas Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador SALVADOR,
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As causas, as sequelas, as estatísticas. Entenda como seria possível prevenir as ocorrências, e por que os casos sem solução ilustram um drama de impacto social cada vez maior em Salvador
MUNDO Programas de prevenção, investigação compartilhada e apoio emocional aos parentes. Veja essas e outras iniciativas de países estrangeiros preocupados com o crescimento do fenômeno
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BAHIA Há dois anos, voluntários do Interbusca se revezam para reencontrar quem some nas ruas soteropolitanas, solucionando mais da metade dos casos registrados
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BRASIL Artigo do sociólogo Dijaci Oliveira questiona os números oficiais, colocando em dúvida os métodos de coleta utilizados pelo Estado
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Vidas Suspensas
Vidas Suspensas Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador
Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador
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DESAPARECIDA
Ver as pessoas mostrando na TV, semanas após semanas, fotos esmaecidas de desaparecidos, sempre nos provocou forte inquietação. Este desconforto recorrente, marco inicial das pesquisas que resultaram neste Produto Experimental, nos impeliu a partir em busca das origens do desaparecimento. Após um ano e meio de investigação, terminamos por nos deparar com o contra-senso de leis que não se refletem em práticas eficazes, e, sobretudo, com as inúmeras falhas que circundam a investigação dos casos em Salvador. Também pesquisamos como o tema vem sendo tratado no Brasil e no Mundo.
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ENTREVISTA | JOSENILDA LIMA Tom Correia
Alessandra Silva de Almeida 9 anos – bairro do Uruguai Reprodução
Para este Caderno Especial, entrevistamos Josenilda Lima, fundadora do recém extinto Movimento Simone Pinho. Ela conta sua saga envolvendo a trágica perda de sua filha até os últimos esforços para manter a instituição que auxiliava na localização de pessoas. A grande reportagem “Vidas Suspensas” apresenta o imenso painel que emoldura as intricadas ramificações do drama provocado pelo sumiço de uma pessoa, colocando em xeque a atuação dos órgãos estatais responsáveis pela solução dos casos, já que políticas públicas visando à prevenção são uma quimera. O Caso Glauber e o Caso Alice são apresentados em perfis que ilustram como a ausência de filhos queridos pode desequilibrar a harmonia familiar, apesar de toda obstinação e tentativas beirando o desespero para localizá-los. Já o artigo do sociólogo Dijaci Oliveira, um dos maiores estudiosos do assunto, contesta os números oficiais apresentados pelo Ministério da Justiça. Há ainda uma mostra de como são executados programas de prevenção e solução de casos em países como o Canadá, Austrália e Reino Unido, o que nos rebaixa à condição de país jurássico quando se trata de eficiência na elucidação desse tipo de episódio. Gabriel Guimarães
Infelizmente a necessidade, cada vez mais imperativa, de debater formas de atenuar a situação dos milhares de atingidos não parece estar na ordem do dia das instituições brasileiras. Ainda assim, esperamos que este TCC seja compreendido como uma colaboração no sentido de alertar a sociedade. E que as autoridades constituídas deixem de tratar o assunto com o descaso, a letargia e a explícita má vontade, como foi constatado durante a apuração, pesquisa e execução deste trabalho. Tom Correia
Expediente Concepção | Texto | Fotos | Edição: Tom Correia Fotojornalista Colaboradora: Carol Garcia Orientação: Bárbara Souza | Revisão: Laís Santos Direção de Arte & Diagramação: Edileno Capistrano Filho Agradecimentos: Arlita Santana, Bárbara Souza, orientadora dedicada, grande amiga dos momentos ruins; ao querido e etílico Coió Futebol Clube (Ciranda Campos, Gabriel Guimarães, Laís Santos); Josenilda Lima; Marcos Dutra; Mari Neide; Drª Susiane Lima (por me mostrar que era possível); Vera Regina, minha irmã e artista incomparável, e a todos que contribuíram para a realização deste trabalho. In Memoriam: ao meu pai, Martins Diogo Correia (1921-1996), habilidoso em dois terrenos fascinantes e perigosos: as mulheres e as palavras Em especial: À minha mãe, Naná, incansável e sempre otimista, origem e amparo de todas as minhas conquistas. À minha doce e amada companheira Rosana, “que tanto tardou a chegar”, pela paciência, carinho e apoio incondicionais. Faculdade Social – Curso de Jornalismo – Projeto Experimental – 2010.2
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A pequena Alessandra era criada por Maria Antônia Santos Soares desde os 2 anos de idade e os pais se chamam Edvan e Jussara. A menina morava com a mãe “de criação” na rua Régis Pacheco quando, na manhã do dia 22 de julho de 2007, aconteceu algo que deixou dona Maria transtornada: ao se levantar por volta das 7 da manhã, ela foi acordar a garotinha para o banho e prepará-la para ir a escola. Encontrou a cama vazia. Segundo os relatos de dona Maria, Alessandra desapareceu em casa, enquanto todos dormiam. Não havia vestígios de arrombamento na casa.
Telefones e Sites Úteis Centro de Defesa da Criança e Adolescente - CEDECA 71 3321-1543 | www.cedeca.org.br Interbusca Desaparecidos 71 3487-3332 Movimento Simone Pinho www.movspinho.org.br Núcleo de Atendimento para Assuntos Criminais – Nacrim 71 3103-6667 | www.mp.ba.gov.br Polinter 71 3116-6573 | 3116-6591 Rede Nacional de Desaparecidos – Redesap http://www.desaparecidos.mj.gov.br/ Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia www.ssp-ba.gov.br
Missão cumprida “Não saber o que aconteceu com seu ente querido é a pior situação, você morre por dentro a cada segundo.”
Uma mulher obstinada, marcada por uma tragédia pessoal e que não se rendeu aos obstáculos. Estes são alguns traços da personalidade da professora Josenilda Lima, 58, que em 2000 teve sua única filha, Simone Pinho, desaparecida na Chapada Diamantina. Foram quase seis anos de buscas e sepultamento após a descoberta do assassinato cometido por José Vicente Matias, o Corumbá, um matador em série que atualmente cumpre pena em Aparecida de Goiânia (GO). Josenilda perdeu as contas de quantas vezes se embrenhou pelas trilhas de cidades como Lençóis, Andaraí, Mucugê, Palmeiras e vilarejos como o Vale do Capão, na expectativa de rever Simone, mas, ao mesmo tempo, com um mau pressentimento de que algo muito sério havia acontecido. Obteve a ajuda de muita gente, de guias de turismo da região e grupo de hippies a donos de pousada que não cobravam diárias quando o dinheiro da professora acabava. Só o Estado demonstrou pouco empenho. “Tudo que enfrentei e ouvi para reencontrar minha filha foi algo digno de um filme, mas um filme de terror”, revolta-se. Desde então, abraçou a causa das pessoas desaparecidas no estado da Bahia. Em 2001, recebeu medalha da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa e, no ano seguinte, fundou o Movimento Simone Pinho, que fechou suas atividades após dez anos de atuação. Alguns fatos são considerados por ela como mensagens espirituais apontando o fim de sua missão: lançar “Na Trilha da Esperança”, livrodepoimento que narra todos os detalhes de sua busca, na abertura do I Encontro Nacional de Pessoas Desaparecidas; e devolver as chaves da sala onde funcionava o Movimento no mesmo dia da audiência de Corumbá em Salvador. Para a budista Josenilda, isso tudo é muito mais do que coincidência: é um claro sinal de que sua missão chegou ao fim.
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Vidas Suspensas Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador
Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador
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“Não se diz uma barbaridade para uma mãe que está sofrendo. Tem que ter mais humanidade.”
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Tom Correia – Como nasceu a instituição fundada por você para defender famílias que tinham parentes desaparecidos? Josenilda Lima – O Movimento Nacional de Busca e Apoio a Pessoas Desaparecidas Simone Pinho foi criado pela dor de perder minha filha, desaparecida em junho de 2000. Pelo descaso dos órgãos constituídos, pela falta de apoio da polícia e quando eu vi que não era só eu que passava por aquela situação e sem ninguém para ajudar, eu transformei minha dor em solidariedade, senti na pele a necessidade de uma organização para ajudar aquelas pessoas. Simone foi assassinada pelo serial killer José Vicente Matias, vulgo Corumbá, que ceifou a vida de seis mulheres em vários estados brasileiros. Minha filha foi sua segunda vítima e eu sofri demais nas buscas. Eu fui à Polinter e quem me atendeu foi a Drª. Clara [Delegada Clara Argolo]. Ela me tratou bem, foi sincera: disse pra mim que não tinha como mandar policiais para o interior, que infelizmente não tinha sido aqui, que os recursos não existiam e que a única coisa que ela poderia fazer era um ofício para que eu levasse pro delegado de Lençois. Foi o que eu fiz, ela perguntou, você leva? Eu disse: ‘me dá agora que eu já tô indo’. Fazia um mês que Simone estava desaparecida porque antes disso eu tinha resolvido procurar sozinha, pensei que ela voltasse logo, que não precisasse de dar queixa numa delegacia. Mas quando a ‘ficha caiu’, vi que ela tinha desaparecido mesmo. Quando cheguei desesperada em Lençois, eu chorava mais do que eu falava, com o ofício da Polinter na mão e o delegado de Lençois nem sequer me atendeu. Ele estava fora da delegacia, nem me convidou pra entrar, olhou o ofício e me devolveu na mesma hora. TC - Você lembra o nome do delegado? JL – José Carlos de Oliveira Couto, eu nunca vou esquecer Tom Correia
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esse nome na minha vida! [se exalta]. Enquanto vida tiver eu vou falar desse delegado arbitrário, que não cumpriu com os deveres dele e cerceou o meu direito de mãe de procurar minha filha. Ele disse: ‘Ora, senhora, sua filha é uma mulher. No mínimo ela deve estar ali no Capão usando drogas’. Isso não se fala para uma mãe. Ele não me conhecia, não sabia quem eu era, não conhecia Simone. Talvez se ele tivesse tomado as devidas providências naquela hora, ela ainda estivesse viva, porque ela foi assassinada logo depois. Não posso afirmar, mas talvez pudesse ter salvo minha filha ou a encontrado logo. O réu confessou o crime e pela data que ele deu (eu não posso confiar na palavra de um assassino), ela ainda estava viva. Levei cinco anos e meio para descobrir a verdade e mais oito meses lutando na Justiça para que o assassino cruel mostrasse onde tinha enterrado o corpo. Só depois de seis anos o meu martírio acabou. Minha filha foi sepultada em 24 de março de 2006, mas a tristeza não tirou do meu coração a vontade de continuar ajudando, porque ninguém mais do que eu sabia o tamanho da dor que é ter um ente querido desaparecido. TC – O que levou o Movimento Simone Pinho a encerrar suas atividades? JL - Nossa ONG foi desativada porque apesar da diretoria ser composta de 13 pessoas, cada um tem os seus afazeres e só eu, como presidente, executava o trabalho. Para isso, eu dedicava meu tempo integral à entidade. Como sou professora da Prefeitura de Camaçari, fui obrigada a retomar minhas atividades naquele município, deixando a ONG funcionando apenas com voluntários. Não tinha a menor condição de fazer as duas coisas ao mesmo tempo: trabalhar 40 horas em Camaçari de segunda a sexta e tocar o Movimento. Então, como não podia abandonar meu trabalho, o fechamento foi inevitável. TC – O Movimento contou com algum tipo de ajuda particular ou institucional, nunca houve apoio do governo? JL – Infelizmente, não. O único apoio que tive foi da Casa Civil [Prefeitura de Salvador] e mesmo assim foi recentemente. Tentei fazer parcerias, mas ninguém dava importância aos meus projetos: eu levava, eles recebiam e depois perdiam porque quando eu voltava pra procurar não existia mais, ninguém sabia onde estava. Durante todo esse período, a ONG foi mantida com recursos próprios. A Casa Civil me ofereceu uma sala com telefone, internet, condomínio e luz, tudo pago por eles, para que eu deixasse de pagar aluguel, ajuda essa que vou agradecer pelo resto da vida, pois foi a primeira e única. Eu também tinha ajuda do Movimento Mães da Sé, de São Paulo, que também trabalha com este fim, mas a parceria era restrita à divulgação das pessoas desaparecidas. TC – Durante algum tempo houve uma parceria entre o MovSpinho e a Coelba. Como funcionava esse trabalho em conjunto?
LIVRO | Josenilda ao lado de uma voluntária do MovSpinho, no dia do lançamento de “Na Trilha da Esperança” que narra as buscas por Simone (foto em cima da mesa)
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Vidas Suspensas
JL – Eu mandava as fotos e eles divulgavam nas contas de energia de todo o estado da Bahia, com meu telefone. Se alguém sabia de alguma informação sobre aquele desaparecido ligava pra mim e aí eu tomava as providências, ligava pra saber se a informação era verdadeira para ‘correr atrás’, saber se realmente era o desaparecido procurado. A gente ligava pra família, íamos
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“Alguém que tiver o seu desaparecido que vá procurando outros meios porque a polícia só sabe tratar mal.” LOCALIZADOS | Em oito anos, mesmo sem contar com ajuda significativa do poder público, o Movimento Simone Pinho ajudou a reencontrar 656 pessoas
até o local onde estava a pessoa. Já aconteceu re-encontros incríveis. Uma vez colocamos a foto de um jovem de Camaçari na conta de energia e alguém ligou pra mim dizendo que ele estava vivendo nas ruas em Periperi. Pedi que a pessoa segurasse o rapaz pra gente checar se era realmente ele. Liguei pra família, eles foram lá, ficaram em dúvida se era o rapaz. Fizeram o teste, não deu positivo, mas mesmo assim essa família tirou esse jovem da rua, cuidou de sua saúde e o levou pra casa. Um belo dia ele falou o nome dele, mesmo com os problemas mentais e disse onde a família dele morava. A senhora que o acolheu, pegou o endereço e foi no local com ele. Quando a mãe viu o rapaz chegando com esta senhora, quase enlouqueceu de tanta alegria: o filho dela estava desaparecido há 10 anos e ela já se dizia sem esperança de reencontrá-lo. TC – Qual foi a reação das pessoas diante do fechamento da ONG? JL – O desespero de quem sempre contou com o Movimento Simone Pinho era visível, as pessoas me perguntavam: ‘E agora, o que vamos fazer sem você?’. Teve um dia, eu já estava a caminho do trabalho em Camaçari, uma mãe ligou. Ela queria desabafar, precisava do ombro de quem compreendia a dor sentida. Ela só perguntava ‘quando é que você volta? O que vai ser de nós sem você?’. De mãos atadas, sem poder fazer nada, também comecei a chorar. E assim vou seguindo em frente, rezando para cada uma delas, para que o seu desespero tenha um fim, porque por mais trágico que seja o resultado, não saber o que aconteceu com seu ente querido é a pior situação, você morre por dentro a cada segundo. TC – Você considera o Estado omisso em relação aos desaparecidos? JL – E muito, muito mesmo. É preciso que eles acordem para esse grave problema social. Eu acho que eles estão esperando que aconteça na vida deles para poder reagir e tomar uma atitude. É muito omisso sim. Campanhas poderiam ser feitas e mesmo após o desaparecimento as diligências deveriam ser mais rápidas. TC – E como você avalia o tratamento dispensado às famílias que procuram a Polinter? JL - O que mais choca é o tratamento da polícia para com
essas famílias, em total desespero, e que ainda ouvem barbaridades como: ‘Você ainda procura? Seu filho é um errado, que estava no local errado, na hora errada e com a pessoa errada, desista, ele está morto’. Ou como o delegado de Lençóis me tratou, se recusando a receber o ofício que a Polinter lhe enviou, dizendo que minha filha era maior, que nada podia fazer e que a única viatura que ele tinha era para assessorar a política, pois estava na época de campanha eleitoral. O descaso da polícia é demais. No meu caso, poucas vezes a polícia ajudou, pelo contrário, às vezes atrapalhou muito. Alguém que tiver o seu desaparecido que vá procurando outros meios porque a polícia só sabe tratar mal, só te trata mal. As mães chegam chorando, apavoradas porque falaram dos filhos delas sem conhecer. Como é que sai falando e mesmo que fosse verdade, não se diz uma barbaridade para uma mãe que está sofrendo. Tem que ter mais humanidade. TC – Além de catalogar 3.091 pessoas e ajudar a localizar 656 desaparecidos, quais as outras principais contribuições do Movimento para a sociedade? JL – O movimento colaborava com a mídia, com os quadros da TV Bahia e da TV Aratu, Era eu que levava todas as famílias para procurar seus desaparecidos, então o prejuízo do fechamento do Movimento Simone Pinho é muito grande. Esse trabalho foi a melhor coisa que já me aconteceu. Eu descobri que feliz é quem dá e não quem recebe, descobri que a melhor coisa do mundo é ajudar. Quando você vê uma mãe desesperada, te pedindo socorro e você consegue fazer aquela pessoa voltar a sorrir, não há maior felicidade no mundo. Não sou mais a mesma depois desse trabalho. Aprendi a dar valor às pequenas coisas que antes não tinham importância, consigo enxergar muito mais além, a minha mente se expandiu e eu comecei a ver o mundo de uma maneira diferente, mais humana. Eu descobri que todos são iguais e que todos podem um dia acordar e não encontrar o seu ente querido, porque ele simplesmente desapareceu. Não foi só comigo, também pode acontecer com qualquer pessoa, é preciso ajudar se você quer um mundo melhor. TC – O Movimento Simone Pinho não volta mais? JL - Olha, para registrar tudo certinho é uma mão de obra, se eu soubesse antes não sei se ‘embarcaria’ nessa. Mas como na época eu estava envolvida com o caso da minha filha assumi porque estava doendo mesmo, mas agora que esfriou, que a poeira baixou, que eu já tenho consciência do que é fundar uma ONG, vou pensar duas vezes se vou fazer isso mesmo sem ajuda de ninguém. É muito difícil, é muita burocracia, muita luta. Sinceramente eu não abriria mais não. Eu poderia tentar ajudar de uma outra forma, mas como funciona hoje, devidamente registrada, com tudo legalizado nos órgãos, não sei se faria mais. Quando eu tiver aposentada aí vou pensar de que forma vou continuar a ajudar os desaparecidos. Agora, com essa responsabilidade que eu tomei pra mim sozinha, não sei se teria coragem não... TC – Valeu a pena, Josenilda? JL – Só valeu... e como valeu... e digo com pureza d’alma que não sou a mesma pessoa de jeito nenhum. Eu sou uma pessoa riquíssima espiritualmente depois desse trabalho e outra coisa, com uma fortaleza dentro de mim que não adianta: não venha, porque se ficar na minha frente vou esmagar. Se é pra me prejudicar ou pra prejudicar alguém desaparecido, saia da minha frente, porque se eu disse eu vou vencer, ninguém me derruba, não. Se eu tomar pra mim aquela dor, vou vencer. Josenilda antes não dava uma palavra, era aquela pessoa tranquila, que não conversava, mais ouvia do que falava... hoje falo mais do que ouço, falo muito porque tenho muito a dizer. E a experiência que eu passei não tem universidade que supere. *Esta entrevista contou com a colaboração da jornalista Arlita Santana, que escrevia a coluna “Onde Está?” do site www. aqueimaroupa.com.br
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Tom Correia
CAPA
Vidas Suspensas Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador Perder um filho, mãe, pai ou irmão e não saber onde eles estão é uma realidade diária na capital baiana. Em dez anos, foram quase 8 mil pessoas que se ausentaram sem vestígios e mesmo após a localização ou retorno, ainda restam 2.250 pessoas extraviadas. Em média, são dois cidadãos que somem todos os dias nos bairros soteropolitanos, especialmente na periferia, mas os números podem ser muito mais expressivos. Má vontade política, descaso, falta de delegacias especializadas e de integração entre os órgãos competentes, investigação precária e núcleo familiar sem estrutura são os componentes encobertos pelas estatísticas. Por sua vez, o Estado patina ao tentar viabilizar políticas públicas eficazes. Números de ONG’s sugerem 40.000 pessoas deslocadas dos seus domicílios, mas ninguém sabe ao certo quantos desaparecidos existem atualmente no Brasil. Enquanto isso, a espera dos familiares pode ser longa. Às vezes, dura uma vida inteira estagnada: sem notícias, sem definição. Então é assim que acontece. A pessoa que você mais ama, uma das mais especiais, a quem você dedica parte substancial de sua existência, lhe dá um beijo, acena ou faz um carinho, diz algumas palavras corriqueiras, sai pela porta em direção à escola, ao trabalho, à esquina, e simplesmente desaparece. Não importa a idade, o parentesco. Criança, adulto, idoso. Pai, mãe, filho. Irmã, sobrinho, esposa, marido; não importa o motivo, se por uma discussão em casa, se conheceu um estranho na rua ou pela internet, se foi alvo de rapto ou queima de arquivo. Estejam em situação de risco ou sofrendo de doença mental, quem parte desconhece a dimensão da dor provocada pelo vazio. Quem fica para trás, com aperto no coração, só começa a perceber que algo mais sério aconteceu depois que as horas se multiplicam, os dias se desdobram. Sábado, Dia dos Namorados, 2010. Luciano Santos, 29, levantou cedo, arrumou suas coisas e conferiu no relógio que estava atrasado, já havia perdido o ônibus das sete da manhã que o levaria até a Brasquímica, fábrica de produtos asfálticos do Distrito Industrial de Candeias, a 46 km de
Salvador. Morando no bairro de Águas Claras, vivendo há sete anos com a vendedora ambulante e evangélica Diene Lima, 32, Luciano deu o presente da esposa, um kit de óleo corporal da Natura e recebeu um perfume Kayak. Pai de Amanda, 4 anos, e padrasto amoroso de Jennifer, 15 e Richard, 9, o operador industrial estava em ascensão profissional: começara como auxiliar de serviços gerais e, em cinco anos, foi promovido três vezes. Para encorpar o orçamento, Diene vende bebidas numa barraca no Centro Histórico. Antes de sair, ele deu um beijo na mulher e disse: “Se eu não vier pra casa, encontro você no Pelourinho”. De acordo com a Polícia Interestadual da Bahia - Polinter, entre os anos de 2000 e 2009, foram registrados em Salvador 7.632 desaparecimentos, mas detalhes como bairro, gênero e idade só foram coletados em 2008 e 2009. “Este ano decidiram não pedir mais isso. Ainda bem, não sei pra que servia”, diz a escrivã responsável pelos relatórios mensais enviados ao Centro de Documentação e Estatística Policial da Secretaria de Segurança Pública (SSP/BA). Caso o governo quisesse levantar um perfil preciso de quem some
todos os dias nas ruas soteropolitanas, enfrentaria dificuldades. Sem uma base de dados precisa, futuras e hipotéticas campanhas específicas de prevenção estariam prejudicadas. Uma das intervenções possíveis seria mapear bairros com maior incidência, levantar a faixa etária mais frequente das vítimas e, a partir disso, ministrar palestras educativas nas comunidades, além de informar a população sobre seus direitos e orientá-la quanto a procedimentos diante de algum caso na família. Ainda segundo a Polinter, 5.377 pessoas foram localizadas entre vivas – retornando aos seus lares, encontradas por outras pessoas – e mortas, com entrada no Instituto Médico Legal Nina Rodrigues. A Praça da Piedade já foi conhecida como local dos fotógrafos lambelambe e moradia de camaleões, ambos erradicados por razões distintas: tecnologia e ignorância. Os familiares de pessoas desaparecidas já demarcaram território ali, transformando o local numa espécie de quartel-general de lamentações, esperanças renovadas a cada aparição de vinte segundos na tela durante a exibição semanal do quadro que vai ao ar desde 2001 pela TV Bahia. No
final da manhã de uma quarta-feira, Diene e outras esposas, pais e parentes de quem sumiu, conversam entre si, sentados na Praça da Piedade à espera do início da transmissão ao vivo. Enquanto aguardava, ela lembrava o frio e a agonia que tomaram conta do seu corpo na noite que dormiu sem o marido. Passou a noite em claro imaginando situações que podiam estar sendo vividas por Luciano. No dia seguinte, soube que ele não havia aparecido no trabalho e só então a família iniciou as buscas. “Fomos na Polinter, mas mandaram a gente procurar primeiro nos hospitais todos e só depois registrar a queixa. A gente procurou HGE, Roberto Santos, Ernesto Simões e fomos pro IML, onde tinha quatro corpos não identificados. Nenhum era ele...”, recorda.
A todo instante os telefones tocam. A pessoa precisa aguardar ali, paciente, na expectativa de que o registro seja o início de buscas que terminem com a rápida localização de quem sumiu mundo afora. A sala possui dois monitores de TV que mostram em circuito fechado imagens escuras da carceragem. Um relógio branco, com a base quebrada, está grudado à parede de pintura gasta. Há um papel A4 com a impressão: ‘Tempo de Visita: 10 minutos’. Outro servidor chega e atende uma ligação. Alguém informava a localização de um cidadão com distúrbios mentais. “Só podemos tomar providência se tiver registro aqui”, diz o agente, 22 anos de profissão, há quatro trabalhando no setor. “Ligamos hoje para os familiares, vamos ver se a delegacia pode fazer alguma coisa. Vamos ver aí, vou te dar um retorno”, desliga.
NA PRAÇA | Diene entra na fila para fazer seu apelo no Quadro “Desaparecidos” acreditando no retorno do marido
Segundo o Sindicato dos Policiais Civis do Estado da Bahia – Sindpoc, atualmente existem 4 mil agentes policiais, 3.500 viaturas e 48 investigadores, dos quais 12 são lotados na Polinter. São esses doze agentes os responsáveis pela investigação de casos em todo o estado. Em 2010, a dotação orçamentária da Secretaria de Segurança Pública foi de cerca de R$ 2 bi. Entretanto, para o vice-presidente do Sindpoc, Marcos Maurício, a mudança da atuação da SSP não depende de altos investimentos. “É necessário que a sociedade não seja mais punida, mas apresentada a soluções envolvendo outros setores além do âmbito do órgão. Para estabelecer mudanças efetivas há um gargalo a ser superado: independente de ideologias, a SSP é fatiada por partidos políticos”, critica.
A situação vivida por Diene é parecida com a de Vanda Francisca, 73, também sentada na praça. A senhora negra, moradora da Fazenda Grande do Retiro, buscava informações sobre o filho, Valdir Moreira, 43, que há quatro meses não dava notícias. “Ele saiu para trabalhar no projeto Minha Casa, Minha Vida pros lados de Camaçari e nunca mais retornou”, conta. Segundo dona Vanda, Valdir sempre foi muito pacato, chegando a ser tímido, e não tinha motivo para sair de casa daquela forma. A aposentada diz ainda que não havia registrado queixa na Polinter porque ali era “coisa muito séria”, e o filho podia se chatear também se visse seu rosto mostrado na TV. Na semana seguinte, ela retorna à praça, faz seu apelo no quadro da TV Bahia e presta queixa na Polícia Interestadual. Depois, caminha até o prédio onde fica a ONG Interbuscas Desaparecido, inaugurada em 2008 (ver pág. 15) e entra na fila de atendimento. Explica novamente que não sabe o nome da empresa onde o filho trabalha, que não vai ao IML porque é “complicado”. O rosto expressivo de dona Vanda, mãe de 11 filhos, não demonstra lamento ou traço de desespero. Volta para casa e dá uma olhada no beliche vazio onde o filho “pacato, muito pacato”, passava os dias de folga ouvindo cantores antigos, como Nelson Gonçalves e Orlando Silva.
Por um copo de suco
Um ambiente hostil
APREENSÃO | Toda semana novos casos chegam à Piedade através de familiares preocupados com a falta de notícias de quem sumiu
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O prédio da Secretaria de Segurança Pública tem intensa movimentação. Da entrada principal até o anexo de fachada cinzenta, são cerca de setenta passos. A descida lateral leva às dependências da sede da Polinter no estado da Bahia. Corredores acanhados, móveis gastos e arrumação descuidada das estantes são um cartão de visita desanimador para quem precisa recorrer ao órgão. Numa das paredes, há um pequeno quadro com fotos impressas e desbotadas de pessoas que saíram pela porta e não retornaram; muitos nem quiseram se despedir: os que fugiram espontaneamente. Agentes fazem perguntas e preenchem os boletins de ocorrência. O atendimento é lento.
PIEDADE | Famílias se concentram e compartilham seus dramas enquanto aguardam equipe de TV
Luciano saiu de casa e caminhou cerca de vinte minutos até o Posto Caramuru, às margens da BR-324. Tomou um cafezinho, fumou um cigarro e conversou um pouco com o vendedor de mingau, talvez lembrando do vasilhame de suco que havia sumido da geladeira no meio daquela semana. No refeitório da Brasquímica, onde cerca de 80 funcionários se reúnem todos os dias na hora do almoço, faltava o líquido num recipiente cujo dono, Valdomiro, ficou possesso ao descobrir o pequeno furto. Passou a xingar a mãe de todos os colegas, disparando palavrões para todo lado. Para defender um dos amigos, Luciano discutiu com Valdomiro, com quem não falava há três anos, chegando a chamar o rival para a briga. Diene soube do fato e aconselhou o marido. “Deixa de arrumar confusão, menino”. Já Luciano fez um alerta: “Se acontecer alguma coisa comigo em Candeias foi ele e Messias [outro desafeto]”. A queixa foi registrada dez dias depois do desaparecimento. Durante semanas seguidas, a família circulou em busca de pistas que revelassem o paradeiro: Centro Industrial de Aratu, Simões Filho, Mapele, Ceasa. Baseados em informações que recebiam da Polinter, viajaram em vão para procurá-lo em Castro Alves, Amélia Rodrigues, Humildes e Conceição do Jacuípe.
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No Brasil não existem delegacias especializadas em buscas de desaparecidos. A Polinter é responsável originalmente pela busca e apreensão de foragidos mediante mandados judiciais, além de manter a custódia dos presos. Na unidade de Salvador, o telefone é o meio mais usado para se localizar desaparecidos nas delegacias, hospitais, IML’s e juizados. A internet não é um recurso corriqueiro: na parte térrea do setor, há três terminais de computador, um deles para o registro da ocorrência. Os dados não estão disponíveis aos cidadãos, apesar de a página virtual da pasta de Segurança Pública expor a quantidade de homicídios, roubos
e furtos. O serviço de estatística policial na Bahia existe desde 1895, ano de criação da secretaria. O primeiro princípio fundamental das estatísticas oficiais foram estabelecidos pelas Organizações das Nações Unidas em 1994. O capítulo trata da relevância, imparcialidade e acesso universal e diz que as estatísticas oficiais representam um elemento indispensável ao sistema de informação de uma sociedade democrática, oferecendo ao governo, à economia e ao público, números sobre a situação econômica, demográfica, social e ambiental. E mais: os órgãos oficiais devem reunir e disponibilizar de forma imparcial, estatísticas
TRIAGEM Servidor define, de acordo com seus critérios, se o caso merece maior ou menor atenção, não importa se de origem delituosa ou social. Famílias são orientadas a só retornarem após 24 ou 48 horas do desaparecimento
POLINTER: o passo-a-passo e as falhas
REGISTRO BOLETIM DE OCORRÊNCIA Vagas orientações são passadas às famílias, como ir ao IML uma vez por semana e telefonar para a Polinter para saber sobre a investigação
CHECAGEM POR TELEFONE Apuração limitada a contatos telefônicos torna mais remotas as possibilidades de localização
ESTATÍSTICAS O alto índice de localização não é reflexo de investigação efetiva. ONG’s denunciam que não recebem os créditos pela solução dos casos
INVESTIGAÇÃO As famílias apenas são informadas sobre avistamentos, tornando-se responsáveis diretas pela averiguação
COLETA MENSAL DE OCORRÊNCIAS Dados de baixíssima qualidade, com ênfase na burocracia, inviabilizando a identificação do perfil do desaparecido em Salvador. Resultados não são divulgados
DEPOIMENTOS
CENTRO DE DOCUMENTAÇÃO POLICIAL – SSP DOSSIÊ / INQUÉRITO SECRETARIA NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLICA ENVIO À CIRCUNSCRIÇÃO POLICIAL
ESTATÍSTICAS 2000 - 2009 ano desaparecidos índice de localização localizados
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2009-2010
515
667
876
1.033
1.041
755
657
734
709
645
7.632
60,9%
77,3%
79,4%
61%
58,6%
49,5%
80%
74,3%
87,7%
83,8%
70,4%
314
516
696
631
611
374
526
546
622
541
5.377
Fonte: Polinter – Secretaria de Segurança Pública do Estado da Bahia
No fim do túnel
8
O projeto de lei do Senado nº 244 está em trâmite no Congresso e prevê avanços em iniciativas que já são comuns nos Estados Unidos e Europa. Três pontos podem ser destacados na proposta como auxílio à localização: a obrigatoriedade do teste de DNA, disponibilização de um número telefônico gratuito para receber denúncias e fornecer informações às famílias e ainda a utilização de técnica de envelhecimento de fotografias dos desaparecidos há muito tempo.
de utilidade prática comprovada, para honrar o direito do cidadão à informação pública. Sem dados de qualidade, torna-se inviável implementar de imediato iniciativas que tratem do tema de modo específico. O perfil exato de quem desaparece todos os dias em todo o território nacional é desconhecido. Entretanto, pelos dados esparsos e colhidos em diferentes fontes, percebe-se que os negros, pobres e com baixo nível de instrução são os que formam o exército camuflado atrás dos números. O dossiê de 62 páginas que compõe o inquérito sobre o desaparecimento de Luciano apresenta desde o boletim de ocorrência registrado por sua esposa, até o relatório final assinado pela delegada Patrícia Boeno, responsável pelos encaminhamentos no setor. São termos de declarações, ordens de serviço para empreender diligências, encaminhamento ao delegado titular da circunscrição policial onde o fato aconteceu, solicitação de informações à Brasquímica, pedido de localização ao Instituto Médico Legal, ao Serviço Ambulatório Móvel de Urgência (SAMU), depoimentos de mãe e esposa, colegas de trabalho, diretor da empresa, solicitação da gravação de câmeras dos coletivos que Luciano teria utilizado. O trâmite todo, estritamente dentro do que a Justiça determina, além de engessar as buscas, pode ter colocado a vítima em perigo a cada minuto perdido entre tantas idas e vindas de documentos. Diene não teve acesso ao inquérito e também não soube responder se o fato do pai dela ser policial civil implicou tratamento diferenciado e interesse especial dos agentes da Polinter. Mas de acordo com os parentes de pessoas desaparecidas entrevistados, a lentidão no acompanhamento dos casos é fato unânime, sem falar na mais grave das distorções descobertas no órgão: a “terceirização” das investigações. Os agentes recebem informação e repassam aos familiares, que ficam com a responsabilidade de ir até o local onde a pessoa em questão foi vista. No setor, o cidadão recebe minimamente informações que resolvem uma situação específica. As orientações são verbais, nenhum tipo de cartilha ou informativo é distribuído. Durante a apuração das estatísticas para esta reportagem, o eletricista Neemias de Souza, 38, chega pedindo informação sobre um corpo carbonizado, encontrado em Mirantes de Periperi. A suspeita é de que seja o cadáver de Jorge Luiz de Souza, 43, irmão de Neemias, mas o reconhecimento é impossível. A servidora presta informações, anotando no mesmo pedaço de papel que o homem trouxera da 5ª Delegacia: conseguir foto de Jorge sorrindo, ocorrência do levantamento cadavérico, dirigir-se ao Instituto Médico Legal pedir ofício e se submeter a exames. Não dizer que é DNA, um alerta importante, repetido duas vezes. Os exames de DNA feitos a partir de ossos, custam em torno dos R$ 5 mil, uma das razões pela qual os pedidos não são atendidos de pronto. “Tenho um mês de empresa e hoje tive que pedir folga pra tentar resolver isso. Passei o dia inteiro na delegacia”, relata. Ele conta que vai ser difícil achar fotos ou documentos do irmão, que tinha uma vida sem rumo, vivendo de favor com outra irmã. Com o pequeno papel rasgado na mão, Neemias carrega no semblante uma expressão de múltiplas
A polêmica da votação de outubro deste ano ficou por conta do senador Antônio Carlos Magalhães Júnior (DEM/BA). Ele foi contra a obrigação de veiculação gratuita de campanhas e anúncios sobre desaparecidos em horário nobre nas emissoras privadas. ACM Jr. é proprietário da Rede Bahia, um dos maiores grupos de comunicação do País. O projeto é de autoria da senadora Roseana Sarney (PMDB/ MA) e desde 2004 aguardava apreciação da bancada.
interpretações. Apreensão, mau pressentimento, uma certa resignação com o destino errante de Jorge. Ao término das recomendações, sai, o ar preocupado com o que poderia ouvir do novo chefe. Desde a aprovação da Lei Orgânica da Polícia Civil do Estado da Bahia, em fevereiro de 2009, o Setor de Desaparecidos da Polinter está submetido ao Departamento de Homicídios. Para a delegada Patrícia Boeno, a nova lei deverá agilizar o processo de investigação. “Todo o processo de buscas depende de uma série de autorizações judiciais e mandados e ao passar para Homicídios [departamento], que já tem experiência em lidar com esses trâmites, as coisas devem andar mais rápido”, afirma. O vice-presidente do Sindpoc não vê os efeitos da Lei Orgânica da mesma forma. “Na prática não muda nada. O câncer que mata a SSP são os interesses políticos que travam medidas eficazes que mudem a atuação do órgão junto à sociedade. É uma doença social que precisa ser tratada”, discorda. Engana-se quem pensa que os aspectos sociais do desaparecimento são considerados no Brasil. Há um clima de desconfiança e incerteza pairando no ar, reforçado pelo ambiente onde os registros são feitos. Em 1999, Mari Neide dos Santos, foi obrigada a procurar a Polinter para registrar queixa do sumiço de sua filha, Alice Ane Giselle dos Santos, na época, com 10 anos [ver perfil na pág. 13]. “Parece que pra eles desaparecer não é uma coisa real. Então a Polícia não leva muito em conta se alguém chega e diz que quer prestar conta de um sumiço. Eu penso que eles deveriam parar para analisar o que está sendo exposto e depois tirarem uma conclusão”, afirma. Timidez da imprensa, leis vazias Em Salvador, poucas vezes a imprensa se dedicou a aprofundar o assunto. Limitada a apresentar parentes que fazem apelos enquanto carregam cartazes feitos de cartolina com fotos de quem desapareceu, o serviço prestado pela TV Bahia e TV Aratu se restringe a tentar localizar as pessoas expondo seus retratos. Para Andrea Silva, repórter da TV Bahia, a imprensa, ao mesmo tempo que sente necessidade de cobrar mais das autoridades, fica receosa de melindrar suas fontes. A jornalista, uma das apresentadoras do quadro, acredita que o papel da imprensa deve ser mais incisivo. “Precisamos aprofundar as reportagens, cobrar das autoridades, ver se eles investigam mesmo, mas nossas chefias acabam com medo de ser um tiro no pé, de terminar fragilizando a relação com a polícia, já que também precisamos do trabalho deles. Tenho muita vontade de fazer uma grande reportagem, mas não tenho autonomia, existe uma hierarquia a ser seguida”, afirma. Mesmo com a crescente difusão de casos, o Brasil avançou muito pouco no sentido de instituir programas voltados para prevenir e atenuar as consequências do problema. Nunca houve no país uma campanha estatal para divulgar, alertar e orientar a população sobre as particularidades do tema. Iniciativas de relativa simplicidade, como a criação de uma linha telefônica nacional para o registro e notificação de avistamentos e pistas, não parecem ser cogitadas pelas autoridades. A Secretaria Especial de Direitos Humanos criou a Redesap, página virtual voltada para a questão, mas que atualmente disponibiliza estatísticas defasadas, apresentando 1.247 crianças e adolescentes desaparecidos no Brasil. A Associação Brasileira de Busca e Defesa a Crianças Desaparecidas (ABCD), as Mães da Sé, com sede em São Paulo, estima em cerca de 45 mil pessoas que se perdem de vista todos os anos. O Cadastro Nacional de Pessoas Desaparecidas, lei 11.259 sancionada em 2009 pelo presidente em exercício José Alencar, pretende unificar todas as informações sobre o assunto, mas ainda não foi colocado em prática. Os grandes avanços, ainda que sejam na extremidade teórica do problema, ficaram por conta das emendas propostas pelo deputado Federal Eduardo Amorim (PSDC/SE). O texto apresentado por Amorim contempla a oferta de assistência psicológica aos familiares dos desaparecidos; a previsão de divulgação, em locais de circulação pública, de informações sobre os desaparecidos; e a notificação, pelo sistema de saúde, sobre atendimento de paciente incapaz de se identificar. Outro aditivo importante à lei é a abrangência de todas as faixas etárias dos que estão sendo procurados pela família. Autora da proposta de criação da CPI dos Desaparecidos, a deputada federal Andreia Zito (PSDB/RJ) acredita que crianças e adolescentes aliciados por uma rede de tráfico humano só poderão ser resgatadas e protegidas quando o Estado se sentir responsável pelo problema. “A questão toda só vai começar a ser resolvida quando o Brasil criar delegacias especializadas com agentes treinados para o tratamento dos desaparecidos”, prevê. Para efeitos de parâmetro, guardando as proporções devidas entre contextos históricos e socioeconômicos bem distintos, o fenômeno tem recebido um tratamento diferente em países como Estados Unidos e Canadá, onde uma série de iniciativas, como um alerta disparado pela polícia veiculado imediatamente pelos meios de comunicação [veja página 14].
IMPORTANTE Segundo a Lei 11.259/05, não é necessário esperar 24 horas para registrar boletim de ocorrência. As primeiras horas podem ser cruciais para localização e proteção do desaparecido. O QUE FAZER SE ALGUÉM DESAPARECE 1 Mantenha a calma e inicie as buscas próximo ao local em que a pessoa sumiu. Pergunte às pessoas, vasculhe as imediações e avise imediatamente a parentes e amigos.
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SEM RESPOSTA I
Qual o perfil?
Pobre, morador da periferia e com baixo nível de instrução. Este é um retrato aproximado das pessoas que desaparecem no Brasil, já que a baixa qualidade das estatísticas não permite traçar um perfil exato. Há carência de dados essenciais como faixa etária, profissão e tipo de relacionamento intra-familiar, o que poderia indicar caminhos para pesquisas, programas e campanhas de prevenção. Em Salvador, a situação é exatamente igual ao restante do País.
SEM RESPOSTA II
Quantos
são?
Faça uma busca nas delegacias, hospitais, pronto-socorros e, em último caso, no Instituto Médico Legal. No caso de uma criança, mantenha uma pessoa no local em que ela foi vista pela última vez; ela pode retornar ao mesmo lugar. Tenha sempre uma foto da pessoa, além de fornecer detalhes como idade, sinais particulares e roupa que ela estava usando ao desaparecer. Procure os meios de comunicação para solicitar a divulgação do caso.
COMO TENTAR EVITAR
[Ocorrências com Crianças e Adolescentes]
1 2
Apoio emocional Enquanto Diene contava sua história na praça, moradores de rua dependuram suas roupas maltrapilhas nos gradis desenhados por Carybé, Edileuza Mello, 36, também buscava a mídia como alternativa para encontrar o irmão, José Walter Mello, 32, que sofre de esquizofrenia. Morando há dois meses em Salvador junto com a mãe, em Valéria, Walter teria sido influenciado por parentes e passou a achar o bairro perigoso, e passou a querer voltar para Água Branca, Alagoas, sua terra natal. “Com 22 anos ele era normal, tinha namorada, objetivos. Mas aí começou a se isolar, não queria mais comer, vivia olhando pras telhas”, relata. Edileuza diz que seria bom se houvesse um local de atendimento de apoio específico às famílias envolvidas em casos parecidos com os seus. Em Salvador, o Ministério Público, através do Núcleo de Atendimento para Assuntos Criminais (Nacrim), oferece atendimento presencial também para familiares de pessoas desaparecidas, apesar do foco ser os vitimados por práticas delituosas, como homicídios, chacinas e ameaças de morte. Entretanto, de março a setembro deste ano, dentre os 1.689 cidadãos atendidos pela unidade havia apenas um caso de desaparecimento. O Nacrim é um dos únicos lugares na capital baiana que prestam serviço gratuito sob um aspecto pouco lembrado pelas autoridades: o emocional. “As pessoas chegam aqui muito fragilizadas e além de ouvirmos com atenção os relatos, fazemos o encaminhamento aos Centros de Atendimento Psicossocial [CAPS]. No caso de desaparecido, há um abalo, até porque há uma expectativa, e a coisa pior do mundo é a incerteza”, explica a promotora Solange Rios, coordenadora do núcleo. O que ficou flagrante é o desconhecimento recíproco do funcionamento dos órgãos que deveriam trabalhar de forma conjunta: a Polinter não informa nem encaminha as pessoas ao Nacrim; este, por sua vez, acredita que a Polinter oferece acolhimento psicológico ao cidadão.
Registre imediatamente a ocorrência na delegacia responsável pela investigação de desaparecidos.
3
Torne-se amigo e confidente do seu filho, fazendo-o se sentir seguro para contar qualquer coisa a você. Observe mudanças de comportamento; Observe novos vizinhos com hábitos estranhos em relação a crianças (casas sempre trancadas, falta de sociabilidade) e, caso haja alguma suspeita, não hesite em chamar a polícia; Verifique com quem seu filho está se correspondendo pela Internet (orkut, salas de bate papo, msn, e-mails)
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Deixe orientação explícita na escola sobre quem pode buscar a criança;
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Evite pedir para crianças irem sozinhas a comércios, lojas e lugares de grande circulação de pessoas;
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Ao sair com a criança para um lugar de maior movimentação de pessoas, faça um pequeno crachá com seu nome, endereço, telefone e prenda na roupa do seu filho. Fonte: www.cpicriancasdesaparecidas. com.br
Mil e duzentos, 10 mil ou 50 mil pessoas. Esta é a variação que denuncia como o Brasil encara um fenômeno que cresce às escuras. Perdido com tantas propostas de cadastros nacionais, leis de proteção à criança e ao adolescente e ainda CPI’s que se propõem a investigar o fenômeno, o País não sabe exatamente quantos dos seus cidadãos desaparecem por ano. Sem saber quem e quantos são, não é possível estimar, por exemplo, quanto custaria ao governo um amplo programa que tivesse reflexo imediato na diminuição das ocorrências.
9
Carol Garcia
Reprodução
Recentemente, o Caminho de Volta assinou um convênio com a Secretaria de Direitos da Pessoa com Deficiência do Estado de São Paulo para realizar um projeto de pesquisa e prevenção ao desaparecimento de crianças com deficiência. “A questão do desaparecimento de pessoas ainda não recebe a atenção e cuidados necessários em nosso país. As medidas ainda são tímidas e as ações já regulamentadas não são implantadas e acho que deveríamos trabalhar muito mais a prevenção”, finaliza. Estudos realizados pelo sociólogo Dijaci Oliveira, da Universidade de Brasília, apontam que a maioria dos casos são originados por fugas espontâneas, motivadas por fatores diversos, que envolvem desde maus tratos até procura de oportunidades de emprego em outras cidades. Sem aporte emocional por parte do Estado, sem amparo jurídico, que considera legalmente a pessoa morta após dez anos de desaparecimento, os parentes se sentem desorientados. “Pode-se afirmar que a família torna-se refém uma vez que depende da boa vontade das delegacias, da repercussão na mídia ou da influência a partir dos relacionamentos interpessoais”, conclui. Todo o aparato do Estado no que se refere ao drama dos que desaparecem, é voltado para o âmbito policial, sem preocupações quanto a possíveis delimitações. Onde termina uma prática delituosa e onde começa uma carência social é um fator que passa longe da mentalidade de quem decide. É uma hipótese tentadora, ainda que arriscada: camadas socialmente mais baixas são geradoras de desaparecimentos em função da falta de assistência estrutural que envolve serviços essenciais de educação, saúde e emprego. Em resumo, são ausências que surgem todos os dias em decorrência de outras.
PELLEGRINO | Em dois anos na Secretaria da Justiça, nenhum projeto foi desenvolvido em prol de pessoas desaparecidas
Estado não aparece
graças à deficiência do Estado em investigar os casos registrados na Bahia”, afirma Paulo Reis, fundador da organização. Contando com agentes voluntários, o Interbusca oferece atendimento gratuito. [veja matéria na página 15].
Luciano gostava de passear com a família aos domingos, quando iam a uma churrascaria do bairro. Tranquilo e brincalhão, falava com todos na vizinhança, mas quando ingeria álcool terminava se envolvendo em brigas. Duas delas, por sinal, foram com o próprio irmão, Marcos, que também gosta de beber. O fato aconteceu quinze dias antes do desaparecimento. Apesar do relacionamento familiar ser marcado por desavenças – Diene, por exemplo, não fala com a sogra nem com o cunhado; estes suspeitam do pai de Diene pelo fato dele ser policial civil – A mulher não acredita que Luciano tivesse motivos para desaparecer. “Por incrível que pareça a gente tava vivendo ótimo, porque ele tinha parado de beber, e a gente só brigava assim quando ele bebia, entendeu?”, revela. Em relação à “briga feia” entre os irmãos, ela não relaciona um fato a outro. “Não culpo o irmão dele porque tenho certeza, meu Deus, que Marcos nada fez contra ele. Luciano estava até assim meio triste por causa dessa briga... depois o irmão espancou a mulher e foi preso...”. O espaço vazio que as pessoas deixam nas vidas de seus familiares é tão grande quanto a lacuna do Estado ao lidar com o fenômeno. Um exemplo disso é a participação da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Secretaria de Segurança Pública e da Polinter no I Encontro Nacional sobre Pessoas Desaparecidas, realizado em Salvador entre os últimos dias 16 e 17 de setembro. Nenhum representante titular dos órgãos, nenhum delegado ou agente compareceu ao evento. [Nota: a Assessoria de Comunicação da SSP não considerou pertinente a indagação sobre a ausência das autoridades]. Secretário da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos entre 2008 e 2010, Nelson Pellegrino afirmou durante
o encontro que o poder público deveria dar atenção ao grave problema social, mas admite que o tema não foi estudado embora fosse do conhecimento da secretaria. Perguntado sobre o que faria se alguém de sua família desaparecesse, o ex-secretário e deputado federal se mostrou descrente nos recursos do próprio estado que ele já representou. “Infelizmente, [teria que] fazer o que todos fazem. Procurar nos institutos médicos legais, procurar a Polinter e dar esse conhecimento, investigar na rede social, na internet, ver se há alguma comunicação, identificar relações pessoais. Os instrumentos hoje são limitados”, reconhece. O deputado estadual Bira Coroa (PT) é autor de um projeto de lei que tramita na Assembleia Legislativa visando a criação de um cadastro na Bahia. Presente ao Encontro, ele afirmou que o fato desestabiliza não só pelo próprio desaparecimento, mas pela impossibilidade de sepultar um ente querido que termina envolvido numa situação trágica. Entretanto, não se sabe quando os efeitos práticos da proposta serão sentidas por quem aguarda o retorno dos que se evadiram de seus domicílios. “O projeto está tramitando, mas claro que há um padrão nas casas legislativas. Quando o interessado não é mais um parlamentar, os projetos terminam sendo arquivados, a não ser que um outro parlamentar tenha o interesse de desarquivar”, disse. Enquanto as lacunas se alargam, surgem organizações não-governamentais como o Movimento Simone Pinho (MSP), que durante oito anos ajudou a localizar cerca de 700 pessoas. Sem apoio por parte dos órgãos governamentais, o MSP foi fechado em setembro deste ano devido às obrigações profissionais de Josenilda Lima, fundadora da ONG. Outra iniciativa do terceiro setor na Bahia é o Interbusca Desaparecidos foi criado em 2008 e são 32 casos resolvidos. “Nosso trabalho surgiu
Os desaparecidos 51,3% 36,1% 29,3% de São Paulo maus tratos
alcoolismo
Fonte: Projeto Caminho de Volta (2007). Pesquisa realizada com 302 famílias da capital paulista.
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violência conjugal
causas do desaparecimento ou fuga
24h
Pelo Brasil O sumiço do Estado obriga também que iniciativas na área de Tecnologia sejam tomadas por instituições como o Caminho de Volta, que desde 2004 atua em São Paulo. Idealizado pela geneticista Gilka Gattás, o projeto ajuda a localizar crianças e adolescentes na capital paulista trabalhando em quatro frentes: identificação das causas, criação de um banco de DNA para identificar elo genético entre as famílias e os desaparecidos, suporte psicossocial com acompanhamento psicológico desde o início até a solução final de cada caso e capacitação de profissionais através de cursos presenciais e a distância oferecidos aos envolvidos no processo de localização. O modelo tem pontos semelhantes com o que é desenvolvido no Canadá, especialmente no que se refere ao apoio psicológico e ao treinamento de profissionais que lidam com o tema. O trabalho é feito em conjunto com os policiais e uma equipe de psicólogos fica de plantão na delegacia. A família registra a ocorrência, conversa com o investigador e, se desejar, entra no Caminho de Volta. A participação é gratuita e voluntária. O intuito do projeto é conhecer a dimensão do problema e ajudar aquela família em especial. Apesar do governo de São Paulo conhecer um projeto que tem em mãos estatísticas precisas sobre o perfil dos desaparecidos, não há sinal de aproximação para ação em parceria. “Todos conhecem nosso trabalho e nossos resultados. Entretanto, ainda não existem políticas públicas nesse sentido”, afirma Gattás. Mas há também o que comemorar.
48h
50% das famílias levaram de 24 a 48 horas para registrar boletim de ocorrência. 19,2% das famílias demoraram de 4 a 7 dias para efetuar o registro
1ª vez 52,3% dos desaparecimentos aconteceram pela primeira vez
1
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Polinter: um relatório inconsistente
VULNERÁVEIS | Idosos e crianças de bairros periféricos são vítimas constantes de desaparecimento. Fuga espontânea, rapto e falta de estrutura da família estão entre as causas mais frequentes
PONTOS-CHAVE DO DESAPARECIMENTO EM SALVADOR
As mensalidades do colégio da pequena Amanda estão atrasadas. A menina não tem ido às aulas e às vezes chora ao perguntar pelo pai. Luciano pagava a escola e fazia as compras todo mês, mas desde o seu desaparecimento, a Brasquímica não procurou a família para oferecer auxílio. A ajuda de custo inicial no valor de R$ 50 para cesta básica foi suspensa. “O que me segura é que sempre vendi minhas coisas, minha micheline. Também recebo Bolsa Família e o aluguel de uma casa de R$ 180, é que tá me segurando, entendeu?”. O relatório de diligências policial (sic) sobre o caso Luciano foi assinado pelo coordenador dos agentes da Polinter, Jerenaldo Borges: “diligências foram efetuadas na localidade de Águas Claras, local onde foi visto o desaparecido pela última vez, na cidade de Madre de Deus, local onde trabalhava a vítima e em outras localidades do estado, sem êxito na localização do procurado. Saliento que, também foram feitas buscas no IML de Salvador e Santo Antônio de Jesus, assim como hospitais da capital, Candeias e Dias D’ávila. Estou dando continuidade às investigações no sentido de localizar o desaparecido”. Já o relatório assinado pela delegada Patrícia Boeno, encaminhando o processo para a circunscrição policial responsável pela área onde a vítima foi vista pela última vez, diz que “a Polinter apenas realiza investigações e adota providências preliminares junto a outros órgãos públicos pertinentes, visando afastar ou não a existência de fato delituoso”. O caso foi transferido para a 13ª Delegacia, localizada em Cajazeiras, mas Diene alega ter dificuldade para falar com os responsáveis pelas investigações. Ouviu do delegado que todos seriam interrogados novamente, mas as testemunhas e envolvidos não foram chamados. Presença certa nas quartas-feiras da Piedade, ela sempre carrega consigo a foto do marido colada num papel de ofício plastificado. Sua persistência diária para elucidar o caso, porém, está assumindo contornos religiosos. “Meu pai até me chamou pra ir na delegacia, cobrar deles, mas aí eu tô na Igreja... tô recebendo revelações... agora eu espero o tempo no Senhor...”, reafirma.
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Dona Vanda, Edileuza, Neemias e Diene enfrentam seus dramas particulares cada um à sua maneira. Tentam o refúgio na religião, recorrem ingenuamente à polícia ou fazem apelos-relâmpago na TV. À medida que o tempo avança sem esboçar novidades, qualquer tentativa é válida para aplacar o desespero. Em comum, além da ausência dos que partiram não se sabe para onde, resta a eles prosseguir convivendo com a expectativa de um retorno incerto, mais angustiante do que a certeza da morte: eterno suspense que arrasta as horas do cotidiano. Reprodução
Silêncio que fala por si Foram inúmeros os contatos feitos com a Secretaria de Segurança Pública, através da Assessoria de Comunicação, no sentido de se realizarem entrevistas com o delegado-chefe Joselito Bispo e o coordenador da Polinter, delegado Joelson Reis. Apesar da promessa do assessor Cláudio Pimentel em atender às solicitações para esta reportagem, perguntas essenciais para entender o desaparecimento em Salvador não foram respondidas nem mesmo por correio eletrônico. Algumas delas:
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Os resultados são satisfatórios? Por que as ocorrências só são registradas após 24 ou 48 horas, ao contrário do que estabelece a Lei Federal 11.259? Como pode ser interpretada a ausência de autoridades do Governo do Estado no I Encontro Nacional sobre Pessoas Desaparecidas, realizado nos dias 16 e 17 de setembro deste ano em Salvador?
57,7%
25,6%
57,7% das meninas e 25,6% dos meninos foram acolhidos por conhecidos que não informaram às autoridades sobre o fato
AUSÊNCIA | O delegado-chefe da SSP, Joselito Bispo, não respondeu às perguntas sobre os métodos de investigação da Polinter
Estatísticas de baixa qualidade Interpretação dos dados colhidos junto aos familiares geraria banco de dados com alto grau de precisão, identificando o perfil do desaparecido. Relacionamento distante com a mídia Historicamente, a relação da polícia com a imprensa é marcada por tensões, mas uma aproximação em nome de ações articuladas poderia marcar uma nova fase entre jornalistas e agentes da Secretaria de Segurança Pública. Transferência da investigação para as famílias A maioria das famílias não possui recursos financeiros nem técnicos para deslocamento e averiguação. Além de expor ao risco quem procura seus parentes, a “terceirização” invalida os números oficiais de casos solucionados. Foco na investigação policial desconsiderando o aspecto social do desaparecimento A Polinter é especializada em Busca e Apreensão autorizadas por mandados judiciais. Em todo o País não existe uma delegacia que trabalhe exclusivamente com os desaparecidos, o que se reflete em atendimento desumanizado ao cidadão. Relação utilitária com instituições que atuam na busca de desaparecidos As ONG’s que cuidam de desaparecidos em Salvador são taxativas ao afirmar que a Polinter encaminha os casos (outro tipo de “terceirização”), mas não concede o crédito pelas localizações. Uma parceria institucional talvez fosse uma saída. Perpetuação da cultura das 24 horas para registrar ocorrência Todos os entrevistados afirmaram que só puderam fazer o registro após um dia de o fato acontecer. Sem saber dos seus direitos, as famílias poderiam apelar para a lei 11.259 e obrigar os agentes a registrarem o boletim.
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Falta de integração com outros órgãos do Estado (Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, Ação Social, Ministério Público) para estabelecer ações conjuntas O trabalho conjunto provavelmente implicaria resultados satisfatórios, como campanhas educativas, criação de canais diretos para denúncias e mobilização da sociedade. No exterior, o trabalho conjunto é um dos pilares para a prevenção.
O que é feito com os dados estatísticos após o envio de boletins ao Centro de Documentação e Estatística Policial?
Como o desempenho da Polinter é avaliado no que se refere às investigações e localização de desaparecidos?
Infraestrutura precária Tecnicamente a aquisição de armamentos, viaturas, equipamentos e reforma do espaço físico das delegacias depende de dotação orçamentária.
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Por que os números de desaparecidos não são disponibilizados no site da SSP?
Há algum tipo de encaminhamento para que se implementem medidas de prevenção?
Falta de efetivo e treinamento especializado Necessidade de contratação de agentes e reestruturação do curso de policiais civis, atualmente com duração de três meses.
20%
58,9%
das famílias se declararam usuárias de álcool em conjunto com o uso de drogas e contravenção/infração
das famílias já haviam procurado o Conselho Tutelar em busca de auxílio para os problemas domésticos
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Vidas Suspensas
Vidas Suspensas Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador
Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador
FACULDADE
FACULDADE
SOCIAL
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CURSO
DE
JORNALISMO
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PRODUTO
EXPERIMENTAL
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2010.2
PERFIL I Tom Correia
Há um ano e três meses, o jovem saía de casa para desaparecer próximo ao prédio onde trabalhava, numa das avenidas mais movimentadas de Salvador
Dona Marisa se despediu do filho e ao entrar no quarto percebeu que ele havia deixado sua pochete, coisa que jamais fazia. Outra coisa que chamou a atenção foi o lençol estirado, a cama arrumada, algo também que não era do feitio de Glauber. A mãe só pressentiu que as coisas não iam bem quando não recebeu os telefonemas costumeiros do filho, por volta das 9 da manhã e ao meio-dia, antes do almoço. Àquela altura, George já havia recebido ligação da empresa por volta das 8 da manhã, pois Glauber não havia batido o ponto, mas Dona Marisa só saberia disso na manhã
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Os passos perdidos de Alice Um desaparecimento inexplicável e sem respostas há onze anos, mas que pelos indícios esteve muito perto de um final feliz
“Morreu, seu filho está morto”. Esta foi a frase que a aposentada Marisa Santos, 63, escutou de um agente da Polinter, aonde fora buscar notícias sobre Glauber Fausto da Silva Santos, 27, desaparecido em 21 de agosto de 2009. Moradora do bairro da Valéria, no limite do perímetro urbano, dona Marisa também é mãe de Aline e George, mas Glauber era o mais apegado a ela: não pensava em se casar e vivia bem em casa, apaixonado por surf e motocicletas.
“Mãe, estou bonito?” “Meu filho, você é sempre bonito, mas deixe pra usar isso amanhã que é sábado”. “A senhora arruma meu quarto?” “Você sabe que eu arrumo toda sexta...” “Mas eu quero que a senhora arrume agora”.
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CURSO
DE
JORNALISMO
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PRODUTO
EXPERIMENTAL
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2010.2
PERFIL II
Um certo Glauber
A cama do rapaz que tem tatuagens no braço e na barriga – um Patolino e uma gárgula, figura mitológica metade humana e metade monstro – continua arrumada, do jeito que ele viu ao sair para trabalhar no Centro de Operações Financeiras Petrobras, localizado na avenida Tancredo Neves, na manhã de uma sexta-feira. Naquele dia, dona Marisa fez o almoço para ele levar, preparou sua mochila e recebeu do filho um beijo na testa como forma de agradecimento. O auxiliar administrativo pediu carona a George, já que a moto estava com problemas. Antes de sair, foi ao quarto, colocou uma corrente de prata e perguntou:
SOCIAL
CAMINHOS TURVOS | Apesar das afirmações de agentes da Polinter, D. Marisa ainda espera reencontrar o filho com vida
de domingo. “Quando eu ouvi ‘minha mãe, o Glauber desapareceu’, aí pronto, foi o fim. Até hoje não costurei a bermuda que ele pediu para consertar porque estou esperando por ele...”, afirma. O percurso das buscas foi o mesmo seguido por outras famílias: registro na Polinter após 24 horas (por orientação dos agentes), procura no Instituto Médico Legal e anúncio no Quadro Desaparecidos da TV Bahia. Além disso, espalharam cartazes pela cidade, na esperança de obter alguma informação. Nada, nenhum telefonema foi recebido. D. Marisa e George acreditam que investiram cerca de R$ 10 mil com a divulgação de fotos, organização de grupos de motociclistas que já percorreram locais como a ilha de Itaparica e a contratação de um detetive. De acordo com os dados oficiais, foram 645 casos de desaparecimento em Salvador no ano de 2009, dos quais 541 foram encontrados, grupo que não inclui o filho de dona Marisa. No sábado, 21 de agosto, exatamente um ano após o desaparecimento, a aposentada chegou ao quarto arrumado com a nítida sensação de que ele estaria lá. Chegou na entrada e disse “Glauber, cheguei”, tentando imitar a forma como o filho fazia ao voltar da rua. “Até hoje não me conformei, não consigo
me concentrar nas coisas. Perdi o ânimo até de ir à Igreja Renascer, único lugar onde encontrei algum tipo de conforto”, murmura. A família acredita que o sumiço de Glauber tenha relação com o tráfico na região, já que ele era usuário de drogas. Além disso, a família alugou um imóvel a um traficante, um dos suspeitos pelo desaparecimento. Segundo George, o detetive descobriu através de gravações telefônicas e fotografias que há fortes indícios da eliminação do irmão, mas para resolver o caso eles teriam de abandonar a casa onde moram. “Ele jamais saía de casa sem dizer onde estava, além de ser muito ‘família’. Não gostava nem de comer na rua, dizia que passava mal, que só se sentia bem em casa”, relembra George. A causa provável do desaparecimento pode ser outro fator que desmotiva a polícia para investigar o caso em profundidade, deixando os parentes em eterno suspense, já que não há prova material do suposto crime. Atenta aos entraves policiais e judiciários, dona Marisa queria apenas uma resposta diferente da que recebeu. “Ouvir que meu filho está morto foi muito duro pra mim, eu disse ao agente. Ele me respondeu apenas que eu tinha de me conformar, pois a polícia trabalha apenas com a realidade”, conclui.
As avenidas que fazem parte do circuito de carnaval de Salvador estavam abarrotadas no dia 14 de fevereiro de 1999, um domingo. No meio da confusão de milhares de foliões seguindo os trios elétricos, uma pessoa em estado de choque antevia o rosto de sua filha em cada criança no caminho. Em cada canto do Campo Grande, Barra e Pelourinho havia uma mãe em particular com o coração aos pulos, abrindo passagem entre a multidão alheia e alegre que sambava ao som de “Juliana”, sucesso da época cantado por Pierre Onassis, então vocalista do grupo Bom Balanço. A despeito de toda semelhança, a busca frenética ao virar cada garotinha de frente, desvelava uma angustiante sequência de pequenas decepções; o som da pretensa alegria dos trios era a trilha musical que marcava o ritmo da procura por uma menina que vestia saia e blusa lilás e usava uma sandália plástica da mesma cor; tinha o cabelo solto na parte de trás e preso em cima com uma “xuxa” de crochê rosa. Além disso, usava uma argolinha do piu-piu. Era Alice Ane Giselle dos Santos, 10 anos completados dois dias antes. A vizinhança da rua Souza Uzel, 51, Federação, se mobilizara naquela tarde carnavalesca, a mais dolorosa de todas para a costureira Mari Neide e o mecânico Eduardo, pais da menina que já chamava a atenção devido ao corpo que já se desenvolvia, prometendo uma bela adolescente. A mãe se preparava para fazer um bolo de aniversário para seu Alfredo, avô de Alice, quando ela chegara do mercado trazendo farinha de trigo. “Mainha, vou pra casa de minha tia brincar com Graziele”, disse, logo depois. A casa ficava a uns 50 metros. Alice foi até lá e durante poucos minutos brincou com a prima até resolver voltar pra casa. Era sua intenção. A voz ainda trêmula e os olhos marejados de Mari Neide denunciam a dor causada pela ausência prolongada da única filha, com quem só andava de braços dados. A falta da criança fortaleceu a relação do casal, que já havia decidido não
ter mais filhos. A mãe passou a se sentir um zumbi dentro de um pesadelo, perdeu peso e ainda que abalada emocionalmente, não teve nenhum acompanhamento psicológico; o pai, “enlouquecido”, durante anos seguidos se dedicou a investigar por conta própria. A qualquer hora, em qualquer lugar, ele estava em busca de Alice, chegando a acordar os mendigos que dormiam na Estação da Lapa para perguntar pela menina, mostrando sua foto. Como consequência, a situação financeira da família entrava em declínio. Eduardo começou a perder os clientes, já que não conseguia mais se concentrar no trabalho. O casal deixou o apartamento em Colinas de Pituaçu, que terminou sendo invadido e hoje é disputado em questão judicial. Passaram a morar com o pai de Mari Neide, na mesma casa onde viram Alice pela última vez. “No início as pessoas nos ajudaram, mas o tempo vai passando e elas foram se afastando, porque cada pessoa tem sua vida pra cuidar. Apesar da gente ouvir alguma palavra de conforto, o problema passa a ser só seu. Até as autoridades passam a enxergar a situação como algo normal”, relata Mari Neide. Segundo a Polinter, em fevereiro de 1999 foram registradas 12 ocorrências de desaparecimento em Salvador. Apenas uma criança do sexo feminino consta nos relatórios. É o caso de Alice. Faz 11 anos e 9 meses que a menina meiga e estudiosa desapareceu, deixando os pais arrasados emocional e financeiramente. As despesas incluíam contas telefônicas astronômicas, viagens a cidades como Ilhéus e até combustível dos carros emprestados aos agentes para que fizessem investigação. Riscos e quase reencontro Em dois momentos, durante todo esse tempo, os
pais de Alice acreditam que seguiram pistas capazes de solucionar o caso, mas foram obrigados a parar por chegarem aos seus limites. Através de uma informação que chegou da Polinter, eles foram atrás de uma mulher que havia ligado dizendo saber onde estava a menina. Passaram uma semana indo à invasão do Inferninho, no bairro da Mata Escura. Além do aspecto tenebroso do lugar, outro detalhe chamou a atenção do casal. “Quando a gente mostrava a foto, as pessoas diziam ‘não sei, não vi, não conheço’ e corriam assustadas pra dentro de casa. Depois passamos pra polícia o que fizemos e eles disseram que éramos loucos, que a gente não deveria ter ido naquele lugar sozinhos, porque nem eles tinham coragem de entrar naquele lugar”, relata. A outra pista foi investigada por eles em Barra do Pojuca, povoado que pertence a Camaçari. Com carro emprestado, passaram um tempo visitando escolas e mostrando a foto da filha. Lá descobriram que uma mulher estrangeira havia tentando matricular uma criança muito parecida com Alice, mas a menina não tinha documentos, o que impediu o registro. Sem mais recursos para continuar viajando, não foram adiante, mas informaram tudo à Polinter. Especialistas afirmam ser raros os casos de crianças desaparecidas que reaparecem após tanto tempo. “Sonho com ela, só que no meu sonho ela não cresceu, não ficou adulta ainda, vejo sempre da mesma forma quando ela desapareceu. Mas é uma coisa que ninguém tira da minha mente: eu só vivo pra encontrar minha filha”, reafirma. A farda nova comprada para Alice cursar a quinta série ainda permanece guardada, junto a antigos brinquedos. Mari Neide afirma que já jogou muita coisa fora, tentando se desapegar da menina ao se livrar dos pertences. Ela acredita num reencontro que toma a forma de um milagre. Tom Correia
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DESAPEGO E CRENÇA | Mari Neide já se desfez dos brinquedos, mas ainda guarda roupas e retratos da filha
Vidas Suspensas
Vidas Suspensas Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador
Os descaminhos de pessoas desaparecidas em Salvador
FACULDADE
FACULDADE
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CURSO
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JORNALISMO
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PRODUTO
EXPERIMENTAL
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SOCIAL
INTERNACIONAL
Auxílio financeiro e emocional às famílias, programas de prevenção, linha telefônica gratuita para denúncias e disparo imediato de alerta nos meios de comunicação. Veja como o desaparecimento de pessoas é tratado no exterior
Comparar o quadro no Brasil com a atuação das instituições no exterior, mostra como o drama enfrentado pelas famílias daqui está longe de receber a atenção devida. Em países como o Canadá, Austrália, Comunidade Europeia, Estados Unidos e Reino Unido, a preocupação em relação ao tema, envolve tanto o governo, o terceiro setor e veículos de comunicação. Como se não bastassem as diferenças em pontos cruciais como as quantias investidas, a qualidade das estatísticas, a produção de pesquisas e artigos que ajudam a entender o problema, há três outros fatores essenciais que determinam a eficiência para localizar pessoas: agilidade nas buscas, promoção de políticas públicas e atuação conjunta da polícia e de organizações civis. Confira o que cada país faz para reencontrar seus desaparecidos ou para evitar que o fato aconteça.
UNIÃO EUROPEIA
Na Europa, a Missing Children Europe foi criada em 2001 e atualmente reúne 24 ONG’s de 17 países, incluindo a Suíça, para combater o desaparecimento de crianças e adolescentes. Atendendo a uma determinação da Comissão Europeia de fevereiro de 2007, a organização disponibiliza o número 116000 no qual esclarece o assunto através de dicas para a família, manual de conduta e melhores práticas e perguntas mais frequentes sobre desaparecimentos. Uma das iniciativas da MCE é distribuir gratuitamente braceletes de identificação para os pais e responsáveis colocarem nos filhos. [www.missinchildreneurope.eu] [http://www.hotline116000.eu/]
REINO UNIDO
A organização inglesa Missing People investe anualmente cerca de 1,9 bilhão de Libras Esterlinas (cerca de R$ 5 milhões) para oferecer apoio gratuito aos familiares de desaparecidos, estimados em 250 mil pessoas/ano. Entre 2010 e 2013, a organização pretende implementar novos serviços de apoio, orientação e suporte psicológico e financeiro para os que sofrem com as consequências de desaparecimentos de parentes e amigos. Destacamse serviços como linha telefônica (nº 116000) exclusiva para atender a população em pontos espalhados pelo país, agilizando a informação quando um desaparecido é visto; extensa rede de voluntários mobilizados nas grandes e pequenas cidades mobilizados em torno de ações promovidas pela instituição; acompanhamento por profissionais de psicologia a fim de oferecer conforto emocional à família. Além disso, a MP promove parcerias com o governo e organizações de voluntários que otimizam o atendimento à população. A Missing People busca ainda influenciar na legislação do país em busca de implantação de políticas públicas e de melhorias das práticas já em vigor. [www.missingpeople.org.uk]
sistema de comunicação amber alert auxílio financeiro e/ou psicológico serviço de atendimento telefônico
AUSTRÁLIA
pesquisa avançada
O país foi um dos primeiros a tomar medidas contra o desaparecimento de pessoas, especialmente de crianças e adolescentes. Em 1981, foi instituído o 25 de maio como o Dia Internacional de Crianças Desaparecidas e desde então uma série de providências foi tomada, como a criação do Amber Alert, em 1996, um comunicado acionado pela polícia, após checagem detalhada, para informar rapidamente sobre o desaparecimento de criança ou adolescente vítima de rapto ou sequestro. Em casos excepcionais, são emitidos alarmes sobre o sumiço de adultos vulneráveis. O sinal é veiculado imediatamente por estações de rádio, canais abertos e fechados de TV, além de utilizar correio eletrônico e outdoors luminosos, já que especialistas consideram as primeiras três horas como cruciais para a vida do desaparecido. O Amber é registrado também no Centro Nacional de Informação sobre o Crime, órgão ligado ao FBI. No final de 2002, o sistema foi adotado também pelo Canadá e atualmente seis outros países possuem um alerta que segue as premissas norte-americanas: Austrália, França, Grécia, Holanda, Irlanda e Malásia. A organização Office of Juvenile Justice and Deliquency Prevention é uma das centenas que atuam na questão de desaparecimento infanto-juvenil em parceria com o Departamento de Justiça Norte-americano, emitindo relatórios e estatísticas que são utilizadas em políticas públicas que se refletem na vida prática do cidadão. [http://www.ojjdp.gov/]
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CURSO
DE
JORNALISMO
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BAHIA
Mundo solidário
ESTADOS UNIDOS
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CANADÁ
O Serviço Nacional de Crianças Desaparecidas, administrado pela Polícia Real Montada canadense, se destaca pela série de medidas que ameniza e previne o extravio de pessoas do ambiente familiar. Contudo, apesar do modo exemplar como o país trata os desaparecidos, ainda que crianças e adolescentes sejam mais protegidos, as estatísticas apontam para números como os registrados em 2009: 50.492 casos de desaparecimento, sendo que 35.768 foram ocasionados por fuga. Atualmente, onze programas específicos estão em prática no país e que auxiliam o cidadão oferecendo assistência a pais que não podem arcar com as despesas de viagens domésticas ou internacionais para reencontrar seus filhos. As passagens aéreas são fornecidas gratuitamente após criterioso acompanhamento do caso. O Amber Alert é baseado no modelo norte-americano [ver abaixo] e envolve parcerias com voluntários, meios de comunicação e ONG’s para mobilizar as buscas. Outro recurso é um software utilizado nos casos de desaparecimento ocorridos há mais de dois anos. Trata-se de um processo de envelhecimento fotográfico que ajuda a divulgar a provável aparência atual da pessoa, facilitando o reconhecimento e aumentando as chances de um reencontro.
Funcionários do governo, investigadores, departamentos da polícia, cidadãos e instituições que se dedicam ao fenômeno também são reconhecidos com condecorações. A premiação consiste em passagens aéreas para voos domésticos, destinada a pessoas físicas ou jurídicas que se destacam por ajudar nas investigações ou na solução de casos de desaparecimento. Além disso, são oferecidos várias vezes por ano, dois dias de treinamento específico para atualização de profissionais que atuam diretamente com os casos de desaparecimento, como investigadores e representantes da lei canadense. A rede mundial de computadores também passou a ser uma fonte de preocupação das autoridades canadenses. Entre 2000 e 2008, foram realizadas 33 investigações on line, auxiliadas pela Interpol e que originando um manual com dicas de segurança para lidar com o mundo virtual. Outras medidas envolvem estatísticas atualizadas, integração do governo e sociedade civil num esforço conjunto de combate ao desaparecimento, extensa rede de parceiros em outros países que facilitam a localização fora do território canadense. [http://www.rcmp-grc.gc.ca/nmcs-sned/index-fra.htm]
Além da forma organizada como concentram informações as autoridades australianas se destacam pelo extenso número de pesquisas e artigos que tentam entender e prevenir o fenômeno. Os casos são investigados por oito unidades especializadas espalhadas pelo país, com apoio da Polícia Federal e parceria com cinco agências de buscas que oferecem auxílio gratuito às famílias. As ocorrências são estudadas para estabelecer perfil, modo e causas do desaparecimento, permitindo que o governo desenvolva campanhas anuais de conscientização. Com os estudos, eles chegaram a conclusões apontando que cada desaparecimento afeta diretamente doze pessoas em média, refletindo em prejuízos econômicos e também na queda de rendimento no trabalho de funcionários que perderam alguém. O governo australiano oferece aconselhamento psicológico e apoio emocional às famílias envolvidas numa situação de perda. As pesquisas australianas abrangem detalhes como orientar as pessoas que se ressentem ainda mais dos desaparecidos em datas especiais, como aniversários e outras datas significativas. As famílias são orientadas a atuarem em conjunto com a polícia e os meios de comunicação, estimulando que as informações sejam atualizadas a cada nova pista descoberta. [http://www.missingpersons.gov.au]
Porta que se abre Fundada em 2008, organização baseada no voluntariado acolhe e atende gratuitamente quem procura ajuda nas buscas. O melhor: já conseguiu solucionar mais de 50% dos casos registrados. A sala 509 do Edifício Adolfo Basbaum, localizado no centro da cidade, próximo ao Mosteiro de São Bento, possui grande movimentação às quartasfeiras. Quem se concentra na Praça da Piedade para tentar participar do quadro exibido pela TV Bahia, é informado sobre a existência do Interbusca Desaparecidos, e se dirigem para o local na expectativa de aumentar as chances de reencontro. Nas dependências do prédio, o que se vê são vários agentes masculinos e femininos, com uniformes pretos, anotando a ocorrência e perguntando detalhes que podem ser fundamentais para elucidação do caso. Paulo Reis, 37, é funcionário da Secretaria de Turismo do Estado da Bahia (Setur), atuou como mediador no Balcão de Justiça durante 10 anos e sua prática atendendo às pessoas, despertou aos poucos o interesse pelos desaparecidos. Reis é fundador e presidente da organização, registrada no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente (CMDCA), e que desde 2009 já localizou 32 pessoas do total de 57 registros. “Nosso trabalho nasceu porque vimos que se tratava de uma necessidade muito grande que não vinha sendo atendida pelos órgãos que deveriam tratar do assunto”, afirma. Mantida por doações de pessoas comprometidas com a causa, o Interbusca já pleiteia recursos ao Fundo do CMDCA e apresentou proposta de parceria com o Ministério Público do Estado. A ideia é ampliar o serviço prestado à população, que às vezes não possui dinheiro nem mesmo para a condução. Entretanto, segundo o presidente, toda a iniciativa
de atuar em prol dos desaparecidos não parece estar sendo bem vista pelo poder público. Um agente chegou à 12ª Delegacia com um ofício solicitando a localização da pessoa e em vez de o policial verificar quem estava sendo procurado, resolveu investigar se o agente tinha passagem pela unidade. “O policial questionou se estávamos colocando à prova o trabalho da polícia. Na verdade queremos somar, mas constatamos que nossos resultados estão começando a incomodar”, ressalta Reis. De segunda a sexta, das 9 às 17h, 62 agentes voluntários se revezam em turnos semanais de oito horas. O presidente do Interbusca credita a solução dos casos ao trabalho à orientação que os agentes recebem, a de permanecerem sempre atentos mesmo fora dos plantões. Foi assim que Hildemária Ataíde, 34, foi encontrada perambulando pelo bairro de Cosme de Farias por um agente que voltava da musculação. Hildemária sofre de esquizofrenia e só foi reconhecida por um detalhe anatômico que pode ser visto na foto deixada no Interbusca pela família: um defeito num dos dedos do pé. Moradora do Doron, dona Ana Clara Ataíde, tia de Hildemária, afirma ter recebido da instituição apoio para conseguir internar a filha no Hospital Juliano Moreira. “Fui muito bem atendida, eles são muito atenciosos. Tivemos muita sorte porque oito dias depois de registrar a ocorrência, eles localizaram minha sobrinha. Agora temos mais cuidado para que ela não desapareça novamente”, relata. Informações: Interbusca Desaparecidos - Av. Sete de Setembro, 202 - Ed. Basbaum, sala 509 | 71 3487-3332 Tom Correia
PAULO REIS | “Nossos resultados só incomodam a quem não faz nada pelos desaparecidos”
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ARTIGO – DIJACI OLIVEIRA
A fragilidade e imprecisão de nossas estatísticas Desde que foi criado, o site do Ministério da Justiça tem servido como referência oficial sobre o panorama dos desaparecimentos de pessoas. Na maior parte dos Estados, os dados são inacessíveis ou de péssima qualidade. Isso dificulta formular políticas mais eficientes para o enfrentamento do fenômeno. Sentimos falta de uma política de segurança que estimule uma investigação aprofundada sobre os dados criminais no Brasil. Segundo o site www.desaparecidos.gov.br, de janeiro de 2000 aos dias atuais, foram registrados 1.267 casos de pessoas desaparecidas. Conforme os números, Brasília aparece em primeiro lugar com 299 desaparecimentos; em segundo fica o Rio de Janeiro com 146 casos; Sergipe vem em terceiro com 128; São Paulo logo atrás com 126 ocorrências. Goiás estaria em quinto, contabilizando 97 casos. Destes, 73 já teriam sido resolvidos e 24 permanecem sem solução. Mas o que dizem tais números? Eles incomodam. Pela dor que provocam nos familiares dos desaparecidos, pela ausência de uma organização policial mais eficiente que permita a elucidação e pela fragilidade das informações produzidas no Brasil. Mas quais os problemas em relação aos dados? Diante dos relatórios sobre desaparecimentos em outros países, percebe-se claramente um descompasso nos dados do Brasil. Vamos tomar três exemplos: França, Canadá e Estados Unidos. Conforme dados do Office of Juvenile Justice and Delinquency Prevention (OJJDP), ligado ao Departamento de Justiça dos EUA, em 1999 desapareceram 204,5 mil pessoas e em 2002 os números sobem para 797,5 mil. Na França, conforme a Manu Association, 56.073 pessoas desapareceram em 2007 e outras 59.480 em 2008. Já o Services Nationaux des Enfants Disparus, do Canadá, informa que anualmente desaparecem, em média, 65 mil crianças e adolescentes. Ao compararmos os dados do Brasil com esses três países, obviamente nos indagamos sobre o que produz essa disparidade entre os números. A resposta está na metodologia que utilizamos. Nossos dados são frágeis e não representam uma leitura adequada da realidade. Em pesquisa realizada no ano passado no Rio de Janeiro pelo Instituto de Segurança Pública (ISP), o sociólogo Gláucio Soares analisou 4.637 casos de desaparecimentos ocorridos em 2007. Ou seja, em um ano o Rio de Janeiro registrou três vezes e meia a quantidade de registros de dez anos presentes na página virtual do Ministério da Justiça. Pesquisas
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anteriores indicam que de cada dez pessoas desaparecidas, quatro são mulheres. Todavia, em alguns Estados elas podem superar em número os casos masculinos, como em Pernambuco e no Rio Grande do Sul. Outro dado que chama a atenção é que sete em cada dez casos envolvem pessoas negras (pretos e pardos). O estudo constatou ainda que crianças e adolescentes são os que mais desaparecem. Chama a atenção o fato de que na faixa de 15 a 19 anos os homicídios correspondem a 11,8%, enquanto os desaparecimentos, totalizam 24,8% dos casos notificados. A pesquisa constatou ainda que entre os jovens de 16 a 20 anos, mais de 80% dos casos haviam reaparecido. Infelizmente este ainda não foi o caso dos jovens desaparecidos em Luziânia*. A situação deles parece ser muito mais delicada. Sobretudo quando algumas instituições de segurança de outros países já demonstraram que as três primeiras horas são cruciais para ampliar as chances de se encontrar com vida. O que dizer, então, de 60 dias depois? Esperamos que as políticas públicas de segurança sejam mais eficientes para que os casos de Luziânia e muitos outros também tenham finais felizes. Temos ainda outra barreira não menos importante: a publicização dos dados. Sem isso não é possível realizar uma análise aprofundada das inúmeras ocorrências. Ainda hoje no Brasil as estatísticas policiais são guardadas a sete chaves. Este é um grande problema para os pesquisadores, os meios de comunicação, a sociedade civil e o cidadão. Todos podem dar boas contribuições para compreender o fenômeno e precisam produzir informações para os cidadãos. A ampla disponibilidade dos dados é fundamental para que todos os interessados possam se debruçar sobre as informações em busca de respostas para os desaparecimentos. Sem a produção adequada dos dados e sem sua exposição continuaremos a achar que temos um grave problema pela frente, mas sequer suspeitaremos da sua real gravidade. Dijaci David de Oliveira é doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília (UnB), professor da Faculdade de Ciências Sociais (FCS) e da Universidade Federal de Goiás (UFG). Possui livros, teses e trabalhos publicados sobre desaparecidos civis. * Entre dezembro de 2009 e janeiro de 2010, seis adolescentes com idades variando de 13 a 19 anos, desapareceram no bairro Estrela D’alva, em Luziânia, cidade goiana que fica a 66 km de Brasília. Os casos repercutiram na mídia, chegando a ser investigado pela Polícia Federal por determinação do Ministério da Justiça. Em abril de 2010, os corpos foram encontrados após a confissão de assassinato dos garotos pelo pedreiro Admar Santos, que já havia cumprido pena por pedofilia.
“Chama a atenção o fato de que na faixa de 15 a 19 anos os homicídios correspondem a 11,8%, enquanto os desaparecimentos, totalizam 24,8% dos casos notificados.”
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