EBA135 – Expressão Tridimensional III – UFBA – 2018.2 Prof. Dr. Cristiano Rocha Píton Marli Nalon
Expressão Tridimensional III Expressão Tridimensional III é uma disciplina que têm como proposta o estudo teórico e prático de composições tridimensionais com materiais de livre escolha e desenvolvidos de acordo com o tema proposto para o semestre “Jogo Eleitoral”. Durante o semestre diversas atividades fizeram parte da programação e contribuíram de forma significativa para o exercício e a percepção criativa, com discussões acerca dos projetos que permitiram compreender o processo e as ideias, revelando habilidades, preferências, sensibilidade, ou seja, o modo de pensar, ver e sentir de cada pessoa que acabam fazendo parte do processo criativo e da construção da obra. As atividades desenvolvidas foram: Livro de artista, Quinquilharias, DDD (Dispositivos Deflagradores de Diálogos), Cinco conto, Portifólio, Sinto e Escultura final.
Livro de Arteir@ Inicialmente o livro de artista era considerado um caderno de anotações, como os de Leonardo da Vinci no século XV, mas a partir da segunda metade do século XX, o livro de artista adquiriu status de obras de arte realizada sob a forma de um livro. Habitualmente são publicados em pequenas edições e, às vezes, são produzidos como obras de arte únicas. Na disciplina de Trid III cada aluno confeccionou seu livro de artista de forma livre onde foram registradas as atividades realizadas durante as aulas, assim como, desenhos, ideias, imagens e as composições poéticas. https://www.youtube.com/watch?v=q56yHcMri6I
Quinquilharias A primeira proposta de trabalho para a disciplina de Trid III foi Quinquilharias. Cada estudante levou da sua casa vários objetos que não tinham mais utilidade e disponibilizou para o uso coletivo. Inicialmente realizamos o exercício da escrita automática, um método que foi criado pelos dadaístas e surrealistas e consiste em um processo de produção de material escrito que objetiva evitar os pensamentos conscientes do autor, registrando as ideias de forma livre e inconsciente. Escrevemos palavras aleatórias com um tempo pré-estabelecido e depois destacamos palavras que considerávamos importantes no texto e que se tornariam palavras-chave para o desenvolvimento do projeto. Após a escrita automática foi proposto que se desenhasse o projeto com base nas palavraschave e nas possibilidades de objetos disponíveis para a construção da obra. Os projetos foram apresentados e discutidos individualmente. Palavras-chave: natureza, lembrança, animais, amarelo. A partir de palavras-chaves e do contato com os objetos foi realizados atividades dinâmicas em grupo em que se pensou nas diversas possibilidades de como usar estes objetos para a construção de uma escultura tendo como tema “Jogo Eleitoral”.
Os objetos eram distribuídos no chão e organizados por forma, cor e tipo. Esta atividade permitiu interagir, conhecer e pensar na utilidade de cada peça de acordo com a proposta da escultura de cada um. Além das atividades dinâmicas, havia também atividades escritas que ajudavam na reflexão de como organizar as ideias, de como pensar o espaço e de como fazer. O projeto desenhado ajudou na visualização da escultura final e nas possibilidades de construção.
(ver atividade em grupo) https://youtu.be/TgLx6UZDKrc
Para a produção da escultura usei como material principal uma lata de achocolatado que pintei com tinta spray cinza prateada, conexões para tubulação de água, abridor de lata e demais peças que foram coladas com cola epóxi líquida. A escultura "Abridor de Rombo" surgiu a partir dos escândalos políticos e dos rombos causados pela corrupção. De forma lúdica e divertida a escultura ganhou personalidade e se tornou um candidato político filiado ao partido ATF-Amor, Trabalho e Fé. (Contribuição para o panfleto Paulo Ricardo).
DDD - Dispositivos Deflagradores de Diálogos Nesta atividade chamada de DDD a proposta seria a confecção de forma livre de pequenos objetos que seriam entregues para as pessoas nas ruas e que funcionassem como um dispositivo gerando diálogo.
A ideia do sachê perfumado surgiu com o intuito de levar perfume, leveza e gentileza para as pessoas em um período eleitoral bastante tenso em que as ideias são debatidas entre as pessoas nas redes sociais, gerando discursos acalorados, críticas, opiniões divergentes, exclusões, bloqueios e por fim amizades desfeitas. Junto com o sachê, mensagens de caráter político de pensadores, filósofos, escritores, cientistas, etc foram fixadas. As mensagens não tinham o objetivo de influenciar eleitores apenas deflagrar reflexões.
Na produção dos sachês usei sagu, essência de lavanda, álcool fixador, corante, tule branco e fitilho. Primeiro dividi o sagu em duas partes, uma apliquei o corante junto com a essência de lavanda e na outra apenas a essência. O processo de secagem levou 24 horas. Após a secagem iniciei o processo de montagem.
A entrega dos dispositivos ocorreu três dias antes do primeiro turno das eleições. Ao abordar as pessoas na rua iniciava uma conversa falando sobre o momento político, especialmente sobre o comportamento das pessoas nas redes sociais onde as discussões estavam abertas ao público. No primeiro momento as pessoas demonstravam aborrecimento com o assunto “política”, algumas até diziam que não queriam falar sobre isso, mas ao entregar o sachê e dizer que era uma forma de gentileza para contrapor a tensão causada pelas eleições as pessoas mudavam de fisionomia e sorriam. A entrega ocorreu na frente da universidade Unijorge, na avenida Paralela, local de grande movimento, especialmente, no final do dia, onde há um ponto de ônibus, muitos estudantes, trabalhadores em trânsito e vendedores ambulantes de alimentos e objetos. Foi uma experiência única e muito interessante em que pude experimentar o contado direto com diferentes pessoas levando um pouco de gentileza, uma forma de amor em movimento.
Mapa Mental O mapa mental é uma técnica que auxilia o processo de organização do pensamento, ou seja, ajuda a hierarquizar o pensamento e a compreender melhor as informações sobre determinado conteúdo. A proposta do mapa mental surgiu após um diálogo entre os alunos e o professor referente às aulas e a necessidade de motivação para continuar a disciplina e realizar as atividades propostas conforme o cronograma. Cada aluno produziu o seu próprio mapa mental de forma livre, colocando no papel o tema central e demais informações que seriam importantes para a organização das ideias e a realização das atividades.
Aulas Teóricas Ao longo do semestre aulas teóricas referentes grupos de intervenção urbana, artistas e performances foram apresentados por meio de imagens e vídeos. Conhecer estes grupos, artistas, suas propostas e o significado de suas ações ajudaram na compreensão do estudo de expressão tridimensional III. Cito alguns grupos de intervenção urbana apresentados como: Coletivo Opavivará, Coletivo BijaRi, Grupo EmpreZa, Grupo Gia e algumas artistas latino-americanas como: Lotty Rosenfeld, Ema Villanueva, Mônica Mayer, Ana Mendieta, Graciela Carnevale com destaque para:
María Evelia Marmolejo: artista colombiana realizou em 11 de março de 1982 (trabalho intitulado o mesmo que a data em que aconteceu), na cidade de San Diego na Galeria de Bogotá uma performance onde se apresentou nua ao público, exceto pelo uso de absorventes higiênicos que havia aderido ao seu corpo, e dedicou-se à pintura das paredes e alguns papéis que cobriam o chão com o sangue vaginal da menstruação. Com este trabalho, Marmolejo tentou combater as noções e tabus repugnantes e vergonhosas associados à menstruação. A
artista tentou se libertar de todos os preconceitos e limitações culturais e religiosas conservadoras lançados sobre o corpo feminino.
María Evelia Marmolejo, 11 março de 1982, 1982.
Marta Minujín: Em Lendo as notícias, Minujín embrulhou-se em seções de jornal e deitou no chão perto do Rio da Prata, em Buenos Aires, lendo seções do jornal antes de entrar na água, onde deixou o jornal - e suas mensagens - desintegrar-se gradualmente ao seu redor. A performance de Minujín reconhece os efeitos limitantes e constrangedores dos meios de comunicação de massa, mas também celebra sua transitoriedade e efemeridade.
Marta Minujín, Lendo as Notícias no Rio da Prata, 1965.
Portifólio Minibio Marli Nalon sempre gostou de arte, herdou da mãe Maria o gosto pelo desenho. Na adolescência fazia desenhos de moda para as mulheres levarem para as costureiras fazerem suas roupas. A vida levou-a para outros caminhos, estudou e trabalhou em áreas distantes da arte. Seu reencontro com a arte se deu na Escola de Belas Artes e as ilustrações de moda, estampas, tecidos fazem parte da sua área de interesse. (Ver portifólio) https://docs.google.com/presentation/d/e/2PACX-1vT3CCw71lPBFkFIm7M7EDmkKLK1ZvCsGdEeVKz8iUK6VN4wHWih_L8HnWm_HQE1e2mR5K8qRFvW94P/p ub?start=false&loop=false&delayms=3000
Cinco Conto A proposta “Cinco conto” consistiu em visitar as lojas da rua Carlos Gomes em busca de matéria prima para a construção de esculturas. O nome da atividade refere-se ao valor de R$5.00, limite a ser gasto em materiais. Com uma peneira média, linha elástica preta e um pequeno pássaro branco desenvolvi a escultura “Livre para ser”. Nesse trabalho busquei experimentar o processo de construção sem o uso de acessórios, por isso não usei cola nem agulha, apenas uma tesoura para cortar a linha. Sobre as tramas da peneira fixei o pássaro e bordei “livre”, uma palavra que pode assumir muitos significados de acordo com a história de vida de cada pessoa. Neste caso, foi uma referência a ser livre de rótulos, de preconceitos e a liberdade de expressão.
Sinto A atividade “Sinto: experimentando a cidade” é um evento que acontece na praça do Campo Grande em que os artistas elaboram e realizam experimentos, ações, performances ou intervenções urbanas, com o objetivo de compreender, testar e se comunicar com o ambiente urbano. O evento aconteceu nos dias 04 e 06 de dezembro e antes de por em prática as atividades foi necessário visitar a praça duas vezes. As visitas foram muito importantes para conhecer o local, ver a movimentação e o comportamento das pessoas. Para divulgação do evento nas redes socias foi produzido um cartaz e planfletos individuais com um mapa indicando o local e a descrição da atividade.
No Sinto o exercício do trabalho em conjunto para a realização de uma atividade individual evidência a importância da produção coletiva, com uma ação cooperativa que atua de forma positiva na instalação, realização e, principalmente, no registro de imagens do experimento no momento em que ele acontece. Usando aparelhos celulares, fotografias e vídeos foram produzidos e editados como forma de registro e posterior divulgação do evento.
Apresentei uma intervenção urbana denominada “Arte em retalhos”. Pedaços de tecido jeans cortados em tamanhos de 12x12cm e tinta para tecido foram oferecidos às pessoas para que pudessem expressar através de desenhos ou em palavras o que seria importante para melhorar a cidade. Após a pintura os retalhos eram pendurados em um varal de barbante que foi instalado entre dois postes de iluminação. Para facilitar levei estênceis com imagens caso alguém tivesse interesse em usar, e foi uma ótima ideia porque as pessoas preferiram pintar com eles. Realizei a atividade em um local na praça próximo ao parque infantil, onde havia uma movimentação grande de pessoas e as crianças foram as que mais participaram e deixaram marcas e lembranças de um dia que ficará guardando tanto no pensamento como nos retalhos como memórias do Sinto.
Abaixo texto crítico de autoria do designer gráfico Adson Rodrigues sobre “Arte em retalhos”
“Arte em retalhos foi uma ação artística concebida pela artista Marli Nalon, montada e realizada pela primeira vez no Largo do Campo Grande, precisamente durante toda a manhã das datas 4 e 6 de dezembro, durante a edição de 2018 do evento “Sinto: experimentando a cidade”, uma ação coletiva e cooperativa de
intervenções
urbanas
e
performances
fora
dos
ambientes
de
arte
institucionalizados, organizado e realizado pelas turmas da disciplina de Expressão Tridimensional III da Escola de Belas Artes da UFBA como instrumento de avaliação parcial dos estudantes e coordenado pelo professor Piton. Nessa edição a professora Nirlyn Seijas co-orientou os projeto dos trabalhos que foram apresentados no evento como parte de seu tirocínio docente. Nesse contexto do Sinto, cujo tema abordado foi o jogo eleitoral, aproveitando também o cenário político pós-eleitoral, Marli traz uma ação que na sua materialidade envolve a disponibilização de materiais de criação e de expressão artística como pincéis, tintas, estêncil e tecidos, todos familiares o suficiente para que as pessoas que se sintam convidadas a mostrar de uma forma lúdica tudo aquilo que elas esperam que mude para melhor depois do processo traumático que foi o das eleições presidenciais de 2018. Marli conta que o resultado desse trabalho será transformado numa colcha de retalhos que será construída numa comunidade com a qual ela já trabalhou algumas outras vezes. Essa inclusive é uma característica marcante na produção da artista: a co-criação. Ela transforma todos em potenciais artistas, resumindo a sua autoria a uma gestão das ferramentas necessária para que o trabalho aconteça. Uma das grandes questões de arte em retalhos é que existe um grande valor atribuído ao processo e as suas etapas e desdobramentos que nos faz questionar se as pessoas que pintam realmente fruíram, se são artistas ou se fazem parte a obra. O mesmo pode ser questionada com aqueles que ainda participarão da etapa de construção da colcha.Nesse sentido essa ainda é uma obra inacabada e justamente é aí que talvez resida a sua essência”. https://www.youtube.com/watch?v=RePLEceuO0c&feature=youtu.be
Escultura Final Após o evento do Sinto verifiquei que havia obtido um material muito significativo, que poderia torna-se um objeto de registro, como memória, uma vez que, o evento proporcionou o contato direto com pessoas que de maneira muito especial participaram da ação.
A escolha de peças do vestuário em tecido jeans para o corte estava associada a alguns fatores que considerei importante durante o processo criativo: as peças eram usadas, carregavam um pouco da vida de quem um dia as usou; seria uma forma de reciclagem e aproveitamento máximo de uma peça que usa muita água na sua fabricação; é um tecido rústico com alta durabilidade, fácil de ser obtido e manuseado. Muitos artistas desenvolvem trabalhos com o uso de tecido jeans usado, seja para confecção de peças para uso doméstico como colchas, almofadas, bolsas etc, ou em obras de artes para galerias como do artista inglês Ian Berry.
Ian Berry, Airton Senna Semper, feito com jeans da família Senna. Fonte: http://www.ianberry.org/portraits/ak3m13yeal6ulnyelrgw55nlehvcw2
Ian Berry, Esperando Fonte: http://www.ianberry.org/london/underground
Com o resultado da ação “Arte em retalhos” usei as peças que tiveram intervenção das pessoas por meio de pinturas para confeccionar um patchwork. As peças foram unidas com uma máquina de costurar formando uma peça única, sendo apresentada como escultura final no curso de Trid III e nomeada “Memórias do Sinto”. Agradeço Luna, Camila, Gabriel, Marcelo, Rafaela, Ana Gilma, Adson, Fernanda, Eduardo, Márcia, Erik, Miguel (não lembro o nome de todos mas guardo lembranças e imagens) pela participação e carinho no evento do Sinto. Ao professor Cristiano Píton e Nirlyn que durante o semestre nos orientou e aos colegas de turma que sempre estiveram dispostos a ajudar.