Notícias das Trincheiras Nº 5 – Março/Abril de 2015
Se há fenómeno que mais interfere com o quotidiano da humanidade é a guerra. Tudo se altera, valores são «guardados na gaveta» em nome da vitória, a faceta mais feroz e animalesca do ser humano vem ao de cima, tudo por um objectivo – derrotar o inimigo. Mas, suprema ironia, a guerra também é muitas fezes factor de desenvolvimento, de progresso, de bem-estar. Do microondas às modernas conservas, de novos medicamentos a revolucionárias técnicas cirúrgicas, dos radares aeroportuários e atmosféricos até aos transportes aéreos, muitos são os elementos de civilização, hoje considerados fundamentais, que tiveram origem bélica. Tal como a vida, tudo tem duas faces. É o que é preciso é saber escolher o melhor de uma e eliminar o pior da outra. Das trincheiras, como sempre, saúda-vos o
Mário Nuno Neves Vereador do Pelouro da Cultura
O fiasco de Gallipoli (Parte II)
Tudo esteve mal em Gallipoli O desembarque das tropas na península de Gallipoli foi feito sem mapas precisos da região; muitos barcos acabaram em praias que não estavam nos planos. E, claro, os soldados tornaam-se alvo fácil para a artilharia inimiga. A investida começou a 25 de Abril de 1915, como vimos. Só foi bem-sucedida em dois pontos: no cabo Helles, ao sul da península, e em Ari Burnu, local que passou a ser chamado Anzac Cove (Abrigo Anzac), em homenagem às tropas neozelandesas e australianas, a maioria do contingente. Em 6 de agosto de 1915, novas tropas aliadas desembarcaram na baía de Suvla. Contudo, nem o reforço nem as ofensivas planeadas impediram uma retirada nada honrosa dos soldados da Entente no ano seguinte, em Janeiro de 1916. No Cabo Hellas
1. Cabo Helles A 25 de Abril, 35 mil homens desembarcam ao sul da península. Alguns dias depois, três ofensivas foram lançadas com o objectivo de atingir Krithia. A fortaleza turca foi atacada pelas tropas aliadas em Abril, Maio e Junho. Todas as tentativas terminaram rechaçadas pelo general alemão Liman von Sanders, que reorganizou as defesas otomanas. Os aliados também contaram com a incompetência dos militares, que não souberam aproveitar a possibilidade de conquistar o sector. Após a terceira investida, o comandante britânico Aymler Hunter-Weston teve uma crise nervosa e foi enviado de volta a Londres. Em Anzac Cove
2. Anzac Cove Mais de 17 mil soldados chegam à região a 25 de Abril. O comandante William Birdwood conseguiu avançar no território, mas a investida foi contida pelos turcos menos de um mês depois. A 19 de Maio as tropas da Turquia atacam os soldados estacionados no sector. Eram 42 mil turcos contra 17 mil australianos e neozelandeses. As sentinelas aliadas conseguiram dar o alarme. Em menos de seis horas, 3 mil turcos morreram. A praia é hoje um grande mausoléu em homenagem aos heróis nacionais.
3. Baía de Suvla Às 22h de 6 de agosto, 20 mil homens desembarcam na baía, praticamente sem resistência turca. Na manhã seguinte, mais 5 mil soldados britânicos chegaram ao local. Com novos reforços, Churchill preparou uma operação para ligar Suvla a Anzac Cove. Havia dois montes – e apenas 5 quilómetros a serem vencidos entre os pontos. Trincheiras foram construídas no acidentado terreno. Novamente os turcos levaram a melhor. Foi a gota d’água para os aliados decidirem pela retirada de Gallipoli. Retirada da Baía de Suvla
O Grande Mentor Winston Churchill é apontado como o mentor da investida sobre a península na costa da Turquia. O plano de tomar o Estreito dos Dardanelos já estava a ser preparado há algum tempo. Mas graças ao empenho do então alto comandante da marinha britânica, a desastrada campanha foi levada a cabo. Pretendia-se atingir um duplo objectivo: além de proporcionar um rápido acesso à capital turca, Constantinopla, controlar a região possibilitaria a passagem para o Mar da Marmara. Assim, a Grã-Bretanha e a França poderiam ajudar a Rússia na Frente Oriental. j á retirados. Com esse tosco arranjo, a ideia tornou-se prática em Fevereiro de 1915. O objectivo era usar a frota naval para atacar as fortalezas turcas que defendiam o Estreito de Dardanelos.
A morte em Gallipoli
Entre os aliados, a situação também não era muito diferente. Boa parte dos soldados que morreu durante a campanha foi vítima de doenças. Expostos a corpos insepultos nas trincheiras e sem comida suficiente, os soldados ficavam à mercê das infecções. Durante o desembarque de tropas aliadas na baía de Suvla ocorreu um dos episódios mais sangrentos de Gallipoli. Os aliados sabiam que em menos de 24 horas os inimigos atacariam as suas bases no continente. Ao mesmo tempo, tinham de distraí-los para que a operação em Suvla tivesse êxito. Portanto, teriam de promover uma ofensiva terrestre, que seria auxiliada pela artilharia da frota de navios. Nela participou a cavalaria australiana Light Horse. Apesar de ser uma brigada montada, os soldados encontravam-se a pé, já que não era possível desembarcar animais e utilizá-los num terreno tão desigual. A operação foi um desastre. Dos 300 homens, 220 morreram. O problema foi que o fogo de barragem não atingiu o armamento e as trincheiras turcas antes da ofensiva terrestre. O episódio foi tema do filme Gallipoli, de 1981, protagonizado por Mel Gibson. No filme, a culpa pelo envio de mais homens para uma batalha perdida é dos ingleses, mas na verdade os comandantes da operação eram australianos. Este verdadeiro desastre serviu de lição para futuros desembarques aliados, mormente os da Segunda Guerra Mundial. J.M.M.
Evacuação dos aliados, 5 de Janeiro de 1916
O número de soldados mortos nos nove meses da campanha em Gallipoli é incerto: 60 mil aliados e 90 mil turcos, segundo as estimativas. Curiosamente, os vencedores perderam mais homens do que os derrotados. Os comandantes turcos, incluindo Mustafa Kemal, usaram ataques do estilo onda humana em momentos cruciais e sofreram pesadas baixas nessas ocasiões. Além de usar tácticas que custavam muitas vidas, o exército otomano era pobre em recursos médicos. Muitos feridos morriam por falta de tratamento.
Feridos aliados a serem retirados de Gallipoli, Maio 1915
Seminário “A Grande guerra – Portugal e o Mundo no conflito”.
Exposição “A Grande Guerra na Ilustração Portuguesa - Gallipoli”
Realizaram-se em Março e Abril mais duas sessões deste seminário. Ambas versaram «A participação de Portugal na Grande Guerra», tentando-se estabelecer um balanço da nossa presença e fornecer uma visão crítica da nossa prestação. Na primeira delas tratou-se o período entre 1914 e 1916 e na segunda a acção do CEP nos teatros de instrução e de batalha.
Na sequência da utilização da «Illustração Portugueza» como fonte para o conhecimento da História Contemporânea e, neste caso, da Grande Guerra, apresentamos, no átrio da Biblioteca Municipal, uma exposição sobre o episódio desastroso de Gallipoli. Socorrendo-nos de reproduções de páginas daquela revista, completamo-las com alguns painéis explicativos e com uma pequena mostra bibliográfica. Foi visitada por vários grupos de estudantes, incluindo os sempre atentos alunos do Instituto Cultural da Maia.
Palestra “Portugal na Grande Guerra – mitos e realidades” Aconteceu no dia 24 de Abril, na Biblioteca Municipal da Maia, e o palestrante foi o Prof. Doutor Sérgio Veludo Coelho, da Escola Superior de Educação do IPP. A participação de Portugal na Grande Guerra encontra-se envolta num conjunto de “mitos” e de ideias feitas que, muitas vezes, não correspondem à verdade. No estilo vivo que o caracteriza, o conferencista abordou questões tão diversas como a falta de preparação das tropas, o seu equipamento, o comando mal estruturado, a difícil integração no conjunto dos aliados, a falta de rotatividade e as dificuldades de alimentação dos soldados portugueses, até o «esquecimento» a que foram votados.
Fizemos uma interessantíssima viagem pela difícil participação do CEP (e não só) na Grande Guerra. Foi sem dúvida um dos momentos mais altos deste conjunto de realizações.
PARTICIPAMOS:
PARA LER:
Quotidianos Portuenses em contexto de guerra
Robert Gerwarth, Erez Manela (org.)
Impérios em Guerra: 1911-1923, de Uma forma diferente de ver a Grande Guerra – tentar compreendê-la, e explica-la, através do estudo dos vários impérios envolvidos nesta contenda, até partindo do pressuposto de que se tratou de “uma guerra de sobrevivência e expansão imperiais”. Consegue-se assim perceber melhor que se tratou de facto de um conflito mundial, não só pela origem das tropas envolvidas como pela geografia das acções bélicas. E compreende-se muito melhor o Tratado de Versalhes e as suas consequências. A parte do Império Português está a cargo de Filipe Ribeiro de Menezes. Excelente. Livro imprescindível se quisermos de facto perceber este conflito.
Esta conferência teve lugar no Arquivo Distrital do Porto no dia 27 de Março. Foi moderada por Sérgio Veludo Coelho e teve a participação de Joel Cleto (Matosinhos), Manuel de Sousa (Porto) e José Maia Marques (Maia).
Lisboa: D. Quixote, 2014.
Colóquio «Outras facetas da Guerra» Este Colóquio realizou-se em 21 de Abril na Escola Prática dos Serviços (Póvoa de Varzim), numa organização daquela unidade militar. Foram oradores a Profª Drª Ana Paula Pires do Instituto de História Contemporânea (FCS-UNL) e o Prof. Dr. Sérgio Veludo Coelho da ESSE/IPP. Assistiram, para além do público em geral, técnicos e autarcas de Viana do Castelo, Esposende, Barcelos, Vila do Conde, Póvoa de Varzim e Vila Nova de Famalicão.
Exposição “Portugal e a Grande Guerra” em Abril/Maio de 2016. A exposição «Portugal e a Grande Guerra», uma organização do Instituto de História Contemporânea, que visitamos na Casa dos Cubos em Tomar, e que já tinha estado patente na Assembleia da República, está pré-agendada para Abil/Maio de 2016 para as galerias do Fórum da Maia.
Notícias das Trincheiras Nº 5 – Março/Abril de 2015
O Comandante da Unidade, Cor. Tir. Rui Manuel Rodrigues Lopes e os Palestrantes, Profs. Ana Paula Pires e Sérgio Veludo Coelho
Sessões 8 e 9 do Seminário “A Grande guerra – Portugal e o Mundo no conflito”. Nos dias 8 de Maio e 5 de Junho realizam-se mais duas sessões que têm lugar e são uma organização do Instituto Cultural da Maia – Universidade Sénior, com a colaboração da Câmara Municipal da Maia. As sessões versarão o estabelecimeno de um balanço final do conflito e o perspectivar de um mundo novo no pósguerra. A entrada é livre.
Projecto A Maia e os Maiatos na Grande Guerra
Director: Mário Nuno Neves
Edição: Câmara Municipal da Maia Pelouro da Cultura
Redactores: José Maia Marques Adriano Freire