Boletim do Centro Regional de Informa ção das Nações Unidas para a Europa Ocidental BRUXE LA S, AGO ST O 20 15 , E DI ÇÃO NR. 72
Conferência de Adis Abeba definiu instrumentos para financiar Agenda Pós-2015 Migração
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Entrevista a Jeffrey D. Sachs
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Cimeira sobre Desenvolvimento Sustentável
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Cimeira sobre Aterações Climáticas
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CINE ONU
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Na Terceira Conferência Internacional das Nações Unidas sobre Investimento para o Desenvolvimento, realizada em Adis Abeba, Etiópia, entre 13 e 16 de julho, ficou definido o conjunto de políticas e ações que irão gerar recursos para apoiar a implementação da nova Agenda de Desenvolvimento Sustentável, também conhecida por Agenda Pós-2015. Na reunião foi adotada a Agenda de Ação de Adis Abeba, que estabelece um quadro de orientação política para mobilizar recursos financeiros. “A Agenda de Ação de Adis Abeba é um passo em frente para construir um mundo de prosperidade e dignidade para todos. Este acordo define o caminho a ser seguido por todas as partes envolvidas no que se refere a investimentos, em várias escalas, para fazer face às necessidades das pessoas e do planeta”, disse o SecretárioGeral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon. Esta conferência em Adis Abeba foi o primeiro de três marcos políticos agendados para 2015, na media que será seguida da Cimeira sobre Desenvolvimento Sustentável, em Nova Iorque (EUA), em setembro e da Conferência sobre as Alterações Climáticas, em Paris (França), em dezembro. O quadro resultante da Agenda de Ação de Adis Abeba inclui mais de 100 medidas que visam direcionar recursos financeiros públicos e privados - para resolver um conjunto de desafios. Em destaque estão a proteção social, infraestruturas, tecnologia, assistência aos países mais pobres, cooperação em assuntos fiscais e a necessidade de travar os fluxos financeiros ilícitos que retiram recursos ao desenvolvimento. É importante também realçar que os países se comprometeram a promover a igualdade de direitos e de oportunidades a nível económico paras as mulheres e as meninas. Os resultados da Conferência sobre Inves-
Sessão da Confêrencia de Adis Abeba Foto FAO/Zacharias Abubeker timento para o Desenvolvimento foram para além do previamente negociado. Seis mesas redondas e quase 200 eventos à margem da Conferência resultaram no anúncio de novas iniciativas para implementar a nova agenda de desenvolvimento sustentável. Pincipais novidades: Impostos: Foram lançadas três grandes iniciativas, nomeadamente “Inspetores de Impostos sem Fronteiras (PNUD e OCDE)”, “Iniciativa de Impostos de Adis Abeba” (18 países desenvolvidos vão duplicar a ajuda pública ao desenvolvimento para criar mais capacidade de execução fiscal) e uma iniciativa conjunta do Banco Mundial e do FMI. Adicionalmente, com base no sucesso dos casos de redes na América Latina e África, uma rede regional de administradores fiscais da Ásia será convocada pela UNESCAP. Bancos de Desenvolvimento: Os bancos nacionais, regionais e multilaterais de desenvolvimento decidiram providenciar centenas de milhares de milhões de dólares em recursos nos próximos anos, particularmente para infraestruturas e financiamento de pequenas e médias empresas. Há também compromissos por parte dos
países desenvolvidos e dos países em vias de desenvolvimento para criar novos bancos de desenvolvimento. Necessidades Sociais: Novas parcerias de investimento foram lançadas para abordar as questões de saúde e nutrição, incluindo um Mecanismo Global de Financiamento para a Saúde das Mulheres e Infantil (12 mil milhões de dólares); um fundo de 2,5 mil milhões de dólares por parte da Fundação Gates e do Banco de Desenvolvimento Islâmico; e ainda a UNITLIFE, um mecanismo financeiro inovador para canalizar uma porção dos direitos de exploração de indústrias extrativas para intervenções na área da nutrição em África. Antes da Conferência de Adis Abeba, o G-7 (países mais industrializados do mundo) anunciou o seu compromisso de retirar 500 milhões de pessoas da situação de fome e subnutrição até 2030. Preocupações Ambientais: A iniciativa “Energia Sustentável Para Todos” lançou um relatório realizado pelo seu Comité de Intensificação de Financiamento para Investimentos de Energia Sustentável, que identifica como catalisar 120 mil milhões de dólares de investimento anual, para explorar energias sustentáveis, até 2020.
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MIGRAÇÃO
François Crépeau propõe à União Europeia uma visão solidária da migração O último relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), relativo a 2014, refere que o número combinado de pessoas refugiadas noutros países diferentes do de origem e pessoas forçadas a deslocarem-se no interior do seu país chegou aos 59,5 milhões, a nível mundial. É um valor aproximadamente igual ao da população da Itália ou do Reino Unido e o mais alto desde o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. Só em 2014, o aumento foi de 11 milhões de pessoas face ao registado até então. “Estamos a testemunhar uma mudança de paradigma na escala global de deslocamento forçado e a necessidade de encontrar soluções para este problema é agora muito maior do que alguma vez foi no passado recente”, afirmou o Alto Comissário, da ONU para os Refugiados, António Guterres, sobre o atual fluxo migratório mundial e, em particular, sobre a procura de refúgio na Europa. Na primeira metade de 2015, bateu-se um recorde neste continente: a entrada de 103 mil refugiados e migrantes económicos, sobretudo via travessia do mar Mediterrâneo (dos quais 54 mil na Itália e 48 mil na Grécia). Por detrás deste aumento estão o agravamento de conflitos nas regiões do Médio Oriente e de África, destacando-se países como Síria, Iraque, Afeganistão, Eritreia,
Operação de salvamento de migrantes em Itália Foto IOM/ Francesco Malavolta Somália, Sudão do Sul, Iémen; mas também a guerra civil na Ucrânia. A nível mundial, uma em cada cinco pessoas deslocadas é de nacionalidade síria, tendo este país destronado o Afeganistão (que tinha esse recorde há 30 anos) como a principal origem de deslocados e refugiados. Face a este quadro, o Relator Especial
das Nações Unidas para os Direitos Humanos dos Migrantes, François Crépeau, defendeu uma nova abordagem da União Europeia (UE) ao fenómeno migratório, durante a apresentação do seu mais recente relatório, numa conferência de imprensa, em Bruxelas, a 18 de junho. “Ninguém coloca os filhos em barcos, a menos que a água seja mais segura do que a terra”, disse François Crépeau, num apelo a uma visão mais solidária e integrada dos fluxos migratórios, patente no relatório intitulado “Apostando na mobilidade ao longo de uma geração: atualização do estudo regional sobre a gestão das fronteiras externas da União Europeia e o seu impacto sobre os direitos humanos dos migrantes”. UE precisa de melhores reformas migratórias O Relator Especial expressou frustração com forma como a Comissão Europeia tem respondido à crise migratória e considera que há muitas falhas na Agenda Europeia sobre Migração. “As novas propostas de reformas migratórias da UE são boas em teoria, mas na prática são inadequadas face aos altos níveis de migração”, disse.
Relator Especial da ONU, François Crépeau Foto ONU/JC McIlwaine
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D E S E N V O L VM I MI G EN R TAO Ç ÃSOU S T E N T Á V E L “Parece-me totalmente insuficiente face à atual crise que um bloco regional como a UE se disponibilize a acolher apenas 20 mil pessoas. Sabemos que, só em 2014, 200 mil migrantes em situação irregular - a maioria dos quais eram requerentes de asilo – chegaram à Europa por barco", frisou François Crépeau. Em vez do encerramento de fronteiras, o especialista advoga a criação de mecanismos que incentivem a migração regular e que evitem o recurso às redes de tráfico e de contrabando de pessoas. “Devemos reconhecer que as fronteiras foram e sempre serão porosas. Portando, fechar as fronteiras não é apenas impossível, como também é pouco efetivo no controle migratório. No momento em que os fazemos, aumentamos o mercado para os contrabandistas”, referiu. Propostas de resposta à crise migratória Infografia ACNUR François Crépeau elencou no seu relatório uma lista de recomendações que vão desde a questão da busca e regaste no mar até a gestão coletiva dos fluxos de migração. Os pontos principais são:
Aceitar que é impossível fechar as fronteiras, reconhecer que há incentivos e paradoxos perversos que foram criados pelo sistema atual e que existem benefícios em apoiar a mobilidade de pessoas. Preparar-se para receber os migrantes e refugiados que chegam por via marítima, comprometendo-se a implementar plenamente as obrigações ditadas pela lei internacional sobre prestação de serviços de busca e salvamento. Analisar quais são os fatores que influenciam negativamente a vontade dos navios privados de ajudar os migrantes em dificuldades no mar e criar compensação pelas perdas comerciais. Desenvolver protocolos de cooperação
com embarcações militares que não estão afetas às operações de busca e salvamento de imigrantes sobre como responder a incidentes de migrantes em dificuldades, por forma a complementar a ação do Estado. Continuar a desenvolver mecanismos de solidariedade e de partilha de responsabilidade entre países em relação às operações de busca e salvamento e processamento de pedidos de proteção, através da disponibilização de recursos técnicos, financeiros e humanos. Face à crise atual, aceitar que a UE tem condições para acomodar pelo menos um milhão de refugiados (0,2% da população total da UE) pelo período de alguns anos. Trabalhar com uma variedade de opções para a migração legal, tais como vistos humanitários, esquemas de protecção temporária, políticas de reagrupamento familiar, mobilidade de estudantes, programas de evacuação médi-
Infografia ACNUR
ca; mas também mecanismos para empregabilidade de trabalhadores com diferentes níveis de competências, incluindo os de baixa qualificação e os que procuram trabalho sazonal. Investir no desenvolvimento de uma política de migração global, coerente e ampla que seja um reflexo dos direitos humanos dos migrantes tal como consagrados no direito internacional e regional. Criar um roteiro para a evolução desta política através do desenvolvimento de uma estratégia integral para 25 anos que descreva intervenções curtas, mas também de médio e longo prazo. Investir na recolha de dados sobre realidades tais como mercados de trabalho clandestino, exploração do trabalho dos imigrantes, fatores de incentivo e desincentivo à travessia por mar, etc. Além disso, é necessário que se aumente a harmonização e coordenação das fontes de dados sobre migração para que se crie um quadro sistemático e realista sobre o tema. Refletir sobre os preconceitos que sustentam as políticas de segurança contra produtivas e ineficazes, que criminalizam e estigmatizam os imigrantes, e integrar essas análises na definição da comunicação pública e dos currículos escolares. Usar a considerável influência global que tem a região europeia, incluindo dois assentos permanentes e um assento não-permanente no Conselho de Segurança da ONU, para pressionar no sentido de encontrar soluções mais eficazes para as crises humanitárias na Síria, Ucrânia e noutros países.
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Jeffrey Sachs: “Objetivos de Desenvolvimento do Milénio mostraram o caminho para erradicar a pobreza extrema” Os oito Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM) foram criados com o propósito de transformar a vida de milhões de pessoas, entre 2000 e 2015. Quase chegados ao fim da meta, os resultados dos ODM evidenciam os sucessos alcançados e estabelecem pistas para a Agenda Pós2015, a ser definida em setembro, numa cimeira da Organização das Nações Unidas (ONU). Os líderes vão estabelecer metas – desta vez, 17 – a atingir em 2030, numa ação global para acabar com a pobreza, promover a prosperidade, proteger o ambiente e combater as alterações climáticas. "Este ano temos uma oportunidade única, para a nossa geração, de definir metas e caminhos claros para um mundo melhor, mais próspero e mais seguro", disse o economista Jeffrey Sachs, Conselheiro Especial do Secretário-Geral das Nações Unidas sobre os ODM, em entrevista ao Centro de Notícias da ONU. O especialista em desenvolvimento de renome internacional explica porque é que o mundo precisa urgentemente de enveredar por um caminho mais sustentável. Para Sachs não se trata apenas de um desafio económico, mas também moral. Centro de Notícias da ONU: Para 2015 a ONU criou o slogan “Tempo de agir pelas pessoas e pelo planeta”. Porque é que este ano é tão crucial? Jeffrey Sachs: É um grande ano para o desenvolvimento sustentável devido ao facto de várias etapas diplomáticas terem levado a que tudo convergisse para 2015. Temos, naturalmente, a adoção dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em setembro de 2015. Essa foi uma decisão tomada em 2012, durante o 20º aniversário da Cimeira da Terra , no Rio de Janeiro (Brasil). Com os ODM a terminarem este ano, os ODS serão adotados em setembro. Além disso, os contratempos das negociações sobre alterações climáticas, em Copenhaga, em 2009, exigiram um novo cronograma para que se chegue a um acordo sólido nesta área. Foi decidido que tal deveria ser feito em dezembro de 2015, em Paris, onde decorre a 21ª Conferência das Partes sobre Alterações Climáticas (COP21). Então os líderes começaram a perguntar como é que se iria financiar todos estes planos, chegando à conclusão que era preciso um quadro de financiamento para o desenvolvimento sustentável. Por isso foi convocada uma conferência sobre o tema, no início de julho, em Adis Abeba (Etiópia). Tudo isto nos dá uma oportunidade única para mudar a direção do mundo e adotar o desenvolvimento sustentável como um verdadeiro princípio de funcionamento para o planeta. Precisamos de mu-
Economista Jeffrey D. Sachs FOTO ONU/Rick Bajornas dar de direção urgentemente e este ano é entre a vida e a morte - não apenas a souma oportunidade única para a nossa gera- breviverem, mas a saírem definitivamente ção definir metas e caminhos claros para da pobreza extrema. Apesar de não terem um mundo melhor, mais próspero e mais sido atingidas todas as metas como desejáseguro. vel, foi levado a cabo um enorme progresso em várias áreas. Tanto assim é que, em Centro de Notícias da ONU: Com tantas 2012, quando os governos fizeram um questões importantes na agenda global, qual deve ser o objetivo primordial a atingir ponto da situação, disseram: 'Os tratados existentes não estão a funcionar tão bem pelos governos em 2015? quanto deveriam, mas quando olhamos Jeffrey Sachs: Os governos têm que chegar para estes Objetivos de Desenvolvimento a acordo sobre uma nova visão - a do dedo Milénio, que nem sequer são tratados, senvolvimento sustentável – e isso signifivemos que estão a ter um grande impacto ca juntar o desenvolvimento económico, a público”. Essa foi uma das motivações para inclusão social e a sustentabilidade ambiter novas metas de desenvolvimento susental. Esse é o conceito que nos permitirá tentável. Claro que se pode também aponviver em segurança, que permitirá ter um tar que ainda não foram cumpridas as promundo mais justo e mais próspero. Ao adomessas, por exemplo, de adjudicar 0,7 por tar essa visão holística, colocando-a no cento do rendimento nacional bruto à ajuda centro de todas as decisões – sejam ao pública ao desenvolvimento, sobretudo por nível do financiamento ou do clima - podeparte dos países mais ricos. Mas, mesmo mos ser mais bem sucedidos. com a crise financeira, devemos realçar o Centro de Notícias da ONU: Como é que progresso feito na luta contra o VIH/Sida, avalia o resultado dos ODM nos últimos 15 na luta contra a malária e a tuberculose, no acesso das crianças à educação, na reduanos? ção das taxas de mortalidade materna e Jeffrey Sachs: Eu penso que os Objetivos de infantil, no aumento do acesso a água potáDesenvolvimento do Milénio mostraram vel. O triunfo mais significativo, a nível gloque funciona estabelecer um sistema de bal, é que nos países em vias de desenvolmetas. Quando foram anunciadas, em se- vimento, como um todo, a pobreza desceu tembro de 2000, houve muito ceticismo. para menos de metade face ao registado Na verdade, tenho a certeza que alguns em 1990. Devemos continuar a ter fortes líderes nem sequer perceberam que tinham objetivos de desenvolvimento sustentável, adotado os objetivos quando assinaram a dos quais o primeiro é terminar o trabalho Declaração do Milénio. Mas hoje já não há dos ODM. nenhuma razão para o cinismo. Os ODM estão enraizados e ajudaram as Nações de todo o mundo a perceberem que a nossa maior prioridade deve ser ajudar as pessoas pobres – que enfrentam uma luta diária
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Economista Jeffrey D. Sachs FOTO ONU/Rick Bajornas Infografia ONU Centro de Notícias da ONU: Pensa que é possível erradicar a pobreza nesta geração e, se sim, o que é que será necessário para isso? Jeffrey Sachs: É claro que é possível erradicar a pobreza, especialmente quando se percebe quão rico é o mundo em que vivemos. Por bem menos do que 1 por cento do rendimento dos países ricos poderíamos acabar com a pobreza extrema. O desafio é em parte económico e tecnológico, mas é fundamentalmente moral. É uma questão de mobilizar a vontade e o compromisso de fazer a expansão do acesso a sistemas de saúde e de educação; de ajudar os pequenos agricultores a serem mais produtivos; de fomentar competências e formação para jovens que vivem em áreas urbanas de rápido crescimento nos países em vias de desenvolvimento; de se certificar de que há acesso à banda larga em telecomunicações já que esta tem enorme potencial para criar novos empregos, novas aplicações, novas indústrias, novos sistemas de governação e de comunicação. É claro que podemos fazê-lo e não custaria muito. A única coisa necessária é a nossa atenção - acho que é esse o verdadeiro desafio - pois estamos distraídos. Facilmente nos desviamos do rumo. Tentamos resolver emergências que, por vezes, não são verdadeiramente emergências e não vemos o que se pode fazer para ter resultados a médio prazo. Se voltarmos firmemente as nossas atenções para 2030 e decidirmos acabar com a pobreza extrema, isto pode ser feito. Centro de Notícias da ONU: Disse que o desenvolvimento sustentável é "o maior e mais complicado desafio que a humanidade já enfrentou". Pode explicar melhor?
Jeffrey Sachs: Todos, no fundo, enfrentamos uma espécie de momento de rutura do qual não estávamos à espera. E isso acontece porque a economia mundial está a crescer e de forma muito robusta, embora não tão universalmente como gostaríamos. Mas o planeta não está a crescer. Temos uma população mundial em expansão, uma economia mundial em expansão, mas vivemos num planeta finito, com recursos finitos. Portanto, o que temos visto, e os cientistas dizem-no todos os dias, é que estamos a ultrapassar os limites do planeta. Quer se trate das alterações climáticas induzidas pelo homem, da acidificação do oceano ou da escassez de água doce, da mudança no ciclo do nitrogénio e da produção maciça de poluentes industriais, da destruição do habitat e da perda de biodiversidade, estamos a falar de uma espécie de rolo compressor que é a economia mundial. Esta está a pressionar os limites finitos do planeta de forma tão forte que põe em risco milhões de espécies, incluindo a humana. E isso é algo que é novo, porque a humanidade e a economia mundial nunca foram tão pujantes, tão exigentes na utilização dos recursos, de uma forma que pode realmente ameaçar ou desencadear uma crise ambiental global. Mas o impulso da economia mundial é tão forte, os interesses são tão fortes, a forma como as empresas se comportam tão poderosa que mudar o caminho e fazê-lo de forma cooperativa - que permita que os países em desenvolvimento continuem a crescer rapidamente e encontrem o seu espaço numa escala global –, respeitando os limites do planeta, é algo novo para a humanidade.
É possível e exige uma mudança de curso; requer a adoção de novas tecnologias sustentáveis, exige que os melhores intelectos espalhados pelo mundo ajudem a resolver problemas e a projetar novos sistemas mais sustentáveis. É possível, é o desígnio desta geração. É a razão principal pela qual devemos adotar metas de desenvolvimento sustentável.
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DESC EN V EOILRVAI M IM D EE NNTOOV SAUISOTREQNUT EÁ V E L
Líderes mundiais debatem novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável Em 2000, líderes de todo o mundo comprometeram-se a reduzir para metade a pobreza extrema, até 2015, com um plano global chamado Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM). Graças aos esforços e empenho de milhões de pessoa, muitos progressos foram alcançados nos últimos 15 anos para concretizar esses objetivos. O número de pessoas a viver em condições de pobreza extrema caiu para menos da metade em comparação com o alto nível de pobreza de 1990. Mais de dois mil milhões de pessoas passaram a ter acesso a água potável e a quantidade de moradores de bairros degradados nas cidades foi reduzido, melhorando a qualidade de vida de pelo menos 100 milhões de cidadãos. Porém, apesar destas conquistas, ainda há muitos desafios pela frente. Atualmente, 1400 milhões de pessoas vivem em condições de extrema pobreza, a cada quatro segundos morre uma criança devido a doenças que podem ser prevenidas e mais de 900 milhões de pessoas sofrem de fome crónica. As alterações climáticas também ameaçam a vida de milhões de cidadãos, a desigualdade social continua a aumentar em várias regiões e os direito humanos são desrespeitados em muitos países, principalmente nos que são marcados pela guerra. Além disso, a população mundial deverá aumentar para 9,5 mil milhões em 2050, colocando ainda mais pressão sobre o sistema alimentar. 2015 é o ano para moldar uma nova agenda baseada nos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), através da definição dos novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), a concretizar até 2030. A nova agenda está, atualmente, a ser negociada na Assembleia-Geral da ONU, entre os governos dos Estados-membros e diversas entidades da sociedade civil, e deverá ser aprovada na Cimeira de Desenvolvimento Sustentável, de 25 a 27 de setembro, na sede da ONU, em Nova Iorque (EUA). Objetivos de Desenvolvimento Sustentável Com base de trabalho para esta nova visão, no início do ano, o Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-moon, apresentou aos Estadosmembros o seu relatório-síntese: “O Caminho para a Dignidade até 2030: Acabar com a pobreza, transformar todas as vidas e proteger o planeta” . "Temos que dar sentido à promessa da ONU de "reafirmar a fé na dignidade e no valor do ser humano" e de conduzir o mundo para um futuro sustentável (...). Temos uma oportunidade histórica e o dever de agir, de forma corajosa, vigorosa e expedi-
Deslocados sudaneses em consulta médica Foto: ONU Flickr
ta , para transformar em realidade o desígnio de uma vida digna para todos, não deixando ninguém para trás", disse Ban Kimoon por ocasião da apresentação deste documento. A ONU também tem desempenhado um papel fundamental no processo de diálogo e envolvimento dos cidadãos, ao promover amplas consultas públicas - tais como o questionário MyWorld, na qual o público pôde votar naqueles que considerava serem os principais problemas globais -, e contribuindo com informação baseadas em diversos tipos de estudos, análises críticas e investigações no terreno, a cargo de especialistas independentes. Apesar dos obstáculos conhecidos, pela primeira vez na História, a Humanidade tem os recursos necessários para acabar com a pobreza e promover o desenvolvimento global de forma sustentável. O percurso é longo e exige um trabalho conjunto para que essas mudanças aconteçam, pelo que terá que passar por uma atitude proativa dos governos e o empenhamento dos cidadãos de todo o mundo.
ONU/Milton Grant os novos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 20152030:
Proposta dos novos 17 Objetivos : 1. Erradicar a pobreza em todas as suas formas e em todos os lugares 2. Erradicar a fome, alcançar a segurança alimentar e nutrição adequada para todos, e promover a agricultura sustentável 3. Garantir saúde para todos em todas as idades 4. Fornecer educação equitativa, inclusiva e de qualidade, e oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos 5. Atingir a igualdade de género e a autonomia para mulheres e meninas em todo o mundo 6. Garantir acesso a água potável e saneamento para todos 7. Garantir serviços de energia modernos, fidedignos, sustentáveis e a preços acessíveis para todos 8. Promover o crescimento económico forte, sustentável e inclusivo, e trabalho digno para todos 9. Promover a industrialização sustentável 10. Reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles 11. Construir cidades inclusivas, seguras e sustentáveis 12. Promover padrões de produção e consumo sustentáveis 13. Promover ações para combater as alterações climáticas 14. Promover a conservação e o uso sustentável dos recursos marinhos 15. Proteger e restaurar os ecossistemas terrestres e interromper toda a perda de biodiversidade 16. Promover sociedades pacíficas e inclusivas, o primado do Estado de direito e instituições eficazes 17. Fortalecer os meios de implementação dos objetivos e a parceria global para o desenvolvimento sustentável
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CIMEIRA DE PARIS
COP21 – Novo acordo para lidar com as alterações climáticas
Emissão de gases num complexo industrial em Toronto, Canadá. Fot o ONU/ Kibae Park
A França será a anfitriã, em 2015, da 21ª Sessão da Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP21), também conhecida como "Paris 2015", que se realiza de 30 novembro a 11 dezembro, reunindo cerca de 40 mil participantes, entre delegados representantes de cada país, observadores e membros da sociedade civil. A referida Convenção-Quadro é um tratado internacional resultante de uma conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) conhecida como Cimeira da Terra, que teve lugar no Rio de Janeiro (Brasil), em 1992. “Paris 2015” é uma reunião crucial, já que nela deverá ser alcançado um acordo internacional sobre o clima, aplicável a todos os países, com o objetivo de manter o aquecimento global abaixo dos 2°C. Na verdade, 2014 foi o ano mais quente já registado e 14 dos 15 anos mais quentes já registados ocorreram no século XXI. O nível do mar continuar a subir, o gelo no Ártico está a diminuir e há cada vez mais fenómenos climáticos extremos, incluindo secas prolongadas e inundações devastadoras. Datas marcantes Neste caminho da comunidade internacional para lidar com o problema das alterações climáticas existem várias datas marcantes: a entrada em vigor do Protocolo de Quioto, em 2005 – com indicações sobre limites desejáveis de emissões de gases com efeitos de estufa -, a definição do Plano de Ação de Bali, em 2007 - que fez com que 180 países discutissem várias soluções-chave para se chegar a um acor-
do mundial sobre o meio ambiente -, a Conferência de Cancun, em 2010 - onde foram criados mecanismos de implementação das decisões políticas tais como o Fundo Verde Climático. A Plataforma de Durban foi estabelecida, em 2011, para reunir os esforços de todos os países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento na definição de um "protocolo, instrumento legal ou um resultado acordado com força legal", aplicável a todas as partes, a ser aprovado em 2015 e aplicado a partir de 2020 – este é o objetivo de “Paris 2015”. Contributos nacionais Este é o maior evento diplomático levado a cabo pela França e uma das maiores conferências do clima já organizadas. Como titular da presidência da Conferência, este país terá de facilitar as discussões entre os restantes membros e garantir que estas sejam transparentes e inclusivas. As expectativas são grandes e o objetivo é conseguir, pela primeira vez, um acordo universal e juridicamente vinculativo que permita combater eficazmente as alterações climáticas e impulsionar a transição para sociedades e economias resilientes, com baixa emissão de carbono. Para que isto se concretize, o acordo deve ter como foco os esforços para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa e esses esforços devem levar em conta as necessidades e capacidades de cada país. Assim, cada país deve explicar claramente qual é a sua contribuição, apresentando os esforços feitos a nível nacional. Pouco antes da COP21, o secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre
Alterações Climáticas publicará um resumo dessas contribuições, para dar uma indicação do impacto cumulativo de todos estes esforços. Fundo Verde Climático Outro objectivo fundamental da conferência é estabelecer a mobilização, a partir de 2020, de 100 mil milhões de dólares por ano, por parte dos países desenvolvidos (a partir de fontes públicas e privadas) para ajudar os países em vias de desenvolvimento a combaterem as alterações climáticas e a promoverem o desenvolvimento de forma justa e sustentável. Algumas destas verbas serão canalizadas para o Fundo Verde Climático, que deverá ter como capital inicial 10 mil milhões dólares. Este Fundo vai orientar os agentes económicos e financeiros no sentido de redirecionarem os seus investimentos para a transição para modelos de desenvolvimento de baixo carbono. "Também é importante garantir plataformas eficazes para o desenvolvimento e partilha de tecnologias e investigação inovadoras. As “barreiras” à transferência de tecnologias verdes, incluindo as questões de proteção de propriedade intelectual, precisam de ser abordadas com urgência”, disse Sam Kutesa, presidente da Assembleia-Geral das Nações Unidas, durante o Evento de Alto Nível sobre as Alterações Climáticas, realizada em Nova Iorque, no passado dia 29 de junho.
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CICLO DE CINEMA DIREITOS E DESENVOLVIMENTO
CINE ONU de regresso a Lisboa Ficha técnica Direcção: Afsane Bassir-Pour Edição: Isabel Marques da Silva Redação: Isabel Marques da Silva , Ricardo Oliveira e Vanessa Van-Dunem http://www.unric.org/pt/ https://www.facebook.com/UnricPortugal
Em breve… 4-27 de setembro: Exposição
comemorativa “A ONU em imagens — 70 anos de História”, na Galeria Torreão Nascente da Cordoaria Nacional, em Lisboa 17 de setembro:
Dia International da Democracia Sushma Kallam (segunda à esq.) realizou o filme exibido Ricardo Oliveira/UNRIC
21 de setembro: Dia Interna-
tional da Paz
O CINE ONU/Ciclo de Cinema sobre Direitos e Desenvolvimento – uma parceria entre a secção de Portugal do Centro de Informação Regional das Nações Unidas 25-27 de setembro: Cimeira para a Europa Ocidental (designado em diante por UNRIC Portugal) e a Plataforsobre os Objetivos do Desenvol- ma Portuguesa da ONGD - regressou a Lisboa, no passado dia 4 de junho, com o vimento Sustentável, em Nova filme “Walls and The Tiger”, da realizadora indiana Sushma Kallam, exibido no Cinema São Jorge, novo parceiro desta iniciativa. Iorque “Walls and The Tiger” conta a história de agricultores indianos cujos meios de 28 de setembro: Sessão CINE subsistência são destruídos devido à criação de Zonas Económicas para a instaONU com o filme “Cartunistas: lação de multinacionais, analisando os impactos económicos, sociais, culturais e Soldados de Infantaria da De- ambientais nas comunidades locais.
mocracia”, da realizadora francesa Stéphanie Valloatto, no No final da exibição do filme, o público discutiu estas temáticas e outras quesCinema São Jorge, em Lisboa tões de desenvolvimento sustentável com a realizadora, Sushma Kallam, o pro-
dutor, Liam O’Connor, e o jornalista Luís Ribeiro, da revista Visão, num debate 13 de outubro: Conferência moderado por Isabel Marques da Silva, representante do UNRIC Portugal.
sobre os resultados da Cimeira de Nova Iorque, promovida pelo Por ocasião do Dia Internacional da Democracia, a próxima sessão está marcada para 28 de setembro, às 18h30, no Cinema São Jorge, com o filme “Cartunistas: Instituto Camões, em Lisboa
Soldados de Infantaria da Democracia”, da realizadora francesa Stéphanie Valloatto, que foi selecionado para o prestigiado Festival de Cinema de Cannes, 24 de outubro: Cerimónia so- em 2014.
lene e sessão académica de celebração do 70º aniversário São retratos de 12 formidáveis cartunistas de todo o mundo que defendem a democracia e a liberdade de expressão, fazendo rir com uma só arma: um lápis, da ONU correndo com cada desenho risco de vida. Mais uma vez haverá convidados de alto nível para o debate. Não perca!