Contracultura Gospel - Um Estudo de Caso da Banda Tanlan

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL HABILITAÇÃO EM PUBLICIDADE E PROPAGANDA

URSULA GABRIELA BREHM MÜLLER

CONTRACULTURA GOSPEL: Um estudo de caso da Banda Tanlan

São Leopoldo 2014


Ursula Gabriela Brehm Müller

CONTRACULTURA GOSPEL: Um estudo de caso da Banda Tanlan

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Comunicação Social, pelo Curso de Publicidade e Propaganda da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS.

Orientadora: Profª Ana Iwancow

São Leopoldo 2014


AGRADECIMENTOS

Meu maior agradecimento destino ao Criador de tudo, fonte de inspiração e criatividade, motivador da minha profissão e a quem dedico não apenas esse trabalho, mas meu futuro. Aprendi que Deus é minha luz e a minha salvação, por isso não preciso ter medo (Salmo 27.1), acreditando nisso, cheguei até aqui. Por me amarem desde quando eu sequer sabia soletrar meu nome, agradeço aos meus pais, Velerci e Maria Brehm. Nenhuma universidade no mundo poderia me ensinar tudo que aprendi com eles. Agradeço por terem investido em mim com educação de qualidade, não só intelectual, mas nos valores e no amor. Sou grata por todo cuidado, otimismo e incentivo de sempre. Não sei viver sem vocês. Pelo “eu te amo” de todas as manhãs e por me permitir, de diversas formas, chegar ao fim dessa trajetória acadêmica, agradeço ao meu marido, Ricardo Müller. Sou grata por silenciar as tempestades com um abraço e pela compreensão por cada dia que deixei de estar ao seu lado durante esse trabalho. Pelo sorriso de encorajamento, as muitas louças lavadas e o amor demonstrado em cada gesto, eu sou agradecida, de todo coração. Te amo. Aos meus irmãos Katia, Priscila e Douglas por vibrar pelas minhas pequenas e grandes conquistas na vida. Obrigada pela amizade de sempre e para sempre. Por compartilhar comigo de longos anos nessa luta por um diploma, das aflições e deleites de ser publicitária e de uma fase tão especial desse percurso, agradeço minha colega e amiga Bila, formalmente conhecida como Fabíula Azevedo. Pelo companheirismo, bom-humor, chimarrão, café, açúcar e alguns surtos, esse tempo foi inesquecível e a nossa amizade será herança duradoura disso. À minha amiga Sandra Barbosa, por, de forma tão amável, colaborar comigo na tradução do resumo deste trabalho. Aos meus familiares, amigos e irmãos de fé, com quem eu gostaria de ter passado mais tempo nos últimos meses, e que estando perto ou longe, torceram e oraram por mim. Agradeço cada um por me ouvir ou simplesmente respeitar meu momento, não me distraindo. Cada um é muito importante e está guardado no meu coração. À banda Tanlan, especialmente a Fábio Sampaio e Oziel Alves que, de forma tão prestativa, forneceram informações que colaboraram com esse trabalho. Sou


ainda mais admiradora dessa música por conhecer melhor a história dela e de quem a faz. Às minhas orientadoras, prof. Magda Ruschel e prof. Ana Iwancow por compartilharem comigo, com exímia paciência, o que possuem de mais precioso: o seu conhecimento. Aos demais mestres e influenciadores de carreira que cruzaram minha caminhada acadêmica, em especial aos inspiradores, José Luis Reckziegel, Lisiane Cohen, Guilherme Caon, Márcia Molina, Gustavo, Fischer e Maria Luiza Cardinale Baptista.


“Vem transpor a nova dimensão, Entre o que é e o que poderia ser”. Fábio Sampaio


RESUMO Esta pesquisa consiste em investigar as origens da música e da cultura gospel no Brasil, assim como em entender o movimento contracultural que começou a se manifestar no país nos últimos dez anos. Para isso, analisa a Banda Tanlan, através do método estudo de caso, a fim de identificar características pertinentes a esse movimento e analisar sua atuação nesse novo contexto artístico-cultural da música cristã brasileira. Além do método de estudo de caso, o levantamento bibliográfico cria o embasamento histórico necessário para o entendimento do cenário atual. Como principais resultados, encontramos evidências na Banda Tanlan que ajudam a entender a contracultura gospel no país e a relação de sua filosofia com o mercado fonográfico, podendo concluir que a essência do artista é o diferencial de sua atuação no circuito comercial.

Palavras-chave: Música Cristã. Cultura Gospel. Comunicação. Arte. Mercado fonográfico.


ABSTRACT This research consists in investigating the origins of music and gospel culture in Brazil, as well as understanding the counterculture movement which has begun manifesting in the country for the last ten years. Therefore, this research analyzes the Tanlan band through case study method in order to identify relevant characteristics with this movement and with its procedure in this new cultural and artistic context of the Brazilian Christian music. Besides the case study method, the bibliographic survey creates the necessary historical foundation to understand the current scenario. The mainly results were found as evidences in Tanlan band which assist to understand the gospel counterculture in the country and its philosophical connections with phonographic market, as well as concluding that the artist’s essence is a differential of its acting in the commercial circuit.

Keywords: Gospel Music. Gospel Culture. Communication. Art. Phonographic market.


LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Capa Revista TIME de junho de 1971......................................................19 Figura 2 – Capa disco For Him Who Have Ears to Hear………………………………21 Figura 3 – Hinário Salmos e Hinos.............................................................................25 Figura 4 – Disco Conjunto Wesley.............................................................................28 Figura 5 – Grupo Elo em apresentação.....................................................................29 Figura 6 – Festival SOS da Vida 1993 no Pacaembu................................................34 Figura 7 – Gravação Diante do Trono 15...................................................................36 Figura 8 – Thalles Roberto no Programa Esquenta da Rede Globo..........................39 Figura 9 – Banda Tanlan em 2010.............................................................................66 Figura 10 – Capa Cd Tudo Que Eu Queria................................................................67 Figura 11 – Cd Um Dia A Mais...................................................................................68 Figura 12 – Variações no Logotipo da Banda............................................................68 Figura 13 – Participação da Banda Tanlan do Programa Radar...............................70 Figura 14 – Banda Tanlan no Projeto Pop Rock........................................................71 Figura 15 – Ingresso Show de Lançamento Cd Um Dia A Mais................................72 Figura 16 – Participação de Arthur de Faria no Show de Lançamento do Cd Um Dia A Mais........................................................................................................................73 Figura 17 – Divulgação Show Thalles Roberto em Porto Alegre...............................75 Figura 18 – Selo Rock Festival - Tanlan e Palavrantiga............................................76 Figura 19 – Divulgação na Página do Facebook da Estação ZH...............................76 Figura 20 – Tanlan na Revista Noize #15..................................................................78 Figura 21 – Capa Revista Época...............................................................................78 Figura 22 – Banda Tanlan na Billboard Brasil............................................................80 Figura 23 – Marcos Almeida e Fábio Sampaio em estúdio para gravação de Vaidade......................................................................................................................80 Figura 24 – Divulgação da Semana de Arte Cristã....................................................82 Figura 25 – Banda Tanlan no Rock no Vale..............................................................83 Figura 26 – Post em Fanpage sobre patrocínio da Multisom para o Show de Lançamento do cd Um Dia A Mais.............................................................................83 Figura 27 – Post Fanpage em agradecimento aos likes............................................84 Figura 28 – Menção de Tanlan no Instagram de Maurício Soares............................85 Figura 29 – Interação com fã via Twitter....................................................................86


Figura 30 – Capa single É Natal................................................................................87 Figura 31 – Postagem no Facebook anterior à contratação......................................95 Figura 32 - Postagem no Facebook posterior à contratação.....................................96


LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Principais grupos da igreja evangélica brasileira.....................................42 Tabela 2 – Religião no Brasil Censo 2010.................................................................43


SUMÁRIO INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 12 1 HISTÓRIA DA MÚSICA GOSPEL.... ..................................................................... 16 1.1 UM MOVIMENTO E UMA REVOLUÇÃO NA MÚSICA EVANGÉLICA................18 1.2 A MÚSICA GOSPEL NO BRASIL........................................................................23 1.2.1 Anos 50 e 60....................................................................................................26 1.2.2 Anos 70............................................................................................................28 1.2.3 Anos 80............................................................................................................31 1.2.4 Anos 90............................................................................................................33 1.2.5 Anos 2000........................................................................................................35 1.2.6 Anos 2010........................................................................................................38 2 PERFIL DO CONSUMIDOR DE MÚSICA GOSPEL..............................................41 2.1 OS EVANGÉLICOS NO BRASIL, IDENTIDADE E CONSUMO..........................43 2.2 A INFLUÊNCIA DO ARTISTA..............................................................................45 2.3 MERCADO FONOGRÁFICO E PIRATARIA........................................................48 3 A CONTRACULTURA GOSPEL ...........................................................................52 4 BANDA TANLAN – UM ESTUDO DE CASO NA CONTRACULTURA GOSPEL.64 4.1 METODOLOGIA...................................................................................................64 4.2 TANLAN – DO INDEPENDENTE À CONTRATAÇÃO DA SONY MUSIC...........65 4.2.1 Sobre a marca da Banda Tanlan....................................................................68 4.3 SHOWS E EVENTOS – O CONTATO DIRETO COM O PÚBLICO....................69 4.3.1 Programa Radar – TVE...................................................................................69 4.3.2 Pop Rock + Coca Cola Zero..........................................................................71 4.3.3 Show de Lançamento cd Um Dia A Mais.....................................................72 4.3.4 Abertura Show Thalles Roberto.....................................................................74 4.3.5 Selo Rock Festival...........................................................................................75 4.3.6 Estação ZH.......................................................................................................76 4.4 MÍDIA ESPONTÂNEA EM PUBLICAÇÕES.........................................................77 4.4.1 Revista Noize...................................................................................................77 4.4.2 Revista Época..................................................................................................78 4.4.3 Revista Billboard Brasil..................................................................................79 4.5 ALGUMAS INTERAÇÕES COM ARTISTAS E EVENTOS DO MOVIMENTO PÓS-GOSPEL............................................................................................................80


4.5.1 Semana de Arte Cristã....................................................................................81 4.5.2 Rock No Vale...................................................................................................82 4.6 REDES SOCIAIS.................................................................................................83 4.7 PLATAFORMAS DIGITAIS..................................................................................86 5 ANÁLISE................................................................................................................89 5.1 CONTATO COM A BANDA.................................................................................89 5.2 SOBRE O QUESTIONÁRIO................................................................................90 5.3 ANÁLISE DO QUESTIONÁRIO...........................................................................90 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................98 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................102 APÊNDICE A ..........................................................................................................110 APÊNDICE B ..........................................................................................................114


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INTRODUÇÃO

A música é uma prática cultural e humana. É a arte dos sons, é uma linguagem peculiar que troca signos através de seus diversos elementos e, por isso também é um fenômeno semiótico. Nela cabe muito mais do que melodia, ritmo, harmonia. Cabem mensagens de amor, de guerra, de liberdade, de alegria, de rebeldia, de paz. Cabe uma filosofia inteira. Cabe a fé. É indiscutível que a música é valiosa, seja como entretenimento, arte, linguagem universal, terapia ou veículo de comunicação. Através dela é possível estudar a trajetória humana, a forma de expressão de cada época, de cada povo e nação. Há um mundo dentro de uma pauta. Um universo enorme, impossível de ser analisado em um único trabalho como este. Todavia, existe uma perspectiva que interessa ao presente estudo: a música cristã. Ela aparece já nos primeiros relatos bíblicos, e não são poucos os episódios em que encontramos na Bíblia, histórias em que a música é apresentada não apenas como arte, mas como instrumento de algo espiritual. Isso reforça essa capacidade que a música tem de transportar informações, mensagens, emoções e muito mais do que podemos mensurar. De acordo com as sábias palavras do filósofo Antoine Fabre d’Olivet (2004, p. 37), a música intelectual, quando praticada com a finalidade da contemplação de algo maior, alcança “seu mais alto nível de perfeição, forma um tipo de elo analógico entre o sensível e o inteligível, e assim conquista um meio simples de comunicação entre dois mundos”. Com a evolução e expansão da igreja cristã no decorrer da História, a música adaptou-se aos novos formatos que a Igreja adquiriu, e nesse percurso, criou sua própria história, paralelamente aos movimentos culturais e religiosos ao longo dos anos. E essas adaptações aproximou a música cristã das pessoas, de um modo geral, fazendo com que o público abraçasse esse gênero não mais como simplesmente um cerimonial, mas o levasse para sua casa, sua vida, suas reuniões de família e rodas de amigos. A partir dos anos 90, a música cristã virou música gospel e o gospel virou uma marca que, nos dias de hoje, abrange uma infinidade de outros produtos que atendem um público desejoso por aproximar sua identidade com a de Cristo e seus ensinamentos. Público esse, que cresce vertiginosamente e consome da própria cultura cada vez mais.


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No entanto, escreve-se, nos últimos dez anos, um novo capítulo na história da música cristã no Brasil: o surgimento de uma contracultura, que sustenta um discurso muito mais artístico e menos mercadológico do que o mainstream gospel. É nesse contexto que está inserida a Banta Tanlan, precursora de uma nova geração de artistas cristãos que executam sua arte sem rotulá-la como religiosa ou secular. Chamado por alguns de movimento pós-gospel, o que se percebe nesse novo momento da música cristã é um desprendimento da música como produto e uma valorização dela como arte, atribuindo mais importância à mensagem do evangelho enquanto essência de vida do que como propaganda de uma religião. Apontada como precursora desse movimento, a Banda Tanlan, de Porto Alegre, foi escolhida como objeto de pesquisa desse trabalho pelo fato de ser uma das que, recentemente, passaram pelo processo de transição de carreira independente ao circuito comercial através da contratação da gravadora Sony Music. Almeja-se, através do estudo de caso da Banda Tanlan, entender outros artistas do movimento pós-gospel que, assim como ela, tem sido alvo de investimento de grandes gravadoras no Brasil, servindo ainda como amostra para identificação das características da contracultura gospel no Brasil. Diante dessas considerações, este estudo apresenta como questões de pesquisa: Quais características da Banda Tanlan a tornam parte da contracultura gospel? Houve mudança no âmbito da filosofia da Tanlan após a contratação pela Sony Music? Porque a gravadora Sony Music firmou contrato com uma banda que, além de não se enquadrar em um segmento específico, não contempla o faturamento como principal meta de seu trabalho? Assim, o presente trabalho tem como objetivos: Investigar as origens da música e da cultura gospel no Brasil; conhecer o público consumidor que se formou nessa cultura; entender o movimento contracultural que começou a se manifestar no país nos últimos dez anos; e, identificar as características da Banda Tanlan, que a insere nesse novo contexto artístico-cultural da música cristã brasileira. A formação da autora dessa pesquisa foi atravessada pela cultura religiosa, mais precisamente a protestante evangélica. Desenvolveu sua cultura musical baseada, essencialmente, pelo que seus pais ouviam e pelo que a igreja cantava. Logo, a motivação para realizar esse trabalho acadêmico vem de sua própria experiência em acompanhar as evoluções da música evangélica, juntamente com


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sua apreciação natural por tendências comunicacionais dentro de um contexto cultural. Ao perceber esse novo momento na musicalidade cristã brasileira, construído por artistas como Fábio Sampaio, vocalista da Banda Tanlan, objeto de estudo desse trabalho, a autora se viu entusiasmada pela expectativa de ver, em sua geração, algo com potencial para dividir a história da música cristã no Brasil. A escolha do objeto de pesquisa também se deu pelo interesse no trabalho da Banda Tanlan e no discurso argumentado e comunicado por esses novos artistas. Além disso, a autora identificou-se na figura do artista cristão que busca fusionar-se na cultura contemporânea e tornar-se relevante através de sua arte. Essa identificação gerou algumas indagações quanto à interferência da fé no processo criativo do artista, vindo, a autora, a perguntar-se se estariam suas habilidades criativas limitadas pelo receio de ter sua fé corrompida pela filosofia mercadológica. A pesquisa se divide em cinco capítulos, sendo que no primeiro capítulo iremos apresentar um histórico da música gospel, desde suas origens mais primitivas, registradas na Bíblia, até as primeiras aparições, nos Estados Unidos, abordando ainda sua chegada ao Brasil. Para isso, utilizaremos os seguintes autores: Baggio (2005), Bíblia (2013), Frederico (2007), Braga (1961), Cunha (2007), Soares (2012, 2013) e Levino (2011). No segundo capítulo apresentaremos a definição do público evangélico, a matriz das igrejas evangélicas do Brasil, mensuração de evangélicos brasileiros no contexto atual e explanação do mercado gospel contemporâneo. Além disso, abordaremos as interligações entre consumo, fé, pirataria, discurso comunicacional e influência do artista na cultura gospel. Para isso, utilizaremos os seguintes autores: Cunha (2007), Frederico (2007), Prates (2013), Corrêa (1989), Xavier (2007), Campbell (2006), Baggio (2005), Soares (2013, 2014) e Carvalho (2014). No terceiro capítulo abordaremos sobre a construção da cultura gospel e as características dela que propiciaram o nascimento de um movimento contracultural, as ideias e conceitos defendidos pelos artistas da nova geração da música cristã, os influenciadores desse novo momento na música evangélica, discursos sobre religioso e profano e a importância da cibercultura para a propagação do movimento pós-gospel. Para isso, exploraremos os autores a seguir: Baggio (2005), Cunha (2007), Almeida (2012, 2013), Fernandes (2014), Bessa (2014), Maurício Soares


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(2013, 2014), Mateus Soares (2013), Rookmaaker (2010), Frederico (2007), Costa (2014), Bruner e Ware (2002), Castro (2004) e Junior e Nogueira (2010). Na metodologia, quarto capítulo desse trabalho, é feita uma abordagem teórica à investigação exploratória em música na contracultura gospel, incidindo particularmente no estudo de caso qualitativo. Seguidamente, é feita a apresentação do objeto de estudo do presente trabalho. Para definições da metodologia utilizou-se os seguinte autores: Duarte e Barros (2008), Santaella (2001), Silva e Menezes (2001), Yin (2005) e Gil (2002). No quinto capítulo teremos a apresentação e análise do questionário, técnica de coleta de dados escolhida pela autora. Espera-se que a leitura deste trabalho ajude na compreensão do cenário da música cristã contemporânea brasileira, provinda de um movimento contracultural, sua filosofia e sua atuação no mercado.


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1 HISTÓRICO DA MÚSICA GOSPEL Neste capítulo iremos apresentar um histórico da música gospel, desde suas origens mais primitivas, registradas na Bíblia, até as primeiras aparições, nos Estados Unidos, abordando ainda sua chegada ao Brasil. Para isso, utilizaremos os seguintes autores: Baggio (2005), Bíblia (2013), Frederico (2007), Braga (1961), Cunha (2007), Soares (2012, 2013) e Levino (2011). A origem mais primitiva da música cristã, está nas páginas da Bíblia, o livro sagrado dos cristãos. Nela, encontram-se diversos trechos onde a musicalidade aparece de diferentes formas: cânticos, versos inspirados em experiências divinas, orações musicadas, enfim, melodias nascidas do anseio de comunicação da criatura com o Criador. Há vários episódios em que a música aparece na Bíblia, mas nenhum personagem está tão envolvido com ela como Davi. No capítulo 16 do livro de I Samuel, nos versículos 15 até 23, diz: Os funcionários de Saul lhe disseram: "Há um espírito maligno mandado por Deus te atormentando. Que nosso soberano mande estes seus servos procurar um homem que saiba tocar a harpa. Quando o espírito maligno se apoderar de ti, o homem tocará a harpa e tu te sentirás melhor. E Saul respondeu aos que o serviam: "Encontrem alguém que toque bem e o tragam até aqui". Um dos funcionários respondeu: "Conheço um dos filhos de Jessé, de Belém, que sabe tocar harpa. É um guerreiro valente, sabe falar bem, tem boa aparência e o Senhor está com ele". [...] Davi foi apresentar-se a Saul e passou a trabalhar para ele. [...] E sempre que o espírito se apoderava de Saul, Davi apanhava sua harpa e tocava. Então Saul sentia alívio e melhorava, e o espírito maligno o deixava. (BÍBLIA, 2013, p. 359)

É perceptível nesse texto o uso da música como veículo de algo sobrenatural, que não carregava apenas arte, mas como ela ganhava vida e poder através do comportamento e da postura de Davi. No entanto, a música gospel, como a conhecemos, teve sua história atravessada por muitos outros episódios até se tornar um gênero musical. Pode-se dizer que, as primeiras características desse gênero se ouviu nas igrejas americanas, quando as canções que faziam parte do culto nas igrejas, ganharam o ritmo e o improvido da música dos negros. Tendo chegado à América do Norte como escravos, os negros africanos cantavam suas dores e sua cultura nas plantações de algodão no sul dos Estados Unidos. Quando esse povo se tornou


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adepto ao cristianismo, formaram congregações negras como fuga da segregação que havia nas igrejas, onde eram inferiorizados. Ali surgiu o negro spiriritual, nome dado à maneira particular dos negros de cantar suas esperanças de liberdade e as mensagens bíblicas nos rituais de suas reuniões. Além de expressarem seus sentimentos e sua fé, a Igreja era o lugar onde sentiam-se livres para praticar costumes próprios e preservar parte de sua cultura musical (BAGGIO, 2005). A princípio, os negros cristãos usavam suas melodias cantadas no campo em seus cultos, mas depois, baseando-se nelas, compuseram os primeiros hinos negros. As letras enfatizavam a obediência a Deus e o afastamento do pecado, sempre ressaltando a recompensa eterna no Reino do céus, através de frases musicais. As canções de trabalho consistiam em chamados e respostas, nos quais uma linha solo era alternada com uma resposta coral, uma frase curta ou uma palavra. Tais cantos, oriundos da África, ainda hoje são usados em muitas igrejas naquele continente. [...] Por volta de 1870, os cantores negros Jubilee, da Universidade Fisk, em Indiana, realizaram várias apresentações nos Estados Unidos e na Europa levando o gospel para fora da comunidade negra. (BAGGIO, 2005, p. 17)

Essa nova musicalidade, gerada na realidade dos negros no século 18, vai além de uma expressão cultural, ela muda a história e transforma as sisudas e formatadas estruturas musicais, até então utilizadas nas igrejas, como os cantos gregorianos cantados nas Missas da Igreja Católica Romana ou os corais e hinos alemães de Lutero, em canções cheias de entusiasmo, acompanhadas de dança e palmas. Conforme Baggio (1997, p.43), isto deu “desenvolvimento ao blues (tristeza) como música secular e ao gospel como música sacra.” Nos anos 1910, Charles A. Tindley, ministro de uma congregação metodista e considerado pioneiro no gênero Gospel, publicou suas primeiras composições, porém, somente de dez a vinte anos depois é que as músicas, de fato ficaram conhecidas (CUNHA, 2007). Mas foi Thomas Andrew Dorsey que ficou conhecido como pai da música gospel. Thomas, filho de pastor e músico de blues, ouviu umas das canções de Tindley e inspirou-se em suas letras, motivando-se a abandonar as canções seculares e adotar letras religiosas às suas composições de blues (BAGGIO, 2005). Na época, inclusive, foi criticado por associar o santo e o profano, mas isso não o fez estagnar. As letras de Thomas seguiam a atmosfera das primeiras canções negras e a musicalidade contagiante do jazz (CUNHA, 2007).


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Uma de suas obras mais conhecidas, Precious Lord, Take My Hand foi gravada por músicos como Aretha Franklin, Elvis Presley, BB King e Mahalia Jackson. Essa última, inclusive, a cantou no funeral de Martin Luther King Jr. (BAGGIO, 2005), a seu pedido, pois a canção era uma de suas favoritas e era entoada em muitos de seus comícios a fim de inspirar as multidões. Podemos entender examinando a letra (traduzida) que se segue: Precioso Senhor, pegue minha mão Precioso Senhor, pegue minha mão Guie-me, deixe-me ficar Estou cansado, estou fraco, estou desgastado Através da tempestade, durante a noite Guie-me para a luz Pegue minha mão, precioso Senhor, conduza-me para casa Quando meu caminho se escurecer Precioso Senhor, fique perto Quando minha vida estiver quase no fim Ouça o meu clamor, ouça meu chamado Segure a minha mão para que eu não caia Pegue minha mão, precioso Senhor, conduza-me para casa Quando a escuridão aparece E a noite se aproximar E o dia é passado e se foi No rio eu fico Guia meus pés, segure a minha mão Pegue minha mão, precioso Senhor, conduza-me para casa Fonte: http://letras.mus.br/gospel/1611925/traducao.html (2014)

É notório o cunho sofrido nos versos da canção de Dorsey, traço típico do negro spiritual, e o modo como a canção é utilizada como um desabafo, uma válvula de escape da alma, uma comunicação com um Deus que, em algum momento, irá aliviar a dor, mesmo que seja na morte.

1.1 UM MOVIMENTO E A UMA REVOLUÇÃO NA MÚSICA EVANGÉLICA Verão de 1967. Canções como She’s leaving home [Ela está saindo de casa], do álbum Sgt. Pepper’s lonely hearts club band dos Beatles, manifestavam o espírito hippie daqueles dias utópicos e esperançosos em que o rock era a trilha de uma celebração de drogas e sexo (BAGGIO, 2005). A palavra “busca” era uma constante nas conversas entre os jovens da contracultura hippie. Procuravam “paz,


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amor, realidade e vida. Eles rejeitavam o consumismo capitalista, a hipocrisia religiosa e a superficialidade da cultura americana” (BAGGIO, 2005, p. 45).

As

primeiras músicas de cunho cristão que surgiram dessa época vieram de integrantes do Jesus Movement, movimento que surgiu no rastro da contracultura hippie e que buscava oferecer uma perspectiva de vida cristã aos jovens descepcionados com as propostas de paz e amor baseados em drogas e sexo livre, fomentadas pelos shows de rock secular (BAGGIO, 2005). Figura 1 – Capa Revista TIME de junho de 1971

Fonte: Blog Uma Nova Conciência (2010)

A Revista Time, em junho de 1971, “publicou uma reportagem de doze páginas sob o título ‘Revolução de Jesus’” (BAGGIO, 2005, p.49), assim como outras revistas como a Life e a Look, que também faziam publicações sobre o movimento. Esses movimentos contraculturais incentivaram o surgimento de novas ideias. A música cristã contemporânea nasceu em meio a uma revolução espiritual que varreu os EUA no final da década de 1960 e início da década de 1970, levando milhares de jovens a Cristo. Tal revolução ficou conhecida como conhecida como Movimento de Jesus [Jesus Movement] por sua ênfase na pessoa de Jesus e em seus


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ensinamentos, no lugar do cristianismo institucionalizado das igrejas norte-americanas. (BAGGIO, 2005, p. 43)

Desses milhares de jovens citados por BAGGIO (2005), muitos eram também músicos sob influência da explosão do rock, que, ainda segundo BAGGIO (2005), aprenderam com Bob Dylan, Beatles e Joan Baez a utilizar a música como um veículo de expressão de conceitos e ideias e, ao converterem-se ao cristianismo, utilizavam seus dons para propagar suas convicções de fé . A cena jovem cultural da época pregava liberdade e é isso que esses jovens cristãos carregavam em suas mentes após o encontro com os ensinamentos bíblicos: desejavam utilizar-se de todos tipo de arte para passar adiante o que haviam recebido (CUNHA, 2007). Esses jovens novos convertidos começaram a procurar as igrejas de cristianismo protestantes, o que causou algumas modificações nesse meio.

(1) igrejas tradicionais adotaram estilos mais informais nos cultos para incluir os novos convertidos e passaram a admitir até mesmo no seu staff pessoas provenientes do movimento hippie; (2) novas igrejas e denominações cristãs surgiram, adequadas ao estilo hippie mais descontraído na aparência e na forma de cultuar; (3) o uso de diferentes formas de comunicação pelos hippies cristãos, como os jornais alternativos (meio comum daquele movimento) e as artes (teatro, pintura, desenho, caricatura), com fins conversionistas; o surgimento da Jesus Music [Música de Jesus], uma combinação de rock e gospel que se tornou a base do movimento de avivamento da juventude (...). (CUNHA, 2007, p. 72)

Um dos atingidos por essa onda foi Keith Green. Americano, de origem judaica, criado na seita Ciência Cristã e dono de um talento nato, aos 12 anos gravou pela Decca Reccords, uma das maiores gravadoras do mundo, que mais tarde veio a ser comprada pela Polygram. Por seu álbum não repercutir como esperava, Keith, aos 15 anos, decidiu se afastar de Los Angeles ao máximo, com uma caminhonete velha e 175 dólares, conforme conta o documentário Your Love Broke Through – The Keith Green Story (2002). Green (2002) embarcou no que chamou de jornada espiritual e relatou essa busca em um diário, onde registrou suas diversas experiências ambientadas no final dos anos 60, quando as experimentações psicodélicas, o amor livre e a espiritualidade cósmica mudavam a cultura. Sua fome espiritual dava letra às suas músicas, feitas juntamente com seu amigo Todd Fishkind, com quem também compartilhava o uso de drogas, acreditando que elas o levaria ao lugar onde estava


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o “algo a mais” que não encontrava ao seu redor, mas que sua alma caçava com toda intensidade. E, nessa época, na onda hippie, todos estavam nesse estado de busca espiritual, tendo uma diversidade de filosofias e opções para quem quisesse experimentar: misticismo oriental, budismo, gurus, metafísicos entre outros. Ainda segundo o documentário (2002), depois de algumas experiências que chamou de “viagens ruins”, Green não quis mais as drogas e seguiu sua busca até decidir estudar sobre Jesus, pois percebeu que todas as religiões falavam dele como um homem admirável. Foi quando Randy Stonehill, músico que já seguia os ensinamentos de Jesus foi crucial na vida de Keith. A musicalidade de Green aproximou os dois, que imediatamente tornaramse amigos e trocavam ideias sobre o cristianismo de maneira informal, como os demais jovens hippies cristãos daquele contexto. Assim, à medida que Green foi se entregando aos ensinamentos de Jesus, suas músicas foram transformando o dircurso de “estou em busca de um sentido espiritual” para “eu encontrei o meu caminho espiritual”. E isso, imediatamente fez com que seu público, que era atraído pela fome sagaz que tinha por respostas, se distanciar, pois agora toda sua linguagem era outra. Agora, Green comunicava que sua busca cessou e propagava as verdades em que acreditava, tornando-se uma referência para os jovens que chegavam ao cristianismo, como conta o documentário (2002). Com isso, Green e sua esposa Melody, em 1975, tiveram sua casa transformada em um abrigo, cheia de novos convertidos, ex-hippies e ex-drogados, mães solteiras e qualquer pessoa que precisasse de um refúgio temporário. A vida de Green tornou-se um discurso palpável. Sua transformação espiritual tornou-se inspiração para muitos jovens e músicos. Figura 2 – Capa disco For Him Who Have Ears to Hear


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Fonte: Wikipedia (2014)

Como relembra Baggio em seu site, Foi somente em meados de 1977 que o primeiro disco de Keith Green, “For Him Who Have Ears to Hear” (Para quem tem ouvidos para ouvir) chegou às livrarias cristãs. Este disco tornou-se o maior álbum de estréia na história da música cristã, com mais de 300 mil cópias vendidas. O resultado foi que, de um artista totalmente desconhecido, Keith Green logo tornou-se um dos mais populares e procurados cantores do cenário da música cristã. (BAGGIO, 2010).

Green gravou cinco álbuns, entre eles o For Him Who Have Ears to Hear, conforme Figura 2, e criou a política do “pague o que puder”, que se tratava de enviar

seus discos pelo preço que as pessoas pudessem pagar e se pudessem pagar. Tudo porque acreditava que as suas canções falavam de algo que todos precisavam ouvir, independente se tivesse condições de pagá-lo pelo trabalho ou não (KEITH, 2014). Com uma trágica morte, em uma queda de avião, e juntamente com dois de seus quatro filhos, Green sai do cenário da música cristã que ajudou a reinventar. Com apenas 28 anos ele escreveu músicas que inspiram até hoje os artistas cristãos, justamentre porque seu discurso e sua vida andavam em harmonia. Diversos líderes ligados ao Jesus Movement, no ímpeto de sua juventude e motivados pelas convicções do movimento, tornaram-se missionários e dispersaramse em várias nações para disseminar a fé cristã. Muitos vieram para o Brasil e, além de praticarem as formas de evangelismo informais típicas do movimento, traduziam


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as músicas do inglês para o português e adaptavam o som inserindo guitarra e bateria (CUNHA, 2007). Essa influência modificaria definitivamente a percepção de música cristã, principalmente entre os jovens.

1.2 A MÚSICA GOSPEL NO BRASIL

Assim como em todo histórico da Igreja, a música sempre esteve presente na Igreja brasileira, ocupando seu espaço dentro do culto, como um momento de introdução

à pregação da Palavra e também como expressão individual de

“adoração” a Deus. Os primeiros cânticos evangélicos entoados em terras brasileira, se deram já no primeiro século do descobrimento, que também foi o da Reforma protestante. A Reforma, movimento culminado por Martin Lutero, através da publicação de suas 95 teses, trouxe também, uma reforma na maneira como os cristãos usavam da música nos seus cultos. Conforme Frederico relata em seu livro,

A música usada por Lutero nos cultos foi modificada, para que todos os participantes pudessem atuar ativamente. Passou a usar então, no canto, a língua alemã. O canto congregacional foi incentivado como forma de participação efetiva de todos os fiéis. Ele mesmo compôs hinos em alemão. Lutero era músico: sabia tocar o alaúde e estudou música na Universidade de Erfurt. Compreendia que a música, ao lado da teologia, seria um grande instrumento para a evangelização e propagação das novas doutrinas da Reforma. Além disso, usou o canto como meio para combater ideias teológicas contrárias às suas. Às vezes usava melodias já conhecidas, optando sempre pela simplicidade. (FREDERICO, 2007, p. 30).

As músicas de Lutero foram um forte veículo de propagação da Reforma, afinal “os hinos são um veículo de ensino. Diziam os jesuítas que Martin Lutero fez mais danos à Igreja Católica com seus hinos do que com sua teologia” conforme Frederico (2007, p.157). A execução dos primeiros hinos evangélicos em terra brasileira, se deu através dos primeiros viajantes alemães. Luteranos, os alemães trouxeram junto sua forma de cantar as passagens bíblicas e suas palavras de louvor à Deus. Hans Staden, um dos primeiros alemães a chegarem ao Brasil, conta em seu livro de memórias que publicou em 1557, na Alemanha, um episódio muito interessante contado pela autora Braga, em seu livro:


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(...) desempenhava Hans Staden, por contrato com os portugueses, as funções de artilheiro do Forte construído na Ilha de Santo Amaro, defronte à Bertioga. Vindo a cair em poder dos tupinambás, que o cercaram na ocasião em que saira à procura de um serviçal que fora caçar, sua grande aflição levou-o a implorar o socorro divino. Orou a Deus e buscou, na recordação de Salmos apropriados, a consolação de que tanto carecia e que lhe foi outorgada. Assim é que, ferido, sangrando e rodeado de selvagens que ameaçavam devorá-lo, Hans Staden ergueu a voz e entoou o Salmo 130: “Das profundezas a ti clamo, ó Senhor”, cuja versão alemã Aus tiefer Noth schrei ich zu dir, por ele cantada, fora preparada e musicada em forma de coral por Martinho Lutero alguns anos antes. (...) Sempre sob a terrível ameaça de ser morto e devorado pelos canibais que o retinham prisioneiro, viu-se certa vez, em que particularmente o afligiram, obrigado a cantar. Obedecendo à intimação, entoou vários cânticos espirituais. Quiseram os selvagens saber o que estes significavam, tendo-lhes explicado Hans Staden (que aprendera a língua dos tupinambás antes de ter sido por eles aprisionado) tratar-se de versos ao seu Deus. Por motivo de seus hinos, orações e recitativo de Salmos e outros trechos bíblicos em alta voz, teve o prisioneiro múltiplas oportunidades de falar-lhes de Deus; como orasse com fervor e fossem ouvidas as suas súplicas, apoderou-se dos tupinambás certo temor e respeito em relação à sua pessoa, graças aos quais lhe pouparam a vida, receosos de perderem as suas caso lhe fizessem mal. (BRAGA, 1961, p.32).

A migração trouxe à Igreja do Brasil a herança musical das culturas dos imigrantes. Do protestantismo, que se instalou no Brasil a partir de 1820 no Rio de Janeiro e 1824 no Rio Grande do Sul, veio o uso de órgão de tubos, o harmônio e também os coros mistos, masculino e feminino (BRAGA, 1961). O casal de missionários Robert e Sarah Kalley, escoceses, vindos da Illha da Madeira, Portugal, chegaram ao Rio de Janeiro no ano de 1855 e foram responsáveis pelo primeiro hinário evangélico brasileiro, utilizado pela primeira vez em 1861 na Igreja Evangélica Fluminense, a qual fundaram. Essa coletânea de, aproximadamente, 50 hinos, foi nomeada Salmos e Hinos e era composta por composições próprias e acervo de hinos cantados no seu país de origem traduzidos pelo casal. Essa primeira edição foi adotada pelas demais igrejas protestantes do Brasil. Segundo Frederico (2007, p.153), “os hinários ainda em uso nas igrejas protestantes do Brasil contem praticamente os mesmo hinos que foram editados no final do século 19 e início do século 20”. A aposentada Esther Marques Monteiro, também bibliotecária voluntária na Igreja Evangélica Fluminense (2014) conta, no site da instituição:


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Nos 50 primeiros anos de sua história, o "Salmos e Hinos com Músicas Sacras" teve quatro edições (1868, 1889, 1899 e 1919). Desta última, já com 608 hinos, foram feitas três tiragens (1919, 1952, 1959). (...)Os direitos autorias dos "Salmos & Hinos" foram doados pelo filho adotivo do casal Kalley, Dr. João Gomes da Rocha, à Igreja Evangélica Fluminense, no Rio de Janeiro, poucos dias antes de sua morte, em 1947. 119 anos depois da publicação do modesto hinário de 1861 e 61 anos após a última edição de "Salmos e Hinos com Músicas Sacras", podemos usar a quinta edição, totalmente revisada e aumentada para 652 títulos, que foi impressa em 1975.

Figura 3 – Hinário Salmos e Hinos

Fonte: Site Dicionário do Movimento Pentecostal (2011)

Uma das tradicionais canções contidas nessa seleção histórica é Mais Perto, Meu Deus, de Ti, escrita em 1841 pela norte-americana Sarah Flower Adams (S.F.A.), conforme relata Isael de Araújo no site Dicionário do Movimento Pentecostal (2011),


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(...)a música foi escrita por Lowell Mason em 1856. (...) Sua versão em português foi feita em 1888 pelo Dr. João Gomes da Rocha e foi publicado no hinário Salmos e Hinos, sob o N° 219, com o título “Mais Perto Quero Estar” (atual Nº 360).

A música evangélica brasileira teve seu primeiro disco gravado em 1910, pela RCA Victor e, depois, para a Odeon, pelo Grupo Coral da Igreja Evangélica Fluminense, a fundada pelo casal Kalley, no Rio de Janeiro (BRAGA, 1961). Além da produção musical, o trabalho radiofônico também começou a ser utlizado pelas igrejas evangélicas como canal de comunicação e propagação da sua fé. Esse recurso foi “inaugurado em 1929 pelo Ver. Rodolfo Hasse. Em 1954, A Voz da Cruz da Hora Luterana, através de gravações adrede preparadas, mantinha programas em vinte e cinco emissoras nacionais.” (BRAGA,1961, p. 396) Porém, o uso das tradicionais canções, inquieta as novas gerações, que esperam por algo novo. O que acontece é que “os membros antigos das igrejas não querem perder sua bagagem musical, enquanto os mais novos desejam introduzir novidades” (FREDERICO, 2007, p.154). Frente a esse impasse, as igrejas históricas protestantes optam por inserir músicas de sonoridade mais contemporânea para envolver o público jovem. Nisso vemos que a adaptação musical dentro da igreja acontece por uma “demanda de mercado” e não simplesmente por critérios doutrinários ou teológicos. A resistência das gerações mais velhas se dá muito pelo medo de romper o vínculo de identidade que as une com demais igrejas pelo mundo (FREDERICO, 2007). Os hinos que chegaram ao Brasil tem suas versões originais cantadas por muitos países, e isso, traz um sentimento de unidade, firmando a identidade da igreja como um grupo (FREDERICO, 2007). Isso se repete até hoje no contexto evangélico. A cada nova geração que se levanta, cria-se uma nova demanda para atender às suas persepções e gostos, provindos de sua carga cultural, da sociedade em que está inserida, das informações a que tem acesso e experiências que vive.

1.2.1 Anos 50 e 60

Desde o início do uso de hinários na igreja evangélica brasileira, implantados no século XIX, pelos missionários, a mudança mais relevante no contexto musical se deu nos anos 50 com a propagação do que foi chamado


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“corinhos” (CUNHA, 2007). Esse estilo de música se teve pela forte influência das canções cantadas nas reuniões avivalistas dos EUA, conforme afirma Cunha,

Inspirados nas composições populares, de melodia e letra simples e forte tom emocionalista, criadas nas reuniões avivalistas do EUA a partir do século XIX, eles foram introduzidos no Brasil nos anos 50 por grupos pentecostais e instituições paraeclesiásticas cujo alvo para propagação da fé cristã eram jovens e adolescentes. Os pentecostais desenvolviam composições populares mais ligadas às raízes nacionais (à música sertaneja) e as paraeclesiásticas produziam versões em português de cânticos populares estadunidenses (marchas e baladas românticas). (...) De fácil melodia, versos curtos e ritmo animado, os corinhos entoados pelos jovens dessas organizações encontraram ampla aceitação entre a juventude que participava dos eventos, e inseriram-se de forma bem sucedida no citidiano das comunidades. O conteúdo era fiel à tradição teológica da hinologia clássica protestantes – a alteração dava-se na simplicidade das letras (...). (CUNHA, 2007, p. 70)

Quanto à termologia paraeclesiástica, utilizada na referência de Cunha, o Dicionário Informal (DICIONÁRIO, 2014) define como uma “atividade paralelo ao ministério eclesiástico”, não, necessariamente envolvendo uma igreja no processo de divulgação do Evangelho. No exemplo a seguir, nesse hino de autoria desconhecida, podemos verificar como a composição dos cânticos tornou-se simples em relação aos hinos protestantes: Momentos Há momentos que as palavras não resolvem Mas o gesto de Jesus demonstra amor por nós. Foi no Calvário que ele sem falar Mostrou ao mundo inteiro o que é amar. Aqui no mundo as desilusões são tantas Mas existe uma esperança É que ele vai voltar. (CUNHA, 2007, p. 71)

A introdução desses corinhos nas igrejas, no geral, não agradou. A nova experiência musical causou uma repulsa, principalmente pela inserção de instrumentos musicais que eram julgado profanos, como teclado e violão. Inclusive, “nesse período o uso deles nas reuniões públicas das igrejas foi praticamente proibido e restringia-se às reuniãos específicas da juventude” (CUNHA, 2007, p. 71) Como já apresentado anteriormente, o negro spiritual foi o estilo musical que se propagou nos EUA a partir do século 17 com a chegada de escravos negros da


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África. Essa musicalidade também influenciou a produção de hinos no Brasil, servindo de base para muitas canções.

Em algumas igrejas protestantes, pequenos grupos se reuniram para cantar em estilo dos negros americanos, com música original, que podia ser ou não traduzida. Alguns conjuntos tornaram-se até bem conhecidos, como o conjunto Wesley, que na década de 1960, no RJ, cantava e gravou elepês nesse estilo de música americana. (FREDERICO, 2007, p. 62)

Figura 4 – Disco Conjunto Wesley

Fonte: Site Rádio Naftalina (2009)

1.2.2 Anos 70

Nos anos 70, a influência da Jesus Music, oriunda do Jesus Moviment, que acontecera nos EUA, resultado de uma estratégia de evangelismo realizado nas ruas e focado nos jovens, enfim chega, através de missionários, nas igrejas brasileiras. Nessa época, os conjuntos musicais ganharam força, principalmente entre o público jovem, alterando o cenário de aversão que houve nas comunidades em relação aos corinhos que usavam diferentes instrumentos (CUNHA, 2007), e que tiveram até mesmo suas execuções proibidas nos anos 50, como vimos. Os missionários influenciaram os jovens brasileiros na prática de evangelismo por meios informais em lugares públicos como ruas e praças. Esse modo jovem de cultuar, cantar e pregar passou a influenciar fortemente a juventude protestante brasileira e ampliou a presença


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dos movimentos paraeclesiásticos já existentes no país, reforçando-os e abrindo espaço para outros. (CUNHA, 2007, p. 73).

Muitos grupos se formavam utilizando-se da música como estratégia de comunicação para campanhas evangelísticas, mas evitavam o visual informal dos hippies cristãos, temendo que o impacto fosse brusco demais para as igrejas que não estava habituadas com tamanha manifestação jovem em suas atividades (CUNHA, 2007). Alguns grupos destacaram-se nesse período como Vencedores por Cristo, Grupo Elo e Palavra da Vida. E foi a partir desses conjuntos jovens de organizações paraeclesiásticas que o repertório utilizado nos cultos se renovou.

As músicas

chegavam às igrejas através dos discos gravados de forma independente ou pela visita dos próprios grupos que faziam campanhas evangelísticas se apresentando em diversas igrejas pelo Brasil, levando seus discos para venda. Houve, então, uma certa inspiração nos jovens por todo país, que estruturavam seus próprios conjuntos desse estilo canto coral ou simplesmente ensaiava com seus próprios grupos as canções que estavam nos discos (CUNHA, 2007). O grupo Vencedores por Cristo, fundado pelo americano Jaime Kemp que apresentou e executou com sucesso o projeto de equipe musical itinerante, foi, com certeza, um dos mais significantes, sendo hoje uma organização que desenvolve diversos projetos com objetivo evangelístico (BAGGIO, 2005). Conforme o site oficial da organização (2014), “música sempre foi o meio de comunicação adotado por VPC, letras com conteúdo bíblico, ritmos diversos, uma comunicação direta com o jovem e seus problemas”. Esse conjunto “tornou-se marcadamente conhecido no meio protestante por suas composições caracterizadas por força poética e inovadora na inserção de ritmos brasileiros como a bossa-nova e o baião.” (CUNHA, 2007, p. 75) Figura 5 – Grupo Elo em apresentação


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Fonte: Site Oficial Grupo Elo (2014)

O Grupo Elo, outro importante conjunto da década, conforme Figura 5, fundado em 1976 por Jayro Trench Gonçalves e Paulo César da Silva e suas esposas, produziu “músicas do mais alto nível no cenário evangélico de sua época” (BAGGIO, 2005, p. 58). De todas suas canções gravadas, a chamada Calmo, Sereno e Tranquilo (1978) foi uma das que se tornaram clássicos da música evangélica brasileira, tendo sido, desde então, regravada por outros grupos, bandas e artistas independentes, sendo alguns: Grupo Logos (1984), Fábio Sampaio ( 2013 em publicação no SoundCloud – plataforma online de publicação de áudio), Terno e Saia (2014). Podemos perceber a forma como a mensagem dessa canção não perde o seu sentido, mesmo sendo sujeita à prova das diversas nuances musicais e culturais que atravessou por 40 anos. Calmo,sereno e tranquilo Letra e musica : Ivan C. Borges Calmo,sereno e tranquilo Sinto descanso neste viver Isto devo a um amigo Que só por ele eu pude obter Ele é Jesus meu amigo Meu Senhor, o Salvador Só por ele ganhei a vida eterna com Deus Triste foi sua história Levado a cruz sem pecado algum, só porque me amou Morreu por mim e não hesitou. Fonte: http://letras.mus.br/grupo-elo/364034/ (2014)


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Ao pesquisar sobre as mudanças musicais dos anos 70, é possível perceber que há uma concordância no sentido de que esse foi um período, de fato, revolucionário no cenário evangélico protestante. As rupturas e inovações acontecidas ali, pelos jovens, gerou uma onda de novas influências, ramificações e formatos que criariam uma base para uma nova resolução duas décadas depois (BAGGIO, 2005). A explicação para a abertura dada aos jovens dentro das igrejas, afetando as tradições nos cultos protestantes, “pode ser encontrada não no cenário religioso, exclusivamente, mas também no quadro sóciopolítico brasileiro no período” (CUNHA, 2007, p. 76).

1.2.3 Anos 80

A década de 80 foi marcada por formação de bandas que faziam suas próprias composições. Ocorreu um “movimento de jovens compositores em São Paulo, que escreviam música evangélica brasileira” (FREDERICO, 2007, p. 164). Rebanhão, banda de rock que iniciou fazendo shows sobre a carroceria de um caminhão e teve seu primeiro disco gravado em 1981, foi a banda mais expressiva nessa época (BAGGIO, 2005). Fundada por Janires Magalhães, compositor admirado por suas expressões irreverentes e musicalidade inteligente, foi um dos grupos mais polêmicos na música cristã do Brasil (CUNHA, 2007).

Esse disco foi tão revolucionário que recebeu acusações de conter mensagens invertidas (backward messages). Sem se importar com as críticas, Janires e seus companheiros seguiram adiante, desafiando os conceitos e preconceitos de como deveria ser a música cristã. O grupo trazia uma mistura de ritmos que iam do baião ao rock’n’roll. O segundo LP foi Luz do Mundo (1983, Arca Musical), com um som mais amadurecido. O disco foi muito bem recebido e chegou a ter algumas de suas canções tocadas em rádio FM seculares do Rio de Janeiro. (BAGGIO, 2005, p. 60)

Em uma das composições de Janires, chamada Baião, gravada no primeiro disco do Rebanhão, é possível identificar essa brusca diferença entre as letras dos corinhos da década de 70, simples, curtos e poéticos, cantados até então nas igrejas, e essa nova proposta de música cristã que, conforme Baggio (2005), polemizava o meio.


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Baião Minha vida aqui era muito louca Só faltei correr atrás de avião Mas Jesus entrou no meu deserto E inundou o meu coração Eu era magro que dava dó Meu paletó listrado era de uma listra só Mas Jesus entrou no meu deserto E inundou o meu coração Sem Jesus Cristo é impossível Se viver neste mundão Até parece que as pessoas estão morando no sertão É faca com faca, é bala com bala Metralhadoras e canhões Até parece que a faculdade só tá formando lampião E lampião e lamparina, Vela acesa e candeeiro Nunca vai salvar ninguém E ainda se vai gastar dinheiro E o dinheiro anda mais curto Do que perna de cobra Filosofia de malandro: "No bolso ele bota mas nunca sobra" E o que tá fartando de amor Tá sobrando iniquidade Todo mundo se odiando Pelas ruas, pelas ruas das cidades Se essas ruas, se essas ruas fossem minha Eu pregava cartaz Eu comprava um spray Escrevinhava nelas todas Jesus is the only way Jesus é o único caminho Pra quem quer morar no céu Quem quiser atalhar vai pro beleléu! Fonte: http://letras.mus.br/rebanhao/48337/ (2014)

A polêmica se deu pela identidade radical que a banda assumiu, rompendo o fundo litúrgico de músicas evangélicas (CUNHA, 2005). (...) radical aqui significa a adoção de ingredientes considerados ‘profanos’ para a musicalidade religiosa evangélica: postura cênica, visual dos músicos, linguajar, apresentação no estilo espetáculo (a Rebanhão foi o primeiro grupo evangélico a se apresentar em casas de show, como o Canecão, no Rio de Janeiro). O secular


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penetrava na performance da nova música evangélica. (CUNHA, 2007, p. 82).

A banda gravou discos onze discos, sendo alguns deles por gravadoras seculares como a Polygram e a Continental. O som deles ganhou muito alcance e sucesso, espalhando de forma rápida sua influência pelas igrejas, onde os grupos de juventude passavam a adotar o estilo “banda” no lugar dos “conjuntos jovens” (CUNHA, 2005).

1.2.4 Anos 90

Nos anos 90, essa expansão da música evangélica para fora do meio religioso, ficou ainda mais forte. A Igreja Renascer em Cristo teve papel importante nisso. Estevan e Sonia Hernandes, fundadores da Igreja em questão e ambos de Igrejas de diferentes denominações, iniciaram reuniões informais de evangelismo e estudo da Bíblia dirigidas à jovens. O grupo aumentou significantemente, fazendo-os trocar o lugar das reuniões com frequência para poder receber todos os jovens. Então, o casal formalizou a situação e fundou a Igreja Renascer em Cristo (CUNHA, 2005). Nesses encontros havia um incentivo para que os jovens trouxessem seus instrumentos e se organizassem em bandas. A novidade é que essas bandas, formadas por jovens e que tocavam todo tipo de estilo musical, começaram a ser levadas para executar suas canções nos cultos. O espaço sagrado da cerimônia de culto passou a agregar gêneros musicais populares que, até o momento, não eram aceitos nas demais igrejas evangélicas

(CUNHA, 2007). Isso se tornou

extremamente atraente para jovens de todas as igrejas evangélicas, causando a migração de muitos deles para a nova denominação. Ainda segundo CUNHA (2007), além da inserção desse tipo de música nos cultos, essa música passou a ser disseminada fortemente através dos meios de comunicação que a Igreja passou a adquirir, a começar pela criação da gravadora Gospel Records, em 1990. Depois disso, a compra da Rádio Imprensa, de São Paulo, que passou a chamar-se Imprensa Gospel. De acordo com CUNHA (2007, p. 84), “o sucesso levou ao registro dos direitos sobre a marca ‘Gospel que se associou a outros empreendimentos de mídia da Igreja Renascer (...)”. Vieram revista,


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Editora, TV, rádio, portal de internet, sistema de atendimento telefônico, e, para além da mídia, a marca passou a ser associada a empresa de cartão de crédito – Gospel Card Bradesco -, grife de roupas e até curso pré-vestibular (CUNHA, 2007). Desde então, o termo gospel

passou a se popularizar no Brasil, associado a essas

canções de ritmos contemporâneos à um novo tempo de liberdade de expressão musical dentro das igrejas e transformação na forma de publicidade e consumo no meio evangélico. As bandas ganharam mais exposição pública, devido à estratégicas de publicidade, envolvendo produtoras, emissoras de rádio e programas de TV. Há uma aceleração no processo de industrialização do gênero nessa época (FREDERICO, 2007). A Gospel Records possuiu mais de 20 bandas/artistas em seu casting. Algumas “bandas como Resgate e Oficina G3, e artistas, como Carlinhos Felix e Brother Simion, passaram a viajar por todo o Brasil e até para outros países e continentes, tocando em centenas de lugares anualmente.” (BAGGIO, 2005, p. 62) Além das emissoras de rádio e das gravadoras especializadas em divulgar a música cristã contemporânea, os artistas e as bandas começaram a contar com todos sistema de shows e festivais de grande porte. (...) O maior de todos os eventos de música cristã no Brasil na década de 1990 foi o S.O.S. da Vida. Realizado durante vários anos em São Paulo, o evento chegou a reunir aproximadamente cem mil pessoas em sua quarta edição, em setembro de 1994. (BAGGIO, 2005, p.63).

Figura 6 – Festival SOS da Vida 1993 no Pacaembu


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Fonte: Elaborado pela autora com base no YouTube - Frames de imagens feitas pela Rede Manchete (2014)

Na Figura 6 podemos ver o cantor Brother Simion, ex-dependente químico, convertido à Igreja evangélica através do trabalho do casal Hernandes usando um boné com frase sobre a pessoa de Jesus, colocando esse figurino em evidência e transformando-o, automaticamente em um produto. Ainda podemos reparar na aparência dos músicos, que em nada se diferencia de demais artistas de rock, e na estrtutura de megashow montada para o evento S.O.S. da Vida (CUNHA, 2007).

1.2.5 Anos 2000

Nos anos 2000, a música evangélica de massificou para além de expressão religiosa, ela se proliferou enquanto produto. Torna-se comum as apresentações em estádios, a comercialização de CDs e produtos diversos com aplicação de logomarca das bandas e grupos organizados por comunidades, chamados Ministérios de Louvor, uma tendência nesse período (FREDERICO, 2007). A maior referência desse estilo de organização musical nessa fase, destacando-se pela publicidade e vendas significativas de produtos, é o Diante do Trono, pertencente à Igreja Batista da Lagoinha, de Belo Horizonte (CUNHA, 2007). Tornou-se tão popular que “um conceituado músico brasileiro já chegou a usar o termo


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“lagonização” do canto em terras brasileiras, para mostrar a influência dessa instituição.” (FREDERICO, 2007, p. 166) Maurício Soares, publicitário e diretor executivo da Sony Music selo Gospel , faz uma análise sobre o momento em seu site Observatório Cristão (2012). Claramente baseados em ministérios de louvor internacionais, o fenômeno arrebatou o país e de uma hora para outra, igrejas de todo o canto passaram a seguir o modelo de adoração e louvor. A este fenômeno deu-se o nome de “adoração congregacional”. Esse movimento depois criou diferentes vertentes como a “adoração extravagante” e outros termos esquisitos, mas que no fundo apenas apontavam para um conceito de uma música mais espiritual.

Diferente do que já vimos até aqui nas revoluções na música evangélica brasileira, neste momento, não é a influência secular que traz o novo para a igreja, mas a igreja exportando para o secular a linguagem que exercia em seus momentos de culto (SOARES, 2012). E esse foi o ponto inovador desse momento. Segundo o Portal Estado de Minas (2014), atualmente o Ministério Diante do Trono “tem 33 álbuns gravados, esteve em 14 países e vendeu mais de 7 milhões de cópias”. Figura 7 – Gravação Diante do Trono 15

Fonte: Site Diante do Trono (2014)

O grupo de 50 integrantes, que tem como figura central Ana Paula Valadão, filha de um dos pastores da Igreja Batista da Lagoinha e autora da maior parte das canções cantadas pelo Ministério, evita o termo “apresentação” para definir as megaproduções de gravação de seus cds, exmplo na Figura 7. Para o Diante do


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Trono, tudo não passa de um culto de adoração à Deus, feito com excelência (CUNHA, 2007). O “culto” conta com muita tecnologia, som, telões, iluminação, tradutores de línguas de sinais, orquestra de sopro com trompetes, trombones, saxofones e trompas, dançarinos, cenografia que harmoniza com a iluminação e com o figurino do grupo. E, em meio a tudo isso, uma multidão canta, chora, levanta as mãos e grita, envolvidos por toda atmosféra criada física e espiritualmente. No cenário brasileiro do momento em questão, O termo “corinho” está em desuso. Foi praticamente substituído por gospel (...) Parece querer significar toda a música evangélica atual. Tanto é verdade que o louvor pode ser também gospel, a cantora, a noite, e até produtos, que estão sendo vendidos como gospel. Virou uma marca de consumo e cai bem nas propagandas de mídia. (FREDERICO, 2007, p.167)

Nessa década também manifestou-se uma tendência de músicas com letras extremamente metafóricas, que, muitas vezes, dificultava a compreensão de sua mensagem. Composições cheias de expressões apaixonadas e termos como “quero te abraçar”, “beijar teus pés” e “noivo” e noiva”, que, diferente do que se associa no primeiro momento, não se trata de uma relação amorosa entre homem e mulher, mas de um relacionamento de Jesus e sua igreja (FREDERICO, 2007). “O problema é que a maioria desconhece até o belo livro poético de Salomão” (FREDERICO, 2007, p. 171), que se refere à Cântico dos Cânticos (ou Cantares de Salomão), um dos livros bíblicos que utiliza esse vocabulário romântico em seus versos. Além da linguagem conotativa, essas canções também abusavam na repetição dos seus versos (FREDERICO, 2007) e, conforme SOARES (2012) algumas “músicas duravam 15, 16 minutos com apenas uma ou duas frases… uma coisa realmente diferente” . Este É O Som da Tua Noiva (David Quinlan) Este é o som da Sua Noiva Este é o som da Sua Igreja Apaixonada, fascinada por Ti (3x) Vem Jesus, e toma o Teu lugar! Vem Jesus, vem dançar! (2x) Corações apaixonados, Corações entrelaçados O meu e o Teu, Meu Amado e eu (3x)


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Fonte: Encarte Álbum Fogo e Glória – Curitiba (2001)

Essa nova música pode ser identificada como Adoração Profética ou Extravagante , conforme explica Renato Vargens (Púlpito Cristão, 2014): Em linhas gerais, essa tendência afirma a necessidade de uma adoração sincera, abundante, espontânea, totalmente guiada pelo Espírito de Deus. Para estes a palavra “extravagante” fala da atitude do adorador, a qual deve sobrepujar os padrões formais e expressar sua adoração em termos de liberdade e espontaneidade.

Como informa CUNHA (2007, p. 120), “um dado curioso é que os ministérios mais destacados desse novo formato são liderados por estrangeiros”. Temos como exemplo, o Ministério Paixão, Fogo e Glória, de MG, que tem como líder o pastor irlandês David Quinlan, vindo de outro Ministério, o Uma Chamada Para As Nações, liderado pelo pastor estadunidense Dan Duke. E assim como esse, grupos como Ministérios Asas da Adoração, Ministério Santa Geração e Ministério Casa de Davi também tinham líderes vindos de fora do país (CUNHA, 2007). Ainda conforme CUNHA (2007), a forma musical desses ministérios dissiminaram-se pelo país através de cursos e seminários organizados por eles, onde palestravam sobre a Palavra de Deus e ministravam suas canções. Também nessa fase, integrantes de grandes ministérios como o Ministério de Louvor da Comunidade da Vila da Penha, Ministério Apascentar e Diante do Trono passaram a seguir, o que se pode chamar de, carreira independente, pois desvinculavam-se dos ministérios e passavam a gravar cds solo (CUNHA, 2007). Assim foi com Aline Barros, Davi Sacer e Nívea Soares, oriundos dos ministérios respectivamente citados acima.

1.2.6 Anos 2010

A música que se chamou no Brasil de gospel, não diretamente pelo estilo musical do negro spiritual americano, mas como uma estratégica de marketing (BAGGIO, 2005), chega, na década de 2010 à uma diversidade nunca imaginada desde suas primeiras aparições no país. Existe canções cristãs embaladas pelos mais inimagináveis gêneros e formatos musicais. E isso despertou uma esperança no mercado fonográfico, segundo relata Rodrigo Levino (VEJA, 2011):


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Entre vendas de discos e de DVDs e a produção de grandes festivais, o segmento movimentou em 2010 cerca de 1,5 bilhão de reais, patamar que deve crescer 33% este ano, e chegar a 2 bilhões de reais, de acordo com uma pesquisa de mercado de uma gravadora do setor. Segundo a Associação Brasileira de Produtores de Discos (ABPD), o gospel é o segundo gênero musical mais consumido no país, atrás apenas do inquebrantável sertanejo, abocanhando uma parcela significativa dos 500 milhões de reais movimentados anualmente com a venda de CDs.

A música Gospel se populariza de tal forma que, atrai fortemente o mercado secular, recebendo investimento de gravadoras como Sony Music e Som Livre, que não demoram a perceber o poder econômico desse gênero (LEVINO, 2011). Como evidência disso, em 2011, com apoio da Rede Globo, o Troféu Promessas tem sua primeira edição, a princípio como Festival Promessas, inserido na programação especial de fim de ano da emissora, e, atualmente, como premiação do segmento gospel no Brasil (TROFÉU PROMESSAS, 2014). Essa primeira edição, contou com a produção da GEO Eventos, “empresa responsável pela edição brasileira do festival Lollapalooza, uma grife internacional” (LEVINO, 2011). Em entrevista à Veja, Luiz Gleiser, diretor da Globo responsável pelo Promessas, diz que “como maior produtora de cultura do país, [a Globo] não pode ficar indiferente à força artística da música gospel” (LEVINO, 2011). Nesse contexto, foi perceptível esse interesse da Rede Globo em abocanhar essa fatia de promissora de mercado, que passou a convidar artistas gospel para participar dos programas de linha de sua grade como, por exemplo, Domingão do Faustão, TV Xuxa e Esquenta (LEVINO, 2011), vide Figura 8. Por passar a ser distribuída por grandes empresas, a música gospel ganha as prateleiras populares e a barreira entre religioso e secular se torna cada vez mais difícil de destinguir. Artistas como Aline Barros, Régis Danese, Irmão Lázaro e mais recentemente, Thalles [Roberto], conseguiram extrapolar o segmento gospel participando de programas de TV, sendo citados por outros artistas seculares como Ivete Sangalo, Luan Santana, entre outros (...). (Soares , 2013)

Figura 8 – Thalles Roberto no Programa Esquenta da Rede Globo


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Fonte: Portal G1 – EPTV (2013)

Thalles Roberto é um desses artistas que, representa audiência, ao pisar nos palcos dos programas de diversas emissoras. Em menos de 4 anos de carreira, [Thalles Roberto] já tem mais de 5 milhões de seguidores nas redes sociais, fez mais de 600 shows com público médio de 10 mil pessoas – já atingiu mais de 1 milhão de cópias vendidas, marca esta que o coloca no topo da lista de artistas que compõem o mercado fonográfico gospel brasileiro. Nunca na história da música cristã, outro artista evangélico fez tantas apresentações, num espaço tão curto de tempo. [...] Em 2013, o "Sejam Cheios do Espírito Santo" chegou para fechar a trilogia. Mesmo antes de ter o CD impresso, a pré-venda já havia vendido, antecipadamente, cerca de 75 mil cópias, uma façanha, até mesmo para o segmento secular, que chamou a atenção dos grandes programas de televisão escancarando as portas para suas apresentações. (THALLES ROBERTO, 2014).

Como vimos nesse capítulo, a música evangélica não apenas adaptou-se à sociedade e a cultura através dos anos, auxiliando os fiéis a expressar sua devoção, mas também desempenhou com eficácia o seu papel de veículo de comunicação de um estilo de vida, transformando-se em uma ferramenta útil na propagação do evangelho de Cristo (BAGGIO, 2005). O indivíduo que adota a fé cristã evangélica, passa a identificar-se com os produtos que tem, como pano de fundo, o cultivo dessa fé. Conforme CUNHA (2007, p.140), “os produtos são codificados e decodificados como mediações com o sagrado – é por meio deles que cristãos estariam mais próximos de Deus”. Abordaremos mais sobre esse assunto e a identificação do perfil desse consumidor no próximo capítulo.


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2 PERFIL DO CONSUMIDOR DA MÚSICA GOSPEL

Neste capítulo apresentaremos a definição do público evangélico, a matriz das igrejas evangélicas do Brasil, mensuração de evangélicos brasileiros no contexto atual e explanação do mercado gospel contemporâneo. Além disso, abordaremos as interligações entre consumo, fé, pirataria, discurso comunicacional e influência do artista na cultura gospel. Para isso, utilizaremos os seguintes autores: Cunha (2007), Frederico (2007), Prates (2013), Corrêa (1989), Xavier (2007), Campbell (2006), Baggio (2005), Soares (2013, 2014) e Carvalho (2014). O consumidor de música evangélica é o indivíduo que se identifica como evangélico ou simpatiza com as práticas evangélicas. Porém, quem são os evangélicos? Na definição de Cunha (2007, p. 13) evangélico “é o termo mais comumente designado como referência aos cristãos não-católicos no Brasil.” A expressão “crentes” também é usada pra se referir ao mesmo grupo de religiosos. Ainda segundo Cunha (2007), para representar as novas experiências vividas pelos missionários protestantes no Brasil, era importante escolher um nome que os diferenciasse dos católicos, então escolheram “crente em nosso Senhor Jesus Cristo”, decidindo que os caracterizava bem, já que não adotavam a fé nos santos, mas apenas em Jesus e nas verdades do Evangelho. Com o tempo, a expressão foi abreviada para apenas “crente”. O nome nasceu da busca por uma auto-identidade, do desejo de separar sua definição de fé da que já era comum a todos. Pode-se dizer, então, que ao se dar um nome, estabeleceram uma marca, criaram sua identidade (CUNHA, 2007). Como vimos no capítulo anterior, a Igreja Evangélica no Brasil surgiu a partir de missionários protestantes (FREDERICO, 2007). O protestantismo, após ter sido despargido, a partir do século XVI, na Europa, estabeleceu-se nos Estados Unidos por intermédio dos colonos ingleses no século XVII. Estes são os dois pontos de partida das correntes protestantes que instalaram, na América do Sul e no Brasil, a nova confissão cristã. Num primeiro momento, chegaram ao Brasil, vindos do Velho Continente, anglicanos ingleses e luteranos alemães. Eles vieram, a partir do século XIX, incentivados pela “abertura dos portos às nações amigas”. Mais tarde, ainda nesse século, chegaram ao Brasil fluxos de missionários já então instalados nos Estados Unidos: congregacionais, presbiterianos, metodistas, batistas e episcopais. Posteriormente, já no alvorecer do século XX, foi a vez dos grupos pentecostais. (CUNHA, 2007, p. 14)


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A diversidade de denominações protestantes, que, no Brasil, ganharam a expressão “evangélica” em sua nomenclatura, torna complexa a sua classificação completa, pois essas estão em constante transformação, gerando novas tipologias (CUNHA, 2007). Para que se tenha uma compreensão do campo evangélico brasileiro e da origem desse público consumidor, passaremos a apresentar a matriz da igreja evangélica no Brasil, em seis principais grupos, suas ramificações, origens de confissão e formas de implantação. Tabela 1 – Principais grupos da igreja evangélica brasileira

Protestantismo Histórico de Migração

Tem suas raízes na Reforma do século XVI. Chegou ao Brasil com o fluxo migratório estabelecido a partir do século XIX, sem preocupações missionárias conversionistas. É representado pelas igrejas Luterana, Anglicana e Reformada.

Protestantismo Histórico de Missão (PHM)

Também tem suas origens na Reforma do século XVI. Veio para o Brasil trazido por missionários norte-americanos no século XIX. Corresponde às igrejas Congregacional, Presbiteriana, Metodista, Batista e Episcopal.

Pentecostalismo Histórico

Se chama assim por suas raízes nas confissões históricas da Reforma, veio para o Brasil no início do século XX com objetivo missionário. É caracterizado pela doutrina do Espírito Santo, ou seja, pela condição que os adeptos devem assumr de um segundo batismo, o batismo do Espírito Santo, caracterizado pela glossolalia (falar em línguas estranhas). Composto pelas Igrejas Assembléia de Deus, Congregação Cristão do Brasil e Evangelho Quadrangular.

Pentecostalismo e Renovação ou Carismático

Surgiu a partir de expurgos e divisões no interior das chamadas “igrejas históricas”, em especial na década de 60, caracterizado por posturas influenciadas pela doutrina pentecostal. Mantém vínculos com a tradição da Reforma e com a estrutura de suas denominações de origem. É formado pelas Igrejas Metodista Wesleyana, Presbiteriana Renovada, Batista de Renovação, entre outras.

Pentecostalismo Independente (Neopentecostalismo)

Não tem raízes na Reforma do século XVI. Surgiu (e surge ainda hoje) de divisões teológicas ou políticas nas “igrejas históricas” a partir da segunda metade do século XX. Tem como especificidades sua composição em torno de uma “liderança carismática”, a pregação da Teologia da Prosperidade e da Guerra Espiritual, a prática constante de exorcismos e curas milagrosas e o rompimento com o ascetismo pentecostal histórico. Sua enumeração é dificílima, dada a profusão constante de novas igrejas: Deus é Amor, O Brasil Para Cristo, Casa da Bênção, Universal do Reino de Deus, entre outras.


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Surgiu no final do século XX e ganhou força no início do século XXI. Possui as características do Pentecostalismo Independente (alguns autores tratam este grupo de igrejas integrado ao outro), no entanto difere dele por ter como público-alvo as classes médias e a juventude, estruturando seu modo de ser e alcançá-los. Esse modo de ser atenua a ênfase no exorcismo e nos milagres e ressalta a prosperidade e a guerra espiritual. Esse grupo é composto por igrejas como Renascer em Cristo, Comunidades (Evangélicas, da Graça), Sara Nossa Terra, Bola de Neve, entre outras.

Pentecostalismo Independente de Renovação

Fonte: Elaborado pela autora com base em Cunha (2007, p. 14)

Foi entre esses grupos, nesse trabalho, tratados como “evangélicos”, que o gospel surgiu, inicialmente, como uma expressão relacionada apenas à música, mas consecutivamente também usada para identificar demais expressões culturais do meio.

2.1 Os evangélicos no Brasil, identidade e consumo

A igreja evangélica no Brasil está em ascensão expressiva desde os anos 2000, como podemos ver na tabela abaixo, baseada na divulgação dos dados do Censo 2010, pelo IBGE. Tabela 2 – Religião no Brasil Censo 2010 % em 1980

% em 1990

% em 2000

% em 2010

Quantidade em 2010 (em milhões de pessoas)

Católicos

89

83,3

73,6

64,6

123,2

Evangélicos

6,6

9,1

15,4

22,2

42,2

Outras religiões

2,8

2,8

3,6

5,2

9,6

Sem religião

1,6

4,8

7,4

8

15,3

Religião

Fonte: Censo 2010/IBGE. Publicado no Portal Exame.com

Segundo os dados do Censo 2010, os quais são os mais atualizados, a população católica atual é de 64,6% e 22,2% a evangélica. Porém, a previsão do pesquisador e professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas, do IBGE, José Eustáquio Diniz Alves, no estudo “A dinâmica das filiações religiosas no Brasil entre 2000 e 2010”, e apresentada por Marco Prates (2013), é que os evangélicos ultrapassarão os católicos no Brasil até 2040.


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Os católicos, que em 1980 eram quase 90% da população, devem representar menos de 50% já em 2030, mas ainda liderarão. Dez anos depois, estarão em menor número que os evangélicos, segundo o artigo. O Brasil terá passado então, por um raríssimo processo de mudança da religião hegemônica, feito inédito em qualquer país de grande porte do globo no mundo moderno. (PRATES, 2013).

O pesquisador afirma que se “pegar a tendência dos últimos 20 anos, os católicos perdem um ponto percentual ao ano no Brasil. Evangélicos estão mais bem posicionados entre grupos que têm maior crescimento demográfico.” (apud PRATES, 2013). Ainda conforme o professor Alves (apud PRATES, 2013), no catolicismo predomina a população mais velha, enquanto a religião evangélica ganha força entre jovens e mulheres em idade fértil. Ele acredita que isso se dá pela customização do discurso nas igrejas evangélicas, que vem criando denominações que abraçam estilos específicos de pessoas, a fim de atingir diferentes públicos. Segundo especialistas, isso mostra que a tendência é que esse crescimento não pare por aqui. Estes jovens evangélicos formarão famílias e a possibilidade maior é que eles criem os filhos de acordo com o mesmo princípio.(R7, 2012).

Além disso, os evangélicos são mais atuantes em suas igrejas, quando comparados aos católicos, segundo o Instituto Datafolha, em pesquisa publicada em 21 de julho de 2013 e comentada no Portal de notícias G1.

Entre os católicos, apenas 17% costumam ir à missa e outros serviços religiosos mais de uma vez por semana. Quando é questionada a presença apenas uma vez por semana, o número sobe para 28%. Ainda entre os católicos, 21% dizem ir à igreja uma vez por mês, e 7% assumem que não a frequentam [...]Entre os evangélicos pentecostais, 63% vão à igreja mais de uma vez por semana [...]Entre os evangélicos não pentecostais, 51% vão à igreja mais de uma vez por semana. (G1, 2013).

Esses dados podem revelar o forte nível de comprometimento que os evangélicos tem com seu estilo de vida e sua identidade. Um profundo engajamento nas atividades eclesiásticas evidencia uma conexão, primeiramente, espiritual, mas também cultural e emocional com o meio e tudo que está ligado a ele. Podemos considerar que essa conexão seja entendida como a própria comunicação, a troca de mensagens existentes nesse cenário evangélico. Porém, podemos considerar,


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também, que essa conexão tenha um sentido de pressuposto para que a comunicação ocorra (Xavier, 2007). Para entender essa classificação da conexão, que Xavier (2007) classifica como emocional e cultural, vejamos a definição dada pelo autor: A conexão emocional tem função de abre-alas e atua prioritariamente nos domínios do sentir. Não se trata de emoção ao pé da letra, restrita às abordagens profundas/ arrepiantes/ lacrimejantes, mas de todo tipo de emoção, incluindo as que provocam riso. [...] A conexão cultural refere-se à proximidade referencial, à relevância, à vivência da mesma realidade. Ela é geradora de identificação e atua prioritariamente nos domínios do pensar. [...] Os dois tipos de conexão são simultâneos, igualmente necessários e importantes, como os dois pinos de uma tomada ligada à energia elétrica.” (XAVIER, 2007, p.59).

Colocando em análise esse conceito com o olhar sobre a música gospel, é possível perceber que o público evangélico está conectado à ela por esses dois pinos definidos por Xavier (2007). Na música, a conexão cultural seria encontrada no tema, escolhido de acordo com a realidade dos ouvintes; a conexão emocional estaria na composição tecnicamente bem desenvolvida, levando-se em conta seus aspectos melódicos, rítmicos e harmônicos. (XAVIER, 2007, p. 69).

O indivíduo de fé evangélica identifica-se na música gospel através da conexão cultural, pois o tema que está centrado nas canções é parte da sua realidade e do seu cotidiano. Essa identificação gera o desejo pelo consumo do produto gospel. Sobre essa identidade pessoal e a atividade de consumo, Campbell (2006) diz que [...] o eu contemporâneo ou pós-moderno é excepcionalmente aberto e flexível. Isso é o mesmo que dizer que as pessoas – ao fazerem uso da grande e constante oferta de novos produtos na sociedade de consumo moderna – estão regularmente engajadas no processo de recriar a si mesmas. (CAMPBELL, 2006, p. 50).

Levando em conta que a afirmação da identidade se dá a partir da resposta para a pergunta “quem eu sou?”, e, sabendo que nessa pergunta estão envolvidas questões básicas como sexo, raça, nacionalidade, etnia e, inclusive,

religião

(CAMPBELL, 2006), entende-se que o consumidor evangélico é cometido por esse impulso de formação de identidade ao adquirir um produto gospel.

2.2 A influência do artista


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Assim como nos demais segmentos musicais, a música gospel também possui seus ícone de identidade. Um deles, obviamente o principal, é a figura de Jesus, que utilizou-se de uma forma de comunicação tão poderosa que permanece ativa até os dias de hoje. É interessante a maneira como Xavier (2007) expõe Jesus e sua forma de comunicação: A famosa formulação “Você é o que você come” – incorporando a nós o que internalizamos-, aplica-se, hoje mais do que nunca, ao universo da comunicação: “Você é o que você comunica” – incorporando a nós o que exteriorizamos. Intencional ou acidentalmente, a imagem que construímos na cabeça de quem nos observa é, em última instância, nossa mais concreta realidade. Para Jesus, isso não era novidade, conforme ele demonstra ao se definir como “caminho, verdade e vida. Ele de propôs a ensinar o caminho, revelar a verdade e comunicar a vida, mas nem por isso se definiu como “mapa, tira-teima e conselheiro”. Em vez de dizer “eu comunico isso e aquilo”, preferiu dizer “eu sou”. E podia dizer isso com toda tranquilidade do mundo, porque tinha certeza de que sua vida estava em perfeita sintonia com o conteúdo de sua comunicação. (XAVIER, 2007, p.194).

Aqui, entendemos mais sobre a importância da coerência no discurso comunicacional. A identidade de Jesus gera inspiração, pois a harmonia entre suas atitudes e seu discurso faz dele um parâmetro para um modo de vida. É esse modo de vida que os consumidores buscam e desejam afirmar ao adquirirem um produto gospel. Tupã Gomes Corrêa (1989) diz que existem vários elementos que intervém no processo de identidade da música, no caso, ele aborda o gênero rock e a decorrência dessa identidade com o mercado de produtos para a juventude. Um desses elementos é o artista ou grupo que interpreta esse gênero. Dessa forma, podemos fazer a mesma associação refletindo sobre a música gospel. [...] porque há um vínculo obrigatório entre a corrente ou estilo do rock e quem o representa, muito mais do que em outros gêneros e formas de música. E nesses casos, o vínculo é acentuado em razão de uma certa personalidade desses representantes imposta à maneira como se vestem, ensejando uma espécie de moda que, aos poucos, pode ser transformada em produto para consumo em larga escala. (CORRÊA, 1989, p. 30).

Essa afirmação de Corrêa (1989) coloca o artista, o emissor da mensagem, como um fator determinante para que haja a conexão referida por Campbell (2006), que, através da identificação com a mensagem, dispõe de sua personalidade como propulsora de produtos para consumo. A apreciação da obra de um artista por parte


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de um indivíduo, faz com que ele compartilhe de seu ponto de vista, se “alimentando de seus sentimentos”. (XAVIER, 2007, p.70). Na linha de pensamento de Corrêa (1989) sobre a influência do artista sobre seu público no quesito consumo, temos Baggio (2005) que aborda sobre a influência do artista em relação ao modo de vida, a partir do exemplo de Kurt Cobain. Guitarrista e vocalista do Nirvana, e viciado em heroína, Kurt deu um tiro na cabeça, aos vinte e sete anos, por não suportar a pressão dos fãs, que viam nele um super-homem. Ele sabia a verdade acerca de si mesmo e escolheu o suicídio como fuga das ilusões que o cercavam. Infelizmente, sua atitude motivou outras pessoas a fazerem o mesmo, inclusive alguns de seus fãs. A história de Kurt Cobain mostra-nos o poder de influência que um artista possui – tanto para o bem como para o mal. [...] há muitos artistas que tentam negar o poder de influência e esquivar-se da responsabilidade [...] É uma irresponsabilidade tremenda os artistas escreverem algo negativo em suas canções e dizerem que tudo não passou de uma piada. Na verdade, geralmente eles estão refletindo nas músicas suas próprias crenças e estilo de vida. (BAGGIO, 2005, p.75).

Os artistas cristãos são diferentes. Eles entendem que estão diante dos olhos do público e que tudo que fizerem ou disserem terá um impacto na vida de seus fãs (BAGGIO, 2005). Essa consciência provém dos valores inculcados pela mensagem do Evangelho de Cristo, como podemos ver na mensagem contida na passagem bíblica de Mateus (Mt 12,35-37): O homem bom tira boas coisas do bom tesouro do seu coração, e o homem mau do mau tesouro tira coisas más. Mas eu vos digo que de toda a palavra ociosa que os homens disserem hão de dar conta no dia do juízo. Porque por tuas palavras serás justificado, e por tuas palavras serás condenado. (BÍBLIA, 1998).

Melody

Green

posiciona-se

da

seguinte

forma

em

relação

a

responsabilidade do cristão que está em evidência: “qualquer um que faz uso de uma plataforma pública é um modelo, quer queira ou não, e quer reconheça isso ou não. É aí que vem a responsabilidade” (apud BAGGIO, 2005, p.76). Seu marido, Keith Green, o qual apresentamos no capítulo anterior, foi um homen de convicções fortes, trilhou uma trajetória exemplar nesse sentido e deixou uma herança que serve de lição para demais artistas que possuem como objetivo, levar a mensagem bíblica através da arte (BAGGIO, 2005). Certa vez Green declarou: “O mundo está cansado de dizeres religiosos... Eles querem ver o Evangelho sendo vivido e nós, cristãos, temos de nos conscientizar de nossa responsabilidade de mostrar-lhes esta


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vida” (apud BAGGIO, 2005, p. 76). Green tinha uma noção clara sobre o compromisso do artista que, sobretudo, propaga sua fé antes mesmo de sua arte. Essa abordagem sobre a influência do artista cabe nessa explanação do perfil do consumidor de música evangélica porque esse é um fator determinante para que a música do artista tenha valor enquanto produto. Quem afirma isso é Leo Ganem, ex-presidente da Som Livre e diretor da agência UM Entretenimento, primeira agência focada em música e entretenimento cristão no Brasil, fundada em setembro de 2013 (UM, 2014). Ao ser questionado por Pedro Carvalho (2014) do Portal UOL sobre a diferença entre o hit do mercado gospel e o do mercado secular, Ganem diz Ele tem alguns dos mesmos elementos. Você precisa de uma melodia simples que apele para uma grande massa de pessoas e a harmonia também costuma ser simples. Generalizando, claro. [...] Mas para além disso, o que a música secular não tem e a evangélica tem que ter é uma mensagem bem costurada que fale dos valores e da fé. E o artista tem que navegar bem não só pelos palcos, mas também com os pastores e a igreja. Ele não pode esquecer das raízes.” (CARVALHO, 2014).

2.3 Mercado fonográfico e pirataria

O que Ganen (CARVALHO, 2014) afirma sobre a necessidade de uma boa fluência do artista gospel entre os pastores e a igreja se trata de uma estratégia de mercado, pois através desse relacionamento pode-se gerar proximidade do ícone com seu discurso cantado. A música tem um lugar especial dentro dos cultos. Esse espaço, geralmente se trata do chamado “momento de louvor” (FREDERICO, 2007, p.54), onde os fiéis cantam liderados pelo grupo interno de músicos da igreja. Porém, Levino (2011) afirma que, quando um artista leva à esse espaço uma música que faz parte de um produto que está à venda, esse momento, que seria apenas uma expressão musical espontânea no contexto do culto, torna-se um meio de difusão e propaganda, tornando a igreja um veículo para divulgação de produtos. Ao contrário dos artistas laicos, cujos lançamentos requerem grandes campanhas publicitárias e inserções em rádios, os evangélicos contam com as igrejas e as rádios ligadas a elas para difundir suas músicas. O culto, que chega a ter 70% do tempo dedicado ao chamado louvor, e a programação de rádios religiosas se complementam, executando à exaustão músicas de cantores já conhecidos e indicando novos artistas. (LEVINO, 2011).


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Os projetos do meio gospel, no Brasil, geralmente passam por uma série de obstáculos para serem divulgados, já que não se conta com muitas mídias de massa.

Para um trabalho ganhar notoriedade nacional, é necessário alto

investimento e múltiplas estratégias por parte do artista e sua gravadora. Fica claro que a carência de canais de publicidade que acelerem o processo de divulgação, acaba exigindo do artista uma maior diversidade no seu sistema de promoção e é aí, que o trânsito pelas igrejas se torna mais necessário, por ser uma estratégia que atinge diretamente o público e gera resultado, mesmo que de forma mais lenta (SOARES, 2014). As entrelinhas do mercado gospel trabalham pontualmente o discurso de geração de identidade do público com o produto. Na programação das rádios e TVs dedicadas ao público evangélico, pode-se encontrar comerciais que utilizam chamadas como “aprofunde a sua fé com o produto y”, “fique mais perto de Deus com o produto z” (CUNHA, 2007, p.146). Assim se dá o apelo evangélico no contexto de consumo e mídia.

[...] os programas e a literatura da mídia evangélica tornam-se os mediadores de uma comunidade de consumidores em que a vinculação religiosa já não é o que mais importa e sim uma vivência religiosa e o consumo de bens e de cultura que possibilitem aproximação com Deus e entretenimento “sadio”. [...]Esse processo que dá forma à cultura gospel é reflexo da midiatização da religiosidade (ou prática religiosa individual ou coletiva) experimentado, que é, em suma, a produção de significados por meio do qual os evangélicos têm buscado se compreender, se comunicar e se transformar, a partir das novas tecnologias e dos meios de produção e transmissão de informação. (CUNHA, 2007, p.146).

Quando discurso coerente, qualidade musical, artista e investimento midiático fluem bem, o sucesso do produto gospel é, praticamente, inevitável, já que o mercado se encontra aquecido no segmento desde a primeira década dos anos 2000 (LEVINO, 2011). Segundo Laudeli Leão, diretor de comunicação da MK Music, a maior gravadora do segmento gospel no país, a música é o carro-chefe dos produtos evangélicos. Ainda conforme Leão, o mercado cresce pela simples razão que “todos os dias, as igrejas recebem novos convertidos, que passam a consumir vorazmente os produtos evangélicos” (Levino, 2011). Como exemplo disso, temos os números da cantora gospel Aline Barros, do cast da MK Music. São 5 Grammys Latinos, 2 discos de diamante, 4 discos de


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platina triplo, 4 discos de platina duplo, 9 discos de platina, 10 discos de ouro, fora os DVDs (ALINE BARROS, 2014). Só o disco Extraordinário Amor de Deus (2011) vendeu 300 mil cópias. Conforme Levino (2011), excede até mesmo artistas “como Ivete Sangalo (245.000 de Ao Vivo no Madison Square Garden, lançado em 2010) e Maria Gadú (180.000 do disco de estreia que leva o seu nome, em 2009)”. O que pode explicar esse alto nível de vendas são algumas particularidades do segmento gospel, como o preço baixo que os discos evangélicos tem em relação aos demais (em média, custam 15 reais) e o baixo índice de downloads legais ou ilegais, que seria porque o público evangélico é formado, na maior parte, por fiéis das classes C, D e E e teria menos acesso à internet (LEVINO, 2011). Sobre a questão da pirataria no meio evangélico, Levino (2011) diz:

Desde o fim dos anos 1990, o mercado de música enfrenta uma crise sem precedentes. No Brasil, de acordo com dados da Federação Internacional da Indústria Fonográfica (IFPI, na sigla em inglês), 45% das músicas são consumidas a partir de downloads ilegais e 52% dos discos vendidos são piratas. Mas há no cenário pouco animador uma ilha de bonança: o mercado gospel. [...] Há uma questão moral. A religião proíbe burlar a lei. A venda de discos pirateados representa de 10% a 15% do mercado gospel, um índice muito inferior que os 52% do mercado laico, por exemplo.

Conforme vimos nesse capítulo, a fé evangélica está em expansão no Brasil. Esse crescimento não se dá apenas no âmbito quantitativo, mas também na forma como tem influenciado significativamente várias áreas na sociedade em que está inserida. O movimento evangélico desenvolveu hábitos de consumo próprio, sempre aliados à significância de seus valores baseados no Evangelho (CUNHA, 2007). O mercado evangélico une fé e música para gerar dinheiro, “impulsionado pela crescente penetração dos evangélicos no país, por produções bem feitas, por artistas que se unem aos fãs por laços religiosos e pelo poder de consumo da nova classe média” (LEVINO, 2011). O entrelaçamento da cultura gospel com os meios de comunicação, política e demais setores da sociedade, faz com que alguns se questionem se os valores da Igreja não se perdem em meio a essa “secularização”. Como podemos observar na colocação de Frederico (2007, p. 54):

A geração atual é uma geração de consumo. Parece que os cristãos não aprenderam a agir diferentemente, pois abraçaram o


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consumismo com o mesmo vigor dos que não se professam cristãos. É uma geração que adora imagem (embora não exatamente ídolos religiosos), venera o som alto e exalta a tecnologia de último tipo. [...]Como esse consumismo acaba se refletindo na música para a igreja? No consumo desordenado de músicas que chegam via rádio, mídia, internet, sem uma reflexão teológica sensata. Canta-se isso ou aquilo porque os cantores gospel ou as rádios estão repetindo sem parar tais cânticos. Não se está dizendo aqui que seja errado o cantor ou a cantora gospel cantar suas músicas e vender seus CDs; o que se deseja salientar é o consumo sem critério daquilo que se ouve para fins de uso no culto cristão. Vale ressaltar que muitas comunidades e igrejas estão aderindo a isso, mesmo que a teologia e as doutrinas próprias fiquem prejudicadas.

Essa reflexão vem atingindo muitos artistas evangélicos que tem visto o mercado gospel se massificar e ganhar formas e valores diferentes dos prezados pela tradicional fé evangélica. E, a partir disso, muitos tem se manifestado contra esses rumos tomados pelo consumismo evangélico, refutando o rótulo de artista gospel e, naturalmente gerando um novo nicho no segmento musical no Brasil (SOARES, 2013). Veremos mais sobre isso no capítulo que se segue.


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3 A CONTRACULTURA GOSPEL

Nesse capítulo abordaremos sobre a construção da cultura gospel e as características dela que propiciaram o nascimento de um movimento contracultural, as ideias e conceitos defendidos pelos artistas da nova geração da música cristã, os influenciadores desse novo momento na música evangélica, discursos sobre religioso e profano e a importância da cibercultura para a propagação do movimento pós-gospel. Para isso, exploraremos os autores a seguir: Baggio (2005), Cunha (2007), Almeida (2012, 2013), Fernandes (2014), Bessa (2014), Maurício Soares (2013, 2014), Mateus Soares (2013), Rookmaaker (2010), Frederico (2007), Costa (2014), Bruner e Ware (2002), Castro (2004) e Junior e Nogueira (2010). Em torno da música gospel brasileira, criou-se um movimento. O que, a princípio, teria tudo para ser um fator positivo, inclusive por mobilizar multidões, se torna negativo pela tendência de gerar grupos fechados e rótulos em produtos e pessoas que fazem ou não parte dele. Com isso, “corre-se o risco de reverter os aspectos positivos da identificação e contextualização da mensagem” (BAGGIO, 2005, p. 139). Para o autor: Artistas cuja carreira musical estava em decadência abraçaram o movimento e começaram a gravar CDs gospel para tentar abocanhar um pedaço do mercado. Virou moeda, em certos círculos, ser conhecido como gospel. No entanto, o que significa ser gospel? Para muitos significava apreciar certo estilo de música – a música cristã contemporânea. Para outros era vestir a indumentária gospel – camisetas, bonés, moletons, lenços etc., com jargões cristãos. Para outros ainda, era frequentar certas igrejas – ou espaços – e falar a linguagem gospel. Isso tudo demonstra que o gospel foi de fato um movimento, uma tribo de jovens cristãos modernos. O risco dessa ideia de movimento é que, com o passar do tempo, as pessoas tendem a cansar-se e passam a rejeitar tudo aquilo que está associado a ele, como ficou claro no caso do movimento gospel no Brasil. (BAGGIO, 2005, p. 139)

A cultura gospel tem uma formação híbrida, por apresentar elementos totalmente distintos numa mesma identidade. Por meio do movimento gospel no Brasil, os evangélicos demonstram modernização e constante transformação, mas ainda revelam conservação e tradição. A conservação está na essência, no mais profundo dessa cultura, enquanto a modernidade está na superficialidade, apenas


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como facilitadora da mensagem que o movimento deseja comunicar (CUNHA, 2007). Com a expansão significativa do mercado evangélico a partir dos anos 2000, a camada de superficialidade da modernização na cultura gospel passou a chamar muito a atenção, deixando a camada mais relevante em segundo plano. Igrejas disputando direitos sobre rótulos criados em nome do Evangelho, artistas cobrando cachês exorbitantes, cultos transformando-se em meios midiáticos para divulgação de trabalhos. Isso tudo evidencia a importância comercial que ganhou a marca gospel e como ela, enquanto estratégia mercadológica, funcionou muito bem (BAGGIO, 2005). Diante dessa cultura mainstream que o gospel se tornou, surge um novo nicho composto de artistas cristãos que enjeitam o rótulo gospel. Não que neguem o movimento e os marcos históricos que ele firmou, mas olham para ele como mola propulsora de algo novo. Segundo o músico Marcos Almeida (2012) “é plausível considerar o movimento gospel como fenômeno preparatório para o que se constrói hoje em dia: uma música brasileira de raízes cristãs”. Almeida é responsável pelo projeto chamado Nossa Brasilidade, definido como “um movimento transmídia de fé, pensamento e arte”, através do site Nossa Brasilidade (2014), que mostra as diversas formas de expressão cultural através da música. Sobre o projeto, o músico diz que o objetivo é Trazer novos artistas cristãos que pensam na arte não como propaganda religiosa, nem como arte litúrgica, eclesiástica, mas uma arte profundamente brasileira e com a raiz cristã. Não temos medo de expor a nossa fé e também não acreditamos que a fé é um ato restritivo que nos tira da cultura porque somos todos brasileiros. Acreditamos que estamos em um tipo de pósmovimento gospel.[...] Acredito na transformação da cultura. [...] A identidade da cultura brasileira é determinada por um público não cristão e até mesmo anticristão. Essa concepção de que o brasileiro é o cara que gosta de cerveja, de Carnaval, de bossa nova e samba, é uma construção feita por um grupo de intelectuais. E existe até certo desprezo pelo Cristianismo. O que estamos tentando dizer é que não há uma separação. Acredito que existe um mundo só. Tanto a cultura “secular” está sendo influenciada pela cultura evangélica, assim como a cultura evangélica é influenciada por tudo que está em volta dela. (FERNANDES, 2014)

Para a autora dessa pesquisa, esse discurso do projeto Nossa Brasilidade personifica muito bem o que está guiando novos artistas cristãos mais empenhados


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no impacto de sua arte na sociedade do que em definir uma nova nomenclatura para o que estão fazendo. Não mais a arte categorizada pela crença, mas arte categorizada por seus critérios artísticos e estéticos (BESSA, 2014). Afinal, se a crença do artista definisse categorias nas prateleiras das lojas, “só poderíamos ter música gospel, umbanda, materialista ou quem sabe pagã, panteísta ou cristã” (BESSA, 2014). É possível identificar nesse novo movimento, que Almeida (FERNANDES, 2014) chama de pós-gospel: letras poéticas, linguagem livre de jargões evangélicos e mais próxima da língua corrente das ruas, instrumental e arranjos com identidade mais brasileira, composições próprias e uma linha tênue, digamos, quase invisível, entre o religioso e o secular. Essas características vem aparecendo já há uns 10 anos na música cristã brasileira. Nos Estados Unidos, esse pensamento e prática musical, adotado com o termo crossover, já circula há muito mais tempo. Frequentemente artistas que iniciaram no meio gospel, migram para a música secular, como é o caso de Whitney Houston, Beyoncé e Elvis Presley (SOARES, 2013). No entanto, isso não gera nenhuma identificação com o que acontece hoje no Brasil, por isso que o uso do termo crossover não é muito bem recebido para classificar o movimento. Mas, há na cultura norte-americana exemplos de longa data que manifestam uma identidade maior com o corrente momento da música cristã no Brasil.

[...] artistas como Michael W. Smith, Kirk Franklin e Yolanda Adams conseguiram romper com o mercado gospel e são executados e reconhecidos no meio artístico fora do próprio segmento. Ou seja, extrapolaram os limites do mercado religioso sem abrir mão de seus estilos musicais. Temos ainda os casos de Amy Grant que depois de uma carreira estabelecida como cantora gospel seguiu numa linha mais romântica ou o P.O.D. que segue até hoje atuando no mercado secular, sem abrir mão de conceitos e mensagens cristãs. (SOARES, 2013)

No Brasil, a banda Aeroilis, de Santa Catarina, foi a primeira a nascer com essa ideologia, tendo lançado seu primeiro álbum em 2004, o qual é considerado o primeiro trabalho desse movimento. Em 2005, a banda gaúcha Tanlan, grava seu primeiro EP e torna-se, juntamente com a Aeroilis, precursora dessa nova música que, mais tarde vem influenciar e ganhar mais notoriedade através da banda Palavrantiga, de Belo Horizonte (ABREU, 2014).


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Os traços, expressos no posicionamento assumido e cultivado por Almeida no projeto, era também aplicado na música da banda Palavrantiga, do qual era vocalista. A banda, formada em 2007, iniciou carreira com gravação independente do EP Volume 1, tendo gravado mais um álbum em 2010 e em, 2012, já com a contratação pela Som Livre, gravou o álbum Sobre o Mesmo Chão, que contém a canção entitulada Rookmaaker, que “tornou-se referência entre as outras canções por indicar o caminho artístico da banda e apontar novos temas nas composições” (PALAVRANTIGA, 2014). Rookmaaker Eu leio Rookmaaker, você Jean Paul Sartre A cidade foi tomada pelos homens. Na cidade dos homens tem gente que consegue ler, Mas os outros estão néscios pra Ti. Eu canto Keith Green, você canta o que? A cidade está cheia de sons. Na cidade dos homens tem gente que consegue ouvir, Mas os outros estão surdos pra Ti. Vem jogando tudo pra fora. A verdade apressa minha hora. Vem revela a vida que é nova. Abre os meus olhos agora. (2x) Eu fico com a escola de Rembrandt você no dadaísmo de Berlim. A cidade está cheia de tinta. Na cidade dos homens tem gente que consegue ver, Mas os outros estão cegos pra Ti. Eu monto o paradoxo no palco. Você anda zombando da Cruz. A cidade está cheia de atores. Na cidade dos homens tem gente que consegue dizer, Mas os outros estão mudos pra Ti. Toda vez que procuro pra mim algo pra ler, ouvir, olhar e Dizer, Senhor sabe o que eu quero. Não me furto a certeza: és a Vida que eu quero. Deus eu sei. Fonte: Encarte Álbum Sobre o Mesmo Chão (2012)

Nessa composição, Marcos Almeida (2012) escreve sobre a relação entre o cristão e a cultura. Cita Keith Green, o músico que apresentamos no primeiro


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capítulo, e que é referência de artista que usou sua arte livre e genuinamente inserida na cultura de seu tempo. Fala do pintor cristão holandês Rembrandt, considerado o mais importante da história holandesa.

Além de ter ficado conhecido por seus autorretratos únicos e sinceros, e também com retratos de grupo, foi com as ilustrações de cenas da Bíblia que Rembrandt fez grande fama. Em muitas pinturas bíblicas Rembrandt pintou-se como personagem na multidão, o que, de acordo com John Durham, mostrava que para ele a Bíblia era um tipo de diário, uma conta sobre os momentos de sua própria vida. A “escola de Rembrandt” são os pupilos do pintor, que por sua vez tiveram muitos alunos, pois a técnica de Rembrandt influenciou e continua a influenciar artistas em todo o mundo. (SOARES, Mateus. 2013).

Ao trazer essas referências para a letra de sua música, Almeida demonstra o anseio por retomar a postura dos artistas cristãos mencionados: cristãos que se misturam na cultura secular e deixam uma herança não-rotulada, mas expressiva e inspiradora em sua qualidade. E, ainda nomeou a composição de Rookmaaker, em referência ao historiador e crítico cultural protestante do século 20, que, tendo morrido em 1977, deixou dezenas de livros publicados em que abordava as relações entre a cultura e o cristianismo, centenas de artigos e também departamentos de arte estruturados tanto na Europa como nos Estados Unidos (ROOKMAAKER, 2010). Hans Rookmaaker considera que antes do século 19, a arte religiosa ou sacra era muito valorizada. A partir daí, essa temática tornou-se cada vez mais secundária. O autor acredita que a fotografia pode ter colaborado para isso, mas afirma que essa tendência já estava presente antes mesmo da sua invenção. O resultado foi que, com o surgimento de novos valores na arte, as pessoas deixaram de atrair-se pelos conceitos cristãos (ROOKMAAKER, 2010). Sobre esse período, Rookmaaker aponta ainda que

A religião não era problema, desde que ela fosse de ordem puramente particular e não interferisse nas coisas importantes do mundo, como ciência, a filosofia, a erudição e as belas artes. Assim, desenvolveu-se o princípio da neutralidade: no trabalho erudito, deveríamos deixar para trás as coisas irrelevantes e totalmente subjetivas, tais como nossas convicções religiosas. Precisávamos buscar aquilo que fosse objetivo, que fosse verdade independentemente da nossa fé. (ROOKMAAKER, 2010, p. 16)


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O que se percebe nesse relato de Rookmaaker (2010) é que a religião pode ser uma limitação para o artista que, ao sentir-se preso, entra em conflito com sua arte. A expressão da arte revela a identidade do artista. Se por uma demanda comercial o artista se render a formatos que não permitam sua livre expressão, essa já não é uma arte genuína, pois despreza o âmbito subjetivo da alma do artista, quando, na verdade, “a arte deve ser uma expressão do que há de mais profundo em nós” (ROOKMAAKER, 2010, p. 17). Em conformidade com esse pensamento, Almeida (2013) afirma, em uma entrevista à revista Billboard Brasil, que: essa nova geração de artistas cristãos, estão interessados em expressar-se com mais liberdade, sem deter-se tanto aos padrões do mercado, inserindo em sua música “conteúdo humano, estético, espiritual e poético do nosso fazer artístico – ou seja, aspectos reais anteriores ao mercado” (ALBUQUERQUE, 2012). Soares (2013), que particularmente chama o novo estilo musical de Nova Música Cristã Brasileira, manifesta sua percepção sobre esse cenário:

[...] creio que estamos vivendo um momento onde teremos um ambiente mais consolidado para a “música do bem”, ou seja, um estilo musical onde artistas de fé cristã usarão como temas em suas músicas uma linguagem mais universal e menos evangélica. Assuntos como amor, amizade, respeito, bem estar, companheirismo estarão mais presentes nas composições em contraposição aos chavões e temas largamente utilizados pelos artistas do universo gospel mais tradicional. (SOARES, 2013)

Percebe-se que neste aspecto, o ponto de vista de Soares (2013) está em harmonia com Almeida (2013) e Rookmaaker (2010), mas Soares também analisa a intenção desse nicho de realizar o crossover, que segundo sua própria definição “significa, em rápidas palavras, a possibilidade de um artista estender sua arte para diferentes públicos” (Soares, 2013). Sobre isso faz as seguintes considerações: Particularmente não creio no “crossover puro sangue”, para nossa realidade no país, em se tratando de artistas que passeiam no universo gospel. O que eu entendo como crossover tem a ver mais com a sonoridade e linguagem do que propriamente em fusão de públicos ou um maior espaço na mídia. [...] O crossover tão propalado deve ser prioritariamente artístico, musical, na forma e conteúdo. O público que irá consumir essa música, não tenham dúvida, será prioritariamente cristão, seja católico ou evangélico. É quase uma ilusão pueril acreditar que o público secular irá consumir esse perfil de música de forma espontânea, até porque espera-se para um artista secular algumas posturas que não coadunam de


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forma alguma com as práticas e conceitos da fé cristã. (SOARES, 2013)

A oposição gospel/secular é uma das questões levantadas pelos personagens desse movimento ainda não organizado, mas que toma força através de iniciativas diversas criadas por esses artistas (ALMEIDA, 2013). A diferenciação entre música gospel (religiosa) e secular (profana) não é simples, requer avaliação de alguns de seus elementos e desperta opiniões diversas. Para Frederico (2007), a letra da música pode auxiliar nesse processo de identificação, sendo que, se ela fala sobre o Evangelho, dirige uma mensagem diretamente a Deus ou fala sobre um texto bíblico, logo pode ser caracterizada como religiosa. Porém, não julga possível levantar uma relação exata de elementos musicais ou até não-musicais capazes de estabelecer o estilo ao qual a música pertence. Afinal, se isso fosse viável , “a música contemporânea estaria praticamente banida dos cultos cristãos, uma vez que seu estilo é cópia mesma dos estilos ditos “seculares” veiculados a todo momento na mídia” (FREDERICO, 2007, p. 64). Em uniformidade com a concepção de Frederico (2007), o teólogo e escritor João de Souza Filho assegura que nem a melodia, o ritmo ou a letra podem identificar uma música como religiosa ou profana. Segundo ele, a conduta e o nível de espiritualidade dos músicos é que é determinante, assim: “Uma música pode ser inspirada por Deus, cantada para ele, mas, se as vidas não forem dele, é profana” (apud FREDERICO, 2007, p. 58). Rookmaaker (2010) também compartilha do mesmo pensamento: [...] Falar de música cristã não significa necessariamente falar de uma música cuja letra transmita uma mensagem bíblica explícita ou expresse a experiência de uma vida de fé e obediência piedosa. A obediência não está restrita às questões de fé e ética. E aí entra a totalidade de vida. É a mentalidade, o estilo de vida, que recebe forma e expressão artística. (ROOKMAAKER, 2010, p. 61).

Esse movimento contracultural na música evangélica brasileira, que aqui chamamos de pós-gospel, adotando o termo usado por Almeida (FERNANDES, 2014), carrega em seu discurso o desejo de desfazer essa barreira entre os termos mercadológicos gospel e secular, e um desprezo pelo mercantilismo que se alastrou pelo cenário da música evangélica nos últimos anos. Podemos constatar essa afirmação através da letra da canção Saco Cheio, do cantor e compositor goiano Adriel Vinícius, músico cristão da nova geração:


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Saco Cheio E ai Adriel Opa,beleza Chegou a hora da verdade Sua musica é gospel ou secular? Olha, a comida que você come é gospel ou secular? O livro que você lê é gospel ou secular? Minha música é simplesmente música Já não to mais aguentando Essa droga que inventaram pra vender Que o tal do gospel e secular É que eu to de saco cheio De ter que engolir o meio Onde sempre tentam te modificar Se eu canto sobre Deus Do meu jeito e não do seu Me colocam entre o inferno e a MK Cômica seria essa história, se não fosse trágica E é isso que eu tenho que aturar Se isso dói meu coração imagina o do Senhor Vendo o seus filhos se vendendo e vendendo o seu amor Se isso dói o meu coração imagina o Deus Que não tem religião e ama os crentes e ateus Fonte: http://letras.mus.br/adriel-vinicius/saco-cheio/

Nessa música do álbum Transcendente Missão (2014) de Vinícius, nota-se o tom confrontador, também encontrado em outras composições do movimento e justificado por Almeida que diz: “[...] não estamos tentando ser simpáticos com o mundo. Estamos provocando muitas coisas, mas com beleza, poesia e na língua corrente das ruas e não nos jargões evangélicos” (FERNANDES, 2014). Os pensamentos do pós-gospel não são, de todo, novidade. Muitos músicos, escritores, escultores e demais artistas cristãos na história já traçaram caminhos semelhantes, servindo de inspiração para a geração atual. A banda Resgate, atuante desde o fim dos anos 80, pode ser considerada uma dessas inspirações por demonstrar integridade com a visão que sempre anunciaram através de seu trabalho. Pioneira no rock cristão no Brasil, a banda Resgate teve início no episódio, relatado no primeiro capítulo desta pesquisa, na página 30, em que o casal Hernandes, da Igreja Renascer em Cristo, permitia que jovens tocassem suas músicas nos cultos. Os integrantes da banda permanecem os mesmos até hoje e,


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em mais de 20 anos de carreira, acumulam: 12 trabalhos, sendo nove produzidos em estúdio, um acústico e dois ao vivo, além de dois DVD's e vários videoclipes, segundo informações disponíveis no site da Banda (2014). Algumas das composições de Zé Bruno, também vocalista da Resgate, trazem esse tom confrontador, pois é composta em harmonia com o discurso que ele, pioneiramente, vem fazendo de forma pública ao questionar a cultura gospel no Brasil, como podemos averiguar no trecho da entrevista feita por uma emissora evangélica na Expocristã de 2011: A gente tem uma avalanche de música americana traduzida. Aonde está a arte da nossa composição? Cadê o compositor brasileiro? Onde está a reflexão? [...] Vamos falar de arte? Onde está a nossa arte? O CTRL+C, CTRL+V tomou lugar da nossa música. [...] Onde está a cultura sendo valorizada? Onde está o evangelismo? [...] Vamos fazer um programa numa rádio que não é evangélica, porque rádio evangélica quem ouve é evangélico. O evangélico paga pra ouvir o que deveria ouvir na igreja. Eu, sinceramente, tenho um desapontamento profundo. A proposta evangelística desapareceu. Me fala um programa hoje que não toca música evangélica, em que a música evangélica não fala grego pro cara que é ímpio, que tem ritmos de uma cultura diferente, que a mensagem é falada numa linguagem simples. [...] Nós temos que acordar. [...] Estamos investindo todo nosso esforço de conquista do Corpo [Igreja] para alguma coisa que só serve pra nossa culturazinha do próprio Corpo. E que nós depois consumimos as próprias coisas que fazem parte do nosso mundinho. [...] O cara que tá afim de fazer um projeto para alcançar vidas, ele não tá preocupado se ele vai vender muito ou pouco, ele quer entrar onde ninguém entra. Esse cara não é interessante pro mercado. (ENTREVISTA, 2013).

Bandas como a Resgate criaram uma plataforma para fundamentar o que se faz hoje na música cristã brasileira, tornando-se “o melhor exemplo de um aspecto vivo dessa matriz cristã que enriquece a nossa cultura” (ALMEIDA, 2013). Para além do universo musical, podemos citar como discurso influenciador do pós-gospel, personalidades como J.R.R. Tolkien, o escritor de O Senhor dos Anéis e C.S. Lewis, escritor de As Crônicas de Nárnia. Segundo Bruner e Ware (2002), o livro de Tolkien, que vendeu mais de 50 milhões de exemplares e inspirou a produção cinematográfica sobre a trilogia, causou impacto na fé e na imaginação das pessoas. Tolkien era cristão e ajudou C.S.Lewis em sua trajetória na fé cristã. Juntos, se reuniam em um bar para trocar ideias sobre suas obras e falar sobre Deus. No entanto, muitos cristãos negam-se a crer que um escritor cristão pudesse criar uma obra repleta de criaturas irreais (BRUNER; WARE, 2002).


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A arte e a criatividade que estão por trás desta maravilhosa fantasia colocaram essa obra [O Senhor dos Anéis] entre as maiores obras literárias de todos os tempos. No entanto, é provável que muitos dos admiradores de Tolkien não saibam que a fonte de inspiração e entusiasmo da imaginação do autor se deve à sua fé cristã. Na verdade, muitos cristãos irredutíveis em sua linha de pensamento hesitam em aceitar uma obra criativa que inclui figuras míticas, anéis mágicos e temas sobrenaturais. Isto é lamentável porque as verdades transcendentes do cristianismo fervilham por toda essa história, levando nossa imaginação a realidade que são melhores quando experimentadas do que estudadas. Como as obras de C.S. Lewis, o mito e a fantasia de Tolkien podem abrir a porta dos fundos do coração quando a porta principal está trancada. (BRUNER; WARE, 2002, p. 8).

É possível identificar aqui a essência da fala dos artistas do pós-gospel: a excelência da arte como principal veículo da mensagem da fé cristã. O poder da subjetividade como fator enriquecedor e facilitador da assimilação da mensagem intrínseca na arte. Isto vem ao encontro de Rookmaaker que diz que “a arte tem sua própria justificativa” (ROOKMAAKER, 2010, p. 39), independentemente se ela possui algum elemento cristão ou não. Ainda conforme Rookmaaker (2010), a arte não deve ser comprometida para se encaixar em padrões, pois assim perde seu valor. O autor cita os músicos Handel e Bach como artistas que criaram obras dignas de perpetuação sem, necessariamente, declarar ou expor suas convicções religiosas. Eles não comprometeram sua arte. Não estavam produzindo ferramentas de propaganda religiosa ou publicidade santa. E precisamente por isso suas obras foram tão profundas e importantes. Elas não eram um meio para o fim de ganhar almas; eram significativas em si e tinham um fim em si mesmas. (ROOKMAAKER, 2010, p. 37).

Guiados por algumas fontes de inspiração e muitas convicções teológicas e culturais, os artistas do pós-gospel passam a evidenciar características desse movimento a partir de 2010, quando a tecnologia e o acesso à internet já transformara os padrões de consumo de música. Assim como demais artistas menores de todos os segmentos, os novos músicos cristãos encontraram no espaço virtual e na cibercultura um meio para propagar suas ideias e trabalhos. As novas formas de sociabilidade da internet são potencializadas pela sua característica interativa. É nesse ambiente que formam-se comunidades virtuais


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agregadas por interesses, ideias e gostos musicais em comum. Gisela Castro (2004) afirma que, sites de distribuição de música digital proliferam na rede e atraem milhões de usuários. Dessa forma, um espectro de opções cada vez mais abrangente entre estilos e gêneros musicais, facilmente acessáveis através da Internet, vem se descortinando para o consumo. (CASTRO, 2004, p. 9).

Considerando que o pós-gospel trata-se de um movimento impulsionado, substancialmente, por jovens, é compreensível que o meio digital, ambiente em que estão culturalmente inseridos, funcione como propulsor desses novos trabalhos que são divulgados de forma natural e menos estratégica. Dessa forma, a cultura do underground atinge também o meio evangélico, fomentada pela busca do novo e do inusitado nos conteúdos musicais publicados na internet (JUNIOR; NOGUEIRA, 2010). Sobre esses hábitos anti-massivos, Junior e Nogueira (2010) apontam: Essa pequena transferência de poder que é dada ao consumidor faz surgir um outro fenômeno dentro da indústria da música: a formação de uma terceira parada de sucessos, com artistas quem nem estão sendo lançados pelas grandes gravadoras, nem estão sendo comentados nos jornais e revistas especializados. [...] O ouvinte/receptor experimentou o topo das paradas e agora pode optar por consumir as dezenas de fileiras de artistas menores que as gravadoras não têm interesse ou recurso para promover em trilhas de filmes, novelas, capas de revistas e cadernos culturais. (JUNIOR; NOGUEIRA, 2010, p. 221).

É importante ainda considerar que dentro das transformações da cultura auditiva dadas pelos avanços tecnológicos, encontra-se a proximidade do ouvinte/fã com o artista. Isso é possível pela facilidade de obterem-se fichas completas sobre todos os detalhes das músicas e dos artistas que a executam. Além do acesso às informações, é possível conectar-se à outros fãs e, até mesmo, com o próprio artista (JUNIOR; NOGUEIRA, 2010). Para Junior e Nogueira (2010),

Essa transformação aponta para uma mudança no acesso às informações sobre o consumo cultural, bem como para uma potencial transformação do entorno comunicacional da música, o que se reflete nas próprias características dos julgamentos de valor sobre a música. (JUNIOR; NOGUEIRA, 2010, p. 223).

A nova geração da música cristã no Brasil parece entender-se bem em meio a essas transformações, pois vem despertando a atenção de gravadoras pela sua relevância nos ambientes virtuais. Soares (2014) afirma que atualmente, a aposta das gravadoras, está nos artistas que se destacam nas redes sociais, oferecem


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conteúdos relevantes em seus canais e tem visibilidade em seus vídeos. Segundo o autor, “se um artista tem um vídeo com milhares, às vezes milhões de views, já há um forte indício de que temos algo interessante à frente” (SOARES, 2014). Muitos são os artistas e bandas, hoje, que manifestam elementos de pósgospel na sua música. Podemos citar alguns como Crombie, Palavrantiga, Tanlan, Hélvio Sodré, Lorena Chaves, Bruno Branco, Marcela Taís e Simonami. E, segundo Soares (2014), alguns desses se destacaram na esfera digital através de conteúdo de qualidade, talento e também perseverança apontando a jovem Marcela Taís e a banda gaúcha Tanlan como exemplos disso. Ambos foram lançados em selos digitais e, num curto espaço de tempo, “tornaram-se artistas nos moldes tradicionais de gravadoras” (SOARES, 2014). Sobre sua notoriedade virtual, a cantora Marcela Taís, relata: “Meu trabalho é fruto da Internet, não tive patrocinador, nem dinheiro para pagar rádios ou mídia, mas graças aos compartilhamentos e apoio dos internautas, meu trabalho foi visto por milhares de pessoas” (COSTA, 2014). Em 2012, a artista sul-mato-grossense foi contratada pela Sony Music que se pronuncia sobre ela da seguinte forma:

Seu trabalho ganhou grande notoriedade nas redes sociais, o principal meio de divulgação inicial, o que deu muito certo, seu último clipe lançado no YouTube possui mais de 400.000 acessos. Rapidamente chamou atenção, não somente do segmento evangélico, mas também ultrapassou a questão religiosa por tratar os princípios cristãos sob uma ótica poética e simplificada, com um tom sincero e divertido, suas músicas expõe assuntos relativos à muitos: família, perdão, fé, amor, paz, esperança, etc. As melodias são cativantes e possuem mistura bem única de folk, MPB, reggae e estilo próprio da cantora, interpretados por uma voz doce e marcante. (SONY, 2014).

Já sobre a Tanlan, banda gaúcha também referenciada por Soares (2014), sua contratação pela Sony Music foi anunciada em outubro de 2012 pelo próprio Maurício Soares, que é diretor da gravadora, e que na ocasião disse: “A Tanlan é um dos projetos com maior potencial no cenário gospel para fazermos o tão aguardado processo de crossover, que é expandir o alcance da música para além do segmento cristão”. Por apresentar essa e outras características singulares do movimento pós-gospel, a banda Tanlan foi escolhida como objeto de estudo do presente trabalho, o qual apresentaremos no capítulo seguinte.


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4 BANDA TANLAN – UM ESTUDO DE CASO NA CONTRACULTURA GOSPEL

Neste capítulo, é feita uma abordagem teórica à investigação exploratória em música na contracultura gospel, incidindo particularmente no estudo de caso qualitativo. Seguidamente, é feita a apresentação do objeto de estudo do presente trabalho e a análise desse estudo. Para definições da metodologia utilizou-se os seguinte autores: Duarte e Barros (2008), Santaella (2001), Silva e Menezes (2001), Yin (2005) e Gil (2002).

4.1 METODOLOGIA

Para que haja profundidade no estudo em questão, faz-se necessária o uso de pesquisa. Ela é o maior desafio na realização do trabalho, pois exige um estudo de concepções e procedimentos variados. É através da pesquisa que serão encontradas as respostas para as perguntas intrínsecas neste trabalho (DUARTE; BARROS, 2008). Oriunda do desejo de encontrar explicação para algo, a pesquisa esclarece dúvidas e, no processo de busca, todo o esforço aplicado para responder a essas perguntas converte-se na obtenção de conhecimento. Desta forma, pesquisa é a maneira pela qual a ciência adquire conhecimento (SANTAELLA, 2001). A pesquisa bibliográfica tem extrema importância para o cumprimento dos objetivos desse trabalho. Uma grande vantagem da pesquisa bibliográfica está no fato de permitir ao pesquisador uma ampla cobertura de fenômenos, muito maior do que o investigador teria acesso diretamente (GIL, 2002). Conforme Marconi e Lakatos (2005) a pesquisa bibliográfica

abrange toda bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudo, desde publicações avulsas, boletins, jornais, revistas, livros, pesquisas, monografias, teses, material cartográfico etc., até meios de comunicação orais: rádio, gravações em fita magnética e audiovisuais: filmes e televisão. Sua finalidade é colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que foi escrito, dito ou filmado sobre determinado assunto, mas propicia o exame de um tema sob novo enfoque ou abordagem, chegando a conclusões inovadoras. (MARCONI; LAKATOS, 2005, p. 183).


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Grande parte do presente trabalho se dá no resgate histórico da música evangélica e do cenário que, ao decorrer dos anos, ela construiu junto à cultura. Faz-se fundamental esse retrato para embasamento do momento atual do qual o objeto de estudo está inserido. Neste caso, a pesquisa bibliográfica é indispensável, pois na maioria dos casos, é improvável saber de “fatos do passado se não com base em dados bibliográficos” (GIL, 2002, p. 45). Quanto à metodologia de obtenção de dados, uma pesquisa pode ser classificada como quantitativa ou qualitativa. Os métodos quantitativos são predominantemente relacionados às ciências naturais. Por outro lado, os procedimentos qualitativos são relacionados às ciências sociais. Os procedimentos analíticos são escolhidos em relação ao caso estudado e também baseados nos objetivos pretendidos (DUARTE; BARROS, 2008). Para o desenvolvimento da presente pesquisa optou-se por trabalhar com a investigação qualitativa, pois o foco está nas relações da Banda Tanlan com o contexto cultural que envolve a música evangélica contemporânea. O método de pesquisa adotado foi o estudo de caso. O método de estudo de caso busca responder as questões “como” e “por que” os fatos acontecem. Segundo Yin (2005, p. 20), “o estudo de caso permite uma investigação para se preservar as características holísticas e significativas dos acontecimentos da vida real”. Silva e Menezes (2001, p. 22), define necessário o estudo de caso “quando envolve o estudo profundo e exaustivo de um ou pouco objetos de maneira que se permita o seu amplo e detalhado conhecimento”. Como afirma Yin (2005, p. 109) “as evidências para um estudo de caso podem vir de seis fontes distintas: documentos, registros em arquivo, entrevistas, observação direta, observação participante e artefatos físicos.” As estratégias de coleta de dados utilizadas nesta pesquisa foram documentação, entrevista e observação.

4.2 TANLAN - DO INDEPENDENTE À CONTRATAÇÃO PELA SONY MUSIC

A banda gaúcha, de Porto Alegre, surgiu de uma ideia fomentada pelos irmãos Tiago e Fernando Garros, nos anos 90, que a compartilharam com o pernambucano recém-chegado de Manaus em 2001, Fábio Sampaio, e com Beto Reinke, amigo do contexto cristão de Fernando. A ideia e a inquietação trazidas


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pelos irmãos Garros, bateu forte no coração de Fábio e Beto: “Por que o cristianismo que os unia parecia tão desconexo do mundo em que viviam? Será que o cristianismo poderia não ter nada a dizer para o ‘mundo real’?” (BANDA, 2014). Partiram, então, para um projeto acústico e despretensioso que ganhou certa notoriedade pela sonoridade e pelas composições sem linguagem comum no meio evangélico, porém ainda não viam as respostas para as inquietações iniciais. Somente após um ano de ensaios, discussões, ajustes no discurso, composições é que conseguiram amadurecer a ideia embrionária “de fazer música que pudesse ser relevante e comunicável tanto a gregos como a troianos” (BANDA, 2014). Figura 9 – Banda Tanlan 2010

Fonte: Flickr Banda Tanlan (2014)

Assim, em 2004, forma-se oficialmente a Tanlan. Apesar de muito aperfeiçoarem e afinarem a ideia de seu discurso, muitas vezes é identificada como uma banda de rock cristão ou rock gospel, mas prefere não ser rotulada dessa forma e diz apenas ser uma banda formada por integrantes cristãos, mas que produz canções para públicos diversos. A banda afirma ter como referências e influências, sons como Muse, Switchfoot, Foo fighters, Doves, As Tall as Lions. A fim de romper com alguns conceitos, a Tanlan, defensora da mentalidade antissectária, busca sair das paredes dos templos e, de alguma forma comunicar-se com a cultura. Perceberam que isso não só era viável como também uma crescente tendência que ganhava seguidores por todo Brasil.


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Em 2005, a banda gravou seu primeiro EP e foi muito bem aceito, inclusive nas rádios seculares, expandindo, assim o público de ouvintes e fãs. Logo, o EP, que tinha quatro músicas, uniu-se a outras oito que constituíram o primeiro cd da Tanlan, intitulado Tudo Que Eu Queria, em 2008, capa conforme Figura 10. O show de lançamento desse cd, de forma aparentemente improvável, foi realizado no Porão do Beco, casa de shows de rock alternativo de Porto Alegre, reforçando sua intenção de romper os limites entre o gospel e o secular. Figura 10 – Capa Cd Tudo Que Eu Queria

Fonte: Banda Tanlan (2008)

Esse primeiro álbum da banda foi incluso como um dos 15 melhores de 2008 em Porto Alegre pelo blog Volume do ClicRBS. Muito elogiado pela crítica, também ganhou review extremamente positivo na revista especializada no universo musical, a Noize. De forma totalmente independente, a banda divulgou esse trabalho durante quatro anos, com shows no interior do RS, Santa Catarina, Paraná, São Paulo, Brasília e até no Maranhão, sendo que a trajetória incluiu organizações religiosas e também bares, universidades, colégios e festivais. Em setembro de 2012, a Tanlan lançou seu segundo álbum Um Dia A Mais, cuja capa consta na Figura 11, produzido de forma independente, gravado e mixado pelo vocalista Fábio Sampaio e masterizado pelo estúdio Sterling Sound, de Nova Iorque, Estados Unidos. Lançado virtualmente no Soundcloud, o álbum alcançou mais de 60 mil “plays” em menos de um mês, o que atraiu a atenção da gravadora Sony Music que veio a assinar com a banda em outubro de 2012.


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Figura 11 – Cd Um Dia A Mais

Fonte: Banda Tanlan (2012)

4.2.1 Sobre a marca da Banda

O nome da Banda é motivo de curiosidade para quem se depara com ele pela primeira vez, afinal, não deixa pistas óbvias sobre o estilo musical dela. Tanlan é o nome, em chinês, do inseto que, aqui no Brasil, é conhecido como louva-a-deus e é também o nome de um estilo de kung fu que se baseia nos movimentos do inseto. Segundo Fábio Sampaio (ENTREVISTA, 2014), a banda adotou o nome por simpatizar com essa simbologia e também pela sonoridade. Perante observação de diversos materiais da Banda Tanlan, fica evidente certa instabilidade na aplicação do logotipo. Há diversas versões sendo utilizadas, parecendo não ter uma identidade oficial determinada, conforme podemos ver na Figura 12. Ao ser questionada sobre essa constatação, a Banda assume não possuir uma logotipia definida e credita isso ao viés crítico dos integrantes, que não encontram em uma só imagem a identidade gráfica que a represente. Sampaio afirma ainda que a identidade gráfica da Banda ganha um novo conceito, afinado com cada novo trabalho, mas certifica a aspiração por uma marca “mais pensada e atemporal” (APÊNDICE A).


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Figura 12 – Variações no Logotipo da Banda

Fonte: Elaborado pela autora

4.3 SHOWS E EVENTOS – O CONTATO DIRETO COM O PUBLICO

Durante os dez anos de existência da banda Tanlan, muitos foram os eventos, shows, programas e festivais em que ela esteve presente para tocar sua música e divulgar seus trabalhos e ideias. Na opinião dessa autora, esses momentos são de grande importância, pois é nesse ambiente que se faz a conexão banda-fã de uma forma mais profunda, onde a performance de palco agrega à construção da imagem da banda junto ao público e onde a banda pode comunicar sua mensagem sem necessidade de veículos intermediários. Apresentaremos, a seguir, alguns eventos que foram significativos na história da Banda Tanlan. 4.3.1 Programa Radar – TVE

A Banda Tanlan esteve no programa Radar da TVE, a emissora gaúcha, no dia 9 de janeiro de 2008, onde tocou músicas do seu primeiro cd e divulgou sua agenda de shows, vide Figura 13. Na época, a banda estava envolvida no projeto Rock Start Bandas Independentes, que reunia bandas de rock independentes no


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Revolution Pub Bar, na Cidade Baixa, em Porto Alegre. Além de divulgar o projeto, na ocasião a banda também anunciou um show que veio a realizar no Manara Bar, juntamente com outra banda de rock, a Culpados Inocentes, de acordo com o site Rock Gaúcho (2014). Figura 13 – Participação da Banda Tanlan do Programa Radar

Fonte: Elaborado pela autora com base YouTube Canal TanlanTv (2014).

No programa, a banda tocou duas músicas inclusas no cd: Aonde Vou e Aprender. Como as demais composições do álbum, as letras seguem a linha de pensamento baseada no conceito da banda e revelam as características inerentes à contracultura gospel. Aprender Coloque a culpa na história Nos erros que o passado cometeu Coloque a culpa nos reis de agora Coloque a culpa no estado Ou mesmo em tudo que é religião Coloque a culpa no caos do acaso Tanta gente já morreu Sem nunca viver E a razão já se perdeu Sem nunca saber Quando vamos aceitar Todos temos tanto pra melhorar Quando vamos entender Antes de mudar Temos que aprender Alguém me mostre um alívio Vivemos numa grande confusão Como acabar com um problema antigo Não sabemos nem viver


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Nada é o que parece ser Não sabemos nem porque Matar ou morrer Quando vamos aceitar Todos temos tanto pra melhorar Quando vamos entender Antes de mudar Temos que aprender a amar Fonte: http://letras.mus.br/tanlan/1134310/ (2014)

4.3.2 Pop Rock + Coca Cola Zero

O projeto Pop Rock + Coca-Cola Zero na Trensurb, promovido pela Pop Rock, rádio FM gaúcha, aconteceu nas estações Farrapos/IPA, São Luis/Ulbra, Unisinos e São Leopoldo da Trensurb, e tinha como foco o público jovem que se dirige para as universidades da região. O projeto apresentava bandas do cenário independente local, com show de entrada franca que fazia parte de uma programação especial nas quintas-feiras, quando também eram oferecidas degustações do refrigerante Coca-Cola Zero. Figura 14 – Banda Tanlan no Projeto Pop Rock

Fonte: Elaborado pela autora com base no Fotolog da Banda Tanlan

Além da participação nesse projeto, conforme Figura 14, a Tanlan também participou do programa Cafezinho, da mesma Rádio. Abordando fatos da atualidade comportamento e música com muito bom humor, era o programa de maior audiência da Pop Rock e, abriu espaço para que a banda divulgasse seu trabalho. Inclusive,


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as músicas do primeiro cd da banda tocavam com frequência na programação da rádio, conforme informa o Fotolog (2014) da Tanlan.

4.3.3 Show de Lançamento Cd Um Dia A Mais

Realizado no Teatro do Ciee, em Porto Alegre, com público que lotou o espaço, o show de lançamento do cd Um Dia A Mais da Tanlan aconteceu em 31 de outubro 2012. O evento soma às evidências da presente pesquisa como observação participativa realizada pela autora desse estudo. Produzido pela Selo Produções, o show teve ingressos vendidos por um preço bem razoável, conforme consta no ingresso Figura 15, para tornar a aquisição bem acessível a todos que desejassem participar. Foi notável, durante a execução do show, a atmosfera íntima da banda com a plateia, que, em grande parte, era formada por família, amigos e parceiros de igreja dos integrantes, o que revelava característica de banda independente. Figura 15 – Ingresso Show de Lançamento Cd Um Dia A Mais

Fonte: Elaborado pela autora com base em arquivo pessoal

Dentre as músicas que foram tocadas na ocasião, uma delas, chamada Vaidade, teve participação do compositor, produtor musical e arranjador gaúcho Arthur de Faria, conforme registro fotográfico apresentado na Figura 16, que adicionou a musicalidade de sua gaita ao arranjo da música que, segundo o vocalista Fábio Sampaio (ENTREVISTA, 2014), é, atualmente, uma das canções mais pedidas nos shows pelo país.


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Faria havia se pronunciado alguns dias antes do show, em sua página no Facebook, sobre sua reação ao primeiro contato dele com o, então novo, trabalho da Tanlan, conforme relata: [...] Eu já tinha simpatizado com o primeiro CD. Mas aí, quando dei o play na primeira música, no carro, o queixo do produtor fonográfico dentro de mim caiu e só levantou no final da faixa. Os caras tiraram um som assombrosamente bom, como poucas vezes (põe poucas nisso) eu ouvi em discos de rock gravados no Rio Grande do Sul [...]. (FARIA, 2012).

Figura 16 – Participação de Arthur de Faria no Show de Lançamento do Cd Um Dia A Mais

Fonte: Flickr da Banda Tanlan (2014) Vaidade Sou a criança que chorou logo ao nascer O velho homem que morreu sem perceber Eu sou o pó que se levanta de manhã e à noite, se foi Sou a vontade incontrolável de chorar A liberdade indesejável de errar Eu sou um pouco menos do que eu quero E muito mais do que não Sou o desejo incorrigível de sorrir A busca tão indiscutível por sentir Um incompleto irresponsável Pronto pra te dizer sim Um hábito inútil, sem sentido, um vapor Um indiscreto transitório, um louco sem pudor


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Mas a vida ainda vale a pena A vida ainda vale a pena Eu sou o livro cuja capa não se pode ler A dor e toda graça do que é viver Eu sou o que sobrou de uma lembrança A arrogância de ser Sou egoísta e tento te dizer que não O meu cinismo só revela a omissão De quem assiste a um desfile triste Um clichê em vão A vaidade das vaidades, um vazio sem fim A busca da realidade é o que me trouxe aqui Fonte: http://letras.mus.br/tanlan/vaidade/ (2014)

O momento de maior surpresa no show foi, com certeza, o encerramento, quando foi anunciada a contratação da banda pela Sony Music. O anúncio se deu através de um vídeo feito pelo diretor da Sony, Maurício Soares, que estaria no local para dar a notícia, mas, por um imprevisto, não conseguiu estar no palco. Assim que Soares comunicou a contratação, uma grande emoção tomou conta da banda e do público que, como citado anteriormente, apresentava um vínculo próximo com os integrantes. O show foi finalizado nessa vibração de toda plateia e um discurso do vocalista em agradecimento a oportunidade que recém havia sido lançada.

4.3.4 Abertura show Thalles Roberto

Já como parte do cast da Sony, a Tanlan abriu o show de um dos maiores artistas gospel da atualidade, o Thalles Roberto, vide Figura 17 com cartaz do evento. O show aconteceu em março de 2013 e lotou a casa de shows Pepsi On Stage, em Porto Alegre. Aqui percebemos a interação da banda com o meio gospel, mesmo mantendo um discurso crossover, a banda é muito bem recebida no meio e esse evento, além de fortificar essa relação com o público gospel, também propiciou uma grande visibilidade para o público no geral. O show gerou divulgação em muitas mídias, cobertura em vários canais de comunicação e arrecadou muitos quilos de alimento que foram doados a entidades assistenciais.


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Figura 17 – Divulgação Show Thalles Roberto em Porto Alegre

Fonte: Site Milsons (2014)

4.3.5 Selo Rock Festival

Em evento promovido pela Selo Produções, no Bar Opinião, em Porto Alegre, o Selo Rock Festival realizou-se dia 24 de agosto de 2013. O show contou com um público de aproximadamente 700 pessoas, conforme informação cedida pelo empresário da banda, Oziel Alves (2014), por email. O evento trouxe pela primeira vez ao Rio Grande do Sul a banda Palavrantiga, de Minas Gerais, cujo vocalista, Marcos Almeida, também fez algumas participações no vocal na apresentação da Tanlan, conforme registro da Figura 18. Palavrantiga, banda que compartilha das mesmas ideias contraculturais da Tanlan, divulgou seu cd, lançado pela Som Livre, Sobre o Mesmo Chão, e a Tanlan seu álbum Um Dia A Mais. Na ocasião Fábio Sampaio, vocalista da Tanlan disse à Zero Hora: “dividir o palco com a Palavrantiga anima a trabalhar mais e juntos ‘por uma nova música produzida por cristãos no Brasil’” (ZH, 2014).


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Figura 18 – Selo Rock Festival. Tanlan e Palavrantiga

Fonte: YouTube - Frame Canal da Banda Tanlan (2014)

4.3.6 Estação ZH

Como uma ação que faz parte um cronograma comemorativo aos 50 anos da Zero Hora, jornal gaúcho, a Estação ZH é uma estrutura itinerante que conta com uma agenda de atrações, entre elas, atividades recreativas e esportistas, bate-papos com jornalistas e shows. E é nessa estrutura montada no Parque Moinhos de Vento, dia 05 de outubro de 2014, que a Tanlan fez seu show e tocou músicas de seus dois CDs e também uma música nova, que a plateia cantou, ensinada pelo vocalista Fábio. Figura 19 – Divulgação na Página do Facebook da Estação ZH


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Fonte: Fanpage da Estação ZH (2014)

O evento teve programação publicada pela Zero Hora e também nas redes sociais do veículo de comunicação, como podemos verificar na Figura 19. 4.4 MÍDIA ESPONTÂNEA EM PUBLICAÇÕES

A banda Tanlan gerou algumas matérias em que foi citada como revolucionária entre o meio evangélico, além de ter seu trabalho elogiado pela crítica especializada e ser apontada excelente referência de banda de rock nacional. Vejamos algumas dessas aparições.

4.4.1 Revista Noize

Em julho de 2008, a edição #15 da Revista Noize, revista gaúcha que é distribuída gratuitamente por todo o país, apresenta a Banda Tanlan como uma promessa no cenário pop rock nacional. O periódico, que traz em suas edições novidades da música indie mundial e boas indicações de artistas da cena independente brasileira (MEIO, 2012), faz uma análise positiva do cd Tudo Que Eu Queria, elogiando o capricho na produção do álbum e as boas letras das canções, conforme Figura 20.


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Figura 20 – Tanlan na Revista Noize #15

Fonte: Issuu (2014)

4.4.2 Revista Época

Em uma matéria de capa intitulada Os Novos Evangélicos, de 9 de agosto de 2010, a Revista Época, publicação semanal da Editora Globo, fala sobre os novos rumos da Igreja evangélica no Brasil. Na reportagem chamada A Nova Reforma Protestante, publicada na versão impressa e online da Revista, Ricardo Alexandre

(2010)

fala

do

raciocínio

antissectário

que

caracteriza

alguns

posicionamentos ativos no meio evangélico atual e de como esse pensamento se espalhou para o campo da música. É nesse trecho que o autor cita a banda: “Nomes como Palavrantiga, Crombie, Tanlan, Eduardo Mano, Helvio Sodré e Lucas Souza se definem apenas como ‘música feita por cristãos’, não mais como ‘gospel’. Eles rompem os limites entre os mercados evangélico e pop” (ALEXANDRE, 2010). Figura 21 – Capa Revista Época


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Fonte: Site Evangelismo e Louvor (2014)

4.4.3 Revista Billboard Brasil

Em matéria nomeada Fora da Caixa, em alusão à forma de pensar dos novos artistas cristãos, a Revista Billboard Brasil, publicação que é referência mundial no cenário da música, insere a Banda Tanlan como parte do novo contexto da música cristã brasileira. O texto destaca a capacidade de transcendência da Banda, que encara palcos de bares alternativos e altares de igrejas sem alterar seu discurso e sua proposta artístico-musical. A publicação ainda inserta falas de Fernando Garros, baterista da Tanlan, e de Marcelo Soares, diretor geral da Som Livre, que compartilha das ideias de transcendência entre “secular” e “religioso”, e afirma que “a diversidade e a qualidade na música religiosa são muito grandes [...] e com o tempo, esses artistas de alta qualidade tendem a conquistar novos terrenos e novos públicos, sem perder a honestidade de sua mensagem” (ALBUQUERQUE, 2012).


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Figura 22 – Banda Tanlan na Billboard Brasil

Fonte: Issuu (2014)

4.5 ALGUMAS INTERAÇÕES COM ARTISTAS E EVENTOS DO MOVIMENTO PÓS-GOSPEL

É natural que o pensamento comum e o partilhar de convicções sobre os rumos da música cristã brasileira, gere identificação entre artistas do movimento. Isso se confirma na junção dos mesmos em eventos e participações especiais nos CDs uns dos outros. A fortificação de laços entre esses artistas, ajuda na formação da cena musical com a qual sonham, conforme Fábio Sampaio (ABREU, 2014), “uma cena só existe quando aqueles que participam dela se comunicam, trocam experiências e provoquem uns aos outros”. No caso da Banda Tanlan, já apresentamos anteriormente o Selo Rock Festival, que é um exemplo dessa interação, onde a banda Palavrantiga uniu-se à Tanlan num único show apresentado no Bar Opinião, em Porto Alegre. Ainda sobre a ligação com o Palavrantiga, Marcos Almeida, vocalista da banda, gravou participação especial, em 2012, no segundo cd da Tanlan, onde canta a canção Vaidade juntamente com Sampaio (Figura 23). Figura 23 – Marcos Almeida e Fábio Sampaio em estúdio para gravação de Vaidade


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Fonte: Flickr Banda Tanlan (2012)

Levantaremos a seguir, alguns outros eventos em que houve esse diálogo da Tanlan com demais adeptos do movimento pós-gospel, o que intensifica seu posicionamento e reforça seu discurso em relação à música.

4.5.1 Semana de Arte Cristã

A Semana de Arte Cristã é um movimento que acontece anualmente durante o mês de julho e se trata de um encontro de artistas cristãos que discutem e apresentam sua arte. A edição de 2013, na qual a Banda Tanlan esteve presente, aconteceu de 9 a 13 de julho, em São Paulo, no Espaço Super Nova, e contou com a participação de centenas de pessoas. O Espaço Super Nova é um projeto da ONG Super Nova Cultura que “tem a missão de ser um lugar onde toda a programação desenvolvida leve a sociedade a interagir, questionar e propor soluções para suas necessidades e aspirações, focando sempre em transformação social e a espiritualidade” (GOSPEL, 2014). Além da Tanlan, o encontro reuniu artistas como Oficina G3, Leonardo Gonçalves, Melk Vilar, Bruno Branco, Tiago Grulha, Marcela Taís, João Alexandre, Daniela Araújo, Alexandre Aposan, Lito Atalaia entre outros, vide figura 24 com a divulgação online do evento. Na ocasião, o cantor e compositor João Alexandre expressou sua definição sobre arte aliada à religiosidade: A arte em si já é uma ferramenta poderosa. Quando bem feita, toda


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arte é bonita, imagina isso na mão de cristãos, na mão de quem tem o que dizer. Não dá pra negar que isso é uma ferramenta forte para atingir o coração das pessoas. Arte é criar, então Deus é o maior artista de todos os tempos, Ele criou tudo. A diferença entre cristãos e não cristãos é que nós fazemos a arte para quem é digno de toda a glória. (SIMIONI, 2013)

Figura 24 – Divulgação da Semana de Arte Cristã

Fonte: Portal GuiaMe (2013)

4.5.2 Rock no Vale

Evento que acontece em Arujá, São Paulo, o Rock no Vale promove um encontro que une rock, evangelho e sustentabilidade. A Missão Jovens da Verdade, que organiza o evento, o realiza convicta de que ele atende à uma necessidade dessa geração. Para Alexandre (2010), o antissectarismo torna os evangélicos mais sensíveis a ações sociais e essa iniciativa é uma evidência disso. A banda Tanlan esteve presente no evento que aconteceu em dezembro de 2013 que, além de música, também contou com vários palestrantes e ONGs especialistas e militantes em sustentabilidade.


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Figura 25 – Banda Tanlan no Rock no Vale

Fonte: Elaborado pela autora com imagens do Flickr da Banda Tanlan e site oficial do Rock no Vale

4.6 REDES SOCIAIS

Por ter um público jovem e entender o valor de uma boa comunicação, a Banda Tanlan está presente nas principais redes sociais e faz delas um canal para promover seu trabalho, divulgar sua agenda, registrar sua rotina, e firmar vínculo com seu público. De acordo com o vocalista Fábio Sampaio, “um artista que não se comunica não é relevante [...] Precisamos falar a língua da nossa época e é isso que gera comunicação relevante com a cultura” (ABREU, 2014). Conforme entrevista (APÊNDICE A), Fábio afirma que a manutenção dos canais e criação de conteúdo é feita pelos integrantes da Banda, sendo principalmente por ele e por Fernando Garros, que, tendo firmado critérios com todos os integrantes, respondem e falam em nome da Banda nas plataformas. Veremos a seguir algumas postagens da Banda nas redes sociais. Figura 26 – Post em Fanpage sobre patrocínio da Multisom para o Show de Lançamento do cd Um Dia A Mais


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Fonte: Fanpage Banda Tanlan (2014)

Postagens de cunho comercial, como o exemplo da Figura 26, são percebidos nas páginas oficiais da Tanlan nas redes sociais, porém, estão bem menos em evidência, se comparados às postagens de outras naturezas, levando em conta a quantidade de posts. A divulgação de marcas associadas ao nome da Banda é importante, sobretudo, para as marcas que investem na música dela, afinal, esse é o objetivo do patrocínio. Interagir com os fãs da página é o objetivo maior da presença da Tanlan nas redes sociais. Para isso, postagens com mensagens aos seguidores é algo que integra artista e público, como vemos na Figura 27, onde a Tanlan agradece aos fãs de sua página no Facebook pelos vinte e cinco mil likes. Figura 27 – Post Fanpage em agradecimento aos likes


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Fonte: Fanpage da Banda Tanlan (2014)

A interação das redes sociais permite que, não apenas os canais oficiais da Tanlan falem sobre ela, mas que o público, e até mesmo outras personalidades, citem seu nome e o joguem na imensidão da rede virtual. No caso da Figura 28, o diretor geral da Sony Music, Maurício Soares, compartilha em seu perfil no Instagram, uma opinião pessoal sobre o cd Um Dia A Mais, da Tanlan. Figura 28 – Menção de Tanlan no Instagram de Maurício Soares

Fonte: Elaborado pela autora baseado em Instagram de Maurício Soares (2014)


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Conforme sinalização numérica adicionada pela autora na Figura 28, passamos a identificar as interações presentes nessa postagem, a começar pela descrição da foto postada por Soares (1). Ali ele usa diversos adjetivos para elogiar o projeto da Tanlan, referindo-se ao cd registrado na foto e ainda convida aos que nunca ouviram a Banda, a conhecê-la. No primeiro comentário do post (2), um usuário da rede segue elogiando a Banda e opina que ela deveria fazer parte do cast da Sony Music, sem limitá-la ao selo gospel. Em seguida, Fábio Sampaio, em nome da Banda, se manifesta em um segundo comentário (3) agradecido e honrado pelo reconhecimento de Soares, que, abaixo, responde ao vocalista (4), reiterando seu positivo e sincero pensamento sobre o trabalho. É perceptível ainda, entre os canais sociais da Tanlan na internet, postagens de interação direta com fãs, onde a Banda responde dúvidas, compartilha/retwitta imagens e postagens em que são marcados ou tem trecho de suas canções. O uso de linguagem informal e espirituosa nesses diálogos virtuais, conforme percebemos na Figura 29, também é frequente e pertinente junto ao público jovem. Figura 29 – Interação com fã via Twitter

Fonte: Twitter Banda Tanlan (2014)

De acordo com entrevista (APÊNDICE A), Fábio Sampaio afirma que a banda vibra quando percebe o aumento de conteúdo digital compartilhado nas redes sociais, porém reconhece que a Banda Tanlan poderia possuir uma fanbased maior, caso houvesse mais dedicação para criar conteúdos relevantes, inclusive com estratégias promocionais.

4.7 Plataformas digitais

Acompanhando as transformações do mercado fonográfico e a tendência mercadológica de consumo cultural através da internet, a Banda Tanlan está


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presente em diversas plataformas digitais e serviços de streaming de música, como iTunes, Rdio, Deezer e Spotify. Uma considerável ação feita pela banda através das plataformas digitais foi o lançamento do single É Natal, em dezembro de 2013, vide capa na figura 30. A canção que foi considerada, pelo jornalista e crítico musical Ricardo Alexandre, uma das 10 melhores canções de Natal para fugir do comum (GOSPEL, 2013). Figura 30 – Capa single É Natal

Fonte: Plataforma Rdio (2013)

Um clipe, contendo imagens da sessão de produção do single em estúdio e de

making

of,

foi publicado

no

canal

da

Banda

na

plataforma

Vevo.

Simultaneamente, o single foi disponibilizado para compra no iTunes, Deezer, Rdio e Music Unlimited e os valores obtidos com a venda da música, foram revertidos para o Lar Restaurar, uma entidade assistencial que abriga crianças em situação de risco na Grande Porto Alegre. O apelo da Tanlan foi para que não se fizesse o download de forma ilegal, mas se aproveitasse a oportunidade de oferecer “um Natal com mais dignidade e amor para quem precisa” (GOSPEL, 2013). É Natal Uma noite feliz Que se canta ao luar Muitos dias de paz


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Se espera alcançar São mil braços abertos para abraçar Corações prontos pra amar É natal Lála, lálala, lála Filhos voltam pra casa Pais que pedem perdão Não existem migalhas Pra quem já tem o pão Uma criança sorriu pra mim Ao canto de anjos sem fim Fonte: http://profetirando.com.br/tanlan-e-natal/ (2014)


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5 ANÁLISE

Este capítulo tem como objetivo apresentar e analisar as informações obtidas através da técnica de pesquisa entrevista por email, a qual foi respondida por Fábio Sampaio, vocalista da Banda Tanlan. Para tanto, passaremos a transcorrer sobre o processo de aplicação do questionário, apresentando um relato da autora desde o primeiro contato com o responsável até o envio das respostas, passando pela exposição e análise das questões.

5.1 CONTATO COM A BANDA

A escolha do objeto de pesquisa se deu de forma natural, por já conhecer a Banda Tanlan, e reconhecer nela um discurso inovador em meio ao universo da música evangélica. Além disso, o fato da Banda ser de Porto Alegre, também contou, pois a proximidade geográfica facilitaria o contato. Por estar ligada ao Fábio Sampaio através das redes sociais, a autora acreditou que esse seria o melhor meio de fazer o primeiro contato, porém, por não julgar de caráter profissional a troca de informações relevantes nessa plataforma, escolheu apenas fazer o contato solicitando seu endereço de email, aproveitando para explicar os motivos de sua solicitação, no dia 13 de setembro de 2014. Em menos de 24 horas, Fábio respondeu ao contato, mostrando-se muito interessado em colaborar. Assim, obteve-se seu email e redigiu-se, então, sobre a proposta de pesquisa e da vontade da autora de utilizar a banda Tanlan como o objeto de análise da mesma. Tendo passado aproximadamente um mês, a autora encontrou-se com Sampaio em um show da Lorena Chaves, no dia 17 de outubro, em Porto Alegre, artista que também é da nova geração da música cristã brasileira. Nesse contato pessoal, conversou-se sobre a melhor forma de realizar a entrevista, tendo ficado combinado que se faria necessária a aplicação de questionário por email, pois a Banda viajaria no outro dia para uma sequência de shows no nordeste, retornando após 10 dias, o que atrasaria muito o andamento do trabalho. Dessa forma, o questionário foi enviado para Fábio Sampaio no dia 18 de outubro e retornou para a pesquisadora, respondido, no dia 27 de outubro.


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5.2 SOBRE O QUESTIONÁRIO

O questionário (ver APÊNDICE A) consistiu em uma relação de questões formuladas a fim de serem respondidas por Fábio Sampaio por email. Como foi enviado pela internet e a pesquisadora não estava presente no momento do preenchimento das questões, isso implicou em um maior cuidado na elaboração dessas questões, além de serem autoexplicativas precisaram ser de fácil entendimento, pensando que o entrevistado não teria como dirimir suas dúvidas no ato da resposta. A primeira parte das questões deteve-se sobre ser ou não ser gospel, a segunda parte das questões enquadra o cenário da Banda pós contratação da Sony Music e a terceira parte das questões aborda sobre publicidade convencional e online.

5.3 ANÁLISE DO QUESTIONÁRIO

A primeira parte das questões aborda sobre o ser ou não ser gospel. Ao abordarmos sobre a filosofia da banda e em que gênero sua música se encaixa, Sampaio (2014) afirma que a banda tem como proposta, desde sua concepção ser uma “banda de rock”, sem prender-se a subgêneros ou um determinado segmento. O entrevistado identifica a Tanlan como uma banda “que se comunica com quem se interessar pelo seu som, independente de ideologia ou fé”. Declara ainda que, pelo fato de todos os integrantes serem cristãos evangélicos e a banda ter seu trabalho conhecido nesse meio, faz com que sejam classificados como uma banda do gênero gospel, mas Sampaio (2014) nega essa classificação, pois entende que o fato de suas letras serem escritas sob uma perspectiva cristã, não é motivo suficiente para categorizar sua música como religiosa. Essa afirmação de Sampaio (2014), vai ao encontro de Almeida, do projeto Nossa Brasilidade, que se posiciona da seguinte forma: “[...] não acreditamos que a fé é um ato restritivo que nos tira da cultura [...]” (FERNANDES, 2014). Pelo


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pensamento de ambos, a fé não limita o artista a viver ou executar sua arte apenas no aspecto religioso. Quanto ao público não-cristão ou “secular”, o entrevistado diz que esse não sinaliza a pretensão de rotular a música da banda, mas se atrai por ela simplesmente pelos aspectos estéticos que ela apresenta. E continua a afirmação: “Se eles gostam, é porque a música se comunica com eles de alguma forma. E tudo isso passa pela maneira como compomos e entendemos nosso projeto”. Essa declaração está de acordo com o crítico cultural Hans Rookmaaker (2010, p. 39), que afirma que “trabalhar como cristão não é fazer uma arte e adicionar um complemento, o elemento cristão”. O autor explica sobre isso de uma forma metafórica: A melhor comparação talvez seja com um encanamento. Embora ele seja algo totalmente indispensável em nossas casas, raramente nos damos conta de sua existência. Similarmente, a arte tem uma função importante em nossa vida, ao criar a atmosfera na qual vivemos, ao nos dar as palavras para falar e ao nos oferecer a estrutura na qual podemos absorver as coisas sem sequer notarmos. (ROOKMAAKER, 2010, p. 38).

A afirmativa de Rookmaaker (2010) associa-se ainda com a declaração de Sampaio (2014) ao ser indagado sobre a existência de alguma evidência na banda quanto à sua fé professada. “Nossa fé evidencia em nossos relacionamentos. Não paramos nossos shows para fazer uma pregação, ou algo do tipo (exceto quando tocamos em igrejas e os organizadores nos pedem isso). Quando estamos no palco, estamos ali para fazer o nosso show, mas quando estamos fora dele, estamos ali para nos relacionarmos e vivermos o cristianismo como um todo.” Ao questionarmos a Tanlan sobre a existência de algum episódio que tenha impactado a banda, em que a fé tenha feito diferença através da música ou da postura da banda, Sampaio (2014) afirma que existem algumas dessas histórias, mas uma delas em especial. O entrevistado, então, relata o acontecido: “Há alguns anos fomos contratados para fazer dois shows na maior casa de rock de São Luís, no Maranhão. O contratante não sabia nada sobre nossa fé. Nos chamou porque havia gostado das músicas e toda a equipe


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do bar também. Ao terminarmos o show, na primeira noite, ele veio nos encontrar muito contente e satisfeito com o que havia visto e ouvido. Durante a conversa com nosso produtor, que nos contou tudo depois, comentou que pouco antes de chegarmos para o show havia feito uma pesquisa no Google sobre a gente e ficou intrigado com a quantidade de artigos que nos relacionava ao universo evangélico. Então, perguntou: vocês são de igreja? (sic). Nosso produtor respondeu que sim e iniciou uma conversa sobre o que ele achava disso.”

Faremos uma pausa no relato para analisar algo relevante nessa primeira parte. O dono do bar onde a Tanlan se apresentava, ao desejar saber mais sobre ela, utilizou-se da internet para buscar informações. Percebemos aqui a valia de marcar presença no ambiente virtual, seja através das redes sociais, site ou artigos relacionados, como foi nesse caso. Sem essas referências, fica mais difícil, na cultura corrente, criar sua identidade junto ao público. Segundo Soares (2014), é fundamental que o artista tenha conteúdos digitais de qualidade e relevância. Além disso, todas as informações disponibilizadas para acesso do público, tanto sobre a banda, quanto sobre suas músicas, agregam valor à sua identidade. Conforme Junior e Nogueira (2010), as transformações da cultura auditiva dadas pelos avanços tecnológicos “apontam para uma potencial transformação do entorno comunicacional da música, o que se reflete nas próprias características dos julgamentos de valor sobre a música.” (JUNIOR; NOGUEIRA, 2010, p. 223). Seguiremos o relato do entrevistado: “Entre outras coisas, ele disse que jamais podia esperar algo assim vindo de ‘crentes’, pois, segundo ele, um crente jamais poderia fazer algo que ele pudesse gostar”. Assim que o proprietário do bar constatou a ligação da banda com o universo evangélico, imediatamente associou a música da banda à linguagem “de igreja” ou à cultura gospel, e, baseado em um preconceito - aqui com ênfase em um conceito sem conhecimento – se viu surpreendido por apreciar o som. Esse preconceito tem a ver com o rótulo que se dispõe, nesse caso especificamente sobre os evangélicos, e, de acordo com Baggio (2005) essa rotulação corre o risco de reverter-se de forma negativa no processo de identificação.


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Isso [rotulação] pode parecer bom a princípio, [...] mas logo se torna negativo, porque gera uma tendência de se criarem círculos fechados e rotular as pessoas ou coisas como fazendo ou não parte dele. Dessa forma, corre-se o risco de reverter os aspectos positivos da identificação e contextualização da mensagem. (BAGGIO, 2005, p. 139).

A negação do dono da casa em aceitar que havia gostado de uma música feita por evangélicos reflete a posição em que ele se coloca: se não sou evangélico, logo, não posso gostar de algo evangélico. O que nos leva a concordar com Xavier, que afirma: “Quando apreciamos a obra de um artista, estamos comungando seu ponto de vista, nos alimentando de seus sentimentos.” (XAVIER, 2007, p. 70). Prosseguiremos no relato de Sampaio: “Outra coisa que chamou muito a atenção dele, foi o fato de cumprirmos todos os horários combinados, de não termos enchido a cara no bar (a bebida era liberada para a banda) e nem ficado assediando as meninas da casa ou do público. Depois disso, ele ficou tão impactado com seu próprio preconceito ruindo diante de seus olhos, que nos convidou para voltarmos no ano seguinte para a festa de aniversário do Bar”. Nessa narrativa, percebemos que o comportamento dos integrantes da banda comunicou, de forma impactante, a fé cultivada por eles, muito mais do que as letras das canções, que nem sequer deram pistas sobre a natureza religiosa do quarteto. Nisso, relembramos a afirmação de Green sobre a identidade do artista cristão: “O mundo está cansado de dizeres religiosos... Eles querem ver o Evangelho sendo vivido e nós, cristãos, temos de nos conscientizar de nossa responsabilidade de mostrar-lhes esta vida.” (apud BAGGIO, 2005, p. 76). O conflito entre o conceito sobre os evangélicos e a sensação agradável da experiência do show da Tanlan, pareciam não combinar para o empresário de São Luís. Porém, a qualidade da música da banda sobrepujou qualquer pensamento negativo inicial, fazendo-o descartar qualquer rótulo ou julgamento. Sendo assim, a música e a postura da Tanlan, no palco e fora dele, funcionou, nesse episódio, como um canal que comunicou sua filosofia, sem levantar uma palavra sequer sobre o que acreditavam. Isso vai ao encontro de Rookmaaker que afirma que “a comunicação e a forma são as duas facetas, as duas qualidades da arte. A comunicação acontece sempre por meio da forma, e a forma sempre comunica valores e significados.” (ROOKMAAKER, 2010, p. 49).


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Esse impulso por rotulação da arte, que reflete, muitas vezes em conceitos predefinidos, não ocorre apenas no cenário não-cristão, mas o contrário também é fato na rotina da Tanlan. É o que Sampaio (2014) afirma quando quisemos saber se a banda já vivenciou alguma resistência ou crítica no meio evangélico por não assumirem um rótulo gospel, mesmo sendo, os integrantes todos cristãos evangélicos. Entretanto, o entrevistado assegura que isso ocorre, geralmente, quando não existe conhecimento ou aproximação em relação à proposta da banda, o que, segundo ele, se esclarece com um bom diálogo. A segunda parte do questionário levantou questões referentes ao cenário da banda pós-contratação pela gravadora Sony Music, que aconteceu em outubro de 2012. Quando perguntamos à banda sobre qual ela pensava ser o diferencial que a salientou perante a visão da Sony Music, Sampaio (2014) afirma: “A Tanlan nasceu com o propósito de ser uma banda formada por cristãos acessível a todos. E acredito que a possibilidade de ter uma banda que alcançasse dois mercados, ao mesmo tempo sem criar barreiras entre eles, foi o que mais chamou a atenção da gravadora. Sem falar no fato de que a gravadora decidiu apostar num movimento de bandas e artistas cristãos que se propõem em fazer arte e não uma música proselitista”. O que poderia ser considerado um problema, tornou-se oportunidade aos olhos da gravadora. A não classificação de segmento da Tanlan junto ao mercado fonográfico não impediu que a música feita por ela ganhasse destaque e fosse reconhecida como uma arte digna de conquistar seu espaço no âmbito nacional. Aliás, bem pelo contrário, foi justamente esse posicionamento que atraiu a atenção da Sony Music, oferecendo a possibilidade de tornar a Tanlan, de fato, um caso de crossover, que, segundo Soares (2013), diretor geral da gravadora, o entende como algo que tem mais a ver “com a sonoridade e linguagem, do que propriamente em fusão de públicos ou um maior espaço na mídia”. Com essa declaração, Soares mostra entender que tanto a linguagem quanto a sonoridade da Tanlan são capazes de transitar entre diversos segmentos, o que insere a banda no movimento contracultural do gospel. A fim de obter interação sobre a transição do independente para o cast da Sony Music, perguntamos ao entrevistado quais as diferenças que a banda identificou com essa mudança, ao que Sampaio (2014) respondeu, surpreendendo a


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autora, que nada havia mudado, conforme vemos no trecho da entrevista citado abaixo. “Sempre fomos uma banda underground/alternativa. Nunca fomos envolvidos com o mainstream, nem secular e nem gospel, o que nos permite circular bem por festivais, bares, shows de prefeituras, shows próprios, cultos e eventos de igrejas. Nada mudou, neste sentido, com o advento da Sony em nossa vida”. Porém, Sampaio identifica um ponto positivo e determinante para a Banda a partir de sua contratação pela gravadora, ao afirmar: “O que aconteceu, é que nós começamos a chegar em lugares onde uma banda independente normalmente não conseguiria chegar. E isso foi muito bom”. Com isso, entende-se que a gravadora permite à banda contratada uma maior visibilidade e presença em todos os sentidos, seja físico, mercadológico, virtual, etc., e nesse enfoque, é perceptível a ruptura do independente à contratação, através de uma simples análise do ambiente das redes sociais da Tanlan, como veremos a seguir. No período anterior à contratação da Sony Music, as postagens de maior visibilidade, conquistavam em média 70 likes, conforme exemplo da figura 31, referente ao post de divulgação do show de lançamento do Cd Um Dia A Mais, que aconteceu na mesma ocasião da oficialização da contratação da Sony Music. Figura 31 – Postagem no Facebook anterior à contratação


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Fonte: Fanpage Banda Tanlan (2012)

Desde 2012 como parte do cast da gravadora, a página da Tanlan no Facebook adquire novos fãs a cada dia, e postagens como imagens contendo frases das músicas da banda ou simplesmente mensagens que refletem a filosofia dela, adquirem praticamente oito vezes mais likes do que no período anterior á contratação, como vemos na figura 32.

Figura 32 - Postagem no Facebook posterior à contratação

Fonte: Fanpage Banda Tanlan (2012)


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Com isso, percebemos que, de fato, a contratação da banda resultou em projeção de seu trabalho para um público bem maior do que ela possuía anteriormente, entretanto, parece que, no volume de vendas o impacto não foi tão otimista. Ao questionarmos a banda sobre qual é, atualmente, a sua abrangência no mercado fonográfico, o entrevistado lembra que a Tanlan ainda é uma banda underground e, por isso, suas vendas não são altas. Sampaio (2014) afirma ainda que, “para a gravadora, isso não é o mais importante, nesse momento, pois, segundo ela mesma, este cenário ainda está em formação no Brasil”. Essa afirmação da Tanlan contesta a colocação de Zé Bruno, da banda Resgate, quando este afirma que o artista que se importa mais com a arte e com o impacto dela, seja cultural ou espiritual, e que apenas deseja firmar presença aonde outros artistas cristãos não chegam, não é interessante para o mercado (ENTREVISTA, 2013). Com isso, entendemos que, nem sempre as gravadoras estão atrás de um talento com promessas de faturamento, mas também são atraídas por artistas que são promissores por apresentarem uma essência relevante e uma postura diferenciada, com possibilidade de criarem um novo nicho de mercado, como é o caso da Tanlan, que colabora, hoje, com a construção de um cenário ainda em formação na música cristã brasileira.


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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O trabalho aqui proposto teve como objetivos investigar as origens da música e da cultura gospel no Brasil; conhecer o público consumidor que se formou nessa cultura; entender o movimento contracultural que começou a se manifestar no país nos últimos dez anos; e, identificar as características da Banda Tanlan, que a insere nesse novo contexto artístico-cultural da música cristã brasileira. Ao contemplar esses objetivos, é possível afirmar que, ao longo dessa pesquisa, foram todos atingidos, e os apresentaremos a seguir. Através da pesquisa bibliográfica foi permitido investigar o histórico da música evangélica ao longo dos anos, desde aparições bíblicas, passando pela hinologia protestante, a implantação da hinologia no Brasil através de imigrantes alemães e escoceses, o negro spiritual, que deu origem ao termo gospel através das canções entoadas pelos escravos negros do sul dos Estados Unidos, no século 18, o Jesus Movement dos anos 70, quando hippies cristãos introduziram instrumentos de rock nas canções evangelísticas, até as transformações da música evangélica no Brasil, onde o gospel tornou-se marca, a partir dos anos 90. Ao explorar essas origens, foi perceptível o acompanhamento da música evangélica juntos às rupturas e evoluções sociais e também tecnológicas no decorrer do tempo. Torna-se visível a necessidade humana de comunicar-se através da arte musical, adicionando a música, elementos contemporâneos que a tornam típica dentro do tempo vigente. Além disso, a pesquisa permitiu reconhecer a potência dos jovens para provocar transformações no meio em que estão inseridos, pois a maioria das mudanças relatadas nesse resgate histórico teve o impulso da juventude. Também através da pesquisa bibliográfica, foi possível conhecer o público consumidor da música gospel no Brasil e concluir que este vem se destacando de forma expressiva no país desde os anos 2000 e promete crescer ainda mais. O aumento vertiginoso de adeptos à Igreja Evangélica e a previsão de que os evangélicos superem, em número, os católicos no Brasil em um tempo médio de 20 anos, foi uma das constatações geradas pela pesquisa. A pesquisa bibliográfica permitiu ainda entender o movimento da contracultura

gospel,

suas

fundamentações,

influências

e

características.

Compreendeu-se que os artistas desse movimento não negam o importante impacto


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da música gospel na história da música religiosa no Brasil, mas desejam, a partir dela, fazer algo novo, e sinalizam isso não rotulando seus trabalhos como gospel. Outras características do movimento, que ficaram visíveis durante a pesquisa, são a defesa por uma não categorização da arte pela crença e sim por seus critérios artísticos e estéticos, e letras livres de jargões evangélicos. Verificou-se, ainda, que a contracultura gospel surgiu como um amparo libertador para os artistas cristãos, que muitas vezes impõem limites em seus talentos por receio de corromper sua fé. Os artistas do movimento entendem que o resultado da soma entre a inspiração, a composição, a produção e todos os elementos e processos da música feita por eles, é fruto de uma vivência no cristianismo e que, sendo eles próprios a prova da sua fé, naturalmente a obra deles é cristã, ela levantando ou não evidências disso perante a sociedade. Considerando uma das questões dessa pesquisa, foi permitida, por meio da metodologia, a identificação das evidências que tornam a Banda Tanlan parte da contracultura gospel, podendo apontá-las da seguinte forma: A atuação da banda em palcos de bares alternativos, como por exemplo, o lançamento do primeiro cd da banda, que aconteceu no Porão do Beco, em Porto Alegre; A aceitação e atração de um público não-cristão pela música da Tanlan, produto do reconhecimento da qualidade musical que seus trabalhos apresentam, não ficando aquém de demais bandas do cenário rock brasileiro; A não imposição ao público de ouvir sobre a profissão de fé dos integrantes, pois Tanlan não utiliza o espaço dos shows para fazer pregações sobre o evangelho; As composições das músicas, que não contém linguagem típica da cultura gospel, isto é, não emprega termos que se assemelham aos hinos entoados nas igrejas ou aos contidos nas canções gravadas por artistas cristãos nos anos 2010 no Brasil, período em que a cultura gospel passou a ganhar maior repercussão. Ao contemplar uma das questões dessa pesquisa, analisamos o cenário pré e pós-contratação da Banda Tanlan pela Sony Music a fim de constatar se a banda apresentou alguma mudança em relação a sua filosofia após ser contratada pela gravadora. Através de observação participante de um show da banda antes da contratação e analisando questionário respondido pela Tanlan, pode-se afirmar que não houve alteração na filosofia da banda após a contratação. Porém, o que


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podemos averiguar é que a entrada da Tanlan no circuito comercial a colocou em evidência diante do mercado, resultando em um número maior de fãs pelo Brasil, tornando claro que a maior transformação do período pós-contrato foi a projeção da banda para um público mais amplo que o período pré-contrato. Ainda através da análise do estudo de caso, foi possível responder a outra questão levantada nessa pesquisa, a qual busca entender o motivo porque a gravadora Sony Music firmou contrato com uma banda que, além de não se enquadrar em um segmento específico, não contempla, como principal meta de seu trabalho, o faturamento. Por meio dessa análise, podemos afirmar que, é justamente pela Tanlan não possuir um segmento único, definindo-se ela própria favorável a arte antissectária, nem “religiosa” e nem “secular”, é que sua música é consumida e admirada por ambos os segmentos. Com isso, a Sony Music aposta em seu trabalho por verificar uma crescente tendência

no mercado evangélico,

conforme

constatamos no terceiro capítulo desse trabalho, e por, além disso, ter condições de oferecer essa mesma música para o consumidor não-evangélico. Conclui-se, então, que a Sony Music não perde por contratar artistas que não se enquadram num gênero musical específico, pelo contrário, ela entende a possibilidade de abocanhar uma fatia heterogênea do mercado e, por isso, bem maior. Além disso, entendemos que, a Banda Tanlan se fez atrativa para a gravadora, acima de tudo, por apresentar a possibilidade de um novo nicho de mercado, cujo público consumidor está afinado com os pensamentos característicos da contracultura gospel, cenário que está em formação no Brasil e, por isso, se faz promissor. Também comprovamos, através de relato feito por Fábio Sampaio (2014), que o comportamento dos integrantes da banda, postura que evidencia sua fé, colabora de forma positiva na aceitação da banda pelo público. É relevante apontar algumas dificuldades encontradas durante a pesquisa, a fim de justificar possíveis lacunas no seu desenvolvimento. Uma delas foi o relato completo sobre a origem da música cristã, afinal, seu histórico é deveras amplo, possuindo muitas fases e artistas que construíram a sua trajetória no âmbito mundial e nacional. Outro aspecto adverso foi encontrar fontes de informação sobre a contracultura gospel, pois as manifestações ainda são recentes e a maioria delas está em formato de notícias, colunas e releases, não possuindo ainda autores que


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abordem

com

profundidade

sobre

o

assunto,

principalmente

em

termos

comunicacionais e culturais. Essa pesquisa tornou-se particularmente relevante à medida que concedeu o entendimento de que toda e qualquer arte, seja ela música, pintura, poesia, criação gráfica ou qualquer outra técnica que se sirva da criatividade como matériaprima, é construída a partir do indivíduo e é fruto das experiências, filosofia, conhecimentos e fé deste. A autora, que compartilha da fé cristã, sente-se encorajada, a partir dessa pesquisa, a romper em suas aplicações profissionais aprendidas durante sua graduação, motivada pela compreensão de que a fé não é apenas um modo de vida, mas interfere e enobrece o resultado final de todo trabalho que esta se propuser a executar.


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recebida

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APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO À BANDA TANLAN

SOBRE SER OU NÃO GOSPEL

Vocês se classificam como uma banda gospel? Qual a filosofia da banda Tanlan? Desde o início da banda, temos como proposta ser uma “banda de rock” (sem subgêneros mesmo), ou seja, uma banda que faz música, que se comunica com quem se interessar pelo seu som, independente de ideologia ou fé. Nunca quisemos ser uma banda segmentada em um único gênero (gospel, por exemplo), mas o fato de sermos todos cristãos evangélicos, e termos em nossas letras uma percepção e perspectiva das coisas a partir de um ponto de vista cristão, faz com que muitas vezes sejamos classificados como uma banda gospel.

Essa

classificação surge geralmente do público cristão que está, de certa forma, acostumado com essa nomenclatura. O nosso publico dito “secular” não se importa muito com isso, e se interessa muito mais pelos aspectos estéticos da música. Se eles gostam, é porque a música se comunica com eles de alguma forma. E tudo isso passa pela maneira como compomos e entendemos nosso projeto.

Os integrantes da banda se consideram cristãos evangélicos? Que hábitos a banda (ou seus integrantes) cultiva no seu cotidiano e nos seus shows que evidencia essa fé cristã? Sim, somos todos membros da PIB Porto Alegre. Nossa fé evidencia em nossos relacionamentos. Não paramos nossos shows para fazer uma pregação, ou algo do tipo (exceto quando tocamos em igrejas e os organizadores nos pedem isso). Quando estamos no palco, estamos alí para fazer o nosso show, mas quando estamos fora dele, estamos alí para nos relacionarmos e vivermos o cristianismo como um todo. Sendo relevantes em nossas relações com outros músicos de outras bandas, com o dono do bar, com os técnicos envolvidos etc. Acreditamos que o verdadeiro evangelismo deve ser exercido, em primeiro lugar, com a nossa vida.

Existe alguma situação/história que tenha impactado a banda em que a fé tenha feito toda diferença através da música ou da postura de vocês?


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Existem algumas, mas gostamos muito de uma em especial. Há alguns anos fomos contratados para fazer dois shows na maior casa de rock de São Luís, no Maranhão. O contratante não sabia nada sobre nossa fé. Nos chamou porque havia gostado das músicas e toda a equipe do bar também. Ao terminarmos o show, na primeira noite, ele veio nos encontrar muito contente e satisfeito com o que havia visto e ouvido. Durante a conversa com nosso produtor, que nos contou tudo depois, comentou que pouco antes de chegarmos para o show havia feito uma pesquisa no google sobre a gente e ficou intrigado com a quantidade de artigos que nos relacionava ao universo evangélico. Então, perguntou: vocês são de igreja? (sic). Nosso produtor respondeu que sim e iniciou uma conversa sobre o que ele achava disso. Entre outras coisas, ele disse que jamais podia esperar algo assim vindo de “crentes”, pois, segundo ele, um crente jamais poderia fazer algo que ele pudesse gostar. Outra coisa que chamou muito a atenção dele foi o fato de cumprirmos todos os horários combinados, de não termos enchido a cara no bar (a bebida era liberada para a banda) e nem ficado assediando as meninas da casa ou do público. Depois disso, ele ficou tão impactado com seu próprio preconceito ruindo diante de seus olhos, que nos convidou para voltarmos no ano seguinte para a festa de aniversário do Bar.

Você acredita que há coerência entre o discurso cantado nas músicas da Tanlan e a postura de palco e comportamento dos integrantes da banda? Sem dúvida alguma.Toda arte é um reflexo natural das vivências, experiências e percepções da vida, do mundo e dos outros que o artista decodifica e coloca pra fora em forma de artefato. Sempre que nos perguntam se somos uma banda gospel, eu costumo responder que apenas cantamos o que acreditamos e acreditamos naquilo que vivemos.

Já vivenciaram alguma resistência ou receberam alguma crítica no meio evangélico por não assumirem um rótulo gospel? Sim, mas geralmente, isso acontece quando as pessoas não entendem nossa proposta e filosofia. Na maioria das vezes, uma boa conversa resolve tudo.


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SOBRE O CENÁRIO NACIONAL DA BANDA PÓS SONY MUSIC

Qual o diferencial da banda que vocês acham que mais chamou a atenção da Sony? A Tanlan nasceu com o propósito de ser uma banda formada por cristãos acessível a todos. E acredito que a possibilidade de ter uma banda que alcançasse dois mercados, ao mesmo tempo sem criar barreiras entre eles, foi o que mais chamou a atenção da gravadora. Sem falar no fato de que a gravadora decidiu apostar num movimento de bandas e artistas cristãos que se propõem em fazer arte e não uma música proselitista.

Qual o cenário da banda pré e pós o contrato com a Sony? Sempre fomos uma banda underground/alternativa. Nunca fomos envolvidos com o mainstream, nem secular e nem gospel, o que nos permite circular bem por festivais, bares, shows de prefeituras, shows próprios, cultos e eventos de igrejas. Nada mudou, neste sentido, com o advento da Sony em nossa vida. O que aconteceu, é que nós começamos a chegar em lugares onde uma banda independente normalmente não conseguiria chegar. E isso foi muito bom.

Teve algum valor da banda que precisou ser revisto ou negociado por conta da contratação com a Sony? A gravadora impôs algo que a banda precisou se adequar? Não. A Sony não possui qualquer poder neste sentido.

Qual

a

abrangência

da

banda

no

mercado

fonográfico

atual

(produção/venda)? Como falei, não somos uma banda de mainstream, logo, nossas vendas não são altas. Para a gravadora, isso não é o mais importante, nesse momento, pois, segundo eles mesmo, este cenário ainda está em formação no brasil.

SOBRE PUBLICIDADE CONVENCIONAL E ONLINE

De que forma o ambiente virtual colabora para a projeção da Tanlan?


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Colabora de forma fundamental. Tudo o que fazemos, divulgamos no ambiente digital, seja em redes sociais, seja em sites específicos. Hoje a internet é o único canal confiável de relacionamento artista-público. Sem ele, dependeríamos de terceiros, que não se esforçariam como nós para divulgar a banda.

Como vocês avaliam o relacionamento artista/fã no meio virtual e fora dele? Fora dele, nossa relação com o público é surpreendente. Temos fãs em lugares onde jamais imaginaríamos ter. Tratamos a todos com muito respeito e o carinho tem sido enorme. Dentro do ambiente digital, nossa interação é muito boa. Poderíamos até ter uma fanbased maior, se nos dedicássemos muito mais, com estratégias promocionais nas redes sociais. Mas ficamos felizes quando temos um bom número de conteúdos compartilhados.

Quem desenvolveu e como foi o processo de criação da marca (logotipo) Tanlan? Assunto complexo. A marca Tanlan não tem ainda uma tipia escolhida, porque somos muito críticos e ainda não encontramos uma identidade gráfica para ela. Pensamos que a cada novo trabalho, ela ganha a identidade do trabalho em questão. Mas ainda teremos uma identidade visual mais pensada e atemporal.

Quem cuida da marca Tanlan, nos canais online e peças gráficas convencionais? Nos canais onlines, Fernando e Fábio são os que mais postam conteúdo. Temos alguns critérios em que todos concordam e balizamos as coisas por ai. Nos canais convencionais, a maioria dos materiais é criada pelo Fernando, nosso baterista.


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APÊNDICE B – AUTORIZAÇÃO PARA COLETA DE INFORMAÇÕES SOB A FORMA DE ESTUDO DE CASO COM NOME DA EMPRESA


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