Valter Casseti Delírios
“Lua, Triste imunda deflorada Que sozinha envergonhada Acompanha o meu pesar...” (1969: quando o homem pisou na lua) DELÍRIOS
Não são poemas sistêmicos
Nem crônicas anacrônicas
Não contém fios narrativos
Nem fatos indutivos São estilhaços ao vento
Fulgurações sem ruídos Enigmas sem nexos Côncavos ou convexos Puras deambulações Sem confissões
Caminhos tortuosos que não levam a nada Não existem caminhos
Não existem estradas São apenas...
Delírios
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Notas de esclarecimento:
(i) para alguns títulos ou parágrafos, foram adicionadas notas de referência, procurando justificar o contexto.
(ii) antes do título de referência foi adicionada a letra “D” (de Delírios), seguida de numeral, que leva em consideração a sequência cronologia da elaboração.
(iii) os “Delírios” foram agrupados em compartimentos imaginados pelo autor.
Contato:
valcasseti@gmail.com
Capa: óleo sobre tela do autor
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Valter Casseti Delírios
ÍNDICE
I. Delírios do Absurdo 9
D02. A absurdidade do ser
D03. A idade da razão
D09. Desejos existenciais
D21. O suplício de Damiens
D29. Clemência por evidência
D40. Utopia existencial
D69. Alienam D85. Idade da devoção
II. Delírios do Passado 23
D01. Inferno dantesco
D07. Marcas do passado
D08. Herói mentiroso
D37. Medéia
D66. Dionísio
D75. Tragédia de Prometeu
3
D76. Odisseu
D81. Concerto Barroco
D92. Glauco
D94. Niobe D100. Ela
III. Delírios de Transcurso 37
D23. Meu rio
D26. Paixão do sertão
D33. Cicatrizes na alma
D62. Infame desejo
D86. Rebeldia D93. Desassossego D.99. Dizer o que?
IV. Delírios de Percurso 48
D05. Angústia pandêmica
D24. Visão mítica
D42. Como assim?
D45. Interrogações
D49. Perguntas dementes
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Valter Casseti Delírios
baixinho
Imagens que ficaram
Terra goyazes
Agonia
V. Delírios dos Sonhos 69
Aldeia e sonhos
Pesadelo real
sonho faustiano
Incógnita onírica
impossível
Recorrências oníricas
barroco
VI. Delírios dos Contrários 87
5 D51. Pensando
D53. Macedônio D56. Cidadenia D57. Pandemia D.67.
D71.
D90.
D04.
D19.
D20. O
D32.
D52. Sonho
D55.
D82. Sonho
D84. Pesadelo D87. Sonhos indecentes D88. Afrodite D98. Vermes
do espectro
Navegar é preciso
Paradoxo dos contrários
Retalhos heraclitianos
Tempo indefinido
Arte dos desencontros
Acaso e descaso
Um dia disse
Chegada partida
Concreto abstrato
VII. Delírios do Corpo 104
Dilema do ensaio
demais
Com a garrafa na mão
me basto
da paixão
6 D13. Retrospecto
D15.
D22.
D25.Nostalgia D28.
D39.
D47.
D48.
D91.
D96.
D.97.
D16.
D17. Expressionismo D30. Sentimentos reprimidos D31. Tarde
D58.
D65. Eu
D68. Reflexos D79. Limites
Valter Casseti Delírios
D83. Madrugada
VIII. Delírios do Saber 119
D35. Alienação
D59. Ser mãe
D60. Galdino
D61. Zé Porfírio
D63. Tem dias...
D72. Que importa?
D73. O que dizer?
D77. Os porquês
D80. Quem foi?
IX. Delírios da Morte 138
D06. Contagem regressiva
D11. Desejos contidos
D14. Não se vive duas vezes
D36. Vidas
D74. Urutau
D89. Quem disse?
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X. Delírios do Universo 146
D10. Contra a correnteza
D18. Neomalthusianismo
D27. Feminismo ético-político
D32. Hasta cuando?
D38. Destruição anunciada
D41. Apocalipse
D43. Ser máquina
D44. Caos
D46. Evolução criadora
D50. Desencanto
D54. Futuro do universo
D70. Onde sonham as formigas verdes
D78. ½ ambiente
D95. Desencantamento do mundo
Notas Explicativas 170
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Valter Casseti Delírios
I. DELÍRIOS DO ABSURDO
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D02. A absurdidade do ser1
Radicalizar o absurdo pondo fim à vida
É ilusão que não resolve a partida
Tratar o absurdo numa abordagem irracional
É decisão filosófica fatal: suicídio moral
Aceitar o absurdo vivendo sem resignação
Aproveitar a liberdade ao fruir da concessão Preferir o nada ao nada querer
É desconhecer a consciência, é deixar de viver Paradoxo da essência ôntica, do devir ao existir Radicalizar o absurdo do ir pondo fim ao partir
Na busca da incompletude, de uma suposta virtude Como um misto cartesiano, no tratado malthusiano Que sonha com o entorpecimento, a todo momento Tem a feliz apatia, como meta tardia Busca na transcendência, a superação da querência Concebe a oração, como mito da salvação
Pensa em outra existência, como única potência Abandona a emoção, em prol da escravidão
O esclarecimento como referência, da impotência
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Valter Casseti Delírios
Em busca da iminência, de uma suposta imanência Aceita o absurdo da crença, negando a coerência Idealiza o aproveitar; degenerescência da latência Esperando a descida, vista como perdida O desejo de encontrar a paixão renhida
Não basta lograr o sacrifício, como protótipo do armistício
Nem deve conter o suplício, como vontade de ofício Assim como o argonauta, em uma aventura arguta
Negando as crenças de mitos, eternos beneditos Absurdo inevitável reclama, por liberdade da trama Compensando a sempre injusta, crueldade vetusta No absurdo desigual e inevitável da vida, cumprida Conclama pelo desejo da esperança, ferida Carrega no ombro a pedra da sina, como ruina Compensa a leve descida, pensando na próxima subida
Cada ato contempla o ridículo dos fatos, inatos
Dos excessos da alma e o cansaço, dos fardos Suficiente para justificar um espelho maldito, de um desejo restrito
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O paradoxo absurdo: felicidade e iniquidade Razão de latência, na imanência da indecência D03. A idade da razão2
Buscou a liberdade pura que resultou amargura Embora sem saber se seria a hora, do agora Enfrentou o paradoxo do querer, sem poder
Apropriou de recurso alheio; puro devaneio Tentou abortar o que passava de hora, da aurora Rompeu com a moral conservadora, pela razão inovadora Pensou no purgatório existencial, para curar seu mau Renunciou ao político, em troca do armistício Preferiu que nada mudasse, sem que nada se fizesse Para não perder a indignação de ser, sem querer Deixou a vontade do querer, sem poder Nunca tinha mordido antes, por falta de dentes Hoje não tinha dentes, por falta do antes Relutou quebrar as amarras bizarras
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Enquanto espera ansioso o destino, como se fosse menino
Valter Casseti Delírios
Na sombra contemplativa, de falsa prerrogativa Se fez pequeno burguês deturpado, maculado Investido de intelectual malogrado, desgraçado
Um epicurista desabusado, ausente, dessacralizado
A indulgência de uma decisão sorridente, inconsequente
Só restou proclamar a própria culpa, pela incúria Como forma de encontrar uma desculpa, mais que justa Proclamou e relutou contra a própria razão, da abstenção
“Ninguém entravou a minha liberdade”, até essa idade
“Foi a minha vida que a bebeu”, e a bebendo, encolheu D09. Desejos existenciais
Odores de vinagre nauseantes
Melodias pueris inebriantes
Gestos maquinais desconcertantes
Silêncio opressivo doente
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Canto triste de libertação ausente Vontade de felicidade premente D21. O suplício de Damiens3
Mesmo depois de implorar para que fosse libertado, foi executado
O condenado foi levado ao patíbulo, para suplício público
Aferrado nos mamilos e braços, fraco, desconheceu a razão desses atos
É exposta a arma da acusação, de um parricídio não cometido
Tem o corpo puxado e desmembrado, por cavalos traçados
Sobre as feridas expostas, despejam óleo fervente, enxofre derretido no ventre Grita sem blasfemar, as dores excessivas, só o fazem chorar
Confessores insistiam em vão, pela compunção Clama por um deus ausente, por um perdão sem razão
Prosseguiu o martírio exemplar: ferro da caldeira derramado sem cessar
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Valter Casseti Delírios
Num ato derradeiro, diante do confessor, pediu perdão, pela imensa dor Transpassados ganchos de aço, pernas, barriga e braços Nervos e juntas retalhadas, sem que restasse mais nada Carnes foram arrancadas, ficando expostas as chagas
Como se não bastasse, esquartejado, pedaços foram espalhados
Restos, levados à fogueira, foram consumidos; tudo ao pó reduzido
No local onde jazia, um cão deitado usufruía
O calor do que foi corpo um dia
D29. Clemência por evidência
Se existisse nessa terra cabralina A dita pena capital
Pelo menos um “paraíba” seria Condenado à pena fatal
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Mesmo com os avanços em voga
A velha balança romana
Seria mais justa que a toga
Em uma estrutura que engana Em um prato a pluma da deusa No outro o coração do julgado
Delação sem evidência
Inocência ao denunciado
A antiga balança romana
Com sua eterna precisão
Teria bons resultados
Independente da coação
Mais justa que a justiça Condenado por premissa
Com base no falso inventado Por um sistema invocado
Ajustada a assimetria e curtose Reduzido ao desvio padrão
A balança em nova pesagem
Absolveria o coração
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Valter Casseti Delírios
D40. Utopia existencial
Como destruir o estado sem promover contestado? Quando alguém aparece, ornando a economia em prece?
O germe da serpente inaugura, o estado da ditadura Se o trabalho foi componente do ser, o capital assumi o poder
Surge a espada liberal, com mudança radical Nas forças produtivas; trabalho: subjugação redutiva
A mais-valia fetichiza a mercadoria
Para justificar a razão, basta a alienação Para quem se produz? O trabalho a quem conduz!? Refém do processo produtivo; objeto de exclusão: sujeição
O estado burguês estrutura, instituições da amargura
A propriedade da terra e dos meios de produção, excluem pobres da razão
Judiciário: poder de repressão; sentenciam com pena de prisão
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Instituições como igreja, cultura e educação: instrumentos da alienação
Mantêm o contínuo processo de dominação Poder ampliado aos conglomerados; miséria aos desamparados Estrutura perversa que cresce; revolta que padece Só a revolução, socializa os meios de produção Cumprindo a esperada utopia, do desejo de um novo dia
Só a consciência de classe fará, uma nova estrutura vingar
Uma nova base fundada, na coletividade irmanada Utopia desejada, contrapondo a negação, do princípio da exclusão
Sonho esperado: ditadura do proletariado
D69. Alienam
O que se espera quando nada se gera?
Mesmo não crendo em prece, quem sabe um dia aparece!
O que se vê quando nada se enxerga?
Mesmo não sendo pulsante e nem mesmo navegante
O que se ouve quando nada escuta?
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Valter Casseti Delírios
Mesmo não sendo moco e tendo um sonho louco O que se espera da vida sempre sofrida?
Mesmo não sendo estorvo, ou tendo um bico de ogro
Perguntas sem respostas, que não foram questionadas (nada, nada!)
Respostas ou propostas, em local proibido, sem ter qualquer sentido
Restando ao destinatário, procurar o remetente; mesmo estando ausente
Evidência que se perde, como um desejo que medre Desejo que se compraz, como não existisse o jamais Olhando para o passado, em um futuro que se foi... o presente vem depois Futuro que já passou, sem que o passado chegasse e a vontade voltasse
Pergunta: onde estará, o que não saiu do lugar? Para onde se foi, o que nunca pensou no depois?
Onde estará a manada, que não deixou quase nada? Onde foi o amanhã, que não esperou no divã?
Éumpesadeloacordado,semnuncatersidosonhado Pensando em um novo dia, sem saber se outro viria Aparição do sentido, na esperança de ter vivido Negando a confissão, sem mesmo saber a razão
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Negando o que foi negado, em umdilema regado, de sonho defenestrado
Como se fosse o poema, sem ao menos umesquema, que espera estratagema
Quem haverá de conceder, a natureza do próprio ser, sem saber se ser será!?
Quem poderá afirmar, que ninguém vai naufragar, nessa nau em algum lugar!?
Como conter a tormenta, se a própria vida não aguenta!?
Como destilar o ódio, depois de tanto ópio!?
Entorpecer o sentido, confortando o parco espírito
D85. Idade da devoção
É só dispor o corpo em queda livre
Para que a gravidade do tempo transige
A flacidez das estruturas corporais
É denunciada com rugas imorais
Mesmo reconhecendo o efeito do tempo
Prorroga o momento para o próximo evento
A imagem refletida escancara a realidade perdida
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Valter Casseti Delírios
Que se tentou negar sem cessar: piedade varrida Mostra com toda rudeza
A impotência de superar a agudeza
Como os fatos levam à aceitação
Não resta alternativa, senão frustração
E num recurso de compensação, enaltece a vida Reconhece estar vivo, na estância perdida
Uma recompensa para poder vivenciar
As transformações da história mostrar
Mesmo desapontado com os limites impostos
O corpo em descensão, neutraliza os opostos
Ao tempo em que a lâmina se aproxima Nutre o tempo, no espaço que alucina Recorda os eventos, ao longo do tempo
Atenuando os erros do momento Revisitando o passado inerte
Anulam maldades inférteis
E uma nova batalha, no balanço da própria sala Apagando as marcas da senzala
Aí vem o arrependimento do passado
Pouco aproveitado, que clama por novo ato
Do quanto poderia ter sido audacioso
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Nas decisões pessoais, do devir perigoso
Na inocência de orientações equivocadas
Pouco historicamente lembradas
Ou de seguir dogmas inconsequentes
Desprovidos de valores renitentes
A falta de um conhecimento para contribuir Com propostas sonhadas do novo porvir Sem que o ontológico fosse moldável
Pela prática contestável, da razão incomensurável
Mas a vida se funda na dialética
A sagacidade do ser na estética
Caso contrário, maior preguiça
Desalentados clamam por caricia
Chega-se à conclusão,deque nada éperfeito Leis equivocadas, perdem seus efeitos
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Valter Casseti Delírios
II. DELÍRIOS DO PASSADO
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D01. Inferno dantesco4
Um globo imerso no espaço inverso Imensa cratera cravada na terra
No núcleo em chamas o inferno proclama
Condenados macabros sem rumos deixados Núcleo espiralado por categorias de pecado Destinados aos penitentes prementes e indulgentes Transgressão vã da moral cristã
Avaros, heréticos, perdulários sincréticos
Da porta se avista a intrepidez do Aqueronte
Ancorado à margem, o barqueiro Caronte
Espera os desencarnados ao suplicio dos pecados Carrega a alma dos incrédulos desesperados
Para o castigo imerso no eterno inferno No limiar, almas a espiar sem procrastinar
Condenadas a ritos prementes de um desejo imanente
Na outra margem, almas esperam avidamente, o perdão renitente
Levadas por coerção, sem direito a absolvição
O velho barqueiro conduz ao destino clandestino Almas que imploram por clemência, pela dura penitência
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Valter Casseti Delírios
Caronte assiste com horror, embora fiel condutor Carrega no peito o calor, de aceitar tamanha dor Na entrega dos desvalidos ao depósito de demolidos Cena que contrasta, arrasta para a hora nefasta Escavando as profundezas, como altivez da rudeza Se Aqueronte for um dia o inconsciente da travessia Caronte exorciza os insensatos, na liturgia do pacto Com o remo na mão espera, a sublime decisão da fera
Aporta os transgressores, no divã da alma, pedindo calma
E como bom barqueiro na tempestade, pede potestade Cansado de ser escudeiro, vence o Aqueronte traiçoeiro
Se embrenha por outros rios, outras margens, afio E num relance derradeiro de ante, proclama a verdade chocante:
“Se não posso dobrar os céus, moverei o inferno” de Dante
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D07. Marcas do passado
As palavras devem ser ditas mesmo que inauditas Mesmo contendo violência para superar a demência
O pouco que se sofre, basta para aceitar a sorte Sonhos recorrentes: histórias latentes
As imagens do passado se fazem presentes Superando as carências, acumuladas na existência Chega a hora do basta, mesmo que seja nefasta
Livre para decidir, mesmo sem saber onde ir O limite tardio da imprudência, transforma a apatia em doença
Os arroubos do saber, sempre deixam a merecer Limitado pela incompetência, tem-se a pura aparência
Os efeitos narcísicos inatos, o desejo de afirmação dos fatos
Inconsequências primatas, com atitudes sensatas (?)
As chagas históricas abertas, como verdades libertas
Estanca o sangue que jorra, por entre fissuras da história
Pensamentos reprimidos, liberados, consumidos
Um entorpecimento atávico, sem perceber o trágico
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Valter Casseti Delírios
Consumo teológico de um desejo escatológico Angústias do passado, aos desejos represados Necessidades da alma, para manter a altivez da calma Crise de uma existência, suportada pela imanência
O suplício do poder, rompendo entranhas do ser Mesmo inútil reclama, a esperança da vingança profana
Penar nos subterrâneos, dos infernos temporâneos O tempo restante oferece, a indulgência de uma prece
Destituir o sentimento da paixão, que perturba o eterno senão
O sono merecido, de um limite reprimido. Impulso do desvalido
D08. Herói mentiroso5
Baudolino entre guerreiros: herói ou embusteiro?
Torna-se confidente do imperador valente Liberta o sábio; busca o Graal para vencer o mal Relativiza os fatos como artefatos
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Um Quixote que enfrenta nos tempos, o próprio moinho de ventos
Conhece cidades que jamais visitou Enfrenta batalhas que jamais combateu Ama princesas que jamais conheceu Aprisionado no campanário, é salvo por um pássaro alado
Transmuta para outros cantos, em busca do desencanto
Apodera se de desejo, do sonho de um grande guerreiro
Batalha contra o inimigo, encontra o próprio castigo
Como louco suicida, se descobre parricida Teme o destino recluso, se enxerga só obtuso Penitencia-se do sêmen incestuoso; vergonhoso! Torna-se profeta maldito, blasfema como erudito Expulso pelos proscritos, traído pelos desditos Vai ao encontro da amada, sabendo quase nada Mesmo ciente dos riscos, avança como corisco Decide sua própria sorte, diante da própria morte Mostra a quem carece, que viajar também embastece
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Valter Casseti Delírios
D37. Medéia6
Conta Eurípides que Medéia, seduzida por Jasão Em nome do velo de ouro, matou o próprio irmão Em Corinto cedeu Jasão, os desejos do coração Abandona mulher e filhos, desconsiderando a razão Medéia finge aceitar a decisão de Creonte
Pede clemência: mais um dia adiante
A concessão real é tempo para a estratégia fatal
Por despeito e ódio, planeja vingança por opróbrio Mata Glauce, Creonte e os filhos, por revanche e martírio
Medéia filicida, converte se na eterna diva Com a dimensão telúrica, voa embevecida, escarnecida em vida
Calculista implacável, não se arrepende dos males
Seria psicopata ou assassina inata?
Seria mártir imponente ou ícone do feminismo latente?
Mesmo que mude o enredo, o mito atualiza o ensejo; espírito do desejo
29
D66. Dionísio
Dionísio tem vaidade dos porres e iniquidades Concentra excessos, fulgores e ambiguidades
Contrapõe à força de ponderação
Do antípoda apolíneo, meio irmão
Um deus estrangeiro, misterioso e sem razão
Que representa ruptura e dissolução
Um culto regado de vinho e conspurcação
Aniquilando hábitos e instituição
É o disforme das forças da natureza
Que se opõem à apolínea beleza
Pulsões legítimas e reais
Que levam a caminhos irracionais
Uma nova concepção de existência
Um eterno vir a ser da essência
Um mundo sem deus, sustentando pelo caos Fruto da desordem natural
Um lugar reservado à força do crescimento Pungindo a dor do sacramento
Desejo de destruir, para criar o novo vir Contrapondo ao sonho do porvir
A negação submissa à afirmação
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Valter Casseti Delírios
A imanência absoluta da razão
D75. Tragédia de Prometeu7
Epimeteu fez do barro os animais, pouca massa sobrou aos “imortais”
Prometeu o fogo roubou, para compensar a falta do que restou Punido por assegurar a equivalência, foi tratado pela demência
Amarrado em escarpas rutáceas, pagou pela própria audácia
A águia seu fígado comia, que no dia seguinte crescia
Pandora foi como vingança, para romper a aliança
O baú segredado foi violado
Disseminou-se doenças e acabou com as crenças Opondo ao destino da vida, só a esperança mantida Tirano perverso e insano, Zeus tornou-se profano
Prometeu denunciou,a diabólica condiçãosimbólica Capital como força estranha, devorando as próprias entranhas
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Vingança que resgatou a profecia, daquele que sabia o que viria Prometeu, expressão de potência, salvou a esperança, utopia da existência
D76. Odisseu8
Longe de casa, Odisseu à Ítaca volta Instruído pela deusa Circe, vai a Hades em busca da rota remota Encontra almas de entes queridos, no reino dos mortos esquecidos Seres fantasmagóricos, ectoplasmas, relatam suas mortes nefastas Tristezas e arrependimentos, compõem a mitologia dos tempos
Aquiles lamenta a amargura, da morte tão prematura Agamenon exorta cuidados, no retorno ao berço envidado Depois de aprisionado, Odisseu é libertado Penélope tece a chegada, dessa vez não desmanchada Odisseu como mendigo, entregou-se ao seu destino
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Valter Casseti Delírios
D81. Concerto barroco9
É necessário se afastar do problema, para resolver o dilema
Olhar a América, a partir da Sibéria, para conhecer a miséria Contada pelo europeu, o colonizado não sofreu
A conquista enaltece o explorador, que usurpou com vigor Impôs cultura desalenta, a partir de base virulenta
Um mundo barroco, de um surrealismo louco Colonos por serem originais, são seres ditos imortais Princípio da contradição: barrocos em busca da perfeição
Mesmo em oposição ao dilema, contrapõe ao teorema Princípio da contradição, que se fecha na razão
O tempo que interessa, espiral que não se fecha O tempo recorrente invertido, enaltece o prejuízo
Mundo móvel e mutável, instável e insaciável Povo diacrônico, sempre sincrônico e histriônico Conduz planos de expressão, com intervenção
Um barroco, de planos convergentes, irreverentes
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Quando começa um e termina o outro!? Mesmo não sendo barroco!?
D92. Glauco10
Perseguindo uma camurça, cai no desfiladeiro Morre o caçador aventureiro
A erva mágica lhe devolve a vida Se imortaliza pela bebida sorvida
Vagaporáguasterrenas,impulsionadopelasmilenas Cabelos nevoentos, sonhando com cada momento Pernas finas com sedas femininas
Escondendo a calda que se aglutina No barco vagueia, dispondo de um catre de madeira No móvel rústico uma vela, na cabeceira alumeia
Na paredeumbosquímanouma lança emana
Um escudo colorido que avança e inflama O barco sem leme, levado pelas correntes da sorte Ventos sopram nas regiões inferiores da morte
Tempestades e provações hediondas
O barco-rolha embriagado nas ondas Mergulhado no verso leitoso de astros mesclados
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Valter Casseti Delírios
O eterno passageiro continua calado Encalha no próprio caminho Chega ao lugar sem destino
Um outro morto-vivo reclama Pedindo respostas que clama Qual a sentença a um morto indolente Se vivos respiram uma vida aparente?
D94. Niobe11
Niobe, esposa de Anfião Chora lamentando a morte dos sete filhos
Mortos por Artemis e Apolo Chora pelo marido que de desgosto se suicidou Niobe chora Apiedados, os deuses a transformaram em pedra Mas mesmo pedra... Niobe chora
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D.100 Ela12
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Ela era poesia Eu não sabia ler Quando aprendi Ela fez-se prosa
Valter Casseti Delírios
III. DELÍRIOS DO TRANSCURSO
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D23. Meu rio13
Meu rio foi o são Domingos, que um dia dava para nadar
A montante do Minguta tinha o “Formigão”, rebojo em formação
Desconheço o porquê do nome; bizarro, possível de significado (?) Lá juntava a molecada; eram pobres sem opção de recreação
Pulava do barranco alto, vencia a correnteza e voltava para a destreza Era um ciclo contínuo, até cansar; voltar para casa... e às vezes apanhar
As águas passavam pela gente, mas assustava quando vinha enchente
A correnteza levava tudo; desbarrancava, inundava e lagoa formava Peixes ficavam represados e facilmente apanhados
As mudanças no ritmo do tempo só eram percebidas nesses momentos
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Valter Casseti Delírios
A gente enxergava a vida com inocência, sem se dar conta da abrangência Naquela época o rio só tinha duas margens; não se imaginava a terceira ou outras tantas lindeiras Não sabia que em cada pulo que dava, a gente não era a mesma, e nem mesma a água ficava Percebendo essas coisas, o sentido da vida foi mudando Hoje o “Formigão”, acho que nem mais existe, ou persiste
O rio que tão grande parecia, hoje não tem a mesma alegria
Não se encontram os meninos de então; nem mesmo aquela paixão
Obarrancode“lançamento”foisolapadopelotempo
O “Formigão” desfigurado, depois de maculado A vida buscou outras margens, que não foram encontradas Não restou quase nada
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D26. Paixão do sertão14
Como diz João do sertão em sua digressão: “Sem coragem não há salvação”
Carece dela para libertar da opressão Vencer a covardia, superar a alienação Deletar arquivos contaminados Reformular as bases de dados Armazenar em bancos nublados
O desejo de um novo dia, de retomar a rebeldia Rebeldia que se manifesta, no silêncio da noite em festa Que implora por luz, mesmo na incerteza que seduz Mesmo para quem não deseja a proeza Mesmo que o desejo seja apenas lampejo
A consciência transitiva, transcende a indutiva Depara com as grades do inconsciente da gente No temor, a alma pede calma Expulsa do fosso existencial, o que é natural Renasce a coragem do grito infinito, inaudito Gerado nas entranhas do pesadelo; um desvelo Uma narrativa perversa, por vezes adversa Que se rende ao desejo da ação
Fazendo nascer... um novo sertão
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Valter Casseti Delírios
D33. Cicatrizes na alma15
Olho para a última cicatriz no braço e logo procuro outras mais
Tento datá-las no tempo, relacionando com eventos Na orelha, marcas do carcinoma bacilar: exposição solar
Outras marcas visíveis, como no dedo anular, que me faz lembrar:
Resposta do meu grande cão que reagiu a “forca”, quando media força
Como vingança, foi doado, morreu por falta de cuidado
Na coxa direita, marca de furúnculos da infância, fruto da malemolência
Restam as dores por imprudência, ou desvios de nascença
Uma dor sazonal no menisco esquerdo, em que o tempo lembra o evento:
Uma bola dividida, habilidade comprometida
Leve dor no pé direito, herança de uma fratura do tarso, por descuido no passo
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Incômodo incurável na perna esquerda; problema neurológico ou patológico (?)
Provável efeito colateral da dengue contraída em vida
Incômodo no ombro esquerdo, associada ao “humor” natural, da cervical
Começou na infância: diagnóstico bizarro, se não fosse um sarro
Ainda dores e cicatrizes na alma, que doem na calma
Não são de origem biológicas ou ontológicas
Muitas poderiam ter sido evitadas: decisões precipitadas
Atribuídas ao destino!? Ou pura falta de tino?
Outras, decisões precipitadas, possíveis de serem procrastinadas
Desejo de outra jornada, marcas da aldeia abandonada
Cicatrizes profundas acumuladas; velhice inconformada
Nem mesmo o tempo freia o momento que alardeia São atitudes incontidas, inconsequentes; incompletudes recorrentes
Resgate de uma vida restringida; desequilíbrio nas ilações perdidas
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Valter Casseti Delírios
Fica o desejo do desafio na vida, tentando superar a vontade incontida Mesmo não sendo alcançada, o arrependimento aparente traduz a vingança latente
Por não querer o que não ter e gostaria de ser Atitudes impensadas; ausências descontroladas
Dores e cicatrizes que alteram as emoções, no fogo das desilusões
Enquanto isso, novas dores e cicatrizes vão sendo acumuladas
Outras vão sendo apagadas Novas recriadas.... Outras sufragadas... Novas recriadas.... Outras abortadas....
D62. Infame desejo
Bem depois do passado ter passado
É que me dei conta do quanto fui ingênuo De imaginar que poderia imaginar o imaginável
A possibilidade de superar o insuperável Desejo de ser presente, mesmo estando ausente Ter a força remida na infância perdida
Enfrentar sem defenestrar
43
Ponderar o imponderável inelutável Desejo de potência em estado de imanência Coragem para enfrentar o que estava para estar Esperar que o início concedido não fosse perdido Que a derrota inicial não fosse nocaute fatal Uma vergonha marcada por dias de agonia Escondida por dias sem alegria, fingindo alegoria
Levando à resignação a tão frustrada pretensão
Tornando o passado presente como se fosse vigente
Tendo a memória de um futuro sem glória, vitória Mesmo sem ter a esperança do desejo de vingança Mesmo sabendo o limite da vontade que omite Desejo inigualável para destruir o implacável De desvendar o imaginável indesvendável De superar o insuperável insustentável
D86. Rebeldia
Rebeldia carece de ações intempestivas Agindo de forma incisiva nas iniciativas É preciso uma base calculada
Perscrutar, dominar a história fundada Rebelar contra a estrutura consolidada
Sem subestimar o poder da virada
44
Valter Casseti Delírios
Só o tempo legitima o resgate Enaltecendo o vigor do embate Ser rebelde carece de estratégia factual
Contrapondo à estrutura emocional
Significa reconhecer a luta renhida
Sem esquecer conquistas reprimidas Tendo a ideologia como forma de alforria
Sem esperar por nada, nem mais um dia
Não basta a revolução como redenção
É preciso deter os percalços da inação
Superar a aceitação do oprimido
Desconsiderando a estratégia do inimigo
Destituir o poder oculto dos oportunistas
Vencer os intentos dos nazistas Há de chegar o dia em que o momento cria Há de chegar a hora em que loucura implora Há de chegar o momento Trazendo no ventre o novo rebento
45
D93. Desassossego
O sonho do recanto para repor o tempo perdido Chegou como mérito ao corpo carente de sentido Supondo nada abalasse o momento esperado O sonho imaginado foi abortado
O rio que serpenteava o terreiro
Foi aos poucos sorrateiro
Num instante nunca visto um dia Ocupou o espaço que lhe pertencia
Desconhecendo as exigências legais
Cobrou seus direitos naturais
Solapava margens, em sucessivas aluições Engolindo o que restava do pouco chão
Enquanto o rio avançava, o sonhador blasfemava Praguejando ao deus que não escutava
Não restou sossego Nem mesmo desejo
46
Valter Casseti Delírios
D.99. Dizer o que?
Dizer que vivi aqui sem saber se existi (?) Falar de fatos que ocorreram sem saber se aconteceram (?)
Vivendo oculto em um mundo injusto Não tendo razão nem sombra no chão Como se fosse sonho obscuro do corpo inseguro Como se pensasse o impensável, deletável Como os que pensam o inefável indesejável
Falando de fatos irreais em um tempo que liquefaz Sem saber da dor do próprio ardor Supondo história de horror no esplendor Mesmo a pretensa aurora indo embora Não sei se seria vontade da saudade Sabendo que o sermão não atinge o coração Sabendo que a taramela não fecha a janela Esperando um novo dia, mesmo que não chovia
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IV. DELÍRIOS DO PERCURSO
48
Valter Casseti Delírios
D05. Angústia pandêmica16
Acordar sem o que fazer; sem nada acontecer Sem mudar o desejo, a vontade do ensejo Um ócio vazio do ‘não’, abandonado no desvão Entorpecendo a inspiração, que aliena doce paixão Pensar na imanência, desterro da clemência
Apagar a luta pelo luto da justiça injusta Opressão que se repete, ao longo da vida inerte Mesmo diante da encruzilhada da antiga estrada
Notícias se repetem ao longo dos dias; pura agonia! Como o presente, um passado ausente
Onde o poder mágico, sustenta o domínio trágico Sombras destroem sonhos da utopia de um novo dia O mercado, de repente, corrompe o estado ausente
A miséria não satisfaz a amargura dos sais Que clama por justiça, calada pela imperícia Pobres e pretos, espaços reclusos; difusos!
A mídia mascara biombos escuros: murmúrios!
Impõem um novo padrão voraz, fugaz De uma verdade loquaz, um requinte compraz
A angústia e transcendência, anula a plena essência Sociedade indiferente que só deseja o ausente
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Imobiliza a gente, de amar intensamente Procura saídas no labirinto, absinto retinto Como suposto povo guerreiro; aventureiro Desencanta inerte, nada faz, morre em paz Cansado de indignar; nunca revoltar Jamais lutar!!
D24. Visão mítica
No mundo heráclitiano o espaço é dinâmico
A harmonia invisível desvela o sensível
A odisseia não é epopeia
Ulisses desperta para um mundo homérico incerto Impelido pelo desejo de lutar, conquistar
O sacrifício pelos deuses supera limites revezes Domou monstros da natureza, vencendo incertezas Abriu mares e conquistas insulares
Vontade de potência, contrapondo a indulgência Adormecidos despertos, com desejos incertos Amarrado ao mastro resiste, encanto que persiste Uma máxima premente se faz presente Tornando o conflito fáustico um dilema cáustico Momento onírico-contemplativo, desejos partidos Indignado com desperdícios da natureza-proeza
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Valter Casseti Delírios
Converte o estamento no desencantamento Desperta a envergadura, na candura pura Sob o pacto mefistófico, o delírio fáustico
Astúcia da modernidade, fronteira da insanidade Troca o desejo do amor pelo pacto empreendedor Acaba corrompido pelo espírito inquisitivo
Sonhos de Goethe imaginados, heróis defenestrados Coibindo astúcia e desejo, uma vida sem degredo
Futuro indesejado de impérios instalados No conflito com a lucidez, desejo da intrepidez
Os heróis passaram, ferimentos ficaram Nasceu o desencantamento do mundo; imundo
O domínio de estar sem o limiar do lugar
O fraco humano dolente, na curta vida latente Mutilada a natureza só restará tristeza
Novas espécies evoluirão, sem qualquer obstinação Novas bases do estar, novo desejo de mar
D42. Como assim?
O eu racional, coerente, consciente
O eu dividido em permanente conflito Entre o racional e o imoral...
51
Lugar do inconsciente, lascivo, transparente Pessimismo, otimismo, depressão... sem razão Crítica ao próprio desejo do enlevo Uma realidade objetiva que transita...
Da alienação ao desejo do não Da anomia à louca alegria...
Causas e consequências do grau da aparência
Quando se liberta dos malditos infinitos...
Os aflitos buscam conflitos
Como tapar coerências com demências?
Metáfora da diferença, entre razão e expressão
Tensão que reprime a pulsão
Satisfação da retórica patológica...
Sempre trágica; recorrências mágicas
Estado de inação, impossibilidade de emoção...
A própria questão do ciclo de possessão
Relação direta da submissão insurreta; Prazo de validação da sensação
Adeus restrição quando chegar Armagedom, Caráter crônico do pessimismo irônico
Se não houver tempo, só resta escapar do vento
Assim é a vida: sempre infligida
Tendo como referência a própria essência...
Mesmo mantendo a esperança na vingança
52
Valter Casseti Delírios
Mudanças descartadas, refogadas...
Outras postergadas na madrugada Muitas sujam a própria estrada do nada Guerras híbridas acovardadas, estigmatizadas Revolução fundamental, do analógico ao digital; Do logarítmico existencial ao exponencial Sem falar com razão, da grande corporação Controle humano, dominação, subordinação
Aumento do desemprego, exército do medo;
Sistema financeiro maldito dominando o infinito
Mercado subordinando ao estado; Maioria trágica cada vez mais “mágica”
Avanços da medicina, mortes e carnificinas
Inércia de movimento a todo momento Sempre turgência da malevolência
Efeitos suicidas, pandemias genocidas Articulações políticas das oligarquias malditas
Império das privações: subordinações Liberdade de expressão controlada pelo nada; Instância que ladra, domínio que mata Comunicação de massa, oligopólios na praça...
Efeito primata, permanente desgraça
Mesmo que se vislumbre, qualquer alumbre...
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Em ação, forças coercitivas inativas Democracia sucumbida...
Estado de exceção; prevalece a opressão Esperar pelo tempo a todo momento... Se houver tempo para o sustento
D45. Interrogações17
O que vem a ser a vida para os que vivem na lida?
Para os linbeiros na borda do despenhadeiro? Sem deus como companheiro (?)
Os que têm até a sombra atropelada na calçada!?
Fugindo da polícia, da fome e do próprio nome!?
Qual a razão de se viver perdendo a razão de ser?
Vida que foi castigada, explorada, expropriada...!? Que foi violada, estuprada, roubada Mantida na cela fudida da vida!? ***
Quando a fogueira projeta na caverna cenas externas Uns enxergam a possibilidade de outra realidade Pensando em se libertar da prisão insular Despertam para a luta factual, existencial Quando a sombra se agiganta
O prisioneiro se torna guerreiro
54
Valter Casseti Delírios
Outros adormecem entorpecidos pela prece Uns lutam sem parar para a história mudar Outros adormecem a esperar ver a morte chegar Assimtemsidoahumanidade emsuasambiguidades Apesar das conquistas, a história restaura a memória Carrascos apagam fogueiras, criando sombras matreiras Monarquias e igrejas produziram tristezas
Em nome da deificação proclamaram a inquisição Bruxas queimadas por não serem escravas
Criaram sanções para justificar dominações Uns, com razão, romperam a submissão
Transmutaram valor de uso em abuso
Empréstimo solidário em crédito para otário Juros de mercado com lucros acumulados
Corporações empresariais em grupos exponenciais Novos escravos pelo sistema caçados Detentores do capital alienaram o trabalho braçal Força dos humilhados, mais valia dos rejeitados Manobras imorais forjando castas sociais Risco ambientais em seleções “naturais”
Expropriados da terra pelo poder que impera Novas formas de exploração, mantidas pela ambição
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Fome endêmica em profusão, fulcro da seleção Velhas esperanças, recuperando novas crenças Sem fogueiras, nem sombras projetadas, mais nada As cavernas e cadeias abarrotadas, abandonadas Inocentes aprisionados, sempre lesionados Espera de novas sombras projetadas em quase nada Dando de beber aos que já não têm mais sede...
Só febre em rede
D49. Perguntas dementes
A impermanência da memória gera falhas na história?
Pequenas alterações no sistema geram gangrena?
Seriam os efeitos perversos sempre reversos? Se possível retroagir no tempo, o futuro seria estamento?
Seria possível a consciência imanente, gerar solução precedente?
Se retroagir fosse possível, o suicídio seria reversível?
Imaginando uma vida sonhada, qual o degrau da escada?
Nova escolha tomada, leva a decisão melhorada?
56
Valter Casseti Delírios
O que seria, se a noite se transformasse em dia?
E se a terra parasse e a humanidade descesse?
A complexidade do acaso leva a resultado desejado?
Se a vida fosse reversa, existiria certeza inversa?
Seria possível recuperar o tempo perdido, em direção ao infinito?
Pode-se oferecer oportunidade para construir a realidade?
E se os resultados passassem da existência, seria apenas demência?
A insignificância física e temporal é digna da verdade universal?
Qual a importância do ter diante do ser?
D51. Pensando baixinho
Caminhar faz pensar; sistematizar o nexo complexo Lembrar fatos do dia: coletivos lotados; viajantes calados
Será que se têm a noção da relação de produção?
Acordando de madrugada, subjugado ao patrão para ganhar o pouco pão
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Insensatez: agradecer a deus por ser branco, talvez! Pior é que muitos desejam ocupar o lugar de seu par
Um rebanho de oprimidos em um país de excluídos Condomínios adornáveis, favelas deploráveis Tudo legitimado por atos insensatos
Relação de produção e sua imaginação
Justiça: poder de polícia; determinação: poder de opressão
Quando o grito dos excluídos será ecoado no espaço abandonado?
Como lutar com os titereiros comandando os fios dos obreiros?
Quem sabe na próxima jornada não se deseja mais nada D53. Macedônio18
Quisera ser produto da máquina de Macedônio Multiplicadora de relatos e sonhos
Fora do contexto semântico
Produzindo invento quântico
Onde relatos virtuais reproduzem ideias reais
Conceitos imortais de volúpias boreais
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Valter Casseti Delírios
Reinventando estórias contadas Linguagem sonhos e mais nada O relato reprodução da ordem Numa escala verbal da morte Uma réplica da vida
Como palavras mantidas Um universo digressivo Repleto de desvios adutivos
Dotado de paratexto autêntico Fictícios no espaço e no tempo
A ficção como projeto Sem sujeito ou objeto
Um projeto sempre crítico Irregular, polivalente e analítico Centrado na compreensão da identidade Dilacerada, improvisada na ambiguidade Estórias construídas
Formas diferentes de chegadas e partidas Sugerindo sempre incongruências Não se detendo aos absurdos da inocência
Legitimadora de contradições Seguindo o curso de orações
Essa é a emoção que me deve agradecer
59
Ante o desejo de não ser, ou morrer A memória permanece enclausurada No museu do romance da eterna amada D56. Cidadenia
Pelo para-brisa, pelo retrovisor da vida; pelas janelas que cercam o carro, pelas ruas que quebram no estalo; pelas lombadas que passo, pelos faróis que atravesso; pelos buracos que desvio, pelo destino bravio; pelo horário programado, pela ação do estado; pelo cartão vencido, pelo momento indeciso; pela fila enfrentada, pela explicação de mais nada; pela concessão da graça, pelo retorno à praça; pelo local de regresso, pelo limite do verso; pela multa possível, pela orientação emissível; pelo olho no painel, pelo tempo no borel; pela voz metálica, pela explicação esquálida; pelo tempo do fazer, pelo custo ao recolher; pelo recebimento do documento, pela preparação da estamento; pela entrega ao destinatário, pelo tempo do emissário; pela expectativa da chegada, pelo rastreamento na virada; pela decepção na recepção, pelo andamento sem razão; pela expectativa de estar, pela espera do ficar;
60
Valter Casseti Delírios
pelo desejo da obtenção, pela tempo da conclusão; pela concessão da conjunção, pela resposta do não; peloporquêdoagorafazer (?),peloporquêdodesejo de querer (?): peloporquê do tempo perdido(?),pelo porquê de ter tanto corrido (?); pelo porquê de ter começado (?), pelo porquê de ter esperado (?); pelo porquêdeestar aflito(?),peloporquêsenãoacredito (?); pelo porquê do querer (?), pelo porquê de nada saber; peloporquêdoparir(?),peloporquêdoexistir (?)...
D57. Pandemia
Depois de anos de reclusão, deixa de existir compaixão
A medida que o tempo passa não se acha mais graça Mesmo no silêncio da trama, a paisagem reclama
A dimensão do impacto é de se considerar o fato Será que as mudanças não produzem esperanças? Será que não se observou a vacância?
Comércios fechados, outros a serem locados
Abertos só comércio de expressão e igrejas da salvação
61
Esses sim, em franca expansão. Ocupando espaços fechados, para outros fins destinados
Emoutrossetemaimpressão, nemparaigrejasfarão locação
Pergunta do momento: o que está acontecendo?
Nos bunckers, se protegendo de ataques virulentos?
Guerra teria nos próximos dias?
Cadê os invasores, que causam tantos horrores?
Seriam módulos teleguiados...19
Invadindo os inebriados?
Mesmo com esses questionamentos, de antemão se sabia razão
Ou a quem se cabia a responsabilidade do dia O farol fechou...freou. O córtex balançou Interrompeu os sinais sensoriais
D67. Imagens que ficaram
A nau de madeira é guiada pela estrela
Anuncia em silêncio o que plantou no advento Se angustia com a nova ordem do dia
É a rotina que resta, para aquele que empresta Vítima de um sistema, que exclui quem blasfema
62
Valter Casseti Delírios
Morre no além, sem deixar qualquer bem À mãe só resta lutar para os dois filhos criar Lutar atendendo, ao destino do momento Lavar e passar, para uma classe média flanar Subjugação consentida, humilhação reprimida Filhos crescem alienados, pelo modo herdado Um vagueia conformado, no espaço confinado Cumprindo o ritual, de uma herança patriarcal Outro rompe a subordinação, contra a situação Morre a mãe na contramão, sem reencarnação
Um na batalha, com filhos e tralhas Esperado por um mérito desejado Outro se lança na incerteza da vida obreira Questionando dificuldades, para superar desigualdades Suborna a incompetência, para vencer desistência Enquanto um tem como esperança a outra existência Outro não se converteu por se considerar ateu Mesmo na noite fria, não perdem a utopia Momento de reflexão, só se lembram com emoção: A voz do verdureiro contida, defendendo a vida A roupa na prancha, da mulher que não se cansa
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O ranger da tábua de passar, naquilo que se chama lar
Entretida com a radionovela que a faz chorar Espera a hora do filho chegar Quando o descanso prometia Foi embora, sem avisar o dia
D71. Terra goyazes
Goiás, Terra em transe que revela, o mito de Barbarela Curiosa e impessoal, guerreira transexual Enfrenta criminosos galácticos, ditadores lunáticos Onde o tempo não passa, sem pressa, sempre devassa20 Goiás, Fundado nos tristes cerrados, aos poucos atropelado Pela falta de potência, sem ao menos ter ciência Falou mais alta a vontade, de se tornar potestade Ser destaque nacional, ser distrito federal21
Goiás,
64
Valter Casseti Delírios
Na luta dos posseiros, mostrou quase ser guerreiro22 Massacrado por grileiros, ruralistas fazendeiros Pensando ser um dia (!), despertar da utopia
Sem vencer os contrários, sertanejos universitários
Goiás,
Sonho de um profeta aluado, continente inundado23 Soçobrando ao chapadão, tábua de salvação
Só que o mar não chegou, a água quase acabou O grande sertão degradou, o horizonte fechou
Goiás,
Um destino consentido, acabou com nossos índios24
Destruiu a natureza, arruinou sua pobreza Acabou suas certezas, naufragou na correnteza E num último suspiro, só sobrou o desatino
Goiás,
Num golpe derradeiro, pensou ser o hospedeiro
Sem nunca ter partilhado, um paraíso maldado E numa divisão nefasta, Plutão recebeu a devasta De comandar a nação, sem qualquer motivação25
65
D90.Agonia
Acordar sem saber o que fazer Sem qualquer estamento, que mude o momento Sem ter que suportar, a letargia do acordar Um ócio vazio do não, sofrendo estagnação
Abandonado na inércia, decisão da inépcia
Televisão descartável, entorpecimento confortável Depoimento contundente sobre morte latente
Irreversibilidades vividas: estruturas dissipativas Questões da existência, frente a imanência
Dificuldade em levantar, mesmo onde apoiar Só resta arrastar, para ninguém escutar
O consolo de lutar, sem sair do lugar
Notícias do presente, mesmo estando ausente Problemas são os mesmos, eternos defeitos
Intervenções das corporações...
Nações sofrem sanções...
“Imperialismo das razões”
Blocos econômicos questionam o câmbio...
Deságio, apanágio...
Banqueiros pressionam por concessões...
Ampliam-se mansões...
O crédito estimula afinal, o consumo banal ...
66
Valter Casseti Delírios
“Tudo um grande carnaval”
Descartável: lixo insustentável
O medo ativa a indústria de segurança
“Pobres sem esperanças”
Abarrotam presídios, sem prestígios...
A fome grassa nos quatro cantos da praça
Conclusão: a história perdeu a razão!
Prevalece a alienação, dos náufragos da emoção
Sem saber que estavam errados, foram atropelados
Procuram espaços e só encontram embaraços
Consolo da indignação, contradizendo o “não”
Esvazia em pensar, só podendo lamentar
Boiada estourada, fugindo da estrada Diferenças sociais, em busca de novos ideais Áreas de risco programadas, para matar a manada Homens fazem a história, de uma minoria inglória Perspectiva revolucionária, ebulição libertária
Nem mesmo um deus oferece, a opção de uma prece Proliferam drogas terápicas, pelas religiões erráticas Remédios essenciais, para crises existenciais
Anomia de um tempo, do eterno estamento Estado de letargia, que nenhum deus propicia
Imaginou-se a utopia, de um dia que nunca viria
67
A democracia da incerteza, continua burguesa Sonhos lunáticos, de um poder midiático
Fundamentalistas cáusticos, rompem os pactos Entorpecimento pela religião, o crack-solução Redoma imanente, alienação transcendente Na expectativa do sopro divino: ser crente menino Problemas persistem insolúveis, iniciativas volúveis
68
Valter Casseti Delírios
V. DELÍRIOS DOS SONHOS
69
D04. Aldeia e sonhos26
É preciso ter uma aldeia na vida
Mesmo que para abandoná-la
A vontade de fuga de um dia
É recobrada pela melancolia
Até que em certo momento
A memória não suporta o tormento
Desejos e sonhos recorrentes
A volta se torna iminente
A aldeia não é mais aparência
Nem mesmo o sonho essência
Pesadelos latentes se tornam imanentes
Desejo premente do inconsciente Como se o prenúncio fosse exigência
Para cumprir suposta indulgência
Libertar da prisão
O desejo da paixão
70
Valter Casseti Delírios
D19. Pesadelo real
Sucessivas vigílias dolentes, contornadas por sonhos recorrentes
Desafios de saltos impossíveis, lugares instransponíveis...
São tantos que ao despertar, os algozes não estão no lugar
Procuro respostas desencontradas que foram ignoradas
Preferia o sono de Hipnos, os sonhos de Morfeu, com a lira de Orfeu
Pesadelo em livre associação só merece exaltação
A inutilidade dos atos são fatos inatos
Esperando que as janelas da alma, ofereçam noites mais calmas
Caminha e avista o vasto horizonte; antes fosse um monte!
Centrada em seus celulares, ignoram os lugares
A impossibilidade de compartilhar a crítica política que jaz
A alienação não contempla a razão da existência
Sua inocência não respeita a própria indolência
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Cumpre mais uma jornada subordinada Pensa na absurdidade do querer sem desejar o ser Espera por um deus temente que um dia reconheça gente Não sei se são sonhos concretos ou pesadelos abjetos
Melhor arrancar o véu da alienação que clamar por um deus da razão
D20. O sonho fáustico27
Mesmo sendo paralelo, nas cordas do violoncelo O oriente não fica tão próximo como o Próximo Oriente
Mesmo que o sextante polinésio norteie o amnésico Fica distante do perto nascente, ali pelo médio Oriente
O cabo da esperança dormente, vira esperança da gente
O grito das três gargantas, vence a fúria Atlântica Copérnico tirou a autoestima, o crente inocente lastima
72
Valter Casseti Delírios
Elegendo o sol comandante, de um sistema ofegante Nova forma de ver, pensando no próprio ser Azimutaram loxodromicamente a terra inexistente Angulizaram as rotas complacentes dos caminhos inexistentes
Rumando sem desatino, mesmo que sem destino A morte do herói clássico aquiliano, se embrenhou no oceano Deu lugar ao sonho fáustico no insano náutico
Trocando a ambição da morte pelo hedonismo da sorte
(Antes mesmo do pacto neoliberal, tornar prenúncio fatal)
Descartes expandiu o universo e matou o deus controverso
Desencantando o mundo nevrálgico, aristotélicoptolomaico Rimbaud lançou o barco embriagado, no oceano dos afogados Rompeu a alma do inquieto: poeta sempre indiscreto
73
Até que Hubble trouxe para perto, o imenso universo
O oriente ficou mais próximo de Oxóssi
A rota da seda tirou o oriente da degreda Recursos naturais de hegemonias cabrais Mataram em nome de deus criando nativos hebreus Zaratustra falou dos filisteus nas narrativas de himeneu
Subjugaram nações como sádicos, ao prazer dos pobres trágicos
Na mesa imaginária, uma mágica sentença hilária
Tudo ficou mais próximo, do antemeridiano lógico Tudo foi desvendado, no universo esmiuçado
Os segredos foram expostos, como pesadelos opostos
A guerra híbrida surgiu, no espaço que emergiu Algoritmos biopolíticos, ressuscitaram anjos malditos
Tornando os corpos reféns, de um sistema do além
74
Valter Casseti Delírios
D32. Incógnita onírica
Um desenho de autor Convence o narrador
Um observador; cumplicidade
O cativar; amizade
O sangue é estancado pelo emissor Enreda o sentimento da dor
O autor salva o dilema
Sem sequer ouvir o poema
As pálpebras cansadas se fecham Reclamam os silêncios que secam
Feliz por não ter vacilado
E nem mesmo sem ter tido lado Mantendo intacta a moral dividida Antes fosse arrependida!
O socorro vem da indulgência
Para apagar a própria crença
Desejando o prévio clarear
Uma vida sem rima chegar
Em detrimento do lugar
Desejando vir sem estar
75
Mesmo em um lar aviltante Uma garganta sonante
O eco do alento do insano
Ausente do grito profano Levanta da lápide e diz Fiz o possível amigo infeliz!
D52. Sonho impossível
Enaltecer o opressor
Legitima a própria dor Em troca da sobrevivência
Declara infeliz inocência
Mudança que amplia Desigualdades amargas do dia
De um lado minoria abastada Do outro, reserva ampliada
O paraíso contaminado Pelo opulento execrado
Desejo de emancipação
De uma nação em gestação
Antiga lição malthusiana
Que não se esgota enquanto engana
76
Valter Casseti Delírios
Anunciando a reencarnação
Desejo de solução Pacificação dos conflitos
Dos pobres e dos aflitos Reequilíbrio nas relações
Dos desprovidos de apropriações Nova ordem imposta
Realidade nefasta
Drogas arrebanham e aplacam Forças residuais que atacam
Desejo de superação da letargia Ação messiânica de todo dia
Reedição de um deus apócrifo Novo herói escatológico Nesse lamaçal de vingança
Não resta nenhuma esperança
Domínio oligárquico presente
Mantendo alegorias ausentes Vence pelo cansaço maldito
Cancelando o desejo bendito
Até que novas esperanças
Se transformem em vinganças
Mais uma vez prevalece
77
A eterna estupidez que padece Entorpecida pela fetichização Mantendo a alienação Pacificando o novo domínio Ampliando o futuro exímio
Quem sabe o que está submerso Desperte o desejo reverso Origine a transvaloração sonhada Uma vontade desdenhada
Lideranças eclesiais Insubordinações imorais
D55. Recorrências oníricas28
Privadas transbordando, cômodos inundando... Casa desarrumada, coisas espalhadas... Arrumação parece não ter fim; o que será de mim?
A medida que ajeito um lugar, outros ficam a desejar Fujo de não sei o quê, sem mesmo saber o por quê Caminhos que se bifurcam, labirintos que se transmutam Defronto com o perigo, sem saber qual o castigo Consigo me desvencilhar, sem me libertar
78
Valter Casseti Delírios
Perco a esperança no caminho, procuro e não encontro o ninho
O passado sempre presente, sem querer ver essa gente
Dono de um suposto destino; alforria em desatino Outras questões aparecem, como se fossem preces Serviços cobrados, sem a certeza se foram prestados
Diálogos infindos com devedores, que negam horrores
Procuro o carro estacionado, em lugar não encontrado
Procuro a bicicleta: será que foi roubada (?), sem saber se foi deixada
A fuga do inimigo; não sei se teria sentido
É tudo muito confuso, parecendo muito escuro
Lembranças distorcidas, significam a própria vida Confusão: sintomas de depressão?
Os sonhos recorrentes, cobram as dívidas da gente Fenômenos psíquicos em associação, que merecem compreensão
Um divã para aclarar, ou janela para fechar São sucessivos conflitos, que tornam sujeitos aflitos
79
Porta aberta do inconsciente, para o real caminho latente
Enquanto o manifesto imanente, expressa o enredo presente Resultado iminente, que apela ao onipotente
D82. Sonho barroco
Sempre se fala no “fim dos tempos” sem saber em que momento Seráodiadaressurreição?Ouincertezadaprevisão?
Será quando a trompete soar? Ou quando o apocalipse chegar?
Como diz o deus de Zacarias, o senhor de Isaías: Até quando terei que esperar? Em que lugar?
A cidade envelheceu em rugas; paredes cansadas, descaiadas, sisudas Fissuras gretadas, manchadas pelos fungos, que começam a roer os fundos Nessa multidão de imagens, o destino dos lugares Marcados por provação de uma nova inserção
O nível das águas subiu e ninguém viu
As ondas se tornaram agressivas, ceifando as pobres vidas
80
Valter Casseti Delírios
Romperam-se pilares, paliçadas, estruturas escoradas Caíram as obras plásticas das arquiteturas bombásticas
A cidade foi sendo engolida por águas turvas da vida Uma grande tristeza se abateu: Prometeu morreu
D84. Pesadelo
Uma questão não tão relevante, assume expressão malsoante
Estaria ou não no limite da intervenção?
O prólogo induz, a uma comprovação que seduz Caminha por rotas desconhecidas, sem previsão de saídas
Num sobe e desce de corredores labirínticos, como se fossem invictos Sem um rumo definido, escuros caminhos perdidos Trajetos desconexos, sem nexos ou reflexos Desejo de comprovar, o que se tentou sustentar E num ímpeto involuntário, se vê em um guindaste hilário
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Alçado no anonimato, na iminência de queda ao vácuo
Sem coragem para ver o chão, dada a escala da reversão
Supõe-se que nada pode querer, sem saber o acontecer
Um componente macroestrutural, entra em distúrbio fatal
A corrente que o corpo sustenta, vai contra o comboio que inventa
Um gancho de dimensão descomunal, balança em espaço fetal
Sem saber o que aconteceria, só se espera que termine um dia
E num recurso mensageiro, o gancho fisga o hospedeiro
Suspira de alívio ao embate traiçoeiro, que supunha derradeiro
Só resta a resistência da vida, para alçar a estrutura perdida
Mais uma vez em balanço se lança, na certeza da desesperança
Como se fosse um milagre de zelo, subitamente rompe o pesadelo
82
Valter Casseti Delírios
O véu real do degredo leva a sonhar sem medo D87. Sonhos indecentes
Quando o passado atormenta E não existe razão para a interpelação Ruídos perturbem a ordem, arruína a própria sorte Não se espera respostas, nem conclusões repostas O que precisa é a paz, para não se sofrer mais Mesmo que perturbado, é preciso deixar de lado
Sabendo o que pode ser feito, sem produzir defeito Depois de tanto tempo, pensar no exato momento
Não parece existir razão, que dê satisfação Mesmo atormentado, é preciso deixar de lado Mesmo sem razão, não carece de compaixão Mesmo na incerteza, é preciso se ter clareza Foi feito o possível, para superar o sofrível
83
D88. Afrodite
O passado interrompe o pesadelo, para um novo desvelo
O desejo chama para o leito, o que ficou escondido no eito
A cama no amplo espaço, é divisada por pedras em abraços
O cheiro lascivo improvisa, a onírica espera indecisa
A sede de amar é marcada pelo intento, que retroage nesse momento
No desespero da paixão, aos poucos vai escapando a mão
Preparando o corpo ao lado, como se fosse o primeiro ato Acaricia apelecomloção,uma fragrâncialevantado chão
Eis que surge na alcova do desejo, algo estranho que prorroga o ensejo
Contrariando a ordem da natureza, surge a proeminência de uma ingrata surpresa
Nem Homero teria solucionado, a surpresa do desesperado
84
Valter Casseti Delírios
A longa espera do momento, desfez numa lufada de vento D98. Vermes
Como seriam classificadas as imagens imaginadas?
Mesmo que parecidas ficaram dúvidas imperativas Seriam nematelmintos, filarias ou platelmintos?
Não parava de sair das entranhas, muitas misturas estranhas
Imenso depósito de vermes, expulsos de um corpo que ferve
Não sei se padecia sem saber que morria, ou se morrendo vivia Também não sei se isso existia, pois força não mais teria
O esforço da expurgação, não buscava qualquer razão Também não sei se seria pecado, o resultado expurgado
Os vermes saiam das fístulas como se fossem pústulas
Não tenho certeza da purificação, tudo era podridão
85
A impressão é de que um dia acabaria; sem saber quando seria
Um corpo de invasores paria; seres repugnantes que temia
Respirava melhor a cada contração, filhos gerados na contramão
Monte crescia aturdido, enquanto vermes expelidos Polígonos no chão, pareciam ondas em convulsão Como se fossem amebas, reproduzindo sem trégua
Um monte que continuava, não parava, nem cessava Parecia não ter fim; um pesadelo ruim
Exaurido pelo cansaço compulsivo, o parto foi interrompido
Aliviado por achar que acabava, o que acabava e começava
86
Valter Casseti Delírios
VI. DELÍRIOS DOS CONTRÁRIOS
87
D13. Retrospecto do espectro29
Depois da relutância de uma curta infância Carrega o peso da tristeza, resumo da pobreza O trabalho cedo do dia, fundado na apologia Moral inscrita, razão que ínsita Deficiência de cognição, atribuída à limitação Marcas na carne, carênciasprementes e permanentes Desejo de ter vencido, um saber desconhecido
Carências expostas, humilhações nas costas Restou baixar a cabeça, sem reação que ofereça
Num ímpeto derradeiro, coragem de aventureiro Fazendodaastúciainventada,umarespostafraudada Só resta encarar os fatos, condenando os próprios atos
Desafios supostamente vencidos, falsamente absorvidos Autocrítica esquecida, autoestima embevecida Etapas superadas, humilhações rechaçadas Esconde o deficiente, à crítica imanente Suborna seu próprio ditame, tentando esconder o vexame Sem dar tempo a penitencia, assume em resistência
88
Valter Casseti Delírios
Abandona desafios prementes, preservando imagens latentes
Perdas de oportunidades irreversíveis, limitações inconcebíveis
Encerra a carreira, escondendo a frágil barreira
Vida abandonada, em nome de aparência forjada Manter a imagem, para preservar a farsa paragem Sair com honrarias, mantendo a falsa ufania
Antesquetermineopleito,melhormorrerdessejeito Na encenação da vida, melhor deixar a guarida
Antes que o pano caia, antes que a vida esvaia
D15. Navegar é preciso30
Navegar é preciso Pela exata precisão Viver não é preciso Inverso à navegação
Na vida nada se cria
Nem mesmo para navegar Para poder um dia Outras terras conquistar
89
Mesmo não sendo preciso Quem sabe o timoneiro amigo
Dono do próprio roteiro Escolha caminho alheio
Mesmo que se navegue Sem lugar para ir Importante é o que se persegue Sempre o próprio partir Cruzar oceanos plenos
Buscar novas moradas Beber seus próprios venenos
Epopeia de viagem sonhada Viajar por eternas rotas
Em busca da contradição
Derivar por correntes remotas Mesmo sem ter razão
A poética dos lugares Faz dos gregos sonhadores Epopeia homérica dos mares Heróis conquistadores
O mar convida os fortes
Para a arte de navegar Desafiando a própria morte
Dispostos a sempre ousar
90
Valter Casseti Delírios
Cruzando o inexistente Promontórios resistentes Vencendo dragões ausentes Sem temer o onipotente
O argonauta esperado
Navega, deriva e naufraga Tem o caminho cortado
Na espera de quase nada Como artifício a amada Espera tecendo o sudário Chora, promete calada Desmancha, eterniza o lendário
Protela desejos terceiros
Na esperança do novo alento Sabendo que o grande guerreiro Vencerá ocultos tormentos Mesmo que não leve a nada Mesmo com prepotência É longa a extenua jornada
A vida pede paciência
91
D22. Paradoxo dos contrários
Deito, dormes; acordo, se foi Volto, fostes; busco; desejo; anseio, versejo Almejo, não encontro; vejo, bordejo
Resta esperança; desejo de vingança
Incompleta, desagrada; utopia conflagrada Negação da mais-valia; progressão da distopia
Preconceitos sem razão; universo em expansão: Razões dos atos, dos fatos, dos natos inatos
Hipérbole da vida; eufemismo em dinamismo
Mensagens se contrapõem; segredos que se expõem Bólido como sólido, me desmancho no ancho Ser objeto inanimado, espaço limitado
Sem vida, sem solução, sem freio, sem coração Paredes reprimidas, sem saídas permitidas
Resta consolo do canto, sem tempo para descanso Sem esperança de esperança; sem ida nem vingança Sem esperança de desejo; sem promessa de ensejo
92
Valter Casseti Delírios
D25. Nostalgia31
Como em uma mágica, Tarkovski expressa o desterro do enlevo
A nostalgia se funde, perda do objeto que infunde Lugares atópicos e distópicos, suspensos entre terras e tempos
Um vazio incondicional, de uma latência existencial A loucura como memória arguta, a voz que não se escuta; transmuta
No limite do humano, como anjosdecaídos, umdeus para os pecados, outro para os perdidos Sentido inescapável, de uma eternidade de crenças, ultrapassa a própria demência
O mundo como caverna, com vozes entre vultos, como se fossem insultos Mulheres murmurando aos pés da santa, desejando fertilidade, em mantra Imagens esfumaçadas se fundem, se confundem... Condensando lugares, épocas diferentes, com atmosfera onírica presente
Representações inertes de labirintos indistintos, passando por lugares extintos
93
Rupturas que expressam, sentimentos intuídos, sempre indefinidos
Ao mesmo tempo um louco nas águas carrega, fogo morto que fumega
Como Prometeu, entrega o conhecimento, condenado pelo advento
A chama ultrapassa o corpo, desaparece ao bufar do vento, registrando um único momento
O recomeço manifesta a vontade primordial, como estamento moral
Ressurge o peso das lembranças, até promessa da desdita esperança
Final do calvário, com sintomas pulsantes, tensões em sons radiantes
Em um sentido imanente, a fé ausente se acende Um desejo contagia, a indecifrável elegia
A imagem hipnotiza, sequências míticas da vida
O louco em ideação suicida prenuncia, a Ode à Alegria
Só resta o sonho desejado, o colo materno desencantado, do eterno desterrado
94
Valter Casseti Delírios
D28. Retalhos heraclitianos32
Na dialética da vida, o ser representa a partida Ser o que se forja, na contradição que entorna Sequências que se abrem e se fecham, mas sempre se conectam
Todas a narrativas, palavras e atos, resultam de fatos Água do rio não mais sendo, tudo muda: irreversibilidade do tempo
Mesmo tendo algum tino, pensa o caminhante ser dono do próprio destino
Como a rolha que deriva nas águas alucinadas, o ‘logos’ nunca foi nada
Como um barco embriagado, decisões naufragadas, malfadadas
Tudo flui, tudo tem deslocamento, conceito de movimento
Como adultos edípicos os sonhos são elípticos Depois de procurar o universo, encontra-se o inverso
Por caminhos desconhecidos, marcas utópicas do destino
95
Um sentido que culmina com o mito da morte, aplacado pelo desejo da sorte
A morte negando a vida, no instante da nova partida
Na imobilidade da morte, a vida reclama a sorte
No desespero do futuro incerto, a imortalidade é desejo aberto
Não dando respostas aos filósofos de plantão, as moiras tecem a indignação
Em busca demente, procura desesperadamente, sepulcros indigentes
Na interpenetração dos contrários, a negação busca o sacrário
D39. Tempo indefinido
Só o tempo separa a vida da morte Tudo é uma questão de sorte
Mesmo que vivendo vem do passado
O destino marcado não é revogado Viver é perigoso quando idoso
Mesmo sendo duvidoso
96
Valter Casseti Delírios
A busca transcende limites ausentes Mesmo estando presente Mesmo questionando a existência
A presença é pura imanência
O sentido se torna finito
O suplício é sempre maldito
A verdade suprema é efêmera
Os fatos sensatos, dilemas
Desejos como simples lampejos Imagens como ensejos
É preciso espaço possível Sendo o tempo irreversível
D47. Arte dos desencontros
A vida é feita de contradições Muitas vezes adversas
Outras vezes incontestas
Às vezes até funestas
A sorte é saber o que dizer
A arte de amar, aprender e respeitar
Saber pensar ao dialogar
Tornar repleto o silêncio deserto
97
Momento certo no lugar aberto Deixar reticências para a eloquência Supondo apreender sem saber Tornar a vida oficina divina
Fazer da sintaxe a praxe Contrapondo sem perder o ser Sabendo difícil ser e ceder Ser podendo fazer Só resta ao sábio sonhar
Esperar a vontade chegar Aprendendo esperar sem malfadar Perdido no oceano sem plano Vida e morte, extensão do tempo forte
D48. Acaso e descaso
A natureza tolera o humano profano Mesmo que seja a mais nobre certeza Vida degradada, impostora fadada Inconsequente, desimanente Testemunhos pretéritos, avanços deletérios O passado sem precedência, tamanha imprudência Universo sequente, inconcluso, demente
98
Valter Casseti Delírios
Fontes do nascimento, estruturas em aquecimento No vácuo quântico do nada, partículas virtuais imaginadas
Nada escapa da atração, do buraco negro em suspensão
Um mundo irreverente, com probabilidades diferentes
Matérias dissipativas, sempre ativas
Dilemas no infinito, ativados pelo atrito
Forjando planetas, bailando, supremos cometas
Meteoros preservados na sequência dos fardos Bancos de dados complexo, arquivos disléxico Sem excluir imperfeições penadas, das almas cansadas
Escarificadas nas paredes dos pensamentos em rede Realidade que expressa, partículas da vida regressa A seta do tempo irreversível, o espaço instransponível
Buscando respostas prementes nas decisões insurgentes
Se não respondidas, só resta questionar a vida
99
D91. Um dia disse
Marcou data da partida Esperando ser mantida
O dia foi chegando E a vontade passando Chorou por estar sozinho
Abandonado no próprio ninho
Como se fosse um menino
Que nunca tivesse partido Pensou nos transtornos Juntar tralhas do entorno
De não esquecer pertences
Nem mesmo escovas de dentes Pensou no que ficaria Gatos, pássaros, alvenaria
Pensou no que viria
O abandono que sempre teria Pensou no conforto do lar Mesmo sem ter o jantar Pensou ter liberdade
Mas não tinha mais idade Na hora da prescrição
A indecisão assumiu a razão
100
Valter Casseti Delírios
Então foi ficando...
O tempo passando...
Não se deixou sozinho...
Apenas se abandonou... Até que foi...
Ficando, ficando, ficando...
D96. Chegada partida
Contava minutos para a chegada Contava segundos para a partida Chegada sempre ansiada Partida sempre sofrida
Um tudo para a chegada Um nada para a partida Partida na madrugada Madrugada sempre sofrida
Espera da eterna chegada
Um dia partiu sem ter chegado Nunca mais chegou sem ter partido
Não contava mais minutos
Nem segundos contava
101
Um passado tão ansiado Um apagado passado... Nunca chegado
Nem sequer existido
Nublou sem ter podido Partiu sem ter morrido Morreu sem ter partido
Sem ter partido e nunca esperado
Sem ter esperado e nunca chegado
Sem ter chegado e nunca partido D.97. Concreto abstrato
A concretude do concreto concretiza a construção coletiva
A mesma que não se amassa na esperança que se amassem
Como se amasse o pão exaurido, que nunca sequer dividido
Um sonho sempre fendido, nesse concreto jamais partido
Erguido na longa esperança, de aumentar a própria vingança
102
Valter Casseti Delírios
Vingança que se desfez, sem que chegasse a vez de um talvez Manter o poder para os quem detém, desejo dos que nada tem, ou convém Argumentos nefastos, para alicerçar a estrada que não leva a nada Só o desejo da arte de quem padece, imaginando salvar-se com prece Com pressa de ficar rico sem saber como é que eu fico
Ficar sem dizer nada, na esperança de cantar a pátria amada
Terminada no concreto, do imaginário indiscreto, do corpo de desejo insurrecto Concreto do jazigo, que prende o eterno inimigo, em permanente castigo
103
VII. DELÍRIOS DO CORPO
104
Valter Casseti Delírios
D16. Dilema do ensaio33
Tentou-se criar, para não “repaginar”
Concluiu que a releitura não era aventura Partiu do nada, sem nada programar
Esperando alguma luz, que viesse iluminar Mesmo sem pretensão, tentou-se imaginar; em vão! Mesmo achando expressionista, posou de surrealista
Relógios derradeiros, se derreteram em limoeiro
Grito das profundezas clamaram por incertezas Mesmo diante da abstração idealista, definiu-se iluminista
Um novo parâmetro de luta, implorou por nova conduta
Algo a ser esboçado, mesmo não programado Começaram as primeiras impressões, vencendo as disjunções
Figuras geométricas nasceram da estética Rabiscos desfeitos deixaram marcas de palimpsestos
Tentativas sucessivas foram pervertidas
105
Por mais que se buscasse a expressão, não cativava a emoção
Os olhos fechados, lábios manchados, tudo estereotipado
Depois de várias tentativas de superpor imagens inventivas...
Depois de diluir, clarear, redefinir novos traços em embaraços...
O suporte se desfez, mais uma vez
Num último recurso, a imagem desfigurada foi restaurada
Pura estupidez, não seria dessa vez Mesmo derretido, o relógio ficou invertido Sem precedente, expressou-se ambivalente
Sem se dar conta do instante, manteu-se insignificante
Apesar da insistência, prevaleceu a incompetência Na insistente incerteza, abandonou a própria peleja
D17. Expressionismo34
O que seria da vida não fosse a arte nascida?
Expressionar com o grito de Munch?
Entorpecer com as cores de Rembrandt?
106
Valter Casseti Delírios
Admirar à introspecção de Goya? Embriagar nas cores de Matisse? Condoer na “miséria” de Gogh? Ater ao lírico poder de Kandinsky? ***
O expressionismo fundou a base instrumental da arte visual Liberou emoções sem impor limitações
Rompeu com a romantização medieval que parecia imortal
Projetou o cubismo como arte suprema, e suas verdades dilemas
Enunciou a complexa sutileza do ser em relação ao poder Deu ao surrealismo, o eterno inconformismo
Como na velha ciência, expressou a sua essência, suplantando a aparência
O fim da impressão das verdades, pelas reais possibilidades Explorou a psique humana, em ato que imana
107
Substituiu o controle consciente da realidade imanente
Transformou a expressa em razão, Desconstruindo a submissão
D30. Sentimentos reprimidos
O dissimular da realidade do mundo, está centrado no estado profundo Corporações aliciam multidões, legitimadas por instituições
Mantendo o ideário perverso, reproduz desejos funestos
Estado aliado ao mercado, compartilham o mesmo pecado
Exaurem as parcas forças que restam, dos que não enxergam ou contestam
A manutenção da histórica dominação, não alterou a lógica da razão
Usam velhas práticas imorais, legitimando escravidões ancestrais
Suplícios dos indigentes, se perdem no deserto latente
108
Valter Casseti Delírios
Ações perversas de fascistas dementes, minam as forças jacentes
Recrudescem incertezas, destruindo sonhos da pobreza
Fundamentos da nova ordem, reproduzem coveiros da própria morte
Malthusianismo vulgar recrudesce, excluídos em risco padecem
Abençoados pela ordem criacionista, prevalece o desejo escravagista
Desejo do armagedom é o que resta, para contrapor a ordem funesta
Uma batalha fatal, contra a paz universal
D31. Tarde demais
Não chegue tarde; a noite termina
O corpo padece, a névoa já fina Mesmo que não Inibe a visão
O escuro do quarto, nubla a memória
Os dedos tateiam, apalpando histórias
Procura presença, levanta o joelho
109
Só encontra resposta, atrás do espelho
A noite se finda, o dia amanhece
A névoa se vai, a vida fenece
Vazia presença, vagueia esperança
A noite projeta, a nova vingança
A coragem do dia, à espera de outra
O tempo acelera, e nunca mais volta
Um corpo perpassa, o véu mais profundo
Um raio atravessa, descobre se imundo
D58. Com a garrafa na mão
Na mão esquerda a vontade da embriaguez, que aplaca a insensatez
Na mão direita o barman que aplasta, dizendo “basta! ”
Na mão esquerda a voz que implora um agora
Na mão direita a voz nega, sonega
Na mão esquerda a vontade do fraco, em nome do Baco
Na mão direita a traição, sem tempo para a salvação
Na mão esquerda a equidade, em nome da liberdade
Na mão direita o decreto, que impede o mesmo teto
110
Valter Casseti Delírios
Na mão esquerda o porquê, sem saber o que fazer Na mão direita a censura, que ignora a amargura Na mão esquerda a insistência, apelo à indulgência Na mão direita a prepotência, resposta a leniência
Um ato que implora por liberdade, desejo e amizade
Um ato que impede a compreensão, ausência da razão
Um ato que luta por direitos, sem preconceitos
Um ato que impede o desejo de pensar, de gozar Um ato que preza, afaga, abnega
Um ato que impede a vontade de expressão: obsessão
Um ato que implora, pelo gole que demora Um ato que cala; Até que concede a dose...
E mata de over...dose
D65. Eu me basto
Me basto diante das minhas contradições e ilações Diante de meus conceitos, preceitos e defeitos Pelos erros e acertos, sem quaisquer proveitos Me basto por conter, meu próprio desejo de ser
111
Por não controlar meus instintos imortais, naturais Mesmo diante, de uma prática alucinante
Me basto por me autoconhecer, sem saber
Por me considerar suficiente, enquanto ausente Supostamente carente, de manifesto latente
Me basto por ignorar conselhos, opostos aos meus conceitos
Por me indignar com a diferença e premência
Sem direitos e defeitos, mesmo sem ter proveitos
Me basto por sonhar, com a possibilidade de lutar
Pornãoacreditar naintenção,desuperaraingratidão
Em um engodo moralista, supostamente existencialista
Me basto por não acreditar no poder exercido, pelo mercado proscrito
Por não confiar e nem acreditar, só no particular
Nem mesmo nos ditos irmãos, que se julgam pagãos
Me basto em não acreditar em um deus, que não seja ateu
Por ter que acreditar, em pessoa bajular
Ou mesmo em promessa institucional, de igualdade social
112
Valter Casseti Delírios
Me basto, amanhã deixando a vida, triste pela história renhida
Por saber que nada fiz, para a tal pobreza infeliz Nem mesmo pensar, em alternativa a pleitear Mebastoporpedirdesculpas,paraaplacar asminhas culpas
Por ter existido, sabendo que nunca fui lido, em qualquer sentido Eu me basto!
D68. Reflexos
Me olho no espelho e não me vejo diferente, por não ter referência imanente E mesmo que enxergasse resultado, me viria inalterado
Mas o espelho adverte e me desmente, em minha frente
Mostra as rugas que se aprofundaram na face, realçadas com o desembace Além de outra que existia, sem que percebia um dia
113
A barba de náufrago de um barco náutico, embriagado, errático
Será o espelho obstacular que deixou de mostrar a realidade secular?
Na sobridez, nem mesmo a presbiopia mascara a miopia
O efeito do tempo é mutável, mesmo se achando imortável
Abro e fecho os olhos de antanho, buscando o engano profano
Chego à conclusão de não dizer não à ilusão: a imagem não é utópica nem fotoshópica
Sem coragem de comparar e arquivar, na irrisória memória
Me pergunto sobre as razões das deformações, procrastinadas pelo tempo a todo momento
Me perguntosobre apossibilidade, de novaforma de pensar ou tentar imaginar
Mesmo sabendo que o tempo não apaga o passado, para novo enunciado
Acordo com a sensação de que sofri e não dormi, um só instante nesse levante
Faço de uma forma maquinal, operação racional, clandestina da rotina
114
Valter Casseti Delírios
Sem mesmo ter planos para o dia que inicia, já sinto a desalegria Sempre haverá razão, para fazer o que deixou de ser feito pelo defeito Abrir, fechar portas; fechar, abrir janelas; limpar, sujar, sujar, limpar, fechar; molhar, arrumar; Escrever, reescrever; ler, desler; calcular, recalcular; pensar, ignorar...
Ações que fazem parte da história inglória; aos poucos lesada; questionada:
Qual a essência da vida se não existe partida?
Que razão justifica a sucessão habitual, da desação maquinal?
Qual a razão de se repetir, de forma continuada, sem dizer nada?
Mesmo na pandemia prorrogada, não existe mudança acordada?
Mesmo sem influências externas, as internas são insuficientes e indulgentes
Na repetitividade insolente, qual a contribuição para a história da gente?
Aí se pergunta: qual a entrada se as portas estão fechadas?
115
Aí se pergunta sobre o quê, se não existem porquês (?)
Que amanhã não terá divã, nem mudança de rotina da linha (!?)
O que fazer para que haja uma mudança, que dê sentido à esperança?
O consolo da absurdidade sisifiana, carece de quem proclama:
Rolar a pedra morro acima, com a força feminina
Voltar à base, até que a força retomada, leve ao objeto do nada
Descendo pensando na vida, sem ainda considerar a subida
Jornada que nunca termina, até que as forças exauridas, impeçam novas subidas
Sem subida ou descida, finda o projeto de vida.
116
Valter Casseti Delírios
D79. Limites da paixão
Sei que tens razão, mesmo dizendo não Sei que destituir da censura, não passa de uma aventura
Não existe desculpa para justificar o enlevo, de um louco enredo
Mesmo considerando as anomalias da alma, em um momento de calma Só resta perdoar a si próprio, como impróprio
Mesmo que na dormência, a história tenha relevância
Irrelevantes são os distúrbios de momento, no próprio tempo Mesmo sob o império da força, não justifica a morsa É preciso esconder a emoção, para conter a paixão Mesmo que a resistência moral, não seja original Contraponha a desculpa da estupidez, mais uma vez Que esta seja reconhecida; ao menos destruída Dialogar com sabedoria, superando o absurdo do dia
117
D83. Madrugada
Mesmo sem esperar, o dia antecipa o chegar Não existem razões para despertar, precipitar... Parece que algo assalta, sem sentir sua falta É como se precisasse de um ensejo, para aplacar o desejo
O corpo pede companhia, para superar a agonia
Não precisa ter rosto, para quem sofre desgosto Nem precisa ter nome, para atender ao telefone
Basta estar presente, mesmo estando ausente
O vulto faz a diferença, na penumbra da aparência
Ler não supera a ausência, que desfaz a imanência
Só resta levantar, para novo dia enfrentar Assim se caminha, esperando a nostalgia
Sórestaorastronacama,comtochasemplenaflama Abroaporta,oventoentra,ocorpo arrepiaelamenta O tempo passa, o espaço estilhaça, a vida simplesmente... esfumaça
118
Valter Casseti Delírios
VIII. DELÍRIOS DO SABER
119
D35. Alienação35
Pagou por algumas diabruras, sem conhecer amarguras Quanto mais calado aguentava, mais o corpo suportava
A mãe dos mártires convocada ironizou, mas nada mudou
Os dias continuaram nublados, sem uma fresta, mesmo que fosse modesta Caminhando na calada, buscou sol na outra calçada Falava com defuntos, brigava com moribundos Voltaram os vingadores, com nova onda de horrores Saíram do centro da terra, para difundir males da guerra Entrou no corpo, avançou por entranhas, de forma estranha
A existência foi superada, por forças rasgadas Maldição de nada ter, feliz por nada perder Quantos se mantiveram na fila, esperando nova partida!?
Só resta pedir ajuda a um deus, que dizem gostar de ateus (!)
Desculpa!? De quem é a culpa?
120
Valter Casseti Delírios
Trabalho que se faz, sem saber a quem apraz por aprender Desconhecendo o parceiro,deixando de se expor por inteiro
A sobrevivência obriga, ao desconforto da vida Sem tempo para sonhar, nova luta encadear Pensa no dilema; é despedido, continua maldito Procura lugar para poder morar, sem nunca encontrar Estrada sempre bifurcada, que termina sempre no nada Reclama do corpo inerte, mas não se subverte Cada vez com menos sorte... mais próximo da morte Numa dessas madrugadas, imagina a boca fechada Coração parado, sangue estancado
Sem que aborte a própria morte, acreditando na sorte Prefere deixar a alma, em algumlugar que se acalma
D59. Ser mãe
Ser mãe é padecer num paraíso, indiviso
Um paraíso presente, do desejo onipotente Cabendo à mulher, dar para gerar
121
Assim se fez a humanidade, em nome da cristandade Sem que fosse compreendida, a dupla jornada da vida
Submissão primitiva, herdeira da costela excluída Tirada do encaixo, de propriedade do macho Cujo desejo divino, legitimou seu destino Rever necessário se torna, a escritura da desventura Rompendo o domínio machista, de base capitalista
Que subverteu a emoção, em nome da produção Só resta matar o criador, destruindo o mito do horror
D60. Galdino36
“A terra é pra quem nela veve e é habitado sobre ela”37
Galdino, boiadeiro, profeta, sertanejo, curandeiro Respeitado nos rincões dos desalmados Como conselheiro, grande herói dos limbeiros Comosupostoserfútil,tornou-seabsurdoporserútil Como profecia, tinha “a terra como dádiva divina”
Na esperança de um dia, “para quem nela vive e caminha”
Amarrado, foi exibido, como triunfo ao submundo
122
Valter Casseti Delírios
Polícia capataz de fazendeiros, jagunços e grileiros Apropriaram e expropriaram arrendatários e posseiros
Galdino, elemento ativo, considerado nocivo Condenado, indesejado, inimputado... Imagemépicadocangaço,aomessianismodolapso Transveste do romantismo lunático, ao utópico errático
Folclorizado como capaz, de ostentar valentia apraz Da justiça militar, ao manicômio sentenciar No sanatório judiciário, pagou pela ironia, da igualdade de um dia Oito anos de reclusão; por tribunal de exceção Médico sustenta, a medida que lhe ostenta Concebida pela elite dominante, de uma burguesia ruminante
Acepção de um contrato estatal, atendendo ao bemestar social Galdino esculpe nos dedos, nas palmas das mãos Gestos, apoio e combinações
Depois de libertado, jardineiro, pobre; coitado! Morreu desassistido, como não tivesse existido
123
Poema da Terra38 (incidental)
“E o capim matou as roças Antes dos pobres colher Muitos coitados ficaram
Sem recursos para comer Crianças morrem à míngua
Sem remédios para beber
A agitação que fizemos
Foi de tudo denunciar Essas grandes injustiças
Que os pobres vinha esmagar Com tamanha crueldade
Que dava horror presenciar”
D61. Zé Porfírio39
Foi na década de cinquenta, pelas bandas do Tocantins
Em Formoso reinava João Soares, homem forte dos grileiros no combate aos posseiros
Em Trombas, capital dos posseiros, tinha Zé Porfírio; guerrilheiro
Trabalhadores vindos dos sertões nordestino, fugindo da seca-destino
124
Terras até então devolutas ocupadas por quem vivia na labuta
A estrada de ligação40 despertou interesses de ocupação
A terra dos posseiros foi ameaçada pelos grileiros Com a participação de cartórios, juízes e advogados, documentos foram forjados Zé Porfírio e Geraldão se preparam da iminente invasão
Primeiras investidas, saque da produção com posterior judicial decisão Forças milicianas dos grileiros, comandaram a invasão dos posseiros
O dito “incidente” foi noticiado: “invasão de fazendas por bandos armados” Na capital, posseiros foram apoiados, por sindicalistas e partido comunista Forças policiaissaíramem marcha, namadrugada de abril, para a operação vil Armados com arsenal pesado prenderam mulheres e crianças, sob pressão e rendição Oficiais marcharam para acabar com o pouco que restou
A reação dos posseiros não demorou
Valter Casseti Delírios 125
Depois de muitas negociações, o governo garantiu a provisão
Posseiros tiveram direito a ocupar o próprio chão Zé Porfírio, deputado eleito, seguiu o seu eito Dois anos depois, com a ditadura militar Desapareceu para não mais voltar
Catarino, bom violeiro, fez a “moda dos posseiros”, que levou Soares a prendê-lo, quebrando o seu “caixote” e fazendo, literalmente, comer um sapo
Moda dos posseiros41: “Camponeses de Goiás, Falo mal, peço perdão, Mas se não falo bonito, Eu falo com o coração Minha voz é um protesto Contra a fome e a exploração
O grileiro, minha gente, É a maior flagelação, Tira o que se tem, Sem deixar um só tostão, Ranca o olho, chupa o buraco, Corta a perna e come a mão”
126
Valter Casseti Delírios
D63. Tem dias...
Tem dias que a gente sente, que a vida se tornou latente Não só pela indução inercial, como pelo desejo mortal Mesmo sem ter cumpriu, o que foi pretendido
O desejo enfraquece, o corpo padece: Angustiado, sem lugar para estar Nessa hora é que se pensa, que se ficou às expensas Mesmo sabendo que se sumisse um dia, diferença não faria
Aí vema dúvida cruel: entre o ir e oficar, para saldar Entre o partir para a “eternidade”, ou retornar à iniquidade Com os pés no dormente, entre os trilhos da ferrovia indolente
Esperando o apito anunciando, à estação do pecado Como se o tempo não passasse e o imenso relógio quebrasse Comissário sonolento, esperando chegar o momento Passageiros ansiosos com o atraso, ... sem prazo
127
Olham para o relógio no pulso, que pulsa acelerado, descompassado
Não acreditando no painel em transe, que derrete em lance
Relatividade do tempo, questiona a esperança com perseverança
Enquanto me mantenho doente, deitado em pleno dormente
Imaginando que o tempo tenha parado e a terra não mais girado
Penso na possibilidade detransformação, da vida em retração
Edificações caindo por gravidade, em instante brevidade
Terremotos virão, placas se manifestarão Tenho a impressão que flutuo; ou me excetuo?
Não! Pessoas ondulam, suas falas modulam Tudo não passa de imaginação; ou não?
Trem apita, anunciando a aproximação que crepita Passageiros se agitam. Eu, ansioso, aguardando o embarque desastroso
128
Valter Casseti Delírios
Ainda não me decidi se darei passagem ao trem que vem...
Ou se ele passará sobre o destino do menino
D72. Que importa?
O que importa:
Se a aparência, matou a essência da carência?
Se não existe espaço sem matéria nessa artéria?
Se a matéria inexiste no espaço em colapso?
Se o tempo e espaço, caminham no mesmo compasso?
Se o quantum falado, é energia para a mudança de estado?
Se a fenomenologia influenciou, o existencialismo que vingou?
Se o identitatismo subornou a ideologia que restou?
Se a semântica ontologizou a narrativa que sobrou?
Se a fetichização acabou na entrada, de uma luta armada?
Se o preconceito culturalista, levou ao defeito personalista?
129
Num mundo de aparência, a essência do ausente está sempre presente
Mesmo que a ausência implique presença, na esfera da obsolescência Mesmo sendo a presença objeto corporal, como fenômeno passional
Já que a presença simbólica é submetida, à embriaguez da própria vida...
Já que o que basta é o entorpecimento sistemático do fato...
Como superar a estrutura no mundo da tortura?
“Onde estará Nicanor?
Tinha nó de marinheiro quando amarrava um amor”42
Onde estará o significado da ciência, quando não existe imanência, ou complacência?
Onde estará o biombo que escondeu, a ignorância que reviveu?
Ninguém ressurgiu do próprio ventre que pariu Não se sabe dizer se o sincopado foi desestruturado Se a ausência substituiu a essência, ou se os fatos se tornaram infartos...
A vida desconstruída só encontra uma saída:
130
Valter Casseti Delírios
Aquela é a janela, para a terceira margem amarela
Importante é a embriaguez, mesmo não sendo freguês
Importante é não naufragar, mesmo sabendo nadar
Mesmo sem vacilar, não sei onde tudo vai dar
A vida é um processo, que se traduz em regresso
É a vanguarda do atraso, sempre obra do acaso
Embora a dialética nos diga, o avanço é guerra renhida
Onde andará a voz minoritária, da sociedade igualitária?
Onde andarão os que construíram prédios, para acabar com o tédio?
Onde a vida nos conduz, mesmo semenxergar a luz?
E se o trem vier? E se no escuro do costume, não encontrar o lume?
E se a notícia não chegar, sem saber o que vai dar?
Sãotantasas questões,quenão expressamrazões, ou emoções
Se o espaço existe sema matéria, é outra ideia etérea Mesmo na idade medieval, quem se importava com o existencial?
131
Morrer sem saber, é um defeito do ser Mesmo que não existam explicações, nunca saberão as razões
Por estarem ligadas aos interesses da estrutura, que se traduz em amargura
Ou pela falta de compreensão científica, que supere a crença mítica
Quem sabe um dia perguntarão: fomos inocentes ou dementes?
Por acreditar no estado de estar, não se compreendeu a arte do imaginar
Como se o imaginar metafísico, era coisa de um louco idílico
Um dia haveremos de saber, que fenecemos sem ao menos entender ...:
O significado da existência, sem a compreensão da imanência.
A vida é fatal, etecetera e tal (Tenho medo da existência)
132
Valter Casseti Delírios
D73. O que dizer?
O que dizer do que não foi dito
Mesmo sabendo que dizendo, não estaria sendo
O que dizer do que pensou
Mesmo não tendo pensado, o que não foi imaginado
O que poderia ser se não fosse?
Mesmo não sendo, objeto do intelecto
Não se pode procrastinar, o que se deixou de sonhar Mesmo falando, melhor pensar imaginando
É assim que se concebe a sempre lógica patológica
Será na mística cura, que se decifrará a aventura?
Aquela que foi um dia, a razão que já morria?
Um sonho que não sabia, acordar de um novo dia?
Quem imagina o futuro, sem desvendar o venturo!?
Algo que não se fez, por merecer a carecia da vez Fazer por imaginar um tempo perdido, com remorso aturdido
Quem acenderá o pavio que se apagou, se o combustível acabou?
133
Quem alimentará o fogo que se esvai, e a luz não satisfaz?
O caminho está livre, mas as raízes estão presas nas incertezas
As asas estão quebradas: desejos são lampejos O tempo se torna obsoleto, quando se termina o soneto
É o prenúncio de um novo canto, que se transforma em pranto D77. Os porquês
A vida perdeu o sentido quando algum defeito genético criou o antroprojeto
Se soubessem no que daria, a evolução criativa não continuaria
A vida perdeu o sentido, quando o inteligente, se tornou inconsequente Perdeu a razão, quando apropriou da natureza, em nome da riqueza Infringiu as leis básicas da terra, explorando a própria esfera Deixou de ter sentido, usurpando nação, sem concessão
134
Valter Casseti Delírios
Perdeu mais, quando nativos e negros, foram submetidos ao degredo Quando instituiu a estrutura feudal, em nome do domínio imperial Ainda mais quando a igreja, em nome de deus, legitimou territórios que não eram seus Também em nome do onipotente, beatificou o massacre punindo hereges inconsequentes
Em nome da moral cristã, legitimou verdades vãs Modos que foram adotados, com argumentos consagrados
Condenou a barbárie dos tempos, como além dos argumentos
Perdeu o sentido da vida, pela civilização reprimida Instituiu o perdão do pecado, com as oferendas do coitado Decretou a moral, para pagar o pecado original Combateu o mal, para salvar a cultura racional Suscitou a ideia hegemônica global, legitimando o poder central Uma unificação que se alastra sem esperança; possibilidade de vingança
Pergunta-se:
135
Quais os riscos extintos pela civilização, associados à evolução?
Assassinato em larga escala, para exterminar a senzala?
Destruição da natureza, com a reprodução da pobreza?
Religião e seus tentáculos, lavando dinheiro sacro?
Concessão legal, para a reprodução do capital?
Estado submisso aos conglomerados, para excluir excluídos danados?
Porquê?????
D80. Quem foi?
Quem foi, que acabou com o índio que aqui raiou? Quem foi, que buscou o negro que escravizou?
Quem foi, que grilou as terras que não comprou?
Quem foi, que expulsou o posseiro que aqui morou?
Quem foi, que excluiu o servil que não serviu?
Quem foi, que vendeu o patrimônio que não era seu?
Quem foi, que prendeu o sonho que já morreu?
Quem foi, que amordaçou aquele que alienou?
Quem foi, que Prometeu o fogo que concedeu?
Quem foi, que viu a caixa que Pandora abriu?
136
Valter Casseti Delírios
137
Quem foi que... .... Ainda bem que restou a esperança
XI. DELÍRIOS DA MORTE
138
Valter Casseti Delírios
D6. Contagem regressiva
Ao longo da vida urdida
O desejo se confunde com medo
Uns por conta dos fatos, outros por impulsos inatos
Os arroubos da juventude, ficaram na incompletude
Os sonhos se diluíram, futuros se excluíram
Com a dívida somada, não resta mais nada
Acumularam excedentes, sem preocupar com a gente
Sem espaço para o pensar, sem tempo para amar
O avanço do asco, fecha o encanto no frasco
O corpo definha, a esperança esfria, a mente atrofia Não há mais tempo e espaço, para mais um fracasso
O relógio dispara, a vontade emudece, o corpo padece
As ideias confundem, as estruturas refundem
Vencer as etapas do tempo, exige certos momentos Buscar o significado da vida, antes da própria partida
139
D11. Desejos contidos
Enquanto o tempo subverte, o desejo contido perverte
O velho ressente do tempo ido, que no tempo foi consumido
O novo espera o porvir, sem saber para onde ir Coisas acumuladas, atrapalham a caminhada Aumenta o paradoxo do ter, em relação ao ser Como a ânsia do querer, sem saber o que fazer Resta o ressentimento, de um pretenso estamento
A juventude freada, pelo fim da curta estrada Deficiência do saber, por falta do próprio ser Desculpa ou verdade, que impede a realidade
Uma forma de querer, sem poder ao menos ser Superação de frustrações reprimidas, ou abolidas?
Uma resposta ausente, para uma pergunta premente Quando recrudescem cobranças, pelas então ditas vinganças
Limita o resgate do desejo, por puros lampejos Estancam as expectativas, do querer da vida Querendo fugir do viver, para morrer e renascer As cercas do inconsciente, mantêm o desejo latente Vigiada por um algoz, como se fosse feroz
140
Valter Casseti Delírios
Prisão sem reclusão, por inanição ou paixão Sobram apenas sonhos, da esperada libertação Na brevidade adulterada, sem que reste mais nada Encorajado pela utopia, desejo de entropia A perna não se sustenta, o frágil corpo que ostenta
As asas estão quebradas, depenadas, estraçalhadas Premência de outra existência: paciência!
Quisera ser possível acreditar, que pudesse emular Pura quimera, que se esgota na eterna espera
D14. Não se vive duas vezes43
Quando tudo parece ter desmoronado, surge o inesperado
Perspectivas na vida madura, superando as desventuras
Eventual decisão; esperança por nova paixão No fundo a canção pedia, para deixar para outro dia Que nada devia ter pressa, ansiando pela vida posgressa Mas o desejo escafandrista, despertou o futurista
Vestígios latentes do próprio inconsciente
141
Correndo contra a prudência, e da própria imanência
A audácia transgrediu os limites da insolência; Ou da decência?
O corpo eclodiu em chamas, clamando pelo que inflama
Desvelou-se o desejo da vinda, depois de antiga partida
Carregando lembranças presentes, ruídos do inconsciente
Sem saber o que previa, o sonho de um novo dia Carregado de incertezas do tempo, destino levado pelo vento
Mesmo na inócua esperança melódica, o sonho virou uma incógnita
D36. Vidas
Só existe uma vida, que embute muitas vidas Vidas demarcadas na própria sina, com bifurcações descontínuas Exigem paradas, para as decisões a serem tomadas
Só depois da caminhada é que são avaliadas
142
Valter Casseti Delírios
Os resultados, mesmo não esperados, são incorporados
A impossibilidade de correções no trajeto, deixam marcas no intelecto
Testemunhos nos palimpsestos, com acertos e seus defeitos
Enquanto acrescentam novos atos, os contrários negam os fatos
Narrativas da temporalidade transcorrida, única história da vida D74. Urutau
Há quem diga ser “fantasmagórico” Que “anuncia maus presságios”
Mesmo que existam relações canto espanto Melhor aquilatar o pensamento, como fruto de cada momento
O imaginário traduz, aquilo que se produz
Jamais pensar em sobrevir, como prenúncio do devir Um canto inigualável seduz, aos que por ele conduz Mesmo melancólico, sempre simbólico
Diferença entre essência e aparência
143
Um trinado compassado da magia, à hermenêutica da elegia Marcando identidade compraz, de um sonho apraz Quisera ter o dom primaz, de um urutau perspicaz
D89. Quem disse??
Boa morte é a desejada Mesmo sendo antecipada
Não me venha com a “de repente”
Mesmo se estando ausente
Boa morte é quando o momento Quer pôr fim ao sofrimento Implorando pela partida
Sem piedade; destemida Estado de anestesia
Sem saber o que foi um dia Só o desejo inconfesso
De imediato regresso
Dizer que de repente A morte se faz ausente?
Boa é aquela desejada Mesmo levando ao nada Morte sem desejo
144
Valter Casseti Delírios
É o fim do próprio ensejo
Como não tivesse princípio Ao que findou do suplício
Nada melhor que pedindo
O fim de um eterno domingo
Um desejo que não mingua Como domingo fosse ainda
145
IX. DELÍRIOS DO UNIVERSO
146
Valter Casseti Delírios
D10. Contra a correnteza44
Queria falar da exclusão, Dos crédulos e dos laicos, Dos ingênuos e dos mágicos, Dos pobres sempre trágicos
Queria falar da terra, Da liberdade de expressão, Do homem subjugado, Do processo de alienação
Queria falar do domínio, Da externalização da natureza, Dos sonhos e esperanças, Contrapondo a correnteza
Queria falar, mas não posso Minha memória é fraca Minha voz foi sufocada
Pela poeira da estrada
147
D18. Neomalthusiano45
Se Malthus como alquimista: Quis garantir a alimentação, com redução da população... Serviu aos interesses do capital, contrapondo ao mutual
Sua teoria aprovou condições inumanas, aos desprovidos de grana
“Apinhar mais gente nas casas, aumentando os riscos das pragas”
“Aldeias em ambientes nocivos, condenando os desassistidos”
“Deixar a seleção natural, promover controle populacional” Malthus tem contribuído, para a “redução” dos excluídos Pobres, pretos, tem como sina, ação concreta da chacina Chacinainduzidapelopoder,queusaanaturezapara esconder
Já que o mercado dispensa sua presença, a lâmina de corte é sentença da morte Mais da metade da população, carente de solução
148
Valter Casseti Delírios
Desempregados, informalizados, subjugados na iniquidade da sociedade Semqualquer serventiaaosistema,a morteé decisão suprema Corpos desovados, abandonados, não identificados Tendo como algozes o mercado, legitimado pelo estado
Governos fascistas, misóginos, racistas, estimulam ação belicista
Excluídos imploram, em nome da santidade, o direito à igualdade
A estratégia malthusiana é o argumento que engana Enquanto preservam os ditos potentes, exterminam inaptos “dementes”
Reduzem o custo-nação, em defesa da escravidão
Uma lástima destituída, de qualquer sentido de vida O jornal estampa, mais uma tragédia espanta:
Pobres que lamentam a morte, pela falta de sorte São moradores que habitam áreas de riscos:
A culpa é sempre das chuvas, para justificar agruras Resta a indignação da mídia corporativa, por manter a política nociva
149
Aos que restam fica a esperança da sorte, para que sobreviva, antes da própria morte D27. Feminismo ético-político46
Rebaixado pelo machismo em sua essência, como se fosse aparência
O feminismo passa pela reificação material no contexto capital
Denuncia a estrutura perversa, histórico patriarcal, segregacional
Luta pelo direito em sua plenitude, sem amiúde Contrapõe a força machista e sua demência revanchista
A emancipação busca a superação da opressão, da violência e humilhação
Quando o homem vencer suas fraquezas, dias virão com certeza
O preconceito será superado, pondo fim ao culturalismo herdado
Compreenderá que a opressão do sistema, não tem gênero nem dilema
150
Valter Casseti Delírios
Ação política carece da conciliação de gênero, para derrotar o poder sistêmico
Uma luta ético-política, contra a dicotomia maldita Não basta apoiar o feminismo, sem mudar o culturalismo
Não basta colocar a mulher em pedestal, mantendo sua dominação social
Não basta a romantização enaltecida, por ser “objeto” reprodutor da vida
Não ser considerada pelos orifícios, em troca dos próprios suplícios
Precisa uma parceria justa, para travar a verdadeira luta
Uma nova carga semântica, fundada na igualdade romântica
Capaz de oferecer perspectivas reais, para a unificação dos iguais
D34. Hasta cuando?47
A eterna sangria, das veias em embolia
Destroem o sonho latino do eterno menino
Colônias extorquidas em nome de coroas erguidas
151
Saquearam e arrasaram os povos originários Alienaram e mataram, em nome do explorador...
Impondo a dor O colonizado esperou em vão, a possibilidade da redenção
Nações hegemônicas subsequentes, mantiveram a exploração doente
Estabeleceram políticas de coerção, subjugando a própria razão
Contribuição para a redenção da oligarquia local, à custa do patrimônio nacional
Copiou a tática do opressor, multiplicando a exploração e a dor
Articulou golpes para manter o domínio, quintal sufragado pelo “destino”
Império hegemônico impôs a submissão, colônias em eterna escravidão
Prenderam e condenaram sem paixão, os que clamaram por outra condição
Golpes militares, pontes de destruição, alegando perigo de invasão
Foram tantas mortes que nem dá para se contar, estimar ou imaginar!
152
Valter Casseti Delírios
Os suplícios nas masmorras foram contidos, mas nunca esquecidos Aliando-se à chacina, a imprensa se fez ladina Nunca se viu tanto sofrimento, sufocado pelo silêncio...
Nem mesmo translucidado pelo véu maculado De um obscurantismo tardio, o martelo da inquisição proferiu:
O holocausto da sanguinária e eterna colonização, persistiu na histórica dominação
Quem sabe um dia... Arqueólogos da libertação, cobrarão...
Os responsáveis pela destruição
D38. Destruição anunciada
A discussão ambiental banalizada já era anunciada Resultou de um estado capitalista, essencialmente mercantilista Foi agravada com o estado golpista, que expôs-se fascista
153
Com a participação direta, das instituições insurrectas Enquanto prospera na esplanada a crescente boiada Não há o que detém, a degradação dos nossos bens A destruição das certezas, de gerações indefesas Agrotóxicos para fazer o agronegócio crescer Desmata, incendeia, destroça, o que ficou da soca Erosão, assoreamento, ações nefastas, infestas Uma política destrutiva com loucos da executiva Terras indígenas ocupadas, nunca demarcadas Não respeitam divisas, nem ocupações primitivas Expropriam terras, grileiros matam posseiros Militares entreguistas fazem parte da mesma missa Abandonam a soberania em nome da tirania
Com a espada em punho, instituições perdem os rumos Poderes acovardados se vergam à imposição: subjugação
Transformam a nação, em produto de exportação
Antiga exploração ressurge, no tempo presente que urge Resgata o velho pesadelo, da ausência do desvelo
154
Valter Casseti Delírios
Modernizam o léxico: commodities, globalização, onde se lê apropriação Cada vez mais destruindo a nação, que insiste em projeção Uma forma branda de desestatização; desejo de mercado em progressão Enquanto isso a nação, assiste calada, o rito da destruição
D41. Apocalipse48
O primeiro cavaleiro, depois de pregar a igualdade Foi denunciado, pelo sinédrio julgado e crucificado Durante todo suplício o condenado ficou calado Perdoou seus carrascos, sem ressentimento ou asco
O segundo cavaleiro, natural do pecado residual Maldizendo os desejos, trouxe guerras e medos Impondo nova ordem bastião, abençoado pela religião
Colonizou os esquecidos, do ódio pervertido
O clero sacralizou a escravidão, sem compaixão Bandeiras foram fincadas, ao longo de toda estrada
O homem tornou-se refém, subjugado com desdém
155
A guerra se fez presente, para matar o inocente Com promessa de um paraíso, aceitando o imperativo
Para os condenados sem perdão, a pena da maldição
O terceiro cavaleiro, trouxe fome acumulada, além das guerras passadas Depois do ideal comunitário do “louco” crucificado, veio o germe do mercado
A miséria se alastrou; estado demonizado pelos grandes conglomerados
Dominaram as nações, misérias e inanições Até que sorrateiro, veio o quarto cavaleiro Acrescentou ingredientes, às nações então doentes
Em busca de solução, as massas pediram perdão, no horizonte da destruição
Renasceu o malthusianismo, que nunca foi esquecido
Mortes banalizadas por sucessivas pragas, com sepulturas fechadas
Nem mesmo o barqueiro Caronte, na turbidez do Aqueronte
Esperou pelos devotos ascéticos, descartados pelos infernos
156
Valter Casseti Delírios
D43. Ser máquina
Combustível bombeados do reservatório selado A ignição em câmara fechada: combustão processada
Explosãotransformaenergiaemmovimento,numsó momento
Pistões entramemfuncionamento como pensamento Impulsionam o líquido vital, como se fosse fetal Circuitos eletrônicos comandam o sistema: teorema
Movem-se as engrenagens com suas rudes mensagens
Energia potencial em cinética; pura imagética! Enquantocombustívelinjeta,oprocessosecompleta Com o tempo, os componentes desgastados vão sendo trocados Até que reparos pendentes, já não são suficientes
Acaba o combustível; colapso plausível
Já não existem soluções, para mover os pistões
Não existe tecnologia ativa, para a ignição da partida O movimento do sistema, se transforma em problema Circuitos desligados, silenciados
157
Máquina imprestável; objeto descartável Peças inaproveitáveis em máquinas irretificáveis Quando descartados, resíduos acumulados Megamáquinas guincham restos funestos Empacotam camadas empasteladas Bota-fora cresce, enquanto novas máquinas florescem
Descompasso: produção-destruição
Sistema reduz demanda, esperando mudança(?)
Máquinas mágicas de perdas trágicas
Novas tecnologias desenvolvidas, ao longo das próprias vidas
Paradoxos econômicos, transtornos histriônicos Crise de consumo (?) sem rumo; mercado findado
Máquinas sendo desligadas, vidas paralisadas Pátios de perdas abarrotados, comrestos descartados
Restos extintos: campos infindos Só resta o tempo, em outros momentos Tectônicas fundirão, restos da incorporação Fusões produzirão, depósitos sem distinção Quem sabe, em um futuro distante, novas máquinas falantes Em paleodepósitos da história, recuperarão a memória
158
Valter Casseti Delírios
Quem sabe poderão, com base em outra concepção, Produzirem alternativas, para um sistema compatível com a vida
D44. Caos49
O pedido do menino não podia ser mais crucial: Punição paternal por tê-lo posto no mundo fatal Uma vida maligna de desgraça indigna Viver amontoado em pedaço de espaço recriado Irmãos passando fome: divino demoníaco do destino
(O trabalho infantil: dever para sobreviver) Todos em situação de morte, entregues à própria sorte
Violência, prostituição e humilhação
Desesperado sai à procura do nada, pelo nada esperar encontrar
Mesmo nas andanças, não encontra mudanças
O estado não existe; a religião dita, a vida maldita
159
São vidas destruídas da multidão excluída Maldades com opostas iniquidades Não existem perspectivas para compreender, a essência do querer (ou ser) Estágio letárgico com desígnio insígnios Implora que seja decretado, para que novos filhos não sejam gerados Desejo de uma criança para conter, a miséria sobre a terra Sem mesmo compreender o sistema, é preciso enfrentar o dilema
D46. Evolução criadora
A familiar feudal consumia o que paria Do feudal à corporação, o artesão teve os meios de produção No capitalismo nascente, o artesão tornou-se dependente
O sistema fabril cresceu; o artesão desapareceu Perdeu os meios de produção; virou força de tração
O capital inicial, não foi esforço pessoal
160
Valter Casseti Delírios
Foi daexploraçãodas colôniasnaAmérica; do saque das Índias orientais
Da caça comercial aos negros; do patrimonialismo do estado de degredo
O capitalista apropriou em ação, da matéria prima e força da produção
A força de trabalho tornou-se mais valia, sem que o trabalhador percebia
A alienação, instrumento de dominação nas relações de produção
A medida que a demanda aumenta, a automação a produção sustenta
A precarização do trabalho,o desemprego crescente: um exército de dementes
O capital financeiro assume relevância, a desigualdade avança; perde-se a esperança
D50. Desencanto
O mundo desencantado Pôs o véu no alienado
Questionou a magia das crenças Matou com flecha a esperança
161
Valorizou as próprias teorias Fez do encanto uma ironia
Da beleza uma saudade Fomentando nova realidade
Ofereceu ao poder da riqueza Legitimar a objeta pobreza Destruiu a utopia Destilando alegoria Sem que fossem superadas
Com fé buscou nova estada Velhas, retrógradas teorias
Em nome da distopia
Promessas de bons tempos Nasceu do próprio advento
O sonho de uma terra dividida Sem divisas requeridas
Mesmo sendo utopia
São sonhos sonhados um dia
Sonho de desejo de paz Mundo com fronteiras jamais Sem diferença de dor
Canto desencantando o clamor
Pondo fim às incertezas Superando as tristezas
162
Valter Casseti Delírios
D54. Futuro do universo
O panorama científico-especulativo indutivo Transcende ao tempo histórico-concreto insólito Percepção no tempo presente, como projeto imanente
O bigbange o universo, não contemplam tergiverso Sonhos futuros tornam se céticos e ecléticos
Do bigbang para o bigcrunch, só mesmo chucrutes
Toda energia centrada, em um único ponto do nada Criar uma nova explosão, de um novo universo em expansão
Cheio de buracos negros, como atração dos desejos Podendo engolir o universo, como espelho reverso Pensa-se ainda no bigrip, que um dia nos rasgaria
A morte térmica dolorosa, de uma existência penosa
A entropia alcançaria, o valor máximo da anomia Oscilações extremas de temperatura, em toda criatura Calcinando, crioclastando os seres sensíveis, mesmo os invisíveis
163
Nem o multiuniverso infinito, sugere um mundo maldito
Só restaria programar, o espaço interestelar, para o homem dominar
Enquanto as teorias não são, só resta a energia, elegia da dominação
Um jesus louvado nos cânticos, dos mares atlânticos
Resgatando os titãs irônicos, do paganismo epifânico
De um cristo pessoal e gnóstico, antinômico e pernóstico
D70. Onde sonham as formigas verdes50
Vejo antiga pastagem transformada; apropriada Terreno preparado, cimentado, calçado, paisagismo equilibrado
Vez ou outra brotam formigas que escavam a terra inumada Mesmo combatidas, insistem emressurgir, cobrando o direito de existir
164
Valter Casseti Delírios
Como colônias ocupadas por viajantes estrangeiros, que se apropriam do espaço hospedeiro Indígenas expropriados, escravizados, em nome de um desenvolvimento questionado Primeiros colonizadores, depois usurpadores, legitimados pelo estado empeirado
Limitam espaços residuais, extraem recursos naturais
Interesses comerciais, transações patrimoniais
Tal qual aborígenes australianos, expropriados dos espaços desolados
Descoberta do urânio legitimou a ocupação; exploração-expropriação
Incapazes de se comunicarem, dialetos perdidos: tempos sem sentidos
Sobreviventes mortos onde a língua universal é o capital
Mesmo depois de excluídos, espaços sagrados mantidos
Lugar de preces e mantras desfigurados por estarem privatizados
Também não foi respeitado o posseiro, quando da intervenção do grileiro
165
Pelo direito que tinha, de plantar no antigo chão, que não é seu mais não Pergunta-se até quando, o sistema de apropriação, matará a própria nação?
Nãosóadaexistênciahumana,comoda Pachamama Metas de crescimento econômico, como desejo premente, desconhecem o que é gente
Desconhecemefeitosnefastos,deromper adinâmica do abasto
Mesmo diante dos resultados pandêmicos, pensa-se no crescimento sistêmico
Sem se ater aos prejuízos alcançados, um dia serão cobrados
Necessário se faz pensar, em novo modelo fugaz
Por um novo chão, perdido no tempo, sonham formigas verdes, ao sabor de seus deleites
Onde o simbolismo se constitua identidade, resistência para nova nave
166
Valter Casseti Delírios
D78. ½ ambiente
Houve um tempo em que o homem rompeu com a natureza, para legitimar a própria riqueza Houve um tempo em que invenções, resultaram degradações
Houve um tempo em que os impactos crescentes, mataram a própria gente Houve umtempo em que a contradiçãoabriu mão do ecológico sem razão
Houve um tempo em que se imaginou, a autolimitação da produção
Houve um tempo em que o capital, inventou alternativas, para suprir suas medidas Houve um tempo em que a mudança ambiental, virou hecatombe universal Houveumtempoemqueascorporações,falaramem exageros e aberrações Houve um tempo em que o meio ambiente deixou de ser ambiente, e se tornou um meio Um meio de acumular capital, para o explorador irracional
167
Assim como na pandemia, são os que lucram no dia a dia
Dirão que as novas bases materiais, vão atenuar os impactos ambientais
Alternativas para os que podem pagar, e seus impactos prorrogar
Aos excluídos, a seleção natural, conduzirá ao juízo final
Houve um tempo em que o meio ambiente, deixou de ser ambiente e se tornou apenas um meio Meio para poucos...
Bilhões, que nem meios terão
D95. Desencantamento do mundo51
Trabalho: dimensão ontológica, da existência biológica
Criação livre e consciente, da realidade imanente Apropriado como mais-valia, reproduziu agonia Do servil à escravidão, objeto de exploração
Força viva, tecnificação da própria vida
Exército de reserva, ódio xenófobo como meta Azares onipresentes, argumentos subjacentes
Como um deus presente, efeitos inconsequentes
168
Valter Casseti Delírios
Sistema blindando, potências e suas malevolências Alienação aniquila o ser, reduzindo o poder Estimula a subjugação, escondendo a reação Precariza garantias trabalhistas, como dívida arrivista
Se apropria de processo, em nome do dito pregresso Desemprego, informalidade, gerando iniquidade
Garantias sociais, discursos imorais
Aumenta a miséria deletéria!
Estado nega obrigação social, trabalho se torna letal Polegar desenvolvido, telencéfalo reprimido!
Que animal irá se opor a esse estupor?
Qual o resultado do jogo? Responda sem engodo
169
NOTAS EXPLICATIVAS:
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1 Camus (O mito de Sísifo”, Albert Camus, Trad. Mauro Gama, R.Janeiro:Ed.Guanabara, 1989) demonstra o seu esforço ao inconformismo e à recusa de todas as fugas. Camus condena o suicídio que ele chama de “filosófico” . Compara o absurdo da vida do homem com a situação de Sísifo, condenado a repetir eternamenteatarefadeempurrarapedraatéotopodamontanha, que volta em seguida para a base, exigindo o esforço continuado para repetir o processo. Para os críticos, Camus mostra como a absurdidade do humano se estendeu e fez metástase por toda parte. Uma obra que assume destaque na atualidade, onde o autoritarismo tem adotado disfarces para a preservação da absurdidade.
2 Inspirado na personagem de Sartre (“A idade da razão”, JeanPaul Sartre. Tradução de Sérgio Millet. S.Paulo:Abril Cultural, 1979), Mathieu Delarué, professor de filosofia que tem por princípio a “liberdade pura”. Ao se deparar com uma série de problemas, como a gravidez indevida de sua companheira, vai em busca de alternativas para interromper o processo, A falta de recursos implica ações que contrariam seus princípios, levandoo a questionar a sua suposta liberdade. O romance faz parte da trilogia “Os caminhos da liberdade” (A idade da razão e Sursis, 1945; Com a morte na alma, 1949).
3 Relato utilizadoporMichelFoucault naintroduçãodo seu livro “Vigiar e punir” (Trad. Raquel Ramalhete. Petrópolis:Vozes,
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2012), em que Damiens é condenado em 1757, submetido às mais bárbaras formas de punição destinada a um ser humano 4 Inspirado nos nove círculos imaginados por Dante (A divina comédia: Dante Alighieri, Trad. Fábio M. Alberti. S.Paulo: Nova Cultura, 2003). O “mapa do inferno” de Botticelli retrata os círculos concêntricos com os patamares destinados à gravidade dos pecados. O barqueiro Caronte, que carrega as almas dos recém-mortos sobre as águas do Aqueronte, que dividia o mundo odos vivos do mundo dos mortos.
5 InspiradonapersonagemBaudolino (Baudolino,Umberto Eco, trad. Marcos Luchesi, R.Janeiro:ed.Record, 2001) que seria uma máquina de invenções (Macedônio?) que produz relatos falsos, cartas falsas, pergaminhos falsos, trafica relíquias falsas e desenvolve planos e acordos baseados em inverdades.
6 Baseada na obra de Eurípides (Medéia, tad. de Jaa Torrano, S.Paulo:Hucitec, 1991). Corresponde a uma da mais conhecida tragédia grega, aqui evidenciando o papel da personagem enquanto mulher.
7 Criado a partir de Hesiodo, incorporando texto dA tragédia de Prometeu: a degradação da pessoa humana que trabalha na era do capitalismo manipulatório. Coord. Prof. Giovanni Alves. UNESP Bauru, S.Paulo:Projeto Editorial Praxis, 2016
8 Inspirado na obra de HOMERO. Odisseia. Tradução de Carlos Alberto Nunes. 25ª edição. Editora Nova Fronteira: 2015 e no artigo de de Augusta da Silva: A concepção Homérica da alma fantasmagórica na Odisseia. Academia.Edu, 2021
9 Concierto Barroco. Alejo Carpentier. Buenos Aires:Calicanto, 1974. Posfácio de Jean-Claude Bernardet Teixeira Coelho (1985).
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Fusão de imagens contadas por Eurípedes (Orestes), Kafka (Glauco o caçador), Murilo Rubião (O pirotécnico Zacarias) e Rimbaud (O barco embriagado)
11 Níobe é uma personagem da Mitologia Grega, esposa de Anfião, rei de Tebas.
12 A partir de Luiz Felipe Pimentel (sigocomfe)
13 Lembranças da infância no interior paulista
14 Vaga lembrança do Rosa (Grande Sertão: Veredas, João Guimarães Rosa, R.Janeiro:Nova Fronteira, 1985)
15 Observações sobre as cicatrizes e dores do próprio corpo
16 A partir de um texto do autor, postado no “Pretenso Novelo Literário” (2021).
17 Tem como referência de fundo a alegoria da Caverna (A república. Platão, trad.Allan Bloom. S.Paulo: Edipro,2020) que trata da relação entre o prisioneiro comum e aquele que busca o conhecimento. A evolução do sistema de produção lembra “História da riqueza do homem” (Leo Huberman. Trad.Walternsir Dutra,R.Janeiro:Zahar, 1973), com inserção de conceitos de Marx (O capital, Karl Marx, V.I, trad.Regis Barbosa e Flávio R.Kothe. S.Paulo:Nova Cultura, 1988).
18 Referência a Macedônio Fernández (Museu de la novela de la eterna. S.Paulo:Alla-Edusp, 2007) que exerceu grande influência na literatura argentina, como o próprio Jorge Luis Borges. Ricardo Píglia (A cidade ausente, trad. Sérgio Molina, S.Paulo:Iluminuras, 1997) utiliza se supostamente da “máquina multiplicadora” de Macedônio para os seus relatos.
19 (Me esqueci o nome: vou no google para tentar lembrar, procurando por “módulo teleguiado” e só encontro: Módulos suporte aéreo em promoção no Magazine Luiza;
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Módulos aéreos para cozinha em promoção; Módulo de controle remoto trx para a fechadura Yale; Módulo de armário aéreo; Módulo adicional para extensor de controle remoto; Módulo de vigilância de veículo aéreo não tripulável vant: .... Não sabiaqueexistiamtantos módulos, eacabei semsaber o que desejava. Só mais tarde é que me lembrei do “drone”)
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Barbarella é uma série em quadrinhos para adultos criada em 1962 pelo ilustrador e escritor francês Jean-Claude Forest. Foi levada ao cinema pelo diretor Roger Vadim em 1968, se transformando em símbolo sexual na época. De tendência ninfomaníaca, usa o corpo e a sexualidade para derrotar os seus opositores. É uma analogia à Goiás por ser umestado “devassa”, aberto a tendências, berço dos ruralistas e difusor do sertanejo universitário
21 Depois da “marcha para o oeste” do Governo Vargas, a expansão das fronteiras agrícolas no governo militar, oferece as condições apropriadas dos planos cerrados para a expansão da soja, promovendo a intensa degradação do bioma e respectivos impactossociais. Emprestapartedo territórioparaaimplantação do distrito federal na expectativa de compensações econômicas.
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Referência à guerrilha de Zé Porfírio, em Trombas, um dos primeiros conflitos agrários no Brasil, registrado em meados da década de cinquenta do século passado. Culmina com a vitória dos posseiros: um novo sonho libertário aos poucos aplacado pelo domínio do capital.
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Refere-se ao sonho de Dom Bosco (1883) que fazia uma viagem à América do Sul, vislumbrando povos e riquezas. Entre os paralelos 15 e 20°S, imaginou uma grande enseada que partia do ponto onde se formava um lago: “Quando se vierem cavar as minas escondidas em meio a estes montes, aparecera aqui a terra prometida, quejorraleiteemel. Seráumariquezainconcebível”.
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Referência aos colonizadores e suas bandeiras, que em nome da legitimação do território, aprisionou e exterminou nações indígenas
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Plutão (mitologia grega) era filho de Saturno e de Reia e irmão de Júpiter. Quando Júpiter fez a partilha do universo, deu a Plutão o império dos infernos.
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Inspirado na máxima de Pavese (“A lua e as fogueiras”, Cesare Pavese, trad. Sérgio Limarão, R.Janeiro: Ed.Guanabara, 1986): “é necessário se ter uma aldeia, nem que seja apenas pelo prazer de abandoná-la”. O autor fala da aldeia que existe dentro de nós, que nos leva a busca-la na infância, contrapondo a violência que irrompe ao longo da existência humana. Acredita que cada pessoa é prisioneira de seu próprio destino interior. Uma aldeia significa não estar sozinho, saber que nas pessoas, nas plantas, naterra, há alguma coisa de nósque, mesmo quando não se está presente, continua à nossa espera.
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Inspirado no segundo livro de Fausto (Fausto, Johann Wolfgang (von) Goethe. S.Paulo:MartinClaret, 2002), considerado um dos precursores do desencantamento do mundo ao questionar o desperdício humano em relação às forças disponíveis na natureza
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Inspirado em “A interpretação dos sonhos. Sigmundo Freud. Trad. Renato Zwick.. S.Paulo:L&PM, 2016.
29 Crítica autobiográfica
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Um dos poemas de Fernando Pessoa (Livro do desassossego. S.Paulo:Cia das Letras, 2000): “navegar é preciso, viver não é preciso”; originalmente atribuída ao general Pompeu (70a.C). A frase procura considerar a precisão de se navegar para viver, o que exclui a mesma precisão quanto à existência.
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Análise a partir do filme “Nostalgia” de Andrei Tarkovski (Itália/URSS, 1983) que narra o desejo do retorno de um vazio incondicional, ecoada enquanto ruptura com o presente.
32 Inspirado em “Heráclito e seu (dis) curso” (Donald Schüller, Porto Alegre:L&PM, 2001), onde o autor comenta os aforismos ou fragmentos do “pai da dialética “, mostrando a importância de se acompanhar as ousadas explorações do filósofo pré socrático (540aC)
33 Reflexões pessoais sobre as tentativas de assumir algum significado na arte de pintar. Experiência que durou pouco mais de dois anos
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A partir de “O conceito da arte moderna” (organiz. Nikos Stangos, trad. Álvaro Cabral. R.Janeiro:Jorge Zahar, 1974)
Ensaios escritos poro diferentes autores que parte do Fauvismo, passando pelo expressionismo, cubismo... até o minimalismo. Mostra o papel crítico eteórico naconcepção dosnovosavanços artísticos.
35 Inspirado em Galeano (A canção de nossa gente. Eduardo Galeano, Rio:Folhetim, 1976).
36 Baseado no relato de José de Souza Martins (A militarização da questão agrária no Brasil. Petrópolis:Vozes, 1985): Apêndice: O boiadeiro Galdino do tribunal miliar ao
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manicômio judiciário (Aparecido Galdino Jacinto). Inserção do poema incidental do arrendatário Olímpio Pereira Machado (Poema da terra:1961).
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Boia fria na lavoura canavieira, em Santa Helena de Goiás GO:1984
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Inserção do poema incidental do arrendatário Olímpio Pereira Machado (Poema da terra:1961).
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Inspirado em Trombas: a guerrilha de Zé Porfírio. Sebastião de Barros Abreu. Brasília:Ed.Goethe, 1985.
40 Referência à construção da BR 153, Belém Brasília
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Versos do poeta Haroldo de Brito Guimarães
42 Referência à música “Nicanor” de Chico Buarque de Holanda
43 Inspirado na canção “Futuros amantes” de Chico Buarque, sem relação pessoal
44 Prefácio do livro do autor(Contraacorrenteza. Valter Casseti, Goiânia:Kelps, 1999), com a inclusão da última estrofe
45 Conceito de Malthus (Ensaio sobre o princípio da população. R.Janeiro:Relógio d´Água, 2014), e críticas de Neil Smith (Geography, Marx and the concepto of nature. Antipode (12):30 39, 1980)
46 Conceitos a partir de Mary Wollstonecraft (Reivindicação dos direitos da mulher. Trad. Ivania P.Motta, S.Paulo:Boitempo, 2016), escrito no final do século XVIII. A autora é uma das precursoras do movimento feminista no mundo.
47 A partir de Galeano (As veias abertas da América Latina. Eduardo Galeano. Trad. Galeno de Freitas.
R.Janeiro:Paz&Terra, 1979)
48 Inspirado em informações sobre “O livro da revelação”, também chamado de Apocalipse de João, último da seleção doo
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Cânon bíblico, supostamente escrito no mar Egeu, antes da batalha de Armagedom (batalha final).
49 Inspiradono filme “CapharnaûM” dirigido por Nadine Labaki (2018).
50 Com base em observações, lembrando de Werner Herzog, “Onde sonham as formigas verdes”, em que explora os limites dacondição humana. Opalco éodeserto australiano, ondetribos aborígenes, Wororas e Riratjingus, preservam lendas e cantos ancestrais. Com a descoberta de recursos naturais (urânio), a região tornou-se interesse de grande empresa multinacional, tendo como maior concentração, um dos redutos sagrados: as terras onde sonham as formigas verdes. Mesmo com as alterações impostas pelos interesses capitalistas, as tribos se reunião em um ponto, no supermercado, local considerado sagrado para as suas devoções, o que causava indignação por parte da moderna sociedade que usurpou o espaço de contemplação
51Alguns pontos relacionados ao desencantamento do mundo de Pierre Bourdieu. S.Paulo:Ed.Perspectiva, 1979
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CONTRA-CAPA
Pretensos poemas que não obedecem, necessariamente, a lógica formal. Tratam de questões da existência humana, sem desconsiderar as bases ideológico-políticas.
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