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Fractal

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editorial Mudanças necessárias “Sem cultura não existimos, apenas ocupamos espaço.” (Luiza Gosuen)

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udanças fazem parte de todo ciclo. Apesar do pouco tempo de existência, a Fusão Cultural mudou. O seu tamanho reduziu, mas a qualidade das informações continua a mesma, e a publicação passou a ser bimestral, contudo ela continua gratuita.  A Fusão Cultural nasceu do sonho de ver a cultura valorizada e reconhecida como importante ferramenta de transformação social. Enquanto essa esperança existir, e houver pessoas e empresas acreditando nisso, a Fusão Cultural existirá.  Nesta edição, a matéria de capa trás poesias de Pedro Morato Krähenbühl, poeta piracicabano que completaria 88 anos no dia 22 de agosto, mês de aniversário de Piracicaba. Cyro del Nero, autor da matéria de capa desta edição, apresenta-nos um pouco da história de Krähenbühl e de sua obra não publicada em livro, sua Bagagem Avoenga (herança de avós).

ISSN 2177-7225 www.fusaocultural.com.br Diretora executiva e jornalista responsável: Rafaela Silva – MTb: 48.363/SP Diretor comercial e financeiro: Gilberto Pessato Jr. Projeto Gráfico e Redação: Bennu Editora Ltda ME Diagramação: Valdir Felipe Garcia de Brito Revisão: Priscila Salvaia Colaboraram nesta edição: Cyro del Nero, Nilo Lima, Priscila Salvaia, Karine Silva Faleiros, Nicolle Carvalho Pinto Vieira e Raul Rozados Impressão: Gráfica Mundo A Fusão Cultural é uma publicação bimestral e gratuita da Bennu Editora Ltda ME (CNPJ: 11.476.103/0001-49), Telefone: (19) 3375-1512 E-mail: contato@fusaocultural.com.br Site: www.fusaocultural.com.br Os textos e imagens publicados na Fusão Cultural só poderão ser reproduzidos com a devida autorização da direção.

Rafaela Silva diretora executiva www.bennueditora.com.br


Sugestões, críticas, elogios, opiniões e colaborações podem ser enviadas para: e-mail: contato@ fusaocultural.com.br telefone: (19) 3375-1512

Fusão Cultural na Internet Site: www.fusaocultural.com.br Blog: www.fusaocultural.com.br/blog Orkut: Revista Fusão Cultural Facebook: Revista Fusão Cultural Twitter: @fusaocultural MSN: msn@fusaocultural.com.br

Parabéns a toda equipe da revista Fusão Cultural pela qualidade do trabalho! Estou adorando receber a revista. Os assuntos são interessantes e, o mais importante, os textos expostos em uma linguagem bem simples, fácil de entender. Fico aguardando a próxima edição. Ana Paula de Jesus Piracicaba – SP

Parabenizo-lhes pela iniciativa de fazer com que a cidade tenha cultura. Só não entendo porque Piracicaba, com um espaço interessantíssimo como o Engenho Central, ainda não possua nenhum festival de música clássica ou mesmo um festival de cinema. Paulo Rogério Neubern Zanetta Piracicaba – SP

Meus queridos. É sempre um momento de êxtase receber a revista

Eu quero!

em minha casa. Conteúdo diversificado e com muita qualidade, que enriquecem minha vida e tem me ajudado em meu trabalho, a missão de educar. Mais uma vez e sempre, parabéns por concretizarem o excepcional. Grande abraço da amiga e fã! Sunamita Oliveira Gravatá – PE

Para receber os exemplares da Fusão Cultural cadastre-se no nosso site: www.fusaocultural.com.br, ou pelo telefone: (19) 3375-1512. Por ser gratuita, a distribuição, por enquanto, é restrita a Piracicaba (SP), e a algumas pessoas e empresas/ instituições com cadastro aprovado. Todos os exemplares disponíveis no site.


sumário

AGO/SET | edição 05 | ano 01

12 06 07 08 09 10

fique ligado... ph0da rapidinhas cultura piracicabana up

cine fusão A oitava arte

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capa Bagagem avoenga Obra não publicada de Pedro Morato Krähenbühl

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cena teatral

Objtividade e subjetividade em cena

simplesmente dance Corpo que dança

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10 De pai para filho

36 Folclore: algumas considerações conceituais

23 Só agora ser repentista é profissão?

38 Body modification

30 José Saramago: um intelectual de múltiplas facetas

39 Pintura por computador

34 O reencontro entre a cultura e a educação

35 Pintando as unhas

39 Papel reciclado artesanal:arte consiente

40 Nilo Lima


...no livro Histórias e Memórias de Folias de Reis, de Daniel Costa. O autor é bacharel e licenciado em Dança, integra a Cia. Bonita e atua como intérprete/criador, preparador corporal e pesquisador na área da dança e cultura popular. No livro, Costa trás a fala de mestre e foliões. Segundo Rosana Baptistella, no prefácio do livro, essa escolha “trás para perto do leitor o cotidiano do folião e da comunidade, assim como a vida do indivíduo que é parte dessa coletividade”. O autor cedeu três livros para darmos aos leitores da Fusão Cultural. Um deles foi para Edna Josesnira Perez (Piracicaba/SP), o outro para Alisson Felipe Granadier (Piracicaba/SP) e o terceiro para Roberto Luiz da Silva (Piracicaba/SP).

...no livro A Menina do Bairro Fria – Sonhos e Desabrochar, de Luzia Stoco. De acordo com o prefácio, escrito por Camilo Irineu Quartarollo, “a narradora aborda fatos pitorescos da sua infância no Bairro Fria, na região de Piracicaba (SP), e sobre o desabrochar como mulher com o êxodo da família à cidade, cuja atividade era o corte de cana. O romance tem o condão de ligar as fases de uma mulher e sua relação com a sociedade, com as vivências dela e dos circundantes, na matriz caipira que se originou, em diálogos (a autora é atriz e professora de teatro) a palavra escrita segue como pronunciado pelo dialeto vigente na região”. Luzia cedeu um livro para a Fusão Cultural para ser sorteado. Quem ganhou o livro foi Tatiane Velozo (Piracicaba/SP).

...nos próximos filmes que estarão em cartaz no Brasil Como Cães e Gatos 2 3D -Gênero: Comédia-Diretor: Brad Peyton Karate Kid -Gênero: Ação - Diretor: Harald Zwart Nanny McPhee e as Lições Mágicas Gênero: Aventura -Diretor: Susanna White Nosso Lar -Gênero: Drama -Diretor: Wagner de Assis O Aprendiz de Feiticeiro -Gênero: Ação / Aventura Diretor: Jon Turteltaub O Último Mestre do Ar 3D -Gênero: Fantasia - Diretor: M. Night Shyamalan Os Mercenários -Gênero: Ação - Diretor: Sylvester Stallone Wall Street - O dinheiro nunca dorme -Gênero: drama Diretor: Oliver Stone Salt -Gênero: Ação / Suspense-Diretor: Phillip Noyce ...no 37º Salão Internacional de Humor de Piracicaba, que ocorrerá em Piracicaba (SP) entre os dias 28 de agosto e 17 de outubro. Há muitas novidades neste ano. Você pode conferir mais informações no site www.salaodehumor.piracicaba. sp.gov.br/humor ou pelo telefone AGO/SET  2010 (19) 3403-2604. 6


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á muitas coisas irritantes nesta vida, algumas mais amenas, outras irritantes ao extremo. Algumas irritam no momento que ocorrem, outras não precisam ocorrer em um momento específico para irritar. Dois exemplos enviados por leitores ilustram bem essas situações. Para Paulo Rogério Zanetta, a impunidade com políticos corruptos lhe irrita muito. Uma grande quantidade de pessoas concorda com a opinião de Zanetta.  Outro exemplo também pH0da é o que passou Karina Cristine de Lima. Segundo Karina, ela participou de um circuito de palestras, no qual eram distribuídos na entrada folhetos informativos, bloco para anotações e canetas. “Como demorou um pouco para começar, as pessoas ficavam apertando a caneta e fazendo aquele barulhinho super irritante. Imagine uma sala com quase cem pessoas fazendo tic tic com as canetas? Super pHOda!”, escreveu-nos Karina.

por Rafaela Silva  Já Eric Luis Poppi acredita que o pH0da é amar e não ser correspondido. Realmente essa situação é muito chata, mas não há muito que fazer, a não ser amar-se acima de tudo e procurar uma pessoa que corresponda os seus sentimentos. Três exemplos bem diferentes, mas todos pH0da. E dependendo do estado de espírito da pessoa no momento em que passa por determinada situação, o problema ou incidente parece maior ou menor. E para você, o que lhe irrita?

O que é pH0da?

Envie sua opinião para contato@ fusaocultural.com.br sobre o que é pH0da (irritante). Sua sugestão pode ser abordada na próxima edição da Fusão Cultural.

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Paulo Moura ta e Morre o músico o cl ar in et is 12 d e ju lh o

d ia es ta v a M o rr eu n o . O m ú si co ra u o M lo P au por consa x o fo n is ta daquele mês, 04 ia d o e d es Preto, in te rn ad o d São José do Rio em o d ci as N cer. entrou para ta de um cân rumentistas, st in e d ia íl ou a em uma fam . Moura cheg os an 14 s ao o pai al do Rio de o conjunto d heatro Municip T o d a tr es qu B, como integrar a or nomes da MP es d an gr m u co m dos mais Janeiro, e toco ascimento. U N n to il M e como no Elis Regina tanto no Brasil a, ri go te ca a su ecimento em requisitados na nhou o reconh ga ra ou M o io da exterior, Paul y – o maior prêm m m ra G o ou ganh guinha: Paulo 2000, quando trabalho “Pixin o m co – l ia d música mun utas”. Moura e os Bat

Marilyn M anson expõ e obras de a Cantor fa rte moso e p

olêmico, assume se Marilyn M u lado art anson is ta plástico junho, foi . No dia 2 aberta no 5 de museu de a mostra a V ie n a , n a ssinada pe Áustria, lo cantor, logies of p intitulada ain. As ob Genearas, realiz de aquare adas com la, apresen a técnica tam a mes soturna d ma caracte o trabalho rística musical d informaçõ o artista. Se es divulga gundo das pelo m se de Mari useu, “o in lyn Manso teresn se foca n po human a análise d o e suas ex o cortremidade especial, a s e cavida s regiões d e s, em vulneráve bocas, ded is ao med os, olhos e o , como órgãos gen itais”.

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Festa do Divino “Assim como os três reis magos Que seguiram a estrela-guia A Bandeira segue em frente Atrás de melhores dias, ai, ai...” (“Bandeira do Divino”, Ivan Lins)

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Festa do Divino Espírito Santo é realizada em muitos cantos do Brasil, parecendo ser mais relevante no Centro-Oeste. São poucas as informações sobre sua origem, mas é certo que o evento surgiu em Portugal e foi trazida ao Brasil pelos missionários jesuítas.  Essa festa ocorre no Domingo de Pentecostes, cinquenta dias depois da Páscoa, em uma comemoração da vinda do Espírito Santo sobre os apóstolos de Jesus.  Em Piracicaba (SP), a Festa do Divino Espírito Santo faz parte do calendário da cidade, sendo muito prestigiada. A festa teve início na cidade em 1826, completando 184 anos em 2010. O Rio Piracicaba é um cenário perfeito para o evento, prestigiado tanto pela parte santa quanto pela profana.

foto de Gilberto Pessato jr.

Carla Ceres é 2ª colocada em concurso do Abletras

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arla Ceres Oliveira Capeleti, de Piracicaba, conseguiu a segunda colocação no primeiro Concurso de Microcontos do Abletras, com o microconto:    “Joguei. Perdi outra vez! Joguei e perdi por meses, mas posso apostar: os dados é que estavam viciados. Somente eles, não eu”.    O objetivo do concurso, lançado em março deste ano, foi aproximar a tradição acadêmica da sociedade. Poderiam ser inscritos microcontos com tema livre e até 140 caracteres. No total, 2.293 microcontos foram enviados, inclusive de outros países, como Argentina, Espanha, Japão, México e Portugal.  Segue o microcontos vencedor:

“Toda terça ia ao dentista e voltava ensolarada. Contaram ao marido sem a menor anestesia. Foi achada numa quarta, sumariamente anoitecida”. de Bibiana Silveira Da Pieve do Rio de Janeiro (RJ).

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eguem os filmes em destaque no You Tube em três categorias no mês de julho: viagens e eventos, humor; guias e estilo.

Viagens e eventos Where the Hell is Matt? (2008) Link: http://migre.me/10lhX

Guias e estilo David Blaine’s Card Tricks Revealed Link: http://migre.me/10lqe

Humor Deadpool’s Comic Con Song (Parody)! Link: http://migre.me/10lsc

Parabéns a todos os pais, pelos ensinamentos, apoio e compreensão. Equipe Fusão Cultural. O pai chama o filho para uma conversa: Filho, eu estou decepcionado com você.

Conversei com a sua professora e ela me disse que, dos 20 alunos da classe, você é o pior.

Ora pai, poderia ser bem pior.

Ué, a turma poderia ter 40 alunos...

Como assim, garoto?

por valdir


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ascido em Piracicaba, interior de São Paulo, em 22 de Agosto de 1922, Pedro Morato Krähenbühl viveu nessa cidade até 1941, mudando-se depois para a capital. Aluno da Faculdade de Farmácia de São Paulo em 1942 e da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras em 1943, abandonou os estudos após um ano de aulas. Trabalha no Instituto de Previdência a Assistência dos Servidores do Estado (Ipase) de 1944 a 1958. Entre 1951 e 1952, colaborou com o suplemento literário Letras e Artes Narceja, revista literária editada por Miltom de Lima Souza, e publicou seus poemas, como também os suplementos literários do O Estado de São Paulo e do Diário de São Paulo. Publicou em 1948, com Ciro Pimentel, Geraldo Pinto Rodrigues e Domingos Paolielo o Informe dos Novíssimos. Faleceu em 21 de Julho de 1958.

por Cyro del Nero *

ração, meu co e d e m O lu rpo, meu co e imas, d r o d ar has lágr in m e d ento eblina pensam gélida n a o d u t re ãos caia sob inhas m m m a s s o orta e nem p minha p e d s e v s cha volver a órtula. a da esp d e o m ou a eblina densa n a t s e o e tud Mas cur a alma, o, e cale it r g o e cale descia viaduto m u r o p que da. al deseja ic t r e v na

: escreve de 1958 o ndono lh u J de aba e t i Em 2 de o n em uma Poema

ro M

d e P e d a d a c i l b Obra não pu

a g n e o v A m e ühl g a orato Krähenb Bag


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gavas e carre o i r o s Já era búzios as dos t u l o v nas . das nações das on o s r terras e o d no spenso ecoas Ora su inadas m u l i s ea em gáv chão. rio do ú m r u om

o escrit

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s as, pagado desolad s Lares a n e g r es e ma E árvor ros, uando, isionei r p s o c ida flut v a bar d s so , s reman assível todos o te, imp n a t idade s n , co em da c g a is a e lenta p lga a te empo egaço. a corren h e no r l r a r b a sosso

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Cerca de 50 dias após escrever Poema em uma noite de abandono, Pedro Morato Krähenbühl suicida-se em São Paulo, se atirando de um viaduto sobre a Avenida Nove de Julho. O poema era uma profecia e certamente um desejo. Sua obra de extraordinária qualidade poética deveria ser conhecida e difundida entre seus conterrâneos de Piracicaba. Ele havia dedicado sua atenção poética para o Rio Piracicaba através de alguns poemas. A contemplação do Rio Mensageiro na sua infância e juventude criara no poeta uma referência poética, que não o deixou nunca mais. O Rio Piracicaba foi razão de identificação com o poeta e este encontrou nele um espelho fluente de sua vida. Um épico projetivo, muito pessoal.

guas dulta. so às á u-me a o Regres r g o l a io infânci onde a e silênc gens d r a m s Entre a te. rito a torren o um g n o id t r repous ue ve de sang clamor

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eiro 7 g a s n 95 e Rio M s entre 1943 e 1

Paulo Bomfim Poeta

“... o seu testamento lírico (Bagagem Avoenga), repleto de vozes misteriosas que povoaram a sua vida atormentada.”

s Poema

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Crescer como uma árvore a compor tua moldura de beleza, sem outra sede que tua voz de indiferença. Ter pelos barrancos a noite debruçada, sua febre entornando no teu bojo.

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Nada mais floresce nas areias escaldadas, seu brilho a noite fosca já sepulta. Envergando suas vestes de limo, navega só, o escuro leito, extenso, amortalhando as locas do silêncio.

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14 A palavra sem melodia rumoreja, escorrendo em águas profundas, como seixo rolado e polido na lavra do tempo, em remanso de alheias vozes confundida. Nas retinas impévidas desfilam os rostos espalhados na tua face. Antiga sedução.

Oferecida a vária escória, submersa vacila a chama flébil, lume desaguado em caudais de traficância, a imprimir-lhe rumos preteridos. Quando este verso ressurgir do olvido, ao mar largando sua concha de nostalgia contempla-o e diz se lhe refulge o pensamento de vida que o gerou.

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num estendal de rumores resumidos, surdo coração, és mar para onde sigo.

com seu carimbo de setas dardejantes. Ao longo das ribeiras, nas fímbrias das procissões, nas alamedasdo credo, sombras graves e esguias meneiam suas confissões. Prantos e folguedos

Menino náufrago em ondas de ternura, nem lavra de ouro ou diamante ao encrespar a sua fantasia, nos recessos da infância a estatuária do sonho inventando tesouros de areia. o sol vivo e claro enriquece-lhe a fábula,

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Ontem, sempre e ainda depois agasalha-me em tuas orlas. Leva-me no teu jorro aonde não mais chegarei. instância de sumo devaneio, lágrima de malogros, único vetor de confiança. De criança a homem a memória, constância do meu afeto, tu, humano curso, galgarás o aconchego de corações solutos na imemorial traça do oceano. Bandeiras arfantes em vagas adunadas, teu pequeno sulco, manso e pertinaz, há de impor, por um braço aqui distante, ilhado em destemor, sobre um roteiro de terras irmanas, coligidas em sinuoso colóquio, a pedra, a roca, a esquina do mundo desfechando sua luz.

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Ignora a morte teu degredo de águas exaustas na distância, morada de horas inacessíveis. infatigável nem pedras, nem lodo são tropeços ao tempo que constróis.

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Fluem cantigas erradias na pauta do teu estro sussurrante. troncos perdidos para antigos fogões, alhures, vão tombando confidências num aranzel de despojos. Em dia remoto, não adverso, nas malhas de sua rede, o pescador ouve o rio cantar seu perpétuo desterro.

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Pedro Morato deixou poemas dedicados aos amigos que encontrava diariamente na Biblioteca Municipal Mário de Andrade, na Rua Consolação a poucos passos do Ipase onde trabalhava. Ali havia uma pequena congregação de jovens devotos da poesia e das artes que usufruíam da companhia de Pedro e de seus poemas. Tais jovens ganham um novo vocabulário para a genração advindo das obras de poétas como Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira e o próprio Predro, que lhes ensinava com o exemplo de seus poemas. Pedro Morato era carinhosamente respeitado por seus amigos devido à sua postura gentil e nobre.  O poema seguinte me foi dedicado por ele e nele há uma referência ao meu compasso diário acompanhando-o por bares e pelo silêncio que fazíamos enquanto compartilhávamos a contemplação das gentes da cidade.  Há outras referências no poema: o desenho, retrato que fiz de Pedro e que ao vê-lo ele teve uma surpresa, uma revelação da leitura que fiz dele. Referência ainda ao seu passo claudicante: Pedro claudicava (mancava) em razão de um problema ao qual nunca se referiu.

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Domingos Carvalho Silva Poeta

“Não chegou nunca a permitir a sua publicação, pois tinha sempre reparos e retificações a fazer.”


conduzia

mim meu abraço e o eterno aconchego de a madrugada. era relva apenas, para o coração me Tão silencioso e grave

em de exílio”. “Escolhe outra linguag aratas fora de Havia o rumor das cat

amor, dizia:

dimensão eterFlui pelos nervos uma na, como o cansaço vai lenta, vaga, calma da aurora. aos remansos tímidos da corredeira, As águas bóiam, além um barco e deslizo no dia como

a minha voz Essas lajes que forram s meus cílios. Como pesam agora no

dras a noite. e o desejo vazio como

pe em seu esquivo tropeço brilho das pepor lume, só o parco

vereiro de 1955 Escrito em 05 de fe la sombra,

o Poema Ribanceir

arado de miAndei um instante sep nha alma ímpeto e ao corpo que jazia sem a água murmurava: is puro; Sê linfa de um ardor ma o e suave como ao gesto que era brand

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A mão mutila da, o audacioso d esenho compondo in exorável estilo , Os olhos sem órbitas, e outras mínim as evocações de uma farta vão amarfanh constância, adas nesta pág ina, onde as noçõe s mais claras não subsistem ao retrato em grafia de apôd o

de fevereir o

de 1955

indeclinável, teu socorro ao meu passo clau dicante. Todo desacor do anterior ao s mitos, atroz, pois in umano, desfaleça num abraço e ingreso nos dê a um coraçã o mais vasto.

Não ouso o es forço da sediç a palavra, Amigo, mas um sussu rro desgovern a-me os lábios e abriga, ,

e apelo, com que te fu i despertar par a sorveres min ha dor. nosso estandar te bem fora o riso pueril e galhardo o levaste, aos escombros projetados onde fundam os idêntica es perança.

Nero em 13

Cristóvão

a Cyro del Eu não sabia passar e tu m e levaste a vadear o man ancial que nos ata e ora escorre em terna e co m passiva partilh Leve me faço a. para teus om br os imensos e o pouco de desafio ceifad o na memória sustento com o lume. Vou esboçar o calendário de uma vida, para em porçõ es incessantes espalhar o idíl io que me con cedeste.

Escrito par


Outros poemas atestam sua qualidade poética e sua pesada carga existencial. Pedro Morato se refere sempre à sua bagagem avoenga, (herança de avós) como um fel que fora obrigado a beber.

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9 de março de 1957

Augúrio

Aguardo o pânico abrir suas veias de insanidade. Aguardo o brado da loucura a percurtir-me o coração. Espero os dedos ágeis da morte para decifrar-me as contradições. Vou crivando meu corpo de dissonâncias, de malogros. Sob a clausura de um rosto fingidor, o pó de meus ossos escreve o derradeiro mote da vida: Desesperou de cansar-se.

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Torneio

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A morte por descrença, à desventura do tédio, este riso que a vontade abomina subjuga e mostra o pensamento. Um dia despojado do cansaço, bagagem avoenga que me frustra as jornadas ideais, terei que romper o rictus letal, e, sobrepondo o elmo da esperança a imagem envilecida do sarcasmo, poderei rir sem abalar a estrutura do sonho.


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Poema 2

Oh! nós que roçamos a fímbria das coisas e não vencemos jamais o seu fátuo limite Em nossos olhos o reflexo de um lume, arde sua espera extrema, ardem os carvões, aos olhos da treva. Quando nada mais reluzir e sombra sobre sombra, vontade minada e sujeita ao crepúsculo, nos roce apenas o eco de uma pobre palavra, indistinta e sutil, lápide de silêncio, teremos dito além do alarme do sonho, a palavra rapace, vindime instrumento, verbo oculto, de outra conversão.

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Viagem, riqueza, mágoa do que deixou de abarcar nas suas mãos gastas de cal, tudo se compõe em arquiteturas de sombras na heráldica vontade de erguer, outra vez, velas da aventura a descobrir no tempo exausto o coração intacto.

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Migração

Vê que teu verso não ande aceso onde ande a noite. Não lhes dispense noturnidade. Põe nas vigílias em que demoras as nebulosas do pensamento. Falso episódio. Seja teu sorriso mancha tênue, mas perceptível da face das coisas. Guarda-te, armeiro próprio, forjando palavras que te livrem quando o sonho vier disputar, a tua vontade, tuas mãos.

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Poema Oculto


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Deveras nunca soube ser prudente, aceitando a fortuna oferecida. Dos bens colhidos em minha rede um não tive que escapasse às malhas largas. Ou fosse o coração ou fosse o pensamento em cinzas o desmanchei, e, por terras natais espalhei seu resíduo a ventos desiguais. Duro era meu ser, avesso aos torneios, e a palavras amáveis não sujeito, que via todo dom em cólera desfeito. Não tendo meu quinhão em bom proveito, neguei todo o bem e a mim ser bom.

Escrito em 6 de julho de 1958

Imitação de Solon

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em Cenografia e Indumentária Teatral da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (USP), responsável pela área de História da Arte na Antiguidade para as interunidades da USP, professor da pós-graduação de História da Moda da Univali de Santa Catarina, e professor convidado da Escola São Paulo. Prêmio Melhor Cenógrafo Nacional na VI Bienal de Artes Plásticas de São Paulo, fundador como cenógrafo e diretor de arte da TV Excelsior em 1960, cenógrafo do Teatro Brasileiro de Comédia (São Paulo) durante dez anos, Cyro del Nero criou cenografia em Atenas, Berlim, Lyon, Sófia, no Museu do Louvre, Paris, e também para o Pavilhão Brasileiro na Feira de Osaka. Sua erudição abrange o conhecimento e o ensino da História da Cenografia e da Indumentária Teatral, História do Teatro, História da Moda e da Cultura Helênica. Autor de obras sobre a Grécia Clássica, Cenografia e História da Moda. Para mais informações, consultar o site do autor: http://www.cyrodncenografia.com.br/

*Cyro del Nero é professor titular da pós-graduação


A 8ªarte

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o princípio eram os praxinoscópios – brinquedo feito com latinha e tira de papel, que refletia em fitas transparentes desenhos de bichos e pessoas movimentando-se. Vieram os jogos de espelhos para projetar as imagens. Mais adiante, o Teatro Óptico, então, estava inventado o desenho animado.  Encantando crianças e adultos, o filme de animação, conhecido como a oitava arte, surgiu, supostamente, com as sombras chinesas entre os séculos XVII e XVIII, evoluiu e cada vez mais ganha espaço nas salas de cinema. Sua primeira evolução foi com o avanço da fotografia e, mais atualmente, com a agilização do processo de produção, devido ao desenvolvimento da animação digital.  A grande característica do cinema de animação é o fato de a trama não ser realizada por atores, mas desenhos, fotos ou bonecos. Assim ele compreende a animação de marionetes, cinema de recortes

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(no qual são usados cartões de papel colorido), cinema abstrato (funde música, pintura e cinema), cinema animado e a animação computadorizada.  O primeiro desenho animado a contar uma história e não mostrar a mão do artista criando os traços foi a animação Fantasmagorie, feita pelo parisiense Emile Cohl e exibido em 1908. Já a primeira animação em longa metragem diverge entre Sinking of the Lusitânia, do novaiorquino Winson McCay, e El Apostol, do argentino Frederico Valle.  O desenho animado tem uma trajetória de grandes sucessos: Gato Félix, Pica-Pau, Mickey Mouse. Nas últimas décadas, o número ampliou consideravelmente; Irmão Urso, Era do Gelo. Duas grandes produções que recentemente tiveram suas continuações no cinema foram Shrek, em Shrek para sempre, e Toy Story 3. A oitava arte evoluiu e ainda há espaço para crescer, desde que haja criadores criativos para fazer novas histórias e inventar novas técnicas. Você se arrisca?


A

Só agora ser repentista é profissão?

voz ecoa. Versos rimados são ditos. Embate entre cantores, no qual um tema improvisado é o pano de fundo do repente. A profissão de músico repentista não é nova. No entanto, só agora é reconhecida por lei. A lei nº 12.198, de janeiro de 2010, dispõe sobre o exercício da profissão de repentista. A lei não muda a profissão, mas sim a forma como ela é encarada por muitas pessoas e casas de show.  De acordo com a disposição, repentistas são considerados cantadores e

violeiros improvisadores, além de emboladores e cantores de coco, poetas repentistas e os contadores e declamadores de causos da cultura popular, e escritores da literatura de cordel. “Lei nº 12.198, de 14 de janeiro de 2010.  Art. 1o Fica reconhecida a atividade de Repentista como profissão artística.  Art. 2o Repentista é o profissional que utiliza o improviso rimado como meio de expressão artística cantada, falada ou escrita, compondo de imediato ou recolhendo composições de origem anônima ou da tradição popular.”

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ensar com o o su jeito se coloc a no mu ndo atr avés de seu c orpo remete a Fenomenologia de Merleau-Ponty que aborda em sua teoria a problemática da corporeidade humana integrando a visão de corpo e movimento na totalidade do ser e estar no mundo. A movimentação do bailarino se revela como intencionalidade do ser através do tempo e do espaço. Segundo Merleau-Ponty (1999) a

movimentação espontânea do corpo do bailarino naquele momento que envolve a composição e a atuação simultânea. Ao não serem determinados os movimentos abrese espaço para novas possibilidades e descobertas. A improvisação surge nesse contexto como um meio de aproximação do bailarino com o seu sensório e sua percepção, potencializando sua sensibilidade através da exploração de seu corpo.  Desta forma, o presente texto

Através da dança não se diz, mas se é. (Ted Shaw)

Um olhar fenomenológico sobre a improvisação na dança

Corpo que dança

sensações. O sujeito quando dança manifesta sua memória corporalafetiva acessando a sua história, o que lhe permite um maior contato com suas emoções. Dançar envolve tanto o movimento quanto a comunicação, e também a emoção de forma que, dançando é possível “compor a forma do movimento como expressão de um significado interno” (Garaudy, p. 49, 1980).  Improvisar para Laban, citado por Launay (p. 76, 2000), “é de

por Nicolle Carvalho Pinto Vieira

pela Universidade Paris 8.

é mestranda nos cursos de Dança e em Filosofia

Minas Gerais. Atualmente

Universidade Católica de

formada pela Pontifícia

é bailarina e psicóloga

Nicolle Carvalho Pinto Vieira


Fenomenologia é a tentativa de uma descrição direta de nossa experiência tal como ela é. Essa descrição compreende o ser humano em sua totalidade corpo-mente através do desenvolvimento de percepções do sujeito sobre o mundo que o cerca, transformando suas noções de ser e estar no mundo.  Esse “estar-no-mundo” implica relação com o meio externo, corporeidade, possibilidade de ser, temporalidade, espacialidade, afetividade; o que é chamado por Merleau Ponty de espacialidade de situação. Ou seja, como o corpo é colocado diante de suas tarefas. Esses fatores são observáveis na dança, principalmente quando a atividade exercida é a improvisação.  Entendemos por improvisação na dança a situação em que não há movimentos determinados. Improvisação é a

propõe investigar a improvisação na dança como possibilidade de reflexão sobre o “estar-no-mundo”. Para que seja possível essa investigação fazse necessário considerar a marca da história pessoal no corpo, ou seja, vivências, desejos, frustrações e tudo o mais que o estar-no-mundo propõe, colocando como problema a questão: É possível promover a reflexão acerca do “estar-no-mundo”, ou seja, como os bailarinos se colocam nesse mundo de possibilidades a partir da improvisação na dança?  Lobo (2003) diz que o corpo está impregnado pela história pessoal, de lembranças, mantendo em si uma memória-corporal-afetiva. Portanto, é através dos movimentos que se aciona esta memória corporal de forma a manifestar o imaginário, pensamentos, ideias, emoções e AGO/SET  2010

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um mesmo movimento, buscar e encontrar, decompor e unificar, esquecer e rememorar, sobretudo, não se lembrar”. Neste sentido, entendese por improvisação na dança a possibilidade de sensibilização, de ordenação das idéias a partir de experimentações e sensações seguidas de reflexões sobre os movimentos realizados. Durante a improvisação o sujeito vivencia no presente suas experiências passadas através do que foi inscrito, marcado em seu corpo. A movimentação extrapola os limites de tempo e espaço estabelecendo relação entre as experiências vividas e o movimento, compreende a busca pelas possibilidades de movimentação e expressão através dos movimentos.  Assim, mente e corpo, que para Merleau-Ponty são interdependentes, se relacionam e estabelecem uma ligação


pelos movimentos, manifestações psíquicas no espaço-tempo dentro do qual este corpo está inserido. “Um único movimento, ou uma seqüência de movimentos, deve revelar, ao mesmo tempo, o caráter de quem o realiza, os obstáculos exteriores e os conflitos interiores que nascem deste esforço.” (Garaudy, p. 113, 1980)  Movimentar-se é manter-se vivo, é resgatar a identidade corporal, tornando consciente o seu mundo interior e reagindo ao mundo exterior. E assim apreender os fenômenos do universo na busca da compreensão do que ocorre ao seu redor, despertando o desejo de expressão. Dançar e existir tornam-se uma só coisa. É a intencionalidade do ser, diante de suas tarefas, de seu devir, proposta por Merleau-Ponty (1999), que diz da abertura do ser ao mundo externo.  Segundo Santos (2003), o homem

identidade e de todo o seu ser.  Esta é a proposta de Merleau-Ponty (1999) quando diz da consciência global da própria postura no mundo intersensorial. A improvisação surge em meio à sociedade moderna como possibilidade de viver intensamente as angústias e as realizações no tempo. Surge também como possibilidade de invenção de novos signos de expressão capaz de exprimir os sentimentos mundanos. E através das sensações do dançar podemos reformular a representação desse corpo no mundo.  Nosso corpo tem seu lugar no mundo, ele ocupa um espaço e por isso pode-se dizer que está no mundo, porque atua como fator espaço-temporal, o que permite constituir a essência do ser. Sua espacialidade é seu desdobramento, é sua possibilidade marcada pela

estímulos e necessidades ao mesmo tempo que não se prende a nenhuma receita ou fórmula preestabelecida, orientandose pelas mais diferentes emoções e pela percepção consciente dessas sensações.” (Vianna, p.126, 1990)  Porém, para trabalhar o corpo é preciso acordá-lo, tirá-lo dessa mecanização e repetição do dia-a-dia. É preciso desestruturá-lo, retirá-lo do paradigma em que se encontra. Só com o corpo desperto, e aberto, para novas experiências é possível mudar. As ações dependem da relação de cada um consigo mesmo, o trabalho a ser feito é a retirada das barreiras para a movimentação, conseguir flexibilizar as fronteiras entre as


caracteriza-se por relacionar-se através de seu corpo. Assim, a dança surge para viver corporeamente esses conflitos, servindo como um instrumento de elaboração. Dançar, em sua essência, não é só a movimentação em si, como um fim em si mesmo, dançar é também se relacionar com o mundo a nossa volta. Ou seja, “o trabalho corporal tem uma dimensão terapêutica, na medida em que torna o corpo uma referência direta de nossa existência mais profunda.” (Vianna, p.70, 1990). É possibilidade de sensibilização, de ordenação das idéias a partir de experimentações e sensações seguidas de reflexões sobre os movimentos realizados. Através do movimentar é possível incorporar e transmitir valores e atitudes que propiciarão um meio de apropriação do corpo, de sua

temporalidade. Toda intenção é respondida com reações corporais, nosso corpo exerce atreladas tarefas, ou seja, nosso corpo organiza as diversas atividades necessárias para que possa mover-se em direção do objetivo. Ele constantemente se move em direção a algo que é externo a ele, em direção da intenção que produziu o movimento.  O fator importante da improvisação permite que esse corpo se mova em função de seu mundo interno. Nessa função, o outro surge como fator determinante, já que possibilita novas experiências e novos questionamentos, “... uma reflexão no outro, um poder de pensar segundo o outro que enriquece nossos pensamentos próprios.” (Merleau-Ponty, p. 243, 1999). “(...) um corpo inteligente é um corpo que consegue adaptar-se aos mais diversos AGO/SET  2010

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ações. Se o espaço no qual se vive torna-se igual em todos os momentos é porque se perdeu a capacidade de senti-lo, se perdeu a capacidade de transformação e assim o mundo ao redor não é mais percebido. Para conseguir o equilíbrio, é necessário antes reconquistar o espaço.  Enfim, a dança utiliza o corpo que se expressa através dos movimentos carregados de afetividade. Dançando podemos intervir de forma a promover profundas transformações nos seres humanos para que suas relações sejam modificadas em direção a uma evolução. Através do dançar podemos transformar e melhorar aquilo que somos, descobrindo nosso próprio corpo, suas capacidades e limitações. É por meio de nossos corpos, dançando, que os sentimentos

cognitivos se integram aos processos mentais e que podemos compreender o mundo de forma diferenciada, ou seja, artística e esteticamente. (Marques, p.25, 2005) Portanto, este texto tem como objetivo propor a improvisação como recurso a ser utilizado para promover novas percepções através da movimentação espontânea buscando novas formas de significação.  Nesse contexto a improvisação surge com uma possibilidade para que os bailarinos possam se ver na forma como se posicionam no mundo. Nesta pesquisa, as formas de posicionamento puderam ser observadas e filmadas através dos momentos em que os bailarinos se disponibilizaram a improvisar. A dança aparece assim como

comunicação, como narrativa em meio à contemporaneidade para que seja possível a manifestação de nova maneira de estar no mundo.  O fator importante da improvisação é que esta permite ao corpo se mover em função de seu mundo interno. Nessa função, o outro surge como fator determinante, já que possibilita novas experiências e novos questionamentos. De acordo com Merleau-Ponty, através do corpo o ser humano é capaz de se manter em relação com o tempo e com o espaço, associando o corpo como poder de expressão da história.  Através da improvisação o bailarino é capaz de resgatar a história em seu próprio corpo. Dançando percebe-se o corpo e através deste também percebese o mundo como receptor de tudo o


que é exterior ao corpo projetandose através das possibilidades. Dançando, improvisando, os bailarinos reconquistam suas dimensões corpóreas que podem ter sido perdidas na automatização do dia-a-dia contemporâneo.  Nosso corpo tem seu lugar no mundo, ele ocupa um espaço e por isso pode-se dizer que está no mundo, porque atua como fator espaço-temporal, o que permite constituir a essência do ser. Sua espacialidade é seu desdobramento, é sua possibilidade marcada pela temporalidade. Toda intenção é respondida com reações corporais, quando o corpo exerce atreladas tarefas, ou seja, nosso corpo organiza as diversas atividades necessárias para que possa mover-se em direção ao objetivo, e ele constantemente se

move em direção a algo que é externo a ele, na intenção que produzirá o movimento  A improvisação também pode acontecer entre duas ou mais pessoas. Esta interação permite que novas percepções ocorram. Essas novas percepções possibilitarão a construção de novos sentidos pelos bailarinos. Não se movimentar acumula no corpo o cansaço do diaa-dia e limita a capacidade expressiva dos seres humanos. Limitar esta expressividade acaba por levar o homem ao esgotamento, à repetição. E essa automatização se reflete diretamente nas formas de reflexão através deste corpo cansado. A improvisação permite que o bailarino busque se expressar de diferentes formas construindo novos sentidos para sua existência. Ao trazer em AGO/SET  2010

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seu corpo cansado a história, através do que se denominou memóriacorporal­ afetiva, novas construções são comunicadas por meio da improvisação na dança.  Pode-se então concluir que a improvisação se faz através do diálogo daquele que improvisa com ele mesmo e com a repetição cumulativa da história no tempo e no espaço. É o reconhecer semelhanças, diferenças e descobrir potencialidades e novas formas de se expressar, de se posicionar no tempo e no espaço resgatando as impressões do passado na percepção do presente. A improvisação pode surgir como um fator que liberta o sujeito de uma realidade opressora que o aliena e desvincula de si, afastando-o de sua corporeidade, de suas percepções, emoções e pensamentos.


José Saramago

por Priscila Salvaia

A

um intelectual de múltiplas facetas.

bordar a obra e a vida de José Saramago é antes de tudo perder-se nos caminhos apontados por um autor cuja personalidade era multifacetada. Por vezes nos deparamos com o literato, com seus romances, peças de teatro, poesias. Em outros momentos nos deparamos com o ativista político, “comunista hormonal”, crítico severo da sociedade capitalista moderna. E como deixar de destacar o Saramago ateu, cético, descrente de qualquer tipo de paraíso “extraterreno”. Contudo, todas estas facetas estão presentes na prosa, nos versos e na atuação de Saramago.  A escrita “caótica” do autor é uma de suas principais características, os longos períodos, a pontuação não convencional, a ausência de travessões, tornam o texto mais próximo da oralidade, em muitos momentos o leitor não sabe se lê as falas ou os pensamentos das personagens. Trata-se de um fluxo contínuo que expõe os inconscientes fictícios, a fim de que o leitor se envolva e em muitos momentos se identifique.  Como seria possível não nos reconhecermos no Ensaio sobre a cegueira (1995)? Como não admitir que somos “cegos” subjetivamente, humanamente e politicamente? Na epígrafe do romance o autor destaca a seguinte frase: “Se podes olhar, vê, se podes ver, repara”. O “olhar” significa a percepção visual, consequência do sentido da visão, porém “ver” teria um sentido mais amplo, de observar atentamente, compreender aquilo que nos aparece à vista. E neste sentido somos todos cegos, que olhando, não vemos. Somos alienados de nossos sentimentos, de nossa humanidade, de nossos desejos. Ao perder a consciência de si, o homem se degrada, perde a sensibilidade de coexistir com seu semelhante e desta forma se “barbariza”, como as personagens cegas entregues à violência e ao esquecimento.  Mas a vasta obra do “tardio autor” aborda ainda outras várias temáticas. O seu país de origem, Portugal, também seria cenário e tema constante de seus romances. A terra do pecado (1947); A jangada de pedra (1986); História do cerco de Lisboa (1989); são romances que transitam entre o tênue limite da História e da narrativa histórica ficcional. Saramago busca evidenciar a formação

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Priscila Salvaia é licenciada em História pela Universidade Estadual de Campinas, e revisora da Fusão Cultural.

e a invenção das identidades nacionais de um país ibérico que se encontra na margem e à margem do continente europeu.  Temas político-sociais também seriam constantes em sua obra. Saramago abordou de forma bastante crítica os conflitos inerentes à estrutura do capitalismo moderno, como os embates causados pela exploração do homem, a desigualdade social, a globalização massificadora, etc. Em Levantado do chão (1980); A Caverna (2000); Ensaio sobre a lucidez (2004), entre outros; o autor aborda criticamente as desventuras do sistema capitalista. A lúcida postura crítica de Saramago não se restringiu somente à sua obra, mas em manifestos, entrevistas e discursos, o autor apontava as contradições e imposições do capital e da “democracia representativa” cerceadora do exercício da cidadania.  Há ainda os famosos e polêmicos romances com temáticas religiosas. Em livros como O Evangelho segundo Jesus Cristo (1991); Caim (2009); deparamos-nos com o Saramago ateu, questionador e provocador dos paradigmas e dos dogmas da Igreja Católica. O autor retrata a religião e a criação do pecado como instrumentos de controle e dominação social, as personagens bíblicas são humanizadas de forma perturbadora aos olhos do leitor, Jesus seria simplesmente o filho primogênito de José e Maria, e não o filho de um messias salvador chamado deus (com letra minúscula).  Saramago foi uma das mentes mais dissonantes da literatura portuguesa, capaz de expor as mazelas humanas, questionar as estruturas de poder, afrontar as crenças de um país predominantemente católico. Mas, além disso, Saramago foi uma intelectual atuante até os últimos momentos de sua vida, um provocador de consciências estagnadas em vivências medíocres. O Nobel da Literatura foi um homem capaz de cultivar idéias. É impossível não repetir o clichê que Fernando Meirelles utilizou no dia do falecimento do autor: com a morte de Saramago “o mundo ficou ainda mais burro e ainda mais cego.” AGO/SET  2010

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Objetividade e Subjetividade em Cena

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onceituar de maneira “objetiva” termos como objetividade e subjetividade não é fácil, pois esses conceitos podem ser aplicados em várias situações e em diversos campos do conhecimento. Nesse ponto uma visita ao velho e bom “Aurélio” pode ser ilustrativa. Na cena teatral, o espetáculo objetivo pode ser considerado aquele com “começo, meio e fim”, ou mais do que isso, representa um encadeamento lógico em que cada cena acontece em função da outra.  Subjetivo, seria então, o espetáculo que não contêm esse encadeamento lógico, pelo menos não de maneira evidente, apresentando fragmentação de linguagem, em que cada cena funciona para si. São exemplos de objetividade: teatro grego, romano, renascentista, clássico francês, teatro do século 18, parte do teatro romântico (Dumas) e teatro realista. Em relação à subjetividade, podem ser citados: teatro do movimento Sturm und Drang, outro lado do teatro romântico (Byron), teatro simbolista (Maeter-

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linck), teatro expressionista (Wedekind), moderno (com as técnicas de Artaud, Meyerhold, Grotowski, etc.). Além do objetivo e do subjetivo há também o ambíguo: teatro religioso medieval, teatro de Shakespeare, peças de Buechner, peças de Strindberg, entre outras.  O teatro tal como o conhecido no ocidente, advém da Grécia, do século VI a.C.. Evidentemente, podemos buscar origens muito mais remotas, chegando aos rituais dos antigos xamãs e aos primórdios da humanidade. Porém, não é aqui o caso. Aristóteles, (384-322 a.C.), em sua famosa obra “Poética”, (provavelmente escrita em 335 a.C.), descreve que “A Tragédia é a imitação de uma ação séria e completa, dotada de extensão, em linguagem condimentada para cada uma das partes; ação apresentada, não com a ajuda de uma narrativa, mas por atores...”; obedecendo a uma estrutura.  A “Poética” aristotélica (apesar de nos chegar incompleta) exerceu uma profunda influência sobre todo o ocidente. Tanto que, mais de vinte


séculos depois, Bertolt Brecht (18981956) apresenta o seu Teatro Épico como a primeira proposta formal rigorosamente não aristotélica. Para Brecht praticamente todo o teatro escrito antes do Teatro Épico estava influenciado pela “Poética” de Aristóteles. Essa afirmação é contestada por diversos estudiosos do tema, para os quais essa generalização deve-se a uma interpretação limitada dos conceitos expressos por Aristóteles. Fato é que vamos observar um estridente “estilhaçar” das formas de fazer artístico no século XX. Gosto de uma definição de arte do falecido ator Raul Cortez (1932 – 2006): “Arte é a transformação estética de uma realidade”. Para mim, essa definição é suficiente porque engloba o sujeito, o objeto, e estabelece uma relação entre eles. Pensando dessa maneira, me parece descomplicado imaginar que as transformações ocorridas em decorrência da Revolução Industrial nos séculos XVIII e XIX e que desembocaram no século XX (mudando radicalmente a maneira de viver de toda a humanidade), teriam que obrigatoriamente repercutir nas formas do fazer artístico. No século XX, houve duas grandes guerras, as teorias de Freud sobre o inconsciente (subjetividade), a expansão do capital com todas as tensões e reações

geradas pela mesma, a explosão tecnológica em todos os campos do saber, a dilapidação da natureza, etc.. Movimentos provocam movimentos.  No mesmo século, o Dadaísmo (Zurique, 1916) pretendeu a destruição completa de todas as formas convencionais de expressão artística e foi o precursor do Surrealismo, do Expressionismo e outros movimentos. “Happening”, “Performance” e outras manifestações, a união do teatro, dança, artes visuais e a participação ativa e mesmo física do espectador se apresentam como formas de preenchimento artístico do espaço aberto pelo “estilhaçar” de todo um modo de vida. Como complicador, há também a “Cultura de Massa”; a transformação de tudo em mercadoria, imposta pelo capital. O que virá a seguir?

Raul Rozados é licenciado em Filosofia pela Universidade Metodista de Piracicaba (SP), ator formado pelo Conservatório Carlos Gomes de Campinas (SP), e fotógrafo pela Escola Paulista de Fotografia.

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Karine é engenheira florestal, educadora e integrante do Educomunicamos! Ponto de Cultura de Piracicaba (SP)

por Karine Silva Faleiros

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ara abordarmos a complexa relação entre Cultura e Educação, iniciaremos com uma reflexão sobre a necessidade de integração entre os diferentes campos do saber. Integrar saberes que na realidade nunca estiveram separados é uma tarefa de reforma do pensamento que historicamente divide e põe em caixinhas o conhecimento. Nos encontramos em um momento no qual é urgente dar movimento à transformação do pensamento e unir saberes inseparáveis.  Com o disse Edgar Morin no seu necessário livro entitulado Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro: “O todo tem qualidades ou propriedades que não são encontradas nas partes, se estas estiverem isoladas umas das outras, certas qualidades ou propriedades das partes podem ser inibidas.”  Então, partindo desta reflexão, nos sentimos motivados a considerar que a Educação e a Cultura são parceiras inseparáveis, se inter-relacionam intensamente, se retroalimentam e se embelezam mutuamente.

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Mas, a questão chave deste breve texto, não é reverenciar a integração entre Educação e Cultura e sim evidenciar a necessidade de seu reencontro criativo. No decorrer da história da sociedade esta íntima relação vem se dissociando por forças e conflitos entre o saber e o poder, e com isso, atualmente, nos deparamos com uma educação que dá ênfase à alfabetização, à tecnologia e à formação de especialistas, os quais vêm se mostrando, de forma geral, indiferentes a complexa teia da vida. Ou seja, a cultura é enfraquecida como dinamizadora e transformadora da sociedade. Aqui, evidencia-se a necessidade de trazer a cultura para a renovação da educação, uma educação integrada com o movimento da vida e não isolada em compartimentos.  Porém, ao mesmo tempo em que verificamos o empobrecimento cultural da educação, verificamos também a oportunidade de estabelecer de forma concreta uma nova cultura. Uma cultura conciliatória, de conví-


vio entre as diferenças e mais importante, uma cultura de participação na mudança do presente e do futuro da sociedade.  E aqui ficam duas perguntas para nos motivar a enfrentar a tarefa da integração real de diferentes campos do saber: Como construir esta nova cultura sem a educação e como construir uma nova educação sem a cultura?  Soluções importantes estão no planejamento de políticas públicas que integrem de forma ampla estas duas áreas, mas deve ir muito além disso, educação não acontece só na escola e sim em qualquer espaço de convívio, assim como a cultura que se realiza no encontro, dessa forma somos co-responsáveis pelo reencontro entre Educação e Cultura.  Exemplos de reencontro criativo entre a Cultura e a Educação, atuais e conectados com o contexto acima explorado, são os Pontos de Cultura distribuídos por todo o país. Em Piracicaba temos agora dois Pontos de Cultura, o Garapa e o Educomunicamos Ponto de Cultura. Faço parte do Educomunicamos Ponto de Cultura e se você se interessa por essa movimentação contate-nos, acesse www.educomunicamos.blogspot.com e participe!

Pintando as unhas Tendências de esmaltes para a primavera

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rimavera, tempo de amores, de flores, de cores. Nas unhas, o colorido continua como tendência. No entanto, novos tons devem prevalecer. Ok, a primavera iniciará apenas no dia 23 de setembro, mas a antecipação é a premissa das tendências. Em relação aos esmaltes, as tonalidades em voga são as lançadas por marcas famosas. Algumas, inclusive, surgiram a partir dos acessórios, como as bolsas apresentadas durante as semanas da moda do Rio de Janeiro e de São Paulo.  Os tons que devem ter lugar cativo na primavera são os pastéis. E as grandes apostas estão no salmão e no laranja. Apesar de as cores mais claras prevalecerem, há espaço também para tons mais escuros, como o roxo e o esverdeado. As cores neon, por outro lado, deve perder o destaque.  Textos, flores e formatos variados também estarão nas unhas das mulheres. Mais do que simples partes do corpo, as unhas transmitem magia e sedução, ainda mais na primavera. AGO/SET  2010

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por Rafaela Silva

onceito popular e amplamente estudado, o folclore é tido como um conjunto de mitos e lendas passados de geração para geração. Os mitos são narrativas de apelo simbólico, criadas para explicar fenômenos, transmitir conhecimentos e alertar sobre perigos, defeitos e qualidades do ser humano. Já as lendas são histórias transmitidas oralmente, e misturam fatos reais e fantasiosos. Segundo Roberto Benjamin no texto O conceito de folclore, a palavra folclore tem raízes saxônicas, e foi formada pela junção dos termos folk (povo) e lore (saber).  A conceituação de folclore entre os estudiosos, contudo, não se resume em “saber do povo”. No esforço em conceituar adequadamente o termo, foi realizado no Brasil em 1951 o I Congresso Brasileiro de Folclore, no qual foi estabelecida a Carta do Folclore Brasileiro, uma tentativa de conceituar melhor o termo. Apesar de adotada por muitos anos, a Carta ainda tinha muitas imprecisões e ambigüidades. Sua atualização foi realizada em 1995, durante o VIII Congresso Brasileiro de Folclore. De acordo com a re-conceituação, “folclore é o conjunto das criações culturais de uma comunidade, baseado nas suas tradições expressas individual ou coletivamente, representativo de sua identidade social. Constituem-se fatores de identificação da manifestação folclórica: aceitação coletiva, tradicionalidade, dinamicidade, funcionalidade.”

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Muitas características do folclore foram atualizadas, relativizadas ou desapareceram. A característica anonimato (o fato folclórico não ter autor conhecido), por exemplo, tem sido progressivamente relativizada, por deixava de fora o artesanato e a poesia dos repentistas. A característica aceitação coletiva tem sido usada na reinterpretação do anonimato, visto que para alguns folcloristas, a criação de um autor conhecido passa a ser folclórica quando o coletivo a aceita.  Outra característica amplamente discutida é a transmissão oral, pois sua absolutização exclui manifestações escritas, como a literatura de cordel, do conceito folclore. Estudiosos do tema, como Renato Almeida, acreditam que a transmissão oral deva ter um sentido simbólico, para não deixar de lado outras formas de aprendizado.  Quanto à antiguidade, provavelmente uma das características mais polêmicas, folcloristas mais tradicionalistas a colocam como primordial para um fato ser considerado folclore. Contudo, uma forte corrente acredita no “folclore nascente”, que reconhece novos fatos folclóricos, permitindo ao criador popular a possibilidade de criação. Pois não há como negar o surgimento do novo, nem proibir sua existência em uma cultura popular.

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Body Modification ara muitos povos modificar o corpo não é nada de bizarro ou anormal, mas sim elemento tradicional de sua cultura, ligado às questões estéticas. Na África muitas tribos realizam essa prática. A tribo Mursi, da Etiópia, utiliza uma placa no lábio inferior e também no lóbulo da orelha. As mulheres da tribo Ndebele, em Lesedi, usam pesadas argolas de metal no pescoço, pernas e braços depois que se casam para não olharem para outros homens. Mesmo hábito das “mulheres girafas” da tribo Padaung, de Burma – Ásia. Os Padaung acreditam que o pescoço é o centro da alma.  Em tribos africanas são comuns as escarificações (marcas feitas por cortes na pele), que começam a ser realizadas quando a garota tem apenas cinco anos. Em busca da beleza, mulheres chinesas tiveram os pés deformados. Para ser belo, o pé deveria assemelhar-se a uma pequena flor de lótus, e para atingir esse resultado, a menina ao completar três anos tinha ataduras colocadas em seus pés. Essa prática durou do século 10 até 1949.

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por Rafaela Silva

A body modification realizada atualmente pelas tribos urbanas assemelham-se à de tribos tradicionais e tem os mesmos motivos, estéticos, culturais ou espirituais, sendo considerada uma arte. No entanto, as questões culturais que envolvem as formas de modificação divergem. Cabe a cada um que optar por essa arte avaliar os prós e os contras e não entregar-se a modismos, pois mesmo as culturas mudam.  E x e m p l o s c o m u n s d e b o d y modification são: Bifurcação da língua (divisão da língua em duas partes), Branding (cicatriz na pele de uma queimadura feita de ferro quente), Escarificação (cicatrizes cortes feitos por bisturi), Implantes subcutâneos (implante de objeto sob a pele), Implante transdermal (implante de aço cirúrgico, no qual metade do objeto fica exposto e a outra metade fica dentro da pele), Pocket (assemelha-se ao piercing, no entanto a haste fica para fora da pele e as pontas, para dentro) e Surface (implante de objeto semelhante a uma trave ao contrário, no qual as pontas ficam para fora da pele e a haste fica dentro).

foto de Eric Lafforgue’s photostream

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Uma releitura das tradições tribais


Papel Reciclado Artesanal Arte Consciente

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apéis de carta, cartões, marcadores de livro, envelopes, porto-lápis e outros objetos tem em comum o material utilizado para s galerias virtuais estão se confecção, o papel reciclado artesanal. Enmultiplicando para dar contre os papéis recicláveis estão as folhas de ta do grande número de caderno, envelopes, fotocópias, papel de artistas plásticos que utilizam o comfax, cartazes, folhetos, jornais e revistas. Os putador não apenas para acessar innão recicláveis são papéis sujos, parafinaformações, mas para criar suas obras, dos, plastificados, metalizados, etiqueta, fita com o uso de equipamentos, como crepe, papel carbono e fotografias. o mouse-pincel ou o tablet. A  A preparação do papel reciclado artesanal impressão é realizada em plotadoé fácil e os materiais também são fáceis de enras digitais, também conhecidas contrar. Primeiro é feita a polpa, com o papel como giclée. Essa nova forma de picado e água. Os papéis também podem ser fazer arte amplia o acesso às obras. decorados, misturando à polpa outros ingreAlém de apreciar os quadros nas dientes como linha, fios de lã, cascas ou pegalerias virtuais, há a possibilidadaços de frutas e vegetais, pétalas de flores, de de comprar a obra impressa. entre outros. Para dar cor ao papel reciclado  Todas as técnicas de pintura podem basta adicionar papel crepom junto à água ser reproduzidas pelos programas ou guache e anilina junto à polpa. Depois é de computador. Para muitos teóricos, feito o papel com uso de moldura e porteesse tema ainda rende muito estudo, riormente o papel é prensado. Com o papel por conta da reprodução em massa das reciclado artesanal pronto, é só usar a obras de arte. Ela deixaria de única e imaginação e criar. passaria a ser um produto feito em série. Segundo falas do jornalista, escritor e art-designer Bezerra Neto, as obras feitas a partir do computador são a arte do futuro e talvez faça muitos artistas aposentarem os pincéis.

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As imagens deste ensaio são de Nilo Lima. Fotógrafo há mais de 50 anos, trabalhou por 17 anos no exterior para a agência Photo Researcher. Nos últimos 14 anos Lima tem se dedicado à fotografia aérea no Brasil. No ensaio fotográfico desta edição, Lima apresenta-nos o Rio de Janeiro (RJ) visto do céu, apenas uma mostra do seu livro Rio das Alturas (Andrea Jakobsson Estúdio; 160 páginas). A publicação foi feita a partir de diversas fotos tiradas em vôos de helicóptero. Para mais informações sobre Nilo Lima acesse o site www.nilolima.com


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