públicos, para operar um sistema que exige inovações em sua administração por se configurar como uma rede interfederativa de serviços. Outro ponto destacado nesta obra é a falta de regulamentação de temas fundamentais para a organização do SUS, como padrão de integralidade da assistência, acesso regulado e inovação tecnológica.
Esse aparente paradoxo (autonomia x rede interfederativa) somente poderá ser solucionado se operado numa administração pública concertada, negocial-consensual.
Esta é uma obra para operadores do direito, profissionais da saúde, conselheiros, membros do Ministério Público, do Judiciário e para todos aqueles que pretendem conhecer o SUS de ontem e de hoje e seus desafios futuros.
9 788561 240004
Luiz Odorico Monteiro de Andrade
ISBN978-85-61240-00-4
Lenir Santos
Luiz Odorico Monteiro de Andrade é médico sanitarista, mestre em saúde pública pela Universidade Federal do Ceará e doutor em saúde coletiva pela Unicamp. É professor adjunto da Faculdade de Medicina da UFC, campus de Sobral, pesquisador e orientador de mestrado em saúde pública pela UFC. Em sua história profissional, contam-se dezenove anos ininterruptos como secretário de Saúde de quatro municípios cearenses: Icapuí, Quixadá, Sobral e Fortaleza, este desde 2005. Foi presidente do CONASEMS na gestão 2003-2005. Atua na área de medicina, com ênfase em saúde pública, saúde da família e educação permanente em saúde. É palestrante e conferencista nessas áreas.
Por isso a premente necessidade de o SUS alcançar maturidade política e pautar-se por arranjos administrativos e financeiros que sejam capazes de atender suas peculiaridades - a maior delas, a que conforma todo o sistema de saúde, a integralidade da atenção à saúde, que impõe o formato de rede interfederativa de serviços. Essa rede é dirigida por entes autônomos, mas que se mantêm interdependentes técnica, administrativa e financeiramente.
O SUS requer novas regras administrativas, como os consensos e os colegiados interfederativos, além de necessitar de instrumentos, como os contratos públicos firmados entre entes públicos, com o objetivo de organizar a ação pública da saúde.
Lenir Santos Luiz Odorico Monteiro de Andrade CONASEMS
Sem um instrumental correspondente às inovações que o SUS traz para a gestão pública, não será possível operá-lo em favor do usuário da saúde. Este livro enfrenta o desafio e traz propostas inovadoras para sua gestão, como a política de contratualização entre entes públicos.
Os autores
Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde Instituto de Direito Sanitário Aplicado
Lenir Santos Luiz Odorico Monteiro de Andrade
novos instrumentos, como os contratos firmados entre entes
O grande desafio do século XXI para o SUS é colocá-lo a serviço dos interesses e das necessidades de saúde da população. E, sendo o SUS um sistema administrativo complexo, os paradigmas da atual administração pública não são suficientes para atuá-lo.
Aspectos jurídicos, administrativos e financeiros
normas operacionais e do Pacto pela Saúde 2006, propondo
Aspectos jurídicos, administrativos e financeiros
SUS:
direito e da saúde e analisaram a organização do SUS à luz das
SUS:
O ESPAÇO DA GESTÃO INOVADA E DOS CONSENSOS INTERFEDERATIVOS
Os autores deste livro uniram seus conhecimentos nos campos do
SUS: O ESPAÇO DA GESTÃO INOVADA E DOS CONSENSOS INTERFEDERATIVOS
Lenir Santos é advogada, especialista em direito sanitário pela USP, integrante do Instituto de Direito Sanitário Aplicado (IDISA) e foi procuradora da Unicamp. Autora de diversos artigos publicados em revistas especializadas e de obras específicas sobre o SUS, como o livro Sistema Único de Saúde: comentários à Lei Orgânica da Saúde, participou ativamente da criação do SUS. Colaboradora do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) desde sua criação, atua como conferencista e consultora na área do direito sanitário.
O ESPAÇO DA GESTÃO INOVADA E DOS CONSENSOS INTERFEDERATIVOS
O SUS, durante esses anos, teve sua organização e funcionamento pautados por normas operacionais editadas pelo Ministério da Saúde, que privilegiaram o financiamento e não a primazia do interesse e da satisfação do usuário. A lógica do financiamento sempre foi o grande motivador da organização administrativa e técnica do SUS.
SUS:
O ESPAÇO DA GESTÃO INOVADA E DOS CONSENSOS INTERFEDERATIVOS
Aspectos jurídicos, administrativos e financeiros
Copyright © by Lenir Santos e Luiz Odorico Monteiro de Andrade Direito desta edição IDISA - Instituto de Direito Sanitário Aplicado - 2007
Projeto gráfico, capa e editoração Valéria Ashkar Ferreira Revisão Ana Paula Gomes
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL DA UNICAMP Sa59s
Santos, Lenir. SUS : o espaço da gestão inovada e dos consensos interfederativos : aspectos jurídicos, administrativos e financeiros / Lenir Santos, Luiz Odorico Monteiro de Andrade. -Campinas, SP : Instituto de Direito Sanitário Aplicado, 2007.
ISBN 1. Sistema Único de Saúde (Brasil) 2. Saúde pública - Legislação. II. Andrade, Luiz Odorico Monteiro de. III. Título. CDD - 614.0981 - 614.026 Índice para Catálogo Sistemático 1. Sistema Único de Saúde (Brasil) 2. Saúde pública - Legislação
614.0981 614.026
CONASEMS Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde
Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde - CONASEMS Esplanada dos Ministérios - Bl. “G” - Anexo, sala 140, ala “B” CEP 70.058-900 - Brasília, DF (61) 3223.0155 conasems@conasems.org.br - www.conasems.org.br
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Instituto de Direito Sanitário Aplicado - IDISA Rua José Antônio Marinho, 430 CEP 13.084-783 - Campinas, SP (19) 3289.5751 idisa@idisa.org.br - www.idisa.org.br
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SUS:
O ESPAÇO DA GESTÃO INOVADA E DOS CONSENSOS INTERFEDERATIVOS
Aspectos jurídicos, administrativos e financeiros
Lenir Santos Luiz Odorico Monteiro de Andrade CONASEMS Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde Instituto de Direito Sanitário Aplicado
DEDICATÓRIA
Aos nossos amigos da área da saúde, verdadeiros Quixotes deste século, pelo incansável desejo de transmutar a realidade ante a insatisfação com o hoje e pela certeza de que é a utopia do amanhã que eleva o homem de si mesmo. Pela nossa cumplicidade em favor do bem comum.
DEDICATÓRIA
Às minhas filhas, Bruna, Andrea e Luciana, amores transcendentes. Lenir Santos
Uma coisa é falar dos direitos do homem... outra coisa é garantir-lhes uma proteção efetiva... Poder-se-iam multiplicar os exemplos de contrastes entre as declarações solenes e sua consecução, entre a grandiosidade das promessas e a miséria de suas realizações. Norberto Bobbio
ÍNDICE
APRESENTAÇÃO .......................................................................................13 PREFÁCIO ....................................................................................................17 PRIMEIRA PARTE O SUS e a sua organização por normas operacionais de 1991 a 2006 e o Pacto pela Saúde 2006: uma retrospectiva e a atualidade 1. Introdução...............................................................................................................27 2. Antecedente recente: o programa SUDS - o sistema convenial.........................31 3. NOB-SUS 01/91: o retrocesso no financiamento ou quando o financiamento foi pautado pelos critérios do INAMPS .....................................35
4. NOB-SUS 01/92: a que não chegou a sair do papel ..............................................41 5. NOB-SUS 01/93: “A Ousadia de Cumprir e Fazer Cumprir a Lei”.....................45 6. NOB-SUS 01/96: aprofundamento das transferências por programas federais ................................................................................................53
7. NOAS-SUS 2001: uma tentativa de ordenar a regionalização ...........................67 8. NOAS-01/2002: a continuidade da NOAS 01/2001 e a hipertrofia normativa federal................................................................................................... 77
9. O Pacto pela Saúde 2006: o SUS pós-NOB e a possibilidade de inovação da gestão .................................................................................................79
SEGUNDA PARTE O desafio da organização do SUS pautado por consensos interfederativos e contratos entre entes públicos 1. Novos paradigmas na administração pública.....................................................95 2. O município e o interesse local ............................................................................103 3. Rede interfederativa de serviços: a regionalização e a hierarquização de serviços ..................................................................................109
11
Índice
4. SUS: o espaço da articulação interfederativa consensual.................................111 5. Colegiados interfederativos: o locus da articulação interfederativa ...............117 6. O fim da era da “cenoura e da vara”.......................................................................123 7. Os contratos entre entes públicos. A administração pública consensual .......127 TERCEIRA PARTE O vácuo normativo e o desafio de sua regulamentação 1. O vácuo normativo...............................................................................................139 2. O desafio de regulamentação de temas sanitários ............................................147
CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................153 BIBLIOGRAFIA..........................................................................................159 ANEXO: Quadro-resumo da organização e gestão administrativa do SUS.... 161
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APRESENTAÇÃO
O Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS) tem a grande satisfação de patrocinar a edição, pelo Instituto de Direito Sanitário Aplicado (IDISA), da obra de Lenir Santos e Luiz Odorico Monteiro de Andrade ambos sanitaristas, uma da área do direito (fato inusual em nosso país) e o outro, da saúde , que trata de tema prioritário e relevante para o Sistema Único de Saúde: sua organização técnico-política e administrativa. Sabe-se que o SUS enfrenta, desde sua origem, sérios desafios, tanto em sua organização como em seu financiamento, fatos discutidos ao longo dos anos por todos aqueles que militam na área. E, nessas discussões, um dos atores fundamentais tem sido o CONASEMS, entidade de congregação dos 5.562 secretários municipais de Saúde, gestores locais do sistema público de saúde. Este livro surge num momento de maturidade política e administrativa do SUS, quando o Ministério da Saúde, juntamente com os demais gestores estaduais e municipais da saúde, firmaram o Pacto pela Saúde 2006, documento definidor das políticas nacionais dessa área para os próximos anos. Os autores analisam a organização do SUS a partir da edição das normas operacionais da saúde, que se iniciaram em 1991, e confirmam que somente os consensos interfederativos serão capazes de decidir os rumos do sistema público de saúde 13
Apresentação
numa nova administração pública negocial-consensual, que respeite as diversidades deste país sem perder a unicidade conceitual. Demonstram, ainda, que o SUS, nos últimos tempos, tem sido a única política pública universalista que considera o ser humano como sujeito de direitos perante o Estado, contendo em seus regramentos constitucionais e legais a mais moderna concepção de Estado, sendo uma inovação da gestão pública; daí necessitar de novos paradigmas administrativos para ser operado. O livro SUS: o espaço da gestão inovada e dos consensos interfederativos analisa com profundidade os novos rumos que o SUS requer da administração pública, apontando caminhos para sua concretização no âmbito administrativo e político, como os consensos e os colegiados interfederativos e os contratos de organização da ação pública da saúde, além de lembrar ser premente regulamentar determinados temas sanitários, como a integralidade da atenção à saúde, o acesso regulado, a assistência farmacêutica, a inovação tecnológica, entre outros, deixando claro o esgotamento da era das normas operacionais. A rede interfederativa de serviços de saúde, os consensos e os colegiados interfederativos e a política de contratualização entre entes públicos, proposta pelos autores, configuram uma solução inovadora para a concretização de um SUS maduro, centrado nos acordos entre os entes federativos, os quais devem consubstanciar-se em contratos entre entes públicos, garantindo, assim, segurança jurídica e clareza sobre as responsabilidades, direitos e deveres dos entes responsáveis por 14
Santos & Andrade
operar a saúde pública. A administração pública consensual, negociada mediante contratos que organizam a ação pública, será capaz de oferecer uma resposta para o compartilhamento interfederativo dos serviços de saúde. O SUS do século XXI enfrentará desafios éticos, morais e filosóficos com o avanço da tecnologia interferindo em temas sanitários, como clonagem, reprodução assistida, mudança de sexo, bancos de DNA, devendo, pois, estar apto para discutir e cuidar desses temas. Para tanto, precisa com urgência promover as necessárias mudanças administrativas, técnicas, operacionais e financeiras, para se consolidar como política pública que considera a pessoa humana em sua integralidade, introduzindo novos paradigmas administrativos na operacionalização do moderno sistema público de saúde.
Brasília, 2007 Helvécio Miranda Magalhães Junior Presidente do CONASEMS
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16
PREFÁCIO
Este livro não foi, a princípio, pensado como tal. Inicialmente os autores, ao comentarem o esgotamento do Sistema Único de Saúde - pautado por forte regulação infralegal da lavra do Ministério da Saúde - decidiram escrever em conjunto um artigo que, de um lado, abordasse as normas operacionais editadas entre 1991 e 2006 e, de outro, apresentasse uma proposta de inovação na organização jurídica e administrativa do SUS, expurgada do engessamento da liberdade dos estados e municípios para gerir os sistemas locais, regionais e estaduais de saúde. As discussões travadas pelos autores foram evoluindo a ponto de eles perceberem que o tema tinha dimensão maior do que aquela pensada anteriormente, exigindo reflexões e análises mais aprofundadas. Assim os autores, após examinar a organização do SUS durante esses quinze anos, sob a lógica de normas operacionais, bem como o Pacto pela Saúde editado em 2006, propõem um modelo gerencial cooperativo, negocial, capaz de conformar um SUS interfederativo, consensual e autônomo. Os autores defendem a tese de que somente um sistema de saúde negociado periodicamente entre as três esferas de governo será capaz de respeitar a autonomia dos entes da federação, as várias realidades locais e regionais e manter a unicidade conceitual do SUS, com o fim de preservar sua 17
Prefácio
inteireza, em face da diversidade sanitária e do necessário tratamento diferençado que lhes devem dar os estados e municípios, autônomos na gestão do sistema no seu âmbito político-administrativo, mas interdependentes em razão da configuração do SUS em rede regionalizada e hierarquizada. Além de analisar o modelo administrativo do SUS, os autores também buscaram demonstrar o vácuo legal centrífugo no tocante a diversos aspectos do sistema de saúde, uma vez que todo o emaranhado regulatório do SUS se deu no sentido centrípeto, ou seja, no sentido de uma configuração interna, entrópica do sistema (entre os entes federativos, com vistas ao repasse de recursos), não tendo havido uma regulação que o conformasse para o exterior, para seus usuários, os cidadãos. Muitos temas tratados pela Lei n. 8.080/90 não foram suficientemente explicitados, detalhados em sua operacionalização, havendo um vazio legal na definição de questões como: padrão de integralidade da assistência; assistência farmacêutica como integrante da terapêutica; portas de entrada do SUS; protocolos de conduta; incorporação tecnológica; parâmetros de custos que caracterizam a assistência à saúde; elaboração de normas técnicas e estabelecimento de padrões de qualidade da saúde e muitos outros aspectos do SUS que estão a exigir regulamentação voltada para a população usuária. As demandas judiciais na saúde também vêm expondo esse vazio legal, que está a exigir urgentes marcos em temas relevantes, como a questão do medicamento e do acesso regulado, além de outros temas éticos, morais e filosóficos. 18
Santos & Andrade
O mundo tecnológico e informatizado causará (ou já causa) fortes impactos na vida sanitária. Novos temas sanitários exigirão regramentos, como a clonagem, a reprodução assistida, a intimidade, o consentimento informado, intervenções de risco elevado, bancos de DNA - todos eles fortemente influenciados por questões éticas, morais e filosóficas, devendo o direito demarcar as possibilidades e os limites desses avanços científicos à luz dos valores constitucionais e da sociedade. E o SUS deverá estar pronto, do ponto de vista organizativo e financeiro, para dar conta de abarcar todos esses novos temas. Buscou-se revisitar a organização do SUS desde o convênio SUDS, precursor do SUS, as normas operacionais, o Pacto pela Saúde, o vácuo normativo centrífugo e a importância de organizar o SUS à luz do direito administrativo contemporâneo, que aponta para uma administração pública, negocialconsensual, descentralizada, com a participação do cidadão na tomada de decisões, transparência na gestão e resultados qualitativos. A maturidade alcançada nesses anos pelos entes federativos, na prestação de serviços de saúde, exige findar todos os equívocos na organização do sistema sanitário, que deve se orientar por sua concepção constitucional - sistema articulado, interdependente, cooperativo e consensual -, sendo o financiamento uma conseqüência e não a única finalidade. As articulações interfederativas consensuais devem ser o eixo da operacionalização de um sistema capaz de garantir à pessoa o direito à saúde, ao mesmo tempo em que se mantém único conceitualmente e harmoniza as várias realidades locais e 19
Prefácio
regionais em prol do bem comum, configurando-se como uma unidade na diversidade, um organismo com elementos constitutivos de natureza legal, política, filosófica, cultural, ética, administrativa, financeira, material e humana de todos os entes. Além disso, o vácuo normativo quanto aos direitos e deveres do cidadão usuário do SUS precisa ser preenchido com a regulação de temas que explicitem esses direitos e deveres e ordenem um sistema capaz de responder às crescentes demandas tecnológicas, farmacológicas, éticas e morais, priorizando as ações preventivas e coletivas de saúde em relação àquelas de cunho individual e altamente especializadas, cujo risco de intervenção e cujo custo não se conciliam com um sistema de saúde equânime. Este livro está dividido em três partes:
1-
A primeira visa fazer uma análise do convênio SUDS,
das normas operacionais básicas editadas nos anos de 1991 a 1996, das normas operacionais de assistência à saúde de 2001 e 2002 e do Pacto pela Saúde 2006, suas implicações na gestão municipal, seus avanços e recuos e outros aspectos da gestão e do financiamento.
2-
A segunda parte tem uma dimensão mais jurídica e visa
situar a organização do SUS à luz da formação de uma rede interfederativa de serviços, administrada de maneira autônoma, mas sob parâmetros, princípios e diretrizes únicos. Esse formato de rede de serviços requer arranjos administrativos não-usuais na 20
Santos & Andrade
administração pública, como os consensos e os colegiados interfederativos e a administração por contratos (contratos firmados entre entes públicos), com a finalidade de organizar os serviços de saúde interfederativos.
3-
A terceira examina a necessidade de os entes
federativos, a partir do acúmulo de experiências desses quase vinte anos, regulamentarem questões prioritárias para a estrutura do SUS nacional, como o padrão de integralidade da assistência, o acesso regulado, a assistência farmacêutica, a direção única e outros elementos relevantes que estão a exigir, urgentemente, definições e enquadramentos, contribuindo até mesmo para diminuir as demandas judiciais que surgem de flancos deixados em aberto pelo próprio sistema. O grande desafio do SUS no século XXI é pautar-se pela primazia do interesse e da satisfação do usuário e não pelo financiamento limitado pelas políticas econômicas. O SUS é uma política pública que realiza a condição humana.
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PRIMEIRA PARTE O SUS e a sua organização por normas operacionais de 1991 a 2006 e o Pacto pela Saúde 2006: uma retrospectiva e a atualidade
Os Estados podem desempenhar papel decisivo, com a condição de que aceitem, em razão do próprio interesse, abandonar a sua soberania absoluta acerca de todos os grandes problemas de utilidade comum e, sobretudo, dos problemas que ultrapassam sua competência isolada. Edgard Morin
O SUS e sua organização por NOB e Pacto de Gestão
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1. Introdução
A implantação do SUS, após seu surgimento na Constituição de 1988 e na Lei n. 8.080/90, passou por diversas fases. Contudo, todas as tentativas de organizar o sistema foram pautadas pelo financiamento federal (de cunho obrigatório e não voluntário) e não pelas necessidades de saúde da população. O que orientou a sua organização foi muito mais o financiamento do que os ditames das leis que o regulamentam, os resultados pretendidos ou as necessidades do sistema. A transferência de recursos da União para os estados e municípios induziu a organização do SUS. A cada edição de portarias ministeriais - NOB-SUS 01/91, NOB-SUS 01/92, NOBSUS 01/93, NOB-SUS 1996, NOAS-SUS 2001, NOAS-SUS 2002 -, os estados e municípios deveriam arranjar-se para organizar o sistema local e regional nos termos ali definidos, ainda que estes termos contrariassem aspectos das leis nacionais reguladoras do sistema e as normas editadas (por meio de portarias) inibissem fortemente a liberdade dos estados e municípios para dispor sobre seus planos de saúde, de acordo com sua realidade local e regional - respeitadas as diretrizes e os princípios do SUS e os consensos regionais e estadual. A lógica dessa organização pautada pelo financiamento nos leva a inferir, por conseqüência, que a concepção do SUS, inscrita na Carta Constitucional e nas Leis ns. 8.080/90 e 8.142/90, nem sempre foi o que orientou sua organização, tampouco os 27
O SUS e sua organização por NOB e Pacto de Gestão
resultados qualitativos pretendidos, mas sempre o financiamento federal regulado por normas operacionais federais (portarias ministeriais). Essas normas e outros programas federais pormenorizados ditaram a formação e organização do SUS nacional. E isso, conseqüentemente, influenciou também o controle dos repasses de recursos. Outro ponto a destacar nesta primeira parte, num resgate das origens políticas e administrativas do SUS, é o Programa dos Sistemas Unificados e Descentralizados de Saúde (SUDS), que, criado sob a égide da Constituição de 1967, mediante convênio de cooperação entre a União e os estados-membros, 1
buscou de fato tornar realidade a Reforma Sanitária e os princípios e diretrizes da 8ª Conferência Nacional de Saúde. Esses convênios de cooperação visavam dar concretude a um sistema que unificava as ações e serviços de saúde e descentralizava sua execução. Os repasses de recursos da União para os estados, nos convênios SUDS (transferências voluntárias e não obrigatórias), eram globais, com o fim único de financiar o conjunto de ações e serviços de saúde sob o comando do estado-membro, ainda que o critério de pagamento por produção, no tocante aos serviços de
1
Reforma Sanitária foi um movimento surgido nos anos 70 contra o modelo hegemônico da saúde; essa reforma defendia ser a saúde direito de todos e dever do Estado de acesso universal, fundado em princípios como: integralidade da assistência; equidade; e descentralização administrativa.
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Santos & Andrade
terceiros contratados pelo INAMPS,
2
estivesse presente no
convênio. Contudo, com a edição das normas operacionais ao longo de quinze anos, essa lógica foi invertida e o financiamento passou a ser feito quase que exclusivamente pelo critério de produção, projetos e programas, ainda que pequena parcela dos recursos tenha sido repassado pelo sistema per capita.
2
Convém lembrar que o INAMPS comprava serviços de terceiros - pessoas jurídicas de direito privado, na maioria, ainda que, muitas vezes, comprasse também serviços de hospitais públicos estaduais, conforme ocorria em São Paulo - para complementar os serviços próprios, credenciando profissionais de saúde, hospitais e clínicas para o atendimento de seus beneficiários, os trabalhadores. Lembre-se, ainda, que o INAMPS garantia ao trabalhador, dentre os benefícios previdenciários, o da assistência médica curativa.
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O SUS e sua organização por NOB e Pacto de Gestão
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2. Antecedente recente: o programa SUDS o sistema convenial
Antes de começar a tratar das Normas Operacionais Básicas, que doravante serão denominadas simplesmente NOB e vêm orientando a organização do SUS ao longo desses quinze anos, vamos falar brevemente do Programa dos Sistemas Unificados e Descentralizados de Saúde (SUDS), por ter sido ele o precursor do SUS e por ter-se mantido durante alguns anos até a edição da primeira NOB, em 1991. O Programa SUDS fundava-se na cooperação intergovernamental prevista no artigo 13, § 3º, da Constituição de 1967, que estabelecia: “União, os Estados e os Municípios poderão celebrar convênios para a execução de suas leis, serviços ou decisões, por intermédio de funcionários federais, estaduais e municipais”, e no artigo 10, § 5º do Decreto-Lei n. 200/67, que dispunha: “a execução das atividades administrativas da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada” e a “execução de programas federais de caráter nitidamente local deverá ser delegada, no todo ou em parte, mediante convênio, aos órgãos estaduais ou municipais incumbidos de serviços correspondentes”. A partir do texto constitucional vigente à época e do princípio da descentralização consagrado na Reforma Administrativa (art. 6º, III, do Decreto-lei n. 200/67), foi elaborado o Decreto n. 94.657, de 20 de julho de 1987, que instituiu o 31
O SUS e sua organização por NOB e Pacto de Gestão
Programa SUDS com o objetivo de contribuir para a consolidação e o desenvolvimento qualitativo das ações de saúde integradas. O Programa SUDS foi o precursor do Sistema Único de Saúde - (SUS), consagrado na Constituição logo no ano seguinte, 1988. O SUDS era o início, na prática, das idéias propugnadas na 8ª Conferência Nacional de Saúde, de 1986: a) unificação das ações e serviços de saúde dispersos entre vários ministérios, desarticulados e compartimentados; b) organização administrativa descentralizada e integrada; c) direito à saúde, independentemente de o cidadão ser ou não um trabalhador participante do regime geral da Previdência Social; d) princípios e diretrizes únicos; e e) financiamento integrado e intergovernamental. O convênio SUDS já previa um colegiado intergovernamental para a sua administração, que era a Comissão Interinstitucional de Saúde (CIS), e uma orçamentação integrada, denominada de Programação Orçamentação Integrada (POI). Esse era o instrumento orçamentário e financeiro do SUDS. Nos convênios SUDS, as transferências intergovernamentais tinham como parâmetro o custo global das ações e serviços de saúde transferidos da União para os estados. Os recursos financeiros transferidos eram depositados em conta especial e administrados pelos secretários estaduais de Saúde. 3
Por se tratar o SUDS de um programa federal, a União podia definir como deveriam ser aplicados os recursos. 3
Lembramos, ainda, que o Programa SUDS reconheceu, mediante convênio, a saúde como um direito do cidadão e um dever do Estado, com organização descentralizada, integrada e democratizada.
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Santos & Andrade
Durante o seu curto período, a organização dos serviços de saúde não foi totalmente induzida pelo financiamento; o repasse de recursos era, em parte, uma conseqüência do objeto do convênio, que era a unificação das ações e dos serviços de saúde, a descentralização de sua execução e a garantia dos serviços do INAMPS à população brasileira. Os convênios SUDS continuaram a existir até o ano de 1991, uma vez que a Lei n. 8.080/90, rezava, em seu artigo 50, que esses instrumentos persistiriam até que seu objeto fosse absorvido pelo SUS. Já na era SUS, no ano de 1990, o convênio SUDS sofreu um retrocesso em seu financiamento, quando o Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS) alterou as regras do repasse de recursos, que passou a ser feito totalmente pelo sistema de produção, de acordo com tabela de procedimentos. A partir daí, até os dias de hoje, o financiamento por produção ou por programas passou a induzir a organização do sistema de saúde. Outro ponto importante a destacar é a forma convenial de cooperação. O SUDS era um acordo de vontades instrumentalizado como um convênio de cooperação entre os entes federativos, fato impossível a partir da Constituição de 1988, quando a saúde passou a ser responsabilidade de todos os entes, não cabendo mais delegação de competência de uma esfera de governo para outra, ainda que houvesse necessidade de arranjos institucionais complexos para sua organização. Por ter sido bem-sucedido, fundamentalmente no estado de São Paulo, o convênio SUDS teve influência decisiva nas discussões que se travavam, à época, na Assembléia Nacional 33
O SUS e sua organização por NOB e Pacto de Gestão
Constituinte e, logo em seguida, no debate do anteprojeto de lei orgânica da saúde, a Lei n. 8.080/90.
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