Jorna Marco #327

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ESCOLA ASSIS DAS CHAGAS LANÇA LIVRO EM COMEMORAÇÃO AOS 50 ANOS E REGISTRA SUA HISTÓRIA NO BAIRRO DOM CABRAL.

Júlia Guedes

Júlia Guedes

Flora Silberschneider

ALÉM DE DIVERTIR, AS MARCHINHAS DE CARNAVAL DÃO VOZ AO POVO E FAZEM DA FESTA UM MOMENTO DE REFLEXÃO SOCIAL.

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ÍDOLO DO GALO, REINALDO É GRATO PELO CARINHO DOS TORCEDORES E AFIRMA QUE NÃO TEM PRETENSÕES POLÍTICAS.

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marco Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo . Faculdade de Comunicação e Artes . PUC Minas . Ano 44 . Edição 327 . Março . 2017 Ana Luisa Santos

DESAPARECIDOS Histórias sem fim, famílias sem respostas

Interesse público em conflito com relações da vida privada Em meio a tantos vazamentos de informações, provenientes de redes sociais ou provocados por profissionais em deslizes éticos, o dilema entre direito à privacidade e liberdade de imprensa preocupa a sociedade brasileira. A postura polêmica de alguns veículos de comunicação traz à tona o Código de Ética dos Jornalistas e a legislação que prevê a liberdade de imprensa. Página 3

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Júlia Guedes


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m editorial

Rostos passam despercebidos Marina Moregula 5º Período

A Grande Belo Horizonte tem uma população de quase 6 milhões de habitantes. Todos os dias, essas pessoas transitam pela região para seguir suas rotinas. Mas o estilo de vida da cidade exige cada vez mais produtividade, agilidade, e não admite perda de tempo. Por isso, os belo-horizontinos circulam pelas ruas sem perceber aspectos do lugar onde vivem. Nos ônibus, nas contas de água e luz, há fotos de pessoas que desapareceram e não seguem mais suas rotinas todos os dias. Em 2016, até setembro, foram registradas 957 pessoas desaparecidas em BH. Nesta edição do MARCO, contamos como esses casos são investigados e como os familiares buscam apoio para uma perda tão difícil. A maioria dos casos nunca é solucionada e eles passam despercebidos, assim como as fotos divulgadas nos espaços que sobram nos ônibus e nas contas. Um desaparecido deixa para os familiares o desafio de viver em um limbo, tendo pouquíssimas pistas do que pode ter acontecido com a pessoa e nenhuma certeza se um dia a verão novamente. O MARCO traz histórias de ONGs e voluntários que se dedicam a apoiar essas famílias. O jornal acompanhou também a questão da “invasão” de redes sociais e divulgação de dados pessoais, repercutindo casos que vieram à tona como da ex-primeira-dama Marisa Letícia e da primeira-dama Marcela Temer. A liberdade de imprensa e o direito à privacidade se confrontam e geram a dúvida se há limites também para a vigilância das câmeras em locais públicos. Esta edição traz ainda reflexões sobre o cenário político brasileiro e também internacional. Observamos o uso frequente e, às vezes, incorreto dos termos “direita” e “esquerda” nos debates provocados pelos recentes escândalos de corrupção em nosso país. O MARCO esclarece o que esses conceitos realmente significam nesse ambiente tão polarizado. Já no âmbito internacional, algumas medidas adotadas pelo novo presidente americano, Donald Trump, afetam as relações econômicas dos Estados Unidos com o Brasil, enquanto outras preocupam o mundo por serem radicais. Esperamos que todos façam uma boa leitura desta primeira edição do MARCO em 2017 e nos enviem comentários em jornalmarco@pucminas.br.

OPINIÃO CRÔNICA

Podemos Conversar Paulo Henrique 1º Período

Outro dia em uma dessas boas conversas de bar, eu e alguns poucos amigos discutíamos, entre um copo e outro de cerveja, o porquê de as pessoas não aceitarem opiniões diferentes das suas. Um amigo mais conectado ao mundo virtual contava que em seu twitter conteúdos de caráter xenofóbico, homofóbico e de intolerância racial, religiosa e política eram muito mais frequentes do que todos nós, naquela mesa, poderíamos imaginar. De acordo com ele, o simples fato de uma pessoa não gostar do PT faz com que ela seja, na rede, imediatamente PSDBista e vice-versa. Ele falava ainda que é praticamente impossível, ou bem raro, um usuário discordar de alguma

opinião sem apelar para ofensa e a hostilidade. Naquele momento, percebi que a internet, que tem tudo para se tornar um meio cada vez mais eficiente da comunicação, está se tornando uma propagadora da falta de bom senso e de educação das pessoas. E não me espanta, nem um pouco, a intolerância na web ser reflexo do mundo real. Um lugar em que anônimos se revelam muito agressivos e intransigentes, à medida que discursos de ódio ganham força por todas as partes do planeta. Atordoado com tudo isso e com uma bela dor na consciência, paguei a conta, pedi um Uber e voltei para casa. Porém, se você prefere táxi e/ou não concorda comigo, antes de sair destilando raiva pelas redes sociais, saiba que podemos conversar amigavelmente.

CRÍTICA

Um filme-espetáculo Pedro Fernandino Cinema e Audiovisual 7º Período

La La Land, de Damien Chazelle, atinge seus objetivos enquanto espetáculo. O longa deslumbra pela profusão de estímulos visuais e sonoros, somados a um star system de saltar aos olhos e uma estrutura rítmica facilmente digerível conforme as demandas dos tempos do fast food. À parte, é de se questionar o título de “filme do ano” para um musical tão dependente de referências, narrativamente pouco desafiador e, sobretudo, ególatra. Trata-se de Hollywood bendizendose sem autocrítica. A abertura com grandioso número musical em pleno engarrafamento de Los Angeles dá o tom que o filme assume: uma ponte do passado para o futuro, uma reverência à linguagem da época de ouro de Hollywood, com sotaque contemporâneo. Ao fim da sequência,

apresenta-se o par condutor da narrativa: Mia, atriz, e Sebastian, músico de jazz, interpretados por Emma Stone e Ryan Gosling. E em meio a danças e planos sequências, o casal tenta conciliar relacionamento e carreira. É bom questionar esta troca entre gerações, a “ponte” que La La Land representa. Em que ponto a reverência saudosista aos clássicos torna-se subterfúgio para a proposta de se criarem narrativas inovadoras? Repetir estereótipos, como uma personagem atendente de lanchonete que sonha em ser atriz, não significaria simplificar a experiência do espectador? O fato de uma obra sustentada por artifícios ornamentais ser indicada a 14 Oscars não expõe autoindulgência? A falta de criticidade que o filme assume soa como um sintoma de 2017, quando crises mundiais suscitam o enfrentamento intelectual e dialógico dos problemas.

O filme ganhou 6 estatuetas: melhores diretor, atriz, trilha sonora, fotografia, design de produção e canção original.

m expediente Jornal MARCO Laboratório da Faculdade de Comunicação e Artes da PUC Minas www.pucminas.br | e-mail: jornalmarco@pucminas.br Rua Dom José Gaspar, 500 | CEP 30.535-610 | Coração Eucarístico Belo Horizonte | MG | Tel: (31) 3319-4920 Sucursal PUC São Gabriel: Rua Walter Ianni, 255 | CEP 31.980-110 Bairro São Gabriel | Belo Horizonte | MG | Tel: (31) 3439-5286 Diretora da Faculdade de Comunicação e Artes: Profª. Cláudia Siqueira Chefe de Departamento: Profª. Viviane Maia Coordenador do Curso de Jornalismo: Prof. Ercio do Carmo Sena Coord. do Curso de Comunicação / S.Gabriel: Profª. Alessandra Girard Coordenador do Curso de Jornalismo (S. Gabriel): Profª. Viviane Maia Editora: Profª. Ana Maria Oliveira Subeditores: Profª. Maura Eustáquia e Prof. Getúlio Neuremberg Editor Gráfico: Prof. José Maria de Morais Monitores de Jornalismo: Ana Clara Carvalho, Bruna Curi, Giulia Staar, Marina Moregula eTaynara Barbosa Monitoras de Fotografia: Ana Luisa Santos e Júlia Guedes Monitores de Diagramação: Laura Brand e Samuel Lima Apoio: Laboratório de Fotografia e NEP CTP e Impressão: Fumarc. Tiragem: 12.000 exemplares

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fórum dos leitores

Literatura em pauta Excelente a matéria sobre os 60 anos de ‘Grande Sertão: Veredas’, obra-prima da literatura brasileira. Gostei muito da abordagem dada à linguagem utilizada no livro de Guimarães Rosa, das reflexões sobre a sua leitura entre os jovens e da referência ao trabalho do excelente escritor Luiz Ruffato. O MARCO, mais uma vez, está de parabéns. Rogério Faria Tavares Ex-aluno de comunicação PUC Minas, membro da Academia Mineira de Letras


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DIREITOS

Direito à privacidade x acesso à informação

Júlia Guedes

Dilema preocupa a sociedade em meio aos vazamentos de informações no cenário político Giulia Staar Marina Moregula 5° Período

Os cidadãos brasileiros têm direito à privacidade. Quanto à transgressão desse direito, a legislação é clara; invadir conversa do outro é crime. Mas o que dizer da imprensa que divulga parte de uma conversa particular que tem algo de utilidade pública? Alguns casos vieram à tona nas últimas semanas. A divulgação de resultados de exames médicos da ex-primeira-dama Marisa Letícia motivou uma sindicância do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, contra os médicos e profissionais envolvidos (sendo uma médica demitida). Grande parte da imprensa divulgou as informações vazadas por quem trabalhava no hospital. A divulgação de dados da conversa entre a primeira-dama Marcela Temer e seu irmão gerou duas questões. O hacker responsável está preso; já os veículos de comunicação online Globo e Folha de S. Paulo, que publicaram parte da conversa, foram colocados em xeque. A direção do Globo alegou que havia informação de interesse público e, por isso, deveria publicá-las. A Folha de S. Paulo ganhou uma liminar na Justiça com base no artigo da Constituição que prevê a liberdade de imprensa. A sociedade vive um momento em que a tecnologia está em seu dia a dia pessoal, comercial e profis-

sional. A divulgação de informações é instantânea e se espalha de forma incontrolável. Casos como esses levantam um debate: até que ponto a imprensa, ao divulgar o que é de interesse público, não transgride as relações da vida privada? Será que existe a possibilidade de censurar o que a imprensa publica, sendo isto inconstitucional? LEGISLAÇÃO O advogado e doutorando na PUC Henrique Avelino Lana explica que a Constituição assegura, em seu artigo 5°, que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, e que é assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação: “De acordo com as notícias divulgadas pela imprensa, em relação ao caso da primeira-dama, poderíamos estar diante de crime de invasão de dispositivo informático, previsto no artigo 154-A do Código Penal”. Ele explica que, em casos como esses, a pena “normalmente será de detenção, de três meses a um ano, podendo variar para mais, caso a caso.” O advogado frisa que a pena também pode se submeter àqueles que reproduzem, oferecem, vendem e distribuem as informações hackeadas. “De acordo com o art. 154-A, da referida lei 12.737/12, a pena pode ser majorada de um a dois terços, se houver divulgação,

comercialização ou transmissão a terceiros, seja a qualquer título, dos dados ou informações obtidos.” Lana acrescenta que, para que esta lei tenha eficácia preventiva, é necessário conscientizar a população: “Há necessidade de maior divulgação da legislação para que as pessoas invoquem seus direitos. Afinal, como se diz pelo brocardo latino ‘Dormientibus non succurit jus’, o direito não socorre aos que dormem.” Já para a jornalista Valéria Said, que preside a Comissão de Ética e Liberdade de Imprensa do Sindicato dos Jornalistas de MG, é preciso considerar que há uma diferença entre informações de interesse público e privado. A imprensa prioriza as informações de caráter público. No entanto, os meios de comunicação têm que obedecer a princípios éticos. No embate entre direito à privacidade e interesse público, é importante diferenciar: “De interesse público são os elementos para o cidadão se posicionar criticamente sobre situações que vão afetar a vida dele. Já de interesse do público são matérias sensacionalistas. O Código de Ética deixa claro que nossa função é pública, é dever do jornalista publicar matérias de interesse público”, destaca Valéria. VALORES Valéria Said está à frente do projeto que reinstalou

a comissão de ética sindical mineira. Esta comissão é importante para operacionalizar o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. Segundo Valéria, o código já sofreu quatro atualizações; a última foi em 2007. Entretanto, ainda não é completo: “Não responde por deslizes em redes sociais. O código não contempla, com as novas tecnologias, as questões mais explícitas que acontecem na internet.” Porém, para a jornalista, nenhum código deontológico dá conta de responder a todos os dilemas éticos. “O código é apenas uma base dos princípios fundamentais nos quais o jornalista baseará suas reflexões para discernir comportamentos.” Assim, o código mostra quais são os princípios fundamentais de uma filosofia moral que prevê o comportamento do jornalista: “O princípio básico de ética dos jornalistas não vai mudar, independente da plataforma. O mínimo que se exige da nossa profissão está lá, mas a sociedade não tem essa cultura de ética”. Sobre o caso da divulgação de exames da ex-primeira-dama Marisa, Valéria comenta que “não se deve compartilhar matérias que possam colocar o cidadão em situação constrangedora, de caráter mórbido, em estado extremamente delicado, como era o dela. Quando a imprensa compartilha isso nas redes sociais, está indo contra o

Romance denuncia vigilância e perda de direitos O romance “1984” é um clássico do escritor britânico George Orwell. Publicado em 1949, o livro traz uma realidade distópica que aconteceria no futuro ano de 1984, mas que, na verdade, se trata de uma metáfora dos regimes totalitários que o autor observou de perto na época em que escreveu a obra. Orwell pretendia alertar a sociedade sobre os perigos dos regimes stalinista, fascista e extremista que cresciam na Europa e na Ásia, e como a perda da privacidade e a vigilância estão diretamente relacionadas a esses riscos. Desde a posse do presidente Donald Trump em janeiro, o romance “1984” subiu na lista dos livros mais vendidos nos Estados Unidos na livraria Amazon. A editora Signet Classics, que publica a obra atualmente, informou que as vendas aumentaram 10.000%. Em uma época em que fatos e versões se mescclam, gerando dúvidas no cenário político, faz sentido que a narrativa de Orwell volte a despertar atenção. O livro conta a história de um funcionário público que vive em um regime no qual a privacidade não mais existe. O único partido político existente controla tudo

que os cidadãos pensam por meio da manipulação do idioma e de câmeras instaladas em todo lugar. Nessa nova língua, há o conceito de “duplipensar”, que permite que se aceitem dois opostos como verdadeiros. Assim, a verdade torna-se completamente manipulável por quem está no poder. O Grande Irmão vigia todos, o tempo todo, e deve ser adorado por todos, cada dia mais. Os papéis de parede se tornam televisores pelos quais se pode ver e ser visto, não havendo como fugir do controle do Estado em momento nenhum. Essa ideia originou o reality show “Big Brother”, criado na Holanda, que hoje é recriado em diversos países, como no Brasil. A crescente invasão dos direitos do indivíduo é um tema tratado no livro que está também presente no reality show e é cada vez mais ignorado à medida que aumenta o medo e a sociedade clama por mais vigilância. Entretanto, é fundamental questionar até que ponto é legítimo abrir mão da liberdade e individualidade pela segurança.

A jornalista Valéria Said é presidente da Comissão de Ética código porque está indo contra os direitos humanos. As pessoas têm privacidade, principalmente em momentos delicados, estão passando uma informação sem autorização.” Valéria explica que “o

código deontológico traz a questão da liberdade de imprensa mas leva em conta que ela tem, como pressuposto, a responsabilidade pela informação divulgada. Nós somos responsáveis por essas informações.”

Sorria: você está sendo filmado As câmeras já fazem parte do dia a dia dos moradores. Dentro dos prédios, lojas ou nas ruas, as pessoas são monitoradas. Tudo que se faz é facilmente registrado e visto em prol da segurança. Hoje, investir nesse equipamento de vigilância tornou-se uma necessidade. Mas, até que ponto é razoável abrir mão da privacidade? Diariamente são divulgadas reportagens sobre a eficácia das câmeras de vídeo contra a criminalidade. Em BH em 2012, começou a ser instalado o sistema Olho Vivo, através de câmeras com filmagem de 360°, numa parceria entre a Polícia Militar, PBH e a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL). O tenente Ulisses, do 13° Batalhão da PM, afirma que as câmeras “dão maior respaldo na ação do policial que, às vezes, não consegue atuar em diversas áreas da cidade.” Ele adiciona que o objetivo é espalhar o sistema por todo o estado. Após a instalação das primeiras câmeras, houve uma redução na criminalidade em torno de 40% nas regiões. As câmeras podem auxiliar as autoridades no combate à criminalidade e na proteção dos bens comuns. Contudo, também abrem espaço para o debate sobre a violação do direito à privacidade. Ao mesmo tempo que parece normal a vigilância 24 horas de um banco ou caixa automático, ainda é estranho para as pessoas se sentirem monitoradas. Simão Pedro é administrador de um prédio comercial no bairro Funcionários e conta que há 12 anos foi instalado um sistema de segurança que só evoluiu. Ele é composto por câmeras nos elevadores e nos outros espaços comuns do prédio, além da área externa. “Temos boas quantidades de câmeras, para que isso? Segurança. Pode até inibir as pessoas, mas é por garantia.” Para o advogado Henrique Lana, as câmeras colocadas em locais públicos ou privados não são suficientes para ofender o direito do cidadão. “Tais mecanismos estão de acordo com o Código Cívil. A publicação, ou exposição da imagem de uma pessoa pode ser obtida, se for em benefício da administração da justiça ou manutenção da ordem pública.” A exposição da imagem pode ser proibida pela pessoa “caso atinja honra, respeitabilidade ou se destine a fins comerciais.” Ana Luisa Santos

O monitoramento das câmeras do Olho Vivo é feito pela PM


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CIDADE

Mobilidade urbana é um problema grave em BH

Luz Esneda Rastrepo

Sistema de transporte público é alvo de críticas e as propostas de melhoria não saem do papel Luz Esneda Restrepo 8º Período

Segundo o artigo 4 da Lei Federal de Mobilidade Urbana, considera-se transporte público coletivo o serviço público de transporte de passageiros acessível a toda a população. Já o artigo 6 diz que a política nacional de mobilidade urbana está orientada por vá-

rias diretrizes. Uma delas é a prioridade dos serviços de transporte público coletivo sobre o transporte individual motorizado e a mitigação dos custos ambientais, sociais e econômicos dos deslocamentos das pessoas. Além disso, diz que é preciso reduzir as desigualdades e promover a inclusão social. Então, surge a pergunta: por que, na prática, a lei Júlia Guedes

Transporte individual não é uma opção sustentável

não é obedecida em Belo Horizonte? Apesar de ser a primeira cidade planejada do país, o aumento da população e a grande expansão residencial não foram levadas em conta nesse planejamento. Isso resultou na precária mobilidade urbana que atinge a população. Nos últimos anos, o aumento da frota de veículos, devido aos estímulos que facilitaram o acesso ao carro próprio, sem a ampliação da capacidade viária da cidade, criou um verdadeiro caos urbano. Segundo o Mobilize Brasil, portal brasileiro, mobilidade urbana é o deslocamento de pessoas com base em desejos e necessidades de acesso ao espaço urbano por meio da utilização de diversos modos de transporte. E mobilidade urbana sustentável é a realização dos deslocamentos de pessoas e bens, sem comprometimento do meio

Sentindo na própria pele Sou colombiana, moro em BH desde setembro do 2012. Desde que cheguei já morei em quatro bairros e todas as mudanças foram devidas às dificuldades com trânsito. O primeiro bairro foi Cidade Nova, muito tranquilo, mas só tinha uma linha de ônibus. A situação era inaceitável. Os domingos começavam com um forte barulho de carros e buzinas de ônibus. É que a avenida José Cândido da Silveira começou a ser utilizada como ciclovia e era fechada às 6h. O tráfego dos carros e ônibus que passavam por lá foi deslocado para as pequenas ruas do bairro União, terminando seu percurso na rua onde eu morava. O caos se instalou ali. No nosso novo bairro, Boa Vista, era frustrante chegar à estação e ter que esperar um metrô, logo outro, depois outro. Era impossível entrar. Os vagões estavam tão lotados que quando conseguia entrar era impossível respirar. Às vezes em algum lugar observava um pequeno espaço, quando tentava aproximar-me, via uma pessoa – sempre um jovem - sentado no chão. Ninguém falava nada, ninguém reclamava e o serviço não dispõe de seguranças para exigir dos usuários uma cultura adequada. O último dia que utilizei o metrô eu nunca esquecerei, já que deixou marca em minha pele. As passarelas da estação Gameleira têm grades deterioradas e, nas horas de pico, a lotação é impressionante: As pessoas correm e se empurram sem se preocupar com os outros.

Sem perceber, fui empurrada contra a grade, senti uma dor impressionante na minha mão. Quando olhei tinha um corte em meu braço, feito por arame enferrujado. Esse mesmo dia, pela tarde, voltei à estação e contei para os funcionários o que tinha acontecido, mostrei a ferida para eles. Sabia que não era responsabilidade deles, mas só queria, com minha reclamação, que outra pessoa não sofresse outro acidente pela deterioração da grade. Mas os funcionários foram muito displicentes e grosseiros. Depois desse dia nunca mais voltei a utilizar o metrô. Do terceiro bairro, Trevo, para deslocar-me à universidade precisava de dois ônibus. O trânsito era muito congestionado. Quando minhas aulas começavam às 7h, precisava sair de minha casa às 5h. Mas o pior era o regresso, à tarde as esperas dos ônibus acabaram com minha paciência. Às vezes ficava mais de uma hora aguardando um ônibus e demorava três horas e meia para chegar em casa. Hoje, estou morando em um bairro perto da minha universidade, dez minutos caminhando. Uma vantagem. Só que meu aluguel é R$1200,00 e não me identifico com a vizinhança. Nestes quatro anos morando em BH, em diferentes regionais, vivenciei a falta de acessibilidade urbana e como os cidadãos da cidade não têm alternativas eficientes de transporte e têm que adaptar-se à poluição sonora e ambiental e ao caos no trânsito que leva a um excesso de tempo perdido nas ruas.

ambiente. Em BH, o sistema de transporte coletivo é deficiente. O metrô por exemplo, opera só com uma linha. Além disso, na cidade existe uma rede cicloviária sem conexão com o sistema de transporte público, o que impede sua utilização como deslocamento diário de rotina. Em muitas cidades do mundo existem estacionamentos de bicicletas - bicicletários nas estações do metrô, incentivando o uso deste tipo de veículos. Agnieszka Studénka, polonesa que mora em Belo Horizonte há quatro anos diz que: “Os usuários de metrô e ônibus frequentemente sofrem com roubos e assaltos. Faltam ciclovias e os ciclistas só podem entrar com bicicleta no metrô após às 20h30 durante a semana e nos fins de semana após às 15h. Isso é muito injusto e restritivo”, disse ela. MUDANÇAS Políticas e propostas estão ficando no papel ou não passam de conversas de políticos durante eleições. A população de Belo Horizonte já ouviu várias vezes falar da melhoria do metrô. No último plano de mobilidade urbana elaborado pela BHTRANS e a Prefeitura de Belo Horizonte previa-se para 2020 a ampliação do metrô oferecendo à população duas linhas novas. Pela falta de obras tudo indica que isso não vai acontecer. Em um país onde a maioria dos habitantes mora nas cidades, a qualidade de vida está sendo afetada pela precária mobilidade. Uma cidade como

Rede de ciclovias não é conectada à de transporte público Belo Horizonte precisa de um sistema de metrô bom. Para abranger mais áreas, é necessária uma política do solo que possibilite transportes coletivos eficientes e duráveis. Já que o transporte público é uma questão de equidade da distribuição dos recursos públicos, procurando o benefício da maioria e oferecendo, suporte a todas as regiões e seus diferentes problemas. Segundo a professora Vânia Barcelos, arquiteta do Programa de Engenharia de Transportes do IME - Instituto Militar de Engenharia, “de acordo com as dimensões do desenvolvimento sustentável, pode-se considerar que a mobilidade dentro da visão da sustentabilidade pode ser alcançada sob dois enfoques. Um relacionado com a adequação da oferta de transporte ao contexto socioeconômico e outro relacionado à qualidade ambiental. No primeiro, se enquadram medidas que associam o transporte ao desenvolvimento urbano e a equidade social em relação aos deslocamentos e no segundo se enquadram a tecnologia e o modo de transporte a ser utilizado”. ESTRANGEIROS Para o polonês Grregorr Potoczny, que mora há quatro anos em Belo Horizonte e utiliza com frequência ônibus, metrô e bicicleta, a informação nas paradas dos ônibus é ausente: “Falta a tabela de horários

e rotas. Os motoristas dirigem agressivamente, não há respeito pela pessoa que utiliza o serviço. Existe muito problema para levar bicicletas nos ônibus e no metrô, já que estão sempre lotados”, afirma Potoczny. “Deveria haver mais trens de manhã e à noite quando as pessoas estão indo e voltando do trabalho. O metrô é a forma mais rápida para movimentar-se na cidade, mas só tem uma linha. Então sempre é preciso pegar o metrô e depois um ônibus para se chegar ao destino.” O colombiano Sergio Lopera Aristizabal, engenheiro, mora há nove anos no Brasil, sendo quatro em Belo Horizonte. Ele utiliza o carro particular em seus deslocamentos e percebe que em avenidas grandes como a Antônio Carlos, há muitos semáforos que, em vez de controlar o trânsito junto com radares, só geram caos e engarrafamentos. Segundo ele, as obras viárias demoram e a qualidade do asfalto é péssima e “frequentemente, aparecem buracos que causam acidentes”. Diego Bagnis, italiano gerente de P&D, está em Belo Horizonte há dois anos, se desloca por ônibus e moto. Para ele, o trânsito da cidade é muito congestionado, difícil para os motoqueiros, já que a cidade tem muitos quebra-molas. Observa também que ônibus não respeitam horários divulgados pela internet.

Soluções indicam rodízio e inclusão social A Mobilize Brasil - Associação Abaporu analisou o Plano de Mobilidade de Belo Horizonte e fez várias propostas para melhorar a mobilidade urbana na cidade. Algumas delas são simples, e outras, mais complexas: * Redução ou eliminação dos estacionamentos em via pública. * Definição de horários compatíveis com o fluxo de veículos para as operações de carga e descarga. * Restrição de acesso ao transporte individual em determinadas áreas e horários, exemplo no centro, priorizando o transporte coletivo.

* O rodízio como solução de curto e médio prazos. * Estimular o uso da bicicleta integrando ciclovias ao sistema coletivo de transporte e ao sistema de transporte escolar. * Articulação das organizações governamentais às diferentes esferas de governo dos municípios vizinhos com a finalidade de trabalhar integrados. * Mobilidade pensada para a inclusão social, otimizando a qualidade do espaço e propiciando a mudança cultural em um ambiente sustentável.


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POLÍTICA

Governo Trump gera tensão no mundo Analistas comentam que as primeiras medidas do novo governo dos Estados Unidos apontam para mudanças que ameaçam a frágil estabilidade internacional João Pedro Ferreira André Lobato Rafael Fernandes 1º, 3º e 4 Períodos

O Governo Trump tem despertado apreensão em todo o mundo. Polêmico, Donald Trump conduz o Executivo alterando drasticamente os rumos da gestão anterior. Além do perfil diferente – sem o carisma e a propensão ao diálogo de Obama – bem próximo do autoritarismo –, o novo presidente dos EUA anunciou medidas que agravam

os riscos de erosão do sistema sócio, político e econômico internacional. O slogan da campanha eleitoral de Trump foi America First, que significa “Estados Unidos em primeiro lugar”, que já anunciava o cunho nacionalista e protecionista de seu governo que sensibiliza a camada tradicional da sociedade estadunidense – composta por brancos, protestantes e de origem anglo-saxônica. Trump orientou sua política – tanto econômica, quanto social e de relações

exteriores – para atendimento deste público. Neste sentido, estão entre suas medidas: a saída do bloco econômico Trans-Pacífico (TPP) e o pedido de revisão do Tratado Americano de Livre Comércio (Nafta); a retirada da seção LGBT do site da Casa Branca; a construção de um muro na fronteira com o México; e o impedimento da entrada de imigrantes de sete países muçulmanos: Iraque, Síria, Irã, Sudão, Líbia, Somália e Iêmen. Os reflexos desta con-

duta já estão sendo percebidos. Para Ricardo Ghizi, professor de Relações Internacionais e Geopolítica, da PUC, o nível de tensão social nos EUA está aumentando. “Depois que se confirmou a eleição de Trump, foram registrados, uma semana depois, no país inteiro, 700 casos de intolerância e discriminação. Isso já acontecia antes, mas não nessa escala.”, afirma Ghizi. As medidas de Trump têm servido, de alguma maneira, para inspirar atitudes da extrema-direita. REAÇÕES

Efeitos nas relações com o Brasil A relação entre Brasil e EUA ainda é uma incógnita. Isso porque o Brasil não está – e nem estava – entre as prioridades diplomáticas dos norte-americanos. “O país está em uma região do mundo que não oferece ameaças imediatas de terrorismo, guerras e riscos aos interesses estratégicos dos americanos”, afirma Ghizi. Apesar disso, os EUA ainda se colocam como aliados comerciais do Brasil, uma vez que são a maior potência econômica mundial. Neste sentido, o governo Temer tenta estreitar a relação bilateral, pois a abertura ao comércio exterior é uma das estratégias para alcançar a recuperação financeira. Por outro lado, a chegada de Trump representa uma oportunidade para o Brasil. “Talvez o país possa aproveitar o protecionismo norte-americano, a sa-

ída do bloco TPP e o pedido de revisão do Nafta, para tentar fechar acordos comerciais com os países destes blocos, como México, Chile e Colômbia. Pode, também, aproveitar o vácuo na América Latina para tentar estabelecer uma liderança”, analisa o professor. Uma amostra disso é a movimentação que já se iniciou nos países sul-americanos, com a visita do presidente argentino, Maurício Macri ao Brasil, após viajar ao Chile. Porém, no tocante à imigração para os EUA, as perspectivas não são boas. A entrada de brasileiros no país fica mais difícil com Donald Trump. Além disso, já há inúmeros relatos de imigrantes brasileiros vivendo momentos de suspense e apreensão no território norte-americano.

Por outro lado, surge uma forte resistência ao presidente. De acordo com pesquisa divulgada pelo canal CNN, em fevereiro, o Trump tinha 53% de reprovação, o pior de um presidente em início de mandato, desde 1953. Além disso, sua posse foi motivo de inúmeras manifestações pelo país, como a Marcha das Mulheres, com mais de 3 milhões de pessoas. Essa rejeição não se resumiu à população civil. Em resposta ao fechamento das fronteiras, empresas do Vale do Silício (como Facebook, Google) se posicionaram a favor dos imigrantes e refugiados. Segundo estas companhias, a ordem de Trump afetaria tanto o setor econômico, como o

fluxo de talentos profissionais. Na questão dos imigrantes, Trump sofreu um revés do Poder Judiciário. No dia 9 de fevereiro, a Justiça invalidou o decreto que impedia a entrada de imigrantes de sete países muçulmanos. O futuro é motivo de preocupação, de acordo com o professor Ricardo Ghizi. Apesar dos países ainda estarem aguardando as primeiras decisões de Trump para agir, seus posicionamentos têm agravado a tensão no mundo. Afinal, “seu governo tem características fascistas como o culto ao líder, nacionalismo, intolerância, discriminação e perseguição. E a gente viu aonde o fascismo e nazismo levaram: à Segunda Guerra Mundial”. Quanto à economia

Ana Luisa Santos

Relações entre Brasil e EUA são uma incógnita

Confusão no uso dos termos direita e esquerda Gabriel Gomide Leonardo Parrela 5º Período

O atual contexto do Brasil, marcado pelos conflitos do “impeachment” e pelos efeitos da Lavajato, coloca a política em evidência na mídia, despertando o interesse das pessoas pelo debate, nos quais emergem opiniões diversas. Ele é acalorado nas redes sociais e no cotidiano, inspirado em diferentes ideologias políticas. Termos e ideias como “esquerda” e “direita” aparecem, mas nem sempre da forma correta. Os termos “esquerda” e “direita” surgiram no contexto da Revolução Francesa, por volta de 1789. Durante a Primeira Assembleia, os deputados se dividiam em dois grupos: o primeiro era composto por pessoas da alta sociedade, com mentalidade conservadora e já ativos na vida política, se posicionavam do lado direito do presi-

dente da Assembleia; já o segundo grupo, composto por camponeses, que pela primeira vez participavam do debate político, tinha ideias de igualdade social e se assentava à esquerda. Para o professor da PUC Euclides Guimarães, assim surgiu o primeiro significado dos termos: “Direita está associada a gente de posse, gente mais conservadora, enquanto a esquerda se liga a essa turma que estava chegando ao poder, disposta a reinventar a organização política, de modo que se tornasse mais acessível ao povo”. No entanto, as ideologias associadas aos termos têm sofrido transformações e cada uma tem subdivisões. No espectro político, há variações que vão da extrema-esquerda à extremadireita. O desconhecimento desses conceitos leva a discussões que se baseiam em argumentos errados. É recorrente definir os gover-

nos de Cuba e da ex-União Soviética como de esquerda. Segundo Guimarães, esses governos usaram da ideologia esquerdista para ascender ao poder, mas se afastaram da sua essência ao governar e acabaram se tornando regimes, em muitos segmentos, opressores. O termo “direita” é empregado, pejorativamente, para definir pessoas extremamente individualistas e despreocupadas com as questões sociais. Os grupos de direita tendem a acreditar que o problema das

desigualdades não é estrutural e, sim, de má administração. Ou seja, a direita não identifica que o problema da sociedade está na desigualdade causada pela estrutura do sistema governamental que atua no país, como pensa a esquerda, mas sim em problemas administrativos, refletidos pela falta de meritocracia e habilidade de pessoas que assumem cargos públicos. Essas pessoas não assumem postos de acordo com sua capacidade, mas sim, por Júlia Guedes

influências políticas e, por isso, acabam não tendo bom desempenho como teriam especialistas que chegassem aos cargos por méritos. Segundo o professor Malco Camargos, não existe, na sociedade, uma interpretação certa desses conceitos. “No Brasil, todos os conceitos políticos têm sido deturpados. Paralelamente, a participação política, no Brasil, aumentou e o brasileiro, cada vez mais se sente porta-voz do que pensa. Isso, associado ao baixo nível de educação e somado ao baixo nível de leitura da sociedade, faz com que a maioria dos conceitos usados para discutir política, nas redes sociais ou nas mesas de bar, sejam muito abaixo do esperado e distantes da realidade”. NO BRASIL

O uso correto dos conceitos direciona o debate

internacional, acredita-se que o discurso de seu governo seja mais populista do que realista. Segundo Alysson Parreira Gomes, professor de Economia e História, “ainda que se tenha a pretensão de adotar uma política protecionista, isso não é possível de fato. Ele não pode simplesmente alterar a ordem econômica vigente, que é extremamente integrada. Trump, embora seja idiota em muitas coisas, não é neste ponto: como homem de negócios, sabe que isso seria prejudicial para a economia norte-americana”. Porém, continua o professor, “pode ser que os EUA dificultem a entrada de produtos lá e que, em retaliação, estimule países a adotarem medidas semelhantes, sobretaxando produtos estadunidenses”.

A má interpretação dos conceitos faz com que, em geral, o povo brasileiro

defina o Partido dos Trabalhadores (PT) como de esquerda e o Partido da Social-Democracia Brasileira (PSDB) de direita. Porém, afirma Guimarães, essa é uma visão deturpada dos conceitos originais. “Pela história do partidarismo brasileiro, não há partidos ideológicos”, pois se alguém acendesse ao poder e tivesse uma visão apenas ideológica não conseguiria governar. Para conseguir governabilidade é preciso fazer acordos com os demais partidos, o que PT e PSDB admitem. Logo, esses partidos não podem ser considerados como exemplos para as ideologias. Essa nebulosidade no uso dos conceitos abre precedente perigoso quanto ao modo de governar, segundo o prof. Camargos: “Se um candidato não se posiciona, ideologicamente, o eleitor não tem ideia do que ele se propõe fazer. Logo, votar nele é dar-lhe um cheque em branco para ele agir como quiser. A ideia popular agora é negar o partido e a ideologia, valorizando mais as pessoas”.


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CAMPUS

DCE une calouros através de debate O objetivo é contribuir para o amadurecimento dos jovens estudantes Larissa Duarte 3º Período

O primeiro dia na universidade é um evento importante para muitos jovens. Os “calouros”, novos estudantes de curso superior, sentem uma mistura de várias emoções, como alegria, nervosismo e medo. Esse primeiro passo na vida adulta pode ser assustador para muita gente. Foi pensando nisso que o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da PUC Minas preparou ao longo da primeira semana de aula, várias atividades para introduzir o calouro no mundo dos universitários.

Com o tema geral “A quem serve a universidade”, o DCE preparou duas conversas por dia, entre 6 e 10 de fevereiro. Os temas dos debates enfocaram questões sociais que impactam a vida dos estudantes da PUC Minas, como “negritude,” que discutiu a vida dos negros numa universidade particular; feminismo; questões LGBT e arte urbana. Entretanto a participação nas conversas foi baixa: pouquíssimos alunos compareceram e quase nenhum era calouro. Sobre isso, a presidenta do DCE, Thainá Nogueira, acredita que: “Tudo que não é

natural tem resistência. Agora houve menos adesão, mas fazendo sempre vamos instigar cada vez mais os estudantes a participarem”. Thainá disse também que o DCE “deseja que o estudante venha para a universidade e fique além do tempo de sala de aula, buscando outros tipos de conhecimento”. Para isso, várias atividades já estão sendo preparadas para os próximos meses. “É muito importante que a gente acolha os calouros, por isso a recepção deve contribuir para levá-los a perceber as contradições existentes nesse ambiente”, disse Paulinha

Ajac empossa nova direção Gabrielle Monteiro Ludmilla Abreu 3º Período

A Ajac (Atlética José Albino de Comunicação) troca de gestão após um ano de funcionamento. A atlética que reúne alunos dos cursos de Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Cinema, agora tem um novo diretor: Guilherme Vido, 21, cujo principal objetivo em sua nova gestão é o maior engajamento dos alunos nas atividades da organização. Atléticas universitárias são responsáveis por coordenar e promover atividades esportivas de cada faculdade, organizando treinos e campeonatos, externos e internos, de diversas modalidades. Além disso, a entidade organiza festas para a integração dos alunos, confecciona e comercializa produtos como camisas, bonés e canecas. A Ajac já tem produtos próprios e equipes consolidadas, porém a sua relação com os alunos da faculdade de comunicação não é próxima, algo que a nova gestão quer reverter.

Para isto, a diretoria foi reformulada: no ano passado eram sete, agora são quatro. O que facilita a articulação interna. “São menos pessoas, mas elas são mais dedicadas ao trabalho, elas conseguem produzir muito mais”, disse Vido. “O nosso principal objetivo é o engajamento dos alunos, quero que a galera compre a ideia da AJAC, que digam ‘essa é minha galera, essa minha atlética, estou representado por esse grupo de pessoas’”, completa. Uma das novidades da Ajac em 2017 é o lançamento da caneca personalizada, de alumínio preto, que está em pré-venda por R$ 20,00. A previsão de chegada do produto é para o dia 22 de fevereiro. Outra inovação da Atlética é o plano de sócio torcedor, feito em parceria com a empresa ForSócios. A plataforma oferece planos mensais para os alunos do prédio 13. As assinaturas custam entre R$ 7,50 e R$ 15,00 e traz diversos benefícios para o assinante como descontos em estabelecimentos em Belo Horizonte. Dessa forma, o aluno pode Júlia Guedes

A Ajac quer alunos mais próximos e participativos

se beneficiar e ajudar a Atlética com recurso financeiro que será revertido na promoção de eventos para eles próprios. Segundo o diretor, mais conhecido pelo apelido de Paulista, a principal dificuldade da nova gestão é a falta de recursos financeiros, sem os quais fica difícil a realização de qualquer projeto da entidade. Porém, a adaptação da nova equipe também é uma etapa a ser cumprida. Sobre os eventos, a Atlética ainda não promete festas, mas garante estar pensando em palestras e workshops de interesse dos alunos. Segundo o diretor de eventos, Henrique Laje, a intenção é planejar atividades que sejam a cara do prédio 13 e que, acima de tudo, representem os interesses dos alunos. Quanto aos esportes, algumas modalidades tiveram demanda e foram confirmadas para 2017. Futsal feminino e masculino, handebol feminino e masculino, basquete e vôlei masculino já têm equipes formadas, mas ainda nesse semestre serão abertas vagas. O presidente afirmou que se houver uma demanda grande para um esporte específico, eles farão o possível para atender. Uma surpresa para os alunos do prédio 13 é que a nova gestão pretende trabalhar em esportes alternativos. Luiz Augusto, diretor de esporte, diz que campeonatos de baralho, truco e FIFA são ideias que, se consolidadas, serão transmitidas para todo o prédio.

Silva, estudante de psicologia e coordenadora da pasta de assistência e movimento estudantil no DCE. “Nós estamos inseridos numa sociedade estruturada com base em várias opressões e na universidade não é diferente. O que é muito contraditório já que ela é um espaço para produção de conhecimento”. “Para mudar essas coisas, primeiro é necessário que o estudante se informe e as conversas têm tal objetivo. É preciso levar os jovens a se engajar nos movimentos sociais junto com o DCE para dar-lhes um direcionamento mais positivo”, afirmou. Pabline Santana, estudante do quarto período do curso de cinema e audiovisual, conduziu a conversa sobre negritude e disse que, quando foi caloura, houve uma iniciativa do gênero no prédio em que ela estuda, mas bem diferente da atual. “Geralmente, quando as pessoas entram na universidade a recepção que têm é só comemorativa, sempre festas, ir a bares.

Quando entrei, eu era chamada todo dia para ir aos bares ao redor daqui”. Pabline também disse que atividades sérias, de cunho político ou social, são relevantes para que o estudante já entre na universidade fazendo questionamentos sobre a vida do país e do povo e dispostos a participar dos movimentos sociais. “Os calouros se diferenciam: alguns atribuem muita importância às conversas, outros nem tanto, principalmente a galera mais nova. Mas, depois, eles acabam entendendo a importância”. O estudante João Gui-

lherme, do oitavo período de ciências sociais, adorou a iniciativa do DCE e disse que no seu curso “as pessoas sempre trouxeram muitas discussões e qualquer atividade dessas é um passo a mais no processo de formação, em que aprendemos muito com as pessoas que estão na mesa e na troca de experiências nos debates. Cada um leva as contribuições que marcaram sua trajetória e vendo as experiências de outras pessoas ficamos inspirados, cada vez mais, a resistir e combater qualquer tipo de opressão”. Ana Luisa Santos

DCE procura tornar universidade atraente fora do horário

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Helbert: cuidar é uma arte Taynara Barbosa

Uma vida dedicada aos pacientes Taynara Barbosa 2º Período

O enfermeiro Helbert Pereira da Silva, 46 anos, trabalha no ambulatório da PUC, unidade São Gabriel (PSG), há dois anos e três meses, tempo suficiente para ganhar a admiração e simpatia de funcionários e estudantes. Ele é conhecido por todos como “o enfermeiro gente boa”, engraçado, educado e prestativo. “Estou aprendendo muito com ele”, afirma o colega Adriano César de Oliveira Lima. A estudante de jornalismo, Nathália Souza, diz que sempre que vai ao ambulatório e “bem atendida”. Sempre que preciso de um analgésico, uma pastilha efervescente para aliviar a queimação no estômago, ou até mesmo um simples band aid, consigo no posto médico.” O também estudante de jornalismo, Pedro Henrique Sampaio, se sente grato por todas as vezes que precisou da assistência do enfermeiro: “Falar do Helbert pra mim é difícil pois nem consigo descrever o quanto ele foi bom pra mim quando eu mais precisei, semestre passado, quando eu estava passando muito mal. Ele me tratou muito bem, fez os primeiros socorros e me indicou o hospital mais próximo. Todas as vezes que eu fui ao ambulatório, fui bem atendido por ele, sempre muito

atencioso comigo. A única coisa que eu posso dizer é ‘muito obrigado’. Helbert atribui sua popularidade a uma via de mão dupla: o sucesso dele depende do bem estar do outro: “Graças a Deus, em todos os lugares em que eu passo sou bem aceito. Eu procuro também cativar isso”. Ele acrescenta que, independentemente do que as pessoas pensem, ele tem que exercer a profissão acima de tudo com muita dedicação, respeito e carinho. EXEMPLO DO PAI Helbert conta que foi inspirado pelo pai, que trabalhava em uma farmácia. Ele passou parte da infância e adolescência no meio dos medicamentos. Quando iniciou a vida adulta, chegou a seguir os caminhos do pai e trabalhou em uma farmácia durante um período. Pouco tempo depois, migrou para a enfermagem, onde atua com muita dedicação há 20 anos. “Meu pai trabalhou em farmácia durante muitos anos, então eu acredito que isso aí me incentivou um pouco pra esse lado. Mais tarde eu saí da farmácia, trabalhei em outros lugares, mas sempre tive vontade de fazer pelo menos o (curso) técnico de enfermagem... É um sonho de infância.”, ressaltou Helbert. Um ambiente do ambulatório é totalmente diferente do de um hospital, o quee foi uma novidade para Helbert e o motivou para o trabalho. É sua primeira experiência em uma universidade, e ele gosta muito do que faz e da convivência com tanta gente propiciada pela sua atividade. Para ele, o contato direto e cara a cara foi e é muito importante na adaptação: “Eu pude crescer ampliando meus conhecimentos, e isso vem me ajudando muito, como pessoa e profissional”. A demanda do posto é de aproximadamente 40 pessoas por semana.


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COMUNIDADE

SUS já oferece terapias alternativas Novas abordagens representam para os pacientes maiores oportunidades de cura e de atendimento mais humano, mas ainda há dificuldades a superar Luiza Dias Proença Carolina Pontes Janaína Renata 3° Período

O Sistema Único de Saúde (SUS) implantou, em janeiro, novas práticas de medicina alternativa como reiki, meditação, arteterapia e tratamentos naturopáticos, quiropáticos e osteopáticos no tratamento de seus clientes. Elas têm o objetivo de complementar os tratamentos já existentes, são aprovadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e passam a ser reconhecidas pelo Governo Federal como técnicas comprovadamente curativas. A Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC)

criada em 2006, já havia incluído no SUS tratamentos como fisioterapia, acupuntura, homeopatia, dança circular/biodança, ioga, oficina de massagem/ automassagem, auriculoterapia, massoterapia, medicina antroposófica e termalismo. Entretanto, constatou-se que existem falhas na implementação dessas terapias. No posto de saúde no bairro Dom Cabral, não há previsão para que o SUS implante esses novos recursos pois, de acordo com a Secretaria Municipal de Saúde, cada município se adequará, no devido tempo. Não é obrigatório entrar imediatamente em vigor, ou seja, a lei existe, mas a população terá acesso a ela paulatinamente. As práticas Júlia Guedes

Posto de saúde ainda não oferece algumas modalidades

alternativas que deveriam ter sido implantadas desde 2006 também não estão devidamente disponíveis na Regional Noroeste. O Centro de Acolhimento ao Idoso do bairro Dom Cabral é o único local que oferece novas terapias como acupuntura e lian gong. A iniciativa foi dos próprios funcionários que chegaram a receber cerca de 200 inscrições para a iniciação do tratamento. Como o serviço é privado, os pacientes pagam uma pequena taxa, convertida na compra dos materiais usados. A sala onde é realizado o tratamento, apesar de não estar preparada para receber um grande número de pacientes, acolhe de 20 a 30 pessoas por sessão e tem apenas seis macas. Falta aopoio municipal ao Centro. O mestre em reiki, Walter Araújo, explica a leigos e pacientes a importância da introdução desta terapia no SUS já que muitas pessoas a confundem com uma doutrina religiosa. É comum entre o público em geral achar que a medicina tradicional japonesa é uma religião. Os profissionais do reiki, assim como os de outras terapias, receberão um código que vai possibilitar a cada um contribuir com a Previdência Social (INSS) aposentando-se no ofício.

Essas práticas integrativas têm como foco tratar o paciente de forma holística, ou seja, dando ênfase a aspectos relativos à integridade estrutural, funcional, espiritual e mental

da pessoa. Devido ao fato de não serem invasivas, de não necessitarem do uso de medicamentos e de terem baixo custo comparado ao da medicina tradicional, a introdução no

Técnicas valorizam saúde mental O reiki é uma técnica japonesa que, através da imposição das mãos, trata os chakras, ou seja, os pontos energéticos do corpo. Ele relaxa e alivia o stress do paciente. Doenças, muitas vezes não explicadas pela medicina convencional, são tratadas com essa terapia e os resultados são positivos. Não existem contra-indicações e ela é compatível com qualquer outro tratamento. A meditação é outra prática integrativa. É indicada para todas as pessoas, pois ajuda a relaxar a mente e voltar a atenção para o interior e silêncio de quem a pratica. Antes de aplicações de reiki, por exemplo, o terapeuta faz uma meditação para se preparar para a terapia. Ela também não tem contra-indicações e nem é maléfica para quem a pratica. Complementa tratamentos e é indicada para todos os aspectos da vida. A Bíblia Sagrada fala sobre a meditação e, apesar de não ser voltada para religiões, a técnica propicia um bom momento da pessoa consigo mesma. A arteterapia trabalha a psicologia com simbologia, buscando articular o universo externo com o interno de cada indivíduo. Os pacientes fazem trabalhos manuais e, além de ser uma técnica relaxante, ela agrega outras terapias e tratamentos. É diferente do tratamento naturopático, que cuida do paciente mudando seus hábitos alimentares, usando a hidroterapia,

acupuntura e nutrição. Ambas seguem o raciocínio das terapias holísticas, cuidando não somente do paciente como um todo, mas também da influência entre ele e o meio ambiente. A fisioterapia também ganhou espaço no SUS. Os tratamentos quiropáticos e osteopáticos chegam para agregar e especializar a profissão, pois somente os fisioterapeutas podem praticá-los no Brasil. As fisioterapeutas Juliana Zaidan, osteopata, e Tabata Cuadros, quiropata, explicam como as técnicas são usadas para despertar a autocura dos pacientes. Basicamente, ambas trabalham a parte motora do corpo, mas transcendem o físico, como relata Juliana: “São seis anos de curso ao todo, só de osteopatia. O objetivo do osteopata é restaurar o equilíbrio, ou seja, mexemos com a estrutura para melhorar a função. Focamos mais no paciente como um todo do que na doença em si. Não tratamos diretamente os sintomas, tentamos buscar a causa. Qualquer pessoa pode ser tratada, desde o recém nascido até o idoso”. Segundo elas, será interessante o ingresso das modalidades no SUS. “A osteopatia é tida como uma medicina preventiva, cuidados de saúde primária e o efeito é praticamente imediato. Só ficamos na dúvida sobre quem irá atender osteopatia pelo SUS, pois as consultas particulares são sempre melhor remuneradas. Júlia Guedes

Livro homenageia os 50 anos da Escola Estadual Assis das Chagas Bruno Garofalo Daniel Daher 3º Período

Os moradores do tradicional bairro Dom Cabral, na Regional Noroeste, acompanham a Escola Estadual Assis das Chagas desde sua fundação. Recentemente a escola completou 50 anos de existência e publicou um livro que conta a sua longa história, que envolve a do surgimento do próprio bairro. Há também um documentário reunindo entrevistas de ex-alunos, moradores da comunidade e funcionários. A boa relação com a comunidade está presente desde que a Assis das Chagas, em 1978, incorporou docentes da escola “Cecília Meirelles”, também conhe-

cida por “escola de tábua” devido à sua construção de madeira. Ela foi fechada pelo Governo por apresentar risco de desabamento. Desde então, a Assis Brasil se tornou um ponto de encontro dos moradores, já que se localiza próximo à “Praça da Comunidade”, às quadras de futebol e à Paróquia Bom Pastor. A escola desenvolve projetos musicais e esportivos, além de manter parceria com a PUC e com o posto de saúde do bairro. Segundo Fábio Cássio da Cruz, diretor da escola, até 2013 a instituição recebia alunos do primeiro ao quinto ano. A partir de então passou a oferecer o restante do ensino fundamental, incluindo do sexto

ao nono ano. No último, os alunos sempre visitam o Cefet-MG (Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais) para conhecer novas alternativas e perspectivas de trabalho. Os moradores zelam pela preservação da escola através de vigilância e denúncias em caso de suspeita. “Muitos moradores vieram do interior, então a relação é a de que todos conhecem todos, todos ajudam todos, típica de cidadezinha do interior. As pessoas do bairro gostam muito da escola e cuidam dela. Ligam para a polícia se for preciso e estão sempre preocupados, mesmo que não haja parentes estudando lá”, disse Maria da Conceição, superviso-

SUS foi mais fácil. Ainda há poucos estudos sobre os efeitos destas formas de tratamento, mas são inegáveis a praticidade e a melhoria de qualidade de vida de seus pacientes.

ra pedagógica da escola e moradora do bairro Dom Cabral. Em comemoração aos 50 anos da Assis das Chagas, o professor Luís Filipe Arreguy, em conjunto com seus alunos do curso de História do Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH), percebeu que a escola não tinha uma história registrada e resolveu trabalhar no levantamento e na apuração de dados históricos que não constavam nos registros internos da instituição. “Muita coisa que a gente conseguiu em termos de imagens, fotos antigas, foi do acervo dos próprios moradores”, disse o professor. Dessa ação resultaram dois produtos: um livro e

Prof. Luís Felipe procurou valorizar a história da Escola um documentário. Ambos contam com informações do passado, entrevistas gravadas durante o processo de resgate e até alguns registros de atividades realizadas ao longo do ano. O livro tem ainda uma peculiaridade: alguns capítulos temáticos sobre lendas urbanas que fizeram parte do cotidiano dos alunos em determinadas épocas, como uma história da Loira do Banheiro. Luís conta

que foi feita uma investigação sobre isso para checar se era uma história isolada, até que se percebeu que ela foi contada diversas vezes. “Alguns até tinham medo de ir ao banheiro por causa da loira. Inclusive fizeram uma pequena gruta com uma imagem de Nossa Senhora em frente ao banheiro, para espantar o espírito”, relatou.


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Giulia Staar Samuel Lima 5° Período

Gente que saiu de casa e nunca mais voltou. Crianças que brincavam na porta de casa e sumiram. Casos que atormentam, todo dia, mães, pais, parentes e amigos das pessoas desaparecidas. No o dia a dia na cidade, em vários lugares públicos, fotos de pessoas desaparecidas estão afixadas em todos os lugares, enquanto, elas mesmas, em lugar nenhum. Nos muros e nas paredes das ruas, nos quadros de avisos dos ônibus, em folhetos espalhados pelas calçadas, estão presentes, até mesmo, no verso da sua conta de luz. Apesar desta alta exposição, não importa o quanto os rostos são divulgados, ninguém parece vê-los. E o problema é grave: a cada 15 minutos desaparece uma criança no Brasil. Segundo dados disponibilizados pela Secretária de Defesa Social de Minas Gerais, em Belo Horizonte, até setembro de 2016, um total de 957 pessoas desapareceram. Em todo o Estado, durante o ano, foram 9.022. Os números alarmantes, desta verdadeira ferida social, recebem pouca atenção da população, do governo e da mídia. Apesar das ocorrencias, em Minas, terem diminuido (5%) em 2016, em comparação a 2015, o problema é preocupante. É que segundo a Sedese (Secretariade Defesa Social de Minas Gerais), apenas 4.767, das 9.022 desaparecidas foram localizadas em 2016. Além disso, apenas cerca de cinco delegacias são especializadas em desaparecimento em todo o Brasil

SEGURANÇA

Desaparecidos: rostos perdidos na multidão Diariamente são registrados novos casos de pessoas que somem de casa e nunca mais são encontradas Arquivo pessoal

Cerca de 250 mil pessoas estão desaparecidas em todo o Brasil, apesar do esforço para encontrá-las

e nenhuma delas tem banco de dados compartilhados com os estados. Uma delas está em Belo Horizonte. PROCURA

Segundo o investigador da Divisão da Referência da Pessoa Desaparecida em Belo Horizonte, Lucas Eduardo Guimarães, não é necessário esperar tempo algum para dizer que uma pessoa está desaparecida. Ela é assim considerada quando não cumpre a sua rotina óbvia e não

há notícia dela entre os seus parentes ou conhecidos mais próximos, no trabalho, escola e casa. A busca deve ser imediata. Existem duas opções para as famílias: ir a qualquer unidade da polícia civil ou militar e registrar o desaparecimento ou fazer isto pela delegacia virtual. Guimarães explica que essa ação tem um efeito prático imediato: a pessoa em questão, entra em um sistema integrado de informações das policias do Estado, os oficiais passam a receber um aler-

ta e ficam mais atentos quando consultam documentos em blitz ou batida policial. Isto impede que elas passem despercebidas. “É o primeiro passo para se encontrar alguém.” Caso isto não funcione, o fato é encaminhado para a Delegacia de Desaparecidos, que produz um cartaz de localização. O registro e autorização de divulgação da imagem e dados devem ser feitos por um parente de primeiro grau. O desaparecimento é um caso

PROVIDÊNCIAS

Existem dois tipos de desaparecimento: voluntário e involuntário. Cabe aos policiais estudar cada caso para depois classificá-los. De acordo com o investigador Guimarães, cerca de 30% dos casos são involuntários ou misteriosos e, neles, a divulgação é o foco. Os outros 70% são voluntários, gente que fugiu de casa e a Laura Brand

Apoio psicológico é essencial A Rede de Apoio a Perdas Irreparáveis (API) promove reuniões e palestras abertas a todos que sofreram perda de algum ente querido e precisam de forças para seguir em frente. Criada há 18 anos, a API faz reuniões mensais e mantém unidades em várias cidades de Minas Gerais. O trabalho surgiu com pais que perderam filhos. Hoje a rede se expandiu e atende todos que já sofreram perdas irreparáveis. Gláucia Rezende é a psicóloga clínica idealizadora

de ausência, por isso é necessário gerar material de identificação fácil para ajudar a investigação.

do projeto e começou o trabalho após perder a filha em um acidente. Segundo ela, a maior dificuldade é aprender a conviver emocionalmente com a situação indefinida, de ter um parente desaparecido. É diferente da morte de um ente querido, no qual, apesar da dor, as pessoas podem “recorrer a rituais, velar o corpo, se despedir, fazer missas. Isso tudo vai ajudando aos pais e amigos a se organizarem nessa nova condição. Com os desparecidos isso não acontece”, observou.

No caso de pessoas desaparecidas, há uma perda ambígua, pois não necessariamente a pessoa morreu. Então a família tem que aprender a lidar com o tempo de espera. De acordo com a psicóloga, a tendência do ser humano é de se apoiar naquilo que chama de pensamento mágico de negação: “aquilo não aconteceu. Isso não é comigo. Isso não é possível”, quando estão diante de uma condição para qual não existe nenhuma prova material. “Nós temos a necessidade

humana de definir, de tornar tudo material.” Segundo ela, é preciso conversar. Leandro Gomes Campos é corretor de seguros e teve sua filha desaparecida há quatro anos. Ele afirma que o diálogo foi essencial para que aprendesse a viver com a dor; mas reforça: “Fica na minha cabeça que a gente vai encontrar a minha filha. E bem”. Para Josely de Souza Melo, cuja filha também desapareceu, conversar sobre o assunto ainda é muito difícil: “Quando a pessoa some, você não tem mais estrutura, o fato abala sua família inteira, você não sabe conversar, lidar com isso”. Ela vendia roupas antes do desapareci-

divulgação não adianta muito. Mas, segundo a Delegacia de Desparecidos de MG, eles são mais fáceis de localizar: a maioria se apresenta e informa sua condição ao ver seus dados divulgados. Segundo a SEDES, a maior parwwte dos desaparecidos, em 2016, um total de 3.470 pessoas, encontrava-se na faixa etária de 12 a 17 anos,(38,5%). Feito o registro de ocorrencia, a Lei de Busca Imediata (lei n° 11.259) é aplicada, conferindo total prioridade ao caso entre as ações do departamento da delegacia que cuida especificamente de questões referentes à criança e ao adolescente. Se eles estiverem fugindo de situações de violência doméstica, a competência da delegacia se esgota ao encontrá-los e o caso é passado para a Vara da Infância e Juventude, para que sejam tomadas as devidas providências. Muita gente retorna às suas famílias sem que isto seja comunicado à polícia. Quase ninguém volta à delegacia para informar que a pessoa foi encontrada. Guimarães explica que, por causa disso, a maioria das pesquisas é inconclusiva, pois o número de localizações realizadas pela polícia é baixo se comparado ao que realmente acontece. As delegacias em Minas Gerais têm um cadastro geral de pessoas desaparecidas e a maior parte do seu material é divulgado por concessionárias que prestam serviços de abastecimento de água e energia elétrica. Eles oferecem um espaço para exposição de fotos e dados dos desaparecidos nas contas enviadas aos moradores da cidade.

mento da filha, em 2009, e hoje, diz não ter forças para trabalhar mais. Segundo a psicóloga Gláucia ai está a importância das reuniões: elas suprem a necessidade de discutir o tema ao reunir pessoas para compartilhar suas experiências. O dialogo é importante, pois falar sobre o assunto é o primeiro passo para começar a entender o sofrimento. “Claro que não se supera uma perda irreparável, mas se aprende a lidar com ela e tirar disso vontade de continuar a viver. A gente se reconstrói. Não existe o caminho certo. A receita é o dialogo e lutar por aquilo que achamos importante.”


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Giulia Staar Samuel Lima 5° Período

Eles estão todos a procura de algo. São os parentes e amigos de pessoas desaparecidas, cuja procura parece nunca ter fim; o tempo torna-se seu maior inimigo. Para eles, pouco importa a passagem de semanas ou anos: a esperança nunca se esvai. A busca torna-se parte da rotina: delegacias são mais frequentadas que casas dos seus amigos e suas redes sociais são tomadas por pedidos de ajuda. Eles espalham folhetos, fazem passeatas, tentam de tudo para que a chance de encontrar seus entes queridos não desapareça. BRUNA Bruna Marques Melo tinha quatro anos quando desapareceu. Era outubro de 2009. Brincava com seu irmão gêmeo e mais três crianças na calçada. Segundo Josely Melo, sua mãe, era uma tarde de sexta feira

SEGURANÇA

Espera constante e muita dor marcam a vida das famílias Em Minas Gerais, doze crianças/adolescentes desaparecem por dia, deixando familias e amigos sem respostas comum na cidade de Frutal, no Triangulo Mineiro. Ela estava sentada assistindo televisão quando o som do carro de circo passando repetidas vezes chamou sua atenção; algo estava errado: “eles passaram 10 vezes em 15 minutos.” Josely lembra que na última vez em que o carro passou, distribuiram ingressos para as crianças que estavam na rua. Logo depois, seu outro filho entrou em casa pedindo para ir ao circo. Bruna não costumava ficar sem o irmão, o que preocupou imediatamente a mãe. Ela correu até o local onde os filhos estavam. “Quando cheguei lá, Bruna

havia sumido; só encontrei a bicicleta. Meu coração de mãe já dizia que tinham levado minha filha. Saí gritando o nome dela.” A polícia demorou para investigar o caso da Bruna: “Disseram que iam procurar na cidade, mas não perguntaram como ela era, a roupa, etc. Não deram valor”. Josely diz que a atitude da polícia não mudou durante a investigação do sumiço da sua filha. “Muitas vezes fui à delegacia e eles faziam pouco caso de mim. Nem o pior bicho do mundo é tratado como as famílias de desaparecidos. Parece que foi a gente que sumiu. Não dão apoio suArquivo Pessoal

ficiente.” Segundo o investigador da Divisão da Referência da Pessoa Desaparecida, em BH, Lucas Eduardo Guimarães, casos de desaparecidos são mais complicados porque há poucas pistas. “Às vezes não tem material para investigar.” Além do que, no Brasil, “se investe mais em policiamento preventivo (militar) e menos em policiamento investigativo (civil).” Depois de oito anos de procura, Bruna continua desaparecida, mas Josely nunca perdeu a esperança. Ela continua indo até a delegacia, espalhando fotos da filha na rua e na internet e pedindo ajuda. “A luta para encontrar Bruna não terminou”, assegura. EMILY

Não é preciso esperar 24 horas para registrar o sumiço de uma criança ou de um adolescente

Assim como os pais de Bruna, os de Emily Ketlen Ferrari, de nove anos, permanecem sem notícia do paradeiro de sua filha. A garota desapareceu na cidade de Rio Pardo de Minas, no norte do Estado, em 2013, enquanto brincava na porta da casa da mãe. Após quatro anos, a po-

lícia ainda não tem nenhuma pista da garota. Segundo Elton Reis, investigador da polícia civil de Rio Pardo de Minas, o desaparecimento já foi investigado como cárcere privado, sequestro e, até mesmo, tráfico internacional de pessoas. Nunca se chegou perto de sua localização. Na procura pelo culpado, o pai de Emily, Leandro Campos, foi investigado. Ele e a mãe de Emily já estavam separados e moravam em cidades diferentes. Ele acredita que isso desviou o foco da polícia e que, talvez, a menina já tivesse sido encontrada se não fosse a insistência nele como principal suspeito. “A população da cidade ficou contra mim, acusaram-me de raptar minha filha. Foi horrível. Mas hoje sabem

que não sou o culpado.” Apesar da falta de pistas, o investigador Reis afirma que todos na delegacia ainda têm esperança de encontrá-la. “Com o tempo o caso foi esfriando e nós ficamos à mercê de novas informações. Às vezes elas não vêm, mas no caso da Emily, acreditamos que ainda vamos sair vitoriosos.” E completa: “Não temos muitos recursos, mas temos força de vontade, isso temos de sobra.” Leandro também acha que sua filha será encontrada, mas acredita que não será nada fácil. “A mídia não ajuda, ninguém dá atenção aos desaparecidos. Eles dão preferência a quem tem influência; quando é gente anônima, ninguém dá atenção. Eles são esquecidos.” Arte: Laura Brand

Voluntários se dedicam às buscas As famílias de desaparecidos não estão sozinhas. Existem ONGs e grupos que apoiam a causa e dedicam sua vida às buscas. Criada em 2007, na cidade de Governador Valadares, a ONG Gente Buscando Gente, atua pelas redes sociais e, desde então, trabalha para encontrar e pro-

mover a procura de pessoas desaparecidas. A ONG foi criada pelo seu diretor Carlos Rodrigues, junto com voluntários. A motivação veio de um caso familiar, envolvendo a avó de Carlos. Hoje, atuam orientando as famílias e oferecendo acompanhamento próximo, além Arquivo Pessoal

do auxílio na busca. Segundo ele, Gente Buscando Gente, “apesar de ter sua sede no interior de Minas Gerais, tem abrangência nacional e, em dez anos de história, já ajudou na localização de mais de 5 mil pessoas em todo o Brasil.” Para ele, a ONG tem como missão divulgar os casos de desaparecidos, já que “nem todos são noticiados pela mídia e muitas famílias ficam esquecidas.” SOLIDARIEDADE

Luciana investe todo o seu tempo na causa

Com o mesmo objetivo, a voluntária Luciana Coelho, moradora de Contagem, começou um grupo de voluntárias, em novembro de 2013. Após acompanhar o caso de desaparecimento do menino João Rafael Kovalski, de um ano e 11 meses, em Adrianópolis, Paraná, as seis mulheres se juntaram para lutar pela causa. “Vimos que a realidade não era só de João, era de vários Joãos.” Luciana conta que ela e as outras cinco voluntárias se conheceram pelo Face-

book, onde começaram a realizar divulgação on-line: “Inicialmente começamos com crianças, mas o movimento foi crescendo e muitas famílias começaram a nos procurar”. As voluntárias usam recursos próprios e ajudam famílias, com o apoio da polícia civil. “Somos apenas voluntárias pela causa, cada uma ajuda como pode.” E explica que a maioria dos casos que ajudam envolvem famílias carentes: “Às vezes elas não têm condições de arcar com a divulgação e não têm acesso à internet”. Josely Melo, mãe de Bruna, encontrou na internet o apoio que precisava, com as voluntárias. “Não as chamo de voluntárias, chamo-as de anjos! As meninas ajudam com dinheiro para divulgação e buscas, com conselhos. Elas se preocupam comigo e com meu caso.” Luciana, hoje, dedica todo o seu tempo à causa. Juntas, as cinco mulheres, promovem atos públicos,

fazem panfletagem, exposições e manifestações, em diversos locais da cidade, como Praça da Liberdade e a rodoviária, além do ativismo diário pela internet. Luciana acredita que a sua luta envolve principalmente a conscientização daqueles que não dão atenção ao problema: “O desaparecimento de pessoas é uma ferida social e essa ferida só toma a atenção das pessoas quando atinge as famílias delas. Isso tem que acabar, temos que ser solidários”. Ela relata a fala de uma das mães que ajudou: “Ela me disse que preferia ter um filho morto do que um

filho desaparecido. Morto ele está lá, enterrado, você se despede dele. Desaparecido você fica no limbo, na espera e, às vezes, é para sempre.” Por isso, as seis mulheres acreditam tanto no seu trabalho. Desde que começaram a atuar, as voluntárias dizem já ter visto diferença na preocupação das pessoas em relação aos desaparecidos. O objetivo do grupo e a sua maior missão é divulgar, ajudar e não deixar ninguém entrar no esquecimento. Se você tem informações sobre pessoas desaparecidas, ligue para a Polícia Civil 0800 2828 197.


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10 COMPORTAMENTO

Solteiros lutam pelo direito de ser pais Luciana Mendes 2° Período

Homens e mulheres não veem problemas em educar e cuidar de filhos sem a ajuda de um companheiro Ana Luisa Santos

Nos últimos anos, o número de brasileiros solteiros que desejam ter filhos aumentou consideravelmente. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), dos anos 90 até 2000, houve um crescimento de 74,5% no número de homens que cuidam sozinhos dos filhos e de 58,8% no número de mulheres na mesma condição. O sonho de ter um filho, por muito tempo, foi algo apenas ao alcance de casais heterosexuais, casados ou vivendo juntos. Hoje em dia, ter um filho não significa necessariamente ter um companheiro ao lado. Cada vez mais, brasileiros solteiros têm tomado a decisão de ter filhos sozinhos. CASAMENTOS

Vários motivos levam homens e mulheres a cuidarem dos filhos sozinhos e um deles é o fato de os casamentos durarem cada vez menos. Assim as crianças passam a morar mais cedo com apenas um dos pais. Alguns dispensam o casamento e preferem adotar crianças mesmo sem um companheiro. “Isso evita dor de cabeça. Só vou precisar me preocupar com meu filho e também não quero ficar presa a nenhum homem”, explica Maria Clara Pereira, vendedora de 34 anos que está tentando adotar. No caso de Madalena Fagundes, jornalista e chefe de redação da PUC TV, a adoção não foi algo planejado: “Participei de um processo de apadrinhamento e conheci o Vitor. Ele era o mais novo e me falaram que passava muito tempo sozinho; então resolvi apadrinhá-lo”. A jornalista conta que, inicial-

mente, começou a ficar com ele todos os fins de semana. Ela organizou um quarto em sua casa e, mais tarde, obteve autorização para passar as férias inteiras com ele. Madalena foi de coração aberto e iniciou o processo: “Após algum tempo recebi uma mensagem do Juizado da Infância e da Juventude sobre a possibilidade de adoção, pois a família não teria mais condições de ficar com ele, por vários motivos. Vítor já fazia parte da minha vida, éramos praticamente uma família”. Adotado aos 5 anos hoje ele já tem 18. Para mulheres e homens que decidem ter filhos de maneira não convencional, existem diversas possibilidades legais, como: fecundação in vitro, inseminação artificial, barriga de aluguel e até sites que oferecem serviços de maternidade. Entretanto, segundo Elzania Costa, advogada especialista em direito de família, o ideal seria a adoção: “As crianças

confiança para cuidar da criança enquanto ela trabalhava.” O resto foi tranquilo: “Em relação à convivência e à educação não houve nenhuma dificuldade.” FILHOS

Vitor foi adotado por Madalena aos cinco anos de idade

já existem e estão ali precisando de carinho e afeto. No Brasil contamos com centenas de crianças nesta situação”. Contudo, a advogada ressalta que não se pode julgar cada escolha, pois cada pessoa tem um sonho. “Algumas mães querem sentir a criança dentro

delas, por isso buscam clinicas especializadas”, comenta. Em relação às dificuldades de criar um filho sozinha, Madalena Fagundes tem posição definida: “Não existe nenhuma dificuldade que não possa ser superada. A maior foi encontrar alguém de

Há pessoas mais conservadoras que se espantam com as mudanças que estão acontecendo na estrutura familiar. Algumas se preocupam com a forma como as crianças passarão a ver o mundo na ausência de um dos pais. Entretanto, para a estudante de jornalismo Luiza Rocha de 18 anos, o fato de ter sido criada só por sua mãe não influenciou negativamente sua vida: “Eu cresci praticamente sendo cuidada por minha mãe e nunca me faltou nada, nem em questões financeiras e muito menos amor e carinho”. Fabiana Moreira, de 22 anos, cresceu junto com seus irmãos sem nunca conhecer a mãe e afirma não ter nada do que reclamar: “Nunca me preocupei

Milhares de crianças ainda esperam um novo lar No Brasil, centenas de crianças e adolescentes de 0 a 17 anos fazem parte do Cadastro Nacional de Adoção (CNA). Lançado em 2008 o CNA é uma ferramenta digital que visa auxiliar juízes das Varas da Infância e da Juventude a localizar pretendentes à adoção.Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), existem no Brasil cerca de 38 mil pessoas interessadas em adotar e 7.160 crianças cadastradas. Essa discrepância existe pois, na maioria dos casos, o perfil de criança exigido pelos pretendentes não é compatível com aquele disponível nas instituições de acolhimento. A principal barreira são as crianças mais velhas (pois apenas 1.128 possuem três anos ou menos), crianças com irmãos e portadoras de doença ou deficiência. Conforme dados do CNA, das 657 adoções realizadas em 2016, um total de 332 foi de crianças maiores de três anos. Para facilitar o processo de adoção, sem descuidar da segurança e do bem-estar da criança, projetos buscam diminuir o prazo

do processo que, atualmente, gira em torno de um ano. Quanto menores forem as exigências quanto ao perfil da criança a adotar, (sexo, idade, cor da pele ou fazer parte de grupo de irmãos), menor é o tempo que o pretendente tem que aguardar. EXIGÊNCIAS Para ser considerado apto a adotar a pessoa tem de comprovar renda suficiente para uma vida digna, idade e a capacidade de criar uma criança em um ambiente saudável. Cada caso é avaliado separadamente, mas, em geral, o adulto deve ter mais de 21 anos, independentemente do seu estado civil. Na hipótese de pretendentes casados, a adoção deve ser solicitada por ambos, que participarão juntos de todas as etapas do processo adotivo e será feita a avaliação de estabilidade da união. Em caso da adoção por homossexuais, a autorização fica a critério do juiz responsável pelo processo, pois ainda não há nada descrito na legislação a esse respeito.

com isso. Meu pai conseguiu nos criar muito bem e não faltou nada. O amor e o carinho com que fomos educados nos fez ser pessoas de bem. Não mexemos com nada de errado e crescemos muito felizes e unidos”. INTERTÍTULO

Segundo a psicóloga Leticia Barbosa, a figura do pai e da mãe são fundamentais na formação, no desenvolvimento e construção moral, social, emocional e psicológica da criança. Contudo, os filhos de pais e mães solteiros não são mais problemáticos dos que os de pais casados. “Algumas vezes, a sociedade tem uma tendência de rotular ou generalizar que deve ser evitada.” A psicóloga explica que os filhos necessitam, em qualquer condição, de apoio, carinho, proteção, companhia, cuidados e limites. “É fundamental o papel da família no desenvolvimento da autoestima dos filhos, pois é nela que desenvolvemos os laços afetivos. O importante é saber equilibrar de forma que a criança receba a disciplina e o afeto necessários; assim o desenvolvimento pode ser bem saudável”, afirma Letícia. A quantidade de casais sem filhos e de pais e mães solteiros mostra como o conceito de família se transformou. A partir de 2003, no Código Civil Brasileiro, a definição de família se tornou mais flexível e plural, deixando de ser baseada apenas no casamento e abrangendo, também, qualquer união estável ou comunidade de genitor e descendente.


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Marcella Gasparete Rebeca Almeida 1º Período

No início do mês de fevereiro, a apresentadora do Globo Esporte de Minas Gerais, Maíra Lemos, cometeu uma falha ao falar da vitória do Cruzeiro sobre o Atlético pelo Campeonato Mineiro. “Maior público do futebol brasileiro nesta temporada até aqui. Foi pela Copa da Primeira Liga e o maior… e o Cruzeiro venceu com um gol do Arrascaeta” disse ela na primeira edição do MG TV. O público não perdoou a jornalista e esse erro virou meme nas redes sociais. No entanto, o que muitos internautas consideraram uma questão de gosto pessoal, foi, na verdade, uma falha de quem estava manuseando o teleprompter (equipamento que exibe o texto a ser lido pelo apresentador), que demorou ao rolar o texto lido por Maíra. Casos como esse são comuns no meio jornalístico. Devido ao dinamismo do trabalho, os jornalistas co-

IMPRENSA

Gafes fazem parte do trabalho jornalístico O dinamismo da profissão, o nervosismo e a problemas técnicos levam repórteres a cometer erros mas eles são encarados com bom humor pois sabem que no outro dia tudo se renova metem erros que, muitas vezes, podem prejudicar as reportagens. São as chamadas gafes, “saias justas”, que vão desde erros ortográficos até falhas de comunicação e acontecem com frequência. O profissional da área deve ser preciso, não redundante e imparcial. Todavia muitos falham, involuntariamente, nesse quesito. Quando se trata de transmissões ao vivo, erros são ainda mais comuns. Maíra recorda-se também de que, além da tal gafe, já confundiu o nome de um jogador e se enrolou toda para falar a palavra “reivindicações”, errando a pronúncia seis vezes. Júlia Guedes

Hélia já está aposentada e tem muita história para contar

AO VIVO Pautas de programas ao vivo, na rua, também são sempre mais difíceis. Paolo Xavier, repórter e produtor da Rede Minas, recorda a dificuldade de gravar no meio da multidão. “É gente entrando na frente da câmera, toda hora, pessoas gritando, empurrando. Ao vivo, tudo pode acontecer, é uma profissão muito imprevisível.” Ele revela que, na televisão, principalmente, há muitos detalhes, precisa-se de muita técnica, boa execução, imagens e som de alta qualidade. O trabalho em equipe ainda torna tudo mais difícil, pois é necessário o entrosamento que as vezes não ocorre. E claro, o nervosismo pode atrapalhar muito: “Fui fazer uma entrevista ao vivo dentro do Jornal Minas, primeira edição, e me deu branco. Eu estava muito tranquilo, sabia muito bem do assunto, mas quando a âncora me chamou, travei.” Há também ocorrências nas quais o entrevistado se sente ofendido ou incomodado com a pergunta, como foi o caso contado por Hélia Ventura, jornalista aposentada, do Diario da Tarde. Ana Luisa Santos

Hélia disse que sua maior gafe ocorreu ao entrevistar Emilinha Borba, cantora conhecida nos anos 50 como a “rainha do rádio” que, na época, estava em Belo Horizonte para desfrutar de uma pausa na carreira. A jornalista queria perguntar como Emilinha, sendo tão famosa, conseguia manter-se no anonimato, sem ser reconhecida. No entanto, ao invés de usar a palavra “anonimato”, usou “ostracismo”, que significa esquecimento, isolamento, no sentido de exclusão social. “Ela me chamou de jornalista de quinta categoria. Eu tentava explicar, pedia desculpas e ela já não me escutava mais. A entre-

vista acabou ali”, relembra Hélia. Ela explica que artistas muito famosos que caem no esquecimento têm dificuldade em aceitar essa condição, como foi o caso da entrevistada. As gafes são inevitáveis; tanto iniciantes quanto profissionais mais experientes estão sujeitos a cometê-las. Para prevenir a situação, todos os jornalistas concordam que é fundamental ter “jogo de cintura” e humildade para admitir que errou e pedir desculpas, independente de ser ao público ou a um entrevistado, em particular. “Fazemos o possível para não errar, tem uma estrutura toda para isso, mas somos seres humanos. E quando falhamos não tem o que fazer, devemos só rir. Mas o bom é que passa, tudo passa, amanhã isso acontecerá com outra pessoa e ninguém mais lembrará do seu erro.” diz Maíra Lemos. A única coisa a fazer é aceitar e seguir em frente; afinal, a exposição faz parte da profissão e errar é humano. Júlia Guedes

Paolo teve um branco na hora de entrar ao vivo

Painel mostra etapas d0 fazer jornalistico Ana Luisa Santos 7º Período

O painel “A imprensa”, criado pela artista plástica Yara Tupynambá, domina toda a parede da entrada da Casa do Jornalista, que abriga também o Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais. Ele foi produzido em 1966, quando ela ainda era recém-formada pela Escola Guignard. A ação do tempo desgastou cores e contornos e houve a necessidade de restauração da obra, que tem um enorme significado para a categoria dos jornalistas e seu Sindicato. Segundo o presidente da entidade, Kerison Lo-

pes, a artista procurou representar todo o contexto do Jornalismo naquele período: “Olhando os detalhes, dá pra identificar todos os momentos do jornalismo. Desde a produção dentro da redação, na época com as máquinas de escrever; a fotografia, os linotipos para impressão, as tipografias. Tem até um trecho que mostra um estúdio de televisão”. Faz também alusão à guerra Fria e à do Vietnã, que aconteciam no momento de criação do painel.“Ela mostrou todo o processo em que está inserido o Jornalismo, desde a notícia, a produção da notícia, a venda do jornal e a


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SAÚDE

Depressão aflige jovens Vida corrida, muita exigência e falta de atividades saudaveis favorecem a depressão e a ansiedade Bruna Nogueira 7º Período

“Era carnaval. Meu pai insistia, me chamando para sair no bloquinho, mas eu tinha vontade de morrer. Tentei suicídio, de abrir janela e querer pular. Meu pai é médico, então ele percebeu que não era passageiro. Por um mês e meio fiquei de cama, quase parei a faculdade. Meu irmão via tudo como frescura, achava que era tristeza porque terminara um namoro. Mas não era frescura nem preguiça, era doença, e grave”. Esse depoimento é de uma jovem universitária de 20 anos que sofre de depressão. A dor dentro dela já foi mais forte que sua força de vontade e é apenas mais uma dentre milhares de jovens e adultos que vivem com a patologia. Conhecidas como o mal dos tempos modernos, doenças como ansiedade e depressão vêm tomando conta da sociedade. Segundo a Organização Mundial da Saúde, cerca de 33% da população mundial sofrem de ansiedade. O Brasil aparece no topo da lista de países mais afetados. Para a psicóloga e coordenadora da clínica de psicologia da PUC Minas, Lúcia Efigenia, é natural que, com a rapidez cobrada no dia a dia, os jovens desenvolvam ansiedade. “É inegável que temos mais urgência atualmente. O sujeito às vezes não acom-

panha a correria, internamente. A questão é cada um desenvolver um recurso para lidar com isso; não devemos nem recusar nem nos misturar a esses avanços”, comenta. Dados do INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) mostram que os distúrbios mentais estão entre as maiores causas de afastamento do trabalho, custando quase R$ 200 milhões por ano aos cofres públicos. Os profissionais de saúde alertam que, com a vida agitada, processos mentais são acelerados. O resultado é a pessoa estar sempre com a adrenalina a mil, e assim, é impossível manter hábitos saudáveis. ANSIEDADE Um certo grau de ansiedade é esperado em qualquer pessoa. Essa ansiedade move o sujeito a um tipo de produção, o que difere totalmente, daquela ansiedade que nos paralisa. Quando é alta, é preciso ser trabalhada e controlada com ansiolítico. A ansiedade traz sintomas que atrapalham a vida social: dores e apertos no peito, podendo evoluir para palpitações, dores na região abdominal, tremores, roer unha, falar rápido, preocupação, medo constante e uma sensação de que algo ruim vai acontecer. A ansiedade que paralisa é uma inquietação psicomotora. Algumas pessoas

não conseguem estudar, nem se concentrar, ficam sempre em uma atenção difusa que as deixa muito cansadas pelo próprio trabalho psíquico. “Eu não me lembro exatamente do momento em que descobri que era ansiosa. Meu pai é muito ansioso e eu sempre fui também achando isto natural”. O depoimento é da estudante G. M. que começou a sentir-se incomodada de repente. Após três anos, passou a ter reações mais intensas de ansiedade, o que a levou a procurar ajuda profissional: “De um tempo para cá, comecei a fazer tratamento com remédios, mas sempre frequentei psicólogos”. G. M. afirma que os estudos trazem dificuldades, mas não são a causa exclusiva da ansiedade. “A pessoa ansiosa pensa muito no futuro. Se tenho algo pra fazer na segunda-feira que vem, hoje já estou nervosa e já quero fazer. Fico pensando e já acho que vai dar errado”. DEPRESSÃO Segundo a psicóloga, sintomas como desânimo, irritação, mudança súbita de humor e cansaço extremo podem ser uma reação a algo difícil que a pessoa está vivendo e não se tratar de depressão. “É preciso examinar cada caso. Depressão é uma terminologia muito usada inadequadamente, até mesmo

por profissionais de saúde. Às vezes a pessoa está só muito triste”, ressalta Lúcia Efigenia. A estudante de 20 anos A. P. conta que sua mãe morreu de câncer, quando ela tinha um ano de idade. Ela e o irmão foram criados pelo pai, mas sentiu a falta da figura materna. “Eu era muito próxima da minha sogra e ela cumpria esse papel de mãe para mim. Quando terminei o namoro, me distanciei dela e senti o baque; cresceu a falta da mãe que nesses 19 anos eu fui levando; foi a gota d’água”, conta a estudante, que caiu em depressão. Foi difícil confessar o mal para outras pessoas, tanto que sua família ainda não sabe: “Sinto vergonha de falar e medo de eles acharem que falharam comigo. Via a morte como uma saída e queria acabar com tudo. Mas logo vinhame o sentimento de culpa, pois se eu fizesse isso acabaria com a vida da minha família.” A psicóloga Lúcia Efigenia explica que o tratamento varia de pessoa para pessoa e, antes de indicar a abordagem apropriada, é necessário conversar com o paciente.Só após entrevistas bem preparadas é possível diagnosticá-lo. Para a estudante G. M., “o psicólogo através de conversas bem trabalhadas, cria barreiras para você não passar por esse problema

Clínica da PUC trata alunos Na clínica de psicologia da PUC Minas, o paciente é acolhido de acordo com o grau de seriedade da patologia que o acomete. Uma entrevista inicial é feita por monitores supervisionados:seis alunos do final do curso de psicologia. O monitor e o supervisor responsável decidem qual será o melhor encaminhamento para o cliente, seja permanecer na clínica, para mais quatro encontros semanais, ou ser transferido para outras clínicas ou consultórios. “Aqui acolhemos os alunos que necessitam de atendimento psicológico. Os alunos de final de curso atendem alunos de nível grave. A gente avalia se vai tratá-lo aqui, se vai encaminhar para fora, ou dar outro encaminhamento”, explica Lúcia, coordenadora do trabalho. Este programa é parte do projeto Acolhimento Psicológico desenvolvido pela universidade. Ele tem plantões de segunda a quinta, no turno da manhã e da tarde. É possível marcar consultas gratuitas no telefone (31) 33194322 ou ir direto à clínica, que fica no prédio 44. Ex-alunos também são recebidos e atendidos a preços mais acessíveis.

de novo. Já o psiquiatra atua quando está pegando fogo; ele vai lá e o apaga na hora”. A rede pública de saúde conta com Centros de Atenção Psicossocial, que tratam pessoas que sofrem patologias psicológicas. Para pacientes que não

apresentam sintomas graves, existem programas que melhoram a qualidade de vida. Eles diminuem efeitos da ansiedade e da depressão, baixando níveis de cansaço e estresse, e fazem parte do Programa Estadual de Atenção Básica. Ana Luisa Santos

Remédios só devem ser tomados sob receita médica

Atividades físicas melhoram desempenho nos estudos Aline Beatriz 3° Período

Alguns estudantes dividem seu tempo entre o trabalho e a universidade, o que afeta o rendimento escolar e pode resultar em problemas de saúde. A prática de esportes ou atividades físicas é importante para aliviar o estresse, melhorar a disposição e o desempenho nos estudos. Arthur Valentim, 20, é estudante de odontologia e trabalha como vendedor. Ele pratica esportes e, às vezes, é difícil conciliar tantos afazeres, mas o resultado final é estimulante. “Dos quatro aos 19 anos pratiquei natação, fui atleta e ganhei premiações, hoje faço somente musculação. No final a rotina cansativa é boa, pois auxilia a minha mente e o fortalecimento dos meus músculos”. Joyce Almeida, 21, que estuda arquitetura e traba-

lha como babá, começou a frequentar academia há dois anos e não parou mais. “Comecei musculação aos 19; nessa época tive dificuldade em conciliar todas as minhas obrigações, porém fui acostumando e, agora, sinto-me mais disposta graças à musculação”. Outros jovens não deixam de praticar esporte, mesmo que só nos fins de semana. É o caso de Lucas Gobbi, estudante de psicologia e auxiliar administrativo. Ele não abre mão de jogar futebol pois sabe dos benefícios dessa atividade para sua saúde. “Eu jogo todos os sábados e, apesar do cansaço e dores no corpo, por não ter um bom preparo físico, sei que essa atividade é importante para manter uma boa relação com meus amigos e me manter fora do quadro de jovens sedentários”, relata.

RECOMENDAÇÕES Agnelo Alves, professor de educação física, ressalta a importância do esporte na juventude “É o momento de formação dos sistemas e órgãos e os cuidados com o corpo são mais receptivos e disciplinados. Aconselho atividades como artes marciais, natação e

musculação, pois melhoram o condicionamento físico e desenvolvem a capacidade de raciocínio”. Carlos Alberto também é profissional de educação física, formado há 11 anos. Ele acredita que “quanto mais moderna se torna nossa sociedade, mais sedentários nos tornamos Arquivo pessoal

pela falta de necessidade de nos movimentarmos para cumprir tarefas cotidianas. Há pouco mais de 20 anos precisávamos nos levantar para trocar o canal da tevê e atender ao telefone; hoje sequer precisamos sair de casa para fazer nossas compras de supermercado”. Além disso, ele alerta que qualquer atividade deve ser praticada sob a orientação de um profissional sério e qualificado. “Essas atividades podem ser feitas três vezes por semana, com a duração de 45 minutos a uma hora, sempre supervisionadas”. EXEMPLO

Bruno Souza perdeu quase 30 kg em oito meses de exercícios

Bruno Souza, 19, estudante de educação física e professor de zumba, sempre sofreu de asma e o seu sobrepeso acarretava-lhe problemas de saúde. Porém, aos 16 anos, resolveu mudar de vida, começou a

se exercitar e melhorou sua alimentação. “Lembro-me até hoje do meu primeiro dia: como foi sofrido. Até disse ‘não volto nunca mais aqui’, mas tive força de vontade, e aí foram se passando um, dois, três meses e fui gostando dos resultados nítidos. Minha autoestima era outra, fiz várias amizades. Entrei para a academia com 103 kg e depois de oito meses já havia eliminado quase 30 kg. Isso foi uma conquista que deu um rumo diferente à minha vida”, comemora. Orgulhoso, o jovem diz que seu objetivo é dar esperança e ajudar pessoas que são como ele era: “Hoje curso educação física e já atuo na área. Ajudar o próximo sempre foi meu objetivo e não tem coisa melhor do que ajudar quem tem o mesmo objetivo que eu tive Sou muito grato”.


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13 CULTURA

Mulheres ganham espaço no cinema Amanda Koide

A presença feminina cresce na indústria do cinema brasileiro, mas ainda enfrenta muito preconceito Carolina Cassese 1º Período

O debate sobre igualdade de gênero e participação feminina se intensificou no campo do cinema, no Brasil. Isto ocorreu, nos últimos anos, em consonância com uma pauta social mais ampla, que discute a representação das mulheres em diversas esferas. Há muitas vitórias, mas o mercado cinematográfico ainda é pouco generoso com elas. Um dos reflexos positivos de mudança é a realização, pelo Canal Brasil, da segunda temporada da Mostra Cine-Delas, uma espécie de festival que reú-

ne longa-metragens dirigidos por mulheres. São 13 filmes assinados por diretoras como Anna Muylaert (“Que horas ela volta”, “Durval discos”) e Monique Gardenberg. Muylaert entrevista a diretora responsável por cada filme antes da exibição do longa no Canal Brasil. O olhar feminino no cinema brasileiro também vem sendo abordado por festivais. A Mostra de Tiradentes completou 20 anos em janeiro e homenageou mulheres na última edição. As atrizes Helena Ignez e Leandra Leal receberam o Trófeu Barroco em reconhecimento por seu trabalho. O curador Ana Luisa Santos

da Mostra, Cléber Eduardo, acha muito importante a presença das mulheres no cinema. “As coisas ainda não estão equilibradas, mas mudanças não acontecem de supetão. É um processo histórico e cultural no qual todos temos nossas responsabilidades e nossos papéis”. Dos 29 longas selecionados para a Mostra de Tiradentes, 12 são de realizadoras. Entre eles está o documentário “Divinas Divas”, dirigido por Leandra Leal, que retrata a primeira geração de travestis brasileiros. Segundo Eduardo, existe um “valor político” em mais filmes serem dirigidos, fotografados e montados por pessoas que representam grupos historicamente oprimidos, como as mulheres. OUTRA PERSPECTIVA

CINE PUC exibiu filmes produzidos e realizados por mulheres

O filme “A Cidade onde envelheço”, produzido por Ana Vilhana e em cartaz atualmente nos cinemas, surgiu do encontro entre três mulheres: Luana Melgaço, Clarissa Campolina e Marília Rocha, todas do meio audiovisual. Luana, que se dedica à produção desde

2005, acredita na importância do conceito de representatividade e afirma: “Um filme dirigido por uma mulher pode mudar a perspectiva da representação da própria mulher, inclusive quebrando estereótipos arraigados há séculos”. Para ela, a melhor maneira de combater o sexismo é enfrentá-lo na sociedade como um todo, em todas as suas diversas esferas. A atriz Inês Peixoto, do Grupo Galpão, também já se destacou no cinema e na televisão. Inês acredita que as produções de mulheres têm ganhado mais visibilidades nos últimos anos e que esse tema está no centro do debate em diversos âmbitos. “No caso da arte, a valorização do olhar feminino na construção de obras e a crescente capacitação da mulher para qualquer mercado de trabalho fizeram crescer a produção delas”, afirma. Inês diz que é grata às mulheres que lutaram por um lugar na arte: “Tenho plena consciência de que pude assumir minha vida artística com tranquilidade graças a muitas mulheres, que vieram antes de mim

Iara Laporte fez apresentação no Cine PUC

e lutaram por isso. E sigo porque sei que tem outras seguindo ao meu lado”. Estudante de cinema da PUC Minas, Nanda Pallazi lembra que a história cinematográfica foi construída também por mulheres, mas muitas delas foram apagadas da linha do tempo. “A questão é que, historicamente, mulheres do campo do audiovisual têm menos oportunidades do que os homens e, no geral, são rechaçadas por um preconceito na indústria que diz que diretoras, atrizes em papéis principais ou qualquer equipe que seja feminina ‘não são rentáveis’”, afirma. Apesar dos consideráveis avanços, o mercado de trabalho ainda seria, segundo ela, pouco generoso com as mulheres.

Também estudante de cinema, Iara Laporte, acha que as produções comerciais não agregam as mulheres. Mulheres negras e trans são ainda menos representadas. Iara tem várias referências no meio audiovisual, entre elas as atrizes Viola Davis (vencedora do Oscar de atriz coadjuvante em 2017) e Laverne Cox (“Orange is the new black”). Segundo a estudante, os filmes estão ficando cada vez mais politizados, mas ainda reforçam diversos estereótipos que são prejudiciais à sociedade, principalmente em comédias. “Um deles é da mulher gostosa e burrinha. É importante que diretoras, produtoras e atrizes contestem esse padrão”, destaca.

Política invade a folia e carnaval vira momento de crítica Flora Silberschneider 8º Período

Quem nunca dançou ao som de “mamãe eu quero, mamãe eu quero, mamãe eu quero mamar”, ou até mesmo cantando “olha a cabeleira do Zezé, será que ele é, será que ele é ?”. Não importa quando, mas todos nós já balançamos o esqueleto ao ritmo de marchinhas de Carnaval, em algum momento. Porém, alguns se esquecem de que o carnaval também tem um cunho político muito forte e as marchinhas podem ser usadas- e são para, além de divertir, dar voz ao povo. Mais do que uma festa de origem religiosa e divertida, os mineiros fazem do Carnaval um momento de reflexão social. Para o historiador e músico Guto Borges, o carnaval é uma festa do povo da cidade, que sai da cultura de consumo e leva movimento para as ruas, numa manifestação cultural popular. Com isso, abrem-se espaços para diversas críticas

e as marchinhas dão voz à elas. Borges ressalta que as marchinhas, além de hinos dos blocos, criam um desenho da visão deles sobre a cidade. É o caso do Bloco Pula Catraca, nascido do movimento social Tarifa Zero, que atua nas questões de mobilidade urbana. Neste ano, os foliões do Bloco se uniram e montaram paródias de marchinhas e músicas antigas com letras criticando algumas questões atuais sobre mobilidade. Para eles, o momento é de atualizar as letras e falar da nova gestão da prefeitura. Uma das marchinhas critica, por exemplo, as promessas de campanha do atual prefeito, Alexandre Kalil, que foram deixadas de lado. A bateria toca e os foliões fazem o coro e cantam “Malandramente o Kalil inocente, fez de bobo a gente e aumentou a tarifa”, entoam e continuam com outra marchinha “Kalil eu quero, Kalil eu quero, Kalil eu quero me

deslocar, é ciclovia, tarifa zero, tarifa zero pra cidade andar”. Além dos blocos, em Belo Horizonte, o Concurso de Marchinhas Mestre Jonas abre espaço para a criação e divulgação de músicas de carnaval, em sua maioria com temáticas políticas. Kuru, o idealizador do concurso, conta que a ideia veio do anseio de projetar a força do Carnaval na cidade, no âmbito musical, que já vinha mostrando um grande

crescimento. O Concurso, desde 2012, é feito antes do Carnaval e antecipa as marchinhas que serão cantadas durante a folia. Este ano, a marchinha ganhadora foi “O Baile do Cidadão de Bem”, composta pelos músicos da Orquestra Brega de Minas Gerais, Jhê Delacotrix e Helbert Trotta. A letra, crítica, ironiza os que se intitulam cidadãos de bem sem ser nada disso, cantando o refrão “olha lá quem vem, é o cidadão de Flora Silberschineider

Marchinha de carnaval critica a mobilidade urbana

bem, é o cidadão de bem; contra a corrupção, e taça de champanhe na manifestação”. Trotta ressalta que as marchinhas de carnaval “são uma crônica da sociedade, um retrato de um momento, de uma coisa que está acontecendo” e para eles a expressão “cidadão de bem”, em alta na sociedade atual, tinha uma origem muito mais obscura e ignorada. A partir de uma pesquisa, descobriram que o termo era usado por um já extinto jornal norte-americano da “Ku Klux Klan” em defesa da hegemonia branca, promoção de xenofobia e de um governo de extrema direita. Com a adoção dessa expressão por diversos brasileiros de direita, eles decidiram fazer a marchinha como um alerta e crítica à essas pessoas que se auto-intitulam cidadãos de bem sem ao menos saber a origem da expressão. Jhê espera que as pessoas sejam cada vez mais “cidadãos do bem, do amor,

da tolerância e da diversidade”. O administrador de empresa e compositor nas horas vagas, Vitor Velloso, ganhou o Concurso em 2014 com o trocadilho “O pé rela no pó, o pó rela no pé” da marchinha “Baile do pó Royal”. Neste ano ficou em segundo e terceiro lugares com os trocadilhos “Solta o cano que não cai” e “Pinto na ponte, pinto no muro, pinto de branco e pinto mais escuro”, respectivamente. Para ele, as marchinhas são como as tirinhas e charges: buscam fazer crítica de uma maneira divertida e descontraída. A cada ano, novos acontecimentos incentivam a criação delas. Criatividade é o que não falta entre os belohorizontinos que querem expor sua opinião através das músicas. Kuru ressalta que o anseio por mudança do país está cada vez mais presente e, assim, os mecanismos para promover tais mudanças se diversificam. As marchinhas são um deles.


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ECONOMIA

Supermercado: cada bairro, um preço O valor dos produtos varia de acordo com a região em que a loja se localiza e essa prática é considerada legal; mas o consumidor deve ficar bem mais atento Ranier Alves 7º Período

As grandes redes de supermercados passam a ideia de que praticam preços iguais em todas as suas lojas, em qualquer lugar. Quem frequenta os estabelecimentos pode não perceber, mas a precificação dos produtos varia conforme a região em que se localiza a filial. Para confirmar a prática, o MARCO realizou uma conferência entre os dias 10 e 11 de fevereiro nas seguintes lojas da rede Epa, em Belo Horizonte: Rua Curitiba (Centro), Coração Eucarístico (região Noroeste), São Gabriel (região Nordeste) e São Lucas (Contorno, região Centro-Sul). O levantamento contemplou 98 itens de uso essencial nos seguimentos de alimentação, higiene e limpeza e revelou variações de preço de até 31% entre uma loja e outra. Constatou-se que os preços são menores em regiões onde, supostamente, os consumidores têm menor poder aquisitivo. Já em bairros nos quais se presume que os consumidores têm maior poder de compra, o preço é mais alto, mas há maior variedade de produtos. Os números apontam que uma pequena

compra de cada um dos 22 itens populares listados sairia mais em conta na loja Epa São Gabriel (R$139,19), Cnas demais: centro (R$142,39), Coração Eucarístico (R$146,29) e São Lucas (R$150,59). Caso o consumidor opte por consumir produtos mais caros (de marcas mais conhecidas), essa ordem sofreria a seguinte alteração: Coração Eucarístico (R$195,98), Centro (R$196,28), São Gabriel (R$196,76) e São Lucas (R$219,66). Segundo Giovanni Peres, gerente de comunicação da Associação Mineira de Supermercado (AMS), diversos fatores influenciam na variação de preço e não apenas o poder aquisitivo dos consumidores. Entre eles, destacam-se o custo operacional, o tempo de giro da mercadoria em cada loja e o preço praticado pela concorrência. O tempo de giro dos produtos tem peso expressivo na diferente precificação das mercadorias em lojas da mesma rede. Isso, segundo Peres, está ligado a um fator que não pode ser desprezado pelos supermercadistas: o prazo de validade das mercadorias. E afirma: “Há a necessidade de giro, não só para fazer renda, mas também

Júlia Guedes

Consumidores precisam adotar estratégias para melhorar sua postura na hora de comprar

para cumprir os prazos de validade”. LEGALIDADE

Habituado a comprar em lojas de grande rede, o aposentado Gilson de Andrade disse que nunca prestou atenção nisso por acreditar que a prática fosse ilegal. A dúvida do Sr. Gilson é também a de muitos outros consumidores que desconhecem as leis que disciplinam o tema. Elas consideram legal a prática de diferentes preços entre lojas físicas da mesma rede. Mesmo com a legalidade comprovada, a variação de preço não pode ser exorbitante, e o consumidor deve procurar o Procon mais próximo de sua localidade caso sintase lesado pelo valor cobrado. Segundo a lei nº 8.884, de 11 de junho

de 1994, elevar sem justa causa o custo de produtos ou serviços é considerado prática abusiva. O professor de economia da PUC Minas, Jean Max Tavares, esclarece: “A prática de preços diferenciados em estabelecimentos da mesma rede pode ser explicada por um aspecto da Teoria do Consumidor, chamado de Discriminação de Preço em 1º grau”. O estudo determina que um estabelecimento pode cobrar de acordo ou igual à máxima disposição do consumidor de pagar por um bem. Em outras palavras, o mercado cobra de acordo com o que o consumidor está disposto a pagar. ECONOMIZAR

O levantamento demonstrou que, embora Júlia Guedes

A região em que a loja está situada pode interferir nos preços dos produtos ofertados

relevantes, as variações de preços entre estabelecimentos da mesma rede fazem parte de um grupo de outros fatores aos quais os consumidores devem se ater na hora de realizar suas compras. A diferença de preço entre marcas é um deles, chegando a números expressivos como nos itens: bebida láctea (75,19%), amaciante de roupas (57,72%), sabão em pó (52,44%) e feijão carioca (50,17%). Para Lúcia Pacífico, presidente do Movimento das Donas de Casa e Consumidores de Minas Gerais (MDC-MG), planejamento e organização são importantes na hora de avaliar se vale a pena se deslocar para comprar um produto. “Às vezes o que se vai gastar com o transporte não compensa a economia de comprar o produto mais barato”, observa. Contudo há medidas simples que auxiliam na hora de economizar, como: ficar atento às promoções, à qualidade e à validade dos produtos; não levar crianças na hora de fazer as compras e outros detalhes técnicos como não comprar apenas o que está à altura dos olhos, ajudam a economizar. Lúcia explica: “Normalmente, os produtos mais caros ficam posicionados de maneira mais visível.

Por isso, sempre verifique as prateleiras mais baixas.” De acordo com ela, a lista de compras é uma grande aliada no processo de consumo consciente. “A lista é essencial para que o consumidor não compre por impulso o que não precisa”, afirma. Em 33 anos de atuação, a ferramenta principal da MDC-MG tem sido a pesquisa de preço, como conta Lúcia: “Esta é a principal ferramenta que o consumidor pode usar na hora de fazer as compras”. É importante driblar as estratégias do mercado e, para isto, o consumidor deve se ater aos mínimos detalhes. Entre eles, não ser fiel às marcas pois isto é um hábito essencial para uma boa economia. O MARCO tentou contato com a assessoria de comunicação do supermercado Epa, mas não obteve sucesso até o seu fechamenVeja planilha completa da pesquisa de preços através do QR Colde:


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jornalmarcoedição327março2017

ESPORTE

Morros de Minas atraem praticantes de Downhill

Leonardo Sander

A Região Metropolitana de BH vai sediar competiçõews do Circuito Mundial dessa modalidade de skate Esther Armani Leonardo Sander 1º e 4º Períodos

Minas Gerais é um estado marcado por seu relevo, uma infinidade de morros e serras, que o tornam atrativo para quem curte alta velocidade e pratica esportes radicais como o Skate Downhill. Em Belo Horizonte, cada vez mais os skatistas tomam conta dos bairros Belvedere, Bandeirantes, Mangabeiras e Vale do Sereno. O Downhill é uma vertente do skate que começou com o objetivo de descer morros sobre skate mas, depois, a brincadeira tornou-se coisa séria. Como em uma corrida, os atletas descem ladeiras, de diferentes tamanhos e traçados, atingindo velocidades altíssimas.

Desde 2013, a Região Metropolitana de BH vem sendo usada pelo Circuito Mundial organizado pela Federação Internacional de Downhill (IDF). Durante quatro anos, o Autódromo do Mega Space, em Santa Luzia, foi escolhido para o evento mas, este ano, será realizado pela primeira vez em Nova Lima. A etapa inédita já está gerando enorme expectativa na comunidade mineira de Downhill. Ela será realizada na estrada localizada ao lado do presídio APAC, que dá acesso à Rodovia MG 030 (no trecho NL – Rio Acima). Trata-se de um dos principais locais de prática de Downhill em Minas. A ladeira ganhou esse status devido à segurança, pois a pista é duplicada e há pouquíssimo trafego de veículos.

MINEIROS Em 2016, na final do mundial, os mineiros foram destaque: Thiago Lessa e Max Ballesteros, de BH, terminaram na segunda e terceira colocações. Outro atleta da capital mineira, Mateus Cavinato, atingiu a impressionante marca de 135 Km/h sobre o skate, em evento realizado no Canadá no ano passado. O skate, segundo o instituto de pesquisas Datafolha, é hoje o segundo esporte mais praticado no Brasil, com 8,45 milhões de adeptos, ficando atrás apenas do futebol. Esse crescimento refletiu-se no aumento de pessoas praticando o Downhill. Ramon Santana Hostalácio, 22 anos, começou a andar de skate aos 18 anos, após assistir a um campe-

Esporte enfrenta preconceitos Ainda falta aceitação do skate como esporte. Os praticantes sofrem preconceito e geralmente são estereotipados como vagabundos. Isso ocorre devido às origens do skate, que sempre foi considerado um esporte rebelde. O Downhill ainda é pouco conhecido pela população e esse desconhecimento resulta em desrespeito aos praticantes e na desvalorização de sua prática, o que culmina na falta de investimentos. Rodrigo Melo Rocha, presidente da Federação Mineira de Skate Downhill, sente falta da presença de atletas com idade de 14 a 16 anos. “Na maioria das vezes, os pais não incentivam seus filhos para a prática do esporte. Isso pesa muito. Pensa em um moleque de 14 anos tendo o apoio dos pais para a prática de um esporte de risco. São pouquíssimos.”

Segundo Rodrigo, para melhor formação é bom começar cedo. Outra dificuldade é o alto custo. É necessário dar manutenção constante no skate e tudo é muito caro. As rodinhas se desgastam facilmente e os equipamentos de segurança vão se destruindo na medida em que são utilizados. Ainda são poucas as empresas nacionais que produzem este material e as melhores peças são importadas. Há também a gasolina que se gasta no carro que conduz os atletas no começo da ladeira e os leva até o topo. Esses fatores tornam a modalidade elitizada. Há enorme dificuldade em conseguir investimento e apoio de empresas, prefeituras e governo. O estudante Ramon acredita que isso se deve ao fato de o esporte ainda ser novo: “Em BH sofremos

onato no Vale do Sereno, em Nova Lima. “Aqui no Brasil, BH é referência no Downhill; somos privilegiados com muitos lugares ao redor da cidade para andar. O esporte vem crescendo e procuramos difundi-lo.” No final dos anos 1960, o alto da Avenida Afonso Pena foi o primeiro ponto de prática de skate na cidade. Naquela época, os skatistas construíam rampas no local e alguns desciam a avenida arriscando-se em alta velocidade. Hoje, as principais ladeiras em que se pratica o Downhill localizam-se na Serra da Moeda, Ouro Preto, Itabirito, Macacos e Nova Lima. RISCOS O skate, independentemente da modalidade, é um esporte radical. O risco

As ladeiras provocam adrenalina nos competidores de queda é um dos aspectos para a formação da sua identidade. Esse fato serve como um filtro para os praticantes do esporte. No Downhill, os skatistas utilizam as vias públicas, sendo esse o fator mais perigoso: descer em locais onde passam automóveis. Os amadores podem não chegar a velocidades absurdas, porém os 60 km/h facilmente atingidos já são suficientes para que um grave acidente ocorra. Por isso, é importe andar em segurança. É comum atletas descerem ladeiras juntos, contando com carros que os acompanham; é importante ter

com a falta de incentivo do governo para realização de campeonatos que gostaríamos de ter, como o Circuito Mineiro. As coisas estão muito nas mãos dos atletas e na parceria com as federações para tentar cada vez mais conseguir apoio e divulgação do esporte”. MULHERES No Brasil são poucas as mulheres que participam da categoria Downhill em relação ao Street (modalidade mais popular do skate). Luana Paiva tem 18 anos e anda de skate Downhill há três. Ela acredita que as mulheres têm certo receio de participar de um esporte considerado masculino e perigoso: “Andamos em vias públicas, onde passa carro e caminhão, então o esporte é de risco. Mas no exterior já é bem diferente, o cenário é bem mais forte, lá existe o apoio e incentivo do Estado”. Luana já participou de etapas do circuito mundial realizadas no Brasil, além

Débora de Souza

esta ajuda para fazer curvas de pouca visibilidade, para sinalizar em momentos que passam veículos. Sem contar o uso dos equipamentos de segurança: capacete, joelheira, cotoveleira e luvas. Os macacões também são utilizados por quem gosta de andar mais rápido ou participar de campeonatos. Nem todo lugar é viável para descer de skate. O asfalto ruim, os buracos nas ruas e o tráfego de veículos são os principais problemas. É comum andar à noite, pois alguns locais que, durante o dia, têm grande fluxo de carros ou pessoas, na madrugada tornam-se totalmente pacatos.

de outros campeonatos no interior do Estado. O grupo de mulheres que pratica a modalidade em Minas possui uma página no Facebook chamada “MG DownGirls” e através dela incentivam as outras meninas. “A ideia é introduzir aquelas que querem andar de Downhill dando força e apoio, recebê-las bem, porque é muito bom andar de skate com outras garotas.” Ramon, que às vezes treina com Luana, conta: “Tenho amigas que descem lado a lado com a gente. Estamos sempre aprendendo um com o outro, nos divertindo e elevando os limites. Assim como qualquer outro esporte, as meninas estão cada vez mais presentes, aumentando o número de praticantes e é assim que tem que ser”. Luana diz que a relação é muito boa entre meninos e meninas: “Nunca sofri um preconceito explícito, mas é comum ouvir coisas do tipo: ‘a Luana anda mais rápido do que eu, aí não pode’”. Ela diz que isso não a abala e serve de incentivo para ir mais rápido.

Nova praga de insetos leva PBH a cortar árvores Débora de Souza 4º Período

Depois da mosca-branca em árvores do gênero Ficus em 2013, como na Avenida Barbacena (foto), no Barro Preto, Belo Horizonte enfrenta agora uma infestação de besouros gigantes metálicos, Euchroma gigantea. Os insetos depositam larvas que destroem o sistema de raízes das árvores, que por sua vez ficam sem sustentação e podem facilmente cair pela ação

do vento. O surto em si foi diagnosticado há quatro meses, mas o medo da queda iminente levou a Prefeitura a tomar medidas antes da passagem dos blocos de Carnaval na região Centro-Sul, como a poda ou o corte de 50 árvores em situação de risco, principalmente no caminho dos foliões. Outras 1800 árvores continuam sendo monitoradas pela Secretaria do Meio Ambiente e Defesa Civil.


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REINALDO

ENTREVISTA

Taynara Barbosa, 2º Período

De Rei na bola à política, uma vida de dificuldades e de vitórias impensáveis

Como é que você vê o atual momento político do Brasil? A gente fica muito triste com o comportamento e a cultura que se formou no país de todo mundo se dar bem, de se valer da “lei de Gerson”. Isso principalmente na esfera política. Eu acho que a sociedade tá melhorando, mas ainda tem que evoluir muito, vai-se precisar das novas gerações pra mudar esse comportamento; pra se ver que o social é mais importante que a individualidade.

Reinaldo, um dos maiores ídolos da história do Clube Atlético Mineiro, para a torcida fanatica é ,até hoje, simplesmente o seu “ Rei”. Dois livros biográficos lançados ao final do ano passado homena- Entre os atacantes, centroavantes da geiam o cidadão José Reinaldo de Lima. Um deles, “Punho cerrado – a história do Rei”, foi escrito por atualidade, quem se destaca ou se aproseu proprio filho, Philipe Van R. de Lima; o outro, infantil, é “O Menino Rei”, uma parceria do jornalista xima do seu estilo? É difícil, na minha posição avaliar. Eduardo de Ávila com Felipe Assunção Soares, autor das ilustrações. Em um aprazível café nos quarteiO que eu achei mais próximo foi o rões fechado. Também não se negou a contar detalhes de sua vida como militante e político de esquerRomário. Mas o Romário já parou da, contra a ditadura militar, bem como dos anos de escuridão por que passou no mundo das drogas. há muito tempo, também. Hoje ca era diferente de hoje. ConvocaComo foi essa iniciativa de, vam 40 jogadores, três meses antes aos 60 anos, lançar dois livros? da Copa. Nesse período, eu estava O meu filho, Phlipe, atleticano nato contundido, mas na época da Copa já e hereditário, sempre gostou muiestava bem, mas não tinha sido relato de literatura, tem boa erudição e cionado entre os 40. Talvez tivessem formação. Ele sempre escutou muitas receio de me levar e eu não suportar. histórias sobre mim na rua, no campo, em todo lugar que frequentava e se identificava como meu filho. Um Quando você sentiu que sua carreira dia ele propôs: “vamos fazer um li- estava começando a se abreviar? vro? Quero escrever um livro sobre Comecei a perder força na perna, sua carreira”. Eu aceitei fazer um sentia dores e não tinha mais aquelivro de filho atleticano pra pai. Fila explosão, por causa das contusões. zemos essa biografia contando alguO joelho é uma articulação muito mas fases da minha vida. Eu gostei difícil. Era um joelho muito agrediporque com filho pude me abrir mais do, sofreu muitas agressões tanto de um pouco, ficar mais à vontade pra beques (zagueiros) como de médicos, conversar. E ele tem um bom texto pelo tratamento que era feito, com também, por isso achei legal a ideia. infiltrações. Tudo isso deixou sequeEle coleciona, guarda tudo que sai a las. Sequelas quase que irreversíveis. meu respeito, foi uma pesquisa longa. A medicina ainda não tinha recursos O livro, na verdade, para combater, fisiotedemorou quase três rapia nessa época era anos, tempo em que muito acanhada ainele fez pesquisa nos da. Aí pensei: “chega, jornais e com amiO presidente Geisel já tá bom pra mim, já gos. Eu acho imporme falou que eu tinha não dá mais pra jogar.” tante no sentido de era de jogar bola, que deixasse a política preservar a memória Durante a ditadura, do futebol, do clube você comemorava e mesmo da cidade. os gols com o punho E pra resgatar tamcerrado, lembrando o bém aquelas emoções na época em que eu jogava. O tor- gesto dos Panteras Negras. Era provocedor ainda vibra muito com isso. cação deliberada? Havia manifestações, movimentos, em todas as áreas, reivindicando o reVocê fez 255 gols pelo Atlético, maior torno da democracia. Era uma época artilheiro da história do clube e do de muita repressão, povo oprimido, Mineirão, mas encerrou a carreira cedo triste, sem liberdade de expressão, enpor causa de uma lesão no joelho. Os fim, ditadura. Uma ditadura em que torcedores jovens te reconhecem como seu vizinho era “dedo duro”. O Brasil parte da história do Galo? precisava respirar; então, começaram Ando nas ruas e sou reconhecido os movimentos para resgatar a demopor muitas pessoas. Em todo lugar cracia. Eu, como jogador de futebol, do Brasil que eu vou, quando falam quis justamente deixar uma posição meu nome, sempre me reconhecem. da categoria, dizer: “somos iguais O interessante disso não é só o recoa qualquer outro trabalhador, nós nhecimento do atleta, mas sobretutambém temos um interesse social do o carinho do povo torcedor que é nas coisas.” E aí, como eu tinha trimuito espontâneo e chega perto do buna, por ser uma figura conhecida, seu ídolo com muita emoção. São fui falando os pontos fundamentais momentos maravilhosos porque vêde luta: a extinção do AI-5, anistia, se ali a emoção, a alegria do torcedor. democratização, liberdade de imprensa, enfim, a democracia. Eu fiz E a Copa de 82, na Espanha, você não foi um pronunciamento forte no jornal, “Movimento” que chamavam de imconvocado porque se contundiu antes? prensa marrom. E meu gesto era de Era outra fórmula. A convocação para a Copa do Mundo naquela époum socialista revolucionário, afinal,

vínhamos sofrendo muito retaliação, e era oportuno o punho cerrado dos ‘black powers’, que estavam muito em voga, para driblar a repressão.

Você chegou a ser convocado por alguma autoridade militar para depor? Primeiro pelo ministro Ney Braga, da Educação. Os dirigentes da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) também eram militares e um deles, André Richer, aconselhava-me a não fazer esse gesto. No final, quando fomos pra Copa do Mundo, o presidente Geisel também me falou que eu tinha era de jogar bola, que deixasse que eles cuidavam da política. Mas o embate maior, mesmo, foi o da imprensa. A imprensa foi me descaracterizando, bombardeando, desconstruindo-me como ídolo, como aquele jogador notável, de antes.

cada um tem uma característica, um estilo, cada um produz de um jeito. Mas ainda há muitos jogadores de alto nível. Tem aí o Neymar, um grande jogador, Cristiano Ronaldo, o (Lucas) Pratto mesmo, um jogador muito interessante.

O livro com a sua biografia fala também do período em que enfrentou as drogas. Essa batalha resultou de sua aposentadoria precoce no futebol? Não, não. A droga é uma coisa quase social. Nesse período então foi uma coisa que... “tava nevando cocaína e crack aqui”. É uma droga perigosa, uma droga sedutora, facilmente ela faz de você um prisioneiro, um refém dela, do vicio. E quando você entra no vício, você desliza nas delicias dele. E assim como milhares e milhares de pessoas, fui refém disso durante muito tempo. Foi um período difícil, de muita louDe onde veio a vontade cura, de muita dor. É uma de fazer carreira política? escuridão, uma maldição, Eu gosto de polítiNão se deve um negócio de louco. Mas, brincar com ca, sou uma pessoa graças a Deus, eu sobrevidrogas, você política, gosto de vi e resgatei os verdadeipode pagar caro participar embora ros valores. Não se deve com sua vida esteja, agora, fora da brincar com drogas, você política. Ao ver esse pode pagar caro com sua espaço, quis particivida ou até perder muitos par diretamente ali anos de vida. Então, não entre nespra ter uma presença efetiva no parse delírio; ele é muito perigoso. lamento; por isso eu fui candidato. Júlia Guedes


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