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EPÍLOGO | EPILOGUE
EPÍLOGO
Em 1996, a enfermeira Tercina, já aposentada, com 87 anos, sessenta dos quais vividos na Vila, era a moradora mais antiga do conjunto. Alugava uma das casas com frente para a rua Martiniano de Carvalho, de onde um inquilino havia sido despejado. O gráfico Antonio de Salles Barbosa, de 68 anos, dos quais 32 como morador da Vila, vivia ali com a mulher e dois filhos no andar de cima de um sobrado com dois quartos, duas salas e cozinha. No último andar do palacete morava o cozinheiro Josias, de 40 anos, há dezessete na Vila. E no segundo pavimento do palacete, Maria continuava alugando seus cômodos para três familias. Também no palacete, após a morte de Corália, Mercedes, sua acompanhante, permaneceu na casa.116
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Mas, a essa altura, a rotina da Vila já estava completamente alterada. Com dois processos de tombamento sem definição e uma tentativa de permuta do terreno da Vila com outros terrenos da Emurb inviabilizada117, a provedora da Fundação Leonor de Barros, Maria Cândida Sampaio, em 1994, assume a administração da Vila. Com os aluguéis defasados, a Fundação deseja desocupar as casas alugadas e inicia uma sequência de ações envolvendo desde o aumento dos aluguéis até o despejo, seguido da demolição das casas vazias. O antigo Clube Éden é fechado e suas dependências, alugadas para a Lavanderia Ideal, que passa a usar a piscina como tanque para suas atividades. Em 1996, a Fundação decide parar de receber os aluguéis dos moradores. Apenas nesse momento algumas casas vazias são ocupadas por novos habitantes e se configuram, segundo depoimentos de ex-moradores, como cortiços.
EPILOGUE
By 1996, the nurse Tercina, then retired, at 87 years old, sixty of which she had spent in the Vila, was its longest dweller. She rented one of the houses facing Martiniano de Carvalho Street, from which another tenant had been evicted. The 68year old graphic worker Antonio de Salles Barbosa, who had been living in the Vila for 32 years, remained there with his wife and two children at the top floor of a house, with two bedrooms, two living rooms and a kitchen. The mansion’s top floor was occupied by the 40-year old cook Josias, who had been in the Vila for seventeen years. And, in the mansion’s second floor, Maria was still subletting her rooms for three families. Also in the mansion, after the death of Corália, Mercedes, her lady’s companion, stayed in the house116 .
By then, however, the Vila’s routine had been completely altered. With two inconclusive heritage listing processes and one frustrated attempt at exchanging the Vila’s plot for other Emurb plots117, the supervisor of the Leonor de Barros Foundation, Maria Cândida Sampaio, in 1994, takes over the Vila’s administration. With outdated rental prices, the Foundation wishes to vacate the rented houses, and begins a series of actions, from raising rental prices to eviction, followed by the demolition of empty houses. The former Clube Éden is closed, and its quarters are rented out for the Ideal Laundry, who starts to use the swimming pool as a tank for its activities. In 1996, the Foundation decides to stop collecting rent from the inhabitants. That was when some of the empty houses were occupied by new inhabitants and became, according to former dwellers, like tenements. 129
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Desde 1994 os moradores da Vila começam a se organizar e, ao longo de mais de dez anos, recorrem a múltiplas estratégias: pagam seus aluguéis em juízo; guardam os valores devidos em poupança; ocupam as casas que vão sendo esvaziadas; criam a Associação de Amigos e Moradores da Vila Itororó – Ama-Vila, respaldados pelo Estatuto da Cidade aprovado em 2001 e, por fim, auxiliados pelo Serviço de Assessoria Jurídica Universitária da Faculdade de Direito da USP – Saju, entram com ação de usucapião, tentando provar a legitimidade da posse dos imóveis abandonados pela instituição proprietária.
Com o decreto de utilidade pública em 2006 e a consequente desapropriação do conjunto, os moradores são lançados na lógica da atuação do poder público no atendimento à demanda habitacional de baixa renda. Recorrem à justiça para suspender a decisão que dá a posse do conjunto da Vila ao governo do estado e buscam uma parceria com o poder público para um eventual projeto de recuperação.
Mas a desocupação da Vila se torna irreversível e, no processo de negociação, os moradores garantem sua permanência na área central para continuar morando nas cercanias. Entre 2011 e 2013, num processo pleno de conflitos, com notificações e ações de despejo antes da conclusão pelo CDHU das moradias destinadas aos ex-moradores, a Vila não foi poupada da truculência policial recorrente nas reintegrações de posse. As 71 famílias, afinal, foram alocadas em três conjuntos, dois localizados nas imediações da Vila e um terceiro no Bom Retiro. Com a solução do aluguel dos aparta-
In 1994, the Vila’s inhabitants start to organize, and for over ten years they resort to multiple strategies: paying their rent through judicial deposits; storing the amount owed in a savings account; occupying the houses that became vacant; creating the Association of Friends and Dwellers of Vila Itororó - Ama-Vila, backed by the City Statute approved in 2001, and finally, with the assistance of the University Legal Advisory Service of USP’s Law School - Saju, they file for usucaption, trying to prove the legitimacy of their possession of the real estate abandoned by the institution that owned them.
With the public utility decree of 2006, and the consequent expropriation of the ensemble, the inhabitants are thrown into the logics of public power in fulfilling lowincome housing demands. They resort to Justice to suspend the decision that passed the Vila ensemble to the State Government, and seek to establish a partnership with the public power for a possible recovery project.
But the evacuation of the Vila is now irreversible, and in the process of negotiation, the inhabitants manage to ensure their permanence in the central area, with new housing arrangements in the vicinity. Between 2011 and 2013, in a process fraught with conflicts, with eviction notes and actions before CDHU had finished building the houses destined for the former dwellers, the Vila was not spared the police violence that is recurrent in ownership repossessions. The 71 families were finally relocated in three ensembles, two in the vicinity of the Vila and one in Bom Retiro. With
mentos do CDHU, suas memórias das experiências vividas na Vila Itororó serão reelaboradas permanentemente, sempre a partir do presente. Como disse uma vez Maurice Halbwachs, “o passado não se conserva e não ressurge idêntico... Apenas a imagem do espaço, graças à sua estabilidade, é que nos dá a ilusão de não mudar através do tempo e de reencontrar o passado no presente: é assim que se pode definir a memória”118 . the solution of rental apartments by CDHU, the memories of their experiences in Vila Itororó will be permanently redrawn, always from the present. As Maurice Halbwachs once said, “the past is not conserved and it never reappears identical... Only the image of space, thanks to its stability, gives us the illusion of not changing through time and of reencountering the past in the present: this is how one might define memory”118 .
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