INSTITUTO FEDERAL FARROUPILHA DISCIPLINA: QUÍMICA PROF. Dr. VINÍCIUS FELTRIN GIGLIO
Drogas: um contexto Químico e Social
"Para vencer o medo que temos, necessitamos dos conhecimentos que ainda não temos. Para conhecer mais, formulamos hipóteses que reforçam nosso medo e nossa curiosidade; insistindo no processo, vamos criando novos medos e preconceitos ou chegamos ao prazer do conhecimento." (Theodoro I. Pluciennik - "Medo e preconceito")
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Índice 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 3 2 CÉREBRO: ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO ....................................................................... 3 3 AS DROGAS ................................................................................................................................ 8 3.3 DEPRESSORES DO SNC ............................................................................................ 8 3.4 ESTIMULANTES DO SNC ......................................................................................... 23 3.5 PERTURBADORES DO SNC .................................................................................... 35 4 VISÃO GERAL DAS DROGAS ................................................................................................. 50 5 CONTEXTO SOCIAL ................................................................................................................. 51 6 CONCLUSÕES GERAIS ............................................................................................................ 71 7 BIBLIOGRAFIA .......................................................................................................................... 73
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1 Introdução Antes de falarmos sobre as diferentes drogas temos que entender como as drogas agem no nosso organismo e principalmente no nosso cérebro. Para entendermos os mecanismos de ação das drogas no cérebro temos também que entender como ele funciona.
2 Cérebro: Estrutura e Funcionamento O nosso cérebro é um órgão que se difere muito dos outros órgãos do nosso corpo, é ele que comanda todas as funções do nosso corpo. Cada erguida de braço, cada gesto nosso, cada palavra que falamos são produzidas pelo nosso cérebro. O cérebro é dividido em várias partes diferentes que comandam diferentes ações. Todo o cérebro é formado por milhões de células nervosas chamado neurônio (figura ao lado). As células nervosas interagem com outras células nervosas, ou com os músculos, através de junções ou lacunas, denominadas sinapses. Os impulsos nervosos são transmitidos através das sinapses por compostos químicos chamados neurotransmissores. São vários os neurotransmissores existentes no nosso cérebro e, cada um deles tem uma função. Veja o esquema de um neurônio abaixo: Arranjos sinápticos nos neurônios do SNC: A. Uma sinapse axo-dendrítica. B. Uma sinapse axo-somática. C. Uma sinapse axo-axônica.
As transmissões neuroniais possuem um mecanismo de ação que pode ser facilmente entendido, já que, ocorrem em etapas. Em uma pessoa normal os impulsos nervosos são convertidos em neurotransmissores, e liberado nos espaços sinápticos. Uma vez passada a informação ao outro neurônio a substância é recuperada ou destruída. A informação que chegou ao outro neurônio é transformado em impulso elétrico e o processo ocorre novamente como no primeiro. Observe o processo na: 1. Bainha de mielina 2. Botão terminal do axônio 3. Membrana do axônio (mostrando inversão de polaridade 4. Espaço intra-sináptico 5. Vesículas com o mediador químico 6. Mediador químico livre no espaço intrasináptico 7. Receptores moleculares pós-sinápticos (já combinados com o mediador químico) 8. Membrana pós-sináptica
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Então, se formos definir, um neurotransmissor é um componente químico secretado por um neurônio e que pode tanto inibir como estimular o fluxo de um impulso entre as células nervosas. Pouco depois de um neurotransmissor completar sua atuação, ele é quebrado por uma enzima. A acetilcolina e a noradrenalina (norepinefrina) são exemplos de neurotransmissores estimulantes. A noradrenalina age como as anfetaminas, estimulando a transmissão de impulsos nervosos. O ácido gama aminobutírico (gamma aminobutyric) é um exemplo de inibidor. Se compara ao álcool, inibindo a transmissão de impulsos. Outros dois neurotransmissores, serotonina e dopamina, são estimulantes em algumas partes do cérebro e inibidoras em outras. A acetilcolina também estimula a contração muscular cada vez que um neurônio se conecta com um músculo. Vejamos mais detalhadamente alguns neurotransmissores:
2.1 Acetilcolina A acetilcolina estimula o impulso a ser transmitido. Está envolvida na transmissão de impulsos de células nervosas, de músculos cardíacos à algumas glândulas, e de células motoras para os músculos do esqueleto. É o neurotransmissor encontrado em maior quantidade no corpo. Estômago, baço, bexiga, fígado, glândulas sudoríparas, vasos sangüíneos e coração são apenas alguns órgãos que o neurotransmissor controla. A acetilcolina ajuda no controle do tônus muscular, no aprendizado, e nas emoções. Também controla a liberação do hormônio da pituitária, a qual está envolvida no aprendizado e na regulação da produção de urina. A síntese de acetilcolina pelo organismo é vital, pelo seu papel relativo aos movimentos e à memória (baixos níveis de acetilcolina contribuem para falta de concentração e esquecimento). Também é relacionada à performance sexual, controlando a pressão sanguínea e batimento cardíaco durante a relação sexual. A acetilcolina tem um grupo amônio quaternário na sua estrutura. Sendo pequena, e iônica, a acetilcolina é muito solúvel em água e se difunde com facilidade, duas qualidades apropriadas ao papel de neurotransmissor. As moléculas de acetilcolina são liberadas, pelas membranas présinápticas dos neurônios, em grupos de 10.000 moléculas. O grupo de moléculas difunde-se, então, através da sinapse. A reação que descreve o processo é a seguinte:
O
H3C
C
O
H2 C
+ CH3 N CH3 C CH3 H2
ACETILCOLINA
O
acetilcolinesterase
+
H2O
H3C C
OH
+
HO
H2 C
+ CH3 N CH3 C CH3 H2
COLINA
Depois de transportarem o impulso nervoso através da sinapse até o músculo, onde provocam resposta elétrica, as moléculas da acetilcolina devem ser hidrolisadas (a colina), num intervalo de tempo de poucos milisegundos, a fim de deixar o campo livre para a chegada de novo impulso. Esta hidrólise é catalisada por uma enzima, cuja ação é quase perfeita, denominada acetilcolinesterase. O receptor da acetilcolina, na membrana pós-sináptica dos músculos, é o sítio de ataque de algumas neurotoxinas mortais. Entre elas a tubucarina, componente do curare, das flechas
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ervadas de alguns índios da Amazônia. Observe que a
H3C
tubucarina tem grupo amônio quaternário (na realidade tem dois
grupos)
neste
e
parece-se,
particular,
com
+ CH3 N CH2 H
a
HO O H CH2
acetilcolina.
H3C O
O CH3
+ N
O
H3C
CH3
HO TUBUCARINA 2.2 Endorfina Atua como calmante natural aliviado a sensação de dor. Em um machucado, receptores na pele produzem sinais elétricos que vão da coluna espinhal ao cérebro. O cérebro então avalia a dor, que será negociada pelas endorfinas enviadas para ligação com receptores dos neurônios. A quantidade de endorfina liberada é relacionada à quantidade de dopamina. Em alguns casos, dependendo das concentrações de cada uma, a dor pode ser substituída pela sensação de prazer. A endorfina é responsável pelo sentimento de euforia, êxtase. A feniletalimina (substância química, ingrediente natural do chocolate) atua no sistema límbico assim como a endorfina. Daí a explicação para o fato do chocolate deixar as pessoas felizes.
2.3 Dopamina
Um inibidor dependendo do local onde atua. Tem
HO
CH2CH2NH2
papéis diferentes: a dopamina no gânglio basal (no interior do cérebro) é essencial para execução de movimentos suaves e controlados, sendo que a falta de dopamina no
HO
H DOPAMINA
cérebro é a causa da doença de Parkinson, a qual faz a pessoa
perder
a
habilidade
de
controlar
seus
movimentos. A dopamina se move até o lóbulo frontal regulando a enxurrada de informações que vem de outras partes do cérebro. Portanto, comprometer as quantias do neurotransmissor
pode
resultar
em
N
OH HO
CHCH2NH
pensamentos
incoerentes, como na esquizofrenia.
HO
Também é responsável pelo sentimento de
NORADRENALINA
euforia, assim como a endorfina. É capaz de acalmar a dor e aumentar o prazer se estiver em grande quantidade no lóbulo frontal.
OH HO
HO
CHCH2NHCH3
ADRENALINA 5
2.4 Noradrenalina Conhecida também como norepinefrina, definida por algumas bibliografias como o hormônio precursor da adrenalina (com efeito estimulante na lipolase, aumentando o nível de algumas gorduras no sangue) e por outras como o neurotransmissor que eleva a pressão sanguínea através da vasoconstrição periférica generalizada. A noradrenalina também é usada no sistema que nos faz ficar alertas, e ter uma boa memória. O desequilíbrio entre ela e outras substâncias pode causar diversas doenças.
2.5 Serotonina
A serotonina, também conhecida como 5-hydroxytryptamine (5HT), é o hormônio e neurotransmissor
HO
CH2CH2NH2
envolvido principalmente na excitação de órgãos e constrição de vasos sanguíneos. Nos mamíferos, a serotonina é produzida em células especializadas, as enterochromafinas. Também é encontrada nas paredes sanguíneas, e localizada no hipotálamo e parte central do cérebro.
N H SEROTONINA
Algumas funções da serotonina incluem o estímulo dos batimentos cardíacos, o início do sono, a luta contra a depressão (as drogas que tratam de depressão preocupam-se em elevar os níveis de serotonina no cérebro). Também regula a luz durante o nosso sono, visto que a serotonina é a precursora do hormônio melatonina (regulador do nosso relógio natural). A serotonina é sintetizada a partir do aminoácido L-triptofan (L-tryptophan). Neurônios especializados na recepção da serotonina estão localizados na maioria dos órgãos; esses órgãos são estimulados a realizarem suas funções quando moléculas de serotonina ocupam os receptores. O excesso na produção de serotonina, que ocorre durante a síndrome carcinóide (tumor nas células de chromafina), resulta no enrubescimento da pele, variações na pressão sanguínea, cólica e diarréia.
Todo o sistema visto acima (constituído de cérebro, medula espinhal, nervos, neurônios, neurotransmissores e muitos outros) são os constituintes do chamado sistema nervoso central (SNC), que é justamente o que controla todas as funções do nosso corpo.
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3 As Drogas 3.1 Pequeno Histórico
De origem controversa, a palavra droga pode ter origem do persa droa (odor aromático), do hebraico rakab (perfume) ou do holandês antigo droog (folha seca, porque antigamente quase todos os medicamentos eram feitos à base de vegetais). A ação das drogas sobre o organismo é estudada pela Farmacologia, ciência bastante antiga, que entre os primitivos se misturava com a magia. Conhecia-se a ação curativa ou anestésica de certos extratos vegetais e os alteradores da consciência tinham as vezes funções mágico-religiosas. Há mais de 4000 anos a.C. os Sumerianos (atual Irã), utilizavam a papoula de ópio como a "planta da alegria", que traduzia o contato com os Deuses. Há 500 anos a.C. o povo Cita (habitantes do Rio Danúbio / Rio Volga - Europa Oriental), queimavam a maconha (cânhamo) em pedras aquecidas e inalavam os vapores dentro de suas barracas ou tendas. Na Antiguidade, o álcool, ou mais comumente o vinho, era conhecido como a dádiva de todos os deuses, sendo Baco o deus do Vinho. Aproximadamente no ano de 1500, o Cactus Peyoteera utilizado em cerimônias religiosas (no descobrimento da América). O ópio foi por muito tempo cultivado livremente por camponeses, por volta do século XVI, como fonte de alívio de sua triste realidade sofredora. Na mesma época, os espanhóis utilizavam as drogas alucinógenas como uma forma de auto-castigo, pois para este povo, Droga significa "Demônios". Ainda no século XVI, junto com drogas realmente eficazes, como digitalina e beladona, os médicos receitavam pó de asa de morcego, ou pedras preciosas trituradas, que feriam a mucosa do intestino e devem ter matado muitos pacientes. Nos séculos XVIII e XIX, a Farmacologia tornou-se mais científica, comprovando o efeito de vária drogas tradicionais como a cânfora, quina ou coca, e descartando as ineficazes. A descoberta de medicamentos naturais prosseguiu com os antibióticos, extraídos de fungos, e os tranqüilizantes, extraídos de plantas. O ópio (morfina / anestésico) incentivado na guerra civil americana (1776) era utilizado para fornecer alívio à dolorosa vida dos soldados. A primeira droga sintética utilizada pela medicina foi o hidrato de cloral (figura ao lado), em 1869 . A partir daí os remédios, antes extraídos de ervas pelo boticário, começaram a ser fabricados por grandes indústrias.
Cl3C
OH
C H OH Hidrato de Cloral
Em 1890, iniciou-se a livre comercialização de vinho, elaborado com extratos de coca e xaropes, com as mesmas composições. Em 1914, deu-se a proibição da livre negociação, com isto iniciou-se o Mercado Negro - ilícito (EUA faturou cerca de 100 a 200 bilhões de dólares). Por volta de 1920, os EUA instauraram a "LEI SECA" - Proibição do comércio de álcool - lei esta que prorrogou-se por 13 anos. Durante a 2a Grande Guerra, receitas de anfetaminas (estimulantes) eram utilizadas para combater a fadiga.
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Barbitúricos e Hipnóticos tiveram seu auge em 1950 "VIVA MELHOR COM A QUÍMICA" (Lema utilizado pelos laboratórios). 1960 foi o auge do LSD (a era dos ácidos), muitos psiquiatras receitavam impiedosamente o consumo deste tipo de droga. Em 1970 proliferação da cocaína e seus derivados, entre eles o "crack", e mais recentemente aparecendo o ecstasy, mais popular entre as classes média e alta. A atuação desses medicamentos no organismo varia conforme o indivíduo e a dose aplicada. Uma substância capaz de livrar o homem de uma doença mortal pode tornar-se extremamente perigosa se o seu emprego for incorreto. Mas as drogas não são usadas apenas pelos homens, alguns animais usam e se viciam com certas drogas. Certas formigas figuram entre os poucos animais sociais conhecidos que “usam drogas”. Elas têm como hábito carregar piolhos de plantas, vivos, para as profundezas de seus ninhos, e ingerem parte dos sucos expelidos por suas presas, assim aparentemente encontrando na intoxicação resultante, alívio da pressão de um dia de trabalho. Mas tais formigas pagam um preço por essa intoxicação, pois a “droga” também reduz a sua percepção e sua agressividade. Tornam-se então incapacitadas para compor uma defesa adequada se sua colônia for atacada por outra “nação” de formigas. Na Bíblia Sagrada aparece em alguns versículos, alertas sobre o poder viciante das drogas, como em provérbios 23:32, O Rei Salomão alerta sobre os perigos do álcool: “Não olheis para o vinho, quando se mostra vermelho, quando resplandece no copo e se escoa suavemente. No seu fim morderá como a cobra e como basilisco picará”
3.2 As Principais Drogas
As drogas estão divididas em 3 grandes grupos:
Depressores do SNC
Estimulantes
Perturbadoras
3.3 Depressores do SNC
Os Depressores da Atividade do Sistema Nervoso Central (SNC), referem-se ao grupo de substâncias que diminuem a atividade do cérebro, ou seja, deprimem o seu funcionamento, fazendo com que a pessoa fique "desligada", "devagar", desinteressada pelas coisas. Este grupo de substâncias é também chamado de psicolépticos. As substâncias que compõem o grupo de Depressores do SNC são:
Álcool
Inalantes e Solventes
Ansiolíticos
Barbitúricos
Opiáceos
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3.3.1 Álcool Aspectos históricos, culturais e químicos A palavra álcool origina-se do árabe al-kuhul que significa líquido. As bebidas alcóolicas representam as drogas mais antigas das quais se têm conhecimento, por seu simples processo de produção. Obtidas pela fermentação de diversos vegetais, segundo procedimento no início primitivos e depois cada vez mais sofisticados, elas já estavam presentes nas grandes culturas do Oriente Médio e são utilizadas em quase todos os grupos culturais, geralmente relacionadas a momentos festivos. Os mais antigos documentos da civilização egípcia descrevem o uso do vinho e da cerveja. A medicina egípcia, respeitada em toda a região mediterrânea, usava essências alcóolicas para uma série de moléstias, enquanto meio embriagador contra dores e como abortivo. O vinho entre os egípcios era bebido em honra à deusa Isis. O consumo de cerveja pelos jovens era comum; muitos contos, lendas e canções de amor relatam os seus poderes afrodisíacos. O seu uso social e festivo era bem tolerado, embora, já no Egito, moralistas populares se levantassem contra o seu abuso "por desviar os jovens dos estudos". A embriaguez, no entanto, era tolerada apenas quando decorrente de celebrações religiosas, onde era considerada normal ou mesmo estimulada. Na Babilônia 500 a.C., a cerveja era oferta aos deuses. Nas culturas da Mesopotâmia, as bebidas alcóolicas existiram, com certeza, no final do segundo milênio a.C.; aos poucos, a cerveja à base de cereais foi substituída por fermentados à base de tâmaras. A fermentação da uva também é regularmente mencionada. O uso medicinal de produtos alcóolicos é comum. O consumo de álcool nas civilizações gregas e romanas é bem conhecido. Ele era utilizado tanto pelo seu valor alimentício, quanto para festividades sociais. Ressaltamos apenas a associação entre o uso do vinho e certas práticas e concepções religiosas representadas pela popular figura do Bacchus (Baco – deus do vinho). Durante longos períodos, o consumo de vinho era proibido para as mulheres, proibição do qual testemunham também os relatos bíblicos. Lembramos ainda que o vinho é parte integrante de cerimônias católicas e protestantes, bem como no judaísmo, no candomblé e em outras práticas espiritas. O consumo de bebidas alcóolicas é amplamente difundido no Brasil, onde se consome mais álcool per capita do que leite. Nos anos 20, nos Estados Unidos, houve uma proposta de coibição legal do uso de bebidas alcóolicas chamada “Lei Seca”. Porém, durou pouquíssimo tempo. O seu fracasso deu-se devido à pressões econômicas que fácil e vitoriosamente se interpuseram, além de que o próprio consumidor encontrou uma forma sutil e prática para alimentar suas necessidades. O principal agente do álcool é o etanol (álcool etílico). As bebidas alcóolicas são elaboradas a partir da fermentação de produtos naturais: vinho (fermentação da uva); cerveja (fermentação de grãos de cereais); outros (fermentação do mel, cana de açúcar, beterraba, mandioca, milho, pimenta, arroz etc.). Bebidas alcóolicas destiladas - como cachaça, rum, uísque ou gim - são obtidas através da destilação de bebidas fermentadas. 9
Para muitos brasileiros, festa é sinônimo de cerveja. Diversão, sinônimo de porre. Em alguns lugares criam-se festas de adoração à bebida alcóolica, tal como a Oktoberfest em Blumenau. No supermercado, qualquer criança pode sair com litros de uma substância tóxica e entorpecente: etanol, a droga legal. O etanol (álcool etílico), CH3CH2OH, é um líquido incolor, inflamável, com um odor característico. É um álcool - um grupo de compostos químicos cujas moléculas contém um grupo hidroxila (-OH), ligado a um carbono. Outra definição para a palavra álcool vem do arábico al-kuhul, que refere-se a um
CH3 CH2 OH ETANOL
fino pó de antimônio, produzido pela destilação do antimônio, e usado como maquiagem para os olhos. Os alquimistas medievais ampliaram o uso do termo para referir-se a todos os produtos da destilação e isto levou ao atual significado da palavra. O ponto de fusão do etanol sólido é de –114.1°C, e de ebulição e de 78.5°C. É menos denso que a água (0,789 g/mL a 20°C). É utilizado como fluído em termômetros, principalmente para temperaturas baixas, uma vez que o mercúrio congela a –40°C. Existem basicamente 3 processos utilizados para a fabricação do etanol: a fermentação de carboidratos (açucares), a hidratação do etileno, e a redução do acetaldeído (normalmente preparado pela hidratação do acetileno). Antes de 1930, o etanol era preparado somente por fermentação, mas, hoje, estima-se que cerca de 80% do etanol produzido nos EUA seja através da hidratação do etileno. O etanol é produzido desde a antiguidade pela fermentação de açúcares. Todas as bebidas alcóolicas e mais da metade do etanol industrial ainda é feito por este processo. Uma enzima, a zimase, é responsável pela conversão dos açúcares ( C6H22O6 ) em álcool e gás carbônico (CO2):
C6H22O6
zimase
2 CH3CH2OH
+
2 CO2
Na produção de bebidas, tal como whiskey e vodka, as impurezas é que dão o sabor diferencial. Substratos de batatas, milho, trigo e outras plantas podem ser usados na produção do etanol por fermentação. Uma enzima, a diastase (ou maltase), converte o amido em açúcares e, então, a zimase converte-os em álcool. O etanol produzido por fermentação chega no máximo a 14% na solução: acima desta concentração, o etanol destrói a enzima zimase e a fermentação pára. O etanol pode ser concentrado por destilação, mas ocorre a formação de um azeótopo (mistura de ponto de ebulição constante) a 96% de etanol em água. Portanto, o etanol puro não pode ser obtido por destilação. A indústria utiliza agentes desitratantes (eliminam água do meio) ou prepara o etanol sinteticamente, a partir de acetaldeído, que é feito através do acetileno como visto anteriormente. O etanol é utilizado, nas indústrias, como reagente de partida para vários compostos químicos, tais como o ácido acético, butadieno, acetaldeído. Também é utilizado como combustível, puro ou misturado com gasolina. Como é miscível com qualquer proporção de água, e com a maioria dos solventes orgânicos, é muito utilizado como solvente para muitas substâncias na fabricação de perfumes, tintas, vernizes e explosivos. Quando uma bebida alcóolica é ingerida, o etanol é absorvido no intestino delgado e distribuído pelo corpo, sendo que mais etanol é encontrado no sangue e no cérebro do que nos músculos e tecidos adiposos. O etanol é uma substância tóxica, e o organismo inicia o processo de excreção desta substância tão logo ela é consumida. Cerca de 90% é processado no fígado - a enzima álcool desidrogenase converte etanol em acetaldeído (IUPAC: etanal), que também é uma 10
substância tóxica (responsável pela enxaqueca). O acetaldeído é convertido a acetato, pela enzima aldeído desidroxigenase.
O CH3 CH2 OH
álcool desidrogenase
CH3 C
O aldeído desidroxigenase
O CH2 CH3 acetato de etila
H acetaldeído "etanal"
Etanol
CH3 C
Todas as bebidas alcoólicas contém um certo teor de etanol (álcool etílico), podendo ser classificado em dois grupos: bebidas destiladas e não-destiladas.
Bebidas não-destiladas Teor alcoólico (em ºGL) Cerveja
3a5
Vinho Champagne Sidra
até 12 11 4a8
Bebidas Destiladas Teor alcoólico (em GL) Pinga (aguardente de cana) 38 a 54 Uísque
43 a 55
Vodca Conhaque (brandy) Rum
40 a 50 40 a 45 45
Matéria-prima cevada, lúpulo, arroz, cereais maltados (germinados), água e fermento. uvas Uvas (fermentação na garrafa) Maçã (semelhante ao champagne) Matéria-prima cana-de-açúcar cereais envelhecidos(tipo escocês) e milho(tipo bourbon) batata, cereias(trigo) destilado do vinho(uva) melaço de cana
O que é "Teor em GL":
Através do processo de destilação fracionada do mosto fermentado do melaço da cana, obtém-se uma solução contendo até 96% de etanol e 4% de água em volume, sendo essa solução denominada 96° GL (Gay-lussac).Isto quer dizer, por exemplo, se tivermos uma cachaça com 40° GL, teremos então 40% de álcool e 60% de água. Veja na tabela abaixo: uma garrafa de cachaça equivale a dez garrafas de cerveja. Cachaça 40° GL (40% de álcool e 60% de água)
Cerveja 4° GL (4% de álcool e 96% de água)
Teste do Bafômetro A legislação proíbe que pessoas que apresentam nível alcoólico sanguíneo maior que 0,1% dirijam veículos automotivos. À medida do teor alcoólico pode ser medido pelo aparelho chamado "Bafômetro". Parte do álcool não-absorvido pelo organismo é eliminada através da respiração. Quando um motorista está sob suspeita de dirigir embriagado, ele é solicitado a realizar o teste do bafômetro, que consiste em recolher o ar expirado pelo motorista em uma mistura de dicromato de potássio em meio ácido, cuja cor é alaranjada. O álcool sofre oxidação ao entrar em contato com
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essa mistura, e o produto da reação apresenta cor verde. Quanto maior for o teor de álcool eliminado pela respiração, mais intensa será a cor verde.
K2Cr2O7
(aq)
+
4 H2SO4 + 3 CH3 CH2 OH(g)
dicromato de potássio ácido sulfúrico "alaranjado"
.....
Cr2(SO4)3
.....
Etanol
+ 7 H2O(L) + 3 CH3CHO(g) + K2SO4
(aq)
Sulfato de cromo III "verde"
Etanal "incolor"
Sulfato de potássio
Os primeiros aparelhos usavam esta reação e um sistema dentro do aparelho media a intensidade da cor verde do sulfato de cromo III, ou seja, quanto mais a pessoa beber, maior vai ser a intensidade da cor verde. A lista a seguir informa os diferentes comportamentos de acordo com as concentrações de álcool no sangue:
Concentração Comportamento 0,05% Falsa sensação de bem estar, euforia e visão reduzida 0,10% Deficiência da coordenação e confusão mental 0,15% Grande dificuldade na coordenação e na resposta a fatos externos 0,20% Depressão física e mental 0,30% Fala indistinta 0,35% Coma alcoólico acima de 0,45% Morte Efeitos físicos e psíquicos Provoca um efeito desinibidor. Em caso de uso mais intenso, pode favorecer atitudes impulsivas e, no extremo, levar à perda da consciência chegando-se ao coma alcóolico. Com o aumento do seu uso, diminui a potência sexual. O uso crônico de doses elevadas leva ao desenvolvimento de dependência física e tolerância. Em caso de supressão abrupta do consumo, pode-se desencadear a síndrome da abstinência caracterizada por confusão mental, visões assustadoras, ansiedade, tremores, desregulação da temperatura corporal e convulsões. Dependendo da gravidade dos sintomas, pode levar à morte. "Delirium tremens": quadro de abstinência completamente instalado (estado de consciência turvo e vivência de alucinações, principalmente táteis). Nomes populares: birita, mel, mé, pinga, goró, cana, loirinha.
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3.3.2 Inalantes/solventes Inalante: toda a substância que pode ser inalada, isto é, introduzida no organismo através da aspiração pela boca ou nariz.
Solvente: substância capaz de dissolver coisas. Via de regra, todo o solvente é uma substância altamente volátil, isto é, evapora-se muito facilmente podendo, por isso, ser inalado. Devido a essa característica, são, portanto, chamados de inalantes. Muitos dos solventes ou inalantes são inflamáveis, isto é, pegam fogo facilmente.
Aspectos históricos e culturais
Os solventes começam a ser utilizados como droga de abuso por volta de 1960 nos EUA. No Brasil, o uso de solventes aparece no período de 1965-1970. Hoje, o consumo de solventes se dá muito em países do chamado Terceiro Mundo, enquanto que em países desenvolvidos a freqüência de uso é muito baixa. Os solventes são drogas muito utilizadas por meninos em situação de rua como forma de, por exemplo, sanar a fome; e por estudantes de 1º e 2º graus dado seu fácil acesso e baixo custo. Eles podem ser aspirados voluntariamente (caso dos meninos de rua que cheiram cola de sapateiro) ou involuntariamente (trabalhadores de indústrias de sapatos ou de oficinas de trabalho, expostos ao ar contaminado por essas substâncias). O clorofórmio e o éter chegaram a servir como drogas de abuso em outros tempos e depois seu uso foi praticamente abandonado. No Brasil, a moda voltou com os lança-perfumes trazidos da Argentina. O clorofórmio é conhecido desde 1847 como anestésico, mas foi abandonado porque surgiram anestésicos mais eficientes e seguros. Assim também ocorreu com o éter. Há referências ao abuso do éter como substituto do álcool durante a Lei Seca nos Estados Unidos e durante a Segunda Guerra Mundial na Alemanha. Por volta de 1960, os lança-perfumes, que eram feitos de Cloreto de Etila, começaram a ser aspirados para dar sensação de torpor, tontura e euforia. O Quelene, anestésico local, formava par com o lança-perfume e era empregado fora das épocas de Carnaval, quando a disponibilidade do lança-perfumes era menor. Muitas pessoas morreram de parada cardíaca provocada por essa droga e, por volta de 1965, o governo brasileiro proibiu a fabricação dos lança-perfumes e do Quelene. Contudo, começaram a surgir referências ao retorno do uso de lança-perfumes, só que como um produto à base de clorofórmio e éter.
Efeitos físicos e psíquicos
Após a aspiração, o início dos efeitos é bastante rápido. Entre 15-40 minutos já desapareceram. O efeito dos solventes vai desde uma pequena estimulação, seguida de uma depressão, até o surgimento de processos alucinatórios. Os principais efeitos são caracterizados por uma depressão da atividade do cérebro. O aparecimento dos efeitos após a inalação foi dividido em 4 fases: 13
1a. fase: fase da excitação. A pessoa fica eufórica, aparentemente excitada, ocorrendo tonturas e perturbações auditivas e visuais. Podem aparecer náuseas, espirro, tosse, muita salivação e as faces podem ficar avermelhadas. 2a. fase: a depressão começa a predominar. A pessoa entra em confusão, desorientação, fica com a voz “pastosa”, começa a ter a visão embaçada, perda do autocontrole, dor de cabeça, palidez e começa a ver e a ouvir coisas. 3a. fase: a depressão se aprofunda com redução acentuada do estado de alerta, incoordenação ocular, incoordenação motora, fala "enrolada", reflexos deprimidos, já podendo ocorrer processos alucinatórios. 4a. fase: aparece a depressão tardia, podendo chegar a inconsciência. Há queda de pressão, sonhos estranhos, podendo ocorrer surtos de convulsão. Há possibilidade de se chegar ao coma e à morte. A aspiração repetida, crônica, pode levar à destruição dos neurônios, causando lesões irreversíveis. Os usuários podem apresentar-se apáticos, com dificuldade de concentração e com déficit de memória. Os solventes têm a propriedade de deixar o coração muito sensível à adrenalina (uma substância produzida pelo corpo), o que faz com que os batimentos cardíacos aumentem. Os solventes, inalados cronicamente, podem levar a lesões da medula óssea, dos rins, do fígado e dos nervos periféricos que controlam os nossos músculos. Não há, na literatura médica, afirmativas claras de que os solventes possam levar à dependência. Também não se figura síndrome de abstinência. A tolerância pode ocorrer, instalando-se em um ou dois meses.
Nomes comerciais
Os solventes estão presentes em muitos produtos comerciais. Existem dois grupos principais: Substâncias voláteis: éter, clorofórmio, gasolina, benzina, fluído de isqueiro, Carbex. Substâncias usadas na indústria como solvente, diluente e adesivas: cola de sapateiro, tintas, vernizes, removedores, limpa-manchas, esmaltes (estes possuem tolueno na sua composição). Algumas estruturas dos solventes:
HC HC
H C
CH3 CH CH
C H Benzeno
HC
C
CH3 CH2 Cl
CH3 CH2 O CH2 CH3 Éter etílico
Cloreto de etila
CH
HC
CH C H Tolueno
H3C
H2 C
H2 C
C C H2 H2 n_hexano
H C Cl Cl Cl Clorofórmio
CH3
Estes produtos pertencem a um grupo químico chamado Hidrocarbonetos Aromáticos ou Afiláticos cujas substâncias ativas são: Tolueno, N-hexano, Benzeno, Xilol, Acetato de Etila, Cloroetila ou Cloreto de Etila etc.
Nomes populares: cheirinho da loló ou loló, lança-perfumes ou lança, cola. 14
3.3.3 Ansiolíticos Aspectos históricos e culturais
NH CH3
N Os
ansiolíticos
surgiram
em
1950,
com
o
meprobamato, que praticamente desapareceu após a descoberta do clorodiazepóxido (Líbrium), em 1959. A
+ N
Cl
O
partir daí, seguiu-se uma série de derivados que se mostraram muito eficientes no controle da ansiedade, insônia e certos distúrbios epilépticos. O Diazepam foi o segundo a surgir, sendo o mais
Clorodiazepóxido
destacado membro desse grupo de substâncias conhecido
CH3
como benzodiazepinas. Assim, as principais drogas pertencentes
N
O
à classificação de ansiolíticos são os benzodiazepínicos. A benzodiazepina, sintetizada na década de 50, tem mais de 2.000 derivados. Existem 19 substâncias comercializadas no
N
Cl
Brasil, com mais de 250 nomes comerciais. O meprobamato foi sendo abandonado e as benzodiazepinas dominam completamente os tratamentos farmacológicos das neuroses e das formas de ansiedade. Além da grande eficiência
Diazepam
terapêutica, mostraram-se drogas muito seguras. Tem uso terapêutico como ansiolítico, hipnótico e síndrome de dependência do álcool. O crescimento de seu consumo foi vertiginoso entre 1960 e 1980, e estima-se que cerca de 10% da população adulta dos países desenvolvidos tomem benzodiazepínicos, regular ou esporadicamente. Estas drogas têm sido prescritas indiscriminadamente. Hoje assistimos ao desenvolvimento de um novo padrão cultural, a "cultura das benzodiazepinas", pelo qual as pessoas encaram com permissividade o uso de um "calmante". No Brasil essa situação é mais grave, pois esses medicamentos são vendidos na farmácia sem a exigência de receita médica. Estas drogas estão sendo usadas acima do que se justificaria, do ponto de vista exclusivamente médico. Não poucos autores tem comparado estas substâncias ao "Soma", descrito por Aldous Huxley em "O Admirável Mundo Novo".
Efeitos físicos e psíquicos Estimulam os mecanismos do cérebro que normalmente combatem estados de tensão e ansiedade, inibindo os mecanismos que estavam hiperfuncionantes, ficando a pessoa mais tranqüila, como que desligada do meio ambiente e dos estímulos externos. Produzem uma atividade do cérebro que se caracteriza por diminuição da ansiedade, indução do sono, relaxamento muscular, redução do estado de alerta. Dificultam os processos de aprendizagem e memória. Prejudicam, em parte, as funções psicomotoras afetando atividades como, por exemplo, dirigir automóveis.
15
Efeitos tóxicos Misturados com álcool, seus efeitos se potencializam, podendo levar a pessoa a estado de coma. Em doses altas a pessoa fica com hipotonia muscular ("mole"), dificuldade para ficar de pé e andar, queda da pressão e possibilidade de desmaios. O seu uso por mulheres grávidas tem um poder teratogênico, isto é, pode produzir lesões ou defeitos físicos no feto. Quando usados por alguns meses, podem levar a pessoa a um estado de dependência. Ou seja, sem a droga a pessoa passa a sentir muita irritabilidade, insônia excessiva, sudoração, dor pelo corpo todo, podendo, nos casos extremos, apresentar convulsões. Há figuração de síndrome de abstinência e também desenvolvimento de tolerância, embora esta última não seja muito acentuada.
Nomes comerciais Valium, Diempax, Kiatrium, Noan, Diazepam, Calmociteno (substância ativa - diazepam). Psicosedim, Tensil, Relaxil (substância ativa - clorodiazepóxido). Lorax, Mesmerin, Relax (substância ativa - lorazepam). Deptran, Lexotan, Lexpiride (substância ativa - bromazapam). Rohipnol, Fluzerin (substância ativa - flunitrazepam).
Nome popular: calmantes.
3.3.4 Barbitúricos
Aspectos históricos e culturais
Os barbitúricos foram descobertos no começo do século XX e, diz a história, que o químico europeu que fez a síntese de um
O
deles pela primeira vez, foi fazer a comemoração em um bar. Lá encantou-se com a garçonete, linda moça que se chamava
N
Bárbara. Num acesso de entusiasmo, o cientista resolveu dar ao
C2H5
composto recém descoberto o nome de barbitúrico. Em 1903, foi lançado no mercado farmacêutico o Veronal, que se mostrava um promissor hipnótico que vinha substituir os medicamentos menos eficientes até então existentes. O próprio
C2H5
H
O
N
O
H Veronal (ácido 5,5-dietilbarbitúrico)
nome comercial era uma alusão à cidade de Verona, sede da tragédia "Romeu e Julieta", onde a jovem toma uma droga que induz um sono profundo confundido com a morte para, em seguida, despertar suavemente.
16
Os barbitúricos foram amplamente empregados como hipnóticos até o aparecimento das benzodiazepinas, na década de 60. A partir daí, suas indicações se restringiram. Hoje alguns deles são úteis como antipiléticos. Nos primeiros anos, não se suspeitava que causassem dependência. Depois que milhares de pessoas já haviam se tornado dependentes, é que surgiram normas reguladoras que dificultaram a sua aquisição. Até algum tempo atrás, sedativos leves que continham barbitúricos em pequenas quantidades, não estavam sujeitos aos controles de venda, podendo ser livremente adquiridos em farmácias. Era o caso dos analgésicos. Vários remédios para dor de cabeça, além da aspirina e os antigos Cibalena, Veramon, Optalidon, Fiorinal etc., continham o butabarbital ou secobarbital (dois tipos de barbitúricos) em suas fórmulas. O abuso de barbitúricos foi muito mais freqüente até a década de 50 do que é hoje em dia.
Efeitos físicos e psíquicos São capazes de deprimir (diminuir) varias áreas do cérebro. As pessoas podem ficar sonolentas, sentindo-se menos tensas, com uma sensação de calma e de relaxamento. A capacidade de raciocínio e de concentração também ficam afetadas. Com doses maiores, causa sensação de embriaguez (mais ou menos semelhante à de tomar bebidas alcóolicas em excesso), a fala fica "pastosa", a pessoa pode sentir dificuldade de andar direito, a atenção e a atividade psicomotora são prejudicadas (ficando perigoso operar máquinas, dirigir automóveis etc.). Em doses elevadas, a respiração, o coração e a pressão sangüínea são afetados.
Efeitos tóxicos Os barbitúricos são drogas perigosas pois a dose que começa a intoxicar as pessoas está próxima da que produz efeitos terapêuticos desejáveis. Os efeitos tóxicos são: sinais de incoordenação motora, início de estado de inconsciência, dificuldade para se movimentar, sono pesado, coma onde a pessoa não responde a nada, a pressão do sangue fica muito baixa e a respiração é tão lenta que pode parar (a morte ocorre exatamente por parada respiratória). Os efeitos tóxicos ficam mais intensos se a pessoa ingere álcool ou outras drogas sedativas. Os barbitúricos levam à dependência, desenvolvimento de tolerância, Síndrome de abstinência, com sintomas que vão desde insônia, irritação, agressividade, delírios, ansiedade, angústia e até convulsões generalizadas. A síndrome de abstinência requer obrigatoriamente tratamento médico e hospitalização, pois há perigo da pessoa vir a morrer.
Nomes comerciais
Hipnóticos: Nembutal (substância ativa - pentobarbital); tiopental - substância ativa (utilizado por via endovenosa, exclusivamente por anestesistas para provocar anestesia em cirurgia). Antiepilépticos: Gardenal, Comital, Bromosedan (substância ativa - fenobarbital). 17
O
O C2H5
H
C2H5
H
N
N C2H5
O
N
C6H5
O
O
O H Fenobarbital
H Veronal (ácido 5,5-dietilbarbitúrico)
N
(ácido 5-etil-5-fenilbarbitúrico)
Nomes populares: soníferos, bola, bolinha.
3.3.5 Opiáceos Opiáceos ou drogas opiáceas são substâncias derivadas do ópio. Todas produzem uma analgesia (diminuem a dor) e uma hipnose (aumentam o sono). Em função disso, recebem o nome de narcóticos sendo também chamadas de drogas hipnoanalgésicas ou analgésicos narcóticos. São classificadas como substâncias entorpecentes, podendo ser: Opiáceos naturais: Derivados do ópio que não sofreram nenhuma modificação (ópio, pó de ópio, morfina, codeína) Opiáceos semi-sintéticos: Resultantes de modificações parciais das substâncias naturais (heroína) Opiáceos sintéticos ou opióides: Totalmente sintéticos, são fabricados em laboratório e tem ação semelhante à dos opiáceos (zipeprol, metadona)
As substâncias que compõem o grupo de drogas opiáceas são:
Codeína e Ziprepol
Ópio
Morfina
Heroína
Codeína e zipeprol
Aspectos históricos e culturais
A codeína, ou metilmorfina, é um alcalóide natural (opiáceo natural) que compõe o ópio. O ziprepol é uma substância sintética (opióide), isto é, fabricada em laboratório. Indicadas para tosses irritativas e sem expectoração (tosse seca), são chamadas de substâncias antitussígenas, estando presentes em xaropes e gotas para tosse como, por exemplo: Belacodid, Gotas Binelli, Tussaveto etc. Os métodos usuais de administração são oral ou endovenoso. A duração do efeito é de 3 a 6 horas. A codeína é um narcótico de origem natural mais amplamente empregado na clínica médica. Mesmo sendo menos potente que outros opiáceos, seu uso continuado induz a certa tolerância.. 18
O zipeprol, devido a sua grande toxicidade, foi recentemente banido do Brasil (ou seja, está proibido fabricar ou vender remédios à base desta substância no
H3C O
território nacional). No ano de 1991, foram retirados do comércio remédios com o ziprepol como, por exemplo:
O
Eritós, Nantux, Silentós e Tussaveto. Isto ocorreu pelo fato de ter havido várias mortes de jovens que abusavam destas substâncias, principalmente crianças em situação
H
N
CH3
HO Codeína
de rua. Os xaropes e gotas à base de codeína só podem
ser vendidos nas farmácias brasileiras com a apresentação da receita do médico, que fica retida para posterior controle. Isto nem sempre acontece, pois há estabelecimentos que, para ganhar mais dinheiro, vendem estas substâncias por "baixo do pano".
Efeitos físicos e psíquicos
A codeína possui os vários efeitos das drogas do tipo opiáceo. Assim, é capaz de dilatar a pupila, de dar uma sensação de má digestão e produzir prisão de ventre. O ziprepol, além da possibilidade de produzir convulsões, pode também produzir náuseas. A codeína e o ziprepol são drogas capazes de inibir e bloquear o centro da tosse, no cérebro. Assim, mesmo que haja um estímulo para retirá-lo, o centro não reage, estando bloqueado pela droga. Também agem em mais regiões do cérebro, inibindo outros centros que comandam as funções de nossos órgãos. Com a codeína, a pessoa sente menos dor (é analgésico), e pode ficar sonolenta. A pressão do sangue, o número de batimentos do coração e a respiração podem ficar diminuídos. O ziprepol pode atuar no cérebro, fazendo a pessoa sentir-se aérea, flutuando, sonolenta, vendo ou sentindo coisas diferentes. Com freqüência, leva também a acessos de convulsão. A codeína, quando tomada em doses maiores do que a terapêutica, produz uma acentuada depressão das funções cerebrais. Como conseqüência, a pessoa fica apática, a pressão do sangue cai muito, o coração funciona com grande lentidão e a respiração torna-se muito fraca. A pele fica fria, pois a temperatura do corpo diminui, e meio azulada, por respiração insuficiente. A pessoa pode ficar em estado de coma, inconsciente, e se não for tratada, pode morrer. A codeína leva rapidamente o organismo a um estado de tolerância. Assim, é comum saber-se de casos de pessoas que tomam vários vidros de xaropes ou de gotas para continuar sentindo os mesmos efeitos. E, se deixam de tomar a droga, já estando dependentes, aparecem os sintomas da chamada síndrome de abstinência. Calafrios, cãibras, cólicas, nariz escorrendo, lacrimejamento, inquietação, irritabilidade e insônia são os sintomas mais comuns da abstinência. Com o ziprepol há, também, o fenômeno da tolerância, embora em intensidade menor. O pior aspecto do uso crônico (repetido), dos produtos à base de ziprepol, é a possibilidade da ocorrência de convulsões.
19
Nomes comerciais Belacodid, Belpar, Benzotiol, Codelasa, Gotas Binelli, Naquinto, Pastilhas Veabon, Pastilhas Warton, Setux, Tussaveto, Tussodina, Tylex (substância ativa: codeína). Eritós, Nantux, Silentós, Tussiflex (substância ativa: zipeprol). Uso terapêutico: antitussígeno e analgésico (codeína); antussígeno (zipeprol)
Ópio
Aspectos históricos e culturais
O ópio ("suco", em grego) é obtido a partir de um líquido leitoso da cápsula verde da papoula (Papaver somniferum), planta que cresce naturalmente na Ásia. É também chamada de "dormideira", sendo originária do Mediterrâneo e Oriente Médio. Quando seco, o suco passa a se chamar pó de ópio. O ópio é apresentado em barras de cor marrom e gosto amargo que podem ser reduzidas a pó. Quando aquecido, produz um vapor amarelo que é inalado. Pode ser dissolvido na boca ou ingerido como chá. A papoula é legalmente cultivada, servindo de fonte de matériaprima a laboratórios farmacêuticos. Contudo, em sua maioria, as plantações são ilegais e destinam sua produção ao comércio clandestino de ópio e heroína. Entre os gregos antigos, o ópio era revestido de um significado divino como símbolo mitológico poderoso. Os seus efeitos eram considerados como uma dádiva dos deuses, destinada a acalmar os enfermos. Na China, desde tempos imemoriais, a planta da papoula era símbolo nacional (tal como os ramos do café no Brasil). Parece que o ópio foi introduzido na China pelos árabes no século IX ou X. As provas mais antigas do conhecimento do ópio remontam às plaquinhas de escrever dos sumerianos, que viveram na baixa Mesopotâmia (hoje o Iraque) há cerca de 7.000 anos. O conhecimento de suas propriedades medicinais chega depois à Pérsia e ao Egito, por intermédio dos babilônios. Os gregos e os árabes também empregavam o ópio para fins médicos. O primeiro caso conhecido de cultivo da papoula na Índia data do século XI. No tempo do império Mongol (século XVI), a produção e o consumo de ópio nesse país já eram fatos normais. O ópio era conhecido também na Europa na Idade Média, e o famoso Paracelso o ministrava a seus pacientes. Quando utilizado por prazer, era ingerido como chá. O hábito de fumar ópio conta umas poucas centenas de anos. Em muitas sociedades orientais tradicionais, recorre-se ao ópio contra dores nas enfermidades do corpo mas, também, como tranqüilizante. É também instrumento de relaxamento e de sociabilidade. No século XIX, a "British East India Company" produzia ópio na Índia e o vendia para a China. A insistência do governo chinês em reprimir a venda e o uso da droga que se alastrava, levou a um 20
conflito com a Inglaterra, conhecido como a "Guerra do Ópio". Os ingleses obrigaram a China a liberar a importação da droga e como resultado, em 1900, metade da população adulta masculina chinesa era descrita como dependente da droga. Amplamente aceita como droga recreativa no Oriente, e comprado livremente na Inglaterra e Estados Unidos, até fins do século XIX, o ópio provocou o surgimento de "casas de ópio" na maioria das cidades européias. Foi somente no início do século XX que o seu consumo começou a ser proibido.
Efeitos físicos e psíquicos As pessoas não iniciadas podem experimentar náuseas, vômitos, ansiedade, tonturas e falta de ar. O dependente entra diretamente num estado de torpor, sentindo os membros pesados e o raciocínio lento. A dependência e tolerância se desenvolvem rapidamente e o dependente passa a sentir tudo, menos prazer. Privado da droga, tem tremores, suores, angústia, cólicas e cãibras - sintomas da sindrome de abstinência..
Nomes comerciais: Tintura de Ópio, Elixir Paregórico, Elixir de Dover (substância ativa - pó de ópio).
Uso terapêutico: anti-diarréico e analgésico.
Morfina
Aspectos históricos e culturais
A morfina é a mais conhecida das várias substâncias existentes no pó de ópio. A palavra morfina vem do deus da mitologia grega Morfeu, deus dos sonhos. Foi isolada em 1806, sendo uma das mais potentes drogas analgésicas.
Após
a
constatação
das
desastrosas
conseqüências do seu largo emprego, a morfina foi
H O
relegada a um plano secundário em medicina. Os mecanismos de fiscalização sobre a sua produção e comercialização são severos. Só está
O
disponível em soluções injetáveis e comprimidos, e seu
H
uso é restrito a algumas situações médicas onde se impõe o uso de um analgésico potente (como câncer, queimaduras
extensas,
grandes
traumatismos).
O
N
CH3
HO Morfina
mercado clandestino é restrito, quase insignificante.
21
Efeitos físicos e psíquicos
Os efeitos agudos da morfina são semelhantes aos do ópio, mas mais potentes. Tolerância e dependência também se instalam rapidamente. O dependente de morfina vive em um estado de torpor e insensibilidade. A síndrome de abstinência é muito grave, acompanhada de intensa angústia, tremores, diarréia, suores e cãibras. A hospitalização é sempre uma imposição nos tratamentos de desintoxicação. A droga nunca é retirada bruscamente, havendo necessidade de se estabelecer um programa de retirada progressiva da droga ou sua substituição por derivados sintéticos mais seguros. Veja a seguir a semelhança entre as molécula da codeína e morfina:
R O
O H
N
CH3
HO Morfina (R=H) Codeína (R=CH3)
Nome comercial: morfina.
Heroína
Aspectos históricos e culturais Obtida a partir da morfina (veja a semelhança
O
da molécula da heroína com a da morfina), é muito
C O
mais potente do que ela. Conhecida como a "rainha
H3C
das drogas" por causa de seus efeitos, foi sintetizada em 1874, em Berlim.
O
A palavra heroína vem do termo "heroich" que,
H
O C O H3C
N
CH3
em alemão, significa potente, enérgico. De início, foi preconizada como substituta da morfina e chegou a fazer
Heroína
parte
dos
medicamentos
analgésicos,
antitussígenos e hipnóticos. Hoje em dia, não tem qualquer indicação médica.
Na sua forma pura, é um pó branco e amargo. Vendida clandestinamente, tem coloração que varia do branco ao marrom escuro, por causa das impurezas deixadas pelos processos primitivos de obtenção ou pela presença de talco, açúcar, corantes químicos, leite em pó etc. A via de administração preferida pelos usuários de heroína é a endovenosa. Pode ser também aspirada ou fumada. 22
O comércio ilegal da heroína representa um dos segmentos mais importantes e rentáveis do tráfico de drogas. A produção e a distribuição estão sempre ligadas as grandes organizações clandestinas. O uso de heroína é raro no Brasil. Por outro lado, os Estados Unidos vivem uma situação epidêmica, cujo início se localiza por volta da metade da década de 60, coincidindo com o envolvimento dos americanos na Guerra do Vietnã. Milhares de soldados adquiriram o hábito de tomar heroína junto às populações do sudeste asiático. Foi grande a quantidade de jovens que retornou da guerra dependente. A grande dificuldade em ajudar os dependentes de heroína levou vários países a criar os programas de "manutenção pela metadona" - opióide sintetizado por químicos alemães, durante a Segunda Guerra Mundial, em resposta à escassez de morfina. A metadona é utilizada no tratamento dos dependentes de heroína. Não desenvolve tolerância e o seu efeito pode durar até quatro vezes mais que os efeitos de outros opiáceos.
Efeitos físicos e psíquicos
Os efeitos agudos são semelhantes aos obtidos com os outros opiáceos: torpor e tonturas misturados com um sentimento de leveza e euforia. As primeiras doses podem provocar náuseas e vômitos. Depois de instalada a dependência, há necessidade de ministrá-la mais vezes a fim de prevenir os desprazeres da abstinência: cólicas, angústia, dores pelo corpo, letargia, apatia e medo. A tolerância instala-se rapidamente. A repetição das doses nada mais faz a não ser aliviar estes sintomas.
3.4 Estimulantes: Estimulantes do SNC
Os Estimulantes da Atividade do Sistema Nervoso Central referem-se ao grupo de substâncias que aumentam a atividade do cérebro. Ou seja, estimulam o seu funcionamento, fazendo com que a pessoa fique mais "ligada", "elétrica", sem sono. Este grupo de substâncias é também chamado de psicoanalépticos, nooanalépticos, timolépticos. As substâncias que compõem o grupo de Estimulantes do SNC são: Cafeína Nicotina Anfetamina Cocaína
23
3.4.1 Cafeína
Aspectos históricos e culturais
A forma pura da cafeína foi extraída das plantas em 1820, mas atualmente pode ser produzida em laboratório. Em nosso dia-a-dia a encontramos em pequenas quantidades por meio do café, do chá preto, chá mate, guaraná, coca-cola ou da noz de cola.
Café:
Infusão feita das sementes do cafeeiro, o café é a bebida que
O
contém cafeína mais consumida no mundo. O cafeeiro é originário da Etiópia, tendo chegado à Arábia no
CH3
H3C N
século XIII e à Turquia no século XVI. Mas é somente com sua chegada à Itália, no princípio do século XVII, que se dá sua grande expansão, pois começaram a surgir, desde então, casas de café por toda Europa, servindo de local de encontro e discussões sérias. Na
O
N
N
CH3 Cafeína
segunda metade do século XVII, o café chegou à América. Antes de ser consumido da maneira que conhecemos, o café, há cerca de 700 anos, foi uma comida, depois vinho e também remédio. No século XVII, em vários condados da Alemanha e na Rússia Czarista, consumidores de café foram condenados à morte. Tendo se popularizado com sua chegada à Europa, foram os Estados Unidos, após sua independência, que se tornaram o principal consumidor mundial, respondendo hoje pelo consumo de cerca de 1/3 (um terço) do café cultivado no mundo. O Brasil entra, por sua vez, na estatística do café com o primeiro lugar entre os produtores, vindo acompanhado da Colômbia, detentora do segundo. É também cultivado em Java, Sumatra, Índia, Arábia, África Equatorial, Hawaí, México, Antilhas, América Central e outros países da América do Sul.
Chá ou chá preto:
A primeira referência ao chá na literatura chinesa data de 350 d.C.. De origem chinesa, a lenda remete sua descoberta ao imperador Chen Nung, no ano 2737 a.C.. Tendo se difundido no Japão e outros países orientais, chegou à Europa por volta de 1600, através de mercadores vindos do Oriente. No século XVII, o chá consolidou-se como a bebida nacional da Grã-Bretanha. Na segunda metade desse mesmo século, chegou às colônias americanas. Em 1767, o governo britânico passou a cobrar uma taxa pelo chá ali consumido. Esta taxa foi um dos temas explorados pela resistência anticolonialista na guerra de independência dos Estados Unidos. Atualmente, o principal consumidor mundial é a Grã-Bretanha, vindo logo em seguida os Estados Unidos. Na produção, o primeiro lugar é da Índia, com a China em segundo. O chá também é 24
produzido no Japão, Sri Lanka, ex União Soviética, Indonésia, Turquia, Bangladesh, Irã, Taiwan, vários países da África e América do Sul, inclusive Brasil.
Erva mate:
Nativa da América do Sul, contém relativamente, uma grande quantidade de cafeína. É consumida principalmente como chá ou chá mate, ou chimarrão, bebida popular dos pampas, ou o tererê, bastante popular no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraguai. A cultura da erva mate é uma grande indústria no sul do Brasil, no Uruguai e Argentina, sendo deles exportada em grande quantidade para toda a América do Sul.
Guaraná
Fruto do guaranazeiro, arbusto trepador originário do estado do Amazonas, seu cultivo foi iniciado pelos índios Maues. Esses objetivavam com o seu consumo realizar trabalhos físicos mais cansativos. O consumo era feito através de dissolução do pó do guaraná em água. O homem branco teve o primeiro contato com o guaraná por volta do século XVI. É comum encontrarmos hoje refrigerantes com nome guaraná, mas esses são normalmente feitos com sabor artificial. Outra forma comum de consumo, que se assemelha à dos índios Maues, vincula o guaraná à idéia de um produto natural, sendo um produto, nesse caso, pouco popular.
Efeitos físicos e psíquicos
A cafeína é uma droga estimulante consumida por via oral, que em pequenas quantidades aumenta a circulação por provocar dilatação dos vasos sangüíneos. Pode, em dose excessiva, produzir excitação, insônia, dores de cabeça, taquicardia, problemas digestivos e nervosismo. Alguns a usam para resolver problemas cardíacos, auxiliar pessoas com depressão nervosa decorrente do uso do álcool, ópio e outras drogas. Porém alguns estudiosos não observam nenhum uso terapêutico na cafeína, alertando para o perigo da dependência psíquica e da síndrome de abstinência.
3.4.2 Nicotina
Aspectos históricos e culturais
O tabaco é uma planta da família das Solenáceas, cuja variedade principal é a nicotiana tabacum L., da qual a nicotina pura foi isolada pela primeira vez em 1828 por Posselt e Reiman. Planta originária do continente americano, o tabaco já era fumado pelos índios desde antes da chegada dos colonizadores europeus. Este hábito, como os demais de mascá-lo ou aspirá-lo, foi sendo adquirido também pelos viajantes europeus que vinham à América. 25
Foi somente em 1560 que o uso do tabaco veio a tomar grande impulso na Europa, a partir da propaganda de Jean Nicot - diplomata francês cujo nome originou a palavra nicotina - de que ela possuía "maravilhosos poderes curativos". Foi Nicot que introduziu o seu uso na França. Com o passar do tempo, o hábito de fumar tabaco havia se propagado e, no século XVII, já era um vício generalizado em toda Europa, alcançando também a África e Ásia. O tabaco perde, contudo, sua auréola de "remédio para todos os males" restringindo seu uso à população de baixa renda. Mas aos poucos vai ganhando o gosto da nobreza e da burguesia e, por fim, no início do século XVIII, é um dos maiores valores de comércio internacional. O cachimbo no século XVII, o rapé e o hábito de mascar no século XVIII, assim como o charuto no século XIX, foram formas muito comuns do uso do tabaco nas respectivas épocas. Mas a grande "democratização" do consumo de tabaco veio a acontecer no século XX, com a expansão do hábito de fumar cigarro. Originário dos "papeletes" ou "papelitos" espanhóis do século XVII e do "cigarette" francês do século XIX, o cigarro se popularizou de forma impressionante no século XX, sobretudo depois da Primeira Guerra Mundial. Apesar de existirem vozes se opondo ao uso do tabaco, este sofreu uma expansão constante e crescente. Somente na década de 60, com a revelação dos cientistas de que o cigarro provoca câncer no pulmão e outros males, é que se deu início a uma campanha contra seu uso. Certos grupos tomam esta campanha como uma verdadeira "cruzada".
O Fumo Hoje:
Apesar de várias pessoas relatarem que se sentem relaxadas quando fumam, o o cigarro é uma droga psicotrópica estimulante do sistema nervoso central (SNC). A sensação de relaxamento é provocada pela diminuição de tônus muscular. O rótulo de uma embalagem de cigarro fornece as seguintes informações:
Teores no Cigarro Alcatrão Nicotina Monóxido de carbono
Normal 13 mg 1,1 mg 14 mg
Light 8 mg 0,8 mg 11 mg
Ultralight 5 mg 0,5 mg 5 mg
Os teores na tabela ao lado referem-se apenas ao que é absorvido pelo fumante. Quantidades até 3,7 vezes maiores são lançadas no ambiente a cada queima de um cigarro. Um cigarro com teor de monóxido de carbono igual a 11 mg libera cerca de 43,2 mg dessa substância para o ambiente.
Na verdade, essas informações são bastante resumidas. Dependendo da região de cultivo, do solo, da secagem e do armazenamento, é possível encontrar na folha do tabaco cerca de 500 substâncias diferentes e, após a queima, os cientistas já conseguiram isolar um total se 4720 substâncias diferentes. A fumaça do cigarro é resultante da combustão incompleta do tabaco; a combustão completa só se realiza na brasa, onde a temperatura atinge 850 ºC. Durante a combustão ocorrem simultaneamente 3 tipos de reação:
Pirólise (decomposição térmica): as substâncias orgânicas do tabaco são fracionadas em moléculas menores devido à alta temperatura.
26
Pirossíntese (síntese pelo calor): os elementos fracionados da pirólise recombinam-se em novos componentes originalmente não existentes no tabaco.
Destilação: o aquecimento elevado na ponta do cigarro provoca a destilação de algumas substância, como a nicotina, por exemplo. A composição química da fumaça depende da qualidade do tabaco, de como é embalado, o
comprimento do cigarro, das características do filtro e do papel, da temperatura em que é queimado e da maneira de fumar. Porém, duas fases fundamentais podem ser diferenciadas: a gasosa e a particulada, conforme mostra a tabela a seguir com os constituintes mais importantes da fumaça do tabaco: Constituintes da Fumaça Gasosa Monóxido de carbono (CO) Amônia Acroleína Acetaldeído Dimetilnitrosamina Acetonitrila Ácido cianídrico Constituintes da fase Particulada Nicotina Fenol Cresóis (orto, meta e para) Benzopireno Benzoantraceno Nitrosonornicotina Nitrosoanatabina Cádmio
Concentração por Cigarro 17 mg 60 µg 70 µg 800 µg 13 ng 123 µg 110 µg Concentração por Cigarro 1,5 mg 85 µg 70 µg 20 ng 40 ng 250 ng 1,5 µg 0,1 µg
* 1 mg = 0,001 g 1 µg = 0,000001 g 1 ng = 0,000000001 g
A Fase Gasosa é composta de gases e vapores formados na pirólise e na pirossíntese. Os mais importantes constituintes desta fase, sob o ponto de vista toxicológico, são: monóxido de carbono, amônia, óxido de nitrogênio, aldeídos (acroleína e acetaldeído), nitrosaminas voláteis (metilnitrosamina, dimetilnitrosaminas) e nitrilas (ácido cianídrico, acetonitrila). Monóxido de carbono ( CO(g) ): é um gás incolor, inodoro, insípido, combustível, altamente tóxico, formado na combustão incompleta de materiais orgânicos. Combina-se com a himoglobina com uma facilidade cerca de 200 vezes maior que o oxigênio. Pode ser fatal se absorvida em grande quantidade. Amônia ( NH3
(g)
): é formada naturalmente na queima do tabaco e também é adicionada ao
cigarro como agente de sabor. O problema é que a amônia é alcalina ( pH básico ) e a absorção da nicotina pelo organismo do fumante depende do pH do tabaco. Um tabaco mais ácido ( pH = 5,5) pode ser muito rico em nicotina, mas, sob o efeito da acidez, liberará uma quantidade bem menor da substância no organismo do fumante e essa liberação ocorrerá nos alvéolos pulmonares. O inverso acontece com um tabaco mais alcalino ( pH = 8,5 ) – mesmo fumos pobres liberaram mais nicotina no fumante e, mais rapidamente na mucosa bucal. A amônia é uma substância básica e sua adição reduz a acidez do fumo, tornando-o mais alcalino, logo fazendo com que libere mais nicotina. Mais nicotina implica maior dependência e mais prejuízos à 27
saúde. O teor de amônia nos cigarros brasileiros é bastante elevados, variando entre 13,2 µg e 15,0 µg. Nitrosaminas: são consideradas um dos mais terríveis e versáteis grupos carcinogênicos até agora descobertos. Seu papel na origem do câncer tem causado crescente preocupação do pesquisadores.
H3C
N
N
O
H metilnitrosamina
H3C
N
N
O
CH3 dimetilnitrosamina
A Fase Particulada, também chamada de condensado, é constituída de um aerossol sólido com substâncias voláteis incluídas e com aproximadamente de 1 a 5 bilhões de partículas por mililitro de fumaça, cujo tamanho varia de 0,1 a 0,8 µm. Os filtros dos cigarros geralmente retêm 99% das partículas com diâmetro igual ou superior a 0,3 µm. Ao fumar um cigarro um indivíduo absorve cerca de 10 trilhões partículas; as mais altas concentrações de poluentes urbanos não ultrapassam 10 milhões por mililitro. Os constituintes mais importantes dessa fase são: nicotina, água e alcatrão. Nicotina: é uma substância de caráter básico que possui o grupo funcional amina e odor característico. Apresenta-se na forma de um líquido oleaginoso e incolor que se torna pardo-escuro em contato
N
com o ar, por sofrer oxidação. É solúvel em água e muito solúvel em solventes orgânicos, sobretudo no álcool e no éter que são utilizados para extraí-la de suas soluções aquosas alcalinas. A nicotina faz parte
N
CH3 nicotina
de um grupo de compostos denominados alcalóides. Alcalóide é todo composto orgânico nitrogenado, de caráter básico e de origem vegetal, que apresenta em geral uma potente ação tóxica no organismo animal. A nicotina é, em termos farmacológicos, o ingrediente mais ativo da fumaça do cigarro e um dos agentes tóxicos mais potentes e mais rapidamente fatais que se conhecem. A dose letal média para o homem situa-se entre 40 e 60 mg. Doses de 4 mg já determinam sintomatologia grave e a DL50, para rato, via oral, situa-se entre 50 e 60 mg/Kg. Quando a fumaça do cigarro é tragada, a nicotina imediatamente é distribuída pelos tecidos e absorvida pelos pulmões, chegando ao cérebro em 9 segundos. Apresenta leve ação estimulante, reduz o apetite e aumenta o batimento cardíaco, a pressão arterial, a frequência respiratória e a atividade motora. Ao longo de algum tempo, a nicotina desenvolve tolerância no organismo, ou seja, o indivíduo tende a consumir um número cada vez maior de cigarros para sentir os mesmos efeitos que originalmente eram produzidos por doses menores. A nicotina causa dependência como a cocaína, a heroína e o álcool. A nicotina também é utilizada como inseticida na agricultura. É absorvida facilmente por via oral, pulmonar e dérmica. Alcatrão: é um líquido negro e espesso que fica em parte retido no filtro do cigarro e em parte impregnando o pulmão dos fumantes. É tudo o que resta depois de extraídas a nicotina e a umidade do tabaco. Quimicamente é constituído principalmente por hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, alguns dos quais são carcinogênicos comprovados como, por exemplo, o benzopireno. O alcatrão contém vários outros compostos como fenóis, cresóis, nitrosaminas nãovoláteis (N-nitrosonornicotina, N-nitrosoanatabina), íons metálicos (ferro, cádmio, crômio, 28
manganês, zinco) e compostos radioativos como o polônio 210. Algumas substâncias são adicionadas ao tabaco para melhorar suas características organolépticas, como agentes umactantes, flavorizantes e aglutinantes. Outros compostos também podem aparecer no tabaco como resultado da contaminação das plantas com praguicidas e fertilizanes.
Benzopireno "3,4-benzopireno"
Efeitos físicos e psíquicos
Consumida por via oral ou nasal, a nicotina, componente do tabaco, é considerada uma droga estimulante. Não possui nenhum efeito terapêutico, provocando dependência física e psíquica. Provoca tolerância, ou seja, o organismo adapta-se a sua presença através de um processo biológico, e sujeita a síndrome de abstinência os indivíduos que param de fumar de uma maneira brusca. Entre as 4 mil substâncias existentes na fumaça do tabaco, a nicotina é a responsável pela dependência física, caracterizada por sintomas de irritabilidade, palpitação, tontura, ansiedade e fadiga. Aumento da pressão arterial, diminuição do fluxo sangüíneo para a pele, diminuindo a temperatura; Faringites, bronquites, falta de apetite; Perturbações da visão; Diversos tipos de câncer; Doenças cardiovasculares, angina, infarto.
3.4.3 Anfetaminas
Aspectos históricos e culturais
Sintetizada pela primeira vez em 1887, as anfetaminas são drogas estimulantes, ou seja, alteram nosso psiquismo, aumentando, estimulando ou acelerando o funcionamento do cérebro e do sistema nervoso central. São drogas sintéticas, fabricadas em laboratório, não sendo, portanto, produtos naturais. Foi lançada no mercado farmacêutico
na
forma
de
um
inalador
indicado
como
descongestionante nasal, em 1932. Em 1937, iniciou-se o comércio de benzedrina, um comprimido para revigorar
CH2 CH CH3 NH2
Benzidrina
energias e elevar estados de humor. Foi usado, durante a Segunda Guerra Mundial, pelas tropas alemãs para combater a fadiga provocada pelo combate. Os Estados Unidos também permitiram seu uso na Guerra da Coréia. Por ser uma droga cujo uso terapêutico auxilia principalmente na moderação do apetite, são facilmente encontradas nas farmácias, que são obrigadas a vendê-las sob prescrição médica.
29
Além de inibidoras de apetite, as anfetaminas podem, também, a partir de uma certa dosagem, provocar um estado de grande excitação e sensação de poder. Este uso se popularizou após a Segunda Guerra Mundial, na década de 50. Na gíria, estas drogas são conhecidas, por exemplo, como "rebite" e/ou "bolinha". "Rebite" é como são chamadas as anfetaminas entre os caminhoneiros. Tendo um prazo para entregar determinada mercadoria, eles tomam o "rebite", objetivando dirigir à noite e não pegar no sono, ficando "acesos" e "presos" ao volante. O uso entre jovens passou a ser também freqüente. Usadas com o nome de "bolinha", deixam a pessoa "acesa", "ligadona", provocando um "baque". Procurando varar a noite estudando, uma pessoa pode usá-las com o objetivo de realizar esta tarefa por mais tempo, evitando o cansaço. Mais ou menos em l970, inicia-se o controle da comercialização - pois as anfetaminas passaram a ser consideradas drogas psicotrópicas, sendo portanto ilegal seu uso sem acompanhamento médico adequado. A pessoa que toma anfetaminas é capaz de executar uma atividade qualquer por mais tempo, sentindo menos cansaço. As anfetaminas fazem com que o corpo reaja acima de suas capacidades, exercendo esforços excessivos. Isto justifica o fato de muitos motoristas e estudantes se tornarem usuários da droga. Acontece que isto não ocorre sem que a saúde seja seriamente prejudicada. Além de agirem sobre o cérebro, as anfetaminas também provocam aumento da pressão sanguínea (o que pode agravar problemas cardíacos ou de pressão) e provocam a dilatação das pupilas dos olhos (para o motorista que dirige à noite isso significa ficar ofuscado pelos faróis dos carros que vêm em sentido contrário, com o risco de perder a direção). E depois, quando o efeito da droga passa, a pessoa é acometida de astenia (uma grande falta de energia, cansaço), ficando bastante deprimida, pois não conseguem realizar nem as tarefas corriqueiras. Se uma pessoa nesta condição ingere uma nova dose de anfetamina, os efeitos estimulantes voltam, porém, com uma intensidade menor, ou seja, para obter o efeito inicial são necessárias doses cada vez maiores da droga.
Efeitos físicos e psíquicos
As anfetaminas provocam dependência física e psíquica, podendo acarretar, com seu uso freqüente, tolerância à droga, assim como a sua interrupção brusca, síndrome de abstinência. Consumidas por via oral ou injetadas, são consideradas psicotrópicos estimulantes, por induzir a um estado de grande excitação e sensação de poder, facilitando a exteriorização de impulsos agressivos e incapacidade de julgar adequadamente a realidade. Doses maiores da droga podem provocar comportamentos fora do normal. A pessoa se torna agressiva, irritadiça e começa a suspeitas que estão tramando contra ela: é o chamado delírio persecutório. Uma pessoa mais sensível ou que tenha tomado doses ainda maiores está sujeita a entrar num estado de paranóia e a ter alucinações. É a psicose anfetamínica, que vem acompanhada de taquicardia, grande dilatação das pupilas e acentuada palidez.
30
Este tipo de intoxicação é grave e como as anfetaminas causam dependência física e psíquica, a pessoa precisa ser internada para conseguir desintoxicar o organismo e se livrar da dependência. As anfetaminas são compostos que agem também como anorexígeno. Anorexígeno é toda substância que provoca anorexia, ou seja, perda de apetite, inapetência. Uma classe de anfetaminas são utilizadas como “moderadores de apetite” (indicados para regimes de emagrecimento). Os anorexígenos são muito usados indevidamente por adolescentes que querem perder peso “a qualquer custo”, não importando os riscos que sua saúde pode correr. São muito usados por modelos que precisam manter o peso.
Nomes comerciais Dualid, Inibex, Hipofagin, Moderine (substância ativa - dietilpropiona). Lipomax, Desobesi (substância ativa - fenpropex). Dasten, Absten, Moderamin, Fagolipo, Inobesin, Lipese, Diazinil (substância ativa - mazindol). Uso terapêutico: anorexígeno (medicamento utilizado para provocar a anorexia, que é aversão ao alimento). Pervitin (substância ativa: metanfetamina) - "ice".Não tem uso terapêutico. Ritaline (substância ativa: metilfenidato). Uso terapêutico: sistema hipercinético.
A partir da ß-fenetilamina (em que todos os radicais são substituídos por hidrogênio) e consultando a tabela a seguir, têm-se a estrutura e o nome dos derivados mais utilizados da anfetamina:
R5 R4 R3 R6
C C N H R7 ß-fenetilamina
Substância Anfetamina Clorfentermina Dietilpropiona Efedrina Femproporex Fenfluramina Fenilefrina feniprazina Fentermina Metanfetamina norfenfluramina
R1 H H CH2CH3 H CH2CH2CN CH2CH3 H H H CH3 CH3
R1
R2 H H CH2CH3 CH3 H H CH3 NH2 H H H
R3 H CH3 H H H H H H CH3 H H
R2
R4 H H =O* OH H H OH H H H H
R5 H H H H H CF3 OH H H H CF3
R6 H Cl H H H H H H H H H
R7 CH3 CH3 CH3 CH3 CH3 CH3 H CH3 CH3 CH3 H
* neste caso, o carbono do radical R4 não faz ligação com o hidrogênio Nomes populares: bolinha, bola, rebite, "ice". 31
3.4.5 Cocaína
Aspectos históricos e culturais
É um produto extraído da planta Erythroxylon coca, ou, como é popularmente conhecida, coca ou epadu. Sendo uma planta tipicamente sul americana, é nativa dos Andes, onde mascar sua folhas, "coquear", é um habito tradicional que remonta vários séculos. Sua principal função é evitar a sede, a fome e o frio. Podemos encontrar, em algumas sociedades andinas, um valor cultural e mitológico ligado à coca. Em certas sociedades, por exemplo, é aplicada a folha no recém-nascido para secagem do cordão umbilical - que depois é enterrado com as folhas, representando um talismã para o resto da vida do indivíduo. Em certas cerimônias funerais é usada, também, mediante certos rituais, como forma de apaziguar e tranqüilizar os espíritos. O papel sócio-cultural da coca é importante em alguns países andinos. Dois exemplos são o Peru e a Bolívia, onde é consumida também sob a forma de chá, com propriedades medicinais que auxiliam principalmente problemas digestivos. Sua importância é tal que neste primeiro país existe até um órgão do governo encarregado de controlar a qualidade das folhas vendidas no comércio, o "Instituto Peruano da Coca". Se em alguns países andinos a coca é um bem sócio-cultural, histórica e tradicionalmente importante, em outros países, como no Brasil, é vista como um "mal, algo a ser combatido e exterminado de qualquer maneira". A lei destes países procura taxar o seu uso como ilícito e a sociedade, em sua maioria, procura estigmatizar seus usuários como "desviantes" ou "marginais". O uso mais comum nestes casos é sob a forma de sal - o cloridrato de cocaína. É consumida
H
via nasal, ou
seja, aspirada, "cheirada". Por ser uma droga cara, seu uso é
O O C
N CH3
dificultado a pessoas de baixa renda. Se o "pó", como é
C
popularmente conhecido o sal cloridrato de cocaína, é muito
O
caro, favorecendo o seu uso pelas camadas mais altas da
Cocaína
O CH3
sociedade, o uso da coca tornou-se mais acessível à população de baixa renda com o advento do "crack". Esta é uma forma de uso que surgiu nos Estados Unidos, entre a população negra, e que começou a se difundir no Brasil, principalmente na periferia das grandes cidades. No crack, a substância usada é a pasta básica de coca ("freebasing", em inglês). A cocaína pode também ser injetada na corrente sangüínea. O "pico" como é conhecida esta forma de uso produz um efeito chamado de "rush" ou "baque".
Efeitos físicos e psíquicos
A cocaína provoca sensação de euforia e bem-estar, idéia de grandiosidade, irritabilidade e aumento da atenção a estímulos externos.
32
Com o aumento da dose: reações de pânico, sensação de estar sendo perseguido, às vezes alucinações auditivas e táteis (escutar vozes, sentir sensação de bichos andando pelo corpo). O quadro completo é chamado de "psicose cocaínica". Intoxicação aguda: em intoxicação com doses mais altas, quadro de síndrome cerebral orgânica (SCO), caracterizado por confusão e desorientação, podendo resultar em lesão cerebral. Efeitos físicos: aumento da pressão arterial e da freqüência cardíaca podendo provocar infarto e arritmias que causam morte súbita. Menciona-se ocorrências de convulsões generalizadas e aumento da temperatura capaz de induzir convulsões. Com a aplicação endovenosa corre-se o risco de contrair-se os vírus do hepatite e da AIDS.
Nomes populares: pó, neve, brisola, bright, branquinha, pico, coca, basuko, pedaço etc.
3.4.6 crack
Por atingir o cérebro em questão de segundos, provoca as alterações bioquímicas e os efeitos da cocaína mais rapidamente. O nome "crack" surgiu do som que é produzido quando a pedra de coca está sendo queimada. A cocaína fumável surgiu na Colômbia, no final da década de 70, quando os usuários começaram a fumar o bazuco, isto é, os restos do refino, que contêm substâncias corrosivas, como ácido sulfúrico e acetona. Depois, a pasta de cocaína começou ser fumada misturada com maconha, nos EUA e na Amazônia. Mais tarde começaram a ser produzidas as pedras de crack, um precipitado de cocaína com bicarbonato aquecidos em água. A droga é introduzida no organismo através da absorção em toda a mucosa respiratória, fumada com tabaco ou cachimbos improvisados com caneta esferográfica, embalagens de produtos alimentícios, isqueiros de plástico, etc. Ao se fumar uma pedra de crack, a cocaína se volatiliza e entra no organismo sob a forma de vapor , ganhando a circulação sangüínea. Quando a cocaína é introduzida no organismo através da mucosa do nariz, sua absorção se faz por uma superfície de 2 ou 3 centímetros quadrados. Sendo a mucosa do aparelho respiratório muito mais extensa que a mucosa nasal, a absorção é muito rápida e uma grande quantidade de droga atinge o cérebro em questão de segundos, como ocorre no uso por injeção endovenosa, e o usuário fica dependente mais rapidamente. Além disso, são mais freqüentes as overdoses. A cocaína fumada, o crack, assim como a injetada, é muito mais potente que a cocaína aspirada, atingindo o máximo em 15 segundos, enquanto a aspirada leva cerca de 15 minutos, além de desaparecer mais rápido, deixando uma forte vontade de usar mais, fazendo com que uma pessoa fique até vários dias seguidos usando a droga.
Danos causados pelo crack.
O crack provoca os mesmos danos que a cocaína aspirada, porém, devido ao seu avassalador poder desestruturador da personalidade, age em prazo muito curto e em maior intensidade. Insônia, agitação psicomotora, agressividade, emagrecimento, perda da autocrítica e da 33
moral, dificuldades para estabelecer relações afetivas, psicoses, comportamento excessivamente anti-social , marginalidade e prostituição. Lesões do tracto respiratório.
3.4.7 Merla
A merla é um subproduto da cocaína. É obtida das folhas de coca às quais se adicionam alguns solventes como ácido sulfúrico, querosene, cal virgem, etc., transformando-se num produto de consistência pastosa com uma concentração variável entre 40 a 70% de cocaína. 1 Kg de cocaína chega a produzir 3 Kg de merla. Pode ser fumada pura ou misturada ao tabaco comum, ou à maconha (bazuca). Possui a cor amarelo pálido a mais escuro quando vai envelhecendo. É uma droga altamente perigosa, que causa dependência física e psíquica, além de provocar danos, as vezes irreversíveis ao organismo. Sua absorção normalmente é muito grande através da mucosa pulmonar e seu efeito é excitante do Sistema Nervoso Central. Sua atuação é semelhante a da cocaína, causa euforia, aumento de energia, diminuição da fadiga, do sono, do apetite, ocasionando perda de peso e psicose tóxica (alucinações, delírios, confusão mental). Devido aos resíduos dos ácidos solventes, os usuários poderão apresentar casos de fibrose (endurecimento pulmonar). Durante o uso podem ocorrer convulsões e perda da consciência. As convulsões podem levar a parada respiratória, coma, ou parada cardíaca e, obviamente, à morte. O usuário comumente apresenta as extremidades dos dedos amareladas. Pode evidenciar lacrimejamento, olhos avermelhados, irritados, respiração difícil, tremores das mãos, muita inquietação e irritabilidade. A longo prazo, perda dos dentes causado pelo ácido de bateria usado na mistura. Passado a euforia provocada pelo uso, surgem efeitos como alucinações, depressão, sensação de medo e paranóia de perseguição, por isso a merla é também chamada pelos usuários de "nóia", gíria derivada da palavra paranóia. Essas sensações continuadas podem, em alguns casos, levar ao suicídio. Somatório dos princípios do crack, dos inalantes e de outros produtos químicos altamente tóxicos e viciante usados na sua fabricação, a merla aciona o Circuito de recompensa, libera neurotransmissores e exaure os neurônios. Os efeitos duram cerca de quinze minutos. "A primeira sensação é de bem-estar. Seu uso é ainda mais difícil de disfarçar, por ser ela muito mais atuante no organismo do que o crack. Uma de suas características é o cheiro que o corpo exala na eliminação (pela transpiração intensa) dos produtos químicos adicionados durante o preparo da droga. Os usuários cheiram a querosene, gasolina, benzina e éter. O fato de ser consumida por 80% de rapazes e por 20% de mulheres entre 16 e 18 anos facilita sua identificação. Os usuários de merla rapidamente entram para a delinquência: 68,7% roubavam para sustentar o vício e 17% se envolveram com o tráfico para comprar a droga. Não bastasse tudo isso, o
34
sofrimento é tão grande que 20,5% dos usuários tentaram o suicídio para fugir à Síndrome de Abstinência ou à depressão causada pelo uso contínuo. (Fonte: Anjos Caídos, Içami Tiba. Editora Gente, 6ª edição)
3.5 Perturbadores do SNC 3.5.1 Breve Histórico das Drogas Perturbadoras do SNC
Os Perturbadores da Atividade do Sistema Nervoso Central referem-se ao grupo de substâncias que modificam qualitativamente a atividade do cérebro. Ou seja, perturbam, distorcem o seu funcionamento, fazendo com que a pessoa passe a perceber as coisas deformadas, parecidas com as imagens dos sonhos. Este
grupo
de
substâncias
é
tambem
chamado
de
alucinógenos,
psicodélicos,
psicoticomiméticos, psicodislépticos, psicometamórficos, alucinantes. As substâncias que compõem o grupo de Perturbadores do SNC são:
Anticolinérgicos – Medicamentos
Anticolinérgicos – Planta
Maconha
Daime
Cacto
Cogumelo
LSD – 25
Ecstasy
Grande parte das drogas alucinógenas são provenientes de plantas. Estas plantas foram descobertas, em sua maioria, por culturas primitivas, no passado, que ao sentirem os efeitos mentais das mesmas, passaram a considerá-las como "plantas divinas", isto é, que faziam com que, quem as ingerisse, recebesse mensagens divinas, dos deuses, pois elevavam o homem a uma dimensão não material, provocando alucinações. Dessa maneira, esses povos e culturas, em seus rituais, acreditavam estar em contato com forças da natureza e suas divindades. Assim, até hoje, em culturas indígenas de vários países, o uso de plantas alucinógenas tem este significado religioso. Seu uso é basicamente ritual ou de cura. No entanto, também são utilizadas para fins ritualísticos, fora do contexto cultural de origem, com a finalidade apenas de provocar alucinações. No Brasil, drogas alucinógenas são até hoje muito usadas nos rituais de tribos indígenas. A serviço da comunidade, o xamã, ao consumir alucinógenos, entra em contato com os espíritos que o ajudarão a curar doenças, proteger a comunidade contra ataques mágicos e propiciar bem-estar, boas caçadas etc. O xamã, assim, compartilha com o seu povo os prazeres obtidos com a droga. Esta, antes de tudo, é propriedade coletiva e não individual, e seu uso deve propiciar harmonia ao invés de desavença, paz ao invés de contestação. 35
As drogas perturbadoras tiveram seu uso popularizado na década de 60, com o movimento hippie. Este fenômeno sócio-cultural tratava-se de uma revolta contra os valores exclusivamente unitilitaristas, competitivos e materialistas, incorporados ao modo de vida das sociedades industriais que colocavam, em segundo plano, os sentimentos mais íntimos e as necessidades místicoreligiosas. Denunciando certas características de alheamento da sociedade industrial, os hippies incluiam o uso de tais drogas em sua contestação à procura do "flower-power" (poder das flores). Nesta época, cresceu o número de pessoas que passaram a fazer uso de drogas alucinógenas como manifestação simbólica dos seus ideais.
3.5.2 Alucinógenos, psicodélicos e psicoticomiméticos
A palavra alucinação significa, em linguagem médica, percepção sem objeto, ou seja, a pessoa que está em processo de alucinação percebe coisas sem que elas existam. Assim, quando uma pessoa ouve sons imaginários ou vê objetos que não existem, ela está tendo uma alucinação auditiva ou uma alucinação visual, respectivamente. Pode também ser tátil, gustativa ou olfativa. As alucinações podem aparecer espontaneamente no ser humano em casos de psicoses. Destas, a mais comum é a doença mental chamada esquizofrenia. Também podem ocorrer em pessoas que não tem doença mental, mas que tomam determinadas substâncias que são chamadas de alucinógenas, isto é, que "geram" alucinações. Estas drogas são também chamadas de psicoticomiméticas por "imitarem" ou "mimetizarem" um dos mais evidentes sintomas das psicoses que são as alucinações. Esses efeitos são também chamados de psicodélicos - termo contestado por alguns autores, pois significa expansão da mente. Tal contestação deve-se ao fato de acreditarem que alucinação nada tem de aumento da capacidade mental; ao contrário, são aberrações, perturbações do perfeito funcionamento do cérebro. 3.5.3 Anticolinérgicos – medicamentos
Anticolinérgicos: diz-se das substâncias antagonistas da ação de fibras nervosas parassimpáticas que liberam acetilcolina. Ou seja, que inibem a produção da acetilcolina.
Aspectos históricos e culturais
As drogas anticolinérgicas podem ser sintetizadas em laboratório. É o caso de alguns medicamentos como Artane, Akneton, Bentyl e outros. Em doses elevadas, além dos efeitos no corpo, são capazes de alterar as funções psíquicas. Estes medicamentos tem utilidade terapêutica no tratamento da Síndrome de Parkinson e como antiespasmódico. Foram usados durante a Segunda Guerra Mundial por organismos militares, que viram neles um "soro da verdade", pois na aplicação parenteral levam a um estado torporoso, com especial tendência à sugestibilidade, liberando barreiras conscientes de defesa.
36
O uso não médico de substâncias anticolinérgicas, em particular Artane, mas também Bentyl, Asmosterona e outros, é mencionado no Brasil desde 1972. Lançados no mercado para o tratamento dos parkinsonianos, eles fizeram conhecer-se rapidamente nos meios iniciados no uso indevido de drogas, a começar por menores em situação de rua. Entre eles, o Artane é conhecido pelos nomes populares de "artemis", "aranha" e "buquê"; e o Bentyl por "bentinho". O uso de Artane por crianças de rua é assustador, inclusive por aplicação endovenosa. Chega a ser a terceira droga mais usada pelos meninos em situação de rua do Brasil (após os inalantes e a maconha). O abuso de anticolinérgicos, tanto das plantas como dos medicamentos, é relativamente comum no Brasil. Estas drogas, com exceção feita aos meninos em situação de rua, são usadas esporadicamente.
Efeitos físicos e psíquicos
Absorvido em quantidades maiores do que a dose terapêutica, o produto provoca alterações mentais como alucinações e delírios, com duração de 48 horas. Consumido junto com outras drogas, como inalantes e maconha, o efeito pode durar mais tempo ainda, iniciando pela sensação de "barato" na cabeça ou no corpo todo, seguida de alterações na percepção de cores/sons, terminando com sensações de estranheza, medo, confusão mental, idéias de perseguição, dificuldades de memória - síndrome que adota a forma de um surto psicótico agudo. O potencial de dependência parece elevado, com alta toxicidade, evoluindo para alterações crônicas. Os delírios e alucinações dependem bastante da personalidade da pessoa e de sua condição. As drogas anticolinérgicas são capazes de produzir muitos efeitos periféricos. Assim, as pupilas ficam muito dilatadas, a boca seca e o coração dispara. Os intestinos ficam paralisados - tanto que são usados medicamentosamente como antidiarréicos - e a bexiga fica "preguiçosa" ou há retenção de urina. Os anticolinérgicos podem produzir, em doses altas, grande elevação da temperatura - que chega, às vezes, até a 40-41 graus. Nestes casos, não muito comuns, a pessoa apresenta-se com a pele muito seca e quente com vermelhidão principalmente no rosto e pescoço. Esta temperatura elevada pode provocar convulsões. São, por isto, bastante perigosas. Existem pessoas que, também, descrevem ter "engolido a língua" e quase se sufocarem por causa disto. Ainda, em casos de dosagem elevada, o número de batimentos do coração sobe exageradamente, podendo chegar acima de 150 batimentos por minutos. Estas drogas não desenvolvem tolerância no organismo e não há descrição de sindrome de abstinência após a parada de um uso contínuo.
Nomes comerciais Akineton (substância ativa - biperideno) Uso terapêutico: Mal de Parkinson (antiparkinsoniano) Artane (substância ativa - triexafenid) Nome popular: aranha, artemis, buque Uso terapêutico: Mal de Parkinson (antiparkinsoniano) Bentyl (substância ativa - diciclomina) 37
Nome popular: bentinho Uso terapêutico: antiespasmódico Asmosterona (substância ativa - benactizina) Uso terapêutico: asma Periatin, Periavit (substância ativa - ciproheptadina) Uso terapêutico: orexígeno (produz apetite)
3.5.4 Anticolinérgicos – plantas
Anticolinérgicos: diz-se das substâncias antagonistas da ação de fibras nervosas parassimpáticas que liberam acetilcolina. Ou seja, que inibem a produção da acetilcolina.
Planta anticolinérgica (Datura)
Aspectos históricos e culturais Em 1866, um médico na Bahia descreveu um quadro apresentado por dois escravos: "Fui chamado a visitar estes doentes no dia seguinte, às 8 horas da manhã. Já podiam caminhar, mas estavam trôpegos e alucinados, vendo objetos imaginários, fantasmas, ratos a passear pela câmara, etc., de que procuravam fugir dirigindo-se para a porta. Ambos tinham as pupilas dilatadas (...), a boca e fauces nada ofereciam de notável (...). Na panela que servira para fazer o cozimento, estavam dois ramos com muitas folhas e algumas flores rudimentares, de uma planta que reconheci ser a trombeteira (Datura arbórea, Lin)". Em 1984, um jovem advogado de São Paulo narrou sua experiência, após ingerir chá de saiabranca: "Os sintomas iniciam-se cerca de 10 minutos mais tarde com queixas de não enxergar direito, vendo tudo embaraçado e fora de foco. As pupilas estão totalmente dilatadas. Seguem-se alucinações terrificantes, visão de animais e plantas ameaçadoras, cadáveres de índios, pessoas etc. Algumas horas mais tarde relata que perdeu o pulso e engoliu a língua sendo levado para o prontosocorro". Além dos medicamentos, as drogas anticolinérgicas podem ser de origem vegetal. Neste caso, a planta Datura arbórea sintetiza substâncias (atropina e/ou escopolamina) que produzem efeitos anticolinérgicos.
Efeitos físicos e psíquicos
Esta droga é capaz de produzir muitos efeitos periféricos. Assim, as pupilas ficam dilatadas, a boca seca e o coração pode disparar. Provoca retenção de urina e paralisia das funções intestinais. Produz delírios e alucinações, que dependem da personalidade e sensibilidade de quem ingeriu a substância. Esta droga não desenvolve tolerância no organismo e não há descrição de síndrome de abstinência. Em doses elevadas podem produzir grande elevação da temperatura (apresentação da pele muito seca e quente com vermelhidão principalmente no rosto e pescoço) que pode provocar
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convulsões. O número de batimentos cardíacos sobe exageradamente, podendo chegar até acima de 150 batimentos por minuto.
Nomes populares: lírio, zabumba, trombeta, trombeteira, cartucho, véu de noiva, saia branca (substancia ativa - atropina, escopolamina) Uso terapêutico: não reconhecido
3.5.5 Maconha
Aspectos históricos e culturais
Maconha é o nome dado a uma planta chamada cientificamente de Cannabis sativa, conhecida há séculos e que cresce naturalmente em várias partes do globo podendo ser facilmente cultivada e encontrada em todos os continentes. Seu plantio foi incentivado durante muitos séculos devido à utilização de seus talos para a fabricação de cordas, fibras têxteis, palitos e até papel. Todavia, é das folhas, bem como de seus topos floridos, que se extrai a substância ativa THC Delta-9Tetrahidrocanabinol. Os produtos da Cannabis sativa podem ser consumidos por via pulmonar (fumada) ou por via oral (comidos), como ocorre nas populações indígenas. Originária da Ásia Central, seus primeiros registros históricos são de mais de 200 anos a.C. na China, no Egito e na Índia. No segundo milênio a.C. era empregada com fins terapêuticos na China e descrita pelo imperador Shen Nung como analgésico. Seu emprego medicinal corresponde a uma longa tradição entre povos africanos e asiáticos, mas também já era utilizada como desinibidora: os gregos a usavam para liberar do corpo gases intestinais e para dor de ouvido; e os indianos, há 1000 anos a.C. a utilizavam para "libertar a mente de coisas mundanas". Seu consumo é tradição secular em alguns países, principalmente naqueles onde o consumo de álcool é proibido. Parece ter sido introduzida nas Américas pelos espanhóis, que fizeram as primeiras plantações no Chile, no século XVI. O hábito de fumar ou ingerir folhas e sementes da Cannabis é antigo, vinculado a práticas religiosas de muitos povos. Na segunda metade do século XIX, escritores e intelectuais franceses fornecem as primeiras descrições do uso recreativo desta preparação no Ocidente. Há séculos ele fazia parte do arsenal de medicina popular em vários países e, ao final do século XIX, fez parte de vários medicamentos produzidos por respeitáveis laboratórios farmacêuticos dos Estados Unidos. Era indicada como analgésico, antiespasmódico e dilatador dos brônquios. O interesse médico pela Cannabis diminui no início do século XX em detrimento da morfina e dos barbitúricos, que ofereciam melhores resultados. Hoje em dia, seu emprego terapêutico é quase nenhum, mas atualmente, em função de pesquisas recentes, é reconhecida como medicamento em pelo menos duas condições clínicas: reduz ou abole as náuseas e vômitos produzidos por medicamentos anticâncer, e tem efeito benéfico em alguns casos de epilepsia. Em algumas partes da Ásia, os médicos ainda a utilizam no tratamento de algumas afecções. 39
Considerada como "droga da moda" nos anos 60, no auge da contestação hippie (junto com o LSD-25), a maconha continua a ser muito fumada até hoje, em particular nas faixas jovens, mas perdeu o seu destaque em favor dos inalantes, nas classes desfavorecidas, e da cocaína, nas classes média e alta. Na Jamaica seu uso é popular. Conhecida como "ganja", é facilmente cultivada e produzida, embora o seu consumo seja considerado ilegal. Certas seitas atribuem-lhe poderes místicos e divinos, especialmente o de afastar os maus espíritos. O operário jamaicano encontra na ganja energia para trabalhar e relaxamento após o trabalho; oferece a droga, mesmo aos filhos, para que fiquem "mais inteligentes". Nessa população, fumar a ganja é um rito e não um fator de alienação ou desintegração social: seu uso constitui um complexo de crenças, atitudes e costumes compartilhados por toda a comunidade. Porém, há diferença entre as classes sociais. Na população de baixa renda, a criança aprende a usar a erva muito cedo, sendo possível que se coloque chá de "ganja" até nas mamadeiras. Nas classes média e alta, no entanto, a droga é condenada, mas os adolescentes a fumam, expressando, assim, a sua oposição à geração adulta. Ela se tornou, portanto, um símbolo de curiosidade, prazer ou mesmo revolta. O haxixe é uma substância mais ativa, extraída da própria maconha. Enquanto a maconha contém 1% de THC, o haxixe contem até 14%. Pouco comum entre nós, é habitualmente reduzido a pó e misturado ao tabaco normal para ser fumado em cachimbo. É, em sua maior parte, produzido no norte da África, Paquistão, Nepal, Líbano e Turquia, sendo contrabandeado para os Estados Unidos e Europa, onde seu preço é elevado. A faixa da população que usa o haxixe é a mesma que usa a maconha, mas observa-se que a maconha é mais comum entre aqueles que estão iniciando-se no hábito ou que o fazem esporadicamente. O haxixe é mais encontrado entre aqueles já iniciados e fumantes contumazes, que necessitam doses mais potentes da droga. É moldado em pequenas barras ou bolos de cor marrom escura e seu óleo é bem mais potente. Diz-se que a palavra assassino parece originar-se do árabe "hashishin", designação dada a uma tribo do norte da Pérsia, na Idade Média, por volta do século XI, povoada por homens guerreiros altamente perigosos e temidos por sua grande crueldade. Sabia-se que seus homens eram "motivados" pelo consumo de certa substância despersonalizante, que os impelia ao barbarismo e delitos sádicos dos mais horrendos crimes. No Brasil atribui-se a origem da maconha aos escravos africanos trazidos para cá, sendo inicialmente utilizada por índios e negros - o que talvez justifique a associação de seu nome à marginalidade, mostrando que as origens dessa crença são mais culturais do que farmacológicas, já que a maconha é a droga ilícita de uso mais freqüente e alvo de muitas controvérsias, pois enquanto uns condenam seu uso, alegando que é uma porta de entrada à delinqüência, outros a inocentam. Muito consumida pela população negra, o seu uso foi muito difundido principalmente em Estados do Nordeste, como Bahia e Maranhão, onde até hoje existe um uso recreativo a nível popular. Do ponto de vista médico não há unanimidade, mas a maioria dos trabalhos leva a concluir que a maconha é uma droga que não causa dependência física e cujos malefícios não seriam maiores do que aqueles provocados pelo álcool e pelo tabaco. 40
Um Pouco sobre a cannabis sativa (Tetra-hidro-canabiol): Maconha é o nome popular de um grupo de plantas arbustivas de origem asiática (talvez nativas da Índia), cujo nome científico é cannabis. Todas as plantas do gênero cannabis contém canabióis, substâncias químicas responsáveis pelos efeitos psicotrópicos. O principal canabiol é o Delta-9-THC (tetrahidrocanabiol), também conhecido por THC. Este, responsável pelas "viagens" do usuário. Outros canabióis presentes na maconha também podem ter efeitos psicotrópicos ou até mesmo intensificar o efeito do THC. Sabe-se que as plantas de maconha podem ser femininas (só produzem flores femininas) ou masculinas (só produzem flores masculinas). As plantas femininas possuem concentração muito maior de THC. Existem 3 tipos diferentes de plantas da maconha ou cannabis: a sativa, a indica e a ruderalis. Elas diferem no seu formato das folhas e no porte. As 3 espécies possuem THC, e os climas em que são cultivadas podem alterar a quantidade e a potência das substâncias ativas que possuem. a espécie de cannabis mais cultivada para uso psicotrópico na América é a cannabis sativa, que foi trazida pelos europeus para serem utilizadas na produção de fibras têxteis e cordas. Essa espécie possui baixo teor de THC (1% no conjunto de substâncias da resina).
Tipos de Maconha:
Numa mesma planta a concentração dos agentes ativos variam de acordo com a parte utilizada. Nas extremidades como a folha encontra-se as maiores concentrações. a maconha é preparada de várias formas: "fumo", sem semente, haxixe, óleo de haxixe e cristais de haxixe. "Fumo” - preparado com folhas, talo e sementes, é triturado e transformado em cigarro. Essa forma possui teor de THC entre 1% e 2%. Maconha sem semente - costuma ser prensada e vendida como "tijolos", triturados antes do uso; chega a conter até 6% de THC e provém da espécie Cannabis indica. Na américa costumase prensar a maconha comum (sativa) e vendê-la como importada para ser cobrada mais cara. Haxixe - obtido das flores femininas secas e folhas com bastante resina, chega até um teor de 8% de THC. Óleo de Haxixe - o óleo - ou resina - extraído da planta por processos industriais e chega a conter de 15% a 40% de THC. Cristais de Haxixe - também obtido de processos industriais, os cristais de canabiol possuem até 60% de THC.
Estes valores variam de acordo com a forma do seu beneficiamento. Tem-se encontrado nas ruas geralmente um valor um pouco abaixo dos apresentados acima.
41
A Química da Maconha:
A composição química das
CH3
maconha é mais complexa que da
OH
maioria das outras drogas. Existem mais de quatrocentas combinações químicas psicotrópicas classificadas
H3C
em dezoito categorias diferentes. Quando
a
maconha
é
O CH3
são transformadas em outras pela maconha
vendida
CH2 CH2
CH2 CH3
Maconha Tetra-hidro-canabiol (THC)
fumada, algumas de suas substâncias
combustão. A
CH2
na
rua
é
muitas
misturada
com
impurezas (como
excremento bovino) e restos de outras plantas que podem conter venenos ou substâncias que se tornam venenosas com as transformações da combustão. Foram identificados mais de 150 componentes na fumaça da maconha. Um deles, chamado benzopireno, é 70% mais abundante na fumaça desta droga que no tabaco e é reconhecidamente cancerígeno. Como o tabaco, a maconha contém monóxido de carbono, ácido cianídrico e nitrosaminas, que são substâncias tóxicas. A maconha ataca principalmente o aparelho respiratório, causando sinusite, laringite, inflamações e predispõe ao câncer do aparelho respiratório. Causa problemas no aparelho circulatório que se caracteriza ao aumento dos batimentos cardíacos. Os efeitos da droga se assemelham aos do stress. Para acelerar seu ritmo e bater mais forte e com maior freqüência, o coração necessita de quantidades adicionais de oxigênio. Mas o pulmão cheio de fumaça de maconha aumenta o teor de monóxido de carbono no sangue, reduzindo a quantidade de oxigênio que chega ao coração. Assim, num momento em que o coração está sob o esforço extra e necessite de mais oxigênio, ele acaba recebendo menos do que obteria normalmente. Esta situação pode ser tolerada por uma pessoa com coração normal, mas não por uma pessoa que sofre de algum tipo de doença cardiovascular, como pressão alta. A maconha também ataca o sistema imunológico, que é constituído por algumas células brancas (linfócitos) e por que se espalham por todo o organismo e combatem invasores que nele penetram. O uso freqüente da maconha reduz a atuação e a quantidade de um tipo vital de célula de defesa, os linfócitos T ou células T (as mesmas que são atacadas pelo vírus da AIDS).
Usos medicinais da maconha:
Devido a ontogenia, a cannabis
CH3
apresenta três metabólitos secundários em três diferentes fases de sua vida.
OH
Quando temos a planta nova, ela produz apenas a substância conhecida como
canabidiol,
que
possui
HO
efeito
antibiótico. O THC só existe na planta com meia vida ou adulta, e tem afeitos
H3C
CH2
CH2
CH2 CH2
CH2 CH3
Canabidiol - Planta Jovem 42
alucinógenos. Por fim, a planta já velha não produz nenhuma substância que tenha algum efeito biológico.
CH3
CH3 OH
H3C
O CH3
CH2
CH2 CH2
CH2
Maconha Tetra-hidro-canabiol (THC)
CH3
H H
O
CH2
CH2 CH2
CH2 CH3
Planta Velha
Os efeitos medicinais da planta ainda estão sendo estudados por vários pesquisadores. Eles não tem um resultado concreto sobre seu uso, portanto o uso da maconha não está liberado para usos medicinais.
Efeitos físicos e psíquicos
Podem ser físicos (ação sobre o próprio corpo ou parte dele) e psíquicos (ação sobre a mente). Esses efeitos sofrerão mudanças de acordo com o tempo de uso que se considera. Ou seja, os efeitos são agudos (isto é, quando ocorrem apenas algumas horas após fumar) e crônicos (conseqüências que aparecem após o uso continuado por semanas, meses ou mesmo anos). Os efeitos físicos agudos são muito poucos: os olhos ficam meio avermelhados, a boca fica seca e o coração dispara (de 60-80 batimentos por minuto pode chegar a 120-140 ou até mais). Os efeitos psíquicos agudos dependerão da qualidade da maconha fumada e da sensibilidade de quem fuma. Para uma parte das pessoas, os efeitos são uma sensação de bemestar acompanhada de calma e relaxamento, de diminuição da fadiga e vontade de rir. Para outras pessoas, os efeitos são mais desagradáveis: sentem angústia, ficam aturdidas, temerosas de perder o controle da cabeça, trêmulas e suando. É o que, comumente, chamam de "má viagem". Há ainda evidente perturbação na capacidade da pessoa calcular tempo e espaço, e um prejuízo da memória e atenção. Aumentando-se a dose e/ou dependendo da sensibilidade, os efeitos psíquicos agudos podem chegar até a alterações mais evidentes, com predominância de delírios e alucinações. O delírio é uma manifestação mental pela qual a pessoa faz um juízo errado do que vê ou ouve. Neste caso, há mania de perseguição (delírios persecutórios). A mania de perseguição pode levar ao pânico e, consequentemente, a atitudes perigosas ("fugir pela janela", agredir as pessoas em "defesa" antecipada contra agressão que julga estar sendo tramada). Já a alucinação, que é uma percepção sem objeto, pode ter fundo agradável ou terrificante. Os efeitos físicos crônicos da maconha são maiores. Com o continuar do uso, vários órgãos do corpo são afetados. Os pulmões são um exemplo disso, levando a problemas respiratórios (bronquites), como ocorre também com o cigarro comum. Porém, a maconha contém alto teor de alcatrão (maior que no cigarro comum) e nele existe uma substância chamada benzopireno, conhecido agente cancerígeno. Ainda não está provado cientificamente que a pessoa que fuma
43
maconha cronicamente está sujeita a contrair câncer dos pulmões com maior facilidade. Mas, os indícios de que assim possa ser são cada vez mais fortes. Outro efeito físico indesejável do uso crônico da maconha refere-se à testosterona, ou hormônio masculino. Já existem muitas provas de que a maconha diminui em até 50-60% a quantidade de testosterona. Em conseqüência, o homem apresenta um número bem reduzido de espermatozóides no líquido espermático, o que leva a uma infertilidade. Este efeito desaparece quando a pessoa deixa de fumar a planta. É também importante dizer que o homem não fica impotente ou perde o desejo sexual, ele fica somente estéril. Há ainda os efeitos psíquicos crônicos da maconha. Sabe-se que o uso continuado da maconha interfere na capacidade de aprendizagem e memorização e pode induzir um estado de amotivação. Além disso, a maconha pode levar algumas pessoas a um estado de dependência, isto é, elas passam a organizar sua vida de maneira a facilitar o uso da maconha, sendo que tudo o mais perde o seu valor.
Sensações provocadas pela maconha/haxixe.
A maconha tem um efeito relaxante, causando uma sensação de liberdade total. Provoca uma sensação de falsa sabedoria, dando a impressão de que só o usuário e sua turma sabem sobre todas as coisas do mundo. Pode gerar euforia e hilaridade, fazendo com que se ache qualquer coisa engraçada e além de perda do sentido de tempo, despersonalização e pânico.
Danos provocados pela maconha/haxixe.
Estudos em animais mostraram alterações morfológicas nas sinapses, além de perda neuronial no hipocampo. É a droga mais desmotivante que existe, e o usuário não consegue assistir às aulas, trabalhar ou levantar da cama, ficando "desencanado". Provoca um déficit na atenção auditiva, isto é, tem-se a impressão de que o usuário ouve mas não ouve. Compromete as funções necessárias ao aprendizado, como a percepção, memória, atenção, capacidade de concentração e os processos associativos, com danos sutis à organização e integração de informação complexa. Pode provocar surtos psicóticos e aumento do risco de acidentes. Também provoca diminuição do apetite sexual(que às vezes é substituído pela droga sem que o usuário perceba) e esterilidade temporária. Danos na traquéia e brônquios. Nomes mais conhecidos: maconha, haxixe, cânhamo, bangh, ganja, diamba, marijuana, marihuana.
Nomes populares: baseado, erva, tora, beise, fumo, bagulho, fininho.
44
3.5.6 Daime
Aspectos históricos e culturais
O Daime é um chá extraído de duas plantas alucinógenas: do "cipó da vida" (Banisteriopsis Caapi) e de uma folha (Psychotria Viridis). Há referências, também, da utilização da planta Chacrona. Essas plantas, das quais se produz o chá, são utilizadas no ritual do Santo Daime ou do Culto da União do Vegetal e várias outras seitas. O cipó dá "força" e a folha, "luz". Estes rituais são bastantes difundidos no Brasil e cultuam as forças e os deuses das florestas. São praticados nas
H
regiões Norte, (Amazônia e Acre), como também na região Centro Oeste, nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro.
N
O ritual tem origem na sociedade das populações indígenas e mestiças da Amazônia Ocidental. Seu uso veio dos índios da América do Sul. O Daime é utilizado para rituais mágicos e religiosos,
CH3
C C N H2 H2 CH3 DMT
para receber orientação divina, para comunicar-se com os espíritos que animam as florestas e, também, para determinar a causa de moléstias e cura, bem como produzir interação social através do ritual. As alucinações provocadas pelo chá são chamadas de "mirações". Uma das substâncias sintetizadas por essas plantas é a DMT - Dimetil-triptamina, responsável pelo seus efeitos.
Efeitos físicos e psíquicos Provoca dilatação das pupilas, suor excessivo, taquicardia, náuseas e vômitos. Perda da discriminação espaço-temporal, ilusões, alucinações e delírios.
Não há desenvolvimento de tolerância; comumente, não induz à dependência e não ocorre síndrome de abstinência.
Nomes populares: Natema, Yajé, Nepe, Caapi. É mais genericamente conhecida pelos índios Quechuas como "Ayahuasca" (ou huasca, ou hoasca), que significa "cipó dos espíritos" e "vinho da vida".
Uso terapêutico: foi demonstrado cientificamente que os efeitos desse chá têm eficácia no combate a vermes e protozoários.
45
3.5.7 Cacto (Peyote)
Aspectos históricos e culturais
Utilizado desde remotos tempos na América Central, em rituais religiosos indígenas, é originário desta mesma região. Este cacto mexicano (Lopophora williansi), que não existe no Brasil, produz a substância alucinógena mescalina. Peyote é seu nome popular, de origem asteca, que significa "planta divina". Carlos Castanheda, em seu livro "A Erva do Diabo", fala de uma experiência com o mescalito: "Abriu a tampa e entregou-me o
CH3O CH3O CH3O
CH2 CH2 CH3
Mescalina
vidro: dentro havia sete artigos de aparência estranha. Eram de tamanhos e consistência variados. Ao tato, pareciam a polpa de nozes ou superfície de cortiça. Sua cor acastanhada os fazia parecer cascas de nozes duras e secas." Era - e ainda é - empregado e venerado como amuleto, panacéia (remédio para todos os males) ou alucinógeno, nas regiões montanhosas do México, bem antes da chegada dos conquistadores espanhóis. Por certos índios, era utilizado como remédio ou para visões que permitissem profecias. Ingerido em grupo pode servir como indutor de estados de transe durante certas atividades rituais. Os astecas o mascavam durante festividades comunitário-religiosas. O mescalito é considerado como protetor espiritual, pois acredita-se que ele aconselha e responde a todas as perguntas que você fizer.
Efeitos físicos e psíquicos Dilatação das pupilas, suor excessivo, taquicardia, náuseas e vômitos. Alucinações e delírios. Essas reações psíquicas são variáveis; às vezes são agradáveis (boa viagem) ou não (má viagem), onde podem ocorrer visões terrificantes, como sensações de deformação do próprio corpo. Não há desenvolvimento de tolerância, não induz à dependência e não ocorre síndrome de abstinência com o cessar do uso.
Nomes populares: peyote, peyotl, peiote, mescal, mescalito.
Uso terapêutico: não reconhecido.
46
3.5.8 Cogumelo
Aspectos históricos e culturais
Seu uso ritual é bastante antigo no México, onde ficou famoso, sendo utilizado pelos nativos daquela região desde antes de Cristo. Sabe-se que o "cogumelo sagrado" atualmente ainda é utilizado por bruxos, em seus rituais, e por alguns pajés. É chamado pelos índios astecas do México de "carne dos deuses", sendo considerado sagrado por certas tribos. Tem o nome científico de "Psylocybe mexicana" e dele pode-se extrair uma substância com forte poder alucinógeno: a psilocibina. No Brasil, temos pelo menos duas outras espécies de cogumelos alucinógenos: o "Psylocibe cubensis" e a espécie do gênero "Paneoulus". Um caso real conta: "Um jovem arquiteto coleta vários cogumelos. Prepara-os num liquidificador, com leite e leite condensado. Guarda essa mistura na geladeira de sua casa. Mais tarde, com grande sentimento de culpa, depara com sua avó, que bebera a mistura pensando tratarse de batida de frutas ou vitamina, meio aterrorizada na sala de visitas, com a TV ligada, e discutindo amargamente com os personagens da novela - que haviam “saído” da TV e estavam pela sala."
Efeitos físicos e psíquicos
Os sintomas físicos são poucos salientes. Podem aparecer dilatação das pupilas, suor excessivo, taquicardia, náuseas e vômitos. Não há desenvolvimento de tolerância. Também não induzem dependência e não ocorre síndrome de abstinência. Produzem alucinações e delírios. Estes efeitos são maleáveis e dependem de várias condições, como personalidade e sensibilidade do indivíduo. As alucinações podem ser agradáveis. Em outras ocasiões, os fenômenos mentais podem ser desagradáveis (visões terrificantes, sensações de deformação do próprio corpo). Pode também provocar hilaridade e euforia. Um dos problemas preocupantes deste alucinógeno, bem como da Datura, Daime, Peyote e o LSD-25, é a possibilidade, felizmente rara, da pessoa ser tomada de um delírio persecutório, delírio de grandeza ou acesso de pânico e, em virtude disto, tomar atitudes prejudiciais a si e aos outros.
Nomes populares: chá, cogú.
Uso terapêutico: não reconhecido
47
3.5.9 LSD-25
Aspectos históricos e culturais
O LSD-25 (abreviação de Dietilamida do Ácido Lisérgico), é
uma
substância sintética fabricada em laboratório. Foi descoberto em 1943 por um cientista suíço, Albert Hoffman, que estudava alcalóides (substâncias encontradas nos vegetais) extraídos de fungos que atacam o centeio e cereais. Este cientista trabalhava com os alcalóides da ergotina, sobretudo a Dietilamida do Ácido Lisérgico, substância que ele próprio, cinco anos antes (1938), havia composto a partir da associação
OH N LSD - 25
experimental da Dietilamida do Ácido Lisérgico-25 e cuja fórmula final resultou no tratamento de destro-dietilamida do ácido lisérgico-25 (este nome indica que, além da combinação química básica, a droga desvia a luz polarizada para a direita - destro -, é solúvel na água e foi a vigésima quinta de uma série de anotações experimentais). Seu interesse pela ergotina baseava-se numa expectativa gerada desde a Idade Média, a propósito de uma peste que era conhecida, devido ao excessivo ardume que provocava na pele, como "fogo sagrado" ou "fogo de Santo Antão" - causada pelo contato direto com um fungo (um cogumelo conhecido popularmente por Ergot e que comumente cresce atado à planta do centeio). Esta substância foi ingerida acidentalmente pelo cientista, ao aspirar pequeníssima quantidade de pó, num descuido de laboratório, provocando estranhos efeitos como distorções visuais, perceptuais e alucinações. Eis o que ele descreveu: "Os objetos e o aspecto dos meus colegas de laboratório pareciam sofrer mudanças ópticas. Não conseguindo me concentrar em meu trabalho, num estado de sonambulismo, fui para casa, onde uma vontade irresistível de me deitar apoderou-se de mim. Fechei as cortinas do quarto e imediatamente caí em um estado mental peculiar semelhante à embriaguez, mas caracterizado por uma imaginação exagerada. Com os olhos fechados, figuras fantásticas de extraordinária plasticidade e coloração surgiram diante de meus olhos." Em 1960, apareceram os primeiros relatos do uso do LSD-25 entre jovens e adultos, influenciados pelo movimento hippie. Em 1968, o LSD-25 foi proibido, mas continuou sendo produzido em laboratórios clandestinos. Normalmente, o LSD-25 é encontrado em minúsculos pedaços de papel, "selos" embebidos da substância. Esporadicamente sabe-se do uso de LSD-25 no Brasil, principalmente por pessoas das classes mais favorecidas. O Ministério da Saúde do Brasil não reconhece nenhum uso terapêutico do LSD-25 (e de outros alucinógenos) e proíbe totalmente a produção, comércio e uso do mesmo no território nacional.
48
Efeitos físicos e psíquicos
O LSD-25 produz uma série de distorções no funcionamento do cérebro, alterando as funções psíquicas. Tais alterações dependem muito da sensibilidade da pessoa, do seu estado de espírito no momento em que tomou a droga e do ambiente em que se deu a experiência. As alucinações, tanto visuais quanto auditivas, podem trazer satisfação (boa viagem) ou deixar a pessoa extremamente amedrontada (má viagem, "bode"). Outro aspecto refere-se aos delírios. Estes são chamados juízos falsos da realidade, isto é, há uma realidade, um fato qualquer, mas a pessoa delirante não é capaz de avaliá-lo corretamente, podendo desencadear também estados psicóticos como pânico e sentimentos paranóicos. O LSD-25 produz poucos efeitos no resto do corpo. A pulsação pode ficar mais acelerada, as pupilas podem ficar dilatadas, além de ocorrer sudoração e certa excitação. São raros os casos de convulsão. Mesmo as doses muito fortes não chegam a intoxicar seriamente a pessoa do ponto de vista físico. Não leva comumente a estado de dependência e não há descrição de síndrome de abstinência. A tolerância desenvolve-se muito rapidamente, mas também há desaparecimento rápido da mesma com o parar do uso. O perigo do LSD-25 está no fato de que, pela perturbação psíquica, há perda da habilidade de perceber e avaliar situações comuns de perigo. Há descrições de casos de comportamento violento e de pessoas que, após tomarem o LSD-25, passaram a apresentar por longos períodos depressão ou mesmo acessos psicóticos. O "flashback" é uma variante dos efeitos a longo prazo - semanas ou até meses após a sua utilização, a pessoa passa repentinamente a ter todos os sintomas psíquicos daquela experiência anterior, sem ter tomado de novo a droga.
Nomes populares: ácido
Uso terapêutico: nenhum
3.5.9 ECSTASY
Princípio ativo
O princípio ativo do ecstasy é o mesmo do LSD, a Metilenodioxidometaanfetamina (MDMA). Sua forma de consumo é por via oral, através da ingestão de
um
comprimido.
Os
usuários
O
CH2 CH2 N CH3 H
O
Ecstasy
normalmente
consomem o ecstasy com bebidas alcoólicas, o que intensifica ainda mais o efeito e agrava os riscos.
Efeitos
Os principais efeitos do ecstasy são uma euforia e um bem-estar intensos, que chegam a durar 10 horas. A droga age no cérebro aumentando a concentração de duas substâncias: a 49
dopamina, que alivia as dores, e a serotonina, que está ligada a sensações amorosas. Por isso, a pessoa sob efeito de ecstasy fica muito sociável, com uma vontade incontrolável de conversar e até de ter contato físico com as pessoas. O ecstasy provoca também alucinações. Os malefícios causados pela droga ao corpo do usuário são ressecamento da boca, perda de apetite, náuseas, coceiras, reações musculares como caimbras, contrações oculares, espasmo do maxilar, fadiga, depressão, dor de cabeça, visão turva, manchas roxas na pele, movimentos descontrolados de vários membros do corpo como os braços e as pernas, crises bulímicas e insônia. A principal causa de óbitos dos consumidores da droga é o aumento da temperatura corpórea que ele provoca no usuário. A droga causa um descontrole da pressão sangüínea, que pode provocar febres de até 42 graus. A febre leva a uma intensa desidratação que pode causar a morte do usuário do ecstasy. Associado a bebidas alcoólicas, o ecstasy pode provocar um choque cardiorrespiratório.
Histórico
O ecstasy é uma droga relativamente nova e, diferentemente de drogas como a cocaína e a maconha, só foi sintetizada pela primeira vez já neste século. A primeira notícia que se tem da droga é de 1912, quando foi sintetizada pela primeira vez por um laboratório alemão. Sua primeira utilidade foi medicinal, em sessões de psicoterapia, e como um inibidor de apetite. Nomes populares: ecstasy
Uso terapêutico: nenhum
4 Visão Geral das Drogas 4.1 O poder de cada droga Características de cada substância, nos Estados Unidos, em 2001 Substâncias Nicotina Heroína Cocaína Sedativos* Estimulantes* Maconha Alucinógenos Analgésicos* Álcool Tranqüilizantes* Inalantes
Acessibilidade Poder de vício**
Letalidade
Precocidade***
Grande
80
Alta
15,5
Pequena
35
Média
19,5
Média
22
Alta
21,9
Média
13
Média
19,5
Média
12
Alta
19,3
Média
11
Baixa
18,4
Grande
9
Baixa
18,6
Média
7
Média
21,6
Grande
6
Média
17,4
Média
5
Média
21,2
Grande
3
Média
17,3
* Uso não-médico de substâncias psicoativas ** % de usuários que se tornam dependentes ***idade do primeiro uso, em anos Fonte: Pesquisa Doméstica Nacional sobre Uso de Drogas 2001, do Departamento de Saúde dos Estados Unidos - Revista Super Interessante
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5 Contexto Social 5.1 Causas do uso
Muitos podem ser os motivos que levam um jovem para o mundo das drogas. Entre eles, a procura de um prazer que para o jovem representa o êxtase, a euforia. Muitas vezes é a fuga de uma realidade difícil de lidar à nível consciente. Como consciências psicológicas, há todo um transtorno comportamental e um prejuízo das atividades como: estudo, trabalho, convivência com as pessoas devido a mudanças de humor. Além do fato que o uso de drogas acarreta, com o tempo, danos às estruturas cerebrais. A família fica desesperada. Muitas vezes não sabem como lidar com o jovem e há atritos graves entre membros da família. Há uma forte perturbação emocional, o que necessitaria de um trabalho orientado de um profissional. A família teria que fazer um trabalho no sentido de se fortalecer do ponto de vista emocional para com isso poder ajudar a pessoa envolvida com drogas, e este precisaria de um acompanhamento psicológico com o objetivo de fortalecer a auto-estima e conseqüentemente se livras das drogas. Fica difícil dizer o que é certo e o que não é, quem é bandido e quem é mocinho, onde está o bem e o mal. Mas não dá para fugir da realidade. DROGA é uma coisa perigosa e muita gente se arrasa por causa dela. O assunto está ai: na TV, nos jornais, na rua, na escola, na casa do lado e, talvez, na sua. Finge que não é com você é um péssimo jeito de se prevenir. Considerando o tráfico, o número de crimes, problemas de saúde e todas as vidas que são arruinadas pela droga, dá uma imensa vontade de ser radicalmente contra elas. Mas nesses campo é muito difícil ser radical. A distância entre beber um copo de cerveja gelada num dia de calor e morrer de cirrose hepática é enorme. Tão grande quanto a que existe entre fumar maconha uma vez na vida e morrer de overdose. Seria inútil exterminar todas as substâncias que podem ser usadas como droga porque são muitas. E não esqueça que droga é sinônimo de remédio e a mesma coisa que mantém a vida de monte de pessoas pode deixar outras viciadas. Proibir não é a solução. Fingir que o problema não existe ou acontece apenas com os outros resolve muito menos. Diante desse impasse, não vá saindo como quem não tem nada com isso. Viciado não é só gente doida, barra pesada, marginal ou pavorosa Muita gente bonita, elegante e sincera como você acaba se viciando às vezes por brincadeira. As fronteiras entre o certo e o errado são invisíveis e, assim, ninguém sabe mostrar o comportamento ideal a ser adotado. O que se sabe é que as drogas são um risco enorme. 73,9% dos estudantes de escolas públicas de 10 capitais brasileiras já experimentaram algum tipo de drogas. 76% dos portadores do vírus da AIDS entre 11 e 19 anos contraíram a doença por meio das drogas intravenosas. Já te ofereceram alguma droga? 33% dos entrevistados de 10 a 12 anos, 49% dos de 13 a 15 anos e 67% entre 16 e 18 anos responderam sim. "Comecei fumando uns baseadinhos em festas, tomando umas bebidinhas. Eu sempre achei que era forte para lidar com as drogas. Então eu alternava uma época careta, uma época chapado. Para 51
tentar me enganar, eu tentava trocar a dependência por álcool mas não adiantava. Eu estava sofrendo. Eu estava fugindo de um problema que vinha desde a adolescência: admitir que a droga era mais forte que eu. Uma hora me dei conta que ou todo mundo se afasta de você ou você acaba numa overdose. Três amigos meus morreram, dois de overdose e outro que injetou na veia pó de mármore comprado como cocaína. Eu optei pela vida. Estou brigando com unhas e dentes. Eu queria que alguém tivesse me dito: não tenta nem experimentar. Eu achava que careta era otário. Mas não é nada disso: os malucos é que são otários." C. 34 anos.
5.2 Os motivos e diferenças de classe entre os Jovens que procuram as drogas
Classe Média e Alta
Os jovens dessa classe entram no mundo das drogas por diversos motivos; seja por influencia de alguém, para ser aceito em um determinado grupo, por curiosidade, vontade de mostrar que é capaz de seguir seus caminhos, de querer experimentar todas as coisas da vida, altas emoções, revolta com os pais, para acabar com inibição, enfim, muitos motivos que os levam à droga.
Muitos motivos levam a este beco quase sem saída: 1. Influência de amigos que usam drogas é muito importante, pois, na adolescência, o grupo é muito importante e, querendo ou não, fazem coisas semelhantes para se identificarem.
2. Com as drogas as noites são mais divertidas, fogem a realidade e, assim começa a cumplicidade entre eles. Mesmo quando o jovem quer parar é muito difícil. Seu círculo de amizade está ligado à droga e para de usá-la é uma ameaça para essa "amizade". Logo é muito mais fácil continuar com a vida que parece perfeita do que recomeçar do zero e, o pior, sozinho. A droga da moda da classe média alta é o ecstasy, que dá sensação de prazer, torna o corpo leve, dá muita sede e disposição. É de mais difícil acesso para a classe média baixa ou pobre pelo seu elevado preço. A droga "quebra" as diferenças sociais, fazendo o rico subir o morro e se relacionar com pessoas de outro nível social, achando algo em comum entre eles. É o caso de meninas ricas com traficantes, de tanta gente da classe média alta nos bailes funks, pois com as drogas acham que todos têm algo em comum, só que muitas vezes é tarde demais para descobrir que os iguala é algo muito pior - a droga.
Classe Pobre -
As crianças que moram em morro convivem com todos os tipos de drogas, pois é lá no morro que se concentra o tráfico.
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- Os menores de rua desde cedo têm contato com várias drogas, e uma das mais usadas por eles é a cola de sapateiro, que inibe o apetite. Em qualquer esquina, podemos facilmente ver um ou vários meninos de rua, com uma latinha em sua mão, próxima ao seu nariz. 52
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- Os jovens pobres também usam maconha, pois além de ser "aceita" socialmente, eles a comercializam desde cedo.
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- Os pobres geralmente procuram drogas mais baratas. Quando começam a usar drogas mais caras, exemplo de cocaína e heroína, isso os leva para o mundo do crime, seja roubando ou ajudando os traficantes.
Fatores que propensa o adolescente ao uso das drogas 1. Sem adequadas informações sobre o efeito das drogas;
2. Com saúde deficiente; 3. Insatisfeito com sua qualidade de vida; 4. Com personalidade deficientemente integrada; 5. Com fácil acesso às drogas. 5.3 Como identificar um usuário “De perto, talvez ninguém seja normal' ; por outro lado, de perto, de muito perto, talvez o diabo não seja tão feio quanto se pinta. O difícil é olhar de perto; afinal a exclusão esconde o insuportável.” (Tarcísio Matos de Andrade - "A pessoa do usuário de drogas intravenosas")
Antes de identificar um usuário de drogas é necessário definir como entendemos os termos usuário e droga. Podemos dizer que identificar um usuário é tarefa muito simples: quem toma um cafezinho, bebe uma cervejinha, fuma um cigarrinho e toma um remedinho (por conta própria ou por indicação médica), é usuário de droga! Esta afirmativa pode parecer um tanto quanto estranha, afinal costumamos fazer as seguintes associações:
droga = substâncias ilícitas (maconha, cocaína etc.)
usuário = dependente (popularmente chamado de viciado, drogado etc.)
Alguns podem argumentar que as substâncias ilícitas são mais perigosas e prejudiciais do que as lícitas (álcool, cigarro etc.). Mas com base em quê? Por exemplo, o que é pior: uma pessoa usar maconha ou álcool? Se analisarmos as situações a partir da substância, já saberemos a resposta. Se tomarmos como referência o tipo de relação que o usuário mantém com a droga, a análise já será diferente. Se imaginarmos um uso constante, em quantidades relativamente altas, enfocando prejuízos orgânicos causados pelo uso crônico, síndrome de abstinência, incapacitação social e riscos de overdose, comparados entre as duas substâncias, a posição relativa das drogas, mudará drasticamente. A este respeito, Masur e Carlini no livro "Drogas: subsídios para uma discussão", fazem uma visão comparativa dos prejuízos causados a curto e a longo prazo, por cinco substâncias sobre as quais existe mais discussão: cigarro, álcool, maconha, cocaína e heroína. 53
Bem, o que estamos querendo dizer com tudo isso? Primeiro: que tudo é muito relativo. Segundo: que ao invés de nos preocuparmos em identificar um usuário seria muito mais adequado procurarmos olhar para o ser humano, ou seja, entender como ele pensa, o que sente, o que deseja, o que o preocupa, quais as suas necessidades... sem pré-julgamentos, sem preconceitos, sem medo. Mas... como disse Andrade: "O difícil é olhar de perto. Afinal a exclusão esconde o insuportável". E o insuportável é aquilo que mais intimamente, dentro de nós, evitamos ter contato. Quando suspeitamos que alguém usa droga ilícita, procuramos alternativas para lidar com a situação da melhor maneira possível. Podemos conversar com a pessoa ou solicitar a orientação de um profissional. Às vezes buscamos soluções mágicas como, por exemplo, uma lista de sinais de uso de drogas. Mas o que fazer com as informações contidas nesta lista? Mesmo que nos auxiliem a identificar um usuário, o que fazer com esta descoberta?... E, então, perguntamos: essa lista serve para quê? Muita vezes acaba sendo utilizada como pretexto para que nos tornemos detetives ou espiões capazes de invadir a privacidade do outro. Serve, portanto, como um paliativo para diminuir a angústia que se tem pelo desconhecido. E o desconhecido não se refere apenas às drogas ilícitas - embora estas despertem uma certa curiosidade, acompanhada por uma sensação de mistério decorrente do mito que se criou em torno delas - nem muito menos às lícitas, já que são aceitas socialmente e seu uso é estimulado. O desconhecido é o ser humano, com sua enorme complexidade. Somos nós mesmos. É o outro diferente de mim. Várias podem ser as causas dos sinais listados para reforçar nossa capacidade de rotular, estigmatizar e discriminar aquele que é diferente, ou seja, que foge daquilo que chamamos de normalidade. Não nos interessa, portanto, saber quais os sinais para identificar quem é usuário. Devemos nos interessar em saber o que o uso de drogas (lícita e/ou ilícita) está sinalizando. Pode, por exemplo, ser uma das respostas (às vezes a única) para problemas individuais, familiares e/ou sociais ou, ainda, uma experiência que faça parte das descobertas e do crescimento do ser humano. Assim, um uso constante de qualquer substância não deve ser ignorado nem banalizado, tal como habitualmente fazemos quando se trata das drogas lícitas. De outro lado, uma experiência com droga ilícita não deve ser tratada com pânico nem desespero. Investir no diálogo, em relações de respeito e confiança não evitará que as pessoas usem drogas (lícitas e/ou ilícitas). Porém, teremos a garantia mínima de um espaço aberto para a comunicação, o qual será útil para o encaminhamento mais adequado da questão. Afinal, quem usa drogas são os seres humanos. Portanto, como tais, devem ser respeitados em sua subjetividade e individualidade.
5.4 Estatísticas
Queira você ou não, a decisão de usar drogas não é meramente um problema individual. Enquanto a indústria de drogas "legais" como álcool e cigarro não contabiliza em seus lucros o impacto da violência, o mesmo não acontece com o comércio das drogas ilegais. Altamente lucrativo, o narcotráfico movimenta milhões de dólares por ano no mundo inteiro. O Brasil participa desse circuito, funcionando como corredor do tráfico que desembarca nos EUA e na 54
Europa. Por isso, comprar um baseado ou qualquer outra droga não pode ser um ato isolado. Alimentando o comércio ilegal, acaba atraindo jovens para o narcotráfico e fazendo o crime organizado crescer.
Veja o que representa a matemática das drogas hoje:
O comércio ilegal de drogas envolve no mundo todo US$ 400 bilhões por ano, segundo a ONU
* Pelas estatisticas da OMS, o consumo de tabaco mata anualmente quatro milhões de pessoas e pode vir a matar dez milhões no ano de 2030.
* O abuso de drogas custa aos EUA mais de US$ 80 bilhões anuais
* Os números policiais indicam que o consumo anual de cocaína no mundo chega a 6 bilhões de papelotes, o que renderia ao narcotráfico cerca de US$ 120 bilhões
* Nos últimos dez anos, cerca de 50 milhões de gramas de cocaína foram apreendidos pela Polícia Federal, o que significa por volta de R$ 2 bilhões (o número pode ser até três vezes maior, já que esse cálculo não inclui as apreensões das polícias estaduais e Forças Armadas)
* Com base nas operações contra o plantio de maconha no Nordeste, a Polícia Federal acredita que a venda da droga - da produtor ao consumidor - possa render um lucro mensal de R$ 50 milhões para o traficante, livre de todas as despesas
* Segundo o SOS Criança, em 1999, 62% dos menores de rua em São Paulo admitiram o uso de inalantes e 19% de crack
* Dos processos criminais em andamento no Rio de Janeiro em 1999, 26,6% eram ligados ao tráfico e ao uso de entorpecentes
* Os crimes relativos a entorpecentes representam 35% dos processos que correm na 2ª Vara da Infância e Juventude de São Paulo
* US$1trilhão é a estimativa de quanto o tráfico movimenta no mundo por ano
* 79,5 mil hectares são utilizados no plantio de coca na Colômbia
* US$ 25 bilhões em repressão e prevenção às drogas
* 6 bilhões de papelotes de cocaína são consumidos por ano no mundo
* R$ 700,00 é o preço do quilo da droga pura no Polígono da Maconha
* US$ 120 bilhõesé o valor estimado que o consumo de cocaína rende ao tráfico por ano
* R$ 20 mil é quanto os traficantes brasileiros lucram com cada plantação de maconha
5.5 Prevenção
O fascínio que o tema drogas vem despertando na sociedade brasileira nos dias atuais não tem paralelo em nossa história. Tratado de maneira sensacionalista pela grande imprensa, a todo momento estão no ar reportagens sobre grandes apreensões de cocaína, a guerra do narcotráfico no
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Rio de Janeiro, a discussão sobre a legalização da maconha, o crack que destrói a vida dos meninos de rua em São Paulo. Um dos aspectos desta questão porém foi relegado a um plano bem inferior a todos os outros: a prevenção ao uso de drogas. Prevenção não vende jornais, não aumenta os índices de audiência das grandes emissoras de televisão, não dá votos. Faz parte dos objetivos de todos os Conselhos de Entorpecentes do país, sejam eles municipais, estaduais ou federal, mas raras são as vezes em que as palavras elaboradas no papel transformam-se em ações. Até mesmo os livros sobre drogas evitam ou são reticentes quando o assunto é prevenção. Enquanto isto, pais e professores ficam entregues a sua própria sorte, tentando atenuar o impacto que o tema causa nos jovens. Para fazermos uma introdução sobre prevenção, escolhemos um texto cuja base foi extraída de um livreto da ABRAÇO Associação Brasileira Comunitária e de Pais para a Prevenção do Abuso de Drogas, intitulado Como a comunidade e os pais devem atuar no combate ao uso de drogas, que segue abaixo:
1. Abordagem precoce - Uma escritora americana, Peggy Mann, escreveu um livro antológico, cujo título no original é Twelve is too old (Doze anos já é tarde). Segundo a autora, deve-se começar a educar sobre as drogas mesmo as crianças de 9, 10 e 11 anos. As melhores escolas do país trabalham questões como sexo e drogas logo nas 5as séries. Quanto mais cedo for iniciado o ensino, melhor.
2. Programas educativos - Colaborar para estabelecer programas educativos permanentes sobre drogas nas escolas, ou mesmo fora delas. Tais programas devem ser destinados a crianças, adolescentes, jovens e adultos. Esses programas devem visar, inicialmente, à capacidade humana no setor, isto é, antes de educar nossos filhos, precisamos educar pais e mestres. É necessário formar multiplicadores para tal trabalho educativo.
3. Mobilização da comunidade - Mobilizar a comunidade para participar do projeto. Cada pai ou líder comunitário deve empenhar-se para a execução dos debates e palestras sobre o assunto, principalmente aqueles que visam a orientação de leigos.
4. Levantamentos estatísticos - Levantar a extensão do problema. A aplicação de questionários sigilosos, após palestras, conferências, cursos e aulas sobre drogas é uma boa medida. Os questionários devem ser preparados por especialistas neutros que não estejam envolvidos com o programa, para se evitar erros ou omissões e devem ser feitos de maneira a preservar rigorosamente o anonimato. Não devem ser aplicados aleatoriamente, mas após orientações corretas e adequadas do público alvo, procurando-se captar sua confiança para se obter respostas sinceras e confiáveis.
5. Oferta de novas atividades - Ampliar e diversificar as oportunidades, promovendo ocupações e lazer onde a droga não tenha lugar. Nesse sentido é importante oferecer uma gama variada de atividades desportivas, recreativas, culturais, científicas, serviços à comunidade e outros.
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Estimular a imaginação criadora das crianças, adolescentes e jovens, apoiando-os nessas iniciativas, é outra excelente opção.
6. Estabelecimento de metas - Estabelecer metas realistas e humanamente viáveis. Por exemplo, pode-se estabelecer como uma das metas o uso correto dos tranqüilizantes sob orientação médica, como armas terapêuticas valiosas nos casos em que são bem indicados, e não querer eliminá-los simplesmente da terapêutica. Outro exemplo é lutar para que os pais não ofereçam bebidas alcoólicas ou cigarros aos seus filhos, e não querer torná-los (os pais) totalmente abstêmios.
7. Incentivo à formação de profissionais - Arregimentar (nos programas ou campanhas de prevenção) profissionais com formação especializada (médicos generalistas, psiquiatras, psicofarmacologistas, psicólogos, assistentes sociais, farmacêuticos, bioquímicos) ou pessoas com habilitação básica em saúde, educação, serviço social e áreas afins. É importante salientar que deve ser utilizada uma linguagem próxima do público alvo.
8. 8. Cursos de preparação - Organizar cursos de extensão, congressos, seminários, simpósios, cursos de férias, cursos de especialização e outros nas diferentes áreas do abuso de drogas, a fim de preparar multiplicadores e adquirir recursos humanos no setor.
9. Estabelecimento de programas - Estabelecer com realismo os programas a serem cumpridos de modo que possam atingir realmente a população alvo. Por exemplo, não podem ser idênticos programas destinados aos menores de rua (onde o uso mais comum é o de solventes voláteis cola de sapateiro, cheirinho da loló e outros) e programas dirigidos aos alunos de escolas particulares (onde geralmente é mais comum maconha e anfetaminas, e algumas vezes a cocaína). Isto sem falar nas profundas diferenças sócio econômicas dessas populações alvo.
10. Mobilização da opinião pública - Mobilizar a opinião pública através de encontros, jornadas, seminários, concursos de slogans, cartazes, temas, frases, mensagens. Principalmente junto aos jovens. O objetivo de tais empreendimentos é destacar a gravidade do problema e retratar suas repercussões no meio social.
Esta tipo de prevenção é tecnicamente chamada de prevenção primária, e segundo a Proposta para uma Política Nacional de Drogas, elaborada pelo Conselho Federal de Entorpecentes em 1992, tem a finalidade de: a) antecipar-se ao início da experiência do uso de drogas, experiência essa - vivenciada em diferentes planos - do grupo familiar, da comunidade escolar, do meio profissional e do virtual usuário; b) b) atalhar o aprofundamento do uso experimental; evitar problemas decorrentes do uso de drogas; o abuso e a dependência, que são efeitos primários, e os efeitos secundários. 57
Antes de continuar, vamos conhecer os fatores de risco que a Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu para considerar uma pessoa mais propensa ao uso de drogas: · sem adequadas informações sobre os efeitos das drogas; · com uma saúde deficiente; · insatisfeita com sua qualidade de vida; · com personalidade deficientemente integrada; · com fácil acesso às drogas.
Em contrapartida, a pessoa com menor possibilidade de utilizar drogas seria aquela: · bem informada; · com boa saúde; · com qualidade de vida satisfatória; · bem integrada na família e na sociedade; · com difícil acesso às drogas.
Nos tópicos seguintes, vamos analisar a prevenção nos locais onde ela pode surtir melhor efeito para que o problema não se instale: em casa, na escola e no trabalho. Dicas práticas e experiências bem sucedidas serão relatadas para que você construa sua própria maneira de exercêla. Entretanto, é preciso ficar claro desde já que para que a prevenção tenha eficácia, é necessário tratar o tema sem radicalismos, cercando-se de todas as informações possíveis e observando a realidade do público a quem você está se dirigindo. · A Prevenção em Casa · A Prevenção na Empresa · A Prevenção na Escola 5.6 Sintomas – Um breve resumo
Mudanças bruscas no comportamento, Queda do rendimento escolar ou abandono dos estudos, Queda na qualidade do trabalho, inquietação, irritabilidade, insônia ou, ao contrário, depressão e sonolência, Atitudes furtivas ou impulsivas; Uso de óculos escuros mesmo sem excesso de luz, camisas de manga longa mesmo no calor; Uso de sons em alto volume; Troca do dia pela noite; Síndrome emotivacional.
Maconha: Tagarelice, excitabilidade, risadas ou depressão e sonolência. Aumento do apetite (doces), olhos vermelhos congestos, alucinações, distúrbios na percepção do tempo e do espaço.
Anfetaminas: Inquietação, excitabilidade, tagarelice constante, confusão mental, falta de apetite com emagrecimento, insônia, conduta agressiva, boca seca com irritação das narinas (secas), alucinações e dilatação da pupila.
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Cola de sapateiro: Aparência de ébrio, excitação, hilariedade, linguagem enrolada, perda de equilíbrio, olhos vermelhos, nariz escorrendo (constipado), sonolência, inconsciência.
LSD e chá de cogumelo: Alucinações, delírios, confusão mental e dificuldade de raciocínio. Risos e choros, atitudes impulsivas e irracionais. Calafrios, tremores, sudorese, pupilas dilatadas, reações de pânico com sensação de deformação no corpo e objetos.
Cocaína: Excitação, aumento da atividade, agressividade, idéias delirantes com suspeita de tudo e de todos, palidez acentuada e dilatação da pupila.
Ópio e Heroína: Estupor, analgesia, lacrimejamento, coriza, "pupila em cabeça de alfinete" sonolência.
5.7 Alguns comentários importantes "É fato muito comum as pessoas comentarem sobre qualquer fenômeno como se ele fosse um evento isolado, fechado sobre si mesmo. Geralmente ignoram que a vida é uma complexidade de causas e conseqüências." As pessoas tendem a considerar as questões de uso, abuso e dependência de drogas como algo relacionado unicamente a substância (atribuindo o "problema" às drogas - como se tivessem vida própria), ou ao indivíduo (rotulando-o de sem-vergonha, doente, desocupado, marginal, criminoso) ou a sociedade (conferindo todas as responsabilidades - e culpas - ao governo, ao traficante, à família). O uso, o abuso e a dependência de drogas não devem ser entendidos somente como uma causa ou uma conseqüência e, muito menos, como algo redutível a um fator específico. Isto ultrapassa os limites simplistas do senso comum. Suas possíveis causas e conseqüências estão referidas a uma articulação dinâmica entre as esferas biológica, psíquica e social. Assim, o ato de consumo de drogas de um indivíduo deve ser compreendido a partir: dos problemas psicológicos que ele esteja enfrentando, da tensão sócio-política e econômica que define sua sociabilidade, da propriedade farmacológica das drogas.
Cabe ressaltar que qualquer substância não tem efeitos predeterminados sobre os indivíduos. Isto varia de acordo com cada situação específica. Do mesmo modo, um dado problema psíquico ou social não conduz, necessariamente, alguém para as drogas. Tudo depende de como cada um desses fatores estão dispostos na realidade. Portanto, para diminuir o preconceito e o estigma em torno do fenômeno das drogas e de seus usuários, é fundamental que se faça uma discussão ampla e séria, tendo-se como referência a relação proveniente da interação entre o indivíduo, o meio social e a droga.
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Se considerarmos apenas um dos tópicos acima, isoladamente, estaremos fazendo uma interpretação falha e incompleta da questão.
DISTINÇÃO ENTRE USUÁRIOS DE DROGAS 5.8 Distinção entre usuários de drogas
Podemos dividir os usuários em quatro tipos:
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EXPERIMENTADORES OU OCASIONAIS: São aqueles que provam uma determinada droga movidos pela curiosidade ou por pressão do grupo (de amigos) em que se encontram no momento, e não mais voltam a usá-la. Não ocorre dependência física ou psicológica, e não apresentam nenhum transtorno se não mais usarem a droga.
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MODERADOS: São aqueles que já apresentam uma certa dependência psíquica, já apresentam certo impulso que faz com que eles procurem a droga. Dependendo do tipo de droga e do tempo de utilização, estes usuários podem já apresentar algumas alterações leves de comportamento nas áreas afetiva e familiar.
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HABITUAIS: Apresentam dependência psíquica acentuada, pois mudam seus hábitos para procurarem fornecedores de drogas (amigos ou traficantes), apresentando modificações evidentes de comportamento, mudanças de humor, criando atritos com os familiares, trocando o dia pela noite, tendo dificuldades em estabelecer ligações íntimas com as pessoas e abandonando escola, profissão, namoros, esportes, passatempos, etc.
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DEPENDENTE (VÍCIO): São aqueles que dependem da droga para sobreviver, fazem da droga seu único objetivo. Não há interesse por nenhuma outra atividade, nestes casos as alterações físicas são evidentes, são os chamados TOXICÔMANOS.
5.9 Dependência DEPENDÊNCIA: É um estado de necessidade física e/ou psíquica de uma ou mais drogas, resultante de seu uso contínuo ou periódico. A dependência pode ser: FÍSICA: É um estado anormal, produzido pelo uso repetido da droga. Com o passar do tempo, o organismo não consegue funcionar sem o uso da droga.
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PSÍQUICA: É um estado psicológico de vontade incontrolável de ingerir drogas periódica ou continuamente.
SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA: É um conjunto de sintomas que se apresenta quando o indivíduo interrompe o uso de drogas, ocorrendo um estado de mal-estar. A síndrome pode ocasionar calafrios, tremores, vômitos, náuseas, diarréia, sudorese, confusão mental, delírios, convulsões, dores generalizadas, etc.
TOLERÂNCIA: É a adaptação do organismo ao consumo da droga, obrigando o usuário a aumentar a dosagem para obter os mesmos resultados. Pode ocorrer a tolerância cruzada, isto é, quando uma determinada droga confere ao organismo a tolerância a outras drogas. SINERGISMO: É a soma ou potencialização dos efeitos de certas drogas semelhantes ou diferentes, como por exemplo a ingestão de barbitúricos e/ou álcool.
5.10 O que é adicto?
De repente você topa com uma palavra desconhecida. O que é Adicto? Um adicto é simplesmente aquela pessoa cuja vida é controlada pelas drogas. Sua vida e seus pensamentos são centrados nas drogas, de uma forma ou de outra, vivem para obter, usar e procuram todas as maneiras e meios de conseguir mais. O adicto usa para viver e vive para usar. O adicto sofre da inabilidade de aceitar responsabilidades pessoais, sendo incapaz de encarar a vida tal como ela é. O adicto continua usando, mesmo quando as drogas cessaram de lhe fazer sentir bem. É alérgico a drogas mas mesmo assim continua sentindo-se atraído por elas. O que caracteriza um adicto é a sua realidade nas drogas(comportamento), e não a quantidade que usa. A negação é um aspecto preponderante da doença da adicção. A negação impede o adicto de enxergar sua própria realidade e a realidade de sua doença. Romper com a negação não permite ao adicto uma visão clara para, então procurar soluções para seus problemas. O adicto é impotente perante sua adicção. Aqueles que se descobriram adictos descobriram serem portadores de uma doença da qual não se conhece cura, uma doença progressiva, e potencialmente fatal.Ao contrário de antigas crenças a adicção é uma doença do corpo, da mente e do espírito, passível não de cura mas sim de estabilização. A recuperação se inicia quando o adicto pára de usar todas as drogas, trocando-as pelo companheirismo de pessoas ativamente engajadas na recuperação. É possivel então ao adicto ver um pouco de si mesmo em cada um dos outros e assim se permitir ser ajudado e ao mesmo tempo engajar-se na ajuda de outros. 5.11 Conseqüências do uso de drogas – um breve resumo Até há pouco tempo a toxicomania era freqüente na idade adulta, mas atualmente ela se tornou freqüente nos adolescentes, levantando com isso problemas psicossociais de massa. Sabe-se que muitas pessoas experimentam algum tipo de droga ilícita ou lícita, em algum momento de sua vida, e nem por isso vão desenvolver um quadro de dependência. O indivíduo pode usar a droga sem que isto acarrete problemas bio-psico-sociais. 61
ALTERAÇÃO BIOLÓGICA: Todas as drogas causam danos à saúde física, sendo que vários órgãos podem ser seriamente comprometidos, causando várias doenças cardíacas, respiratórias, do aparelho digestivo, do aparelho sexual, e podem até levar à morte.
ALTERAÇÃO PSICOLÓGICA: (afetivo, emocional) - As drogas podem causar várias alterações no campo psicológico dos dependentes, tais como: diminuição da atenção, concentração e memória, perda da noção do tempo e espaço, alterações bruscas de humor, perda da auto-estima, tornando-se uma pessoa passiva, insegura e introvertida, podendo causar depressão ou outros sintomas mentais mais graves.
ALTERAÇÃO SOCIAL: As drogas prejudicam o desempenho social, profissional e afetivo, trazendo conseqüências como repetência escolar, afastamento da família, brigas com o namorado, rejeitar e ser rejeitado pelos amigos que não usam drogas. Para os adultos, perda de emprego, dinheiro, da família e dos amigos (rompimento dos vínculos sociais).
Características da personalidade
O usuário de drogas geralmente apresenta comportamento impulsivo, para o dependente o pensar, o esperar para que as coisas aconteçam a seu tempo é dificultado, geralmente a ação (consumo de drogas) substitui o pensar. O dependente apresenta incapacidade de enfrentar problemas, frustrações (baixa resistência à frustração), e muitas vezes recorre as drogas para enfrentar a angústia, de forma a buscar sempre a gratificação imediata, pois não aprendeu a controlar o impulso com o pensamento. Geralmente usa de alguns mecanismos para com as pessoas de forma a manipulá-los: o dependente se ilude a respeito de sua condição e nega a realidade, não admite a dependência química, acha que pára quando quiser e consegue controlar o uso de drogas. justifica seus comportamentos insanos, negando a realidade e a causa do comportamento, que é a droga. o indivíduo minimiza o problema, levando a se iludir sobre sua própria condição. projeta suas dificuldades nas outras pessoas, e vê características dos seus comportamentos nos outros, de forma que as pessoas que o rodeiam são o problema.
Comportamentos e sintomas físicos
Estaremos descrevendo abaixo algumas características que podem apontar a possibilidade do jovem estar usando drogas: encontro de objetos estranhos ao ambiente (papel de seda, seringas, colírios, cachimbos, lâminas de barbear, cola, esmaltes, resíduos de pó branco e erva). Comportamentos suspeitos como esconder objetos pessoais, troca do dia pela noite, rejeição dos antigos amigos, mudanças na forma de se vestir, adquire o hábito da mentira, inventa desculpas para não realizar tarefas, usa colírios e/ou óculos escuros em ambientes fechados, rouba dinheiro ou objetos da casa.
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Existem também alguns sintomas físicos que podem indicar o uso de drogas, ou seja, calafrios no verão, suores no inverno, falta de coordenação motora, pupilas dilatadas ou contraídas, reações retardadas, palidez, perda ou aumento de peso, coriza constante, tonturas, taquicardia, vertigens, secura na boca, entre outros. É importante destacar que a observação de alguns destes sintomas não deve causar pânico nos familiares, mas sim a iniciativa de procurar ajuda profissional, nos grupos de ajuda mútua, ou se necessário, com internações em Comunidades Terapêuticas.
5.12 As relações sociais
O Adolescente
Aspectos da personalidade do adolescente
A grande maioria das pessoas percebe a fase da adolescência como um "período problema", mas na realidade é uma fase da vida em que a criança (que está começando a se tornar adulta) está passando por uma série de transformações que a tornam, muitas vezes, um ser mal compreendido. Nesta etapa da vida, o desenvolvimento biológico (aspectos físicos) muitas vezes não é acompanhado do desenvolvimento psicológico, ou seja, o adolescente tem o corpo do adulto mas ainda é imaturo. De maneira geral o adolescente possui um sentimento de onipotência, de forma que, para ele tudo é possível, tudo é permitido, ele gosta de esportes perigosos e de tudo o que representa risco, além de gostar de desafiar as autoridades (pais, avós, chefes e professores). É justamente nesta fase que ele pode experimentar drogas, por curiosidade, para infringir normas preestabelecidas ou por outros fatores bio-psico-sociais poderá, dependendo do caso, passar de experimentador para usuário ocasional ou habitual. Deve-se levar em conta, que no período de adolescência existem quatro fatores ou grupos de risco, que influenciam no desenvolvimento da drogadição: A FAMÍLIA / A ESCOLA / OS AMIGOS
A FAMÍLIA
A prevenção deve acontecer na família desde a constituição no relacionamento saudável entre os parceiros, baseado no amor, na aceitação ou não desta criança (desejada ou não), e quais as expectativas dos pais em relação a esta criança após o nascimento.
O homem ao nascer, e durante um período de tempo, necessita de dedicação, atenção, cuidados amorosos para poder desenvolver-se adequadamente, se a criança está bem apoiada pelos pais e por condições ambientais adequadas, pode desenvolver-se de forma satisfatória.
Nos primeiros anos de vida é a mãe que supre todas as necessidades da criança (alimentação, higiene, etc.), uma vez que nesta fase, ela é totalmente dependente. Porém, se 63
nesta fase a mãe não souber lidar com sua própria ansiedade, agindo de forma a satisfazer imediatamente todas as necessidades da criança, ao menor sinal de choro ou irritação, correrá o risco de incentivar comportamentos impulsivos na criança que não aprenderá a trabalhar com situações de frustrações. Com o passar do tempo a criança percebe a figura paterna, o pai na maioria das famílias, tem um papel ausente, mas a figura paterna é fundamental no processo de crescimento da criança, a sua ausência pode, em muitos casos, gerar no indivíduo insegurança.
Os pais devem manter um relacionamento saudável, pois são modelos onde a criança se espelha, o fundamental no desenvolvimento da criança é estabelecer regras e limites, possibilitar à criança a interiorização do 'não', para que possa aprender a lidar com as frustrações e com as dificuldades que a vida pode proporcionar ao indivíduo, Pais que têm atitude de satisfazer de forma rápida às necessidades da criança, desenvolvem na mesma, comportamento impulsivo.
Muitas vezes, também, percebemos que os membros da família representam modelos inadequados, se automedicam, bebem, fumam, tomam calmantes e todos os tipos de medicamentos. A criança introjeta uma dupla mensagem: "Faça o que eu digo, mas não o que eu faço".
Os membros da família devem estabelecer um relacionamento saudável, baseado em regras e limites definidos, possibilitando ao jovem desenvolver a auto-imagem, autoconfiança e autoestima positivos.
AMIGOS
O adolescente passa por uma série de transformações bio-psico-sociais e nesta fase não estabeleceu a própria identidade, por isso sente necessidade de identificar-se com o outro, possui um ego grupal, e nesta fase elege uma nova família "a turma", que passa a ser a família paralela, que o jovem passa a ter como modelo. A necessidade de ser aceito pelo grupo pode, em muitos casos, ser facilitadora para o jovem entrar em contato com as drogas.
ESCOLA
Que não possui pessoal treinado para entrar na problemática das drogas, que não possui no currículo escolar espaço para aulas que tratam da questão. Também é na escola que o aluno entra em contato com os usuários de drogas e se tiver professores e amigos como facilitadores, poderá ingressar no caminho da dependência química.
COMUNIDADE A comunidade pode ser considerada como fator de risco, pois de forma geral a sociedade impõe ao adolescente que deve levar vantagem em tudo e que a corrupção é uma coisa natural. A 64
sociedade não reforça valores morais de dignidade, de honradez e de honestidade, o que ajuda a tornar os jovens presas fáceis para iniciar no caminho das drogas. É preciso compreender que a adolescência é caracterizada por mudanças físicas e psicológicas, tais como: a busca de si mesmo e de sua identidade; tendência à identificação com o grupo, a turma; fantasiar a realidade; atitudes de reivindicações; variações acentuadas e freqüentes no humor; sentimento de onipotência (tudo é possível); desvalorização da família e supervalorização da turma.
5.13 Outros fatores que podem influenciar no desenvolvimento da drogadição
Durante a fase da adolescência, o jovem pode se sentir independente, o adolescente quer demonstrar que já cresceu, querendo provar sua segurança pode experimentar drogas. Além disso, a curiosidade pode também levar o jovem a se drogar, pois é a época das descobertas, e o adolescente quer conhecer tudo. Outro fator que pode induzir o jovem a se drogar é a incapacidade de enfrentar problemas. Os adolescentes recorrem às drogas quando surgem os problemas, mas quando passa o efeito, o conflito ainda existe acrescido de mais um: o próprio envolvimento com a droga. A onipotência juvenil (mania de Deus do adolescente) acreditando que nada vai acontecer, faz com que ele abuse de tudo. O jovem ainda usa drogas para ser aceito pelo grupo que as usa, mudar seu jeito de ser pois não se aceita, para acabar com a solidão ao preencher o tempo, por relações familiares conflituosas, na tentativa de ultrapassar as coordenadas de tempo e espaço, vencer os próprios limites e a busca do prazer.
5.14 As drogas e a economia no Brasil
"TUDO O QUE EXISTE, SERVE PARA CUMPRIR UMA DETERMINADA FINALIDADE". Quer dizer: o perfume somente existe porque existem pessoas que gostam e sentem-se bem quando estão perfumadas... Assim também acontece com as drogas, que possuem várias finalidades, quer sejam para curar doenças, para fins industriais, ou ainda aquelas que causam entorpecimento (os psicotrópicos). Seja qual for a finalidade, as drogas obedecem um ciclo tipicamente econômico, que é: PRODUÇÃO / DISTRIBUIÇÃO / CONSUMO A produção e a comercialização das drogas existe para servir a uma necessidade de mercado, ou seja, para os laboratórios farmacêuticos (medicamentos), para a fabricação de produtos para a indústria (solventes), para a indústria de calçados (cola de sapateiro), existindo ainda as várias indústrias de cigarros e bebidas alcóolicas, para consumo da população. Da mesma forma, existe também a produção das drogas comumente chamadas ilícitas como a cocaína, a maconha, o "crack", a heroína, o LSD, etc., que infelizmente possuem consumidores específicos (chamados dependentes químicos), além de um mercado que não pára de crescer, apesar da preocupação e esforço das autoridades ligadas à questão.
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Custos sociais decorrentes do uso abusivo de drogas Para estimar os custos relativos ao uso e abuso de drogas (lícitas e ilícitas) em termos de saúde pública, as pesquisas têm se pautado, principalmente, nos gastos com tratamento médico, na perda de produtividade de trabalhadores consumidores abusivos de drogas e nas perdas sociais decorrentes de mortes prematuras. Já no início da década, o custo anual estimado nos Estados Unidos era superior a 100 bilhões de dólares. No Brasil, os custos decorrentes do uso indevido de substâncias psicoativas são estimados em 7,9% do PIB por ano, ou seja, cerca de 28 bilhões de dólares (In: Secretaria de Estado da Saúde/SP,1996). Destacamos o custo decorrente do tratamento de doenças ligadas ao uso de tabaco, que corresponde a 2,2% do PIB nacional. O custo total para o SUS das patologias relacionadas com uso de tabaco elevam-se é de R$ 925.276.195,75 (Chutti. In Bucher, 1992). Contudo, o tabaco não é usualmente incluído nas estatísticas sobre dependência química. A assistência especializada no tratamento das drogas ilícitas consome, em contraposição, 0,3% do PIB (Bucher, 1992). As internações decorrentes do uso abusivo e da dependência do álcool e outras drogas também comportam importantes custos sociais. No triênio de 1995 a 1997, mais de 310 milhões de reais foram gastos em internações decorrentes do uso abusivo e da dependência de álcool e outras drogas. Ainda neste mesmo período, o alcoolismo ocupava o 4º lugar no grupo das doenças que mais incapacitam, considerando a prevalência global; Finalmente, devemos considerar os transtornos mentais associados ao uso e abuso de substâncias psicoativas. As Psicoses Alcóolica e por Drogas, bem como as Síndromes de Dependência do Álcool e de outras Drogas são o primeiro motivo de internações psiquiátricas. Os gastos totais relativos ao diagnóstico de Dependência de Droga (CID 304) passaram de US$902.886,29 em 1993 para US$2.919.933,94 em 1997. No total, os gastos diretos em internações que podem decorrer do uso de substâncias psicoativas, em hospitais gerais da rede do SUS, chega a R$ 601.540.115,33.
Drogas e AIDS
Com a expansão da epidemia da AIDS, o consumo de drogas requer uma atenção ainda maior. Desde 1982, quando se registrou o primeiro caso de AIDS entre usuários de drogas injetáveis no país e, principalmente, a partir de 1985, o curso dos casos de AIDS entre esta população vem tendo um aumento expressivo. Em 1985 este número representava 2,7% do total (14 casos), já em 1990 chegou a 18,2% (736 casos). Atualmente, cerca de 25% dos casos de AIDS notificados ao Ministério da Saúde estão relacionados com o uso de drogas injetáveis. Dados do "Projeto Brasil" indicam que em cidades como Santos (SP) e Itajaí (SC) a prevalência de HIV entre usuários de drogas injetáveis alcança o índice de mais de 60%, dos casos identificados. Nas quatro cidades pesquisadas (Santos, Salvador, Rio de Janeiro e Itajaí), o índice de compartilhamento de seringas varia de 56% na região centro-oeste a 85% no Sul. A transmissão através do compartilhamento de seringas é, também, um dos fatores responsável pelo crescimento
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do número de casos de AIDS entre as mulheres, parceiras sexuais dos usuários e, consequentemente, da AIDS pediátrica.
Drogas e violência
É corriqueira a associação entre drogas e violência, especialmente no que diz respeito ao tráfico de substâncias ilícitas. No entanto, as dimensões sociais e econômicas subjacentes são usualmente obviadas, dando-se ênfase a aspectos sensacionalistas que limitam a compreensão do problema e legitimam atitudes repressivas. O aumento da violência e da criminalidade, especialmente nos centros urbanos, está diretamente vinculado a fatores como o desemprego e a distribuição desigual da riqueza, e nesse sentido deve entender-se, também, a violência relacionada com o tráfico de substâncias ilícitas. A relação entre desemprego, tráfico e consumo de drogas, aliás, já foi comprovada por vários estudos nos EUA e Europa. Recentemente, o jornal Folha de São Paulo publicou pesquisa realizada pelo Departamento de Investigações sobre Narcóticos (DENARC) nesse estado, com 981 traficantes, usuários e dependentes de drogas. O estudo revela que, de cada 100 traficantes, 75 estão desempregados, e de cada 100 usuários e dependentes, 76 estão igualmente desempregados. Quanto à escolaridade, do total de traficantes presos pelo DENARC no ano de 1997, 87.4% estudaram até o primeiro grau completo. Além disso, a pesquisa mostra que a grande maioria dos usuários e dependentes detidos têm entre 15 e 30 anos. Assim, o perfil que este estudo apresenta é o de uma população na faixa etária mais afetada pelo desemprego e que, em decorrência da baixa escolaridade, encontra-se impossibilitada para a inserção e a competição no mercado de trabalho. No outro lado da moeda, estudos no Brasil e alhures mostram a relação entre o consumo de psicotrópicos e os atos de violência. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Abuso de Álcool e Alcoolismo dos EUA, o uso excessivo de bebida é um fator verificado em 68% dos homicídios culposos, 62% dos assaltos, 54% dos assassinatos e 44% dos roubos ocorridos no país (In: ALCOHOLALERT,1997). O mesmo estudo chama à atenção sobre o uso de álcool em casos de violência doméstica: cerca de dois terços dos casos de espancamento de crianças ocorrem quando os pais agressores estão embriagados. O mesmo ocorre nas agressões entre marido e mulher. No Brasil, pesquisadores do CEBRID analisaram em 1996 mais de 19.000 laudos cadavéricos feitos entre 1986 e 1993 no IML central de São Paulo e constataram que, de cada 100 corpos que entraram no Instituto Médico Legal neste período, vítimas de morte não natural, 95 tinham álcool no sangue.
Drogas e trânsito
Embora os acidentes de trânsito estejam entre as principais causas externas de morte no Brasil, só recentemente tem sido objeto de estudo a relação entre estes e o uso de drogas. Em 1997, pesquisa realizada nas cidades de Recife, Brasília, Curitiba e Salvador, mostrou a alta presença do uso de drogas, especialmente álcool, nas situações de violência no trânsito. A média para as quatro cidades é de 61% de casos de alcoolemia positiva entre as pessoas envolvidas em acidentes (Melcop et. al., 1997). 67
A mesma pesquisa também verificou o uso de outras substâncias psicoativas pelas pessoas envolvidas em acidentes de trânsito, em diferentes proporções para cada cidade. No Recife, uma em cada 10 vítimas de acidentes havia feito uso de maconha (10%), o dobro do percentual detectado em Brasília (4.5%). Com relação à cocaína, não houve detecção entre os acidentados de Recife, mas nas outras três cidades os valores variaram entre 3.8% em Salvador, 3.4% em Brasília e 3% em Curitiba. Foi constatado ainda o uso de outras substâncias como os Benzodiazepínicos (3.4%), Barbitúricos (1.5%), Anfetamínicos (0.6%) e Opióides (0.3%). Números ainda mais altos foram encontrados em outra pesquisa, desta vez realizada no período de Carnaval, na cidade de Recife: 88.2% das vítimas fatais de acidentes de trânsito tinham consumido álcool (MELCOP et.al. 1997). O novo Código Nacional de Trânsito vai ao encontro desta preocupação e estabelece que dirigir sob influência do álcool (níveis de alcoolemia iguais ou acima de 0,6g/l) é crime. Estão previstas multa e prisão para aqueles que infringirem a norma.
Drogas e trabalho
Igualmente, é preciso chamar a atenção para os problemas relativos ao uso de drogas e sua influência no trabalho, tanto no que diz à segurança do trabalhador, física e social, quanto à produtividade das empresas. No Brasil, estudo realizado no ano de 1993 pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo - FIESP (Waismann, 1995) aponta que de 10 a 15% dos empregados tem problemas de dependência, e que este abuso: · é responsável por três vezes mais Licenças Médicas que outras doenças; · aumenta cinco vezes as chances de Acidentes de Trabalho; · está relacionado com 15 a 30% de Todos os Acidentes no trabalho; · é responsável por 50% de Absenteísmo e Licenças Médicas; · leva à utilização de oito vezes mais Diárias Hospitalares; · leva a família a utilizar três vezes mais Assistência Médica e Social. Esses dados são confirmados por outras pesquisas (Dias et.al. 1997, Campana, 1997).
Uso de drogas entre crianças e adolescentes
Outro aspecto que tem sido motivo de reflexão é a tendência mundial que aponta em direção à iniciação cada vez mais precoce e de forma mais pesada no uso abusivo de drogas. No Brasil, são referência os estudos realizados, desde 1987, pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID) sobre o uso indevido de drogas por estudantes de 1º e 2º graus e crianças e adolescentes em situação de rua. Os resultados desses levantamentos confirmam que, no país, também há um consumo cada vez mais elevado de substâncias psicoativas entre crianças e adolescentes. O último levantamento do CEBRID, realizado em 1997, revela que o percentual de adolescentes que já consumiram drogas (uso na vida) entre os 10 e 12 anos de idade é altíssimo: 51.2% usaram álcool; 11% usaram tabaco; 7.8% solventes; 2% ansiolíticos e 1.8% já se utilizaram de 68
anfetamínicos nessa faixa etária. Nas 10 capitais pesquisadas, cresceu a tendência para o uso freqüente de maconha entre crianças e adolescentes. O uso freqüente de cocaína e de álcool também aumentou em seis capitais. Quanto ao uso pesado de drogas, isto é, 20 vezes ou mais no mês, também experimentou um aumento nas 10 capitais para a maconha e, para o álcool, em oito capitais.
5.15 Centros de ajuda Antes de mais nada, tenha uma certeza: não existem métodos miraculosos no tratamento da dependência química. Os modismos que existem nesta área são normalmente tratados de maneira sensacionalista, prometendo soluções rápidas e eficazes como se os seres humanos tivessem saído de uma mesma linha de montagem. Vale destacar o pensamento do Dr. Dartiu Xavier da Silveira Filho, psiquiatra, consultor científico em farmacodependência da Organização Mundial de Saúde (OMS), quando diz que "a toxicomania é um fenômeno polimórfico". "Cada estratégia de tratamento tem de ser personalizada", conclui. Basicamente, existem três tipos de tratamento para dependentes de drogas: grupos de autoajuda, terapias psicológicas e internação. Podem ser aplicados separadamente ou em conjunto, variando de caso a caso. Dos grupos de auto-ajuda, o mais conhecido de todos atende por A.A., sigla de Alcoólicos Anônimos. Com milhares de grupos espalhados por todo mundo, pessoas de todas as religiões, sexo, idade, raça e condição social têm conseguido deixar de beber ao entrar para A.A. desde o início de suas atividades, em 1935. Talvez a melhor definição sobre Alcoólicos Anônimos esteja resumida nos dois parágrafos que são lidos na abertura das reuniões dos muitos grupos: "Alcoólicos Anônimos é uma irmandade de homens e mulheres que compartilham suas experiências, forças e esperanças, a fim de resolver seu problema comum e ajudar outros a se recuperarem do alcoolismo. O único requisito para se tornar membro é o desejo de parar de beber. Para ser membro de A.A. não há necessidade de pagar taxas nem mensalidades; somos auto-suficientes graças as nossas próprias contribuições. A.A. não está ligado a nenhuma seita ou religião, nenhum movimento político, nenhuma organização ou instituição; não deseja entrar em qualquer controvérsia; não apóia nem combate quaisquer causas. Nosso propósito primordial é manter-nos sóbrios e ajudar outros alcoolistas a alcançar a sobriedade”. Para os membros de A.A., não existe cura para o alcoolismo; uma vez que a pessoa tenha perdido a possibilidade de controlar a bebida, nunca mais é possível beber normalmente. Mas o dependente pode tornar-se sóbrio, um alcoólico em recuperação. Para alcançá-la, foram elaborados os Doze Passos de A.A., orientando-o na busca de uma vida feliz e útil. Na mesma linha, existem ainda os grupos de Narcóticos Anônimos (NA), Amor Exigente (AE), Comunidade Casa Esperança e Vida (CCEV), Neuróticos Anônimos (NA) para usuários de outros tipos de drogas. Estes grupos preenchem uma grande lacuna existente no Brasil dos dias atuais, onde os tratamentos clínicos em hospitais e consultórios são insuficientes para atender a demanda. Na área dos serviços públicos a situação é ainda pior, pois não existem verbas disponíveis para um atendimento especializado. 69
As terapias psicológicas, segundo descreve o Dr. Içami Tiba no livro 123 Respostas Sobre Drogas, "...são importantes em todas as etapas do envolvimento com a droga, pois atuam nos valores pessoais, na filosofia de vida de cada um, resolvem os conflitos e modificam a postura do indivíduo perante a droga". "Tudo isso favorece o entendimento do vício, de modo que o drogado tenha forças para enfrentar e solucionar a questão...". Conclui dizendo que "mesmo quando o tratamento é biológico (internação para desintoxicação), a ajuda das terapias psicológicas é importantíssima para que a pessoa compreenda tudo o que está acontecendo com ela". A escolha do terapeuta é fundamental para a obtenção de bons resultados neste processo. Muitas vezes não basta ser um bom profissional ou a família gostar do terapeuta. É necessário que o paciente sinta confiança em quem está tratando dele, desenvolvendo um relacionamento sincero, sensível e afetuoso. Para tanto, troque de terapeuta quantas vezes forem necessárias. Experimente pessoas com mais idade ou mais jovens, do sexo masculino ou feminino, de linhas terapêuticas mais duras ou mais suaves, enfim; até encontrar o profissional que melhor se adapte ao caso. Um bom método, para observar se a terapia está surtindo efeito ou não, é analisar a qualidade global de vida de quem está em tratamento. Se esta qualidade estiver dando sinais de melhora, por menores que sejam, significa que o caminho está correto. Notas melhores na escola, menor agressividade nos relacionamentos, disposição para fazer coisas que antes o paciente não fazia são alguns exemplos. A internação de um dependente químico é algo que deve ser analisado com muito cuidado. Em primeiro lugar deve ser levado em consideração que este tipo de tratamento tem um índice de sucesso que varia de 30% a 40% em clínicas e hospitais que prestam realmente bons serviços. Internar o dependente deve ser o último recurso, utilizado quando todas as demais tentativas fracassaram. Interná-lo contra sua vontade só pode ser cogitado se o paciente apresentar grande risco de vida para si ou para as pessoas que o cercam. Não são raras as ocasiões em que as famílias internam seus filhos em uma clínica apenas para transferir o seu problema para outros. Em todo Brasil, existem excelentes hospitais e clínicas com tratamentos sérios e competentes, sendo que alguns servem de referência até no exterior. Infelizmente, funcionando paralelamente a estes serviços, criou-se uma verdadeira indústria no tratamento de usuários de drogas, que vendem ilusões e ganham muito dinheiro. Para ajudar a diferenciá-los, seguem algumas dicas:
1. Solicite referências. Informe-se com um médico de sua confiança a respeito do lugar onde você pretende internar seu filho. Procure também outros profissionais da área e recolha mais informações. Referências de pacientes que já foram tratados no local também podem ajudar, desde que não sejam indicados pela própria clínica ou hospital. Explica-se: se o tratamento não for sério, nada impedirá que se monte um verdadeiro teatro para convencer pais e dependentes da eficácia do tratamento.
2. Informe-se sobre detalhes do tratamento. Tempo de internação, MEDICAMENTOS utilizados, acompanhamento clínico, terapias ocupacionais, atividades físicas, número de consultas semanais e tempo de duração, terapias em grupo, etc.
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3. Conheça o local. Visite quartos, banheiros, refeitórios, pátios, quadras de atividades esportivas, enfermarias, salas de televisão e tudo mais que houver para conhecer. Verifique a higiene e o estado de espírito dos pacientes e funcionários. Se isto lhe for negado, troque de clínica ou hospital. Este não é apenas um dever seu como familiar, mas também um direito como consumidor.
6 Conclusões Gerais Um dos problemas do ensino de química nas escolas, é a sua escassa ou até mesmo inexistente contextualização. Buscando enfrentar essa problemática, este texto foi produzido para trazer para a vida do aluno os malefícios das drogas, buscando uma abordagem que vai da química até a problematização social que o assunto envolve. As discussões e propostas apresentadas neste documento mostram uma visão panorâmica das alternativas de alguns dos agentes envolvidos nesta problemática no nosso país. Na escola o assunto deve ser tratado no início como uma conversa informal com o aluno, de forma que o próprio aluno comece a perguntar ao professor sobre a estrutura e funcionamento das drogas. Assim sendo, o professor inicia a exposição de informações sobre cada droga, integrando o assunto à conteúdos de química, mas sempre estimulando as conclusões finais do próprio aluno. Desta maneira o aluno poderá refletir sobre a estrutura e funcionamento de cada droga, além de ter incorporado cognitivamente conteúdos de química como nomenclatura de compostos orgânicos, classificação de cadeias e funções químicas. As pessoas que por ventura vierem a utilizar este texto para algum tipo de palestra ou aula, e não tiver um conhecimento da química tão bom quanto a de um professor de química deverá se ater nas partes do texto que falam das drogas no geral, informando sobre os perigos sobre cada droga e suas implicações na saúde física e mental de cada uma delas. O aspecto social deve ser discutido sempre, tanto em sala de aula, tanto em palestras. A discussão deve ser direta com os alunos ou público. É muito importante no final da aula ou palestra o público sair com uma opinião crítica renovada sobre as drogas, tanto no aspecto químico, quanto social.
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