Forrester 1989 planejamento em face do poder

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PLANEJAMENTO EM FACE DO PODER JOHN FORESTER

ln: Planning in Face of Power Berkeley, Los Angeles: University of C:(Jifomi., Press 1989

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Planejamento em Fac e do Poder

Os planejadores que ignoram aqueles que estão no poder asseguram sua própria fraquesa. Alternativamente , ~ e._laneiadores gue compreendem as re l ações d e pod e r que modelam o processo de plane j amento, _conseguem melhorar a qualidade de suas análises, e fort alecer a ação da comunidade . Ao co ncentrar- s e e m questões prát ica s como o Eontrole da informação, a des i nformação e a di sto rção d a comunicacao este capitulo pretende desenvo lver um perfil pragmático e progressista para todos aque l es que plan ejam em face do poder. Se poder corrompe, a ausência dele certamente f rus ta. Os planejadores sabem mu i to bem quando são pressionados po r p9derosos interesses económicos , ou po r in teresses po líti cos ou ambos. 1 No plane j amento da saude pública, por exemplo, assim como no planejamento do us o solo , o planejador sempre reage de forma defensiva às ini ciativas dos "p rovedore s" estabelecidos de assistência médica privada , o u aos projetos de empreendedores imobiliários. Estes prov edores possuem tempo, dinheiro, téc n ica, informação e o cont r o l e d o capital, enquanto que os consumidores estão q uase despossuidos de tais recursos . No entanto , em mu i to s c asos , os planejadores possuem mandato legal para fazer da participação popular uma realidade do processo de planejamento ao invés de uma simples promessa romântica. Além disto, os planejadores quase não t em i nf l uência na implementação dos planos . Na maioria do s casos planos cuidadosamente elaborados acabam por ser e ngavetado s q ua ndo nao são usados para propósitos políticos diferentes daque l es pretendidos. Dadas estas condi ções de trabalho e da natureza intrinsecamente po l ít i ca da práti ca de planejamento, como podem então os p l anejadores desemp enha r seus mandatos legais e estabelecer um processo genuinamente democrático de p l anejamento? Que tipo de poder podem o s planejadores utilizar? Em t empos de retrocesso , estas questões tornam-se mais importantes que nunca. De uma vez por todas não se deve esperar soluç ões da prát i ca do planejamentp, somente porque o objeto de Q_lanejamento enquanto ação dirigida ao f ut uro , s empre involva o novo e o particUlar . Mesmo quando o plane j a men to é usado para racionalizar decisõe s eco nômi cas, e l e deve estar atento a problemas especiais q ue s e a p rese nta m no c as o sendo abordado. Até mesmo ques t ões té c n i c o s que p odem s er resolvida s através de métodos padroniz ada s, podem s u r g ir a Veja A tshulcr (1 965) . Balka s (1979 ). Ba um (1980a. l 480h} Bradk y (19 79 ). H owl.· e Kau f rnan (1979 , Page ( l 977) e R ac he (1 98 1

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partir do conflito de interpretações e interesses, entre os poderes estabelecidos e aqueles de segmentos excluidos da população--os quais inevitavelmente limitam a eficácia das soluções puramente técnicas . _Apesar dos planejadores não Qossuirem r a influenc·ar as estruturas do poder e da propriedad~_p_t:_i-Y-ª~a na sociedade, eles podem sim in uenciar as condições que capacitam (ou descapaci~•â> os cidadãos a Earticipar, agir. e se organizar de forma efetiva apesar das limitações inerentes à suas vidas. Este capítulo procura demons t rar que em f unção da decisão de ignorar ou pautar pela linha do exercírcio do poder político no processo de planejamento, os planejadores podem tornar aquele processo mais ou menos democrático, mais ou menos tecnocrático, ou ainda mais ou menos dominado pelos tradicionais detentores do poder. Por exemplo, os planejadores modelam não somente os documentos mas também a participação: quem é contatado, quem participa nas reuniões informais de revisão do plano, quem persuade quem a optar por determinadas políticas. Os planejadores podem ter influência não apenas ao determinar a forma como os fatos serão apresentados às pessoas, mas também por moldarem a confiança e as espectativas dessas pessoas. Os planejadores atuam de forma decisiva no planejamnento não apenas por trabalharem com os dados e mapas mas também por organizarem a cooperação ou o consentimento. Em geral eles não são esteiótipos dos engenheiros que se preocupam apenas com obteção de soluções técnicas competentes para os problemas. Na maioria dos casos os planejadores func i onam como organizadores (ou desorganizadores) da atenção pública: moldando de forma seletiva a atenção em torno de certas opções de ação, de certos tipos particulares de custos e benefícios , ou certos tipos de argu~entos a favor ou contra as propostas de planejamento. O controle da informação é uma importantg fonte pela qual os planejadores poderm exercer seu poder. Este capítulo argumenta, portanto, que (1) informação é urna complexa fonte de poder do processo de planejamento; (2) várias espécies de desinformação- - alguma s inevitáveis, algumas evitáveis, algumas sistemáticas, algumas ad ho c - odem ser anteci adas e desmobilizadas ela astúcia dos Rlane1a ores; (3) esta desisinformação enfraquece o elane·amento bem informado assim como a a ão da o ula ão ao manipu ar crenças, concentirnentos, confia nç a e s ensos de relevância dos problemas; (4) até mesmo o s planejadores, e m casos especiais e às vêzes justific a v ei s , pa r ticipam d9 processo de distorção da comunicação; e (5)como o pJane jador deverá sempre esperar que a desinformação i nflue ncie o processo de tomada de decisão, a definiçã o da s pautas e, a 2 3

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argumentação política no plane j amento, ~le de v erá pa ~ti cipar de forma ativa a fim de incentivar um processo bem informado e democrático de planejamento, através do qual a população diretamente afetada pelas diretrizes do planejamento seja fortalecida. Informação como Fonte de Poder Como pode a informação ser uma fonte de poder para os planejadores? Existem quatro maneiras de r e s ponder esta questão, mas iremos considera r também uma quinta. Elas se relacionam às ~rspectivas do planejamento enquanto um processo que pode assumir a forma técnjca, ~ncrementalista ou pragmatist~, advogativa-liberal, estruturalista_t! 2rogressista. Cada uma das perspectivas sugere uma diferente base de poder na qual os planejadores podem cultivar em suas práticas. Discutiremos a seguir corno as diferentes formas de controle e gerência de informação pode fazer uma diferença prática em planejamento e em processos políticos mais amplos . Mesmo que cada urna destas perspectivas sejam aqui discutidas separadamente, .!2.Q... cotidiano da rática os lane ' ad · estas perspectivas ao atuarem sobre um caso qualquer . Por exemplo, um planejador de transporte poderia combinar de maneira estrgtrégica \s atitudes de técnico e de p l anejador progressista , ou um planejador do setor de saude poderia se utilizar de um carater pragmatista de um lado e de outro urna perspectiva advogativa-liberal.

o Técnico. o Técnico sempre acredita que o poder está na informação técnica: ~aber cama encontrar os dados~ _.que guestões pesquisar, Bmlº desenvolver análises relevaq!~~Como aqui, a informação deve fornecer as soluções aos problemas técnicos, ela se torna então uma fonte de poder. Esta visão reflete desde logo a noção mais tradicional de . planejamento baseada na da soluçao técnica dos problemas (problem-solving), e um dos ideais mais citicados da profiss~o--pois ele evita,.ou dissimula a importância ou a necessidade de lidar diretamente com questões políticas . .Q técnico imagina que juizos de valor político podem se r evitados, e que o contexto político do entorno pode ser ignorado. Adotando uma visão ingênua da pol í tica, o técnico acredita que um trabalho técnico consistente possa se manter por seus próerios méritos. Plane j adores e críticos se tõrnarn cada vez mais céticos quanto as possibilidades dessa atitude tecnocrática. 4 5


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~ ~ncrementali~ta. _ O profissonal i n creme ntal ista é um pragm~tico da o 7g~nizaçaao. Çomo o técnico ele também acredita que a in~ormação ~ uma das f ontes do poder uma v e z que ~la responda as neces s~dades da orga n ização. As pessoas precisam saber onde obter informaçao para conseguir a aprov~ção de um projeto com o mínimo de demora possível, e que tipos de problemas de desenho evitar. Aqui conhecer os meandros é uma fonte de poder: redes informais, contatos · fixos e Comunicação regular são formas de manter o planejador informado. Esta é uma concepção social de soluçao-técnica do problema, onde "social " neste caso significa "organizacional". Os planejadores trabalham, naturalmente, através de redes nas organizaçoes onde ~iferente atores dependem um dos outros para obter informações importantes . Ironicamente ~ <r.Jd_ando outr:...os dependem da informaçao do planejador, essa informação tornase fonte de poder--apesar de que os planejadores incrementalistas (como sugeriu Lindblorn trinta anos at rá s ) possam desconhecer para que objetivo tal poder possa servir, senão aquele imediato retacionado com a política organizacional estreita. O advogado- l iberal. O profissional com esta característica também v ê na info rmação urna fonte d e poder uma vez que ela responde à s necessidades c riad~ pe lo sistema político pluralista; info rmação, nesse caso, pode ser usada por grupos sem representação ou relativamente desorganizados para capacitar urna artici a ão mais e fet iva dos mesmos no processo e planejamento. Esta é urna linha tradicional d e p l ane j amento representada pelo planejamento advocativo. 7 Este planejamento procura redirecionar as desigualdades sociais e de participação ao inser ~ os grupo ~ excluidos no processo político e guarantir-lhes ~ igualdade de chance, de informaçãõ, e de recursos t écnicos . Os antigos projetos de acessoria técnica [à popul aç__ao) fazem parte desse tipo de planejamento. Esses projetos tinham por 6Djêtivo for n ecer assistência técnica afim de permi tir que as comunidades de bai rros (entre outros) pude ss e m competir em igualdade de condições com os empreendedores imobiliários . O advogado liberal concentra-se nas necessidades de informação do cliente, isto é, o 8 desfranqueado , o nao representado, o pobre, o despossuido. o estrutura lista. P~radpxa lrnente, ~ estruturalista acha que~ informação é uma fô'rrte de ooder para os planej ado res porque ela necessariamente serve para ( 1 ) l~git imar ~ manutenção da estrutura de pader e de propriedade existente e, (2) serve para perpetuar a desatenção pública em relação a questões fundamentais corno a incompatibi l idade do processo político democrático com a economia política capitalista. _.A_ 6 7

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concepção estruturalista, provêm ironicamente do funcionalismo conservador de várias décadas atrás, mas cujo argumento sofreu mudança radical recentemente: As ações do Estado, assim como a dos planejadores que dentro dele trabalham, funcionam inevitavelmente para fortalecer o capitalismo. A perspectiva estruturalista sugere que o s planejadores possuem poder, mas apesar de suas melhores intenções, esse poder serve apenas para manter as pessoas em seus lugares e proteger o poder estabelecido. Assim o podgr dos planejadores não pode servir para a ação da liberdade. O progressista. Q progressista, finalmente, trata a informação corno urna fonte de poder urna vez que ela permite a Rarticipação da população e evita a função de legitimação corno adverte o estruturalista. A informação gue os glanejadores manipulam pode também ser usada para .chama~ atenção para obstáculos estruturais, organizacionais e políticos que distorcem desy5cessariamente a informação que a população terá para agir. A perspectiva progressista combina desse modo características das concepções l iberal e estruturalista e dá um passo adiante. Ela reconhece que o poder político-econômico atua para sistematicamente desinformar os públicos afetados, ao dissimular os riscos ou custos das políticas. A linha progressiata tem por objetivo (1) antecipar estas des info rmações regulares e estruturalmente enraizadas e, (2) organizar a informação para enfrentar o ''ruido" dessa desi~formação (ou informação ideologizada como alguns a chamam). Cada uma dessas perspectivas de planejamento indica diferentes razões parque a informação é importante, definindo assim fundamentos diferentes de poder: problemas técnicos, necessidades organi zacionais, desigualdade política, legitimação dos sistema, ação do cidadão. Como a concepção progressista desenvolve-se a partir de outras posições iremos analiza-la em detalhe adiante. Ao enfatizar a participação popular e as práticas de organização do planejador, a v isão progressista reconhece também os obstáculos à tal participação. Nós vamos primeiramente comparar as outras concepções, e depois examinaremos a posição progressista. Limitações Comuns a cada Concepção

O técnico não é mais errado do que um negligente intencional. Política é vista como objeto alheioa no curso de um trabalho rigoroso. Q contexto político de planejamento é entendido como urna ameaça e não corno urna 9 10 11


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_o portunidade. 12 Na verdade o contexto de planejamento é um processo político gue não apenas cria um conjunto de problemas para serem resolvidos tecnicamente, mas cria também o trabalho dos técnicas. Como o técnico é necessariamente um ator político. váriass questões cruciais podem ser levantadas: De que maneira o técnico é um ator político? O quanto dissimulada é essa ação política? Para quem ele serve? Quem ele exclui? Após a publicação do artigo clássico de Lindblom "The· Science of muddling Through" a concepção Incrementalista foi a pricípio aplaudida por ser ~minentemente prática, mas logo deu margem para intermináveis críticas ~or ser uma gropositura apolítica, sem princípios. 1 A concepçãao incrementalista .é_.wn_importante antídoto ao planejamento racional-compreensivo, ao rejétar as exigências impostas por esse último de obtção de todos os fatos de uma situaçao~ no entanto, o incrementalismo diz pouco sobre como avançar na prática do planejamento, sobre o que os planejadores devem fazer e como podem faze-lo. , A linha liberal-advocatica teve como base questões éticas, em parte por dirigir-se para ~ectos como desigualdade, no entanto ela foi também alvo de críticas por não considerar a~ caraterísticas históricas e estruturais dessas questoes. 4 O advogado liberal foi caricaturizado como um enfermeiro que assiste ao doente que é incapaz de evitar gue seus males se desenvolvam. A posição do estruturalista é tão trágica quanto a do aàvogado liberal: pura em intenção, mas frustada na prática. Ao comceber toda prática de planejamento corno a legitimação ª9 status quo, o estruturalista sistematicamente fí~cassa em considerar as oportunidades reais no planejamento. A visão estruturalista falha até em identificar e explorar o que poderia ser chamado "contradições internas'' na estrutura da economia-política e em particular no processo de planejamento. A ironia dos advogados liberais é que suas melhores intenções acabam por serem traídas devido a sua ignorância dos efeitos estruturais da organização economico política--por exemplo, o controle privado dos investimentos, ou o fato de que um crescente número de relatórios de impacto ambiental não evitará a destruiçao ambiental . ..A tragédia da concepção estruturalista é que sua posição aparentemente abrangente torna - se totalmente adialética ª2 imaginar que o poder que os planejadores confrontam ~ü servem) seja monolítico e sem ·contradições internas.

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Análise Progressista do Poder Os progressitas também possuem os seus problemas . . Da mesma forma que os planejadores mais estritamente técnicos, _os progressistas também necessitam de boa informação. Assim _.como os planejadores liberal-advocativos, .também interessa aos progressistas fornecer informaçoes à população em geral, às comunidades locais, aos trabalhadores, objetivando assim cQntribuir para a organização e os esforços democráticos · desses grupos. Os planejadores progressistas tabém precisam da análise política P,ara orientar a sua ação e sua compreensão da forma que o sistema político funciona para , desinformar regularmente os participantes do procr~so de p l anejamento assim como a toda população afetada. _Q_ p,lanejador progressista deve saber antecipar, (a) como os incorporadores, por exemplo, dissimulam as inforrnaçoes ou e s c a moteamos objetiYQ.S.. de um determinado projeto, corno o lucro, por exemplo; (b) que o uso de consultores, em certas situções, esteja mais diretamente ligado a necessidade de legitimar projetos, do que avaliar-los corretamente, ( c) __gJ,llL os hor ários das reuniões nos orgãos públicos estejam mais ligados às disponibilidades dos empresários, do que às possibilidades de garticipação das pessoas afetadas~ justamente naqueles horários trabalham; (d ) que o planos fornecidos pelos projetistas privados para aprovação procurarão esconder as problemas e exaltar as virtudes dos mesmos, e assim por diante. Diferentemente dos planejadores incrementalistas ou dos liberal-advocativos, os progressistas não acreditam que a desinforrnaçao não seja acidental no planejamento: Ela é entendida como um problema crônico e sistrwático que deve ser confrontado nos seus próprios termos. As tarefas práticas que o planejador progressista confronta, são portanto, similares à aquelas desempenhadas t radicionalmente pelos organizadores ou representantes políticos das comunidades. Os planejadores do setor de saude, por exemplo, reconhecem cada vez mais a necessidade de possuírem ~abilidades pedagógicas e organizativas para res~~nder aos problemas que aparecem na prática do dia a dia. Além de produzir tais respostas educat ivas e organizacionais às desinformações previsíveis o planejador deve confrontar__g_Qffi_ questões práticas cruciais colocadas pela análise política e organizacional. Que tipos de desinformação pode ser préviamente antecipado? São algumas distorções inevitáveis enquanto outras não o são? Sao algumas distorções socialmente sistemáticas enquanto outras não? Como a distorção afeta o 17

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planejamento e a ação da população? Que respostas respostas práticas são possíveis nestes contextos? Podem os planejadores serem fonte de distorção da informação? Poderiam tais distorções ser justificaveis? Como esperam os planejadores que a desinformaçao flua através das relações de poder que estrutura o processo de planejamento? Finalmente, tendo em vista que a desinformação e a distorção crônica ameaça a ação de um planejamento competentemente, bem informado, assim como a ação do cidadão, o que concretamente pode o planejador progressista fazer em termos práticos? A sequência desse capítulo, discute essas questões assim como a questão mais ampla relativa ao significado desta análise para uma prática mais efetiva e mais progressista de planejamento.

Tipos de Desinformaçao Devemos distinguir varios tipos de desinformação (veja Tabela 1). Algumas desinformações poderão ser ad hoc, ocasionais ou espontâneas . Por exemplo, numa audiência pública o consultor de um certo incorporador ao falar com rapidez ou usar involuntáriamente demasiados termos técnicos não possibilitará que a audiencia seja entendida. Essa comunicação será falha, mas nao como causa de uma distorção sistemática ou intencional. Em outras circunstâncias, no entanto, a desinformação refletirá os papeis políticoeconômicos dos atores. Consideremos os comentários de James C. Miller III, diretor executivo de um grupo tarefa presidencial sobre a desregulamentação, onde ele indicava esperar dos representates da industria exageros no cálculo dos custos de certa regulamentação, enquanto que dos representantes do governo (isto é, os reguladores) era esperado a exau 8ção dos benefícios da mesma regulamentaçao. Tais dissimulações claramente nao são ocasionais mas, pelo contrário, são produtos da estrutura de relacionamentos político- econômicos. Se o planej ador puder antecipar tais tipos de desinformação ( sistemática e ad ho c ) , ele poderá igualmente v ariar suas práticas de ação. Por exemplo, medidas informais e improvisadas podem ser suficientes para respoder à distorções da informação não sistemáticas, porque tais ~distorções podem ser apenas uma questão da força do hábito. Esclarecimentos podem ser solicitados; tempo para questionamentos e verificações podem ser previstas nas a udiência s, nas avaliações de projetos, ou nas reuniões de comissões; um coordenador sensível pode intervir e solicitar para que o expositor fale mais devagar,

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mais perto do microfone, menos tecnicamente, e assim por diante. As respostas às desisnformações sistemáticas, pelo contrário, devem ser mais estratrégicas, e ter por base a análise que o planejador faça da estrutura de poder à mão. Como argumenta Steven Lukes desinformaçao sistemática é baseada em estruturas político-econômicas que determinam quem inicia e quem reage; quem invoca autoridade ou competência e quem é mistificado ou consente, quem apela para a confiança e quem prefere confiar ou permanecer cético; e finalmente quem define as agendas [pautas) do que é necessidade e quem passa a ser considerado necessit ado. ~l Algumas instâncias da desinformação podem ser socialmente necessárias (isto é inevitavel) embora outras não o sejam. Parece ser uma questão socialmente, se não biologicamente, necessária que haja uma certa divisão de capacidades e conhecimentos na sociedade, não em relação às particularidades da distribuição de renda (já que esta é uma questão política), mas em relação à distribuição desigual de outras características [e elementos inerentes à vida]. Certas pessoas desenvolvem habilidades em artes gráficas, outros capacidade de articulação junto às comunidades, outros habilidade para compor música; alguns serão mecânicos, outros pintores, alguns fazendeiros, outros professores. A maneira pela qual a divisão de trabalho é estruturada em uma dada sociedade é uma questão política-mas parece ser necessári o que haja uma certa divisão de trabalho nas vidas sociais das sociedades capitalistas, socialistas, ou das sociedades futuras. Assim algum tipo de desinformação não poderá ser evitado; elas fluirão de um alguma forma da divisão do trabalho e daí da divisão de conhecimento, capacidade e acesso à informação. Outras desinformações, como propagandas caprichosas, serão socialmente desnecessárias e portanto evitáveis. Esta análise da desinformação e da distorção comunicativa fornece bases para uma poderosa refomulação da noção dos ''lim~~es" da racionalidade da ação social de Herbert Simon. Que a racionadade da ação é limitada, parece certo; Mas como? Até que ponto isto é inevitável? Até que ponto esta limitação é política? Voltaremos a estas questões abaixo e, em mais detalhe, no próximo capítulo . Algumas limitações da a ação socia l podem ser necessárias, mas outras podem ser instrumentos sociais ou políticos- -l imitações que ?e baseam em meras relações de costume, estatus, ou poder são quase sempre inevitáveis ou imutáveis. Agir para alterar os limites n ecessárias da ação racional pode ser urna tolice, mas trabalhar para alterar os limites desnecessários que distorcem a ação racional pode ser libertador. 21 22


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Alguns limites à ação social poderá resultar de ruídos ocasionais, no entanto, outros serão sistemáticos, e decorrerão das estruturas político-econômicas que constituirão o contexto para qualquer ação. Se por um lado, lidar com distorções casuísticas como se elas fossem sistemáticas pode ser uma parnóia, por outro, lidar com distorções sistemáticas como se elas fossem apenas um fenômeno ad hoc (casuístico) é ser políticamente e eticamente cego, além de guarantir a corrência de surpresas, desapontamentos e muito provavelmente fracassos.

Como a Desinformação pode Manipular a Ação De que maneira a informação e a comunicação sempre potencialmente distorcida, pode condiciona as ações das pessoas com a quais o planejador trabalha? 3 Como as promessas de um político, os projetos de um incorporador, ou um relatório de um planejador pode influenciar as ações da população? A ação de cidadãos informados e não manipulad~~ depende de quatro critérios práticos de interação social . Em toda interação o locutor pode falar de forma mais ou menos (1) comprensivel, (2) sincera, (3) apropriada ou legítima e, (4) precisa. Em cada interação, a ação subsequente do ouvinte tambem depende sobre maneira de como estes mesmos quatro critérios sejam satisfeitos. Consideremos cada um deles brevemente. Primeiro, dependendo dos termos nos quais as questões são discutidas, as pessoas podem acha-las claras ou extremamente complicadas, relevante para suas preocupações ou não, formuladas numa linguagem corriqueira ou em burocratez. Os planejadores podem, por exemplo, pincelar as questões mais importantes ou escamotea-las com estatísticas, verborragias, impressos de computadores, ou detalhes irrelevantes- - alterando pois o ententedimento da população sobre um certo assunto, o que implicará na elevação ou redução de sua compreenssão e consciência. Segundo, dependendo das intensões nas qua.J: s as questões são apresenta~s, ..a po.pula ~ oos!e considerar d~ voto de sua confianÇ.§._ou não. As pessoas podem ser enganadas por promessas dos f u ncionários das agências de proteção social, por técnicos que se proc l amam neutros, ou por interesses estabelecidos que dissimuladamente afirmam estarem servindo ao interesse público maior. Esta confiança pública, sempre precária, pode ser honrada ou manipulada. Terceiro, dependendo das justificat i y as usadas na apresentação das questões de planejamento, as pessoas podem_

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achar que seu con~entimento está sendo manipulado ou não. Os membros de um orgão podem reivindicar legitimidadêf)Or usarem métodos adequados; partidos rivais dentro de uma comunidade podem reividincar l egitimidade por estarem atuando no interesse público, trabalhando para -endireitar os errados, ou agindo corno representantes das populações necessitadas. Em cada um desses casos a reinvindicação de legitimidade é uma tentativa de moldar a ação_s!a~~essoas através da mobilizaçao ae seus consentlmentos. Quarto, de~ndendo da forma corno-se usa-as evidências e os dados, a_ gopulação pode achár que as guesto.§s fõrãm ~presentadas de forma escamoteada ou relatadas com precisão. Os políticos assim com os proponentes ou oponentes de um certo projeto podem exagerar na argumentação, e fabricar estimativas de custos, benefícios, riscos e oportunidades. Sem consider se a verdade liberta ou não alguém, a escamoteação sistemática da verdade no processo de planejamento, poder levar ao cinis~g, mutilar a ação, assim manipular as crenças da população. Não há qualquer guarantia contra a prese.n..ç_a__d.e manipulaçao no pranejamento. O planejamento bem informado assim como a ação da população são vulneráveis ao mal gerenciamento (seja ele ad hoc ou sistemático) das crenças, consentimentos, confianças e compreensão dos planejadores e cidadãos. Tabela 2 e 3 mostram como tal gerenciaciamento (desastrado) pode ocorrer a partir do exercício do poder em processos de tomadas de decisão, determinação de agendas ou a modelação das necessidades das pessoas.

Respostas à Desinformação Cada um dos quatro critérios acima sugere como os diferentes tipos de desinformação pode in~~uenciar a parcicipação no processo de planejamento. Mais importante ainda, cada tipo de desinformação involve um diferente tipo de resposta dos planejadores. o planejador progressista pode neutralizar a manipulação da confiança de uma organizaçã comunitária local, revelando previamente como cais desinformações foram apresentadas em outra s comunidades--no caso, por exemplo, de uma promessa suspeita feita por um incorporador. Ao procurar estirpar da comuniçação os jar~s, aô chamar a atenção para questões realmente im ortantes no planejamento que poderiam estar obscurecidas pelo s imple s acúmulo informações introduzidas nos relatórios ou nas propostas dos consultores técnicos, poder-se-ia evitar o assalto à compreenssão cujo efeito é a 25 26


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desmobilização da ação dos cidadãos. Qma inflamada r�invidicação à_cornpetência técnica proferida num orgão de planejamento de saude por um administrador hospitalar para ganhar o consentimento dos consumidores, pode ser neutralizada ao se divergir polida��te daq��la competên_g_ip, ou ao explorar a questão esclarecendo onde a técnica pode ser apropriadamente usada no caso em questão. Finalmente, o planejador pode �.Ealizar a m_!!ni2ulação da crença ou do. entendimento da população, promovendo debates e críticas-ª-º pro�eto submetido à a2._r..2._vação, politizando ainda mais os processos de planejamento. "Politizar" aqui significa uma argumentação estruturada de forma mais democrática e mais aberta ao público, e não uma política de acordos espúrios e ocultos. Estas ações corretivas usadas nos processos de planejamento do uso do solo ou da saude, são variantes das estratégias organizacionais utilizadas nas comunidades e nas burocracias. Nestes casos busca-se fortalecer uma g_articipaçã� informada que ..r.�onheça os direitÕsaiheios, mas que seja cética em relação ao discurso da benevolência dos interesses estab---efecidos CujÕ obje �'7õ é ceifar ganhos privados no projetos de incorporação. Informar antes e não depois aos "afetados" tLdesorganizados", é uma regra pratica simples que ajuda neutralizar as várias formas de desinformação ou de comunicação distorcida que a população encontra no desenrolar do processo de planejamento. Da mesma forma, uma segunda regra prática é estabelecer �acionamentos d�confian<i.9 com a população e organizações comunitárias locais (ou outros grupos sociais) de forma a constituir coalisões à medida que o processo evolua. (Tais relacionamentos caracterizaram o trabalho de Allan igcobs em Satl Francisco e o de Norman Krumholz em Cleveland). O crucial aqui não é uma noy_a tecnologia social progressista o�m novo a�tifício político. Na verdade, os planejadores já possuem um vasto repertório de respostas prá�icas com as quais podem neutralizar a desinformação: ações comuns como c��em, dugla checagem, �e, consultas a�ecialistas, busca de_uma t.e.r::.c.e..i.:r:a_opini�o, esclarecimento de aspectos, exposição das hipót�, revisão e._cita�ão de relatórios, ��ação aos precedentes, i...illl.Q._cação ge valores imgortantes (como a participação democrática, por exemplo), disseminação de guestões sobre possibilidades inexploradas, atenção aos jargões e revelação de seus significados, gegociação para �ue os valores e os efeitos de uma política seja��ais_claramente definidos, trabalhar atraves de redes informais _pp.ra obter informação, �arganhar por diante. 2 por informa�o, reter�outra_l,,_e assim -

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Os planejadores progressistas, portanto, devem aprender a antecipar desinformação antes que o fato se consume, quando alguma coisa possa ainda ser feita para neutralizar­ lo, As perspectivas mais tradicionais de planejamento tratam dos problemas da informação corno se fossem inevitáveis ou ad hoc (veja Tabela 1), o que resulta sempre numa reação tardia por parte dos planejadores. O problema prático, não é, pois, inventar novas estratégias para responder à desinformação--tais estratégias já são por demais abundantes--mas é ser capaz, como sugere a concepção progressista, de antecipar e neutralizar as desinformações práticas comuns aos vários processos políticos e organizacionais (veja Tabela 2). Com tal perspectiva os planejadores progressistas podem então valer-se de um repertório de respostas para neutralizar os efeitos desmobilizadores da desinformação no processo de planejamento. Somente após conseguirem antecipar esses problemas é que os planejadores poderão neutralizar as deturpações utilizando-se da checagem e do Somente após a checagem das promessas teste dos dados. anteriormente feitas é que os planejadores podem fazer a defesa contra falsos apelos à confiança das pessoas. Somente após a antecipação da desisnforrnação que os planejadores poderão resistir ao ofuscamento utilizando-se de argumentos claros e poderosos. Somente, então os planejadores poderão devotar-se à manipulação do consentimento, invocando às tradições comuns, os precedentes, ou os direitos constituidos. O enfoque progressista extrai suas ações de um vasto conjunto de estratégias já existentes entre os planejadores e cidadãos. O enfoque também sugere que tanto o planejador corno os cidadãos tenham a capacidade de antecipar a desinformação a tempo de poder usar estas estratégias de forma efetiva, ao invés de deplorar o passado e dizer, "Bem, o que deveríamos ter feito era ... " Estas respostas involvern riscos ao planejador. Para que ele possa desempenhar essa função de forma obejetiva é necessário, primeiro do apoio interno dos orgãos de planejamento e, segundo, de apoios externos de outras agências, comunidades locais, ou figuras estabelecidas. 30 A quantidade de riscos envolvidos não pode ser minimizada n exagerada, mas conhecida através da teoria e da prática.

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Os Planejadores como Fonte de Desinformação

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0.ê__Qróprios_plaEejadores Qodem produzir desinformação. Eles quase sempre trabalham sob pressão de tempo e com dados limitados. Além disso eles sempre enfrentam pressão política e organizacional para legitimar o atual processo, aliviar ou evitar conflitos e sempre que possível promover o consenso e o consentimento entre facções potencialmente conflitantes (incorporadores, comunidades locais, representantes dos trabalhadores). Sob tais condições os planejadores podem algumas vezes exacerbar os Q!:Oblem�s causados pela desinformação promovendo: d�rpaG§.o dos ~...................................... à comQ§!tência ou à precedência, fa..tQs, apelo� indevidos declaraçoes de interesses enganosas_ou ofuscação de g!!.._estões signifi�ªntes. Além disso, a produção de desinformação pelos planejadores nem sempre ocorre por acidente, mas pode até ser incentivada pela própria estrutura das burocracias na qual eles trabalham. Não há com garantir que os planejadores não produzam desinformação. De fato, duas questões são cruciais para a prática do planejamento: Primeiro, quando é que a de?informaç� pode s�r eticamente justificada ou, então rejeitada?.- _.., Segundo, se a desinformação �ão 12.9de� p_�evista, gue _pr�v�ito se E_ode ti�ar análi�e desses problemas? O_groblema ético da desinformaçãq produzida pelos planejadores (assim como por outros profissionais) foi um tQ_pico sistemati�ente negligenciado na profissão do planejamento até rescentement�. Nos últimos anos, alguns estu os começãram a enfocar estas questões, o que produziu algumas indicações de como justificar em casos isolados--mas quase sempre rejeitando--as ações de planejamento que distorciam a comunicação: por exemplo, retenção d� informação, exacerbação dos riscos ou incertezas. 3 As atitudes dependem da particularidade dos contextos para que façam sentido e tenham algum significado; da mesma forma, qualquer justificativa ou rejeição que busque proteger a integridade, a autonomia e o bem-estar humano, deve ser interpretada e sempre reinterpretada a cada novo e particular contexto histórico. Se os princípios éticos gerais não forem aplicados cada caso específico, os planejadores correm os rico de se tornarem ou dogmáticos e cegos às peculiaridades de cada caso específico, ou apenas ums relativistas, que se contentam em acreditar que tudo que pareça direito numa dada situação é o que importa. Firme adesão a um princípio formal, pode substituir soluções prontas e insensíveis, por julgamentos éticos descriminativos e sensíveis. O relativismo situacional,no entanto, promove a ética da conveniência para os poderosos. Quando a situação decide, aqueles com poder para definir a situação irão decidir, e o "certo", será então substituído

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pelo "possível". Em cada extremo, questões relativas a justificação da prática profissional perdem o significado.34 Em casos- concretos, como poderão os planejadores, se utilizar de princípios gerais para proteger a integridade, a autonomia e o bem-estar do cidadão. De maneira geral deveríamos desaconselhar a mentira, porque, entre outras coisas, ela provoca um efeito corrosivo sobre a confiança social, no entanto em certas circunstâncias muito especiais poderiamas até justifica-la:_ tal como despistar um assaltante violento so� e o paradeiro de sua vítima que se refugiou em nossa casa. De forma semelhante, atitudes de desinformação do planejador pode em casos especiais se justificar, mas somente em condições muito particulares, e não com a frequência corno se supõe possível: quando não existirem alternativas melhores (enquanto assim consideradas por um público diversificado e bem informado); quando houver o consentimento informado de outros (um cliente solicita um breve sumário do problema, e não uma análise mais precisa); ou quando uma proposta alternativa a que é apresentada possa causar um importante e sério dano. Essas condições são bastante "soft" para darem margem a más interpretações, mas cada uma delas pode, no entanto, ser útil para se avaliar as ações desinformativas dos planejadores. Diante de contínuas mudanças nas circunstâncias históricas que demandam urna ação prática, qualquer análise ética mais geral deve ser feita de forma ampla e indeterminada. Mesmo assim, a análise da desinformação pode exercer urna função politicamente crítica. Somente depois que se conseguir distinguir os vários tipos de desinformação que o planejador produza, é que alternativas concretas para circunstâncias específicas podem ser examinadas--e somente então poderemos nos voltar para questões que involvam a justificação ou a rejeição da ação do planejador. Este capítulo não pode oferecer julgamentos éticos independentemente dos casos práticos, mas ele pode e assim o faz para, primeiro, identificar os tipos de desinformação (produzidas ou confrontadas pelos planejadores); segundo, identificar o repertório de respostas às desinformações; e terceiro, sugerir como se pode avaliar eticamente as estratégias práticas de apresentação, retenção, checagem, ou desafio à informação que são utilizadas no processo de planejamento. Como então poderão os planejadores agir diante do poder?

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Fontes Estruturais de Desinformação 34 35


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Em termos práticos, a forma dos planejadores respoderem à desinformação dependerá em parte de sua forma de vêr as Se a desinformação for fontes de tal desinformação. entendida como acidental ou particular a certas comunidades ou certos tipos de projetos, pode-se agir de maneira mais informal do que se a desinformação for de origem estrutural, a qual deve ser constantemente esperada e neutralizada. Questões relativas às fontes de desinformação tornam-se, portanto, eminentemente práticas. Quais são os tipos e os­ mecani�mos de poder que os planejadores e a população afetada enfrenta e, quão influentes são esses modos de poder? Como esse poder atua, e até que ponto ele é vulnerável ou limitado? Procurando extender a analise de Steven Luk �·s, podemos explorar três respostas a essa questões. 1 Cada resposta deverá sugerir diferentes estratégias de ação por parte dos planejadores progressistas. Uma forma de exercício do poder poder ser entendida enfocando--como o fazem os pluralistas--a questão da tomada de decisão. Aqueles que tomam decisão podem informar ou desinformar de maneira decisiva a população, em virtude da habilidade de se prevalecerem em situaçoes formais de tomada de decisão. Uma outra forma de execício sutil do poder ocorre no processo de definição de agendas--processo por onde se controla quais pessoas vão encontrar, o que e quando, que projetos deverão estar na pauta, que opções vão ser discutidas, e o que será possível fazer no final das contas. Tal tipo de poder decorre de funções tais como a de mercador (intermediário) de informaçoes que são frequentemente atribuídas aos planejadores: a determinação de quem vai descobrir o que e qu��do, sempre condiciona a ação (assim como a falta dela). Outra forma de exercitar o poder ainda mais insidiosa é aquela que resulta da habilidade de atores importantes em moldar as opiniões, o sentimento do que deve ser uma expectativa legítima, e por último as necessidades das pessoas: por exemplo, o conceito de que as pessoas devem se sujeitar defronte de grandes empresas ou de altos escalões do governo; que o socialismo para o pobre e para a classe média é perverso, mas adequado ao rico pois este controla os investimentos; que o mercado irá atender satisfazer necessidades; e que a ação coletiva não é u wª responsabilidade pública map um transtôrno. É difícil medir esse tipo de poder, no entanto ele parece ser inegável. Cada um desses três modos de poder pode dificulatr os esforços dos planejadores e cidadãos conscientes que buscam 36 37 38


participar num processo de planejamento mais democrático. Cada um desses três modos--controle da tomada de decisão, determinação da agenda, e modelação das necessidades-- podem criar desinformação que não apenas subverte a participação do cidadão consciente e articulado, mas também enfraquece os relacionamentos de trabalho entre os planejadores e a população. No planejamento de saude, por exemplo, hospitais que se proponham expandir sempre utilizam a pompa e a capacidade de suas equipes médicas para manipular a confiança e o consentimento dos mern� os da comissão municipal de planejamento da saude. 9 Nesses casos a participação da população consumidora, se caracteriza pela passividade e deferência, enquanto que a equipe de planejamento progressista que eventualmente questiona a necessidade de tal expansão passa a ser vista com suspeita Em tal caso, os membros do hospital pelos consumidores. exercem o poder não apenas através da tomada de decisão, mas por meio de suas habilaidades de controlar a agenda de discussão, e o que a população deve perceber corno Como se modelada essas agendas assim como as necessidade. percepçoes das pessoas? Por que os membros da comissão dá ouvidos a toda encenação?

O Poder como forma de Comunicação Política Os membros da equipe do hospital, no exemplo acima, foram capazes de exercer poder porque a informação que eles aprentaram--assim como a maneira como eles a comunicaram-­ foi altamente política.40 Eles apresentaram as informações de forma bastante seletiva de forma a desinformar os cidadãos. A atenção foi canalizada para necessidades aparentes e específicas enquanto as disponilidades de recursos para atender aquelas necessidades eram obscurecidas. Apelando para que o público confiasse na reputação e no passado de serviços à comunidade, os administradores do hospital enfatizavam os problemas urgentes da comunidade assim corno sua devoção e compromisso em atende-los. Ao mesmo tempo que os administradores pareciam acolher uma discussão legítima e aberta com a comunidade, procuravam ignorar e dificultar a participação das populaçoes afetadas nas.discussoes. Eles omitiram análises importantes sobre outras alternativas à expansão proposta deturpando assim as verdadeiras opções de planejamento aque foram presentadas aos membros da comissão municipal de planejamento da saude. Em cada um desses casos--e todos eles são o muito similares, como revela qualquer análise da participação pública--quase sempre o 39 40


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"empreendedor imobiliário" privado estabelecido pode exercer poder por meio do controle da informação. Ao informar ou desinformar a população, o poder atua através da manipulação da compreensão, ou da ofuscação do entendimento; da confiança, ou do falso compromisso; do consentimento, ou da concordân�iª manipulada; e do conhecimento ou da deturpação. Cada um desses três modos de poder acaba atuando para: opor-se à participação democrática e incentivar a passividade; ou estimular a ação política articulada e a implantação de um pro��sso de planejamento democrático (veja Tabela 2 e 3). Antecipando a Desinformação: Respostas do Planejamento Progressista O planejador progressista busca antecipar e neutralizar a desinformação que obstrui o planejamento acessível, informado e participativo. Cada modo de poder (tomada de decisão, controle da agenda, modelação das necessidades) assim como cada dimensão da desinformação (ofuscação da compreensão, falso compromisso, pretenção de legitimidade ou deturpação dos fatos) podem apresentar distintos obstáculos para a prática do planejamento progrel�ista, e cada Tal como aqui obstáculo pede uma resposta distinta. discutido, os planejadores podem preparar os participantes do processo de planejamento para confrontarem-se com tais desinformaçoes--às vêzes preparado-os com fatos, às vêzes com questoes e argumentos, às vêzes com conhecimento, e em outras vêzes com advertências prévias. Os planejadores podem responder ao poder da tomada de decisão antecipando às iressões políticas e mobilizando apoios compensatórios.4 Para se anteciparem às tentativas de controlar e definir a agenda, por parte interesses estabelecidos, os planejadores devem responder com uma variedade de papeis informais como a corretagem (intermediação) de informação, ou tornar-se agudamente sintonizado com o "timing" do processo de planejamento: seus estágios e procedimentos, os interesses em jogo, e as percepçoes de todos os particpantes ao longo do caminho. Além disso o planejador deve atuar para incluir ou buscar vinculações com setores que são tradicionalmente excluidos, e canalizar a atenção para as aternativas que os interesses dominantes possam querer suprimir. Como foi aqui apresentado, as práticas do planejamento progressista 41 42 43 44


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representa um refinamento do planejamento advocativo tradicional, um refinamento baseado na prática de reconhecimento das fontes sistemática de desinformação. Finalmente, os planejadores devem atuar para antecipar as tentativas de modelação das necessidade da população exercidas por interesses estabelecidos. Nestes casos o planejador deve não apenas trabalhar contra a retórica da modelação de necessidades, mas também incentivar ou se aliar aos esforços progressitas locais de organização. Diante desses modos de poder, nunca será suficiente um único tipo de resposta. Sem dúvida várias estratégias serão necessárias para que os planejadores possam responder ao poder, e sobretudo fortalecer os cidadãos que esperam ter voz efetiva nas questoes que afetam suas vidas. Conclusão O poder disponível aos planejadores progressistas envolve o uso das estratégias do técnico, do incrementalista, e do advogado-liberal, mas êsse poder é ainda mais amplo. Ao reconhecer as desinformações sistemáticas e estruturais, o planejador progressista busca antecipar e neutralizar os esforços daqueles interesses que ameaçam zombar do processo democrático de planejamento, ao deturparem casos, ao invocarem autoridade inapropriadamente, ao fazerem promessas falsas, ou ao desviarem a atenção das questões chaves. No planeiamento ambiental isto significa .c omeçar por exigir relatórios de impactQ___ambiental inteligíveis para o público e não apenas para serem comentados nas audiênc_ias públicª§. Isto significa confrontar as deturpações sobre custos, riscos e alternativas disponíveis apresentadas pelas corporaçoes. No planejamento da saude isto significa, acompanhar a assistência preventiva à saude assim corno ao atendimento médico curativo, prestar a atenção nos perigos dos locais de trabalho assim como nas respostas dos médicos. No planejamento das comunidades locais isto significa contrabalançar as reinvindicaçoes exageradas dos incorporadores e desmistificar o processo de planejamento-­ assim como todo o governo local. Em cada área, os planejadores progressistas podem incentivar a mobilização e informar a ação da populaçãd afetada. Da mesma forma que a desinformação é uma barreira para uma particpação popular competente (veja Tabela 2), a análise dessas barreiras poderá ajudar às pessoas e aos planejadores a identificar, antecipar e suplantar os obstáculos ao processo democrático de planejamento. Os planejadores devem agir para distinguir as distorções evitáveis das invetáveis, distorções ad hoc das de naturêza estrutural, e responder às mesmas de forma apropriada afim •


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de razoavelmente proteger o planeji�ento informado que fortaleça a ação do cidadão comum. Num mundo eminentemente político, qualquer tipo de racionalidade no planejamento, só poderá ser mantida se as análises avalirem cuidadosamente os contextos em que elas atuarn--como veremos no próximo capítulo. Ao agir para antecipar e neutralizar as distorções de comunicação que enfraquecem o planejamento democrático, o planejamento progressista--ainda que crítico das estruturas, e negando-se ao fatalismo--é ao mesmo tempo um processo de democratização e uma prática de organização social.

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