15 anos de um fiasco

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SALVADOR, TERÇA-FEIRA, 5/2/2008

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CADERNO DEZ!

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MÚSICA ❚ Sem sonhar com a influência de hoje, o Radiohead conheceu o fracasso no disco de estréia

15 anos de um fiasco, honey EMI | DIVULGAÇÃO

VITOR PAMPLONA

do que isso, a banda veio ao mundo decalcando sonoridade e postura grunge em vias de extinção. Em sua estréia no mundo da música – e do marketing –, o Radiohead quase conseguiu ficar no anonimato.

vpamplona@grupoatarde.com.br

Eminência parda nas discussões sobre mercado fonográfico desde que liberou na internet as músicas de In Rainbows, o Radiohead verá, em poucas semanas, brotarem referências a uma época em que tudo o que queria era ter seu nome associado a uma grande gravadora. Em 22 de fevereiro, Pablo Honey, disco de estréia da banda, completa 15 anos, período em que o Radiohead desenvolveu sua vocação para apontar o que muitos consideram a trilha musical do amanhã. Se o futuro ao Radiohead pertence, o tempo dirá. Quanto ao passado, Pablo Honey não deixa mentir: o “farol” da música era uma banda qualquer. Foi uma estréia tardia. Amigos desde a adolescência em Oxford, os cinco integrantes deixaram o rock de lado para fazer faculdade no fim dos anos 1980. Concluídos os estudos, o Radiohead pôs os diplomas na gaveta e foi à luta. Assinou com a Parlophone, ligada à gigante EMI, e gravou um EP obscuro chamado Drill antes de lançar o primeiro álbum. Mas, ao chegar às lojas, Pablo Honey não despertou praticamente nenhuma atenção. Só meses depois rádios de Israel e dos EUA desenterraram Creep, que os alçou do porão do rock alternativo. Mas o salto rumo ao estrelato acabou frustrado. Só Anyone Can Play Guitar teve ainda alguma projeção. E, após sucessivas tentativas de vingar, o Radiohead fracassou miseravelmente.

Caras e bocas do Radiohead na era Pablo Honey: no início, era assim

BABAQUICE – Anos mais tarde, já gozando do prestígio conquistado por The Bends [1995] e firmado por OK Computer [1997], Thom Yorke ouviu de uma fã uma explicação para o naufrágio de Pablo Honey: as músicas eram honestas, mas muito pessoais; não sobrava espaço para a imaginação.

Na mosca: o disco ecoa monólogos internos confessionais. Thom Yorke entendeu o recado: “Honestidade é uma qualidade babaca, não quer dizer muita coisa. Se as canções têm qualidade, extrapolam qualquer referência pessoal”, disse a respeito da fixação pelas canções sinceras no início de carreira. Mais

MUDOU – O que aconteceu desde então para aquela banda qualquer se tornar a máquina de chamar atenção de hoje? Há no mínimo duas explicações. Uma é óbvia: eles trabalharam duro até alcançar a alforria em OK Computer, sem deixar o sucesso barrar as ambições criativas. Mas uma passada de olhos sobre o lançamento dos últimos discos indica que o Radiohead, em que pese sua atual ojeriza por grandes corporações, melhorou muito sua percepção do capitalismo. Kid A [2000], o disco mais aguardado da banda, foi lançado sem estratégia de marketing: sem single e sem videoclipe [a MTV só passou pequenos trechos de vídeos liberados pelo próprio Radiohead]. Resultado: primeiro lugar na parada da Billboard. Pouca gente lembra, mas Hail To The Thief [2003] também “caiu” na internet antes de chegar às lojas. E a banda, numa atitude discrepante em relação à de In Rainbows, ficou contrariada, tendo afirmado que o disco vazado não era o definitivo. Desde Pablo Honey, o mundo da música pop mudou, em boa medida graças ao Radiohead. Mas, ao seguir renovando a música e a forma de vendê-la, o Radiohead também mudou com ele.

Comentário

Faixa a faixa, falta coesão a Pablo Dizem os psicólogos que a personalidade é formada até os sete anos. Foi pouco para o Radiohead, que existe na prática desde meados dos anos 1980. Faixa após faixa, com exceção de Creep, Pablo Honey parece ter aparecido antes da hora. É dispersivo e até certo ponto ingênuo. You, a canção de abertura, é razoável demais para um abre-alas. É notória a diferença para Creep, onde a contenção trabalha a favor dos versos auto-depreciativos de Thom Yorke. A distorção e o deboche de How Do You? poderiam estar num disco dos Sex Pistols, enquanto Stop Whispering, baladona pré-The Bends, tem ecos de U2. A ‘acústica‘ Thinking About You atinge o topo na escala confessional do disco. Em Anyone Can Play Guitar, nem a piadinha do título segura as pontas. E o pára-quedas metafórico de Ripcord, a sétima das doze faixas, faz Pablo Honey se esborrachar no chão. Com algum potencial para afastar a modorra, resta apenas Lurgee. Lenta e atmosférica, traz um Thom Yorke incrivelmente otimista, cantando pela primeira no falsete que, anos mais tarde, iria fazer escola.

CAROLINE BITTENCOURT | DIVULGAÇÃO

HEADPHONE Gabriel Bubu, 28, é baixista e guitarrista da banda carioca Do Amor. Entre outros projetos, ele acompanhou o Los Hermanos de 2001 até 2007.

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PLATO DIVORAK E OS EXCITERS

NATALIE PORTMAN’S SHAVED HEAD

ANGHENFIL Y NOS

COWBELL

CHAMAS DO INFERNO

DANÇA DO EXCITER

MOUTH FULL OF BONES

Além do carisma da voz, a banda é absurda. Linda gravação.

Vi no Myspace, num post da Cansei de Ser Sexy. Tem um solo lindo.

ZOMBIEOPER FEAT. GRUFF RHYS Novo trabalho de Diego Medina. Gruff, do Super Furry Animals, canta em galês.

TAPES ’N’ TAPES

OS ATONAIS Clima fresco de banda simples, de todo mundo tocando ao vivo, que não se acha mais com freqüência.

Dá pra ver os caras gravando num estúdio em chamas. Dreher, Birck e Leandro Blessman: o time.


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