Entrevista com Orlando Senna

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SALVADOR DOMINGO

ABRE ASPAS ORLANDO SENNA CINEASTA

«O

cinema da Bahia está vivendo o seu melhor momento» Texto VITOR PAMPLONA vpamplona@grupoatarde.com.br Fotos IRACEMA CHEQUER ichequer@grupoatarde.com.br

Corriam os anos 1950, e Orlando Senna, aos 14, estava atrasado para uma assembleia estudantil no prédio da Secretaria da Educação, hoje Museu de Arte da Bahia. Ao entrar, um garoto discursava. Ficou impressionado com duas coisas: 1) a capa em gabardine, a Humphrey Bogart, usada pelo orador em pleno calor da Bahia; 2) no discurso, o menino dizia que a política não daria conta de solucionar os problemas do Brasil e só uma revolução artística poderia levar à justiça e liberdade. A plateia bateu palmas, mas não deu bola. O orador saiu e Orlando Senna foi atrás, apresentou-se e disse que era ator. “Muito prazer, Glauber Rocha. Também sou ator”, ouviu (os dois faziam parte de grupos teatrais escolares). Cineasta do núcleo original do Cinema Novo, ex-secretário nacional do Audiovisual e ex-diretor da TV Brasil – da qual pediu demissão após divergência de gestão –, Senna vive o cinema brasileiro há meio século.

Sua geração fez a revolução artística que desejava? É difícil ter uma visão exata da minha geração e sua revolução cultural, mais do que artística. Se deu os resultados esperados ou não, acho que deu. Porque, quando falo da minha geração, não me refiro só aos baianos, mas a toda uma geração no Brasil e na América Latina. Acho que, além da revolução artística, o Cinema Novo, o teatro, a literatura renovada, tem a revolução geral dos anos 1960, a revolução sexual, de costumes, de comportamento. O último Panorama Coisa de Cinema homenageou o senhor com três filmes seus dos anos 1970, Iracema (codirigido por Jorge Bodansky), Gitirana e Diamante Bruto. O que lhe parecem hoje? São uma trilogia, fazem parte de um mesmo projeto estético. Vejo com

muito carinho. Essa nova geração de cineastas nordestinos, como Marcelo Gomes e Karim Aïnouz, tem uma relação forte com o Iracema, é uma referência para eles. Isso me dá satisfação. É história. E permanência. Sua visão sobre o cinema brasileiro mudou depois da passagem pelo governo, como servidor público? Gostei do “servidor público” (risos). Agregou conhecimentos, me deu mais responsabilidade, talvez. Eu tinha uma ideia mais selvagem: “Ah, o governador não faz porque não quer, o presidente vetou porque quis”. Aprendi que não é só querer ou não querer. É também querer, mas há toda uma espiral de acontecimentos, interesses, surpresas. Aprendi que o poder muda de lugar. Como secretário do Audiovisual, tive momentos em que o meu gabinete

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tinha uma importância decisória enorme e, depois de duas horas, não tinha mais. O senhor é agora presidente da TAL (Televisão América Latina). O que é a TAL? É uma distribuidora, uma grande cooperativa de emissoras públicas. Para se associar, as emissoras colocam programação e têm direito de tirar o que quiserem. Temos 190 associados na América Latina, perto de 500 emissoras. E Espanha e Portugal estão para entrar. Todo o conteúdo está na internet, no www.tal.tv. O audiovisual é para os países um território de afirmação. Como está o Brasil?

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«A comunicação, com o audiovisual na ponta, será o motor econômico do século. O próximo governo terá que encarar isso» A comunicação, com o audiovisual na ponta, será o maior motor econômico do século 21. Na América Latina, todos os países estão tratando de fazer ou reformar suas leis de comunicação. E os países industrializados estão reformando sua legislação. O Brasil também, mas de maneira muito tímida. Digo tímida porque faço uma comparação com a Argentina, que acaba de fazer uma lei

de meios de comunicação muito mais adiantada do que foi a proposta da Ancinav. Acho que o próximo governo terá que encarar essa questão. Corremos o risco de, sem uma legislação adequada e contemporânea, a comunicação no Brasil virar uma terra de ninguém. A lei terá que ser mais protecionista? Toda legislação é protecionista. O

Brasil está muito bem posicionado no que se refere ao consumo de sua TV no seu território e ao consumo do seu cinema nas salas de cinema. Nos últimos oito anos, tivemos em média 10% de ocupação de mercado de filmes brasileiros e já chegamos a 21%. A Argentina teve 13% ano passado e foi uma festa. Mas o Brasil não está bem no que diz respeito ao controle da distribuição. Isso está, praticamente, em mãos estrangeiras. E a divisão beneficia quase uma fonte só, os EUA. Pela sua formação étnica e cultural, o Brasil devia ser exemplo de diversidade. Quem é o inimigo da diversidade?

As hegemonias ou tentativas de hegemonia. Quem tem o monopólio tenta impor uma linha de produtos. É o que fazem Hollywood e Globo. Mas a Globo é um monopólio? Na realidade, não é mais monopolista, pois só tem 49% da audiência. Mas ainda se comporta com uma atitude monopolista. Sua força política ainda é maior do que a de todas as outras redes comerciais juntas. A resistência à nova regulamentação, vista na época da Ancinav, permanece? A mesma. Tem que resolver o embate das telefônicas com as difusoras. E só a lei pode fazer isso. Mas falta par-

Amor, carinho e cumplicidade em uma só palavra: Sim.

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ticipação popular. Na ocasião da aprovação da TV Brasil, a militância foi enorme. Aprovou e acabou a militância, como se bastasse para ter uma TV pública. Se a sociedade continuar calada, o governo não vai fazer nada. Na minha opinião, tem que criar uma fundação ou instituto desligado do governo. É uma TV da sociedade. Tem que convencer governo e partidos. Duvido muito que o José Serra, pelas coisas que já disse, apoie qualquer ideia de TV pública. No governo de São Paulo, a coisa dele com a TV Cultura foi um horror. Foi preciso o Conselho da Cultura enfrentá-lo. Ele queria usar como TV do governo, fazer até propaganda.


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«Qualquer comparação é odiosa, dizer que pernambucano faz filme melhor do que baiano é uma tolice» O senhor teme pelo audiovisual se Serra for eleito? Baseando-me nas reações dele em relação à TV pública, eu temo. O governo Lula pelo menos não era contra a TV pública, embora não tenha conseguido chegar lá. O senhor tem dois livros recentes, Os Lençóis e os Sonhos e Um Gosto de Eternidade. Qual o lugar da literatura em sua vida? É o primeiro lugar. Mas não sei qual o meu prazer maior, se escrever ou fazer um filme. A minha medida é o prazer, principalmente nessa idade. Só sinto não saber tocar um instrumento, acho que o futebol que me atrapalhou. Minha mãe me colocou para estudar piano no mesmo horário do baba (risos). Os Lençóis e os Sonhos é sobre o espaço. Tem um mundo ali e o tempo passando sobre aquele lugar. Um Gosto de Eternidade é feito sobre o tempo, como o cinema e a música. O tempo que dá sustentação à narrativa. Não tem escrito mais roteiros? Retomei agora, acabo de fazer um. No governo, podia escrever livros, mas não fazer filmes nem roteiros porque, daqui a pouco, seria eu mesmo autorizando. Esse novo roteiro é sobre Marighella. Produtores do Rio e São Paulo me pediram uma ideia de filme, como deveríamos nos aproximar do personagem. Mas não posso falar muito sobre isso. Como vê o cinema baiano atualmente? A Bahia está vivendo o melhor momento da sua história, sob o ponto de vista da produção. Não vamos fazer comparações com a época de ouro do cinema baiano, fim dos anos 1950 até meados dos anos 1960. Aquilo foi um momento especial. Eu estou muito entusiasmado. Tem uma geração de cineastas muito talentosa, como desde o Cinema Novo não existia. Qualquer comparação é odiosa, dizer que pernambucano faz filme melhor do que baiano, por exemplo, é uma tolice enorme. «

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