Feira livre da Amazônia

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AGÊNCIA ESTADO

Com o coração e as tripas O gaúcho Moacyr Scliar, que completa 72 anos amanhã, é um dos mais prolíficos autores brasileiros, com cerca de 70 livros, entre ensaios, romances, contos e crônicas. Scliar é membro da Academia Brasileira de Letras desde 2003 Texto BRENO FERNANDES bfernandes@grupoatarde.com.br

ALGUNS LIVROS PUBLICADOS: A guerra no Bom Fim (1972); O exército de um homem só (1973); Os deuses de Raquel (1975); Mês de cães danados (1977); O centauro no jardim (1980); Max e os felinos (1981); Cenas da vida minúscula (1991); A majestade do Xingu (1997); A mulher que escreveu a Bíblia (1999); Os leopardos de Kafka (2000); Na noite do ventre, o diamante (2005); Os vendilhões do tempo (2006); Manual da paixão solitária (2008).

Texto VITOR PAMPLONA vpamplona@grupoatarde.com.br

Feira livre da Amazônia Os portugueses tinham razões de Estado para erguer, em 1688, o posto fiscal para taxar todas as mercadorias que saíam da Amazônia às margens da Baía do Guajará, em Belém. Três séculos depois, a parada obrigatória não determina o pagamento de impostos, mas continua inevitável na capital dos paraenses. O desígnio de “haver o peso” das especiarias amazônicas deu origem àquela que se presume a maior feira livre da América Latina. O título é contestável, mas o Ver-o-Peso é, sem sombra de dúvida, o campeão moral da variedade. Madrugada adentro, carradas de açaí desembarcam direto da floresta para logo cedo ir parar nos pratos a decorar os balcões e a paisagem. Acompanha frango ou peixe frito. Estômagos mais aventureiros têm à disposição toneladas de maniço-

ba. É pai d‘égua, segundo os belenenses. Culinária contemporânea e popular influenciada por hábitos e paladares indígenas, o cardápio da feira convive em perfeita divergência com as ferragens seculares do mercado do peixe. Uma joia arquitetônica cravada na história local. Trazido peça por peça da Inglaterra, o cartão-postal comprova que a revolução industrial chegou à floresta amazônica. Com cheiro de peixe, ervas medicinais, frutas ou frituras, o Ver-o-Peso é a eminência parda que flutua sobre a geografia e a alma de Belém. «

DESTAQUE: No centro do Ver-o-Peso, o Museu do Índio do Pará oferece uma amostra permanente da cultura indígena amazônica. Fotos, artesanato e pureza. Solar da Beira – Boulevard Castilho França, s/n – Cidade Velha, Belém - Pará

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ELÓI CORRÊA

SAT É L I T E MERCADO VER-O-PESO BELÉM

» LEIA ENTREVISTA NA ÍNTEGRA EM ATARDE.COM.BR/MUITO

ORELHA MOACYR SCLIAR

A que o senhor se dedica, além da literatura? Sou médico e tratei de compatibilizar minhas atividades nesta área com a literatura. Agora trabalho menos em saúde, mas mantenho meus vínculos. O papel dos escritores vem mudando? Com o avanço da tecnologia, a atividade literária está ao alcance de muito mais gente, e o risco da banalização, do culto ao ego, existe. Mas, como no passado, literatura tem de ser feita com emoção, com o coração e com as tripas, se possível. O senhor já disse que escreve pelo “prazer de criar situações e personagens, nesta ordem, infelizmente”. Por que “infelizmente”? Sempre achei que a literatura deveria partir do personagem e a partir dele criar situações; mas, para mim, a trama é fundamental. O personagem vai sendo gerado em função dela. Mas é meu jeito... Qual a sua visão da obra de Jorge Amado? Conheci Jorge e Zélia quando era criança, eles eram amigos de minha família. A obra de Jorge me fascina pelo engajamento, espontaneidade, pelo retrato do Brasil que representou. O senhor já cogitou escrever algo mais ‘denuncista’? Vejo a denúncia como uma atividade sobretudo jornalística. A ficção pode, e deve, mostrar problemas sociais, mas de forma diferente. É o que acontece em muitos de meus livros. O carnaval dos animais reúne contos nos quais, em linguagem metafórica, eu falava da ditadura, então em seu auge. E qual a história da vez? Estou trabalhando num ensaio sobre medicina e poder, estudando médicos que, como Che Guevara, trocaram o estetoscópio pelo fuzil. «


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