O goleiro, o gato e a andorinha

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FOTOS REPRODUÇÃO

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Salvador, SÁBADO, 8 de março de 2008

O goleiro, o gato e a andorinha Personagens diferentes têm encontros impossíveis. Essa é a lição dos contos do escritor baiano mais famoso do mundo: Jorge Amado

VITOR PAMPLONA vpamplona@grupoatarde.com.br

No futebol, há um ditado: a bola procura sempre o craque. Durante um jogo, depois de um bate-rebate na área, ela rola para o jogador mais habilidoso, que chuta e faz a torcida inteira gritar gol. Uma bola especial, justamente a mais adorada pelos craques, um dia fez tudo diferente. Inventou de se apaixonar justo pelo pior goleiro que já existiu, tão ruim que era chamado de Cerca-Frango, Mão-Furada, Mão-Podre, Rei do Galinheiro. A bola era conhecida como Fura-Redes porque, com ela em campo, nenhum time ficava sem fazer gols. Mas, quando Cerca-Frango estava embaixo das traves, Fura-Redes só queria saber de descansar nos braços do goleiro. Esta história incrível está no livro A bola e o goleiro, do escritor baiano Jorge Amado. Ele é famoso em todo

o mundo por contar a vida de pescadores, capoeiristas e baianas de acarajé que habitam até hoje a Bahia. A história da bola Fura-Redes e do goleiro Cerca-Frango será relançada segunda-feira pela editora Companhia das Letras (R$ 25,00), com outros cinco livros do escritor, entre eles, Mar morto e Capitães da areia. “Decidimos usar muitas cores e um traço moderno, mas no espírito do futebol de antigamente“, disse o ilustrador Kiko Farkas, que fez os desenhos da nova edição de A bola e o goleiro, o segundo livro para crianças escrito por Jorge Amado. A partir de 10 de março, você visita o site www.jorgeamado.com.br para conferir as atividades que acontecerão em Salvador, no Rio e em São Paulo, como mostra de cinema, exposições e um concurso sobre a obra de Jorge Amado.

Ilustrações de Kiko Farkas, para o livro A bola e o goleiro, e de Carybé, para O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá

Dom Malhado e dona Sinhá Os gatos vivem no chão e têm fama de solitários. As aves vivem soltas pelo ar e, às vezes, andam em bandos. Será possível bichos tão diferentes gostarem um do outro? No caso do Gato Malhado e da Andorinha Sinhá, personagens de Jorge Amado, a resposta é sim. Na história, ela é o único

animal a simpatizar com o Gato na fazenda onde moram. Os outros bichos o acham egoísta e maldoso, mesmo sem conhecê-lo direito. A Andorinha, curiosa com o jeitão do Gato, aproxima-se dele. Os dois acabam namorando, o que faz os outros animais perguntarem como pode

uma ave se apaixonar por um felino feioso. A história do Gato Malhado e da Andorinha Sinhá foi uma forma que Jorge Amado encontrou para dizer que, se é possível dois bichos tão distintos conviverem, pessoas diferentes também podem fazer a mesma coisa. O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá não termina como os contos de fadas, em que o príncipe e a princesa vivem felizes para sempre. Mesmo assim, o Gato e a Andorinha guardam lembranças dos momentos juntos. O livro será relançado em junho. A TARDE FALA mais sobre Jorge Amado no Caderno 2, na segunda-feira, dia 10.

O livro O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá tem uma história curiosa também na vida real. Ele foi escrito por Jorge Amado há 60 anos para presentear seu filho João Jorge em seu primeiro aniversário. No começo, Jorge Amado não queria que o presente virasse livro. Isso só aconteceu muitos anos depois, quando seu filho pediu para Carybé (artista argentino que morou na Bahia) fazer os desenhos do Gato e da Andorinha. Jorge Amado então achou tudo tão bonito que aceitou transformar a história em livro. A seguir, João Jorge conta como foi. A Tardinha - Seu pai escreveu O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá quando você completou 1 ano. Mas você só leu a história depois de quase 30 anos. Como foi isso? João Jorge - É verdade. Eu estava com minha mãe (Zélia Gattai), mexendo em uns papéis velhos de meu pai, até que achamos os originais do livro. Eu já conhecia a história, porque minha mãe me contava quando eu era pequeno, mas foi a primeira vez que a li. Achei tudo muito bom e resolvi transformá-la em um livro. Datilografei tudo, deixando espaços para ilustrações. Aí levei esse material para Carybé. Ele desenhou nos espaços em branco e isso ficou primoroso. Quando meu pai viu, gostou também e permitiu que a gente publicasse. O livro foi um sucesso. AT - Seu pai, Jorge Amado, gostou tanto do sucesso de um livro para crianças que resolveu fazer outro, A bola e o goleiro, 36 anos mais tarde? JJ - Não, esse foi diferente, esse foi um livro feito por encomenda, para fazer parte de uma coleção de livros infantis feitos por

IRACEMA CHEQUER | AG. A TARDE

“Meu pai era doido por futebol”

João Jorge ganhou O Gato Malhado quando fez 1 ano

escritores de livros adultos. A bola e o Goleiro também fala de uma história de amor, mas meu pai decidiu que essa teria um final feliz, o que não pôde fazer na época de O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá. Quando ele escreveu O Gato..., a sociedade não era muito tolerante. Era difícil fazer com que um gato ficasse com uma andorinha. Em A bola... ele pôde mudar isso e criar um final feliz. AT - Ele gostava de futebol? JJ - Meu pai resolveu falar de futebol porque sempre foi doido por isso. Assistia aos jogos, gritava, brigava. Na Copa de 1998, ele já estava doente, mas via os jogos com a gente. Ele se levantava no meio do jogo e ia para o quarto, porque dizia que podia ter um ataque, a gente não sabe se de nervosismo ou do coração. Ele gostava tanto de futebol que até usava as palavras em inglês (o futebol foi criado na Inglaterra) para se referir ao goleiro, às jogadas, ao gol. AT - Jorge Amado tinha algum time do coração? JJ - Ele era apaixonado pela Seleção Brasileira e por dois times: o Ypiranga, de Salvador, e o Bangu, do Rio de Janeiro. Torceu por eles a vida toda.


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