SETEMBRO DE 2012
TREND HOUSE’12
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
Tudo que rolou na 6ª Ed do evento APERTA O PLAY em Banda Uó
LEIA MAIS UM CLÁSSICO A Metamorfose
MAMILOS Um assunto polêmico VITROLAE&JEANS |
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V&J #01
FOTOS DO MĂŠS Galeria de
Renata
Baracho
www.flickr.com/photos/renaaata
SUMÁRIO
STRIKE A POSE
Before the catwalk
p. 70
NESTA EDIÇÃO EDITORIAL
35mm
Uma mulher e seus 23 anos
p. 4
Identidade visual
p. 5 p. 7
O mundo lúdico e multicolorido de Fernando Perdigão
APERTA O PLAY
p. 44
A arte de vestir
p. 13
Música sertaneja - do brega ao pop
p. 15
Banda Uó quer te levar pro motel
p. 20
AMPLIFICADOR Rock Cordel em Maceió
p. 42
Trend House’ 12 para leigos em moda à fashionistas de beco
Almoçando com William S. Burroiughs II
Música indie
p.39
STRIKE A POSE
NA CABECEIRA Leia mais um clássico: A Metamorfose
p.37
Movimento cinematográfico
p. 72
p. 78
ARTIFÍCIOS Para entender a arte p. 86 ENTRETANTO
p. 26
Um caleidoscópio de interpretações
p. 34
Manilos: Um assunto polêmico Uma delícia anarquista
p.88 p.92 3
| EDITORIAL O QUE QUEREMOS “A gente não quer só comida: a gente quer comida, diversão e arte.” (Titãs) Estamos imersos em uma diversidade prazerosa, muitas vezes confusa, de produções culturais. Numa chuva de informações acerca da música, da literatura, da moda, das artes no geral e das problemáticas de uma sociedade de classes, a Revista encontra um desafio que vai além da disseminação de informações: incitar o leitor e a leitora para uma visão construtiva dos assuntos que desabrocham no nosso cotidiano, principalmente. Contudo, não descartamos as análises de questões passadas. Pois entendemos que apresentar e levar a discussão sobre situações de outrora contribuem para o enriquecimento do conhecimento humano. Sejam essas análises de filmes antigos, músicas que repercutiram em um dado momento, acontecimentos que precisam ser relembrados, etc. Alguns aspectos da cultura serão assuntos certos na revista. Músicas de todos os gêneros para todos os gostos, cinema para todos os apaixonados pela sétima arte, moda para quem gosta de se vestir bem... do seu jeitinho, literatura para quem não vive sem um bom companheiro na cabeceira, artes seja ela de rua, ou feita no conforto de seu computador todas terão seus espaços. Na primeira edição da revista 4
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Vitrola&Jeans a Trend House’12 ganha destaque e é capa. Assim, a produção da moda alagoana e sua abordagem é discutida na V&J Nº 1. Estilos musicais diversos e o movimento cinematográfico compõe esta edição. Voltarmos nos olhos a um assunto polêmico: Mamilos e poliamor é necessario. Literatura traz uma análise sobre clássicos e a arte vem trazendo um manual que faz você entender melhor - ou não - sobre ela. Que seja a primeira de muitas, e que seja apreciada por quem gosta de cultura. O intuito é se divertir fazendo e mostrar coisas legais a todos. Discutir sobre coisas importante. A V&J se compromete em trazer sempre um edição com novidades ou não tão novidades assim, mas que no mínimo tenha algo diferente, um olhar diferenciado. EXPEDIENTE Editor-chefe: Niara Aureliano e Daybson Vasconcelos Direção de arte: Laura Pedrosa Repórteres: Ariane Sapucaia, Niara Aureliano, Daybson Vasconcelos, Roosivelt Carvalho, Ben-Hur Bernard, Laura Pedrosa e Wilson Smith
CAPA DESTA EDIÇÃO
FOTO: JACKSON RODRIGUES
NA CABECEIRA |
LEIA MAIS UM CLÁSSICO
POR LAURA PEDROSA
�������������������������������������������������������� Você já deve ter lido ou ouvido em algum lugar sobre Kafka, ������������������������� o escritor do clássico “A metamorfose”. Um dos contos mais originais de todos os tempos com um enredo um tanto quanto surreal. O assustador drama do caixeiro-viajante Gregor Samsa ainda deixa muita gente de cabelo em pé, e que faz sentar, até hoje, para discutir qual seria realmente o objetivo de Kafka ao arquitetar toda a trama. Esta obra abriu caminhos na literatura contemporânea a explorar a utilização de metáforas para analisar e criticar as relações humanas com situação novas. Sua linguagem simples e suas 140 páginas apenas não altera seu valor literário e vem conquistando cada vez mais leitores.
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A Metamorfose, de Kafka
regor Samsa, um caixeiro-viajante que está cansado da rotina desgastante do seu trabalho, certo dia, acorda em forma de inseto. Tomamos consciência dessa situação perturbadora que a personagem principal da narrativa se encontra quando, no início do livro, o autor escreve: “Numa manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregor Samsa deu por si na cama transformado num gigantesco inseto”. A metamorfose física de Gregor dá origem a uma série de outras metamorfoses não só nele, como também em toda a sua família, que antes o apoiava – interessada no retorno financeiro que o trabalho de Gregor daria – e após sua metamorfose o despreza e ignora. Há uma inversão de valores a partir do momento em que Gregor sai do papel de único trabalhador da família, e
assim, portanto, o que a sustenta e passa a ser simplesmente um inseto – que, pela descrição, é uma barata. Para o pai ele é um nada - um peso morto -, para a mãe um monstro abominável e para a irmã – esta, no entanto, afetuosa no início da metamorfose – um animal que não é o irmão e, portanto, um nada também. De um jovem “admirado” e “querido”, Gregor passou a ser execrável, nojento, e motivo de desgosto e até mesmo raiva para a sua família, que agora tinha de trabalhar para manter-se. Seu pai, antes um velho inválido que mal conseguia andar, agora trabalhava em um banco. Sua mãe bordava roupas e sua irmã era caixeira. Neste livro o autor, Franz Kafka analisa a relação do valor afetivo - não só na relação familiar, mas na sociedade como um todo – com os interesses pessoais. Essa análise torna-se cada vez mais VITROLAE&JEANS |
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clara, quando ao longo do romance vemos o “afeto” por Gregor dar espaço a um ódio, por parte do seu pai, em virtude da sua improdutividade. Essa análise aplica-se diretamente à sociedade capitalista em que vivemos, onde pessoas doentes e incapazes de produzirem algo que gere lucro ou qualquer tipo de benefício acabam por ocultadas/ apagadas da sociedade e, ainda mais, vista como um inseto, um parasita que só incomoda e atrapalha o bom funcionamento do sistema. Uma sociedade competitiva que não dá valor/lugar para o mais fraco, o diferente, o inválido. Gregor, antes de sua metamorfose possuía uma vida em virtude totalmente e exclusivamente do seu trabalho, seus familiares parasitavam-no. E então, ele se tornou o parasita. O que me causou estranheza ao ler o livro foi o motivo pelo qual Gregor, em momento algum, indagou-se sobre sua metamorfose ter acontecido. Com o tempo, Gregor cai na solidão – sua irmã, antes a única que o alimentava, não mais cuidava dele -, recolhido sempre no seu quarto, sem contato com as pessoas, apenas ouvindo e sentindo todo o desprezo de todos. Sente-se, então, não só fisicamente, mas em todos os aspectos, reduzido a um inseto. Digno de nojo e repulsa. Nessa confusão entre ser um humano e ser um inseto, Gregor morre em um mundo que o consumiu e em seguida desejou o seu fim. A seqüência da narrativa após a 6
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morte de Gregor deixa o leitor ainda mais indignado com a posição a qual o mesmo se encontrava e o sentimento de libertação da família que acaba de se livrar de um fardo e, melhor, sem culpa. Metamorfose é um retrato de uma sociedade que é essencialmente individualista e egocêntrica. “A metamorfose ela não nos transforma em insetos mais em seres mais lúcidos e mais abertos para o mundo louco em que vivemos.” KAFKA, Franz
Recomenda-se para quem gostou de ler o também clássico “A Peste”, de Albert Camus.
A METAMORFOSE, de Franz Kafka Onde comprar: Livraria Cultura Quanto? R$ 22,00
NA CABECEIRA |
Almoรงando com
Burroughs POR LAURA PEDROSA
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| NA CABECEIRA
O QUE HÁ NA PONTA DO GARFO?
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alar sobre a literatura contemporânea e fora da lei do escritor estadunidense William Seward Burroughs II é mais difícil do que parece. Como tentar entender, descrever e sistematizar toda a complexidade de um autor que foi considerado
o melhor do mundo na segunda metade do século XX? Bem, não sei. Vamos tentar começar pelo início.
Nascido em 5 de fevereiro de 1914, Burroughs foi escritor, pintor e, ainda, crítico social. Mesmo vindo de origem de uma rica família, do estado de Missouri, a do inventor de máquinas de calcular Burroughs, o escritor não demonstrava interesse algum nos negócios da família e decidiu cursar Artes na Universidade de Harvard: “Meu avô. Veja, ele não inventou exatamente a máquina de calcular, mas a engenhoca que a fazia funcionar - ou seja, um cilindro cheio de óleo e um pistão perfurado que se move sempre para cima e para baixo com a mesma velocidade. Um princípio muito simples, como a maioria das invenções. E isso me deu algum dinheiro, não muito, mas algum.”, disse em uma entrevista à Paris Review, no ano de 1965. Burroughs radicalizou a literatura, escrevendo sobre o que mais ninguém havia tido culhões para escrever até então: drogas, sexo e homossexualidade. Ele lançou aos sete ventos tudo o que qualquer pessoa, da época, esconderia no fundo do 8
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baú e tornou-se uma lenda na literatura beat [anota aí] por isso. Tratou-se do vício em drogas, antes mesmo de isso ter se tornado algo ilegal. Foi um revolucionário em todas as vezes que ousou datilografar sobre suas experiências alucinógenas. Um desconstrutor de rótulos. Grande parte da sua obra, de caráter autobiográfico, possui uma atmosfera surreal, grotesca e, muitas vezes, sem conexão alguma. Essas características dão-se devido a William ter sido um dos pioneiros da literatura experimental e, além disso, ter sido o escritor que levou à intensidade máxima o dito de que “não há literatura experimental sem vida experimental”. Durante 15 anos de sua vida, Burroughs entrou e saiu do vício nos mais variados tipos de drogas e relatou por todo esse tempo suas experiências em seus livros em fluxo de consciência. Toda pretensão que soa quando citamos o termo “autobiografia” desaparece no momento em que o associamos nos minutos seguintes a cada ponto e vír-
WILLIAM S. BURROUGHS
LONDRES, 1988 | NA CABECEIRA
gula aplicado por Burroughs em suas obras. O mais inacreditável (ou não) é que Burroughs começou a escrever do nada, apenas por tédio, o que o torna mais fantástico ainda: “Comecei a escrever por volta de 1950; tinha trinta e cinco anos na época; não parecia haver nenhuma motivação forte. Eu estava simplesmente me esforçando para pôr no papel, num estilo mais ou menos direto e jornalístico, alguma coisa sobre
minhas experiências com o vício e os viciados.”, afirmou. Em seguida, completou: “Não tinha mais nada a fazer. Escrever me deu alguma coisa que fazer todos os dias. Não acho que os resultados tenham sido de modo algum espetaculares.” Os escritos de “Naked Lunch”, seu principal livro, iniciaram-se após a morte de sua mulher, Joan Vollmer, ocorrida em 6 de setembro de 1951: “Eu sou forçado à terrível con-
clusão que eu nunca teria me tornado um escritor, a não ser pela morte de Joan, e nunca teria uma compreensão da extensão em que este evento tem motivado e formulado a minha escrita.”. Joan foi atingida, acidentalmente, por um tiro disparado por Burroughs, numa brincadeira de Guilherme Tell, onde no lugar da maçã havia um copo. Preciso citar que ambos estavam bêbados? VITROLAE&JEANS |
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GERAÇÃO BEAT Foi um movimento literário em meados dos anos 1950 por um grupo de jovens intelectuais que estava cansado do modelo quadradinho de ordem estabelecido nos EUA após a Segunda Guerra Mundial. Com o objetivo de se expressarem livremente e contarem sua visão do mundo e suas histórias, esses escritores começaram a produzir desenfreadamente, muitas vezes movidos a drogas, álcool, sexo livre e jazz – o gênero musical que mais inspirou os beats. Mais do que escrever, esse grupo de amigos tinha interesse em estar sempre junto, compondo, viajando, bebendo e, por vezes, transando em grupo. FONTE: MUNDO ESTRANHO FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
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HORA DO ALMOÇO
emorei cerca de sete dias para digerir o “Almoço Nu” (original: Naked Lunch) e as viagens – em todos os sentidos que a palavra pode assumir - de William Lee deram-me indigestão algumas centenas de vezes forçando-me a deixar o livro em um canto qualquer, até que decidi lê-lo completamente. O título significa exatamente o que eu e você compreendemos de início: Um almoço. Nu. Onde cada um dos presentes na mesa consegue ver o que há na ponta de cada um dos garfos levantados. E, diferente do que imaginei, não foi Burroughs quem o intitulou, mas seu amigo e também escritor Jack Kerouac. [anota aí] Burroughs não é algo fácil de apreciar na primeira vez, mas após algumas injeções de heroína todos nos mudamos para a “Interzone” e embarcamos na vida do junkie mais conhecido na história da literatura mundial. Em Almoço Nu, o autor nos joga em um ambiente urbano, sujo, repleto de viciados, descrevendo minuciosamente
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os efeitos de drogas de forma confusa e desconexa. A personaJACK KEROUAC gem, William Lee (ou O Agente), acorda de Escritor do famoso livro um “pesadelo” de uma da geração beat “On the Road”, recentemente vida frenética e domi- adaptado para o cinema, nada pelo vício em ópio e amigo de Burroughs dos durante 15 anos. Bur- tempos da universidade roughs coloca-nos na fileira da frente, de cabeça erguida, com o pescoço tensionado para depor sobre sua vida desvairada, a luta contra o Imperialismo norte-americano e a luta para desconstruir estereótipos. Pessoas sensíveis demais o odiarão. Odiarão o modo maçante como os seus livros descrevem drogas e a falta de linearidade.
Anota aí!
Anota aí!
|NA CABECEIRA
William Lee é de longe, sem sombra de dúvida, a personagem mais maluca de toda a Geração Beat (e por que não de toda a literatura mundial?). Em um breve resumo, eu diria que o Almoço Nu trata-se de uma coleção de textos escritos seguindo o fluxo de consciência de Burroughs após o consumo de drogas. Mas podemos ir mais além, Almoço Nu segue a mesma linha de “Junkie”, obra escrita seis anos antes. O cenário muda antes mesmo de nos acostumarmos com o anterior. Lee pode estar nos EUA e dois minutos depois no México conversando com Dr. Benway. Burroughs nos leva a orgias homossexuais, personagens estranhos, violência, mais orgias e territórios fictícios frutos de alucinações de Lee (e também de Burroughs, claro). Um livro que não nos deixa preocupado com o “onde eu parei?” e que, como podemos observar no seu prefá-
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
NA CABECEIRA |
cio: “Você pode entrar no Almoço nu em qualquer ponto de interseção... Escrevi muitos prefácios. Eles atrofiam e se amputam espontaneamente, como se amputa o dedo menor do pé, numa doença da África ocidental restrita à raça negra, e a loura que passa mostra seu tornozelo de bronze, enquanto um dedo manicurado salta pelo terraço do clube, recuperado e colocado a seus pés por seu Cão Afegão.” WILLIAM S. BURROUGHS E FRANCIS BACON LONDRES, 1989
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|NA CABECEIRA ������������������������������� Um livro cru, para quem tem estômago forte. Que questiona drogas, a estrutura da realidade e da sociedade, e a homossexualidade, pois foi nele que Burroughs declarou-se sem o mínimo receio sua opção sexual: “Um estado policial em pleno funcionamento não precisa de polícia. Não ocorre a ninguém que a homossexualidade seja uma conduta concebível...Num matriarcado, a homossexualidade é um crime político. Nenhuma
sociedade tolera a rejeição aberta de seus princípios básicos. E nós aqui não somos um matriarcado”. Critica, também, as políticas de saúde da época e sua administração com a personagem Dr. Beway. Esta biografia alucinante foi proibida nos Estados Unidos, mas liberada alguns anos depois. Inspirou até o conceito de “corpo sem órgãos”, do filósofo francês Gilles Deleuze.
Em 1991, o livro foi adaptado para o cinema pelo renomado cineasta norte-americano David Cronenberg. Nele, há uma mistura de biografia e interpretação que resulta um roteiro alucinante, fantástico e meio trash.
Recomenda-se para quem deseja enveredar pela geração beat e refletir sobre a estrutura da sociedade da época que se assemelha, em muitos pontos, à sociedade existente hoje. Recomenda-se para quem deseja discutir sobre literatura marginal e sua evolução pós-Burroughs. Para quem deseja, enfim, encontrar um livro com mil prefácios e sem fim.
Burroughs sobre Almoço Nu: “É necessariamente um livro brutal, obsceno e desagradável”.
ALMOÇO NU, de William S. Burroughs Onde comprar: Livraria Cultura Quanto? R$ 46,90
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MISTÉRIOS E PAIXÕES, de David Cronenberg Onde comprar: Livraria Cultura Quanto? R$ 16,90
APERTA O PLAY|
MÚSICA INDIE
Independência ao som dos acordes e muita vibe underground POR ROOSIVELT CARVALHO
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som indie surgiu nos anos 80 geral o indie rock não tem diferenças no com influência do punk e apare- modo de fazer música do rock and roll ceu no Reino Unido e nos Esta- que conhecemos, as letras são heterogêdos Unidos por meio de bandas com um neas, os instrumentos sãos os mesmos e som alternativo e independente que não não há tema que envolva o gênero. A dieram vinculadas a grandes gravadoras. A ferença está mesmo no modo de fazer, no cultura indie se contrapõe ao ‘normal’ e modo independente. engloba, além da música, moda e com- O indie rock se desenvolveu quase portamento, se opondo de algum modo no mesmo tempo nos Estates e em UK, a padrões sociais. mas passaram A música indie por fases diferené encontrada em tes. Nos anos 90 diversos lugares o grunge do Pearl do mundo, e com Jam e Nirvana, essa variante o até então partes som muda mando rock alternatitendo só a libervo, passou a fazer dade como o fator muito sucesso, comum. com isso, bandas F a l a n d o como essas passasobre música, o ram a ser chamaBANDA NIRVANA indie rock trouxe das de alternativas o gênero à tona através de bandas com por estarem visíveis enquanto o underinfluência punk e hardcore. Sonic You- ground classificou as que continuavam do th, The Smiths e My Bloody Valentin são velho jeito de fazer o som. referências no meio por fazerem sucesso Na virada do século, alguns gruproduzindo seus próprios discos. Outra pos como The White Stripes, The Killers e característica dada ao indie rock é som Franz Ferdinand fizeram sucesso massivo forte e distorcido, como os da banda Pi- e ficaram mais comerciais, virando refexies e da atual Foster the People. De modo rências do indie rock no mundo. FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
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| APERTA O PLAY Subgêneros Mas não é só de rock que o indie existe, o gênero independente absorve uma serie de bandas com um som diferente que compõem assim subgêneros. O hardcore, folk e até uma levada mais pop se incorporam ao indie, tornando um pouco difícil a classificação de alguns artistas. Indie pop É mais uma vertente da música independente que tem como referência Orange Juice, e no início era chamado pela imprensa britânica de “pop anorak” e pop “desajeitado”. Antes esse subgênero estava ligado à inocência e simplicidade em suas composições. O indie pop ganhou mais destaque depois de um tempo sem novidades em que perdeu a força no cenário mundial. Com a chegada de artistas como Lana Del Rey, Gossip esse subgênero reaparece no contexto musical. Baroque pop (pop barroco) O que diferencia esse subgênero dos outros é um pouco de melodrama, experimentalismo e orquestra. Uma mistura de rock, pop e música erudita feita de forma independente. O pop barroco pode parecer desconhecido ou distante, todavia artistas atuais como Florence + The Machine, 14
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Arcade Fire, Fiona Apple se enquadram nessa categoria. Indie folk Esse subgênero surgiu um pouco mais tarde que os outros, já nos anos 90, quando artistas com influências do folk começaram a fazer um som independente. As melodias começaram a apresentar mais leveza e algumas músicas tiveram seus arranjos formados por instrumentos como piano, violino e banjo. Beirut, She&Kim e Belle and Sebastian esão exemplos de indie folk. Post-punk revival Influenciado pelo pós-punk, esse subgênero surge em 2000, com o som influenciado pelo punk rock, sendo inserido teclado ou música eletrônica na composição musical de algumas bandas. The Strokes, The Killers e Interpol fazem parte desse movimento e são conhecidos mundialmente, produzindo também um som mais comercial. Indie no Brasil Alguns artistas fazem parte da música indie brasileira, com sucesso no cenário independente e com seu surgimento desvinculado de grandes gravadoras. No indie pop, por exemplo, Copacabana Club e Cansei de Ser Sexy (CSS) são bandas que se destacam. Já no cenário folk, Malu Magalhães e Vanguart .
APERTA O PLAY|
Música Sertaneja – Do brega ao pop Estilo anteriormente considerado brega é hoje o mais pedido das rádios brasileiras de diversas regiões do Brasil POR ROOSIVELT CARVALHO
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onge da cidade grande, na pacata vida interiorana, surgiu um gênero musical que representava o povo e o costume caipira. No início, as duplas cantavam sobre amor, saudade e a vida no campo, acompanhadas de suas violas. O som que se difundiu com duplas como Zico Dias e Ferrinho ou Mariano e Caçula eram as chamadas modas de viola, e são um retrato claro do começo da música caipira. Esses músicos (duplas ou solo) usavam instrumentos típicos do Brasil Colônia, como a viola caipira. A música sertaneja passou por quatro momentos desde seu surgimento em 1910, quando ainda era conhecida como um estilo caipira; hoje esse tipo de música se encontra em seu grande momento, e não está mais presa ao interior. A principal mudança foi no tema de suas canções. Se antes se falava sobre o modo de vida caipira, o ritmo passou por modificações temáticas e melódicas até os dias atuais. A adição de novos instrumentos musicais consolidou, na década de 1980, um novo estilo moderno da música sertaneja, chamado então de “sertanejo romântico”. De certa forma, uma mudança de foco do rural para o urbano. A transformação seguinte seria para o que conhecemos como sertanejo universitário.
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| APERTA O PLAY Principais mudanças do gênero sertanejo Na primeira fase do ainda conhecido como música caipira, as duplas de viola retratavam em suas letras as belezas do interior, assim como, os costumes, e o modo de vida do homem caipira, que era o oposto do homem urbano. Hoje, essas músicas são classificadas como música sertaneja raiz. Destacam-se nessa fase Tonico&Tinoco e Vieira&Vieirinha.
fase de modernização do ritmo, pois nela foi inserida a guitarra elétrica e o romantismo total. Nesse período o gênero não tinha notoriedade, pois eram nos circos, rádios AM e nos rodeios que se apresentavam os artistas. Foi em 1980 que eles passaram a ter espaço em programas de TV e rádios FM. Na terceira fase, destaca-se a massificação da música sertaneja, com releituras de músicas internacionais e de músicas da jovem guarda. Nessa fase do sertanejo destacavam-se duplas como Zezé de Camargo & Luciano e Chitãozinho & Xororó. Roberta Miranda e Nalva Aguiar são as precursoras da introdução de mulheres na música sertaneja. A música sertaneja ganha espaço no cenário nacional. FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
A segunda fase mantém quase as mesmas temáticas, incorporando agora o amor e a saudade, mas de forma leve. Essa era começou depois da segunda guerra mundial, e inseriu outros instrumentos, fazendo mesclas com alguns estilos nas melodias como, por exemplo, a música mexicana. Milionário e José Rico foi uma dupla com essas características que fizeram sucesso na década de 1970. A terceira fase é considerada a 16
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Capa do CD da dupla Zezé de Camargo& Luciano
A quarta fase pode ser considerada a mais atual da música sertaneja, ou, para alguns, o que se tornou uma verten-
APERTA O PLAY| te da mesma, uma espécie de subgênero. Surgido a partir dos anos 2000, o sertanejo universitário é a forma que se pode considerar a mais popular de todas as mudanças, e tem como característica a inserção de guitarras elétricas, sintetizadores e de uma levada mais pop. Os temas das músicas têm sido bem aceitos em várias camadas da sociedade: o sertanejo que antes sofria preconceito pelas suas temáticas ‘melosas’ e seu contexto rural, hoje está muito mais popularizado.
No início dessas mudanças, Vitor&Leo e César Menotti e Fabiano foram os nomes mais fortes, mas, com o passar do tempo, nomes como Luan Santana e Michel Teló tornaram-se os de maior destaque. É de se chamar atenção que na construção das melodias o sertanejo universitário receba influência de ritmos que antes pareciam muito distantes, como o funk, axé, pagode e até mesmo o arrocha.
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
MICHEL TELÓ IMAGEM RETIRADA DO SEU DVD AO VIVO
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GUSTTAVO LIMA CANTOR DO HIT “NA BALADA”
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
Do brega ao pop “É o Amor, Que mexe com minha cabeça E me deixa assim; Que faz eu pensar em você E esquecer de mim; Que faz eu esquecer Que a vida é feita pra viver.” Quem escuta “É o amor” ( Zezé de Carmargo e Luciano) nos dias de hoje, às vezes, nem percebe a mudança que ocorreu na música sertaneja. Antes, falava de amor; hoje, deixa lugar para letras sobre festas, mulheres e carros. O sertanejo universitário, que considero um subgênero,
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é o ritmo responsável pelos artistas que mais vendem CD’s por todo país. Apesar das inúmeras mudanças, alguns moldes continuam os mesmos: uma dupla, violas e os velhos nomes que combinam e tem a mesma sonoridade - o que dizer de Rick e Rener? ou Munhoz e Mariano, do “Camaro Amarelo”? “Agora eu fiquei doce igual caramelo, To tirando onda de Camaro amarelo. E agora você diz: vem cá que eu te quero, Quando eu passo no Camaro amarelo. E agora você vem, né? Agora você quer. Só que agora vou escolher, Tá sobrando mulher”
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O surgimento do sertanejo universitário trouxe o que pode ser considerada uma visão uma tanto quanto colegial sobre relacionamentos e a vida, onde o foco é a balada, carros e pegação. Mas, de fato, foi na juventude que o gênero encontrou seus maiores sucessos: o hit “Ai se eu te pego”, que ficou mundialmente conhecido, é destaque das músicas brasileiras que se enquadram na visão colegial e fútil. Assim como a maioria dos gêneros musicais, o sertanejo não está só nas canções, está no modo de se vestir e se comportar, nesse caso, o estilo caipira. As roupas xadrez, o uso de chapeis e cinturões está cada vez mais inserido na cultura urbana. Não mais considerados brega, hoje bombam em cada esquina movimentada da cidade grande. O estilo sertanejo também mudou da classe rural, em sua maioria pobre, e passou para a classe A da cidade. As baladas mais caras da noite paulistana, por exemplo, são de música sertaneja universitária. De certa forma isso entra em contradição com os rodeios e expoagros que antes exploravam o gênero de forma mais popular. A mudança ocorrida na música sertaneja não é um caso a parte na história da música. A questão aqui também não é se melhorou ou piorou, e sim o fato do que essa mudança refletiu na sociedade: o que era coisa de ‘matuto’, hoje é compartilhado por muitos. A música muda o
tempo todo e não importa se melhorou ou piorou, aí já depende do gosto de cada um. O sertanejo universitário é moda, vende e vende muito bem, obrigado.
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POR ROSSIVELT CARVALHO
Banda UÓ quer te levar pro motel Tecno brega e irreverência no primeiro disco do grupo que fez sucesso na internet POR ROOSIVELT CARVALHO
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uando algo é UÓ ele é cafona, é ruim, e quando se fala em Banda Uó a intenção é exatamente essa, já que é no estilo tecno brega que eles fazem seus sons. Usando inicialmente samples de músicas pop internacionais, o grupo trouxe uma nova roupagem cool e moderninha a música de Belém do Pará. Assim, a Uó tornou-se destaque no cenário alternativo do país, com a intenção de tornar relativa e discutir o que torna uma música “de qualidade”, e abranger um público maior com um tipo de música antes centralizado. Quem conhece o brega de cantores como Odair José, por exemplo, sabe que o tecno brega do trio é diferente do gênero no norte do país que surgiu entre as décadas de 1960 e 1970. Aí é que está a diferença da Banda Uó. As letras com temáticas de sofrimento e dramaticidade como: “(...) Hoje de manhã quando acordei, senti a falta sua ao meu lado sobre o cobertor, esperei sentada a noite toda, por que me castigas todo dia com esse falso amor (...)” relembram o brega, mas com uma roupagem totalmente diferente e atual. Lá pelas bandas do Pará, o gênero tecnobrega surgiu da fusão do tradicional brega com a música eletrônica, lá no início do milênio. Tendo como influência o carimbó e o calypso misturado a sintetizados e guitarras, é um dos estilos musicais do país que se desenvolveu de forma independente, com distribuição e produção sempre de forma alternativa. Gaby Amarantos, cantora do ritmo, seguiu a mesma linha de reprodução alternativa. A tecnobrega e melody paraense hoje, como tantos outros ritmos brasileiros, são produzidos e consumidos por pessoas de uma determinada região, assim como o funk e o forró que têm em comum a rejeição por parte da crítica especializada. Classicista. Música de pobre, preto, favelado. Nordestino. Essa variante da música brega (assim como outros ritmos regionais) sempre trouxe esse fator kitsch para a música, a incorporação de algo já existente - nesse caso uma música internacional - transformando em algo mais próximo da realidade do público que a atinge. Eike Uó A Banda Uó começou de forma inesperada quando o grupo fazia vídeos pra divulgar uma festa com temática brega que aconteceria em Goiânia, cidade natal do trio; nessa época, a cantora Flora 22
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Maria era a voz feminina do grupo. O vídeo fez sucesso e, com a banda agora formada por Mateus Carrilho, Davi Sabbag e a cantora transexual Mel Gonçalves, a Uó está espalhando seu som irreverente cada
APERTA O PLAY| vez mais aos quatro cantos do Brasil. O sucesso mesmo começou ano passado quando o vídeo da música ‘Shake de Amor’ foi lançado no youtube e virou sucesso na internet. O hit usa como sample ‘Whip my Hair’, da cantora norte-americana mirim Willow Smith. De lá pra cá outros vídeos saíram e mesmo sem CD o grupo já fazia shows por todo o Brasil. A versão tecno brega para a canção rendeu mais de 100 mil visualizações em duas semanas. A letra da música tem como inspiração o relacionamento da apresentadora e modelo brasileira Luciana Gimenez com o rockstar Mick Jagger. O EP - Me emoldurei de presente pra te ter - que traz cinco canções, incluindo o hit ‘Shake de Amor’, foi lançado ainda em 2011 e trouxe mais notoriedade pra banda, com todas as músicas sendo composições autorais, batidas inspiradas nos hits americanos e letras divertidas que abordavam assuntos sem pudor. O destaque no ano passado foi tão grande que a banda fez um dueto com Luiz Caldas e ganhou o prêmio de melhor web clipe no VMB (Vídeo Music Brasil), premiação da MTV Brasil. No começo, o trio contou com a ajuda dos seus padrinhos do Bonde do Rolê, que são destaque internacional por misturar elementos do rock com o funk e música eletrônica. Ganharam visibilidade internacional quando o DJ e produtor musical Diplo, e o blogueiro de Hollywood Perez Hilton postaram o vídeo deles em
seus twitters. Diplo também escreveu sobre a Banda Uó para a revista Vanity Fair. É no ‘Motel’ que eles te querem No dia 04 de setembro o CD lançado no iTunes já era o mais baixado do país, apenas com trechos de algumas faixas disponibilizadas na rede; e foi o bastante pra sentir a vibe do disco. Com 13 músicas e uma capa no estilo anime, Motel já é bem aceito e tem tudo pra fazer sucesso. Produzido por Rodrigo Gorky e Pedro D’Eyrot, integrantes do Bonde do Rolê, o disco é lançado pela gravadora Deck, e conta com a participação da cantora Preta Gil na canção Nega Samurai. Todo autoral, o CD conta com composição de todos os integrantes e outras participações como a da jamaicana Ce’Cile, o grupo de rap Das Racist, o produtor Diplo e Caetano Veloso. Sim, Caetano. O CD é o que a própria banda define como new melody, um som mais pop e com batidas mais leves que o tecnobrega original, sofre influências do reggaeton, música eletrônica e faz referências ao Axé. Mas não pensem que Motel só tem música chiclete e frenética: há baladinhas no CD e músicas com a temática brega a lá banda uó como conhecemos. O Cd é um pop bem brasileiro e irreverente: uma mistura que dá certo. VITROLAE&JEANS |
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| APERTA O PLAY Aperta o play em: Motel - Banda Uó Analisar o primeiro CD da banda uó foi divertido, é cômico e fica bem claro as referências bem legais feitas ao som brasileiro e as inusitadas misturas. Vou arriscar falar faixa a faixa sobre o disco que já é sucesso: 1. Faz Uó - A música que abre o CD tem um refrão muito chiclete e é o atual single da banda, lembra as primeiras músicas lançadas por eles. Como fãs de É o tchan que são, o clipe tem até coreografia que lembra o grupo dos anos 90; 2. Búzios do coração - Baladinha com uma levada de axé, a música faz referência aos ritmos e é cheia dos ôôô’s que já conhecemos. Lembra misticismo e - por que não? - religiosidade e amor. A música é uma das mais bonitinhas do cd, não tem muita brincadeira não. “Você é minha lua e eu sou o seu sol.” Legal né?
plicação: Vânia. A música é irreverente e uma das mais dançantes do CD; 5. Gringo - Essa faixa começa de leve, a mesma pegada pop e melody, só que mais suave, e muda no decorrer da música quando rola um batidão que particularmente me deixou confuso. Achei desconexo; 6. Cowboy - Mais uma baladinha, uma música toda bonitinha mesmo com todo o jeito incívil dos três. O legal é que rola umas referências à música sertaneja com os violões, som de berrante e uma segunda voz durante o refrão. Kitsch, não? 7. Malandro - Reggaeton puro. Uma das minhas favoritas, e é aquela que dá pra se jogar na balada até por que rola uma espécie de transição no som. Do new melody o som muda para um eletrônico com uma vibe bem massa. Super divertida;
3. Castelo de areia - Nessa música já começamos ver a experimentação de alguns elementos junto com o tecno brega: na terceira faixa metais são inseridos nas melodias. A letra dessa música lembra aqueles bregas de sofrimento do comecinho. Só eu senti uma vibe caliente na música?
8. Nega Samurai - É a música que tem como participação da Preta Gil, uma letra bem divertida e chiclete. O som do piano se sobressai em alguns momentos e dá um toque diferente na música. É uma sacanagem com a amiga, onde Preta é a fura olho da Candy Mel. Eike uó essa gargalhada no final viu;
4. Vânia - Sirenes e caos iniciam a música, e esse perigo todo tem uma ex-
9. I <3 Cafuçu - Outra que é favorita, em todos os sentidos. Tudo se mistu-
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APERTA O PLAY|
10. Cavalo de fogo - Esse nome é muito uó né?! a introdução é bem legalzinha, mas no geral eu achei a música dispensável, não tinha muitas diferenças. 11. Show da Rita - Mais uma mulher é celebrada pela UÓ, dessa vez, é Rita que dá um show. Girl Power, a música tem elementos diferentes e é bem legal, rola uma brincadeira com o rap, tanto na letra como na construção da música; 12. Chorei - Essa é bem diferente, talvez a mais diferente de todas. Nessa mistura, o forró e o new melody compõe uma canção bem brasileira, bem nordeste. A sanfona se torna um destaque na faixa e mostra a mistura de duas regiões num som que ficou bem legal. É uma das que mais representa a Banda Uó e como ela explora os ritmos do país no CD; 13. Shake de Amor (Whip My Hair) - “Vou me vingar de você, Vou me vingar de você, Vou me vingar de você (...)” Alguém ainda não conhece? O maior sucesso do grupo finaliza o álbum. Nessa o destaque é para guitarra pesada no iní-
cio que super combina com as batidas fortes da música e para a letra que é cômica se você conhecer o contexto. Motel só será lançado em CD físico em outubro, mas pela menos digitalmente o disco já é um sucesso. Depois do lançamento uma das principais performances do Grupo será no Planeta Terra Festival, que acontecerá no dia 20 de outubro, em São Paulo, e será transmitido para 19 países. No Brasil, você poderá acompanhar o festival pelo site www.terra.com.br. Se ser brega está na moda, pode-se dizer que a Banda Uó foi um das precursoras desse movimento e está fazendo bem feito. Grupo traz em Motel não só músicas diferentes, mas também uma valorização para o Brasil, pra música produzida por aqui. Um som divertido, irreverente, misturado e bem safadinho, a cara do país. Quer conhecer a UÓ? Sound Clound: http://soundcloud. com/banda-uo Se liga aí!
ra muito bem e o raggeton fica bem legal. A letra, como sempre bem divertida, mas é voltada ao meio GLS, já que cafuçu é uma gíria conhecida no grupo. Não vou explicar o significado da gíria por que é muito ampla e até os próprios gays não sabem definir bem;
Me emoldurei pra te ver (2011): http://www.fiestaintruders.com/galeria/banda-uo-ep/19317/ Motel (2012) - Deckdisc: http:// itunes.apple.com/br/album/motel/ id547234402 VITROLAE&JEANS |
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FOTOS: LAURA PEDROSA
ROCK CORDEL EM MACEIÓ
POR DAYBSON VASCONCELOS
Coletivo Popfuzz mais uma vez trabalhando pela democratização do acesso à música independente
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Banda Coffeeshop no segundo dia do Rock Cordel em Macei贸 VITROLAE&JEANS |
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É
do conhecimento de todos que Maceió não é uma cidade rica em eventos com estilos musicais diferenciados. É certo também que quando vão buscar shows, aqueles que não apreciam os ritmos tão populares na cidade acabam encontrando outra barreira, que é a falta de locais que disponibilizem espaço para que grupos diversos se apresentem. Aqui em Alagoas realmente não é comum o surgimento de oportunidades para bandas que fogem daquele casamento monogâmico – nem sempre tão fiel, é bom frisar – entre forró e pagode, porém seja lá qual for o argumento que os empresários usem para não inovar, um com toda certeza não será válido, que é afirmar que a nossa cidade não tem público para o rock. Esse tipo de argumento não é difícil de ser ouvido, mas além de ser falacioso, de certa forma é imbuído de muito preconceito, já que ainda para alguns o gosto musical de uma pessoa é unicamente um reflexo das roupas e da forma como ela se comporta. Todavia, além desse comentário nem sempre ter sustentação em si mesmo, ainda cai em um erro recorrente quando desconsidera a possibilidade de que as pessoas possam curtir gêneros musicais diferentes sem ao menos se encaixar em nenhum estereótipo que há por trás de cada um deles. Essa diversidade de indivíduos com estilos diferentes e que estavam ávidos por novidades esteve presente duran28
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te três dias na orla de Maceió. Muita gente compareceu ao posto 7, na praia de Jatiúca, nos dias 13, 14 e 15 de setembro para prestigiar diversos grupos que se apresentaram no Rock Cordel, que aconteceu pela primeira vez na capital alagoana. O Rock Cordel surgiu no ano de 2007 em Fortaleza, no Centro Cultural do Banco do Nordeste, que é a instituição idealizadora do projeto e é também a responsável pelo seu financiamento. Em alguns centros culturais o evento está consolidado e já faz parte do calendário cultural desses lugares. Na capital do Ceará, por exemplo, esse festival já está na 6ª edição, o que mostra a viabilidade da realização de eventos como esse em nossa região. Em 2012 o Banco do Nordeste completa 60 anos e a expansão do Rock Cordel para outras cidades foi uma das formas encontradas para comemorar esse aniversário. Junto ao BNB nesta tarefa está o Fora do Eixo, que convida produtores locais vinculados ao próprio circuito para a realização do evento. Em Maceió essa responsabilidade foi do Coletivo Popfuzz. Outras cidades também foram credenciadas para receber o evento pela primeira vez, como foi o caso de Vitória da Conquisto (BA), Recife (PE) e Teresina (PI), sendo que o da cidade baiana aconteceu em agosto e o próximo será em outubro na capital pernambucana.
| Igor Sandes, baixista da banda Coffeeshop
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| AMPLIFICADOR A escolha das atrações que iriam compor o Rock Cordel foi feita através do Toque no Brasil, que é um portal dinâmico que visa aproximar os produtores dos diversos artistas que têm perfil cadastrado no site. Todas as bandas se inscreveram e, a partir daí a curadoria foi feita respeitando-se a meta de que a maioria dos grupos
fosse aqui do Estado. E ainda segundo Nina Guimarães, integrante do coletivo popofuzz, era fundamental a presença de bandas de outros lugares que não apenas de Alagoas, até mesmo por uma questão de intercâmbio cultural e para incentivar o avanço da cena independente regional.
Posto 7, no segundo dia do evento
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AMPLIFICADOR| Foram selecionadas 21 bandas, das quais 16 são locais, duas de Pernambuco, duas de Sergipe e uma do Rio Grande do Norte. Todas elas se revezaram no palco durante os três dias de festa e contagiaram o público apresentando excelentes trabalhos autorais, mas também covers que tiveram espaço nas noites do rock em
Maceió. Na quinta-feira, 13, se apresentaram as bandas Dezcomunal (Mcz), Dof Lafá (Mcz), Sticky Garden (Mcz), Los Prego (Mcz), Radiola Serra Alta (PE), Eek (Mcz) e Interrompidos (Mcz), que animaram o público que esteve presente no posto 7. Apesar de o evento ter começado
Manutes (SE) tocando no Posto 7, em Maceió
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| AMPLIFICADOR com quase uma hora de atraso devido a problemas com a iluminação do local, as pessoas que foram prestigiar o primeiro dia do festival não se decepcionaram, pelo contrário, puderam curtir muito rock com segurança e profissionalismo, tanto dos artistas quanto por parte dos organizadores do evento. Um grande destaque foi Radiola Serra Alta, que é uma dupla pernambucana da cidade de Triunfo, que inova fazendo uma ponte entre a tradição popular e um som experimental com uso de novas tecnologias. Trajados de figurinos carnavalescos, eles subiram ao palco embalando um coco de roda diferenciado que fez a galera vibrar. Na sexta-feira foi a vez de Necronomicon (Mcz), Baztian (Mcz), Coffeeshop (Mcz), Mamutes (SE), Janu (Arapiraca), Foxy Trio (PE) e Xique Baratinho se apresentarem. Mesmo tendo ocorrido um novo atraso na programação, o evento continuou a brilhar e o público mais uma vez esteve presente em grande número. Thiago Gadelha, vocalista da Foxy, conversou com a gente antes do show e demonstrou estar muito feliz não só pela oportunidade de poder retornar a Alagoas, como também pela realização do evento. Segundo ele, o apoio a grupos independentes é raro e a valorização de músicas autorais é algo que deve ser sempre cultivado. E para encerrar a primeira edição do Rock Cordel em Maceió, mais sete bandas subiram ao palco no sábado, 15 de setembro, Demodèe (Mcz), Katty Winne 32
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(Mcz), Bonança (Mcz), The Baggios (SE), Marcelo Cabral + 20 (Mcz), Talma e Gadelha (RN) e Gato Negro (Arapiraca). Em respeito à diversidade de tantos outros gêneros musicais que existem, não seria aconselhável apenas dizer que o Rock Cordel é um evento de músicas de qualidade, ainda que seja; contudo, mais que isso, esse evento é responsável por disponibilizar um dos poucos espaços que viabilizam uma democratização do acesso à música, porque possibilita que algumas bandas se apresentem em centros urbanos que muitas vezes não oferecem espaços a grupos independentes. Por outro lado, ainda há toda uma aproximação e interação que existe entre os públicos que curtem os mais variados estilos de um único gênero. No caso, o rock.
Conheça o Coletivo Popfuzz http://popfuzz.com.br/ /popfuzz @ popfuzzrec
AMPLIFICADOR| Thiago Gadelha, vocal e guitarrista da banda Foxy Trio (PE)
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Um caleidoscópio de interpretações Em seu primeiro show, Elisa Lemos canta clássicos da música brasileira POR ROOSIVELT CARVALHO
O
palco do Espaço Cultural Linda Mascarenhas estava pronto para o show de estreia de Elisa Lemos, no dia 14 de setembro. O teatro lotado contou com a exibição de material audiovisual no hall e às vinte horas, pontualmente, as portas do Linda foram abertas e o ambiente ficou pequeno para a apresentação. O show Caleidoscópio, que tem direção de Toni Augusto - pai e guitarrista da cantora - faz parte do projeto “Outras Ondas” da TV Educativa (TVE) e do Instituto Zumbi dos Palmares (IZP), que levou a soteropolitana aos palcos alagoanos. O show teve ainda a participação de Gabriel Cerqueira e músicas inéditas como “Seu perdão”, de Junior Almeida. Com clássicos da música brasileira, que vão desde a MPB ao rock setentista, Elisa entra no palco e da inicio a um show sofisticado, emocionante e cheio de interpretações únicas. Foi com a música Flor de Manacá que o caleidoscópio começou. Outras canções como “As rosas não falam” e “Histórias de uma gata” foram verdadeiramente interpretadas por Elisa, que além de cantora é atriz. Visivelmente emocionada, em alguns momentos, soube segurar bem o nervosismo e 34
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manter o show sem contratempos até o final. Mesmo com toda a ansiedade da estreia, o show de Elisa Lemos foi intimista e sofisticado; a escolha do repertório foi bem adequado e a desenvoltura no palco ainda verde, talvez - foi marcante. A baiana alagoanizada tem o DNA artístico e veio para mostrar que vai ficar e encantar ainda mais e nós esperamos que isso, de fato, aconteça. Elisa concedeu uma entrevista a Vitrola&Jeans e nos contou mais detalhes sobre o show e a carreira [Vitrola&Jeans] - Quando e como surgiu a oportunidade de participar do projeto “Outras Ondas” da TV educativa? [Elisa Lemos] - A oportunidade surgiu a partir do convite da TV Educativa, depois de me ouvirem cantar numa festinha informal, numa brincadeira. [V&J] - Seu pai, Toni Augusto, famoso guitarrista Alagoano é também o produtor do seu show. Qual foi a sensação de dividir o palco com ele?
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FOTO: FERNANDO CYSNEIROS
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AMPLIFICADOR
| AMPLIFICADOR [E L] - Foi maravilhoso trabalhar com ele, pois já produziu outros artistas e experiência não lhe falta muita responsabilidade e exigência, mas sabe ouvir. Isso me deu muita segurança no palco. [V&J] - “Seu perdão” é uma música inédita, escrita por Junior Almeida. Você tem outras parcerias em mente? Tem planos de lançar um CD só com músicas inéditas em breve? [E L] - Na verdade não foi uma parceria, foi mesmo um presentão, uma honra. Pretendemos levar esse show a outros lugares e em breve gravar um CD com músicas de compositores diversos e a maioria inédita. [V&J] - Como foi a escolha do repertório para o Caleidoscópio? As canções foram escolhidas de forma mais técnica ou pessoal? [E L] - Só canto aquilo que me sensibiliza, mas claro que passa pelo critério técnico, pois ainda tenho muito o que crescer musicalmente. [V&J] - Você também é atriz. Isso te ajudou nesse primeiro show? [E L] - Como sou muito tímida, o teatro me ajuda, mas sem perder a minha essência. [V&J] - Como surgiu a parceria com Gabriel Cerqueira? 36
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[E L] -Ele me mostrou a música e eu gostei muito, e o convidei para cantar e tocar comigo.•. [V&J] - Quais os artistas que te influenciam? [E L] - Taaaantos (risos), da música erudita, rock, MPB e ainda passa pelas músicas do Leste europeu (risos). [V&J] - Elisa, você me pareceu muito “visual”, dá pra perceber isso desde o cartaz do show, até o próprio desempenho, figurino e cenografia. Como você trabalha essa questão para compor Elisa, a cantora? Como você pretende trabalhar a imagem e a comunicação nos próximos trabalhos? E como isso ajuda a compor o show? [E L] - Tive o apoio de grandes nomes! Rafael Lemos: Designer Gráfico, Fotografia: Fernando Cysneiros, Davis Farias: Diretor de palco, Alex Cerqueira: Maquiagem e cenário, Geová Amorim: Preparação vocal, Figurino: Andrea Buyers, Vivian Rose: Produção Executiva. E pude contar com músicos de primeira. Apenas senti a música, quando a emoção aflorou, me deixei levar. Como faço teatro, foi muito natural pra mim, pois me deu segurança de está diante do público, também com uma plateia daquela, quem não se emocionaria? (risos).
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UMA MULHER E SEUS 23 ANOS Uma análise do filme “minha vida sem mim” POR ARIANE SAPUCAIA
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
SARAH POLLEY INTERPRETANDO ANN EM “MINHA VIDA SEM MIM”
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ão é habitual nos depararmos nas telas de cinema com um drama que não seja regado por um sentimentalismo medíocre. Dentro do seu gênero, “Minha Vida Sem Mim”, que foi adaptado do romance de Nancy Kincaid, consegue abarcar intensamente uma sen-
satez pouco vista em relação ao que temos nas produções hollywoodianas. Ann, interpretada por Sara Polley, trará consigo uma caixinha de surpresas. A diretora e roteirista espanhola Isabel Coixet consegue assinalar no longa-metragem um conjunto de problemáVITROLAE&JEANS |
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|35mm ticas pelo qual o ser humano perpassa, e essa característica tem um valor eminente, pois traz a sensação de que as questões tratadas se assemelham cada vez mais à realidade, e permite que se construa a noção de que a vida dói, mas que tem grandes chances de ser transformada. São 106 minutos de um misto de sensações e da necessidade de uma reflexão que aparece de maneira espontânea quando se acompanha as cenas do filme. Ann que é casada com Don (Scott Speedman) trabalha à noite como faxineira de uma Universidade enquanto seu marido trava uma batalha na busca por emprego. Eles vivem em um trailer com suas duas filhas. É interessante essa percepção de como duas linhas descritivas podem desembocar em proporções mais amplas: o emprego de Ann é limpar uma Universidade quando na sua idade, 23, o mais comum seria estudar no local, contudo, faltam-lhe recursos financeiros. A personagem precisou amadurecer precocemente e as necessidades fizeram com que ela deixasse de enxergar a vida com outras perspectivas. Só restou se limitar ao que estava posto. É preciso, agora, falar do fator central que percorre o filme como um todo: a doença de Ann. Longe de revelar o desenlace da história, não se trata aqui de um spoiler, mas de (1) uma análise cuidadosa de aspectos que estão presentes no filme sem que necessariamente seja preciso expor detalhadamente as cenas e de (2) colocar os elementos básicos que norteiam o 38
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filme, ou seja, como se fosse uma sinopse, porém crítica. Quando a protagonista se depara com uma doença grave ela faz uma reflexão. Depois de descobrir seu estado suas ações futuras vão levar a um conhecimento mais profundo da realidade, das relações que contornam o indivíduo e a sociedade. Tristeza, fardos, rotinas de um trabalho exaustivo, busca por padrões e amargura são particularidades de todos os personagens e mostradas desde o início do filme e tão similares com as da vida real. A narrativa traz uma reflexão para além das relações de Ann e transcorre, mesmo que brevemente, para um assunto no tocante à complexidade da mercadoria. Como nossa vida é bombardeada pelo que produzimos e não podemos consumir. O que se tem nas vitrines é o que não podemos comprar, mas estão lá para nos oferecer prazer, felicidade e nos lesar, desviando o nosso olhar. Faz acreditar que não morreremos, mas “não funciona”. A tristeza é incontestável no cotidiano dos personagens, mas não significa a exclusão de pequenos gestos de amor. Na verdade, esses gestos são pequenos, intensos e de fácil percepção. Eles trazem à tona a pureza dos relacionamentos, a sensação de compartilhar com alguém o que resta da sua vida e de que aquela pessoa observe você dormindo e que ache bonito você babar no travesseiro. Um sorriso e uma lágrima, no seu rosto, triplicarão.
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MOVIMENTO
CINEMATOGRÁFICO
POR ARIANE SAPUCAIA
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ara surpresa, ou não, dentre vários movimentos no mundo há também o movimento cinematográfico. Descrever brevemente sobre alguns deles pode contribuir para acúmulo de informações e, para quem gosta de cinema, será prazeroso identificar dentro dos filmes as características dos estilos. É preciso ter a clareza de que não se trata aqui de uma análise profunda, mas uma exposição simples do que norteia os movimentos. O objetivo é elencar três movimentos cinematográficos, são eles: Nouvelle Vague, Cinema Novo e Cinema Marginal. A começar pelos dois intrigantes, Cinema Novo e Cinema Marginal. O Marginal é uma forma radical e extremista de produzir filmes. Surgiu na década de 60 e contestou claramente a forma de fazer cinema que estava dada na época, ou seja, se desligou das regras estabelecidas pelo cinema europeu e norte-americano. Nesse bojo de contestação, o Cinema Novo caminha junto. Mas de uma maneira antagônica ao que o Cinema Marginal propõe (no caminhar das pala-
vras essa divergência será mostrada). Há a necessidade de expor um pouco sobre a época desses movimentos, pois é de se abismar quando notamos a importância do momento histórico para relatar qualquer situação. Na década de 60, a América Latina foi marcada por movimentos revolucionários e uma grande luta contra os modelos políticos, econômicos e culturais que estavam sendo impostos pelos norte-americanos e europeus, não tão diferente do que citado há pouco no contexto cinematográfico. Eis que aparece um ponto de ligação, por que não retratar a realidade latino-americana através de filmes? O Cinema Novo cumpre esse papel e Glauber Rocha e Leon Hirszman, cineastas brasileiros, os expoentes desse modelo. O foco era deixar o cinema mais perto do povo e sem a necessidade de majestosos efeitos especiais. Como citou Glauber Rocha, “Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça!”. A diferença entre Cinema Novo e Cinema Marginal se coloca da seguinte maneira: a ética, o compasso das formas e a denúncia da realidade de uma maneira VITROLAE&JEANS |
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|35mm crítica são canalizados pelas ideias, eis o novo. Já o marginal, bem, não há grandes preocupações quanto aos valores culturais, morais e éticos, por exemplo. Trata-se, então, do inverso: extravagante, excêntrico, grotesco. Mas vale observar que assim como o novo, o marginal também delata a realidade. Júlio Bressane, Rogério Sganzerla e José Mojica Maris (o tão conhecido Zé do Caixão) representam o que sabemos sobre o movimento marginal. FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
Cineasta Glauber Rocha
Para continuar na mesma década, porém em localidade distinta, a arte do movimento Nouvelle Vague (Nova onda). Inicialmente as características básicas do movimento não vão diferir do que encontramos no site do Wikipédia. Como? Bem, trata-se de um movimento do cinema francês, dos anos sessenta, sem auxílio financeiro. Simples. Mas não se limita um movimento dessa maneira. O que estava 40
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posto na França no início dos anos 60? Estava se refletindo em todos os setores, inclusive o da cultura, a reabertura da crise capitalista. E manifestações, na França, foram surgindo decorrente de tal crise: o romance francês na literatura, conhecido como Nouveau Roman (novo romance) e o forte existencialismo de Sartre presente na filosofia são algumas delas. E no cinema, então, a Nouvelle Vague. A importância de tratar um pouco o momento histórico dos movimentos significa não atropelar o que eles propõem e não vendar os olhos para o grande conjunto de fatores que influenciaram para a existência de cada um. O movimento também é caracterizado pela mocidade dos cineastas, seria arriscado comentar que as obras cinematográficas são à flor da pele assim como a fase em que eles se encontram? Arriscado ou não, elas são intensas e ricas em diálogos e olhares sinceros entre os personagens. Jean-Luc Godard e François Truffaut, talvez os cineastas mais famosos do movimento, colocam em seus filmes o que é a nouvelle vague: quebrando as regras de um cinema puramente comercial, se arriscam em montagens incomuns e originais, uma narrativa ousada e densa, ironias e conflitos políticos, sociais, econômicos. O descuido de toda essa síntese sobre os três movimentos cinematográficos é não comentar, nem que seja rapidamente, sobre os filmes que foram produzidos pelos cineastas citados. Não queria
35mm | apenas indicar, mas acredito que seja até mesmo interessante fazer dessa maneira. E deixar o gostinho de descobrir, agora, na prática, cada caracterização feita nesse texto: temos hoje uma imensidão de produções no mundo do cinema, mas voltar um pouco no tempo não é pedir muito. Quem sabe, até mesmo, todos esses momentos históricos nos aponte algo além dos registros? Aponte-nos semelhanças e diferenças que nos façam mudar um pouco o pensamento que acumulamos sobre o mundo. São aventuras de diversas maneiras, leituras da realidade que passaram e passam por nós, seres humanos.
O Bandido da Luz Vermelha Zé do Caixão: Encarnação do Demônio Na Nouvelle Vague – François Truffaut: Os incompreendidos Jean Luc Godard: Acossado FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
VAMOS LÁ, ALGUMAS DICAS DE FILMES:
No Cinema Novo - Glauber Rocha: Deus e o Diabo na Terra do Sol Leon Hirszman: Eles Não Usam Black-Tie (com atuação incrível da Fernanda Montenegro) FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
Curiosidade: Existe um coletivo musical chamado Nouvelle Vague, ou seja, a escolha do nome da banda se deu pela existência do movimento artístico. Mais interessante ainda é o que a banda adotou para se estabelecer no cenário: reinterpretação de músicas! Cheia de surpresas, ela consegue fazer covers como se as músicas fossem próprias da banda. No mais, fica a dica e boa busca nos sites de download
No Cinema Marginal – Rogério Sganzerla: VITROLAE&JEANS |
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|STRIKE A POSE
Identidade visual Um tour pelos fatores que estão envoltos na constituição do estilo próprio POR WILSON SMITH
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imagem construída através das roupas e acessórios é um tópico que rende muitas pautas atualmente, mas essa questão além de recorrente, vem de longa data. Geralmente é pontuada por uma gama de fatores que envolvem aspectos de níveis comportamentais, econômicos, físicos e sociais acrescidos a ótica pessoal dos indivíduos. Uma indagação recorrente dentro deste assunto é como ter o tão almejado estilo próprio, diante de todas essas informações que temos acesso diariamente. É possível filtrar essa quantidade exorbitante de referências advindas das mais diversas fontes. Será realmente viável construir esse estilo único e exclusivo, ou as ondas de tendências são mais fortes e acabam inundando a individualidade. Diante dessa profusão de indagações, estar atento ao estilo se tornou um quesito que tem ganhado novos olhares (para os amante da moda ou não), as pessoas são muito mais do que o reflexo das próprias imagens. Ser cool, estiloso, descolado não esta condicionado a ter a jaqueta assinada pelo designer do momento, ou calçar as botas que foram produzidas em uma edição limitada, ter uma imagem marcante vai além do simples uso das peças que estão em alta na temporada. E pensar assim não é algo condenável, entretanto quando se enxerga pela ótica da postura/atitude fica nítido que essas qualidades se sobressaem aos objetos desejo. Não se pode comprar estilo, isso ocorre de forma gradativa e ninguém pode incorporar essa vertente na base da imposição. Pois, não é algo que esta limitado ao simples vestir. Renovar o guarda roupa a cada coleção não é a solução para esse dilema, - há aqueles que se aventurem por provar diversas criações, mas não é esses não são o foco da vez -, até por que o bacana de se criar uma imagem emblemática não esta na ostentação e sim na capacidade de redefinir os padrões através do que esta ao seu alcance. A construção do estilo esta condicionada a percepção e reprodução do seu comportamento, embora isso não fique nítido sempre. Ao compor um look é transmitido uma 42
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imagem, que trás consigo uma mensagem que resulta em inúmeras impressões, mais a única pessoa que tem que aprovar esse resultado é você mesmo, por sua opinião é a que realmente importa. Então a autoconfiança é a base para que você se sinta confortável e bem consigo mesmo. Não adianta se deter ao mérito de que estilo custa caro ou condicionar sua imagem na opinião das pessoas, o que vale mesmo é estar usando o que te agrada, sendo velho ou novo. Não adianta comprar por modismos, nem tudo que fica bem nos outros poderá surtir o mesmo efeito em você. Essa questão de encontrar o estilo próprio é algo que pode ocorrer de forma imediata ou com passar do tempo, enquanto isso não se concretiza é extremante válido aproveitar a fase das descobertas. Pois, se num futuro próximo ainda não tiver uma ideia exata do que é condizente com seu perfil, ao menos será nítido as coisas que você não gosta, em virtude de já ter experimentado para poder formular uma opinião bem alicerçada. Não adianta se privar e ficar dizendo que não gosta, sem ao menos ter tentar. Uma boa vertente é burlar o medo da ousadia e de ficar preso a rotina/ditadura fashion. Então nada de ficar no comodismo dos padrões, ao não ser que isso te faça bem. O novo é algo instigante e que proporciona o prazer dos novos horizontes. Não tenha medo de inovar, muito mesmos ter receio das opiniões alheias. Os conceitos prontos e a estranheza que o diferente causa sempre vão existir, mais isso não é motivo para ficar prezo as amarras da moda. Faça dessa experiência uma grande brincadeira, customizar uma peça que esta encalhada no seu guarda roupa, mesmo se suas aptidões para o oficio não sejam tão boas, o que vale é o exercício. Celebre a democratização da moda e o prazer de conhecer o novo. Sem rótulos, grupos ou modismo, trilhando pelo autoconhecimento e experimentação.
FOTOS: LAURA PEDROSA
Trend House’12 para leigos em moda à fashionistas de beco
POR BEN-HUR BERNARD
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ma ‘Semana de Moda’, seja a de Nova York ou a de Coité do Noia, para quem tem medo de fazer feio na vestimenta ou de se perder entre termos e nomes nunca ouvidos, é realmente intimidadora. Para quem for pela primeira vez e não fizer o tipo fashionista, pode ser que esbarre em arrogâncias e rostos fechados, mas é uma experiência única e válida! E também porque mais de 50% dos narizes empinados que você encontrar será produto do seu medo; a grande maioria das pessoas, pelo menos as que a nossa equipe da Vitrola&Jeans encontrou na Trend House’12, a Semana de Moda de Alagoas, são boa gente. Mas sim, há alguns atrevidos a Karl Lagerfeld, vestindo um modelo da Zara ou Riachuelo pelos estandes. A questão é que você definitivamente não pode se privar de assistir a um desfile de moda apenas pelo medo do desconhecido. Machucou o dedão do pé? Pois é, tropeçou no preconceito. Moda é um fenômeno social importante, reflete e produz muitos discursos culturais e políticos consistentes ao redor do mundo, desde que a humanidade decidiu ter pudor e comer frutos proibidos por Deus; além de ser um dos gêneros artísticos (vamos considerar a moda como arte, ok?) de maior alcance entre as pessoas. Portanto não permita que o preconceito ou medo de narizes pontudos, que usam uma Loui Vuitton da Rua do Comércio, te impeçam de prestigiar o trabalho de pessoas sérias, comprometidas com suas concepções estéticas, que traduzem, sim, ideias e discussões e não são apenas um belo vestido de noite. Ok, são também e alguns são apenas isso, mas e daí? Que mal há em ser apenas bonito e fim? Contanto que não cometa um desserviço social, a gente apoia o belo. 46
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Segundo dia da Trend House’ 12
Desde as marcas mais comerciais – aliás, que marca não é comercial? – até as mais exclusivas e conceituais, todas têm em comum ideias de pessoas que gastam seu precioso tempo criando formas, texturas, elegendo cores e formatando conceitos para vestir gente que pensa como os idealizadores da coleção, ou que quer aparentar que pensa algo que não é. E por favor, não tropece de novo no preconceito, ok? Também não é assim tão errado passar uma ideia de ser uma pessoa que não se é. Ninguém é o que é sempre, 100%, o tempo todo. Seria hipocrisia dizer que quem se veste sempre bem do portão pra fora, mas dentro de casa não dispensa aquela camiseta de vereador da última eleição, é uma pessoa falsa. Mentira também é falsidade e quem nunca “omitiu” informações pessoais daquela pessoa que cutucou no Facebook está, provavelmente, mentindo. O errado não é se vestir e comprar uma ideia que você não é, mas sim permitir que a roupa passe de mero acessório social para ser o seu Currículo Lattes. Até porque, não é errado julgar pela aparência? Tão errado quanto achar que um dread é coisa de maloqueiro, é apontar quem usa marca internacional como uma pessoa fútil. A menos, é claro, que seja uma pele de animal, aí a gente não só acha fútil, como criminoso e cafona. Além do mais, muitas das roupas que vestimos não refletem mesmo a nossa personalidade, mas sim um momento, um humor ou ocasião. E se a roupa emite um discurso que você apoia, mesmo que não seja de um contexto dentro da sua realidade, eis ai mais uma razão para “aparentar o que não se é”, afinal, é por uma boa causa. VITROLAE&JEANS |
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FONTE: FLICKR/DIVULGAÇÃO
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Desfile coletivo com inspiração na homenageada da Trend House’12
Trend House’12 Na sexta edição, a Semana de Moda de Alagoas pôs definitivamente o Estado na rota nacional do mundo fashion. O evento ganha destaque nos principais sites e publicações especializadas e recebe a atenção de nomes de peso como Lilian Pacce e Gloria Kalil. Assim, a Trend House, que abarca também o design e a gastronomia, se consolida como um dos grandes expoentes da moda no nordeste, fazendo-se contemporâneo e relevante ao calendário nacional. E tal qual sua importância para Alagoas, esse ano homenageou a saudosa Vera Arruda, que dispensa apresentações. Uma estilista que conseguiu materializar em roupas e acessórios as minúcias da beleza da mu48
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lher alagoana e brasileira, tendo seu nome alavancado por personalidades como Adriane Galisteu, de quem era amiga. Realizado pelo grupo S&M Bureau Criativo, o evento aconteceu de 13 a 17 de agosto, com grande parte de sua programação recepcionada pela casa Vox Room, no histórico bairro de Jaraguá. A festa de abertura, no dia 13, aconteceu na neoclássica Associação Comercial, também em Jaraguá, onde estiveram presentes alguns dos nomes da moda e da sociedade alagoana. Outros famosos, como a ex-BBB Ariadna e seu companheiro Gabriele Benedetti, além do outro casal Filipe Dylon e Aparecida Petrowky, fizeram presença. A decoração e iluminação,
STRIKE A POSE | parava à Lady Gaga (?), como sinônimo de vanguardismo. Após o vídeo, outros discursos se seguiram, como o de Fernanda Vilela, madrinha da Trend House, e do vice governador Tomás Nonô, que soube explorar bem sua eloquência. O desfile coletivo continuou as
FONTE: FLICKR/DIVULGAÇÃO
embora simples (não simplória), trouxe charme e elegância, mas não poderia ser diferente quando se projeta uma ambientação em um lugar tão imponente e cheio de significados quanto a Associação Comercial. Porém, o clichê do filé alagoano estendido em algum lugar de destaque de um evento local, seja uma conferência nacional de apicultores ou de pediatras, não foi superado. Ok, o filé é o principal ícone de nossa moda e deve sempre ser aludido em ocasiões como essa. Mas em se tratando de criatividade, transgressão, desconstrução, inovação e tudo o mais que se espera da moda, apenas estender uma toalha de filé não é o bastante. Afinal, já que se prevê a adoção do filé, que seja algo surpreendente, como uma releitura ou uma composição não convencional que remeta à técnica tradicional. A noite era de Vera – ou deveria ser – e a abertura se daria com um vídeo, que t/razia depoimentos de familiares e amigos. James Silver, o anfitrião, bem que tentou dar início aos trabalhos, mas educação era um acessório pouco utilizado pelos convidados (talvez considerado out nessa estação) que não paravam de berrar suas conversas, impedindo o discurso de abertura. Quando este finalmente se deu, o vídeo em seguida calou a todos. Entre comentários significativos e emocionados de seus irmãos e amigos, que exultavam a personalidade e os grandes êxitos da estilista – uma boa oportunidade de conhecer Vera Arruda por outro ângulo, mais intimista e caprichado – havia um que a com-
Réplica, de Nilda Rosa Leão, do famoso vestido de gravatas de Vera Arruda VITROLAE&JEANS | 49
| STRIKE A POSE homenagens da noite. A cantora Cris Braun surgiu em uma das escadas do hall da Associação Comercial, descendo os degraus cantando a capella. Sem dúvida um dos momentos (curtos) mais admiráveis, fazendo um pot-pourri com “Meu bem querer” e “Oceano”, de Djavan. Uma interpretação única e tocante, que introduziu as modelos e as peças inspiradas em Vera. O famoso vestido de gravatas esteve presente no desfile em forma de réplica, concebido pela estilista Nilda Rosa Leão (grife Da Rosa) e arrancou aplausos dos convidados. Outros nomes do desfile coletivo foram Larissa Nunes, Los Santos D’arca, Ariana e Juliana Gameleira (Artsório), Marcus Telles, Petrúcia Lopes, Bruna Bert, Marília Herman e Gabriela Jatobá (MeG), Nathália Amaral, Lara e Laís Amorim (Maneka), Fernando Itallo Ehllers, Fernando Perdigão e outros expoentes. Devido ao curto trajeto – para quem conhece o hall do prédio, o desfile se estendia de uma escada a outra – e por se tratar de um momento de pura fruição, já que o objetivo (ou ao menos se imagina isso) era relembrar Vera por meio das peças, as modelos caminhavam com muita rapidez. Talvez o desfile tenha sido esquematizado sob uma dinâmica convencional, remetendo até a um desfile de fast-fashion, porém, para essa ocasião, seria mais adequado que os modelos em exibição recebessem tratamento de obras de arte como em um vernissage. Mas felizmente tudo indicava o toque da saudo50
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sa estilista, seja nos bordados, nas cores, nas texturas ou na chita. A abertura se deu por encerrada após o término do desfile.
No segundo dia da Trend House,
a Vox Room se apresentava confortável a seus visitantes, com muitas poltronas e sofás distribuídos pelo espaço, estandes de empresas apoiadoras do evento e de comidas em geral – como a Cozinha Gourmet da Algás, que dedicou um de seus pratos, elaborados por acadêmicos de Gastronomia da Faculdade Mauricio de Nassau, à homenageada da Semana. Mas havia pouco sobre moda fora das passarelas, que se detinham a apenas duas exposições fixas e nada mais. Havia um estande onde se concentrava algumas marcas e produtos para vender, mas era apenas venda. Sobre moda, apenas dois ambientes!
Jairo Lins, acadêmico de Gastronomia da Faculdade Maurício de Nassau na Cozinha Gourmet Algás
|STRIKE A POSE A exposição “Estado D’espírito”, com curadoria de James Silver, trazia 9 estilistas representando o Nordeste, 1 de Brasília (Centro-Oeste), 1 do Paraná (Sul), 1 do Acre (Norte), 1 de São Paulo e 1 de Minas Gerais (Sudeste). Cada estilista escolhido era indicado por um amigo ou admirador. Representando nosso Estado, estava Vera Arruda mais uma vez, com sua brasilidade explícita. Heloísa Helena, que não dispensa um jeans, camiseta branca e um rabo de cavalo, estava entre os fashionistas que indicavam um nome: trazendo o Acre, a vereadora por Maceió apostou em Marina Silva que, além de figura política, é designer de biojóias. Ronaldo Fraga (SP), Melkz-Da (PE) e Alexandre Linhares (PA) eram alguns dos estilistas que também foram contemplados pela exposição.
O outro ambiente do salão da Vox Room que se destinava à moda era, obviamente, dedicado ao trabalho de Vera Arruda. Em um estande bem estruturado, com duas telas de TV que exibiam o vídeo da noite anterior, 5 manequins vestiam peças ricamente detalhadas e exuberantes. Distribuídos em 2 expositores poderiam ser vistos 2 buquês artificiais, 1 coroa, 2 gargantilhas e 2 sandálias. Na parede, uma fotografia manipulada digital e manualmente da estilista relembrava a beleza de quem um dia já foi Miss Alagoas. Porém não havia etiquetas que indicassem o ano das peças, em que situação cada uma foi concebida ou sua importância dentro da obra de Vera e nem mesmo o nome do artista da fotografia. Mesmo assim, nada apagava a emoção ou retardava a memória afetiva da experiência que é
A exposição “Estado D’espírito” com Vera Arruda (AL) e Melk Z-Da (PE) 52
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Quadro no estande em homenagem à Vera Arruda
estar diante de um Vera Arruda legítimo! Estava ali a prova da sua contemporaneidade e da necessidade (sim, necessidade) que a moda alagoana ainda possui de ser melhor representada nacional e internacionalmente. Por mais leigo em moda que fosse, o observador da exposição estava constantemente passível de se emocionar e reconhecer a brasilidade de cada peça no trabalho minucioso dos detalhes, nas cores e texturas, nas referências às etnias que colorem nossa cultura nacional etc.,
admitindo finalmente a moda como uma expressão significativa. E se leigo em Vera Arruda, o contemplador enxergaria quase que imediatamente a razão de ela ter sido, em vida e em morte, indicada como uma das melhores embaixadoras contemporâneas de nosso Estado. Mas só um “seleto” público pôde presenciar isso. Para quem desconhece quem foi ela, o nome Vera Arruda está apenas associado a uma praça pública e à violência que macula aquele lugar. Certamente Vera merecia um destino melhor. VITROLAE&JEANS |
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| STRIKE A POSE Os desfiles A equipe da V&J teve a oportunidade de acompanhar alguns dos desfiles da Trend House’12 e o saldo foi mais que positivo. Era notável a seriedade do evento e dos estilistas, o compromisso com os conceitos de cada coleção e o alinhamento e ao mesmo tempo distanciamento da moda exterior (nacional e internacional). Não que haja uma necessidade, sob o ponto de vista artístico, de sempre parecer usual, mas a moda, principalmente a das passarelas, necessita desse gancho para poder ser compreendida. E isso não é de todo ruim, até porque com a rapidez que as modelos vêm e voltam do backstage e a concorrência local com as marcas externas, se faz necessário essa padronização de modelagens. Afinal, não podemos esquecer que as roupas estão ali para despertar interesse de consumo. Assim, para quem não tem criatividade de imaginar aquele look no cotidiano das ruas ou para quem adora um desfile externo, as coleções da Aero Boat, em conjunto com os acessórios de Carol Paz, e Dui, apresentaram-se para o verão de 2013, no dia 14, na beira do Cais do Porto de Maceió. O visual industrial, que por si só já contrasta agressivamente com as ondas do mar, continuou provocando esse sentimento de não pertencimento sobre as peças em desfile, formando uma atraente composição plástica. No mesmo dia, as roupas de praia continuaram em 54
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destaque, mas na passarela da Vox Room, com Dora Marques, que trazia ilustrações Heway Verçosa como estampas, em conjunto com as joias de Sta Paz. Os looks eram predominantemente limpos, sem ruídos, apenas quebrados por ilustrações caprichadas e pelos acessórios. A união entre roupa e joia era harmoniosa. Larissa Nunes, uma das mais jovens promessas da moda local, apresentou ‘Glacê’, sua coleção inspirada nos doces de sua mãe. A década de 1920, uma de suas inspirações em coleções passadas, mesmo que não defendida assumidamente esse ano, parecia presente, sem parecer datada. As candy colors, tendência atual e já bastante explorada pelas fashionistas, ganharam tonalidades mais pasteis em ‘Glacê’. Como o próprio folder de apresentação dizia, “a coleção é feminina, sutilmente sexy e elegante”. E era mesmo! No dia do desfile, foi possível identificar que alguns comentários a acusavam de “pouco comercial”, apesar da impecabilidade do que foi apresentado. Se é verdade, não conseguimos identificar, mas se for, isso chega a ser um elogio ao mar de clichês que a moda alagoana costuma promover. Inserida no desfile do Coletivo Procompi – que contou com as marcas Da Rosa e Mythos – Maneka, a grife especializada em tamanhos especiais apresentou ‘Brilliancy’. A apresentação iniciou ao som de “Garota de Ipanema” – nada mais adequado que a música que melhor representa a beleza da mulher brasileira
FOTOS: SILVIO EUGÊNIO
O verão da Dui, com modelos a lá Frida Kahlo
Desfile Aero Boat, com acessórios de Carol Paz
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Dora Marques com as j贸ias Sta Paz e a arte em estampas de Heway Ver莽osa 56
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| Larissa Nunes interpreta os doces de sua m達e: elegante e sensual
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Desfile da Larissa Nunes 58
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STRIKE A POSE | fosse a trilha sonora – e parecia não haver nenhum limite ou recomendação para as consumidoras. Havia cumprimentos diversos para as saias, a atual tendência mullet, cores quentes e estampas, paetês e lantejoulas, cintura alta ou marcada e tudo aquilo que vai além ou até mesmo de encontro ao “preto que emagrece”. Emagrecer pra quê? Mas sim, também havia preto na paleta de cores da marca. Desde a entrada da primeira modelo plus size na passarela, assistir à Maneka proporcionou uma alegria danada ao constatar que a moda está se democratizando. E as modelos eram só deboche! Diferente das expressões gélidas esperadas em desfiles, estas sorriam; “sensualizavam” é o melhor termo; como se pensassem aliviadas que a moda finalmente contemplava suas autoestimas. Eram umas gostosas muito das exibidas, isso sim! A entrada das estilistas Lara e Laís Amorim foi ovacionada com muito entusiasmo. A Corpo Leve instalou coqueiros no percurso da passarela e trouxe a alagoanidade (ou alagoaneidade) que mais exploramos turisticamente, impressa em suas roupas: a praia. A Nação Zumbi iniciou os trabalhos, mas Eliezer Setton e Djavan cantaram o nosso Estado para os modelos femininos e masculinos desfilarem. As cores já convencionais da moda praia se fizeram presentes, mas as sungas e bermudas receberam estampas de nossos coqueiros e mares. Para a moda masculina não havia muitas surpresas e a praia apresentada dava conta de concluir
o clichê que construímos, de que somos um povo turisticamente praiano. Fora das passarelas, essa discussão que vemos cotidianamente na prática, pode até render críticas negativas. Porém devemos considerar que, não havendo muitos ícones alagoanos contemporâneos ou positivos que nos referencie país afora, não é ruim que exploremos nossas belezas naturais como um convite ao conhecimento de nossa cultura. Ainda mais sendo a Corpo Leve uma marca de moda praia. Partindo de um clichê para outro, Marcus Telles fez um desfile-show com o filé. Nele pode ser percebido que nossas referências não devem apenas ser expostas para gringo ver, sem que o próprio artista (nesse caso, estilista) a desconstrua a seu modo. Diferente da toalha de filé exposta livremente na noite de abertura da Trend House como uma mera peça de decoração, a coleção de Marcus Telles usou e abusou desses ícones tradicionais de nossa moda vernácula, transformando-as em objetos de puro luxo. Foi um show porque inicialmente se desenvolveu um cenário virtual e físico na passarela diante dos olhos de todos. Uma projeção de barras vermelhas, que deslizavam horizontal e verticalmente sobre um fundo preto, formando uma trama em constante mutação, provocou ansiedade nos espectadores. As modelos fizeram um desfile teatral, com pausas dramáticas e generosas, permitindo que os convidados observassem as minúcias das roupas, que eram VITROLAE&JEANS |
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| Não se impôs limites ou recomendações para as gostosas que vestem Maneka
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A “alagoanidade” acessível aos olhosVITROLAE&JEANS da Corpo | Leve 61
| Drama e sofisticação no desfile teatral de Marcus Telles
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| Encerramento do desfile do Marcus Telles
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muitas. E mesmo ofertando tanto tempo, elas não iam para o backstage. Voltavam do percurso, sentavam-se em cadeiras posicionadas no início da passarela e contribuíam para a formação de um cenário mágico, que misturava tecnologia atual (projeção) e tradição. As cadeiras eram Louis Ghost, de Philippe Starck e tais peças de design, famosas no mundo todo, são uma releitura da cadeira Luís XV, de meados do século 1700, que na versão contemporânea é confeccionada em policarbonato injetado transparente. Como se não fosse o bastante a quantidade de referências adotadas, a trilha sonora apresentava-se em carne e osso, na voz do cantor de música erudita, Frank Constancio, que também desfilava pela passarela, ao som de uma melodia clássica, porém atualizada. Ou seja, um show! Porém houve um elemento lamentável no desfile, que não pode, em nenhuma hipótese, ser creditado a Marcus, que foi a figuração do ex-BBB Rodrigão, apenas de sunga, desfilando por duas vezes entre as modelos profissionais. O fato é que as sungas faziam parte da coleção de Dora Marques com Sta Paz, com ilustrações de Heway Verçosa (que também não detêm culpas), mas tais peças se deslocaram para o desfile de Telles devido a um atraso do ex-BBB, que não chegou a tempo de desfilar no inicio daquele dia. Uma situação que merece apenas que se descreva e não se teça críticas, tamanha a desnecessidade que é analisá-la. Merece sim que se afirme que as sungas, a 66
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Ex-BBB Rodrigão em desfile com sunga da coleção de Dora Marques com Sta Paz e ilustrações de Heway Verlçosa
quem devemos render nossa atenção, trouxeram novidades e significâncias ao reduzido repertório de moda masculina. Voltando para Marcus Telles, essa ocasião não lhe tirou os merecidos aplausos, que foram ofertados de pé, pela primeira vez, durante toda a Trend House’12. No dia 16, entre marcas mainstream como Gasoline e Colcci, um dos mais aguardados foi Fernando Perdigão, que também trouxe o filé reinante em suas criações [ver entrevista com o estilista na página XX]. Porém se Marcus Telles mergulhou ao mesmo tempo que fugiu do clichê regional, Perdigão simplesmente operou uma transgressão em último grau. Se ousarmos definir o que se apresentou em uma única palavra, esta seria “absurdo”. Foi um daqueles instantes em que os leigos puderam se fazer a clássica pergunta “onde eu vou usar isso?”, mas “aquilo” era uma estridente manifestação de nossa moda, cultura e arte conceitual. Era como se Perdigão nos questionasse “é o filé que vocês querem ver?” e nos convidasse a revisitar esse ícone alagoano sob uma nova ótica, nos obrigando a lubrificar nossas retinas. A começar por uma das matérias primas, que não é considerada nobre, o TNT, aquele mesmo “tecido” que comprávamos para fazer fantasias na época da escola, em nossas fatídicas feiras de cultura. Lembra-se disso? Pois é, a passarela da Trend House foi o palco para ele. As formas geométricas e inconcebíveis para o que se entende convencionalmente por VITROLAE&JEANS |
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FOTO: SILVIO EUGÊNIO
Fernando Perdigão elevando o nosso filé ao extremo
roupa exibiam, como se fossem lentes de aumento, o trabalho artesanal e minucioso que é a confecção do filé. As tramas apareciam expostas, como a ação de um cirurgião que abre um corpo humano, revelando aquilo que não fazemos ideia de como funciona e se mantém vivo. Assim, mesmo filé e identificando-o como tal, as 68
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texturas que se resultavam desse experimento eram bem diferentes do que estamos acostumados a ver quando se visita as ruas do bairro do Pontal da Barra, por exemplo. Eis aí, propositadamente ou não, uma ode e uma crítica ao que construímos como elemento de nossa identidade cultural. Não era apenas moda, era arte; aliás, era também arte. No dia 17, o último desfile da Semana de Moda alagoana, aconteceu também em um espaço externo, assim como o desfile de abertura, mas dessa vez em um local mais acessível: a orla da Pajuçara, em frente ao bar Lopana. Alguns dos nomes que figuraram durante toda o evento, como Heway Verçosa, Marcus Telles, Larissa Nunes e Bruna Bert, outros conhecidos artistas e estilistas da cena alagoana, como Audifax Seabra, Ariana e Juliana Gamaleira, Ana Glafira e Ana Maia e Rosa Piatti também participaram desse “flash mob”. Um ônibus de turismo surgiu na estrada e dele surgiram modelos e peças praianas, que embora fossem produtos de pessoas distintas, pareciam dialogar entre si, como se fosse uma única coleção. A espontaneidade e a descontração parecia ser o conceito que as unia. A proposta era customizar uma simples camisa branca, que foi dada aos estilistas, com total liberdade, em comemoração aos 15 anos da revista S.MAG. Além dos desfiles convencionais, abertos aos convidados, houve também exibições que se restringiram a imprensa nacional, como o showroom de Marta
traduz ideias, promove a cultura de um ou vários lugares e dialoga universalmente sem precisar de tradutor. Logo não pode ser negligenciada pelo preconceito daquele que se diz culto, ou trancafiada em luxuosos espaços para aquele que se identifica como elite. É este sim um sentimento utópico, mas que se justifica pelo direito que o alagoano possui de poder se reconhecer no outro e experimentar a roupa como um dos elementos de expressão de sua cultura.
O flash mob em frente ao Lopana, que reunio 17 estilistas e artistas, que customizaram uma simples camisa branca
FOTO: SILVIO EUGÊNIO
Medeiros – talvez o mais famoso e representativo nome de nossa moda no mundo hoje, que traduz a renda em alta costura –, no dia 14; e o desfile externo de Maia Piatti (Ana Maia e Rosa Piatti) – marca alagoana que não se restringe à moda, mas abarca o design em geral e que possui peças em venda no Museu de Arte Moderna (MoMA) em Nova York –, no dia 16. Aberto aos convidados, contudo, aconteceu no dia 15 a exposição de joias de Bruna Bert, no restaurante Wanchako. E eis talvez o único ponto negativo da Trend House’12. Embora seja compreensivo fechar aquelas duas apresentações para os visitantes e convidados externos, pois são nomes extremamente representativos de nossa produção, objetivando que abram portas lá fora para novos talentos, Alagoas perde mais uma oportunidade de se conhecer por meio de seus artistas. Perde também a chance de desmistificar a moda como algo superficial. Ok, roupa veste apenas a nossa superfície, mas vai além das expressões de nossas identidades pessoais e coletivas. E uma única sugestão que se ousa emitir, é que o Corredor Vera Arruda, que também se situa na praia (já que não conseguimos nos desvencilhar do mar e da areia) poderia ter sido palco de ao menos um desfile. Não é necessário explicar o motivo dessa sugestão... Mas enquanto se pode pontuar pequeníssimos pontos negativos, deve-se anunciar os resultados positivos desse grande evento, que foram muitos. Moda é algo sério, gera renda,
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Before the catwalk... Relances captados antes dos desfiles POR WILSON SMITH FOTOS: JACKSON RODRIGUES
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urante a 6ª edição da Trend House, - Semana de Moda, Design e Gastronomia de Alagoas -, a Vitrola&Jeans fez a sua primeira cobertura jornalística como veículo e teve a oportunidade de prestigiar as atividades propostas pela curadoria de James Silver. Assistindo aos desfiles, fazendo um tour pelos lounges, interagindo com os fashionistas, o press local e nacional, além de vários outros formadores de opinião. Das atividades propostas, os desfiles ganham status especial, pois são através deles que os estilistas apresentam suas apostas para a próxima estação. É assim que o público pode extrair as ideias e referências para compor seus looks. A exposição de uma coleção envolve muita preparação no backstage, e esse ‘Lado B’ rende momentos incríveis, que para nossa revista foi capturado pelas lentes do fotógrafo Jackson Rodrigues. A ideia dos registros, feitos antes das tops da elite de São Paulo entrarem em cena na passarela caeté, foi fazer com que as imagens falem mais alto. Com a intenção de mostrar a preparação das modelos, os momentos preliminares dessas profissionais essenciais para fazer o show acontecer, pensamentos pairavam enquanto o ofício da fotografia era exercido. As fotos retratam da concentração anterior à alegria do final feliz. Saber o que acontece nos bastidores é uma curiosidade recorrente a muitos, e os veículos de comunicação têm investido alto nessa maxitendência. Há campanhas publicitárias onde se gasta mais no registro dos bastidores do que propriamente no teaser proposto. De fato, os registros são bastante instigantes e resultam em imagens conceituais e inspiradoras.
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O mundo lÚdico e multicolorido dE Fernando PerdigÃo POR WILSON SMITH
Uma onda conceitual invadiu a passarela quando Fernando Perdigão iniciou o seu desfile durante a 6ª edição da Trend House - Semana de Moda, Design e Gastronomia de Alagoas. As peças causaram entradas apoteóticas, que arrepiaram todos que estavam presentes. E, posteriormente, as fotos e vídeos renderam inúmeras pautas que se propagaram e vêm rompendo fronteiras, evidenciando o quanto é relevante o trabalho deste artista, que revolucionou a tecelagem em Alagoas, desde meados de 1984. A coleção foi apresentada no último dia de desfiles, 16 de agosto, na Vox Room, localizada no histórico bairro do Jaraguá, e mereceu cada aplauso que recebeu. A curadoria do evento acertou ao instigar o retorno desse mestre do filé na produção de moda caeté. O desfile foi pautado por peças extremamente expressivas e com crivo de moda impactante, pois trazem em si padronagens e texturas inéditas. E mesmo tendo a renda filé como base o trabalho está longe da linhagem padrão do artesanato, uma vez que o tear manual é redefinido de forma a proporcionar um ar de sofisticação que enche os olhos e aguça os sentidos. Além do talento nato, Fernando realiza projetos para capacitação de jovens e adultos em comunidades periféricas, onde ensina todas as técnicas necessárias à produção e confecção dos produtos - que vão da moda à decoração. Outro diferencial desses objetos diz respeito aos materiais, pois ele emprega fibras naturais, tabôa, e o paneiro. Sempre visando à sustentabilidade e trilando pelo ecologicamente correto. Em seu retorno ao cenário da moda, Perdigão incrementou para a base da sua coleção de verão’13 a modelagem de painéis plásticos, onde os pontos e tramas do filé são inseridos em telas de animais às ‘telas galinheiro’, e como se não bastasse ao invés das linhas de algodão e seda, Fernando usou tecido-não-tecido, o singelo TNT. Essa junção de matérias finalizou com maestria a proposta das roupas desta coleção autoral e inusitada. Em suma, diante dessa imensidão de criatividade o que foi visto é só um preview das propostas idealizadas por Perdigão. E como faltam palavras para descrever esse trabalho ímpar a Vitrola&Jeans optou por dar voz a Fernando, para assim compreender e propagar essa viagem tingida pelas cores de Alagoas, e os novos fluidos que a moda alagoana tem ganhado.
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FOTO: FELIPE CAMELO
|STRIKE A POSE Desde 1984 você vem trabalhando com tecelagem em Alagoas. E a paixão pelo filé como ocorreu? Apesar do preconceito local sobre este artesanato, ao lado de Sandra Marie Penicaut, fui à São Paulo e em nossa estadia na cidade realizamos várias pesquisas sobre o assunto e voltamos decididos a desenvolver esta técnica. Porém, tinha um grande desafio que era colocar o filé para serem lavadas em máquinas, sem causar danos às peças. Ao fim de muito estudo e aprimoramento, lançamos uma coleção no Hotel Jatiúca com direito a um grande desfile direcionado ao mercado turístico nacional. O que te levou a trilhar pelos rumos da moda, e quais são as suas principais referências na área? Comecei com a ideia de criar uma confecção para que minha ex-mulher, Sandra Marie Penicaut, viesse a assinar os modelos; e como estávamos ligados ao turismo, devido ao Hotel Jatiúca, colocamos os olhos na técnica do filé. Procurei a Teca, rendeira, para entender um pouco da vida dos artesões que desenvolviam a renda e me empenhei para aprender o ofício. Quanto ao processo de criação o que mais te inspira para executar as peças com crivo de moda tão conceitual? Como não dependo de amarras, minha mente é solta para criar... Não pesquiso o mercado, nem tendências, apenas crio e sei o que meu público gosta e assim lanço os modelos. O filé é tão rico em texturas 74
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e pontos que fica fácil desenvolver peças e atingir o gosto masculino e feminino. O seu potencial de criação é surpreendente. E isso ficou nítido no desfile da sua coleção summer’13, durante a 6ª edição da Trend House. Qual foi o motivo que te levou a dar essa pausa? Em 1994 parei de desenvolver moda e comecei a criar produtos de decoração, mesclando o filé a técnicas de cestarias e utilizando fibras naturais como a taboa, paneiro do coqueiro, fibra da bananeira, sisal etc... Consegui obter sucesso e comecei a participar de projetos com arquitetos locais e nacionais. Participando por vários anos da Casa Cor Pernambuco nos projetos de Miguel Vaz e Flavius Lessa Braga, tive a honra de conhecer e participar de projetos de Janete Costa e de vários renomados arquitetos pelo Brasil a fora... Sempre elevando o nome de Alagoas e suas riquezas culturais. Também no meio de decoração encontrei o preconceito de trabalhar com produtos artesanais, e sempre procuro enaltecer a arte e proporcionar o entendimento sobre ela. O que te levou a escolher materiais como: tela de galinheiro, TNT, tampas de garrafas PET, esferas de desodorante ‘roll on’ para compor as peças da sua coleção? Bem, quando fui convidado a participar da Trend Hause, já estava desenvolvendo uma exposição completa sobre a riqueza do filé alagoano e os produtos desenvolvidos com tela de galinheiro e TNT.
STRIKE A POSE | É muito fácil trabalhar com dinheiro, o que me atrai realmente é a criatividade e poder tirar leite de pedras. Então me deu um ‘click’ de criar uma coleção com estes materiais inusitados e totalmente fora do mundo da moda e testar a reação do público e da imprensa especializada. Em quanto tempo você desenvolveu esta coleção e como formulou a sua equipe criativa? Desenvolvi esta coleção em 15 dias. Todas as peças foram criadas por mim e executadas pelo mestre artesão Manoel Augusto dos Santos, os acessórios foram criados e produzidos pelo designer Rona Silva, e não tivemos receio da ousadia. Ciente de que sua arte é muito expressiva, qual a principal mensagem que você quis passar? Para mim estes eventos são para mostrar novidades e apresentar ao mundo da moda novos talentos. Eu não podia participar dessa edição e marcar o meu retorno ao mundo da moda com um trabalho tipo ‘Feijão com Arroz’... A ideia era propor algo inovador e fiquei super contente com o entendimento do público que aplaudiu e compreendeu a proposta. No desfile ficou nítido que você não tem medo de ousar, entretanto ainda há certa resistência pelo diferente em nosso país, as amarras da moda e ditadura fashion são palpáveis. Que orientação você daria para impulsionar a liberdade nesse quesito?
A crítica especializada da moda tenta desenvolver conceitos que não comporta ao mundo globalizado, e é pobre em criação. Tentam enaltecer os grandes e o poderio do comercial. Digo aos jovens estilistas que não levem em consideração e que não se limitem a esses conceitos... Escolham o perfil de quem poderá usar uma peça sua e mandem brasa. Se o trabalho for bom, nada o impedirá de fazer sucesso e concretizar seus objetivos. Visto pelo lado social, o que definitivamente está fora de moda? O preconceito, que está em todo lugar. Mas temos que desmistificar este processo. A revista eletrônica Vitrola&Jeans é formado por estudantes de Comunicação Social da UFAL (Jornalismo e Relações Públicas) que sonham em exercer suas profissões, entretanto a comunicação assim como a arte e moda são áreas repletas de dificuldades em Alagoas. Com toda a sua experiência e bagagem qual seria o seu recado aos jovens alagoanos? Estou orgulhoso de ver jovens alagoanos tentando alçar voos, tendo a ousadia de criar uma revista eletrônica e participar da editoria de moda em sua 1ª edição me deixou feliz. Isso serve para colocar o filé alagoano novamente no mundo da moda e mostrar que a cultura e a arte estão além dos preconceitos desta terra. VITROLAE&JEANS |
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Fernando Perdigão retrabalha o filé com materiais diferenciados e traz uma profusão de referências para afirmar o potencial alagoano no segmento da moda
FOTO: FELIPE CAMELO
A ARTE DE VESTIR FOTOS: JACKSON RODRIGUES
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Edição: Wilson Smith Direção criativa: Fernando Perdigão Make up: O Boticário Hair: Fios de Cabelo Sapatos: Andarella Acessórios: Rona Silva Casting: Elite de São Paulo
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Para entender a arte: um manual de como não fazer, que nós não recomendamos seguir POR BEN-HUR BERNARD
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m dos maiores desafios da arte ainda hoje, principalmente a contemporânea, é ser prestigiada e, por conseguinte, compreendida. A tamanha cobrança por entender, enfiar na cabeça – ou goela abaixo – o significado, tanto de quem contempla, quanto dos pseudocultos, acaba afastando não só o público da arte, como a própria arte se distancia quilômetros de quem pode ser seu mais novo propagador. Afinal, a arte só sobrevive porque antes mesmo de inventarem o termo “viral”, comum na web, alguém já “viralizava” obras e artistas há séculos. Em Maceió não é diferente, ainda hoje, no século 21, são maioria nas galerias, museus e exposições os mesmos rostos, sendo muitos deles também artistas, que só conseguem divulgar entre si as datas de suas mostras. Um viral cíclico e impenetrável, infelizmente. 86
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E tudo isso porque um simples traço não pode ser arte apenas por ser um traço, ele tem que significar mais que isso. “Deve representar a morte da sensibilidade da sociedade pós-moderna em seu velório; lamentado pelos teóricos das ciências humanas e desprezado pelos tecnocratas neo liberais”, poderá dizer alguém, um pseudo alguém, talvez. Mas não, é apenas um traço! Realmente perdemos a sensibilidade desse jeito, a ponto de não nos emocionarmos com um traço simplesmente pelo o que ele é? Talvez seja até demais nos sensibilizarmos por um traço, então, se for mais confortável dar um significado, que seja, vá em frente. Mas por favor, não obrigue ninguém a interpretar o mesmo. Se nem o artista do traço achou um significado, por que o seu colega que odeia ver filme iraniano com você deveria achar algum valor na obra?
Ok, digamos que o traço tenha sim significado, mas... Você não achou, não captou a mensagem. Não, você não morreu junto com a sociedade neo liberal, você só não entendeu o traço. Não há culpados e, não, isso não é desculpa para você nunca mais visitar uma exposição de arte abstrata, ou bater na madeira três vezes sempre que alguém pronunciar “Mondrian e Kandinsky” numa mesma frase. A arte está há dois séculos tentando se “descomplicar” para se tornar mais próxima, até mesmo o nosso cotidiano está virando obra prima (eu acho que eu vi um mictório colorido), e você não pode gastar dois minutos entre pinturas? Além do mais, arte contemporânea está longe de ser apenas abstracionismo. Arte contemporânea é arte, de qualquer tipo, produzida no hoje e só. Se você ver um artista de rua esculpindo um lampião com argila no centro da cidade, pode ter certeza que aquilo é arte contemporânea e, se a obra tocar você de algum jeito, pode ter outra certeza: aquilo merecia estar em uma galeria de arte. Mas então você pode perguntar “por que então só ouço falar do prestígio das obras que não entendo?” e nós da Vitrola & Jeans rebateremos: onde você esteve que não opinou isso entre críticos e artistas? E mais outra pergunta: você comprou o lampião de argila, não é mesmo? Porém, esse argumento também não serve de desculpa para fugir das exposições. O valor da arte é imensurável, por mais que digam que um Picasso vale mais que o crochê da sua mãe. Logo, as
obras expostas em galerias, selecionadas para ali estarem por uma curadoria especializada, são tão merecedoras daquele espaço quanto o lampião. Apenas não houve alguém (na verdade um grupo significativo de pessoas) que reivindicou isso, ou até mesmo o próprio artista de/da rua não quer ou não se importa com um circuito de exposições por ignorância ou preconceito. Se hoje existe um mercado de arte – por bem ou por mal, não estamos aqui para criticar, ou pelo menos não agora – é porque existe uma demanda. Você poderia ser uma demanda se estivesse m a i s preocupado em festejar a arte em geral, ao invés de estar ainda buscando o significado daquele traço deixado lá atrás.
’Broadway Boogie Woogie’ (1942-43) de Piet Mondrian: um monte de quadradinho coloridinho que desconstruiu a arte a ponto de fazer com que ela discutisse a si mesma”
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Mamilos: um assunto polêmico Ao menos os mamilos femininos, pois homens não os têm
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ulher tem peitos; mãe tem seios; a paciente de câncer tem mamas; a tetuda tem... tetas. Dependendo de quem está envolvido e da situação, o substantivo (ou devo dizer adjetivo?) muda. O que parecem não saber é que mulheres têm peitorais, músculos de sustentação que se encontram abaixo das mamas, e o mais assustador: homens também têm mamas! E eles podem desenvolver ginecomastia - termo médico que designa aumento das mamas em um homem - e até câncer. A parte cômica, ou trágica, da história é que apenas mulheres são recriminadas por mostrar as mamas (ou peitos, seios, tetas, enfim). Enquanto estar sem blusa, pra eles, é apenas sinal de calor, ou não, já que muitos o fazem para demonstrar como seus peitorais estão bem trabalhados; para elas, é sinal de vulgaridade, falta de respeito para com o próprio corpo. Sexualização do corpo feminino Este processo é chamado de sexualização e está intimamente ligado ao corpo feminino. Por isso, mulheres não são vistas por aí com os seios para fora. Assim, no nosso país tropical, topless é 88
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POR NIARA AURELIANO
coisa de “vadia”. Quantos peitos para fora, em uma praia, você viu por aí? Comum na Europa, o hábito por aqui causa estranhamento. Por menor que seja a parte de cima do biquíni, os mamilos (os polêmicos mamilos!) devem estar cobertos. A sexualização não atinge apenas as mulheres adultas: o corpo feminino desde cedo é sexualizado. Um exemplo: qual modelo de biquíni você compra pra sua filhinha, sobrinha, priminha? Apenas a parte de baixo? Não. A parte de cima do Sexualização precoce? biquíni é usada pelas meninas que ainda nem entraram na puberdade. Assim, enquanto elas por estarem sem a blusa podem ser recriminadas pela sociedade, ou até processadas por atentado ao pudor, eles estão lá, lindos e livres, com os peitorais de fora.
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
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Até os anos 90, no Brasil, não havia o apelo que há hoje aos seios grandes. Não lembro por ser nova, mas sei que bonitos Joana Prado, a “Feiticeira” eram os peitos pequenos, durinhos. Hoje, se uma mulher tem peitos pequenos e dinheiro, deveria aumentá-los. Seja por estética (o que não deve ser tomado por gosto pessoal, pois sabemos a pressão que a mídia e, por conseguinte, a própria sociedade impõe, e vice-versa) ou por gosto masculino. Se, atualmente, uma grande comissão de frente é “tão bonita” devido ao grande apelo erótico dos estadunidenses, dos quais incorporamos muitos aspectos a nossa cultura, ou pela exaustão das imagens do bumbum da mulata, ou ainda pelo apelo da personagem Feiticeira, a Joana Prado, uma das primeiras no país a colocar implantes GG, não se diz com certeza. Mas que a crença de que tetas grandes dá status de poder à mulher está ali, aqui, acolá, está. O que é isso, Batman? Nos longas “Batman Eternamente”, de 1995, e “Batman & Robin”, de 1997, as armaduras de Batman com mamilos
marcados na roupa não agradaram aos fãs de animações. A relação do super herói com o companheiro Robin sempre foi alvo de brincadeiras, mas depois da fantasia com mamilos a grande fama de gay da personagem clássica dos quadrinhos aumentou. Pela “má reputação” que conseguiu, viu-se como desnecessário marcar os mamilos de Batman na armadura, apesar das boas intenções do diretor (que eram idealizar o corpo masculino como as estátuas gregas, valorizando a anatomia
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
Implantes de silicone
Batman, Robin e os mamilos
masculina). Mas homens não têm mamilos, certo? Obviamente, as tetas masculinas não passam pelo processo de sexualização que as tetas femininas passam. Então se está marcadinho ali é desnecessário, engraçado, feio... Gay. Mamilos poderiam ser bem menos polêmicos Imagina um mundo em que mulheres e homens andassem por aí sem caVITROLAE&JEANS |
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|ENTRETANTO misa, sem que elas fossem escorraçadas, repreendidas? Sem a sexualização dos seios, a mulher poderia andar livre e solta com suas bolas por aí. Alguns podem pensar: “ah, mas isso acabaria com o tesão dos homens nos peitos”... Talvez. Talvez, peitos não tivessem mais aquele “quê” de escondido, de algo que se está esperando pra ver. Entretanto, os seios/peitos/mamas/tetas/comissão de frente continuariam a ser uma zona erógena do corpo feminino e, pasmem, do masculino também. Além do que, as tetas ainda estariam ali para serem colocadas na boca, acariciadas... (Não apenas as tetas dela, mas as quatro envolvidas, ou as seis envolvidas, ou mais, vai saber.). Anterior à questão sensual está a função fisiológica: a amamentação. Apesar das campanhas ao redor do mundo da Organização Mundial da Saúde, OMS, para que as mulheres amamentem até no mínimo o bebê completar seis meses de idade, nos Estados Unidos, em alguns países da Europa e no Brasil, algumas mulheres foram e continuam a ser repreendidas por amamentar em público. Mães brasileiras, indignadas com a situação, realizaram o ato chamado “Mamaço” em várias cidades brasileiras no decorrer de 2012. O ato consistia em dar de mamar às crianças em público como reprovação a quem considera a amamentação ao ar livre como algo vergonhoso. Protesto também foi realizado em Londres, depois de uma mulher ser incomodada por um funcionário de uma cafeteria, ao alimentar no 90
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seio sua criança. Sabendo do poder da amamentação e da função fisiológica que as mamas têm, algumas pessoas costumam resumir peitos a sua função sexual. A modelo britânica Nicola McLean afirmou, em maio de 2009, que seus seios são “uma coisa sexual” e que não se sentiria sexy se tivesse amamentado seu filho. Protestos em Topless Há alguns anos, ativistas costumavam tirar a roupa para protestar contra o uso de peles de animais em casacos. Mas o topless tornou-se particularmente famoso depois que ucranianas começaram a protestar sem a parte de cima. É a mais nova – e válida – moda. Chegou ao Brasil através das meninas do Femen: organização de mulheres da Ucrânia, que luta contra o turismo sexual, à violência, à prostituição, dentre outras causas. Depois de um policial canadense dizer às estudantes da Universidade de Toronto que “evitassem se vestir como vadias para não serem vítimas” de estupros,
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Grupo feminista ucrianiano, Femen
3 mil mulheres foram às ruas de Toronto protestar. No Brasil, a “Slut Walk”, ou “Marcha das Vadias”, foi realizada em diversas cidades e, em algumas delas, uniu-se à causa a ideia do topless das feministas do Femen.
importante é que sejam grandes, duras, “chupáveis”. Elas devem estar lindas para as capas da Playboy ou outra revista masculina, para os vídeos pornográficos ou talvez para deixar o corpo mais proporcional. Consequentemente, algo ligado à estética, ao que é determinado sexy... Para protestar, não; porque assim tiramos as duas únicas funções que a comissão de frente deve ter: para o homem e para o bebê. Para ela tomar controle sobre seus seios, não; para desafiar algo no “sistema”, já é demais, né? FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
Para o deleite masculino pode; para protestar, não Alguns condenam a exibição dos peitos em protestos. Porém, a maioria dessas pessoas, são as mesmas que não veem problemas nos biquínis minúsculos ou nos seios à mostra na televisão, em época de carnaval ou não. E assim nos sexualizamos: meninas, por serem meninas, devem – e a ênfase aqui está na obrigação imposta na palavra “devem” - agir como meninas; meninas, mesmo que ainda não tenham seios, vestem-se como se os tivessem. Parece-me tão estranho uma criancinha de cinco anos usando a parte de cima de um biquíni, ou um mini decote! O motivo não sabemos bem. Entretanto, que tetas grandes são lindas e sensuais, sabemos; sejam naturais ou siliconadas, o
Brigida Sousa, aluna da Ufal, fazendo topless em protesto em São Paulo
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Uma delícia anarquista
Hippies, punks e adeptos do anarquismo compartilham uma ideia em comum: o amor livre
POR NIARA AURELIANO
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em controle, sem posse, sem nome. Termo usado desde a Era Vitoriana para designar o repúdio à ideia do casamento tradicional, o amor livre foi adotado e enquadrado aos moldes anarquistas, rejeitando a intromissão da Igreja e do Estado nas relações pessoais. Nada de relacionamentos baseados em leis, proibições, regulamentações feitas por instituições religiosas ou governo. O amor livre relia as relações amorosas, sem fundamentos em preceitos de convenção social, submissão ou dependência psicológica. Ao contrário do significado atual de promiscuidade, os envolvidos neste tipo de relacionamento poderiam não ser poligâmicos; na verdade, muitos eram monogâmicos, o que demonstra que não se tratava de fazer sexo por sexo, ao contrário do que pensam, mas da quebra de valores considerados ultrapassados. Assim, o intuito não era praticar libertinagem, mas não permitir que houvesse regulação de suas relações; tornando-os livres das amarras do sistema quanto à forma de amar. Não oficializando seu relacionamento, puseram-se contra qualquer lei moderadora de suas relações amorosas. Queriam apenas ser, e foram, livres para amar a quem quisessem e a hora que quisessem. E por que não envolver-se com várias pessoas ao mesmo tempo? Por que não estar livre para conhecer, amar, respeitar? Visto como liberdade sexual, retomada do corpo feminino por elas próprias, e como uma entrega ao prazer, o amor livre foi amplamente defendido por feministas e socialistas no final do século XIX. Tratava-se de um autodomínio de seus corpos, uma autoafirmação de controle corporal e sexual, e assim rejeitavam-se quaisquer regras de como amar ou quem amar. Nada mais anarquista.
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ENTRETANTO| “Faça amor, não faça guerra” - A tão famosa e linda revolução sexual O ideal de amor livre logo foi adotado pelos hippies, nos anos 1960. Contrários à guerra, ao patriarcalismo, consumismo, capitalismo e aos valores tradicionais da sociedade, passaram a viver o amor livre de responsabilidades. Aí estava feita a confusão: o conceito de amor livre logo foi confundido com sexo sujo. Tratando-se de uma forma de protestar contra o sistema de leis e domínio das relações amorosas, o amor livre fora interpretado como fazer sexo sem nenhum pudor e com qualquer pessoa. Aí caiam por terra preconceitos como o da homossexualidade, por exemplo. A maioria dos adeptos do amor livre não distingue gênero; bastava tesão. Infelizmente, para a sociedade das décadas de 1960 e 70, era completamente inaceitável. Assemelhando-se em vários aspectos ao anarquismo, a ideologia punk não deixaria de agregar o valor do amor livre às suas crenças. Opondo-se à mídia tradicional, ao capitalismo, à homofobia, fascismo, machismo e antilideranças, como poderiam aceitar o envolvimento do Estado nas relações das pessoas? O amor livre é, então, mais uma forma de burlar o sistema. Toda forma de amor que houver nessa vida O amor livre costuma ser confundido com relacionamento aberto, ou com
uma forma menos conhecida de relação, o poliamor. Relacionamento aberto, amor livre e poliamor não se tratam da mesma coisa. Algumas características de cada um: Relacionamento aberto: Mesmo em um relacionamento amoroso fixo, os adeptos não deixam de sentir atração sexual por outros. Então, quando os envolvidos se envolvem sexualmente por outra pessoa, não é entendido como traição, pois o casal mantém um acordo de aceitação. Essas pessoas não liberam apaixonar-se por outra pessoa, mas apenas transar. Ou seja, não há relacionamento aberto sem total ciência e aceitação dos envolvidos; Poliamor: as pessoas envolvidas neste tipo de relacionamento aceitam vários relacionamentos íntimos com outras pessoas. Não um casal tradicional: um homem e uma mulher, ou dois homem, ou duas mulheres; mas, consensualmente, um relacionamento não monogâmico em que se pratica um relacionamento responsável e por vezes duradouro com envolvimento emocional com mais de duas pessoas. Poliamor não deve ser confundido com poligamia (poliginia ou poliandria); poligamia trata-se de um casamento. Aqui é uma relação poliafetiva. Assim, a diferença entre relacionamento aberto, poliamor e o amor livre: no primeiro, não se permite envolvimento emocional, mas apenas sexual; no segunVITROLAE&JEANS |
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|ENTRETANTO do, envolvimento sexual e emocional, de forma consciente e respeitosa para todos os envolvidos; no terceiro, uma forma de protesto às instituições religiosas e jurídicas que tentam definir o quê e para quê servem as relações amorosas: constituir família nos moldes tradicionais, procriação, etc. Amor sem pressão social, sem convenções, sexo livre e sem, necessariamente, estar envolvido emocionalmente. É isso que o amor livre é: sem controle, sem repressão. Entrevista com Natália Agra – adepta do amor livre e relacionamento aberto Como conheceu o amor livre? - Conheci a expressão amor livre através de fanzines libertários e mais tarde, através de amigos, eu conheci o poliamor. Na verdade, ainda estou construindo essa ideia em mim. É um processo bem complicado, que exige muita pesquisa, respeito ao nosso corpo, desejos e, principalmente, respeito à liberdade do outro. Eu vivo uma construção diária... Cheia de provações, quebras de sentimentos. É mais ou menos isso. Como foi explicar pra família e amigos o tipo de relacionamento que leva? - Não me sinto na obrigação de explicar nada. A vida e os ideais são meus e o corpo e desejos são meus. É algo que só comento, ou falo quando me questionam. No mais, a minha vida segue sem intromissões. Mas 94
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algo meu e do meu parceiro (os/as). Conhece muitos adeptos do amor livre? Costumam ser anarquistas ou punks, ou conhece pessoas não engajadas nesses movimentos que seguem esses princípios amorosos? Pessoas comuns, leia-se pessoas que preferem uma vida de enganações e restrições de desejos, são bem improváveis que se permitam pensar sobre, quanto mais vivenciar isso. Conheço muitas pessoas de fora da cidade... Pessoas que dividem a vida com duas ou mais pessoas. Pessoas que amam uma única pessoa, mas mesmo assim não se fecham para o mundo e suas pessoas também interessantes (eu e meu namorado somos assim). Enfim, é uma infinidade de maneiras de se relacionar. Onde a monogamia é uma privação capitalista de poder e posse. O amor é anulado e massacrado por prisões, ciúmes e insegurança. Sim, são pessoas ligadas ao anarquismo e ao punk, mas não é uma conduta puramente nossa. Ela é aberta a todos que abrem a mente e se permitem ser livres de fato. Essa questão me pareceu meio confusa... Então você vive uma mistura de relacionamento aberto, poliamor e amor livre? Porque sendo o relacionamento aberto mais uma questão sexual, o amor livre uma luta contra o sistema e o poliamor o direito de amar várias pessoas de forma responsável, você vive os três? Você se enquadra em to-
ENTRETANTO | dos? Indo por todos esses rótulos, sim. Me sinto à vontade para viver das três maneiras. A questão sexual é a mais aflorada em mim e na grande maioria das pessoas, mas muitas não percebem. O poliamor é algo que acredito piamente, mas, na prática, vejo muitas deficiências. Já amei duas pessoas ao mesmo tempo, mas não durou tempo suficiente para eu me perceber numa postura poliamorosa. Hoje sou aberta, sim, porque me respeito quanto ser livre e respeito meu parceiro. Mas, o que tenho hoje é um relacionamento que me faz crescer muito e que fazemos de tudo para mantermos entre nós dois. Hoje não me cabe outra pessoa, e estou feliz assim. Mas façamos sempre o que nosso desejo e razão quiserem. Libertação é a palavra de ordem.
Não há exploração da sexualidade. Só fazemos o que sentimos vontade e não para afirmar ou reafirmar nada pra ninguém. Amor livre é amor de verdade, com respeito. FONTE: FACEBOOK
Já se apaixonou por alguém que não era adepto? Como foi manter a relação? Desde que pus isso como algo que diz muito sobre a minha liberdade, tive dois relacionamentos sérios, e ambos livres para fazermos o que quisermos. O outro era meio deficiente. No meu atual temos total confiança, respeito e consciência das nossas vontades. Não me relacionaria com alguém monogâmico e nem eles comigo. Amor livre, aberto ou poliamor não quer dizer em nada que há promiscuidade. Esse é um conceito contrário a qualquer uma dessas formas de amar. E também não há um glamour como veem a sexualidade.
Natália Agra é estudante de Comunicação Social – Jornalismo, da Universidade Federal de Alagoas.
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AGRADECIMENTOS
Nós, da Vitrola&Jeans, acreditamos na importância da democratização da comunicação, e mais que isso: acreditamos no disseminar de cultura como uma forma de melhorar o social. Apostamos no conteúdo regional sem descartar todas as produções independentes e/ou de qualidade que surgem para ser consumidos por todos.
Agradecemos a curadoria da Trend House’12, por conceder as credenciais para o evento, ao Fernando Perdigão e Elisa Lemos que concederam entrevistas e fotos para esta edição, ao pessoal do Coletivo Popfuzz, e à Natália Agra, pela contribuição na construção de nossa 1ª Edição.
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