OUTUBRO DE 2012
DISTRIBUIÇÃO GRATUITA
a vadia e talentosa Azealia Banks STRIKE A POSE em O jeitinho brasileiro de criar
LEIA MAIS UM CLÁSSICO O Morro dos Ventos Uivantes
ENTRETANTO em E se o sangue menstrual for sagrado? VITROLAE&JEANS |
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V&J #02
FOTOS DO MĂŠS Galeria de
Milca Lins
www.flickr.com/photos/milcalins
SUMÁRIO
APERTA O PLAY
Soul contemporâneo e três artistas pra você sentir a alma
p. 13
NESTA EDIÇÃO EDITORIAL
p. 4 STRIKE A POSE
NA CABECEIRA
Nasce um criador
Leia mais um clássico: O Morro dos Ventos Uivantes
p. 42
O jeitinho brasileiro de criar
p. 5
p. 60
Roberto Damatta e Jorge de Lima
p. 8
APERTA O PLAY Azealea Banks: fashionista
ARTIFÍCIOS Boca
suja
e
p. 18
p. 72
ENTRETANTO
35mm
Carmem Santos: Uma obcecada por cinema p.26 Curta um curta
Asfaltando os caminhos do design alagoano
E se o sangue menstrual for sagrado?
p.82
p.29
Terra dos marechais também é terra de cinema
p.34 3
| EDITORIAL Outubro foi um mês difícil. Após uma greve de quase quatro meses, voltamos às aulas na Universidade Federal de Alagoas em setembro, pouco antes do lançamento de nossa primeira edição, publicada dia 25 de setembro. Provas, trabalhos, seminários, notas erradas, ansiedade, todos esses aspectos fazem parte da vivência dos estudantes universitários. Terminar mais um semestre nos deu o alívio acadêmico e a responsabilidade de, finalmente, conseguir focar na 2ª edição da Vitrola&Jeans. Se para construir a 1ª edição (escrever, diagramar, editar, fotografar, cobrir eventos), construir site, blog, flickr, fan Page no facebook e twitter, tivemos cinco meses, para a 2ª edição tivemos apenas duas semanas. Sim, duas semanas de muitas dúvidas, ainda frequentando aulas, irritação e brigas. Quem disse que seria fácil? Pois aqui está. Em um mês que a cinematografia alagoana deu as caras no evento “Curta um Curta”, a “3ª Mostra Sururu de Cinema Alagoano” e em breve ganhará força com o “Festival de Cinema Universitário de Penedo”, a V&J não poderia deixar de se fazer presente. Somos arte, somos cultura, somos cinema. Carmen Santos, uma incrível atriz, roteirista, produtora, diretora e dona de estúdio, também tem seu espaço em nossa revista. Não poderíamos, saudosistas como somos, deixar de lembrá-la. A música garantiu seu lugar, e continuará garantindo. A rapper Azea4
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lia Banks, os artistas de Neo Soul, o soul contemporâneo, como Mayer Hawthorne, Lianne Las Havas e Aloe Blacc estão por aqui. Aperte o Play. Indicamos a leitura de mais um clássico: “Morro dos Ventos Uivantes”, de Emily Brontë, e a apreciação de Jorge de Lima, autor alagoano. Ou você achou que em nosso estado só havia Graciliano Ramos? Delicie-se com Jorge, Na Cabeceira. Além disso, esteja a vontade para saber mais sobre o design alagoano, na Artifícios. A Strike a Pose desse mês traz matérias sobre brasileiros que ganham o exterior e estampam o Brasil com moda. Por fim, como você se sentiria se o sangue menstrual fosse sagrado? Conheça a Wicca, religião pagã politeísta, na Entretanto. E como sempre, delicie-se em cultura e arte. EXPEDIENTE Editor-chefe: Niara Aureliano e Daybson Vasconcelos Direção de arte: Laura Pedrosa Repórteres: Ariane Sapucaia, Niara Aureliano, Daybson Vasconcelos, Roosivelt Carvalho, Ben-Hur Bernard, Laura Pedrosa, Wilson Smith e Maysa Santos Colaboradores: Nathália Honci
CAPA DESTA EDIÇÃO
FOTO: REPRODUÇÃO DAINTERNET
NA CABECEIRA |
LEIA MAIS UM CLÁSSICO
POR LAURA PEDROSA
Após a ascensão da saga Crepúsculo, o livro “O Morro dos Ventos Uivantes”, de Emily Brontë, invadiu as prateleiras das livrarias de todo o país. Tal feito se deve a menção que a personagem principal da série, Bella Swan, faz ao clássico da literatura inglesa. Esta obra, publicada inicialmente no ano de 1847, é o único romance escrito por Emily Brontë. “O Morro dos Ventos Uivantes” se diferencia dos demais clássicos britânicos por suas características singulares que revolucionaram, dentre tantas outras coisas, uma narrativa dramática estruturada não baseada em ações complexas e tortuosas, mas como a dinâmica resultante de choques de vontade, criando uma mistura de romantismo e realismo que vai além do que a literatura da época oferecia. O romance de Emily já foi adaptado mais de vinte vezes para rádio, cinema e TV. Uma de suas adaptações, a de William Wyler, de 1939 é considerado também como um dos clássicos do cinema e foi indicado a sete categorias do Oscar e vencedora na premiação pela sua fotografia fantástica. Transite entre as cerca de 406 páginas de “O Morro dos Ventos Uivantes” e não se arrependa.
O Morro dos Ventos Uivantes, de Brontë
“
O Morro dos Ventos Uivantes nos apresenta inicialmente um ambiente misterioso e sombrio. Desse espaço somos apresentados a uma história de amor e vingança. A história de Heathcliff e Catherine Earnshaw. A obra se dispõe a contar a desventura da família Earnshaw, que após adotar um jovem filho de ciganos tem
suas vidas completamente virada às avessas. A narração dá-se ao longo de todo o livro através da primeira pessoa, pelo Sr. Lockwood e em seguida por Nelly, a governanta da casa, testemunha de todos os acontecimentos até então. O Sr. Lockwood é o mais recente inquilino da fazenda Thrushcross, propriedade do Sr. Heathcliff. Por corteVITROLAE&JEANS |
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ADAPTAÇÃO DE “O MORRO DOS VENTOS UIVANTES”, PARA O CINEMA, EM 1939
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
sia, o Sr. Lockwood vai visitar seu senhorio em Morro dos Ventos Uivantes. Lá ele encontra uma moça, um rapaz e Heathcliff. Não compreende a relação entre eles e fica curioso para descobrir o que há por traz daquela família estranha. Assim, persuade Nelly, a governanta, a lhe contar tudo o que sabe. A partir daí a narrativa passa para Nelly e regressa ao tempo em que Heathcliff não passava de um jovem garoto. O Sr. Earnshaw havia trazido para casa um menino que ele havia encontrado abandonado na rua – Heathcliff. No entanto, Earnshaw já tem um filho, este, por sua vez chama-se Hindley, e, também, uma filha chamada Catherine, que tem a mesma idade de Heathcliff. A preferência de Earnshaw por Heathcliff deixa Hindley muito irritado. E todos os demais membros da família, com exceção de Catherine, incomodam6
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se com a presença do garoto estranho. Logo, quando o Sr. Earnshaw morre, Hindley se volta contra Heathcliff, impedindo sua educação e tratando-o como um trabalhador braçal na fazenda. E faz de tudo para que Catherine e Heathcliff distanciem-se. Essa raiva contra Heathcliff leva Hindley a fazer com que Catherine se apaixone por Edgar Linton. Os Lintons são uma família rica e respeitada que viviam, na época, na Fazenda ThrushCross. A aproximação de Catherine e Edgar gera ciúmes em Heathcliff. Certo dia, Edgar pede Catherine em casamento e ela aceita. Heathcliff a escuta dizer a Nelly que escolheu Edgar Linton apenas porque achava que Heathcliff não era um cavalheiro e que casar com ele estragaria sua reputação e status na sociedade. Após o ocorrido, Heathcliff fica muito magoado,
NA CABECEIRA | deixa os Ventos Uivantes e vai embora. Catherine fica arrasada. Edgar casa com ela para lhe ajudar a suportar a dor. Começam uma nova vida, mas um dia Heathcliff retorna, como um cavalheiro tão desejável quanto Edgar. O conflito emocional de Catherine começa. Ela quer os dois homens na sua vida. Assim, acaba ferindo Linton e a si mesma. Nunca conseguindo sair de seu tumulto emocional, dá a luz a uma filha de Edgar e morre. Heathcliff não suporta essa situação e jura vingar-se de todos aqueles que lhe separaram de Catherine. Seu primeiro passo foi casar com Isabella, irmã de Edgar, e ter um filho com ela. Destrói a vida de Hindley e toma o Morro dos Ventos Uivantes. E, ainda por cima, trata Hareton, filho de Hindley, da mesma maneira que ele foi tratado anos atrás. Ele força a filha de Catherine, Cathy, a se casar com seu filho Linton. Então ele toma conta da Fazenda ThrushCross. O livro finda com a morte de Heathcliff, e Cathy, a jovem que Lockwood tinha encontrado antes, enfim casa-se com Hareton, o outro rapaz. A personagem de Heathcliff é, sem dúvidas, do ponto de vista literário, um dos pontos mais bem trabalhados de toda a história. Ele não é herói, nem vilão, ou vítima. Quem diria que “Crepúsculo” nos traria algo de tão importante?
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
Recomenda-se para quem gostou de ler o também clássico “Reparação”, de Ian McEwan
O MORRO DOS VENTOS UIVANTES, de Emily Brontë Onde comprar: Livraria Cultura Quanto? R$ 48,00
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Roberto DaMatta e Jorge de Lima: similaridades na caracterização do tipo brasileiro POR NATHÁLIA HONCI
Embora não sejam exatamente contemporâneos nem atendam à mesma linhagem de gênero textual, as obras de Jorge de Lima, ficcionista alagoano, e Roberto DaMatta, antropólogo carioca, em muito convergem; especialmente em Calunga e O que faz o brasil, Brasil?
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apogeu da obra limiana se deu pouco antes e durante a infância de Roberto DaMatta, por isso não há possibilidades reais de diálogo entre os dois autores; porém, o regionalismo e a caracterização do cidadão brasileiro está recorrentemente e de forma muito densa presente nas duas obras. Calunga narra a trajetória do personagem Lula Bernardo, nordestino, que se criou fora, e volta às suas origens para tentar a vida nessa região brasileira tão castigada pela miséria e pelo latifúndio. Ele volta principalmente para reencontrar sua família e acaba descobrindo que essa fora consumida pelo meio social em que estava inserida, sendo ele próprio também consumido, após muito tentar transformar os valores e as convicções dos atores sociais daquele meio. Esse é o romance menos contemplativo da obra de Jorge de Lima, demonstrando uma maior preocupação social e até uma profunda indignação relativa à precariedade das condições de vida do 8
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nordestino da década de 1930. Através da descrição dos personagens e dos espaços, característica fortemente presente em toda a obra de Lima, o leitor é convidado a conhecer as peculiaridades dessa região brasileira e de seus viventes. Apesar de limitar-se à caracterização do nordestino, Calunga reflete conceituações de trabalho, de comportamento do ser social, de raízes sociais e raciais, de religião, e de sexualidade que podem ser perfeitamente analisadas em nível nacional. Por esse viés, encontramos muita similaridade entre a proposta de DaMatta em O que faz o brasil, Brasil? e de Lima, em Calunga, posto que os dois fazem uma apresentação do tipo nacional, ressaltando suas emblemáticas características. O que destoa entre ambos é a forma do texto, sendo o primeiro uma exposição didática de conceitos e opiniões acerca da figura do brasileiro e o segundo um romance regional. O que faz o Brasil, Brasil? divide
NA CABECEIRA | nosso país em dois brasis: o já estereotipado “pedaço perdido e doentio da Europa portuguesa” e um Brasil vivo, complexo e com características próprias. É a esse segundo Brasil que este artigo se atém; no qual DaMatta não se fixa apenas em saber “quem somos”, mas também em compreender “como construímos o que somos”. O primeiro setor da vida social do brasileiro comum às duas obras seria o trabalho. Em Calunga, o trabalho é sentido pelos cambembes, povo baixo do campo, proveniente de uma subtribo alagoana, como algo sofrido; e pelos seus chefes, quase donos, como algo digno de seres abjetos, como seus empregados. Como os sururuzeiros na capital alagoana, os cambembes, nas alagadas ilhas de Santa Luzia e adjacências, trabalhavam dentro da lama, tangendo porcos e adquirindo maleitas. Lula Bernardo, o protagonista, ao se deparar com essa situação, propôs uma nova forma de trabalho, mais digna: uma criação de carneiros com todo o suporte, principalmente botas para os trabalhadores. Porém, como diz DaMatta, em nosso país há uma concepção de trabalho como “castigo”, presente até mesmo na etimologia da palavra, vinda de tripaliare ou “castigar com o tripaliu” (objeto de tortura da Roma Antiga). Durante o enredo, Lula nunca fora levado a sério em seu desejo de modificar a precariedade em que viviam aqueles trabalhadores. O que sustenta a afirmação dessa visão do trabalho é o fato de esse descrédito não apenas ser prove-
ESCRITOR JORGE DE LIMA FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
niente de outros donos de terras, mas principalmente dos próprios trabalhadores. Para DaMatta, em nossa sociedade, o trabalhador não é glorificado como herói, perdendo o posto para outros tipos sociais brasileiros, como o “renunciador”, aquele que abandona tudo e vai trabalhar para o “outro mundo” e o tão famoso “malandro”, que vive sem trabalhar e ganha o máximo com o mínimo de esforço. Tudo isso é explicado pelo sistema escravocrata do qual advimos. DaMatta explica que os patrões nesse sistema são mais que exploradores de trabalho para seus empregados, são VITROLAE&JEANS |
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NA CABECEIRA
ROBERTO DAMATTA, ANTROPÓLOGO BRASILEIRO FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
também seus pais, seus tutores morais. No caso do personagem Lula, a realidade do local já estava, há várias gerações, estabelecida; bem como a relação da exploração moral, violenta e ridicularizadora, praticada pelos coronéis sobre seus empregados. Dentro do aspecto racial, encontra-se, entre o livro de ficção e o tecnicista, uma característica que está numa linha muito tênue de ser considerada boa ou ruim: a glorificação da mulata, que,
como diz DaMatta, é “uma síntese perfeita do melhor que pode existir no negro, no branco e no índio”. Vejo essa posição como boa, pois ela é uma evolução do pensamento de doutrinas antigas, nas quais a miscigenação seria a degradação do que havia de bom nas raças, formando uma outra totalmente incapaz. Mas também a observo como ruim, pois essa glorificação por reiteradas vezes está atrelada a uma conotação sexual da mulata. Essa conotação sexual relativa à mulata é visível não apenas em Calunga, mas em quase toda a obra de Jorge de Lima. No romance A Mulher Obscura, o protagonista, quando criança, espreitava as negras se banharem e descrevia em detalhes o corpo delas. A história mostra essa prática como algo natural, posto que o corpo mulato seria tido como muito atraente, encantamento esse que também é visto no poema Essa Negra Fulô, no qual o “sinhô” observa Fulô tirar a roupa para castigá-la e se impressiona com sua beleza. Creio que a melhor exemplificação desse conceito que poderia ser retirada de Calunga seria uma passagem em que Lula observa um casal de mulatos dançarem coco e dessa observação exalta a força do mulato, evolução conceitual descrita acima, e a beleza da mulata, sem deixar de lado a apelação sexual. Veio dançando às umbigadas com um caboclo desempenado uma morena bonita como os amores.
NA CABECEIRA | Passou rente da janela em que espiava Lula. Era um pedaço de mulher de seio duro e ancas muito duras também. O caboclo desempenado dançava que só vendo, sapateava para danar, o tórax forte, o pescoço embrulhado num lenço vermelho, as pernas ligeiras riscavam todas as figurações que o coco podia dar. A morena estava orgulhosa de seu cavalheiro, tinha um requebro na cintura, um fecharzinho de olhos que o sujeito ficava derretido. Vontade de cópula subiu o corpo de Lula. Desejou a naturalidade daqueles viventes para dançar assim seu coco, a força do caboclo dançarino para disputar com ele, à faca, com quem quisesse, a posse daquela volúpia. Os autores também convergiram quanto ao aspecto religioso da sociedade brasileira e o fatalismo mostrou-se preponderante. Em Calunga, ao meio do enredo, aparece a figura de um santo milagreiro nas terras da Ilha de Santa Luzia. Esse aparecimento desestrutura toda a rotina daquela população, pois, entre um milagre e outro, grupos e mais grupos de pobres e doentes começam a seguir o santo e literalmente abandonar seus poucos pertences, trabalhos e moradias. Essa é uma passagem interessante do texto, pois as pessoas começaram a viver apenas de ilusões, definhando sem alimento, destruindo o local em que estavam, vivendo, dormindo, comendo e
defecando no mesmo espaço. As condições em que elas estavam não importava, o que importava era estar perto do santo e de seus milagres, era encontrar um sentido que as fizesse viver. Enfim, o caos se estabeleceu. Quanto a isso, DaMatta traz o porquê dessa necessidade de se falar com Deus, de estar perto dele. O autor enfatiza a religião como um meio de explicação para os infortúnios, apresentando as possibilidades de resgatar a indiferença do mundo, no caso, promovendo a cura dos debilitados. DaMatta também aborda a religião como um modo que a sociedade tem de legitimar ou justificar a sua organização. “A religião pode explicar também por que existem ricos e pobres, fortes e fracos, doentes e sãos, dando sentido pleno às diferenciações de poder que percebemos como parte de nosso mundo social”, expõe o antropólogo. Mas, com toda certeza, o aspecto que melhor caracterizou o tipo social brasileiro foi a descrição do “jeitinho brasileiro” por DaMatta e a exemplificação desse na obra de Jorge de Lima. O primeiro autor coloca o brasileiro no centro do esqueleto nacional, envolto em um dilema entre as leis universais (como indivíduo) e as relações sociais (como pessoa), mostrando que, de certa forma, o brasileiro equilibra esse sistema de paradoxos, seja pelo conquistador “jeitinho” ou pelo antipático “você sabe com quem está falando?”. Jorge de Lima demonstra como se VITROLAE&JEANS |
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|NA CABECEIRA dá esse “estilo” adotado pelos brasileiros, a fim de burlar as leis e sempre extrair o melhor resultado da situação. Numa passagem marcante de Calunga, uma prostituta conta as tramóias do Poder Público alagoano a Lula e afirma que, através das influências que ela teria com os grandes homens públicos da região, ela poderia dar um “jeitinho” na situação em que ele se encontrava. - Olhe, o inspetor tem um xodó baita por mim; pois bem, o inspetor é cunhado do secretário, que é irmão de criação do governador: você esta vendo que mamãezada! Um lugar para você é sopa, meu nego. Hoje meu xodó vem aqui e eu falo com ele. Conto logo suas encrencas na ilha. Daí retira-se não apenas a ideia inicial do presente artigo, a de convergência de conceitos entre um autor ficcionista e outro tecnicista; mas também a real possibilidade da caracterização de nosso tipo nacional a partir de histórias regionalistas de ficção, como é o caso de Calunga. Ainda mais sendo essa região o nordeste, berço da colonização e história nacional.
O QUE FAZ O BRASIL, BRASIL?, de Roberto DaMatta Onde comprar: Livraria Cultura Quanto? R$ 21,50
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CALUNGA, de Jorge de Lima Onde comprar: Livraria Saraiva Quanto? R$ 31,00
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Soul contemporâneo e três artistas pra você sentir a alma POR ROOSIVELT CARVALHO
Novos artistas que misturam contemporaneidade a um dos gêneros mais clássicos da black music
O
Entre as décadas de 50 e 60 surgiu nos Estados Unidos, época em que os negros sulistas tinham como principal fonte de renda a agricultura, mas que, através do êxodo para o norte do país, passavam a buscar melhores condições de vida, surgiu o soul. Naqueles tempos de grande desigualdade social e racial, a música se tornava o paliativo. Mas não se pode achar que foi o soul a primeira expressão musical negra no país. Se pensarmos em uma linha do tempo, tudo começou com o blues que, posteriormente, deu origem ao rhythm & blues, R&B e nessa imigração de negros para as grandes cidades, levaram consigo o gospel, a música sacra afro-americana, que gerou a música soul. Há quem fale que não existe nenhuma relação entre a música gospel e a soul, mas a única diferença entre elas está na letra. A primeira, que louva a Deus na religião protestante, deu origem a um gênero que fala sobre o amor romântico, o carnal, as festas, a segregação social e econômica sofrida pela comunidade negra do país.
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Em português ‘soul’ significa alma, substantivo que tomou forma além da literal. Soul representa a raça negra e encontramos isso nas letras e nomes das canções, como em “Soul Man”, de Sam&Dave, em que o termo soul é interpretado como negro e não alma. Houve uma resignificação. Já nos anos 60 existiam artistas do chamado blue-eyed soul, que era uma espécie de “soul branco” ou “soul para brancos”, como por exemplo, os The Righteous Brothers. Foi nessa década que atingiram sucesso os expoentes Aretha Franklin e James Brown que entraram para a história da música soul e funk, se tornando artistas inesquecíveis para os admiradores da música negra. Os anos 70 e 80 marcaram uma mudança maior no som, melodicamente falando. Artistas como Marvin Gaye e Rick James trouxeram misturas com o rock psicodélico e referências do funk para
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a soul music. Por outro lado, discos como o Superfly, de Curtis Mayfield, trouxeram duras críticas socias em suas canções. Continuando com as mudanças, os anos 80 trouxeram batidas mais dançantes com Prince e Michael Jackson que popularizaram cada vez mais não só a música soul, mas as mais diversas expressões da música afro-americana. Whitney Houston e Tina Turner são as artistas femininas com destaque no cenário. Da mistura do hip hop com o soul, além de diversos experimentos com batidas eletrônicas, enquanto o grunge e o rock alternativo ganhavam cada vez mais adeptos, surge o Neo Soul. Seu principal ingrediente tornou-se o R&B contemporâneo. Durante essa década, Mariah Carey Mary J. Blige, Lauryn Hill, Erykah Badu e Michael Jackson davam os primeiros passos do soul contemporâneo.
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Mayer Hawthorne
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O multi instrumentista, cantor e compositor Mayer Hawthorne trouxe um som contemporâneo, com uma levada old school que lembra o som dos anos 60. Mayer que também é rapper e DJ mistura batidas diferenciadas ao soul clássico. Nascido em Michigan, o cantor tem como referência Barry White e Mike Terry. Hawthorne produziu e tocou instrumentos em grande parte de sua vida, mas nunca teve a intenção de se tornar um cantor. O que ele tornou-se, no entanto, foi uma sensação da neo soul, em turnê mundial e ganhando elogios da Playboy, NPR e Entertainment Weekly. “Ele é um cantor capaz... um arranjador de precisão espantosa” escreveu o New York Times, quando Hawthorne lança o primeiro hit da cena. No ano de 2009 o cantor apareceu no cenário musical com seu primeiro CD
intitulado A Strange Arrangement, que não teve tanto destaque quanto How Do You Do, lançado em outubro de 2011, pela gravadora Universal Republic Records, e que contou com uma participação do rapper Snoop Dogg. Em “The Walk”, o primeiro single de How Do You Do, Hawthorne interpreta um homem abandonado que diz “adeus, você me fez mal” para o amor de sua vida. Na canção “Can’t Stop”, Mayer faz um dueto com Snoop Dogg, em que se nota que mesmo com uma batida mais hip-hop a canção não tem rap. Esse branquelo de roupas coloridas e gravata borboleta – adereços que se tornaram marca do cantor - entra na indústria aos poucos, ganha cada vez mais espaço no cenário musical e produz um estilo contemporâneo com muitas referências ao soul sessentista e setentista. VITROLAE&JEANS |
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ALOE BLACC
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Aloe Blacc não é tão novo assim no cenário musical: começou sua carreira em 1995 quando entrou para duo Emanon e no final dessa década se juntou ao grupo Lootpack em turnê na Europa. Com essa bagagem que rendeu seis discos lançados, Aloe se juntou ao grupo francês Jazz Liberatorz. Em 2003 Aloe Blacc assinou contrato com a Stones Throw Records e se lançou em carreira solo com The Aloe Blacc EP, mas foi só em julho de 2006 que o cantor apresentou seu primeiro CD. Shine Through foi disponibilizado também em vinil e gratuitamente on-line. Em 2010, Blacc lançou seu segundo álbum, Good Things, pela mesma gravadora. O álbum foi produzido por Jeff Dynamite e Michels Leon para produções Truth & Soul. 16
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Seu álbum Good Things, traz a música “I Need a Dollar”, encomendada pela HBO, como a música tema da série How to Make It in America. Junto com as canções “Miss Fortune” e “You Make Me Smile”, Aloe cria uma atmosfera no CD onde ele critica, mesmo que de forma suave, coisas como a impessoalidade, falta de emprego, a crise americana e o capitalismo. Aloe tem um som e um visual muito clássico, as melodias de suas músicas, e muitas de suas letras são puro soul setentista. O neo soul de Blacc, talvez seja o que menos tem mistura com sons mais contemporâneos, mesmo que o rap esteja em algumas de suas canções. Para quem curte black music das décadas de 60 e 70, Aloe é um prato cheio.
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Lianne La Havas
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Lianne La Havas é uma britânica de 23 anos, filha de pai grego e mãe jamaicana, que além da mistura raízes, traz misturas em suas músicas. La Havas faz um soul com referências de folk, rock e jazz. Além de cantora, ela é também compositora e multi-instrumentista. Seu contato com a música começou cedo, já que seus pais também são músicos. A primeira canção de Lianne foi escrita quando ela tinha apenas onze anos. Depois de sair em turnê como backing vocal da cantora Paloma Faith, Lianne assinou contrato com a Warner Bros Records em 2010 e passou mais de um ano se dedicando a suas composições e melodias para poder liberar suas primeiras músicas. Seu primeiro EP Lost & Found foi lançado em 21 de Outubro de 2011 e contou com Willy Mason na faixa de abertura, “No Room For Doubt”. No mesmo mês outro EP, dessa vez ao vivo, foi lançado: Lost & Found live from L.A. “Is Your Love Big Enough?” é o disco debut de Lianne La Havas lançado em julho de 2012, foi sucesso comercial e de crítica, atingindo #4 na parada britânica UK Albums Chart. O disco traz os singles “Forget” e “Gone” com fortes referências do soul sem perder o folk característico da cantora de timbre vocal admirável. Lianne conquistou o respeito de expoentes como Billie Holiday e Ella Fitzgerald que comentaram sobre o talento da jovem cantora que quer conquistar os EUA e que já é considerada uma das apostas da BBC na lista sounds of 2012. Voz, simpatia e aptidão para conquistar o mundo ela tem. VITROLAE&JEANS |
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POR ROSSIVELT CARVALHO
Azealia Banks: Boca suja e fashionista Rapper traz um som jovial e uma mistura com batidas eletr么nicas POR ROOSIVELT CARVALHO
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A
zealia Amanda Banks nasceu em New York, mais precisamente no bairro do Harlem, e em 2011 apareceu na indústria musical, pouco tempo depois de ter completado 20 anos. O sucesso começou quando a BBC e a Revista New Mu-
sical Express – NME apontaram-na como grande aposta para 2012 e ainda lhe atribuíram o título de pessoa mais cool do momento. Seu primeiro single chamado “212” contou com a participação de Lazy Jay e foi lançado em dezembro do ano passado alcançando o topo das paradas de sucesso mais importantes da música.
Canções provocativas, dançantes e muito sexualizadas são as marcas da tam-
bém conhecida como Miss Bank$, que teve suas primeiras aparições em 2009 quando espalhou na internet algumas músicas, como “Gimme a Chance” e “Seventeen”, ambas com produção do renomado DJ Diplo. É nessa primeira faixa que a rapper solta: “até os caras brancos vão querer pular no chocolate quente feito marshmalows. Entende?”. Sentiram o clima da garota?
Azealia estudou no tradicional colégio LaGuardia, em Nova York, o mesmo que
Nicki Minaj, Liza Minnelli e Al Pacino. Seu talento também a levou a ser protagonista de uma comédia-noir musical chamada “City of Angels”. Ela ainda assinou um contrato infeliz com gravadora britânica XL. Banks só começou a se dar bem quando foi para Montreal e lançou sua música de forma independente com ajuda de Paul Epworth, que já trabalhou com Florence and The Machine e Adele.
EP 1991, mixtape e o debut da Dirty Mouth Com quatro faixas, o EP 1991 data de nascimento de Azealia - foi lançado em maio desse ano. Além de “212”, sucesso da rapper, ele traz as faixas “Van Vogue”, “Liquorice” e a música que dá nome ao álbum 1991. Foi com esse EP que 20
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Banks ganhou destaque e hoje se garante como um dos nomes mais fortes do rap contemporâneo. O som do 1991 é uma mistura de hip-hop e música eletrônica, um clima diferente e contemporâneo. Pouco tempo depois do lança-
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mento do EP 1991, a moça retorna com a mixtape Fantasea, onde a artista experimenta diferentes composições estruturais e de ritmos mantendo sempre o bom humor e as letras picantes que já são características dessa celebridade estadunidense. A capa de Fantasea faz uma alusão a Pequena Sereia; e Banks com seu punhado sobre o cotidiano e estilo musical acaba se tornando uma sereia urbana que não tem pudor algum. A mixtape traz muita ironia e versos sexuais, com a mistura das batidas fortes do hip-hop, com a música eletrônica, e a rapidez do rap que torna o som de Miss Bank$ um dos mais legais do ano,
além, é claro, de destacá-la como exemplo feminino no gênero musical. As faixas US e a Nathan feat. Styles P. são exemplos das composições dançantes de sucesso. Azealia nos presenteia com as músicas da mixtape, que funcionam como uma espécie de refletor sobre a artista. Não é fácil imaginar que ela possa vir a ganhar o espaço de outras rappers estadunidenses, mas ela é capaz. Uma mixtape e um EP conceitual, criativo e sem pudor é que faz com que Azealia não seja a ‘next big thing’ e sim um talento que as pessoas estão descobrindo, como ela mesma disse à BBC.
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Fashion Nigga
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Não é só na música que Azealia está ganhando espaço: tem chamado atenção também pelo estilo como se veste e por suas atitudes, ganhando destaque, inclusive, por ser uma das sensações do mundo fashion. Seu clipe “Liquorice” foi dirigido por Nicola Formichetti e nele encontramos muitas referências de moda. Mesmo com sua atitude moderninha e de “garota do Harlem”, como ela mesma diz, a rapper tem um estilo urbano e o mundo da moda anda flertando com ela. Sua música inédita, “Bambi”, foi trilha do desfile masculino de Thierry Mugler, grife comandada por Nicola Formichetti, na última temporada de moda de Paris. Seja em “Liquorice” ou em 212 em que Azealia aparece bem despojada de trancinhas e com o Mickey Mouse estampado no sweter, até os leigos em moda notam que a rapper entende do assunto e sabe usar isso a seu favor. Sempre muito estilosa, ela também já é referência de como ser cool no modo de vestir.
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“Não quero ser chamada de ‘next big thing’ porque isso significa que há uma outra big thing depois de você. A mídia faz um ótimo trabalho em descartar artistas e isso tem um efeito muito grande quanto ao que as pessoas pensam de si mesmas. Então eu tento deixar esse tipo de coisa fora da minha cabeça. Prefiro ser uma excelente artista que o pessoal está começando a descobrir”, afirmou a BBC. VITROLAE&JEANS |
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“Elas” no comando
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Há quem só esteja notando as mulheres no meio do hip-hop/rap agora, mas se atentarmos bem, elas sempre estiveram representando o gênero feminino na mídia. Missy Elliott é um exemplo de mulher que teve sucesso fazendo esse tipo de som. Desde os anos 80, quando surgiu com seu primeiro ‘Sista’, Elliott abriu espaço para outras garotas entrarem no ramo. Nos anos 90, as rappers Lil’kim e Eve trouxeram mais girl power para um estilo musical quase dominado pelos homens. No entanto, só foi possível notar uma ampliação maior de consumidores do som das rappers nos últimos anos, com Nicki Minaj e a própria Azealia, que fizeram uma mistura de música pop e eletrônica ao som oriundo do gueto americano. O primeiro disco da cantora, nomeado de Broke with Expensive Taste, está sendo produzido e deve ser lançado em fevereiro de 2013. Agressivas e bocas sujas elas sempre foram, pois isso é uma característica do som que fazem. Azealia tem destaque por não ser tão extravagante quanto Nicki ou ser mais bem humorada que Elliott. O que se pode afirmar de certeza é que o som que Banks faz é legal, é dançante e que ela faz bem feito. Ela é negra, é rapper, é do gueto e na música assume tudo isso. Azealia gosta mesmo de ser a vadia negra que tanto a sociedade já discriminou e, além disso, quer transar com homens brancos; mas não basta ser branco, tem que ter muito dinheiro. Ou seja, Banks está berrando que é puta, que quer pintos brancos e que não está nem aí para críticas porque é rica e fashion.
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APERTA O PLAY|
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EP 1991 - https://itunes.apple.com/br/ album/1991-ep/id529080589 Fantasea - http://mixtapeaffiliates.com/ Mixtapes/Azealia-Banks/Fantasea/ Site - http://www.azealiabanks.com You Tube - https://www.youtube.com/ user/AzealiaBanks Curtiu o estilo? Saca só - https://shop. bompa.com/azealia_banks/ VITROLAE&JEANS |
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Carmem Santos: Uma obcecada por cinema
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POR NIARA AURELIANO
Anos 20 e mulher independente. A época junto ao substantivo ‘mulher’ definitivamente não combinava, mas ela foi à frente. Atriz, roteirista, produtora, diretora e dona de estúdio, sua obra é de inestimável valor para a cinematografia brasileira
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aria do Carmo Santos Gonçalves foi uma das pioneiras do cinema brasileiro. Ela nasceu em Vila da Flor, Portugal, porém foi radicada na Brasil e ficou conhecida como Carmem Santos. Participou de quase 50 obras entre diversos trabalhos como atriz, roteirista, produtora e até mesmo diretora. Criada em São Paulo, começou a atuar em 1919 no filma do americano Willian A. Jansen, “Urutau” (ou “Eterna História”). Atuou ainda em “A Carne” e “Mademoiselle Cinema”, ambos sob direção de Léo Marten, filmados em 1924 e 1925, respectivamente, época em que o cinema era mudo destaque e que mudo permaneceu até os anos 30. O fato é que Carmen não iria mais abandonar o cinema. Foi para Minas Gerais, conheceu Humberto Mauro, que a lançou como estrela nacional em “Sangue Mineiro”, de 1929, no qual ela fazia o papel de moça rejeitada pelo amado. Apesar do fracasso comercial, Humberto Mauro consolidou seu talento como diretor e o de sua lindíssima protagonista, além de ter se tornado o grande parceiro cinematográfico dela. Ele, considerado o pai do cinema nacional; ela, a grande dama, a pioneira. O cinema foi, para Carmen, o seu grande amor. “Em casa, e mesmo na rua, represento a todo instante; meus pais têm pena e mal sabem eles que sigo o meu destino, que nasci para o cinema e de mais nada quero saber”, afirmava. Um ano depois de ter atuado em “Limite”, de Mário Peixoto, ela o convidou
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Fracasso de bilheteria, mas prova de talento
para produzir o seu primeiro filme chamado “Onde a Terra Acaba”, e se presenteou com o papel da protagonista. Entretanto, o projeto teve um final inesperado: a filmagem nunca foi terminada por um desentendimento entre os dois. Casou-se, então, com Antônio Seabra, teve dois filhos, e com ele viveu por toda a vida. Seabra foi o grande patrocinador da obsessão cinematográfica de sua esposa: o rico herdeiro patrocinou todos os seus filmes e financiou a abertura da Brasil Fox Films, em 1934, o estúdio de Carmen Santos, que passou depois a se chamar Brasil Vita Filmes, localizado na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Ali foram filmados os maiores filmes de Carmen e Humberto. O filme de maior sucesso dessa parceria foi “Favela dos Meus Amores”. Produzido por ela, dirigido por ele, e escrito por Henrique Pongetti, o filme da Brasil Vita Filmes que contava a história de uma professora que se apaixonou por VITROLAE&JEANS |
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|35mm Apesar de grande produção e muitos gastos, o filme não alcançou o sucesso esperado e seu estúdio quebrou. Entretanto, a estrela ainda produziu dois, e co-produziu mais sete filmes até morrer, aos 48 anos, em 1952, no Rio de Janeiro. Os estúdios da Vita Filmes foram comprados por Hebert Richers no final da década de 50, e hoje são utilizados pela Rede Globo de Televisão. A grande parte de sua obra Inconfidência Mineira: o grande sonho de Carmen, a falência de Carmen foi perdida em incêndios; restam apenas alguns registros e poucas fotografias. Carmen, enum milionário teve suas cópias perdidas em um incêndio; infelizmente, o mesmo quanto viva, foi a força feminina do cineaconteceu com as cópias de “Cidade Mu- ma brasileiro; morta, não perdeu parte do lher”. Apesar de tudo isso, os dois decidi- seu brilho, afinal de contas, não foi esqueram juntos filmar “Argila”: a iluminação cida pelos mais velhos e saudosistas do de Edgar Brasil era o ponto alto do filme. cinema nacional. Veio dela e de seus comCarmen, mais uma vez, ficou com o grande papel. O filme foi um fracasso de bi- panheiros o estímulo necessário para impulsionar a cinematografia brasileira. Era lheteria. Um de seus maiores sonhos era mulher. Quebrou padrões: pelo talento filmar a inconfidência mineira. E ela o que tinha escapou da vida de confinarealizou, reservando para si o papel de mento doméstico, o que estava reservado Bárbara Heliodora. Carmem produziu, para a maioria esmagadora das mulheres. dirigiu e atuou no filme que trouxe sua E era linda. Uma linda portuguesa obcefalência. “Inconfidência Mineira” foi um projeto longo. Idealizado em 1939, come- cada por um cinema brasileiro forte. E o çou a ser produzido em 1941; filmado em que quis fazer, independente de seus redois anos, foi lançado apenas em 1948. sultados, fez. FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
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CURTA UM CURTA Você e sua mochila, prestes a viajar por um mundo em que as riquezas são como miudezas raras bem guardadas em caixas envelhecidas, nos galpões antigos das cidades, carregadas de história. POR ARIANE SAPUCAIA
FOTOS: ARIANE SAPUCAIA E LAURA PEDROSA
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evento “Curta um Curta” foi realizado no dia 16 de outubro, no auditório da Reitoria da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e tirou da caixa envelhecida algo que foi muito além da mera exibição de curtas-metragens alagoanos. Os olhinhos curiosos das pessoas estavam presenciando uma parte da riqueza da produção cinematográfica do estado de Alagoas. Organizado pelo Coletivo De-Liz, que é formado apenas
sa com os seus produtores e idealizadores, sorteio de livros e o som acolhedor da banda Bloco 21, que trouxe uma levada da música popular brasileira e também do pop rock para a plateia, o evento fez pensar nos atuais rumos do cinema alagoano. O curta alagoano KM 58, dirigido por Raphael Barbosa, foi o primeiro a ser exibido. É perceptível o jeito sedutor como o diretor constrói a história, usando de maneira apropriada os sons dos objetos
por cinco estudantes universitárias: Clariza Maria, Darlane Tavares, Erine Barbosa e Milena Monteiro. É com o intuito de buscar algo além do que, minimamente, se sabe das produções artísticas que o coletivo idealizou o “Curta um Curta”. Com a exibição de curtas, conver-
nas cenas do filme. E conseguindo reforçar a importância da relação entre o símbolo e o objeto, uma relação marcante e ousada. O segundo filme foi “O Catador de Fotogramas”, feito por Pedro da Rocha, que conta em poucos minutos quem seria Elinaldo Barros e qual sua contribuição
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Professor PHD Almir Guilhermino, Dário Junior e Henrique Oliveira conversam com o público do evento Curta um Curta
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Banda Bloco 21 animou o evento no Auditório da Reitoria
para o cinema alagoano, mas não apenas isso. Mostra que além de ser uma figura das telinhas, ele é um homem carregado de simplicidade. Na sequência, o curta dirigido por Henrique Oliveira, do coletivo de produção audiovisual Panan Filmes, chamado Farpa. Trata de uma adaptação do livro da escritora alagoana Arriete Vilela e conta a história de mulheres cujos filhos nascem sem vida, as atuações são bem expressivas. Os dois últimos filmes são “12:40” e “O que lembro, tenho”. O primeiro é de Dário Júnior, com produção dos estudantes de Comunicação Social da Ufal. Ele é resultado da Oficina “Da Lauda ao Filme”, ministrada pelo professor 32
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PhD Almir Guilhermino e inspirado no conto do aluno Thiago Almeida. Retrata a história dos problemas de um homem comum e qual a sua atitude para resolver tais problemas. O segundo filme “O que lembro, tenho” levou seis prêmios na 3ª mostra Sururu. Narra a história de uma senhora idosa com problemas de Alzheimer e como se dá a relação com sua filha durante esse processo. Curta um Curta trouxe um breve debate com os produtores dos filmes e conseguiu levantar as problemáticas que se têm ao produzir um curta-metragem e, também, dos sorrisos com os passos da-
35mm | dos durante a realização. Cada fala resgatou as lembranças carregadas de agonias, brincadeiras, companheirismo e vontade de que tudo corresse bem. Devido ao atraso inicial, o tempo do debate foi curto. Mas ficou claro, inclusive na fala do professor PhD Almir Guilhermino, que os problemas encontrados no evento foram, em sua maior parte, dos instrumentos disponibilizados pela Universidade Federal de Alagoas que não são apropriados para a exibição dos curtas e interferiu na qualidade do som e da fotografia.
Coletivo De-lis
/coletivodlis
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Terra dos Marechais também é terra de cinema POR MAYSA SANTOS
Momento mais aguardado pelos cineastas locais, a 3ª Mostra Sururu de Cinema Alagoano resplandece a paixão pela sétima arte
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|35mm A produção audiovisual de Alagoas está em festa após o maior evento dedicado ao cinema em nosso Estado. A 3ª edição da Mostra Sururu de Cinema Alagoano que exibiu 16 curtas-metragens locais, aconteceu entre os dias 25 e 28 de outubro, no Centro Cultural Sesi, localizado no bairro da Pajuçara, aqui em Maceió. Guerreiros pela iniciativa e pela coragem de produzir cinema numa região que não oferece tantos recursos e investimentos, os diretores e suas equipes trouxeram para a telinha o que há de melhor quando se fala em talento, e que não perde em qualidade para nenhum outro Estado no qual o investimento em produção cultural é muito maior. O evento é tradicionalmente organizado pela ABD&C. Em sua primeira edição, no ano de 2009, havia vários pontos de projeção de uma perspectiva que abrangia tudo que já tinha sido produzido em Alagoas, com a exibição de aproximadamente 30 filmes que retratavam dos fotogramas até as produções daquele ano, fazendo até uma referência à Panorama de Cinema Alagoano, obra de Elinaldo Barros. A segunda edição ocorreu em 2011, já com a forma competitiva entre os curtas, estimulando assim a produção de cinema no estado. FONTE: DIVULGAÇÃO
Cena do filme “12:40”, de Dário Jr. 36
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“A Mostra Sururu representa o empenho dos realizadores alagoanos em produzir e exibir seus filmes. Representa também o desejo de conexão com o público, a busca pelo amadurecimento e as conquistas dos realizadores e admiradores do audiovisual alagoano.” Disse Larissa Lisboa, organizadora do evento e integrante da ABD&C/AL. O momento do audiovisual em Alagoas vive uma crescente movimentação que faz do cenário atual a oportunidade mais produtiva desde o ciclo super-8 e das realizações da Caetés Filmes, como o longa-metragem “A Volta Pela Estrada da Violência”, produzido na década de 70 e exibido especialmente na noite da premiação. Os 16 curtas trazem aspectos diversos de produções estreantes, veteranas e inéditas que concorreram a prêmios entre si. Esse ano, novas categorias foram incluídas, como a de melhor direção de arte, trilha sonora e som.
FONTE: DIVULGAÇÃO
Mais uma cena do filme “12:40”, de Dário Jr. VITROLAE&JEANS |
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|35mm A cena atual alagoana ficou mais unificada depois do edital de apoio ao audiovisual da Secult, que premiou cinco dos filmes concorrentes, fazendo com que surgisse um clima de irmandade entre os produtores. Em Alagoas, é comum que o diretor de um filme seja da equipe técnica de outro, afinal de contas o que importa é o bem da produção audiovisual local para que tudo seja da mais alta qualidade. Durante as três noites de exibições, o cinema do Cine Sesi registrou indícios claros de lotação. Na sala do cinema há 163 assentos, mas como a demanda de telespectadores foi maior, muita gente
teve de se acomodar no chão ou até mesmo nas escadarias para poder assistir aos filmes. Mesmo a organização anunciando que a partir da terceira noite iria começar a exigir convites para ter acesso às exibições, o público continuou a ser superior à capacidade do local. A comissão julgadora foi formada por Camilo Cavalcante, cineasta pernambucano, pelo diretor de fotografia e presidente da ABD&C nacional, Jaime Lerner, pelo produtor carioca e vice-presidente do Fórum dos Festivais, Antonio Leal, e pelo Assessor Técnico em Cinema do Departamento Nacional do SESC, Marco Aurélio Lopes Fialho. FONTE: DIVULGAÇÃO
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Set de filmagem do curta “Fênix”, de Anderson Barbosa
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Rafhael Barbosa que chegou à mostra como favorito por ter vencido, com “Km 58”, o prêmio de melhor curta-metragem de 2011; esse ano trouxe sua nova obra, o tocante “O Que Lembro, Tenho”, que levou seis prêmios. Dentre eles: Melhor trilha sonora, com autoria de Nando Magalhães; Melhor Som, realizado por Pedro Octavio Brandão; Melhor atriz, a doce Anita das Neves; Melhor Roteiro e Melhor Direção. Questionado sobre as perspectivas para com o seu novo trabalho, Rafhael afirmou: “Em relação ao ‘KM 58’, acho que ‘O Que Lembro, Tenho’ representa um amadurecimento em termos de roteiro e também de técnica. O primeiro foi uma experimentação de uma linguagem radical muito ousada. O novo filme se comunica mais com o público, apesar de não deixar de lado a subjetividade. Por isso, por essa aproximação maior com as pessoas, acho sim que ele tem boas chances nos festivais nacionais. Pretendo inscrevê-lo no Cine PE, que é hoje um dos cinco maiores do país, mas também em muitos outros, inclusive em festivais internacionais”.
FONTE: DIVULGAÇÃO
Set de filmagem do curta “Fênix”, de Anderson Barbosa
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|35mm Seguindo com as premiações e surpreendendo o próprio diretor e o público, o vencedor de melhor documentário foi o curta “Interiores ou 400 anos de solidão”, de Werner Bagetti, que também foi premiado pela melhor montagem. Werner tem dominado o campo do documentarismo alagoano. As outras produções chegam a ser, mesmo que com qualidade extrema, minimizadas perante as obras dos Bagettis e sua equipe, que também venceram o prêmio de melhor fotografia com o documentário “Exu – Além do bem e do mal”, com direção de Michel Rios. Essa última vitória surpreendeu até mesmo os críticos de cinema, pois ao mesmo tempo em que o curta é extremamente estético, ele é um documentário, e é de costume que obras ficcionais é que sejam premiadas com tal categoria, pois exploram tecnicamente estes aspectos. O último curta premiado foi Farpa, de Henrique Oliveira, que foi contemplado com o prêmio de melhor Direção de Arte para Gabriela Miranda e de Melhor Ator para Julien Costa. Mas segundo palavras do próprio Henrique, que é presidente alagoano e secretario nacional da ABD&C, a maior felicidade é a consagração que a mostra conseguiu nessa 3ª edição. O alcance que o evento teve dessa vez surpreendeu os idealizadores do projeto ao perceberem que principal objetivo foi alcançado, que é ver o cinema alagoano reverberar e ser realmente debatido e consumido da melhor forma pela sociedade em geral. 40
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“Nós conseguimos esse ano garantir tudo que desde a primeira edição nós queríamos, que era lotar o cinema de pessoas dispostas a ver e debater filmes alagoanos, atingir todas as faixa etárias, todas as classes sociais, lançar, e até mesmo reexibir filmes que já haviam sido lançados mas que muita gente ainda não tinha conseguido ver. Ver e debater não só na sala com produtores e o público após a exibição no cinema, mas também na rua”, afirma Henrique. Os outros filmes que não foram premiados, mas foram destacados pela crítica e pelo público foram os estreantes “A Banca”, de Aloísio Leahy, e “Fênix”, de Anderson Barbosa. O primeiro foi sucesso de público. Quem prestigiou a exibição de estreia do filme, tece somente elogios ao curta e a sua linguagem que tirou muitos risos dos que prestigiaram sua primeira exibição no sábado, dia 27. Já o segundo vem com peso herdado de “Amor e outros Crimes”, filme premiado na mostra de 2011 como a melhor direção. “Fênix” abriu a mostra com a estreia esperada de mais um obra literal da parceria de Anderson com Pablo Casado. A maioria dos filmes sofreu dificuldades de produção e de investimentos. O próprio Anderson Barbosa afirmou que sua produção é independente e que produziu o filme sem patrocínio. É o mesmo caso do curta universitário, 12:40. Produzido por alunos do curso de Comunicação Social da Ufal, com o mínimo de verba e com direito a apenas duas diárias
35mm| de gravações, o filme representa a universidade e a garra dos alunos em produzir audiovisual em Alagoas. Esse curta também representará o Estado no festival de cinema universitário de Penedo. Em clima de festa e de otimismo, os produtores alagoanos festejaram todos os resultados da mostra. A valorização das produções locais é algo que está chamando a atenção também da sociedade que agora sai de casa para acompanhar e debater o cinema alagoano e seus jovens talentos. Prestigiar a cultura de Alagoas não é mais só assunto de burguês. O alcance que o evento teve foi considerado gratificante por sair da sala de exibição e ir parar em rodas de amigos, em mesas de bar, no cotidiano da sociedade de um modo geral.
FONTE: DIVULGAÇÃO
Cena do filme “O que lembro, tenho”, com a atrizes Ivana Iza e Anita Nevesnix, de Rafhael Barbosa
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Nasce um criador Das ideias à execução, Antonio Castro comanda um verdadeiro show de conceito e estética por meio de suas produções de moda com crivo independente POR WILSON SMITH
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ntonio Castro, um jovem alagoano nascido em Maceió, executou sua primeira publicação dentro do campo da moda na transição dos 15 para os 16 anos. O trabalho é intitulado: ‘The Last Girl Walking’, e a produção evidencia o olhar apurado para a execução do ofício de designer e produtor de moda. No primeiro ano do ensino médio, Antonio já trazia consigo o anseio de cursar moda e fazer da sua paixão, sua profissão: esse pensamento ficou enraizado desde então. Sua primeira peça executada surgiu em decorrência de uma atividade estudantil, a ‘Mostra Cultural’ do colégio, que foi totalmente organizada pelos alunos. Dentro das atividades surgiu o questionamento sobre a produção do figurino para uma peça teatral. Antonio fazia parte de um grupo no qual os componentes, em virtude da pouca experiência, decidiram realizar essa atribuição depois; quando a questão ressurgiu, Antonio se prontificou para executar a peça de roupa (um vestido) em dois dias e à mão. “É só confiar em mim!”, afirmou. Entretanto, os companheiros da equipe não sentiram confiança nas habilidades do colega e resolveram solicitar os serviços de uma costureira profissional. O fato ocorrido contribuiu para que o garoto, atualmente com 17 anos e cursando o 3° ano do ensino médio, ficasse com uma ideia fixa na mente e, para desencargo de consciência, confeccionasse a peça. A partir de então debruçou-se no projeto e reformulou o vestido, já que a ideia principal era que ele fosse azul, tendo em vista que a inspiração inicial era embasada na rainha das águas, enveredando em uma vertente fantasiosa. Esse padrão se transfigurou e ganhou um novo conceito. Vale destacar que o carinho pela primeira obra é tanto que a foto no porta-retrato da mesa de cabeceira é de um ensaio com ela. A roupa foi executada toda em tule preto. A proposta inicial era confeccionar a peça, fotografar e divulgá-la através do facebook, porém a brincadeira evoluiu e seguiu em ritmo frenético: essa experimentação foi o start para que Antonio desse início a sua trajetória. 42
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Esse mergulho na moda foi bastante diferenciado, o que só afirma que o rapaz não tem nada de clichê, contrariando o perfil mais comum, em que muitos designers tiveram como inspiração as avós ou mães costureiras. Os caminhos desbravados por Antonio foram cercados por aspectos mais intuitivos. Ao contrário de seus amigos que buscavam se firmar no meio dos esportes, desde pequeno o designer buscava se encontrar no meio artístico. Tentou fazer aula de teatro, coral, violão, mas não conseguia progredir - sua mãe, já sem esperança, o colocava nessas atividades achando que não iria dar certo. O dilema persistia, já que Antonio ainda não havia se encontrado, mas na moda ele conseguiu se firmar. Na verdade, ela sempre esteve presente em seu cotidiano de um jeito mais subjetivo, visto que sua mãe é designer de bijuterias - o que não é diretamente ligado à área, mas tem correlação com o universo da criação.
FOTOS: GABRIEL PASSOS
| STRIKE A POSE
O projeto Larrareta A primeira produção, que seria algo simples, foi agregada por outros jovens talentos - amigos de Antonio que lidam com artes, como maquiagem, fotografia, música, modelagem e direção de produções, cada um com suas peculiaridades. Unidos, formam um verdadeiro exército fashion, super engajados na produção dos editoriais. Posteriormente surgiu a dúvida: “Onde vamos disponibilizar esse material?”, e foi a partir daí que Antonio decidiu criar o tumblr Larrareta. Em seu segundo editorial, o designer decidiu aumentar o campo de visualização, e então deu origem ao website larrareta. wix.com. O nome Larrareta surgiu em virtude do apelido de uma de suas amigas, Lara. No colégio surgiu um boato de que a palavra ‘Larrareta’ significava ‘prostituta’ no português de Portugal, e seu ciclo de amizade acabou acreditando nisso por um longo período. Tempos depois descobriram que, na realidade, prostituta é ‘lazarenta’, mas o nome que havia sido proposto ficou em definitivo como título do projeto. Antonio pontuou não ter uma preocupação estética exacerbada com o primeiro editorial como tem hoje, mas ainda assim os registros renderam imagens de moda inspiradoras. Na segunda 44
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produção já havia de fato a preocupação de passar alguma mensagem propriamente dita através das fotos e, na medida em que foi se aprofundando na idéia e nas inspirações das histórias por trás das fotografias, desenvolveu-se esse oceano de conceito. Tais histórias por trás das fotos o impulsionam já que, por ser amante do teatro e ter se aventurado na área, os seus trabalhos têm muito reflexo da vertente dramatúrgica, sendo perceptível essa bossa performática no ar.
Ele explica que as ideias para os
editoriais surgem aos poucos - a base da história é o que normalmente vem completa, mas não há um roteiro específico - e adapta tais ideias ao que está ao seu alcance, tentando moldar o que realmente dispõe de forma que se encaixe às suas visões, uma vez que o designer não conta com grandes orçamentos, locações diferenciadas, muito menos profissionais renomados. Mas o legal da criatividade está justamente nesse exercício de adaptar-se às situações impostas, já que seus projetos são independentes.
FOTOS: ISADORA CASTRO
‘’Acho muito errado quando colocam o crédito só para mim porque, com certeza, sem todo mundo que me ajuda, não iria conseguir fazer metade do que eu faço! Eles são meus amigos, não trabalham para mim, trabalham comigo. Então eles estão ao meu lado porque querem. Eu os chamo e eles escolhem se querem vir ou não’’, salientou. VITROLAE&JEANS |
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FOTO: ISADORA DE LUCA
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FOTO: PAULA CORADO
FOTO: PAULO ACCIOLY
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Fontes de inspiração É uma questão um tanto complicada de se explicar, porque Antonio diz não ter algo ou alguém em específico como fonte de inspiração: são as coisas do dia a dia que acabam por inspirá-lo. Para sua coleção mais recente, as referências apareceram da seguinte forma: Castro estava lendo uma matéria sobre a performer Marina Abramovic, em que ela revelou que sempre deixa as paredes de sua casa brancas, pois acredita que suas ideias partiriam do branco - foi aí que o designer fez a ponte entre a cor e os tons mais sóbrios da cartela de cores de suas criações. Antonio gosta de pesquisar novas bases através da internet, revistas de moda e livros, além do fato de que muitas coisas surgem de forma aleatória, das lembranças que carrega há anos e que nunca achou que ressurgiriam e dariam origem às ideias utilizadas em seus trabalhos.
Ideias e elementos de produção A matéria sobre Marina Ambrovic deu a ideia da cartela de cores. Depois, uma matéria sobre o trabalho de Liu Bolin, um artista chinês que pinta o corpo de modelos de acordo com o fundo para que fiquem camuflados ou ‘invisíveis’ nas fotos foi outra referência. Por meio disso o garoto idealizou apresentar reproduções de data show numa modelo usando uma roupa branca, e ir modificando cada foto durante as reproduções, fato que deu origem ao nome de sua última coleção, ‘Metamorfoses’. A partir do nome também foram surgindo várias outras ideias: a base foi a metamorfose da borboleta, mas como a questão está voltada para trabalhar com o corpo da mulher, ele optou por falar da metamorfose feminina. 52
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E o que leva à metamorfose da mulher? É o envelhecimento, as cirurgias plásticas, a obsessão pela beleza. Dentro desse âmbito da vaidade, destacou-se também a deusa Afrodite, que era a mais bela dentre todas as mulheres da antiguidade. Como seu trabalho tem um toque futurista, Antonio levantou a questão de “Como essa deusa estaria atualmente?” quando em pleno século XXI é tão fácil se tornar linda, tendo em vista todos os recursos para essa busca incessante pelo ar jovial - e chegou à conclusão de que Afrodite estaria louca, porque iria querer continuar sendo a mais linda de todas. É nisso que se baseia o vídeo que foi reproduzido durante o desfile, e na performance que acompanha a apresentação da co-
STRIKE A POSE | leção - enquanto as modelos desfilavam, Virna Pereira (amiga de Antonio e integrante do casting) estava no meio do palco com uma peruca longa e loira, penteando o cabelo incansavelmente, para arrematar a ideia proposta.
FOTOS: ARIANE SAPUCAIA
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FOTOS: ARIANE SAPUCAIA
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O desfile da coleção Metamorfoses As peças foram apresentadas durante a festa de encerramento do II Circuito de Design, a [Bar]Haus, que aconteceu no Novo Orákulo. O convite para realizar essa ação partiu de um dos membros do Circuito, que conheceu o projeto Larrareta por meio do concurso Movimento HotSpot, no qual Antonio Castro fez a sua inscrição, totalmente despretensioso e sem perspectiva alguma de vencer, tendo em vista que competiria com talentos de todos os lugares do Brasil. O alagoano não havia contado sobre sua inscrição para ninguém, nem seus amigos mais próximos sabiam. Entretanto, Anderson Silva, da organização do II Circuito de Design, viu a publicação do projeto e formulou o convite, que prontamente foi aceito. Esta é a primeira coleção que Antonio vai expor em um desfile embora nem tenha o número de peças apropriado para uma coleção (são oito looks no total), antes da ‘Metamorfoses’ ele já havia produzido outra coleção batizada de ‘Assassinas de Adão’, que rendeu apenas um editorial. Após aceitar o convite, começou o processo de materialização das peças, já que o conceito estava pronto e a partir daí foram dias corridos até o momento do desfile. Enquanto o desfile se iniciava, um vídeo conceitual sobre a concepção norteadora da coleção era projetado ao lado do palco. Um dos elementos desse mesmo vídeo realizava também uma performance semelhante presencialmente: uma modelo loira, de longas madeixas desgre56
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nhadas, magra e apática, penteava-se incessantemente diante de um espelho por 15 minutos. Na reprodução audiovisual foi inserida uma série de elementos que cortam as cenas e remetem à noção do tempo passando, como uma ampulheta com areia caindo, um relógio com os ponteiros se movendo, uma borboleta presa no pote. Todos esses elementos potencializavam o suspense sobre as peças que ele apresentaria. Tal recurso audiovisual foi fundamental para dar subsídios ao contexto da coleção, uma espécie de complemento das ideias expressadas por meio das roupas. O material foi gravado na Barra de Santo Antônio em uma casa abandonada e branca. A edição ficou ao encargo de Júlia Soares. A música escolhida para o espetáculo, que também contribuía para instalar uma atmosfera obscura, é assinada por Felipe Soares (baterista na banda Sticky Garden, e modelo no editorial ‘Flower Girl’) a convite de Antonio e foi produzi-
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FOTO: BRUNA FLORES
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|STRIKE A POSE da exclusivamente para o evento. A faixa retoma todo o conceito da coleção, e foi intitulada de ‘Fashion Killer’, fornecendo outro elemento diferenciado ao desfile. Essa era notadamente uma das sensações que Larrareta procurava provocar nos espectadores: o estranhamento; a percepção de como aquela estética é diferente de quem a vê e a experimenta. Distante daquilo que é padrão. Paulatinamente as modelos surgiram no palco e desceram os poucos degraus que as separavam do chão. Entre as pessoas, elas desfilaram enquanto concebiam, ao mesmo tempo, uma passarela invisível. Enquanto a música se desenvolvia, mudando o clima do lugar a cada segundo, as peças tornavam-se acessíveis aos olhos e aos poucos não pareciam mais estranhas. A cartela de cores era monocromática, foram oito looks em tons clean: cinza, branco e off-white. Os acessórios também eram elementos de destaque, com maxicolares e brincos confeccionados com pedaços de espelho, já que este é o símbolo maior da vaidade, e Antonio decidiu quebrá-lo. O beauty do desfile era composto por dois elementos de destaque: boca cinza e sobrancelhas bem marcadas. Tintas de pele branca e preta misturadas forneceram o tom cinza desejado, já a sobrancelha bem delineada veio a partir de uma foto encontrada na biografia da Madonna, conforme pontuado por ele: “Madonna é sinônimo do poder feminino e da mudança, uma vez que a cantora vem se 58
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repaginando ao longo da carreira”. Quanto aos materiais das peças, em virtude de estar falando sobre mudança corporal, o designer decidiu retratar uma textura que parecesse que as modelos estivessem usando armaduras. “Queria algo que fosse justo ao corpo, mas que ao mesmo tempo desse uma rigidez, como se fosse uma pele diferente da natural”, justificou. Por isso, ele optou por trabalhar com o courvin facto, material para capotaria. Simultaneamente, quanto ao shape, tentou criar modelagens que mudassem o formato corporal da mulher, justamente para retratar a metamorfose, e para isso foram criadas abas (com fibras de aço dentro para deixar as peças rígidas e armadas). Antonio investiu nos recortes dos tecidos, pontas, sinuosidade e simetria, além de babados nas mangas (em organza branca e cinza) para simbolizar as mulheres viciadas em musculação e adeptas ao fisiculturismo, que geralmente ficam com o tronco mais fino e braços mais largos. A ideia era margear os êxitos e deformidades da metamorfose da mulher, que às vezes é desejada e outras vezes se descontrolam devido à obsessão pela beleza... Uma coleção que arremata várias vertentes. Todos os elementos são originais: peças, vídeo, música, performance... Antonio Castro fora anunciado naquela noite como um ‘jovem’ estilista, e não há como discordar, afinal, sua idade não nega sua juventude. Mas não parecia, de forma alguma, que o entendimento de jo-
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vem denotasse amadorismo. Cristalizou-se diante de todos, uma apresentação completa de moda: conceito, atmosfera, contrastes, música, vídeo. Mesmo sem a formação acadêmica, ou levando em consideração os poucos anos de vida, ali estava um estilista, sem controvérsias.
FOTO: BRUNA FLORES
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O jeitinho brasileiro
de criar
Designers brasileiros que fazem sucesso no exterior POR WILSON SMITH
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Brasil é o país da pluralidade dos talentos - nas mais diversas áreas sempre há um representante verde e amarelo - e a produção de moda não é exceção. Com o frescor e bossa decorrentes das diferentes influências e referências que transitam no território nacional, os criadores inovam constantemente e evidenciam o potencial do país no que diz respeito ao desenvolvimento da indústria do vestir. Os estilistas trabalham vertentes e bases encontradas nas diferentes regiões e acrescentam a elas a pegada cosmopolita das grandes capitais da moda, como Paris, Milão, Londres e Nova York. Esses grandes centros se tornam passarela para os modelos desenvolvidos pela trade da linha e agulha, despontando em conteúdo e colocando em cheque o crivo universal das ideias que afloram na mente dos designers.
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No país, o período pós-guerra teve papel fundamental para o crescimento do setor têxtil e de confecções, que desencadeou o crescimento da moda nacional. Hoje esse segmento rende bons frutos a nação, que se firma como o oitavo maior produtor têxtil do mundo e é considerado auto-suficiente na produção de algodão. Como se não bastasse os destaques econômicos, a qualidade do design da moda nacional está cada vez melhor, e a conquista do mercado internacional é fato consumado. Todos esses índices são frutos da criatividade dos estilistas brasileiros - que, mesmo sem apoio e investimentos por parte do governo, vem conseguindo resultados expressivos. Boa parte do que é produzido no Brasil é consumido aqui mesmo, pelo mercado interno; no entanto, o país já tem clientela seleta no exterior. O trabalho desses talentos é imprescindível para mostrar aos ‘gringos’ que temos muito mais que praias, mulheres, caipirinha, samba e carnaval. Os rótulos são vários, mas o conteúdo vai além: os ‘brazucas’ são uma mistura de culturas e etnias, uma aquarela de pensamentos que fazem com que a criatividade e imaginação corram soltas e proporcionem posição de destaque para o design e a moda brasileira. O segmento têxtil é extremamente fértil, e já ocupa o segundo lugar entre os setores que mais empregam no país. Dentro desse âmbito a Vitrola&Jeans elencou alguns estilistas que são reconhecidos em terras nacionais e no exterior por seus trabalhos. O line-up dos prodígios forma uma lista extensa, vale a pena conferir alguns dos nomes a seguir:
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Alexandre Herchcovich
Alexandre Herchcovich
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Um nome extremamente representativo no fashion world, sua fama rompeu fronteiras há um bom tempo, e já está mais que consolidada. O sucesso de suas produções ecoa com força tanto no Brasil, quanto no exterior. O paulistano Herchcovitch faz suas criações unindo a sofisticação com o mundo ‘underground’ em que sempre viveu – o que explica o ‘caveirismo’ como ícone de suas produções e que tanto atiça o desejo de consumo a cada coleção. O clichê inexiste, a linguagem e o conceito de moda surgem com força e mostram uma preocupação sem igual com a estética das produções. Esses fatores correlacionados à linha editorial das peças garantem a posição de destaque ocupada pelo estilista. No decorrer de sua carreira, Alexandre ganhou fama por seus experimen62
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tos: modelagens diferenciadas, estampas extravagantes e matérias-primas fora da zona de conforto. Desenhar roupas para todos os tipos e estilos, sem amarras aos padrões impostos pela sociedade, é palavra de ordem. Das excentricidades exigidas pelas drag queens, até terninhos chiques para bonequinhas de luxo. Um corte preciso que permite que a sinuosidade corra livremente. Herchcovich é dono de um estilo marcante que encanta o público. Em sua carreira já teve sua marca inclusa nas maiores cidades de moda do mundo, e o nome do designer é assinado em muitas peças que não se restringem às roupas: é uma variedade interminável de objetos que vão desde móveis, calçados, utensílios domésticos e acessórios até roupas de cama. Um sucesso nato que promove o nome do Brasil no exterior.
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Pedro LourenÇO
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Filho dos estilistas Reinaldo Lourenço e Glória Coelho, Pedro Lourenço se lançou no mundo da moda com apenas 12 anos, quando começou a desenhar peças para a marca ‘Carlota Joakina’, a segunda loja de sua mãe. Aos 16 anos lançou sua própria grife no São Paulo Fashion Week - SPFW, ao apresentar sete coleções que havia desenhado desde que começou a trabalhar para sua mãe e, até hoje, ele nos surpreende a cada temporada. Paris, um dos mais importantes palcos da moda, aplaudiu o único latino-americano que apresentou seus trabalhos na semana do prêt-a-porter da ‘Cidade Luz’: além de ser mais um nome extremamente relevante no cenário fashion, Lourenço também é o mais jovem estilista que integra o line up parisiense. 64
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Em uma viagem de estudos à França, ele foi descoberto por grandes editores e fotógrafos da moda. Resultado: as suas produções foram um sucesso! Os modelos modernos e assimétricos do jovem estilista já se encaixam nas linhas de luxo, e podem ser encontrados nas lojas internacionais mais sofisticadas ao lado de criações de renomados estilistas. O berço foi de extrema valia para o start da sua carreira, entretanto as passadas dadas pelo estilista são fortes e bem alicerçadas - alguns editores de moda o consideram ‘o John Galliano brasileiro’. O status conferido a Pedro Lourenço é bem fundamentado, uma vez que acumula vários desfiles de grande sucesso e que tanto inspiram os amantes de moda.
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Carlos Miele FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
O estilista paulistano é um dos principais representantes brasileiros na semana de moda de Nova York e é a mente criativa de uma das grifes mais conhecidas no exterior, a M.Officer. Suas belíssimas criações aparecem em diversos seriados, filmes e no corpo de beldades que passam pelo tapete vermelho. Atualmente, um grande sucesso são os vestidos de festa que levam o seu nome e que têm muita inspiração do Brasil. As criações são fundamentadas na exuberante cultura popular brasileira, que resultam em um trabalho repleto de vertentes que arremata a áurea do país. Nos seus trabalhos, ele mescla a influência da mestiçagem na cultura brasileira de elementos afro-brasileiros com o rico legado dos índios nativos. O resultado é uma moda vibrante, sensual e diversificada, sempre propondo novas misturas e texturas que enchem os olhos. Miele é um verdadeiro embaixador da moda brasileira, visto que o estilista tem como um de seus propósitos disseminar a nossa cultura para importantes lojas em vários países, dentre eles Inglaterra, Estados Unidos, França, Itália, Mônaco, Suíça e Japão, só para citar alguns. Suas criações abrasileiradas geram um reconhecimento inédito no mundo para a moda brasileira em reportagens e editoriais de moda, nos principais jornais e revistas européias e americanas, ao lado dos mais importantes designers internacionais. Em suas produções sempre há um diálogo com as vertentes regionais do país e com um olhar apurado e sofisticado que foge da monotonia. O uso constante da tecnologia é um dos aliados para execução dos trabalhos das fibras ótica, holográficas à utilização de materiais ecologicamente corretos. Impossível não se apaixonar pelos modelos de Carlos Miele. 66
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Francisco Costa
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O mineiro Francisco Costa decidiu viajar para Nova York aos 20 anos de idade, logo após a morte de sua mãe, com o intuito de aprender inglês e se aperfeiçoar nas técnicas de moda na Fashion Institute of Technology, uma das escolas de moda mais renomadas do mundo. Seu trabalho e esforço logo foram reconhecidos, pois trabalhou para grandes grifes como Oscar de La Renta e Gucci, antes de ser convidado para comandar o posto de diretor criativo da cobiçada Calvin Klein - o seu sucesso na marca é imenso. Tendo seu nome reconhecido mundialmente, é responsável pela criação de luxuosos vestidos de festa, procurado por celebridades e seus modelos estão presentes nos maiores eventos internacionais. O estilista é um homem a frente 68
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do seu tempo, e sempre desponta as maxitendências das próximas temporadas a nível mundial, além dos looks CK, que levam sua assinatura, estarem entre os objetos de desejo dos fashionistas. O designer é o primeiro brasileiro a comandar a direção criativa de uma das grifes de maiores sucesso. E o resto é história? Só se for história com final feliz e muitas páginas a serem preenchidas. Costa é o único estilista com dois troféus CFDA, prêmio considerado o Oscar da moda mundial. É amigo íntimo de Eva Mendez, Scarlett Johansson, Natalia Vodianova, Anna Wintour e tantos outros nomes que ajudam a disseminar e perpetuar o legado brasileiro.
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Inácio Ribeiro
O casal Inacio Ribeiro e Suzanne Clement
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E para finalizar o line up de brasileiros que agitam o mundo da moda no exterior, apresentamos Inácio Ribeiro que, junto com a sua esposa Suzanne Clements, é responsável pela marca Clements Ribeiro. O brasileiro já havia trabalhado na Cacharel por um tempo, mas a dupla ganhou maior notoriedade quando personalidades de impacto mundial começaram a usar as suas criações: Michelle Obama, Madonna e Kate Moss são algumas que não dispensam as peças da grife. O grande destaque entre as clientes é Adele, que já usou vestidos da marca nas maiores premiações da música mundial. E a sintonia deu tão certo que a Clements Ribeiro passou a assinar o figurino da cantora. A notoriedade alcançada faz jus ao trabalho de Ribeiro, que hoje já apresenta coleção na London Fashion Week, além de ter colocado em pauta que o plus size também pode ser cool e elegante, sem distinção de medidas ou parâmetros. A produção de moda tem se reestruturado e conferido novos ares, um verdadeiro show de conceito que tem se propagado mundo afora.
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Asfaltando os caminhos do Design alagoano Das idéias à execução, Antonio Castro comanda um verdadeiro show de conceito e estética por meio de suas produções de moda com crivo independente POR BEN-HUR BERNARD
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té hoje é difícil dizer o que é design. Experimente perguntar a um estudante. Alguns com certeza terão certa dificuldade para responder. Não é que eles sejam maus alunos ou que não tenham certeza do que estudam, mas é que explicar “tudo” é realmente complicado. Afinal, design é isso: tudo! Desde a forma como você se acomoda numa cadeira, ou segura uma embalagem de xampu, ou a sensação de paz que se sente em um determinado templo budista; o jeito que você se penteia no elevador, o fato de você ter escolhido um iPad a um notebook – ou vice-versa; a razão por você se sentir atraído ou atraída por pessoas que usam canudinho... Poder-se-ia dizer coisas triviais referentes ao design, tais como a ergonomia da cadeira, a funcionalidade do seu tablet, ou o conforto e harmonia do elevador. Mas design vai além do óbvio e por isso é tão difícil justificá-lo. Pois bem, o design não só tem um objetivo concreto, como transmite sensações, articula ou molda comportamentos, impulsiona a compra de algo etc.. Mas tudo isso é sabido, certo? E o design sendo tudo isso que foi citado, não é um tema que pode ser ignorado, nem mesmo por quem não é designer, pois tal qual a quem não “gosta de política” – sem saber que, querendo ou não, é um ser político – quem não se interessa pelo design apenas é governado por ele. E é justamente pensando nessa premissa que estudantes do Instituto Federal de Alagoas (IFAL) criaram o Circuito de Design, por entenderem a importância de se construir um espaço de discussão entre acadêmicos e demais interessados na área, em Alagoas. Até porque, se já é difícil definir o que é design, imagine fazê-lo sem nem ao menos discuti-lo!?
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A segunda chamada O SURGIMENTO DO ENSINO LÁ FORA
Prédio da Bauhaus projetado por Walter Gropius, fundador da escola
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Quando o I Circuito de Design surgiu nem mesmo sabiam como nomeá-lo; se seria congresso, encontro ou ciclo de palestras, quando nenhuma terminologia parecia abarcar o design como um todo. Além do mais, buscava-se comemorar os 10 anos de criação do Curso Superior Tecnológico de Design de Interiores do IFAL – o primeiro curso superior de Design de Alagoas. E eis mais um argumento que valida a criação de um ponto de debate sobre essa área do conhecimento, pois há apenas uma década surgiu um curso acadêmico voltado para o design, algo que pode ser considerado recente, o que nos põe em posição de atraso [ver box]. A iniciativa surgiu dos estudantes daquele curso, que por sinal também acabavam de fundar o Centro Acadêmico de Design de Interiores (CADI). Nessa edição de estreia, o Circuito de Design tinha como tema os 10 anos do curso do IFAL, porém não se deteve a discutir apenas Interiores. Moda, Gráfico e Produto também foram temáticas abordadas, além do mercado, carreira, processo de criação, comunicação, dentre outros assuntos relevantes. Embora tenha obtido êxito na execução do evento e no bom número de inscritos pagantes, percebeu-se naquele momento que atrair o estudante de Design em Alagoas para eventos locais era mais complicado do que se imaginava. É necessário expor que além do curso de Design de Interiores do IFAL,
Uma das primeiras escolas de Design fundadas no mundo foi a Bauhaus, na Alemanha, na cidade de Weimar, em 1919. Sua formatação vanguardista e multidisciplinar ecoa até hoje, além de sua filosofia de relacionamento com o artesanato e a arte. A primeira escola de Design do Brasil foi fundada em 1962, no Rio de Janeiro. A Escola Superior de Desenho Industrial (ESDI) foi fruto da onda desenvolvimentista que surgiu no governo Kubitschek (1956-1961).
a Faculdade Maurício de Nassau também é outra instituição que oferta o curso de Design, o Gráfico e, naquele mesmo ano de 2011 havia sido criado o curso de Design (bacharelado) da Universidade Federal de Alagoas (UFAL). Além de já haver o conhecimento da criação de outro curso de Interiores no ano seguinte (2012), na VITROLAE&JEANS |
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|ARTIFÍCIOS Faculdade Integrada Tiradentes (Fits). Mesmo com essa ascensão, discutir design ainda era (e é) problemático, devido ao fato de que, quando se faz isso pela primeira vez, academicamente falando, pode-se cometer uma injustiça ou erro de agendamento em longo prazo. Quando apenas um grupo se mobiliza para tal ação, parte dele o encargo de abranger todas as necessidades mais urgentes do Estado; e também é esse mesmo grupo que se responsabiliza por nortear os rumos que esses debates tomarão por diante. Mas alguém tinha que fazê-lo, ou tarde seria. “Tivemos muitos contratempos e dificuldades, principalmente no tocante aos patrocinadores. Foi desafiador, mas muito produtivo. Fizemos diversos contatos que nos ajudaram e auxiliaram muito”, explica Jefferson Nunes, estudante de Design de Interiores e presidente do CADI. Nesse ano, tal qual a edição passada, o Circuito de Design aconteceu durante dois dias (17 e 18 de outubro), com o diferencial de ofertar também workshops, além das palestras e cases. O tema escolhido seria a “transversalidade” do design, ou seja, a sua flexibilidade em dialogar com diversas áreas do conhecimento, além de trazer consigo uma concepção mais cultural e artística. Com o amadurecimento da ideia, percebeu-se que talvez fosse precoce lançar algo tão substancial ao corpo discente alagoano, não por haver uma subestimação dos es74
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tudantes, mas sim por haver estruturas mais urgentes e negligenciadas do ensino e compreensão do design em Alagoas. “Pensamos em transversalidade pelo fato do design ser uma ciência multidisciplinar, isso é um ponto de destaque, por isso mais uma vez expandimos o leque de temas abordados, indo bem mais longe em relação a primeira edição do evento. ‘Caminhos’ surge quando buscamos um termo mais democrático: que caminho um designer deve tomar? Qual a identidade do design alagoano? Esses e outros questionamentos fizeram com que nós mudássemos o tema do II Circuito de Design, mas acreditamos que essa mudança ocorreu apenas no nome, visto que nossas discussões e conteúdos buscaram esse caráter múltiplo do design. Assim, surgiu “Caminhos”, que se propunha a não só expor a cena do design local, desvendando a produção alagoana e o que tem sido feito para a afirmação – ou reafirmação – de nosso design por meio da transmissão de nossa cultura; mas também desfiava os estudantes a se questionarem sobre a sua formação, sendo que o Design não se aprende, ou apreende, apenas com a frequência em aula, ou as boas notas em trabalhos acadêmicos, mas sim por meio da autogestão do estudante em se descobrir na área e de se lançar nos vieses que o design permite, asfaltando assim o seu próprio caminho.
ARTIFÍCIOS| FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
Desde a primeira edição (e muito se deve ao fato de o evento ser organizado por estudantes de Interiores), os palcos também são diferenciados, tornando-se cenários conceituais
A segunda chamada O Espaço Cultural Linda Mascarenhas foi o palco para trilhar tais “Caminhos”, que já se mostravam qualitativamente mais maduros em relação ao I Circuito de Design. Enquanto esse delimitava com nitidez o que se discutir sobre o mercado e o ensino, na segunda edição tais pontos se misturavam fluidamente. Por mais mercadológico ou academicista que seja o designer, o evento parecia deixar claro que o objetivo não era polarizar essas vertentes, mas envolvê-las como partes essenciais de uma unidade. O caminho da identidade local abriu alas
com a mesa redonda Identidade e Iconografia Alagoana, tendo a participação do antropólogo Bruno Cavalcanti, um dos autores (junto com Rachel Rocha) do livro Iconografia Alagoana (2011), publicação viabilizada pela união da Secretaria de Estado do Planejamento e Desenvolvimento Econômico (Seplande) com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) de Alagoas, que foi representado na mesa pela consultora Marta Melo, uma das coordenadoras do projeto. Para concluir a mesa, também foram convidadas Ana Maia e Rosa PiatVITROLAE&JEANS |
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|ARTIFÍCIOS ti, irmãs idealizadoras da galeria Viver de Arte e da marca Maia Piatti, reconhecida pelo mundo devido ao apelo sustentável e estética única. Tais convidados se fizeram importantes para essa abertura temática, pois o Iconografia Alagoana, mesmo com tão pouco tempo de lançado, já pode ser considerado um dos marcos literários sobre o design local, pelo simples fato de atender a demanda tão evidente de um porto referencial sobre a cultura alagoana, especialmente da imagem. Alagoas é ilustrada (ou ilustra) por meio de seus símbolos, cores, paisagens naturais, produtos artesanais e demais manifestações culturais e/ou folclóricas. Segundo Bruno Cavalcanti, as personagens alagoanas foram descartadas do projeto porque no Estado essa é uma abordagem delicada e que provavelmente se estenderia pelo viés político – e quem é alagoano sabe o “perigo” que existe ao fazer qualquer citação de personas políticas (non gratas). Além do mais, continua Bruno, “fazer essa seleção implicaria numa discussão sobre o merecimento daquela pessoa no livro”, algo que com certeza dividiria opiniões. Já Ana Maia e Rosa Piatti trouxeram como contribuição não só a experiência prática para os estudantes e demais participantes sobre como fazer uso da seleção iconográfica da publicação, mas também as suas vivências enquanto designers genuinamente alagoanas. Para elas, embora constantemente estivessem buscando inspirações de nosso Estado, 76
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como as praias e coqueirais, nunca foi algo forçado. Suas criações, que são feitas para durar, segundo Piatti, em entrevista a revista Graciliano, da Imprensa Oficial (edição maio/junho de 2012), carregam a memória afetiva de suas infâncias. Enquanto o debate sobre nossa identidade se desenvolvia no palco, algumas das muitas afirmações feitas pelos palestrantes chamaram atenção. Enquanto se desvendava essa trama sobre quem somos e que tipo de designers alagoanos podemos ser, Rosa Piatti argumentou que “o design alagoano será aquilo o que nós [alagoanos, que temos propriedade sobre o assunto] dissermos que é alagoano”. Tal perspectiva se fez importante pelo fato de que nossa imagem e cultura se misturam ao restante do Nordeste. Há uma espécie de construção caricata da qual nós não conseguimos nos desvencilhar e da qual, possivelmente, nós não devemos ignorar, pois tal construção, de alguma forma, já faz parte de nós. Como exemplo citado pelas irmãs, temos as praias, os coqueiros, o filé, alguns folguedos e tantos outros patrimônios materiais e imateriais que se repetem nos outros Estados nordestinos. Mas tais elementos são constantemente e, na maioria das vezes, exclusivamente elencados como pontos referenciais de nossa cultura. Então sim, Piatti não está errada em fazer tal afirmação, ainda mais se considerarmos a produção contemporânea artística e de design que não precisam, necessariamente, sempre se voltar para o nosso folclore ou demais ícones.
ARTIFÍCIOS| Bruno, por sua vez, suportando-se na antropologia, comentou sobre o fato de não termos a paixão tão grande por Alagoas assim como o baiano ou pernambucano tem por suas terras natais. E enquanto comumente alguns se lamentam por isso, Bruno discutiu um outro lado dessa moeda. Por justamente não termos “essa ligação com as raízes, somos mais cosmopolitas”, comentou Bruno; ou seja, há uma liberdade maior para o artista e para o designer de criar. O antropólogo argumentou com um exemplo bastante curioso: “se Djavan fosse pernambucano ele estaria perdido, pois sempre iriam cobrar a ele a regionalidade; ele teria uma dívida eterna com a cultura de Pernambuco”. E no entanto, Djavan é um dos mais cultuados cantores alagoanos contemporâneos e talvez muito se deva justamente ao fato de haver o descomprometimento (propositadamente ou não) de sua música com a raiz alagoana. Outro argumento eloquente de Bruno foi sobre a cobrança de delimitar uma identidade nossa: “cobrem dos artistas e designers, pois eles, por serem livres, têm mais propriedade para falar”.
Os palestrantes e suas vertentes Tal como dito, a discussão sobre mercado e ensino se diluiu entre os palestrantes, que ora pareciam militar pela ética no meio, ora impulsionavam a ousadia e iniciativa dos participantes. No mesmo dia da mesa Identidade e Iconografia Alagoana (17 de outubro), subiu ao palco – ou melhor, sentou-se a beira dele – o designer Eduardo Queiroz. Para quem não estuda Design talvez esse nome não signifique nada, mas ele é o criador da pastilha de coco, um revestimento que ganhou o mundo por sua matéria prima inovadora e sustentável, além de provocar uma sensação tátil e estética singulares. É talvez o produto de design alagoano mais famoso e representativo de nossa cultura atualmente. Eduardo é curitibano, mas foi em Alagoas que se desenvolveu com a marca Ekobe, pois trouxe consigo a ideia de reutilização da casca do coco. “Eu vim pra cá porque transportar o coco seria muito caro, então como aqui tinha em abundância, resolvi vir morar aqui”, justifica o designer. O reconhecimento com o seu produto, criado em 1995, e os desdobramentos dele em outros revestimentos e matérias primas, rende-lhe prêmios até hoje. Um dos últimos e mais relevantes é o iFProduct Design Award, conquistado ainda esse ano, em Munique, na Alemanha, com o suporte de plantas “Favo Verde”. VITROLAE&JEANS |
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As irmãs designers Ana Maia e Rosa Piatti, o antropólogo Bruno Cavalcanti e a consultora do Sebrae, Marta Melo, abrem o evento com a mesa redonda Identidade e Iconografia Alagoana
Enquanto Eduardo apresentava com espontaneidade as suas inúmeras criações, discursava em prol de uma produção mais ecológica e sustentável, instigando aos estudantes a não desistirem de suas ideias, por mais mirabolantes e desafiadoras que sejam. Outro grande nome esperado foi o do paulistano Thiago Reginato, designer gráfico paulista e fundador da Tipocali, especializada na cultura da tipografia e caligrafia. O jovem de 22 anos, de amplo reconhecimento nacional, além de uma palestra, ofertou um workshop de “tipocaligrafia” para os participantes. Ainda na área de gráfico, houve a participação dos designers Thiago Oli, que também é ilustrador e já foi diretor de arte da agência Núcleo Zero; Rodrigo Ambrosio, que além de arquiteto, possui diversas marcas desenvolvidas no Estado, como a da boate Loop Lounge Club e a do restaurante Praêro; e os componentes do estúdio Zero Pixel, que além dos diversos prêmios nacionais e internacionais que conquistaram, conceberam a identidade visual do II Circuito de Design. A professora Doutora Rossana Gaia, coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Design do IFAL apresentou sua pesquisa sobre cenografia nos espaços midiáticos, como novelas e programas de TV. Além de ser professora de Interiores, por ter formação em Jornalismo, ela abordou a questão da criação de desejos no telespectador por parte dessas produções de mídia, fazendo com que os objetos passem a referenciar os personagens que os usam. Leonardo Sandres, por sua vez, representou a moda local. O estilista, que hoje cria para a Vert Et Rouge, é especialista em roupas conceituais e utiliza nossas referências locais, tais como a renda. Sem o suporte de audiovisual, Leonardo realizou um desfile de três de suas peças mais significativas sobre o palco, surpreendendo a todos. 78
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Surpreendendo a todos com um desfile, Leonardo Sandres apresenta uma de suas peças premiadas, com inspiração regional
Os palestrantes e suas vertentes Não se pode mensurar com exatidão o quão importante é um evento com essa proposta para Alagoas. Não podemos de nenhuma maneira ignorar o quanto crescemos no que se refere ao design, principalmente pela adesão das instituições de ensino pelo desenvolvimento do curso superior na área. Mas é exatamente pelo atraso e pela sentida falta de referencial local – percebida, ao menos, academicamente – que a iniciativa do Circuito de Design de criar um espaço para essa troca e socialização dos agentes, que hoje compõem o corpo discente alagoano, pode ser considerada como um ponto de partida, talvez (por que não dizer?) norteador de uma nova geração de designers por formação em Alagoas. E essa realidade já se anuncia rapidamente. Entre os palestrantes e oficineiros do evento, destaca-se a participação de Anderson Silva, especialista em cenografia, formado em Design de Interiores pelo IFAL, que se não o primeiro, é um dos primeiros professores designers formado em Alagoas. Esse é um ponto de bastante polêmica, principalmente nas instituições IFAL, UFAL e Fits, pelo fato de não haver quase nenhum professor designer em seus corpos docentes, sendo a imensa maioria deles arquitetos e especialistas. É essa uma das reivindicações mais comuns entre os estudantes que militam o design alagoano, principalmente na academia, pois se argumenta que a visão de um designer é diferente de um arquiteto, conduzindo os projetos pedagógicos desses cursos para um outro viés. VITROLAE&JEANS |
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Para Anderson Silva, ter professores designers é o próximo passo para o desenvolvimento da área por aqui. “A presença desses professores torna a dinâmica de aprendizagem mais focada na área, onde haverá uma interação de profissionais formados, que passaram ou estão no mercado e que socializam os conhecimentos adquiridos. Acredito que a presença de professores designers nos cursos os tornam mais reais, mais aptos a rotina da profissão. Acredito que o diálogo flui melhor, a pesquisa perpassa pela lealdade científica de pesquisadores da área e, con-
sequentemente, quem ganha são os alunos e a estrutura do curso”, salienta. Jefferson Nunes, presidente do CADI, corrobora com a opinião de Anderson, pois por ainda ser estudante, percebe em sala de aula a falta que um professor designer faz: “a formação do designer em Alagoas necessita muito experimentar novas possibilidades, se reinventar, buscar referências em modelos de ensino que fazem a diferença, precisamos exigir a presença de designers em nossas faculdades”, completa o estudante.
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Eduardo Queiroz, fundador da Ekobe, estimulou os estudantes a não desistirem de suas ideias e incentivou a produção sustentável. Em primeiro plano, alguns dos revestimentos naturais criados pelo designer; e em mãos o suporte de plantas “Favo Verde” | VITROLAE&JEANS
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Mas também há muito que comemorar, pois não se pode estar alheio às mudanças culturais e econômicas que estamos sofrendo nos últimos anos. Temos uma classe média que cresce em poder aquisitivo, mas que significa muito mais que um argumento quantitativo. O design está diretamente ligado ao consumo, só que o consumo consciente do design não é um fenômeno de compra e venda puro e simples. Há mais significado e desejo de comunicação entre as pessoas e os objetos, marcas ou serviços que imaginamos. Segundo o designer Bruno Clériston, componente do estúdio Zero Pixel, “o Brasil é a moda da vez no exterior e nós nordestinos mostramos em nosso dia a dia que nossa qualidade de trabalho e profissionalismo estão cada vez mais se aproximando dos grandes centros, tornando um mercado diversificado, mas economicamente homogênio”, argumenta.
Para conhecer o design alagoano
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Revista Graciliano nº 14 (maio a junho de 2012) – tema da edição: Design alagoano e identidade cultural Publicação da Imprensa Oficial Graciliano Ramos A partir de R$ 8, na sede da Imprensa Oficial e bancas de revista autorizadas. Livro Iconografia Alagoana, de Bruno Cavalcanti e Rachel Rocha (2011) Publicação em parceria com a Seplande e o Sebrae Alagoas, com patrocínio da Braskem Não está a venda, mas pode ser consultado em bibliotecas públicas. Site do Núcleo de Pesquisa em Design do IFAL (NPDesign) Mantido pelo Núcleo de Pesquisa em Design e coordenado pela profª Drª Rossana Gaia. http://npd.solucaots.com.br/
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E se o sangue menstrual for sagrado? Processo fisiol贸gico para uns, ritual religioso para outros
POR NIARA AURELIANO
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ENSAIO PRODUZIDO PELA VICE HAVERÁ SANGUE
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sangramento mensal feminino marca o período de liberação do endométrio, também chamado de mucosa uterina, a membrana que reveste a parede do útero. A partir do momento em que os óvulos, células femininas produzidas pelos ovários, não são fertilizados pelos gametas masculinos (espermatozóides), gerando uma gravidez, são liberados pela vagina, que descarta o que se chama de fluxo menstrual. A primeira menstruação, ou menarca, costuma ocorrer dos 12 aos 15 anos. Entretanto, algumas meninas menstruam aos nove anos, enquanto outras podem menstruar após a idade esperada. Os sintomas do fluxo geralmente consistem em momentos extremamente desagradáveis para a maioria das mulheres, como dores abdominais, enxaqueca e cansaço, além daqueles considerados emocionais e psíquicos: ansiedade, irritabilidade e tristeza. Esses sintomas psicoemocionais podem ser explicados pela diminuição da liberação da serotonina, neurotransmissor responsável pela regulação do humor, dentre outras funções. Mas os sinais acima citados não se restringem à época do ciclo menstrual. Eles podem ocorrer até dez dias antes do sangramento, o que se denomina Síndrome da Tensão Pré Menstrual. É pela TPM, além do sangramento mensal, que muitas mulheres prefeririam livrar-se do fluxo. Estariam as mulheres que desejam livrar-se de sua condição fisiológica querendo livrar-se do ser mulher? Para algumas filosofias de adoração à Deusa e restauração do poder feminino perdido, sim.
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Quando Deus era mulher A Deusa era o centro da religião pagã, e estaria associada à Mãe Terra: a divindade feminina, uma deusa da natureza, geradora de vida e fertilidade. A Deusa era a criadora do universo, e esta função estaria ligada à possibilidade da mulher gerar vida. Apesar de se ter provas da existência de divindades femininas, não se pode afirmar com a mesma certeza que existiram sociedades matriarcais (quando a mulher, especialmente a mãe, é quem detém o poder e o papel de liderança da comunidade). O homem, não sabendo seu papel na criação da vida, considerava a mulher um ser sobrenatural, capaz de trazer outro humano a vida; capaz de sangrar por dias sem estar gravemente doente ou vir a falecer. Assim, passou a adorá-la como entidade mágica, e aí começaria a ligação humana com o divino: a mulher era considerada a ligação entre a Terra e o mágico. Para as religiões que têm como centro divino a mulher, em conjunto com a gestação, o sangramento mensal tem aspecto sagrado, e é considerado um dos elementos que conecta a sacerdotisa à Deusa.
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Wicca – e o resgate do sagrado feminino Wicca é uma religião neopagã de culto politeísta, que baseada em um culto dualista, crê na Deusa (Lua e Terra), criadora de todas as coisas; e no Deus (sol), de caráter fertilizador. O culto moderno foi criado em 1954 por Gerald Gardner, sendo fortemente influenciado pelas religiões pré-cristãs. A Deusa Tríplice, inspirada nas fases da lua (lua crescente – a virgem; lua cheia – a mãe; lua minguante – a sábia anciã), e o Deus Cornífero, responsável pelas características físicas masculinas e companheiro da Grande Deusa, representariam, na verdade, todos os deuses, já que a religião Wicca é politeísta. Tendo o patriarcado, e o machismo obviamente nele existente, tirado da mulher o domínio sobre o próprio corpo, sua força física, implantado certas agarras emocionais (e aqui o homem também se vê vítima do machismo, e não devemos condená-los como grandes culpados, mas muitas vezes, apenas seguidores da ideologia vigente), e a força do útero, para as wiccanas é hora de se resgatar o poder feminino perdido. O culto a “Senhora de 10 mil nomes” é dividido por panteões, que a partir de rituais, destinam suas energias a algumas divindades femininas e masculinas. Dentre vários outros panteões, pode-se citar: grego, celta, assírio, egípcio, chinês, africano, babilônico, romano, hindu. Além de tudo isso, a religião também é ramificada com as tradições. Em nosso país, dentre inúmeras delas, as mais conhecidas são as Diânica do Brasil e Diânica do Nemorensis. Além destas, pode-se citar a Gardneriana (fundada pelo pai da Wicca moderna Gerald Gardner) as tradições sumeriana, alexandrina e de Algard. O uso de sangue menstrual não é conhecido pela maioria das integrantes da Wicca no Brasil. A Vitrola&Jeans entrevistou a wiccana Edith Granja. Estudante de biblioteconomia da Universidade Federal de Alagoas, Ufal, ela tem 21 anos, mora em Rio Largo e é pequena sacerdotisa do panteão céltico. V&J - Como você entende sua menstruação? Você aceita a menstruação como processo sagrado ou a vê apenas como fisiológico? Edith Granja - Pra mim, a menstruação é um período positivo que sinto a deusa em mim, sinto-me mais mulher e até mi86
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nha libido aumenta. Minha ligação com a natureza aumenta. Sabemos que hoje a menstruação pode ser interrompida, mas para as wiccas é um período sagrado de ligação com a Deusa. V&J - Qual a relação entre o sangue menstrual e os rituais da Wicca?
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Edith Granja - Eu conheci a Wicca aos 10 anos, com a visita de uma tia de São Paulo. Ela era wicca e praticava há muito tempo. Ela me deu os primeiros livros e me iniciou. Hoje tenho 21 anos, ainda estudo e já iniciei algumas pessoas. Cada um tem o seu papel. Na religião temos a Deusa, nossa mãe, e ela tem um companheiro. Porém, o aspecto da mulher é mais relevante, além de sermos maioria nos covens (grupo wiccas), as wiccanas ortodoxas não aceitam homens em alguns rituais, mas isso está se desfazendo pouco a pouco. V&J – Em qual nível dentro da Wicca você se encontra hoje? Edith Granja - Para me tornar uma wiccana, tive de estudar muito, então passei de estudante para iniciada. A partir daí fiz um ritual de passagem, e hoje sou pe-
quena sacerdotisa. Os outros níveis são de média e grande sacerdotisa. Sou do panteão céltico e cultuo a Deusa Mãe, cultuo Lilith, umas das deusas da fertilidade e sexualidade. Além delas, pode-se cultuar a virgem ou a anciã, sendo a virgem, Deusa da caça e batalhas e a anciã, Deusa do lago e da morte. V&J – Você é mãe. Batizou seu filho em alguma religião? Edith Granja – Eu fui batizada no cristianismo sem meu consentimento. Eu desconsidero esse batismo. Meu filho é pagão. Não batizei o Rafael porque quero que ele decida se vai seguir alguma religião. Acho um desrespeito batizar uma pessoa sem que ela queira.
FONTE: REPRODUÇÃO DA INTERNET
Edith Granja - A menstruação na Wicca e nas religiões pré-cristãs têm um sentido sagrado de ligação com a Deusa Mãe. Na época dos celtas e druidas, as sacerdotisas se reuniam nesses dias para decidir o futuro da tribo. Para o paganismo, o ciclo menstrual é ligado à lua (a lua é ligada a fases da deusa virgem, mãe, anciã). No Brasil, não são conhecidas wiccanas que fazem algum ritual com sangue menstrual, já que eles eram feitos para se alcançar fertilidade. V&J - Quando você conheceu a Wicca? O que a religião significa pra você?
Edith Granja, wiccana
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AGRADECIMENTOS Nós da Vitrola&Jeans agradecemos ao professor PHD Almir Guilhermino por nos incentivar a amar, cada vez mais, e incentivar o cinema alagoano; além do Coletivo de-Lis, por promover o evento “Curta um Curta”. Agradecemos a todos os entrevistados, a colaboração de Nathália Honci para a Na Cabeceira e a vocês, leitores, que nos apoiam de forma amável. Este trabalho é de vocês.
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