Cรกssio Borges
revisada e ampliada
Fortaleza 2016
© 2016 Cássio Borges Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. Revisão Rejane Costa Barros Guto Radeke Capa Boqueirão do Rio Salgado, localizado a 428km de Fortaleza (CE), próximo a Lavras da Mangabeira, com 93m de altura e 40m de largura Foto: Walter B. Souza – Lavras da Mangabeira (CE) Design: Guto Radeke Tiragem 2.000 exemplares Impressão Rua Gonçalves Lêdo, 1508 – Centro Fortaleza-CE – CEP 60.110-261 Fone/Fax: (85) 3231.3219 www.pouchainramos.com P.S.: Esta segunda edição foi escrita em Atlanta (GA), USA, no período de maio a julho de 2016. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) _________________________________________________________________ B732f Borges, Cássio, 1933A Face Oculta da Barragem do Castanhão - Em Defesa da Engenharia Nacional (Um Relato Atualizado para a História) / Cássio Borges. - 2. ed. rev. e ampl.- Fortaleza : 2016. 362 p. il. Nome completo: Manfredo Cássio de Aguiar Borges. O autor acrescenta um 2.º subtítulo na obra, caracterizando uma 2.ª edição revisada e ampliada no seu conteúdo. ISBN 1. Recursos hídricos. 2. Barragem do Castanhão - Ceará. 3. Políticas públicas. I. Título. CDU 627.82(813.1) _________________________________________________________________
HOMENAGENS
À Classe dos Advogados do Brasil
N
prestar uma singela homenagem à Classe dos Advogados do Brasil na pessoa de Ruy Barbosa, o “Á gui a de H ai a”, um dos mai s bri lhantes juri stas brasi lei ros em todos os tempos. O motivo é o importante papel desempenhado pela valo audiências públicas convocadas pelo Conselho Estadual do Meio Am biente - COEMA, referente ao pedido de licenciamento da Barragem do Castanhão, cujas razões o leitor encontrará no Capítulo XXVIII – O Castanhão é Condenado no Tribunal da Água . Ruy Barbosa via na justiça um instrumento depurador da sociedade. Suas palavras são sábias e objetivas: Quem, senão ela (a Justiça) há de expulsar do templo o renegado, - o blas femo, o profanador, o simoníaco. Quem, senão ela, exterminar da ciência o apedeuta, o plagiário, o charlatão? Quem, senão ela, varrer dos serviços do Estado o prevaricador, concussionário e o ladrão público? Quem, senão ela, banir da sociedade o imoral, o corruptor, o negocista, a prostituição política ou a tirania? O pensamento de Ruy Barbosa, há quase um século, é emblemático, mas de uma impressionante atualidade: De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantar-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto. O leitor poderá encontrar maiores razões para esta singela home nagem à valorosa classe dos advogados do Brasil, quando da leitura do
Capítulo XXVIII - O Castanhão é Condenado no Tribunal da Água , cujos Se existe a obrigatoriedade legal (Direito Ambiental) de se estudarem - alter nativas que alcancem um mesmo objetivo a menor custo técnico, econômico, social e ambiental, por que não estudá-las e apresentá-las? Como aceitar, na qualidade de cidadão, que o ordenamento jurídico - institu pessoais, ao invés dos superiores interesses da coletividade e da Nação? A verdade é que as alternativas, por nós apresentadas, à pontual Barragem do Castanhão, uma obra isolada no terço inferior do vale do Rio Jaguaribe, não foram consideradas nem pela Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará - SRH e nem pelo DNOCS que, àquela tendo aquela autoridade, inclusive, indicado a nomeação para o cargo de Diretor Geral daquele Departamento Federal o engenheiro José Ribamar Simas, egresso do DNOS, justamente o órgão idealizador e projetista da mencionada barragem, embora apresentando erros de - en genharia inadmissíveis que serão comentados ao longo desta publicação. Póstuma a um grande engenheiro Ao ensejo desta segunda edição, é meu desejo prestar uma homenagem e os meus mais sinceros agradecimentos ao saudoso professor philo Benedicto Ottoni Netto , um dos mai s completos e competentes Hidráulica e Hidrológica do nosso país, quando fui seu aluno na Escola Nacional de Engenharia, em 1962, e na Pontifícia Universidade Católica - PUC, em 1965, ambas do Rio de Janeiro. Nesta publicação, o leitor vai ter a oportunidade de conhecer esse vasar sua sensibilidade, ao transformar-se num simples ser humano capaz de harmonizar a técnica, no mais das vezes fria e insensível, com a faculdade de sentir o sofrimento dos seus semelhantes” (ver Capítulo XVII, item 17.2) ao se referir ao deslocamento da população de Jaguaribara e de seus distritos, fazendo colocações de cunho ambiental e social relacionados à Barragem do Castanhão.
Houve entre a minha pessoa e o eminente professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ uma identidade sintoni zada de pensamentos, não só no que se refere aos pri ncí pi os éti cos trabalhos pioneiros, na década de 70, relacionados com a Transposição de Águas dos Rios São Francisco e Tocantins para a Região Setentrional do jamento e aproveitamento dos parcos recursos hídricos de nossa região, que ele tinha um profundo conhecimento. Dentre dezenas de trabalhos produzidos pelo eminente professor da UFRJ destaco oFundamentos de Engenharia Ambiental com Ênfase em Recursos Hídricos - Perenização e Regularização Fluvialque tive a honra de receber um exemplar com a seguinte dedicatória, datada em 20 de agosto de 1993, Rio de Janeiro: Ao distinto colega e batalhador engenheiro Cássio Borges, a quem nosso sofrido Nordeste muito deve por sua competência, espírito combativo e senso de responsabilidade, temos a satisfação de oferecer nossa modesta contribuição “Fundamentos de Engenharia Ambiental com Ênfase em Recursos Hídricos. Perenização e Regularização Fluvial”, resultante de meio século de estudos, para nós nordestinos: a água como recurso natural. Que sua cruzada e contra a ignorância, incompetência e a famigerada inércia atuacional das nossas lideranças acomodadiças e irresponsáveis, que tantos prejuízos e descrédito vêm trazendo ao nosso país no manejo dos nossos recursos hídricos, considerados os maiores do mundo, que sua atuação desbra vadora e lutador das boas causas, repetimos, possa encontrar algum subsídio em nossas modestas apresentações sobre o assunto de nossa especialidade, no modernidade e verdadeira nacionalidade altiva, positiva e construtiva. Com um abraço cordial e amigo do admirador, No Capítulo XVII – Jaguaribara, A Cidade Submersa , destacamos o professor à Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Ceará - SEMACE, um documento para a posteridade, de profunda e emotiva sensibilidade sobre o ignorado e incerto destino da ordeira população daquela cidade, que em sendo deslocada do seu habitat
pela alteração brusca dos seus hábitos de vida, em face da controvertida construção da Barragem do Castanhão: O texto apresentado à SEMACE pelo cearense Netto deixa extravasar a sua sensibilidade, ao transformar-se num simples ser humano capaz de harmonizar a técnica, no mais das vezes fria e insensível, com a faculdade de sentir o sofrimento dos seus semelhantes. A uma grande instituição Ao Departamento Nacional de Obras Contra as Secas - DNOCS, que na visão do saudoso engenheiro de pesca e ex-Diretor daquele Depar tamento F ederal, Jarbas S tudar t, é a mai s velha i nsti tui ção brasi lei ra. Achamos válido associar a ideia de relacionar a então Pia Sociedade Agrícola (surgida em 24 de outubro de 1802, visando socorrer a popu lação pobre das agruras da seca, e extinta em julho de 1805), como um embrião à criação institucional do DNOCS em 1909, “pois a Capitania da Paraíba ainda se ressentia da grande seca na região nordestina do século XVIII”, segundo relato daquele conceituado técnico. Na tese defendida pelo Dr. Jarbas Studart, o autor reproduz as ad versidades e o sofrimento de que “padeciam o Nordeste semiárido do e fauna”. Estes fatos nos levam a imaginar quanto foi difícil e penoso povoar o desconhecido e misterioso semiárido nordestino, tendo sido demandado um gigantesco trabalho daquele Departamento Federal, ralmente oferecidas pelo Meio Norte maranhense. Graças ao DNOCS, suas realizações e extraordinárias obras de açudagem, abastecimento de água, perfuração de poços, irrigação e pioneiras obras rodoviárias, foi possível a construção “de um sólido império no semiárido, na esquina oriental do Brasil”, como disse o saudoso enge [1] nheiro agrônomo daquele Departamento, Paulo de Brito Guerra, no seu Livro A Civilização da Seca, editado em 1981.
AGRADECIMENTOS
O
aos valiosos préstimos e colaboração para o êxito desta obra, expressa, nestas páginas, gratidão especial às seguintes pessoas: À minha esposa, Maria Eudiméa de Lucena Borges, em compartilhar
deste trabalho; valiosas críticas, orientações, com quem divido as eventuais conquistas e os possíveis méritos que esta obra possa ter perante as sociedades cearense e nordestina. em sua residência em Atlanta, Estados Unidos, durante dois meses de dedicação à redação da segunda edição deste livro; Ao economista Augusto Benedicto Ottoni Filho, do Rio de Janeiro, das ideias na primeira edição deste livro; Ao saudoso amigo, engenheiro Jorge Staico, de Juiz de Fora, Minas Gerais, na revisão dos textos, pelo primoroso prefácio e nas diferentes tarefas que envolvem a elaboração de um trabalho dessa envergadura na sua primeira edição; À professora Célia Guabiraba, Presidente do Instituto da Memória do Povo Cearense - IMOPEC, em reconhecimento ao seu trabalho em prol da primeira edição deste livro, em 1999; e Ao leitor, por dedicar algumas horas em companhia deste livro, que, com certeza será de grande proveito para conhecer debates sobre temas relacionados às questões hidrológicas de grande importância para o nosso Ceará e, por que não dizer, para a região nordestina.
“Tentei acabar com a injustiça contra os índios e não consegui. Tentei acabar com a fome e não consegui. Tentei alfabetizar as crianças nas ruas e não consegui. Por outro lado, os meus fracassos são vitórias, pois detestaria estar do lado dos que venceram.” Darcy Ribeiro
LISTA DE SIGLAS
ABRH – Associação Brasileira de Hidrologia e Recursos Hídricos. CAGECE – Companhia de Água e Esgoto do Estado do Ceará. CHESF – Companhia Hidroelétrica do Rio São Francisco. CODEVASF – Companhia de Desenvolvimento do Vale do Rio São Francisco. COEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente. COOIPA – Cooperativa dos Irrigantes do Projeto Jaguaribe – Apodi Ltda. CREA – Conselho Regional de Engenharia e Agronomia DIJA – Distrito de Irrigação Jaguaribe/Apodi. DNAEE – Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica. DNOCS – Departamento Nacional de Obras Contra as Secas. DNOS – Departamento Nacional de Obras de Saneamento. EIA/RIMA – Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto ao Meio Ambiente. GEVJ – Grupo de Estudos do Vale do Jaguaribe. IFOCS – Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas. IMOPEC – Instituto da Memória do Povo Cearense. INPE – Instituto de Pesquisas Espaciais. IPLANCE – Fundação Instituto de Planejamento do Ceará. IUCN – União Para Conservação Mundial. MIR – Ministério da Integração Regional. ONG – Organização Não Governamental.
PERH – Plano Estadual de Recursos Hídricos. PUC – Pontifícia Universidade Católica. SEMACE – Superintendência Estadual do Meio Ambiente do Esta do do Ceará. SINDIÁGUA – Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Ceará. SIRAC – Serviços Integrados de Assessoria e Consultoria Ltda. SRH – Secretaria de Recursos Hídricos. SUDENE – Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste. SUPREN – Superintendência de Recursos Naturais e Meio Ambiente. UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro. WCD/CMB – Comissão Mundial de Barragens.
SUMÁRIO
LISTA DE SIGLAS
....................................................................................
APRESENTAÇÃO À 2
ª EDIÇÃO ...............................................................
APRESENTAÇÃO À 1 ª EDIÇÃO: RESGATANDO O DIREITO À CRÍTICA
...................................................
11 21 25
PREFÁCIO À 1 ª EDIÇÃO ..........................................................................
27
NOSSA CAPA ..........................................................................................
39
INTRODUÇÃO ........................................................................................ Sobre as excepcionais enchentes do ano de 1985 ............................... Conclusões .................................................................................... Conclusão Final ............................................................................
41 42 45 46
O CASTANHÃO NA ATUALIDADE
55
.........................................................
1ª PARTE: OBJETIVOS DO LIVRO INTRODUÇÃO ........................................................................................ Principais bacias hidrográficas do Ceará.......................................... Sistema do Rio Jaguaribe................................................................
61 67 68
2ª PARTE: HISTÓRICO I. OCORRÊNCIAS E DEBATES SOBRE O VALE DO JAGUARIBE ............ 71 1.1 - As enchentes de 1985.............................................................. 71 1.2 - As enchentes no Vale do Rio Jaguaribe: dimensões, frequência e alternativa de controle................................................. 74 1.3 - Seminário Sobre o Vale do Jaguaribe ....................................... 75 1.4 - Domar o Jaguaribe ................................................................. 78 1.5 - Conclusão ............................................................................. 80 Nota da segunda edição.................................................................. 81 II. TÉCNICOS E ARTICULISTAS REJEITAM O GRANDE AÇUDE CASTANHÃO .............................................................. 83 2.1 - Hypérides Pereira de Macedo .................................................. 83 2.2 - Antônio Mourão Cavalcante ................................................... 87 2.3 - Evandro Bezerra .................................................................... 88 2.4 - Comentários sobre “A água é transparente e incolor”................. 91 2.5 - Dr. Paulo Affonso Leme Machado .......................................... 92 2.6 - Conclusão .............................................................................. 93 Nota da segunda edição.................................................................. 95 III. MORTE DO CASTANHÃO: NOVO ALENTO PARA O AÇUDE CASTANHEIRO ................................. 97 3.1 - Ministro anuncia o fim da Barragem do Castanhão ................... 97 3.2 - O sexagenário Açude Castanheiro ......................................... 101 3.3 - Conclusão ............................................................................ 103 IV. O PROJETO DE IRRIGAÇÃO JAGUARIBE/APODI ........................... 4.1 - Erros e acertos de um grande projeto...................................... 4.2 - Aeroporto (internacional) da Chapada do Apodi..................... 4.3 - A vergonha do século............................................................ 4.4 - Conclusão ............................................................................
105 105 110 110 111
V. A INSISTÊNCIA COM O CASTANHÃO ............................................. 5.1 - O apoio político .................................................................... 5.2 - A retomada das discussões sobre os benefícios........................ 5.3 - Vazão regularizada do Castanhão .......................................... 5.4 - Conclusão ............................................................................
113 113 115 116 117
3ª PARTE: ERROS E OMISSÕES, CONSEQUÊNCIAS VI. ERRO INADMISSÍVEL E COMPROMETEDOR DO PROJETO .......... 121 6.1 - A descoberta do erro............................................................. 121
6.2 - A revelacão do erro............................................................... 6.3 - As consequências do erro...................................................... 6.4 - O reconhecimento do erro..................................................... 6.5 - Conclusão ............................................................................ Nota da segunda edição................................................................ VII. CASTANHÃO: REDENÇÃO OU ELEGIA?
.......................................
7.1 - Castanhão é discutido em Seminário...................................... 7.2 - O Castanhão vira tema político–partidário ............................ 7.3 - Conclusão ............................................................................ VIII. O CASTANHÃO SUPERDIMENSIONADO INVIABILIZA OUTROS BARRAMENTOS ............................................. 8.1 - A real capacidade de acumulação do Vale do Jaguaribe ............ 8.2 - O destino reservado ao Castanhão......................................... 8.3 - Conclusão ............................................................................ Nota da segunda edição................................................................ IX. BARRAGENS ALTERNATIVAS À BARRAGEM DO CASTANHÃO 9.1 - O estudo feito pela sirac ........................................................ 9.2 - Conclusão ............................................................................ Nota da segunda edição................................................................ X. DESPREZO À LEGISLAÇÃO AMBIENTAL
........................................
10.1 - Os erros técnicos do Estudo da sirac/vba .............................. 10.2 - O erro da SIR AC/V BA foi proposital? Ou não? ................... 10.3 - Conclusão ..........................................................................
124 124 125 126 127 129 129 130 132 135 135 137 139 140 .. 143 143 151 152 153 153 156 159
4ª PARTE: HIDROLOGIA XI. VAZÃO REGULARIZADA
................................................................
11.1 - O conceito .......................................................................... 11.2 - Exaustão hídrica do Açude Castanhão .................................. 11.3 - Utilização de dados incorretos............................................. 11.4 - Conclusão .......................................................................... XII. VAZÃO REGULARIZADA DO AÇUDE CASTANHÃO COM 100% DE GARANTIA ................................................................... 12.1 - A vazão regularizada .......................................................... 12.2 - Considerações sobre a Terceira Etapa ................................... 12.3 - Conclusão .......................................................................... XIII. VAZÃO REGULARIZADA COM 90% DE GARANTIA
...................
13.1 - Vazão regularizada de 34,6m³/s ...........................................
163 163 166 167 168 169 169 172 174 175 175
13.2 - Vazão regularizada de 26,6m³/s ........................................... 13.3 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição................................................................ XIV. VAZÃO MÁXIMA REGULARIZÁVEL PELO RIO JAGUARIBE
177 177 178 ....... 179
14.1 - Vazão máxima regularizável ................................................ 14.2 - Perguntas sem respostas...................................................... 14.3 - Conclusões ......................................................................... Nota da segunda edição ...............................................................
179 182 183 184
5ª PARTE: CUSTO FINANCEIRO XV. O CUSTO DO EMPREENDIMENTO
...............................................
189
15.1 - Segundo o EIA/RIMA elaborado pela SIR AC, em 1990 ....... 189 15.2 - Custo de operação e manutenção.......................................... 192 193 15.3 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição ............................................................... 194
6ª PARTE: IMPACTOS NEGATIVOS XVI. IMPACTOS AMBIENTAIS E SOCIAIS
............................................
16.1 - Professor Aristides de Almeida Rocha .................................. 16.2 - Professor Theophilo Benedicto Ottoni Netto ....................... 16.3 - Conclusão .......................................................................... XVII. JAGUARIBARA, A CIDADE SUBMERSA
.....................................
17.1 - A submersão total da cidade de Jaguaribara ........................... 17.2 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição................................................................ XVIII. A QUESTÃO SANITÁRIA DO BAIXO JAGUARIBE
....................
.................. 18.1 - O efeito das grandes barragens no meio ambiente 18.2 - Salinização dos solos e das águas......................................... 18.3 - Controle sanitário do Baixo Jaguaribe.................................. 18.4 - Advertências sobre o Castanhão .......................................... 18.5 - Uma Grande Barragem ....................................................... 18.6 - Conclusão .......................................................................... XIX. CONTROLE DAS ENCHENTES NO BAIXO JAGUARIBE
...............
197 197 199 204 205 205 207 207 209 209 210 211 212 214 216 217
19.1 - O Castanhão teria capacidade para controlar enchentes?........ 217 19.2 - Conclusão .......................................................................... 220
XX. PESCA E PISCICULTURA
..............................................................
223
20.1 - O EIA/RIMA superdimensionou a produtividade pesqueira dos açudes do Nordeste .................................................. 20.2 - Efeito das grandes barragens na Piscicultura........................ 20.3 - Correção de erros iniciais de avaliação................................. 20.4 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição................................................................
223 226 227 228 229
7ª PARTE: TRANSPOSIÇÃO E INTERLIGAÇÃO DE BACIAS XXI. TRANSPOSIÇÃO DE VAZÕES DO RIO SÃO FRANCISCO
...........
233
21.1 - Um pouco da história recente sobre este tema ........................ 21.2 - O DNOS se apossa da ideia e toma a iniciativa..................... 21.3 - Sugestão de um novo plano para a Transposição.................... 21.4 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição ...............................................................
233 236 236 242 244
XXII. INTERLIGAÇÃO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS
..........................
22.1 - O neologismo técnico da problemática hídrica do Ceará........ 22.2 - Mudou o tratamento da seca?.............................................. 22.3 - Interligação de bacias hidrográficas..................................... 22.4 - Exemplos regionais de transposição de vazões, canais e adutoras.......................................................... 22.5 - Integração de bacias hidrográficas....................................... 22.6 - Conclusão ..........................................................................
247 247 249 250 253 256 258
8ª PARTE: APROVAÇÃO DO PROJETO XXIII. ANÁLISE DA SRH AO PARECER DA HIDROESB
........................
261
23.1 - O destino dado pela SEMACE ao parecer da HIDROESB .... 261 23.2 - A vazão com garantia de 90% .............................................. 262 23.3 - A vazão com garantia de 100%............................................. 264 23.4 - Comentários finais sobre o parecer da SRH .......................... 266 23.5 - Castanhão: existe projeto?................................................... 268 23.6 - Castanhão: erros e omissões ................................................ 269 23.7 - Conclusão ........................................................................ 271 Nota da segunda edição................................................................ 272 XXIV. UMA NOTA INFELIZ DA ABRH/CEARÁ
....................................
Os três objetivos da nota da ABRH/Ceará .....................................
273 273
24.1 - A nota da Associação Brasileira de Recursos Hídricos do Ceará (ABRH) ............................................ 24.2 - Nosso comentário ............................................................... 24.3 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição................................................................ XXV. TERCEIRA AUDÊNCIA PÚBLICA SOBRE A BARRAGEM DO CASTANHÃO .........................................................
274 276 280 281 283
25.1 - Membros que compareceram à última Audiência Pública sobre a Barragem do Castanhão e respectivos Órgãos representados ......... 283 25.2 - Abertura dos trabalhos da audiência.................................... 285 25.3 - Solidariedade ao Engenheiro Cássio Borges ......................... 285 286 25.4 - A lembrança do Deputado Jackson Pereira............................ 25.5 - A Nota da Associação Brasileira de Recursos Hídricos - ABRH/Ceará .............................................................. 287 25.6 - Conclusão .......................................................................... 288 Nota da segunda edição................................................................ 288 XXVI. A PARTICIPAÇÃO DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA
...................
26.1 - As posições conflitantes de representantes da Assembleia no COEMA ........................................................... 26.2 - Referências aos pareceres da SEMACE e SRH e a incoerência do parecer daV BA ................................................. 26.3 - Uma afirmação que contraria a razão ................................... 26.4 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição................................................................ XXVII. O CASTANHÃO É APROVADO NO COEMA
............................
27.1 - Discussão em torno do parecer técnico da SEMACE ............. 27.2 - A votação final ................................................................... 27.3 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição................................................................
291 291 292 295 297 297 299 299 301 302 303
9ª PARTE: CONDENAÇÃO DO PROJETO XXVIII. O CASTANHÃO É CONDENADO NO TRIBUNAL DA ÁGUA ....................................................................
307
28.1 - Breve Introdução ................................................................ 307 28.2 - Composição do júri do Tribunal da Água ............................. 308 28.3 - A fala da acusação .............................................................. 309 28.4 - A fala da defesa .................................................................. 310 312 28.5 - A sentença do Tribunal da Água .......................................... 28.6 - Reflexões sobre a ementa e a sentença do Tribunal da Água... 312
28.7 - A tristeza e repúdio à omissão do CONAMA ....................... 28.8 - Conclusão ..........................................................................
318 319
XXIX. O CASTANHÃO É CONDENADO PELA NATUREZA ................. 29.1 - A descoberta do “Paleo-Canal” ............................................ 29.2 - O Castanhão volta a ser notícia na imprensa ......................... 29.3 - Conclusão .......................................................................... Nota da segunda edição................................................................
321 321 322 322 323
XXX. A QUESTÃO SISMOLÓGICA NA REGIÃO DA BARRAGEM DO CASTANHÃO ............................................................ 30.1 - Geólogos opinam sobre a região do Açude Castanhão............ 30.2 - Nossa manifestação ............................................................ 30.3 - Conclusão ..........................................................................
325 325 328 330
10ª PARTE: SÍNTESE DA ARGUMENTAÇÃO CONTRÁRIA AO PROJETO XXXI. CASTANHÃO: SEUS ERROS E OMISSÕES ................................ 31.1 - Síntese da problemática do Castanhão.................................. 31.2 - Breve apresentação do professor Jorge Staico........................ 31.3 - Castanhão: erros e omissões ................................................ 31.4 - Castanhão: projeto sem resposta (por quê?)........................... 31.5 - Castanhão: para que resposta (para que?).............................. 31.6 - Castanhão: como torná-lo aceitável...................................... 31.7 - Conclusão ..........................................................................
335 335 336 337 339 340 341 343
11ª PARTE: CONCLUSÃO XXXII. CONCLUSÃO FINAL DO AUTOR SOBRE A BARRAGEM DO CASTANHÃO ............................................................. 347 32.1 - O melancólico comportamento das entidades ambientais ....... 347 32.2 - Os sentimentos impressos na alma nordestina....................... 351 REFERÊNCIAS
.......................................................................................
353
POSFÁCIO: AS FISSURAS NA BARRAGEM DO CASTANHÃO ............ 355 O Parecer do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia - CREA ................................................ 357 Conclusão ................................................................................... 358 PERFIL DO AUTOR
...............................................................................
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APRESENTAÇÃO À 2
A
ª EDIÇÃO
é hoje em dia uma das grandes preocupações no mundo inteiro, consideradas as mudanças
nas regiões agrestes do Planeta, como no caso do Nordeste brasileiro, e particularmente do estado do Ceará. É nesse cenário hidrológico delicado, em âmbito local e mundial, que sobressai entre nós a importância de um cientista obstinado como Manfredo Cássio de Aguiar Borges, engenheiro especializado no trato com os recursos hídricos, especialmente, a grande, a média e a peque na açudagem, que tem dedicado a vida a estudar a matéria e a tentar orientar renitentes tecnocratas locais sobre as melhores soluções, muitas vezes resistidas pelos “sábios do reino”, ao preço da teimosia resultar em dramáticas erronias. A burocracia estatal tem o vezo de expungir as melhores ideias por que a política estabelece uma nefasta concorrência de saberes, quando os técnicos apenas medianos eventualmente entronizados cuidam de isolar aqueles que lhes possam fazer sombra, rejeitando sua colaboração para que eles não se destaquem e sejam então reconhecidos, e esse processo prejudica de forma aguda a meritocracia desejada. Fui instado a falar sobre sua obra, embora jejuno em ciências exatas agropecuaristas, criado entre tios agrônomos dedicados aos esforços contra a seca pelo Vale do Salgado, resta-me projetar no conceito do autor, que conheço tão bem, a minha avaliação positiva da qualidade Dom Quixote, quem conhecesse de perto a genialidade de Miguel de Cervantes teria como abonar a grandeza de sua obra. Cássio Borges, neste caso, é o autor e o personagem, pois sendo grande estudioso que é – jornalista, escritor, engenheiro de escola, doutor em
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
as Secas, imortal da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo, Membro fundador da Academia Cearense de Engenharia,membro da , se vê obrigado a lutar heroicamente contra os moinhos de vento que o Estado movimenta contra a lógica. As teses de Cássio Borges são defendidas brilhantemente por grandes luminares da matéria – por exemplo, o saudoso engenheiro pernambucano Jorge Staico, especialista em recursos hídricos de projeção nacional, em extenso prefácio da primeira edição desta obra, que Cássio lançou em 1999, o Professor Emérito da Escola de Engenharia da Universidade Ambiental Brasileiro”, já na sua sexta edição, que escreveu as abas do livro, dentre outros. Quanto à obra, expresso algumas considerações sobre temas de gran de importância que ela aborda, segundo o que pude observar e anotar: Um dos aspectos que vale destacar é quanto ao real índice evapori métrico na região onde foi construído o Açude Castanhão. Segundo o regularizadas do referido reservatório, “sua mais importante característica”, tomou como referência o índice evaporimétrico de 1.700 milímetros. Federal do Rio de Janeiro, em seu parecer para a SEMACE – Superin tendência Estadual do Meio Ambiente, considerou-o como sendo de 2.500 milímetros. Não obstante, no EIA/RIMA do Açude Castanhão, elaborado no ano de 1992, segundo o autor, esse índice é apresentado como sendo de 2.893,5. Para Cássio, “uma discussão em torno deste assunto precisa ser feita”, conforme se depreende da leitura Capítulo do VI deste livro: O erro inadmissível e comprometedor do projeto. não só para o estado do Ceará, como para toda a Região Nordestina, permite-me destacar o seguinte trecho do Prefáciodo engenheiro Jorge Staico, quando ele diz: “A obra, que é toda fruto de alento, com dedicação idealística e incansável, impressionará, por seu conteúdo e por sua originalidade, a todos que dela se inteirarem. E, certamente, convencerá a todos que a tiverem lido por - com
Apresentação à 2ª edição
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pleto e com isenção, da procedência do questionamento sustentado pelo autor durante tantos anos. Sem dúvida, uma “obra de referência” e instrumento de conscientização nacional para reformular o atual tratamento dispensado à água, não só no Ceará, como no Brasil”. De grande valia faz-se também o escrito do já aludido Dr. Paulo “O autor do livro – Engenheiro Cássio Borges – contagia com seu - idea lismo e com seu entusiasmo. Mesmo os que não estiverem de acordo com suas ideias e seus conceitos não podem retirar-lhe a qualidade de um cidadão participativo e íntegro. É um Homem que não teme contrariar opiniões dos estamentos existentes”. Prefáciodo engenheiro Jorge Staico que, de forma indireta, elogia o DNOCS quanto à sua elevada competência nessa questão de projeto e construção de barragens: “Cumpre-nos ressaltar o fato de que o autor, em nenhum momento do livro, ou da sua cruzada, arguiu o projeto quanto ao acerto e propriedade do volume, forma, tipo e estabilidade do maciço da barragem. Aliás, nesse campo, a fama, reconhecidamente superior competência da Engenharia Nacional, ultrapassa de muito, nossos limites pátrios. Quanto ao maciço da barragem em si, apenas externo discordância total com as dimensões – (decorrentes de erros hidrológicos) – e com a localização sobre solo inadequado à segurança e à economia com a construção”. Para não sermos demasiadamente longo, ressalto que o engenheiro onde assumiu as mais destacadas funções, seja como Diretor Regional, seja como Diretor da Diretoria de Estudos e Projetos, ou ainda como Chefe da Divisão de Hidrologia daquele Departamento Federal, uma vida inteira dedicada, exclusivamente, à Ciência e à Tecnologia da Região Nordestina. Assim, ainda cuidou da narrativa dos aspectos históricos dos acon tecimentos iniciais, culminantes da construção do Açude Castanhão, enriquecendo grandemente, e tornando mais inteligível, a compreensão dos aspectos técnicos da obra, motivo porque o autor merece parabéns em documentar a polêmica discussão do Projeto Castanhão, reunindo neste livro valiosa documentação, desde o início de quando esse -em preendimento surgiu no cenário técnico cearense, em 1985.
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De minha parte – eu que não tive a possibilidade temporal de -co o Barão de Studart, entre tantos outros grandes personagens da histó ria cearense, me enleva privar com Cássio Borges, que vem se juntar na minha admiração a Raimundo Girão, Rachel de Queiroz e Chico Anysio, gênios da cearensidade contemporânea, que brilharam em seus respectivos misteres, e que ainda conheci pessoalmente, o que enriquece exclusivamente ao autor, porém à Engenharia Nacional, por tão sensi bilizante tratado técnico, verdadeiro lume para aqueles que se iniciam e lidam com a Ciência da Hidrologia. Dr. Reginaldo Vasconcelos Advogado e Jornalista Membro da Academia Cearense de Literatura e Jornalismo
APRESENTAÇÃO À 1
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RESGATANDO O DIREITO À CRÍTICA
O
Instituto da Memória do Povo Cearense - IMOPEC pela problemática gerada com a construção da Bar ragem do Castanhão vem desde a sua origem.Fundado em 1988,o IMOPEC acompanhou o surgimento da Associação dos Moradores de Jaguaribara, no ano de 1989, e estabeleceu, a partir de então, laços de amizade e de compromisso com a causa da população desalojada pela barragem. O Castanhão tem sido um imenso laboratório, onde se entrelaçam questões ambientais e culturais, dois pilares que sustentam e direcionam a ação do IMOPEC. A publicação do Livro A FACE OCULTA DA BARRAGEM DO CASTANHÃO - Em defesa da Engenharia Nacional , do engenheiro Manfredo Cássio de Aguiar Borges , situa-se nesse contexto. Nosso propósito inicial era reunir os artigos do autor publicados na imprensa cearense, desde os primeiros debates sobre a barragem. Sua inquietação e discordância com os rumos tomados pela obra o condu ziram ao aprofundamento e à ampliação da proposta. Durante anos, ele trabalho inédito e valioso sobre a política de recursos hídricos no Ceará, estado localizado no semiárido nordestino. O fato, por si, já é relevante. O autor reuniu e ordenou o que estava disperso, possibilitando a consulta. Os méritos do trabalho, porém, não param aí. No Ceará, o exercício da crítica ao poder constituído é fraco e descontínuo. Com perseverança, coragem e competência, ele localiza as falhas do projeto Castanhão, denuncia conchavos, aponta as falácias de um discurso, o que só pode ser feito por quem está livre de compromissos que amesquinham. É impossível negar três evidências: Os encaminhamentos viciados adotados, no decorrer dos debates e estudos, até a aprovação do EIA/RIMA pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente;
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A prevalência absoluta dos interesses de grupos econômicos sobre os interesses sociais; O autoritarismo que contamina todas as esferas do poder público estadual, que compra consciências, amordaça pessoas e marginaliza críticos e opositores; Ao desvendar a face oculta do Castanhão,Cássio Borges lega às gerações futuras, particularmente, aos ambientalistas, geógrafos e- en genheiros, um importante documento sobre a questão dos recursos hídricos no Ceará. Por tudo isso, é uma honra estimular e patrocinar a publicação de obras honestas e corajosas como esta. Fortaleza, 25 de junho de 1999 Célia Guabiraba Presidente do IMOPEC
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muito se falar em relação a temas como Ecologia, Poluição, Planejamento Integrado e correlatos, pouco ou quase nada se faz, de maneira concreta e racional, no sentido de tê-los na Inúmeros exemplos podem ser citados, em várias partes do Globo Terrestre, onde o homem, sob a legenda de “ser racional e superior”, utili zando tecnologia por ele desenvolvida, escravizou, usou, abusou, e arrasou implacavelmente dádivas postas a seu dispor pela natureza. As consequên cias de tais atos se fazem sentir de maneira marcante naquelas regiões, e, muitas vezes, comprovou-se a impossibilidade de sua recuperação total. Dada a multiplicidade de fatores que atuam como verdadeira reação em cadeia, cria-se um processo irreversível. É bem verdade que, até um passado não muito distante, pouco se- sa bia a respeito das mútuas interações entre os elementos da natureza, bem como, destes com a vida humana. Por outro lado, o pouco que se sabia conhecimentos brotavam. Hoje, porém, o grande impulso dado à ciência e à tecnologia com o advento de novos meios de comunicação, o desenvolvimento das ciências exatas e a introdução dos computadores, permitiram não só detectar a cristalina conclusão de ser irrefutável a necessidade de um perfeito convívio natureza/homem, numa atuação binária, num todo inseparável e interdependente. Conclusão que, mais uma vez, comprova que o homem, ao destruir a natureza, destrói a si próprio. do crescentemente pelas permanentes atuações impactantes do homem
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vez mais concentradas cargas poluidoras lançadas aos ecossistemas da natureza. A crescente carência deste recurso natural faz com que ele já seja considerado como o de maior valor estratégico nesta virada do século. No Brasil, ocorrem problemas cada vez mais sérios de “seca” no Nordeste, gerando lamentáveis casos de calamidades públicas, sem contar a situação preocupante em outras áreas do país, pois nossos recursos hídricos, além de mal distribuídos espacialmente, são mal administrados. Nosso país é equatorial/tropical, tem grande quantidade de precipitações pluviométricas, mas a distribuição é irregular, tanto no tempo quanto na localização. Cerca de 80% dos recursos hídricos do país encontram-se na território nacional onde se concentra 95% de toda a população humana brasileira. paliativas e rentáveis eleitoralmente, como a distribuição de cestas básicas E quando, raramente por sinal, parece despertar do marasmo e anuncia uma ação setorial de vulto, surge sempre um projeto isolado, divorciado de da relação benefício/custo. E o Nordeste, sendo Brasil, não poderia deixar de sofrer as, lamenta velmente, já antigas mazelas que, com relação a obras públicas, assolam o país. Um país de grande território e de singular riqueza e variedade de recursos naturais, mas de pobreza de homens públicos capazes e despren didos. Talvez por isso mesmo, geralmente, sempre que nele se propõe uma ação concreta para a solução de um problema relacionado com um recurso natural ou para o aproveitamento desse recurso natural, a proposta se reveste de dois aspectos negativos, por envolver, via de regra: obra de grande porte e imediatismo. Aspectos técnicos e maximização da relação benefício/custo vista sob amplo horizonte temporal e enfeixando todos os aspectos em prol de vaidade e interesses pessoais ou corporativistas. Difícil e raramente, conseguem prevalecer idealismo, patriotismo, e os interesses da população. Aliás, ainda existem idealistas e patriotas? Felizmente, apesar de cada vez mais raros, sim.
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O trabalho que ora vai a público sob o títuloA FACE OCULTA DA BARRAGEM DO CASTANHÃO – Em Defesa da Engenharia Nacional, de autoria do ilustre engenheiroManfredo Cássio de Aguiar Borges , mais conhecido pela sociedade nordestina como Cássio Borges , é uma irrefupatriotas idealistas. Convicto da transcendental importância do tema para a atualidade e para o futuro de seu querido Ceará, da região nordestina, e da reputação da Engenharia Nacional, não hesitou em assumir o papel de estoico paladino da divulgação dos erros e omissões apresentados pelo casuístico projeto de uma megabarragem no Rio Jaguaribe, mesmo sabendo, de antemão, que sua impávida decisão contrariaria fortes interesses e lhe atrairia desforços. natural importante demais para ser manipulado ao bel-prazer pelas mãos grupos empresariais; um recurso natural em exaustão crescente no mundo inteiro e, por isso, devendo ser zelosamente preservado; um recurso natural hediondo contra a pessoa humana. Convicto de representarem os meios de comunicação – imprensa falada, pulação em geral os inconvenientes do projeto da megaBarragem do Casta nhão, apontando as danosas consequências decorrentes de grosseiros-e im perdoáveis erros cometidos em seu dimensionamento, não hesitou em trocar detentor de rara capacitação técnica especializada e de invejável folha de- ser viços prestados ao Nordeste ao longo de quase 40 anos de exercício funcional, lidando dia a dia com as questões relacionadas com a problemática hídrica do semiárido nordestino. Convicto da necessidade de engajamento de segmentos da sociedade cadas áreas e, por isso, capazes de se fazerem ouvir, não hesitou em aceitar proferir palestras, participar de reuniões, seminários, congressos, sempre levantando a bandeira do congraçamento em prol dos superiores interesses do Ceará, do Nordeste, e da Nação, na esperança de neutralizar assertivas que buscavam caracterizar sua postura como unicamente pessoal e, assim, despertar a consciência da administração pública para a necessidade de uma reconsideração de atitudes e só patrocinar projetos adequados à realidade
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regional, integrados a um planejamento global, hidráulica e espacialmente condizente com as hodiernas práticas em voga no Mundo. Infelizmente, até agora, nada resultou dessa longa e meritória cruzada que possa ser considerado decisivo para atingir o objetivo colimado. Por isso, julgando que sua longa cruzada possa não ter alcançado seu desiderato porque a sucessão de artigos na imprensa, de entrevistas e debates na TV, de palestras, de reuniões, de seminários, e de congressos, se diluiu ao longo dos anos e não apresentou à população e às autoridades gover namentais uma visão simultânea dos verdadeiros fatos e argumentos com relação ao problema,Cássio Borges decidiu levar a público um livro que representa a ordenada consolidação das notícias divulgadas, das opiniões expendidas por personalidades e por técnicos, dos pareceres emitidos por duas das autoridades máximas como tais, reconhecidas internacionalmente do projeto e o porquê de sua inaceitabilidade: falta de adequação técnica lato sensue não observância das vigentes disposições legais pertinentes, inclusive de um EIA/RIMA na forma da Lei, contemplando as possíveis desejado, uma isolada megabarragem concebida pelos seus fautores, como consumado. Caso, imperdoavelmente, não alcance o livro o efeito desejado e esperado quanto à postura das autoridades governamentais do poder executivo e ao imobilismo e passiva conivência por omissão dos demais poderes consti recompensa de ter, irretorquivelmente, alcançado um importantíssimo objetivo paralelo, o de ter preservado aos olhos do mundoEngenharia a Nacionale, especialmente, a Nordestina de um vexatório julgamento de incapacitação. Cumpre-nos ressaltar o fato de que o autor, em nenhum momento, do livro ou da sua cruzada, arguiu o projeto quanto ao acerto e propriedade do volume, forma, tipo e estabilidade do maciço da barragem. Aliás, nesse campo, a fama e reconhecimento da superior competência Engenharia da Nacionalultrapassa de muito nossos limites pátrios. Quanto ao maciço da barragem em si, apenas externou discordância total com as dimensões inadequado à segurança e à economia com a construção. Concentrou suas fundadas e comprovadamente certeiras críticas em três aspectos:
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Nos erros do dimensionamento hidráulico, incompatível com a realidade da hidrologia da região, matéria especializada na qual o autor é, inegavelmente, o técnico de maior experiência no território jurisdicionado pelo DNOCS, conforme síntese apresentada na Introduçãodo livro, ora em foco. Nos erros e consequências da concentração antidemocrática da água no terço inferior do Vale do Jaguaribe, impedindo o atendimento a toda zona dela carente e espacialmente distribuída a montante e, ademais, comprometendo, por sua proximidade à foz litorânea, todo o solo e água subterrânea do Baixo Vale, de vital e insubstituível importância para a economia cearense. Nos erros e consequências da implantação de um lago com superfície excessivamente grande para uma região seca e quente, acarretando inaceitável gigantesca perda d’água por evaporação.
E, como não poderia deixar de fazer, criticou a “dança” dos objetivos e benefícios oferecidos pela barragem à medida que esses caiam no-des crédito técnico e popular. E, sobretudo, criticou a forma e os meios utilizados para a aprovação do projeto no Conselho Estadual do Meio Ambiente - COEMA e para impedir sua apreciação pelo organismo federal competente, o Conselho-Na cional do Meio Ambiente - CONAMA. Outro aspecto a ressaltar no livro reside no fato de o autor nunca ter assacado acusações a pessoas, limitando-se a condenar erros e posturas. Foi obrigado a abrir duas exceções. Primeiro, com relação a técnico que, de forma incompreensível e tornou-se o principal defensor do projeto que, anteriormente, acertada mente, demonstrava publicamente, inclusive pela imprensa, ser totalmente incompatível com a realidade hidrológica e necessidade hídrica do estado, com o planejamento sério preexistente, com a boa técnica e conceitos- ho diernos. A transcrição, no livro, de artigos e declarações suas à imprensa desnuda uma absoluta falta de coerência, de ética, e de consciência, dessa autoridade hoje gestora das questões relativas aos recursos hídricos do Ceará. Depois,com relação a signatários da infeliz nota da ABRH/Ceará, publicada nos jornais de Fortaleza na antevéspera da decisiva Audiência Pública do COEMA, e da análise da Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará -
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está mais do que evidente ao longo do texto do Capítulo XXIV. No bojo de sua metódica, persistente, e coerente exposição, não descui dou o autor de, também, promover justa reparação àquele que é considerado, inclusive internacionalmente, com inteira justiça, a maior autoridade em hidrologia e hidráulica do nosso país, uma das maiores de todo o mundo contemporâneo, e que deveria se constituir em motivo de orgulho para todos de seu estado natal, seu querido Ceará. Entretanto, numa ridícula prova de cega subserviência ao poder e em busca de consolidação de-inte resses pessoais, uns poucos se lançaram à inglória tentativa de deslustrar o eminente Prof. e, assim, neutralizar sua expressa contundente condenação ao projeto, sem dúvida, uma enorme pedra no caminho de sua aprovação e que deveria ser removida a qualquer custo. Só que o partido para tal adotado foi o mais infeliz possível, pois a competência e integridade do Professor Emérito da Universidade Fe deral do Rio de Janeiro são de tal monta que anulam liminarmente esse repulsivo intento. Finalmente, compete-nos ressaltar um singular aspecto do livro. Seu autor pretendeu perpetuar a história da Barragem do Castanhão, com relação a seu projeto original que a concebeu como a maior do Brasil, ou mesmo do mundo, em rios intermitentes. E, para assegurar a veracidade matérias publicadas em jornais cearenses caprichosamente colecionados e guardados ao longo de todos os já mais que quatorze anos que se seguiram Tal proceder, além de constituir demonstração cabal de organização e incansável dedicação pessoal a um inabalável idealismo puro, representa uma inovação na forma de historiar fatos e circunstâncias. O autor selecionou e apresentou, em sua sequência cronológica, as notícias e os documentos comprobatórios da autenticidade da história como ora publicada, enfei xando cada assunto em capítulos próprios, com intitulação claramente e também rápida coleta de dados, devidamente interpretados e comentados, zada em seus inúmeros artigos na imprensa, naquele estilo entendido por qualquer leitor, ou seja, em linguagem jornalística.
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E, além de enfeixar cada assunto em capítulo próprio, o autor dispôs os 32 capítulos constitutivos do livro numa sequência que permite grupá-los Por isso, podemos dizer que o autor, em seu trabalho, expõe, sequen cialmente, onze partes constitutivas da história do projeto, conforme intituladas no índice: • • • • • • • • • • •
Objetivo do Livro (Introdução) Histórico (Capítulo I a V) Erros e omissões, consequências (Capítulos VI a X) Hidrologia (Capítulos XI a XIV) Impactos negativos (Capítulos XVI a XX) Transposição e Interligações de Bacias (Capítulos XXI e XXII) Aprovação do projeto (Capítulos XXIII ao XXVII) Condenação do projeto (Capítulos XXVIII a XXX) Síntese da argumentação contrária ao projeto (Capítulo XXXI) Conclusão (Capítulo XXXII)
Quem é esse autor que ousou transformar sua vida numa catilinária contra o mau uso da água? Quem é esse desassombrado brasileiro de postura que, em última análise, deve ser reconhecida sempre como decorrente de puro e arraigado patriotismo? Não apenas neste entristecedor caso da Megabarragem do Castanhão mas em todos que lhe chegam ao conhecimento envolvendo erros técni cos e/ou conceituais e/ou de gerenciamento, inclusive quanto a aspectos legislativos, mormente quando pressente prejuízos não só ao seu Ceará como ao Nordeste como um todo, prejuízos que, fatalmente, atingirão a Nação brasileira e o conceito daEngenharia Nacional. zado em Recursos Hídricos e Barragens cujas atividades desempenhadas sempre dedicou sua enorme capacitação e sua vida de trabalho. Por isso, cabe-nos apenas ressaltar um aspecto de sua personalidade: a lisura e honestidade de seu caráter, que se traduziram numa invulgar coerência de pontos de vista e de atitudes, por nós convivida durante um
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longo desempenho funcional no âmbito de missões e comissões técnico-ad ministrativas, nós ambos representando órgãos públicos federais distintos. Dessa convivência resultou a certeza de uma perfeita identidade de pensamentos e de atitudes com relação à problemática nacional no campo de recursos hídricos e sua utilização. Certeza que originou a lembrança de nosso nome para participar concretamente deste livro, levando-nos a abraçar o desempenho da difícil e honrosa incumbência de escrever um Prefácio A obra, que é toda fruto de talento, com dedicação idealística e incan sável, impressionará, por seu conteúdo e por sua originalidade, a todos que dela se interarem. E, certamente, convencerá, a todos que a tiveram lido por completo e com isenção, da procedência do questionamento sustentado pelo autor durante tantos anos. Sem dúvida, uma Obra de Referência e instrumento de conscientização nacional para reformular o atual tratamento dispensado à água, não só no Ceará, como no Brasil. propugnados pelo IMOPEC, fez com que esse sodalício cívico do Ceará integralmente e reforçando as razões do autor que, há mais de quatorze anos, desde o anúncio do empreendimento, vem denunciando o malsinado e controvertido projeto da Megabarragem do Castanhão. De nossa parte, além de haver assumido pela imprensa do Ceará, nos artigos que se encontram transcritos no Capítulo XXXI deste livro, postura pública de questionamento ao Castanhão no porte alto (6,7 bilhões de m³), e considerando o texto do livro e o que conhecemos do assunto, assim sintetizamos, em linguagem a todos acessível, nossa análise ao projeto questionado: 1. Na óptica da concepção: Errado, por contrariar o consenso mundial hodierno sobre barragens, com a agravante de construir obra-iso lada de grande porte em região hidricamente carente e submetida a altas temperaturas atmosféricas. 2. Na óptica da localização: Errado, por lançar os alicerces do maciço da barragem em solo profundo geologicamente incerto, justamente na zona sismologicamente crítica do território cearense. 3. Na óptica do meio ambiente: Errado, pela maximização de impactos negativos “lato sensu” em função do grande porte da obra
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e de sua relativa proximidade do litoral, inclusive por não ter obe decido às posturas legais vigentes com relação a cotejo com obras alternativas. 4. Impróprio por, além da desapropriação da imensa área de sua bacia hidráulica (cerca de 550 km²), adicionar ponderosos custos acessórios em deslocamentos de rodovia federal, de linha de transmissão de energia elétrica, e de população, e por adicionar os altos custos decorrentes do reforço do maciço da barragem e de suas estruturas complementares por imposição da necessária garantia contra falhas geológicas e riscos sismológicos do sítio escolhido para implantação do barramento e lago por ele produzido, sendo que esses custos acessórios não podem 5. Na óptica sócioeconômica: Errado, porque um barramento no rio Jaguaribe, no local onde está sendo construído o Castanhão, pode e deve ser concluído, mas nunca como obra isolada e concentradora da disponibilidade dos recursos hídricos de superfície de sua bacia
6. Na óptica histórico-cultural: Errado, por fazer desaparecer lugares e símbolos da rica memória histórica da cidade de Jaguaribara e suas cercanias, memória que abriga fatos de repercussão nacional. 7. Na óptica da viabilidade técnico-econômica: Duvidoso, por ter sido elaborado supondo benefícios impossíveis de serem gerados pela realidade hidráulica e hidrológica regional. A quem cabe a responsabilidade por tão entristecedoras conclusões? A resposta parece-nos mais consentânea com a realidade se for dada a uma outra interrogação: A quê cabe? Logicamente, aos erros e vícios decorrentes de ter sido o projeto -ela borado partindo de benefícios preestipulados, em atendimento a- de terminação superior ao DNOS, dada a público logo em seguida a uma das maiores enchentes já provocadas pelo Rio Jaguaribe, em função de necessidade político-administrativa de atender a um abominável vezo de nossos governantes, que julgam imprescindível atuações oportunistas e impactantes para assegurar prestígio e admiração junto à população e, ao mesmo tempo, servir para consolidação perenizadora de órgãos públicos e
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de suas atribuições, quando o certo, mormente em se tratando de recursos hídricos, seria ter sido elaborado em consequência e conformidade com as conclusões de prévios profundos estudos de otimização de uso múltiplo. O que fazer para evitar que o Castanhão alto provoque as dano sas consequências que foram corretamente previstas como conclu são da competente análise do projeto, tecnicamente, ambientalmente, e sócioeconomicamente? Estas considerações expostas neste livro pelo autor não deixam de ser uma antecipação da análise e recomendação da Comissão Mundial de Barragens - WCD em seu relatório que deverá ser apresentado em junho Gland, Suíça, do ano 2000, conforme resultado do debate, realizado em em 1997, sobre o Relatório do Banco Mundial intituladoA Experiência do Banco Mundial com Grandes Barragens (assim consideradas aquelas cuja altura tem mais de 15 metros acima do leito natural do curso d’água- re presado), que foi motivado por uma crescente oposição a barragens e pelo reconhecimento de que muitos custos indiretos e reais nunca foram levados em consideração no planejamento inicial e continuam a ser subestimados tivos aos danos ambientais e sociais, estes intraduzíveis monetariamente, mas que devem ser tidos na devida conta de sua prioritária e fundamental importância. Os objetivos globais daWCD , que deverão se consubstanciar no men cionado Relatório, patrocinado pela União para Conservação Mundial, entidade conhecida pela siglaIUCN , fundada em 1948, e que congrega 895 membros (Estados, agências governamentais, e uma vasta gama de ONG’s) espalhados por 138 países, e pelo Banco Mundial, são: “rever a contribuição das barragens ao desenvolvimento e avaliar alternativas para o uso da água e geração de energia, estabelecendo normas, diretrizes e padrões que sejam internacionalmente aceitos para o planejamento,-pro jeto, avaliação, construção, funcionamento, controle e desativação de barragens”. No caso do Castanhão, não é impossível evitar atitudes extremas e radicais. A Engenharia Nacional quação, a sugestão do autor deste livro, nele expressa, pela não instalação das gigantescas comportas sobre o sangradouro da barragem, e, aduzimos nós, estabelecendo regras operativas convenientes, complementadas pela cívicos, culturais e religiosos.
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técnica conseguida pelo Ceará após quase vinte anos de discussão relati vamente ao Açude Orós, o qual, projetado e com a barragem construída prevendo acumulação de 4 bilhões de m³ de água, com suas comportas de sete metros de altura que deveriam ser instaladas, para tal já fabricadas e disponíveis no local, teve sua capacidade operacional limitada a apenas 2,0 bilhões de m³. Com a publicação deste livro, está sendo apresentada a toda a Nação e aos membros dos seus Poderes constituídos – Executivo, Legislativo e Judiciário – em qualquer nível – Municipal, Estadual e Federal, principalmente, ao Exmo. Sr. Governador do Estado do Ceará a face até agora oculta do projeto que circunstâncias providenciais levaram a uma desaceleração O momento certo para ser publicamente desvendada essa face oculta é o atual. Destarte, quando se der o necessário reinício das obras, elas, fatalmente, objetivarão um Castanhão diferente, um Castanhão de face radiante sob qual ça e esperança numa administração pública pautada pelo superior interesse da população. Senhores membros dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário (in clusive do Ministério Público) Federal, especialmente, do estado do Ceará: Leiam este livro na íntegra e sem predisposições. Confrontem a coerência e a imutabilidade dos argumentos -le vantados contra uma megabarragem no terço inferior do vale do Rio Jaguaribe com o incessante dançar na corda bamba de seus propalados benefícios. posicionaram e manifestaram contra o empreendimento com o reduzido punhado de seus defensores, todos participantes, direta ou indiretamente, da elaboração e/ou do processo de aprovação do projeto, e/ou com interesses na sua execução e/ou operação . Observem o impressionante fato de que todos juristas chamados a participar do processo de análise e aprovação do projeto negaram, unani memente, legitimidade ao mesmo. Meditem sobre a contundente condenação do projeto pela invulgar unanimidade do insuspeito e competente Tribunal da Água, realizado em Florianópolis (SC).
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esquecendo do alerta já dado pela Natureza com a manifestação do “paleo canal” sob o maciço da barragem. Estudem as válidas e convenientes alternativas ao Castanhão alto. planejamento integrado no contexto de todo o Vale do Jaguaribe, sem prejuízos das ações já desenvolvidas em sua construção. Ponderem a possibilidade de entregar, com grande economia de -cus tos lato sensu , um açude de fato consentâneo com os hodiernos conceitos vigentes no mundo para esse tipo de obra, não provocador de impactos ambientais negativos além do naturalmente tolerável, e apresentando otimização da relação benefício/custo. Avaliem os ganhos de suas imagens pessoais junto à Nação ao- re conhecer e fazer adotar uma melhor solução para “o povo” , apaziguando ânimos, conquistando valiosos aliados, demonstrando sensibilidade e inteligência. Caso, após vencer, um a um, os passos do roteiro acima por nós proposto, ainda lhes remanesça alguma dúvida, convoquem os técnicos e personali dades que já se manifestaram contrárias ao projeto para, individualmente, ou em conjunto, dirimi-las e, com isso, lhes motivar assumir atitude que interessa, sobremodo, ao presente e ao futuro do Ceará e, igualmente, ao roso dos que forem convocados, por serem, acima de tudo, sabidamente idealistas e patriotas. Almejamos que, após conhecerem devidamente, através deste livro, a face até agora ainda oculta e a verdadeira história por inteiro do Casta nhão, as autoridades competentes assumam postura que não contrarie a racionalidade, a lógica e a técnica, tanto nesse entristecedor caso presente, como também em qualquer outro futuro projeto. Não se omitam! Sejam corajosos e patriotas! Juiz de Fora (MG), junho de 1999 Jorge Staico[1]
Capítulo XXXI, item 31.2.
NOSSA CAPA
A
é do Boqueirão de Lavras da Mangabei ra, muni cí pi o no qual o D epar tamento N aci onal de O bras Contra as Secas - DNOCS pretendia construir o Açude Castanhei ro. Para ilustrar a importância que teria para o vale do Rio Jaguaribe a construção desse reservatório, recomendamos a leituraCapítulo do III, item 3.2 - O Sexagenário Açude Castanheiro. Infelizmente, o Açude Castanheiro foi excluído pelos defensores da Barragem do Castanhão. O primeiro, se construído, teria um comprimento de 40 metros, encravado num boqueirão de 90 metros de altura. A Barragem do Castanhão foi construída com um comprimento de 7.770 metros, sendo 3.450m da barragem propriamente dita e 4.320m de diques. Enfatizamos, ainda, que, segundo o planejamento do DNOCS, o Açude Castanheiro, ao lado dos Açudes Orós e Banabuiú, era uma das três “Barragens Mães” ou “Barragens Chaves” prevista pelo DNOCS, na mantida pela MISSÃO FRANCESA/SUDENE nos estudos realizados para aquela região do estado do Ceará (Estudo Geral de Base do Vale do Jaguaribe - GVJ) no ano de 1967, constituído de 12 volumes. ção, difundida pelos defensores da Barragem do Castanhão, de que esta obra se constituía “numa reivindicação de 80 anos da população cearense”. Ceará no ano de 1985, proposta pelo Departamento Nacional de Obras solos na Chapada do Apodi e controlar as inundações no Baixo Jaguaribe, cheias excepcionais como a de 1985 e outras da mesma magnitude como as de 1924 e 1974, como exemplos. (VerCapítulo XIX – Controle das Enchentes no Baixo Jaguaribe) .
INTRODUÇÃO
A
deste livro tivemos em mente contribuir com preciosas informações para as futuras
fundamental importância para o desenvolvimento econômico e social, bem como, para o sadio manejo e conservação dos recursos hídricos da região nordestina. Mas o texto não se destina somente aos versados no assunto, pois a nossa intenção é propiciar o entendimento a um tema de um legado de mais de cinquenta anos de experiência resultante de e engenheiros que legaram um acervo de realizações, cuja importância deve ser ressaltada e reconhecida. Para, além disto, o nosso propósito é o de fornecer aos técnicos em geral, estudiosos, professores, estudantes, políticos e à opinião pública cearense, nordestina e brasileira um relato histórico, elaborado com discernimento e honestidade, sobre a polêmica construção da Barragem do Castanhão, no terço inferior do Vale do Rio Jaguaribe, no estado do Ceará, da qual fomos um dos principais protagonistas de uma discussão que durou quatorze anos. Só assim, sem a emoção e o calor das discussões do passado, o leitor poderá fazer seu Este livro se constituirá, com certeza, uma valiosa e rica fonte de informações, tanto do ponto de vista hidrológico, geológico, como da engenharia ambiental, sobre o Vale do Jaguaribe, pois nele o leitor encontrará todas as controvérsias que foram motivos de acaloradas discussões e debates durante os quatorze anos que antecederam o início ano de 2003, mas que, ainda hoje, é objeto de frequentes e proceden tes questionamentos. Uma delas: qual é, de fato, a vazão regularizada
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do Açude Castanhão com 100% de garantia? O estudo geológico da fundação da barragem, que também f oi objeto de mui tas dúvi das e discussões, foi feito com absoluto critério e competência, numa região sabidamente sujeita a abalos sísmicos? Essas são apenas duas das muitas indagações que este livro pretende responder. E o índice evaporimétrico é mesmo 1700 milímetros, utilizado pelos projetistas deste açude, para dimensionar as suas características hidrológicas, ou 2.893,5 mm como indicado no EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Respectivo Relatório) deste empreendimento? Nesta nova leitura do que escrevemos há dezessete anos, à luz dos fatos de hoje, pretendemos desvendar outras facetas, algumas pitorescas, outras hilariantes, da “A Face Oculta da Barragem do Castanhão” pois, como não poderia deixar de ser, em se tratando de uma obra de governo, desperta recônditos e, às vezes, inconfessáveis interesses empresariais, formação de cartéis e de grupos desenvolvidos à sombra do serviço público. Infelizmente, o brioso DNOCS dos nossos tempos, não afeito às propagandas dos seus feitos e realizações, na atualidade, não foge a esta ignominiosa regra, onde o nefasto poder político partidário que, há tempos (nos últimos trinta anos), o domina e o descaracteriza, é muito mais poderoso do que os nobres princípios que nortearam aquele notável Departamento ao longo de sua existência, tendo como preceitos básicos de conduta, o patriotismo e o idealismo dos seus técnicos e servidores. Sobre as excepcionais enchentes do ano de 1985 Findo o inverno de 1985, como Chefe da Divisão de Hidrologia do DNOCS, era nosso dever e obrigação fazer um amplo relatório para a Direção-Geral daquele Departamento sobre a excepcional enchente ocorrida naquele ano no estado do Ceará e, em especial, no Vale do Rio Jaguaribe. Para compor o referido relatório, era necessário conhecer qual o volume d'água, bem como, a vazão máxima que tinha passado na- se ção do Rio Jaguaribe na ponte da BR-116, em Peixe Gordo, um pouco acima da cidade de Limoeiro do Norte, bem como, na seção da ponte da BR-304 em Aracati tendo em vista a construção de um dique de proteção àquela cidade, construído pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento - DNOS. Naquela ocasião, o que se tinha com
Introdução
43
Para integrar o nosso trabalho com o da Companhia de Pesquisas e Recursos Minerais - CPRM, procuramos aquela Companhia, em For Gordo onde, naquele ano, o DNOCS havia estacionado uma de suas duas equipes de hidrometria do estado do Ceará para fazer medições de vazão, se possível, em cotas altas. Como fomos informado, naquela C ompanhi a, que os referi dos valores do P osto de P ei xe G ordo ai nda não estavam disponíveis, com os dados de vazão em cotas altas, medidas pelo DNOCS, e os da própria CPRM, de anos anteriores, estabelece mos para o ano de 1985, uma Curva Chave (cota x vazão) para aquela estação, localizada acima da cidade de Limoeiro do Norte (CE) Ver e extrapolaçõesconsiderando a longa série pluviométrica existente nos arquivos do DNOCS com os dados de vazão da Estação de Peixe Gordo e os do sangradouro do Açude Orós,que nos tornarampossível estimar o volume d'água que passou na seção do Rio Jaguaribe, em Boqueirão do Cunha (Açude Castanhão) como sendo da ordem de 20,9 bilhões de metros cúbicos. Utilizando-nos da mesma Curva Chave (cota x vazão) que estabelecemos para o ano de 1985, foi-nos Jaguaribe, em Boqueirão do Cunha, para os anos de 1924 (19,3 bilhões de m3), 1974 (16,8 bilhões de m3) e 1989 (9,1 bilhões de m3). Essas informações estão expostas no Capítulo XIX desta publicação. Tendo em vista a segunda edição deste livro, cuja intenção viemos alimentando desde o ano de 2010, por volta daquele ano, voltamos à CPRM aqui em Fortaleza, mas, infelizmente, aquela Companhia não considerou as medições de vazões feitas pelo DNOCS no ano de 1985, portanto, não atualizou, o que teria sido muito importante, a sua Curva cota x vazão, na seção do Rio Jaguaribe em Peixe Gordo pois, como dissemos acima, suas medições eram somente em cotas relativamente baixas, comparadas com as que foram obtidas pelo D N O C S naquele ano. Na realidade, constatamos que aquela Companhia não havia feito medições de vazões naquele ano de cheias excepcionais na Estação de Peixe Gordo. O resultado disso é que, em 1985, há uma grande
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
diferença no volume escoado na seção de Peixe Gordo, determinado pelo DNOCS (considerando as vazões medidas em cotas altas) e o que se pode obter a partir da Curva Chave estabelecida pela CPRM (em cotas baixas), estimadas anterior ao ano de 1985. Ela própria deixou médias mensais daquele ano que nos foram, gentilmente, fornecidas no ano de 2010 por aquela Companhia. Uma espécie de mea-culpa, breves considerações. Em face do que acima foi exposto, tentamos uma segunda alternativa 3 na seção do Açude Castanhão no ano de 1985 que havia encontrado a partir da Estação de acima do Açude Castanhão. Feitas as devidas extrapolações, chegamos à conclusão que na seção do Açude Castanhão, tomando como base as informações que colhemos na CPRM, o volume d'água naquele local, no 3 ano de 1985 teria sido da ordem de 15 bilhões de m com os 20,9 bilhões de m3 encontrados a partir da Estação de Peixe Gordo considerando a Curva Chave (cota x vazão) atualizadas com as medições de vazões em cotas altas obtidas pelo DNOCS naquele ano. de averiguar a razão dessa discrepância de valores. Temos o maior -res peito pelo trabalho da CPRM no estado do Ceará, cujos técnicos são do mais elevado nível, mas em relação a Estação de Peixe Gordo, onde o DNOCS fez medições de vazões extras, inclusive em cotas altas, não 3 temos dúvida que o valor de 20,9 bilhões de m , que passou naquela seção do Açude Castanhão no ano de 1985, merece a nossa total con sideração. Ressaltamos que as duas experientes equipes de hidrometria Peixe Gordo eram comandadas pelo engenheiro do DNOCS, Heitor Hugo da Silveira, com a nossa supervisão de campo. É provável que esta diferença de valores tenha como causa o fato de a C P R M também não ter fei to medi ções de vazões em cotas altas na seção da ponte da cidade de Jaguaribe, desperdiçando, assim, uma excelente oportunidade de também atualizar sua Curva (cota x vazão) para aquela seção do Rio Jaguaribe. Maiores considerações sobre este
Introdução
45
assunto consta noCapítulo I deste livro noitem 1.1 – As enchentes de 1985. Restarianos dizer nesta parte introdutória da segunda edição deste livro, que deste importante trabalho de campo realizado pelo DNOCS no vale do Rio Jaguaribe no ano de 1985 resultou um trabalho técnico denominado“As Enchentes no Vale do Rio Jaguaribe: Dimensões, Frequência e Alternativas de Controle” , de nossa autori a, apresentado no VI Simpósio de Hidrologia e Recursos Hídricos da Associação Brasileira de Recursos Hídricos, realizado em São Paulo no período de 11 a 14 de novembro de 1985. Para quem, no futuro, queira refazer essas avaliações, publicamos métrica de Peixe Gordo, bem como, a do sangradouro do Açude Orós seção do Açude Castanhão nos anos de 1924, 1974, 1985 e 1989. Como Gordo e as hidrógrafas de amortecimento de cheias no Açude Orós no ano de 1985 que constam no nosso trabalho, acima referido, publicado no VI Simpósio de Hidrologia e Recursos Hídricos - ABRH. Conclusões 1. Peixe Gordo no ano de 1985, conforme constatamos pessoalmente quando estivemos lá após o inverno daquele ano, certamente não as terá feito, também, no Posto da ponte do Rio Jaguaribe, localizada na cidade de mesmo nome. Assim sendo, podemos concluir que, do ponto de vista hidrológico, o valor de 20,9 bilhões de metros cúbicos 1985 na minha ótica é inquestionável. Sem dúvida, é uma valiosa contribuição para o conhecimento das características hidrológicas do Vale do Rio Jaguaribe; 2. Não culpamos a CPRM pelo fato de não ter feito medições de vazões em cotas altas no Vale do Jaguaribe no ano de 1985, visto que abrange todo o Brasil, não se detendo, com maior ênfase e detalhes 3. do DNOCS, sem maiores esclarecimentos, até porque eles são
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
46
autoexplicativos, são mais do que uma resposta àqueles maldizentes que apregoam pelo B rasi l afora que aquele D epartamento F ederal não tem experiência em gestão de recursos hídricos. Não obstante, trabalho realizado por ele com o mais absoluto sucesso no semiárido nordestino. Tanto isto é verdadeiro que no ano de 2010 aquele Departamento Federal foi convidado a participar como membro efetivo do Conselho Mundial da Água (World Water Council), para a tristeza dos seus algozes; 4. Infelizmente esse Órgão, nestes últimos dez anos, tem transposto barreiras de fogo que poucos organismos nordestinos jamais foram submetidos. Um dos métodos dos seus mais intransigentes adver sários, que em sua maioria se concentra em Brasília, e porque não dizer no próprio estado do Ceará onde se encontra a sua sede, é o de apagar da memória do povo nordestino a bela história desse vitorioso Departamento Federal em nossa região. Para eles, é como brasileiro fosse um bem da natureza. E apesar disto, o DNOCS continua recebendo o apoio e aprovação de toda população deste vasto território do nosso país. Conclusão Final •
•
Por estas breves considerações, podemos concluir que o DNOCS fazia, na década de 80, em toda a região nordestina, um trabalho de
e, por extensão, no estado do Piauí, onde o DNOCS também mantinha e operava, em convênio com a SUDENE, DNAEE e a CHESF, todas as estações hidrométricas e meteorológicas daqueles organismos naquela parte do território nordestino. (Ver O Papel do DNOCS no Semiárido Nordestino , publicação do DNOCS, de março de 1983). Da referida publicação, extraímos o seguinte trecho: Os fatos estão a mostrar que era muito mais pertinente e econômico se o DNOCS também tivesse sob sua responsabilidade a operação e manutenção de toda a Rede Hidroclimatológica do Semiárido - Nor
Introdução
47
destino, ocupando, integralmente, todo o seu pessoal especializado durante todo o ano. •
E, porque não dizer também, ter o seu pessoal especializado com a responsabilidade de operar e manter toda a estrutura do Projeto de Integração do Rio São Francisco - PISF.
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A Face Oculta da Barragem do CastanhĂŁo
Introdução
49
50
A Face Oculta da Barragem do CastanhĂŁo
Introdução
51
52
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
POSTO PLUVIOMÉTRICO PEIXE GORDO
ANO
MESES JANEIRO
1974
1.169.406.720
MARÇO
4.537.252.800
ABRIL
7.776.777.600
MAIO
3.489.264.000
JUNHO
765.694.080
TOTAL
17.780.593.824 180.476.640
FEVEREIRO
1.946.376.000
MARÇO
3.127.939.200
ABRIL
8.545.613.600
MAIO
5.348.793.600
JUNHO
767.033.280
TOTAL
19.916.232.320
JANEIRO FEVEREIRO 2009
42.198.624
FEVEREIRO
JANEIRO
1985
VOLUME (m³)
48.513.600 125.469.216
MARÇO
1.595.419.200
ABRIL
3.829.204.200
MAIO
1.947.715.200
JUNHO
545.538.240
TOTAL
8.091.859.656
Introdução
AÇUDE ORÓS
ANO
MESES JANEIRO FEVEREIRO
1924
1974
2.971.166 152.952.600
MARÇO
1.932.496.000
ABRIL
4.109.646.000
TOTAL
6.198.065.766
JANEIRO
112.060.800
FEVEREIRO
606.614.400
MARÇO
1.824.940.800
ABRIL
4.418.323.200
TOTAL
6.961.939.200
JANEIRO FEVEREIRO 1985
VOLUME AFLUENTE (m³)
34.905.600 716.601.600
MARÇO
1.220.227.200
ABRIL
3.447.360.000
TOTAL
5.419.094.400
53
O CASTANHÃO NA ATUALIDADE
P
, vamos reproduzir os seguintes artigos sobre os quais a comunidade técnica cearense
Açude Castanhão é a cota 100m, que acumula 4,5 bilhões de metros cúbicos de água e não a cota 106m, que acumula 6,7 bilhões. No nosso entendimento, querer-se obter maior vazão regularizada utilizando-se o “volume de espera” para controle de enchente é um erro que não deve ser repetido como foi feito no ano de 2009 sob pena de colocar o referido reservatório em risco de rompimento, com trágicas consequências para a população do Baixo Jaguaribe. Se desejam acumular mais água no Vale do Jaguaribe que o façam, mas construindo os Açudes Castanheiro e Aurora, conforme temos defendido ao longo desta publicação. A seguir, transcrevemos um artigo que fala sobre este assunto no Jornal O Povo, do dia 07 de janeiro de 2016, e uma entrevista no portalTribuna do Ceará Açude Castanhão: Bendito erro truídos pelo DNOCS na região nordestina. A primeira, é a regularização de vazões para uso múltiplos, e a segunda, para o controle das enchentes do Baixo Jaguaribe. Para esta última, os projetistas destinaram um espaço na sua bacia hidráulica, da cota 100m à cota 106m, denominado -de “vo lume de espera”, para amortizar os picos das enchentes em caso- de inver nos excepcionais, tendo como objetivo salvaguardar o Baixo Jaguaribe de houve aqui em Fortaleza uma discussão nos meios de comunicação - envol vendo técnicos, políticos, jornalistas e o próprio Governador do Estado e do
56
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
Diretor-Geral do DNOCS, quando se questionava se as comportas do Açude Castanhão deveriam ou não ser abertas, ou permanecer fechadas. A discussão ti nha por obj eti v o usar o “v olume de espera” do r efer i do r eser v atór i o para uma acumulação adicional de água de 2,3 bilhões de metros cúbicos. Este “volume de espera”, como o próprio nome diz, deverá sempre que possível, estar seco. Mas não foi o que realmente aconteceu no ano de 2009. Àquela altura, o reservatório já havia atingido o seu nível máximo de alerta (cota 100m), portanto as 12 comportas (acima do sangradouro) obviamente deveriam estar abertas. Os pretendidos 4,4 bilhões de metros cúbicos de água, da chamada cota de regularização, já haviam sido alcançados. Felizmente, ou graças a proteção Divina, não tivemos naquele ano, uma chuva de 100mm ou 120mm como a que ocorreu, inesperadamente, no dia 03 de janeiro de 2015, em plena seca, da ordem de 148mm. Se tal fato tivesse ocorrido, um dos diques daquele açude poderia ter rompido com consequências trágicas para o Baixo Jaguaribe. Graças a esse erro de engenharia, o- Casta nhão ganhou uma acumulação adicional (tecnicamente não prevista) de 2,3 bilhões de metros cúbicos de água que, atualmente, está sendo responsável pelo abastecimento da Região Metropolitana de Fortaleza. Em outras palavras, caso esse erro não tivesse sido cometido, o Açude Castanhão já estaria seco desde o início do ano passado e até mesmo antes. “Fortaleza só tem água hoje devido a risco de tragédia assumida em 2009” Segundooengenhei roC ássi oB orges, um er rodeengenhar i a permi ti u queo Açude Castanhão acumulasse água que, atualmente, abastece a capital. A forte cheia que atingiu a região do litoral cearense em 2009 pode ter contribuído para o abastecimento de água de Fortaleza nos últimos anos. Em entrevista ao Tribuna do Ceará, o ex-diretor do DNOCS, Cássio Borges, revelou que um erro de gestão cometido naquela época garantiu que a capital cearense não as comportas do açude. Após várias reuniões com repercussão na imprensa, envolvendo políticos e técnicos especialistas, foi decidido que as comportas não seriam abertas. O que, segundo o ex-Diretor do Departamento, foi um erro gravíssimo: “O espaço desti nado para v olume de espera estav a com sua capaci dade total de acumulação de água. Essa funcionalidade do açude (volume - de es pera) serve para reter a água do Rio Jaguaribe para não causar inundações
O Castanhão na atualidade
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na região do baixo Jaguaribe. Então não abrir as comportas foi um erro gravíssimo, pois caso acontecesse uma forte chuva naquela ocasião os diques poderiam ser rompidos e a região do baixo Jaguaribe seria completamente inundada”, disse Cássio. Segundo Cássio, os diques são feitos de terra e utilizados para manter a água armazenada no local adequado. Caso a água ultrapasse o volume limite, a barragem poderá romper causando súbita inundação na região. Ao entrar em contato com a assessoria de comunicação do DNOCS, o Tribuna do Ceará foi informado que o responsável para responder os- questio namentos sobre esta matéria seria o coordenador do Castanhão. No entanto, após várias tentativas e até a publicação desta matéria, as ligações não foram atendidas. Conforme o engenheiro, o erro cometido naquele ano foi fundamental para o abastecimento de água da capital: “Graças a esse erro de engenharia, e o não acontecimento de chuvas fortes na região, o Açude Castanhão ganhou uma cumulação adicional que não era previsto no projeto, de aproximadamente 2,3 bilhões de metros cúbicos. É essa reserva que atualmente está -sendo res ponsável pelo abastecimento de água da Região Metropolitana de Fortaleza. Caso isso não tivesse acontecido, Fortaleza já estaria sem água desde o início de 2015”, ressalta Cássio Borges. controlar enchentes: “Caso ocorra chuvas excepcionais como as que aconteceram em 1974 e 1985, o açude não teria condições de evitar as enchentes no baixo Jaguaribe”, complementa Cássio Borges. Observação:
3
3
Theophilo Ottoni
1ª PARTE: OBJETIVOS DO LIVRO
Introdução
61
Principais Bacias Hidrográficas do Ceará
67
Sistema do Rio Jaguaribe
68
INTRODUÇÃO
E
na condição de simples cidadão, mas que possui expressiva da em 37 anos, lidando dia a dia com as questões relacionadas com a problemática hídrica do semiárido nordestino. Anos durante os quais chegamos a exercer o cargo de Diretor Regional do DNOCS e ser empossado como o primeiro Diretor da então recém-criada Diretoria de Estudos e Projetos daquele Departamento, cuja área de atuação abrange, até hoje, todo o Nordeste e parte do estado de Minas Gerais. Como engenheiro civil, formado na Escola Politécnica da Universidade Católica de Pernambuco (1960), dentre outros aconteci mentos marcantes em nossa vida profissional, destacamos o fato visão de Hidrologia do DNOCS, em suas diversas fases de transformações, desde o ano de 1961, quando era parte do Serviço de Estudos do DNOCS, sediado em Recife (PE), até quando este Ser viço foi depois convertido em Diretoria de Planejamento, Estudos e Projetos - DPEP, diretoria esta, de fundamental importância para a atuação daquele Departamento que requereu nossa permanente atualiza ção e aperfeiçoamento na especialidade, inclusive cursos de pós-graduação na Escola Nacional de Engenharia (1962) e na PUC (1965), ambas no Rio de Janeiro. Acrescentamos, ainda, nossa participação efetiva em Congressos Técnicos, Comitês de Estudos, Grupos de Trabalho, Comissões Interministeriais e viagens técnicas ao exterior. Destacamos a nossa participação durante quase dez anos no Comitê de Estudos Integrados [1]
62
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
do Vale do Rio São Francisco - CEEIVASF, nas décadas de 1970/1980, como representante do DNOCS naquele colegiado. nalmente, externar conceitos e emitir pareceres conclusivos sobre todo e qualquer programa e/ou ação relacionada com Recursos Hídricos no território nacional, principalmente em sua Região Nordeste e, mais precisamente, no Ceará, estado onde nascemos. avaliação e diagnose se baseiam na técnica atual praticada no mundo de hoje e recomendada pela Engenharia Ambiental, ramo holístico da Civil e, particularmente, aquela voltada para a problemática hídrica. Este livro, escrito com seriedade e isenção, visa apresentar à socie estado e de todo o país, nossa participação na polêmica e controvertida decisão da construção da Barragem do Castanhão, no Rio Jaguaribe, no estado do Ceará. São mais de quatorze anos de apaixonadas discussões, desde 1985, ano em que o hoje extinto DNOS, com sede no Rio de Janeiro, (órgão não vinculado às peculiaridades da problemática hídrica da região Nordestina), lançou a ideia e projetou a construção de um monumental reservatório em quase 300.000 pessoas, localizada no Baixo Jaguaribe. Com certeza, as dúvidas e os questionamentos sobre a obra em si e seus objetivos, conforme o projeto inicial, já agora em fase de execução, ainda vão perdurar por muitos anos, valendo este livro, não só como registro histórico dos principais fatos, como também um possível des pertar de consciência na defesa da Engenharia do nosso estado que, certamente, será objeto de críticas no cenário Nacional e Internacional. Os projetistas da Barragem do Castanhão defendiam-na com uma capacidade total de 6,7 bilhões de metros cúbicos de acumulação, na cota 106m (máxima), enquanto nós, no início, praticamente sozinhos, em dia com os avanços tecnológicos da Engenharia Ambiental, defendíamos a tese da construção de 10 a 12 barragens de porte médio na região do
Objetivos do livro
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Alto Jaguaribe e na bacia do Rio Salgado, podendo o Castanhão ser uma delas, mas com 1,2 bilhão de metros cúbicos de acumulação, na cota 80m. Nosso livro objetiva, também, tornar transparente para a comunidade,
rico debate sobre as questões técnicas e ambientais que se travou, muitas vezes em recintos fechados, sem que tenha chegado, na sua plenitude, ao conhecimento do público e da sociedade como um todo. Em geral, a imprensa falada, escrita e televisionada, enaltecia os ampliados benefí cios que a barragem poderia proporcionar, principalmente, o reforço do abastecimento de água da Região Metropolitana de Fortaleza; a irrigação de 75.000 hectares na Chapada do Apodi; a defesa contra inundações do Baixo Jaguaribe; e a grande produção de pescado na represa, criando uma imagem não realista do empreendimento e, assim, possibilitando sua aceitação tácita pela sociedade. Todos esses alardeados benefícios foram exaustivamente analisados e colocados em suas reais dimensões neste livro com depoimentos de de um ilustre e conceituado cearense de Orós e Professor Emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Ottoni Netto , especialmente contratado pela Superintendência Estadual do Meio Ambiente - SEMACE para oferecer parecer técnico, econômico e ambiental sobre o EIA/RIMA, assim como o parecer do ilustre professor Aristides de Almeida Rocha , outro Consultor de renome nacional e internacional, igualmente contratado pela referida Superintendência para oferecer parecer sobre a viabilidade técnica, social e ambiental desse se mostraram absolutamente contrárias a este barramento, como poderá ser comprovado quando da leitura do presente livro. É necessário que digamos ser este livro um depoimento, portanto, uma contribuição à verdadeira história da Barragem do Castanhão (a maior do Brasil, ou mesmo do mundo, construída em rios intermitentes). Não temos a menor intenção de fazer qualquer tipo de acusação, ou estabelecer polêmica ou retaliação, a quem quer que seja. Contudo, não nos esquivamos de relatar alguns fatos pitorescos que também fazem parte da história de qualquer empreendimento. Ficaremos restritos tão somente às questões técnicas envolvidas, por nós expressas numa
em matérias publicadas em jornais cearenses, procurando dar uma- se quência cronológica aos fatos aqui narrados, e enfeixando cada assunto nos respectivos capítulos. Reconhecemos que cada técnico, cada pessoa que, de uma forma ou de outra, contribuiu nas diferentes fases dos debates, o fez por suas pró prias convicções, na certeza de prestar um serviço ao Ceará e ao Brasil. Nenhuma pessoa não especializada no assusto está obrigada a conhecer mais profundidade e abrangência, as restrições que hoje se fazem, no mundo inteiro, à construção de grandes barragens, outrora consideradas “benesses” indiscutíveis. Ressaltamos, neste livro, nossa certeza de que esse debate sobre a-Bar ragem do Castanhão ofereceu e vem oferecendo uma grande contribuição para despertar e conscientizar nossos técnicos, políticos, autoridades e demais extratos da sociedade cearense e brasileira para as questões ambientais, aliadas à construção de grandes barragens, ocasião onde, curso apresentado à Escola de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (1987) para obtenção do título de Engenheiro Civil, do aluno Luiz Rafael Palmeira , tendo como orientador o professor philo Benedicto Ottoni Netto , Professor Titular do Departamento de Hidráulica e Saneamento da UFRJ: “Ao tentar conseguir o que é urgente, o homem negligencia o que é importante. Tentando enfrentar os problemas do presente, ele ameaça o futuro.” desenvolvimento social e econômico da região, pois a atual geração tem uma responsabilidade muito grande com as futuras descendências. Sob este mesmo enfoque, citamos o pensamento de Eugene P. Odum “Por outras palavras, não se deve começar o estudo ‘prático’, ou de ‘laboratório’ de ecologia, manuseando Complementando o pensamento acima deste afamado cientista com os atuaisproblemas que se levantam do domínio dos “Recursos Hídricos”, ocasionados por obras hidráulicas, transcrevemos, para conhecimento do leitor, o seguinte trecho do livroA Gestão da Água – Princípios Fun -
Objetivos do livro
65
damentais e sua Aplicação em Portugal dos autoresL. Veiga da Cunha , A. Santos Gonçalves , V. Alves de Figueiredo e Maria Lino : Em face de tudo quanto foi referido, pensa-se que a decisão de construir grandes barragens só deve ser tomada com pleno conhecimento e devida ponderação de todos os possíveis efeitos que atrás foram referidos. Para além disso, uma criteriosa análise de custo-benefício poderá conduzir, em muitos casos, a dar prioridade aos aproveitamentos de dimensão média, que mais facilmente são escalonados de acordo com as necessidades e que envolvem, normalmente, menores riscos. Antes de concluir esta introdução, gostaríamos de ressaltar a enorme diferença de forças entre as partes antagônicas, pois avassaladora era e nossas teses foram muito bem assimiladas e aceitas, tanto que, no COE MA, saímos vitoriosos em duas votações: por 12 votos a 04 e 10 votos a 09, nas Audiências Públicas realizadas, no Auditório da SEMACE, nos dias 27 de julho de 1992 e 17 de agosto de 1992, respectivamente. Depois, como já era esperado em tudo que envolve somas fabulosas de recursos do Governo Federal, formaram-se poderosos “lobbies” em prol dos interesses privados envolvidos no processo, já que, precipitadamente, a licitação da barragem tinha sido realizada antes mesmo de o COEMA se pronunciar sobre a viabilidade técnica, social, econômica e ambiental do empreendimento. Ou seja,contrariando a legislação ambiental, já havia sido consignado simbólico) para a construção de um empreendimento que não existia legalmente, pois seu EIA/RIMA ainda não tinha sido elaborado. Desta forma, as normas legais que regulamentam a questão deixaram de ser ou de grupos que detém o poder político e/ou econômico, ou ambos. lapidar do sempre saudoso professor Darcy Ribeiro , por considerarmos que a Barragem do Castanhão criará mais e maiores problemas do que os que se pretende solucionar: Tentei acabar com a injustiça contra os índios e não consegui. Tentei acabar com a fome e não consegui. Tentei alfabetizar as crianças nas ruas e não consegui. Por outro lado, os meus fracassos são vitórias, pois detestaria estar do lado dos que venceram.
66
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
A visão unilateral da Barragem do Castanhão, plena de distorções, conforme apresentada à sociedade cearense pelas autoridades e pela mídia remunerada pelo Estado, não pode continuar sem um formal protesto daqueles que não a aceitam eivada de erros e contradições. Consolidar e apresentar o resultado de quatorze anos de luta em prol do despertar da consciência da Administração Pública, das clas ses técnicas especializadas em Recursos Hídricos e da população para a verdade sobre esta polêmica barragem, constitui nosso principal -pro pósito com este livre. É necessário que haja a possibilidade de todos os extratos da sociedade se inteirarem de nossos argumentos e da história por inteiro, desde o anúncio deste extravagante projeto, considerando -o sob todos os ângulos. É o que pretendemos com este livro, ou seja, desvendar tecnicamenteA FACE OCULTA DA BARRAGEM DO CASTANHÃO – Em Defesa da Engenharia Nacional.
Objetivos do livro
PRINCIPAIS BACIAS HIDROGRÁFICAS DO CEARÁ
67
68
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
SISTEMA DO RIO JAGUARIBE
2ª PARTE: HISTÓRICO
CAPÍTULO I Ocorrências e debates sobre o Vale do Jaguaribe
71
CAPÍTULO II Técnicos e articulistas rejeitam o grande Açude Castanhão
83
CAPÍTULO III Morte do Castanhão - Novo alento para o Açude Castanheiro
97
CAPÍTULO IV O projeto de irrigação Jaguaribe/Apodi
105
CAPÍTULO V A insistência com o Castanhão
113
I OCORRÊNCIAS E DEBATES SOBRE O VALE DO JAGUARIBE
1.1 - As enchentes de 1985
A
constr ução da B arragem do C astanhão, no muni cí pi o de A l to Santo, no Vale do Rio Jaguaribe, no estado do Ceará, tem sido motivo de intenso questionamento por técnicos e especialistas da área de Recursos Hídricos desde o seu aparecimento na mídia cearense, em agosto de 1985. Em nosso arquivo pessoal, encontra mos duas matérias sobre o Vale do Rio Jaguaribe, publicadas nos Jornais O Povo e Diário do Nordeste , versando sobre as enchentes oca sionadas pelo excepcional inverno de 1985 (o maior já registrado, neste século, pelo DNOCS). Do Jornal O Povo, do dia 14 de junho de 1985, sob o título “Técnico diz como evitar cheias no Vale do Jaguaribe” , extraímos os seguintes trechos: Interessante palestra foi proferida pelo Diretor de Recursos Hídricos do DNOCS, engenheiroCássio Borges, abordando as cheias da bacia do Rio Jaguaribe. Na oportunidade, o engenheiro enumerou uma série de providências que permitirão impedir ou, pelo menos, defender das inundações a região. Acrescentou parecer evidenciando a necessidade da construção de uma ponte na BR-304, que deveria localizar-se entre o triângulo de Aracati e o estimada por ele por ocasião da cheia maior ocorrida no último dia 06 de maio.
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
SegundoCássio Borges, a vazão sob a ponte da BR-304 no Rio Jaguaribe, em Aracati, na cheia do dia 22 de abril passado foi de apenas 4.813m³ por segundo, enquanto a máxima registrada no dia 06 de maio foi de 10.300 m³/s. Para completar a defesa contra as inundações de todo o Baixo Ja guaribe, aconselha Cássio Borges (...) a construção do Açude Castanhei ro, no Rio Salgado, para uma acumulação de 1,5 bilhão de metros cú bicos, servindo de barragem de acumulação e controle de cheias, além da construção de um ou dois açudes no Rio Figueiredo, na margem direita do Rio Jaguaribe, com capacidade total de acumulação de 500 milhões de metros cúbicos (...). Em face das recomendações acima, uma nova ponte na BR-304 foi, realmente, construída pelo DNER, da forma como foi por nós indicada. Esta alterou, completamente, o projeto inicial do dique de proteção da cidade de Aracati, projetado pelo DNOS, cujo coroamento era de apenas 1,70 m, oferecendo mais segurança àquela comunidade. Em função dessa nova ponte, por nós recomendada,grade o (pista de rolamento) da estrada foi elevado ao mesmo nível da ponte antiga sobre o Rio Jaguaribe, em toda a sua extensão, até as proximidades do posto da Polícia Rodoviária Federal (cerca de seis quilômetros) e o dique, que sofreu grandes avarias durante as cheias, foi totalmente reconstruído, tendo seu coroamento o próprio dique. Vejamos a outra reportagem, acima referida, publicada no Jornal Diário do Nordeste , também do dia 14 de junho de 1985, sob o título: “Maior enchente está para ocorrer, alerta técnico”. Dessa matéria extraímos os seguintes trechos: A maior enchente está por vir”.O alerta foi feito ontem pelo engenheiro civil Cássio Borges, do DNOCS na abertura do “Seminário sobre Controle de Enchentes no Ceará”. Cássio Borgeslembrou na sua palestra que as enchentes construção de mais barragens com o objetivo de conter o volume de água e evitar inundações. “Para o sistema do Baixo Vale Jaguaribe, a construção do do Jaguaribe), assume importância de caráter regional, principalmente no aspecto de controle das enchentes”, explicou. Ele mostrou que grandes barragens do Vale Jaguaribe, como Orós - e Ba nabuiú, reduziram em até 40% o “pico das cheias”. (...) E como sugestão
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(...) propôs, além da construção do Açude Figueiredo, a construção do Açude Castanheiro, no Rio Salgado, para uma acumulação de 1,5 bilhão de metros cúbicos, servindo também de barragens de acumulação e controle de cheias. (...) O Seminário em causa foi promovido pela Secretaria de Obras do Estado do Ceará, sendo seu secretário, na ocasião, o engenheiro Luiz Gonzaga Nogueira Marques que, mais tarde, veio a ser Diretor Geral do DNOCS. A principal conclusão que se pode tirar dos fatos acima registrados pela imprensa cearense é a de que, até então, não se cogitava, de forma alguma, da construção do Açude Castanhão, ou melhor, não existia e nunca existira, até então, na programação do DNOCS tal reservatório.Tanto isto é verdadeiro que nos volumes do “Estudo de Base do Vale Do Jaguaribe”, publicado pela SUDENE (Grupo de Estados do Vale do Jaguaribe - GVJ), em 1967, em vra “Castanhão” é mencionada. Note o leitor que esta publicação da SU DENE se constitui, até hoje, o estudo mais completo sobre o Vale do Rio Jaguaribe, tendo dele participado uma Missão Francesa, representada pela ASMIC - Association pour l’Organisation des Missions de Coopération - Te chnique.Portanto, esta estória de se propalar que o Açude Castanhão se constitui uma reivindicação de 80 anos do povo cearense, como alegavam Seus objetivos, à época das discussões em torno desse empreendimento, era a de angariar a simpatia da mídia, e consequentemente, do povo cearense para apoiar a construção da referida obra. De resto, gostaríamos de registrar, nesta ocasião, que a vazão de 10.300m³/seg., medida sob nossa supervisão, no Rio Jaguaribe, em Aracati, na cheia excepcional de 1985, é uma das maiores obtidas com a maior medida em rios do Nordeste. Pontos positivos para o DNOCS que, mais uma vez, registrou um fato inédito na sua vitoriosa trajetória de quase 90 anos de existência, graças à alta capacitação técnica dos seus engenheiros e hidrometristas. Foi uma operação perigosa, que envol veu, inclusive, riscos de vida, daí a razão deste registro (o nível da água, a montante da estrada BR-304, na seção da ponte em Aracati, quase Ceará - COELCE). Naquela ocasião, o dique de proteção à cidade de
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Aracati, de 1,70 metros de altura, construída pelo DNOS ao longo da estrada existente, servia de aterro-barragem de acumulação da excepcional cheia do Rio Jaguaribe no ano de 1985. 1.2 - As enchentes no Vale do Rio Jaguaribe: dimensões, frequência e alternativa de controle Assim que terminou o inverno de 1985, na condição de Chefe da Divisão enchentes no Vale do Rio Jaguaribe, caracterizando aquele evento em várias seções daquele rio e, em especial, em Orós, Peixe Gordo (ponte da BR-116, em Limoeiro do Norte) e Aracati. Em função disso, e do vasto material publicado na imprensa local, fomos convidados para proferir, em nome do DNOCS, palestra na abertura do Seminário sobre enchentes, promovido pela Secretaria de Obras do Estado do Ceará, no dia 13 de junho de 1985.Também sobre o mesmo assunto, no VI Simpósio Brasileiro de Hidrologia e Recursos Hídricos , realizado em São Paulo, no período de 11 a 14 de novembro de 1985, apresentamos um trabalho técnico que teve o tí tulo em epí grafe. O trabalho em causa i ni ci a- se desta manei ra: “RESUMO – Este trabalho foi concebido e realizado por ocasião das cheias do Rio Jaguaribe, no estado do Ceará, no ano de 1985, somente comparadas às que ocorreram, naquele Vale, nos anos de 1924 e 1974”. Nesse trabalho, apresentamos várias alternativas de controle das enchentes no Vale do Jaguaribe e, em todas elas, a construção do Açude Castanheiro, no Rio Salgado, na altura da cidade de Lavras da Mangabei ra, apresentava-se como uma das principais obras a serem consideradas. Ver a foto do boqueirão de Lavras da Mangabeira na capa principal deste livro. Outra barragem importante para a defesa do Baixo Jagua ribe seria a construção do Açude Figueiredo, no rio de mesmo nome, no município de Alto Santo. Para o controle das enchentes da cidade de Aracati, recomendamos uma substancial alteração no projeto do DNOS, no sentido de ser elevado o gradedo dique em construção ao mesmo nível da ponte (antiga) de Aracati (BR-304) e a construção de outra ponte, que deveria localizar-se entre o Triângulo de Aracati e o Posto da Polícia Rodoviária Federal. Ambas as recomendações foram aceitas e aprovadas pelo DNOS e
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DNER, o que deu maior segurança à cidade de Aracati contra as inundações e contra eventuais rompimentos do próprio dique. Vale salientar, nesta oportunidade, que, por ocasião da elaboração do citado trabalho, o Açude Castanhão não existia, sequer, na imaginação dos técnicos do DNOCS ou da SUDENE ou do próprio DNOS. Tanto isto é verdadeiro que nos 10 volumes do “Estudo de Base do Vale do Jaguari be”, publicado pela SUDENE (Grupo de Estudos do Vale do Jaguaribe Castanhão. Note o leitor que essa publicação da SUDENE se constitui, até hoje, o estudo mais completo sobre o vale do Rio Jaguaribe tendo dele-par ticipado uma Missão Francesa, representada pela ASMIC - Association pour l’Organisation des Missions de Coopération Technique. Ver, na página seguinte, desenho esquemático da cheia máxima ocorrida na seção do Rio Jaguaribe, em Aracati, no dia 06 de março de 1985. Ver, também, que o dique projetado e construído pelo DNOS tinha, apenas, uma largura de 1,70m no seu coroamento. No novo projeto, por estrada, em torno de doze metros. 1.3 - Seminário Sobre o Vale do Jaguaribe Nos dias 06 e 07 de janeiro de 1986, o DNOCS, por iniciati va de sua Direção-Geral, reuniu todos os seus técnicos em en contro denominado deSeminário Sobre o Vale do Jaguaribe, tendo como objetivo apresentar a melhor solução para o desenvolvimen to e o aproveitamento dos Recursos Hídricos daquela rica região do estado do Ceará. Durante o evento, foi analisada e discutida toda a documentação existente sobre o Rio Jaguaribe, já agora acrescida pelo elaborado pelo DNOS que versava sobre a construção da “Barragem do Castanhão”, no estado do Ceará, tendo sido proferidas várias palestras pelos mais credenciados técnicos daquele Departamento Federal. tou de 29 páginas datilografadas e assinadas pelos cinco membros da Comissão de Redação designada pela Portaria nº 58/DPE/DNOCS, de 13 de Janeiro de 1986. Eram eles os seguintes técnicos: Eng.Genésio Martins Araújo – Presidente, Eng. José Adalmar Dantas Carneiro , Eng.
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SITUAÇÃO DO RIO JAGUARIBE NA CHEIA DE 6 DE MAIO DE 1985
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Godofredo Chaves Queiroz , Eng. Sebastião Carlos de Albuquerque e Eng. Agr. Francisco Ananias de Paula Coelho . Os Colaboradores e Debatedores convidados pela Comissão foram os seguintes técnicos: Vicente de Paula Pereira B. Vieira , Joaquim Guedes Correia Gondim Filho , , Antonio Sérgio Ferreira , Amadeu Lourenço e Getúlio Peixoto Maia . O Seminário sobre o Vale do Jaguaribe , acima mencionado, teve como palestrantes além de nós, os seguintes técnicos: Veras, Francisco Ananias Paula Coelho , Evandro Bezerra e Joaquim Guedes Correia Gondim Filho . Vejamos alguns trechos do referido relatório: (...) Se as cheias do Jaguaribe e do Banabuiú são razoavelmente- amor tecidas pelas barragens de Orós e Banabuiú, o Rio Salgado permanecerá incontrolado, se não for construído o Açude Castanheiro, isto é, a planície de Icó, o Médio e o Baixo Jaguaribe, continuarão ser submetidos às inundações pelas cheias do Rio Salgado. (...) A construção do Açude Castanheiro, para uma acumulação de 1,5 bilhão de m³, irá, não só, proteger as várzeas de Icó, permitindo prosseguir o seu aproveitamento, já iniciado em Lima Campos, como diminuir as cheias do próprio Baixo Jaguaribe e incrementar a vazão regularizada do Vale. (...) Que sejam compatibilizados e integrados os aproveitamentos dos Açudes Castanhão e Castanheiro, de forma a possibilitar a irrigação da Chapada do Apodi e das várzeas de Icó. A vazão do Açude Castanhão, regularizada pela sua bacia própria, é de 12,35m³/s. Na hipótese da construção do Castanhão, com capacidade de apenas 1 (hum) bilhão de m³, aproximadamente, evitando a inundação de Jaguaribara, poder-se-ia admitir a cessão de parte das vazões regularizadas pelos Açudes Orós (12m³/s) e Castanheiro (8,5m³/s), para atender a uma primeira etapa do Projeto Apodi, enquanto não se efetiva a transposição das águas do São Francisco. Nessa hipótese, a construção do Castanheiro poderia, até mesmo, anteceder a do Castanhão, se comprovadamente mais barata (...). Dessa forma, pela primeira vez, discutiu-se, ou melhor, dizendo, tomou-se conhecimento, em nosso estado, no DNOCS, a construção da Barragem do Castanhão. Mais uma vez, enfatizamos, nos dias 06 e 07 de janeiro de 1986.
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1.4 - Domar o Jaguaribe Com a lamentável extinção do DNOS, no início de 1990, pelo então Presidente Collor de Melo, o DNOCS assumiu a responsabilidade de dar continuidade às várias obras daquele órgão federal, dentre elas a do Açude Castanhão. Como técnico do DNOCS, embora reconhecendo a posição do seu Diretor-Geral, Eng. José Ribamar de Oliveira Simas (oriundo do quadro de funcionários do DNOS e favorável à construção deste açu de), na qualidade de representante da Regional Nordeste da Associação Brasileira de Hidrologia e Recursos Hídricos - ABRH, escrevemos um artigo publicado no JornalO Povo, do dia 05 de junho de 1989, sob o título “Domar o Jaguaribe”. Em assim agindo, pretendíamos resguardar no DNOCS), obedecendo ao princípio básico de respeito à hierarquia funcional, ao mesmo tempo em que nos posicionávamos, tecnicamente, contrário a esse empreendimento, invocando a palavra democracia no início do referido artigo do qual, a seguir, transcrevemos os principais trechos: Democraticamente, vamos externar nosso ponto de vista sobre a polêmica tese da construção da Barragem do Castanhão. A História registra como maiores cheias no Vale do Jaguaribe as ocorridas em 1914, 1922, 1924, 1926, 1960, 1974, 1985 e 1989. Os registros na cidade de Aracati (esperamos que a Prefeitura os conservem para a história) indicam que as maiores foram as de 1924 (não existiam os Açudes Orós e Banabuiú), em 1974 e 1985. Mas a resposta que todos querem saber é como domar a fúria do grande rio. Existem três métodos gerais de armazenamento para redução dos danos causados pelas enchentes: 1) Construção de grande número -de reserva principal; 3) Misto dos dois, muitas vezes a melhor solução. Em regiões semiáridas como a nossa, sujeitas às estiagens prolongadas e inundações, não se pode perder de vista que tais reservatórios devem, prio periódicas. (...) Visando o equacionamento do problema das cheias e, principalmente, das secas, há muito tempo, advogamos não colocar comportas de setor (7,00m de altura) no Açude Orós, inclusive pelos problemas de manutenção conhecidos
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aqui mesmo no Brasil com o rompimento de duas barragens no portentoso estado de São Paulo. Os 2 bilhões que lhe eram destinados, para completar 4,0 bilhões de metros cúbicos de acumulação máxima, seriam melhor - distri buídos a montante com a construção de outras barragens como as de Poço dos Paus, Trussu, Arneiroz, Jucás, Umbuzeiro, Bastiões, Cariús, entre outras, favorecendo grande número de municípios. Esta solução permitiria uma piscicultura, um maior contingente de população nos municípios de Cariús, Jucás, Arneiroz, Iguatu e Acopiara. tivamente, livre do fantasma das inundações. (...) Um planejamento idêntico para o Rio Salgado, a partir da cidade de Lavras da Mangabeira, com a construção do Açude Castanheiro ou outros que tivessem capacidade total de acumulação da ordem de 1,5 bilhão a 2,0 bilhões de metros cúbicos. Mais uma ou duas barragens, à cota de sangria, igual ou superior a 500 milhões de m³, no Rio Figueiredo, completariam, no nosso entendimento, a estrutura hidráulica necessária para reduzir, sig disso, atenderiam à necessidade maior que é a distribuição espacial da água e de riquezas para outras regiões carentes nos pontos mais distantes do litoral. Este seria o caminho para a democratização da água no Vale do Jaguaribe: água, pesca e piscicultura para todos! A Barragem do Castanhão poderia ser construída. A sua inclusão no planejamento descrito obedeceria ao terceiro dos métodos preconizados que, como dissemos, na maioria das vezes, é a melhor solução. Mas ela não teria as dimensões que lhe são, hoje, atribuídas. A sua cota máxima poderia ser tal que evitasse a inundação da cidade de Jaguaribara. Na cota 80m, por exemplo, esta barragem poderia acumular 1,2 bilhão de metros cúbicos, superior ao volume atual da Barragem do Banabuiú. É uma hipótese a ser examinada por quem detém os elementos de projetos em mãos. (...) Essas são, em linhas gerais, as ideias deste planejamento para o Vale do Jaguaribe, com todo respeito aos que pensarem de forma diferente.
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1.5 - Conclusão Pelo exposto, chegamos às seguintes observações: •
de vista técnico, para solucionar os problemas hídricos do Vale do Jaguaribe, como também de outra qualquer bacia hídrica nordestina; • Até meados de novembro de 1985, aquele Departamento Federal, responsável pela política da água no Nordeste, não tomara conhe -
do Rio Jaguaribe, denominado “Barramento do Castanhão”. Tal projeto foi desenvolvido pelo DNOS, em seus escritórios no Rio de Janeiro; • No mês de dezembro de 1986, o DNOCS tomou conhecimento, Seminário Sobre o Vale do Jaguaribe (iniciativa da Direção Superior daquele Departamento), este empreendimento foi exaustivamente discutido e analisado. E, através do relatório conclusivo, foi recomendada sua construção, desdeque a Barragem do Castanhão, fosse compatível e integrada à Barragem do Castanheiro, no Rio Salgado, visando , dentre
de Icó. Tal Barragem do Castanhão teria uma bacia de acumulação entre 1,0 a 1,2 bilhão de m³ (cota 80m). • Não é verdadeira, portanto, a tese levantada por alguns técnicos de que “a Barragem do Castanhão constitui uma reivindicação de mais de 80 anos da população cearense”, conforme vem sendo difundida deste falso tipo de informação era o de engabelar a mídia e, assim, obter o apoio da população cearense a essa obra. Deixamos ao leitor, em face do exposto, o encargo de extrair suas próprias conclusões.
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NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
O Povo
e-mail tônio Eduardo Dias
An -
Caro Cássio À época trabalhava na Cia. Atlantic de Petróleo, Terminal de Mucuripe.
sobre a torre da Igreja Matriz, nada iria sobrar no Aracati. A cheia foi pequena se comparada de 1974. Na cheia do Orós, em 1960, a água não chegou à casa de meus pais, enquanto que em 1974 inundou toda a casa, 1,20m de água dentro de casa, isso durante mais de 30 dias. Um abraço, Eduardo.
II TÉCNICOS E ARTICULISTAS REJEITAM O GRANDE AÇUDE CASTANHÃO
O
que, na década de 80, militavam na área de Recursos Hídricos no estado do Ceará ma nifestaram, inclusive através da imprensa, a sua rejeição à cons trução da Barragem do Castanhão no terço inferior do Vale do Jaguaribe, distante apenas 150 quilômetros do oceano. A esses técnicos juntaram-se expressivos articulistas. numa demonstração cabal de que nossas dúvidas e preocupações não são condicionantes, tem ciência de importantes detalhes do megaprojeto. 2.1 - Hypérides Pereira de Macedo Um deles foi o engenheiroHypérides Pereira de Macedo , atual Secretário de Recursos Hídricos do Estado do Ceará que, em artigo no Diário do Nordestee entrevista no JornalO Povo, teceu contundentes considerações contrárias à referida obra com argumentos, ainda hoje, absolutamente válidos, com as quais concordamos. Vejamos, inicialmente, o que escreveu o referido técnico no Jornal Diário do Nordeste , no dia 26 de abril de 1986, sob o título “Do Castanheiro ao Castanhão”:
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O projeto do Açude Castanheiro, na altura do boqueirão de Lavras da Mangabeira no Rio Salgado e que integra a programação do DNOCS no através de, pelo menos, uma dúzia de barragens de médio e grande porte e que o próprio Açude Orós era parte importante desse plano. Esses barramentos poderiam armazenar mais de quatro (4) bilhões de pelo menos 700 km de leito de rio na bacia do Jaguaribe. São eles os Açudes: Castanheiro (Lavras), Poço de Paus (Cariús), Trussu (Acopiara), Arneiroz (Arneiroz), Machado (Várzea Alegre), Bastiões (Assaré), Porcos (Milagres), Latão (Santana do Cariri), Pedras ( Jaguaretama), Jucás (Parambu), Um buzeiro (Aiuaba), São Miguel (Cedro) e outros. Se tal plano tivesse sido implementado nos últimos vinte anos, período em que os recursos para a construção de barragens praticamente inexistiram, o Estado do Ceará não estaria numa situação ao mesmo tempo vulnerável à inundação e à seca. [o grifo é nosso]. O projeto Castanhão, com quase sete (7) bilhões de metros cúbicos, é, sem dúvida, um projeto exótico ao pensamento clássico e maduro dos -que nos úl timos cinquenta anos pensaram uma solução hídrica para o alto Jaguaribe. É também um projeto concentrador de água, pois formará com o Orós uma região de “grandes lagos” no médio Jaguaribe. Todos os Municípios das re giões do Cariri Oriental, Araripe, Inhamuns e outras extensas zonas do condições de irrigar no segundo semestre de cada[oano grifo é nosso]. fato de que somente com volume máximo era possível a irrigação de toda área disponível na Chapada do Apodi. Este argumento não resistiu a uma primeira análise, pois a capacidade de irrigação de uma barragem tem mais a ver com o tamanho da bacia contribuinte do que com o seu volume e, ainda, que a descarga permanente na bacia possa ser produzida pelo armazenamento de vários açudes que, somados, seriam equivalentes ao de uma grande barragem. (...) Um outro ponto de apoio muito discutido do projeto do Açude - Casta nhão é a sua capacidade de controlar as cheias do Baixo Jaguaribe. Qualquer açude, sem dúvida alguma, é também um controlador de cheias. (...) Por outro lado,a lógica do regime de chuvas na região demonstra que um mesmo volume de armazenamento distribuído em diversos açudes
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de cheias[o grifo é nosso]. Como se observa, aquele especialista em Recursos Hídricos no artigo acima transcrito, foi por demais contundente nas suas conside rações contrárias à construção da Barragem do Castanhão e defendia, com entusiasmo a construção da Barragem do Castanheiro (repito, Castanheiro) sobre a qual ele, atualmente, faz questão de não mais falar. Nós, que temos opiniões divergentes das atualmente manifestadas pelo Eng. Hypérides Macedo , não temos o menor constrangimento em endossar, na íntegra, essas suas declarações de doze anos passados. Nada contrárias ao seu próprio pensamento expresso, de forma tão clara e lúcida, no referido artigo, publicado noDiário do Nordeste , antes citado. Na entrevista ao JornalO Povo, do dia 10 de maio de 1989, sob o título “Represas terão função reguladora”, o atual Secretário de Recur sos Hídricos do Estado do Ceará, Eng. Hypérides Macedo , voltou a artigo no Diário do Nordeste , como que oferecendo novos argumentos contrários à referida obra. Destacamos nessa entrevista: O Diretor Técnico da empresa Águas Solos Consultoria e Engenharia, Hypérides Macedo, que trabalha há 20 anos no ramo de recursos hídricos, defende a política de contenção das cheias e secas no Vale do Jaguaribe, como forma de amenizar os problemas sócioeconômicos do Ceará. O controle deve ser feito através da construção de barragens em sub-bacias diferentes e paralelas, que funcionarão como amortecedor e regularizador das enchentes no Baixo Jaguaribe, pois as chuvas se distribuem de forma irregular no espaço e no tempo. Para conter a seca no Alto Jaguaribe, onde estão localizadas as cabeceiras do que já foi o rio mais seco do mundo, Hypérides Macedo defende- o seu bar ramento através da construção das represas de Arneiroz (na cidade do mesmo nome), no Rio Jucá (Parambu), Umbuzeiro (Aiuba), Conceição (Saboeiro), Bastiões (Assaré), Farias Brito (município do mesmo nome), Poço dos Paus (Cariús) e Trussu (Aiuaba). Com a perenização do Rio Jaguaribe, poderá ser desenvolvido programa de irrigação, salientou. Fazendo referência a um dos principais objetivos da Barragem do Castanhão (o outro seria a irrigação de 75.000 hectares na Chapada do Apodi), o referido técnico sentenciou:
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“Não podemos trabalhar só para enchente, mas contra a seca, através da distribuição de recursos hídricos” – ressaltou Hypérides Macedo. E prosseguiu o diretor Técnico da Água Solos assegura mesmoconstrução que a de 10 barramentos de porte médio ultrapassa a de um açude de grande porte, os benefícios gerados a outras regiões do estado serão maiores” [o grifo é nosso].
Segundo estudos preliminares, o barramento de rios na região dos Inhamuns será mais barato do que no Médio e Baixo Vale. Isso, em função da calha do Jaguaribe ser cristalina, não tendo grandes massas de aluviões e pequenas benfeitorias, não causando impacto negativo ambiental. A região é ideal para se fazer barragens porque não chegam a cobrir benfeitorias e grandes manchas de terras, não havendo necessidade de reassentamento -habita cional. Os açudes nas cabeceiras do Jaguaribe servirão para perenizar as várzeas de Jucás, Cariús e Iguatu[o grifo é nosso]. Hypérides Macedo defende ideias distintas das que ele divulgava, publicamente, há treze anos, as quais continuamos endossando ipsis literis. Como vimos o Eng. Hypérides Macedo , com o artigo publicado no Diário do Nordeste(26 de abril de 1986) e sua entrevista, acima referida, no Jornal O Povo (10 de maio de 1989), demonstrava que estava em plena e total sintonia com nossa proposição de que, em vez do Castanhão ser construído com 6,7 bilhões de metros cúbicos (cota 106m) de águas armazenadas, fossem construídas 10 a 12 barragens de porte médio, espacialmente distribuídas no Alto Jaguaribe (acima Jaguaribe por sua margem direita. Entre essas barragens propostas por Castanheiro (1,5 bilhões de metros cúbicos, situada à altura da cidade de Lavras da Mangabeira) e o próprio Castanhão, mas com apenas 1,2 bilhão de metros cúbicos, na cota 80m. Causou-nos surpresa, para não dizer estupefação, a declaração do engenheiroHypérides Macedo , em artigo publicado no JornalO Povo, do dia 25 de junho de 1995, sob o título“A água é transparente e incolor” ao dizer: alguns opositores da obra”.
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do a Barragem do Castanhão se fez em resposta a um artigo publi cado no JornalO Povo, do dia 18 de junho de 1995, pelo conhecido e respeitado articulista daquele jornal, médico Antônio Mourão Cavalcante, sob o título: “A transparência tem cor?” 2.2 - Antônio Mourão Cavalcante No artigo, antes referido (O Povo, de 18 de junho de 1995), assim se expressou este articulista: Tenho insistido nas últimas semanas, sobre o caráter autoritário, pouco democrático, dos governos atuais. De repente, sem consultar a sociedade, tomam decisões e acabou-se. Montam-se no suposto direito adquirido quando foram que são contra, é porque são sempre do contra. Não entendem. São forças do atraso. Não querem o progresso. Isto é, democracia virou pista única. Quem Uma postura hegemônica construída nos moldes do fascismo. Vou apresentar dois exemplos que ilustram bem o que falo. Primeiro, a construção do Açude Castanhão. Quando o Deputado Paes de Andrade levantou a bandeira da construção desse reservatório, logo - conde nou-se a aventura. Seria um absurdo. Uma agressão. Mesmo o atual- Secre tário de Recursos Hídricos, Hypérides Macedo, que hoje defende com unhas e dentes o projeto, em artigo no Diário do Nordeste (26 de abril de 1986) era radicalmente contra: “O projeto Castanhão, com quase seis bilhões de metros cúbicos é, sem dúvida, um projeto exótico ao pensamento clássico e maduro dos que, nos últimos cinquenta anos, pensaram uma solução hídrica para o Alto Jaguaribe”. E propunha barramentos através da construção de represas de porte médio: “Com a perenização do Rio Jaguaribe, poderão ser desenvolvidos programas de irrigação”. Na reportagem de O Povo (10 de maio de 1989) o referido técnico assegura “que a construção de 10 barramentos de porte médio ultrapassa o de um açude de grande porte, o benefício gerado a outras regiões do estado serão maiores”. Quem mudou? Por que mudou? Ottoni Netto após uma exaustiva análise dos documentos existentes sobre a Barragem do Castanhão: “O empreendimento Castanhão, cota 100m, de cunho técnico convencional, merecendo alguns reparos, impõe grandes riscos, envolve
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condicionantes sociais e econômicos preocupantes e suspeitos, sendo seu efeito ambiental pernicioso e desfavorável ao Rio Jaguaribe e ao estado do Ceará”. Com igual veemência pronunciaram-se os bispos do Ceará em documentos publicados na imprensa essa semana. Dizem os prelados: “Não há recursos barragem de 6,7 bilhões de metros cúbicos, conforme estudos do DNOCS/ veemente: “Que a barragem construída com o dinheiro da Nação não seja privatizada quanto ao uso da água por segmentos, privilegiados da sociedade. Essa tem sido uma prática muito frequente. (...) Em resposta ao artigo do médico Antônio Mourão Cavalcante, o secretárioHypérides Macedo no seu artigo sob o título“A água é transparente e incolor”, publicado no JornalO Povodo dia 25 de junho Em geral os opositores do Castanhão, somente grifam pedaços do meu artigo procurando confundir a opinião pública. Alguns por desconhecimento de causa, outros por substituição da insegurança técnica pelo ataque pessoal e uns poucos por insinuações maldosas e gratuitas. O leitor que tire suas próprias conclusões. 2.3 - Evandro Bezerra Megalomania Hidráulica. Com esse título, o engenheiro agrônomo do DNOCS, Evandro Bezerra , escreveu um interessante artigo, publicado no JornalO Povo, do dia 15 de dezembro de 1985, no qual ele manifes ta reprovação à construção da Barragem do Castanhão, no porte alto, localizada no município de Alto Santo, no estado do Ceará. Vejamos alguns trechos do mencionado artigo: Das amargas heranças da Nova República, uma se destaca pelo pesado ônus que temos de arrastar durante muito tempo ainda: é a da proposta me galomaníaca dos grandes projetos de impactos como a Transamazônica, os metrôs do Rio e São Paulo, Itaipu, Ponte Rio-Niterói, Programa Nuclear e Ferrovia do Aço, alguns sem nenhuma serventia, outros dando prejuízos e alguns gerando, inclusive, problemas técnicos sérios. Como se não bastasse, o hábito de tocar grandes obras ressurge com o advento na Nova República, agora, no Nordeste, com a construção de grandes barragens.
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(...) No caso das obras hidráulicas do semiárido não iniciamos tão pequenos, mas bem que as grandes obras de engenharia desse ponto de vista a estão aí de serem grandes (o destaque é nosso)e, como exemplo, podemos citar os Açudes Orós e Banabuiú; o primeiro com um volume de 2,0 bilhões de metros cúbicos e o segundo com um bilhão, sendo o rendimento do Banabuiú de 33 por o engenheiro Cássio Borgesem seu trabalho “Potencialidades e Aproveitamento dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará” (Separata do Boletim Técnico do DNOCS de julho/dezembro/83). Estes dados vieram à tona quando aquela autoridade em recursos hídricos mostrava ser o espelho evaporativo do Açude Banabuiú 3 (três) vezes menor do que o do Orós face às condições elevadas de temperatura existentes na região semiárida. Com aquele volume, o Açude Orós irriga apenas 19.000 hectares, enquanto o Banabuiú (Arrojado Lisboa) pode irrigar 17.000 hectares, área quase equivalente a do primeiro, apesar deste ter menos de 2 vezes o volume d’água daquele. É preciso que se discuta esse tipo de problema dentro do plano das ideias, mas levando em consideração os aspectos técnicos de caráter hidrológico porque deles é que surgirão as viabilidades econômicas e sociais do empreendimento. Pergunta-se então. E a Barragem do Castanhão, com 6,7 bilhões de metros cúbicos, dos quais 4,5 serão para irrigar 75.000 ha no Apodi e 26.000 ha nos aluviões do Baixo Jaguaribe, terá vazão regularizada para tal, já que o restante da água se destina ao volume de espera para conter enchentes? É o que precisamos saber. O Eng. Agro. Evandro Bezerra , conceituado técnico do DNOCS, que lançou recentemente seu terceiro livro denominado “A Barragem do Castanhão e a Transposição do Rio São Francisco” sabe tanto quanto nós, especialistas que somos no assunto, que tanto os Açudes Orós e Banabuiú, como o Castanhão têm, praticamente, a mesma vazão regu larizada, ou seja, 12,00m³/seg., 11,00m³/seg. e 12,35m³/seg., por ordem, apesar de terem os seguintes volumes de acumulação: 2 bilhões de m³, 1 bilhão de m³ e 4,5 bilhões de m³ (na cota 100m), respectivamente. “O fato de uma barragem ser grande, não quer dizer que sejam hidrologicamente grandes os seus benefícios”. Esses condicionantes técnicos, relativos à construção de barragens, desconhecidos por leigos e por muitos engenheiros que não dominam a moderna ciência hidrológica, contrariam a tese defendida por muitos
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“uma barragem quanto maior melhor”. Outros ainda defendem: “mesmo que a barragem passe muitos anos sem sangrar, quando vier um inverno excepcional, ela enche” e isso é considerado vantajoso por essas pessoas, mesmo que essas enchentes só ocorram de 20 a 30 anos, como é o caso do Rio Jaguaribe. Por oportuno, evidenciamos que toda barragem, acima de sua capacidade ótima ou ideal de acumulação, só serve para evaporar e inundar, temporariamente, grandes e extensas áreas produtivas. Todos os autores da ciência hidrológica, antigos e modernos, advertem para isso. de acordo com os argumentos expostos pelo Engenheiro Hypérides Macedo, transcrito no Capítulo II deste livro, que o volume ótimo ou ideal de armazenamento do Açude Castanhão é de 1,2 bilhão de metros cúbicos. Com esse valor, esse reservatório, que não inundaria a cidade de Jaguaribara e seus distritos e não causaria tantos impactos ecológicos, deslocamento de populações etc., poderia dar os mesmos 12,00m³/ seg. que ele oferece com os mesmos 6,7 bilhões de metros cúbicos de acumulação. É isso que supomos que o engenheiro Hypérides Macedo quis dizer em seu artigo publicado noDiário do Nordeste , referindo-se à “a capacidade de irrigação de uma barragem tem mais a ver com o tamanho da bacia con tribuinte do que com o seu volume”. Portanto, não há nenhuma lógica em construir-se uma barragem com 6,7 bilhões de m³ (cota 106m) quando, naquele local, tecnicamente, a capacidade de acumulação ideal seria de 1,2 bilhão de m³ (cota 80m). Esta hipótese, infelizmente, não foi considerada pelos promotores desse empreendimento, o que obrigatoriamente deveria ter sido feita embora tenha sido objeto das maiores discussões no COEMA. Quanto ao “Estudo de Alternativas da Barragem do Castanhão” (SIRAC/DNOCS, nov./1990), julgamos ter sido este, direcionado no sentido de provar que esta tese, levantada por nós, estava errada. Com esse objetivo, de modo temerário, ou melhor dizendo, irresponsável, consideraram a capacidade de acumulação do Açude Castanhão na cota 80m, como tendo apenas 758,3 milhões de metros cúbicos, em vez de 1,2 bilhões. Um erro grosseiro e inadmissível para quem pretende produzir um documento sério. Essa irregularidade incrivelmente con tinuou no Plano Estadual de Recursos Hídricos, conforme exposto na página 1340, do tomo “Planejamento” e que acabou comprometendo a seriedade deste documento, tornando-o desacreditado, portanto, inútil.
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Voltando ao artigo do Eng. AgrônomoEvandro Bezerra , esclarecemos que o Açude Castanhão não tem capacidade “para irrigar os 75.000 hectares na Chapada do Apodi e mais 26.000 hectares nas aluviões do Baixo Jaguaribe”,conforme diziam os promotores desse empreendimento no ano de 1985. Ele poderá irrigar somente algo em torno de 20.000 hectares, sem nenhuma destinação de vazão para reforçar o abastecimento de água do DNOS, de onde partiu ideia da construção desse empreendimento, a vazão regularizada do Castanhão era de apenas 12,35m³/seg. 2.4 - Comentários sobre “A água é transparente e incolor” Diante dos muitos artigos que publicamos na imprensa fortalezense, para concluir este capítulo, vamos reproduzir o que foi editado no Jor nal O Povo, do dia 02 de julho de 1995, sob o título “Contradições de um megaprojeto”, o qual está intimamente ligado à resposta dada pelo SecretárioHypérides Macedo ao médico e jornalista Antônio Mourão Cavalcante, citado anteriormente: Não fosse o interesse público e, em especial, das populações que vivem no Alto, Médio e Baixo Jaguaribe, portanto, de toda a sociedade- cearen se, como cidadão e engenheiro “expert” no assunto, sentimo-nos - na obri gação de fazer os seguintes comentários sobre o artigo de autoria do Eng. Hypérides Macedo, publicado neste jornal, no dia 25 último, sob o título “A do Ceará: 1 - No artigo, ele cita o extinto DNOS, órgão idealizador do Açude Castanhão e com sede no Rio de Janeiro, como sendo um Departamento “desvinculado da maioria dos problemas do sertão semiárido”. Neste aspecto, concordamos, mas, nem por isso, a ideia da construção daquela megabarragem capacidade de acumulação d’água de 6,7 bilhões de metros cúbicos; 2 - Diz no artigo: “Na ocasião, ninguém dava conta da necessidade de um plano de aproveitamento hídrico para o Alto Jaguaribe”. É curioso o articulista servir-se deste argumento, porque ele próprio, nos seus artigos e entrevista publicados na imprensa local do ano de 1989, cita nominalmente cerca de SUDENE para o Alto Jaguaribe e bacia do Rio Salgado, os quais, segundo
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km de leito de rio na bacia do Rio Jaguaribe”. E sentenciava: “Se tal plano tivesse sido implementado nos últimos vinte anos, o estado do Ceará não estaria numa situação ao mesmo tempo vulnerável à inundação e à seca”; 3 - Refere-se:“ os opositores da obra!” Vejamos sua posição no seu artigo publicado em 1986: “O projeto do Castanhão é concentrador de água, pois formará com o Açude Orós uma região de ‘grandes lagos’. do Castanhão, ‘que a construção de 10 barragens de porte médio ultrapassa a de um açude de grande porte e os benefícios a outras regiões do estado serão maiores”; 4 - Dizer que ele era contra o Açude Castanhão apenas por não ter “uma comporta de fundo” é uma desculpa descabida, até porque este detalhe é somente uma das aberrações daquele projeto, entre muitas outras de maior gravidade. O que ele mais combatia era o volume exagerado da obra que continua o mesmo: 6,7 bilhões de m³; meu artigo”. Isso é uma desculpa insustentável, pois tanto no artigo como inquestionáveis libelos contra a Barragem do Castanhão. estação de rádio local, aludindo ao “tempo da Light” e a “conceitos ultrapassa dos” só demonstra fraqueza de argumentação, revelando ainda inadmissível e grosseiro preconceito contra um renomado técnico e professor que muito tem contribuído para o engrandecimento e modernização da engenharia hidráulica, hidrológica e ambiental do nosso país. 2.5 - Dr. Paulo Affonso Leme Machado Após o julgamento da Barragem do Castanhão noTribunal da Água, realizado em Florianópolis (SC), em abril de 1993 (ver Capítulo XXVIII – Castanhão é Condenado no Tribunal da Água), o Dr. Leme Machado , a maior autoridade brasileira em Direito Ambiental, concedeu uma longa entrevista ao Boletim Raízes, do IMOPEC, da qual destacamos o seguinte trecho: (...) IMOPEC – “No dia 28 de abril, o caso da Barragem do Castanhão foi julgado pelo Tribunal da Água. Como o senhor viu a atuação da defesa e da acusação?”
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“ a presença das duas partes: o reclamante e o reclamado. Deu-se - legiti midade, houve discussão. Houve acusação, mas houve defesa. Eu felicito primeiramente, a atuação dos reclamantes, que não aceitaram passivamente na esquina, no recesso de nossas casas, mas não nos agrupamos para uma reclamação constante, organizada. Fiquei feliz de ver a presença de uma delegação de interessados tão expressiva. Primeiro, a participação do Dr. João Alfredo Telles Melo , que eu já conheço como uma pessoa séria, participativa.A aprovação do Estudo de Impacto Ambiental, no Conselho Estadual do Meio -Am biente, teve os votos contrários do Ministério Público Federal, do- Mi nistério Público Estadual e da Ordem dos Advogados do Brasil. -Pes soas gabaritadas, concursadas, que têm independência assegurada pela Constituição, que é o Procurador da República e o Ministério Público Estadual se posicionam contra [o grifo é nosso]. Quero também ressaltar o brilhantismo do representante do DNOCS. O Departamento - Na cional de Obras Contra as Secas foi representado por um técnico combativo, Da mesma forma, o antigo Secretário dos Recursos Hídricos, Dr. Hy pérides Macedo , professor universitário. Houve o chamado princípio do contraditório em que um falou e o outro se defendeu. Quero também sa Cássio Borgesque veio com -sa piência e com a dedicação de uma vida. Ele está estudando a questão. É te de seu tempo às questões sociais. Temos que ter compromisso com os interesses sociais nos quais o meio ambiente está jungido. (o grifo é nosso). Mais detalhes sobre oTribunal da Água, o leitor conhecerá noCapítulo XXVIII , anteriormente mencionado. 2.6 - Conclusão Mediante as declarações emitidas pelas pessoas citadas neste Capítulo II , destacamos que: Estas personalidades, em sua totalidade, se mostravam favoráveis à construção da B arragem do C astanhão desde que ela obedecesse a técnica recomendada, ou seja:
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resultaria num armazenamento total de 1,2 bilhão de m³; e 2. fosse compatibilizada e integrada à Barragem do Castanhei ro, assim como, ao planejamento anteriormente elaborado pelo DNOCS. Posteriormente, uma única pessoa, dentre as citadas neste capítulo, reformulou o seu posicionamento inicial, passando a defender esse-em preendimento de forma pertinaz, inclusive ferindo, de modo deseducado e deselegante, as pessoas que mantiveram seus posicionamentos. Em programa radiofônico, se referiu, de maneira desprezível, a um excep cional técnico cearense, nascido em Orós (seu pai, à época, era um dos engenheiros responsáveis pela construção do açude de mesmo nome) no caso, o Prof. acadêmica, honra o nosso estado. Criticou-o por sua idade avançada ao aludir que este Professor Emérito da Escola de Engenharia da UFRJ era do “tempo da Light” , de “conceitos ultrapassados” etc. O desvario dessa pessoa, que ocupa cargo de relevo no Executivo cearense, ao assim se pronunciar, não só feriu, de modo grosseiro, um cearense ilustre, mas uma das mais tradicionais Universidades brasi leiras, pois o título de Professor Emérito é concedido somente àqueles que se destacaram na comunidade acadêmica a que pertenceram. É o foi o primeiro técnico nacional a introduzir no Brasil os estudos hidráu licos em modelos reduzidos), no caso, aquele Professor Titular (antigo Catedrático) e Chefe do Departamento de Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia da Universidade referida que, em cerimônia pública, presidida pelo seu Reitor, a ele concedeu este maior galardão universitário, fruto de meio século de serviços prestados àquela Escola de Engenharia, quer como professor “Assistente”, quer como professor “Livre Docente” (atual Adjunto), ou ainda, como professor “Titular” (antigo Catedrático). Ora, convenhamos, pelo exposto, este cidadão cearense mereceria, no mínimo, o respeito dos seus conterrâneos que, a nosso ver, deveriam considerar-se orgulhosos por ter “um velho irmão” alcançado tal título, obtido, exclusivamente, por sua atuação voltada à tecnologia e à ciência, sem nunca se evidenciar pela ocupação de cargos de 1°, 2° ou demais escalões de governos municipal, estadual ou federal. Pelo contrário, neste ano de 1998, o técnico do“tempo da Light” e que emite“conceitos
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ultrapassados” foi convidado (aos 75 anos de idade) pelo Prefeito da cidade do Rio de Janeiro,Luiz Paulo Conde vamente a solução do problema das enchentes naquele município. Gostaríamos de, nesteCapítulo II, registrar a inconstância de opinião do ilustre Secretário de Recursos Hídricos do Estado do Ceará,Hypé rides Macedo, ao fazer a seguinte declaração ao Diário do Nordeste , do dia 14 de junho de 1998, no suplementoA Vergonha do Século : Acho que os projetos em torno da construção de açude devem-ser estu dados e reavaliados. Hoje, não mais entendemos como prioritários grandes açudes como o Banabuiú ou Orós, como fonte de abastecimento para todo o estado. O que achamos mais viável é que possamos construir 20 açudes equivalentes a um Banabuiú, de forma que as águas desses cheguem às diferentes localidades do estado [o grifo é nosso]. Por oportuno, indagamos: o Açude Castanhão, seis vezes maior do que o Banabuiú, três vezes e meia maior do que o Açude Orós, situado quase na foz do Rio Jaguaribe, não teria que merecer igual apreciação por parte do distinto Secretário? De acordo com este pensamento, o Açude Castanhão, com 6,7 bilhões de acumulação d’água também deveria ser substituído por 20 ou mais açudes de porte médio. posicionamento de um técnico que ocupa alta função administrativa no de opinião do ser humano, porém dentro de pequenas variações, diga mos, em linguagem estatística, de um desvio padrão de mais ou menos 5% (cinco por cento). O que não podemos concordar é com um desvio padrão de 100% (cem por cento), pois isto indicaria a não representa tividade da média da série estudada. Ontem era absolutamente contra. Hoje, é absolutamente a favor, não medindo esforços para provar que agora está certo. Cabe ao leitor, porém, tirar suas próprias conclusões.
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
Theophilo Ottoni
III MORTE DO CASTANHÃO NOVO ALENTO PARA O AÇUDE CASTANHEIRO
3.1 - Ministro anuncia o fim da Barragem do Castanhão
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da comunidade técnica do estado do Ceará, a ideia da construção da Barragem do Castanhão parecia
do JornalO Povo, publicada no dia 19 de setembro de 1986, sob o título : O estado do Ceará perde a oportunidade de irrigar 75.000 hectares que aumentariam a produção agrícola em 800 mil toneladas, porque alguns municípios do Vale do Jaguaribe não aceitam a construção da Barragem do Castanhão. Na mesma matéria, o referido jornal dizia que, no dia seguinte, o então Ministro da Irrigação (Vicente Cavalcante Fialho) iria a Limoeiro do Norte, debater com aquela comunidade e lideranças políticas da região a construção da Barragem do Castanhão. No dia 20 de setembro de 1986, enquanto se realizava a mencionada reunião em Limoeiro do Norte, o Diário do Nordeste , em editorial sob o título “Castanhão, nova batalha”, assim se expressava: O debate sobre a construção da Barragem do Castanhão foi marcado desde os primeiros instantes, por divergências profundas e insanáveis. Chapada do Apodi, de modo a se alcançar uma produção anual de 800 mil
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toneladas de alimentos e uma oferta de 75 mil empregos diretos e 112 mil empregos indiretos. Com tantos “benefícios anunciados”, o projeto (aliás, ainda nem existia projeto) do Açude Castanhão era por demais grandioso e importante para ser abandonado e, no dia 21 de setembro de 1986, o mesmo jornal, em novo editorial sob o título “Morte do Castanhão” lamentava “a decisão governamental de suspender a construção da barragem”: Não se compreende que a posição do Ministro da Irrigação sobre a argumentos concrascentes. Sólidos eram os argumentos em contrário à época pois, nem sequer, a referida obra tinha sido projetada, seja do ponto de vista hidrológico, seja de engenharia (verCapítulos IV e VI desse empreendimento era a irrigação de 75.000 hectares na Chapada do Apodi que, por ocasião da elaboração do EIA/RIMA, foi descartada, seriam irrigados com as águas do Açude Orós. Desse total, apenas 1.750 hectares foram efetivamente implantados, sabendo-se hoje do insucesso desse projeto, como se pode concluir da leitura das reportagens do Jornal O Povodos dias 08 de junho de 1996 e 09 de julho de 1996. Vejamos as respectivas manchetes e trechos mais sugestivos, segundo nossa visão: “Projeto de Irrigação Jaguaribe - Apodi é exemplo de desperdício de dinheiro público”; “Obra poderia se tornar grande polo produtor, mas está abandonada após consumir US$ 58,2 milhões em nove anos e servir apenas para irrigar feijão de subsistência”; “A cooperativa dos irrigantes do Jaguaribe/Apodi (CODIPA) possui uma dívida de R$ 4, 75 milhões com o Banco do Nordeste”; “Ministério conhece descaso no Jaguaribe-Apodi”; “Aeroporto construído só é utilizado por políticos” ; “Colonos assentados vivem em situação precária”. O mesmo jornal, em seu editorial do dia 10 de julho de 1996, sob o título “Salvemos o Jaguaribe-Apodi”, assim se expressava: A repercussão alcançada pela reportagem que publicamos segunda-feira, sobre a precariedade em que se encontra o projeto de irrigação Jaguaribe-Apo di, não nos permite acomodações e conivência de nela limitar nossos deveres e preocupações.
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(...) O fracasso dele reduz a destroços toda a luta nordestina no penoso combate aos efeitos das secas, contraditando o que dele se esperava, o de ser exemplar e incentivador, na conquista de novos êxitos nesse esforço. É tão grave a situação, é enorme o desperdício de dinheiro já constatado, que não nos atrevemos a aceitar, como real e verdadeira, qualquer das causas até agora apontadas para tão deprimente descalabro. Devemos ressaltar, a bem da verdade, que o Projeto Jaguaribe-Apodi de irrigação do DNOCS, seguindo um modelo que vinha sendo defendido pelo então Ministro da Irrigação, Vicente Cavalcante Fialho, e pelos atuais gestores dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará e críticos daquele Departamento Federal. Todos esses fatos que hoje (referimo-nos ao ano de 1999 quando este livro foi editado pela primeira vez) vêm à tona demonstram, com clareza, o quanto estávamos com razão na intransigente oposição à men cionada barragem, que foi concebida para dar, exclusivamente, suporte ao grandioso projeto de irrigação da Chapada do Apodi. Na realidade, aquele projeto, que seria irrigado com águas do-Ja guaribe, sempre nos pareceu economicamente inviável pela elevada topo da Chapada, da ordem de 110 metros), o que representa um custo exorbitante de consumo de energia, na forma como ele foi concebido com “pivô central”. Dizia-nos um experiente técnico, francês, quando prestávamos serviços na SUDENE, no Grupo de Estudos do Vale do Rio Jaguaribe - GVJ (1964), que bombeamentos acima de 40 (quarenta) metros de altura tornam inviáveis, economicamente, qualquer projeto de irrigação, fazendo-se exceção no caso de gotejamento. Também um técnico israelense da Missão de Israel no Brasil, servindo no DNOCS, quando dirigíamos a 2ª Diretoria Regional daquele Departamento, em Fortaleza, em 1972, dizia-nos a mesma coisa. O próprio DNOCS considerava nos seus estudos pedológicos esse parâmetro referencial a agricultura irrigada, quando da aplicação das normas do Bureau of Reclamationdos Estados Unidos. Lógicos eram os argumentos técnicos contrários à pontual Megabar ragem do Castanhão. Daqueles que, como nós, defendiam um projeto alternativo da construção de 10 a 12 barragens de porte médio (200 a 500 milhões de metros cúbicos) no Alto Jaguaribe e na bacia do Rio
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Salgado, solução esta também defendida pelo engenheiro Hypérides Macedo mencionado artigo publicado noDiário do Nordeste , do dia 26 de abril de 1986, sob o título“Do Castanheiro ao Castanhão” do qual enfatizamos, mais uma vez, o seguinte trecho, para dirimir qualquer dúvida: (...) Se tal plano tivesse sido implementado nos últimos vinte anos, período em que os recursos para a construção de barragens praticamente inexistiram, o estado do Ceará não estaria numa situação, ao mesmo tempo vulnerável à inundação e à seca. O projeto Castanhão, com quase seis (6) bilhões de metros cúbicos é, sem dúvida, um projeto exótico ao pensamento clássico e maduro dos úl-que nos timos cinquenta anos pensaram uma solução hídrica para oAlto Jaguaribe. Outro referencial importante nas discussões é o trabalho técnico do Castanhão) denominadoPotencialidade e aproveitamento dos Recursos Hídricos do Estado do Ceará , publicado no Boletim Técnico do DNOCS (Fortaleza, 41:219-250, jul./dez. 1983). Nesse trabalho, já defendíamos o planejamento de obras de açudagem elaborado pelo DNOCS para o estado do Ceará e, em especial, para o Vale do Jaguaribe (a Barragem do Castanhão não era prevista até então). De forma pioneira, estimamos em 20 bilhões de metros cúbicos o“volume d’água que poderia ser armazenado no estado do Ceará, o que se pode considerar um número razoável em razão de que são mínimas as possibilidades da existência de boqueirões próximos à faixa litorânea e, principalmente, nas pequenas bacias complementares”. 229, que “sua capacidade máxima possível de acumulação” é de 7,5 bilhões metros cúbicos, dos quais, subtraindo-se os volumes já acumulados nos Açudes Orós (2,0 bilhões de m³), Banabuiú (1,0 bilhão de m³) e outros de menor porte (cerca de 1,4 bilhão m³) restariam, tecnicamente, ainda por acumular no referido Vale algo em torno de 3,0 bilhões m³. Deste total, 1,5 bilhão era destinado ao Açude Castanheiro, previsto para a bacia do Rio Salgado, em Lavras da Mangabeira. A outra parcela de 1,5 bilhão de m³ seria destinada aos 10 ou 12 açudes cogitados para o Alto Jaguaribe e bacias dos Rios Salgado e Banabuiú. Para o Açude Castanhão, não restaria nenhum volume de acumulação, pois este, como já vimos antes, não era nem imaginado pelos técnicos DNOCS. trabalho elaborado pela SUDENE (10 volumes) denominado Estudo
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Geral de Base do Vale do Jaguaribe , editado no ano de 1967, após cinco especialistas franceses e brasileiros naquela rica região do estado do Castanhão não foi citado uma só vez no referido trabalho, constituin “reivindicação do povo cearense de mais de 80 anos”. É importante lembrar que, no nosso trabalho, acima mencionado, ressaltamos a importância da construção de uma ou duas barragens no Rio Figueiredo, totalizando 500 milhões de metros cúbicos, com “o sistema de grandes barramentos para aquela região, resolvendo-se, também, os graves problemas com inundações periódicas no Baixo Jaguaribe”. O estudo feito pela SUDENE, acima referido, foi fruto de um convênio internacional do governo brasileiro com o governo francês que resultou na criação do Grupo de Estudos do Vale Jaguaribe - GEVJ, grupo misto franco-brasileiro. Notem os leitores que, tanto no nosso trabalho (e nos arquivos do DNOCS), quanto nos estudos detalhados da SUDENE, não havia nenhuma citação a respeito da construção de qualquer barragem no Boqueirão do Cunha, local da Barragem do Castanhão. Ademais, se fosse obedecido tal planejamento, da forma como acima foi exposto, não sobraria quase nenhum volume d’água para ser acumulado no mencio nado reservatório. Não obstante, de forma surpreendente e inadmissível, o Açude Castanhão surgiu com uma capacidade de acumulação de 6,7 bilhões de metros cúbicos, quase equivalente à capacidade máxima possível de acumulação de todo o Vale do Jaguaribe que, como foi dito anteriormente, foi estimada em 7,5 bilhões de m³. Tal absurdo só po deria ser concebido por um órgão sem nenhuma tradição no trato dos temas nordestinos, com ênfase a seu semiárido, no caso o DNOS, com sede no Rio de Janeiro. 3.2 - O sexagenário Açude Castanheiro Muitas pessoas, atualmente, confundem o AçudeCastanheiro com o Açude Castanhão. Para ilustrar a importância que teria para o Vale do Jaguaribe a construção do Açude Castanheiro, vamos transcrever alguns trechos da reportagem do Jornal O Povo, do dia 30 de março de 1996, sob o título “Açude Castanheiro foi abandonado há 28 anos”:
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Castanheiro é uma pequena localidade do município de situada Icó, a 12 quilômetros ao sul da sede municipal. É também a denominação original do açude que o Departamento Nacional Obras de Contra as Secas começou a construir em 1951 e o abandonou em 1958, de forma aparentemente -inex plicável, quando os dois mil e tantos operários que lá trabalhavam foram transferidos para canteiro o de obras do Orós. Vale destacar o seguinte trecho da referida reportagem: Desde então, a população de Icó tem esperado em vão as sucessivas que administrações do DNOCS resolvam reiniciar a construção do grande re servatório, prioritariamente destinado à perenização do Rio Salgado. Isto de fortalecer a sua economia, a partir do incremento à atividade agrícola. E, de uma vez por todas, a cidade do Icó estaria livre das enchentes periódicas pouco mais aliviados, já que as cheias do Jaguaribe seriam menos frequentes e menos prováveis. Segundo os cálculos dos engenheiros que realizaram os primeiros es tudos de viabilização técnica da obra, o Açude Castanheiro viria a ser o segundo maior do estado em capacidade de acumulação - de 2,0 bilhões de metros cúbicos - inferior à capacidade do Orós em apenas 100 milhões de metros cúbicos. A matéria ainda faz uma rápida descrição da área de inundação que seria provocada pela represa e conclui : “Em consequência, o valor econômica e social.” Destacamos, ainda, o trecho, que fala das “Cheias Indesejáveis”: Agora, quando o inverno se mostra mais rigoroso em todo o estado do Ceará com a triste perspectiva de que o Rio Jaguaribe volte a causar grandes inundações no Baixo Vale e a própria cidade de Icó, corre mais uma vez o risco de uma cheia, e a construção do Açude Castanheiro é lembrada novamente como a única opção para evitar a repetição das inundações, que só trazem miséria e fome para dezenas de milhares de cearenses. Vale salientar que se o Açude Castanheiro[1] fosse construído, praticamente, deixaria de existir o único potencial alimentador do Açude Castanhão que é o Rio Salgado, atualmente sem qualquer controle. O Rio Jaguaribe, em Orós, seria a outra vertente, mas esta bacia está, praticamente, fora de cogitação se levarmos em conta sua situação atual,
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[2] sem sangramento desde ano de 1985 . Portanto, se o Açude Castanhão estivesse construído, não teria recebido nenhum volume d’água nestes
Açude Orós. Se desprezarmos o pequeno volume vertido pelo Açude Orós no ano de 1989, com uma pequena lâmina de quinze centímetros, poderíamos dizer praticamente que o citado açude sangrou pela última vez no ano de 1985. Como dissemos anteriormente, a bacia de alimentação dos Rio Salgado, isto é, 19.281km². E, no caso de ser efetivada a construção do Açude Castanheiro ( 1,5 a 2,0 bilhões de m³), ou do Açude Aurora bacia de contribuição. Tornar-se-ia apenas um monumento político, sem o menor respaldo na engenharia civil, principalmente da área de Recursos Hídricos. 3.3 - Conclusão • O Açude Aurora (800 milhões de m³), no Rio Salgado (CE), concebido pelo DNOS como sendo o “pulmão” do Sistema de Transposição do Rio São Francisco, foi excluído por ocasião da em Fortaleza. A época o Ministro da Integração Regional era o ex-governador do Rio Grande do Norte, Aloísio Alves. • Em nossa maneira de ver, a exclusão do referido reservatório teve como principal objetivo não prejudicar a bacia de contribuição de • Pelas mesmas razões, o Açude Castanheiro também foi excluí do pelos defensores da Barragem do Castanhão. O primeiro, se construído, teria um comprimento de 40 metros, encravado num boqueirão de 90 metros de altura. Ver foto na capa deste livro. A Barragem do Castanhão terá 7.770 metros de comprimento. Mais uma vez, em face do exposto, deixamos ao leitor a tarefa de tirar suas próprias conclusões.
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BACIA DO RIO JAGUARIBE E PRINCIPAIS SUB-BACIAS (CEARÁ)
IV O PROJETO DE IRRIGAÇÃO JAGUARIBE/APODI
4.1 - Erros e acertos de um grande projeto
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do anunciado Projeto de Irrigação da Chapada do Apodi, basta atentar para a drástica substituição de 75.000 hectares por um projeto piloto de apenas 5.000 hectares, dos quais, como já dissemos anteriormente, somente 1.750 hectares foram, efetivamente, implementados. Fornecendo detalhada análise histórica e técnica desse projeto de irrigação, que era uma das peças básicas da viabilidade econômica e parte proeminente do alardeado rol de benefícios da grande Barragem do Castanhão, vamos transcrever alguns trechos do trabalho publicado na Tribuna do Ceará, em três artigos, de autoria do professor e técnico do Banco do Nordeste do Brasil e ex-Prefeito de Limoeiro do Norte (CE), Pedro Alves Filho , sob o título “Erros e acertos de um grande projeto”. Vejamos, inicialmente, trechos do primeiro dos três referidos artigos, publicado no dia 15 de agosto de 1991: O Projeto de Irrigação “Jaguaribe-Apodi” se originou da edição do decreto federal n° 92.141, de 16/12/85. Este decreto subscrito por José Sarney e Flávio cerca de 47.000 hectares da Chapada do Apodi, nos municípios de Limoeiro do Norte e Quixeré.
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(...) Com essa desapropriação, o município de Limoeiro perdeu o controle administrativo de quase 28% de seu território – que passou à jurisdição federal sob a égide do órgão desapropriador, o Departamento Nacional de Obras de Saneamento – DNOS. Praticamente toda a área da Chapada do Apodi se foi nesta primeira empreitada do Governo Federal, sem nenhuma compensação de qualquer espécie para o Município. (...) Isto posto, e sob o comando do então Ministério Especial da Irrigação (leia-se Vicente Fialho), foi convocada a Cia. de Desenvolvimento do Vale do São Francisco - CODEVASF para fazer a implantação imediata dos colonos, rateando áreas, selecionando assentamentos prioritários. Em torno de 120 irrigantes (das 240 famílias atingidas pela desapropriação) foram reconduzidos às atividades agrícolas na Chapada. Os outros, passaram a depender de outras etapas do projeto. (...) Extinto o Ministério da Irrigação, bem como, o DNOS, tudo passou ao comando da Secretaria Nacional de Irrigação. E agora vai para o Depar tamento Nacional de Obras Contra as Secas – DNOCS. Este, pelo menos, tem econômicas imunes às secas. (...) Em termos físicos, o projeto Jaguaribe/Apodi apresenta algumas características que o marcam como interessante nos programas de irrigação. Quer-me parecer que é o primeiro e único em que a água é trazida,- mecani camente, do Vale para a Chapada, numa elevação de mais de 100 metros. Isso implicou de saída, na execução de uma estação de bombeamento, composta de cinco unidades de bombas aspiradoras-elevatórias, tendo, cada uma, - a po tência de 2.700 CV. E como um projeto puxa outro, projetou-se uma pesada subestação rebaixadora da ordem de 20 MW - igual aquela que abastece o Município de Limoeiro (zona urbana e rural). No topo da Chapada, foi construído um tanque reserva estratégico de água (cerca de 1.000m³). No Rio Quixeré, construiu-se uma barragem de acumulação, controlada por porta d’água, para suprir a casa de bombas. Coroando a obra, a casa de bombas é monumental: até auditório tem! Para visitantes, é de encher os olhos... No platô da Chapada, desenvolveram-se obras de distribuição de água: um extenso canal principal, já com quase 12 km, leva a água até o Município de Quixeré. E, desse canal, saem derivações para as “piscinas” que abastecem as máquinas de irrigação que são equipamentos de autopropulsão, apoiadas num pivô central, por onde recebem a água, a qual se distribui numa estrutura móvel que irriga em círculos de 50 a 100Um ha. equipamento sem falhar é projetado para locais onde é farta a água, a energia elétrica, e muito cara
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a mão de obra. Num Nordeste seco, com energia paga ao preço de energia urbana, e mão de obra quase de graça, a máquina denominada “pivô central” é deveras notável e, sem dúvida, causa impacto aos analistas... [o grifo é nosso]. Mas, como as obras se desenvolviam num ritmo de País Grande, ninguém prestou a mínima atenção a esses “pequenos detalhes”. E o projeto pareceu embalar: em poucos meses, as ondulações verdes de milho e algodão enfeitaria caprichosamente aquelas paragens até então secas e cinzentas. Os felizardos colonos que lograram voltar à Chapada se extasiaram perante tanta beleza, tanta promessa de riqueza rápida... No começo, tudo subsidiado, energia e máquinas quase de graça, o projeto iludiu a grande massa de irrigantes. (...) O sonho amanheceu, logo, numa realidade inesperada. O grande projeto reabriu sem demora, as novas perspectivas menos amplas, mas sombrias. E hoje podem ser analisados vários incidentes que vêm afetando a consolidação do empreendimento máximo do Vale do Jaguaribe e até a construção - do Cas tanhão. São falhas de concepção, de execução e de administração, que, a nível jornalístico simples, iremos abordar daqui por diante. No segundo artigo do ilustre professorPedro Alves Filho , publicado no Tribuna do Ceará, no dia 22 de agosto de 1991, ele fala, com muito conhecimento, do projeto que ele, democrática e despretensiosamente, se propôs analisar. Faz comentários sobre o desprezo dado aos técnicos nordestinos conhecedores da região, tendo sido chamados técnicos do Sul do país para gerenciar o grande empreendimento. Tudo era feito “em ritmo de país grande”, como já dissera o articulista no artigo anterior. Vejamos alguns trechos do seu segundo artigo: valioso conjunto de conhecimentos e experiências, tanto da parte dos nativos da Chapada, quanto dos engenheiros agrônomos locais e passaram a importar técnicos. Vieram os homens da Rural-Minas (que é que isso tem a ver com a Chapada do Apodi, meu Deus?), jejunos quanto às características da área e de sua gente. E o pior, foram entronizados como administradores do projeto. ha) para acolher todos os desapropriados, aos quais se acenara com-a possibili
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hoje explorada, enquanto o projeto piloto estimava em 5.000 ha a área a ser utilizada nesta primeira fase. Como numa comédia de erros, os irrigantes foram comprimidos sob os pivôs, e as áreas de cada um, variando entre 6 a 12,5 ha, se reduziram a 2,3 e um máximo de 6 ha. O projeto virou, assim, um formigueiro onde se atropelam pessoas de diferentes opiniões, esmagados, ainda, por uma expectativa ridícula de plantar 3 ha. E o pior, apesar de já terem sido sorteados e locados todos os irrigantes, ninguém está em seu local casas, silos, estábulos e outros, de interesse da atividade agropastoril. O terceiro e último artigo do professorPedro Alves Filho foi publicado no JornalTribuna do Cearáno dia 29 de agosto de 1991. Nele o articulista faz menção ao custo exorbitante da água do Rio Jaguaribe que chega à Chapada como sendo de Cr$ 10,00/m³ que convertendo ao dólar da época seria de US$ 0,026824/m³, ou seja, US$ 26,82/1.000 m³ que é a unidade usual para a avaliação do custo da água para irrigação. Vejamos alguns trechos desse interessante e histórico relato sobre esse projeto de irrigação: O problema da água - Foi lembrado, aqui, a singular condição do Projeto Jaguaribe/Apodi com relação à água, insumo em irrigação. O Jaguaribe/Apodi é abastecido pela água do Rio Jaguaribe, através de um “braço” chamado Rio Quixeré, que corre no sopé da Chapada do Apodi. A partir do Rio Quixeré, e uma vez acumulada na barragem de retenção de Pedrinha, no município de Limoeiro do Norte, esta água é bombeada e elevada até o topo da Chapada (107m de altura). A poderosa casa de bombas, um empreendimento notório dentro do programa, com 5 unidades de bomba cada uma com a capacidade de 2.700 CV, empurra tudo de serra acima, até o tanque estratégico. E daqui se distribui pela Chapada, por gravidade. Informações checadas ontem mesmo, o custo dessa água está por volta de se for considerar os investimentos feitos, anteriormente ao projeto, para que esta água chegue ao pé da Chapada, é de graça! Quanto não custaria, hoje, fazer o Orós? Qual é o valor do penoso desperdício deste imenso lençol de água em 300km, até chegar às Pedrinhas? Operacionalmente, no entanto, a água tem peso considerável nos custos dos irrigantes: cerca de 14% do total da planilha de custos (leia-se custeio, tão somente) de cada irrigante. É a posição percentual da água no conjunto dos itens que a compõem.
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Para chegar a este patamar, a orientação original veio de fora (sempre as coisas vem de longe) – da CODEVASF. Pode até ser que foi através deste preço que esta empresa está conseguindo esmagar e destroçar as plantações do ouvir as lamentações dos irrigantes de lá. Por isso, causa indignação que uma tabela relativa a um insumo de tamanha importância no Ceará seco, tenha que vir de fora! (...) No caso do nosso projeto, mesmo considerando suas características, a água está cara. E sabem por quê? – Nesse preço se embutem custos de energia elé trica, de pessoal do DIJA, das despesas de manutenção (ainda por demonstrar quanto seria realmente) A energia, que é o componente mais penoso, está ao preço da energia urbana, simplesmente porque o DIJA compra numa subestação alheia (a de Limoeiro), apesar de dispor de uma sensacional unidade de 20 MVA, cujos componentes estão apodrecendo, por ferrugem, obsolescência, lá nas Pedrinhas. Comprou-se tudo, mas não se montou nada até agora. Fizeram até uma linha de transmissão de 69 KV entre Russas e Pedrinhas (27 km), que está ociosa até hoje. Então, uma energia, que poderia estar sendo adquirida em alta tensão (menos onerosa), está custando, hoje, quase Cr$ 4 milhões por mês. E se joga todo este custo dentro do valor da água... (...) Sem essa correção, o preço da água continuará sendo um pesadelo, e, num projeto ainda em implantação, penosamente danoso para os resultados (...). Das informações acima, de acordo com os artigos que compõem o trabalho do referido professor, chega-se à conclusão de que, em 1991, ano em que este foi escrito, somente existiam em funcionamento no Projeto Jaguaribe/Apodi 750 hectares e 120 irrigantes. O custo mensal da energia consumida, referida no terceiro artigo, da ordem de Cr$ 4 milhões, se convertido ao dólar da época, representaria US$ 10.723,86, considerando a equivalência de 1 US$ = Cr$ 372,80, em 29/08/91. Segundo a reportagem do Jornal O Povodo dia 08 de julho de 1996, referida anteriormente, “quem tenta manter o projeto - e não consegue são as 320 famílias de colonos irrigantes assentadas nos 1.750 hectares, da primeira etapa. A maioria sobrevive do plantio de milho e feijão basica mente, em lotes familiares de, no máximo, 2,5 hectares”. [o grifo é nosso].
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4.2 - Aeroporto (internacional) da Chapada do Apodi Ao término deste capítulo, faremos menção à construção de um aeroporto na Chapada do Apodi, que diziam ter capacidade para receber aeronaves de grande porte. Vamos reproduzir a seguinte matéria do Jornal O Povo, do dia 05 de março de 1991 com o título:“Denunciado Sucateamento do Projeto de Irrigação” : Indignado com o abandono sofrido pelo Projeto, o deputado Paulo Duarte reclama da construção do Aeroporto Internacional da Chapada do Apodi. Por considerá-lo sem utilidade, ressalta que é preciso, antes de mais nada, desenvolver plantações na área. Como se construir um aeroporto para receber aeronaves de grande porte que deveriam fazer o transporte de produtos, se até hoje não foi plantado uma fruteira? 4.3 - A vergonha do século O Jornal Diário do Nordeste , sob o título “A Vergonha do Século” , nos meses de maio e junho de 1998, fez amplas reportagens sobre a seca, uma das mais severas deste século, que castigou as populações interio ranas. Sem dúvida, um importante trabalho de cunho político, social e cos e autoridades. Sobre o projeto Jaguaribe-Apodi, que interessa aos objetivos deste livro, destacamos os seguintes trechos: Projeto Apodi desperdiça verbas públicas Máquinas importadas dos EUA estão sucateadas e a pista de pouso usada para secagem de grãos Pelo menos este ano, com a seca reeditando as cenas de misérias e tragédias no campo, foi feita a coisa certa. No Projeto de Perímetro Irrigado Jaguari be-Apodi, onde já foram gastos US$ 56 milhões, as culturas de feijão e milho não somente dão bom lucro aos irrigantes, como representam uma valiosa oferta de grãos. (...) Na opinião de técnicos e irrigantes, o projeto tem sido marcado pelo desperdício de verbas públicas, sonhos de grandezas para o sertão e desmandos administrativos para aquilo que se concebeu como um modelo arrojado de produção agrícola para o semiárido nordestino. O Chefe da Divisão de Assistência aos Perímetros Irrigados, do Depar tamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), Ney Barros da Costa,
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é um dos primeiros a admitir: “a megalomania e o agronegócio ultrapassados impregnaram o Projeto Jaguaribe-Apodi. (...) Este foi um ano atípico, por conta da falta da quadra chuvosa. Mas nos anos anteriores, os irrigantes insistiram em culturas tradicionais e mal Com uma área irrigada projetada para ate 5.395 hectares, o Jaguaribe -Apodi, funciona, hoje, com pouco mais de um quinto de sua capacidade. Ao todo, são 1.750 hectares irrigados com pivô central, mas apenas cerca de 1.100 hectares estão ocupados com plantios exclusivos de milho e feijão. (...) Contudo, a pista de pouso, com 1.400 metros de comprimento, - cons truída para o Projeto, é o item que causa maior estranheza para os visitantes e até para os irrigantes. Na opinião do Chefe da Divisão de Assistência dos Perímetros Irrigados, trata-se de uma “estrutura megalomaníaca” e sujeita a pesadas criticas. Na verdade, a crítica provém até dos irrigantes, cerca de 315, os mais -Apodi (Cooipa), Raimundo Eriberto dos Santos, considera a pista de pouso como o maior dos absurdos envolvendo o perímetro irrigado. Nada mudou desde o ano de 1991, quando o técnico do Banco do Nordeste do Brasil, Pedro Alves Filho , teceu várias considerações sobre o Projeto Jaguaribe-Apodi.
anos, em apenas um ano o Projeto foi rentável, podendo-se atribuir este fato, à falta de competitividade das áreas de sequeiro castigadas por uma das secas mais rigorosas, em nossa região, nesses últimos 50 anos. Fica, portanto, patenteado que nós estávamos com a razão quando nos colocamos contrários ao Projeto de Irrigação da Chapada Apodi que, à época do seu surgimento, no ano de 1985, tinha como principal e que, atualmente, vem sendo utilizada como instrumento de propaganda e legitimação de poder. 4.4 - Conclusão Apesar de todos os fatos aqui narrados, ainda há os que não se-es quecem dos propalados benefícios da irrigação de 75.000 hectares na
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se colocar contrário a tal empreendimento? No mínimo, seria execrado: “São os inimigos do Ceará...” . A técnica mais utilizada é a de desclasNeste Capítulo IV desenvolvemos uma ampla discussão sobre o Pro jeto de Irrigação Jaguaribe-Apodi tomando como referência três artigos publicados no JornalTribuna do Ceará, no segundo semestre do ano de 1991, de autoria do professor e técnico do Banco do Nordeste do Brasil e ex-prefeito de Limoeiro do Norte (CE) Pedro Alves Filho . O referido articulista retratou, naquela ocasião, a situação quase falimentar em que se encontrava o referido empreendimento que, com o Açude Castanhão, fazia parte de uma nova estratégia, segundo a qual “O Nordeste tem que pensar grande”no conceito desenvolvimentista da “Nova República” que lançou Programa de Irrigação do Nordeste - PROINE, com o objetivo de irrigar um milhão de hectares na nossa região. Não é de se questionar a importância da irrigação. Como Diretor Regional do DNOCS, no início da década de 70, fomos um dos responsáveis pela implantação da maioria dos projetos desse gênero no estado do Ceará. Entre os quais mencionamos os Projeto de Irrigação de Morada Nova (cuja elaboração participamos, modestamente, junto à SUDENE, em Recife, nos anos 1967/68), Icó-Lima Campos, Quixabi nha (este participamos de todas as fases de sua elaboração) e Paraipaba, cuja implantação foi por nós iniciada no ano de 1972, sendo um dos mais destacados defensores desse projeto através da Missão de Israel em convênio de cooperação técnica junto ao DNOCS. Face ao exposto, quanto ao“Projeto de Irrigação do Jaguaribe/ Apodi”, deixamos ao leitor a tarefa de emitir suas próprias conclusões.
V A INSISTÊNCIA COM O CASTANHÃO
5.1 - O apoio político
A
pesar dos sólidos argumentos contrários, partidos de vários grupos
da Irrigação, Eng. Vicente Cavalcante Fialho, não desistiu da ideia de lidade básica viabilizar o ousado projeto de irrigação de 75.000 hectares na Chapada do Apodi, sobre o qual, atualmente, já não se fala mais. [1] desses dois empreendimentos (construção do açude e a irrigação da Chapada do Apodi) defendidos pelo Ministro Fialho tinham projeto
Uma delas, por exemplo: por que os projetistas consideraram, nos estu dos hidrológicos, a evaporação no espelho d’água do Açude Castanhão como sendo de apenas 1.700 milímetros, quando já era sabido ser de 2.228 milímetros, referenciados em estudos anteriores pelo Consórcio NORONHA/HIDROTERRA para o DNOS? Oportuno observar que no EIA/RIMA do Açude Castanhão, página 4.30, na Tabela 4.7,
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a evaporação é tida como sendo de 2.893,5 mm. Devemos esclarecer que tal dado, isto é, o da evaporação, corretamente utilizado, é básico para a elaboração dos estudos hidrológicos de qualquer obra hidráulica. Estes estudos indicam os possíveis benefícios que o açude pode oferecer para a irrigação e outros usos e se ele é ou não economicamente viável. A redução da taxa de evaporação real num estudo hidrológico de o projeto do Açude Castanhão, ao que tudo indica, diminuíram, propo poração em um açude no dizer deRay K. Linsley e Joseph B. Franzini no seu consagrado livroEngenharia de Recursos Hídricos : A construção de um reservatório também aumenta substancialmente a superfície da água exposta em relação à que existia nos cursos de água naturais, com o consequente aumento das perdas por evaporação. Como a evaporação, a partir de uma superfície livre de água, quase sempre supera o valor- da eva potranspiração real relativa a uma superfície de terreno, haverá, em geral, uma perda real de água em consequência da construção do reservatório. abandono do projeto de construção de um reservatório [o grifo é nosso]. Para o Ministro Vicente Fialho, a construção do Açude Castanhão e a irrigação da Chapada do Apodi eram duas obras vitais para o estado do Ceará, com repercussões em todo o Nordeste. Aliás, isto me faz lembrar que em uma das Audiências Públicas sobre a Barragem do Castanhão, no Conselho Estadual do Meio Ambiente - COEMA, houve a inter venção de um conselheiro que disse“o Brasil também será altamente Com tamanho exagero, o conselheiro e deputado estadual João Alfredo Telles Melo , ironizando, acrescentou que do primeiro semestre do ano de 1989, quase três anos após a primeira e frustrada tentativa de impor à opinião pública aquelas obras. O DNOCS que, até então, era um obstáculo, por determi nação do M i ni stro V i cente Fialho, teve seu Diretor-Geral, Uirandé Augusto Borges , substituído pelo engenheiroJosé Ribamar Simas de Oliveira , oriundo do quadro de funcionários do DNOS, de onde se originaram os referidos projetos.
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No auge das discussões, no ano de 1986, o DNOCS foi acusado de ser “contra” motivado por“ciúmes” dos seus técnicos às incursões do DNOS em sua tradicional área de atuação, no semiárido nordestino. Era o início de uma luta, tipo “vale-tudo” , para disfarçar uma questão até então vista sob o prisma “técnico-econômico” e transformá-la numa tese “político-partidária”. Para isso, mobilizou-se a opinião pública, através da mídia e de outros meios de comunicação. Iniciava-se, assim, no segundo semestre de 1989, uma nova fase em favor da Barragem “tratar-se de uma reivindicação de 80 anos da população cearense” , numa ardilosa referência a um acidente americanoRoderic Crandell, em 1910, a serviço da IFOCS - Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas. um local ideal para a construção de uma barragem. Existem muitos ou à construção de um açude. Até o ano de 1985, quando a Barragem do Castanhão surgiu no cenário cearense, o DNOCS jamais havia previsto qualquer reservatório de acumulação no Boqueirão do Cunha. Até aquele à Barragem do Castanhão, ou qualquer outra no local escolhido pelo DNOS para o projeto do mega açude. 5.2 - A retomada das discussões sobre os benefícios Sob o título “Castanhão: Diretor-Geral do DNOCS defende a constru ção”, o Jornal O Povo, de 20 de maio 1989, publica uma longa entrevista com o engenheiroJosé Ribamar de Oliveira Simas na qual ele ressaltou, de água da Região Metropolitana de Fortaleza, sem, contudo, citar qual a vazão que seria destinada para tal objetivo. Algum tempo depois, o DNOCS, através de sua Assessoria, informou à imprensa que a vazão seria de 10,5m³/s. Mas, se o Açude Castanhão só tinha disponibilidade para fornecer 12,35m³/s (era um dado da característica da barragem cios? Seriam excluídos? Por exemplo: a irrigação da Chapada do Apodi?
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Diante de uma situação tecnicamente embaraçosa, posteriormente, o DNOCS informou, através de um release, fornecido à imprensa, que o tal “reforço” seria de apenas 2,5m³/s. 5.3 - Vazão regularizada do Castanhão Outro tema bastante controvertido e que vai ocupar grandes espaços deste livro, é o que diz respeito à vazão regularizada do Açude Castanhão. Logo que surgiram as primeiras informações sobre esse empreendimento, fazia-se menção a uma vazão regularizada de 12,35 m³/s, valor este con “Programa para o Desenvolvimento da Agricultura Irrigada - Avaliação das Perspectivas para o Aproveitamento dos Recursos Hídricos e de Solo da Bacia do Jaguaribe - Brasília, abril de 1990”,publicação da Secretaria Geral da Organização dos Estados Americanos.Vejamos o seguinte trecho da referida publicação: Nestas condições, parece lícito pensar que antes de se tomar a decisão de implantar o Castanhão, seria interessante analisar a possível construção do Castanheiro, haja vista que, conforme os estudos disponíveis, as vazões - regula rizadas por essas duas obras seriam de ordens de grandeza semelhantes, isto é: - Castanheiro - 7,3m³/s - Castanhão, com NA min. de 85,0m - 11,1m³/s - Castanhão, com NA min. de 71,0m - 13,0m³/s Note-se que o Açude Castanheiro foi previsto pelo DNOCS para a bacia do Rio Salgado, abaixo da cidade de Lavras da Mangabeira, com 1,5 bilhão de metros cúbicos de água acumulada, enquanto o Castanhão, na cota l00m (cota de regularização), acumulará 4,5 bilhões de metros cúbicos. Portanto, três vezes maior do que o primeiro citado. Se “tamanho fosse documento” , como diz o adágio popular, a vazão regularizada do Açude Castanhão deveria ser três vezes maior do que a do Açude Castanheiro, ou seja, 7,3 x 3,0 = 21,9 m³/s. Mas não é! Porém, muita gente incorre (por desconhecimento técnico) neste engano, achando que, quanto maior for a barragem, maiores serão os seus benefícios. O conhecimento da hidrologia nos mostra esta contradição. Por oportuno, vamos transcrever a declaração correta do engenheiro Hypérides Macedo no Capítulo II, item 2.31: “A capacidade de irrigação de uma barragem tem mais a ver com o tamanho da bacia contribuinte do que com o seu volume”.
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5.4 - Conclusão • A vazão regularizada de um açude não é proporcional a sua maior ou menor capacidade de acumulação, mas depende, fundamental mente, das chuvas, do tamanho de sua bacia de drenagem (bacia posto ao sol e aos ventos. Para ser mais claro, hidrologicamente falando, a vazão regularizada de um açude será sempre a mesma, isto é, permanecerá lnalterada, por maior que seja a sua capacidade, acima de um determinado limite ideal de acumulação. Julgamos que essa capacidade ideal de acumulação do Açude Castanhão estaria entre 1,2 bilhão a 2,0 bilhões de metros cúbicos, no máximo. Este estudo comparativo, infelizmente não foi feito, embora tenhamos insistido em sua elaboração em várias oportunidades nas reuniões do COEMA. Um açude do porte do Castanhão não poderia deixar de ter a sua Curva Vazão regularizada x Volume de acumulação. • É preciso termos em mente que tudo no mundo tem um ponto de equilíbrio. No caso de uma barragem, este ponto de equilíbrio, isto é, sua capacidade ótima de acumulação, é determinada pelos com 2 bilhões de m³ de acumulação tem sua vazão regularizada determinada em 12m³/s. Passando para 4 bilhões de m³, sua va zão regularizada seria de apenas 16,00m³/s. Isto é, a capacidade de acumulação do açude dobrou, mas sua vazão regularizada não obedeceu à mesma proporção. • Já que se admite a construção do Açude Castanhão com 4,5 bilhões de metros cúbicos (cota 100m, isto é, a cota de regularização), o Açude Castanheiro poderia ser construído com 2,0 bilhões de metros cúbicos (em vez de 1,5 bilhão de m³) de acumulação d’água. Neste caso, o Açude Castanhão poderia, até mesmo, ser dispensado e o Castanheiro, em vez de 7,3m³/s, poderia proporcionar uma vazão regularizada em torno de 10 a 12m³/s (valores estimativos), ou seja, praticamente a mesma vazão regularizada do Castanhão. • A solução acima, evitaria a inundação de 70 quilômetros dos be nefícios atualmente proporcionados pelo Açude Orós, desde a cidade de Jaguaribe até o local da Barragem do Castanhão, não
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sendo necessária a construção da nova cidade de Jaguaribara, nem o deslocamento de 26 quilômetros da BR-116, de linhas de transmissão da CHESF (Companhia Hidroelétrica do Rio São Francisco) e, principalmente, a desapropriação de 65.000 hectares, [2] pois só este item poderá custar cerca de R$ 50 milhões . Sobre o relatório do geólogoRoderic Crandell, para a IOCS, em 1910, a respeito da construção de um açude na localidade Boqueirão do Cunha, no Rio Jaguaribe, transcrevemos o seguinte trecho do mesmo para ajuizamento do leitor:“Neste sítio pode-se construir uma represa, não talvez uma represa de armazenagem, porque não há bacia apropriada, porém ao menos uma barragem de diversão com alguma capacidade de armazena gem, para dirigir a água para os canais de irrigação propriamente ditos. A meses, de modo, a assegurar um constante suprimento d’água no tempo em que ela for necessária. Nem toda a água para esta irrigação poderá vir do [3] Açude de Lavras que entretanto suprirá uma parte dela”. (Transcrito do livro Castanhão− Do Sonho à Realidade(2007) de autoria do Eng. Agr. Francisco Pardaillan de Lima ). Expusemos fatos, inquestionáveis, razão pela qual deixamos ao leitor o encargo de tirar conclusões próprias sobre o presente capítulo.
3ª PARTE: ERROS E OMISSÕES, CONSEQUÊNCIAS
CAPÍTULO VI Erro inadmissível e comprometedor do projeto
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CAPÍTULO VII Castanhão: Redenção ou Elegia?
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CAPÍTULO VIII O Castanhão superdimensionado inviabiliza outros barramentos
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CAPÍTULO IX Barragens alternativas à Barragem do Castanhão
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CAPÍTULO X Desprezo à Legislação Ambiental
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VI ERRO INADMISSÍVEL E COMPROMETEDOR DO PROJETO
6.1 - A descoberta do erro
E
O P OVO, do dia 20 de maio de 1989, anexo à entrevista com o novo Diretor-Geral do DNOCS, José Ribamar de Oliveira Simas , foram apresentadas todas as características técnicas do Açude Castanhão, de acordo com o projeto na sua versão inicial, elaborado pelo DNOS, entre as quais destacamos as seguintes: • Evaporação Média Anual (reservatório): 2.228mm [1] • • Vazão Regularizada: 26,0m³/s ou 22,0m³/s, conforme o Orós esteja [2] ou não com suas comportas instaladas • Área do Reservatório (cota 100m): 228,79km² • Volume total do Reservatório (da cota 55m a 100m): 3.429,75hm³, sendo 2.229.75hm³ de volume útil e 1.200,00hm³ de volume morto • Nível Máximo (TR=10.000 anos): 110m (área total atingida pelo projeto)
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• • •
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Volume total do Reservatório: (da cota 55m à cota 108m): 6.200 hm³. Cota da crista (coroamento da barragem) 111m Cota de sangria: 95m para um volume de 3 bilhões de metros cúbicos. A cota 55m é a cota do leito (talvegue) do Rio Jaguaribe na seção
o leito do rio está a exatos 51,00 metros de altura acima do nível médio do mar. Também queremos chamar a atenção para o fato de que a cota cada para 108,80m, pelas razões expostas neste capítulo. (A abreviatura suportar uma lâmina de sangria de uma enchente para um período de retorno de 10.000 anos). Esse e outros erros graves, que serão comen tados neste livro evidenciam que o DNOS, naquele momento, não tinha os necessários conhecimentos das características hidrológicas e qualquer obra hidráulica. Antes de iniciarmos breves comentários sobre cada uma das carac terísticas do Açude Castanhão, acima referidas, devemos esclarecer que, num gesto espontâneo de cidadania, sem que isto representasse qualquer obrigação funcional como técnico do DNOCS, decidimos conferir a “Curva cota/área/volume” do Açude Castanhão. Essa curiosidade
tivemos com o engenheiroJoaquim Guedes Correia Gondim Filho , à época do DNOCS, que não acreditou que nós, sem qualquer aparelho de medi ção, pela si mples contemplação a olho nu, pudéssemos lançar dúvidas sobre os 228,79km2 da bacia hidráulica do Açude Castanhão, divulgados pelo DNOS. Foi assim que começamos a nos interessar por essa polêmica barragem. Para defender nosso ponto de vista, estivemos em Jaguaribara e, através do PrefeitoFrancisco Holanda Guedes DNOS (sede no Rio de Janeiro) nos enviasse uma cópia da restituição aerofotogramétrica da bacia hidráulica do Açude Castanhão. Isto foi, salvo engano, no início do ano de 1986. Como chefe da Divisão de Hidrologia do DNOCS (função que desempenhamos, alternadamente, por quase 30 anos), recomendamos ao desenhista Manoel Rodrigues Araújo, daquela Divisão, e a então estagiária Ana Tereza Mattos Marques hidráulica do mencionado açude. Era apenas um teste, em uma única
Erros e omissões, consequências
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total, a partir da cota 51m, do leito do rio no local da barragem, até a cota 100m, seria exaustiva e, certamente, prejudicaria outros trabalhos inerentes às atribuições da Divisão de Hidrologia, que estavam sob a ver com o DNOCS. O resultado do teste acima referido não nos surpreendeu. A área planimetrada, repetimos na cota 100m, pelos nossos dois auxiliares foi de 345,37km2, em vez de 228,79km2 Um erro inadmissível de 33,76%, incompatível com qualquer obra de natureza hidráulica que se queira projetar. O nosso descrédito em relação como estagiário no Serviço de Estudos do DNOCS e, posteriormente, como engenheiro, na sua sucessora Diretoria de Planejamento, Estudos e Projetos – DPEP, em Recife (PE), e em ambos os setores daquele Departamento, o erro admissível, em casos semelhantes, era de 0,5%. Desse episódio e de outros desacertos encontrados na Barragem do Castanhão e no Projeto de Irrigação da Chapada do Apodi, podemos concluir que os assuntos de natureza hídrica, envolvendo obras hidráu licas em nossa região, entre as décadas de 1950 e 1980, eram tratados com maior rigor e seriedade do que atualmente. Ao encontrarmos tão grave erro na concepção hidrológica do projeto do Açude Castanhão, levamos o assunto ao conhecimento do então Diretor-Geral Adjunto de Operações do DNOCS, engenheiro Vicente de Paulo P. Barbosa Vieira , que nos recomendou sigilo e, em seguida, telefonou para o Escritório Regional do DNOS, em Fortaleza, comuo seu Diretor, Ivan G. Vieira , que, por sua vez, ligou, na nossa presença, para a sede do DNOS no Rio de Janeiro para comunicar a surpreen dente descoberta. Durante muito tempo, não obstante a nossa posição contrária à Barragem do Castanhão, mantivemos sigilo sobre este caso. Entretanto, mais cedo ou mais tarde, nós teríamos a obrigação de comunicar o fato ao Prefeito de Jaguaribara, que nos dera todo o apoio para conseguir os mapas aerofotogramétricos que nos possibilitaram a realização do men cionado estudo, os quais, ainda hoje, guardamos em nosso arquivo pessoal.
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
6.2 - A revelacão do erro No mesmo dia 10 de abril de 1987, soubemos ter havido uma reunião, no gabinete do Governador do Estado, no Centro Administrativo Virgílio Távora, à qual estavam presentes, além do Governador Tasso Jereissati , o Ministro Vicente Fialho , o Prefeito de Jaguaribara,Francisco Holanda Guedes , o Vereador Silnê Dantas e várias pessoas de Jaguaribara, entre as quais a Irmã Bernadete Neves, uma líder inconteste no que se refere a salvaguardar os interesses das comunidades envolvidas nesta polêmica questão. O depoimento, a seguir, é da irmã Bernadete, relatando os acontecimentos havidos naquela reunião, de próprio punho, para este livro: Quando as pessoas de Jaguaribara começaram expondo os motivos de discordarem da obra, criticaram o erro da área na cota 100m de sua bacia Adênia Augusto Guimarães e Ir. Bernadete ao DNOCS, quando receberam a informação da própria Ana Tereza Mattos. Houve, então, uma insistência do Ministro para saber quem era- o res ponsável pela constatação desse erro e o prefeito Francini citou oDr. nome do Cássio. Nesse momento foi convocado o Diretor do DNOCS, Dr. Uirandé, e o Ministro o recomendou que Dr.oCássio fosse chamado a se explicar e Ir. Bernadete apresentou a seguinte proposta: em caso de erro Dr. Cássio do , que ele fosse quérito administrativo, e em caso de erro da empresa responsável, o contrato com a mesma fosse rescindido pelo DNOS. 6.3 - As consequências do erro A primeira consequência do erro é que, na cota 100m a área que era de 28,79km² passou para 328,00 km²[3] . Houve, portanto, um aumento de 99,21km² na área da bacia hidráulica do Açude Castanhão, que corres ponde a 42,05% a mais da área anteriormente divulgada pelo DNOS. Comparativamente era um acréscimo bastante superior à área total da bacia hidráulica do Açude Banabuiú que, na cota de sangria, é de 60km².
Erros e omissões, consequências
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Portanto, as perdas por evaporação, que já eram grandes, deverão ser bem maiores, muito acima das previstas. Existe uma máxima popular, com a qual concordamos, de que “não podemos perder uma só gota de água para o .mar” Esquece-se, porém, que um açude mal localizado pode perder para a atmosfera toneladas e toneladas de água por segundo, por evaporação. Qual a diferença das perdas entre uma situação e a outra? O espelho d’água do Açude Banabuiú tem 60,00km², por exem plo, e o do Castanhão 328,00km². O açude Banabuiú tem uma vazão regularizada de 11,00m³/s e a do Castanhão apenas 12,35m³/s, quase idênticas, apesar de este ser 6,7 vezes maior do que aquele. riormente: “pelo fato de uma barragem ser grande, não quer dizer que, também, sejam grandes os seus benefícios”.A grande perda d’água para a atmosfera por evaporação através de um açude mal projetado, por exemplo, pode causar prejuízos irrecuperáveis numa região já extrema mente carente deste precioso recurso natural. É por razões desta natureza que os estudos hidrológicos de um açude devem ser elaborados com o máximo rigor o que, infelizmente, não podemos dizer que tenha sido o caso do Açude Castanhão. 6.4 - O reconhecimento do erro Quando decidiram construir o Açude Castanhão, pensaram em outras alternativas? A resposta é:não. Ela é uma obra isolada, portanto, fora do contexto geral de planejamento do Vale do Jaguaribe. Sua concepção inicial foi única e exclusivamente destinada com o objetivo de irrigar 75.000 hectares na Chapada do Apodi, conforme vimos em capítulos anteriores. Não levaram em conta, os possíveis prejuízos que poderiam ocasionar ao Baixo Jaguaribe, os quais não existiriam caso fossem adotadas alter nativas ao projeto, como as existentes no planejamento do DNOCS, com a distribuição espacial e democrática da água em médias e grandes gem do Castanhão foi uma imposição do Governo do Estado do Ceará tendo à frente a sua Secretaria de Recursos Hídricos - SRH, a qual todas as decisões lhe eram submetidas, a maioria das vezes, até mesmo, sem a anuência dos técnicos do DNOCS.
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
Quanto ao erro da Curva cota/área/volume, ele somente foi reco nhecido no decorrer do ano de 1992, seis anos depois de sua descoberta. Não obstante, até hoje, não recebemos nenhum agradecimento por esta nossa contribuição. E o que é mais grave, no Plano Estadual de Recursos Hídricos, o erro persistiu, o que torna aquele documento inútil. A título de esclarecimento, devemos dizer que o documento deno minado “Programa Para O Desenvolvimento da Agricultura Irrigada - Avaliação Global da Bacia do Rio Jaguaribe”– Brasília, abril de 1990”, na página 120, refere-se à área da bacia hidráulica do Açude Castanhão, na cota 100m, como sendo de 228km², portanto sem a devida corre -
suas características físicas (dimensões da barragem, altura e volume) permaneceram inalteradas! 6.5 - Conclusão Neste capítulo, comprova-se que o projeto do Açude Castanhão conti nha inúmeros erros graves de engenharia, inadmissíveis para um órgão federal da importância e conceito, a nível nacional, do extinto DNOS. tários e o seu total despreparo para atuar na área do Polígono das Secas, tradicionalmente de responsabilidade e competência do DNOCS. Final e aceito de 328 km²) na determinação da área da bacia hidráulica (cota 100m) do Açude Castanhão, cometido pelo DNOS, do ponto de vista da engenharia, é inadmissível. Além dos aspectos, acima mencionados, até mesmo a taxa evapora ção citada pelo DNOS, de 2.228 milímetros, é questionada neste livro. Desta forma, pode-se concluir, a bem da verdade, que o Açude Castanhão inexiste como projeto dentro dos padrões tecnológicos de engenharia exigidos para uma obra hidráulica desta natureza que, a nosso ver, persistem até a edição deste livro (referimo-nos a primeira edição), portanto, quatorze anos depois de ele ter aparecido na comunidade
Erros e omissões, consequências
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
1)
AÇUDE CASTANHÃO - Relação Cota/Área/Volume COTA (m)
ÁREA (km
60
8
2
)
VOLUME (10 6 x m 3 ) 100
70
32
450
80
82
1200
90
178
2000
100
325
4450
110
550*
8700
2)
Capítulo XXVI,
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
128
3)
Observação:
VII CASTANHÃO: REDENÇÃO OU ELEGIA?
7.1 - Castanhão é discutido em Seminário
P
e outras Entidades, foi realizado, no auditório da Escola Técnica Federal do Ceará, nos dias 20, 21 e 22 de junho de 1989, um Seminário para discutir a viabilidade técnica e econômica da Barragem do Castanhão. Sobre esse encontro, destacamos o seguinte trecho, da página 49, do livro A Barragem do Castanhão e a Transposição do Rio São Francisco , de autoria do Eng. Agro . Evandro Bezerra , técnico aposentado do DNOCS: “Castanhão: Redenção ou Elegia?”, com esse título foi realizado nos dias 20, 21 e 22 de junho de 1989, no auditório da Escola Técnica Federal do Ceará, um Seminário para discutir a mencionada obra. Este seminário aconteceu com a participação de técnicos do DNOS, DNOCS, UFC, Sindicato dos Engenheiros do Ceará, Associação dos Engenheiros Agrônomos do Ceará, Fundação Chico Mendes, ESPLAR, Associação dos Geógrafos do Brasil e representantes das comunidades de Jaguaribara e Jaguaretama. (...) O que é lamentável é que, até aquela data, ainda não estava concluído o polêmico projeto, segundo pronunciamentoPaulo do Dr.Poggi, representante do DNOS. (...) Questionou-se que não tinha sentido aquele evento, uma vez que se discutia uma coisa que não existia [o grifo é nosso] e a população estava sendo enganada, principalmente, pelos políticos interessados na obra
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
de recursos hídricos, e os que mais defendem a construção da Barragem do Castanhão no porte alto, infelizmente. E “o povo” do Baixo Jaguaribe que Satiagraha de Mahatma Gandhi, isto é, da insistência pela verdade, pois é sabido que as enchentes do Vale do Jaguaribe somente serão resolvidas com Castanhão no porte médio, em série com o Orós. No dia 20 de junho de 1989, o Jornal O Povo, em matéria sob o título “Açude Castanhão é Tema de Seminário” , comentava o seguinte: Discutir com a comunidade cearense todos os aspectos de construção da Barragem do Castanhão. Esse foi o objetivo do seminário “Barragem do Castanhão: Redenção ou Elegia?” que foi promovido pela Associação dos Engenheiros Agrônomos do Ceará, Sindicato dos Engenheiros, Comitê Chico Mendes e Associação dos Geógrafos do Brasil. (...) No entanto, os representantes das associações promotoras do evento disseram que o Governo Federal não apresentou um projeto concreto, - especi (...) A comissão também fez uma denúncia com relação às pressões que alguns técnicos do DNOCS, que são contra a construção da barragem, vêm recebendo. Alguns foram, inclusive, ameaçados de demissão do órgão, dizem os denunciantes. 7.2 - O Castanhão vira tema político–partidário rejeitada pela comunidade técnica do estado, quatro anos depois de sua primeira aparição no cenário cearense, deixava de ser um tema- es sencialmente de natureza “técnico-social-ambiental” para ser um tema “político-partidário”. Foi neste contexto que a sociedade cearense, a partir da segunda quinzena de julho de 1989, viu, através da imprensa, um acirrado debate envolvendo o então Governador do Estado do Ceará, Tasso Jereissati e o Presidente da República em exercício e Presidente da Câmara dos Deputados,Paes de Andrade, não faltando, de lado a lado, expressões como“insultos” , “agressões”, “farsa” e outros termos pouco recomendáveis. Sem dúvida, um episódio lamentável que envolveu duas respeitáveis personalidades do mundo político do nosso estado. Ver
Erros e omissões, consequências
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Diário do Nordeste , de 17 e 20 de julho de 1989 e JornalO Povo, de 20 de julho de 1989 e edições posteriores. Esses desentendimentos entre o Governador e o Presidente da Re pública em exercício tiveram como origem as declarações do primeiro por ocasião daExposição de Animais e Produtos Derivados , realizado na cidade do Crato, no dia 16 de julho de 1989, quase um mês depois do Seminário realizado no auditório da Escola Técnica Federal do Ceará, quando, mais uma vez, a Barragem do Castanhão saíra derrotada. Pre o seguinte trecho doDiário do Nordeste , do dia 17 de julho de 1989: O governadorTasso Jereissatirompeu ontem com a linha ideológica e administrativa do PMDB ao falar contra a construção do Açude Castanhão, como objetivo enganar “o povo” do Ceará. Para que os leitores possam melhor avaliar as questões técnicas e políticas que envolveram a construção da Barragem do Castanhão até o engenheiro e então Presidente do Sindicato dos Engenheiros do Ceará, Francisco Luiz Parente Neiva , o qual foi publicado no JornalO Povo do dia 07 de agosto de 1989: Castanhão: Redenção ou Elegia? Passada a recente e escandalosa querela envolvendo o governador Tasso Jereissati e o deputado Paes de Andradesobre a Barragem do Castanhão, gostaríamos de emitir a nossa opinião, sem cair na mediocridade da briga, nem tampouco ver nossa posição confundida com as intenções de qualquer uma das partes envolvidas. Até o momento, o DNOS não apresentou o projeto da barragem, o que nos leva a crer que os estudos estejam ainda em fase de anteprojeto. No entanto, de tudo que tem sido colocado, depreendemos que: 1. A comunidade técnica e a população do Vale do Jaguaribe atingidas se ressentem de uma participação efetiva nos estudos e discussões; 2. Procedem, a nosso ver, diversos questionamentos técnicos, não podendo ser considerados satisfatórios os resultados dos estudos até agora apresentados; 3. Há carência de fundamentação técnica, comprovada através de estudos, principalmente), sem o que não deixam de ser subjetivas as opiniões emitidas;
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
4. A viabilidade do Castanhão, nos seus aspectos sociais e econômicos, deve ser avaliada não de forma isolada, mas sim, através da comparação com outras alternativas de aproveitamento dos recursos hídricos [o grifo é nosso]; 5. É necessário um estudo hidrológico mais abrangente e detalhado que montante, no sentido de comparar os custos e benefícios sociais e econômicos; 6. É imprescindível que sejam elaborados estudos geotécnicos e geológicos, uma vez que a área é sujeita a abalos sísmicos; 7. Não foi ainda elaborado o Relatório de Impacto Ambiental - RIMA, exigido pela legislação atual, que prevê ainda a sua discussão pública. Diante do exposto, a questão não se resume ao simplismo do “ser a favor ou contra”. A favor do quê e contra o quê? É preciso que tenhamos acesso aos estudos e projetos. É preciso que haja uma ampla e democrática discussão envolvendo técnicos e a população atingida. Neste sentido, é inadmissível qualquer postura de bloqueio de informações ou negativa de discussão por parte dos órgãos responsáveis. Somos a favor do progresso, de inovações que possibilitem melhorias nas condições de vida, obras que tragam benefícios para a população. Mas, “progresso” a qualquer custo, não! Melhorias só para alguns e pre juízos para a maioria, não! Somos contra a manipulação, o autoritarismo, a prepotência e o jogo torpe dos que pretendem transformar e confundir a sua vaidade e o seu interesse mesquinho no desejo legítimo da população. Queremos um Castanhão sim! Mas um Castanhão da redenção. Este, só poderá ser concebido com a participação da comunidade técnica e respeitando os legítimos interesses da população envolvida”. 7.3 - Conclusão • Observe o leitor que, pelo exposto, no ano de 1989, o Açude Cas tanhão ainda não existia, ou melhor, dizendo, ainda não existia projeto, isto é, quatro anos depois de ele ter vindo à tona perante a seminário realizado no Auditório da Escola Técnica Federal do Ceará, nos dias 20,21 e 22 de junho de 1989 foi promovido para discutir, como disse: o engenheiro agrônomo Evandro Bezerra ,
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no seu livro acima mencionado:uma “ coisa que não existia e a -po pulação estava sendo enganada, principalmente pelos políticos para • O Açude Castanhão, até meados do ano de 1989, estava circuns crito à esfera técnica/econômica/social e ambiental, quando, no início do segundo semestre do ano citado, passou a ser tema polí tico-partidário entre PSDB (Governo do Estado), versus PMDB (Presidente da Câmara Federal e da República, em exercício). Conclusivamente, o Açude Castanhão somente começou a ter substância téccnica para efetiva discussão no ano de 1992, quando,
Cabe ao leitor, ante o exposto, tirar suas próprias conclusões.
VIII O CASTANHÃO SUPERDIMENSIONADO INVIABILIZA OUTROS BARRAMENTOS
8.1 - A real capacidade de acumulação do Vale do Jaguaribe
V
imos que a vazão média anual do Rio Jaguaribe, na seção de cons trução do Açude Castanhão, é de 73,92m³/s que dá um volume
(período de 1939 a 1989)[1] . O D N O C S, durante mai s de ci nco décadas, até recentemente, dimensionava a capacidade de acumulação dos seus açudes utilizando as consagradas fórmulas de Francisco Gonçalves Aguiar , um dos engenheiros mais conceituados daquele Departamento mensionamento hidrológico dos açudes, desenvolvido por aquele técnico médio anual na seção onde se pretende construir um determinado açude. Nesta circunstância, no local de construção da Barragem do Castanhão, sem nenhum reservatório a montante, a capacidade máxima possível de acumulação seria de: 2 x 2,33 x 109m³ = 4,66 bilhões de m³. Valor este que pode ser acumulado em uma única barragem ou -dis tribuído, espacialmente, em várias outras, dependendo do planejamento
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
anual por 2,5 indicando, neste caso, que a capacidade de acumulação da bacia considerada está próxima da exaustão das reservas hídricas Castanhão, poderia ter uma capacidademáxima “ maximorum”de: 2,5 x 9 2,33 x 10 = 5,82 bilhões de m³. O total das acumulações dos açudes construídos e previstos para o Alto Jaguaribe e para a bacia do Rio Salgado já é bastante superior a esta capacidade máxima-maximorum de acumulações de 5,82 bilhões de metros cúbicos. Senão, vejamos: o Açude Castanhão, em sua versão atual, com 4,5 bilhões de m³ (cota 100m); o Açude Orós, com 2,0 bilhões de m³; o Trussu, com 280 milhões de m³ e mais 10 a 12 barragens de porte médio (ver quadro, na última página deste capítulo, de respon sabilidade da Secretaria de Recursos Hídricos, divulgado em 1993), já construídas ou previstas pelo DNOCS, teremos um total de cerca de 9,4 bilhões de metros cúbicos. Este valor é bastante superior, ou quase o dobro da capacidademáxima “ maximorum”possível de 5,82 bilhões de m³, anteriormente determinada. Caso as barragens, acima referidas, forem todas construídas, pode-se admitir que, no futuro, haverá uma super acumulação da ordem de 3,18 bilhões de m³ acima da capacidade máxima possível daquela região do Vale do Jaguaribe. Mais açudes, mais espelhos líquidos expostos ao sol e aos ventos, mais perdas d’água por evaporação. A assertiva acima, baseada em condicionantes empíricos empregadas com sucesso pelo DNOCS no Nordeste e frequentemente utilizados, há mais de meio século, nos conduz à seguinte e lógica conclusão: Ou se reduz drasticamente a capacidade de acumulação projetada para o de se construir outras barragens a montante desse reservatório. As duas soluções, em conjunto, são incomptiveis do ponto de vista das disponi bilidades hídricas. E o que é mais preocupante: com tantos reservatórios construídos teremos mais espelhos d’água e maiores serão as perdas por evaporação que poderão comprometer, no futuro, as disponibilidades hídricas do Vale do Jaguaribe. Para isto não acontecer, bastaria não colocar as 12 comportas auto máticas projetadas para o Castanhão, cada uma com 11,55m de altura.
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Uma decisão idêntica à que foi tomada em relação ao Açude Orós, cujas comportas teriam 7 metros de altura. Ver na página seguinte o esquema das comportas que serão colocadas no Açude Castanhão. 2,0 bilhões de m³, em vez da cota 207m, cuja acumulação d’água seria de 4, 0 bi lhões de m³ , para a qual, na reali dade, ele foi projetado pelo DNOCS na década de 50. 8.2 - O destino reservado ao Castanhão No item anterior, vimos que a Barragem do Castanhão, com 4,5 bilhões de metros cúbicos, na cota 100m, e a construção de 10 a 12 barragens que apresentamos no Conselho Estadual do Meio Ambiente - COEMA como alternativa de planejamento para o Alto Jaguaribe e a bacia do Rio Salgado, são incompatíveis porque não existe água-su do Castanhão já absorverá, conforme vimos, a totalidade dos recursos hídricos ainda passíveis de acumulação. Só com bastante tempo isto poderá ser comprovado. A rigor, o dimensionamento de um único açude, ou de vários outros pluviometria extremas como foram os de 1924, 1974 e, mais recentemente, o de 1985[2] . Hidrologicamente, o que é válido para o dimensionamento da capacidade ideal/máxima de acumulação de um reservatório é a média em grandes intervalos de anos, são incontroláveis e, portanto, indispo níveis para aproveitamento, como veremos neste capítulo. Citemos, por exemplo, o ano excepcional de 1985 quando passou na seção do Açude Castanhão 20,9 bilhões de m3. (Ver Capítulo XXI ). Como pode o Açude Castanhão contar com os excedentes do Açude O rós, se este, por exemplo, está no momento com quase 10 anos sem sangrar?[3] . Se o Orós está atravessando um período crítico, o Castanhão, se estivesse construído, também estaria. Nesses períodos críticos, não há
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excedentes de água, pois todos os açudes estão com as suas capacidades abaixo do nível de sangria. E quando há excedentes (o ano de 1985, por exemplo), todos estão cheios, não havendo necessidade de se ajudarem mutuamente. A propósi to, vamos transcrever o segui nte trecho conti do à página 39 do “Estudo Geral de Base do Vale do Jaguaribe - Política das Águas”, editado pela SUDENE, em 1967, ao referir-se aos anos de cheias extremas: Estas águas serão sempre irrecuperáveis, pois as cheias são geralmente con da capacidade de regularização levaria a uma capacidade de evaporação dos espelhos d’água livre dos açudes tal que absorveria o volume perdido por escoamento [o grifo é nosso]. Em outras palavras, não adiantaria superdimensionar a capacidade de acumulação dos açudes (ou construir um grande número deles, acima das potencialidades hidrológicas da bacia considerada), pois, neles, as águas que seriam excedentes para o mar se transformariam em vapor, subindo para a atmosfera pelo mecanismo da evaporação. Não haveria, comprovadamente, qualquer benefício. É o que ressalta o documento acima referido da SUDENE. crever, a seguir, um trecho do“Plano de Aproveitamento dos Recursos Hídricos do Nordeste - Fase 1”, Volume XIII (SUDENE), página 2.11: Conclui-se que, do total dos recursos, 32% a 16% irão ter ao mar, sem probabilidade de aproveitamento. Admite-se, portanto, que o aumento da capacidade regularizadora acima do limite máximo (84%) não trará- bene fícios em virtude do crescimento, da mesma ordem de grandeza, das perdas por evaporação nos reservatórios ampliados. Do Volume VIII, página 10.5do mencionado estudo da SUDENE (PLIRHINE), extraímos o seguinte trecho que consolida, inclusive, as razões das nossas preocupações quanto ao superdimensionamento da Barragem do Castanhão, que pode passar 20 ou mais anos consecutivos sem sangrar, conforme foi demonstrado na simulação hidrológica feita pela própria Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará: Em casos de superdimensionamento, com ocorrência mínima de sangria, incorre-se em alto risco de salinização da água com a degradação dos recursos.
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Esta observação é válida, também, para os pequenos e médios açudes. Nestes, como naqueles, a operação deve ser muito simples e não será com ela que se evitará aquela consequência desastrosa dos superdimensionamentos. Com escolha judiciosa da potencialidade máxima possível, reduz-se a níveis desprezíveis o perigo do superdimensionamento dessas estruturas [o grifo é nosso]. comprovar o acerto das posições que assumimos no Conselho Estadual do Meio Ambiente - COEMA quando se discutia, em Audiências Pú blicas, no decorrer do ano de 1992, a viabilidade ou não da Barragem do Castanhão. Para os defensores desse empreendimento, tal obra poderia ser cons truída, assim como, também, as de 10 ou 12 barragens de porte médio, capítulo. O fato de o Açude Orós já ter completado seu décimo ano sem sangrar[4] já demonstra isto: o Castanhão estará restrito apenas às águas originadas da bacia do Rio Salgado, até quando não se decida pela cons trução dos Açudes Castanheiro e/ou Aurora que, como dissemos acima, devem, ou já estão, a esta altura, descartados pelos atuais gestores dos recursos hídricos do Estado do Ceará. 8.3 - Conclusão • no rio principal, não é recomendável por duas razões principais: água segundo, porque cada uma delas criará mais um espelhoágua d’ de evaporação que, somados, podem atingir tal magnitude que as diminuir ou mesmo secar em proporções indesejáveis. • P ara comprovação do que aci ma foi referi do, pode- se tomar como exemplo o caso do estado da Paraíba, quando autoridades admitem
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
“destruir barragens, pois elas foram construídas em número excessivo e estão baixando o nível dos reservatórios” (Jornal do Commércio , de Recife (PE), de 21 de junho de 1998). • A decisão de construir qualquer açude projetado ou previsto para o Alto Jaguaribe (acima do Açude Orós) e na bacia do Rio Salgado, principalmente os Açudes Castanheiro e Aurora, deve ser cuida dosamente avaliado em face da existência doçude A Castanhão. Entendemos que estes dois últimos citados, como já dissemos anteriormente, se tornaram inviáveis, com o advento do çude A Castanhão que tirou deles todos os volumes d’água, oriundos do Rio Salgado que a eles seriam destinados. Cabe ao leitor emitir suas próprias conclusões. Nota do autor: O engenheiro Francisco Gonçalves Aguiar é homenageadoin memoriampela Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará quando da realização de Seminários ou Simpósios, que deveriam ocorrer anualmente, promovidos por aquela Entidade mediante a entrega de uma medalha com seu nome ao técnico que tenha mais se destacado, naquele ano na área de recursos hídricos em nosso estado. Entretanto, nestes últimos quinze ou vinte anos, tal comenda não foi entregue a mais nenhum cearense. NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
O Povo Capítulo I, item 1.4.
Erros e omissões, consequências
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TABELA I
BACIA
NOME DO AÇUDE
MUNICÍPIO
VOLUME (10 6 m³)
RIO/ RIACHO
252 25
61 ALTO JAGUARIBE
137 165 263 37 81 44 44 36 7 TOTAL
1.546 36 42 56 28
SALGADO / PORCOS
82 87 20 20 '
25 61 22
BANABUIÚ BAIXO JAGUARIBE
108 TOTAL
1.087
TOTAL
3.083
Nota do autor: Dos açudes acima previstos, o único construído, após esta divulgação (avulsa) da SRH/CE, foi o Açude Trussu. A tabela acima data do ano de 1993.
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
OPÇÕES DE BARRAMENTO A MONTANTE DO AÇUDE ORÓS - VALE DO JAGUARIBE (CE)
IX BARRAGENS ALTERNATIVAS À BARRAGEM DO CASTANHÃO
9.1 - O estudo feito pela SIR AC
C
de ponderável parcela dos componentes do COEMA e da comunidade de Jaguaribara, quanto ao obrigatório cumprimento da legislação ambiental, que esta, consubstanciada na elaboração do EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Respectivo Relatório), na Lei 6.938/81, no Decreto 99.274/90 e na Resolução 001/86 [1] do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), o DNOCS lançou a Carta Convite de N° 11/90 - DGO, de 28 de novembro de 1990, com o objetivo de estudar, como alternativa à Barragem do Castanhão, a construção, no Alto Jaguaribe e na bacia do Rio Salgado, de 10 a 12 açudes de porte médio, conforme nossa proposição naquele colegiado. À referida licitação, a nível local, concorreram a SIRAC, a AGUASOLOS e a GEONORTE, coincidentemente tendo saído vencedora a primeira justamente ( a mesma empresa responsável pela elaboração do EIA/RIMA da Barragem do Castanhão ). mento apresentado pela SIRAC - Serviços Integrados de Assessoria e Consultoria Ltda., em decorrência da supracitada Carta Convite. Nossa
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análise ao “Estudo de Alternativas da Barragem do Castanhão” , de novembro de 1990, teve como objetivo atender à solicitação de membros da comunidade de Jaguaribara, tendo à frente a admirável e incansável Irma Bernadete Neves, que contribuiu, com muita determinação e coragem, até quando pôde, na resistência daquela indefesa população à construção do referido reservatório. Esse documento, por nós elabo rado, foi enviado à SEMACE através da comunidade, tendo em vista a 2ª Audiência Pública sobre a Barragem do Castanhão , realizada em 27 de abril de 1992: Antecedentes Em 1986, o DNOCS lançou Concorrência Pública, em nível nacional, de N° 34/86 - DGO com vistas à“Racionalização e Otimização do Apro veitamento dos Recursos Hídricos do Vale do Jaguaribe – Ceará” , a qual abaixo dos apresentados pelos outros concorrentes. Essa empresa, entretanto, não se mostrou, na realidade, interessada na assinatura do respectivo con trato, deixando transparecer que seu intuito era somente o de obstacularizar as iniciativas do DNOCS no Vale do Jaguaribe. O DNOCS mantinha, à época, uma disputa de supremacia na região nordestina com o DNOS - - De partamento Nacional de Obras de Saneamento que pretendia entrar numa área que não era de sua jurisdição institucional. Considere-se que a HIDROSERVICE cumpria, então, com o DNOS contratos de projetos relacionados à Barragem do Castanhão: da irrigação de 75.000 hectares na Chapada do Apodi e da Transposição de Vazões do Rio São Francisco para o Nordeste brasileiro. [2] Considere-se, também, que o Ministério da Irrigação apoiava, de forma incondicional, as investidas do DNOS na área de atuação do DNOCS, até porque esses empreendimentos eram, naquela ocasião, considerados planos prioritários do Governo Federal para o Nordeste e, particularmente, para o estado do Ceará. Em razão do apoio irrestrito do Ministério da Irrigação ao DNOS, o DNOCS, subordinado a esse Ministério, deixou caducar a mencionada concorrência, perdendo-se, naquela ocasião, segundo nossa visão, uma grande oportunidade de se ter um estudo sério, compatível com os mais altos interesses de toda a população do Vale do Jaguaribe. A essa concorrência, repetimos, a
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do nosso país no campo da hidráulica e da hidrologia, o que comprovava a seriedade e a transparência dos objetivos propostos [o grifo é nosso]. O que se pretendia, basicamente, naquele estudo, era a realização da análise de um número razoável de alternativas e hipóteses de aproveitamento integral dos recursos de água e solo, considerando todos os reservatórios construídos, projetados e previstos para a bacia de todo o Vale do rio Jaguaribe, inclusive seus usos atuais e futuros. [3] A verdade é que, ainda hoje, decorridos mais de seis , anos desde quando foi lançada a Concorrência N° 34/86 - DGO/G, a Barragem do Castanhão continua sendo polemizada e o projeto de irrigação de 75.000 hectares na consta mais dos planos do DNOCS e da Secretaria de Recursos Hídricos, conforme se, depreende do Relatório de Impacto Ambiental - RIMA-da Bar ragem do Castanhão, posto sob julgamento no Conselho Estadual do Meio Ambiente - SEMACE. mente alta, portanto com uma capacidade exagerada de acumulação de água, para poder reduzir a altura de bombeamento para a Chapada do Apodi, de não só por razões hidrológicas (não tinha e até hoje nãoCurva tem ade Permanência dos Níveis D’águada barragem), como também por existirem do que as localizadas na Chapada do Apodi, conforme tese defendida pelo engenheiro agrônomo do DNOCS, Evandro Bezerra . vieram, de fato, a ser comprovadas e aceitas. Tanto que constam, atualmente, do Relatório do EIA/RIMA da Barragem do Castanhão. Esse Relatório-des carta, totalmente, o projeto de irrigação da Chapada do Apodi, conforme se depreende do Capitulo 5 - O PROJETO, páginas 5.2 e 5.3, combinado com o Capítulo 6 - JUSTIFICATIVA ECONÔMICA DO PROJETO, páginas 6.2 e 6.3 dos Tomos I-A e I-B, respectivamente. Ver, também, o Capítulo 6.2 – USO MÚLTIPLO DO EMPREENDIMENTO, página 6.6 do Tomo-B.
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Mudanças de objetivos Castanhão, que veio à posteriori da solução enfaticamente anunciada que era a irrigação da Chapada do Apodi, é o reforço para o abastecimento de água para a cidade de Fortaleza que, não tem nada a ver com a altura, nem com o seu exagerado volume de acumulação. Parece-nos que este foi mais um astucioso jogo de “marketing” para angariar a simpatia da população fortalezense e chamar a atenção dos políticos para esta obra que vai desalojar cerca de 15 mil pessoas em quatro municípios, por razões que, até hoje, não nos convenceram. (Ver o livro “CASTANHÃO do Sonho a Realidade”, de Francisco Pardaillan Farias Lima , página 246, edição publicada em 2007). A propósito, o Governo Estadual já deve ter iniciado a construção do Açude Pacajus, o primeiro de uma série de três que comporão o sistema Cho ró-Aracoiaba que garantirá o abastecimento de água à Região Metropolitana que, mesmo sem o Castanhão, dos 12, 00 m³/s regularizáveis pelo Açude Orós, existem atualmente disponíveis no Baixo Vale cerca de 8,00 m³/s, por sinal, com muito pouco uso. Estudo das alternativas O Estudo de Alternativas da Barragem do Castanhão , elaborado pela - DGO, de 28/11/90, não atende aos mesmos requisitos da Concorrência N° 34/86 - DGO, de 1986, também da iniciativa do DNOCS, à época, tendo como Diretor-Geral o engenheiro Uirandé Augusto Borges . Esta paulista não se mostrou interessada na sua assinatura, apesar de terem sido reiteradas vezes convocada pelo DNOCS. Havíamos dito anteriormente, que a HIDROSERVICE havia ganhado essa concorrência por ter ofertado propositadamente um preço muito baixo para a elaboração desse estudo, razão porque, ela própria não se interessou em assinar este contrato. Na realidade, a HIDROSERVICE estava mais interessada era nos contratos já assinados com DNOS também para o Vale do Jaguaribe. Essa pendência demandou meses de paciente espera, quando ocorreu a substituição do Dr.Uirardé Augusto Borgesno cargo de Diretor-Geral do DNOCS pelo engenheiro José Ribamar de Oliveira Simas, oriundo do
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quadro de técnicos do DNOS. Entretanto, uma vez havendo a desistência da [4] segunda colocada , no caso a HIDROESB - Saturnino de Brito S.A., do Rio de Janeiro, com mais de 50 anos de grandes serviços prestados à engenharia brasileira. Não há dúvida de que, em toda essa intrigante e estranha situação, houve jogo de interesses inconfessáveis... Mas a grande prejudicada foi mesmo a população do Vale do Jaguaribe. (...) A título de esclarecimento, gostaríamos de dizer que os estudos - elabora dos pelo Consórcio HIDROSERVICE/NORONHA para o DNOS indicaram que, no Rio Jaguaribe, na seção da Barragem do Castanhão, a vazão média
médio anual de 2,33 bilhões de m³. O que fazer com esses 2,33 bilhões de m³ que passam, em média, anualmente, na seção da Barragem do Castanhão? Método tradicional de dimensionamento de reservatórios O método tradicional, utilizado há mais de 50 anos pelo DNOCS, de dimensionamento hidrológico de barragens, em todo o Nordeste brasileiro, o qual vem resistindo a todas as análises críticas que lhe têm sido feitas,- é funda mentado nas consagradas fórmulas Francisco de Gonçalves Aguiar[5], muito conhecidas em todas as organizações de engenharia de nossa região. Graças às conhecidas “Fórmulas de Aguiar”, válidas para a nossa região, é possível calcular, com satisfatória aproximação, a capacidade ideal de acumulação de uma determinada barragem que se queira projetar. Para isto, deve-se - mul riacho onde se pretenda que a mesma seja localizada. Assim, para sabermos o volume “máximo maximorum” que se pode acumular no Rio Jaguaribe no
2,5 x 2,33 x 10 9 = 5,82 bilhões de m³ (1) Este valor, assim encontrado, destina-se a todas as barragens existentes, de suas respectivas acumulações não deve ser ultrapassado. Como já existem construídos os açudes Orós, Atalho II, Quixabinha, Lima
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Floresta, Ema, Joaquim Távora, Umari e outros que totalizam 2,70 bilhões de m³ acumulados na bacia do Açude Castanhão (sem contarmos com cerca de 3.000 pequenos açudes), o que ainda se poderia estocar na referida bacia seria: 5,82 - 2,70 = 3,12 bilhões de m³ (2) Neste documento do DNOCS/SIRAC, que estamos analisando, só o volume da Barragem do Castanhão já aparece com 4,45 bilhões de m³. Tal constatação descarta consequentemente os seguintes açudes citados no “Estudo próprio de 6 Alternativas da Barragem do Castanhão”:Arneiroz II (139,90 x 10 m³), Aurora (873,10 x 106 m³), Farias Brito (197,50 x 10 6 m³), Bastiões (136,70 9 x 106 m³), Poço dos Paus (1,50 x 10 m³) e Trussu (300 x 106m³), os quais totalizam 3,14 bilhões de m³ (ver desenho na página seguinte mostrando as opções de barramento no Alto Jaguaribe a montante do Açude Orós). Ainda sobraria água para o Castanhão? Diante dos fatos acima, o que sobraria de água para o reservatório do Castanhão, se optarmos pelas barragens alternativas? Se levarmos em consideração os açudes existentes que , como -vimos, acu mulam, atualmente, 2,70 bilhões de m³ e mais os relacionados e previstos neste documento do DNOCS/SIRAC, teremos um volume total comprometido de: 2,70 + 3,14 = 5,84 bilhões de m³ (3) Nesta situação, não sobraria nada para o Açude Castanhão, isto é, - a acu mulação atualmente existente (2,70 bilhões de m³) e mais a prevista (3,14 bilhões de m³) já é superior à capacidade “máxima maximorum” permitida de 5,82 bilhões de m³, indicada na equação (1). O que nos parece estranho é que outros açudes, também previstos pelo DNOCS em algumas sub-bacias importantes do Alto Jaguaribe e bacia do Rio Salgado, não foram sequer citados neste estudo do DNOCS/SIRAC, tais como o Jucás, Castanheiro (1,5 bilhão de m³), Umbuzeiro entre outros. Só te, não diria para comprometer totalmente a capacidade de acumulação do 3 Açude Castanhão em 4,5 bilhões de , mas m obrigar uma redução drástica e considerável deste valor.
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Conclusões (...) Após sete anos de discussão, para nós, as questões em torno do Açude Castanhão voltam à estaca zero. Na nossa opinião, a solução que atenderia os melhores interesses do estado do Ceará seria o das barragens alternativas, margem direita. Também, ecologicamente, seria a melhor solução. Por isso, o Quadro 4.3, da página 4.18 do estudo em referência, nos pareceu fazendo apenas hipóteses variáveis de acumulação única e exclusivamente na seção da própria Barragem do Castanhão, sem considerar as barragens existentes, projetadas e previstas na mesma bacia. O que é inadmissível, se este estudo visava admitir a hipótese de acumulação do Açude Castanhão na cota 80m (1,2 bilhão de m³), solução indicada pela maioria dos Conselheiros do COEMA [6] , ele pecou por considerar, erroneamente, que na referida cota, a barragem somente poderia acumula 758,3 milhões de m³, em vez de 1,2 bilhão de m³. Isto porque tanto a Secretaria de Recursos Hídricos, como a SIRAC, até então não queriam reconhecer o erro absurdo de 30,49% da Curva cota/área/volume do Açude Castanhão, que já havíamos detectado no início do ano de 1986. Em outras palavras, tudo que se falou até aqui sobre esse empreendimento, não tem nenhuma consistência técnica por falta de dados o propósito deliberado de confundir a opinião pública cearense(...). (...) Em face do exposto, julgamos que devemos insistir na solução das barragens alternativas, pela possibilidade de perenizar mais de 700 quilôme tros de rios nas regiões mais secas do estado, promover a distribuição espacial da água, democratizá-la, fazendo com que maior número de municípios e propiciam em termos alimentares de proteína animal para as populações carentes. Esta solução não prejudica se for necessário destinar 2,5m³/s para reforçar o abastecimento de água de Fortaleza e criar condições em todo o Vale de atração daquela população para a nossa capital que poderá vir a se tornar, no futuro, uma megalópole. Uma solução também pode acabar ou reduzir de
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(...) É nossa convicção que as barragens alternativas, construídas no cristalino, portanto, praticamente sem fundação, todas elas em - con junto têm custo total muito menor do que a do Castanhão no porte alto. Esta será construída em terreno aluvional, de grande espessura e poderá atingir mais de 30 metros de profundidade, conforme comprovado nos estudos geotécnicos. Todas essas barragens, inclusive a do Castanhão se construída com 1,2 bilhão de m³(cota 80m), resolveriam também a questão das inundações em todo o Vale e não somente no Baixo Vale, já que a Barragem do Castanhão está situada a apenas 150 quilômetros da foz do Rio Jaguaribe que tem seu curso estimado em cerca de 750 km de extensão total. Devemos, mais uma vez, lembrar que no local do Açude Castanhão, o Rio Jaguaribe já -está pe renizado pelos açudes Orós e Banabuiú, portanto a sua bacia hidráulica vai destruir cerca de 70 quilômetros de férteis terrenos ribeirinhos que já estão Não é preciso dizer que as barragens alternativas promoverão um impacto ambiental muito menor, por razões que nos parecem óbvia. No momento em que alguém nos convencer de que a Barragem do Castanhão, no porte alto, é a melhor solução para o estado do Ceará, passaremos a ser o defensor número um desse empreendimento. A dura verdade é que o documento da SIRAC, não atendeu às exi gênci as da legi slação ambi ental pelos erros graví ssi mos e omi ssões, acima referidas, e também porque, em vez de um “Estudo de Alternativas à Barragem do Castanhão”, foi apresentado um “Estudo de Alternativas da Barragem do Castanhão”, portanto, sem levar em consideração as 10 a 12 barragens que lhe serviriam de alternativa de planejamento. Por tanto, os objetivos previstos pelo DNOCS ao lançar a Carta Convite desvirtuada. E a única voz levantada contra este inconsistente docu mento apresentado pela SIRAC foi a nossa, já que todos os órgãos do governo estadual e a comunidade técnica diretamente envolvida no tema dos recursos hídricos do Estado do Ceará, sob a égide da Secretaria de Recursos Hídricos - SRH, estavam, ostensivamente, empenhados na aprovação pelo COEMA do referido empreendimento. É inadmissível que a solução da Barragem do Castanhão, com uma acumulação de 1,2 bilhão de m3, na cota 80m, não tenha sido estudada, conforme nossa insistente proposição. Também é inadmissível que a SIRAC nos estu-
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dos por ela realizado de “Alternativas à Barragem do Castanhão” tenha milhões de m3, quando o certo (corrigido por nós desde o ano de 1986) era, de fato, 1,2 bilhão de m3, conforme comentamos nas Conclusões do documento acima transcrito. Com isto, perdeu-se uma excelente oportunidade de se saber qual seria a vazão regularizada do Castanhão na referida cota. Mas, analisando toda a documentação existente, tudo nos leva a crer ser praticamente a mesma (em torno de 12m³/s) da que será oferecida pelo referido açude, com 4,5 bilhões de m³. Mas este valor teria que ser, necessariamente, estudado e comprovado. Nunca, em hipótese alguma, descartado o seu estudo por uma falsa e irresponsável alegação de que na cota 80m o Açude Castanhão somente acumularia 758,3 milhões de m3. Imperdoavelmente, esta solução das barragens alternativas foi descar esta barragem já surgiu, no ano de 1985, superdimensionada. Portanto, esta, por si só, inviabiliza as demais. 9.2 - Conclusão O nosso objetivo, ao alertar os Conselheiros do COEMA para a necessidade de se proceder um estudo profundo da Barragem do Casta nhão, levando-se em conta as recomendações contidas na Legislação Ambiental, não foi alcançado. A análise do documento apresentado pela SIRAC pelo menos serviu para reacender os debates. Em boa hora, a SEMACE, pressionada pelos Conselheiros do COEMA, de cidiu pela contratação de dois técnicos para estudar e dar parecer de “per-si” sobre o EIA/RIMA desse empreendimento.
Como sempre fazemos, deixamos ao leitor tirar suas próprias con clusões.
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Nota do autor: A Curva de Permanência dos Níveis d’Água de um açude, a que nos referimos no sétimo parágrafo do -do cumento acima transcrito, é um estudo indispensável obtido a partir da operação simulada do reservatório em longos períodos
ou muito abaixo de sua capacidade normal, podendo atingir o seu volume morto. No caso do Açude Castanhão, quando o seu volume de acumulação atingir níveis muito baixos, próximos do seu volume morto, torna-se impraticável, economicamente, o bombeamento da água para o topo da Chapada do Apodi, ou melhor dizendo, para o Projeto de Irrigação da Chapada do Apodi. Em que proporção do tempo, ou do período estudado, isto pode ocorrer? Só o estudo acima referido, isto é, a curva de permanência de níveis d’água poderia responder. Estess estudos, em geral, são obtidas a partir de, no mínimo, trinta anos de ob -
P.S.
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
X DESPREZO À LEGISLAÇÃO AMBIENTAL
10.1 - Os erros técnicos do Estudo da SIR AC/V BA
C
omo dissemos no capítulo anterior, o estudo denominado “Estudo de Alternativas da Barragem do Castanhão” SIRAC - Serviços Integrados de Assessoria e Consultor Ltda., o qual visava atender à legislação ambiental, não correspondeu às exigências da referida lei, pelas seguintes razões: 1. Não contemplou “todas as alternativas tecnológicas e de localização do projeto, confrontando-as até mesmo com a hipótese de não -exe cução do mesmo”, conforme a Resolução 001/86, do CONAMA. O próprio título dado ao estudo da SIRAC, isto é, “Estudo de Al ternativas da Barragem do Castanhão” demonstra que não foi feita nenhuma consideração com respeito às “alternativas à Barragem Castanhão”. Há uma diferença de conceituação muito grande entre os dois títulos e seus objetivos. Lamentavelmente, o estudo con creto, como manda a Legislação Ambiental, exigido pelos Conse lheiros do COEMA, que era, de fato, o “Estudo de Alternativas à do-se, ou perdendo-se a oportunidade, de analisar a possibilidade de construção de outros barramentos (alternativos à Barragem do Castanhão) distribuídos espacialmente na bacia do Rio Jaguaribe. O documento elaborado pela SIRAC limitou-se a conside-
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rar, simplesmente, as alternativas da própria Barragem do Cas tanhão em sua seção de construção, ou seja, “nas suas cotas alternativas” (página 4.18), portanto, nas cotas 100m, 95m, 85m e 80m. Dessa forma, a construção de 10 a 12 barra gens de porte médio que propusemos no COEMA como alternativa à Barragem do Castanhão, sequer foi considerada. Conforme foi dito anteriormente, uma dessas 10 a 12 barragens seria a do próprio Castanhão, na cota 80m, com 1,2 bilhão de m³ de acumulação. Na Curva cota/área/volume, que foi divulgada pelo DNOS, no início das discussões, no ano de 1986, o Açude Castanhão, na cota 80m, aparecia com um volume de apenas 758,3 mi lhões de m³. Este último valor, embora reconhecidamente errado, “Plano Estadual de Recursos Hídricos” , editado em 1992, constituindo-se em um descaso, diríamos, um abusivo zões, o subtítulo deste livro: “Em Defesa da Engenharia Nacional”. Tal alternativa, se tivesse sido levada na devida conta no plane jamento global do vale do Rio Jaguaribe, certamente mostraria que além de reduzir os impactos sócioambientais, teria evitado a submersão da cidade de Jaguaribara e o deslocamento de 26-qui lômetros da BR-116, etc. além de ter um custo bem menor. Esse estudo iria mostrar, também, as consequências determinantes da viabilidade ou não, do Projeto Castanhão, principalmente, por causa das suas exageradas dimensões, levando-se em conta o porte hidrológico do Rio Jaguaribe. Ademais, esta barragem surgiu no cenário do Vale do Jaguaribe de forma surpreendente, parecendo a todos técnicos que então militavam na área de- re cursos hídricos no estado do Ceará, uma obra isolada, portanto fora do contexto global do planejamento, até então existente, para aquela rica e promissora região do estado do Ceará. 2. O estudo elaborado pela SIRAC, ademais, tornou-se um documento inválido, portanto inútil em não corrigir o erro (inacre ditável) daCurva cota/área/volumede 30,49%, que encontramos na cota 100m e que foi denunciado, por nós, através de artigos publicados nos jornais de Fortaleza, nas reuniões do COEMA e em 1989, por ocasião do Seminário patrocinado pelo Sindicato dos Engenheiros sob o título:“A Barragem do Castanhão: Redenção
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Ou Elegia?, realizado no auditório (lotado) da Escola Técnica Federal do Ceará, nos dias 20, 21 e 22 de junho daquele ano. E o mais deplorável foi constatarmos que, também noPlano Estadual de Recursos Hídricos , este erro foi desconsiderado, provavelmente para não dar guarida aos nossos comentários, ou o de não dar o “braço a torcer”, por ter sido de nossa autoria a grave e dura denúncia. Isto é ou não uma inominável irresponsa bilidade? Ressalte-se que o DNOCS não tem nada a ver com isto. Qualquer técnico em Recursos Hídricos sabe que todo projeto de uma barragem depende, fundamentalmente, de sua Curva cota/área/volume , ou seja, da geometria de sua bacia hidráulica. ponto de vista do seu dimensionamento hidráulico e hidrológico, se tomarmos como referência oPlano Estadual de Recursos Hídricos. 3. gina 1340 do Volume “Planejamento”, do referido “Plano”. Lá encontramos que a Barragem do Castanhão, na cota 80m, acu mula 758,3 milhões de m³, quando pelaCurva cota/área/volume corrigida, é, na realidade, 1,2 bilhão de m³. Só este detalhe já é inútil e desprezível. Aqui o erro chega a ser da ordem de 36,84%. Em caso de dúvida, recomendamos consultar o referido “Plano”, na Biblioteca do DNOCS, da SRH/CE ou da SEMACE. 4. Outro erro imperdoável é o relativo à média anual da evaporação que foi considerada nos estudos hidrológicos do Açude Castanhão, ou melhor, na “Simulação da Operação do Reservatório do Castanhão” , realizada pela SIRAC no período de 1939 a 1989, portanto, num período de 50 anos. Embora este assunto tenha sido comentado em várias partes deste livro, por sua gravidade, queremos relembrar que, no referido estudo, a evaporação média anual foi considerada como sendo de apenas 1.700 milímetros, quando deveri a ser de 2. 228 mi lí metros, segundo documentos originais do DNOS. Este fato, também invalida todos os estudos da SIRAC para o Vale do Jaguaribe e, por via de consequência, o Plano Estadual de Recursos Hídricos (1992), que incorreu no mesmo e inacreditável erro.
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5. No Capítulo XVII, item 27.1 sobre este assunto da evaporação, inclusive transcrevemos um trecho do livro Castanhão− Do Sonho à Realidade, editado em 2007, de autoria do engenheiro agrônomo Pardaillan de Farias Lima, “As condições-cli máticas da área induzem a elevadas taxas de evaporação que atingem mais de 2.800 milímetros anuais”. 10.2 - O erro da SIR AC/V BA
foi proposital? Ou não?
Mas tudo tem sua razão de ser. Por que foram cometidos erros de enge nharia tão primários e grosseiros? Só podemos concluir e acreditar que se procurou inviabilizar, com dados manipulados, a solução alternativa que defendíamos das 10 a 12 barragens em substituição a do Castanhão no porte alto, mas com sua acumulação reduzida de 1,2 bilhão de m³, na cota 80m. Como foi dito, no Plano Estadual de Recursos Hídricos, na referida cota, a barragem somente acumularia 758,3 milhões de m³ “deixando de irrigar 50.000 hectares”. Como poderia haver tamanha [1] total de acumulação, somente é possível irrigar 43.000 hectares ? Quer dizer que se o açude for construído na cota 80m ele vai perder mais do que estava previsto no projeto original na cota 100m, isto é, 6,7 bilhões de m3
um importante peso da decisão da SEMACE em aprovar a construção da Barragem do Castanhão no porte alto (VerCapítulo XVI, item 26.2). irrigar 50.000 hectares” surpreendeu a maioria dos Conselheiros do COEMA, que somente perceberam sua incoerêencia alguns minutos - Engenharia de Sistemas Hídricos Ltda (maio de 1992), assinado pelo engenheiroEdnardo Fernandes Cardoso , consultor da SEMACE para assuntos do Castanhão. Foi lido por ele próprio na reunião do COEMA do dia 22 de junho de 1992. Tantos erros, omissões e contradições do ponto de vista da engenharia visavam inviabilizar a proposta alternativa de serem construídas 10 ou 12
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barragens de porte médio no Alto Jaguaribe e na bacia do Rio Salgado, lamentáveis geraram no seio do COEMA um clima de insegurança e insatisfação que se pode sentir por um artigo, publicado no Jornal O Povo, do dia 16 de dezembro de 1992, de autoria do advogado e membro daquele Colegiado,João Alfredo Telles de Melo , sob o título: O Castanhão, COEMA e a Lei Ambiental O Projeto de construção por parte do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), do Açude Castanhão no Baixo Jaguaribe, tem gerado intensa polêmica em nosso estado, em vista da não concessão, - até ago ra, do licenciamento ambiental por parte da SEMACE (Superintendência Estadual do Meio Ambiente). Tal obra, se executada como pretende o DNOCS na cota 100, deverá ter a capacidade de acumular quase 4,5 bilhões de m³, chegando até a 6,7 bilhões de m³ (na cota máxima de 106m), o que levaria a inundação de uma área de mais de 550 km², correspondente a mais de duas vezes e meia o tamanho da Baía de Guanabara. O superdimensionamento dessa barragem gera impactos sócioambientais da maior magnitude, dentre os quais se destaca, em primeiro lugar, a inundação de 2/3 da área do município de Jaguaribara, inclusive sua sede, com mais de 9.000 habitantes, causando efeitos drásticos, não só sob o aspecto sócioeconômicos, mas também sobre outros bens insuscetíveis de mensuração, como a identidade histórico-cultural daquela comunidade, os laços de amizade e vizinhança construídos durante anos, os diversos símbolos culturais e religiosos etc. a jusante da barragem, a alteração no regime sedimentológico de transporte de pesqueira), a qualidade da água a jusante do reservatório, em função da vazão do lençol freático, o que permite a intrusão da água salgada e muitos outros, listados no EIA/RIMA e nos pareceres das consultorias. A despeito de todos esses agravantes, o DNOCS tem se recusado a discutir, como manda a legislação ambiental sobre o EIA/RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Respectivo Relatório) - a Lei 6.938/81, o Decreto 99.274/90 e a Resolução 001/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente - as alternativas que poderiam contemplar a construção de 10 a 12 médios açudes distribuídos
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espacialmente na bacia do Rio Jaguaribe, incluindo o próprio Castanhão com uma dimensão menor (acumulando, no máximo, 1,2 bilhão de m³, construído na cota 80, como tem defendido o ex-diretor do DNOCS, Eng. Cássio Borges); Essa solução, além de reduzir os impactos sócioambientais já menciona dos - evitando, inclusive, a submersão da cidade de Jaguaribara - levaria a estiagens recorrentes em nosso estado, como a região dos Inhamuns (abra-se aqui um parêntese para aduzir o fato de que, no Baixo Jaguaribe, onde se localiza o Castanhão, o rio já está perenizado pelo Açude Orós); No afã de fazer aprovar o licenciamento da obra a qualquer custo, ocorrem regularizada pela barragem (vazão esta que, em última instância, é quem Tais contradições levaram, inclusive, a uma das empresas de consultoria contratada pela SEMACE, a concluir que o estudo de sua viabilidade ecológica philo Benedicto Ottoni Netto, da HIDROESB - Saturnino de Brito S/A) do Rio de Janeiro; O mais grave é que o DNOCS, para encobrir esses questionamentos (não aceitando a discussão sobre as alternativas já mencionadas), procura reduzir o debate à disjunção: contra ou a favor do Castanhão, onde aqueles que têm adotado uma postura crítica e responsável são acusados de travar o-desenvol vimento do estado e da região, de obstaculizar o “progresso” etc. O que importa mencionar neste breve artigo, a título de conclusão, é que, para nós que militamos no movimento ecológico (alguns, inclusive, integrando ambiental - que, reconhecidamente, tem um caráter bastante democrático tem sido um instrumento poderoso em defesa dos interesses da comunidade, no sentido de se garantir a adoção da alternativa “ecologicamente correta”, ou seja, a mais condizente com uma visão do desenvolvimento socialmente justo e ambientalmente responsável. Ainda sobre este tema das barragens alternativas, a título de ilustração, vamos transcrever o seguinte trecho do parecer do professor Ottoni SEMACE:
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mática envolvendo assuntos de grande interesse sócioeconômico -de duas ma neiras distintas, de acordo com o porte e profundidade das alterações que se pretendam impor ao ecossistema com a construção e operação de grandiosos empreendimentos produtivos: a) Implantar de vez grandes obras e atuações destinadas a promover maiores massas de benefícios e, em contrapartida, promover impactos am bientais negativos mais volumosos e de mais difícil previsão e controle. Isto pode conduzir a problemática complexa e de maior responsabilidade; b) Implantar, progressivamente, obras equivalentes de menor porte com atuações menos impactantes, promovendo benefícios gradativa mente crescentes e controlados. [o grifo é nosso]. Os possíveis impactos, de menor porte, poderão ser detectados e monitorados com maior facilidade, daí a segurança operacional para o sistema biofísico. O empreendimento global permitirá ajustamentos sucessivos com base nos resultados obtidos, fato que trará menores riscos de insucessos, havendo melhores índices de economicida de para o empreendimento. Prudência, realismo e objetividade de atuação prática, e maior segurança operacional com melhores resultados, são fatores O projeto do açude Público do Castanhão, infelizmente, prevê a primeira forma de atuação”. 10.3 - Conclusão • O leitor deve ter notado a grande diferença existente entre “Es tudos de Alternativas da Barragem do Castanhão” e “Estudos de Alternativas à Barragem do Castanhão”. A SIRAC deveria ter elaborado a segunda hipótese, isto “Estudos é de Alternativas à Barragem do Castanhão” , pois era o que interessava e era o que, de fato, tinha sido encomendado à referida empresa. Enquanto se perdia tempo com um documento inútil, que levou mais de um mês para ser elaborado, os políticos, empresários, técnicos e a própria imprensa faziam pressão sobre os Conselheiros do COEMA para que a barragem fosse aprovada naquele Colegiado. • Propositadamente ou não, para confundir os Conselheiros do errada Curva cota/área/volume,que dava como capacidade de acumulação do Açude Castanhão na cota 80m o valor de 758,3 milhões de m³, em vez de 1,2 bilhão de m³.
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•
acima referido da SIRAC, em parecer lido naquele Conselho pelo seu diretor Ednardo Fernandes Cardoso , conseguiu “provar o absurdo”: na cota 80m a barragem perderia (ou deixaria de irrigar) 50.000 hectares, isto é, perderia mais do que, na realidade, na cota 100m, ele seria capaz de irrigar, ou seja, 43.000 hectares. • Como se vê, por essa e outras razões, os promotores da Barragem do Castanhão estavam dispostos a tudo para defender os seus- de perante a opinião pública, no presente e no futuro.
Que o leitor nos perdoe pela ênfase e tire suas próprias conclusões. Nota do autor: Lembramos que esta barragem tem duas partes: a primeira, até a cota 100m, com capacidade de acumular 4,5 bilhões de m3, é a chamada cota de regularização e, a segunda, . Da até a cota 106m, com capacidade total de 6,7 bilhões de3m cota 100m à cota 106 m há uma super acumulação de 2,3 bilhões de m3 para servir de controle de cheia para o Baixo Jaguaribe (Ver o Capítulo XIX – Controle das enchentes no Baixo Jaguaribe ).
4ª PARTE: HIDROLOGIA
CAPÍTULO XI Vazão regularizada
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CAPÍTULO XII Vazão regularizada do Açude Castanhão com 100% de garantia
169
CAPÍTULO XIII Vazão regularizada com 90% de garantia
175
CAPÍTULO XIV Vazão máxima regularizável pelo Rio Jaguaribe
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XI VAZÃO REGULARIZADA
11.1 - O conceito
N
um açude, a vazão regularizada é, sem dúvida, a sua principal característica e a grandeza de maior interesse do engenheiro, pois
oferecer. Conceitualmente, a“vazão regularizada”, ou a “descarga regularizada”, é uma vazão constante, isto é, permanente que pode ser garantida, continuamente, durante um“período crítico de estiagem” com o mínimo de possibilidade do reservatório secar. Portanto, perenizar um curso d’água consiste em manter uma vazão constante, inclusive, nos anos ou períodos (sequência de anos) secos, imediatamente a jusante (abaixo) do barramento. Um dos períodos mais críticos de estiagem ocorridos no Nordeste, particularmente no estado do Ceará, foi o de 1950 a 1958, portanto, oito anos consecutivos. O professor , diz, na “Hidrologia do Rio Bana [1] buiú” que elaborou para o DNOCS, o seguinte:
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Para determinar o trem de anos secos mais desfavoráveis, construímos a ano médio, as várias sequ ências de anos que se mantiveram abaixo da média. Dentre os dois períodos, o de 1927-1934 e o de 1950-1958, se destacavam não só pela duração de cerca de sete e oito anos, respectivamente, como também
Estado do Ceará - SRH, tem-se apresentado dubiamente o que se deve entender por“vazão ou descarga regularizada”,pois esta grandeza vem acompanhada de um artifício estatístico denominado “garantia de 80 ou 90%”, sem que isso possa ser entendido em termos hidrológicos práticos. Não há referência quanto à vazão regularizada com 100% de garantia. O valor da vazão regularizada no critério de “garantia com 80 ou 90%” (ver Capítulo XXIII, item 23.2 ), inclui conceitos de custos/be nefícios que não se conjugam, diretamente, com a hidrologia clássica hídrica, admitindo-se, a priori, a falênci a hí dri ca em perí odos crí ti cos de chuvas abaixo da média histórica. A “vazão regularizada” ou “descarga regularizada” de um açude é um parâmetro invariável, mas no critério de garantia de 90%, por exemplo, pode variar, poisvai depender da extensão da série hidrológica considerada, isto é, se abrange um ou mais períodos críticos de longa duração. Vamos tomar como exemplo o Açude Castanhão que, nos seus -es tudos hidrológicos, considerou a série histórica das vazões no período de 1939 a 1989, portanto, 50 anos. Outra série mais extensa, para o mesmo açude, digamos de 1914 a 1989, portanto, 75 anos (que inclui os dois maiores períodos críticos referidos de 1927/1934 e 1950/58), com certeza, no critério com 100% de garantia vai dar um valor da vazão menor do que o encontrado na série anterior, que só abrange o período crítico de 1950/1958. entendível, mas não recomendável do ponto de vista hidrológico, tendo em vista o fator de segurança, já que envolve reais possibilidades de - fa lência hidrológica quanto ao uso seguro da água armazenada. No Plano Estadual de Recursos Hídricos (editado em 1992), a SRH omite o valor da vazão regularizada dos açudes estudados com 100% de garan -
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tia. Omite-se, assim, a principal característica hidrológica dos açudes, visando, talvez, reforçar valores de vazões tidas como regularizáveis, Em vista do exposto, para a hidrologia, a“vazão ou descarga regularizada” isto é, uma vazão constante durante os 365 dias do ano, sem ocorrência de nenhuma falha, podendo atender, ininterruptamente, a uma deter minada demanda. Nos compêndios de hidrologia, quando se fala em “vazão regularizada” não precisa dizer que é com 100% de garantia, pois A decisão de usar uma vazão maior (80 ou 90% de garantia) do que a vazão regularizada não é da competência do engenheiro hidró logo, pois é uma decisão de caráter econômico, com base nos custos e benefícios e nos riscos que este procedimento pode acarretar. Em se tratando de irrigação, os sistemas podem suportar até 20% do tempo Engenharia de Recursos Hídricos de Linsley & Franzini , página 181: Causabilidade de Reservatórios , ano 1978). O assunto voltará a ser abordado, com mais detalhe, no Capítulo XXIII - Análise da SRH ao parecer da HIDROESB , quando oferecemos ao leitor a opinião doBureau of Reclamation, dos Estados Unidos, sobre a adoção do critério de 80 ou 90% de garantia para uso da água armazenada nos açudes do Nordeste brasileiro. Nota do autor: Sabemos da complexidade de um assunto desta natureza para o leigo em assuntos hidrológicos, mas, infeliz mente, não poderíamos nos furtar de abordá-lo com detalhes por questões acadêmicas. Por outro lado, ao nos referir à vazão regularizada do Açude Castanhão como sendo de 19,3m³/s (que não consta no Plano Estadual dos Recursos Hídricos), precisa do Ceará, tendo em vista que no início das discussões a vazão em causa era tida como sendo de 12,35m³/s (ver página 44 do livro em sua 1ª edição).
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11.2 - Exaustão hídrica do Açude Castanhão No parecer do professor
, são feitas as seguintes
que “não encontramos o valor da demanda hídrica destinada aos 43.000 hectares de perímetros irrigados”: (...) O PERH (Plano Estadual de Recursos Hídricos), por outro lado, apresenta o conceito de vazão regularizada com segurança de 90%-de garan dimensionamento hidrológico de reservatório de estiagem visando à produção de benefícios, fato que demonstramos ser inadmissível. (...) Assim, as vazões 34,6m³/s ou 26,6m³/s para o Castanhão, talvez do açude (operação das acumulações em trens de anos médios, por exemplo). períodos críticos, como veremos a seguir. A adoção pelo PERH deste complexo conceito de natureza estatística impõe, obrigatoriamente, a exaustão hídrica total das reservas em água acumulada no reservatório, com o consequente corte absoluto, ou paulatino, no90caso de Q das vazões pode permanecer por anos seguidos mantendo a reservação exaurida. Como será possível gerar benefícios previstos durante esses anos todos? Não se pode esquecer que o objetivo maior de um reservatório de estiagem, como o nome indica, é garantir benefícios em anos de escassez hídrica. Em outras palavras: como atender a irrigação de 43.000ha de glebas - irri [2] gadas; mais 5,00 m³/s para abastecimento a RMF ; gerar 90.500 Mwh/a.a; permitir a pesca de 5.800 t/a.a. de pescado; e propiciar a recreação e lazer, com o Castanhão inteiramente seco e inoperante? O RIMA ignora essa possibilidade já que calcula continuamente os benefícios durante 30 anos corridos (horizonte do projeto), sem que houvesse a mínima alusão a tal esvaziamento inaceitável. (...) Um mero subterfúgio de natureza estatística de forma alguma poderá Considerando a vazão regularizada do Castanhão na cota 100m, - es timada por comparação com o Orós e realizada de acordo com os conceitos 12m³/s, número bem mais modesto que os 34, 6 m³/s ou 26,6 m³/s referidos
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no PERH e aparentemente adotados no projeto do reservatório para atender aos benefícios pretendidos. 11.3 - Utilização de dados incorretos Foi durante o “Seminário sobre Recursos Hídricos do Nordeste” , promovido pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agro nomia - CREA/Ceará, realizado no Auditório Castelo Branco da UFC, uma contundente denúncia sobre a absurda e inacreditável manipula ção dos dados de evaporação quando da elaboração“Simulação da da Operação do Reservatório do Açude Castanhão”. A simulação que, sequer, é citada noPlano Estadual de Recursos Hídricos é encontrada no“Estudo de Alternativas da Barragem do Castanhão” atender a uma exigência do Conselheiro do COEMA, João Alfredo Telles Melo , fato que voltaremos a comentar no Capítulo XXIII - Análise da SRH ao Parecer da HIDROESB . Vejamos alguns trechos do nosso pronunciamento no mencionado Seminário: Mais discutível e que exige pronta explicação por parte dos responsáveis (DNOCS e Secretaria de Recursos Hídricos) é o relativo à média anual da evaporação considerada nos estudos hidrológicos do Açude Castanhão, que resultou na vazão regularizada de 26,6m³/s e 34,6m³/s com 90% e 80% de garantia, respectivamente”. Graças à listagem que a muito custo conseguimos obter junto ao DNOCS, somente possível com a interferência da Procuradoria Geral da República, da evaporação utilizada na simulação hidrológica que visava determinar a vazão regularizada do Açude Castanhão, foi da ordem de 1.700mm, em vez de 2.228mm, como seria correto. Valor este constante das características estudos da HIDROTERRA/NORONHA para aquele Departamento. É como se não existisse evaporação nos meses mais quentes do ano, isto é, outubro, novembro e dezembro. A minimização, da taxa de evaporação anual visava, na realidade, do Castanhão, isto é, aumentar a sua vazão regularizada.
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O que acabamos de relatar é apenas um exemplo, entre outros de igual ou maior gravidade, do que foram capazes os promotores da -bar ragem, visando sua aprovação pelo COEMA com o aval da sociedade cearense crente que os responsáveis pelo projeto da referida obra estavam acima de qualquer suspeita. Para indubitável comprovação da existência de, se não execrável manipulação, pelo menos imperdoável erro, devemos salientar que, no próprio RIMA, Volume I-A, página 4.30, na Tabela 4.7, são apresen tados os dados de evaporação de janeiro a dezembro, os quais totalizam 2.893,5 milímetros (ver também a página 4.33). Não mais 2.228mm, mas 2.893,5mm. O próprio Secretário de Recursos Hídricos, engenheiroHypérides Macedo, no seu livro “Chuva e Chão na Terra do Sol” , também faz referência a uma evaporação no estado do Ceará que pode chegar aos 2.500 milímetros por ano (página l7). Como então usar uma altura anual de evaporação de apenas 1.700 milímetros, característica de regiões de clima úmido e baixa temperatura média? A comprovação da absurda manipulação dos dados de evaporação nos estudos hidrológicos da Barragem do Castanhão (Simulação da Operação do Reservatório do Açude Castanhão) nos dá a certeza de que o professor tem inteira razão quando diz no seu parecer para a SEMACE: 5.13 – Assim, não deve constituir surpresa se a vazão regularizada do Castanhão, na cota 100m, com garantia de 100%, para os períodos críticos, vier a ser da mesma ordem de grandeza que a atual vazão regularizada do Orós que, repetimos, foi medida como sendo de 10 a 12m³/s. Tudo isso mostra que existia uma determinação de um grupo orga nizado, infelizmente dentro da própria comunidade técnica do estado do Ceará, sob o comando de sua Secretaria de Recursos Hídricos, no C O E M A para votarem a favor da construção da B arragem do C astanhão. 11.4 - Conclusão Os dados apresentados falam por si só. Entretanto, deixamos ao leitor a tarefa de analisá-los e se qualquer dúvida tiver, procurar nos documentos
XII VAZÃO REGULARIZADA DO AÇUDE CASTANHÃO COM 100% DE GARANTIA
12.1 - A vazão regularizada
C
no seu parecer para a SEMACE, “o valor da vazão regularizada pelo Açude Castanhão é apresentado de forma pouco convincente, seja pelo projetista da obra, seja pelo autor do RIMA, seja pelo DNOCS”.(pág. 17 desse parecer). registrada (média mensal) de 0,2m³/s e à vazão média de longo período de 73,92m³/s, valor este aceito pelo professor “como apresentado pelo Consórcio Hidroservice/Noronha” . Fica, assim, esclarecida a dúvida deixada no“Estudo de Alterna tivas da Barragem do Castanhão”
3 Castanhão como sendo de 134,5m³/s, em vez de 73,92m /s, como acima foi dito. Essas contradições de números nos deixava uma dose de suspeição, não somente por este caso, mas por outros erros e omissões indesculpáveis já comentadas neste livro. Tudo fazia crer que existia por parte da Secretaria de Recursos Hídricos do Estado do Ceará e de outros órgãos estaduais, da SIRAC (responsável pela elaboração do EIA/RIMA e dos Estudos Alternativos à Barragem do Castanhão) e
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de poderosos grupos econômicos e políticos (por trás o grupo Andrade Gutierrez, ganhador da concorrência para a construção do referido em preendimento) em posições abertas e declaradas em favor da aprovação da obra no COEMA. A conclusão acima é muito importante, isto é, a de que a vazão médio anual de 2,33 bilhões de metros cúbicos, que tomamos como referência em todos os documentos e artigos de jornais que temos produzido ao nos referirmos à Barragem do Castanhão. Desta forma, tudo o que dissemos anteriormente sobre este assunto não retiramos uma só vírgula. Em face do exposto, também podemos concluir que, na foz do [1]
Figueiredo), a vazão média de longo período é de 132,75m³/s, que cor em vez de 6,3 bilhões de m³, como está indicado no discutível “estudo” da SIRAC. São valores consagrados em estudos anteriores realizados pelo DNOCS e pela SUDENE, podendo a comunidade técnica atual e futura considerá-la como absolutamente correta. Além das duas correções acima em relação ao apressado e confuso “Estudo de Alternativas da Barragem do Castanhão” , que superestimou as reais disponibilidades H í dri cas do V ale do R i o Jaguari be, ai nda perdura a dúvi da quanto a real vazão regularizada (com 100% de garantia) que pode fornecer o Açude Castanhão. Com o objetivo de esclarecer também este assunto, o professor , na página 23do seu detalhado e convincente parecer para a SEMACE, previu três situações evolutivas ao longo do tempo, levando em conta a problemática mais geral do Castanhão na cota 100m e cujo texto apresentamos a seguir: 5.4.1 - As condições naturais do Boqueirão do Cunha, por onde transita a vazão modular (média) da bacia no local da futura construção da barragem (situação sem nenhum barramento na bacia); PRIMEIRA ETAPA; 5.4.2 - Vazão regularizada com a implantação exclusiva do barramento Castanhão, sem nenhum outro reservatório a montante; SEGUNDA ETAPA e 1
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5.4.3 - Vazão regularizada pelo Castanhão havendo a utilização dos recursos hídricos do Alto Jaguaribe através da implantação e operação - do sis tema de barramentos preconizada pelo PERH- Plano Estadual de Recursos Hídricos, TERCEIRA ETAPA. Na PRIMEIRA ETAPA (item 5.4.1.), no período de 50 anos (1931 a 1980), o modelo SSARR nas condições naturais indica ser de 73,92 m³/s a vazão média (módulo) do Rio Jaguaribe, no Boqueirão do Cunha (44.850km²), Na SEGUNDA ETAPA, para as condições mencionadas (cota 100m), foram desenhados os clássicos “Diagramas de Rippl”. Desse estudo, foram encontrados os seguintes valores para a vazão regularizada do Açude Cas tanhão,“sem nenhum outro reservatório a montante” [o grifo é nosso]: Para a evaporação de 2m/ano:R Q = 28,4 m³/s, para o período de 1940/50 e QR = 26,8 m³/s, para o período de 1950/58. Para a evaporação de 2,5m/ano:R = Q25,1 m³/s, para o período de 1940/50 e QR = 24,0 m3/s, para o período de 1950/58. Convém ressaltar que esses estudos realizados pelo professor philo Ottoni , já consideram a geometria do reservatório (Curva Cota/ Área/Volume) corrigida. (Ver Capítulo VI, subitem 6.3 e 6.4 ). Dessa SEGUNDA ETAPA, considerando-se a evaporação de 2,5m/ano, pode-se concluir que a vazão regularizada do Açude Cas tanhão (sem nenhum outro reservatório a montante) está em torno de 25,00m³/s. (Notem que, se considerarmos a existência somente do Açude Orós, para o Castanhão sobrariam apenas 13,0m³/s, pois a vazão regularizada do primeiro é de 12,00 m³/s). É importante rever e comparar este resultado com o exposto no Quadro III , do Capítulo XIV – Vazão Máxima Regularizável pelo Rio Jaguaribe. Apenas advertimos o leitor que no referido Quadro, para sermos condescendentes com os projetistas do Castanhão, que adotaram para seu estudo hidrológico a evaporação de 1.700 milímetros, vamos admitir que a vazão máxima possível do referido reservatório (sem nenhum barramento a montan te) seja de 26,8 m3/s determinada pelo professor para uma evaporação de 2.500 mm/ano. Quanto à TERCEIRA ETAPA, trata-se do estudo contratado com a SIRAC, que seria da maior importância se tivesse sido criteriosamente elaborado. Este estudo deveria considerar todos os barramentos existentes e previstos a montante do Açude Castanhão. Era o que se pretendia, isto
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é, o estudo das alternativas à Barragem do Castanhão, conforme exigido para atender a legislação ambiental pertinente. Lamentavelmente, este estudo não foi feito, ou melhor, foi feito com imperfeições. Vejamos o que diz o professor sobre esta ETAPA: 5.7 – Na TERCEIRA ETAPA do estudo evolutivo do Castanhão (item 5.4.3), impõe-se que as barragens indicadas pelo PERH para o Alto Jagua ribee mais o Orós, última cascata, quando em operação períodos nos críticos, que podem ser da ordem de vários lustres, possivelmente promovem o corte total das vazões do Alto Jaguaribe [o grifo é nosso]. Nesses períodos, não das, nas diferentes unidades de barramentos a montante, são consumidas nos respectivos perímetros e perdidas por evaporação”. Nesses períodos críticos, portanto, o Castanhão será operado, quase que 19.281 km²), sendo o Alto Jaguaribe cortado, praticamente, pelo barramento de Orós (A = 23.616 km²). As eventuais sobras de água nos períodos médios nos períodos críticos. 5.8 - Os estudos de regularização do Castanhão na cota 100m para tal situação operativa (item 5.4.3, TERCEIRA ETAPA), são de fundamental durante os períodos críticos. A maior complexidade da problemática e o tempo exigido, não nos - permi [2] tiram realizar as determinações hidrológicas recomendadas no item . 4.22 (...) Assim, não deve constituir surpresa se a vazão regularizada do Castanhão, na cota 100m, com garantia de 100%, para os períodos críticos, vier a ser da mesma ordem de grandeza que a atual vazão regularizada do Orós que, repetimos, foi calculada como sendo de 10 a 12 m³/s. 12.2 - Considerações sobre a Terceira Etapa Sobre este assunto, gostaríamos de fazer as seguintes considerações: 1. Na estimativa acima da vazão regularizada do Açude Castanhão, foi considerado que, nos períodos críticos, o Açude Castanhão irá, 2
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Portanto, em caso de ser decidida a construção do Açude Aurora (800 milhões de m³) para atender ao projeto de transposição de vazões do Rio São Francisco, ou o Açude Castanheiro (1,5 bilhão 2. O Açude Orós sangrou a última vez em abril de 1989, porém com uma lâmina de apenas 15 centímetros. Provavelmente se o Açude Arneiroz estivesse, à época construído, o Orós não teria sangrado. Portanto, estamos praticamente caminhando para onze anos (de 1989 a 1999) sem ter ocorrido sangria naque 2 ), maior do que a sub-bacia do Açude Castanhão (19.281 km²), se considerarmos o Rio Salgado como sendo sua única área de captação pluviométrica. 3. A TERCEIRA ETAPA seria parte importante do estudo das alternativas à Barragem do Castanhão, que poderia até mesmo decidir sobre a inviabilidade hidrológica, técnica e econômica daquele reservatório. 4. Entendemos que a ETAPA TERCEIRA não era, de fato, atri buição contratual da HIDROESB - Saturnino de Brito S.A. a qual deveria ater-se, até por exiguidade de tempo, no seu parecer, única e exclusivamente a análise e estudos das documentações existentes. A SIRAC, que foi paga para fazer este estudo, não o fez! Ademais, faltariam no Rio de Janeiro, sede da HIDROESB, todos os dados hidrológicos mensais (pluviometria, vazão, eva porimetria etc.), bem como as características físicas de todos os barramentos previstos pelo DNOCS e pela Secretaria de Recursos Hídricos, indispensáveis à elaboração deste complexo e demorado estudo. Aliás, o DNOCS, em 1986, lançou Concor rência Pública, em nível nacional, de N° 34/86 - DGO com este objetivo. O assunto foi comentado noCapítulo IX, sob o título Barragens Alternativas à Barragem do Castanhão , a qual foi ganha 5. Caberia ao DNOCS (órgão contratante) exigir da SIRAC a elaboração do estudo das alternativas do barramento Castanhão, o que não se deu, por razões que desconhecemos, tudo fazendo-nos
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crer para evitar apresentar resultados que poderiam contrariar a construção da Barragem do Castanhão. 12.3 - Conclusão • Os defensores e promotores da Barragem do Castanhão quando se referem ao parecer do professor sempre se reportam ao fato dele não ter elaborado os estudos alusivos à TERCEIRA ETAPA, que deveria considerar todos os barramentos existentes e previstos a montante daquele reservatório. Perguntamos: Como poderia o referido técnico, em apenas 45 dias, realizar um trabalho de tal magnitude se este estava fora da discriminação dos serviços a ele contratados pela SEMACE? • O trabalho em causa, isto é, a análise das alternativas à Barragem do Castanhão, levando em consideração os barramentos existentes, projetados e previstos, na realidade, foi contratado pelo DNOCS em referência, elaborou um“Estudo de Alternativas da Barragem do Castanhão”, em vez de “Estudo de Alternativas à Barragem do Castanhão”.
• Açude Castanhão, elaborado, justamente, pela SIRAC, e teria que fundamentar-se, pela 1ógica do prazo exigido, na documentação existente. Um estudo dessa natureza exigiria, no mínimo, após a • Ressaltamos a quase coincidência dos resultados encontrados pelo professor quanto à vazão regularizável pela Barragem do Castanhão, ou seja, 13,0m³/s, com a vazão estimada a partir dos estudos do DNAEE – Departamento Nacional de Água e Energia Elétrica, isto é, 12,0m³/s e, por que não dizer, do próprio DNOS: 12,35m 3/s. Ao leitor cabe analisar o exposto e tirar suas próprias conclusões.
XIII VAZÃO REGULARIZADA COM 90% DE GARANTIA
13.1 - Vazão regularizada de 34,6m³/s
D
e acordo com o que foi contratado pela SEMACE (outubro/1992), o professor analisou o EIA/RIMA e toda a documentação existente sobre a Barragem do Castanhão. Não só analisou como elaborou estudos complementares para embasar o seu parecer técnico sobre a referida obra. Dentre os vários estudos por ele
Castanhão, considerando a vazão regularizada de 34,6m³/s e 26,6m³/s, com 90% de garantia, sendo a última com volume de alerta. Vejamos, quanto na página 19 do seu parecer, o que disse o professor à operação do Castanhão com a vazão de 34,6m³/s: (...) De acordo com os conceitos estatísticos referidos no[1]PERH , a vazão Q 90 = 34,6m³/s foi determinada para 50 anos (600 meses) de dados obtidos através da simulação computacional (balanço hidrológico) desenvolvida em Castanhão na cota 100m estariam assim distribuídas: a) Q R = Q90 = 34,6m³/s, acontecendo durante 540 meses, nos 50 anos;
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b) QR = zero m³/s, acontecendo durante 60 meses restantes, nos mesmos 50 anos. (pág. 19 do parecer). Observe-se que os 60 meses de ausência total da disponibilidade de água deve acontecer justamente durante os períodos críticos (secos), portanto nos anos mais desfavoráveis de longas estiagens. Os estudos em causa foram realizados considerando o período de 1931 a 1980. Na página 21, do seu parecer, diz o citado professor: 4.19 – Como conciliar os conceitos de vazão regularizada emitidos pelo PERH, que aceita a possibilidade do Castanhão passar vários anos nos - pe = zero) havendo, ao mesmo ríodos críticos (trens de anos secos) sem água (Q R tempo, a obrigatoriedade de geração de benefícios (irrigação, abastecimento de água etc.) que demandam água, se ela não existe? 13.1.1 - Operação do Castanhão no período crítico de 1941/59 Na página 29, o parecer considera o período crítico de 1941/59, gerados na sub-bacia no Rio Salgado (19.281 km²). A vazão regularizada é a mesma, isto é, 34,6m³/s: (...) Para tal situação operacional do Castanhão, sujeito à evaporação média de 2.315,2mm/ano (Morada Nova), realizamos o balanço hídrico para todos os meses do período crítico de 1941/59 (228 meses); utilizamos, nhão (19.281km²) pelo modelo MODAC, usado na elaboração do PERH. Os resultados encontrados são os seguintes: 5.14.1 - vazão regularizada de 34,6m³/s. Q 90, (cota do espelho d’água = 71m); 5.14.3 - em cerca de 130 meses, o espelho d ‘água posicionar-se-ia abaixo da cota 79m, o que possivelmente obrigaria a desativação da U.H. (Usina Hidroelétrica). 5.14.4 - Não haveria sangramento durante o período crítico de 228 meses (19 anos) corridos de operação da reservação, o que deveria conduzir a situações desfavoráveis para o Baixo Jaguaribe. Vê-se que, durante vários anos, dos quais cerca de 4 corridos, o Castanhão na cota 100m estaria tecnicamente seco, não sendo possível, assim, a geração dos benefícios pretendidos.
Hidrologia
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13.2 - Vazão regularizada de 26,6m³/s Para a vazão regularizada de 26,6m³/s, nas mesmas condições operativas anteriores, isto é, evaporação de 2.315,2mm/ano (Morada Nova), período Castanhão somente gerados pela bacia do Rio Salgado (19.281km²), os resultados encontrados foram os seguintes (guardando-se a itemização do referido parecer): 5.15.1 - vazão regularizada de 26,6m³/s; 5.15.2 - em 55 meses, o reservatório se esgotaria totalmente, mantendo-se o lastro d’água que é impróprio para o consumo; 5.15.3 - em cerca dos 90 meses corridos o espelho d’água estaria abaixo da cota 79m, fato que provavelmente obrigaria a desativação da U. H. (Usina Hidroelétrica); 5.15.4 - Não haveria sangramento durante o período crítico de 228 meses Durante cerca de 4 anos, o Castanhão não teria água para gerar- os be nefícios pretendidos. causa, à página 31 do parecer do referido professor: reside nos longos períodos de falta de sangramento da barragem na cota 100m. São cerca de 20 anos ininterruptos, durante os quais o Baixo Jaguaribe, de somente descarga de turbinamento (vazão regularizada) que deverá se escoar pela calha porosa do curso d’água natural para atender aos perímetros e glebas irrigadas, controle da poluição e salinidade etc. As enchentes nessa região e no período de 20 anos serão as provenientes, praticamente da bacia residual do Baixo Jaguaribe. Deixará de haver, assim, as “varreduras” hidráulicas e equilíbrio ambiental e que são importantes para proporcionar o equilíbrio outrossim, ser afetada a embocadura no Oceano Atlântico. 13.3 - Conclusão no seu parecer utilizou a • Observe o leitor que o professor evaporação anual como sendo de 2.315,2mm, em vez de 2.228mm,
178
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
ou 1.700mm erroneamente utilizado nos estudos hidrológicos deste reservatório pela empresa SIRAC. • A clareza das conclusões expostas pelo autor do parecer fala por si só, razão pela qual, deixamos ao leitor a tarefa de analisá-las e emitir suas próprias conclusões. Nota do autor: Já neste parecer, o professor admite a hipótese do Açude Castanhão passar até 20 anos sem sangrar, considerando o período de 1931 a 1980, não tendo fundamento “nunca sangrará” (ver Capítulo XIX ). Sobre a vazão regularizada do Açude Castanhão, com 100% de garantia, recomendamos o leitor a leitura doCapítulo XXIII no qual está transcrito um trecho do livroReestruturação Sócio Espacial - Do espaço banal ao espaço da racionalidade técnica (2006) , de autoria do professor e Luiz Cruz Lima , da Universidade Estadual do Ceará.
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
Theophilo Ottoni
ão
O Povo Tribuna do Ceará item Castanhão na Atualidade . à Segunda Edição
Theophilo
Introdução
XIV VAZÃO MÁXIMA REGULARIZÁVEL PELO RIO JAGUARIBE
14.1 - Vazão máxima regularizável
O
constantes do Plano de Aproveitamento Integrado dos Recursos Hídricos do Nordeste do Brasil - PLIRHINE (1980), concluíram que a disponibilidade hí drica efetiva (máxima) da bacia do Rio Jaguaribe, em termos de vazão [1] ou descarga regularizada, seria de 38m³/s , considerando o conjunto das barragens existentes, projetadas e previstas. Naquele ano o Açude estudo visto que o Açude Castanheiro, no Rio Salgado, o substituía no rol das barragens previstas. Por sua vez, a disponibilidade efetiva máxima do Rio Jaguaribe, -se gundo estudos do Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica - DNAEE (Plano de Utilização Integrada dos Recursos Hídricos do Rio Jaguaribe – 1ª Fase: DNAEE/SOSP, 1989) , seria de 43,50m³/s já incluídas todas as barragens atuais projetadas e previstas, inclusive a Barragem do Castanhão no porte alto. Segundo este estudo do DNAEE, a distribuição das vazões regularizáveis (atuais e futuras) seria assim:
180
A Face Oculta da Barragem do Castanhão QUADRO I (Vazão máxima regularizável) SUB-BACIA
VAZÃO (m³/s)
TOTAL
43,50
Na situação atual,com os açudes já construídos, portanto em pleno [2] funcionamento, temos a seguinte repartição por sub-bacia do Rio Jaguaribe: QUADRO II (Vazão regularizada atual - 1999) SUB-BACIA
TOTAL
VAZÃO (m³/s)
28,00
Como o estudo acima foi elaborado em novembro de 1987, se -in cluirmos os Açudes Trussu, Arneiroz, Umari e outros de menor porte construídos posteriormente, é possível que a vazão regularizada atual já possa ser considerada em torno de 31m³/s. Se admitirmos a vazão regularizável do Alto Jaguaribe (incluindo o Açude Orós), a da bacia do Rio Salgado e a residual a jusante do Açude Orós, o Quadro I a seguinte vazão máxima regularizável: QUADRO III (Vazão máxima regularizável) SUB-BACIA
TOTAL
VAZÃO (m³/s)
44,50
Hidrologia
181
É interessante observar que nos estudos que realizamos no ano de 1981 visando à transposição de vazões do Rio São Francisco para o Nordeste[3] (ver Tabela II os açudes já construídos e previstos para o Vale do Jaguaribe citando, nominalmente, as suas vazões regularizáveis que, somadas, totalizariam 40,11m³/s. S e na menci onada T abela, em vez de 1 ( um) bi lhão de m³ para o A çude C astanhei ro, cuja vazão regulari zada é esti mada ser de 7,30m³/s, considerarmos este açude com 1,5 bilhão, sua vazão regularizada passaria para 10,59m³/s, igualando-se à previsão da -va zão máxima regularizável dos estudos do DNAEE para o vale do Rio Jaguaribe, isto é, 43.50m3/s. Desse estudo elaborado pelo autor deste livro em 1981 (quatro anos antes de se falar na existência do Açude Castanhão que, até então, não existia nos planos do DNOCS), pode-se tirar duas conclusões: 1. O Açude Castanheiro, na bacia do Rio Salgado, cuja previsão máxima de acumulação era de 1,5 bilhão de m³, foi substituído pelo Açude Castanhão com 4,5 bilhões de m³ (cota l00m); e 2. O Açude Castanhão está, de fato, superdimensionado. É inadsuperior a que seria do Açude Castanheiro (10,59 m3/s), com 1,5 bilhão de m³ acumulável, já que ambos têm, praticamente, a do Rio Salgado, naturalmente excluindo a bacia do Açude Orós (23.616 km²). Insistir em 34,6m³/s ou 26,6m³/s (com 90% de garantia e volume de alerta), portanto, com valores de vazão regularizada recorrendo-se a e os defensores da barragem, além de confundir os Conselheiros do COEMA que, em 1992, deveriam votar a favor ou contra tal empreendimento (ver Capítulo XXVII - O Castanhão é Aprovado no COEMA).
182
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
14.2 - Perguntas sem respostas ragem 3,5 vezes maior do que a de Orós, ambas localizadas no mesmo rio, possam ter a mesma vazão regularizada? Como aceitar que o Açude Orós, com uma barragem de apenas 600 metros de comprimento possa gerar os mesmos benefícios de outra, situada no mesmo rio, com 7.770 metros de extensão? Como se pode admitir uma barragem que vai inundar uma área de 550 km² (na minha ótica, este valor é bem maior do que este) possa ser, hidrologicamente, semelhante a do Orós, cuja área de inundação máxima é de 310km² ? Como acreditar numa obra que já se prevê possa custar 300 milhões de dólares (o orçamento inicial era de 96 milhões) possa trazer tão poucos benefícios e muitos impactos negativos como os que já estão aparecendo, quando ainda faltam dois anos para a sua conclusão? A questão da água é tema complexo e, naturalmente, exige muitos estudos, dados, informações, considerações e pesquisas para o seu com pleto entendimento e, consequentemente, decidir sobre o seu melhor aproveitamento. A solução correta varia de caso para caso, de local para local, de região para região e, até mesmo, de país para país. Tudo isto é compreensível, mas qualquer erro de interpretação, ou a interveniência de interesses políticos e/ou econômicos podem causar danos irreversíveis. Os livros mais modernos, publicados nos últimos vinte anos sobre ecologia, vêm comentando muitos desses erros, alguns de suma gravidade, causados por barragens construídas no mundo inteiro, principalmente na década de 50. Por isso, em um programa recente de televisão que parti cipamos, quando se debatia a possibilidade de as prefeituras municipais assumirem a administração e gerência de quarenta açudes do DNOCS, posicionamento contrário tendo em vista, principalmente, o custo de manutenção e operação dessas obras e a necessidade de treinamento de pessoal técnico especializado nas várias ciências que envolvem a questão, para as prefeituras do interior se tornarem capacitadas a receber tais- en cargos. A lém desses aspectos, existem os interesses políticos eleitoreiros que, certamente, se envolverão nesta questão da água não podendo do Governo Federal, de forma alguma, abrir mão deste controle em nome
Hidrologia
183
14.3 - Conclusões •
A vazão regularizada (100% de garantia) que se pode esperar de todo o Vale do Rio Jaguaribe, depois que este tiver sua estrutura hidráulica de açudagem totalmente concluída (barragens exis tentes, projetadas e previstas) será de, no máximo, 43,50m³/s. Deste total, o Alto Jaguaribe, as bacias do Rio Salgado e a bacia incremental a jusante do Açude Orós até o Boqueirão do Cunha (A çude Castanhão) podem contribuir com 26,8m³/s, conforme parecer do professor dos quais 16,00m³/s são procedentes da vazão regularizada máxima possível dos Açudes Orós, Trussu, Arneiroz e de outros que ainda serão construídos no Alto Jaguaribe. Com base neste raciocínio,concluie-se que o Açude Castanhão teria uma vazão regularizada, com 100% de garantia, de apenas 11,0 m³/.
•
Não obstante, no dia 25 de novembro de 1992, através do Ofício Nº 1002/92, o então Secretário de Recursos Hídricos,José Moreira de Andrade, enviou à SEMACE uma análise de Consultores ao pare cer da HIDROESB-Saturnino de Brito (leia-se professor Ottoni ) no qual foi dito que a vazão regularizada do Açude Casta 3 nhão era de 19,3 m /s, com 100% de garantia. Referido documento foi assinado pelos engenheirosVicente de P. B. Vieira , José Nilson Bezerra Campos e Walter Martins . Não obstante, é importante ressaltar que o citado valor foi encontrado a partir de uma simulação hidrológica considerando a evaporação como sendo de 1.700 milí metros, em vez de 2.228 milímetros. Além disso, aCurva cota/área/ volume também foi considerada com um erro de 36% que dá um espelho d’água exposto à evaporação menor do que a que será, de fato, na realidade (Ver Capítulo VI).
•
Ainda sobre esta questão da vazão regularizada do Açude Casta nhão, o curioso é observarmos que no livro Castanhão – Do Sonho a Realidade, de autoria do Eng. Agro. Francisco Pardaillan Farias Lima , editado no ano de 2007, onde consta detalhadamente todos os dados referentes ao Açude Castanhão, não há nenhuma citação de sua vazão regularizada, justamente a que mais interessa aos hidrólogos, engenheiros e agrônomos. Por quê? Esclarecemos que o Eng. Agro. Francisco Pardaillan era um dos diretores da SIRAC, autora do EIA/RIMA da Barragem
•
desse empreendimento. Era, também, Conselheiro Suplente da
184
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
Associação dos Engenheiros Agrônomos do Ceará - AEAC com assento permanente nas reuniões do COEMA - Conselho Estadual do Meio Ambiente.
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
Nº é Theophilo Ottoni, : “Assim, não deve constituir surpresa se a vazão regularizada do Casta nhão, na cota 100m, com garantia de 100% para os períodos críticos, vier a ser da mesma ordem de grandeza que a atual vazão regularizada do Orós que, repetimos, foi medida como sendo de 10 a 12m³/s.”
-
Deixamos ao leitor, como sempre fazemos, a tarefa de, após analisar o presente capítulo, emitir suas próprias conclusões.
Hidrologia
185
TABELA II
BARRAGEM
BACIA HIDROGRÁFICA (km)
CAPACIDADE DA BARRAGEM 106 m³
VOLUME DISPONÍVEL 106 m³/ano
VAZÃO REGULARIZADA m³/s
6.928,3
1.265,0
40,11
25.000 13.500 10.115 1.787 340 322 8.300 356 855 1.209 224 269 116 100 150 1.209 800 78
25 96 TOTAL
53.381
Obs.: O Açude Castanheiro é o único previstoincluido nesta tabela.
5ª PARTE: CUSTO FINANCEIRO
CAPÍTULO XV O custo do empreendimento
189
XV O CUSTO DO EMPREENDIMENTO
15.1 - Segundo o EIA/RIMA elaborado pela SIR AC, em 1990
N
consta que o custo da barragem propriamente dita “foi estimado pelo DNOCS em US$ 120 milhões”. E prossegue: “Além deste custo das obras está previsto o dispêndio de US$ 25,5 milhões em ações complementares (desapropriações, reassentamento etc.), entre as quais destacam-se, pelo seu vulto, as relocações da BR-116 e da cidade de Jaguaribara” (Volume I-B – Textos, página 6.21). Pelo visto, o empreendimento total, no ano de 1990, foi estimado em US$ 145 milhões. Apesar dos números acima, os promotores da construção da Barragem do Castanhão, através da imprensa local, sempre se referiam somente ao custo da barragem, em sua estimativa inicial que era de US$ 96 mi lhões, sem fazerem qualquer alusão às obras complementares. Não só na imprensa, mas nas reuniões fechadas com a presença de políticos e empresários, chegando ao ponto de, em uma das Audiências Públicas no COEMA, realizada no ano de 1992, quando se discutia a viabilidade econômica da Barragem do Castanhão, o engenheiro Hypérides Macedo de um computador que estava sendo adquirido, pelo INPE - Instituto
190
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
de Pesquisas Especiais que, segundo ele, teria custado US$ 60 milhões. Os defensores do Castanhão usavam de todos os recursos possíveis e imaginários para conseguir o apoio e a simpatia dos Conselheiros do COEMA para votarem a favor do licenciamento da obra[1] . A declaração acima do engenheiroHypérides Macedo mereceu o seguinte comentário do Instituto de Pesquisa Tecnológica do Estado de São Paulo, à página 10, no seu Relatório N° 30.419, de 13/07/92, dirigido à SEMACE: A comparação feita pelo Dr. Hypérides entre os custos da Barragem do Castanhão e do computador adquirido pelo Instituto de Pesquisa Espaciais - INPE de São José dos Campos (US$ 120.000.000 x US$ 60.000.000) era dispensável. Hypérides Macedo, e que obteve grande repercussão em favor do empreendimento, foi aquela, ainda hoje repetida aos visitantes da barragem, de que na região que vai ser inundada“só tem cobras, calangos e lagartos”.( V er relatório do Prof. no Capítulo XVI, item 16.22 - A Ocupação Dos Terrenos Ribeirinhos no qual o eminente técnico destaca Jaguaribe que será coberto pelas águas acumuladas no Açude Casta acintoso desrespeito às quase 15.000 pessoas que vivem naquela região e que serão deslocadas por causa da construção da barragem. Em várias oportunidades, estivemos em Jaguaribara e pudemos constatar que lá não existem pedintes nas ruas “o e povo”nos parecia pobre, porém, feliz. A Irmã Bernadete Neves, religiosa, residente naquela comunidade, nos dizia que “O povo era humilde, mas tinha uma vida organizada e feliz às margens do Rio Jaguaribe”. Para ela, “uma dádiva de Deus”. A propósito, consultamos duas publicações sobre dados estatísticos dos dois municípios mais diretamente atingidos pela construção da barragem, isto é, Jaguaribara e Alto Santo. São publicações editadas pelo IPLANCE, de 1994 (Informações Municipais):
US$ 30 milhões
Custo Financeiro
191
QUADRO IV REBANHOS E DERIVADOS
JAGUARIBARA
ALTO SANTO
21.436
2.245
3.749
5.000
19.125
6.210
5.808
3.965
18.427
40.776
5.555 50
3.083 57
Os dados acima demonstram que a região em causa não é tão inós pita e improdutiva como apregoava o citado engenheiro, a quem se pode atribuir todos os méritos (ou deméritos) pela construção da Barragem do Castanhão, não obstante a sua posição contrária àquela obra no início das discussões, quando escreveu um artigo no Diário do Nordestee concedeu entrevista ao Jornal O Povo, argumentos ainda hoje válidos e atuais (verCapítulo II). Recentemente, no Diário do Nordeste , do dia 14 de junho de 1998, no suplemento “A VERGONHA DO SÉCULO”, o Secretário de Recursos Hídricos do Ceará, Hypérides Macedo, mais uma vez reformulou seu pensamento, voltando ao seu posicionamento inicial expresso, no ano de 1986, contrário às grandes barragens e cita, nominalmente, os Açudes Orós e Banabuiú que, em vez de uma,“deveriam ser 20”, em cada caso. O alto valor das desapropriações feitas, até agora, também comprovam do Castanhão “só tem cobras, calangos e lagartos”. Ademais, a área da bacia hidráulica da barragem vai cobrir cerca de 70 quilômetros do Rio Jaguaribe no seu trecho mediano, trecho este já perenizado pelo Açude Orós há mais de vinte anos e, ainda, cerca de 50 quilômetros do Riacho do Sangue, perenizado pelo açude do mesmo nome, localizado no município de Jaguaretama. Essas áreas, ao longo desses rios, são, sem sombra de dúvida, das mais desenvolvidas e férteis do estado do Ceará. Sem falarmos no Açude Velame (2,56 milhões de m³, com 8,5 metros Uma destruição que poderia ser evitada. Voltando ao EIA/RIMA, vimos que o dispêndio com as desapropriações (65.000 hectares), relocação da BR-116 e das linhas de transmissão da CHESF, construção da nova cidade de Jaguaribara, indenização de 125 casas na cidade de Jaguaretama e outras ações complementares - de veriam comprometer, segundo as previsões iniciais, recursos da ordem,
192
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
de R$ 25,5 milhões. Vimos anteriormente que só as desapropriações deverão chegar a R$ 37 milhões. Foi com este valor de 25,5 milhões, subestimado, que se elaboraram os estudos de viabilidade econômica do empreendimento... Todos os prognósticos de custos têm-se revelado, totalmente, con trários aos que foram feitos inicialmente, demonstrando que as previsões iniciais foram feitas na base de extremo otimismo. Segundo ampla matéria publicada no JornalO Povo do dia 06 de março de 1997, sob o título “Tasso garante obras do Castanhão”, os investimentos, naquela ocasião, já estavam estimados em R$ 200 milhões, sendo queNova a Jaguaribara deverá custar R$ 15 milhões (ver Nota do Autor deste capítulo) e a relocação da BR-116, cerca de R$ 20 milhões, segundo a mesma fonte. Vimos, anteriormente, que as desapropriações que, só esses três itens (Nova Jaguaribara, deslocamento da BR- 116 e desapropriações) deverão custar cerca de R$ 72 milhões, ou seja, apro ximadamente, US$ 65 milhões[2] , quando, inicialmente, eram previstos apenas US$ 25,5 milhões. 15.2 - Custo de operação e manutenção Para se ter uma ideia da grandiosidade da Barragem do Castanhão, é pouco tempo, estariam entre as maiores já instaladas em todo o mundo . As comportas do Castanhão, em númerode 12, terão 11,50 metros de altura por 10 de comprimento. A manutenção e operação deste complexo sistema eletro-eletrônico-mecânico e a própria barragem exigem, no local, a presença permanente de equipes especializadas, somente justi grande escala. Não é o caso do Açude Castanhão. O custo da operação e manutenção de obras similares gira em torno de l,5 a 2,0% ao ano sobre o valor da obra, devendo situar-se, portanto, em torno de US$ 2,5 milhões, caso a barragem propriamente dita, com seus equipamentos 160 milhões, como antecipam seus promotores. Este custo anual, de operação e manutenção, estrategicamente, nunca foi citado em nenhum documento pelos promotores do empreendimento e nem foi considerado no seu estudo de vi abi li dade econômi ca. S eri a esta mai s uma omi ssão proposital? Por que?
Custo Financeiro
193
A título de ilustração, convém ressaltar que a Barragem do Orós não tem comportas de segmento (acima do sangradouro). Portanto, seu custo de manutenção e operação é bastante baixo. E por falar em Orós, sua barragem tem apenas 600 metros de comprimento, enquanto a do Castanhão terá 7.770 metros. A Barragem do Banabuiú tem 800 metros de comprimento. 15.3 - Conclusão •
[3] Lamentavelmente, até o presente (dez./98) , nossas autoridades
•
incluindo as obras complementares: a construção da nova cidade de Jaguaribara (cerca de 10.000 habitantes), deslocamento de 26 quilômetros da BR-116, desapropriações etc. Mesmo sabendo da fragilidade da nossa previsão, orçamos um custo estimado de meio milhão de reais para este megabar ramento. É certo que o custo médio comparativo com outros barramentos, construídos pelo DNOCS, não pode espelhar uma
•
achamos que tal procedimento embora com reservas, nos permite vislumbrar, mesmo que discutível, o custo provável dessa obra de engenharia. Infelizmente, observa-se que, em nosso país, os interesses políticos se apresentam como fator decisório de um empreendimento quando este deveria ser legalmente amparado pelas
normas jurídicas no Brasil, existem para não serem cumpridas. O Poder Político está acima da Técnica e da Justiça, para nossa tristeza [O grifo é nosso nesta segunda edição]. Deixamos ao leitor a tarefa de concluir o presente capítulo.
194
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
Maria Zita Timbó,
Capítulos XXIX e XXX é Condenado pela Natureza Açude Castanhão
O Castanhão e A Questão Sismológica na região do
6ª PARTE: IMPACTOS NEGATIVOS
CAPÍTULO XVI Impactos ambientais e sociais
197
CAPÍTULO XVII Jaguaribara, a cidade submersa
205
CAPÍTULO XVIII A questão sanitária do Baixo Jaguaribe
209
CAPÍTULO XIX Controle das enchentes no Baixo Jaguaribe
217
CAPÍTULO XX Pesca e Piscicultura
223
XVI IMPACTOS AMBIENTAIS E SOCIAIS
E
sobre a construção da Barragem do Castanhão, que já vinha se arrastando desde o ano de 1985, e que, a partir de 1990, passou a ser travada no seio do Conselho Estadual do Meio Ambiente (COEMA) entre defensores e opositores daquele empreendimento, a Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE), em setembro de 1992, resolveu contratar duas das mais credenciadas autoridades brasileiras, especializadas em hidrologia, meio ambiente, poluição das águas e dos solos, para oferecer parecer técnico sobre este assunto que atraía as atenções da sociedade cearense. Com esse objetivo, foram contratados os professores: • Aristides de Almeida Rocha , Assessor da Organização Pan-Americana e Mundial de Saúde e daUNITED - Desenvolvimento Industrial para Assuntos de Poluição de Águas - Limnologia - e Impacto Ambiental; e • , da Universidade Federal do Rio de Janeiro, uma das mais eminentes e respeitáveis autoridades brasileiras em hidráulica, hidrologia e meio ambiente. Passamos a apresentar a visão dos insignes técnicos, através da trans crição de trechos mais sugestivos expostos em seus relatórios apresentados à SEMACE: 16.1 - Professor Aristides de Almeida Rocha Fez sérias restrições à construção de uma só barragem, no terço inferior do Rio Jaguaribe, concentradora de todos os recursos hídricos dispo -
198
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
níveis, ao asseverar:“De um ponto de vista conceitual, o melhor sempre seria procurar alternativas para a construção de pequenas barragens por serem menos impactantes, exigindo menores gastos”. Apresentou velada crítica ao procedimento de como estava sendo conduzido o processo de licenciamento (EIA/RIMA) do Açude Casta nhão que, antes mesmo de chegar à sua análise, aprovação ou não pelo órgão competente, no caso a SEMACE, já contava com a destinação de construção. Mais estranho do que isso: já era conhecida a empresa-in cumbida da construção da obra vencedora da concorrência (intempestiva) realizada, em 1989, pelo DNOCS, a Construtora Andrade Gutierrez. Vejamos o que o professor.Aristides disse a respeito: A análise de tais pressupostos em momento ulterior à destinação de recursos, a obtenção prévia de licenciamento, atendendo fatos circunstanciais - momen tâneos político - administrativos, pode resultarum emdesgastante processo de confronto entre as várias partes envolvidas[o grifo é nosso] bem como, deixar eventualmente de atender aos reais benefícios ao ambiente, à saúde, região árida e semi árida poderá trazer.”E continuando: “nem sempre, até recentemente, os parâmetros ambientais foram contemplados na medida em que os parâmetros econômicos”. E assevera: “Assim, tais obras, muitas até de grande vulto e, consequentemente, de grande impacto, tiveram decisão polí tica em função apenas do almejado desenvolvimento econômico, sem que as para contraindicar um empreendimento, ainda que fortemente recomendado talvez por razões econômicas. E ntendemos que, em face do exposto, o i lustre professor fez uma expressiva crítica quanto ao comportamento dos nossos políticos (os mais pertinazes defensores da obra) ao longo do conturbado processo decisório da construção da Barragem do Castanhão. E mais uma vez ele adverte:“No caso do Açude Castanhão, não há indicações com o que poderá ocorrer a jusante da barragem” [o grifo é nosso]. E continua: “Jamais a natureza deve prestar-se, em uma visão - an tropocêntrica, para o exercício de tentativas e erros, nem ser entendida como sendo um grande tubo de ensaio de laboratório”. “Essas situações têm ocorrido frequentemente no Brasil, obrigando, posteriormente, à efetivação de enormes gastos públicos no sentido de fazer voltar uma
Impactos Negativos
199
qualidade e condições da água satisfatórias do ponto de vista sanitário e ecológico[o grifo é nosso]. Assim, paradoxalmente, um empreendimento realizado para trazer benefícios sociais e econômicos, acaba originando uma intervenção negativa sobre o meio ambiente deixando de contemplar, não só os aspectos de proteção ambiental, mas, sobretudo, a própria comunidade,
16.2 - Professor Theophilo Benedicto Ottoni Netto Seu parecer foi longo e detalhado, constando de quase 100 páginas renomado professor, além de ter revelado excelente poder descritivo e absoluto domínio sobre a matéria para a qual foi contratado, demonstrou ser, também, um profundo conhecedor das características geológicas, geomorfológicas e hidrológicas do Vale do Jaguaribe. Ele foi o projetista do belo sangradouro do Açude Orós e autor dos Estudos Hidrológicos do Açude Banabuiú, ambos localizados no estado do Ceará. Transcrevemos, a seguir,ipsis litterisalguns trechos sugestivos do item 3 – Inspeção Localdo seu parecer, no que ele denominou de Primeiras Considerações . Esclarecemos ao leitor que, para sua melhor compreensão, guardamos a forma exposta no referido documento: 16.2.1 - A questão da salinização dos solos e da água 3.7. A salinização dos solos e da água na região do Baixo Jaguaribe - cons titui fator preocupante que deve ser encarado com realismo e objetividade. Ela poderá ser promovida pelos seguintes mecanismos mais sugestivos: 3.7.1 - Excesso de radicais salinos em reservatórios sujeitos à forte - eva 3.7.2 - Intrusão de água salgada proveniente do oceano nos prismas de escoamentos que penetram nos estirões marítimos dos cursos d’água (língua interior dos continentes por diferença de pressão (lente de Hertzberg). Ou [4] andamento quando da época de nossa inspeção local, do sistema público de irrigação da Chapada do Apodi (1.750 ha) atendida pela captação em
200
A Face Oculta da Barragem do Castanhão
Pedrinhas; normalmente, as águas de drenagem dessa natureza se tornam progressivamente salinas e agressivas, à medida que se processa a conveniente adequadas de mineralização dos terrenos no horizonte pedológico que contém a massa de raízes dos plantios irrigados a continuidade, ao longo do tempo, das descargas salinas dessa rede de drenagem agrícola, no futuro, pode conduzir a sérios problemas na região do Baixo Jaguaribe, mormente se o sistema de irrigação da Chapada do Apodi atingir as áreas pretendidas. 16.2.2 - A ocupação dos terrenos ribeirinhos , destacamos sua alusão No parecer do professor quanto ao aproveitamento hidroagrícola ao longo do Rio Jaguaribe, já plenamente incorporado à economia do estado, na região perenizada pelo Açude Orós (300km) que, lamentavelmente, será coberto pelas águas do Castanhão. A parte atingida é um trecho aproximado de 70 quilômetros pelas margens do próprio Rio Jaguaribe e cerca de 50 quilômetros da perenização promovida pelo açude Riacho do Sangue. Também o Açude pela represa do Castanhão: A ocupação atual dos terrenos no fundo do vale do Rio Jaguaribe, que se estendem de Cruzeirinho até Itaiçaba, é um fato irreversível constituindo várias dezenas de núcleos populacionais que vão de poucas centenas de ha operosos, e contendo centenas ou mesmo milhares de pequenos -e médios pro prietários rurais, a planície do Baixo Jaguaribe é um verdadeiro cadinho de progresso e atividades produtivas que se estendem por minifúndios e bem conhecidos latifúndios que já vem usufruindo, naturalmente, dos benefícios da água permanente graças às regularizações promovidas, há mais de 10 anos, pelos Açudes públicos Orós e Arrojado Lisboa (Banabuiú). E continuando: “São hoje cerca de 250 a 300 mil usuários ocupando terras razoavelmente irrigadas no Baixo Jaguaribe. De acordo com essas situações, vem sendo im plantado o progresso e o desenvolvimento de uma das regiões tidas como das mais produtivas e operosas do estado do Ceará”. Segundo o documento em causa, merece“uma análise crítica o bombeamento de grande porte através da Usina de Bombeamento (Pedrinhas)” que, poderá afetar“os inúmeros e médios usuários particulares de água para irrigação, se amanhã tais usuários
Impactos Negativos
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se julgarem prejudicados em seus anseios de progredir, caso venha a acontecer restrições quanto ao uso da água.” Na continuidade, diz o relatório: 3.13 - Toda essa problemática de cunho sócioeconômico e legal, - possivel mente poderá ser considerada de maneira imprópria se, além dos parâmetros sucintamente referidos, acrescerem-se a possível existência de novos - e promis sor es grandes bar ramentos que costumam dar ao lei go a i dei a de que haveráágua em abundância...De uma forma genérica, os leigos não sabem que as perdas d’água por evaporação compõem vazões bem maiores do que aquelas que são regularizadas a jusante [o grifo é nosso]. 16.2.3 - A demanda hídrica supera as disponibilidades Observamos, nessas“Primeiras Considerações” de seu relatório encaminhado à SEMACE, que o professor demonstrava sua preocupação com o que poderia advir, futuramente, para a população do Baixo Jaguaribe. Tal inquietude era procedente, pois alguns políticos desinformados ainda insistiam, à época, na aventura da irrigação de 75.000 hectares na Chapada do Apodi, embora, no RIMA, haja citação de apenas 5.000 hectares, contrariando a euforia em torno do assunto, em meados da década de 80. Realmente, a preocupação do professor é procedente, senão vejamos: Uma área irrigada de 75.000 hectares, por si só, consumiria cerca de 42,8m³/s, quando todo o vale (72.440km²) só pode dispor de, no máximo, 43,00m³/s, conforme exposto noCapítulo XIV - Vazão máxima regularizável pelo Rio Jaguaribe . Ademais, a Chapada do Apodi está a montante (acima) do Açude Castanhão, que tem uma bacia de drenagem (23.616km²). Destarte, a bacia de captação pluviométrica do Açude
demandas, apresentada no quadro a seguir, em curto prazo, para todo o Vale do Jaguaribe se fazer em torno de 65m³/s. enquanto este só pode dispor, como já citamos anteriormente, de, no máximo, 43,00m³/s (ver Capítulo XIV).
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PROJETOS DE IRRIGAÇÃO (1) E DE ABASTECIMENTO D'água NO VALE DO JAGUARIBE
DEMANDAS ESTIMADAS (m³/s)
TOTAL
64,99
Notas O Povo
O valor das vazões regularizáveis máximas possíveis de 43.00m³/s para o Vale do Jaguaribe nos parece absolutamente consistente, pois o mesmo foi considerado pelo DNOCS antes mesmo do advento da Bar ragem do Castanhão, pela SUDENE (1980), DNAEE/SOSP (1989), no parecer do professor para a SEMACE (1992) e por nós próprios em trabalho publicado no Boletim do DNOCS (1981), conforme foi amplamente exposto nos capítulos XII e XIV . Portanto, as demandas d’água estimadas para o atendimento das presumíveis necessidades (projetos existentes e previstos) já ultrapassam, mais de 30% de suas disponibilidades (oferta) hídricas. Isso em função da -re gularização tradicional com a açudagem, embora existam métodos mais modernos que poderiam melhorar o rendimento hidrológico das bacias
, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ. Visando demonstrar a consistência da vazão máxima regularizável possível para o Vale do Jaguaribe, citamos nosso trabalho intitulado “Subsídios aos Estudos de Transposição de Vazões dos Rio Tocantins e São Francisco” , publicado no Boletim Técnico do DNOCS (jul./
Impactos Negativos
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dez., 1981), tabela IV, página 138. Nele, relacionamos todos os açudes construídos e previstos para o Vale do Jaguaribe e suas respectivas vazões regularizáveis, onde chegamos ao total de 40,11m³/s. Dessa forma, não o valor “máximo maximorum”de 43,00m³/s para a vazão regularizável de todo o Vale do Jaguaribe. Ao ensejo desta nova edição deste livro já surgiram mais duas -de mandas de água para a já comprometida disponibilidade hídrica do Vale para a Siderúrgica que se cogitam instalar em áreas próximas ao Porto 3 /s e para a Siderúrgica 3 1,5m /s. Essas demandas não estavam relacionadas, isto é, não foram consideradas por ocasião da elaboração EIA/RIMA da Barragem do Castanhão. 16.2.4 - E se a grande barragem secar? item 3 - Inspeção Local do Relatório , o professor Ottoni , considera que a excessiva utilização d’água (90% da garantia) do Açude Castanhão poderá conduzir ao seu total esvaziamento, escrevendo: manejada e de qualidade suspeita, já tem causado problemas ao -país. En quanto os escoamentos naturais disponíveis são utilizados e esgotados na forma tradicional, o nordestino sofre com falta d’água, porém já se conformou com tal ocorrência trágica, para ele “vinda de Deus”. Essa situação para o homem simples do nosso sertão é comum e esperada... Outra coisa,- completa mente diferente para ele, é ter imaginado que seus problemas de falta d’água da disponibilidade hídrica persiste talvez de forma ainda mais difícil, - por tentar progredir? E a situação de revolta interior daquele brasileiro simples prejudicado e injustiçado?
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16.3 - Conclusão •
•
Será que os promotores e defensores do Açude Castanhão, toma ram realmente conhecimento dos pareceres desses conceituados professores, de renomes nacional e internacional, contratados pela SEMACE para, de per si sobre o empreendimento? O que dizer dos Conselheiros do COEMA, que decidiram pelo licenciamento da construção da obra por 12 votos a favor e 8 con tra? Esta aprovação somente foi conseguida após três Audiências Públicas convocadas pelo COEMA. Nas duas anteriores, a licença prévia foi negada por 12 votos contra e 4 a favor (27/07/92) e 10 votos contra e 9 a favor (17/08/92).
• sugestões dos eminentes técnicos por ela contratados para oferecer •
No Capítulo XXVII - O Castanhão é aprovado no COEMA, nos permitimos nominar os conselheiros que votaram contra e os que votaram a favor. Caberá a história o julgamento de suas decisões.
A clareza, a transparência e objetividade das exposições elaboradas pelas eminentes autoridades contratadas pela SEMACE, os professores Aristides de Almeida Rocha e , razão, deixamos ao leitor a tarefa de tirar suas próprias conclusões.
XVII JAGUARIBARA, A CIDADE SUBMERSA
D
já citados nos capítulos anteriores, merece destaque especial aquele relacionado ao reassentamento das populações atingidas em quatro municípios do Médio Jaguaribe. Segundo o RIMA (página 6.78, Volume I-B Textos), foi estimada uma população de 9.008 pessoas que serão impactadas pela Barragem do Castanhão. Do total, o município de Jaguaribara concorre com 7.651 habitantes, sendo 2.109 na área urbana e 5.542 na rural. Os municípios de Alto Santo e Jaguaribe participam com uma população rural de 368 e 289 pessoas atingidas, respectivamente, segundo o referido documento. O município de Jaguaretama, além de ter cerca de 150 casas atingidas em sua sede municipal, ainda terá 1.480 pessoas deslocadas na sua área rural.
17.1 - A submersão total da cidade de Jaguaribara Sobre a cidade de Jaguaribara, o professor reservou, em seu relatório apresentado à SEMACE, um capítulo especial, de profunda e emotiva sensibilidade, somente digno de um técnico do mais elevado nível que não viola o que ainda resta de sacrário à autonomia humana e nem se molda ante o autoritarismo do poder. Vamos destacar alguns trechos desse importante depoimento:
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(...) Alterar, mesmo que aparentemente para melhor, as raízes que vem construindo há séculos os condicionantes próprios de uma comunidade que nas autoridades, são razões compreensíveis capazes de gerar incompreensão, revolta e, sobretudo, desânimo e incertezas; mormente se a área física onde será reassentada for próxima da área a ser submersa que compõe a maior parte do município. Isso porque, devido à operacionalidade do reservatório, em grande parte do tempo (anos e anos seguidos) o espelho d’água do mesmo irá descobrir os resíduos próximos da antiga cidade (áreas elevadas), fato que representará fator psicológico desfavorável. Cabe a questão: a implantação do [1] Castanhão na cota 100m é capaz de promover impactos positivos (benefícios) das adversidades de cunho social, moral e sentimental que atinge -a popula ção reassentada? Note-se: esse assunto não deve envolver somente custos e benefícios medidos com a frieza dos cálculos e previsões nem sempre justas e equitativas; o problema a solucionar é de cunho muito mais profundo já que trata dos sentimentos humanos construídos a base de um passado sofrido e vivido e de um presente de esperanças, as quais quando deixam de existir nivela o homem a qualquer ser vivente animal. Tantos m² por família, - tan tas escolas, creches, iluminação pública, supermercados, bancos, arruamentos, praças, igrejas etc., e o sonho de uma cidade modelo passa a ser vendido aos homens comuns habi tuados a um padrão de v i da bem mai s modesto, onde ele se sente seguro, embora, muitas vezes, infeliz. Tal situação, inerente ao ser humano consciente, pode ser medida em parâmetro de benefício/ custo? É claro que não. Deve prevalecer, no entanto, o interesse maior das comunidades que deverão usufruir os benefícios que o empreendimento se propõe a gerar, e do próprio estado. A justiça social entende assim, e assim também deverão entender as populações a serem reassentadas, se, devidamente, esclarecidas e tem de fato condições de promover os benefícios indicados nos estudos de via bilidade, técnica, econômica e ecológica? -
preendimento em relação ao Baixo Jaguaribe, região das mais progressistas do estado do Ceará. Os impactos ambientais negativos resultantes da construção e operação do Castanhão na cota 100m e que aí poderão ser gerados, realmente irão ser compensados pelos benefícios pretendidos? , são feitas várias advertências e recomendações para que seja elaborado “um novo do Castanhão” benefícios gerados pelo açude. 17.2 - Conclusão •
O texto apresentado à SEMACE pelo cearense Benedicto Ottoni Netto profissional que, atingindo seu ápice, deixa extravasar sua sensibilidade, ao transformar-se num simples ser humano capaz de harmonizar a técnica, no mais das vezes fria e insensível, com a faculdade de sentir o sofrimento dos seus semelhantes.
Como sempre fazemos, deixamos ao leitor que, face ao apresentado, sinta-se à vontade para tirar suas próprias conclusões. NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
de Lima
Francisco Pardaillan Farias
“Estimava-se, a época, que o contingente populacional total a ser retirado da área a ser inundada era da ordem de 11.000 pessoas distribuídos no Jaguaretama e Jaguaribe, predominantemente população rural” da barragem, atingindo e obrigando o reassentamento de mais de doze mil pessoas, o Canal da Integração é uma obra bem menos impactante sobre o meio antrópico”. Hypérides Macedo
XVIII A QUESTÃO SANITÁRIA DO BAIXO JAGUARIBE
18.1 - O efeito das grandes barragens no meio ambiente
A
é de todas as ações que o homem é capaz de realizar, a que acusa, ao mesmo tempo e local, maiores danos ambientais: físicos, biológicos e socioeconômicos. Os que pensam que podem resolver todos os problemas de utilização da água apenas pela construção de grandes barramentos, podem conhecer muito bem a engenharia, mas, certamente, não conhecem os ensinamentos da moderna ciência denominadaEcologia, a qual, atualmente, prepondera como a de mai or i mpor tânci a entre as demai s em todas as camadas Foi essa a mensagem que, insistentemente, passamos à sociedade cearense durante todas as fases das discussões que antecederam a votação no Conselho Estadual do Meio Ambiente - COEMA que, no dia 21 de dezembro de 1992, decidiu, por 12 votos a 8, pelo licenciamento da construção da Barragem do Castanhão. O professor , fez oportunas colocações de cunho ambiental relacionadas à Barragem do Castanhão. Vejamos o que ele diz à página 34: Apesar da listagem dos Planos de Proteção Ambiental (10 Planos, - apre sentados de forma convencional) e a descrição genérica dos mesmos constarem
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
como indispensáveis para viabilizar ecologicamente o empreendimento. O custo desses projetos, aconselhados no RIMA, não foram previstos nos estudos benefícios/custo, onde deveriam compor a rubrica considerada como convencional e obrigatória (custo ambiental). Nos custos globais, -foram le vados em conta, tão somente, as estimativas (a nosso ver otimistas) dos custos áreas a serem inundadas pelo reservatório (desapropriações, reassentamento, relocações etc.) Além dos impactos negativos previstos no RIMA, consideramos - indis pensáveis serem realizados estudos ambientais resultantes da repercussão do Açude Castanhão sobre o Baixo Jaguaribe, uma das regiões mais prósperas e progressistas do estado do Ceará. Convém recordar que, também, o professorAristides de Almeida Rocha , no seu parecer para a SEMACE, já tinha advertido que “No caso do Açude Castanhão, não há indicações com o que poderá ocorrer a jusante da barragem”[o grifo é nosso] - (ver Capítulo XVI do presente livro). O parecer do professor relaciona vários problemas que poderão advir ao Baixo Jaguaribe em consequência do corte hidrosedimentológico do curso d’água do Rio Jaguaribe na seção de construção do Açude Castanhão“que passarão, em períodos chuvosos, a ser resultante da gênese dos escoamentos das vazões sólidas e líquidas bem inferior aos 44.824 km² controlados pela barragem” [o grifo é nosso]. O Açude Castanhão poderá passar por longos períodos sem sangrar: sejam construídas as barragens previstas pelo DNOCS no Alto Jagua ribe e na bacia do Rio Salgado, entre elas, as dos Açudes Castanheiro (1,5 a 2,0 bilhões de m³) ou Aurora (800 milhões de m³), Arneiroz (250 milhões de m³), Farias Brito (165 milhões de m³), Bastiões (137 milhões de m³), Conceição (394 milhões de m³), Trussu (263 milhões de m3), Cariús (81 milhões de m 3), entre outros. Ver Tabela I do Capítulo XIII . 18.2 - Salinização dos solos e das águas Outro Plano de Proteção Ambiental não previsto no RIMA refere-se à questão da possível salinização dos solos e das águas no Baixo Jaguaribe.
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A esse respeito, o professor assim se expressou em seu relatório para a SEMACE (página 39): A salinização, devido aos manejos agrícolas, é, a nosso ver, aquela que poderá, no futuro, trazer maiores problemas graças ao uso de fertilizantes, corretivos e defensivos empregados largamente e, nem sempre, com os cuidados devidos, em áreas irrigadas... A história da humanidade em tempos recentes, mostram fracassos sugestivos relacionados a essa problemática. Continuando, ele diz: A questão da penetração de prismas de salinidade, seja através dos a água do mar a salinizar solos que contenham água doce, deverá-ser devi meio ambiente afetado. Para ilustrar o tema acima, para os que possam achar que o assunto seja irrelevante, vamos transcrever trecho do que dizem os autores Ray K. Linsley e Joseph B. Franzini em seu livro Engenharia de Recursos Hídricos”, sob o título “Intrusão de Águas Salgadas”, página 134: Um equilíbrio natural entre as águas doces e salgadas se estabelece ao longo será necessária uma coluna de água doce cerca de 1,025 mais alta do que uma coluna de água salgada... Assim, as condições reais da superfície de contato entre águas do mar e águas doces é regulada pelo equilíbrio hidrodinâmico entre estas e as águas salgadas. O problema é que, com o possível rebaixamento do lençol freático do Baixo Jaguaribe, decorrente do intenso uso que se faz daquele -ma subterrâneos decorrente da impermeabilização das fundações no local da Barragem do Castanhão, poderá haver o desequilíbrio hidrodinâmico referido pelos mencionados autores, favorecendo, assim, a indesejável penetração (intrusão) da água salgada, o que põe em risco a qualidade dos solos e da água do Baixo Jaguaribe. 18.3 - Controle sanitário do Baixo Jaguaribe A distribuição populacional nas áreas do Baixo Jaguaribe, concentrada em cidades, distritos, vilas, povoados e difusa no meio rural, e o conse quente progresso, promovendo o crescimento industrial, geram fatores de
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
poluição distribuídos temporal e espacialmente na região. Nas condições vigentes (sem o Castanhão), o Rio Jaguaribe ainda está atendendo a um ciclo de escoamento quando, nos períodos chuvosos, as vazões de enchentes tendem a promover efeito apreciável de varredura (limpeza) e diluição das cargas poluidoras mal manejadas por falta de atuações sanitárias adequadas. Com o corte do curso d’água natural pelo Açude Castanhão, as enchentes no Baixo Jaguaribe deverão provir, durante vários anos- se guidos (10 a 20 anos, períodos em que o Açude Orós também deixará de sangrar), tão somente da bacia residual (cerca de 19.000 km²). Será que ela é capaz de realizar a recomposição sanitária da região? A- si tuação deverá se agravar, ainda mais, quando o Açude Figueiredo (500 for construído. Outras barragens previstas pelo DNOCS para o Alto Jaguaribe e na bacia do Rio Salgado vão tornar, cada vez mais, crítica a situação sanitária do Baixo Jaguaribe, onde vivem, atualmente, cerca de 300.000 pessoas e que poderão ser 500.000 nos próximos 20 anos (taxa de crescimento populacional estimada em 2,587% a.a). Na bacia de contribuição do Castanhão, estão localizadas cerca de 50 cidades (665.652 habitantes) e nenhuma delas é dotada de disposição adequada de esgotos, os quais são lançadosin natura no Rio Jaguaribe ou em seus tributários, conforme no seu relatório: comenta o professor Seria o Plano de Controle Sanitário do Baixo Jaguaribe de fundamental que a ele continuarão a ser lançadas, bem como das condições ambientais re lacionadas aos vetores de doenças transmissíveis veiculadas a água (malária, esquistossomose etc.). Tais questões costumam ser levadas em conta de acordo 18.4 - Advertências sobre o Castanhão Recursos Hídricos do Nordeste, publicamos no JornalO Povo, do dia 10 de março de 1993, o seguinte artigo: Diante da polêmica discussão em torno da Barragem do Castanhão, a SEMACE decidiu, de forma prudente e correta, contratar dois técnicos especialistas do Rio de Janeiro e São Paulo para emitirem pareceres sobre a viabilidade técnica, econômica, social e ecológica do referido empreendimento.
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O professor Aristides de Almeida Rocha, Titular da Faculdade de - Saú de Pública da USP e Assessor da Organização Pan-americana e -Mun dial de Saúde (OPS/OMS), entre outros títulos que ostenta, concentrou o seu parecer nos aspectos químicos, físicos e biológicos da água, tendo feito as seguintes advertências: Essas situações têm ocorrido frequentemente no Brasil obrigando - poste riormente à efetivação de enormes gastos públicos no sentido de fazer voltar uma qualidade e condições de água satisfatórias do ponto de vista sanitário e ecológico. Assim, paradoxalmente, um empreendimento realizado para trazer benefício social e econômico, acaba originando uma intervenção negativa sobre o meio ambiente deixando de contemplar, não só os aspectos de proteção ambiental mas, sobretudo, a própria comunidade efetivamente envolvida na E prosseguiu: De um ponto de vista conceitual, o melhor sempre seria procurar- alterna tivas para a construção de pequenas barragens, por serem menos impactantes, exigindo menos gastos. Outra advertência feita pelo ilustre professor paulista é a que respon de à colocaçãofeita pela Secretaria de Recursos Hídricos, que defende a construção imediata dabarragem e, simultaneamente, seja iniciado um “monitoramento da região a jusante do açude”, para que se tenha“um conhecimento mais aprofundado das consequências do fenômeno, permitindo, a médio e curto prazos, soluções de engenharia que minimizarão os efeitos negativos dos períodos sem sangria”. Vejamos o que diz o referido professor sobre este assunto, em seu parecer: “No caso do Açude Castanhão, não há indicações de programas ou simples preocupações com o que poderá ocorrer a jusante dc barragem”. E continua: “Jamais a natureza deve prestar-se, sob uma visão antropocêntrica, para o exercício de tentativas e erros, ou ser entendida como sendo um grande tubo de ensaio de laboratório”. de Janeiro, assinado pelo seu Diretor-Presidente, professor Benedicto Ottoni Netto , considerado uma das maiores autoridades em Hidráulica e Hidrologia de nosso país, foi ainda mais contundente ao reprovar a construção da Barragem do Castanhão, da forma como ela está sendo proposta. Em sua opinião,“aquela imensa obra, paradoxalmente, não temágua para gerar os benefícios pretendidos pelo DNOCS, isto é,
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destinar uma vazão de 5,00 m³/seg para Fortaleza, irrigar 43 mil hecta res e gerar 20 MW de energia”. Para efeito de comparação observa que : “Fortaleza, atualmente, consome 800 MW de energia”. Ressalta, ainda, que nos importância para o atendimento dos benefícios pretendidos pelo empreendi mento”, recomendando que seria melhor “implantar progressivamente obras equivalentes de menor porte, com atuações menos impactantes, promovendo benefícios gradativamente crescentes e controlados”. Após comprovar, tecnicamente, através de dois métodos distintos, que “o Castanhão tem a mesma vazão regularizada do Açude Orós, isto é, 12,00m³/seg.”, a HIDROESB - Saturnino de Brito S.A. em seu pare cer, conclui que: “o Castanhão, na cota 100m, não tem água para gerar viabilidade econômica do empreendimento” [o grifo é nosso]. 18.5 - Uma Grande Barragem Outro artigo de nossa autoria, bastante ilustrativo para o tema abordado neste capítulo, foi o que publicamos no Jornal Diário do Nordeste – ECONOMIA , no dia 14 de março de 1992, sob o título“Uma Grande Barragem” que a seguir transcrevemos: “No Brasil, e mais acentuadamente em nossa região, onde a política de utilização dos recursos naturais e, em particular dos recursos hídricos, nem sempre é considerada nos seus aspectos fundamentais, ainda há uma - injusti Para a formação de uma opinião pública esclarecida sobre este controvertido, mas sempre atualizado tema, data vênia, vamos trans crever alguns tópicos do livro, recentemente lançado por consagra dos autores portugueses, sob o título: A Gestão da Água – Princípios Fundamentais e sua Aplicação em Portugal, editado pela Fundação Calouste Gulbenkian: A controvérsia das grandes barragens tem vindo a alimentar apaixonadas discussões entre ambientalistas, sociólogos e engenheiros. Até poucos anos, estas barragens eram invariavelmente consideradas uma benesse indiscutível e um fator decisivo para o arranque da economia dos países onde se as construíram. Hoje, porém, começa a ser-se menos dogmático nesta forma de ver os problemas
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e atribuir-se importância a certas objeções outrora negligenciadas. Assim, entre os principais inconvenientes que podem estar associados às grandes barragens, é costume apontar os seguintes: Alteração dos hábitos de vida das populações que vivem na região onde se forma o grande lago. Por vezes, a construção das barragens obriga - a deslo psicológicos importantes, determinados pela alteração brusca dos seus hábitos; Alterações dos níveis freáticos e do regime das águas subterrâneos. Os Alteração da distribuição na crosta terrestre. A acumulação de água nas barragens provoca um aumento das pressões exercidas sobre os - terre certos fenômenos geotécnicos, como, por exemplo, escorregamento de terra e sismos;[o grifo é nosso]. rotura das grandes barragens não é, contudo, um acontecimento muito frequente, pois, em princípio, as precauções adotadas aumentam com a dimensão da obra. Outros inconvenientes (o desperdício da água pelo aumento da área de evaporação, por exemplo) foram comentados pelos autores, mas, por uma questão de espaço, deixamos de transcrevê-los. Há que se ressaltar, entretanto, que a publicação em causa não exclui a priori “a construção de qualquer nova barragem, em qualquer região do mundo, como pretendem alguns extremistas da conservação da natureza”. E sentencia: Para, além disso, uma criteriosa análise de custos/benef ícios poderá con duzir, em muitos casos, a dar prioridade aos aproveitamentos de dimensões médias, que mais facilmente são escalonados de acordo com as necessidades e que envolvem, normalmente, menores riscos. É importante assinalar que, como dizem os autores portugueses- ci tados, a implantação de uma grande barragem exige cuidados especiais, (sismos)”[o grifo é nosso]. Por outro lado, a opção pelas barragens de por exemplo) conduzem a custos comprovadamente menores, visto que as cavas de fundação são geralmente pouco profundas (menos de um metro, lembrando que no caso do Açude Castanhão a fundação chega
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a ter 36 metros de profundidade, conforme foi comprovado), além da redução substancial nos custos dos respectivos sangradouros e dos custos Além disso, os autores acrescentam que a grande obra hidráulica tem caráter irreversível, que sejam tomadas da incorreta visão dos problemas” [o grifo é nosso]. 18.6 - Conclusão Os graves problemas que poderão ser causados pela construção da-Bar ragem do Castanhão, não foram levados em conta pelos projetistas e nem pelos seus promotores, apesar de serem advertidos, com bastante antecedência, e, consequentemente, sendo de pleno conhecimento dos Senhores Conselheiros do COEMA. Face ao exposto arguimos: Por que doze Conselheiros votaram a favor, se alguns deles nas duas audiências anteriores foram contra?
Porventura, esses doze Conselheiros do COEMA não leram os relatórios apresentados pelos eminentes professores Aristides de Al meida Rocha e ? Se não os leram, em quais critérios se basearam? conclui recomendando a O parecer do professor elaboração de um novo projeto o que aguardamosé at hoje. Considerando os pareceres dos dois Consultores contratados pela SEMACE, e os diversos níveis de debates com personalidades cearenses, – Quem será responsabilizado, no futuro, pelo insucesso e malefícios desse empreendimento? – Caso haja uma falha técnica de ordem sismológica ou de outra -na tureza, quantos milhares de cidadãos cearenses terão suas vidas ceifadas? Qual o valor de uma vida humana?
Ao leitor deixamos nossas perguntas, certos de que formularão suas próprias conclusões.
XIX CONTROLE DAS ENCHENTES NO BAIXO JAGUARIBE
19.1 - O Castanhão teria capacidade para controlar enchentes?
O
no Baixo Jaguaribe constituiu-se no principal e mais importante argumento do extinto Departamento
da Barragem do Castanhão, concebida e apresentada sob a forma de anteprojeto por aquele Departamento, cuja sede era no Rio de Janeiro. O controle das enchentes no Rio Jaguaribe e a irrigação de 75.000 hectares ragem surgiu no ano de 1985, cinco meses após a maior enchente que, até hoje, se tem registro nos arquivos do DNOCS no Rio Jaguaribe. Portanto, o anúncio da barragem (não existia projeto executivo), praticamente coincidiu com o abalo emocional que ainda se fazia sentir em toda a população do Baixo Jaguaribe, ainda não refeita dos danos causados pelas enchentes de abril e maio de 1985. A ideia assim surgia como a solução salvadora e logo conseguia um número expressivo de adeptos, principalmente das populações mais diretamente afetadas pelas últimas enchentes. A experiência da irrigação na Chapada do Apodi, com apenas 1.750 hectares implantados, agora decorridos quase dez anos de sua operação, logo se transformou em rotundo fracasso, conforme vimos nos Capítulos III e IV .
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controle das enchentes no Baixo Jaguaribe. O projeto da Barragem do Castanhão, na sua edição considerada chimento: da cota 53m até a cota l00m acumulará cerca de 4,4 bilhões de metros cúbicos, destinados à regularização das vazões, sendo a cota 12,35m³/s, segundo o projeto original do DNOS; na outra faixa, ou seja, da cota 100m até a cota 106m, acumulará 2,3 bilhões de m³, que é o chamado “volume de espera” para “reter” ou “controlar” as enchentes no Baixo Jaguaribe. Mas, o volume de espera de 2,3 bilhões de metros só no mês de março, passaram 3,26 bilhões de m³ de água. E, no mês seguinte, mais 11,99 bilhões de m³. Foram 15,25 bilhões de metros cúbicos, onde o pico da enchente se concentrou, praticamente, em-cin co dias. Teria a barragem condições de controlar uma enchente dessa natureza? É claro que não! O mesmo raciocínio poderia ser feito em relação aos anos de 1924 e 1974, considerados, também, anos excepcionais de chuvas na bacia do Rio Jaguaribe e em todo o Nordeste. tenha rendido insistentes e ilusórias matérias nos jornais cearenses e na mídia do nosso estado, e se constituído tema principal do Seminário realizado na Escola Técnica Federal do Ceará, nos dias 20, 21 e 22 de junho de 1985, atualmente existe quase o consenso entre os técnicos cearenses, que a Barragem do Castanhão não promove o tão desejado controle das inundações no Baixo Jaguaribe nos anos de cheias excepcio nais. Esta verdade, que era cristalina para nós, somente foi reconhecida por parte dos que defendiam a Barragem do Castanhão, anos depois, após a publicação de um artigo, de autoria do Eng. José Nilson Bezerra Campos, professor Titular da Universidade Federal do Ceará e um dos mais pertinazes defensores do projeto Castanhão. O artigo foi publicado na Revista Engenharia Paulo de Frontin (ASTEF - Vol. 7, n° 9 ano de 1991), sob o título: “A Questão do Açude Castanhão: Teses e Antíteses” . Dele transcrevemos, inicialmente, o seguinte trecho:“O Açude Castanhão, projetado no Baixo Jaguaribe, se construído, será o maior reservatório do Brasil, talvez do mundo, barrando um rio intermitente.”
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Sobre o controle das enchentes no Baixo Jaguaribe, no seu mencio nado artigo, o professorNilson Campos assim se expressou: as inundações do Baixo Jaguaribe. Os opositores argumentavam que - o Cas tanhão, com sete bilhões de metros cúbicos nunca “encheria” . Veio o inverno de 1989. Escoaram no Boqueirão do Cunha mais de sete bilhões de metros cúbicos. As duas teses estavam derrotadas. O fato é que, em locais com rios com muito pouco provável que se consiga, economicamente, eliminar totalmente as cheias com a construção de um reservatório [o grifo é nosso]. É também pouco provável que se projete, nos dias atuais, um açude que nunca encha... O fato é que, com o Castanhão, Antes de transcrevermos a opinião de outros autores sobre este tema, gostaríamos de fazer alguns comentários sobre o que acima disse o-pro fessor Nilson Bezerra Campos , sem dúvida um dos mais destacados técnicos no assunto em nosso estado: mativa de que a Barragem do Castanhão “nunca encheria”. Ora, se a Barragem do Castanhão tem condições de acumular 6,7 bilhões de m³ de água e dissemos, no início deste capítulo, que só no mês de abril de 1985 escoaram no Boqueirão do Cunha (Açude Castanhão) 11,99 bilhões de m³ de água, é claro que o advérbio “nunca” jamais poderia ser empregado neste caso por quem quer que seja. No trabalho intitulado “As Enchentes no Vale do Rio Jaguaribe: Dimensões, Frequência e Alternativa de Controle” (apresentado noVI Simpósio Brasileiro de Hidrologia e Recursos Hídricos , realizado em São Paulo, de 11 a 14 de novembro de 1985)ressaltamos que houve cheias excepcionais no Rio Jaguaribe nos anos de 1924 (19,3 bilhões de m³), 1974 (16,8 bilhões de m³), 1985 (20,9 bilhões de m³) e, posteriormente, em 1989 (9,1 bilhões de m³). Essas informações sobre as enchentes no Rio Jaguaribe, a Divisão de Hidrologia do DNOCS, a partir de extrapolações de dados conhecidos do Açude Orós e constam de várias publicações, com citação do nosso nome, inclusive no EIA/ RIMA do Açude Castanhão e no “Projeto de Transposição de Vazões do Rio São Francisco” , elaborado pelo extinto DNOS. tado e está sendo construído, poderá passar de 10 a 20 anos consecutivos
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sem sangrar, fato este que poderá comprometer, seriamente, a qualidade das águas nele acumuladas e as condições sanitárias do Baixo Jaguaribe. um novo estudo hidrológico já que “simulação a hidrológica”, realizada para o período de 1939 a 1988, portanto 50 anos, considerou a evapo ração no espelho d’água do Açude Castanhão como sendo de apenas 1.700 milímetros, quandodeveria ser no mínimo de 2.228 milímetros. No relatório para a SEMACE, o prof. utilizou o índice evaporimétrica anual de 2.315,2 mm. Sugerimos ao leitor reler o Capítulo XI - Vazão Regularizada, deste livro. Vejamos o que diz a respeito o professor no seu já mencionado parecer para a SEMACE (página 52): 7.7.3 - quanto ao controle de enchentes do Baixo Jaguaribe, concordamos com o DNOCS que diz: “em locais com rios com grande variabilidade de economicamente, eliminar totalmente as cheias com a construção -de reserva tórios. Na verdade, a Barragem do Castanhao, na cota 100m, promove uma falsa noção de segurança no que diz respeito ao controle de cheias do Baixo Jaguaribe”. 19.2 - Conclusão •
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Evidenciamos que nenhum técnico, mesmo que iniciante deverá usar o advérbio “nunca”, pois as leis que regem a natureza e o próprio ser humano não são estáticas, mas extraordinariamente dinâmicas e imprevisíveis. Observamos que, dados de nossa apresentação tabular que versava “Sobre Vazões Máximas no Rio Jaguaribe e Respectivos Tempo de Recorrência” foram extraídos e usados quando da elaboração
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Também, muitos trechos de trabalhos por nós publicados foram transcritos no“Projeto de Transposição de Vazões do Rio São Fran cisco” elaborado pelo extinto DNOS, fato que, também, muito nos
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O próprio DNOCS, órgão do qual fomos Diretor, confessa a impossibilidade de se controlar as enchentes do Baixo Jaguaribe
Impactos Negativos
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merecendo o seguinte comentário do professor no seu parecer encaminhado à SEMACE, subitem 7.7.3e que repetimos: “Na verdade, a Barragem do Castanhão na cota 100 m, promove uma falsa noção de segurança no que diz respeito ao controle de cheias do Baixo Jaguaribe” [o grifo é nosso]. O que defendemos em relação à Barragem do Castanhão e con tinuaremos a defender, é a adequação de tal empreendimento, dentro de padrões técnicos/econômicos/sociais e ambientais realistas.Isto não foi nem está sendo feito, para nosso desalento.
Mais uma vez, deixamos ao leitor que, face ao exposto tire suas próprias conclusões.
XX PESCA E PISCICULTURA
20.1 - O EIA/RIMA superdimensionou a produtividade pesqueira dos açudes do Nordeste
N
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lugar, com 3,0% dos benefícios que serão proporcionados pela barragem. Segundo aquele documento, o referido reservatório poderá conduzir a uma captura, aproximadamente, de 7.700t/ano de pescado, gerando uma receita de US$ 5,5milhões/ano. Como o assunto foge à nossa especialidade, vamos transcrever, sem comentários, alguns trechos do parecer sobre o RIMA, elaborado para a SEMACE pelo pesquisador aposentado do DNOCS, ex-Diretor da Diretoria de Pesca e Piscicultura daquele Departamento e atual Pro fessor Adjunto do Curso de Engenharia de Pesca daUFC , José Jarbas Studart Gurgel , o qual se referiu, inicialmente, à baixa produtividade pesqueira do imenso lago de Sobradinho, no Rio São Francisco, da ordem de apenas 20kg/ha/ano. (...) Com o Quadro 6.2, o RIMA superdimensionou o potencial de captura do Açude Castanhão[o grifo é nosso], estimando em 7.691 tone ladas a produção, no oitavo ano de atividade da pesca. Esta produtividade se calculou ser de 170,9kg/ha/ano, superior em mais de 75% à média de todos os açudes do DNOCS, que é de 97, 6kg/ha/ano Alves ( op.cit.). De acordo com os dados desse autor, nos primeiros 8 anos a produtividade será somente de 1.923t, com uma produtividade de 42,7kg/ha/ano, visto que, somente em 16
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
anos de atividade pesqueira, é que os açudes atingem sua plenitude- de captu ra. Portanto, carece de uma revisão os estudos de projeção dos benefícios líquidos apresentados no Quadro 6.25, elaborado com base nos dados do RIMA [o grifo é nosso]. O RIMA omitiu, por completo, qualquer providência a ser tomada para a proteção da ictiofauna da bacia do Rio Jaguaribe, já bastante prejudicada 72.440km² reconhecendo, todavia que, com a formação do reservatório, poderá ocorrer a extinção dos peixes de piracema. sem que seja levada em consideração alguma medida neste sentido, tal como tem sido advertido na “Declaração de São Francisco”, no seu item 5 (FBCN, op. cit.). aumento da turbidez da água em suspensão, com implicações negativas para as comunidades bioecológicas, principalmente necton e do plâncton. devido à baixa penetração da luz, cuja maior fonte de produção de O dis2 solvido, será a ação mecânica dos ventos. antes de serem lançados no açude... (o destaque é nosso). O RIMA, portanto, com a solução adequada, deixando de destacar as outras formas de poluição da água e os meios devidos para se evitar que isto venha a acontecer no Açude Castanhão, o que será evidente. (...) Sem dúvida alguma, além dos problemas de natureza social e- econô mica, que não nos compete analisar por afetarem diretamente o meio - antró pico, serão os peixes e outros organismos aquáticos os mais prejudicados com a transformação ambiental que se processará, caso a barragem seja construída e as medidas preconizadas pelo RIMA, em sua forma original, não venham a ser reformuladas. O parecer do pesquisador e professor Jarbas Studart foi contestado pelo DNOCS em ofício N° 10/91-DIPRO, de 06/06/91 encaminhado pelo então Diretor- Geral. Eng. Luiz Marques , à SEMACE. A réplica do pesquisador foi contundente: (...) 3. Por considerar que esta análise foi feita de “forma deselegante e sem fundamento técnico” (página 1), os fatos por nós levantados parece terem
Impactos Negativos
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chocado o DNOCS, que cometeu o grave erro de aceitar um documento da maior importância, elaborado por uma empresa de Consultoria que não tinha mendos erros cometidos, como registramos às págs. 24/25 do Parecer Técnico N° 05/91 dessa Superintendência. (...) 11. O eletismo do DNOCS em selecionar no povoamento do Açude Castanhão apenas espécie de valor comercial, com desprezo para aqueles de pequeno porte, como piabuçu, o acará comum, o jacundaí, o cangati etc é sinal evidente da falta de conscientização ecológica do Órgão, que se preocupa somente com o aspecto econômico da pesca, esquecendo que elas fazem parte da cadeia Vale aqui salientar uma referência elogiosa ao DNOCS, órgão ao qual servimos durante mais de 35 anos e que foi uma escola de civismo e uma verdadeira Universidade de conhecimentos para todos os que nele trabalharam. O biologistaJarbas Studart, que fez a fundamentada crítica aquele vetusto Departamento foi, também, um dos seus mais ilustres e Raimundo Ademar Braga na área de piscicultura que foramOsmar Fontenelle , Rui Simões de Menezes, Hilton Nepomuceno , José Teixeira Peixoto , José William Bezerra e tantos outros que enriqueceram o conhecimento da ictiolo gia do Nordeste, e abraçaram com obstinação e dedicação, a verdadeira causa defendida pelo DNOCS, isto é, a busca incessante de encontrar soluções para os graves problemas nordestinos. Posteriormente, o pesquisadorJosé Jarbas Studart Gurgel publicou um interessante artigo no JornalO Povo/Jornal do Leitor , do dia 25 de (...) Isto nos leva à conclusão de que não é uma boa política para o DNOCS a construção de grandes açudes no semiárido nordestino, com a irrigação, o abastecimento público, o controle das enchentes e a produção de energia elétrica, o açude deve ser construído com capacidade de atender a esses propósitos. Para a exploração pesqueira, entretanto, não se - pres cinde de grandes áreas inundadas, que podem se tornar em pouco tempo improdutivas, caso não sejam adotadas medidas de conservação dos seus recursos pesqueiros.
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São inúmeros os exemplos que se conhece na literatura piscícola de grandes e velhos açudes que quase nada mais produzem em matéria de alimentos para o homem, embora não estejam isentos de serem recuperados. Diante deste aspecto biológico é que temos sempre nos manifestado contrariamente à construção da Barragem do Castanhão considerada como Desde os primeiros debates sobre esta obra optamos pelo barramento de vários trechos do Rio Jaguaribe, por atender melhor os interesses-bioló gicos-pesqueiros. 20.2 - Efeito das grandes barragens na Piscicultura Por ocasião de um Júri Popular sobre a Barragem do Castanhão, realizada no Auditório Murilo Aguiar da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, no dia 09 de junho de 1995, o professor da UFC e ex-pesquisador e funcionário do DNOCS, José William Bezerra , fez interessante conhecimento dos nossos leitores e estudantes interessados no assunto: (...) Estudos por nós realizados em 89 açudes do DNOCS demonstraram que a curva de rendimento da pesca que relaciona a captura por unidade de esforço com o esforço da pesca, diminuiu nos grandes reservatórios, em virtude do enorme tempo desperdiçado pelos pescadores em busca do pescado. No que se refere à profundidade, tornam-se improdutivas, pois a luz, impede que os produtores de alimentos na água possam desempenhar a função produtiva. Nas águas profundas habitam, comumente, os predadores. Estudos por nós realizados em 101 açudes administrados pelo DNOCS mostraram que eles produziram, em média. 17.358t/ano de pescado. Isto para o período de 1978 a 1987. A produtividade média foi de 118 kg/ha/ano, pois o espelho de água daqueles é de 147.058ha. Os mesmos estudos mostraram que a produtividade foi inversamente e proporcional à área dos açudes, sendo mais produtivas aquelas com bacias hidráulicas inferiores a 500ha. Por outro lado, a Represa de Sobradinho, com 34,1 bilhões de metros cúbicos e 420.000ha de área inundada, teve, em seu projeto, estimativas de produzir 29.400t/ano de pescado. Em 1983 o reservatório apresentou sua maior produção (21.000t), com produtividade da ordem de 50kg/ha/ano. Daí em diante houve sensível queda, alcançado apenas 5.000t, em 1989.
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A Barragem de Boa Esperança, no Piauí, com 5 bilhões de metros - cúbi cos de água e de 43.000ha de área inundada, teve, sua produção de pescado estimada em 2.100t/ano (PAIVA, 1973). MENEZES (1973) a estimou em 4.000t/ano. Após, alcançou o patamar de, aproximadamente, 1.500t/ ano. Hoje, a produção se situa em torno de 667,3t/ano, com produtividade de apenas 15,5kg/ha/ano. Saliente-se que os barramentos causam enormes prejuízos às espécies de peixes migratórios, ditas de piracema, tais como os curimatãs, piaus e outras. Isto em benefício das carnívoras como as piranhas, pirambebas, tucunarés, grandes reservatórios nordestinos... Inevitavelmente, a construção do Castanhão alterará o regime sedimen -
Isto acarretará prejuízos sensíveis às atividades pesqueiras, afetando a fauna que habita manguezais, inclusive. Os estudos indicam que o Castanhão poderá passar até 20 anos sem sangrar. Neste caso, a concentração de sais no reservatório, graças ao intenso processo É de se temer, também, o incremento no uso de agrotóxicos, devido à im plantação de cultivos industriais, em larga escala. Isto causará sérios danos à ictiofauna e carcinofauna da bacia no Baixo e Médio Jaguaribe... O professor William Bezerra ainda fez alusão ao combate aos efeitos das secas no Semiárido, destacando o trabalho do DNOCS no campo da açudagem, mas“julgamos que a distribuição espacial de reservatórios das águas o faz, também, com a distribuição do pescado” . E acrescenta: Tomás Pompeu de Sousa Brasil, em 1870, já salientava a importância disto, quando escreveu que as populações nordestinas, durante as grandes secas, se concentravam às margens dos açudes e deles retiravam preciosos alimentos para suas sobrevivências (no caso o peixe e outros organismos aquáticos). Ora, concentrar enormes volumes de água em um só local sugere a retirada das 20.3 - Correção de erros iniciais de avaliação No parecer do professor , encaminhado à SEMACE, encontramos as seguintes considerações, que achamos importante dar conhecimento aos nossos leitores:
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7.1.3 - Potencial de produção de pescado previsto inicialmente de 7.691 t/ano, valor esse reduzido para 5.800 t/ano pelo DNOCS. Note-se que na página 4.37 do Volume I-A (textos) do RIMA é dito que “A produtivida ha/ano”. Esse número para os 300 km² (ordem de grandeza) do espelho d’água do Castanhão chega a 3.000 t/ano de pescado. Parece-nos que nos cálculos benefício/custo é aceito o primeiro valor, seja 7.691 t/ano, embora o DNOCS o tenha reduzido mais tarde para 5.880 t/ano... Não foi previsto no projeto que o barramento permitia a transposição de peixes (escada de peixe etc.), fato que impõe a extinção das espécies piracema para a bacia do Rio Salgado(pág. 47). Nunca é demais citar que na cota 100m a área do espelho d’água do 2 Açude Castanhão foi reconhecido como sendo de 328km . Ver Capítulo VI, item 6.3. 20.4 - Conclusão Como já dissemos em outras partes deste livro, quem ditou as normas e diretrizes dessa barragem foram os organismos estaduais, sob o comando de sua Secretaria de Recursos Hídricos, cabendo ao DNOCS apenas a tarefa de sua construção. Não conheço nenhum parecer de órgãos do piscicultura ou mesmo de outras áreas da ciência. Tudo era contratado a empresas privadas e o que elas diziam tinham caráter dogmático: eram aceitas sem qualquer reparo ou contestação. Se alguma discussão ainda ocorreu foi no âmbito do Conselho Estadual do Meio Ambiente COEMA graças à interferência de alguns Conselheiros, destacando-se entre eles o advogado João Alfredo Telles Melo, representando a O A B . O leitor deve ter notado que a parte do RIMA, referente à Piscicultura, foi elaborado por uma“empresa de Consultoria que não tinha em sua equipe
pesca episcicultura” , conforme ressaltou o professorJosé Jarbas Stuart Gurgel, um dos mais ilustres e competentes técnicos que já passaram pelo DNOCS na área em consideração.
Que o leitor tire suas próprias conclusões, baseado nos estudos- es
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NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
internet : “QUEDA NO VOLUME MATA PEIXES NO CASTANHÃO”. : “Retirada da tilápia em decomposição é o desejo do
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José Jarbas Studart Gurgel:
José Willian Bezerra:
introdução à segunda edição na atualidade
Castanhão
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7ª PARTE: TRANSPOSIÇÃO E INTERLIGAÇÃO DE BACIAS
CAPÍTULO XXI Transposição de Vazões do Rio São Francisco
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CAPÍTULO XXII Interligação de Bacias Hidrográficas
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XXI TRANSPOSIÇÃO DE VAZÕES DO RIO SÃO FRANCISCO
21.1 - Um pouco da história recente sobre este tema
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, a ideia da transposição de águas do Rio São Francisco para o semiárido nordestino surgiu, pela primeira vez, em 1847. Coube ao cearenseMarcos Antônio Macedo levantar esta tese visando
Durante mais de um século e meio, desde o lançamento da ideia, numerosas foram as tentativas de torná-la exequível, sempre coincidindo com épocas de secas intensas. Em décadas passadas, diversos planos foram apresentados, sem que se conseguisse harmonizar técnica, custos e vontade política. Os planos já estavam quase esquecidos quando, em 1978, resolve mos ressuscitá-los, convencidos de que estávamos apresentando, para a comunidade técnica do nosso estado, uma nova versão, para“Projeto o de Transposição de Vazões do Rio São Francisco” que, nas concepções anteriores, previam que a água chegasse à bacia do Rio Jaguaribe por gravidade, isto é, sem bombeamento, sendo para tal necessária a cons trução de um túnel para atingir o município de Farias Brito, no Ceará. Este túnel partiria de Lagoa Grande (PE), num percurso, em linha reta, de 242 quilômetros.
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Com o objetivo acima referido, de apresentar uma nova proposta, na condição de Chefe da Divisão de Hidrologia do DNOCS, sugerimos à Direção-Geral daquele Departamento a realização de um“Seminário sobre Planejamento de Recursos Hídricos” que foi realizado no período de 28 de fevereiro a 03 de março de 1978, em Fortaleza, na sede do DNOCS, em Fortaleza. Participaram desse primeiro encontro 72 técnicos de nível superior pertencentes a 21 Entidades públicas e privadas do nosso país, além da Technique Outremer, da França. Foi esse o primeiro evento do gênero realizado no Brasil reunindo especialistas nacionais e estrangeiros. Por oportuno, registramos que a Associação Brasileira de Recursos Hídricos ABRH havia sido criada quatro meses antes, em 19 de outubro de 1977. A seguir, relacionamos todas as entidades que participaram desse importante e pioneiro acontecimento na área de Recursos Hídricos de nosso país e o número de técnicos que as representaram: a) Departamento Nacional de Obras Contra as Secas - DNOCS (19); b) Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica - DNAEE (15); c) Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste - SUDENE (06); d) Departamento Nacional de Obras e Saneamento - DNOS (03); e) Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco - CODEVASF (01); f ) Companhia Hidrelétrica do São Francisco - CHESF (01); g) Ministério da Agricultura (01); h) Banco do Nordeste do Brasil S/A - BNB (03); i) Instituto de Pes quisas Tecnológicas de São Paulo - I.P.T. (01); j) Conselho Estadual de Planejamento - CEPA (03); l) et Technique Outremer - ORSTOM(01), m) Universidade Federal do Ceará - UFC (07); n) Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ (01); o) Universidade Federal da Paraíba - UFPB (01); p) Centro de Ciências e Tecnologia - Campina Grande (PB) (01); q) Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais - CPRM (02); r) Engenharia Indústria e Comércio Ltda. - HIDROCEAN (01); s) Missão de Israel (01); t) Superintendência do Desenvolvimento do Ceará - SUDEC (04); u) Universidade de Fortaleza - UNIFOR (01); e v) Companhia Internacional de Engenharia (01). As entidades públicas e privadas, antes relacionadas e especialmente convidadas pelo DNOCS, cederam seus melhores técnicos, dentre os quais o engenheiroWilson Jordão Filho da Companhia Internacional de Engenharia, que coordenou tecnicamente o Seminário.
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Dentre os vários itens programados e discutidos no evento destacamos o denominado de “Planejamento dos Recursos Hídricos em Regiões relativas a este importante item: 1 - Que o Planejamento Territorial, ao conceber a evolução da ocupação de espaços para o desenvolvimento sócioeconômico de uma região, parta de um prévio conhecimento das disponibilidades de recursos hídricos da mesma, o agravamento dos problemas para as comunidades daquela região [o grifo é nosso]. 2 - Que em regiões onde o recurso hídrico é um fator limitativo para o desenvolvimento sócioeconômico, o conjunto de medidas básicas para a solução da escassez de água envolva considerações do disciplinamento da demanda e o aumento das disponibilidades, inclusive pelo estudo da transferência de água a partir de outras regiões vizinhas com excesso de disponibilidade hídrica [o grifo é nosso]. Em outubro de 1979, também por nossa indicação, o DNOCS promoveu, em Fortaleza, novo encontro de especialistas da área de Recursos Hídricos, denominado “Ciclo de Palestras sobre Planejamento, Uso tendo o professor , da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, realizado, com muito interesse por parte dos participantes, uma palestra sob o título:“A Perenização Hídrica das Bacias Carentes do Nordeste: - Uma Solução Hidroenergética” , com várias e importantes concepções inovadoras. Todas essas iniciativas do DNOCS, em uma das fases mais expressivas de sua história, tiveram ampla repercussão nacional, através dos meios daquele Departamento. A RevistaInterior, do MINTER - Ministério do Interior da República Federativa do Brasil, Ano IV, N° 24, maio/ jun. de 1978, na seçãoAtualidades, assim se expressou: Uma antiga e promissora ideia, por muitos considerada utópi ca, volta a repercutir entre técnicos em hidrologia de todo o país: a da transferência de águas entre bacias hidrográficas vizinhas [o grifo é nosso]. A possibilidade foi novamente discutida durante o Seminário de - Re cursos Hídricos, promovido pelo DNOCS no início deste ano, e deverá ser efetuado em profundidade a partir de 1979 [o grifo é nosso].
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21.2 - O DNOS se apossa da ideia e toma a iniciativa Em 13 de janeiro de 1981, numa solenidade realizada no auditório do Ministério do Interior, por iniciativa do Departamento Nacional de Obras de Saneamento - DNOS foram assinados os Editais de Concorrência para a realização dos“Estudos de Previabilidade para Transposição de Águas dos Rios São Francisco e Tocantins para a Região Semiárida do Nordeste”. A possibilidade de transposição de vazões do Rio São Francisco, segundo os termos de referência da Licitação do DNOS, era da ordem de 800m³/s, durante os quatro meses de enchentes normais desse rio, retiradas do reservatório de Sobradinho, o que daria um volume global a ser transposto de: 4 (meses) x 30 (dias) x 24 (horas) x 60 (min.) x 60 (seg.) x 800m³/s = 8.294.400.000m³, assim distribuídos espacialmente: 4.147.200.000m³ para o estado do Piauí; 2.073.600.000m³ para o estado do Ceará; 1.036.800.00m³ para o estado de Pernambuco; e 1.036.800.000m³ para os Estados do Rio Grande do Norte e Paraíba. Notava-se, então, a preocupação em transpor apenas vazões que não tinham aproveitamento no próprio vale. 21.3 - Sugestão de um novo plano para a Transposição No segundo semestre daquele mesmo ano, ainda em decorrência do Seminário e do Ciclo de Palestras anteriormente mencionados, publi camos no Boletim Técnico do DNOCS (Fortaleza, 39 (2): 127-144 jul/ dez. 1981) um trabalho técnico intitulado“Subsídios aos Estudos de Transposição de Vazões dos Rios Tocantins e São Francisco para o Nordeste” e no seu Resumo, assim nos expressamos para caracterizar o aproveitamento (horário de tarifas reduzidas: das 20 horas de um dia, até as 7 horas do dia seguinte) da energia produzida pela CHESF para realizar o processo de bombeamento das águas de transposição: Em fevereiro de 1978, o Departamento Nacional de Obra Contra-as Se cas - DNOCS, preocupado com o problema das secas no Nordeste e sobremodo sensível aos problemas da escassez de água, numa visão futura, resolveu trazer as técnicas neste domínio tendem a receber novos impulsos.
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Depois deste trabalho técnico, publicado nos Anais de Simpósios e de vários Congressos de Associações Técnicas do nosso país, iniciamos uma série de artigos e entrevistas, divulgadas através dos meios de comu nicação, enfocando a“Transposição de Vazões do Rio São Francisco” , tendo como novidade a utilização da energia ociosa ( ) da CHESF. Dentre eles transcrevemos os seguintes: Os rios da integração nacional ( Jornal O Povo, de 04/06/93 - OPINIÃO ) O Projeto de Transposição de Vazões do Rio São Francisco para as bacias carentes do Nordeste deverá ser uma realidade da qual a nossa região não pode prescindir em futuro próximo. Quase todos nós aprendemos, desde cedo, que o Rio São Francisco é o Rio da Unidade Nacional. Acreditamos que ele vai, realmente, poder desempenhar amplamente esta função histórica, graças à sua interligação com a bacia do Tocantins, que poderá fornecer energia para o Sistema CHESF, e, assim, possibilitar a liberação de parte de suas águas citárias de nossa região. O Rio Tocantins, desta forma, assumiria, também o papel que, historicamente, era reservado ao “Velho Chico”, cantado em prosa e versos: o Rio da Integração Nacional. Recentemente, estivemos em Brasília reunidos com outros técnicos, - conhe cedores da problemática regional e, após examinarmos as condições atuais e de se pensar, com maior responsabilidade, nessa questão da transferência de água do Rio São Francisco considerando-se, como um fato concreto,- as precá rias condições, no que se refere à oferta de água, da bacia do Rio Piranhas, no estado da Paraíba. A1iás, de todos os Estados, a Paraíba é o que se encontra em situação mais crítica no quadro atual de estiagem que já atinge nossa região, por quatro anos seguidos. É preciso que os nossos técnicos e autoridades se conscientizem de que o cionais, uma vez a cada 15 ou 20 anos, mas a seca que, praticamente, é a nossa companheira do dia a dia, anos após anos, podendo ocorrer, como já ocorreu, durante oito anos seguidos (1951 a 1958), conforme registros pluviométricos. As enchentes, por outro lado, atingem áreas bastante restritas, não mais do o controle de enchentes, mesmo porque é, também, possível a obtenção desse
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com custos mais baixos e impactos negativos desprezíveis ao meio ambiente. Em qualquer circunstância, o papel do Açude Aurora, com 800 milhões de metros cúbicos de acumulação d’água, a ser construído no Rio Salgado, é de fundamental importância. Essa barragem é absolutamente imprescindível, quer seja no Projeto de Transposição, quer seja como grande armazenadora de água, possibilitando a perenização do Rio Salgado e controle das enchentes no Baixo Vale inclusive nas Várzeas do Icó. Entretanto, ele não consta do Plano dos 4,4 bilhões de metros cúbicos que deverão ser armazenados pela Barragem gura como uma obra prioritária em qualquer hipótese ou em qualquer Plano. Foi consensual no Seminário patrocinado pelo “Sindicato dos Engenheiros do Ceará”, no período de 20 a 22 de junho de 1989, a ideia de que ainda seria possível armazenar na seção do Castanhão, ou a montante deste, cerca de 3,5 bilhões de metros cúbicos. Depois desta estimativa, já foram construídos ou estão em fase de conclusão alguns açudes, entre os quais o Atalho (108 milhões de outros reservatórios a montante, como é o caso do Açude Aurora a que nos referimos acima. E se as 10 a 12 barragens que preconizamos para o Alto Jaguaribe e bacia do Rio Salgado forem construídas, não restará praticamente nenhum volume d’água para ser armazenado no Açude Castanhão que, na cúbicos. É inacreditável que o Açude Arneiroz, no leito do próprio- Rio Ja guaribe, a montante de Iguatu, seja construído, como quer a Secretaria de Recursos Hídricos e o DNOCS com um volume de acumulação de apenas 200 milhões de metros cúbicos. Este é outro erro imperdoável rio Plano Estadual de Recursos Hídricos. No caso da construção dos 10 a 12 açudes, teríamos o controle total e absoluto das enchentes em todo o Vale do Jaguaribe, acrescentando mais 700 quilômetros de rios perenizados, tornando obsoletos os famigerados carros-pipas e criando condições, nesses reservatórios de porte médio, para a pesca artesanal, capaz de possibilitar o suprimento de proteína animal para toda a população daquela vasta e importante região do estado do Ceará.
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Castanhão e Transposição ( Jornal Diário do Nordeste , de 23/04/96 – 1º Caderno – IDEIAS ) cialmente, assumiu o papel que, no projeto original de transposição de vazões do Rio São Francisco do extinto DNOS, pertencia ao Açude Aurora (800 margem direita do Rio Jaguaribe. A partir de então, a imprensa local passou a difundir outro projeto, de concepção bastante diferente daquele que esteve na pauta das discussões no período de 1985 a dezembro de 1994. Portanto, durante quase dez anos, a única crítica que os estudiosos faziam ao mesmo era quanto à exagerada vazão de 280 m³/seg que seria desviada do Rio São ano de 1994. O Castanhão será implantado na cota 50m (altitude do talvegue ou leito do rio em relação ao nível médio do mar), enquanto o Açude Aurora O Açude Aurora, que seria construído no município do mesmo nome, tinha duas funções principais: a primeira, acumular as águas superabundantes da própria bacia do Rio Salgado e a segunda, receber as águas oriundas do Rio São Francisco e distribuí-las para os Rios Jaguaribe, Piranhas-Açu e Apodi, propriedade, de “coração” ou “pulmão” do sistema de transposição. Para esta última função, (se fosse somente esta) sua capacidade de acumulação poderia efeito inevitável da evaporação, isto é, um mínimo espelho d’água possível exposto ao sol. O Açude Aurora substituiu (?) o Castanheiro (1,5 bilhão de m³), também previsto para barrar o Rio Salgado, o qual constava dos planos do DNOCS há mais de 80 anos. O Castanheiro, ao lado do Orós e Banabuiú, era uma das três “barragens Mães” ou “barragens Chaves” previstas pelo DNOCS eMISS Ã O FRANCESA/SUDENE para o Vale do Jaguaribe[o grifo é nosso]. O Açude Castanhão que, por sua vez, no novo projeto de transposição, substituiu o Açude Aurora, também terá as mesmas funções deste, isto - é acumu lar as águas oriundas da bacia do Rio Salgado, em maior proporção, e receber eventualmente as vazões do Rio São Francisco (destinadas, exclusivamente, ao Rio Jaguaribe). Não pode ser cognominado de “coração” ou “pulmão” do sistema de transposição porque, a partir dele, não serão, e nem poderão ser, desviadas vazões para os Estados da Paraíba e Rio Grande do Norte. É um
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equí v oco e economi camente i nv i áv el quer er- se, como mui tos pensam e di z em “encher o Castanhão” com águas de transposição, pois com esta infeliz hipótese, haveria um desperdício para a atmosfera de mais de 50% das dispendiosas águas bombeadas do Velho Chico. O Castanhão terá, com certeza, custo de construção superior seis a oito vezes ao do Açude Aurora [o grifo é nosso]. Os dois artigos acima, propositadamente selecionados dentre outros que publicamos na imprensa local sobre o tema em evidência, enfocam especialmente a questão da construção do Açude Aurora, previsto para a bacia do Rio Salgado. A nosso ver, essa obra foi estrategicamente muito bem localizada e planejada pelo extinto Departamento Nacional posição, pois, a partir dela, as águas seriam desviadas, também, para os do Ceará, através do Rio Jaguaribe. Por isso, a Barragem de Aurora foi durante quase 11 anos aceita como o “coração” ou o “pulmão” do sistema de transposição do projeto original do DNOS. Como vimos através deste livro, mesmo na situação atual, a bacia Rio Jaguaribe (72.440km²), isto é, a bacia do Rio Salgado, que tem uma área de 19.281km², aproximadamente. Na hipótese da construção do exclusivamente, à bacia residual abaixo dos Açudes Orós e Aurora que, (6,7 bilhões de m³). Preocupados com a possibilidade de o Açude Castanhão ser transfor mado em um“elefante branco” ou em um“monumento à insanidade”, como foi cognominado por outros técnicos responsáveis e consequentes, os seus defensores trataram de fazer uma “reformulação” no projeto de transposição do DNOS, dando um jeito de salvar o Castanhão, retirando da programação os Açudes Castanheiro e Aurora, ambos previstos para a bacia do Rio Salgado. Com esse objetivo, sob a supervisão do Eng. Rômulo de Macedo Vieira (do Rio Grande do Norte), no segundo semestre do ano de 1994, na sede do DNOCS, em Fortaleza, durante quatro meses, foi elaborado um novo“Projeto de Transposição das Águas do Rio São Francisco”, segundo nosconsta, representado por 228 (?) volumes.
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Para a referida “reformulação” foram gastos cerca de R$ 10 milhões, conforme atesta o engenheiro José Cândido Castro Parente Pessoa , em artigo publicado no JornalO Povo, do dia 19 de março de 1996, sob o título “O Canal do São Francisco ”, cujo trecho inicial transcrevemos, a seguir, para conhecimento do leitor: Recentemente o Governo Federal divulgou, através da imprensa, - ha ver concluído através do MIR - Ministério da Integração Regional, mais um projeto de transposição das águas do Rio São Francisco, no qual foram despendidos cerca de R$ 10 milhões, sem concorrência . [o grifo é nosso] Os riscos de ser iniciada uma obra cujo projeto entre outros equívocos, e Jaguaribe em uma área localizada cerca de 30 metros mais alto do que a tecnicamente correta, poderão esvaziar o apoio da opinião pública- e invia bilizar o empreendimento. Para vencer o divisor na referida posição mais elevada, foi projetado um túnel que é desnecessário [o grifo é nosso]. Esse engano e diversos outros decorrem do fato de o Governo Federal haver decidido não aproveitar, nos estudos que acabam de ser concluídos, nenhum elemento da equipe disponível e ociosa do extinto DNOS, que trabalhou no projeto elaborado no período de 1979 a 1985.A participação de técnicos do extinto DNOS certamente teria evitado que os responsáveis pelo projeto do MIR tivessem cometido a infelicidade de copiar alternativa de estudos, realizada há mais de dez [o grifo é nosso]. Acresce a esse problema que os recursos do MIR repassados aos Estados do Nordeste, estão também sendo aplicados sem concorrência, originando repetições de trabalhos [o grifo é nosso]. Além do que acima foi mencionado, constata-se no “rico trabalho” recen temente concluído, compreendendo 228 volumes, desconhecimento do layout estabelecido para a função primordial do Canal (...) [o grifo é nosso]. Enfatizamos que o engenheiroJosé Cândido Castro Parente Pessoa , na condição de Diretor-Geral do DNOCS, foi o construtor dos Açudes Banabuiú (atual Arrojado Lisboa) e Araras (atual Paulo Sarasate), além da conclusão do Açude Orós (atualJuscelino Kubitschek de Oliveira ), todos construídos nas décadas de 1950/1960. cipais alterações introduzidas no novo “Projeto de Transposição” do MIR/DNOCS:
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1. Reduziu a vazão de transposição de 280m³/s para 150m³/s; e 2. Eliminou a construção do Açude Aurora (800 milhões de m³), que barraria o Rio Salgado, decisão tecnicamente errônea, con paraibanos e cearenses. 21.4 - Conclusão •
•
Perdeu-se muito tempo (quase doze anos) para se tomar uma decisão que sempre nos pareceu cristalina e era a que defendíamos desde a década de 70: a de aduzir do Rio São Francisco apenas 70m³/s. Este valor, corresponde, ou é equivalente, à vazão regu larizada por quase seis açudes do porte do Orós (12m³/s), ou a de dez Açudes Araras (Paulo Sarasate), localizado no Vale do Acaraú, no estado do Ceará. O Açude Castanhão (6,7 bilhões de m³), não substitui o de Aurora (800 milhões de m³) no Projeto de Transposição pelas seguintes razões: 1. cota em torno de 280 metros (altitude em relação ao nível médio do mar), tinha como função, no projeto original do DNOS, servir de “caixa de passagem”para levar as águas recebidas do Rio São Francisco para os vizinhos Estados do Rio Grande do Norte e Paraíba. O Açude Castanhão, na cota
2.
não tem a mínima possibilidade de exercer a mesma função (de “pulmão”) que era atribuída ao Açude Aurora; seria da ordem de 50 a 60 km², portanto com espelho líquido exposto à evaporação bastante reduzido, se comparado o do Açude Castanhão, com 328km² (cota 100 m) ou 550km² (cota 106m). Assim, no Açude Aurora as perdas d’água por
Açude Castanhão; 3. O valor da construção do Açude Aurora foi estimado em US$ 57 milhões (numa área sem quase nenhuma benfeitoria), enquanto o Açude Castanhão, estimado, inicialmente, em U$ 96 milhões, já está orçado, atualmente, em cerca de US$ 300
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milhões. (Ver Capítulo XV - O Custo do Empreendimento ); 4. No Seminário patrocinado pelo“Sindicato dos Engenhei ros do Ceará”, no período de 20 a 22 de junho de 1989, foi consensual que ainda era possível acumular no Açude Cas tanhão, cerca de 3,5 bilhões de m³. Este valor seria reduzido do volume correspondente, toda vez que uma nova barragem fosse construída a montante. Assim se todas as barragens previstas pelo DNOCS para o Alto Jaguaribe e bacia do Rio Salgado fossem construídas, não sobraria quase nenhum volume d’água para o Açude Castanhão, sendo esta, portanto, uma das principais conclusões deste capítulo. Em resumo: o Castanhão não era e nem é compatível com o planejamento do DNOCS. Como sempre fazemos em todos os capítulos deste, deixamos ao leitor o critério de concluir sobre o objeto do tema que dá título a este Capítulo XXI . Nota do autor: Caso o leitor deseje conhecer outros artigos de nossa autoria sobre este tema, recomendamos os que foram publicados no JornalO Povo: “Transposição: Uma Realida de Iniludível” (23/08/94) (17/09/94), “Transfusão ou Diálise” (14/10/94), “Por que a Bahia é contra” (31/05/98), “Agonia do Velho Chico” (03/08/98). “Um debate necessário” (08/09/ 98). Para a revista do Instituto da Memória do povo Cearense - IMOPEC (Propostas Alternativas) escrevemos um artigo com o título:“Transposição: Análise e (20/09/94).
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NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
Revista Conviver -100 anos do DNOCS
O Povo “Escrevendo o Futuro – Pontos de Vista – Caderno do Professor”
No Semiárido Nordestino, a irregularidade das chuvas tem ocasionado “ciclos secos” de até oito anos seguidos como o que foi constatado entre os anos de 1950 e 1958. Mais recentemente, tivemos um “ciclo seco desfavorável” de cinco anos entre os anos de 1979 a 1983, tendo a sua abrangência atingido, até mesmo, o estado do Maranhão. A lita a utilização plena do volume de água armazenado nos açudes, do qual, em consequência, boa parte se perde pela elevada evaporação Ao integrar os grandes açudes da região a uma fonte perene externa lizarão, possibilitando a gestão de um volume bem maior da água armazenada, estimulando o desenvolvimento social e econômico, emprego, renda e produzindo alimentos, que é de interesse Nacional. águas acumuladas nos reservatórios, diminuirá a superfície exposta à evaporação e esta se reduzirá, aumentando, de forma substancial, a disponibilidade hídrica realmente utilizável. Em outras palavras, o desenvolvimento social se dará de forma mais abrangente não pela
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utilização das águas locais que seriam perdidas para a atmosfera pelo da transposição serão reservadas, exclusivamente, ao abastecimen to humano e animal sempre que os açudes estiverem secos, ou na iminência de secar. Como exemplo, o Açude Castanhão, que perde por evaporação, em média, cerca de 25m 3/s, enquanto o aproveitamento regular de suas águas é de apenas 19m 3 duzida de até menos da metade, gerando virtualmente um novo
apenas são utilizáveis 600 milhões de m
3
3
para “guardar a água” para vencer uma possível seca prolongada, ou necessária essa precaução de “guardar água” após a concretização
Como acima foi explicado, desaparecerá, completamente, o mais re
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do dia 17.10.05, na entrevista dada pelo pesquisador João Suassuna na matéria sob o título: “Para opositores, projeto é “chover no mo
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ignorância do que seja o semiárido e aí incluo muitos dos que dizem o direito de falar sobre esse tema nordestino, delicado e complexo, que desconhecem. Não pode deixar de ser salientado que, pelo acima exposto, o custo da da água acumulada nos açudes. O Açude Castanhão, acima citado foi apenas um exemplo. Ou seja, cada m 3 de água transposto irá representar um volume maior utilizável dos açudes. Pelo que, inegavelmente, não é o custo do m 3 considerado na análise custo/benefício da Transposição, mas o seu signi -
XXII INTERLIGAÇÃO DE BACIAS HIDROGRÁFICAS
22.1 - O neologismo técnico da problemática hídrica do Ceará
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de estudos e pesquisas sobre o semiárido nordestino, omarketingpublicitário do governo estadual na rede de comunicação do nosso estado (rádios, jornais e televisão), sobre a problemática das secas foi tão fecundo, quanto agora, ao utilizar-se de e frases de efeito para indicar soluções mirabolantes, sem nenhum respaldo na engenharia de recursos hídricos e ambiental. Referimo-nos ao início dos anos da década de 90. “Interligação de Bacias” , no Ceará... ? Quem vai mandar ou transferir água de quem para quem? De onde para onde? Sem dúvida, um imagi “interligação” recursos hídricos e ecologicamente comprometidas. E o que dizer dos “anéis d’água” e “caminho das águas”? São expressões românticas, que nos induzem a pensar no bonito e no belo. A nosso ver um neologi smo técni co de alcance apenas polí ti co/elei torei ro para angariar o apoio da opinião pública. Um marketing político. Interligar a bacia do Rio Tocantins, no estado do mesmo nome, uma bacia pouco aproveitada e de bons índices ecológicos, com a bacia do Rio São Francisco como, aliás, vem defendendo o ilustre e conceituado técnico cearense,Caio Lóssio Botelho
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natural, através da Lagoa do Varedão, que fornece, segundo ele, cerca de 110m³/s adicionais para o Rio São Francisco, no estado da Bahia, pode nos parecer uma solução tecnicamente viável, principalmente porque esta transferência de água poderá ser feita por gravidade, reforçada por O mesmo não se pode dizer em relação à“interligação de bacias situadas no estado do Ceará, pois, todas são carentes e estão com seus ecossistemas degradados, merecendo, também, tratamento especi al ( exi ste tecnologi a apropri ada) para evi tar sua falênci a ecológi ca, que poderá conduzir a sérios problemas sócioeconômicos que convém sejam, urgentemente, evitados. Achamos imprescindível que soluções inusitadas deste tipo, como “Interligação de Bacias do Ceará”, passíveis de servir a outros inte resses, sejam melhor analisadas e discutidas pela sociedade, tanto do ponto de vista técnico, como econômico.Tememos que “o povo”cearense possa ser iludido com uma propaganda falaciosa feita pela televisão que dá ao telespectador a falsa impressão (pelo pequeno mapa exibido no vídeo) de que todo o Ceará será coberto por obras governamentais, não devendo mais faltar água em nenhum ponto do território cearense. Sem dúvida, uma propaganda bem-feita, utilizando-se dos modernos recursos da informática, levada ao ar de hora em hora, retirada apenas após as eleições de outubro, quando a seca de 1998 instalou-se com toda a sua inclemência e dramaticidade, mostrando a sua face cruel e a governador do Estado, o administrador Tasso Jereissati. Não houvesse a intenção governamental de vincular a panaceia da “Interligação de Bacias” audaciosa tentativa dos marqueteiros do governo de impô-lo à opinião pública, esse assunto não seria por nós incorporado a este livro. Isto porque, no capítulo anterior, já expusemos e comentamos tudo o que se refere ao tema que, realmente, interessa ao Ceará e ao semiárido nordestino, ou seja, a“Transposição de Vazões do Rio São Francis co”, 3 projetado com 6,7 bilhões de m de acumulação d’água, não constitui e nem integra solução técnico-econômica à transposição.
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22.2 - Mudou o tratamento da seca? Nossa primeira manifestação pública sobre o assunto foi atendendo convite do JornalO Povo, do dia 26 de abril de 1998, no Caderno Opinião, quando foram, também, ouvidas oito personalidades, sobre o tema: Mudou o tratamento da seca? . Acreditamos que essa enquete deve ter sido motivada pelas expressões inusitadas que vêm sendo utilizadas pela Secretaria de Recursos Hídricos para traduzir soluções inusitadas da problemática da seca no estado do Ceará. De acordo com as normas pré estabelecidas pelo jornal, a cada pessoa convidada foram concedidas oito linhas para expressar seu pensamento a respeito deste tema. Nesse reduzido espaço, assim nos manifestamos sob o título Ilusionismo: ou se anuncia fazer, para solucionar o problema das secas no estado - do Cea rá, está errado. O Plano Estadual de Recursos Hídricos está eivado de erros grosseiros. Outros projetos, como os da “Interligação de Bacias e Anéis D’água” são magias ilusionistas para engabelar a sociedade. Não se pode nem dizer que são mirabolantes, porque não encontram o necessário respaldo técnico, acreditamos na solução do crucial problema das secas no Ceará. Opinando acerca das nossas declarações, o conceituado jornalista Fábio Campos , em sua colunaPolítica, publicada, diariamente, no Jornal O Povo, assim se expressou no dia 28 de abril de 1998: (...) Mas é preciso haver um urgente, profundo e sério debate sobre a política de recursos hídricosTasso de Jereissati . O engenheiro Cássio Borges de que quase tudo que se vem fazendo, ou se anuncia fazer, para solucionar o problema das secas no estado do Ceará, está errado. O Plano Estadual de Recursos Hídricos está eivado de erros grosseiros. Outros projetos, como os da interligação de bacias e anéis d’água são magias ilusionistas para engabelar a sociedade. Não se pode nem dizer que são mirabolantes, porque -não encon concepções. ‘Magias Ilusionistas’? Será que técnicos de reconhecido saber, a exemplo do Secretário Hypérides Macedo, querem ‘engabelar a sociedade’? E ajudar a
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jogar US$ 1 bilhão do contribuinte na lata do lixo? Ou será mais uma - crí tica irresponsável entre tantas outras que perambulam por ai? Ao governo cabe abandonar a postura de quem costuma ver a opinião pública como um apêndice social que não merece nem sequer esclarecimentos. O Cambeba não pode continuar agindo como se a crítica não existisse. Espera-se ainda que a resposta não opte pelo velho caminho de apenas descredenciar[o grifo é nosso] os críticos das posições do Governo”. 22.3 - Interligação de bacias hidrográficas Diante das colocações feitas pelo conceituado jornalista e pela ausência da resposta dos responsáveis pela condução da política de recursos hídricos do Estado do Ceará, visando esclarecer melhor a opinião pública, resol vemos publicar no JornalO Povo, do dia 08 de maio de 1998, o seguinte artigo, sob o títuloInterligação de Baciasque, a seguir, transcrevemos: agora. Pelo que se lê ou se ouve na imprensa local, atingimos o “apogeu” da tecnologia no trato da água em regiões semiáridas. Tudo está absolutamente equacionado e sob o mais rigoroso controle. Temos uma Secretaria de Recursos Hídricos, a Funceme e uma Companhia de Gestão de Recursos Hídricos - - Co gerh, as quais, pelos seus dirigentes, ocupam todos os espaços que a mídia lhes oferece, sem nenhuma crítica ou contestação de quem quer que seja. Quem se atreve a criticar o que é tido como verdadeiro pela insistência? Os que assim procedessem seriam taxados de inimigos do Ceará e acusados de travar o desenvolvimento do estado, de obstaculizar “o progresso” etc. Não obstante, o que temos lido e ouvido das autoridades competentes (e aqui nos colocamos como simples cidadão, sem pertencer a nenhuma facção partidária) são soluções ambiguamente originais e miraculosas para esta complexa questão das secas em nosso estado. Basta ouvirmos o-ilustre Se cretário de Recursos Hídricos, Hypérides Macedo, expor os seus inusitados projetos de “interligação de bacias” , “anéis d’água”e “caminho das águas” , “misturando rios”na sua imaginosa versão, para nos dar a impressão que o Ceará brevemente será o paraíso das águas [o grifo é nosso]. O Ceará terá cinco “anéis d’água”, diz o Secretário... São frases de efeito que iludem os menos avisados e os menos versados no assunto de recursos hídricos. Com essa nova fórmula mágica de solucionar o secular problema das secas no nosso estado, que dizem “estratégica ser e inovadora”,o Ceará vai Não haverá mais seca, nem falta d’água em qualquer
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ponto do sertão cearense [o grifo é nosso]. Será um milagre, mas só daqui economicamente, levar a água rio acima, contra a declividade, ou -transpô altitudes. E tanta água, de onde virá? Com tanta movimentação da água, não há perdas substanciais em trânsito num estado em que o insumo água já é extremamente limitante? É claro que sim! A lógica mostra, até para o leigo em questões hídricas, que a “interligação de bacias” ou a tradicional e aceita “transposição de bacias” somente pode ser vizinha com escassa disponibilidade hídrica. No Ceará, não existe nenhuma são, potencialmente, carentes daquele precioso recurso natural. Posteriormente, este mesmo jornal, em sua seção Opinião, publicou, em 03 de agosto de 1998, nosso artigo intitulado A Agonia do Velho Chico , que abaixo transcrevemos: Julgávamos que, ao reduzir a apenas 25% (70 m³/s) o valor da vazão, inicialmente prevista, no Projeto de Transposição de Vazões do Rio São - Fran transposto o que parecia ser o principal obstáculo: a questão energética. A oposição das autoridades baianas parece não ter sido abrandada mesmo depois equilibradas ou vivas as combalidas bacias receptoras da referida vazão. Não podemos desconsiderar as razões do Governo e dos parlamentares baianos que reclamam por obras de regularização de vazões que visam au mentar a disponibilidade hídrica do Rio São Francisco em seu território. É com este clamor que eles dizem que o Rio São Francisco está agonizando, assim como também podemos dizer às autoridades constituídas que o nosso Rio Jaguaribe está em colapso iminente, ambos vitimados por devastações antrópicas nos seus ecossistemas naturais. A “caixa d’água” do Rio São Francisco está, caprichosamente, na área em que ele banha o estado de Minas Gerais, que contribui com cerca de 70% para a formação dos 99 bilhões de metros cúbicos médios de água que ele descarrega, O estado da Bahia contribui com apenas 20%, embora concorra com 45% do Vale. O restante, abaixo de Juazeiro, contribui com apenas 10% do volume d’água gerado pela bacia total de 641.000km² [o grifo é nosso].
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Há um grande número de reservatórios previstos para serem construídos
além da transposição dos Rios Tocantins e Rio Grande (Barragem de Furnas) 1.000m³/s, conforme documento/proposta da CODEVASF (Companhia do Desenvolvimento do Vale do São Francisco), denominado “Proposta - de De senvolvimento Sustentável da Bacia do Rio São Francisco e do Semiárido Nordestino”, ano 1996. Deve ser ressaltada pela bancada nordestina no Congresso Nacional (com maior ênfase à cearense) a urgência da implantação do “nosso” Projeto de Transposição, porque não se sabe o que poderá ocorrer nestes próximos dois ou três anos (teremos ou não chuvas alentadoras?) depois de quase 10 anos sem sangria do açude Orós. Ao tal artigo, acrescentamos as seguintes observações: a CODEVASF elaborou um documento-proposta (1996) que visa adicionar à disponi bilidade hídrica do Rio São Francisco, a montante (acima) da Barragem de Sobradinho, uma vazão da ordem de 1.000m³/s, que viria somar-se aos atuais 2.060m³/s regularizados por aquele grandioso reservatório localizado no estado da Bahia. A proposta da CODEVASF, denominada de “Proposta de Desenvolvimento Sustentável da Bacia do Rio São Francisco e do Semiá rido Nordestino” não nos parece um documento completo, detalhado e acabado, merecendo, portanto, uma ampla discussão sobre o mesmo, abrangendo todos os estados diretamente envolvidos (Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe), bem como, os indiretamente favorecidos pelas ações nele propostas, tais como Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco. vazão regularizada do Rio São Francisco? Segundo o documento em questão, duas medidas fundamentais seriam adotadas: a implantação de vazões excedentes de bacias limítrofes, entre as quais as dos Rios Tocan tins e Rio Grande (Barragem de Furnas), para nos referirmos às duas mais conhecidas do público cearense, sobre as quais temos comentado em nossos artigos para a imprensa. Do Rio Tocantins propõe o documento da CODEVASF, sem maiores
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de metros cúbicos de água por ano, provenientes dos seus tributários Paranã, Peixe, Balsas e Novo, volume este correspondente a 444m³/s, a um custo das obras estimado em R$ 2.545 milhões. Da Represa de Furnas (“Vertedor de Furnas”), localizada no Rio de água por ano, ou seja, uma vazão da ordem de 63m³/s, a um custo, segundo o referido documento, da ordem de R$ 465 milhões. Este valor nos parece elevado, se o ponto de captação for o mesmo proposto pelo , a partir do Rio Piumhi, onde já eminente professor existe uma inversão do seu curso natural para possibilitar a construção da Barragem de Furnas (120 metros de altura), no local onde a ELETROBRAS implantou uma “barragem de sela”, de 9 metros de altura, próxima da cidade de Capitólio, em Minas Gerais. Com objetivos tão amplos e múltiplos interesses regionais, sugerimos à bancada de Deputados Federais e Senadores do Ceará, independente de qualquer facção partidária, que tomem a iniciativa de conclamar a união de todos os parlamentares dos Estados interessados no Congres so Nacional, visando estabelecer uma ampla discussão em torno deste evitar descontinuidade ou casuísmo durante sua execução. Desta forma, sobre a questão. 22.4 - Exemplos regionais de transposição de vazões, canais e adutoras Para que o leitor possa tirar suas próprias conclusões, vamos dar alguns exemplos regionais de “transposição de vazões” ou, simplesmente “cons trução de adutoras” que, no nosso entendimento, é o mesmo que este festejado projeto de “interligação de bacias”, terminologia que vem sendo apresentada aos meios técnicos cearenses como uma solução “estratégica e inovadora”, para solucionar o crucial problema das secas em todos os rincões do estado do Ceará: 1. É oportuno lembrar a inauguração, no ano de 1981 do sistema de Virgílio Távora apregoava comomarketingpolítico: “Água para o ano 2.000”.Mas esqueceram ou engavetaram, de lá para cá,
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a construção dos Açudes Choró e Aracoiaba já previstos à época como fontes necessárias e prioritárias para reforçar o abasteci mento de água da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Em 1986, Tasso Jereissati é eleito governador. Nas propos tas de campanha estavam a construção dos Açudes Cho ró e Aracoiaba e a duplicação da Estação de Tratamen to de Água do Gavião. Nada disso foi posto em prática... Ciro Gomes assumiu, em 1990 o governo do Estado do Ceará com o sistema de abastecimento d’água da RMF. de Fortaleza à beira do colapso. Apostou 27 milhões de dó lares do contribuinte na construção do Açude Pacajus. Mas, infelizmente, o Pacajus não acumulou água em 1993. O ano de 1993 começou como se tudo estivesse muito bom no setor de abastecimento. Nos meses de fevereiro e março a imprevidência, iria mostrar sua face cruel e cobrar seu pre ço. Era preciso uma atitude urgente para impedir o colapso total do abastecimento d’água em Fortaleza. Era necessário um novo sistema que pudesse ser construído às pressas para evitar o colapso total em setembro, e que preenchesse a lacu na deixada pela não construção prioritária dos açudes Cho ró e Aracoiaba, previstos desde o governo de Virgílio Távora . Dentre as duas alternativas estudadas (a outra seria trazer água do Açude Pedras Brancas), surgiu a ideia da “transposição de água” do Rio Jaguaribe, a partir da cidade de Itaiçaba. Este canal que foi inicialmente, chamado de “Canal do Jaguaribe”, depois “Canal do Ciro” e, posteriormente, “Canal do Traba48 milhões, sendo US$ 20 milhões provenientes do governo federal e US$ 28 milhões de recursos próprios do governo -es tadual. Para o JornalSindiágua, do Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Ceará, de setembro de 1993, a construção do “Canal do Trabalhador” e do Açude Pacajus somaram US$ 97 milhões. O importante é que a cidade de Fortaleza foi salva de um colapso que era iminente. Talvez entusiasmado pelo relativo sucesso do “Canal do Tra balhador”, o SecretárioHypérides Macedo tenha se inspirado na romântica denominação de“interligação de bacias”
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que nada mais é do que uma “transposição de vazões” entre 2. Outro projeto de “transposição de vazões” que se tem comen tado nestes últimos 15 anos seria o do Rio Piraribú para o Açude Cedro, no Rio Sitiá, que abastece a cidade de Quixadá (CE). O valor desta obra, dizem os jornais ser da ordem de R$ 10 milhões (cerca de US$ 8 milhões) que seria destinado à construção de uma adutora de mais de dez quilômetros de extensão. 3. O DNOCS, em décadas passadas, construiu um canal que tem 45 quilômetros de comprimento, dos quais 30 a céu aberto e o restante em túnel,interligando os açudes Curema - Mãe d’água (Barragem Estévam Marinho - Barragem Egberto Carneiro da Cunha). Ao todo, são quatro reservatóriosinterligados com capacidade total de 1.660 milhões de metros cúbicos de água em condições de irrigar 20.000 hectares nas ricas várzeas de Souza, no estado da Paraíba. 4. Outro exemplo ilustrativo é a ligação do Açude Orós (Barragem Juscelino Kubitschek de Oliveira) ao Açude Lima Camo estado do Ceará, construída pelo DNOCS na década de 60, e que nunca foi explorada, promocionalmente, por aque le Departamento com o alarde que hoje se vê, em rádio, jor nal e televisão, até mesmo por ocasião da inauguração de um simples chafariz, com a presença do Governador do Estado. Trata-se de um canal que tem 4.064 metros de comprimento com as seguintes características: Canal de acesso: 1.380m; Túnel: 1.584 m; Canal de descarga: 1.100m; e Vazão máxima: 7,83m³/s. nal do Trabalhador que foi projetado para transpor 6m³/s, mas por questões técnicas, apesar de terem sido gastos, recentemente, cerca de R$ 10 milhões em sua recuperação, só tem condições de deslo car 3,5 m³/s, vazão que, atualmente (março de 1999), está sendo conduzida para Fortaleza, vazão esta proveniente do Açude Orós. Graças à ligação do Açude Orós ao de Lima Campos (bacias vizinhas), previstas pelo DNOCS, as águas acumuladas no primeiro, além de virem atendendo à Região Metropoli tana de Fortaleza, possibilitaram os seguintes benefícios:
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Abastecimento ao Projeto de Irrigação de Icó-Lima Campos com 3.553 hectares implantados; Irrigação de 600 hectares de arroz a montante, ou seja, na bacia hidráulica do Açude Lima Campos; e Cultivo de 2.500 hectares de arroz na bacia hidráulica do próprio Açude Orós. Esses dois últimos projetos possibilitaram a essa região, compreendida entre os Açudes Orós e o de Lima Campos, transformar-se na maior produtora de arroz do estado do Ceará. 5. Outro exemplo é o abastecimento de água da cidade de Sobral (CE), a partir do Açude Jaibaras (Ayres de Souza) feito através de uma tubulação de aço (adutora) numa extensão apro ximada de 20 quilômetros. Tudo isto foi feito silenciosamente pelo velho DNOCS sem alardes e sem propaganda. 6. Finalmente, como exemplo de uma obra de extraordinária sig “Adutora do Oeste” 41 cidades, vilas e povoados em 10 municípios daquele estado. A extensão desta adutora será de 448,5 quilômetros e a vazão inicial transportada será em torno de 0,7m³/s, podendo chegar a lm³/s. O custo deste empreendimento está orçado em US$ 60 milhões. A captação da água é feita diretamente no Rio São Francisco. Este projeto não pode ser denominado de “transposição de vazões”
22.5 - Integração de bacias hidrográficas Antes de encerrarmos estas considerações sobre o tema em causa, queremos nos reportar a uma entrevista concedida pelo Secretário Hypérides Macedo ao JornalTribuna do Ceará, no dia 29 de fevereiro de 1996, sob o título:“O que PROGERIRH viabiliza transferência de águas entre regiões”. Segundo o entrevistado“será possível, por exemplo, transferir águas da bacia do Rio Jaguaribe para a região dos Inhamuns” . Prosseguindo, disse o referido técnico: “o PROGERIRH prevê a utilização de barragens de grande porte como o Castanhão e o Araras...” . Ao que se sabe, o Açude Araras (Barragem atual demanda e às que estão previstas, em curto prazo, sendo duas delas as dos projetos de irrigação de Araras-Norte e do Baixo Acaraú.
Transposição e Interligação de Bacias
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Estes projetos de“movimentar as águas por centenas de quilômetros no território cearense” devem ser vistos com muito cuidado por causa das perdas em trânsito que“podem chegar a 25% ou mais” o engenheiroEdnardo Fernandes Cardoso,Diretor da VBA - Consultores sobre o Projeto de Transposição de Vazões do Rio São Francisco que está sendo elaborado pela referida empresa de consultoria local, na palestra, por ele proferida, no “Fórum Permanente da Agropecuária do Ceará”, no auditório do Banco do Brasil, no dia 09 de março de 1999. Sobre esta advertência, com respeito às perdas em trânsito, transcrevemos, o seguinte trecho do livro“A Chuva e o Chão na Terra do Sol”, de autoria do Eng. Hypérides Macedo , no qual ele dá, à página 145, a mais clara, explicação para o que ele chama no referido livro de “Integração dos Recursos Hídricos”. A integração dos Recursos Hídricos no território cearense é um projeto estratégico e inovador... Ampliando este conceito fundamental, o novo projeto busca transformar o Ceará numa grande bacia, germinando vales, revertendo cursos d’água, transformando divisores, misturando rios e reabastecendo açudes em plena seca [o grifo é nosso]. será desenhada na superfície do estado. Será que o senhor Secretário quando descreveu este seu decanta do projeto de “integração de bacias” pensou no custo da energia para “transpor divisores”? O que ele quis dizer com“misturando rios”? Se o projeto do Secretário for semelhante ao da Adutora do Oeste per nambucano, concebido pelo DNOCS, para abastecer cidades, vilas e povoados, com vazões diminutas, da ordem de 1 3m /s, nós lhe damos inteira razão. Isto é possível, principalmente a partir de açudes de porte caso do Açude Castanhão que está na cota 51m (leito do rio). As cotas máximas da bacia do Rio Jaguaribe estão em torno de 750m. Finalmente, que projeto é este? Achamos que ele está somente na cabeça do ilustre Secretário que, no meu entendimento, tem um poder de imaginação maior do que a lógica da engenharia de recursos hídricos. para onde? Com que objetivo: abastecimento de água às comunidades, ou a projetos de irrigação? É um único projeto ou dezenas deles? Qual a fonte d’água de cada um? Não seria tudo isto apenas um marketing político para render dividendos eleitorais por muitos e muitos anos?
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
22.6 - Conclusão Se o projeto de “interligação de bacias” ou “integração de bacias”, que julgamos ser a mesma coisa, for semelhante“Adutora a do Oeste” que o DNOCS está construindo nos sertões pernambucanos e que deverá abastecer 41 cidades, vilas e povoados, em dez municípios, mais razão tivemos ao defender a construção de 10 a 12 açudes de porte médio no Alto Jaguaribe e bacia do Rio Salgado, em vez do Açude Castanhão, isolado, no terço inferior do Vale do Rio Jaguaribe, portanto, já bem próximo do oceano. Desses açudes de porte médio, que seriam construídos nos atender prioritariamente ao abastecimento humano e animal, as quais poderiam ter quilômetros e quilômetros de extensão, pro vavel ment e sem necessi dade de bombeament o convenci onal , e como dissemos, anteriormente, transportando pequenas vazões de litros por segundo não se destinando, logicamente, para irrigação. Não tem sentido levar água do Açude Castanhão, cujo leito do rio está na cota 51m, para a região dos Inhamuns, cujas cotas situam-se entre do consumo de energia e da longa distância a ser transposta rio acima. A verdade é que fomos surpreendidos por uma propaganda na tele visão, certamente concebida pelos marqueteiros do governo na área de recursos hídricos, que ia ao ar de hora em hora antes da eleição presi dencial de outubro/1998 a ponto de um amigo ter ironizado que “estav a temeroso de ligar sua televisão com receio de inundar seu apartamento: era tanta água jorrando com abundância por todo o estado do Ceará”. Tal apreciação traduz o que também pensávamos em relação a esta falaciosa propa marketingpolítico-eleitoral. ainda agora, não estamos seguros de que se trata de um empreendimento semelhante ao da “Adutora do Oeste” que, comprovadamente, não tem nada de“inovador”. Deixamos a critério do leitor, após a leitura deste capítulo, tirar suas próprias conclusões.
8ª PARTE: APROVAÇÃO DO PROJETO
CAPÍTULO XXIII Análise da SRH ao parecer da HIDROESB
261
CAPÍTULO XXIV Uma nota infeliz da ABRH/Ceará
273
CAPÍTULO XXV Terceira audência pública sobre a Barragem do Castanhão
283
CAPÍTULO XXVI A participação da Assembleia Legislativa
291
CAPÍTULO XXVII O Castanhão é aprovado no COEMA
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XXIII ANÁLISE DA SRH AO PARECER DA HIDROESB
23.1 - O destino dado pela SEMACE ao parecer da HIDROESB
C
onforme exposto em capítulos anteriores, a Superintendência DROESB - Saturnino de Brito S/A, do Rio de Janeiro (leia-se professsor ), para dar parecer sobre o EIA/ RIMA da Barragem do Castanhão, elaborado pela empresa cearense SIRAC- Serviços Integrados de Assessoria e Consultoria Ltda para o DNOCS. dente da SEMACE , Francisco Eduardo Araújo Soares , encaminhou à Secretaria Estadual de Recursos Hídricos - SRH, o referido parecer da HIDROESB para “análise e posterior manifestação dessa Secretaria no que tange aos aspectos hidrológicos nele abordados” [o grifo é nosso]. Em resposta, o então Secretário de Recursos HídricosJosé Moreira de Andrade CE a análise solicitada, a qual recebeu as assinaturas dos engenheiros Vicente de Paula P. B. Vieira, José Nilson Bezerra Campos e Walter Martins “que exercem atividades de assessoramento junto a esta Secretaria”. Neste capítulo, pretendemos fazer alguns comentários sobre o referido documento da SRH que tem o seguinte título: “Análise do Parecer apre -
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
sentado à SEMACE pela HIDROESB sobre a viabilidade ecológica do Açude Castanhão”, Vejamos seus pontos principais: 23.2 - A vazão com garantia de 90% Diz o documento da SRH: A adoção de níveis de garantia de 90%, para projetos de irrigação vem sendo praticada desde os anos 70, época em que, na elaboração do Plano Plurianual de Irrigação – PPI, pelo Grupo Executivo de Irrigação e Desenvolvimento Agrário (GEIDA), esse critério se impôs, como o mais recomendável sob o ponto de vista econômico. (...) Entendemos, no entanto, que em regiões como a nossa, o critério de 90% poderá redundar em períodos secos muito prolongados, inconvenientes para usos mais nobres como é o caso do abastecimento d’água. critério de “90% de garantia” é inadequado para ser adotado em nossa região pois essesperíodos “ secos muito prolongados ” podem acarretar vários anos seguidos com os reservatórios vazios, portanto “inconvenientes para usos mais nobres como é o caso do abastecimento d’água”. Pelo que foi dito acima pelos Assessores da SRH, pode-se concluir que a adoção do critério de “garantia de 90%”, tendo em vista maximizar áreas de projetos de irrigação em açudes do Nordeste brasileiro, sugere A garantia de 90%, adotada pelo GEIDA, de cujo trabalho (simulação hidrológica da gestão de açudes) participamos intensamente, aqui em Fortaleza, na condição de Chefe da Divisão de Hidrologia do DNOCS, no ano de 1970, foi uma decisão isolada dos técnicos israelenses, espe Felix Melro e Archer Bem Zvi . Aquela atividade computacional, até então pioneiro em nosso país, teve “formular estudos preliminares de hidrologia para 47 açudes construídos no Nordeste Brasileiro pelo DNOCS”. Na publicação de nossa autoria sob o título“Disponibilidades Hídricas para Irrigação dos Principais Açudes doNordeste Brasileiro”,editado no Boletim Técnico do DNOCS, Fortaleza, jul/dez de 1975, expusemos toda a metodologia (à época, inédita em nosso país) utilizada pelos técnicos israelenses. Apre sentamos, a seguir, um breve comentário da metodologia acima citada:
Aprovação do Projeto
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O resultado deste trabalho é o que se pretende mostrar aos mais interessados neste tipo de informação. Embora reconhecendo as limitações do mesmo, visto de ser um esforço a mais no sentido do conhecimento do regime hidrológico de E, no resumo, dizíamos o seguinte: Este trabalho foi feito com o objetivo de estudar o comportamento - hidro caberia considerar na formulação dos programas a cargo do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas - DNOCS. Poderíamos acrescentar, ainda, ao que acima foi dito, que a adoção do critério de “90% de garantia” da vazão regularizada de cada açude cações introduzidas nos estudos hidrológicos, feitos em série, inclusive metri a ( vazão) na mai ori a deles. E , como agravante dessas li mi tações, os referidos estudos foram feitos no modesto computador IBM 1401, à época o mais moderno existente em Fortaleza. Assim mesmo, somente disponível para os nossos estudos a partir das 23 horas nos escrtórios da IBM. Até o fator tempo nos era limitado. A propósito, ressaltamos que o nosso trabalho, além de publicado no Boletim Técnico do DNOCS foi também apresentado no III Seminário de Irrigação e Drenagem da Associação Brasileira de Irrigação e Drenagem - ABID, realizado em Brasília, em 1975, e no Ciclo de Debates sobre Recursos Naturais e Meio Ambiente e Poluição, promovido pela zado no Rio de Janeiro, em 1977, constante do Volume I, editado pela Superintendência de Recursos Naturais e Meio Ambiente - SUPREN, daquela Instituição. Em todas essas ocasiões destacamos o seguinte: cálculos devido à limitada capacidade do computador”.
sessores da SRH de que “A adoção de níveis de garantia de 90%, para projetos de irrigação, vem sendo praticada deste os anos 70, época em que na elaboração do Plano Plurianual de Irrigação - PPI, pelo Grupo Executivo de Irrigação e Desenvolvimento Agrário (GEIDA) esse critério se impôs, como o mais recomendável, sob o ponto de vista econômico”. Ademais, os estudos
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patrocinados pelo GEIDA tiveram apenas caráter hidrológico, não tendo sido realizado nenhum estudo complementar de ordem “econô mica”, como se referiram os Assessores da SRH. Apenas, repetimos o que acima foi dito, o critério de “90% de garantia” tinha como objetivo maximizar as áreas possíveis de serem irrigadas por cada açude, pois se tratava de uma fase somente de seleção “preliminar”, digamos, em nível de reconhecimento. Sobre esse nível de garantia de 90%, a equipe do Bureau of Reclamation (uma das entidades dos Estados Unidos, mundialmente conhecida e respeitada na área de recursos hídricos), em Memo. PROINE/BUREC N° 168, de 22/09/97, dirigido à Coordenação de Cooperação Internacional do Ministério da Irrigação, em Brasília, assim se expressou: Um dos maiores propósitos da irrigação no Nordeste do Brasil é suavizar as condições econômicas fortes que ocorrem nas épocas de seca. Não tem sentido se construírem projetos de irrigação de alto custo, nos locais onde as condições durante as secas são quase tão severas quanto para a agricultura de sequeiro. O memorando doBureau of Reclamationé assinado pelo consultor Rod Vissia e foi largamente distribuído a todas as Diretorias e Divisões do DNOCS localizadas no Polígono das Secas. 23.3 - A vazão com garantia de 100% Continuamos transcrevendo o parecer dos técnicos Vicente de Paula P. B. Vieira , José Nilson Bezerra Campos e Walter Martins , Assessores da Secretaria Estadual de Recursos Hídricos - SRH: O Parecer (da HIDROESB) recomenda na QUARTA CONCLUSÃO,
Na Região Nordeste, conhecida por altas taxas de evaporação,-fato in sistentemente comentado no Parecer, adotar níveis demasiadamente altos de garantia implica no aumento do tempo de oportunidade para evaporação do espelho d’água e na consequente redução dos rendimentos hídrico e econômico do reservatório. Existe no caso um dilema: aumentar a segurança ou diminuir as perdas. Os comentários a seguir têm cunho pessoal. Vamos analisar este assunto por etapas:
Aprovação do Projeto
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1. A vazão regularizada do Açude Castanhão, com 100% de garantia, de 19,3m³/s, somente foi conhecida quando do Ofício Nº 1002/92, de 25/11/92, encaminhado à SEMACE pela Secretaria Estadual de R ecursos H í dri cos. L embramos, mai s uma vez que nem no EIA/RIMA e nem no Plano Estadual de Recursos Hídricos há citação clara sobre esta vazão. Este valor que, até antes do Parecer dos mencionados Assessores da SRH, era citado nos documentos tado por nós em várias oportunidades, desde“Seminário o sobre Recursos Hídricos”, patrocinado peloConselho Regional de Engenharia e Agronomia - CREA, realizado no Auditório Castelo Branco da UFC, no período de 14 a 16 de setembro de 1992. A questão que temos levantado é que a evaporação real no espelho d’água no reservatório do Castanhão, de 2.228mm, não foi considerada na referida simulação, mas somen te 1.700mm. É como se nos meses mais quentes do ano, isto é, parte de outubro, novembro, dezembro, não existis se evaporação nos espelhos d’água dos açudes do Ceará. Queremos, ainda, salientar que noCapítulo VI dissemos que, na realidade, a taxa de evaporação no estado do Ceará normalmente é tida como sendo da ordem de 2.300 a 2.500 milímetros. Entre tanto, como vimos anteriormente, no EIA/RIMA do Açude Cas tanhão, Volume I-A, página 4.30, Tabela 4.7, a taxa de evaporação média anual referida naquele documento é de 2.893,1 milímetros. (Ver também o Capítulo XVII, item 27.1, no qual transcrevemos o seguinte trecho do livroCastanhão− Do Sonho à Realidade(2007) de autoria do Eng. Agr. Francisco Pardaillan de Farias Lima : “As condições climáticas da área induzem a elevadas taxas evapo de ração que atingem 2.800 milímetros anuais ”. Sobre este assunto, escrevemos vários artigos na imprensa local, entre os quais, “Cas tanhão: Erros e Omissões”, publicado naTribuna do Ceará, em 25 de junho de 1995 e“Castanhão: existe projeto?”, publicado no JornalO Povono dia 09 de janeiro de 1996. Ambos os artigos 2. Segundo o EIA/RIMA da Barragem do Castanhão o abasteci mento da Região Metropolitana de Fortaleza deveria receber 10,5 m³/s de reforço de água oriundo daquele reservatório, embora
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o DNOCS, juntamente com a Secretaria de Recursos Hídricos 3 tenha, reduzido esta vazão para 2,5m /s e, posteriormente, se 3 /s. ídricosConforme disseram os Assessores da SRH, em se tratando do uso de água“para usos mais nobres como é o caso do abastecimento de água” [o grifo é nosso], a adoção do critério de garantia com 100%, sem nenhuma dúvida, é o mais indicado, além do que foi dito pelos técnicos do Bureau of Re clamation, acima transcrito. 3. Quanto ao dilema:“aumentar a segurança ou diminuir as perdas” [o grifo é nosso], achamos que, nos períodos críticos de 5 ou 8 anos consecutivos, os grandes açudes, além da irrigação, deverão ser os únicos responsáveis pelo abastecimento de água às populações das cidades, vilas e povoados, mesmo as localizadas a centenas e centenas de quilômetros de suas respectivas bacias hidráuli cas. A garantia para atender a essas populações é prioritária e, indiscutivelmente, deve ser total, isto é, com 100% de garantia. 4. Uma cidade como a de Fortaleza, com dois e meio milhões de habitantes, que irá depender, nos momentos críticos, do abaste cimento de água do Açude Castanhão, não pode, nem de leve, admitir falta d’água por um período maior do que cinco dias, pois já seria uma tragédia. Imaginem 30, 60 ou mais dias. Seria o caos. O mesmo pode-se dizer das 300.000 pessoas que vivem na região do Baixo Jaguaribe. Já pensaram o que seria as consequências se o Açude Castanhão secasse? Portanto, no dilema colocado pe los Assessores da Secretaria de Recursos Hídricos (“aumentar a segurança ou diminuir as perdas”), preferimos logicamente optar objetivos dos chamados“reservatórios de estiagem” (os que são construídos no Nordeste brasileiro). 23.4 - Comentários finais sobre o parecer da SRH É importante ressaltar que, no“Plano Estadual de Recursos Hídri cos” há pouquíssimas informações e dados referentes à Barragem do Castanhão, não obstante, a sua importância para o Vale do Jaguaribe uma legenda, ou uma simples ilustração mostrando que, naquele Plano, a barragem foi criteriosa e rigorosamente estudada e que ela está, com provadamente, inserida no contexto do desenvolvimento dos recursos
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hí dri cos do estado do C eará. S ão quase 4. 000 pági nas daquele P lano e em apenas três (acreditem) fazem referência à Barragem do Castanhão. E é porque é o maior reservatório do estado e do Nordeste. Todos os estudos relativos a essa obra se acham reunidos, basica mente, no seu EIA/RIMA, além de uma publicação denominada de “Estudos de Alternativas da Barragem do Castanhão”, elaborada às Capítulo IX), para atender a um dispositivo da Legislação Ambiental, requerida pelo Conselheiro do COEMA, advogado João Alfredo Telles Melo . Este Conselheiro exigiu o cumprimento da Lei 6.938, do Decreto 99.274/90 e da Resolução 001/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, de tal forma que fosse contemplada como alternativa à Barragem do Castanhão, no porte alto (6,7 bilhões de m³), a proposta da construção de 10 a 12 açudes de porte médio, distribuídos, espacialmente, na bacia do Rio Jaguaribe, incluindo o próprio Castanhão com uma dimensão menor, acumulando, l,2 bilhão de metros cúbicos, na cota 80m. Foi por ocasião da elaboração dos “Estudos de Alternativas da Bar ragem do Castanhão” em 1990 (verCapítulo IX), que foi feita a “Simu lação da Operação do Reservatório do Castanhão”, objeto das críticas que temos feito em relação ao uso incorreto da evaporação no espelho d’água daquele reservatório. Além desse imperdoável erro (entre outros não menos graves) temos as seguintes objeções a fazer em relação ao citado estudo: 1. A simulação foi feita no período de 1939 a 1989, portanto, num período de 50 anos. O Bureau of Reclamationrecomenda no seu memorando, citado anteriormente, que o período ideal seria de 100 anos ou, no mínimo, de 75 anos. O DNOCS dispõe de dados de chuva desde o ano de 1910, tendo chegado ao ano de 1958 com mais de 600 estações deste tipo instaladas em todo o Nordeste. Atualmente, existem mais de 1.000 pluviômetros em funcionamento na região. 2. A constatação acima comprova que o critério de “garantia” ou estatística” . Solicitamos ao leitor rever oCapítulo XI - Vazão Regularizada. Podemos admitir que todos esses erros não tenham sido proposita dos, mas que essa gigantesca barragem merecia estudos mais criteriosos
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de qualquer maneira, e com este objetivo, procuraram ampliar, “com subterfúgios estatíssticos, os seus benefícios e, com isso, conquistar a simpatia de toda a sociedade para esta causa. 23.5 - Castanhão: existe projeto? Com esse título, escrevemos um artigo publicado no Jornal Diário do Nordeste , do dia 09 de janeiro de 1996, o qual reproduzimos a seguir: Desde 1985, quando o projeto Açude Castanhão surgiu na mídia - (por de mais de oitenta anos do povo cearense”), temos feito as mais variadas e contundentes críticas à construção desse empreendimento no terço inferior do Vale do Rio Jaguaribe. Quando dizemos “terço inferior”, começamos por desaprovar, logo de início, sua localização, pois 2/3 da área onde se situam municípios importantes como Campos Sales, Tauá, Iguatu, Jucás, Lavras da Mangabeira, Aurora, Arneiroz, Antonina do Norte, Cariús, Farias Brito e dezenas de outros situados no Alto Jaguaribe e Bacia do Rio Salgado não Dá para os leitores entenderem os motivos pelos quais os municípios situados Castanhão, pois a maioria deles estão localizados a centenas de quilômetros da bacia do mega-reservatório (quando cheio, em raríssimas ocasiões, a cada 10 do espelho d’água da referida obra de engenharia: a barragem terá 7.770 me tros de comprimento, extensão exagerada se comparada com os 600 metros do como aqueles municípios, tão distantes, serão abastecidos... Com carros-pipa a partir do Castanhão? E se não forem, serão através de gigantescas estações de bombeamento? Rio acima? Quem pagará o custo da energia? Mas, o título deste artigo refere-se à existência ou não de projeto- hidroló fazendo publicamente, desde o Seminário Sobre Recursos Hídricos do Nordeste, promovido pelo CREA, em 1992, sobre o grosseiro e inadmissível erro de 28% na utilização incorreta do valor anual da evaporação nos estudos hidrológicos
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o projeto desse empreendimento inexiste. É um projeto empírico, sem base estado não pode se omitir ou respaldar uma obra em circunstâncias duvidosas quanto aos seus benefícios e de consequências duvidosas para as populações envolvidas. Felizmente, o DNOCS dos meus tempos condenou o Castanhão por unanimidade, depois de três dias de discussão sobre o Vale do Jaguaribe, no ano de 1986. Daquele Seminário, saiu um documento recomendando uma barragem naquele local de, no máximo, 1 bilhão de metros cúbicos. O que desejamos é que os técnicos governistas venham a público dizer que nós estamos errados... Mas, essa questão da evaporação é apenas um entre vinte e tantos itens que nos levam a ser contrários a essa obra, contra a qual já se pronunciaram proeminentemente técnicos brasileiros de renome internacional. 23.6 - Castanhão: erros e omissões Com esse título, escrevemos um artigo publicado no Jornal Tribuna do Ceará, do dia 25 de junho de 1995, o qual reproduzimos a seguir: Após o sinal verde dado pelo governador Tasso Jereissati, a Barragem do Castanhão volta a ser discutida em todas as rodas quando o tema -é o apro veitamento dos recursos hídricos do estado do Ceará. Como sempre acontece megabarragem “será a redenção” do nosso estado: “é uma reivindicação de 84 anos do pov o cear ense. . . ”. Para i ní ci o de argumentação, a i dei a da bar ragem surgiu no ano de 1985, não pelo DNOCS, mas pelo DNOS, que foi extinto no início de 1990, pelo então Presidente Collor de Mello. Está aí desfeita a primeira inverdade sobre esta polêmica obra de engenharia, com todo o respeito completa este ano 10 anos, desde quando foi concebido nos escritórios do DNOS, no Rio de Janeiro. Em entrevistas e artigos anteriores, publicados por este esclarecido Jornal, mostramos que no projeto da Barragem do Castanhão existem falhas e omissões
absoluta convicção de que estamos prestando um grande serviço à sociedade cearense e, em especial, às populações que vivem no Vale do Rio Jaguaribe. Pelo menos, é este o nosso único propósito, como técnico e cidadão. Aliás,
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essas denúncias já havíamos feito por ocasião do “Seminário sobre Recursos Hídricos do Nordeste”, patrocinado pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia-CREA, realizado no Auditório Castelo Branco da UFC, no período de 14 a 16 de setembro de 1992 e, diga-se de passagem, não fomos contestados. Mas, qual dessas denúncias, acima referidas, foi a mais grave? Foram várias e dentre elas um erro de 33,36% na avaliação da área de sua bacia hi dráuli ca. N as décadas de1960 e1970, quandotodos os projetos debar ragem do Nordeste eram concentrados no Serviço de Estudos do DNOCS, em Recife admissível era de 3%. E por termos encontrado tal erro, sofremos muitas retaliações, acreditem. Hoje, improvisa-se tudo, ou quase tudo, e aqui mesmo no Ceará são muitos os exemplos deploráveis dessa forma imprevidente de se faz er obras deengenhar i a. E steer roi nacei tável na av ali açãoda área da baci a hidráulica do Açude Castanhão foi, contudo, superado, em gravidade, pelo estudo hidrológico em não considerar a evaporação real de 2.200 milímetros, mas somente 1.700 milímetros. É como se nos meses de novembro e dezembro (e parte de outubro) não existissem (pasmem!) evaporação nos espelhos d’água nos açudes do Ceará. Além dos fatos acima citados, também deve ser lembrado neste pequeno espaço de jornal que a Barragem do Castanhão está superdimensionado e que de 4,4 bilhões de 3mna sua cota de regularização de vazões, isto é, a cota 3 100m (a barragem foi projetada para 6,7 bilhões de demacumulação na cota 106m). Na realidade, se forem considerados todos os açudes existentes e previstos, com suas dimensões creditadas pelo DNOCS e SUDENE nas décadas de 1960 e 1970, sobrariam para o Açude Castanhão algo em torno de 700 milhões de 3mde acumulação de água. Com esta capacidade, a área inundada 2 2 (bacia hidráulica) seria de 170 km , contra os 650 km do projeto atual (6,7 3 bilhões de m ), reduzindo, substancialmente, os impactos ambientais, inclusive
que será destruída numa extensão aproximada de 70 quilômetros.
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23.7 - Conclusão •
•
O procedimento adotado pelas autoridades públicas cearenses nos deixa atônitos, pois à primeira vista, vislumbramos má aplicação do erário público. Senão, vejamos: 1. O DNOCS contrata a Consultora SIRAC para elaborar o ca, ambiental e social da Barragem do Castanhão. A empresa cumpriu o seu contrato. 2. O DNOCS submete o EIA/RIMA à SEMACE para ser apreciado pelo COEMA - Conselho Estadual do Meio Am biente. 3. A SEMACE contrata a HIDROESB - Saturnino de Brito S.A. para analisar e dar parecer sobre o documento elaborado pela SIRAC. O parecer se mostrou contrário à construção temente, comprovada sua inviabilidade técnica, econômica, ambiental e social. O parecer foi entregue pela HIDROESB, em outubro de 1992, à Secretaria contratante. 4. A SEMACE encaminha, em 18 de novembro de 1992, o parecer da H I D R O E S B à S R H . E sta S ecretar i a contrata Assessores para analisar e emitir seu parecer sobre aquele fornecido pela HIDROESB. O parecer pretendeu, sem conseguir, conforme nossos comentários neste capítulo, anular o parecer da HIDROESB. É óbvio que o estado do Ceará despendeu, por um único estudo, no mínimo, três vezes, sem considerarmos os seus próprios custos, quer na SEMACE, quer na SRH, o que consideramos, administrativamente, inadmissível. Se as autoridades do Estado à HIDROESB - Saturnino de Brito S.A. a incumbência de pretender homologar suas decisões? Seria pelo nome representativo o dessa Empresa, cujo Diretor-Presidente é considerado um dos maiores conhecedores do assunto em nosso país? Se foi este o seu intuito, foram contrariados. A HIDROESB, num parecer de mais de 100 páginas, demonstrou, com clareza e seriedade, a inviabilidade técnica, econômica, ambiental e social do EIA/ RIMA do Açude Castanhão.
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Os nossos comentários técnicos, expressos de modo objetivo, nesteCapítulo XXIII demonstram a extrema fragilidade técnico/ bilidade da argumentação desse parecer contra o farto e seguro diagnóstico técnico elaborado pelo professor , desse empreendimento. Desta forma, deixamos consignado, por oportuno, que nossa postura nada mais representa do que aquela
Pela natureza do exposto, estamos absolutamente convencidos de que o leitor há de formular suas próprias conclusões, da mesma forma
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
XXIV UMA NOTA INFELIZ DA ABRH/CEARÁ
Os três objetivos da nota da ABRH /Ceará
N
Audiência Pública sobre preendimento no Conselho Estadual do Meio Ambiente (COEMA), num domingo, dia 20 de dezembro de 1992, pudemos sentir até que ponto o poder econômico é capaz de interferir, de forma tristonha, na decisão de um colegiado composto de vinte pessoas, representantes dos mais diferentes segmentos da sociedade cearense. Referimo-nos a uma nota inconsequente daAssociação Brasileira de Recursos Hídricos - ABRH/ Seção do Ceará , publicada naquela data nos jornais de Fortaleza. Seu triplo objetivo era mesquinho, pois visava: 1. selheiros do COEMA que, dois dias após (22 de dezembro de 1992), iriam se reunir na terceira e última Audiência Pública na sua cota máxima de acumulação, com 6,7 bilhões de metros cúbicos de água (cota 106m); 2. Descredenciar-nos tecnicamente perante a opinião pública em gem do Castanhão nos termos em que ela se achava proposta; e 3. dimento, mesmo que com base em erros primários de engenha -
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A Face Oculta da Barragem do Castanhão
ria expressos no EIA/RIMA e nos “Estudos de Alternativas da Barragem do Castanhão” e outros documentos elaborados pela empresa local de Consultoria SIRAC, em atendimento a Como registro histórico, apresentamos, na íntegra, a nota da ABRH/ CEARÁ: 24.1 - A nota da Associação Brasileira de Recursos Hídricos do Ceará (ABRH) A campanha movida nos últimos anos em torno da construção do Açude Castanhão vem criando um ambiente de desinformação junto à opinião pública, em face, sobretudodeclarações de contraditórias, inconsistentes, que apaixonam interesses menores[o grifo é nosso], sectarizam posições pessoais em prejuízo da palavra mais legítima e mais autorizada sobre o projeto. Tais manifestações, de certo modo, prestam um desserviço à nobre causa da açudagem pública no Ceará e um pânico desnecessário às populações do Vale do Jaguaribe, sedentas de uma solução desenvolvimentista que venha Este clima de indecisão e descrença motiva a exploração política, envolve aspectos eleitorais e termina por insinuar de posturas éticas com interesses de grupos econômicos [o grifo é nosso]. Preocupada com a questão maior do projeto - o Rio Jaguaribe - o Açude Castanhão - as populações atingidas - os benefícios sociais - os impactos ambientais - as medidas de proteção à natureza e ao homem - a Associação Brasileira de Recursos Hídricos do Ceará (ABRH) vem de público esclarecer 1. A ABRH depois de examinar o projeto do çude A Castanhão, analisar cia dos estudos complementares decorrentes do RIMA, considera esta barragem absolutamente viável no plano social, técnico e econômico, aprovando integralmente a sua execução nas bases propostas pelo DNOCS e SEMACE; 2. A ABRH, como Instituição da sociedade civil, na real perspectiva da construção da obra, espera, sobretudo, do governo federal e das instâncias estadual e municipal, o cumprimento dos compromissos assumidos com as populações atingidas pelo elago das medidas de proteção e preser vação do ambiente natural impactado pelo açude [o grifo é nosso];
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3. A ABRH, ao mesmo tempo em que espera uma decisão favorável ao institutos de classe e organização da comunidade, assumindo uma atitude de vigilância e/ou de colaboração, melhorando e ajustando as decisões do projeto; 4. A ABRH continuará defendendo a implantação do Sistema de Gestão dos Recursos Hídricos, e regulamentação urgente da nova Lei de Águas do Estado, a política de Barramentos Médios com base no Programa de “Vazios Hídricos” da SRH, a construção de novos açudes no Alto Jaguaribe, o controle técnico das obras hídricas e o uso social das águas públicas[o grifo é nosso], conforme recomendações do Plano Estadual de Recursos Hídricos. seus membros: contudo torna público que as teses frequentemente expostas pelo Engenheiro Manfredo Cássio de Aguiar Borges manifestam uma opinião pessoal, única e isolada na Instituição e que em nenhum momento representam o pensamento praticamente unânime da Associação Brasileira de Recursos Hídricos do Ceará, em favor do Açude Castanhão [o grifo é nosso]. Pelo que assinam os técnicos a seguir: 1. Engenheiro Adonai de Sousa Porto* – Presidente Regional da ABRH 2. Engenheiro Antônio Nunes de Miranda – PhD – Diretor do Centro de Tecnologia. 3. Agro. Antônio Fernandes Bezerra Peixoto – MSc – Consultor 4. Engenheiro Almir Fernandes Távora – MSc – BNB 5. Engenheiro Ariosto Holanda – MSc – Professor da UFC 6. Engenheiro Ednardo Fernandes Cardoso* – MSc – Consultor 7. Engenheiro Francisco Lopes Viana* – MSc – Presidente da Funceme 8. Engenheiro Genésio Martins Araújo – Ex-Diretor da Escola de Engenharia da UFC 9. Engenheiro Hypérides Pereira de Macedo – MSc – Consultor 10. Engenheiro Joaquim Guedes Gondim* – MSc – DNOCS 11. Engenheiro José Nilson Bezerra Campos* – PhD – Diretor da Pós-Graduação de Recursos Hídricos da UFC 12. Geólogo Luiz Bianchi – MSc - Professor da UFC
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13. Engenheira Nisse Sanford Fraga – MSc – Diretora do Centro de Tecnologia da Unifor 14. Engenheiro Suetônio Mota – PhD – Professor da UFC 15. Engenheiro Swami Marcondes Villela* – Ex-Diretor da EESC - USP 16. Engenheiro Vicente de Paula Barbosa Vieira* – PhD – Professor e ex-Diretor da Escola de Engenharia da UFC 17. Engenheiro Walter Martins Ferreira* – PhD – Professor da UFC. 24.2 - Nosso comentário Vamos analisar, neste capítulo, o triplo objetivo desta triste e inconse quente nota, assinada por apenas nove membros efetivos da Associa ção, cujos nomes estão precedidos de asteriscos. Somente estes tinham condições legais de manifestar-se. Pela gravidade do assunto tratado na nota, esta deveria ter sido encaminhada ao seu Conselho Consultivo, o que não ocorreu. Evidenciamos que, além desta omissão dolosa, deve-se acrescentar outro grave erro estatutário cometido pelo representante da a seu quadro associativo, assinassem o documento. respeito à assinatura do engenheiro Adonai de Sousa Porto , que consta como “Presidente” da ABRH, quando, estatutariamente, é “Representante” da entidade. Por oportuno, informamos aos nossos leitores que a Representação da ABRH no estado do Ceará foi fundada pelo enge nheiro Vicente de Paula Barbosa Vieira, do DNOCS, e por nós, logo após oIV Simpósio Brasileiro de Hidrologia e Recursos Hídricos , realizado em Fortaleza, no ano de 1981, do qual fomos o seu Coordenador Téc Acrescente-se ainda o fato de que nós, como membro efetivo da ABRH/CEARÁ e do seu Conselho Consultivo, não tivemos conheci mento, até hoje, de alguma convocação do Sr. Representante Regional da entidade para qualquer reunião, com data, hora e local estabelecidos, “examinar o projeto do Açude Castanhão” Some-se ainda o fato de que a nota tentou denegrir a imagem de um membro dessa entidade, que ocupava, na ocasião, uma vaga no Conselho Consultivo, o qual deveria ter sido ouvido previamente. No
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nosso entendimento, pela evidência dos fatos, a nota traduz abuso de poder e de autoridade. Firmamos o propósito de, a qualquer tempo, demonstrar à sociedade cearense que nossas críticas a essa megabarragem têm respaldo técnico/ reputação nacional e internacional. Do triste episódio, surgiu a primeira ideia de escrevermos este livro, não só para resguardar a nossa honra objetivos escusos da nota, que passaremos a relatar: 1° Objetivo: Pressionar o Conselho do COEMA É claro que a nota da ABRH/CEARÁ objetivava pressionar e quanto ao voto que deveriam dar em relação à Barragem do Castanhão, temerosos da repetição da última derrota, por 10 votos a 9, na Audiência Pública, realizada no dia 17 de agosto de 1992. e funções de relevo que ocuparam em suas vidas públicas, certamente lações acadêmicas de terceiros. Não duvidamos das intenções nobres e independentes dos Senhores Conselheiros do COEMA ao observarmos tuídos pelos respectivos Suplentes), em relação à última votação. Daí o da barragem. 2° Objetivo: Descredenciar o nosso nome A citação do nosso nome na nota objetivava descredenciar o nos principais fundadores e seu primeiro Representante na Região Norte/ Nordeste e no próprio estado do Ceará, além de nos desacreditar perante os Conselheiros do COEMA. Segundo nosso entendimento, o representante da ABRH/ CEARÁ, sendo funcionário graduado da SIRAC, empresa responsável pela elaboração do EIA/RIMA, do “Estudos de Alternativas da Barragem do Castanhão” e de outros documentos relativos à referida obra, jamais
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deveria ter permitido a publicação da nota em nome daquela Associação, o DNOCS e a SEMACE. Vale lembrar que o DNOCS, em Seminário realizado nos dias 6 e 7 de janeiro, em sua sede, expediu um documento de 29 páginas datilogra fadas recomendando a construção do Açude Castanhão “com capacidade de apenas 1 (um) bilhão de metros cúbicos”. Coincidentemente, três signatários da nota da ABRH/CEARÁ [1] participaram da elaboração ou assinaram aquele documento. O que teria ocasionado a mudança? Conforme o exposto neste livro, a SEMACE contratou dois técnicos de conceito nacional e internacional, os professores Ottoni Netto e Aristides de Almeida Rocha para analisar e dar parecer técnico sobre o contido no EIA/RIMA do Açude Castanhão. Por que a nota da ABRH/CEARÁ não fez menção a esses ilustres nomes que honram a engenharia brasileira e que se manifestaram contra o projeto? É profundamente lamentável que a nota tenha insinuado que a discus são em torno da construção ou não da Barragem do Castanhão pudesse dar margem a suposta suspeita do envolvimento de qualquer das partes com “ligações de posturas éticas, com interesse de grupos econômicos” .A nosso ver, uma citação fora de qualquer propósito, absolutamente -des necessária e inconsequente em se tratando de uma entidade que deveria sociedade e, no caso, da população cearense. É, portanto, lamentável que se tenha procurado trazer para dentro da discussão, que vinha sendo conduzida exclusivamente do ponto de vista técnico, o envolvimento de interesses políticos e empresariais, sem que nós, jamais, tivéssemos feito qualquer insinuação a este respeito, embora sabendo que a porten tosa Construtura Andrade Gutierrez era uma das mais interessadas na referida obra. Evidenciamos que a ABRH/CEARÁ, em vez de levantar suspeição sobre “postura ética com interesses de grupos econômicos” de quem quer que seja, deveria, isso sim, ter vindo a público contestar e esclarecer à sociedade cearense todas as questões técnicas que vínhamos levantando em relação aos efeitos negativos que a Barragem do Castanhão deverá causar ao Baixo Jaguaribe. Referimo-nos às questões ambientais e ao
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tivesse argumentos para tal, deveria defender o estudo da viabilidade técnica, social, econômica e ambiental, o qual, através da imprensa, há mais de sete anos (naquela ocasião), vínhamos contestando com dados técnicos irrespondíveis. Além das pessoas já referidas, que estão de acordo com as teses que defendemos, podemos citar os oito votos favoráveis e independentes a Sentença doTribunal da Água, realizado em abril de 1993, em Florianópolis (SC), que, por sete votos a zero, desaprovou a construção se mostraram contrários a este barramento. Listá-los seria impossível, não só pelo elevado número, como pela possibilidade de esquecermos alguns nomes, o que seria lamentável. Citaremos apenas o professor Caio Lóssio Botelho , eminente geógrafo cearense, Presidente da Academia Cearense de Ciências. Portanto, nossa tese contrária à Barragem do Castanhão no porte alto não é “única e isolada” como diz a nota da ABRH/CEARÁ. 3° Objetivo: Sepultar erros do EIA/RIMA Caso fôssemos apresentar todos os erros expostos no EIA, RIMA que da Barragem do Castanhão, necessário seria elaborar um segundo livro dando seguimento a este. Vamos nos deter somente em dois erros-téc nicos extremamente sérios, os quais invalidam, totalmente, a viabilidade da construção desse megabarramento: 1. O erro gravíssimo, de mais de 36%, na Curva cota/área/volume da barragem (cota 100m). Este fato comprometeu, de forma decisiva, todo o processo de discussão dos estudos de alternativas reclamados pela sociedade, erro este que continuou, claramente, caracterizado, noPlano Estadual de Recursos Hídricos do Estado do Ceará , tornando-o um documento inútil, pelo menos 2. Outro erro inadmissível é o da evaporação média anual con siderada nos estudos hidrológicos deste açude como sendo de apenas 1.700 milímetros, quando o correto deveria ter sido de
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tinto DNOS, que iniciou os estudos referentes a esta barragem. A tualmente se sabe que a evaporação que deveria ter sido, de fato, considerada, segundo o EIA/RIMA era de 2.893,5 milímetros (este assunto já foi abordado em vários capítulos deste livro). Caso pretendesse fazer um pronunciamento sério, a ABRH/CEARÁ jamais poderia ter ignorado estes erros elementares, não admissíveis nem a engenheiros recém-formados, quanto mais a Mestres ou Doutores especializados em Recursos Hídricos. Os erros acima citados possibilitaram que a vazão regularizada deste açude, com 100% de garantia, fosse determinada como sendo de 19m³/s quando, na realidade, é de apenas em torno de 12m³/s,-re presentando um incremento de 7m³/s, ou seja, um acréscimo de 37% (Note o leitor que a 3 vazão de 19m num , pelos engenheiros Vicente de Paula P.B. Vieira, José Nilson Bezerra Campos e Walter Martins, assessores da Secretaria de Recursos Hídricos, conforme nos referimos no capítulo anterior). É inadmissível em Engenharia, em qualquer parte do Mundo, onde seus técnicos possuam um mínimo de responsabilidade, um erro de 36% na determinação da Curva cota/área/volume, como também um erro de 28% na evaporação média anual. Com a opinião pública já esclarecida, a pressão se fez junto à SE MACE. Daí este órgão ter contratado, em setembro de 1992, dois emiseus pareceres sobre o EIA RIMA. Os autores diretos e/ou indiretos desse EIA/RIMA, jamais pensaram que o assunto pudesse escapar deixassem de aprová-lo. 24.3 - Conclusão •
A nota publicada pela ABRH/CEARÁ não merece credibili dade, pois atenta contra os Estatutos Sociais dessa entidade o que a torna juridicamente condenável, pelo abuso de poder e de autoridade conforme evidenciado neste capítulo;
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Dos nove membros efetivos dessa Associação, pelo menos cinco, jamais poderiam ter assinado tal manifesto, por seus envolvimen tos diretos e indiretos no projeto Castanhão. Ao assim agirem, referendando e aprovando, publicamente, um trabalho do qual participaram, através de contratos com o poder público federal
• denúncias de erros por nós formuladas através da imprensa. ração média anual de apenas 1.700 milímetros? Qual o nível de detalhamento da prospecção geológica da barragem situada numa região extremamente afetada por sismos, nível este que detectou “um rio subterrâneo correndo debaixo do Rio Jaguaribe” conforme foi amplamente noticiado pela imprensa à época? (ver Capítulo XXX - A Questão Sismológica na Região do Castanhão ). Muitas outras indagações podem ser encontradas ao longo deste capítulo. Deixamos ao leitor a tarefa de analisar os fatos aqui expostos e fazer seu próprio julgamento.
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
“Qual o nível de detalhamento da prospecção geológica situa da numa região extremamente afetada por sismos, nível este que detectou um rio subterrâneo debaixo do Rio Jaguaribe?”. Maria Zita Timbó
nota da segunda edição
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“Tomás Pompeu de Sousa Brasil já salientava a importância da distribuiç espacial dos reservatórios quando escreveu “que as po pulações nordestinas, durante as grandes secas, se concentravam às margens dos açudes e deles retiravam preciosos alimentos para suas sobrevivências (no caso o peixe e outros organismos aquáticos). Ora, concentrar enormes volumes de água em um só local sugere a retirada das chances de sobrevivência de muitos
XXV TERCEIRA AUDÊNCIA PÚBLICA SOBRE A BARRAGEM DO CASTANHÃO
N
relatamos as principais ocorrências da terceira e última Audiência Pública sobre a Barragem do Castanhão, realizada no dia 22 de dezembro de 1992 no auditório da SEMACE, na qual o Conselho Estadual do Meio Ambiente (COEMA) aprovou por doze votos a oito a construção daquele empreendimento. referida Audiência, que teve duração aproximada de duas horas e meia, iniciando-se às 14h30 e terminando por volta das 17 horas. A Ata será subdividida em vários itens para facilitar os comentários. 25.1 - Membros que compareceram à última Audiência Pública sobre a Barragem do Castanhão e respectivos Órgãos representados Estavam presentes a essa Audiência, sob a Presidência da Dra. Maria de Aguiar Ferreira , titular da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (SDU), os seguintes Conselheiros: 1. Maria Margarete Girão Nogueira Carvalho , Secretária Executiva do COEMA, em exercício, Assistente da Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE); 2. Audísio Uchôa de Aquino , Conselheiro Suplente, da Secretaria da Indústria e Comércio (SIC);
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3. Ramon Flávio Gomes Rodrigues , da Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará (SRH); 4. Gontran Coelho Pinto Júnior , da Secretaria da Agricultura e Reforma Agrária (SEARA); 5. Marília Lopes Brandão , da Universidade Federal do Ceará (UFC); 6. Inácio Arruda e Carlomano Marques Gomes , Conselheiros Titular e Suplente, respectivamente, da Comissão do Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará; 7. José Antônio Vasconcelos de Sá, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA/CE); 8. Joaquim de Castro Feitosa, da Sociedade Cearense da Defesa da Cultura e Meio Ambiente (SOCEMA); 9. Hermano Frank Júnior , da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC); 10. José Irineu de Carvalho e Francisco Holanda Guedes , Con selheiro Titular e Suplente, respectivamente, da Associação dos Prefeitos do Estado do Ceará (APRECE); 11. Vanda Carneiro de Claudino Sales , da Associação dos Geógrafos Brasileiros (AGB/Secção de Fortaleza); 12. Fernando Sérgio Studart Leitão , Conselheiro Suplente, da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária (ABES/Secção do Ceará); 13. Francisco Zamenhof de Oliveira , da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE); 14. Maria do Perpétuo Socorro França Pinto , do Ministério Público Estadual (MPCE); 15. Águeda Maria Frota Ribeiro , Conselheira Suplente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Departamento do Ceará; 16. Cláudio Régis de Lima Quixadá e Francisco Pardaillan Fa rias Lima , Conselheiros Titular e Suplente, respectivamente, da Associação dos Engenheiros Agrônomos do Ceará (AEAC); 17. José Daniel de Oliveira , da Federação dos Trabalhadores da Indústria; 18. Roberto Pessoa, Conselheiro Suplente, da Comissão de Agricultura e Pecuária da Assembleia Legislativa; 19. Oscar Costa Filho , da Procuradoria da República no Estado do Ceará; e 20. João Alfredo Telles Melo , da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/CE).
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25.2 - Abertura dos trabalhos da audiência De início, a Presidente, cumprimentando os presentes, solicitou aos senhores Conselheiros, a maior objetividade possível na discussão do tema da Reunião: “Apreciação, Análise e Discussão do Parecer Técnico n° 158/92, da SEMACE, sobre o EIA/RIMA do Projeto de Construção do Açude Público Castanhão”... A Presidenta anunciou que cada Conselheiro somente teria cinco minutos, no máximo, para se pronunciar, o que provocou pronta reação do Conselheiro João Alfredo Telles Melo protestar contra o cerceamento de falar dos conselheiros”. A Presidenta, Pedindo a palavra, o Conselheiro Inácio Arruda fez questão de regis trar que, de acordo com o Regimento Interno do Conselho, não cabe a sua substituição, naquela reunião, pelo Deputado Carlomano Marquesque“se apresentou como novo Conselheiro Titular da Comissão do Meio Ambiente regra, de acordo com a vontade de alguém ou das circunstâncias”. 25.3 - Solidariedade ao Engenheiro Cássio Borges Em seguida à questão envolvendo os deputados Inácio Arruda e Car lomano Marques, conforme a Ata original da SEMACE, fez uso da palavra o representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/CE), João Alfredo Telles Melo : Lembrou que o espírito natalino pudesse servir para que aquele debate se processasse num nível de companheirismo e respeito, embora houvesse diferenças de pensamentos... Manifestou sua solidariedade ao engenheiroCássio Borges , a quem disse conhecer através da luta em torno do Castanhão e que cada vez mais se impressiona com sua desassombrada coragem cívica. E continuou : “Poucas pessoas têm pago o preço que o engenheiro Cássio Borgestem pago, por manter coerência através dos tempos com as suas convicções. E uma forma de manifestar essa coerência foi através desse documento em que o companheiro responde com veemência a uma nota publicada pela Associação Brasileira de Recursos Hídricos - ABRH/ CE. Não sou da ABRH, não quero entrar em mérito dessa questão, mas quero apenas testemunhar, em favor Cássio, de pela sua honradez, pela sua coragem, pela sua determinação. Porque, hoje em dia, são poucas as pessoas que conseguem enfrentar o cerco dos próprios colegas, porque acredita no que
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diz. Para mim é importante, nesse momento, dizer que alguns de nós, que estamos aqui presentes, temos você numa estima muito elevada e que alguns ataques que lhe foram feitos não fazem justiça à pessoa que , concluiu. você é” Nota: Na oportunidade, o Autor deixa consignado sua sensibili dade pelas referências a si emitidas pelo representante da OAB/ CE. É óbvio que nos sentimos envaidecidos e orgulhosos, pois nossa luta não foi em vão. Isto porque nos foi dado observar que ainda existem pessoas não contaminadas pelo Poder que a mui tos tolda e veda o distinguir o bem do mal; o justo do injusto; a honestidade da desonestidade; a técnica, da política. Entretanto, deixamos expresso o fato de que as palavras que nos emocionaram e honraram devem ser creditadas muito mais à bondade de um companheiro de lutas do que aos possíveis méritos que possamos ter. Finalmente, não carregamos, em nossa consciência, ressen timentos, mas sim a noção atávica do cumprimento do nosso 25.4 - A lembrança do Deputado Jackson Pereira A segunda Conselheira a falar foi a representante da Associação dos Geógrafos Brasileiros, Vanda Claudino Sales . Diz certo trecho da Ata: “Um ponto colocado pela Conselheira Vanda Claudino Salesfoi a respeito de um artigo do deputado Jackson Pereira,publicado no Diário do Nordeste naquela mesma data, e que levantava ponderações acerca da aprovação do açude Castanhão. Pediu licença para ler alguns tópicos do artigo que - conside rava importantes para que os Conselheiros, ali presentes, pensassem bastante na qualidade do voto que iríamos dar: “Arrasta-se uma polêmica sobre a construção do Açude Castanhão. Como a construção depende de uma licença prévia do Conselho do Meio Ambiente, sediado em Fortaleza, muitas críticas são direcionadas aos ambientalistas, sem que se busque saber suas reais razões para esse comportamento. Além das questões ambientais, existem ainda ponderações de técnicos do próprio DNOCS, que carecem de um melhor exame, uma vez que, com forte argumentação e documentação, asseguram a inviabilidade do investimento. Diante das posições Nacional, a constituição de um grupo de trabalho, sem que seus integrantes estejam envolvidos no processo em andamento, para analisar, detalhadamente,
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sobre a prioridade ou não, da construção do Castanhão. (...) Creio, ser este o melhor caminho para que a sociedade tenha a verdade bem transparente. “Lamentavelmente alguns, por má fé, ou desconhecimento, chegaram a propalar que sou contra o Castanhão. Isso não é verdade! O que não admito, doa a quem doer, é o desperdício no trato do dinheiro público. Quando não é máquina burocrática e a incompetência dos gestores públicos. Quando vejo tanta água armazenada, servindo, apenas, na maioria das vezes, para a evaporação, questiono se é emergencial se investir 500 milhões de dólares em uma nova obra [o grifo é nosso]. Estas observações, registro, para que a levar por ideias visionárias e questões que aparentemente são de interesse público. Caso, porém, me provem que o Castanhão é, de fato, um instrumento Enquanto isso não ocorrer, manterei minha postura de equilíbrio à procura da verdade, na defesa do erário”. 25.5 - A Nota da Associação Brasileira de Recursos Hídricos - ABRH/Ceará A Conselheira Vanda Claudino Sales , da AGB/CE, prosseguiu: Jornal O Povo, de ontem: “Açude Castanhão – Nota da ABRH-CE”. Essa nota é apresentada como sendo da comunidade dos Hidrologistas do Estado do Ceará. E eu gostaria de chamar a atenção dos Conselheiros e demais presentes que, na verdade, essa é uma nota da Comunidade dos Hidrologistas Amigos do Castanhão; não se trata da opinião das comunidades dos hidrologistas do Ceará. Porque, desse grupo de pessoas que assinaram a nota – dezessete ao todo – mais de dez estão envolvidos diretamente com o Projeto Castanhão, [o grifo é nosso], seja através das empresas de assessoria, como a SIRAC, VBA, AGUASOLOS e outras mais. O Presidente da ABRH não é, nada mais, nada menos, que um senhor que é da SIRAC e que veio aqui, em reunião deste Conselho, fazer a defesa do seu Parecer, enquanto consultor, enquanto técnico daquela empresa. Professores da Universidade que, inclusive, não estão mais lá, aposentados que são, porque as suas empresas de consultoria estão sempre requisitadas para prestar serviços aos órgãos públicos, sem licitação,- sem qual quer tipo de encaminhamento ético maior e que vem aqui, em nome de uma
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pretensa comunidade do Ceará, dar seu parecer sobre um projeto que, como vem sendo feito, está sendo discutido num processo antidemocrático, viciado, manipulado e aético”. 25.6 - Conclusão •
•
De modo sucinto, apresentamos o que consta inicialmente da ATA dessa terceira Audiência Pública sobre a Barragem do Castanhão. Ao leitor, cabe tirar suas próprias conclusões. Nos capítulos se guintes, continuaremos a transcrever, também, resumidamente, partes subsequentes da referida ATA. O Autor ressalta seu profundo entusiasmo por não se sentir só, nesta luta tão desigual. Agradece, com o respeito e a consideração devida, aqueles que, nessa triste e melancó1ica Audiência Pública, se colocaram ao lado da razão, da lógica, da técnica, da engenharia transparente, ao votarem contra este empreendimento no nível proposto. Tais pessoas que conosco lutam, revigoram nossas energias. Somos em número menor porque o que nos sustenta é o nosso idealismo. E este, pretendemos, com o presente livro, despertar em todos os segmentos de nossa sociedade. Só então seremos vitoriosos. Isto porque não serão vozes de um “pequeno grupo de idealistas”, de uma elite cultural cearense, mas o clamor de um povo que não pede e sim exige que nossas autoridades, realmente, possam entender que “o poder emana do povo e, em seu nome, ele deverá ser exercido” [o grifo é nosso].
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
João Alfredo Telles Melo
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João Alfredo
Vanda
Claudino Sales
Engenharia Nacional
, Carlos Miranda Lobo Maranhão
Capítulo XXX
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XXVI A PARTICIPAÇÃO DA ASSEMBLEIA LEGISLATIVA
26.1 - As posições conflitantes de representantes da Assembleia no COEMA
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ando continuidade aos comentários da terceira e última Audiência Pública sobre a Barragem do Castanhão, ressaltamos mais alguns trechos da ATA: Na sequência falou o deputado Inácio Arruda lamentando a presença, naquela reunião do COEMA, do deputado Carlomano Marquesque, na qualidade de Presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Le gislativa, ali compareceu com o intuito de substituí-lo”. Referiu-se ao - proce dimento do deputado Carlomano Marques, que agiu de forma deselegante, pois“somente soube da sua substituição naquela reunião na SEMACE. Esse ato é que não considero ético”. E indagou: “Qual a razão desse ato? [o grifo é nosso]. Respondendo a uma colocação do deputado Carlomano Marques , segundo a qual o deputadoInácio Arruda “não estaria traduzindo o pensamento, nem da Comissão de Meio Ambiente e nem da Assembleia Le gislativa do Estado do Ceará, vez que todos os 44 deputados são favoráveis à construção do Castanhão e costumeiramente o deputado Inácio Arruda estaria traduzindo não a opinião do Colegiado, mas a sua opinião pessoal sobre a questão do Castanhão” , o deputadoInácio Arruda assim se expressou:
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Foi porqueInácio responde pela sua posição particular e não pela-Assem bleia? É porque Inácio defende os seus interesses pessoais? Tudo isso seria falso de colocar. Totalmente falso! Não tenho interesse pessoal nesse assunto; não tenho voto em Jaguaribara; não estou pedindo voto a ninguém em Jaguaribara; vontade de contribuir para o desenvolvimento do seu estado. Falou, ainda, que de nenhuma forma contrariaria os interesses da Assembleia Legislativa ou da Comissão de Meio Ambiente daquela casa. E que, sempre que convidara os que o assunto fora discutido na Assembléia somente duas vezes; na primeira vez em que o assunto Castanhão fora discutido só se encontravam eles dois (o Conselheiro Inácio Arruda e o Deputado Carlomano Marques). Lembrou, também, que “alguns deputados”, apesar de se posicionarem “correndo”, de forma favorável, docilmente, nunca se preocuparam em saber quais são os prejuízos, qual é a viabilidade econômica, qual o interesse maior que está em jogo[o grifo é nosso]. construa “um novo monumento à insanidade” como foi feito lá em Balbina, exclamou o Conselheiro Representante da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, deputado Inácio Arruda. 26.2 - Referências aos pareceres da SEMACE e SRH e a incoerência do parecer daV BA O Conselheiro João Alfredo Telles Melo , da OAB-CEARÁ, fez os seguintes comentários sobre o Parecer Técnico N° 158/92 - DLA/ UEIA da SEMACE, datado de 27 de novembro de 1992 e assinado pelos seguintes técnicos daquela Superintendência: Adahil Pereira Sena (geólogo),Maria Izolda Rocha Almeida (socióloga) e Lene Simone de Q. M. Peixoto (geógrafa): O ConselheiroJoão Alfredofalou sobre o Parecer da SEMACE e disse que até já advertira aos colegas que o elaboraram alegando não ser uma questão pessoal e que, na verdade, gostaria de fazer uma crítica. Primeiro, o Parecer diz que se restringe aos aspectos ambientais, mas ao longo do Parecer outros aspectos que não sejam estritamente ambientais foram apreciados, sendo óbvio que o fossem pois, na verdade, seria difícil se desvincular a questão ambiental da questão econômica, social, hidrológica, cultural principalmen te numa obra desse porte e dos impactos que evidentemente ela causa” (...)
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E passou a discorrer sobre o que ele denominou de segundo problema: “Pas Parecer da SEMACE diz: “Se houvesse essa diminuição da cota 100 para a 80 se perderia cerca de 50.000 hectares irrigados”. E é justamente aqui onde João Alfredoe continuou: “Isso já havia sido levantado no Parecer Ednardo do Cardosoda VBA [1] e todo mundo elogiou como se fosse verdadeiro. Ora, o próprio Projeto Castanhão prevê a irrigação de 43.000 hec tares. Então, como é que, se eu baixar a vazão regularizada de 26 para 6,7 m³/s eu vou perder 50.000 hectares? Quer dizer que vou perder mais do que era previsto no Projeto? Assim sendo, não há essa perda de 50.000 hectares que está colocado aqui. No entanto, a SEMACE continua utilizando esses dados. Continuando o seu pronunciamento, disse o Conselheiro João Alfredo: Nós tínhamos discutido aqui (foi uma ideia do próprio Superintendente da SEMACE, Eduardo Araújo, e acatado por todos nós) que, em função do não entendimento dos hidrólogos cearenses em relação a essa questão, em função de uma série de problemas de impactos ambientais a jusante da barragem, principalmente, houve por bem a SEMACE fazer a contratação de duas - Con sultorias.E o interessante é que esse parecer da SEMACE que está sendo analisado hoje, aqui, praticamente passa por cima dos dois pareceres que foram encomendados pela própria SEMACE. (...) Na verdade, o parecer da SEMACE deveria se posicionar em relação às questões levantadas pelo respondido pela SRH, o que, inclusive, não é verdade!” [o grifo é nosso]. Disse o Conselheiro João Alfredoque pelo parecer do Dr. , a vazão regularizada do Castanhão (com 100% de garantia) é igualzinha à do Açude Orós, entre 12 e 13 m³/s. Aí a SEMACE, em seu parecer, remete o assunto para a Secretaria de Recursos Hídricos, como se a Secretaria tivesse resolvido a questão. Não resolveu! Os Conselheiros que tiveram o cuidado de ler todo esse calhamaço de papel vão ver que, apesar do parecer da SRH continuar se batendo com o critério de 90% de garantia, há questões que são importantes. Vejamos a primeira, na página 3 do Parecer da SRH, quando defende a garantia de 90%, diz: “Entendemos, no entanto, que em regiões como a nossa...” “Ora!, exclamou o Conselheiro João Alfredo, o Castanhão não é
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para o sul do país. É para o semiárido nordestino...”. E continuou a ler o texto do parecer da SRH: “... O critério de 90% poderá redundar em períodos secos muito prolongados e inconvenientes para usos mais nobres, como é o caso do abastecimento d’água”. Conselheiro representante da OAB: E aí o abastecimento de água de Fortaleza não é uma destinação nobre e não está comprometido com uma vazão de 10,5m³/s? A própria SRH considera, no seu parecer, que a adoção desse critério de garantia de 90% pode comprometer o uso da água, inclusive para o abastecimento da população fortalezense”[o grifo é nosso]. Continuando a ler: “A HIDROESB, em seu parecer, no subitem 5.18, da página 31, menciona o período de 20 anos : “Não entendo ininterruptos sem sangria do Açude Castanhão...”. de hidrologia, mas me disseram que um açude tem que, no mínimo, sangrar de 5 em 5 anos, para fazer uma varredura. Em 20 anos sem sangrar, isso compromete a qualidade dessa água; tanto da água do açude, como da água a jusante. E o parecer da SRH contesta isso? Não! Ao contrário do que diz o parecer da SEMACE, o parecer da SRH não contesta tudo que foi levantado pelo Dr. . Continuando, o Conselheiro João Alfredo Telles Melo assim se expressou: Vejamos o que diz o parecer da SRH, iniciando a leitura: “Concordamos [2] com a sugestão da HIDROESB , no sentido de ser refeita a avaliação econômica, desde que partindo da vazão de 90%” [o grifo é nosso]. Então como é que a SEMACE chega e diz que o parecer da SRH resolve a questão e que ele contestou o da HIDROESB, o que, de fato, não ocorreu. (...) Essa é a de garantia) pode irrigar de 1.500 a 2.000ha. Então seria necessário termos entre 21 a 28m³/s (com 100% de garantia) só para a irrigação. Isso, para não falarmos dos 10,5m³/s de água destinados a Fortaleza. Nota do autor: zada do Açude Castanhão é de 19,3m³/s, com 100% de garantia, embora o professor , no seu parecer, diga ser de apenas 10 a 12m³/s (Ver Capítulo XI). É mais do que evidente que o valor de 19,3m³/s, que somente “apareceu” neste parecer da SRH, é altamente discutível porque foi baseado na evaporação anual de 1.700mm quando deveria ser de 2.228mm. O Plano Estadual
Aprovação do Projeto
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de Recursos Hídricos (1992) é omisso quanto a esta principal característica do Açude Castanhão, como o é de qualquer açude, ou seja, a vazão regularizada com 100% de garantia. Também-es tudos realizados pelo DNAE - Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica estima a vazão regularizada do Castanhão em 12,0m³/s (Ver Capítulos XII e XIV ). E em capítulos anteriores vimos que, também, para o DNOS, que idealizou a Barragem 3 do Castanhão, este reservatório só dispõe de 12,35m /s. Em face do exposto, chega-se à conclusão que o Açude Castanhão não 3 /s para a a irrigação de 43.000 hectares e a destinação de 10,5m Região Metropolitana de Fortaleza.
Finalizando, O Conselheiro da OAB/CE, nesta Audiência Pública diz: Vejam o parecer do Dr. tem 100 páginas e o da SE MACE tenta desmontá-lo em apenas 10 páginas. Está aqui o parecer da SRH, com todas essas incongruências. E, em seu Parecer, a SEMACE teve uma visão tão dirigida que, em seus considerandos, ela diz: “Considerando a análise realizada pela SRH, sobre o Parecer Técnico da HIDROESB...” Ou seja: não apreciou o Parecer Técnico da HIDROESB. No mínimo, a -SE MACE deveria dizer: “Considerando o Parecer do Dr. ; Considerando o Parecer do Dr. Aristides de Almeida Rocha ...; Considerando o Parecer da SRH...” , mas isto aqui está muito claro. Na verdade, a SEMACE não se valeu, em nenhum momento, de todas as questões, de todas as preocupações, de tudo o que foi discutido... E eu falei aqui do problema da salinização que tanto é levantado peloAristides, Dr. como pelo Dr. Ottoni. Infelizmente,nós não podemos votar esse Parecer da SEMACE, sob pena de estarmos cometendo irresponsabilidades, concluiu. 26.3 - Uma afirmação que contraria a razão O Consultor da SEMACE para assuntos do Açude Castanhão, enge nheiro Ednardo Fernandes Cardoso (VBA - Consultores) deixou os “a Barragem do Castanhão, se construída na cota 80m, perderia 50.000 hectares de sua área irrigada” [o grifo é nosso]. A verdade é a seguinte: Conforme já é do conhecimento do leitor, a Barragem do Castanhão, quando surgiu no cenário técnico cearense, no ano de 1985, trouxe no seu bojo um erro de 33,76% na sua curva característica Cota/Área/Volume. Na versão inicial do projeto, com um erro inadmissível desta magnitude,
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a referida barragem, na cota 80m, acumularia apenas 758,3 milhões de m³. Posteriormente, após a devida correção, por nós introduzida (ver Capítulo IX), soube-se que a barragem, na referida cota, acumula, de fato, 1,2 bilhão de m³. Um erro de 36,8%. Pois bem, esse erro, ainda por ocasião da terceira e última Audiência Pública sobre a Barragem do nhecido (acreditem se quiserem) pelo próprio consultor da SEMACE, engenheiroEdnardo Fernandes Cardoso , pois ele considerou no seu parecer que a Barragem do Castanhão, na cota 80m, acumulava apenas 758,3 milhões de m3 em vez de 1,2 bilhão de m3. Sem comentários... . Por outro lado, o próprio Plano Estadual de Recursos Hídricos, editado em 1992, também desconhecia este lamentável erro, embora nós o tenhamos revelado, inclusive através da imprensa, e em Seminários cinco anos antes, de forma bastante incisiva. É importante acrescentar que o engenheiroEdnardo Cardoso foi um dos elaboradores deste contestado Plano que na página 1341, diz textualmente:“a capacidade de armaze namento da Barragem do Castanhão na cota 80m é de 758,3 milhões de m³ e sua vazão regularizada, com 90% de garantia, é de 10,4m³/s” . Es ses valores, se corrigidos e reconhecidos a tempo, teriam, com certeza, mudado os rumos da história do Açude Castanhão. É assim que se faz hidrologia no Ceará? E ainda se autoproclamam os mais avançados do Brasil.... Para mim, uma total decepção. Todos esses fatos, inclusive os que já comentamos em outros -ca “Plano Estadual de Recursos Hídricos do Estado do Ceará ” está eivado de erros grosseiros. à sociedade? Tem razão o Conselheiro da OAB, João Alfredo Teles Mello , quando disse:“Como pode o Castanhão perder 50.000 hectares de área irrigada se ele for construído na cota 80m, se na sua cota máxima, cota l00m, ele só irriga 43.000 hectares? Quer dizer que ele perde mais do que é possível irrigar?”. tão burlescos quanto calamitosos? É por este e outros motivos que este livro tem o subtítulo:Em Defesa da Engenharia Nacional.
Aprovação do Projeto
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26.4 - Conclusão Não gostaríamos de expor atos que poderiam induzir o leitor a aceitar nossos argumentos, razão pela qual rogo a este que, com base no- ex posto, formule suas próprias conclusões quanto ao procedimento escuso adotado para garantir a aprovação do Açude Castanhão no porte alto.
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
João Alfredo Telles Melo
Tribunal da Água
XXVII O CASTANHÃO É APROVADO NO COEMA
27.1 - Discussão em torno do parecer técnico daSEMACE
A
o Parecer Técnico N° 158/ 92, da SEMACE, ainda falaram contra a construção do Açude Castanhão os seguintes Conselheiros:Águeda Frota (IAB/CE), Inácio Arruda (da Assembleia Legislativa), Marília Brandão (UFC) e Joaquim de Castro Feitosa (SOCEMA). Sobre mais esse pronunciamento do Conselheiro Inácio Arruda , gostaríamos de destacar os seguintes trechos da Ata: O ConselheiroInácio Arruda, Representante da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa, pronunciou-se alegando ter a maior boa-fé nos técnicos, nos cientistas, nas pessoas que se dedicam ao estudo da ciência, do desenvolvimento tecnológico, principalmente porque o Brasil era muito atacado, sob esse ponto de vista. Por isso mesmo é que foram solicitadas nos técnicos e porque desejariam promover a mais completa e ampla discussão em torno do assunto; daí haverem retardado o processo deFalou decisão. dos diversos tipos de pressão que o COEMA vem recebendo, submetendo, às vezes os cientistas a humilhações (...) [o grifo é nosso]. “Sei que não sou um cientista da área, mas gostaria de compreender a quase que total desconexão que existe entre aquilo que nós contratamos (porque considerávamos que era importante elucidar uma série de dúvidas que se apresentaram no Conselho),
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que a SEMACE resolveu dar um Parecer sobre o Parecer da Secretaria de Recursos Hídricos e não se dirigir, diretamente, ao material que foi - enco mendado pela própria SEMACE? Por que ela tirou essa responsabilidade de si e a transferiu para a SRH? (...) Penso que é necessário anotarmos todas ConselheiroInácio Arruda. Seria exaustivo reproduzir todos os pronunciamentos feitos durante aquela histórica reunião do COEMA, onde se destacaram nomes como os do engenheiroJoaquim Guedes Correa Gondim Filho , do DNOCS, do geólogoAdahil Sena , da SEMACE, do Dr. Victor de Melo , especialista em estruturas de barragens, Cláudio Régis Quixadá , da AEAC, entre outros. É importante destacarmos alguns trechos do pronunciamento do Eng. Joaquim Guedes Correa Gondim , do DNOCS: (...) Outros pontos levantados acerca desses Pareceres: falou-se aqui que o reservatório passaria 4 (quatro) anos secos. Em momento algum, em estudo - o re nenhum foi dito isso. Nos estudos elaborados pelo PERH, foi dito que servatório passa 7 (sete) meses seco, em 600 meses. Quem disse que passava , no relatório dele. (...) 4 (quatro) anos seco foi o professor Falou-se aqui que a evaporação do açude estava errada. Maquiaram-se números, porque utilizou-se 0,8 da taxa de evaporação do tanque Classe A. Passo às mãos do Conselheiro João Alfredoum estudo que mostra essa mesma metodologia utilizada: 0,8 da taxa da evaporação do Tanque Classe -A. Tra ta-se de uma metodologia perfeitamente conhecida e dominada e é a que foi adotada pelo Governo do Estado, em seu Plano Estadual de Recursos Hídricos. perfeitamente conhecido, como disse o engenheiro Joaquim Gondim . Não é isso que se discute. O que foi dito no COEMA é que, da eva poração real anual, de 2.228 milímetros, somente foram considerados 1.700 milímetros. Depois que são feitas as leituras diárias de campo no “Tanque Classe A do Bureau of Reclamation” e feitos os necessários ajustes, os dados são fornecidos para uso da comunidade técnico-cien Joaquim Gondim , a evaporação de 1.700mm é Em diversos assuntos de engenharia, os dados de campo são subme tidos a prévias correções. Por exemplo, ao lermos na Enciclopédia que o Monte Everest tem 8.880 metros de altitude não tem o leitor que se
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preocupar com as correções relativas à curvatura da terra e do efeito da refração exercida pela atmosfera no momento da medição, porque isto já foi, previamente, feito pelos topógrafos e engenheiros. Vejo com tristeza as explicações inconsistentes de um técnico que considero do mais alto nível como é o engenheiro Joaquim Guedes Correa Gondim Filho . Ele sabe que a taxa média de evaporação anual no estado do Ceará, situa-se em torno de 2.200 a 2.800 milímetros com exceção da faixa litorânea e das serras. Isto está sobejamente comprovado quando um grande número de estações tipo Tanque Classe A, do Bureau of Reclamation, foi instalado pelo DNOCS, principalmente na década de 60. O próprio Secretário de Recursos Hídricos, Hypérides Macedo , A Chuva e o Chão na Terra do Sol , na página 17, o seguinte:“O diagnóstico mais certo é que o Ceará é uma região cuja- evapo ração é a mais alta do mundo, cerca de 2.000 a 2.500 milímetros, isto é, mais de três vezes a média geral de chuvas do estado, cerca de 750 milímetros”. O professor em seu parecer para a SEMACE utilizou-se da evaporação média de 2.315,2mm/ano de Morada Nova (CE) (Ver Capítulo XIII ). E para que este assunto da evaporação seja devidamente esclarecido, vamos transcrever, a seguir, o que disse o engenheiro agrônomo Pardaillan Farias Lima no seu livro, editado em 2007, sob o títuloCastanhão− Do Sonho à Realidade , na página 34: “As condições climáticas da área induzem a elevadas taxas de evaporação que atingem mais de 2.800 milímetros anuais”. Em Lima Campos (CE) a taxa de evaporação é da ordem de 2.980 mm e em Juazeiro do Norte (CE) 2.635mm, valores estes que comprovam o que acima foi dito. Finalmente, recomendamos o leitor rever o Capítulo XI, ser a evaporação na área do Açude Castanhão de 2.893,5 milímetros. 27.2 - A votação final A Presidenta da reunião desse Conselho: Dra. Ferreira , alegando que todos já haviam se pronunciado, propôs a votação do Parecer Técnico N° 158/92 da SEMACE, sobre o EIA/RIMA da Barragem do Castanhão. Votaram a favor do Parecer os seguintes Conselheiros: Audísio Uchoa Aquino (SIC), Ramon Flávio Gomes Rodrigues (SRH), Gontran Coelho Pinho Júnior (SEARA), Maria Margarete Girão Nogueira
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Carvalho (SEMACE), José Antônio Vasconcelos de Sá (IBAMA/CE), Hermano Frank Júnior (FIEC), José Irineu Carvalho (APRECE), Fernando Sérgio Studart Leitão (ABES/CE), Francisco Zamenhof de Oliveira (SUDENE), Cláudio Régis de Lima Quixadá (AEAC), José Daniel de Oliveira (da Federação dos Trabalhadores na Indústria) e Roberto Pessoa (da Comissão de Agricultura e Pecuária da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará). Contra o Parecer votaram:Marília Lopes Brandão (Universidade Federal do Ceará), Inácio Arruda (da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará),Joaquim de Castro Feitosa (SOCEMA - Sociedade Cearense do Meio Ambiente), Vanda Claudino Sales (AGB - Associação dos Geógrafos do Brasil), Maria do Perpétuo Socorro França (Ministério Público Estadual), Águeda Maria Frota Ribeiro (do Instituto dos Arquitetos do Brasil), Oscar Costa Filho (da Procuradoria da República do Estado do Ceará) e João Alfredo Telles Melo “Aprovado o Parecer por 12 (doze) votos contra 8 (oito). Concluída a votação, a ConselheiraVanda Carneiro Claudino Sales solicitou tempo para dizer que“a SEMACE elabora um Parecer sobre dois outros Pareceres, e consegue ter uma conclusão diferente. Os dois condenam a execução do Projeto e solicitam uma revisão dos custos econômicos. (...) Essa postura da o predomínio de interesses escusos na aprovação do Projeto, cujo processo de discussão foi antidemocrático, viciado e aético, concluiu, a seguir, sendo encerrada a seção. E para constar, foi lavrada a presente Ata, que, após lida e achada conforme, será assinada pelos Conselheiros presentes. Fortaleza, 21 de dezembro de 1992”. 27.3 - Conclusão • Castanhão foi aprovada, graças, principalmente, a uma avassa -
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contra esta decisão, mas temos plena convicção de que foram os votos mais livres, conscientes e independentes neste triste e melancó1ico episódio; Os fatos narrados neste livro evidenciam, exaustivamente, que este malfadado projeto está eivado de erros, vícios e contradições;
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O tempo dirá com quem estava a razão e, certamente, destaca rá quem sepultou sonhos e ilusões de um imenso contingente populacional, obrigando-o a deslocar-se do local onde vivia, em atendimento a objetivos inaceitáveis, impostos por interesses inconfessáveis.
Que o leitor analise o exposto e tire suas próprias conclusões.
NOTA DA SEGUNDA EDIÇÃO
Joaquim Guedes Correia Gondim Theophilo Ottoni
Capítulo XIII, item 13.2 .
9ª PARTE: CONDENAÇÃO DO PROJETO
CAPÍTULO XXVIII O Castanhão é condenado no Tribunal da Água
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CAPÍTULO XXIX O Castanhão é condenado pela natureza
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CAPÍTULO XXX A questão sismológica na Região da Barragem do Castanhão
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XXVIII O CASTANHÃO É CONDENADO NO TRIBUNAL DA ÁGUA
28.1 - Breve Introdução
N
realizou-se na cidade de Florianópolis o Tribunal da Água, um júri simulado promovido pela Fundação Água Viva, com o apoio de diversas organizações, para julgar casos de poluição de recursos hídricos no país. Dentre estes, denúncias contra o EIA/RIMA da construção da Barragem do Cas tanhão, no estado do Ceará, aprovado no Conselho Estadual do Meio Ambiente - COEMA, no dia 21 de dezembro 1992. O parecer de três professores, com nível de doutorado (PhD), do“Curso de Mestrado em Recursos Hídricos”,da UFC, contrário àqueles emitidos por ilustres
do Melo Ambiente - SEMACE, serviu de fundamento para a aprovação Aristides de Almeida Rocha ), considerados dentre os mais credenciados e respeitáveis do nosso país na área de recursos hídricos e meio ambiente, em seus pareceres, discordaram desse EIA/RIMA, indicando todos os erros nele contidos, tanto sob a ética da engenharia, como econômica, social e ambiental. O referido Tribunal, do mais elevado gabarito, foi composto de um Presidente, de sete Jurados, de uma Comissão de Peritos e de uma Secretaria Administrativa.
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28.2 - Composição do júri do Tribunal da Água O julgamento do Açude Castanhão ocorreu no dia 28 de abril de 1993. Compuseram o corpo de jurados os seguintes membros: 1. Herman Assis Baeta (Advogado. Ex-Secretário Geral, Vice-Pre sidente e Presidente da OAB/Conselho Federal) - Presidente do Tribunal da Água; 2. Christian Guy Caubet (Doutor em Direito. Professor Titular do Departamento de Geociências/UFSC. Presidente da Fundação Água Viva); 3. Ela Wiecko Volkmer de Castilho (Mestre em Direito. Coorde nadora de Defesa dos Direitos Individuais e Interesses Difusos da Procuradoria da República em Santa Catarina. Subprocuradora Geral da República); 4. Roberto Armando Ramos Aguiar (Doutor em Direito. Procu rador-Geral da Universidade de Brasília. Professor do Departamento de Ciências Políticas e Relações Internacionais da UNB); 5. (Doutor em Direito Ambien tal pela Universidade de Estrasburgo - França, Presidente da Sociedade Brasileira do Direito do Meio Ambiente, Professor de Política e Legislação Ecológica, Vice-Presidente do Centre Internacional de Droit Comparé de L’Environnement – Limo ges, França – e autor do livroDireito Ambiental Brasileiro– 5ª Edição – Relator do caso Castanhão; 6. Zenon Simon (Engenheiro Químico. Ex-Chefe do Departamen to de Operação e Manutenção do SITEL - Sistema Integrado Sul. Conselheiro da AGAPAN e membro do corpo técnico do Conselho de Recursos Hídricos do RS); e 7. Magda Renner (Militante ambientalista. Presidente da Associação Democrática Feminina Gaúcha – ADFG/Amigos da Terra. O advogado João Alfredo Telles Melo , Presidente do Instituto Ambiental e Conselheiro da OAB/ CE, apresentou a acusação. A defesa esteve a cargo do engenheiro do DNOCS Joaquim Guedes Correia Gondim Filho . Como peritos, o engenheiroManfredo Cássio de Aguiar Borges (a favor dos denunciantes, e autor deste livro) e o engenheiro Hypérides Pereira de Macedo (contra os denunciantes).
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28.3 - A fala da acusação O advogadoJoão Alfredo Telles Melo , em nome das entidades denun ciantes, fez um relato das características da Barragem do Castanhão, “cuja licença de instalação foi aprovada no último dia 21 de dezembro do ano próximo passado, por 12 votos a 8 pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente, a partir de um parecer favorável da Superintendência Estadual do Meio Ambiente - SEMACE”. (...) A seguir, o denunciante cita vários impactos ambientais a jusante da “que essa obra sendo construída nessa magnitude (duas vezes e meia o tamanho da Baía da Guanabara), pode passar quase vinte anos sem sangrar, causando um impacto a jusante na qualidade da água do cerca de 150 quilômetros, a salinização dos solos agricultáveis, devido ao rebaixamento do lençol freático, o que permite a intrusão de águas salgadas e muitas outras listadas no EIA/RIMA e nos pareceres das consultorias”. Continuando sua fala, em certo trecho,João Alfredo Telles Melo acusa: A despeito de todos esses agravantes, o DNOCS tem se recusado a discutir, como manda a legislação ambiental sobre o EIA/RIMA (a Lei 6.938/81, o Decreto 99.274/90 e a Resolução 001/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente), as alternativas que poderiam contemplar a construção de 10 a 12 médios açudes, distribuídos espacialmente na bacia do Rio Jaguaribe, incluindo o próprio Castanhão com uma dimensão menor, acumulando, no máximo, um bilhão e duzentos milhões de metros cúbicos de água, na cota 80m, como tem defendido o ex-Diretor do DNOCS, engenheiro Cássio Borges. (...) Abra-se aqui um parêntese para aduzir o fato de que no Baixo Jaguaribe, onde se localiza o Castanhão, o rio, há anos, já está perenizado pelo açude Orós. (...) (...) Vou abrir um parêntese para levantar a questão das alternativas, que é o ponto central da nossa discussão. (...) Portanto, esse estudo das alternativas tem que estar no bojo do projeto. (...) pode dispor de mais água. E podemos ter uma vazão regularizada maior. Se a evaporação é maior (como de fato é), ela não pode gerar todos os benefícios previstos. Tais contradições levaram, inclusive, a uma das empresas- de con sultoria contratada pela SEMACE a concluir que o estudo de sua viabilidade
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dade econômica do empreendimento, o que compromete todo o projeto. Esse foi o parecer do engenheiro , da HIDROESB - Saturnino de Brito S.A. Esse parecer, com mais de cem páginas, foi também desconsiderado pela SEMACE. A SEMACE o submeteu à Secretaria de Recursos Hídricos, que o remeteu, por sua vez, a consultores que tentaram impugná-lo com um contra parecer de apenas dez páginas. A fala do Dr. João Alfredo Telles Melo continuou citando vários trechos do parecer do professor e conclui: Diante do exposto, requerem deste Tribunal da Água se digne declarar a nulidade da licença de instalação concedida, determinando a complementação do EIA/RIMA, especialmente no que concerne ao estudo das alternativas, conforme determina o artigo 3°, inciso 1, combinado com o artigo 6°, 1-2 da Resolução 001 do CONAMA. (...) Por isso, achamos que essa licença está viciada, deve ser declarada sua nulidade, mesmo que a nível simbólico (e tem uma simbologia muito forte, pelo histórico dos membros deste Tribunal), deve ser declarada sua nulidade em função de todas as irregularidades detectadas no Estudo de Impacto Ambiental. Muito obrigado. 28.4 - A fala da defesa Vejamos alguns trechos da defesa deste megabarramento, apresentada pelo engenheiroJoaquim Guedes Correia Gondim Filho , do DNOCS: (...) O Castanhão não é simplesmente uma barragem, mas ele está embutido num projeto de desenvolvimento para o estado do Ceará. Nesta região, vai se situar um futuro polo de desenvolvimento que vai polarizar toda uma área no entorno das bacias do Jaguaribe e do Apodi, no Rio Grande do Norte. O Governo do Ceará é conhecido hoje, nacionalmente, pela seriedade nas suas atribuições. Antes de tomar uma posição sobre a barragem, ele preparou o Plano Estadual de Recursos Hídricos, para ter condições de decidir em cima de uma barragem projetada pelo Governo Federal. Seria interessante discutir, também, a problemática do tamanho- do Cas tanhão. Quando se fala que não se fez o Estudo do Impacto Ambiental para solução do Castanhão pequeno, é preciso que se diga o seguinte: o- estudo eco nômico mostrou que um açude pequeno era inviável economicamente. Antes mesmo de impactar ambientalmente, ele foi considerado inviável, porque somente a partir da explicitação de que a alternativa poderia ser viável - eco
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nomicamente nós partiríamos para a segunda constatação que seria a de que ele é viável ambientalmente, como foi feito para a alternativa atual, na cota 100m. Depois de constatada que ela foi economicamente viável, foi estudado o impacto ambiental. Ela demonstrou ser econômica e socialmente viável. Quanto ao parecer que foi citado do professor , o parecer não foi analisado por consultores. O Estado contratou a Universidade Federal do Ceará, o Curso de Mestrado em Recursos Hídricos. Três professores PHD, do Mestrado, emitiram o parecer onde discordam das considerações levantadas pelo professor . O Plano foi elaborado por conta, principalmente, do problema do - Casta nhão, que acelerou e induziu o Estado a ter seu Plano Estadual de Recursos Hídricos (...). Uma obra como esta não poderia se situar num contexto isolado. Não poderia ser uma ilha federal dentro de um Estado (...). Nota do autor: Constata-se que das 1.400 páginas do Plano Estadual de Recursos Hídricos, a parte referente ao Açude Castanhão está restrita a apenas três páginas, sem nenhuma contribuição
apresentado está com a Curva Cota/Área/Volume do Açude 80m, que ali é tida com capacidade de acumulação de 758,3 milhões de m³, quando, na realidade, é de 1,2 bilhão de m³. Um erro inadmissível de engenharia de 36,84%. Em outro capítulo deste livro foi dito que os três engenheiros que deram parecer favorável à construção do Açude Castanhão eram “assessores” da SEMACE. Na fala do engenheiro Joaquim Guedes Correia Gondim Filho , neste Tribunal, ele traz outra versão: disse que o “Estado contratou a Universidade do Ceará, o Curso de Mestrado em Recursos Hídricos” nos parecendo haver uma contradição em torno desta questão. Observa-se agora que não foi um parecer da Secretaria de Recursos Hídricos (SRH/ CE), como vinha sendo dito, mas de três engenheiros (do Curso de Mestrado) especialmente “contratados pelo Estado”. Esta, para nós, é uma nova versão.
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28.5 - A sentença do Tribunal da Água Transcrevemos, a seguir, de modo sucinto, a Sentença do Tribunal da Água: EMENTA: O Tribunal da Água aponta irregularidades no EIA/RIMA referente ao pedido de licenciamento da Barragem do Castanhão (estado do Ceará, Brasil) e dessa forma, o licenciamento não pode ser concedido (...). (...) O relatório foi aprovado em reunião do COEMA (Conselho Estadual do Meio Ambiente) realizada em 21 de dezembro de 1992. O Estudo foi aprovado nessa reunião por 12 votos contra 08 votos. Assinalo que os Con selheiros que nomeadamente tem formação jurídica - Ministério Público do Estado, Ministério Público Federal e Ordem dos Advogados do Brasil (CE) - votaram contra a aprovação do Estudo de Impacto Ambiental [o grifo é nosso]. A SEMACE expediu licença de instalação, cuja nulidade solicita-se seja cominado por este Tribunal (...). DECISÃO: O Tribunal da Água, reunidos às 18 horas, na Sala do Centro Integrado de Cultura - CIC, nesta cidade de Florianópolis, Considerando que sua atuação e suas decisões não têm nenhum caráter judicial ou arbitral, restringindo-se tão somente ao exame de questões que lhe uma consciência nacional em relação ao problema do meio ambiente, em face do que dispõe o art. 255, parágrafo 1°, inciso VI, da Constituição Federal; RESOLVE: Recomendar a anulação da licença expedida pela SEMACE, devendo ser sanadas as irregularidades que viciam o EIA/RIMA. Florianópolis, 28 de abril de 1993. Assinam: Herman Assis Baeta (Presidente), Christian Guy Caubet, Ela Wiecko (Relator), Zenon Simon, Magda Renner. 28.6 - Reflexões sobre a ementa e a sentença do Tribunal da Água Inicialmente, nos concentramos somente no resultado da Sentença em que o empreendimento, por unanimidade do Júri, composto por sete membros, foi condenado.
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Por diversas vezes lemos e relemos tal decisão, porque percebemos em suas entrelinhas que havia alguma observação mais sugestiva do que o resultado acima apresentado. Sentíamos baseados em nossa - ex e um objetivo maior do que o observado no resultado numérico de tão expressiva votação. Esta preocupação em tentar entender o que de maior se embutia neste documento se tornou obsessiva. Sentíamos que havia um fato mais relevante em tal Sentença! Qual seria este? Deixamos o tempo passar para que, sem a euforia da vitória em nossos sentimentos, pudéssemos entender melhor tal Ementa, com sua Decisão e Resolução. Nossa atitude se mostrou correta. Serenados os nossos ânimos, ao lermos, mais uma vez, tal Sentença, imediatamente se destacou o trecho revelador que procurávamos: “assinalo que os Conselheiros que nomea damente tem formação jurídica”, e continuando: “Ministério Público do Estado; Procuradoria da República, do Estado do Ceará e Ordem dos Advogados do Brasil (CE), votaram contra a aprovação do Estudo do Impacto Ambiental”. O julgamento não se limitou aos sete votos contra e zero a favor. É por demais evidente que o senhor Relator da matéria, Dr.Paulo , deixou absolutamente caracterizado perante a opinião pública presente e futura que as pessoas com formação jurídica na Reunião Pública que aprovou a construção deste açude (COEMA) no Ceará, votaram contra tal empreendimento. Salvaguardava, destarte, a Se, por um lado, nos alegra observar que as pessoas com formação jurídica se mostraram contrárias a este barramento, por outro lado, nos entristece, a atuação de alguns membros da classe de engenheiros com formação em Recursos Hídricos e Meio Ambiente que atuam em Fortaleza. É interessante observar que a Ciência Social se mostrou, no caso, muito mais racional e lógica do que a Ciência Exata, o que nos parece, à primeira vista, um paradoxo. Que contradição! Enquanto advogados (Ciência Jurídica e Social) votaram contra o Castanhão, engenheiros especializados em Recursos Hídricos (Ciência Exata), manipulando dados, sabidamente errados e inconsistentes, elaboraram um EIA/RIMA, tecnicamente errado; e
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também um“Estudos de Alternativas à Barragem do Castanhão”, para uma mesma Secretaria (SEMACE). Acabaram por emitir uma nota da ABRH/CEARÁ, publicada nos jornais de Fortaleza justamente na antevéspera da terceira e última Audiência Pública do COEMA sobre a viabilidade da construção dessa barragem (verCapítulo XXIV ). E tudo isso, em nome do Poder! Em assim sendo, hoje estamos absolutamente convencidos de que o resultado da última Audiência Pública do COEMA que aprovou o RIMA apresentado pela SEMACE não merece a menor credibilidade, pois atenta contra o ordenamento jurídico do nosso país. Como um geólogo, um hidrólogo, um agrônomo ou outra qualquer a Lei que normatiza o convívio social nele inserido, o ambiental? Se existe a obrigatoriedade legal (Direito Ambiental) de se estudarem alternativas que alcancem um mesmo objetivo a menor custo técnico, econômico, social e ambiental, por que não estudá-las e apresentá-las? Jamais, poderiam os ilustres Conselheiros votar a favor do EIA/RIMA do Açude Castanhão. Não só pelos erros técnicos absurdos nele contidos mas, sobretudo, pelos aspectos jurídicos envolvidos. Por nosso raciocínio lógico e racional, esta questão possui uma conotação muito mais grave, ou seja: A barragem atenta contra o “Império da Lei”. Humana , ao se contrapor à Lei 6803/80; 6938/81; a “Constituição do Brasil”, em seu inciso IV do parágrafo 1 ° do artigo 225°; o Decreto 88351/83; Decreto 99274/90; Resolução 001, de 23/01/86 do CONAMA - inciso I do artigo 5°, além dos incisos I e II do artigo 6° da referida Resolução; e Divina por Ele serão obrigados a se deslocar dos locais em que vivem para atender a objetivos inaceitáveis. Pela exposição dos fatos o leitor, agora, pode sentir as razões de nossa contra este fabuloso empreendimento.
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Como entender a submissão da Lei a pessoas ou grupos que detém o Poder? Como aceitar, na qualidade de cidadão, que o ordenamento jurídico Como explicar às gerações presentes e futuras o desrespeito às normas jurídicas que harmonizam, equilibram e sustentam a sociedade em que vivem ou viverão? Como e para quê existe o ordenamento jurídico, se este é totalmente ignorado por pessoas, principalmente por aqueles que possuem o Poder Decisório? O que é o Direito? O que representa a Justiça? Para que Advogados, Juízes Desembargadores, Ministros, Promotores e demais membros com formação jurídica, se não existe“O Império da Lei”? interesses pessoais, ao invés dos superiores interesses da coletividade e da Nação? Como entender e aceitar como normal, o fato de que em determi nada Audiência Pública que iria ou não aprovar o RIMA que embasava a construção de um empreendimento tecnicamente controvertido, de um Conselho formado por vinte pessoas,os três únicos integrantes, Membro do Ministério Público do Estado do Ceará, Membro da Procuradoria da República do Estado do Ceará e o Representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/CE), votaram contra o empreendimento, baseado nas Leis vigentes e que regulamentam o assunto? Como aceitar o fato de doze pessoas, dentre as vinte que constituíam tal Conselho, ter votado a favor do empreendimento, se estes não pos suíam o menor embasamento jurídico? Poder-se-ia admitir, racionalmente, nas circunstâncias envolvidas, o fato de que se houve uma maioria a favor deste RIMA, representa a ao arrepio da técnica e, sobretudo, da Lei? Uma eventual aceitação representaria prática democrática? É claro que não! A Lei existe para ser cumprida. Se ela não atender aos superiores interesses pessoais ou nacionais, que seja ela revogada por outra Lei. Porém, jamais seja ela
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descumprida. Caso contrário, a sociedade não estará protegida e am parada, pois estará vivenciando não um regime democrático, mas um autocrático ou anarquista. Permitimo-nos, embora sem formação jurídica, porém por admiração e profundo respeito ao maior jurisconsulto da história de nossa pátria, inclusive como nossa modesta homenagem a este ilustre brasileiro, transcrever, por oportuno, trecho deRuy Barbosa , de sua obra “Ora ção aos Moços” (Casa de Ruy Barbosa, 1956, pp 78-9), que explica a com formação jurídica que participaram da terceira e última Audiência Pública do COEMA e que votaram contra o RIMA, base de sustentação da SEMACE, para a realização da Barragem do Castanhão, com o aval da SRH/CE: Legalidade e liberdade são as tábuas de votação do advogado. Nelas se encerra, para ele, a síntese de todos os mandamentos. Não desertar a justiça, transfugir da legalidade para a violência, nem trocar a ordem pela anarquia. Não antepor os poderosos aos desvalidos, nem recusar patrocínio a estes contra aqueles. Não servir sem independência à Justiça, nem quebrar a verdade ante o poder. Não colaborar em perseguições ou atentados, nem pleitear pela iniquidade ou imoralidade. Não se subtrair à defesa de causas impopulares, nem à das perigosas, quando justas. Onde for apurável um grão, que seja de verdadeiro direito, não regatear ao atribulado o consolo do amparo judicial. Não proceder consultas, senão com imparcialidade real do juiz nas sentenças. Não fazer da banca balcão, ou da ciência mercatura. Não ser baixo com os grandes, nem arrogante com os miseráveis. Servir aos opulentos com altivez e aos indigentes com caridade. Amar a pátria, estremecer o próximo, guardar fé em Deus, na verdade e no bem. Se os três membros do COEMA que possuem formação jurídica, votaram, por unanimidade, contra o RIMA, apresentado pela SEMA CE (com o desnecessário, errado e inconsequente aval da SRH/CE), contrariando os pareceres técnicos de ilustres personalidades por ela a Presidenta deste Conselho deveria, de imediato, sustar os trabalhos, com base num único e simples argumento: Os votos a favor deste empreendimento contrariam dispositivos legais que regulamentam e normatizam o assunto.
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SEMACE) contratar técnicos para emitirem seus pareceres (que se pronunciaram contrários ao barramento) e subordiná-los a outro Órgão (SRH/CE)? Ora, se este Órgão (SRH/CE) possui o poder de analisar e emitir pareceres conclusivos e decisórios sobre determinados assuntos (no dinheiro dos cofres públicos cearenses para contratar técnicos dos mais renomados do país e simplesmente desconhecer seus pareceres? Por que o assunto sobre a construção desta extraordinária barragem, não foi, desde o seu início de responsabilidade exclusiva da SRH/CE, se foi ela que decidiu sobre a matéria desconhecendo os pareceres de dois ilustres técnicos nacionais, de fama internacional, especialmente contratados pela SEMACE para dar parecer sobre este assunto? Por que não foram levadas em consideração as normas jurídicas que disciplinam o assunto; e, dentre estas, aquelas que obrigam o estudo de alternativas que possam apresentar uma melhor diagnose sobre a problemática envolvida? Por que os votos dos membros dos Ministérios Públicos Estadual e Federal que se mostraram contrários a este barramento, cumprindo com suas obrigações de zelar pelo bem público, obedecidas as leis vigentes, não foram analisados e devidamente acatados na Reunião desta terceira e última Audiência Pública? Como entender o procedimento do mais elevado Órgão da Política Ambiental de nosso país (CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente), ao permitir a retirada, de sua pauta de trabalho, adredemente acordada, o assunto do Açude Castanhão pela intromissão indevida de autoridade cearense que, pela coação política, conseguiu seu intento de recolher tal assunto de sua pauta? Por que, até hoje, o CONAMA não se pronunciou sobre o assunto, conforme é de seu dever? Para que serve a Lei 6938/81; o Decreto 99274/90 e a Resolução 001/86 do CONAMA? Para que existe o CONAMA? Quem é responsável, pela proteção do meio ambiente em nosso país?
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28.7 - A tristeza e repúdio à omissão do CONAMA Tendo em vista a Ementa, a Decisão e a Resolução doTribunal da Água que condenou o Açude Castanhão por sete votos a zero,“Instituto o da Memória do povo Cearense - IMOPEC” e a “Associação dos Moradores de Jaguaribara” tentaram, por duas vezes, que o assunto “Castanhão” viesse constar da pauta do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). Tal Órgão, que normatiza a Política Ambien tal em nosso país, negou-se a considerá-lo naquele Colegiado. Este a não ser pela possível coerção política ditada pelo Poder que o move: o “Poder Econômico”. As duas entidades acima referidas (IMOPEC e Associação dos Moradores de Jaguaribara) distribuíram para a imprensa local o seguinte COMUNICADO: Após a realização do Tribunal da Água, em Florianópolis – Santa Cata rina, em abril de 1993, o caso da construção da Barragem do Castanhão, no município de Alto Santo, estado do Ceará, foi levado ao Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA. O representante da região Nordeste naquele colegiado, Francisco Soares, Presidente da Fundação Rio Parnaíba – FUR PA lutou para que, na reunião do dia 9 de outubro do corrente ano, o assunto constasse na pauta do CONAMA. A Associação dos Moradores de Jaguaribara solicitou ao CONAMA, através de um abaixo-assinado, enviado no dia 10 de janeiro de 1993, a anulação da licença de instalação da barragem e a realização de novos estudos que incluíssem as alternativas ao grande Castanhão, estudos que não foram feitos. No dia 9 de outubro, compareceram ao plenário daquele órgão, em Brasília, um representante da comunidade de Jaguaribara Bernadete (Irmã Neves) e um técnico especialista em barragens e recursos hídricos (engenheiro Cássio Borges). O pronunciamento foi interrompido de maneira intempestiva pelo Secretário de Desenvolvimento Urbano do Ceará, Dr. Adolfo Marinho, que impediu a realização de qualquer debate, sob a alegativa de que o CONAMA estava ferindo o espírito federativo e desrespeitando o governo do Ceará. O deputado Fábio Feldman, do PSDB de São Paulo, em solidariedade ao Secretário de Estado do Ceará,Adolfo Marinho, solicitou vistas ao processo, tendo a reunião prosseguindo sem a análise da questão. A inversão dos valores é notória Os maiores interessados no debate - do Cas tanhão, os moradores de Jaguaribara, que serão desalojados do município a ser
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inundado, não tiveram o direito de se pronunciar no plenário do CONAMA. São eles os que vêm sofrendo desrespeitos desde 1985, quando o anúncio dessa barragem foi feito pela primeira vez. A nota continua fazendo citação dos problemas existentes na con cepção e projeto da Barragem do Castanhão. Maiores detalhes sobre oTribunal da Águapode-se obter no“Insti tuto da Memória do povo Cearense - IMOPEC”, através do número EXTRA, de maio de 1993, do Boletim RAÍZES, editado pela Entidade. Antes de concluir este capítulo, devemos informar que, mais uma vez, o assunto Castanhão foi colocado na pauta da reunião do CONAMA, realizada em Brasília, no dia 09 de outubro de 1995, à qual comparece e o autor deste livro, repreram o engenheiro sentando oIMOPEC e a Associação dos Moradores de Jaguaribara. Após mais de trinta minutos de discussão entre os membros daquele Colegiado, em torno da permanência do tema Castanhão foi dado ao professor o tempo de cinco minutos, nada mais do que cinco minutos, para pronunciar-se, sem direito a que o assunto fosse discutido em plenário. E só: mais uma tentativa inútil! É assim dessa forma desrespeitosa e deselegante a um dos mais ilustres e conceituados engenheiros do Brasil, precursor da ciência hidrológica e do mei o ambi ente no nosso paí s, que se resol vem, lamentavelmente, as grandes questões nacionais. 28.8 - Conclusão Deixamos ao leitor a tarefa de concluir este capítulo, após sua leitura atenta, de modo a que bem possa caracterizar como se estabelece o Direito e a Justiça, em nosso país, e a necessidade de, como cidadão, lutar pela prevalência da Lei, como medida de autodefesa pessoal e da coletividade, contra o arbítrio da força e da opressão que esmaga,-im piedosamente, a liberdade.
XXIX O CASTANHÃO É CONDENADO PELA NATUREZA
29.1 - A descoberta do “Paleo-Canal”
A
no COEMA, iniciou-se um
contar com nossa atuação pessoal ininterrupta no afã de divulgar os erros, vícios e contradições do projeto, este foi alvo de críticas e preocupações por parte de inúmeros técnicos, algumas noticiadas pela imprensa. pelo COEMA, houve a condenação no Tribunal da Água. Por unanimidade! Conforme relato no capítulo precedente. Em sequência, principiou a manifestação da condenação pela Na tureza. Como prenúncio de ser imposta uma pena maior, que será o isto é, a irrigação de 43.000 hectares e a destinação de 10,5m³/s para o abastecimento de água da Região Metropolitana de Fortaleza, tiveram os executores do projeto que se defrontar com o problema do “paleo canal” que foi descoberto durante a escavação para as fundações da barragem, conforme por nós relatado noCapítulo XXX deste livro, quando tratamos da gravíssima questão sismológica na região da Barragem do Castanhão. A notícia da descoberta, divulgada pela imprensa em 12 de dezembro de 1996, foi seguida de várias outras, algumas por nós transcritas no referido Capítulo XXX deste livro.
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As implicações no custo e no cronograma dos serviços de construção da barragem foram, continuam e continuarão sendo vultosas, não se sabendo, até a presente data, o custo provável do empreendimento. Agora, o Castanhão volta a ser notícia na imprensa. E a problemática
29.2 - O Castanhão volta a ser notícia na imprensa Estamos escrevendo este capítulo no dia 10 de outubro de 1998. Nestes dois dias, os jornais de Fortaleza falam insistentemente na Barragem do Castanhão. O Diário do Nordeste , por exemplo, em manchete de primeira página, diz: “Castanhão para. Falta dinheiro” “Construtora já começa a demitir funcionários” . E prossegue: (...) “Tanto no DNOCS, como na Andrade Gutierrez negam a existência de problemas técnicos na obra. Entretanto, a CPT alerta que o desli um lago na margem esquerda da barragem, no leito do rio”. Enquanto isto, o Jornal O Povo, de 10 de outubro de 1998, destaca o seguinte título:“Castanhão para e gera desemprego”ao apresentar matéria cujos trechos mais sugestivos apresentamos a seguir: Até junho último, os 950 homens que trabalhavam na construção do Açude Castanhão não imaginavam que quatro meses depois estariam sem ocupação. (...) A previsão do engenheiro de Planejamento da Andrade Gutierrez, vigias. (...) O “paleo canal” (falha de 30 metros de profundidade na rocha em que a fundação da parede do açude está sendo erguida) está inundado. Os técnicos estavam trabalhando na área na cota de 15 metros abaixo do nível do Rio Jaguaribe. Com a paralisação das obras, foram desligadas três motobombas que aspiravam a água do local, e o nível d’água na falha voltou ao normal. (...) A barragem não está comprometida. Não há risco ou dano, garantiu o engenheiro de planejamento. 29.3 - Conclusão consubstanciando quatorze anos de luta contra os erros e omissões deste mal concebido projeto. Por exemplo, a “descoberta” do “paleo canal” poderia, perfeitamente, ter sido feita por ocasião dos estudos geotécnicos do local
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da barragem. O problema é que o plano de sondagem (perfuração que se falta de detalhamento, o que se constitui mais um erro imperdoável do projeto. Daí caber outra indagação: Seria este erro mais um fato doloso? A fundação máxima, cuja previsão era de 26,00 metros de profundidade, na realidade. atingiu 36,00 metros, exigindo vários cuidados de engenharia para deter o “rio subterrâneo” que passava por baixo da barragem, no trecho já construído, correspondente ao “paleo canal”. A nós e às autoridades em geologia que se manifestaram, pública e expressamente com relação às suas fundadas preocupações quanto ao local do barramento, os fatos que estão ocorrendo não trazem nenhuma surpresa. E, as condenações da obra já havidas, outras, de várias naturezas, certamente virão se juntar. É apenas uma questão de tempo.
Deixamos ao leitor formar juízo próprio sobre este capítulo.
NOTA DA SE GUNDA EDIÇÃO
Capítulo XXIV, item 3 ‘Qual o nível de detalhamento da prospecção geológica situa da numa região extremamente afetada por sismos, nivel este que detectou um rio subterrâneo debaixo do Rio Jaguaribe?’. Maria Zita Timbó
nota da segunda edição
-
Sim-
XXX A QUESTÃO SISMOLÓGICA NA REGIÃO DA BARRAGEM DO CASTANHÃO
30.1 - Geólogos opinam sobre a região do Açude Castanhão 1 - Geólogo José Augusto Mioto
N° 30, datado de 13/07/92, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A. - IPT, especialmente contratado pela SE MACE para oferecer parecer sobre os riscos de ocorrência sísmica na região onde vai ser construída a Barragem do Castanhão. “na área de Palhano, desde outubro de 1988, foram registrados cerca de UFRN”, referindo-se aos dados colhidos pela Estação Sismológica instalada na região da barragem, em 1988, pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN. “Em se tratando de controle da sismocidade, os trabalhos em desenvolvimento pela vêm UFRN do Castanhão”.No mesmo relatório, o IPT “revela que a UFRN não tem familiaridade com a questão”.
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Fugindo à nossa especialidade, vamos resgatar determinadas discus sões que no início da década de 90 sustentaram uma acirrada polêmica a respeito dos impactos sismológicos sobre a Barragem do Castanhão. Para isso, vamos reproduzir duas matérias publicadas nos jornais de Fortaleza que dão bem uma ideia ao leitor do que foram as preocupantes discussões sobre este tema, que envolveram toda a comunidade técnica do nosso estado. Inicialmente, transcrevemos uma reportagem publicada no Diário do Nordeste , do dia 04 de dezembro de 1990, sob o título“Parecer sobre “Existem muitas imperfeições na análise de sismo e erros conceituais no projeto do Açude Castanhão . Este é o parecer do geólogo José Augusto Mioto, do Instituto de Pesquisa Tecnológica de São Paulo - IPT, apresentado durante a Audiência Pública para análise do Relatório de Impacto Ambiental - RIMA do açude público Castanhão, realizada ontem à tarde no auditório da Superintendência Estadual do Meio Ambiente - SEMACE (...). (...) SegundoJosé Augusto Mioto , a análise mostra que o sismo induzido (atividade sísmica, tremores de terra que começam a aparecer após a construção do reservatório) foi calculado sem critérios, por isso é impossível dizer se a construção da barragem pode provocar ou não algum tipo de sismo”. na área do projeto do Açude Castanhão foi publicada no Jornal O Povo, do dia 05 de dezembro de 1990, sob o título:“CASTANHÃO - Geó logo vê imperfeições na previsão de tremores”. Diz a referida matéria: “Na forma como foi elaborado, é impossível prever tremores. Augusto Mioto lembrou que, em reservatórios de grande porte, a sismocidade tem de ser bem calculada”[o grifo é nosso]. Em continuação, diz o referido jornal: “A construção da Barragem do Castanhão foi motivo de audiência pública, convocada para ontem à tarde pela SEMACE. (...) A participação do geólogo José Augusto Mioto, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, causou polêmica na plateia, quando chamou atenção para as questões técnicas relativas à sismocidade (intensidade de tremor de terra na região, devido à construção do açude). O geólogo paulista fez críticas ao Relatório de Impacto do Meio Ambiente (RIMA) apresentado pelo DNOCS, órgão responsável pela construção da obra. (...) Ele explicou que nas construções de reservatórios de grande porte, - a sismo cidade tem que ser muito bem calculada, para que não haja tremores na região”.
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2 - Geólogo Carlos Marcelo Lobo Maranhão Como dissemos acima, não somos especialistas da área de geologia, mas após dois anos de discussão sobre a questão da sismocidade que pode ser induzida pela Barragem do Castanhão, tivemos publicado no Diário do Nordesteuma carta de autoria do Professor Adjunto do Departamento de Geologia da UFC, Carlos Marcelo Lobo Maranhão , a sobre este inquietante problema. A referida carta foi publicada, no dia 03 de janeiro 1993, sob o título:“CASTANHÃO”: Hoje li as notícias nos jornais sobre a aprovação da construção-da Bar ragem do Castanhão. Eu não quero me pronunciar nem contra e nem a favor da construção desta obra grandiosa, até mesmo porque não estou devidamente informado sobre a problemática que cerca a questão. Gostaria de me referir unicamente ao aspecto do risco de abalos sísmicos. A este respeito tenho me pronunciado por diversas ocasiões através dos meios de comunicação de Fortaleza e sempre no sentido de alertar a população so bre o risco de um abalo sísmico de proporções consideráveis tendo como causa principal a Barragem do Castanhão. Muito embora abalos sísmicos sejam acidentes da natureza, a ciência, rência futura de tremores de terra, após o preenchimento deste reservatório, é perfeitamente previsível. Minha preocupação é com a população que habita a jusante da barragem porque nós vivemos em um país cuja pior característica é a da impunidade e se, por ventura, acontecer uma catástrofe, quero deixar registrado aqui que não será acidente e sim negligência [o grifo é nosso]. ser construída e sim que a obra de engenharia deve prever a ocorrência de um sismo, pelo menos de intensidade 5,5 na escala Richter. Mas isto, é claro, aumentará sobremaneira os custos da obra. sidade razoável, provocado por esta obra, embora não seja inexorável, possui uma probabilidade bastante alta de ocorrer. Os motivos que me levam a tal 1. O RIMA (Relatório de Impacto ao Meio Ambiente) do Castanhão não
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2. São conhecidos diversos casos de grandes barragens construídas em ou tros países que provocaram abalos sísmicos de intensidade considerável; 3. A região aonde vai ser construída a barragem é por demais conhecida como uma região sísmica; 4. O Castanhão vai ser construído em um local que está alinhado com a conhecida Falha de Palhano que recentemente provocou aquela tão conhecida série de terremotos nos últimos anos; 5. O Castanhão vai ser construído próximo à Falha do Rio Jaguaribe uma conhecida zona de fraqueza da crosta terrestre e que foi - respon sável por diversos abalos sísmicos na região; 6. O Castanhão vai acrescentar, em curto período de tempo, uma - sobre carga de bilhões de toneladas às rochas da área. Ora, não é necessário ser um gênio da sismologia para prever que haverá movimentação sísmica devido ao acomodamento de blocos rochosos causado pelo enorme peso do pacote de água que será acumulada no Castanhão. O que não se pode prever com segurança é a intensidade que estes abalos alcançarão. Pelo exposto, gostaria de aconselhar os prefeitos dos municípios que possuem habitantes a jusante desta obra que contratem um engenheiro capaz de realizar uma auditoria no projeto de engenharia para saber se esta barragem está dimensionada para suportar um abalo sísmico -de in tensidade, pelo menos 5,5 na escala Richter. Entendo que este é o dever de quem foi eleito para zelar, entre outras coisas, pela segurança da população [o grifo é nosso]. Com esse relato e advertência me sinto com o dever cumprido de geólogo que compreende os riscos envolvidos nesta construção e de cidadão preocupado com os destinos de seus conterrâneos. 30.2 - Nossa manifestação Para tornar o leitor inteirado dos abalos sísmicos (também conhecidos como tremores de terra) que poderão ser provocados pelo peso da água (coluna hidrostática) que será acumulada no Castanhão (cota 106m), vamos reproduzir dois artigos de nossa autoria, publicados no Jornal O Povo, de Fortaleza: “A Falha do Castanhão”(04/02/97) Fomos procurados por um jornalista dessa empresa para opinarmos sobre o que havia sido noticiado por este jornal, no dia 12 de dezembro de 1996, na coluna Cidadania, sob o título “Castanhão faz Água”, no qual foi dito que fora
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“descoberto um rio subterrâneo a uma profundidade de mais de 30 metros, du rante a escavação para as fundações da barragem”. A mesma matéria acrescenta A expressão“descoberto um rio subterrâneo” não é adequada visto que a existência de água subterrânea no Baixo Jaguaribe é reconhecidamente comprovada. O seu “desconhecimento” decorre do fato de nós técnicos darmos fora do alcance dos nossos olhos. Uma das diferenças entre a água subterrânea faz o seu deslocamento a uma velocidade de metros por segundo. A construção de uma barragem impede a passagem da água do subsolo através da fundação para jusante. É uma estrutura impermeável. Com isso, Jaguaribe perderá sua principal fonte de alimentação e deverá depletir ou secar. Em consequência, deverá ocorrer a intrusão da água do mar, salinizando os outroras férteis solos daquela região. Prevendo um desastre ecológico no Baixo Jaguaribe, autoridades como os professores e Aristides de Almeida Rocha , contratados pelo Governo do Estado do Ceará, em setembro de 1992, advertiram em seus respectivos pareceres que no caso do Açude Castanhão não há nenhum estudo ou indicações com o que poderá ocorrer a jusante da futura barragem. Dizer que o lençol freático do Baixo Jaguaribe vai ser realimentado em livre pela parte mais funda do vale e, depois, sua alta velocidade (metros por segundo) imporá a que grande parte da água chegará ao mar antes de se “Castanhão: novas contradições” (05/11/97) No dia 12 de dezembro de 1996, na coluna “Cidadania” deste jornal, sob o título“Castanhão faz água”foi dito que fora “descoberto um rio subter râneo a uma profundidade de mais de 30 metros, durante a escavação para tentam esgotar a água”. Este jornal, em matéria do dia 15 de janeiro deste ano, sob o título “Falha em rocha atrasa obras do Castanhão”, por informação da engenheira Maria Zita Timbó, do DNOCS, dizia o seguinte: “Para contornar o problema que impedia a construção da parede da margem direita da barragem, o DNOCS ergueu um muro de concreto que aumentou
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o custo da obra – orçada em R$ 81.636.000,00 – em torno de 1%. A solução foi apontada por engenheiros brasileiros‘Bureau e do of Reclamation’dos do muro de concreto construído, pelas quais pode-se avaliar a grandiosidade das providências adotadas. Quase um ano depois, no programa Cena Pública, da TVC, no último dia 14, o Secretário Hypérides Macedo, contrariando as informações que se tinha sobre o assunto, disse: “Naturalmente, todo o projeto que se encontra na fase de fundação tem surpresas. A geologia dos terrenos é invisível. Encontrou-se um paleo-canal que está sendo preenchido... Um canal de formação antiga. Ali passou uma cachoeira há muitos anos... existe fratura e a fundação foi mais profunda do que a que se pensava. O DNOCS está contratando um painel de consultores a questão da areia, da galeria e do enchimento do canal”. O fato trazido à tona pelo ilustre Secretário nos surpreendeu, pois pelas vido. Em vários artigos que publicamos na imprensa, no período de 1986 a 1993, sempre alertávamos que aquela seção do Rio Jaguaribe era inadequada para a construção de barragem e que a fundação da mesma poderia ter de 26 a 30 metros de profundidade. Agora, quem está dizendo que o problema não Será que ele está mal informado sobre uma obra que, já admitem, vai custar mais de R$ 200 milhões? 30.3 - Conclusão •
Os fatos relatados neste capítulo mostram que, quando há-in teresses predominantes de pessoas ou grupos em determinados assuntos públicos, nada impede que aqueles objetivos, obsessi vamente perseguidos, sejam alcançados, mesmo que técnica e preocupação com o número de ocorrências de tremores de terra, cerca de 30.000 na região do Castanhão que foram detectados no período de 1988 a 1992, conforme relatório do IPT de São Paulo.
• onde um de seus problemas mais sérios é a formação geológica do terreno que vai suportar um peso d’água descomunal. O
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mapeamento geológico é primordial na construção de um -bar ramento d’água. Quem pagará pelos danos materiais e humanos que poderão (?) ocorrer? Infelizmente, nossas autoridades já se acostumaram com a impunidade. Ninguém é responsável, a não ser “o povo”que, em última instância, é responsável por tudo de errado que acontece no país.
Mais uma vez deixamos as conclusões por conta do leitor, sem antes geólogosJosé Augusto Mioto , do IPT de São Paulo e Carlos Marcelo Lobo Maranhão , Professor Adjunto do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Ceará - UFC. Rogamos ao leitor que releia as observações deste último geólogo, que tomamos a liberdade de grifar. Rogamos, também, que se detenha nos seis itens por ele enumerados moral.
10ª PARTE: SÍNTESE DA ARGUMENTAÇÃO CONTRÁRIA AO PROJETO
CAPÍTULO XXXI Castanhão: seus erros e omissões
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XXXI CASTANHÃO: SEUS ERROS E OMISSÕES
31.1 - Síntese da problemática do Castanhão
E
Por constituírem uma verdadeira sinopse das questões por nós nele abordadas e- tra
o questionamento ao Castanhão na cota 100m não constitui posição isolada nossa, nem mesmo de apenas uma elite técnica e cultural cearense, ou de pessoas envolvidas funcional e/ou socialmente na problemática regional, neste capítulo, transcrevemos, por sua extraordinária substância, três artigos de autoria do engenheiro civil e eletrotécnico professor Jorge Staico, publicados no JornalDiário do Nordeste , nos dias 25, 26 e 27 de janeiro de 1996, em suapágina 2, do 1º Caderno, na coluna Opinião. analisar e criticar aspectos técnicos, econômicos, ambientais e sociais concernentes ao Castanhão. Nos três artigos que vamos transcrever, seu autor, radicado no sudeste brasileiro e que atuou de forma marcante em todo o território nacional, conseguiu sintetizar todos os principais aspectos por nós detalhados na sequência dos capítulos deste livro. São eles: Castanhão: Projeto sem resposta (por quê?) , Castanhão: Para que resposta (para que?) e Castanhão: Como torná-lo aceitável . Cabe-nos, portanto, apresentar o autor dos três últimos artigos deste livro que, atendendo a pedido nosso, nos concedeu a honra de prefaciá-lo.
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31.2 - Breve apresentação do professor Jorge Staico Técnico de renome em nosso país, especialmente em nossa região, onde, Natural da cidade do Recife (PE) veio a se formar em Engenharia Civil e Eletrotécnica, e também em Farmácia. A seguir, foi nomeado para fazer parte do quadro de engenheiros do antigo Departamento Nacional éticos etc., imediatamente se distinguiu nesse Departamento que foi por ele representado, simultaneamente, com excepcional brilhantismo, no São Francisco (CEEIVASF); no Comitê Executivo de Estudos Integrados São Paulo e Minas Gerais; no Comitê Executivo de Estudos Integrados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro; e no Plano Diretor do Vale do Rio São Francisco (PLANVASF). Além de ser Gerente de Projetos Especiais do DNOS e de representar essa Autarquia Federal nos “Comitês” e “Plano Diretor” citados acima, o Eng. Jorge Staico, foi ainda Coordenador do Grupo de Obras e Redator do Relatório Final da Comissão Interministerial de Estudos para Controle de Enchentes do Rio São Francisco; Coordenador dos Trabalhos de Avaliação Preliminar do Uso Integrado dos Recursos Hídricos do Vale do Rio São Francisco; Membro do Conselho Diretor do S.C. de Planejamento do Vale do São Francisco; Relator do Grupo de Trabalho que avaliou as causas e efeitos das enchentes do Rio São Francisco formadas a jusante da Barragem de Sobradinho, fornecendo subsídios para ações preventivas a esta relacionadas; Coordenador dos Subgrupos de Obras e de Relocação da Estrada de Ferro Vitória-Minas da Cia. Vale do Rio Doce e Redator do Relatório do Grupo Interministerial para Prevenção e Controle das Enchentes do Rio Doce em Minas Gerais e no Espírito Santo. ração de energia hidrelétrica e também Membro Efetivo da Comissão Téc nica de Uso Múltiplo de Reservatórios (CTUM) do Comitê Brasileiro de Grandes Barragens. Foi Secretário de Obras e Urbanismo, da cidade de Juiz de Fora (MG), quando era Prefeito desta o Presidente Itamar Franco, nela rea-
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lizando obras estruturais que alteraram profundamente o quadro urbano e embasaram o surto de progresso hoje lá vivido. Foi, também, professor da Escola de Engenharia e do Colégio Técnico Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora. Possui diversos trabalhos técnicos publicados, inclusive livro adotado no Instituto de Geociências da UFJF do qual são extraídas questões aplicadas nos concursos vestibulares daquela Universidade. Proferiu, em diversos estados, conferências técnicas e palestras sobre os temas: hidrologia e hidráulica de canais, saneamento geral e uso integrado de recursos hídricos. Participou de Congressos e Simpósios, apresentando trabalhos. O brilhantismo com que participou de inúmeros projetos e obras públicas e particulares de grande repercussão espalhadas pelo país,-con templando mais de uma centena de municípios só em Minas Gerais, fez com que fosse ainda lembrado, quase dez anos após aposentado e, em setembro de 1998, homenageado com a outorga da comenda “Terceiro Milênio” e arrolado como “Expressão Viva de Minas”, “por se destacar dentre os diferentes segmentos sociais, econômicos, empresariais e- po líticos deste estado” ( JornalTribuna de Minas, 17/09/98). Paraninfou diversas turmas em vários estabelecimentos de ensino e foi Patrono dos formandos de todos os cursos do CTU da UFJF (Uni versidade Federal de Juiz de Fora) por ocasião da primeira formatura daquela Instituição. centena de cidades espalhadas pelo território nacional.
Com a apresentação devida, passamos a cumprir o exposto nos primeiros parágrafos deste capítulo. 31.3 - Castanhão: erros e omissões Por se constituir tema estreitamente relacionado com os três artigos, a seguir transcritos, de autoria do eminente engenheiro Jorge Staico, permita-nos o leitor transcrever o artigoCastanhão: Erros e omissões , publicado no JornalTribuna do Cearádo dia 25 de junho de 1995:
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Após o sinal verde dado pelo governador Tasso Jereissati, a Barragem do Castanhão volta a ser discutida em todas as rodas quando o tema -é o apro veitamento dos recursos hídricos do estado do Ceará. Como sempre acontece megabarragem “será a redenção” do nosso estado: “é uma reivindicação de 84 anos do pov o cear ense. . . ”. Para i ní ci o de argumentação, a i dei a da bar ragem surgiu no ano de 1985, não pelo DNOCS, mas pelo DNOS, que foi extinto no início de 1990, pelo então Presidente Collor de Mello. Está aí desfeita a primeira inverdade sobre esta polêmica obra de engenharia, com todo o respeito completa este ano 10 anos, desde quando foi concebido nos escritórios do DNOS, no Rio de Janeiro. Em entrevistas e artigos anteriores, publicados por este esclarecido Jornal, mostramos que no projeto da Barragem do Castanhão existem falhas e omissões
absoluta convicção de que estamos prestando um grande serviço à sociedade cearense e, em especial, às populações que vivem no Vale do Rio Jaguaribe. Pelo menos, é este o nosso único propósito, como técnico e cidadão.. Aliás, essas denúncias já havíamos feito por ocasião do “Seminário sobre Recursos Hídricos do Nordeste”, patrocinado pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia - CREA, realizado no Auditório Castelo Branco da UFC, no período de 14 a 16 de setembro de 1992 e, diga-se de passagem, não fomos contestados. Mas, qual dessas denúncias, acima referidas, foi a mais grave? Foram várias e dentre elas um erro de 33,36% na avaliação da área de sua bacia hi dráuli ca. N as décadas de1960 e1970, quandotodos os projetos debar ragem do Nordeste eram concentrados no Serviço de Estudos do DNOCS, em Recife admissível era de 3%. E por termos encontrado tal erro, sofremos muitas retaliações, acreditem. Hoje, improvisa-se tudo, ou quase tudo, e aqui mesmo no Ceará são muitos os exemplos deploráveis dessa forma imprevidente de se faz er obras deengenhar i a. E steer roi nacei tável na av ali açãoda área da baci a hidráulica do Açude Castanhão foi, contudo, superado, em gravidade, pelo estudo hidrológico em não considerar a evaporação real de 2.200 milímetros, mas somente 1.700 milímetros. É como se nos meses de novembro e dezembro
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(e parte de outubro) não existissem (pasmem!) evaporação nos espelhos d’água nos açudes do Ceará. Além dos fatos acima citados, também deve ser lembrado neste pequeno espaço de jornal que a Barragem do Castanhão está superdimensionado e que de 4,4 bilhões de 3mna sua cota de regularização de vazões, isto é, a cota 3 100m (a barragem foi projetada para 6,7 bilhões de demacumulação na cota 106m). Na realidade, se forem considerados todos os açudes existentes e previstos, com suas dimensões creditadas pelo DNOCS e SUDENE nas décadas de 1960 e 1970, sobrariam para o Açude Castanhão algo em torno de 700 milhões de 3mde acumulação de água. Com esta capacidade, a área inundada 2 2 (bacia hidráulica) seria de 170 km , contra os 650 km do projeto atual (6,7 3 bilhões de m ), reduzindo, substancialmente, os impactos ambientais, inclusive que será destruída numa extensão aproximada de 70 quilômetros. 31.4 - Castanhão: projeto sem resposta (por quê?) Porque se insiste em construir a Barragem do Castanhão com base no projeto original (1985), cujos benefícios já se demonstraram superdimensionados ou extemporâneos, e cuja elaboração não obedeceu aos conceitos e princípios hodiernamente cada vez mais adotados em todo o globo terrestre e, também, às conclusões e recomendações dos Comitês Executivos de Estudos Integrados de
longo e exaustivo pioneiro trabalho eclético da Comissão Técnica de Barragens e Reservatórios de Uso Múltiplo do Comitê Brasileiro de Grandes Barragens? Por que se ignoram vantajosas alternativas de aproveitamento dos recursos hídricos do Vale do Jaguaribe? Por que não se dá atenção à resistência oferecida há mais de dez anos pelas populações diretamente atingidas e por alguns dos mais ilustres mestres da engenharia hidráulica e hidrológica brasileira, internacionalmente renomados e reconhecidos como as maiores autoridades em recursos hídricos e, também, por expoentes pátrios da nova e fundamental ciência que é a ecologia? Por que não são dadas respostas convincentes às dúvidas e questões de ordem técnica, social e cultural já levantadas e que são, independentemente de seu domicílio, subscritas por todos outros, envolvidos, inclusive-pela una
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nimidade dos jurados que compuseram Tribunal o da Água, quando reunido em 1993 na cidade de Florianópolis? dos e incompatíveis com a realidade climático-geológica regional, tiveram substancial redução em alguns dos seus mais importantes valores e foram capacidade inicial de 6,7 para menos de 4, 0 bilhões de metros cúbicos de água acumulada, implicando, logicamente, num decorrente abaixamento do nível do reservatório, por que não reformular de vez a estratégia de armazenamento e distribuição regionais dos recursos hídricos de superfície, abandonando,
Por que não introduzir, também, a mudança racional de limitar em 80m a cota de operação do reservatório (1,2 bilhão de metros cúbicos de água acumulada), eliminando de uma vez por todas, seus aspectos negativos e, também, os preponderantes custos indiretos (expropriações, relocações viá rias e de redes elétricas, construção de nova sede urbana), implantar não obra inserida no contexto de um sistema de ampla distribuição espacial de benefícios imediatos, gerados por diversos reservatórios de porte médio de localização e operação integrada? [o grifo é nosso]. 31.5 - Castanhão: para que resposta (para que?) Não bastam as mudanças anunciadas na imprensa local, todas comprovando o absurdo superdimensionamento inicial da Barragem do Castanhão e que, procedência do permanente questionamento arguido contra o projeto original desde quando tornado público no ano de 1985. Ainda que traduzam necessário avanço e, por isso, sejam bem-vistas e aplaudidas por todos envolvidos ou interessados num bom emprego do dinheiro público, enquanto não houver convincentes respostas por aos quê?” “ por nós anteriormente apresentados à guisa de sumário das dúvidas e questões já publicamente levantadas, perdurara na população a suspeita de existirem indesejáveis objetivos econômicos e políticos norteando a postura até aqui
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adotada pelas esferas técnicas e administrativas governamentais. Estas, ao projeto, numa indisfarçável busca de alternativas exclusivamente para sua execução ao invés de recorrer a alternativas para atendimento otimizado da demanda hídrica inerente a um desenvolvimento regional integrado. Diante desses fatos, o que se percebe é um autoritarismo incompatível com os ares que se deve respirar numa democracia e numa época em que se alardeia ter sido, novamente, desfraldada a bandeira da moralidade e seriedade administrativa. É imprescindível a divulgação e comprovação de que haverá água su e que, apesar da extrema irregularidade da pluviosidade regional e do baixo rendimento hidráulico da bacia - hi 50 anos, intervalos de 72% do tempo sem sangrar, nem 5 anos de- reser vatório contínua e tecnicamente seco, nem se lamentará o elevado índice evaporimétrico regional provocando, anualmente, a perda de um volume equivalente ao de um açude Banabuiú [o grifo é nosso]. Também é fundamental que seja demonstrado que, apesar da drástica redução em seus objetivos iniciais (irrigação de 75.000 hectares na- Chapa da do Apodi), de o custo dever ser onerado pela consideração da segurança contra a ocorrência de sismo e a comparação com a alternativa oferecida pela construção de outros reservatórios no vale do Rio Jaguaribe, o projeto ainda apresenta uma relação benefício-custo admissível. Isto se não se levar em conta, em todas as alternativas consideradas, o inestimável custo social, em seus múltiplos aspectos, monetariamente intraduzíveis. Comentaremos a seguir o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e- o res pectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA). 31.6 - Castanhão: como torná-lo aceitável O Estudo do Impacto Ambiental (EIA) e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) foram introduzidos no Brasil pela Lei 6803/80, considerados instrumentos de Política Nacional do Meio Ambiente Leipela 6938/81 e “constitucionalizados” pelo inciso IV do parágrafo 1° do art. 225, de nossa vigente Carta Magna , aqui transcrito:“exigir, na forma da lei, para degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade” (os grifos são nossos).
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A regulamentação inicial do EIA se deu pelo Decreto 88351/83e, poste riormente, pelo Decreto 99274/90, pela ainda vigenteResolução 001, de 23 de janeiro de 1986 , do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). É sabido que o EIA/RIMA elaborado para o projeto originalmente - pro posto para a construção da Barragem do Castanhão limitou-se a apreciar seus impactos físicos próprios, descumprindo o inciso I do art. 5 da Resolução CONAMA 001/86: “contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização do projeto, confrontando-as com a hipótese de não execução do projeto”[o grifo é nosso]. Mesmo a posterior complementação da documen tação exigida apresenta uma análise apenas parcial, onde o diagnóstico sobre o meio sócioeconômico não levou em conta os impactos negativos, de forma explícita, sobre a principal comunidade atingida, a cidade de Jaguaribara e municípios circunvizinhos. E a exigência da avaliação dos impactos positivos e negativos, não só do projeto, mas de suas alternativas, encontra-se nos incisos I e II do art. 6 da Resolução CONAMA 001/86. Agora, em face das inúmeras alterações já impostas ao projeto -e seus ob jetivos e das fundadas críticas desfavoráveis ao mesmo, necessário se faz e se espera, como única forma de fazer com que a sociedade diretamente atingida e a regionalmente interessada, e também a de toda a Nação, aceitem e até passem a apoiar a obra, é um novo completo EIA/RIMA, a ser elaborado respeitando integralmente as normas que disciplinam a matéria,- impar cialmente, sem conclusão previamente estabelecida, contemplando todas as alternativas - especialmente a do reservatório na cota 80 – e apontando entre todas as demais pertinentes ao caso, as análises dos efeitos da fundação Baixo Jaguaribe, da salinização das melhores terras agricultáveis do Ceará, do acúmulo de dejetos sanitários e industriais a jusante da barragem por acomodação de blocos rochosos em decorrência do peso da água acumulada numa região por demais conhecida como sísmica. Sem as providências acima é inevitável que a oposição ao projeto continue e se transforme em clamor público supraregional, como última forma extra judicial de despertar a consciência e responsabilidades daque les que, no exercício de cargos funcionais ou eletivos, devem sempre agir em consonância com os superiores interesses da população em geral e com
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rigoroso zelo no gasto do dinheiro público, pois a honestidade devida na administração da coisa pública não se traduz em apenas não se apropriar ou desviar indevidamente dinheiro, mas também, fundamentalmente, em [o grifo é nosso]. 31.7 - Conclusão Ao leitor, deixamos a fácil tarefa de emitir, face ao exposto, suas pró prias conclusões, chamando sua atenção, mais uma vez, para a questão levantada pelo engenheiro Jorge Staico, no seu segundo artigo, quanto à necessária demonstração de que “o projeto ainda apresenta uma relação custo-benefício admissível” em face do considerável aumento dos custos e da drástica redução dos seus benefícios, inicialmente previstos.
11ª PARTE: CONCLUSÃO
CAPÍTULO XXXII Conclusão final do autor sobre a Barragem do Castanhão
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XXXII CONCLUSÃO FINAL DO AUTOR SOBRE A BARRAGEM DO CASTANHÃO
32.1 - O melancólico comportamento das entidades ambientais
E
relatamos os fatos de modo imparcial deixando ao leitor a tarefa de emitir sua própria conclusão sobre o assunto nele tratado.
que julgamos, pela evidência dos acontecimentos, ser absolutamente concordante com a do leitor, ou seja: O EIA/RIMA do Açude do Castanhão aprovado pela SRH/CE, mente contratados pela SEMACE, é absolutamente errado sob a ótica: a) técnica; b) econômica; c) social; d) ambiental; e e) jurídica. Enfatizamos que bastaria um só item, dentre os cinco expostos acima, ser considerado errado, para inviabilizar o empreendimento. Não concordamos, nem aceitamos a passividade política do CONAMA quanto ao tratamento por ele dispensado à matéria. Foram
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agredidos a Lei, a Técnica, a Economia e o Meio Ambiente, além de deslocar-se de seu “habitat”, onde estão contidas suas melhores tradições e culturas, por imposição e força exercidas pelas autoridades legalmente constituídas, as quais deveriam protegê-las e nunca desampará-las. O melancó1ico e decepcionante comportamento da maioria dos Conselheiros presentes no plenário do CONAMA, órgão máximo da Política Ambiental em nosso país, não só mostrou total descaso pelo povo cearense, como àEngenharia Nacionalque, pela inconsequência desses senhores favoráveis a este megabarramento, será, seguramente, objeto de ridicularia perante o mundo. Graças à extremada gestão de um pequeno número de Conselheiros, pode o professor , em apenas cinco minutos que lhe foram concedidos, apresentar, no plenário do CONAMA, argumentos a uma plateia composta por Conselheiros, em sua grande maioria, -ab solutamente desinteressada e omissa. Abrimos espaço para agradecer a atenção dedicada por pequeno, mas expressivo número de Conselheiros mente discutido, o que demonstra que ainda existem pessoas íntegras e responsáveis em nosso país. Outra evidência que nos mostra que o Açude Castanhão já era objeto de uma decisão política pode ser, bem caracterizada num fato extremamente sugestivo: em nenhum momento, os professores philo B. Ottoni Netto e Aristides de Almeida Rocha foram convidados a pronunciar palestras para, publicamente, expor seus pontos de vista contrários a tal barramento. O debate com a comunidade técnica cearense seria extremamente válido e oportuno. É assim que acontece em países sérios. Entretanto, nenhum Órgão público (SEMACE, SRH/ CE, SDU/CE, CONAMA, COEMA etc.) como nenhuma associação privada voltada à engenharia (ABRH/CE - Associação dos Engenheiros Agrônomos - CREA/CE) como, ainda organismos federais, tais como o DNOCS, o “Curso de Mestrado em Recursos Hídricos” da UFC, ou entidades de classe do Ceará (FACIC, CDL, Associação Comercial etc.), se dignaram convidar para ouvir os ilustres Consultores, que emitiram pareceres contrários a tal empreendimento, possibilitando uma melhor diagnose desse empreendimento.
Conclusão
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A bem da verdade, registramos na oportunidade, que o professor foi convidado, por deputados estaduais oposicionistas, a pronunciar, na Assembleia Legislativa cearense, uma palestra sobre este assunto. O referido professor, atendendo a este único convite honroso, veio a pronunciar, no recinto citado, em julho/95, uma palestra de título:“Considerações mais sugestivas sobre a Barragem do Castanhão na cota l00m”. Não somos contrários a tal barramento desde que enquadrado nos padrões técnicos recomendados, ou seja, fazendo parte integrante de um planejamento global atendendo a uma melhor disposição espacial capaz de, com menores investimentos e, consequentemente, a menores custos ambientais, propiciar resultados muito mais vantajosos ao nosso povo já tão sofrido. O que ansiamos não é fruto de possíveis vaidades ou outros nossa posição técnica, destituída de qualquer parcela de interesse a não En genharia Nacional . Os nossos reiterados e sucessivos posicionamentos assumidos publicamente, quer nos artigos que escrevemos para periódicos cearenses, quer em programas radiofônicos e televisados levados ao ar, em nosso Ceará; ou ainda, por nossa presença constante, junto às populações carentes a serem deslocadas, em lugares seletos, como no julgamento do EIA/ RIMA desse açude no Tribunal da Água, em Florianópolis (SC), no Plenário do CONAMA, na Assembleia Legislativa do Ceará etc. foram absolutamente coerentes e convergentes para a defesaEngeda nharia Nacionale da população do estado do Ceará. A razão fundamental que nos levou a escrever este livro foi marcar não só nosso posicionamento, como o de outros ilustres nomes que se mostraram contrários à construção deste açude nas condições impostas pelo Poder público, mas, sobretudo, para deixar caracterizado, perante a sociedade cearense e brasileira, que, embora em menor número, existem pessoas honestas e técnicos capazes em nosso país que se entregam à consecução de ideais elevados, puros e nobres. Por esta razão, nos enche de profundo respeito à atitude límpida e altiva dos jurados que constituíram oTribunal da Água, enquanto nos causa repulsa, anota da ABRH/CE, explicável, tão somente, pela possível -
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ros, os quais, dois dias após a publicação dessa nota, paga com os parcos recursos (?) dessa Associação, iriam se reunir na terceira e derradeira das Audiências Públicas, que aprovaria ou não o EIA/RIMA apresentado pelo DNOCS à SEMACE, o que, de fato, aconteceu, lastimavelmente, graças à aprovação da SRH/CE, que também aprovou o parecer de três professores do Curso de Mestrado em Recursos Hídricos da UFC. Não e crível que, na defesa do DNOCS, no Tribunal da Água(ver subitem 28.4, Capítulo XXXI), o engenheiroJoaquim Guedes C. Gondim Filho tenha imputado, perante aquele Tribunal, a apenas três professores com nível de Doutorado (PHD), do “Curso de Mestrado em Recursos professor Emérito da UFRJ, (por que não, também, do professorAristides de Almeida Rocha ?) que há mais de Os erros observados neste EIA/RIMA são tão extraordinariamente primários que qualquer engenheiro recém-formado, numa razoável Escola de Engenharia, mesmo sem qualquer titulação acadêmica, os detectaria. Duvidamos que um engenheiro civil recém-formado, mesmo sem possuir especialização em Recursos Hídricos e Meio Ambiente, um reservatório. de pessoas responsáveis, em nosso país, que se mostraram contrárias à execução deste açude Castanhão na cota proposta? É claro que não! Com ele, pretendemos não só levantar a consciência de todos os segmentos cada viela; em cada rua; em cada esquina; em cada estabelecimento- co mercial, industrial, bancário ou de outros serviços; em cada lar; em cada escola de 1° e 2° grau; em cada Universidade, por seu corpo docente, discente e administrativo; em cada organismo público, em seus três níveis de poder político (Municipal, Estadual e Federal); na integridade dos Poderes da União (Executivo, Legislativo e Judiciário), desejamos que o cidadão, do mais humilde ao mais expressivo, discuta este problema, de modo a que a sociedade possa bem se posicionar em relação a este megabarramento e, assim, impedir que se repitam seus clamorosos erros em qualquer parte do país.
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32.2 - Os sentimentos impressos na alma nordestina Este livro não é só um sinal de alerta. É um grito de chamamento à consciência nacional. É um protesto veemente em defesa da Engenharia Nacional. Que nosso brado, juntamente com aqueles já emitidos por eminentes acrescido pelo bramido do povo cearense e reforçado pelo grito de todos os nordestinos. Que estas vozes ecoem pelos 8,5 milhões de km² que constituem o solo Pátrio: É a voz cortante do nordestino que agoniza, entre estertores: de dor, ao sentir fome; , por seu sofrimento só visível quando interessa ao poder político que o explora nas “frentes de trabalho”; de tristeza, ao ver a terra ressequida que rouba não só seus sonhos e ilusões, mas a sua própria sensibilidade pois, em suas vistas, já não mais brota uma única lágrima; de pobreza, por sua vida miserável que o faz sair, desesperado, atrás mitigar a fome de sua família maltrapilha, cujos membros vestem, com suas peles ressequidas, seus ossos pontiagudos; de incredulidade, pois, em seus olhos enevoados, incrustados em de orgulho, quando escuta alguém dizer: “O nordestino é, antes de tudo, um forte; de profunda mágoa, quando, em silêncio (embora sua alma possa troar como milhares de canhões detonados ao mesmo tempo), vê seu esposo partir a terras distantes à procura de sustento; ou ainda, ter de dar ou vender, a qualquer preço, um ser gerado em seu ventre que, sugando seu seio, pôde dele extrair, por alguns poucos meses, o leite fraco que, graças a rapadura diluída em pouca água, acrescida de farinha de mandioca, lhe deu condições de se manter vivo, em sua tenra idade. Não importa seu destino. Pela expressão mais eloquente do amor, a mãe renuncia a si própria ao permitir que esta criança possa simplesmente viver, mesmo que seja através de sua prostituição física ou moral. Nada mais importa, a não ser a necessidade de viver! Dentro dessa visão trágica, mas real, se expressa à miserabilidade do nordestino que, numa última e derradeira tentativa de acreditar em
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combalidas e roga a Deus a benção da chuva. Neste gesto humilde, o nordestino mostra sua grandeza. Ao encerrarmos este livro, gostaríamos de prestar uma homena gem especial aGraciliano Ramos transcrevendo pequeno trecho a ele atribuído no seu Livro Vidas Secas(1938), em que reproduz, de modo magistral, esta visão aterrorizadora, quase apocalíptica, do retirante Quatro sombras no caminho estreito coberto de seixos miúdos, -empur rados pela seca, sem destino. No alto, no céu, em vez de nuvens grossas, bojudas, o grasnar dos urubus; na terra, ao invés de searas verdejando, cascalhos, rios secos, espinho, cactos rasgando o sertão, bichos morrendo, gente morrendo, terra morrendo. Urge apagar para sempre esta nódoa do quadro da Nação brasileira. Para tal, basta encerrar o viciado ciclo da má gestão dos Recursos Hídricos (construir barragens, com volumes d’água exagerados e em locais inadequados, é apenas um exemplo); da falta de coragem cívica e de sadias decisões políticas. Um processo amplo e complexo que, como uma caminhada, precisa de um passo inicial. Para o Ceará, esse passo inicial passa pela reformulação da cota de operação do açude Castanhão, colocando-o no contexto geral do Vale do Rio Jaguaribe. Hoje, como sempre é necessário um despertar coletivo de consciência e um congraçamento de forças da população numa cruzada nacional em prol de um correto planejamento e uso do precioso e vital recurso hídrico de superfície, em decorrência de um permanente e insuspeito Engenharia Nacional.
REFERÊNCIAS
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POSFÁCIO AS FISSURAS NA BARRAGEM DO CASTANHÃO
N
referência a um problema detectado na parede de montante da Barragem do Castanhão que mereceu o seguinte artigo de nossa autoria publicado no JornalO Povo, do dia 29 de julho de 2016, sob o título em epígrafe: No livro que escrevemos em 1999, dedicamos dois capítulos à questão sismológica na área em torno da Barragem do Castanhão. Na fase de execução da obra, tiveram os executores do projeto que se defrontar com o problema do “paleo-canal” que foi descoberto a 36 metros de profundidade durante a escavação para a fundação da barragem, “uma gravíssima questão sismológica na região do Castanhão”, conforme nos referimos no citado livro de 336 páginas. A notícia da “descoberta” foi divulgada pela imprensa no dia 12 de As implicações no custo e no cronograma dos serviços de construção da barragem foram, continuam e continuarão sendo vultosas, não se sabendo, até a presente data, o custo provável desse empreendimento”, dissemos na execução ter sido constatado a existência deste surpreendente “paleo-canal”, ou “ falha geológica”, na fundação da barragem? Diante do problema recentemente detectado pelo DNOCS da existência oportunidade, o que escrevemos no referido livro, consubstanciando quatorze anos de luta contra os erros e omissões deste mal concebido projeto oriundo do extinto Departamento Nacional de Obras de Saneamento - DNOS, que tinha sede no Rio de Janeiro.
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poderia perfeitamente ter sido detectado por ocasião dos estudos geológicos da barragem. O problema é que o plano de sondagem (perfuração que se faz no detalhamento, o que se constitui mais um erro imperdoável e inadmissível do projeto. Os fatos de hoje, em relação a uma rachadura (fenda) na parede do Açude Castanhão, não nos trazem nenhuma surpresa quanto ao inadequado local do barramento, uma das principais zonas sismogênicas do Brasil, conforme o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo - IPT. Este estudo do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo foi contratado pela SEMACE, no primeiro semestre de 1992, para oferecer parecer sobre a probabilidade de a Barragem do Castanhão, quando cheia, com 60 metros de coluna d`água, poder determinar certos fenômenos geológicos, como escorregamento de terra e sismos e, assim, provocar danos na estrutura da obra. Neste artigo que, como dissemos acima, foi publicado no Jor nal O Povo ção aos idealizadores, projetistas, interessados, apaixonados, simpati zantes e promotores da Barragem, do Castanhão que, como se sabe, foi concebido e projetado pelo extinto Departamento Nacional de Obras de Saneamento - DNOS, que tinha sua sede no Rio de Janeiro: obra ter sido constatada a existência deste surpreendente ‘paleo-canal’, ou falha geológica?” Neste mesmo artigo respondo a esta pergunta: “O problema é que o ‘plano de sondagem’ (perfuração que se faz no terreno mento, que se constituiu um erro imperdoável e inadmissível dos projetistas”. Ao que sabemos de pessoas ligadas diretamente à construção desta obra desde o seu início, é que o “plano de sondagem” foi feito com um espaçamento de 80 em 80 metros, fato este comentado no V Simpósio sobre Segurança de Barragens e Riscos Associados , realizado em Fortaleza nos dias 17 e 18 de março de 2016, quando deveria ter sido de 25 em 25 metros, ainda que considerando a grande extensão da parede da barragem (cerca de 10.500 metros) que, sem dúvida, oneraria, em muito, os estudos geológicos propriamente ditos. Foi por esse motivo
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que a referida “falha geológica” não foi detectada, e se tivesse, ainda na fase dos estudos iniciais, preponderado o bom senso, certamente a obra teria sido abandonada, prevalecendo as construção, hidrologicamente mais indicada dos Açudes Castanheiro e Aurora, ambos na bacia do Rio Salgado. O Parecer do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia - CREA O Parecer Técnico de Engenharia da Comissão instituída pela Portaria 071/2016 do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia - CREA, teve como objetivo“apresentar análise e proposição de mitigação de risco Castanhão”. A composição da referida Ccomissão foi a seguinte: 1 – Coordenadoria, engenheiro civil Gerardo Santos Filho. Membros: Engenheiros Civis Otacílio Borges Filho, Antônio Nunes de Miranda, Marcelo Correia Alcântara Silveira, Lawton Parente de Oliveira, Getúlio Peixoto Maia, Hypérides Pereira de Macedo, Mário Borges Mamede Neto, Joaquim Antônio Caracas Nogueira e do Geólogo Carlos Marcelo Lobo Maranhão, professor da UFC. O referido parecer faz referência a um Relatório da empresa KL Engenharia, de outubro de 2015, valendo ressaltar que o problema de uma rachadura na parede de montante da Barragem do Castanhão já havia sido detectado no segundo semestre de 2014. Não pretendemos enumerar aqui os vários fatores apresentados pela Comissão do CREA to, sendo um deles“o fator térmico da região” . Também: “Problemas de movimentação da barragem devido às ações sísmicas devem ser descartadas Técnico do CREA conclui: de fundação, porém se faz necessária a análise técnica do momento após a escavação de exposição da fundação e antes da execução do reparo”. Não comentaremos o procedimento de correção proposto pela KL Engenharia considerada pela Comissão do CREA como sendo a mais indicada: “As ações corretivas propostas no Relatório (Fls. 11 a 15) são- perti .
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O parecer da Comissão conclui que reparado imediatamente, conforme o exposto no relatório da KL Engenharia, associado às sugestões citadas neste documento e ainda que seja realizado o monitoramento rigoroso e constante, com catalogação e arquivamento dos dados coletados para estudos técnicos” . Conclusão Olhando para osCapítulos XXIX e XXX deste livro nos parecia consen sual que a região onde foi construído o Açude Castanhão “é por demais conhecida como uma região sísmica e está alinhado com a conhecida Falha de Palhano que recentemente provocou aquela tão conhecida série de terremotos nos últimos anos” , conforme relato do geólogo Carlos Marcelo Lobo Maranhão, que fez parte desta Comissão do CREA. E prosseguindo ele diz: “O Castanhão vai ser construído próximo à Falha do Rio Jaguaribe uma conhecida zona de fraqueza da crosta terrestre e que foi responsável por diversos abalos sísmicos na região” . Não sou geólogo, mas diante do que disse o técnico Carlos Marcelo Lobo Maranhão e olhando para o parecer do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo que a rachadura na parede de montante da Barragem do Castanhão não foi provocada por abalos sísmicos, onde o Laboratório Sismológico da Universidade Federal do Rio Grande do Norte registra, frequentemente, naquela área do Açude Castanhão, tremores de terra chegando alguns deles a atingir a magnitute de 3,5 graus na escala Richter.
Capítulo XXX
PERFIL DO AUTOR
NOME: Manfredo Cássio de Aguiar Borges NATURALIDADE: Sobral – Ceará DATA DE NASCIMENTO: 06/09/1933 VIDA ACADÊMICA: Graduação: • Graduado em Engenharia Civil pela Escola Politécnica da Universidade Católica de Pernambuco (1960). Pós-graduação: • Em Hidrologia – Curso de Obras Hidráulicas da Escola Nacional de Engenharia do Rio de Janeiro (1962). • Em Engenharia Civil, com especialização em Barragens, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro-PUC, (1965). HOMENAGENS: • Homenagem recebida em solenidade pública da Assembleia Legis lativa do Estado do Ceará por serviços prestados ao DNOCS pela passagem do centenário dessa Entidade, diploma assinado pelo Presi dente Domingos Filho. Em 20 de outubro de 2009. • Homenagem recebida em solenidade pública da Assembleia Legis lativa do Estado do Ceará em comemoração dos 20 anos da VSM Comunicação Ltda a “seu principal apoiador e conselheiro”, diploma assinado pelo Presidente Domingos Filho. Em 25 de junho de 2009. • Mérito jornalístico “pelos relevantes serviços prestados à Classe Jorna lística do Ceará” – Casa do Jornalista, 14 de julho de 2005. Diploma conferido em sessão solene comemorativa dos 80 anos da Associação Cearense de Imprensa - ACI.
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VIDA PROFISSIONAL: • Participação em curso sobre Barragem de Terra, ministrado pelo pro fessor português Virgílio Penalva Steves, com duração de seis meses, em Recife (PE). • Professor Assistente do Curso deHidrologia e Fluviologia para enlo Benedicto Ottoni Netto. Recife. 1964. • Estudos preliminares de hidrologia de 47 açudes do Nordeste sob a supervisão dos técnicos israelenses Felix Melro e Arche Ven Zvi. Grupo Executivo de Irrigação e Desenvolvimento Agrário (GEIDA). • Diretor Regional do DNOCS (1971 – 1972). • Diretor de Estudos e Projetos do DNOCS (1972 – 1974). • Chefe da Divisão de Hidrologia do DNOCS (1974 – 1990). • Representante do DNOCS no Comitê de Estudos Integrados do Vale do Rio São Francisco - CEEIVASF (1979 – 1990). • Participação em viagem de observação às regiões áridas da Espanha (sul da Espanha e Ilhas Canárias), através do Convênio DNOCS/IRI DA (1984). Duração: 30 dias • Presidente do Conselho Editorial do DNOCS (1981 – 1986). VI Simpósio Brasileiro de Hidro • logia e Recursos Hídricos , da ABRH, realizado em Fortaleza no período de 15/11 a 19/11 de 1981. • Representante da Associação Brasileira de Recursos Hídricos / Seção do Ceará – ABRH/CE (1986 – 1987). • Fundador e Representante da Regional Nordeste da Associação Brasi leira de Recursos Hídricos – ABRH (1987 – 1989). • Participação, como perito, noTribunal da Água, no caso da construção da Barragem Castanhão, no Estado do Ceará. Florianópolis (SC), de 25/04 a 30/04 de 1993. • Participação no Seminário “O Semiárido do Nordeste Brasileiro”, como debatedor do tema“Atual Legislação de Recursos Hídricos do Brasil, a Nova Lei de Águas e Sugestões para Revisão Constitucional” , promovido pela Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba em 30/11 a 02/12 de 1993. A palestra foi proferida pelo Deputado Federal por São Pau lo, Fábio Feldman, que coordenou a elaboração da referida lei. • Participação no Seminário sobre a Transposição das Águas do Rio São Francisco, patrocinado pelo Instituto Tancredo Neves, do Ceará, no dia 04/03/1994. • Participação no “II Fórum Paraíba em Debate”, como conferencista sobre os temas:“Projeto de Transposição de Águas e Linhas Básicas de , e “Linhas Básicas de um Programa de Convivência com a Semiaridez”
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, patrocinado pelo Conselho Regional de Economia e Sindicato dos Economistas do Estado da Paraíba, João Pessoa (PB), de 16/08 a 19/08 de 1994. • Conferência na Associação dos Geógrafos Brasileiros – Seção Fortale za, sobre o tema:“Concentração e Descentralização dos Recursos Hídricos e Transposição de Vazões do Rio São Francisco” . Fortaleza (CE), 26/05/1994. • Participação, como perito, na Comissão Parlamentar de Inquérito insta lada pela Câmara de Vereadores de Fortaleza, com o objetivo de analisar as causas e efeitos do rompimento do dique fusível do Açude Gavião, que abastece a Região Metropolitana de Fortaleza – RMF (15/05 a 12/06 de 1995). • forma efetiva, a cadeira que tem como Patrono o erudito intelectual cea rense Tomás Pompeu de Sousa Brasil. Fortaleza, 16 de junho de 2000. • Conferencista no Seminário patrocinado pelo Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA) do Rio de Janeiro, sob • Participação e Coordenação da publicação “POR UM NOVO DNO CS – Uma Contribuição da Sociedade à Proposta de Reestruturação do DNOCS. Sociedade dos Amigos do DNOCS (SOAD). Fortaleza, fevereiro de 1999. • Associação Técnica – Membro do Conselho Consultivo da ABRH – Regional Nordeste/Secção do Ceará. (1988 – 1990). • Palestra na UNICAMP, em Campinas (SP), sobre O Projeto e Inte gração do Rio São Francisco com as Bacias do Nordeste Setentrional a convite da Câmara de Vereadores e daquela Universidade. Em 16 de março de 2006. • Debate na TV CULTURA de São Paulo sobre o Projeto de Integração do Rio São Francisco às Bacias do Nordeste Setentrional sendo os de mais convidados o ex-Governador da Bahia, Paulo Souto, o pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, João Suassuna, o professor da Faculdade de Medicina da UFMG e Coordenador do Projeto Manuelzão/UFMG, Apolo Hering Lisboa, o Chefe da Assessoria Técnica da Vice-Presidên cia da República, Francisco Sarmento e o geógrafo e professor titular 2008. • Palestra na Federação das Indústrias do Estado do Ceará-FIEC, sobre o Projeto da Transposição do Rio São Francisco, sob título “A Questão da Água no Nordeste: Gestão das Reservas e a Transposição do Rio São Francisco”, no dia 23 de setembro de 2008, a convite da Fundação Gilberto Freire, com o patrocínio do BNB, CHESF, Governo Federal e apoio da FIEC.
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• Transcrição do artigo “A Futura Gestão dos Recursos Hídricos”, publicado no JornalO Povo, de Fortaleza, no dia 27/12/2005, no “Caderno do Professor – Pontos de Vista -Escrevendo o Futuro ”, editado pela Fundação do Banco Itaú, ano 2006, sendo impressos 500.000 exemplares para serem distribuídos nos Ensinos Fundamental e Médio do Brasil. • Artigo “Projeto São Francisco - Breve História do Projeto de Inter ligação do Rio São Francisco às Bacias do Nordeste Setentrional” (14 páginas) publicado na Revista CONVIVER, comemorativa dos 100 anos do DNOCS – Edição especial. Outubro de 2010. • Participação no Fórum dos Presidentes dos CREAs do Nordeste para ministrar palestra sobre a Transposição do Rio São Francisco (vantagens e desvantagens/Problemas Ambientais) no dia 09 de setembro de 2010, na cidade de Salgueiro, Pernambuco. • Ex-membro do Conselho Consultivo da ABRH – Regional NE/Seção Ceará. • Sócio Contribuinte da Associação Cearense de Imprensa – ACI (1952). TRABALHOS PUBLICADOS: •
deste Brasileiro, sendo três deles sobre o Vale do Jaguaribe. • Aproximadamente 350 artigos técnicos sobre recursos hídricos do Ceará e do Nordeste, em especial sobre planejamento hídrico do Vale do Jagua ribe e abastecimento de água da cidade de Fortaleza, publicados princi palmente na imprensa do Ceará. • Autor do livro A FACE OCULTA DA BARRAGEM DO CASTANHÃO – Em Defesa da Engenharia Nacional. (331 páginas). Instituto da Memória do povo Cearense – IMOPEC. 1999. • Autor do Livro O Nó Górdio da Transposição . Edição provisória publicada pela Federação da Agricultura do Estado do Ceará (FAEC). Fortale za, setembro de 2014.
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