Fascículo

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UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO - UPE Reitor Prof. Carlos Fernando de Araújo Calado

Vice-Reitor Prof. Reginaldo Inojosa Carneiro Campello

Pró-Reitor Administrativo Prof. Cláudio Luiz Dubeux Neves

Pró-Reitor de Planejamento Prof. Béda Barkokébas Jr.

Pró-Reitor de Graduação Profª. Izabel Cristina de Avelar Silva

Pró-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa Profª. Viviane Colares Soares de Andrade Amorim

Pró-Reitor de Desenvolvimento Institucional e Extensão Prof. Álvaro Antônio Cabral Vieira de Melo

NEED - NÚCLEO DE ESTUDO EM EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Coordenador Geral Prof. Renato Medeiros de Morais

Coordenação Padagógica Profª Rute Cândida Pereira Profª Maria Vitória Ribas de Oliveira Lima Profª Aidy Araújo Guedes Profª Patrícia Lídia do Couto Soares

Coordenação de Revisão Gramatical Profª Angela Maria Borges Cavalcanti Profª Eveline Mendes Costa Lopes

Capa e Projeto Gráfico Marcos Leite

Arte Final Anita Sousa

Impresso no Brasil - Tiragem 360 exemplares Av. Agamenon Magalhães, s/n - Santo Amaro Recife / PE - CEP. 50103-010 - Fone: (81) 3416.4041 - Fax: (81) 3416.4014



Genética Geral

APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA Olá! Sejam bem-vindos à disciplina Genética Geral! As bases da hereditariedade foram estabelecidas por experimentos realizados por um monge chamado Gregor Mendel na metade do século XIX, em Brünn, atual Brno na república Tcheca. Em uma simples definição, a genética estuda a hereditariedade e a variação de características dos organismos. No estudo de uma característica, precisamos esclarecer se ela é herdável, ou seja, determinada genicamente, e onde o gene ou genes que expressam a característica estão localizados. Envolve conhecer, também, as interações entre os alelos dos genes que as determinam, e entre genes não-alélicos, se a característica for condicionada por mais de um loco gênico. Compreender como os genes determinantes de uma característica se expressam e como são regulados e qual o papel do ambiente na expressão do fenótipo. Nesta disciplina, Genética Geral, que é a primeira do elenco das obrigatórias da área de Genética, vamos trabalhar a compreensão dos mecanismos de transmissão e o entendimento da variação genética nas populações. Nas próximas disciplinas, iremos aprofundar os conhecimentos sobre os cromossomos (Citogenética) e sobre a expressão e regulação dos genes (Genética Molecular). Apesar de a genética ser desenvolvida a partir de pesquisas realizadas em laboratórios e áreas (microorganismos, vegetal, animal, humano, educação) experimentais ou aplicadas de instituições de ensino e pesquisa em todo o globo terrestre, ela está sempre presente no nosso cotidiano. Lendo jornais, livros, revistas ou assistindo a filmes, noticiários e até novelas, dificilmente você não encontrará algum tema relacionado à genética. Os avanços do conhecimento e as inovações derivadas da ciência e tecnologia muitas vezes provocam medo e desconfiança na população, o que têm feito com que a mídia procure transmitir, em linguagem


acessível, o real significado de tais transformações e sua implicações éticas, sociais e políticas. Contudo, a falta de formação específica de jornalistas e profissionais afins muitas vezes provoca interpretações equivocadas sobre a importância da genética na sociedade. Enquanto você está lendo este texto, pesquisadores do mundo inteiro estão produzindo novos conhecimentos. O ritmo de novas informações nesta área é alucinante. Para enfrentarmos essa tempestade de idéias, precisamos nos valer de duas ferramentas: uma boa fundamentação, só conseguida através da leitura e esforço pessoal, e a capacidade de usar os recursos disponíveis na internet. Esta nossa jornada será coberta de êxito, se vocês, ao terminarem este módulo, estiverem compartilhando o nosso entusiasmo em prosseguir na viagem do conhecimento, desafio lançado pela Fix (a esfinge do conhecimento, a mascote da genética neste curso, que estará sempre fazendo perguntas e lançando desafios). Apresento Fix, Oi, sou Fix, leoa alada com cabeça humana e só posso ser vencida pelo intelecto. Meu primeiro desafio aconteceu quando viajava pela Grécia anos atrás. Decifra-me ou te devoro! “Qual o ser que anda de manhã com quatro patas, ao meio-dia com duas e, à tarde, com três e que, contrariamente à lei geral, é mais fraco quando tem maior número de membros?” Essa é fácil, porém desafio mesmo é o que tenho para vocês. O caminho do conhecimento é árduo, mas extremamente gratificante para aquele que nele se aventurar. Convido quem tiver coragem a entrar na maravilhosa viagem do conhecimento. Negrito – glossário, figuras (desenhos, fotos) Negrito e Itálico – destaques


Genética Geral

1. EMENTA A disciplina Genética Geral apresenta conceitos fundamentais em genética clássica, baseados em princípios básicos sobre a hereditariedade, mostrando que a unidade, a diversidade e as características adaptativas dos organismos são conseqüências da história evolutiva. Identifica as principais formas de transmissão de genes e os fatores que alteram os padrões simples de herança, reconhece a manifestação dos genes na distribuição de características qualitativas e quantitativas bem como a interação entre o genótipo e o ambiente na determinação do fenótipo do indivíduo. Além disso, busca familiarizar os estudantes com os conhecimentos básicos necessários à compreensão de como os conceitos científicos se desenvolvem a partir de observações e de experimentação, visando ao desenvolvimento do raciocínio estruturado.

2. CONTEÚDO PROGRAMÁTICO E METODOLOGIA Fascículos sobre os temas básicos em Genética Geral. 1Mendelismo: experimentos de Mendel, símbolos e terminologias, monoibridismo, dominância e recessividade, retrocruzamento e cruzamento teste, diibridismo, poliibridismo. 2-Padrões de herança: herança monogênica, herança de genes organelares, herança multifatorial, penetrância e expressividade, dominância incompleta, codominância, alelos letais, alelos múltiplos, proporções diíbridas modificadas, epistasia. 3-Base cromossômica da herança e mapeamento gênico: teoria cromossômica, cromossomos, não disjunção cromossômica e genes, descoberta dos genes ligados, mecanismos de permuta gênica, mapas de ligação. 4-Genética evolutiva: teorias evolutivas x genética mendeliana, teoria das freqüências alélicas (Equilíbrio de HardyWeinberg), processos que influenciam as variações, evolução e diversidade, macroevolução.


As atividades solicitadas nos fascículos terão a finalidade de aprofundar as informações, de redirecionar a aprendizagem e de aferir o conhecimento (algumas atividades selecionadas nos fascículos, como exercícios, pesquisas, discussão em fóruns e as avaliações presenciais obrigatórias).


FASCÍCULO 1 Mendelismo

Profa Marília de França Rocha Colaboradoras - Maria Teresa Marquim N. Cornélio Rita de Cássia de Moura

Carga horária - 15 h

INTRODUÇÃO Neste fascículo, vamos iniciar a jornada pelo mundo maravilhoso da genética. Se você estiver disposto(a) a vencer os obstáculos, ao tomar contato com uma terminologia mais especializada, o aprendizado ser-lhe-á muito agradável e de grande valia. Além disso, ao se familiarizar com os conhecimentos básicos necessários à compreensão de como os conceitos científicos se desenvolvem a partir de observações e de experimentação, você estará desenvolvendo um raciocínio estruturado e compreendendo a importância da genética nas questões éticas, sociais e políticas.

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OBJETIVO ESPECÍFICO - Discutir a importância das descobertas de Mendel e suas implicações fundamentais para o estudo da hereditariedade.

MENDELISMO 1- QUEM FOI MENDEL Johann Mendel (1822-1884; o nome Gregor foi acrescentado ao tornar-se religioso) (fig. 1) nasceu na Moravia, Europa Central. Ao terminar os estudos secundários, ingressou no monastério católico de St. Thomas, na cidade de Brünn, atual Brno na república Tc h e c a . P a r a s a b e r m a i s s o b r e M e n d e l a c e s s e : http://www.monkinthegarden, ou para obtenção da versão original do artigo de Mendel: http://www.netspace.org/MendelWeb


8 Como o monastério agostiniano era dedicado ao ensino de ciências e pesquisas científicas, Mendel foi enviado para a universidade de Viena, e como não obteve sucesso nos exames, retornou a Brünn. Lá iniciou um programa de pesquisa de hibridização de plantas e estabeleceu as regras básicas da herança, o que lhe valeu, após a sua morte, o título de fundador da Genética.

Fig 1- Gregor Mendel http://history.nih.gov

2 - AS DESCOBERTAS DE MENDEL 2.1- O ORGANISMO EXPERIMENTAL DE MENDEL Mendel iniciou seus trabalhos com variedades de ervilha de jardim. Utilizou Pisum sativum, P. quadratum, P. umbellatum e P. saccharatum, cujos resultados foram apresentados em 1865, em um congresso local, e publicados no ano seguinte nos Anais da Sociedade de Pesquisas em Ciências Naturais de Brünn, sob o título de “Experiências sobre híbridos em plantas”. A escolha da espécie foi fundamental para o sucesso de Mendel. A ervilha apresenta inúmeras características que a tornam apropriada para estudos genéticos. Apresenta várias gerações no ano, é de porte pequeno, tem flor completa, autopoliniza-se, embora permita a realização de fertilização cruzada, cada vagem fornece várias sementes, e, conquanto não fosse do conhecimento de Mendel, todas as espécies são diplóides. Um outro ponto importante foi a escolha de sete características (propriedades específicas) que permitiam a rápida classificação de indivíduos. Os geneticistas usam este termo como sinônimo de caráter. A planta só poderia apresentar uma forma alternativa para cada característica (fig. 2) e não poderia apresentar ambas de uma só vez, de maneira a ser capaz de distinguir um padrão de herança, caso existisse algum. As formas são chamadas, atualmente, de fenótipos.

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9 Características Altura do caule Morfologia da vagem Cor da vagem Morfologia da ervilha Cor da ervilha

Alto : Completa : Verde :

Baixo: Constringida: Amarela:

Lisa :

Rugosa:

Amarela :

Verde:

Axial :

Terminal:

Violeta :

Branca:

Localização da flor Cor da flor Fig 2- Características contrastantes em ervilha

2.2- O EXPERIMENTO DE MENDEL Embora não tenha terminado a sua formação universitária, Mendel era professor, e possuía bons conhecimentos na área de Biologia e Física. Seu sucesso deve-se não apenas à escolha do material de estudo, mas também aos registros e análises cuidadosas dos experimentos realizados, análise estatística, teste das previsões de hipóteses e análise populacional. Seu método resume-se em:

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- Seleção de sete pares de características, cada uma das quais com duas formas distintas (fig. 2) - Cruzamento de indivíduos com características contrastantes; - Realizações de cruzamentos recíprocos (usou cada uma das sete características como progenitor feminino e como progenitor masculino, por exemplo, fêmea alta x macho baixo e fêmea baixa x macho alto); - Estudo inicial de uma característica por vez; - Análise de cada característica por várias gerações; - Classificação de indivíduos em cada classe de expressão do caráter em cada geração; - Proteção de híbridos de toda influência de polens externos; - Utilização de princípios de probabilidade; - Abordagem, posteriormente, pares de características e até três conjuntos de caracteres. Uma condição era importante: não poderia haver redução marcante da fertilidade dos híbridos e dos seus descendentes em sucessivas gerações.


10 2.3- PRINCÍPIOS MENDELIANOS Mendel foi capaz de deduzir três princípios fundamentais da Genética (segregação, dominância e distribuição independente) que contêm as bases subjacentes da herança e da atividade gênica. Cruzamentos monoíbridos O primeiro passo de Mendel foi estudar a herança de cada par de características. Para isto, ele utilizou cruzamentos recíprocos e a fertilização cruzada de plantas com formas alternativas do mesmo caráter, por exemplo, cor da flor (fig 3). Em cada caso, a geração inicial (F1) mostrava, apenas, uma das características da geração parental (P). Então, não faria diferença o modo pelo qual seria feito o cruzamento. Se um genitor puro apresentar flor violeta, e o outro, flor branca, toda a prole da F1 possuirá flores violetas. Contudo, se indivíduos da F1 fossem autofertilizados, a segunda geração de plantas (F2) apresentaria ambas as características. Para este exemplo, violeta x branca, a geração F2 continha 705 flores violetas e 224 flores brancas. O fenótipo branco que não apareceu na F1 reapareceu na F2, o que fornece uma proporção de 3,15 de flores violetas para 1 de flor branca. Um padrão começou a se repetir para cada um dos cruzamentos monoíbridos. Os resultados para cada um dos cruzamentos estão resumidos no quadro 1. Mendel admitiu que a proporção era de 3:1, estando dentro dos limites de erro experimental.

X

Geração parental P

Violeta

Branca

1ª Geração F1

X

Geração parental P

1ª Geração F1 Fig 3 - Cruzamentos recíprocos e prole

Branca

Violeta

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11 Quadro 1 – Resultados de cruzamentos monoíbridos Cruzamento Caules altos x baixos Vagens completas constringidas Vagens verde x amarelas Ervilhas lisas x rugosas Ervilhas amarelas x verdes Flores axiais x terminais Flores violetas x brancas

Geração F2 Geração F1 Números Altas 787 altas:277 baixas x Completas 882 comp:299 constring

Proporção 2,84 : 1 2,95 : 1

Verdes Lisas Amarelas Axiais Violetas

428 verdes:152 amarelas 5.474 lisas:1.850 rugosas 6.022 am:2.001 verdes 651 axiais:207 terminais 705 violetas:224 brancas

2,82 : 1 2,96 : 1 3,01 : 1 3,15 : 1 3,15 : 1

Total

14.949 : 5.010

2,98 : 1

As conclusões de Mendel Mendel propôs que cada característica ou traço (por exemplo, cor da flor) é controlado por um fator (gene) que poderia existir em mais de uma forma (alelo). Mendel, sem nenhum conhecimento de citologia, foi capaz de deduzir que os fatores seriam estruturas físicas dentro da célula, e, com isso, propôs a existência dos genes. Sua primeira conclusão foi: cada fator existe aos pares. O que equivale dizer que, para cada gene, existe um par de alelos. Durante a reprodução sexual, os alelos de cada genitor se separam ou segregam, produzindo gametas com apenas um alelo daquela característica estudada. A isto, chamamos princípio da segregação ou 1ª Lei de Mendel.

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Ele, também, usou símbolos na forma de letras para denotar as características. Maiúsculas para a versão que aparecia com maior freqüência e minúsculas para a de menor freqüência, e introduziu as terminologias: dominante para essa predominância de um caráter na primeira geração híbrida; e recessivo para as características alternativas, o que é conhecido como o princípio da dominância. Introduzindo alguns termos. Cada letra representa um alelo, e indivíduos representados por Aa são ditos heterozigotos apresentando dois alelos diferentes. Indivíduos de linhagens puras AA ou aa são chamados de homozigotos. Desta forma, uma planta AA é homozigota dominante, Aa é heterozigota, e aa, homozigota recessiva. A constituição genética representada por letras, descrevendo os genes herdados por um indivíduo é o genótipo, enquanto o fenótipo especifica a característica observada.


12 Um grande desafio para Mendel foi explicar não a proporção 3:1, mas as proporções 1:2:1, subjacentes a todas as proporções 3:1. Ele cruzou plantas com sementes amarelas e verdes e autofecundou as plantas da F1 (sementes amarelas), obtendo uma F2 com ¾ amarelas e ¼ verde. Ele selecionou algumas plantas amarelas da F2 e as autofecundou, obtendo novamente uma mistura de ervilhas amarelas e verdes e uma proporção de três amarelas para uma verde. Ao serem autofecundadas, as plantas com ervilhas verdes da F2 apresentaram, apenas, ervilhas verdes (vv). Em conclusão, todas as ervilhas verdes de F2 eram puras. Entretanto, das ervilhas amarelas 2/3 eram iguais às amarelas de F1 (Vv), e 1/3 era como as parentais (VV). Os tipos gaméticos femininos serão fertilizados aleatoriamente pelos tipos gaméticos masculinos. Uma boa forma de mostrar isso graficamente é utilizar o quadrado de Punnett (fig. 4).

Parentais

VV =

Gametas

x

V=

F1

vv = v=

Zigoto Vv = ½V ½V ½v

½v

¼ V/V

¼ Vv

¼ V/v

¼ v/v

1 V/V

2 V/v

1 v/v

Fig 4 - Modelo de Mendel para explicar a proporção 1:2:1

Membros de um par de genes são separados por uma barra, que é usada para demonstrar que eles são, de fato, um par. Quando cruzamos plantas puras com sementes amarela x verde, desconhecemos o genótipo das plantas de F2 cujo fenótipo é amarelo, pois este poderá ser homozigoto VV (com probabilidade de 1/3) ou heterozigoto Vv (com probabilidade de 2/3). Uma forma de descobrirmos o genótipo desconhecido é cruzar esta planta com sementes amarelas com outra de sementes verdes (homozigota para a característica recessiva). Desta forma, realizamos um cruzamento teste. Aquela que for homozigota dominante apresentará uma prole totalmente amarela, e a heterozigota, por sua vez, mostrará prole amarela e verde numa proporção de 1:1.

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13 Consideramos cruzamento teste, ao cruzarmos um indivíduo com fenótipo dominante cujo genótipo se deseja determinar com um indivíduo de fenótipo recessivo. O retrocruzamento, por sua vez, ocorre ao cruzarmos um indivíduo com fenótipo dominante cujo genótipo se deseja determinar e um genitor recessivo. Ambos têm sido de grande importância no estudo de: identificação de genótipos, ligação fatorial, melhoramento vegetal e animal. No google acadêmico http://www.scholar.google.com você poderá encontrar diversos artigos sobre estes tipos de cruzamento.

CRUZAMENTOS DIÍBRIDOS O próximo passo de Mendel foi realizar cruzamentos envolvendo dois pares de características, para saber se eram herdados juntos ou independentemente. Se dois genes estão no mesmo cromossomo, os alelos em um cromossomo são separados dos do outro por uma barra, por exemplo, AB/ab ou Ab/aB. Se estiverem em cromossomos diferentes, separamos os pares de genes por ponto-e-vírgula, como por exemplo, A/a; B/b. Se desconhecemos que os genes estão no mesmo cromossomo ou em cromossomos diferentes, iremos separar os genes por um ponto, por exemplo, A/a . B/b.

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Para efetuar um cruzamento diíbrido, Mendel usou uma linhagem com sementes amarelas e lisas e outra, com sementes verdes e rugosas. A prole F1 apresentou sementes amarelas e lisas. De uma planta autofecundada desta prole, pode-se obter quatro combinações diferentes na F2, duas das quais não existiam nas gerações anteriores (sementes amarelas rugosas e sementes verdes lisas). Por exemplo, em certo cruzamento, ele obteve 350 sementes amarelas e lisas, 108 verdes e lisas, 101 amarelas e rugosas e 32 verdes e rugosas; o que o levou a uma proporção 9,06:3,11:2,91:0,92, muito próxima de 9:3:3:1. Mendel realizou inúmeros cruzamentos com a combinação de outras características, obtendo proporção similar. Mais uma vez, Mendel precisou explicar seus resultados. Ele somou algumas classes fenotípicas de F2 para determinar se as proporções monoíbridas (3:1) estavam ou não presentes. Ao somar as sementes amarelas (315 + 101) e as sementes verdes (108 + 32) das diferentes classes fenotípicas, ele obteve uma proporção muito próxima de 3:1, levando-o à conclusão de que a proporção 9:3:3:1 era a combinação aleatória de duas proporções 3:1 (Fig 5).


14 ¾ de F2 são amarelas V-

¼ de F2 são verdes Vv

ä ¾ lisas (R-)

¾ x ¾ = 9/16 amarelas-lisas (V-R-)

æ ¼ rugosas (rr)

¾ x ¼ = 3/16 amarelas-rugosas (v-rr)

ä ¾ lisas (R-)

¼ x ¾ = 3/16 verdes-lisas (vvR-)

æ ¼ rugosas (rr)

¼ x ¼ = 1/16 verdes-rugosas (vvrr)

Fig 5 – Diagrama ramificado apresentando dois genes. As características de um organismo são determinadas por genes. Definindo V e v como os alelos que determinam sementes amarelas e verdes e R e r como sementes lisas e rugosas, respectivamente, os progenitores são VVRR e vvrr. Conseqüentemente a F1 apresenta genótipo VvRr e esperam-se os gametas VR, Vr, vR e vr. Considerando que cada gameta seja produzido com a freqüência de ¼, metade dos gametas possuirá V, e a outra v, o mesmo ocorrendo para o segundo gene. Novamente podemos nos valer do quadrado de Punnett para observar as fusões dos gametas e observar tanto os fenótipos quanto os genótipos da F2 em um cruzamento diíbrido (fig. 6). Como há evidência de que indivíduos VvRr produzem o gameta VR em freqüência de ¼ , pode-se concluir que: a Parentais V/V;R/R = x v/v;r/r = probabilidade de um gameta conter os fatores V Gametas VR = vr = e R é o produto das F1 Zigoto V/v;R/r = probabilidades de conter F1(V/v;R/r) x F1(V/v;R/r) cada gene em separado (½ F2 x ½ = ¼), o que também é VR Vr vr vR ♂ verificado em relação aos outros gametas (Vr, vR, ♀ v r ) . M e n d e l , e n t ã o , VR VVRR VVRr VvRr VvRR chegou ao princípio da Vr VVRr VVrr Vvrr VvRr combinação dos diferentes caracteres: vr VvRr Vvrr vvrr vvRr Cada caráter é herdado vR VvRR VvRr vvRr vvRR independentemente do outro, e a proporção de dominante para recessivo 9: 3: 1: 3: não fica alterada pelo outro caráter. Fig 6 - Resultado de Cruzamento diíbrido.

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15 Atualmente conhecido como princípio da distribuição independente dos caracteres ou 2ª Lei de Mendel, com o seguinte enunciado: “Pares de genes em cromossomos diferentes se distribuem independentemente na meiose.” Como veremos adiante, o princípio da distribuição independente não é a regra, pois muitos dos genes estudados podem estar no mesmo cromossomo (genes ligados) fazendo parte do que chamamos de grupo de ligação.

CRUZAMENTOS TRIÍBRIDOS E POLIÍBRIDOS Lidamos com cruzamentos através da combinação de três ou mais genes através da utilização de diagrama ramificado (Fig 7) ou, simplesmente, utilizando probabilidades. É desaconselhável o uso de quadro de Punnett, pois seria necessário preencher um quadro com 64 células e somar os genótipos idênticos, correndo o risco de cometer vários erros. Para se obterem proporções genotípicas e fenotípicas de cruzamentos com três ou mais genes, a melhor opção é utilizar a aplicação de regras estatísticas. As duas regras a serem utilizadas são a regra do produto e a regra da soma, as quais consideraremos nesta ordem. Podemos conceituar probabilidade (P) como o resultado da divisão do número de vezes que um determinado evento pode ocorrer (r) pelo número total de resultados possíveis - P = r/n. ä ¾ lisas (R-) ¾ de F

2:

sementes

1 amarelas (V-)

ä ¾ flor violeta (B-) æ

æ ¼ flor branca (bb) ¼ rugosas (rr) ä ¾ flor violeta (B-) æ ¼ flor branca (bb)

ä ¾ lisas (R -) ä ¾ flor violeta (B-) ¼ de F 2: sementes æ æ verdes (vv) ¼ flor branca (bb) ¼ rugosas (rr) ä ¾ flor violeta (B-) æ ¼ flor branca (bb)

Fig 7 – Diagrama ramificado apresentando três genes.

27/64 Amarela, lisa, violeta 9/64 Amarela, lisa, branca 9/64 Amarela, rugosa, violeta 3/64 Amarela, rugosa, branca 9/64 Verde, lisa, violeta 3/64 Verde, lisa, branca 3/64 Verde, rugosa, violeta 1/64 Verde, rugosa, branca


16 REGRA DO PRODUTO (REGRA DO E) Probabilidade de ocorrência simultânea de dois ou mais eventos independentes. Vejamos como poderemos calcular com facilidade a ocorrência de eventos aleatórios. Imaginemos que lancemos ao ar, simultaneamente, duas moedas. Qual a probabilidade de obtermos cara na primeira e cara na segunda nesta seqüência? Perceba que o aparecimento de cara na primeira moeda não influencia o surgimento de cara na segunda moeda. Isso quer dizer que os dois eventos são independentes. Quando os eventos são independentes, a probabilidade da ocorrência de ambos é igual ao produto de suas probabilidades individuais. A probabilidade de obtermos cara e cara no lançamento simultâneo é dada, então, pelo produto das probabilidades parciais: P (cara e cara) = ½ x ½ = ¼ Veja a tabela 1 dos possíveis resultados no lançamento simultâneo de duas moedas e confira o resultado que acabamos de obter: Das quatro situações possíveis, apenas a primeira realmente satisfaz à condição do problema. Logo, a probabilidade de surgir uma combinação cara e cara é 1/4. Tabela 1 - Possíveis lançamentos

1 moeda cara coroa cara coroa a

e e e e e

2 moeda cara coroa coroa cara a

Passemos, agora, a aplicar esse conhecimento à Genética, analisando dois exemplos: a) A probabilidade de uma planta F2 ser de genótipo VVRrbb é o produto das probabilidades de ser VV (semente amarela), de ser Rr (semente lisa) e de ser bb (flor branca), o que equivale a (1/4) x (2/4) x (1/4) = 2/64. De forma semelhante se quero saber a probabilidade de determinado fenótipo, por exemplo, amarela-lisa-branca calculo o produto das probabilidades de cada fenótipo, ou seja, (3/4) x (3/4) x (1/4) = 9/64.

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17 b) Um casal heterozigoto, para uma dada característica, deseja saber qual a probabilidade de ter duas crianças, sendo a primeira heterozigota e a segunda, homozigota dominante.

P:

Aa

x

Gametas:

A

a

F1:

AA Aa

Aa A

Se P (Aa) = ½ e P (AA) = ¼ , então: P (Aa e AA) = ½ x ¼ = 1/8

a

Aa aa

REGRA DA SOMA (REGRA DO OU) Probabilidade de ocorrência de dois ou mais eventos mutuamente excludentes. Quando os eventos são mutuamente excludentes, a probabilidade de ocorrência de qualquer um deles é a soma de suas probabilidades individuais. Assim, no nosso exemplo teríamos: P (ás de copas ou ás de espada) = P (ás de copas) + P (ás de espada) P (ás de copas) + P (ás de espada) = 1/52 + 1/52 = 2/52 = 1/26

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Veja este outro exemplo: qual a probabilidade de um casal, heterozigoto para determinada característica, ter uma criança de genótipo AA ou aa ? Fazendo a separação dos gametas e o quadro de cruzamentos, veremos que:

Marido Gametas:

A a

A AA Aa

a Aa aa

Aa X Mulher ↓ ↓ A a

Aa ↓ ↓ A a

P (AA) ou P (aa) = P (AA) + P (aa) P (AA) + P (aa)

=¼+¼=½


18 Proposta da Fix: Vamos aprender jogando? Introdução: Metade das cartas de um baralho é formada por cartas de naipes pretos, e a outra metade, por naipes vermelhos. Assim, cada vez que se retira uma carta de um baralho completo, a chance de tirar uma carta de naipe vermelho é igual à chance de tirar uma carta de naipe preto, ou seja, ½ (0,5 ou 50%). Da mesma maneira: cada vez que, na fecundação, igual número de espermatozóides com o X ou o Y rodearem um óvulo, a probabilidade de entrar um espermatozóide com o X ou a de entrar um espermatozóide com o Y é a mesma: ½. Objetivo: Entender melhor o uso de probabilidades, para aplicá-la a exercícios práticos em genética. Material: Baralho e tabelas. Procedimento: As cartas de naipes vermelhos não são todas iguais. Metade é do naipe ouros (♦ ) e metade é do naipe copas ( ♥ ). A mesma coisa acontece com as cartas de naipes pretos: metade é do naipe paus (♣ ) e metade é do naipe espadas (♠ ). Suponha agora que as cartas de naipes vermelhos e as de naipes pretos representem os genes D e d dos gametas; (♥ )= óvulo D; (♠ ) = espermatozóide D; (♦ )= óvulo d e (♣ ) espermatozóide = d. Onde D- é destro e dd canhoto. Divida um baralho em dois maços, de acordo com a cor das cartas. Embaralhe cada um deles e retire uma carta de cada maço, formando um par. Anote na linha da jogada 1 da sua tabela a combinação obtida, os genótipos e os fenótipos. Em seguida, recoloque as cartas em seus maços e embaralhe-os novamente e repita a operação até completar toda a sua tabela. JOGADAS COMBINAÇÕES

GENÓTIPOS FENÓTIPOS (♥ )(♠ )=D (♦ )(♣ )=d

1. 2. 3. 4. 5.

Suponha que esses genótipos e fenótipos sejam os de cinco filhos de um casal Dd. 1. Qual é a probabilidade de se formar um zigoto DD? 2. Qual é a probabilidade de se formar um zigoto dd? 3. Qual é a probabilidade de se formar um zigoto Dd? 4. Quantos filhos destros e quantos filhos canhotos têm esse casal?

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19 5. Por que a probabilidade de o casal ter um filho canhoto é menor do que a de ter um filho destro? Envie a sua tabela e as respostas das perguntas de 1 a 5 para os tutores. Obs: A resposta da questão 4 não poderá ser igual à dos seus colegas, pois cada um montou a sua própria tabela.

3-UTILIZANDO O TESTE DO QUI-QUADRADO Como podemos observar ao longo do texto, Mendel se deparou com resultados que são próximos, mas não, idênticos à proporção esperada. Atualmente aplicamos um teste estatístico muito simples 2 chamado, teste do Qui-quadrado - χ , e destina-se a comparar proporções entre os resultados observados e os previstos por uma hipótese. 2 A fórmula para χ consiste: 2 χ =∑ [ (O-E)2 /E] O= freqüência observada para a classe E= freqüência esperada para a classe (O-E)= desvio entre cada valor ∑ = somatório

Oχ emprega números absolutos e não fracionários. Quanto maior a amostra, mais confiável será o teste. 2

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2 O resultado do χ depende do tamanho das amostras e do número de classes da amostra, o que nos fornece os graus de liberdade (GL). Quando um determinado número de classes é fixado, e todos, exceto um, foram arrumados, os demais não estão livres, mas devem preencher um determinado nicho vazio. No caso de lançamento de um dado (seis lados) o GL=5, de uma moeda (cara ou coroa ) o GL=1. Proporções mendelianas, por exemplo, com duas classes (3:1) possuem GL=1, com três classes (1:2:1) GL=2, com quatro classes (9:3:3:1) GL= 3, e assim por diante. Logo, o número de GL é geralmente igual ao número de classes menos um.

Mas ainda estamos no meio do caminho. As hipóteses ainda 2 precisam ser analisadas pelo teste do χ . Então, após o emprego da 2 2 fórmula para o cálculo do χ (χ c) e a determinação dos GL, devemos 2 consultar a tabela de valores de variáveis com distribuição χ (tabela 2) que mostra os graus de liberdade (GL) nas linhas e o valor das 2 2 probabilidades (P) nas colunas. O χ de tabela ( χ t) é função do nível de significância (limites que afirmam se um determinado desvio decorre ou não do acaso) do teste e do número de graus de 2 liberdade. Por exemplo, 3,841 é o χ t para 1GL em 5% de significância.


20 Na tabela 2, estão apresentados alguns dos valores de variáveis 2 com distribuição χ com diferentes graus de liberdade e níveis de significância. Para verificar a probabilidade de concordância entre o valor obtido e 2 a hipótese proposta, é necessário consultar a tabela do χ . Para tal, localize o número de GL à esquerda. Em seguida, percorra a linha 2 referente ao grau de liberdade em busca de um valor de χ tabelado 2 2 2 2 (χ t) igual ou aproximado ao χ calculado ( χ c). O valor do χ c 2 poderá estar entre dois valores do χ t. Por fim, verifica-se o valor de P, diretamente acima, no alto da linha, correspondente 2 aos χ tabelados.

Tabela 2 – Tabela parcial do qui-quadrado (χ 2) GL 1 2 3 4

0,99 0,0002 0,020 0,115 0,297

0,95 0,004 0,103 0,352 0,711

Probabilidade ( P ) 0,90 0,50 0,20 0,10 0,016 0,455 1,642 2,710 0,211 1,386 3,219 4,605 0,584 2,366 4,642 6,251 1,064 3,3571 5,989 7,779

0,05 3,841 5,991 7,815 9,488

0,01 6,635 9,210 11,345 13,277

0,001 10,827 13,815 16,266 18,467

Para obtenção da tabela completa da distribuição de qui-quadrado acesse http://www.cultura.ufpa.br/dicas/biometria

Imagine que está sendo testada uma hipótese de nulidade que é 2 verdadeira, embora isto não seja conhecido. Se o valor de χ c associado a 1GL for 0,0002, verificaremos (ver tabela 2) que a obtenção ao acaso de um valor maior ou igual a ele é bastante 2 provável (0,99), entretanto se o valor χ c associado a 1GL for de 10,827, poderemos concluir que é improvável obter ao acaso um valor maior ou igual a este (0,001). Imagine ainda outras situações nas quais, com base em uma hipótese de 1:1 (GL=1), obtivéssemos, respectivamente, os valores 2 2 de 9 e 0,9 para os χ c. No primeiro exemplo, χ c=9, o valor 9 para 1GL se encontra na tabela entre P=0,01 (6,635) e P=0,001 (10,827). Portanto a adequação desse resultado para uma hipótese 1:1 não é boa. Por outro lado, no segundo exemplo, o valor 0,9 para 1GL se encontra na tabela entre P=0,50 (0,455) e P=0,20 (1,642). Podemos, então, prever que desvios devidos ao acaso, iguais ou maiores que os observados, ocorreriam em 20 a 50% das tentativas. Os dados se ajustam à proporção 1:1. O valor calculado pode não estar nos extremos da distribuição da variável, então fixar o nível de significância é importante e deve ser estabelecido antes de o experimento ser realizado. É o risco que se corre de rejeitar uma hipótese verdadeira ou aceitar uma hipótese falsa. O nível de significância de 0,05 é geralmente escolhido como um padrão arbitrário, definindo desta maneira, que valores

1


21 menores que o tabelado são devidos ao acaso e valores maiores que o tabelado são improváveis de terem ocorrido ao acaso. Assim, se o valor calculado é maior que o tabelado, admite-se que os desvios entre os valores observado e esperado não são devidos ao acaso, rejeitando-se a hipótese de nulidade. Convencionaremos, então, que se houver uma probabilidade de menos de 5% de se observar um desvio do esperado, a hipótese será tida como falsa e rejeitada. Entretanto, se a hipótese obtiver um valor maior ou igual a 5% (P < 0,05), mesmo assim, não significa que a hipótese seja verdadeira e, sim, que os resultados são condizentes com a hipótese. Algumas vezes o nível de significância de 0,01 é utilizado. Neste caso, há uma probabilidade muito pequena (1%) de que uma hipótese verdadeira venha a ser rejeitada, em compensação existe uma grande chance de que uma falsa hipótese venha a ser aceita. Vale a pena lembrar: Geralmente usamos o nível de significância 0,05, embora os valores críticos da distribuição 2 do χ sejam variáveis 0,99-0,001. Vamos usar os dados de Mendel (tabela 3) para analisar hipóteses 2. com o teste do χ Tabela 3 - Números observados e esperados em diferentes classes fenotípicas Fenótipo das O E O-E (O-E)2 (O-E)2/E sementes 2,25 5,0625 Lisa e amarela 315 (9/16)x556= 312,75 0,0162 108

(3/16)x556= 104,25

3,75

14,0625 0,1349

Rugosa e amarela

101

(3/16)x556= 104,25

-3,25

10,5625 0,1013

Rugosa e verde Total

32 556

(1/16)x556= 34,75 556

-2,75 0

7,5625

Lisa e verde

1

0,2176 0,47

Hipóteses: H0: Os genes de ervilha que determinam a morfologia e a cor das sementes apresentam distribuição independente. H1: Os genes de ervilha que determinam a morfologia e a cor das sementes não apresentam distribuição independente. 2 1o passo: Calcular o χ

2 χ =∑ [ (o-e)2 /e] 2 χ = 0,0162 + 0,1349 + 0,1013 +0,2176 = 0,47


22 O valor calculado é próximo de zero. Não havendo motivo para rejeitar a hipótese, e mesmo que a hipótese seja verdadeira, não iremos obter as mesmas proporções. Quando os desvios entre os eventos esperados e observados são 2 pequenos, o χ se aproxima de zero, e o grau de concordância é bom. 2o passo: Definir os graus de liberdade 4 classes fenotípicas – 1 = 3; GL= 3 3o passo: Comparar o valor do 2c com o 2t Considerando o valor de P=0,05 e GL=3 o valor tabelado (2t) é de 7,815. 2c = 0,47 < 2t 7,815 4o passo: Análise da hipótese Aceita-se Ho. Entretanto, aceita-se que os desvios entre os valores observados e esperados são devidos, apenas, ao acaso e não, ao fato de os genes não terem distribuição independente. Fogem ao escopo deste fascículo explicações mais detalhadas sobre testes estatísticos. Para maiores detalhes sobre o teste do 2 e obtenção da tabela completa da distribuição de 2 acesse http://www.cultura.ufpa.br/dicas/biome/bioqui.htm ou http://www.ufv.br/dgb/gbol/htm/gbol23.htm

4- O IMPACTO DAS IDÉIAS DE MENDEL 4.1- HERANÇA TÊNUE X HERANÇA SÓLIDA Na época de Mendel, predominava a idéia da herança por mistura dos caracteres dos ancestrais, e o critério aceito era de que a herança não poderia ser estudada de modo científico ou estatístico. Mendel contribuiu de forma efetiva, para a erradicação da herança tênue ou por mistura. Ele enfatizou que, se os fatores paternos e maternos diferiam, eles jamais se fundiriam, mas se separariam sempre de novo, durante a formação da célula germinativa. Era a descoberta de que as partículas existem em conjunto (genes e seus alelos), o que reforçou a idéia da herança sólida ou particulada. Além disso, a constância da proporção 3:1 refutou o postulado de partículas múltiplas e afirmou o de uma única partícula. As conclusões de Mendel lançaram os alicerces para o desenvolvimento da Genética.

1


23 4.2- REDESCOBRIDORES DE MENDEL Em 1900, ocorreu um fato curioso na história da Biologia. Três botânicos, Hugo de Vries, Carl Correns e Tschermack, dentro de um espaço curto de meses, publicaram relatos sobre a descoberta de leis de hereditariedade, mas, ao compilar dados da literatura, descobriram que Mendel os havia antecipado 35 anos atrás. Seria injusto não acrescentar a esta lista o nome de Bateson, responsável pela tradução do trabalho de Mendel e publicação do mesmo no Journal of the Royal Horticultural Society em 1900. Bateson foi responsável juntamente com seus colaboradores por importantes contribuições para a nossa compreensão atual sobre hereditariedade, além de descobrir alguns desvios mendelianos, como a ligação incompleta e a poligenia.

4.3- TERMINOLOGIA E SIMBOLOGIA

1

Mendel utilizou símbolos na forma de letras para descrever os fenômenos hereditários e pôde analisar os resultados dos cruzamentos matematicamente. Isto foi uma conquista metodológica. Os símbolos representam os genes e seus alelos. William Bateson aperfeiçoou a escolha de símbolos gênicos e convencionou a notação na qual os alelos para características dominantes e recessivas de um determinado gene eram representados por uma única letra que indicava a característica mutante, como por exemplo, W para flores violetas e w para flores brancas. Bateson criou as palavras genética, alelomorfo (alelo), homozigoto e heterozigoto e introduziu a prática de indicar as gerações em esquemas como P, F1, F2. Entretanto, com as novas pesquisas, o número de genes identificados excedeu a capacidade do alfabeto e novas estratégias precisaram ser utilizadas, como utilizar duas ou mais letras para representar um gene (tabela 4). Com a descoberta dos alelos múltiplos, as letras começaram a ser associadas a expoentes, ou até mesmo, a símbolos hifenados associados a números para identificar alelos mutantes. Pesquisa da Fix: atualmente existem muitas notações representando genes e seus alelos. Pesquise diferentes tipos de notações em organismos modelos como, em Drosophila (moscadas-frutas), camundongo, humano, Arabidopsis (planta), Neurospora (fungo), e Escherichia coli (bactéria). Desafio da Fix: se ao invés de plantas diplóides sexuadas e características qualitativas, Mendel tivesse utilizado plantas com reprodução assexuada e características quantitativas, como, por exemplo, altura, ele não poderia ter deduzido as “leis da herança”. Discuta com seus colegas o porquê.


24 Tabela 4 - Alguns exemplos de simbologia utilizada na representação de genes Organismo Gene Fenótipo Gene Fenótipo selvagem mutante Bactéria Str S Sensível ao StrR Resistente a (E. coli) antibiótico estreptomicina estreptomicina Fungo arg-1+ Produz arginina arg-1 Não produz arginina (Aspergillus) Milho Wx Endosperma wx Endosperma amiloso ceráceo Tomate Y Cor vermelha y Cor amarela Asa verde, asa Besouro wb Asa azul w g; w t turquesa Y Camundongo A Pigmentação escura A Pigmentação amarela Carneiro a Pernas longas A Pernas curtas (raça Ancon) Humano Hb A Hemoglobina normal HbS Hemoglobina falcêmica Nos livros-texto indicados, existe uma significativa quantidade de exercícios que vocês podem resolver, embora estejamos propondo alguns exercícios para resolução imediata e envio das respostas para serem analisadas.

REVISANDO CONHECIMENTOS 1- Após completar o diagrama sobre as terminologias utilizadas na genética clássica você verá, na coluna em destaque, o nome de um famoso cientista. Comente brevemente sobre a importância do seu trabalho para a genética e a repercussão na comunidade científica. 1- Constituição genética de um organismo ou de uma célula. 2-Indivíduo que apresenta alelos diferentes para um determinado loco cromossômico . 3- Alelo que só expressa o seu efeito fenotípico, quando se encontra em homozigose. 4- Tipo de textura da semente da ervilha Pisum sativum.

1


25 5- A expressão do genótipo é visivelmente observada. 6- Cruzamento de um híbrido de F1 com um dos tipos parentais. 7- Cromossomos que formam bivalentes na meiose. 8- Cor da semente da ervilha observada como caráter recessivo. 9- Alelo que sempre expressa o seu efeito fenotípico, mesmo que esteja em heterozigose. 10- Tipo de cruzamento envolvendo dois genes. 11- Diferentes formas de um gene que ocorre em um determinado loco de um cromossomo. 12- Organismo ou célula com dois conjuntos de cromossomos (2n).

1


26 12-

3456-

789-

101112-

1


27 2- Suponha que você reproduziu alguns dos experimentos de Mendel, utilizando uma outra espécie de planta, na qual foi analisado o modo de herança para dois caracteres: Textura da folha (lisa ou rugosa) e borda da folha (crenada ou lobada). Partindo da geração parental, foi realizado o cruzamento entre duas plantas puras para estas características, sendo uma com folhas rugosas e crenadas e outra com folhas lisas e lobadas, obtendo-se, na geração F1, todas com folhas lisas e lobadas. Estas foram cruzadas entre si e você obteve, na geração F2 400 plantas, das quais 200 apresentaram folhas lisas e lobadas, 85, folhas lisas e crenadas, 85, folhas rugosas e lobadas e 30, folhas rugosas e crenadas. Com base nestes dados, desenvolva as questões: a) Quais as formas alélicas recessivas? Justifique sua resposta. b) Através do quadro de Punnett, demonstre todos os possíveis genótipos presentes na geração F2. c) Na geração F2, que proporção fenotípica se espera obter de cada tipo? Aplique o teste do qui-quadrado para verificar se os resultados obtidos estão de acordo com a hipótese de segregação independente.

1

3- Os genótipos abaixo estão constituídos de alelos compostos por cinco (5) genes de segregação independente. Através de um diagrama ramificado, demonstre os diferentes tipos de gametas que podem ser formados por cada genótipo. a) AABbCcDdEE b) AABBCcDdEe



Referências

Leitura fundamental GRIFFITHS, A. J. F.; WESSLER, S. R.; LEWONTIN, R. C.;GELBART, W. M.; SUZUKI, D. T.e MILLER, J. H. Introdução à Genética: Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S/A, 2006. Leitura complementar SNUSTAD, D. P. e SIMMONS M. J. Fundamentos de Genética: Guanabara Koogan S/A, 2000. HENING, R. M. O Monge no Jardim: O gênio esquecido e redescoberto de Gregor Mendel, o pai da genética. Rio de Janeiro: Rocco, 2001. Sites Sociedade brasileira de genética: http://www.sbg.org.br Mendel: http://www.monkinthegarden http://www.netspace.org/MendelWeb Geral: http://www.scholar.google.com Testes estatísticos: http://www.cultura.ufpa.br/dicas/biome/bioqui.htm e http://www.ufv.br/dgb/gbol/htm/gbol23.htm Genética Geral: http://www.ufv.br/dgb/gbol/

e



FASCÍCULO 2 Padrões de Herança

Profa Marília de França Rocha Colaboradoras - Maria Teresa Marquim N. Cornélio Rita de Cássia de Moura

Carga horária - 15h

INTRODUÇÃO Neste segundo fascículo, iremos dar continuidade à nossa jornada na construção do conhecimento genético. Convidamos vocês a conhecer os principais padrões de herança dos genes subjacentes às características genéticas. Características qualitativas ou descontínuas são condicionadas pela herança monogênica, enquanto as características quantitativas ou contínuas e

2

semicontínuas ou quase-contínuas fazem parte da herança de características complexas. Vamos nos familiarizar com heredogramas e sua interpretação. Aprenderemos, também, sobre padrões não-mendelianos de herança, como o mosaicismo, a herança organelar ou citoplasmática e a herança epigenética. Além disso, iremos observar as alterações das proporções mendelianas e discutir como ocorrem as interações gênicas.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Identificar as características que apresentam padrões de herança mendelianos e não-mendelianos; - Compreender como os fatores genéticos e ambientais influenciam a variação fenotípica.


32 PADRÕES DE HERANÇA Os distúrbios genéticos podem ser mendelianos (monogênicos) ou não-mendelianos (multifatoriais, mitocôndriais, cromossômicos, epigenéticos).

1- HERANÇA MONOGÊNICA 1.1- CARACTERÍSTICAS QUALITATIVAS No primeiro fascículo, vimos que os genes encontram-se nos cromossomos, e as características são ditas dominantes, ao se manifestarem no heterozigoto, e recessivas, quando não o fazem. Dominância e recessividade são, então, propriedades do fenótipo e não, do genótipo, embora muitas vezes tenham sido aplicadas aos genes. Características mendelianas, qualitativas ou descontínuas, estão restritas a um loco gênico, apresentam fenótipos contrastantes e distribuição populacional descontínua, praticamente sem efeito ambiental. Nos humanos, são conhecidas mais de 14 mil características mendelianas e o principal ponto de busca para maiores informações sobre estas características, seja de ordem patológica ou não, está na base de dados OMIM (Online Mendelian Inheritance in Man), catálogo criado por Victor McKusic continuamente atualizado e acessível em http://www3.ncbi.nlm.nih.gov/omim.

1.2- CONSTRUÇÃO DE HEREDOGRAMAS Os termos heredograma e árvore genealógica são alternativas para o termo pedigree, muito associado a animais. É através do estudo dos genes em genealogias que identificamos os padrões de herança, mas, considerando o tamanho limitado das famílias humanas, freqüentemente não temos a certeza do modo de herança de determinada característica, apenas, pela análise de uma única família. Como vocês podem perceber, não é fácil trabalhar com humanos, pois, além do tamanho da prole (quantidade de filhos) ser limitado, existem outras dificuldades e implicações éticas, tais como: a presença de doenças genéticas de manifestação tardia, a impossibilidade de fazer cruzamentos experimentais com humanos e, ainda, a forma de averiguação da família.

2


33 TERMINOLOGIA E SIMBOLOGIA Para a construção de heredogramas, vamos precisar aprender a empregar alguns símbolos adotados internacionalmente, como os observados na Figura 1. = Homem

2

= Mulher = Reprodução

4

= Número de filhos do sexo indicado

= Indivíduos afetados

= Genitores e filhos; 1 menino e 1 menina (em ordem de nascimento)

= Portadora de gene recessivo ligado ao X = Morte

= Dizigóticos (gêmeos não idênticos

= Aborto ou natimorto

= Propósito

= Monozigóticos (gêmeos idênticos)

2

I

II = Sexo não especificado

=Identificação de pessoas no heredograma: aqui o propósito é o filho 2 da geração II ou II.2

= Casamento consaguíneo

Fig 1- Simbologia internacional utilizada em heredogramas.

As gerações são numeradas em algarismos romanos. Os indivíduos da mesma geração (prole e pessoas fora da família com as quais se casam) são identificados por algarismos arábicos. Não é obrigatório representar o cônjuge, quando este não apresentar a característica em estudo (geralmente destacada na cor negra). Os filhos são colocados em ordem de nascimento da esquerda para a direita, e os números, dentro de quadrados (homem) ou círculos (mulher) indicam vários irmãos do sexo representado com igual fenótipo. Para a montagem de um heredograma, devemos contar, inicialmente, com informações obtidas através do probando (propósito ou caso índice), assinalado com uma seta - indivíduo da família que chama primeiro a atenção dos pesquisadores.


34 Heredogramas podem ser construídos com características normais (variantes fenotípicas), como a capacidade de dobrar ou não a língua, lóbulo da orelha livre ou aderente, dentre outras, onde não há nenhuma implicação clínica; ou montados a partir de características patológicas (doenças ou síndromes monogênicas). Na maioria das vezes, os heredogramas são construídos por motivos médicos e estão associados a distúrbios geralmente raros. Construção e análise de heredogramas são de fundamental importância na determinação do padrão de transmissão de um gene e tornam-se indispensáveis no aconselhamento genético.

1.3- TIPOS DE HERANÇA MONOGÊNICA É do conhecimento de vocês que os caracteres mendelianos podem ser determinados por locos em cromossomos autossômicos ou alossômicos (sexuais X ou Y). Características autossômicas (representadas apenas por letras) e características ligadas ao X (representadas por letras sobrescritas no X) podem ser dominantes ou recessivas. São dominantes, quando se manifestam em homozigose ou heterozigose (AA-Aa; XAXA-XAXa), e recessivas, quando se apresentam apenas em homozigose (aa; XaXa). Entretanto, as características ligadas ao X e ao Y exibem algumas peculiaridades. O macho, ao portar apenas um cromossomo X em suas células diplóides (XAY ou XaY), é dito hemizigoto. Para uma melhor compreensão das características ligadas aos alossomos, precisamos de alguns conhecimentos básicos da citogenética, tais como: geralmente, animais e plantas apresentam indivíduos masculinos ou femininos e, na maioria dos casos, o sexo é determinado por um par de cromossomos sexuais. Na nossa espécie, por exemplo, temos 46 cromossomos: 22 pares autossômicos e dois cromossomos sexuais. A fêmea apresenta dois cromossomos X e, por formar apenas um tipo de gameta contendo um cromossomo X é o sexo homogamético. O macho, por sua vez, apresenta um X e um Y (consideravelmente menor que o X), sendo capaz de formar dois tipos de gametas, portanto é o sexo heterogamético responsável pela determinação do sexo da prole. Em relação ao cromossomo Y, apenas os homens herdam seus genes, com os pais transmitindo genes, diretamente, para os seus filhos. Os três principais padrões de herança monogênica encontrados em humanos são: a herança autossômica dominante (AD), a herança autossômica recessiva (AR) e a herança ligada ao X recessiva (LXR). A herança ligada ao X dominante, por sua vez, é rara. Na Tabela 1, constam alguns exemplos de características humanas com herança autossômica ou ligada ao X.

2


35 Tabela 1: características humanas hereditárias monogênicas Condição clínica 1 Doença de Waardenburg I

Tipo de Efeito mutacional Herança Alteração no controle da transcrição (gene AD PAX3)

2 Acondroplasia (nanismo)

AD

3 Doença de Huntington

AD

4 Neurofibromatose I 5 Hipercolesterolemia familiar

AD AD

6 Fibrose cística

AR

7 Fenilcetonúria 8 Albinismo oculocutâneo 9 Doença de Tay-Sachs 10 Hipotireoidismo 11 Distrofia Muscular Duchenne 12 Daltonismo

AR AR AR AR LXR LXR

13 Hemofilia A

LXR

14 Hemofilia B

LXR

15 Síndrome de Lesch-Nyhan

LXR

16 X-Frágil

LXD

17 Incontinência pigmentar 18 Raquitismo hipofosfatêmico

LXD LXD

2

Mutação no receptor para o fator de crescimento de fibroblastos (FGFR3) Expansão repetida do códon CAG no gene para a huntingtina (proteína do sistema nervoso central) Alteração no gene supressor de tumor (Nf1) Receptores de LDL (lipoproteína de baixa densidade) deficientes ou ausentes Defeito em gene (CFTR) para proteína transmembrana Deficiência da enzima fenilalanina-hidroxilase Deficiência da enzima tirosinase Deficiência da enzima β -hexosaminidase Deficiência da enzima tiroxina Defeito em gene (DMD) para proteína distrofina Ausência de cones (células da retina) para a cor vermelha (Protanopia) ou verde (deuteranopia) Deficiência ou ausência do fator VIII da coagulação sanguínea Deficiência ou ausência do fator IX da coagulação sanguínea Deficiência da enzima hipoxantina-guaninafosforribosil-transferase Expansão repetida do códon CGG no gene FMR1 para uma proteína de ligação ao RNAm Alteração na deposição da melanina Defeito relacionado com a absorção intestinal do cálcio ou com a reabsorção do fósforo

Autossômica dominante (AD); Autossômica recessiva (AR); Ligada ao X recessiva (LXR); Ligada ao X dominante (LXD).

Vocês podem obter, na página da Sociedade Brasileira de Genética (SBG) – http://www.sbg.org.br, o E-book do prof. Bernardo Beiguelman, intitulado: “A interpretação genética da variabilidade humana”. O livro trata de caracteres, heredogramas e padrões de herança.

1.3.1- AUTOSSÔMICA DOMINANTE - AD Critérios para o reconhecimento de herança AD: A característica analisada: - ocorre em ambos os sexos; - é transmitida pelos dois sexos; - pode ser transmitida diretamente de homem para homem (de pai para filho);


36 - em geral, está presente em todas as gerações; - apresenta-se em, pelo menos, um dos genitores; - surge, em média, em 50% dos filhos afetados de um afetado. Na AD, um dos exemplos mais comuns é a polidactilia, que se caracteriza pela presença de um ou vários dedos supranumerários. Na hexadactilia, por exemplo, o sexto dedo extra se encontra freqüentemente situado após o quinto dedo (mínimo). A Figura 2 ilustra o heredograma parcial de uma família hipotética com uma doença autossômica dominante.

I

II

III Fig 2 - Heredograma parcial de uma família hipotética com uma doença autossômica dominante

1.3.2- AUTOSSÔMICA RECESSIVA - AR Critérios para o reconhecimento de herança AR: A característica analisada: - ocorre em ambos os sexos; - é transmitida pelos dois sexos; - pode ser transmitida diretamente de homem para homem (pai para filho); - salta gerações; - ocorre na prole de genitores não-afetados, geralmente heterozigotos e assintomáticos, freqüentemente consangüíneos; - genitores de afetados são geralmente heterozigotos assintomáticos; - surge, em média, em 25% dos irmãos de um afetado; - manifesta-se em irmãos (homozigoto), embora os pais e filhos de afetados (heterozigotos) sejam geralmente normais. Casais consangüíneos, além de apresentarem genes comuns à população, compartilham genes devido à ancestralidade.

2


37 A fibrose cística é um exemplo clássico para este padrão de herança e caracteriza-se por apresentar anormalidades nas secreções exócrinas, incluindo enzimas pancreáticas e duodenais, cloretos da transpiração e secreções brônquicas. A mutação afeta uma proteína receptora transmembrana, que influencia a viscosidade das secreções, o que, por sua vez, pode levar a uma doença pulmonar crônica. O coração, o pâncreas e o sistema reprodutor também podem ser atingidos. É comum ocorrer desnutrição e retardo de desenvolvimento. Na Figura 3, vemos o heredograma de uma família hipotética com uma doença autossômica recessiva. Observem a linha dupla, indicando casamento consangüíneo.

I

II

III

IV

2

Fig 3 - Heredograma parcial de uma família hipotética com uma doença autossômica recessiva

Observem o modo de transmissão vertical em que o pai passa o gene para filhos do sexo masculino, nos heredogramas para AD e AR.

1.3.3- LIGADA AO SEXO RECESSIVA - LXR Critérios para o reconhecimento de Herança LXR: A característica analisada: - não se distribui igualmente nos dois sexos, ocorrendo principalmente em homens; - não é transmitida de pai para filho, visto que o filho recebe o X da mãe;


38 - Em mulheres heterozigotas (portadoras), é transmitida para cerca de metade de seus filhos masculinos, que serão afetados, e metade de suas filhas, que serão igualmente portadoras. Esses critérios podem ser ilustrados na Figura 4 que mostra um heredograma de uma família hipotética, na qual está segregando um traço recessivo ligado ao X. Observe que todos os afetados são homens e filhos de mulheres portadoras. Note na Figura 5 a segregação dos alelos no cromossomo X.

I

II

III

IV

2

Fig 4 - Heredograma parcial de uma família hipotética com uma doença ligada ao X recessiva

a- I

XAY

A

a

XX

II

b- I

II XA Xa

XAXA

XA Y

Xa Y

Xa Y

Xa X a

XA Xa

XA Xa

X AY

Fig 5 - Segregação dos alelos do cromossomos X em cruzamentos. (a) mulher heterozigota (portadora) e homem normal (b) mulher heterozigota (portadora) e homem afetado.

Xa Y


39 Talvez o exemplo mais familiar de LXR seja a hemofilia clássica (tipo A). O defeito de coagulação sangüínea é causado pela ausência ou mau funcionamento de uma proteína da cascata de coagulação, chamada fator VIII. Atualmente a hemofilia pode ser tratada, antes era potencialmente fatal. Isto trouxe importantes implicações no curso da história, devido a sua ocorrência entre os descendentes da rainha Victória da Inglaterra, portadora do gene para essa doença. Para saber mais sobre hemofilia, consulte os livros indicados nas referências e os sites: http://www.drauziovarella.ig.com.br/entrevistas/hemofilia_ana .asp e http://www.google.com.

1.3.4 - LIGADA AO SEXO DOMINANTE - LXD Critérios para o reconhecimento de Herança LXD: A característica analisada:

2

- não se distribui igualmente nos dois sexos, ocorrendo, principalmente, em mulheres; - não é transmitida de pai para filho; - está presente em, pelo menos, um dos genitores de um afetado; - aparece de forma mais leve e variável nas mulheres afetadas do que nos homens (por causa da inativação do X); - no pai afetado é transmitida para todas as filhas, que serão afetadas e para nenhum dos filhos masculinos; - surge, em média, em 50% dos filhos de uma afetada, independentemente do sexo. A herança LXD pode ser confundida com a DA, entretanto ela se distingue através da descendência de homens afetados. Na LXD, todas as filhas de um pai afetado serão afetadas, e nenhum filho o será, diferentemente da AD, em que os filhos de ambos os sexos de um pai afetado poderão apresentar a característica. Existem poucos distúrbios conhecidos para esse tipo de herança, um deles é o raquitismo resistente à vitamina D, também conhecido como raquitismo hipofosfatêmico, caracterizado, principalmente, por hipofosfatemia, baixa estatura e arqueamento dos membros inferiores.


40 1.3.5- LIGADA AO Y OU HOLÂNDRICA Critérios para o reconhecimento de Herança ligada ao Y: A característica analisada: - só ocorre em indivíduos masculinos; - está presente no pai de um afetado; - surge em todos os filhos (masculinos) de um afetado. Até o momento, não foram demonstrados casos convincentes de variantes fenotípicas não sexuais associadas ao Y, e provavelmente, não existem doenças ligadas ao Y.

1.3.6- CARACTERÍSTICAS LIMITADAS OU INFLUENCIADAS PELO SEXO As características limitadas ou influenciadas pelo sexo representam formas especiais de herança autossômica. Na limitada ao sexo, a expressão restringe-se a, apenas, um dos sexos. Na puberdade precoce, em meninos, as epífises ósseas sofrem fusão precoce, resultando em um homem de baixa estatura. Na influenciada pelo sexo, por sua vez, a expressão do gene autossômico é influenciada por hormônios. Um exemplo clássico seria o da calvície humana, em que o gene se comportaria como dominante para os homens e recessivo para as mulheres.

ANÁLISE DE HEREDOGRAMAS Desafio da Fix: Você poderá tentar construir um heredograma da sua família com uma característica simples, como ter o lóbulo da orelha solto ou pregado. Para isto, você seguirá o roteiro da prática, tente incluir o maior número possível de indivíduos. Divirta-se.

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41 ROTEIRO DE PRÁTICA - FORMA DE HERANÇA (Fonte: Material produzido pelos professores Francisco de Assis Maia de Lima e Marília de França Rocha para o Curso de Aperfeiçoamento em Biologia para Professores de 2º Grau - Módulo de Genética e Evolução – Natal-RN, (1997) - com modificações e a permissão dos autores).

INTRODUÇÃO As pessoas diferem com relação à expressão de muitas características. Uns têm certas características herdadas tanto do pai quanto da mãe, mas algumas não ocorrem em nenhum dos genitores. São muitos os exemplos familiares, tais como cor dos olhos, tipo de cabelo, altura, inteligência, forma do lóbulo da orelha, grupos sangüíneos.

OBJETIVO Investigar o modo de transmissão da característica Lóbulo da orelha.

MATERIAL • A ser construído: • Heredograma

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• A ser preenchido: • Tabela • Questionário

PROCEDIMENTO 1 - Observe as orelhas dos seus pais, irmãos e parentes (se residirem na mesma cidade) e verifique se apresentam lóbulos aderente ou livre (figura). Anote os resultados na tabela.

Fig- Orelhas com lóbulos livres (a) e aderentes (b).


42 Ajuste a tabela para o número de indivíduos da sua família.

TABELA - Amostra familiar em relação ao tipo de lóbulo da orelha

LÓBULO Indivíduo 1 Avô paterno 2 Avó paterna 3 Avô materno 4 Avó materna 5 Pai TOTAL

Aderente

Livre

LÓBULO Indivíduo 6 Tio(s) paterno(s) 7 Tia(s) paterna(s) 8 Tio(s) materno(s) 9 Tia(s) materna(s) 10 Irmão (ã) TOTAL

Aderente

Livre

2 - De posse do levantamento, construa o heredograma da sua família quanto à característica, utilizando a simbologia adequada: 3- Analise os dados, preenchendo o questionário.

a) Qual das características (lóbulo livre ou aderente) pode saltar uma ou mais gerações?

d) Casais com lóbulos livres podem gerar filhos com lóbulos livres e aderentes?

( ) lóbulo livre

( ) Sim

( ) lóbulo aderente

( ) Não

b) Os indivíduos que apresentam lóbulos livres e) Casais com lóbulos aderentes podem gerar têm sempre o pai ou a mãe com lóbulos livres? filhos com lóbulos livres e aderentes? ( ) Sim

( ) Não

( ) Sim

( ) Não

2

c) Os indivíduos que apresentam lóbulos aderentes g) Qual o tipo da herança? têm sempre o pai ou a mãe com lóbulos aderentes? ( ) Sim

( ) Não

( ) AR

( ) AD

Vamos fazer uma amostra das genealogias feitas pela turma? Combinem uma exposição com o tutor. Disponibilize o seu heredograma (se for da sua vontade) ou o heredograma de um dos componentes do grupo. Você pode ou não incluir fotos de sua família. Envie o questionário para que ele possa ser pontuado.

2- HERANÇA NÃO-MENDELIANA Abordaremos algumas condições nas quais não são observados os padrões de herança mendeliana.

( ) LXR

( ) LXD


43 2.1- HERANÇA DE CARACTERÍSTICAS COMPLEXAS Os distúrbios multifatoriais são ocasionados pela combinação de efeitos aditivos de genes e fatores ambientais. Abrangem a maioria das malformações congênitas isoladas (não sindrômicas) e diversas doenças comuns da fase adulta. As malformações congênitas mais freqüentes envolvem o sistema nervoso central, o cardiovascular, o esqueletal e o urinário. No sexo masculino, predominam o lábio leporino com ou sem palato fendido, a estenose pilórica, talipes equinovarus e malformações cardíacas, enquanto no feminino, as mais comuns são a anencefalia com ou sem espinha bífida, palato fendido isolado, deslocamento congênito do quadril, talipes calcaneus valgus, talipes metatarsus varus e pé postural. Diabetes, hipertensão, doença coronariana, cardiopatia isquêmica e outros distúrbios cardiovasculares, febre reumática, cárie dentária, transtornos do humor (depressivos, bipolares, esquizofrenia), transtornos relacionados ao álcool, transtornos de ansiedade (pânico, fobias, transtorno obsessivo compulsivo, doença de Alzheimer) são exemplos de doenças comuns da meiaidade e de transtornos comuns psíquicos.

2

Foge ao nosso objetivo dar descrições das doenças relacionadas. Para maiores informações, consultar os livros “Genética Humana” de Borges-Osório e Robinson, 2001, “Thompson e Thompson – Genética Médica” de Nussbaum, McInnes e Willard, 2002. Vocês t a m b é m p o d e m c o n s u l t a r o s s i t e s : h t t p : / / w w w. s c h o l a r. g o o g l e . c o m e http://www.images.google.com.br para o tema malformações, http://www.diabetes.org.br e http://www.sbh.org.br para as doenças comuns diabetes e hipertensão, respectivamente. Para t r a n s t o r n o s p s í q u i c o s , a c e s s a r http://www.neurociencias.org.br/Home.php e clicar em O que é?..

2.1.1- CLASSIFICAÇÃO Características quantitativas contínuas - estão distribuídas em diferentes genes e em vários locos gênicos, cada um com pequenos efeitos sobre a característica; - apresentam mudanças quantitativas mensuráveis (efeito aditivo); - distribuição populacional contínua e bastante influenciada pelo ambiente.


44 Características quantitativas descontínuas - estão distribuídas em diferentes genes e em vários locos gênicos, onde alguns locos podem desempenhar papel mais importante que outros; - apresentam distribuição populacional descontínua, com influência ambiental variável.

2.1.2- CRITÉRIOS PARA O RECONHECIMENTO - As características multifatoriais se distribuem na população, de acordo com uma curva normal; - Os genes sofrem efeito do ambiente; - A herdabilidade indica qual o papel dos genes na determinação de um fenótipo; - Pais normais com criança afetada apresentam risco aumentado de ter uma segunda criança afetada; - Os riscos de recorrência aumentam, quando um membro da família é afetado (parentes em primeiro grau).

2.2- HERANÇA DE GENES ORGANELARES OU HERANÇA CITOPLASMÁTICA A herança de genes organelares envolve o DNA de organelas citoplasmáticas com capacidade replicativa, mitocôndrias e plastídios. As mitocôndrias são encontradas em animais e vegetais. Os plastídios são exclusivos dos vegetais, dos quais os mais importantes são os cloroplastos. O genoma mitocondrial é pequeno em relação ao nuclear, contudo, responsável por ocasionar doenças genéticas humanas transmitidas, exclusivamente, por mulheres (herança mitocondrial). Ao ocorrer uma mutação no genoma mitocondrial, uma pessoa pode apresentar duas populações mitocondriais distintas, uma com a mutação e outra sem. A isso, chamamos de heteroplasmia, causa significativa da variabilidade na expressão clínica de doenças mitocondriais. Os distúrbios mitocondriais caracterizam-se geralmente por problemas musculares e cerebrais. Temos como exemplos: a neuropatia óptica hereditária de Leber (LHON, perda visual progressiva e cegueira) e a síndrome de Kearns-Sayre (fraqueza dos músculos cardíaco e esquelético da face, tronco e extremidades), dentre outras..

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45 O programa GBOL disponível no site http://www.ufv.br/dgb/gbol apresenta texto e aplicativo com uma série aleatória de exercícios, tendo como exemplos: o feijão, a Mirabilis jalapa (planta) e a Limnaea peregra (caramujo). O usuário pode avaliar se as respostas apresentadas estão corretas, clicando no botão Corrigir ou acessar as respostas corretas através do botão Responder.

2.3- MOSAICISMO Mosaicismo é a presença de duas ou mais linhagens celulares geneticamente diferentes, oriundas de um mesmo zigoto, podendo ocorrer no indivíduo ou em um dos seus tecidos. O mosaicismo pode ser cromossômico ou gênico e acontecer na linhagem somática ou germinativa. Se incidir na linhagem somática, só haverá prejuízo para o organismo, se a mutação ocasionar um câncer, ou se o evento ocorrer no embrião inicial, afetando uma parte significativa do organismo como um todo. Assim, o indivíduo poderá apresentar sinais clínicos de uma doença. Mutações na linhagem germinativa, por sua vez, podem causar uma doença no filho de um casal normal, sem história familiar prévia para essa mutação. As alterações cromossômicas também exemplificam a herança nãomendeliana, mas serão vistas detalhadamente na disciplina de Citogenética.

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2.4- HERANÇA EPIGENÉTICA Este tipo de herança é devido a modificações herdáveis no funcionamento dos genes que não sejam decorrentes de mudanças na seqüência de bases do DNA do organismo. Temos como exemplos: o imprinting parental, a inativação do cromossomo X e a paramutação. Estes dois últimos exemplos serão vistos, respectivamente, nas disciplinas de Citogenética e Genética Molecular.

2.4.1- DISSOMIA UNIPARENTAL E IMPRESSÃO GENÔMICA A dissomia uniparental representa uma exceção à primeira lei de Mendel, pois apenas um dos genitores contribui com seus alelos para um determinado fenótipo.


46 A impressão genômica ou imprinting parental é caracterizada por genes homólogos, com diferentes expressões fenotípicas, devido à origem parental. Desta forma, alguns genes só se expressam, quando herdados de um dos genitores. As síndromes de Angelman (pouca coordenação muscular, mandíbula grande, risos incontroláveis, retardo mental grave) e de Prader-Willi (obesidade, ingestão incontrolável de comida, baixa estatura, graus variados de retardo mental) ilustram bem estas duas condições. O gene para estas síndromes está situado no braço longo do cromossomo 15 (na mesma região 15q11-q13), porém a forma como ele é herdado ocasiona uma delas. Na síndrome de Angelman, há uma dose dupla paterna (dissomia uniparental) ou deleção materna; na síndrome de Prader-Willi, a dose dupla é materna (dissomia uniparental), e a deleção é paterna. Ainda não existe uma boa compreensão do controle genético, envolvendo a impressão genética, embora alterações da estrutura da cromatina e metilação tenham sido propostas como possíveis mecanismos. Para saber mais, acesse: http://www.neurociencias.org.br/Home.php e clique em O que é?

3- VARIAÇÕES NA EXPRESSÃO DOS GENES Algumas variações na expressão dos genes freqüentemente distorcem o padrão mendeliano básico.

3.1- INTERAÇÕES ENTRE ALELOS 3.1.1- ALELOS MÚLTIPLOS Quando uma característica apresenta mais de dois alelos diferentes para o mesmo loco, dizemos que se trata de alelismo múltiplo. Um exemplo clássico é o do grupo sangüíneo ABO, determinado por três alelos de um gene que interagem, para produzirem os quatro tipos de fenótipos desse sistema. Os alelos IA e IB determinam, respectivamente, os antígenos A e B, embora Ii seja um alelo nulo e não produza proteína antigênica. Dessa forma, IA e IB são dominantes em relação ao alelo Ii.

2


47 Genótipo IAIA, IAIi IBIB, IBIi IAIB I iI i

Fenótipo A B AB O

Antígenos A B AB Falta de proteína antigênica

Anticorpos Anti-B Anti-A Não produz Anti-A e Anti-B

Outros exemplos conhecidos são os alelos para a cor da pelagem de coelhos (Aguti, Chinchila, Himalaia e Albina) e de ratos (Cinza, Amarela, Preta). Em alguns casos especiais, pode haver mais de 50 alelos para um único gene, embora apenas duas formas alélicas sejam herdadas e se expressem. Isso pode ser observado em certos genes de compatibilidade nas plantas e genes de histocompatibilidade nos vertebrados. Em humanos, temos, por exemplo, o sistema HLA – antígeno leucocitário humano.

3.1.2- CODOMINÂNCIA Na codominância, ambos os alelos de um par de genes se expressam independentemente no heterozigoto. No exemplo acima, vimos que no genótipo IAIB cada um dos alelos (IA e IB) produz seu próprio antígeno, logo eles dem.onstram uma relação de codominância. O grupamento sangüíneo MN também exemplifica esta situação.

3.1.3- DOMINÂNCIA INCOMPLETA

2

Na dominância incompleta, o heterozigoto apresenta um fenótipo quantitativamente intermediário aos homozigotos. Nas plantas maravilha, também conhecidas como quatro-horas, quando uma linhagem pura com pétalas vermelhas (c+c+) é cruzada com uma linhagem pura de pétalas brancas (cc), a F1 (c+c) apresenta um fenótipo de pétalas rosa. Ao haver autofecundação das plantas F1, surge uma F2 com o seguinte resultado: ¼ pétalas vermelhas : ½ pétalas rosa : ¼ pétalas brancas. Ao invés de uma proporção fenotípica de 1:3, temos a proporção 1:2:1.

3.1.4- ALELOS LETAIS Alguns alelos mutantes são capazes de causar a morte de um indivíduo e são conhecidos como alelos letais. Provavelmente, temos uma quantidade significativa desse tipo de alelo em nossos genomas, embora a maioria destes seja letal recessivo.


48 Em humanos, um exemplo de letal dominante é a acondroplasia (AD), tipo de nanismo genético mais freqüente. Pessoas não acondroplásicas são de genótipo aa, acondroplásicos são heterozigotos (Aa), e, em homozigose AA, o gene é letal, causando morte geralmente nos primeiros meses de idade. A capacidade reprodutiva dos afetados é reduzida em 20% do normal. Dessa forma a maioria dos casos observados é esporádica e causada por mutação nova. As síndromes de Rett e Aicardi são alguns exemplos de LXD, descritas, exclusivamente, em mulheres, consideradas letais no sexo masculino.

3.1.5- EPISTASIA A epistasia é uma situação na qual um gene mascara o efeito de outro, ou seja, um gene que exerce sua expressão, cancelando a expressão de alelos de outro gene. Vamos retomar o exemplo do sistema ABO. Para formar os antígenos A e B, precisamos da informação dos alelos IA e IB. Mas, para que isso aconteça, antes, fazse necessária a presença de um gene precursor de antígeno, em que o alelo H forma o precursor, e o alelo h não forma o precursor.

Gene precursor de antígeno HH, Hh HH, Hh HH, Hh HH, Hh hh

Gene para antígenos A e B

Fenótipo

IAIA, IAIi IBIB, IBIi IAIB ii II

A B AB O

2

IAIA, I AIi, IBIB, IBIi, I AIB, I iIi

Dessa forma, se um indivíduo tiver a informação para um determinado tipo sangüíneo (IA e/ou IB), e não para o precursor (hh), ele não poderá formar o antígeno e será um falso O. Este exemplo é conhecido como fenótipo Bombaim, por ter sido observado pela primeira vez, em Bombaim, na Índia. Um outro exemplo de epistasia recessiva é a cor da pelagem em cães Labrador, determinada pelos alelos B e b, representando as cores preta e marrom, respectivamente. O alelo e de outro gene é epistático sobre os alelos B e b, conferindo uma pelagem amarela,

Falso O (Bombaim)


49 por impedir a deposição de pigmento na pelagem do animal. Assim os genótipos B-ee e bbee produzem cães de pêlo amarelo, B-Ecães de pêlo preto e bbE- cães de pelo marrom, produzindo uma proporção fenotípica de 9 (preto): 3 (marrom): 4 (amarelo). A epistasia demonstra a interação entre os genes, de alguma via bioquímica ou desenvolvimental.

3.1.6- SUPRESSORES E MODIFICADORES Genes supressores revertem o efeito de uma mutação de outro gene, restaurando o fenótipo selvagem. Nos genes modificadores, uma mutação altera um segundo loco gênico, mudando a expressão de um gene mutado anteriormente, em um primeiro loco. A supressão, às vezes, é confundida com a epistasia. Entretanto, a proporção modificada indica o tipo de interação. Na mutação supressora, em geral, apenas dois fenótipos segregam, enquanto, na epistasia, três fenótipos segregam (ver exemplo do Labrador). Para maiores detalhes de interações de alelos de um gene ou entre genes consultem o capítulo seis (6) do livro “Introdução à Genética” de Grifffiths e colaboradores, 2006, e acessem o site http://www.ufv.br/dgb/gbol.

3.2- PENETRÂNCIA E EXPRESSIVIDADE

2

A penetrância de uma característica pode ser definida como: a probabilidade de que uma pessoa com o genótipo estudado manifeste esta característica. Em heranças dominantes, a penetrância reduzida (ou incompleta) pode ser um complicador na avaliação de heredogramas, pois a característica salta gerações. A penetrância é como um jogo de tudo ou nada, a característica é ou não expressa. A característica pode ter expressividade variável, manifestando desde o fenótipo mais leve ao mais grave, em diferentes indivíduos. Na síndrome de Waardenburg, os pacientes apresentam alteração do pigmento (pele, cabelo, olho), deficiência auditiva e anomalias discretas da face. Diferentes membros da mesma família podem mostrar distintos aspectos da síndrome (fig. 6), podendo oscilar desde a perda moderada de audição e mecha branca capilar até a surdez profunda, nariz com ponte alta e larga, heterocromia da íris (olho direito e esquerdo com cores diferentes) e grisalhamento prematuro do cabelo. Esta variabilidade pode ser decorrente de efeitos ambientais, genes modificadores e heterogeneidade genética.


50

http://www.atlas-of-ophthalmology.com/ atlasimg/6_106212145428_low_thumb.jpg

http://www.salud.gob.mx/unidades/pediatria/Imagenes/SW3.jpg

Fig 6 - Aspectos variáveis da Síndrome de Waardenburg

3.3- HETEROGENEIDADE GENÉTICA Na heterogeneidade genética, diferentes tipos de mutação no mesmo loco ou em diferentes locos produzem fenótipos semelhantes. A surdez congênita hereditária é decorrente, na maioria dos casos (75%), a genes autossômicos recessivos (locos diferentes), e em menor proporção de genes autossômicos dominantes (3%) e de genes recessivos ligados ao sexo (2%). O mecanismo de ação dos genes varia, afetando diferentes partes do ouvido interno, todavia, todos resultam no mesmo fenótipo, surdez. Vale destacar que, além dos aspectos genéticos, fatores adquiridos, como meningite, rubéola materna, infecções do ouvido, dentre outros, podem causar a deficiência auditiva.

3.4- ANTECIPAÇÃO E IDADE DE MANIFESTAÇÃO A antecipação é a tendência de algumas características surgirem mais cedo e com maior gravidade, a cada geração subseqüente. Este fenômeno parece estar ligado ao aumento de repetições de trinucleotídeos. Estas repetições ocorrem normalmente em vários genes e em número variável. Quando este número ultrapassa a normalidade surgem doenças. Um exemplo é a Distrofia miotônica, doença sistêmica variável com disfunção muscular característica. Imaginem uma mãe afetada discretamente (com 250 repetições CTG) e ao gerar um filho (com mais de 1.000 repetições CTG), esse apresenta graves dificuldades cardio-respiratórias, chegando a falecer nas primeiras semanas de vida. Todos os indivíduos têm um número adequado de repetições de trincas de nucleotídeos, neste caso CTG, mas algumas pessoas, ao se reproduzirem, podem passar adiante uma repetição maior que a normal, acarretando maior gravidade à doença, de forma que a cada geração a doença tende a se manifestar mais precocemente.

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51 Outros exemplos seriam a Síndrome do X-frágil, retardo mental com vários sinais físicos, cujo triplete de bases seria o CGG, e a Doença de Huntington, doença degenerativa do sistema nervoso central, com a seqüência repetida CAG. Em relação à idade de manifestação, uma doença pode estar presente desde o nascimento (Acondroplasia), manifestar-se no início da infância (Distrofia muscular de Duchenne), na adolescência ou idade adulta (Doença de Huntington) e na terceira idade (Doença de Alzheimer). Vamos usar a doença de Alzheimer como exemplo. Essa doença afeta cerca de 5% das pessoas com mais de 65 anos e aproximadamente 20% daquelas com mais de 80 anos. Há perda progressiva de memória, seguida por distúrbios do comportamento e deterioração cognitiva generalizada. Embora seja uma doença de início tardio, em raras ocasiões, essa doença pode ocorrer em idade precoce, sendo geralmente autossômica dominante, enquanto a de início tardio não o é. Se você quiser ter uma idéia do que significa uma doença dessas para uma família, assista a um dos filmes lançados nos anos de 2001: Íris, Uma canção para Martin, O filho da noiva e 2004: Diário de uma paixão.

3.5- PLEIOTROPIA

2

Cada gene apresenta um efeito primário e, a partir deste, podem surgir diversas conseqüências. A pleiotropia é ocasionada pelos efeitos múltiplos produzidos por um único gene. Algumas doenças metabólicas genéticas exemplificam bem esta situação. Mutações gênicas causadoras de defeitos enzimáticos bloqueiam vias metabólicas específicas e acarretam subseqüentemente, acúmulo de substratos e deficiências de produtos. O efeito primário da fenilcetonúria é a deficiência da enzima fenilalanina-hidroxilase, e seus efeitos secundários são: retardo mental, excreção de fenilcetonas na urina, pigmentação clara e odor de mofo. Entretanto, estes efeitos secundários podem ser evitados, se a doença for diagnosticada a tempo. Isto é feito através do conhecido exame do pezinho. Vocês já devem ter percebido que os rótulos de alimentos trazem várias informações. Isto é importante, pois algumas pessoas têm restrições a determinadas substâncias. Alimentos light reduzem o teor de gordura, alimentos diet reduzem o açúcar, alguns cereais matinais alertam: contém glúten, nos refrigerantes avisam: atenção contém fenilalanina e assim por diante. No caso do nosso exemplo,


52 a fenilcetonúria, o tratamento com dieta pobre em fenilalanina deve ser iniciado no primeiro mês de vida e mantido, sem interrupção, pelo menos, ao longo da infância e adolescência. Por ser um aminoácido essencial, a fenilalanina não pode ser removida, totalmente, da dieta. Pesquisa da Fix: Faça uma pesquisa na internet sobre o teste do pezinho e sua importância no diagnóstico de doenças e, em especial, a fenilcetonúria. Discuta com seus colegas. Desafio da Fix: Assistam ao filme “O óleo de Lorenzo”. O filme pode ser encontrado nas locadoras, sob a forma de fita ou DVD. Bom filme e boa pesquisa ! Em 1984, Michaela e Augusto Odone descobrem que Lorenzo é portador de uma doença grave, a adrenoleucodistrofia (ALD). Seus pais, então, iniciam uma luta para salvá-lo. Começam a estudar genética, fisiologia, bioquímica, promovem simpósios e tentam várias dietas na intenção de descobrir a cura da ALD. A ALD ocorre devido a uma ß oxidação pobre ou colapso dos ácidos graxos no peroxissoma. A enzima que degrada estes ácidos é produzida no citoplasma (ribossomos livres) e, então, é enviada, através da membrana do peroxissoma, até o lúmen dessa organela. A primeira enzima no caminho da degradação da longa cadeia de ácidos graxos é a Coa (coenzima A). Esta enzima catalisa a adição de acetil-CoA para as cadeias longas de ácidos graxos, e a degradação depende desse primeiro passo. Pesquisas recentes mostraram que a ALD não é devida a uma síntese deficiente de VLCFA-CoA, (VLCFA = very long chain fatty acids, = ácidos graxos de cadeia longa) e, sim, devido a um transporte deficiente de uma proteína que move a VLCFA através da membrana do peroxissoma. Fórum sobre o filme O óleo de Lorenzo: No filme, quando Peter Ustinov diz a Michaela que “ALD é passada só através da mãe”, o médico percebe o impacto da informação e diz a Michaela que ela não deveria se sentir culpada pela doença de Lorenzo. Michaela tinha um alelo dominante normal e um alelo recessivo com a mutação, mas ela não desenvolvia a doença porque o alelo dominante fazia um transportador que atuava no peroxissoma. Pesquisem: Sobre outros tipos de ALD. Descubram o destino do rapaz. Quem está tomando conta dele, como ele faz para se comunicar, qual dos pais já faleceu, o que a família está fazendo em relação às pesquisas com bainha de mielina?, etc.

2


53 Respondam: - Qual o tipo de herança da ALD? - Quais são os outros tipos de ALD? - Como se encontra Lorenzo atualmente?

REVISANDO OS CONHECIMENTOS 1- Muitas doenças genéticas têm o padrão de herança já bem estabelecido. Embora nestes casos o fator determinante para a expressão da doença seja genético, muitos avanços científicos têm conseguido dar aos indivíduos uma vida melhor e, mesmo, prolongar a longevidade. O aconselhamento genético e o acompanhamento do paciente são fatores fundamentais para a família. O texto abaixo fala sobre uma dessas doenças: a Distrofia Muscular de Duchenne (DMD).

2

“ Até os três anos, Lucas jogava bola e brincava como qualquer criança saudável. Aos poucos, sua mãe começou a perceber que o menino caía com freqüência, apoiava-se nas pernas e na cintura para se levantar e andava nas pontas dos pés. Ela procurou os médicos e descobriu o diagnóstico do filho: Distrofia Muscular de Duchenne, uma doença genética degenerativa e sem cura...Lucas hoje tem 18 anos. Está vivo e anda com as próprias pernas...Apesar de pouco conhecida, a Distrofia Muscular de Duchenne é a mais comum entre as doenças genéticas fatais. O gene defeituoso é transmitido pela mãe. A doença só se manifesta em meninos. Os músculos do corpo se degeneram e progressivamente vão perdendo a mobilidade, devido à produção insuficiente de uma proteína chamada distrofina, componente da fibra muscular...” Modificado e adaptado da revista Época, outubro de 2006. As informações apresentadas na reportagem podem ser bem entendidas por qualquer leitor, entretanto você como futuro biólogo poderá compreendê-las e interpretá-las com maiores detalhes! I- Qual o provável padrão de herança desta doença? a) Autossômica dominante b) Autossômica recessiva c) Dominante ligada ao sexo d) Recessiva ligada ao sexo e) Ligada ao Y


54 II- Das afirmativas abaixo, qual pode justificar (ou explicar) a alternativa assinalada por você na questão I? a) O gene defeituoso é transmitido pela mãe, podendo ela ser portadora e não expressar a doença. b) Como o gene é transmitido pela mãe, todos os descendentes do sexo masculino manifestarão a doença. c) A doença somente se manifesta em meninos, pois a mãe transmite este gene apenas para os filhos do sexo masculino. d) O gene defeituoso tanto pode estar presente na mãe como também no pai, portanto independente do sexo, o gene irá se manifestar igualmente. e) O gene é responsável por uma proteína chamada distrofina, presente nas células somáticas, sendo, portanto, transmitido através de um autossomo. Pesquisa da Fix: Pesquise, na Net, informações sobre o quadro clínico, prognóstico, forma de tratamento e grupos de pesquisa que estudem a DMD no Brasil. 2- O heredograma a seguir representa o estudo de uma família em que alguns indivíduos apresentam polidactilia (dedos extras), característica de herança autossômica dominante com penetrância reduzida. Analise-o e assinale a alternativa correta.

1

I

II

1

2

1

2

3

4

4

5

2

5

6

7

III 3

6

7

8

9

a) O indivíduo II2 deve conter o gene em estudo, por ser do sexo masculino e por sua filha ter expressado a característica. b) Não há possibilidade de o casal III3 X III4 ter um filho que expresse este caráter. c) O indivíduo II8 deve conter o alelo em questão, porém este não se expressou.

2 8

10

11

12

9

13

14

15


55 d) Os indivíduos I1, II1 e III14 são homozigotos. e) O indivíduo II5 é homozigoto para o caráter em estudo. 3- Sobre os tipos de relações entre alelos de um mesmo gene ou genes diferentes, marque a alternativa que faz a correta associação.

Tipo de relação A - Dominância

B - Co-dominância C - Epistasia

D - Alelos múltiplos

E - Dominância incompleta

Característica / conceito

Exemplo

1- Os dois alelos se expressam, produzindo, I- Alelos relacionados com a cor no heterozigoto, fenótipos (ou características) da pelagem em cães Labrador: que estão presentes em ambos os preta, marrom e amarela. homozigotos (dominante e recessivo). 2- Um dos alelos sempre expressa o seu efeito, II- Alelos para a forma da semente da seja na condição homozigota ou heterozigota. ervilha Pisum sativum: lisa e rugosa. 3- Mais de dois tipos de alelos diferentes para III- Alelos para a cor das pétalasum mesmo loco. Todos os tipos contribuem vermelha, branca ou róse a, na planta Boca-de-Leão –Antirrhinum para um mesmo caráter. majus. 4- Os dois alelos se expressam, produzindo, IV- Série de alelos que codificam no heterozigoto, fenótipo intermediário ao os antígenos para o sistema presente nos homozigotos (dominantes e sangüíneo ABO. recessivos). 5- Alelos de um gene impedem ou inibem a V- Alelos para o sistema expressão de um ou mais pares de alelos sangüíneo MN. de outros genes.

2

a) A 2 V, B 5 IV, C 1 II, D 3 I, E 4 III b) A 2 II , B 1 V, C 5 I, D 3 IV, E 4 III c) A 5 I, B 4 III, C 3 IV, D 1 II, E 2 V d) A 4 V, B 5 II, C 3 IV, D 2 III, E 1 I e) A 4 III, B 1 II, C 2 I, D 5 IV, E 3 V



Referências

Leitura fundamental GRIFFITHS, A. J. F.; WESSLER, S. R.; LEWONTIN, R. C.;GELBART, W. M.; SUZUKI, D. T.e MILLER, J. H. Introdução à Genética: Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S/A, 2006. NUSSBAUM, R. L., McINNES, R. R. e WILLARD, H. F. Thompson e Thompson – Genética Médica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S. A., 2002. BORGES-OSÓRIO, M. R. e ROBINSON, W. M. Genética Humana. Porto Alegre: Artmed, 2001. SNUSTAD, D. P. e SIMMONS M. J. Fundamentos de Genética: Guanabara Koogan S/A, 2001. Leitura complementar: E-book - BEIGUELMAN B. A interpretação genética da variabilidade humana. (www.desvirtual.com/bbeiguel/e-book) Sites Gerais: http://www.google.com OMIM: http://www3.ncbi.nlm.nih.gov/omim Genética Geral: http://www.ufv.br/dgb/gbol Sociedade Brasileira de Genética: http://www.sbg.org.br Hemofilia: http://www.drauziovarella.ig.com.br/entrevistas/hemofilia_ana.asp M a l f o r m a ç õ e s : h t t p : / / w w w. s c h o l a r. g o o g l e . c o m e http://www.images.google.com.br Diabetes: http://www.diabetes.org.br Hipertensão: http://www.sbh.org.br Transtornos psíquicos: http://www.neurociencias.org.br/Home.php



FASCÍCULO 3 Base Cromossômica da Herança e Mapeamento Gênico Profa Marília de França Rocha Colaboradoras - Maria Teresa Marquim N. Cornélio Rita de Cássia de Moura

Carga horária - 15h

INTRODUÇÃO

3

Neste terceiro fascículo, compreenderemos como os fatores abstratos (genes), postulados por Mendel, foram localizados e mapeados em cromossomos da mosca das frutas (Drosophila melanogaster), por Thomas Morgan e seu grupo. Veremos um pouco do desenvolvimento histórico da teoria cromossômica da herança, da evidência da ligação e da segregação cromossômica anormal (não-disjunção), que ocasiona anomalias da herança. Faremos uso da análise de crossing, para mapear as posições dos genes nos cromossomos.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Compreender a base cromossômica do mendelismo e os procedimentos para o mapeamento gênico por freqüência de recombinação.

BASE CROMOSSÔMICA DA HERANÇA E MAPEAMENTO GÊNICO Na história da genética, podemos destacar dois períodos: o primeiro, do ano de 1900 até 1909, no qual ocorreu a redescoberta do trabalho de Mendel e do início da validação da hereditariedade mendeliana; o segundo, a partir de 1910, quando tiveram início os estudos da natureza e arranjo dos genes nos cromossomos.


60 1- BASE CROMOSSÔMICA DO MENDELISMO No primeiro fascículo, percebemos que os resultados de Mendel ficaram “desconhecidos” para a comunidade científica até 1900, pois muitos pesquisadores não estavam cientes desse trabalho, apesar do interesse na hereditariedade. Uma questão importante para essa época era a localização do material hereditário na célula. Os locais mais óbvios para iniciar a investigação seriam óvulos e espermatozóides. O núcleo foi considerado um bom local para abrigar o material hereditário, visto que ocorre uma grande diferença de volume entre os citoplasmas dessas células (fig. 1).

Fhttp://www.reprodusite.hpg.ig.com.br/fertilizacao_1.jpg Fig 1- Gametas feminino e masculino. Note a diferença de tamanho ocasionada pelo volume desigual de citoplasma.

1.1- A TEORIA CROMOSSÔMICA DA HERANÇA Em 1840, os cromossomos já haviam sido observados por diversos cientistas, embora apenas, em 1888, o anatomista alemão W. von Waldeyer tenha compreendido o que estava observando e os nomeou de cromossomos, que significa corpos coloridos.

3


61 No ano de 1902, Walter Sutton, um estudante da Universidade de Columbia (Estados Unidos), observou que o agrupamento de cromossomos paternos e maternos em pares, no momento da formação do zigoto, e sua subseqüente separação a cada divisão celular (mitose ou meiose) eram a prova da continuidade cromossômica e poderiam constituir a base física para a lei da hereditariedade de Mendel. Nesta mesma época, Theodor Boveri, professor de Zoologia e Anatomia comparativa da Universidade de Würzburg (Alemanha), estava trabalhando com uma espécie de ouriço-do-mar e produzindo embriões com números variáveis de cromossomos. Segundo Boveri, apenas aqueles que possuíam 36 cromossomos apresentavam desenvolvimento normal, e cada cromossomo possuía, então, uma “qualidade diferente” ou individualidade. Desta forma, o número de pares de cromossomos seria o mesmo para todos os indivíduos da mesma espécie. A individualidade (Boveri) dos cromossomos nas espécies complementava a continuidade (Sutton) dos cromossomos nas gerações sucessivas de células. Esses trabalhos uniram esses dois pesquisadores em uma das idéias mais revolucionárias da biologia do século XX: “A teoria de Sutton-Boveri da hereditariedade por meio de cromossomos” ou simplesmente teoria cromossômica da herança, que forneceu uma estrutura unificadora para todos os estudos sobre a herança.

3

A combinação da evidência citológica com os temas da genética, feita por Montgomery, Correns, Wilson, Sutton e Boveri, originou uma nova disciplina, a citogenética, que lançou uma ponte para o mecanismo da hereditariedade. Entretanto, como vocês podem perceber, conceitos novos necessitam de tempo para serem aceitos, e, com essa teoria não foi diferente. A princípio, vários cientistas, em especial, Bateson e Morgan, não acreditavam na teoria de SuttonBoveri, pois não havia evidência direta de que os genes localizavamse em cromossomos. Bateson decidiu aceitar a teoria dos cromossomos dois anos antes da sua morte, quando as provas se tornaram incontestáveis. Morgan, por sua vez, na tentativa de encontrar uma alternativa, chegou a revelações que o fizeram mudar de idéia e contribuir com algumas das descobertas mais importantes para a nova ciência em desenvolvimento. Vale a pena lembrar: Edmund Beecher Wilson, embriologista e um dos principais nomes da citogenética, foi o mestre e mentor de toda a equipe de Morgan e, como colega de trabalho e amigo, exerceu grande influência sobre Morgan, na aceitação da teoria cromossômica da herança.


62 1.2- QUEM FOI MORGAN Thomas Hunt Morgan (fig 2) nasceu em 25 de setembro de 1866, em Lexington, Kentucky, nos Estados Unidos. Considerado um aluno crítico e independente, obteve seu bacharelado na Universidade de Kentucky e seu doutorado, na Universidade Johns Hopkins. Em 1904, iniciou seus trabalhos como professor de Zoologia Experimental na Universidade de Columbia, em Nova York, onde permaneceu até 1928. Após essa data, Morgan trabalhou como professor de biologia e diretor do Laboratório G. Kerckhoff no Instituto de Tecnologia da Califórnia em Pasadena, onde permaneceu até sua morte, em 04 de dezembro de 1945. Morgan deixou contribuições de grande importância na embriologia experimental, no campo da regeneração celular e, em especial, na genética de Drosophila. O ano de 1910 foi o ano da primeira publicação de Morgan em Drosophila. Para saber mais, acessem: http://nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/laureates/1933/ morgan-bio.html

Fig 2- Thomas Hunt Morgan http://nobelprize.org/nobel_prizes/ medicine/laureates/1933/morganbio.html

1.3- O ORGANISMO EXPERIMENTAL DE MORGAN O gênero Drosophila compreende um grande número de espécies, sendo a D. melanogaster (fig 3) a mais intensamente estudada, desde os dias da Sala das Moscas (laboratório de Morgan na Universidade de Columbia) até os dias atuais. Centenas de laboratórios no mundo inteiro investigam os genes e cromossomos deste organismo modelo. Vários são os atributos que fazem desta

3


63 mosca um organismo experimental, como por exemplo, a produção de gerações a cada duas ou três semanas, fácil manutenção, ocupação restrita de espaço, virtualmente imune a doenças. Uma das propriedades mais importantes é a presença de apenas quatro pares de cromossomos distintos uns dos outros, sendo um deles o par de cromossomos sexuais, XX para a fêmea e XY para o macho. As informações sobre Drosophila estão atualmente disponíveis em um banco de dados eletrônico constantemente atualizado, c h a m a d o F l y B a s e a c e s s í v e l e m http://www.morgan.harvard.edu.

http://neofronteras.com/wpcontent/photos/drosophila.jpg Fig 3- Drosophila melanogaster

1.4- EVIDÊNCIA DE LIGAÇÃO AO SEXO

3

O que determina o sexo de um organismo tem sido objeto de especulação desde épocas remotas. Existem diversas modalidades de determinação sexual, envolvendo sistemas cromossômicos simples ou múltiplos. Entretanto, em alguns organismos, a determinação é ambiental. Essas questões serão abordadas na disciplina Citogenética. Em 1909, Morgan começou a conduzir experimentos genéticos em Drosophila. Ele havia visitado o laboratório de Hugo de Vries na Holanda, ficando impressionado com as mutações na planta Oenothera. Resolveu, então, expor suas moscas a diferentes tipos de temperaturas, substâncias químicas e radiações, no intuito de produzir fenótipos diferentes. Um certo dia, apareceu um único macho de olhos brancos, em uma população de moscas de olhos vermelhos. Esse macho foi prontamente acasalado com suas irmãs de olhos vermelhos.


64 Embora a progênie F1 fosse constituída por moscas com olhos vermelhos, reapareceram machos de olhos brancos na F2, mostrando a recessividade do caráter olho branco. Entretanto, todas as moscas de olhos brancos eram machos e havia duas fêmeas para um macho entre aquelas de olhos vermelhos (fig 4). Ele observou que cruzamentos recíprocos davam resultados distintos, e as proporções fenotípicas eram diferentes entre machos e fêmeas, o que contrariava os princípios de Mendel. Morgan buscou hipóteses para explicar esses desvios na segregação. Ele propôs que o fator da cor dos olhos estava acoplado com o cromossomo X (determinante do sexo), mas não com o Y, e que os fenótipos branco e vermelho se deviam a alelos diferentes, representados por w+ (selvagem vermelho) e w (mutante branco).

P-

Fêmea de olhos vermelhos

x

Macho de olhos brancos

Xw+Xw+ G-

Xw+

F1-

Fêmea de olhos vermelhos

XwY Xw

Xw+

Y

Macho de olhos vermelhos

Xw+Xw G-

Fig 4- Resultado do cruzamento entre uma fêmea selvagem de olhos w+ w+ vermelhos (X X ) e um macho de olhos brancos (XwY)

Xw+ Y

Xw

Xw+

F2 -

½ fêmeas de olhos vermelhos

Xw+Xw+

¼ machos de olhos vermelhos

Xw+ Y

¼ machos de olhos brancos

XwY

Y

3

Xw+Xw


65 Outros resultados confirmaram os elementos de suas hipóteses. Em um cruzamento entre uma fêmea heterozigota (Xw+Xw) e um macho mutante hemizigoto (XwY), independentemente do sexo, metade da prole tinha olhos brancos e metade olhos vermelhos (fig 5). Em outro experimento (fig 6), fêmeas de olhos brancos (XwXw) foram cruzadas com machos de olhos vermelhos (Xw+Y), e todos os machos apresentaram olhos brancos. Ao intercruzar essa prole, a F2 mostrou uma proporção de 1 (fêmea de olhos brancos): 1 (fêmea de olhos vermelhos): 1 (macho de olhos brancos): 1 (macho de olhos vermelhos). Esse experimento apoiava a idéia de genes situados em cromossomos, porém não estabelecia firmemente a teoria cromossômica. Morgan e seu grupo identificaram vários genes (ligados ao cromossomo X e em autossomos) em Drosophila e concluíram que esses estavam situados em cromossomos.

Fig 5- Resultado do cruzamento entre uma fêmea heterozigota (Xw+Xw) e w um macho mutante (X Y)

P-

Fêmea de olhos vermelhos

x

Macho de olhos brancos

Xw+Xw G-

3

Xw+

XwY

Xw

Xw

F1-

Xw+Xw

¼ fêmeas de olhos vermelhos

¼ fêmeas de olhos brancos

¼ machos de olhos vermelhos

¼ machos de olhos brancos

XwXw

Xw+ Y

XwY

Y


66 P-

Fêmea de olhos brancos

x

Macho de olhos vermelhos

XwXw G-

Fig 6- Resultado do cruzamento entre fêmea de olhos brancos (XwXw) w+ com macho de olhos vermelhos (X Y)

Xw+Y

Xw

Xw+

½ fêmeas de olhos vermelhos

Xw+Xw

½ machos de olhos brancos

XwY

Y

F1-

1.5- A NÃO DISJUNÇÃO Calvin B. Bridges, um dos colaboradores de Morgan, cruzou fêmeas de olhos brancos com machos de olhos vermelhos em grande escala. Apesar de as moscas da F1 serem em sua maioria fêmeas de olhos vermelhos e machos de olhos brancos, algumas exceções, como fêmeas de olhos brancos e machos de olhos vermelhos, foram observadas. Ele cruzou essas fêmeas especiais com machos normais de olhos vermelhos obtendo uma prole normal e uma prole especial. Os machos especiais, por sua vez, eram todos estéreis. A explicação dada por Bridges era que as fêmeas de olhos brancos resultavam do comportamento anormal do cromossomo X, originário das fêmeas da geração parental. Assim, fêmeas especiais obtinham ambos os cromossomos X de suas mães de olhos brancos (XwXw). Normalmente, os cromossomos X deveriam segregar um do outro, mas ocasionalmente uma falha na separação, a qual Bridges nomeou de não-disjunção, poderia ocorrer formando um ovócito com dois cromossomos X e outro sem nenhum X. Tais ovócitos anormais, ao serem fecundados por espermatozóides normais, produziriam prole com números de cromossomos sexuais diferentes do habitual. A Figura 7 ilustra o processo. Os óvulos com um Xw, com dois Xw ou sem o X, ao serem fecundados pelos

3


67 espermatozóides com o Xw+, originam indivíduos de olhos vermelhos, com as seguintes constituições cromossômicas: fêmea (Xw+Xw), metafêmea (Xw+XwXw - geralmente morre) e macho (Xw+O), respectivamente. Esses mesmos óvulos, ao serem fecundados por espermatozóides com Y, produzem os seguintes zigotos: macho (XwY) de olhos brancos, fêmea especial (XwXwY) de olhos brancos e um indivíduo inviável YO, respectivamente. Xw

w

X

w+

X

Y

P–

G

3

Fig 7 -Não-disjunção

Ao fazer a análise citológica, Bridges concluiu que - o cromossomo Y não atuava para a determinação sexual, mas era importante para a fertilidade do macho, visto que os machos XO eram estéreis. - os indivíduos especiais eram produzidos por não disjunção do cromossomo X. Bridges forneceu a prova direta da ligação ao sexo, corroborando definitivamente a teoria cromossômica da hereditariedade.


68 1.6- PADRÕES DE HERANÇA DE GENES LIGADOS Algumas das primeiras evidências da ligação vieram de experimentos com ervilhas, realizados por Bateson e Punnett, cujas freqüências das quatro classes da F 2 desviavam-se, significativamente, das proporções mendelianas de 9:3:3:1.

Fenótipos Flores vermelhas e grãos de pólen longos Flores brancas e grãos de pólen curtos Flores vermelhas e grãos de pólen curtos Flores brancas e grãos de pólen longos Total

Representantes Proporções % 583 170

0,73 0,21

26

0,03

24 803

0,03 1,0

Havia uma hiper-representação das classes parentais (583 + 170) contra as não-parentais (26 + 24). Bateson e Punnett propuseram que a F1 havia produzido mais gametas do tipo parental que o normal e, assim, o acoplamento físico entre os alelos dominantes e recessivos podiam ter evitado a distribuição independente, mas eles não sabiam qual a natureza do acoplamento. O desvio nas proporções ocorria por causa da ligação entre o gene para a cor das flores e o gene para o tamanho do grão de pólen. Uma parte da prole mostrava fenótipo não-parental em baixa freqüência, indicando que os alelos dos dois genes se recombinaram na F1. Qualquer produto meiótico com uma nova combinação de alelos é por definição um recombinante. Morgan encontrou um desvio similar na proporção de 1:1 entre os tipos parentais e 1:1 entre os tipos não-parentais, estudando dois genes autossômicos em Drosophila. Um dos genes afetava a cor dos olhos (pr=púrpura e pr+=vermelho), e o outro o tamanho das asas (vg=vestigial e vg+=normal). Morgan realizou um cruzamento com diíbridos, seguido de um cruzamento teste (no primeiro fascículo, foi explicada a nomenclatura para genes ligados). Vejamos estes dados.

3


69 P

pr/pr.vg/vg púrpura vestigial

F1 Cruzamento pr+/pr.vg+/vg teste vermelho normal Parentais Parentais Recombinantes Recombinantes Total

pr +/pr+.vg+/vg+ vermelho normal

X

pr +/pr.vg +/vg vermelho normal X pr/pr.vg/vg púrpura vestigial Resultados pr+.vg+ 1.339 vermelho normal pr.vg 1.195 púrpura vestigial pr+.vg 151 vermelho vestigial pr.vg+ 154 púrpura normal 2.839

Observe que pr+.vg (151) e pr.vg+ (154) são as classes recombinantes, por estarem em percentual menor que 50% do total da prole.

3 P

Desafio da Fix: vocês devem ter percebido o uso do cruzamento teste para genes autossômicos ligados. Por que não há necessidade de cruzamento teste para genes ligados ao X? Discuta com seus colegas. Agora observemos outro cruzamento realizado por Morgan, porém com os alelos em outra associação. Cada genitor é homozigoto para o alelo dominante de um gene e para o alelo recessivo do outro

pr+/pr+.vg/vg

X

pr/pr.vg +/vg+

pr+/pr.vg+/vg

F1

Cruzamento pr+/pr.vg+/vg teste Recombinantes Recombinantes Parentais Parentais Total

X Resultados pr+.vg+ pr.vg pr+.vg pr.vg+

pr/pr.vg/vg 157 146 965 1.067 2.335


70 Temos, novamente, um desvio das proporções, constituindo uma exceção ao princípio de Mendel da distribuição independente. Compare os dois cruzamentos e veja que, independentemente da combinação entre os alelos, as maiores classes continuam sendo as parentais. O experimento de Morgan mostrou genes ligados em diferentes conformações (fig 8). Na primeira, denominada conformação cis ou acoplada, os dois alelos dominantes (selvagens) estão presentes no mesmo homólogo (pr+vg+/prvg). Na segunda, chamada conformação trans ou em repulsão, os alelos se encontram em homólogos diferentes (pr+vg/prvg+). A

B

A

b

a

b

a

B

Fig 8 -Genes ligados nas conformações cis e trans

Morgan sugeriu que os genes para ambos os fenótipos estão situados no mesmo par de cromossomos homólogos. Esta hipótese explica, porque as combinações alélicas dos parentais permanecem juntas. Mas, para explicar o aparecimento de combinações nãoparentais, Morgan propôs que, durante a sinapse, os cromossomos trocam partes durante o crossing-over (assunto trabalhado anteriormente no fascículo 6 de Citologia). Esse processo, também conhecido como permuta, pode ser visualizado citologicamente, através dos quiasmas, estrutura em forma de cruz, entre duas cromátides não-irmãs. A Figura 9 ilustra essa troca física de segmentos cromossômicos. Quiasmas são contados pela análise citológica e cromossomos recombinantes através de análise genética. pr

pr vg

vg+ pr+ Fig 9 -Crossing-over

pr+

3

vg+

vg


71 1.7- O CROSSING COMO CAUSA DA RECOMBINAÇÃO GÊNICA A produção de novas combinações alélicas é conhecida por recombinação. No entanto, enquanto a recombinação de genes não ligados ocorre por distribuição independente (separação dos cromossomos homólogos durante a anáfase I), a recombinação de genes ligados é devida ao crossing-over (troca de segmentos entre cromátides homólogas na prófase I). Morgan e seu grupo estudaram mais de mil genes mutantes classificados em quatro grupos de ligação, correspondendo de modo notável aos quatro cromossomos de Drosophila. Entretanto, apenas em 1931, Curt Sterns, estudando alguns cromossomos anormais de Drosophila, demonstrou a associação entre a recombinação genética e a troca de material cromossômico. Os resultados dos experimentos de Harriet Creighton e Bárbara McClintock, no cromossomo 9 do milho, foram apresentados no mesmo ano e apoiaram fortemente a troca física entre cromossomos pareados, causando recombinação.

1.8- MENDEL E A LIGAÇÃO

3

Vimos, anteriormente, que Mendel trabalhou com sete características. Se na ervilha, existem sete pares de cromossomos, seria esperado encontrar um gene para cada característica, em cada um dos sete cromossomos. Entretanto, Mendel trabalhou com três genes situados no cromossomo 4 (flores axiais e terminais – alelos T e t, vagem completa ou constringida – alelos C e c, caules altos ou baixos – alelos H e h), dois no cromossomo 1 (sementes amarelas ou verdes – alelos V e v, flores brancas ou violetas – alelos B e b), um no cromossomo 5 (vagem verde ou amarela – alelos A e a) e um no cromossomo 7 (sementes lisas ou rugosas – alelos R e r). Então, por que Mendel não descobriu a ligação? Uma resposta possível é que as distâncias dos genes V a B, situados no cromossomo 1, e T a C e T a H, situados no cromossomo 4, eram grandes. Todavia, C e H estão relativamente próximos um do outro, todavia Mendel parece não ter realizado esse cruzamento, o que o levaria à quebra da constância da segregação independente. Essa aparente sorte em nada diminui o brilhantismo das conclusões de Mendel.


72 2- MAPEAMENTO GENÉTICO Morgan observou diferentes percentuais na prole recombinante, de acordo com os genes estudados e imaginou que estas variações da freqüência de recombinação pudessem indicar as distâncias entre os genes nos cromossomos. Este problema foi resolvido por Alfred H. Stutervant, que calculou a posição e a seqüência dos genes no cromossomo X de Drosophila melanogaster, construindo o primeiro mapa genético. Esses mapas são muito úteis, pois permitem compreender o funcionamento gênico, auxiliar no procedimento de isolamento de um gene, prever quais genes poderão vir juntos a uma determinada característica selecionada para estudo, entender mecanismos de doenças, comparar o conteúdo informacional de um cromossomo em espécies diferentes ou correlatas, auxiliando na compreensão das relações evolutivas.

2.1- CALCULANDO A DISTÂNCIA ENTRE DOIS GENES Stutervant estimou a distância entre pontos em um cromossomo, contando o número de crossings entre eles. Ele postulou que a distância entre dois pontos no mapa genético de um cromossomo é o número médio de crossings entre eles. Para facilitar o trabalho, convencionou-se que a distância entre dois locos, acarretando uma freqüência de recombinação (FR) de 0,01 (1%) seria dita uma unidade de mapa (u.m.) ou um centimorgan (cM). Unidade de mapa genético é a distância entre os genes para os quais um produto da meiose em cem é recombinante. O cálculo da distância entre dois genes é bem simples. Vamos tomar como exemplo o cruzamento abaixo.

A/a.B/b

X

Parentais Parentais Recombinantes Recombinantes Total

Aa.Bb aa.bb Aa.bb aa.Bb

a/a.b/b 440 460 48 52 1.000

3


73 A freqüência de recombinantes é dada pela quantidade de recombinantes dividida pelo total da amostra. Neste caso, 48 somado a 52 é igual a 100, dividido pelo total 1.000, obtemos a freqüência de recombinação (FR) de 0,10 u.m ou 10%. FR = rec/N 100/1.000 = 0,10 u.m. A maior freqüência de recombinação detectável entre dois locos ligados é sempre inferior a 50%. Genes separados por distância igual ou superior a 50 u.m. segregam como genes não-ligados.

2.2- CRUZAMENTO TESTE DE TRÊS PONTOS Para fazer o mapeamento, é necessário conhecer a distância e o posicionamento dos locos no cromossomo. O teste dos três pontos permite determinar a distância entre três locos e a ordem seqüencial dos genes. Nesse teste, um triplo heterozigoto é cruzado com um triplo homozigoto recessivo, fornecendo uma descendência com números variáveis de crossings e freqüências.

Classe

Número de crossings

Freqüência

Não-recombinantes (parentais) Recombinantes simples (A-B) e (B-C)

0 1

alta intermediária

Duplo-recombinantes

2

menor

3

Os não-recombinantes evidenciam a conformação cis (ABC/abc) ou trans (AbC/aBc; Abc/aBC; ABc/abC). Os duplo-recombinantes permitem identificar a ordem correta dos genes (ABC; ACB ou BAC), por indicar o gene do meio. Vamos fazer uma tentativa passo a passo. Considere o exemplo a seguir. Em um cruzamento entre um triplo heterozigoto (ABC/abc) com seu homozigoto recessivo (abc/abc), foram obtidos os seguintes dados.

Classe

1 2 3 4 5 6 7 8

Não-recombinante Não-recombinante Recombinante simples (A-B) Recombinante simples (A-B) Recombinante simples (B-C) Recombinante simples (B-C) Duplo -recombinante Duplo-recombinante Total

Genótipo

Fenótipo

Número

AaBbCc aabbcc aaBbCc Aabbcc aabbCc AaBbcc aaBbcc AabbCc

ABC abc aBC Abc abC ABc aBc AbC

450 432 44 37 16 19 1 1 1.000


74 Agora vamos analisar os dados: - Pelas classes mais freqüentes (1 e 2), definimos a conformação cis. - As classes menos freqüentes (7 e 8) nos mostram que B é o gene do meio, por diferir da configuração em cis ABC e abc para, respectivamente, AbC e aBc. - A distância entre A-B é dada pela soma dos recombinantes simples A-B (3,4) com os duplo-recombinantes (7,8). Desta forma, temos 44 + 37 + 1 + 1 = 83 em um total de 1.000, ou seja, 8,3%, 8,3u.m (unidades de mapa) ou 8,3cM (centimorgan). - De forma similar, calculamos a distância entre B-C. O somatório das classes 5, 6 (recombinantes simples B-C) com os duplorecombinantes (7 e 8). Nesse caso, obtemos 16 + 19 + 1 + 1 = 37 em um total de 1.000, ou seja, 3,7%, 3,7u.m ou 3,7cM. O cálculo das distâncias entre cada dois locos é obtido pela soma da freqüência de recombinantes simples para esses dois locos mais a freqüência de duplo-recombinantes. Colocando isso em um mapa:

A← 8,3→ B← 3,7→ C ou A 0

B C 8,3 12

Vimos um cruzamento na conformação cis, o nível seguinte de complexidade é um cruzamento na configuração trans.

Classe 1 2 3 4 5 6 7 8

Não-recombinante Não-recombinante Recombinante simples Recombinante simples Recombinante simples Recombinante simples Duplo -recombinante Duplo-recombinante Total

Genótipo

Fenótipo

Número

aaBbCc Aabbcc aabbCc AaBbcc aabbcc AaBbCc aaBbcc AabbCc

aBC Abc abC ABc abc ABC aBc AbC

418 370 35 30 69 74 1 3 1.000

Agora vamos analisar os dados: - Pelas classes mais freqüentes (1 e 2), definimos a conformação trans. - As classes menos freqüentes (7 e 8) nos mostram que C é o gene do meio, por diferir da configuração trans, de aBC para aBc e de Abc para AbC. - A distância entre A-C é dada pela soma dos recombinantes simples A-C (5,6) com os duplo-recombinantes (7,8). Desta forma, temos 69 + 74 + 1 + 3 = 147 em um total de 1.000, ou seja, 14,7%, 14,7u.m (unidades de mapa) ou 14,7cM (centimorgan).

3


75 - De forma similar, calculamos a distância entre C-B. O somatório das classes recombinantes simples C-B (3 e 4) com os duplorecombinantes (7 e 8). Nesse caso, obtemos 35 + 30 + 1 + 3 = 69 em um total de 1.000, ou seja, 6,9%, 6,9u.m ou 6,9cM. - Todos os locos estão ligados, pois os valores de FR são menores que 50%. Colocando isso em um mapa:

A← 14,7→ C← 6,9→ B ou A 0

C 14,7

B 21,6

Vamos adicionar mais um aspecto à análise. Observem que as duas distâncias entre A-C (14,7) e C-B (6,9) somam 21,6, maior do que o calculado para A-B (35 + 30 + 69 + 74 = 208/1.000 = 0,208 ou FR de 20,8%). Mas, podemos corrigir o valor, ao somarmos os duplorecombinantes duas vezes (35 + 30 + 69 + 74 + 1 + 3 + 1 + 3 = 216/1.000 = 0,216), assim obteremos 21,6%.

2.3 - FREQÜÊNCIA DE RECOMBINAÇÃO E INTENSIDADE DE LIGAÇÃO A distância entre dois locos é definida pela FR entre eles. Dessa forma, quanto maior a distância entre dois locos, maior a probabilidade de ocorrer um quiasma entre eles.

3

Como vocês já devem ter percebido, a teoria cromossômica forneceu a base para o desenvolvimento da estrutura hipotética do mapa de ligação, no entanto, entre os primeiros estudos com genes ligados, havia algumas discrepâncias. Freqüências de recombinação menores que 20 a 25% avaliavam diretamente a distância de mapa, entretanto freqüências maiores, em geral, subestimavam esta distância. Estas discrepâncias foram prontamente eliminadas por Hermann Muller, outro membro da equipe de Morgan, ao detectar a presença de crossings duplos ao longo do cromossomo. Além disso, Muller notou que a presença de um quiasma poderia interferir na presença de um segundo crossing na vizinhança, fenômeno chamado de interferência. As classes duplo-recombinantes podem ser utilizadas para deduzir a extensão da interferência. No último exemplo, vimos que a FR de A-C é de 0,147, e o valor de C-B é de 0,069. Dessa forma, se não ocorre interferência, os duplorecombinantes podem ser esperados para uma freqüência den 0,01014 x 1.000 = 10,14 duplo-recombinantes. Todavia, na


76 amostra, só foi possível observarmos quatro, o que mostra algum tipo de interferência. A interferência é definida como I. Mas precisamos obter inicialmente o coeficiente de coincidência (coc), que é a proporção dos recombinantes duplos observados em relação aos esperados. Assim, I = 1 – coc . Logo,

I = 1

- FR observada de recombinantes duplos FR esperada de recombinantes duplos

Em nosso exemplo,

I = 1

-

4 10,14

I =

1

- 0,39 =

0,61%

A interferência é considerada completa quando um crossingover inibe a ocorrência de outro próximo. Nesses casos, coc=0 e I=1, contudo, na maioria das vezes, os valores de I estão entre 0 e 1. Desafio da Fix: Vocês poderão tentar realizar uma prática simples e interessante com pequenos grupos, intitulada “Entendendo ligação gênica: Uma simulação”. Para isso acessem a página da Revista G e n é t i c a n a E s c o l a n o s i t e h t t p : / / w w w. s b g . o r g . b r (GeneticaEscola2/Web/vol1Num1.htm).

2.4 - O IMPACTO DAS IDÉIAS DE MORGAN E SEU GRUPO As pesquisas da equipe de Morgan sobre o olho branco da mosca das frutas evidenciaram a linearidade dos cromossomos, posteriormente associada à estrutura linear do DNA. Mostraram, também, que o gene w+ podia mutar para um segundo alelo w, e este, por sua vez num terceiro ou num quarto. Além disso, descobriram a reversibilidade dessas mutações. A descoberta das mutações não significou um enfraquecimento da hereditariedade sólida e, sim, uma confirmação do caráter constante do material genético. No exemplo das moscas, só existiam indivíduos de olhos vermelhos, até surgir um novo elemento, um macho de olhos brancos. A mutação permite a mudança evolutiva necessária para a ação da seleção natural. Vale a pena lembrar que, além da mutação como fonte primordial de variabilidade, a segregação e a recombinação gênica produzem novas combinações, fornecendo novos genótipos à população.

3


77 2.5 - MAPEAMENTO NOS DIAS ATUAIS Mapas genéticos clássicos (mapeamento de ligação por recombinação) de espécies, como Drosophila melanogaster e Mus musculus (camundongo), são baseados em genes e sofrem refinamento contínuo, sendo obtidos pelos esforços colaborativos de grupos de pesquisa em todo o mundo. Ao contrário desses, o mapa genético humano não poderia ser baseado em genes, pois a freqüência de cruzamentos entre dois indivíduos, sofrendo de diferentes desordens genéticas, é extremamente baixa.

3

A construção dos mapas genéticos humanos esperou pelo advento dos marcadores moleculares que apresentassem segregação mendeliana e fossem polimórficos. No ano de 1981, existiam mapas de ligação humanos bastante incompletos e de apenas alguns cromossomos. Para essa época, os marcadores consistiam em proteínas de grupos sangüíneos, proteínas séricas e tipos de HLA tissular, raros e pouco informativos. Apenas em 1987, foi construído o primeiro mapa genético humano global, baseado em RFLP (polimorfismo de comprimento de fragmento de restrição). Sete anos depois (1994), mapas de altíssima resolução já haviam sido obtidos, principalmente com a utilização de VNTR (número variável de repetições em tandem) de DNA, na forma de mini ou microssatélites, e SNPs (polimorfismos de nucleotído único) de DNA. Além dos mapas genéticos (construídos a partir da freqüência de recombinação entre marcadores), foram construídos mapas citológicos (baseados em características citológicas, como o padrão de bandeamento cromossômico observado ao microscópio) e mapas físicos (determinados pelas distâncias de bases que separam os marcadores moleculares) do genoma humano, como: de hibridização de células somáticas, citogenético, de sítios de quebra cromossômica, de restrição, com hibridização in situ fluorescente (FISH), de clones contínuos (contigs), de sítios marcados por seqüência (STS), de marcadores de seqüências expressas (EST), de seqüenciamento de DNA. Muitas mudanças ocorreram, e os mapas de alta densidade que, atualmente, integram os mapas genético, citológico e físico dos cromossomos estão sendo construídos, não apenas para humanos mas também para vários outros organismos modelo, como Escherichia coli (bactéria), Saccharomyces cerevisiae (levedura), Arabdopsis thaliana (planta), permitindo uma melhor compreensão da evolução dos genomas. Foge ao nosso objetivo dar descrições detalhadas de outras abordagens para mapeamento, pois você ainda precisa trilhar as disciplinas de Citogenética e Genética Molecular para uma melhor compreensão.


78 REVISANDO CONHECIMENTOS 1- Um experimento de retrocruzamento, envolvendo um triíbrido, resultou na seguinte descendência:

444 AbC / abc 431 aBc / abc 42 ABc / abc 43 abC / abc

18 Abc / abc 17 aBC / abc 2 ABC / abc 3 abc / abc

Com base nesses dados, analise as afirmativas, assinalando-as como verdadeiras ou falsas: ( ) Os genes “b” e “c” estão em posição cis no heterozigoto parental. ( ) Os genes “a”, “b” e “c” segregam-se independentemente. ( ) A distância entre os genes “a” e “b” pode ser estimada na ordem de 9 unidades de mapa. ( ) Pode-se estimar que esses genes encontram-se na sequência b –c –a, no mapeamento cromossômico do organismo estudado. 2- Você já tem conhecimento de que a Drosophila melanogaster tem sido um modelo biológico muito utilizado pela genética clássica e molecular para compreensão dos modos de herança. No mapeamento gênico desse organismo, os genes para cor do corpo (preto ou cinza) e o tipo de asa (longa ou vestigial) estão localizados no cromossomo 2. Suponha que esses genes distam um do outro em 10 unidades de mapa. Representação dos alelos: b+ -cor cinza b - cor preta

vg+– asa longa vg– asa vestigial

Considerando esses dados, verifique seus conhecimentos sobre genes ligados, analisando as proposições e, em seguida, assinalando a alternativa correta. I- Uma fêmea dihíbrida que porta os genes em posição trans, durante a gametogênese, havendo crossing-over, poderá originar dois tipos de gametas recombinantes, com as respectivas frequências: b+vg+ 5% e bvg 5%.

3


79 IIUma fêmea de genótipo b+vg/bvg+, durante a gametogênese, não havendo crossing-over, poderá dar origem a quatro tipos de gametas nas seguintes proporções: 25% b+ vg+; 25% bvg; 25% b+vg e 25% bvg+. IIIA freqüência de recombinação entre os genes b+ e vg+ ou b e vg será de 20%. 3- Em certas variedades de plantas, a cor da flor azul é dominante sobre a cor vermelha e a forma do pólen oblonga é dominante sobre a forma esférica. Os genes para essas características estão ligados e os seus alelos estão representados a seguir: V - flor azul v- flor vermelha

E - pólen oblongo e- pólen esférico

Suponha que uma dessas plantas, com flor azul e pólen oblongo, foi cruzada com uma planta de flor vermelha e pólen esférico. Deste cruzamento obtiveram-se: - 180 plantas com flores azuis e pólen oblongo; - 190 plantas com flores vermelhas e pólen esférico; - 50 plantas com flores azuis e pólen esférico; - 60 plantas com flores vermelhas e pólen oblongo.

3

Pelos resultados obtidos, é possível deduzir o genótipo dos parentais e dos descendentes. Sendo assim, responda as questões abaixo: a) Os genótipos dos parentais-planta com flor azul e pólen oblongo X planta com flor vermelha e pólen esférico podem ser representados por: ( ( ( (

) VE/ ve e ve / ve, respectivamente. ) Ve / vE e VE / VE, respectivamente. ) vE / Ve e ve / ve, respectivamente. ) Ve / ve e vE / Ve, respectivamente.

a) Dentre os descendentes, o total de plantas com genótipos recombinantes é igual a: ( ( ( (

) 270 ) 110 ) 240 ) 60



Referências

Leitura fundamental GRIFFITHS, A. J. F.; WESSLER, S. R.; LEWONTIN, R. C.;GELBART, W. M.; SUZUKI, D. T.e MILLER, J. H. Introdução à Genética: Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S/A, 2006. SNUSTAD, D. P. e SIMMONS M. J. Fundamentos de Genética: Guanabara Koogan S/A, 2001. Sites Morgan:http://nobelprize.org/nobel_prizes/medicine/laureates/19 33/morgan-bio.html Drosophila: http://www.morgan.harvard.edu. R e v i s t a G e n é t i c a n a E s c o l a : h t t p : / / w w w. s b g . o r g . b r (GeneticaEscola2/Web/vol1Num1.htm).



FASCÍCULO 4 Genética Evolutiva

Profa Marília de França Rocha Colaboradoras - Maria Teresa Marquim N. Cornélio Rita de Cássia de Moura

Carga horária -15h

INTRODUÇÃO Neste quarto fascículo, vamos compreender a importância da evolução como conteúdo central e unificador dentro da Biologia. Distinguiremos as principais teorias evolutivas e enfocaremos processos que influenciam as variações genéticas. Faremos uso da análise do princípio de Hardy-Weinberg. Abordaremos a visão

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atual da seleção natural e estenderemos a discussão sobre as restrições ao processo evolutivo. Por fim, trataremos de aspectos da especiação e da macroevolução.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Desenvolver as bases para a compreensão do pensamento evolutivo e populacional.

GENÉTICA EVOLUTIVA “Nada em biologia faz sentido exceto à luz da evolução.”(Theodosius Dobzhansky)


84 1- O DESENVOLVIMENTO DO PENSAMENTO EVOLUTIVO 1.1- QUEM FOI DARWIN Charles Darwin (fig 1) nasceu em 12 de fevereiro de 1809, em Shrewsbury, Inglaterra. Darwin obteve seu bacharelado em humanidades em 1831, e, nesse mesmo ano, embarcou no H.M.S. Beagle como companheiro de viagem do capitão Robert Fitzroy, tornando-se em pouco tempo o naturalista oficial do navio. A viagem durou cinco anos (27/12/1831 a 02/10/1836) e foi o acontecimento mais importante de sua vida, pois oportunizou observações e indagações sobre aspectos geológicos, da vida animal e vegetal, de situações políticas e sociais. Em 1858, no encontro da Sociedade Linneana de Londres, Darwin apresentou sua teoria da evolução por meio da seleção natural, conjuntamente a um manuscrito de Alfred Russel Wallace (18231913) (fig 2) de conteúdo análogo. Darwin publicou, no ano de 1859, A origem das espécies por meio da seleção natural, livro que revolucionou o pensamento ocidental. Publicou inúmeros livros e morreu em Down House, no dia 19 de abril de 1882. Para saber mais, leiam a bibliografia indicada sobre Darwin.

http://www.victorianweb.org/science/ darwin/darwin_beard.gif Fig 1 - Charles Darwin

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http://www.ucl.ac.uk/taxome/jim/Mim/Wallace.JPG Fig 2 -Alfred Russel Wallace


85 1.2- A VISÃO DE MUNDO NA ÉPOCA DE DARWIN As visões de mundo comuns na época de Charles Darwin eram: (1) um mundo constante e recentemente criado (dogma cristão, vitalismo); (2) um mundo de duração longa ou eterna, tendendo a melhoramento ou perfeição (visão teleológica); (3) um mundo eterno, constante ou cíclico, sem exibir uma direção ou meta, simplesmente devido ao acaso ou à necessidade, como dito por Demócrito e seus seguidores. O vitalismo (1) e a teleologia cósmica (2) são duas crenças, atualmente, refutadas. O vitalismo era a crença na existência de uma força oculta (mística), responsável pelas manifestações de vida nos organismos. A teleologia lidava com a explicação de processos naturais que conduziam automaticamente a um fim definido ou a uma meta. Nela estão inclusos os ortogenistas (por acreditarem que havia na natureza viva um anseio intrínseco no sentido da perfeição) e a teoria da evolução de Lamarck (segundo a qual formas complexas de vida surgiam a partir de múltiplas formas primitivas, oriundas de geração espontânea, e caracteres adquiridos pelo uso seriam transmitidos aos descendentes).

1.3- AS TEORIAS DE DARWIN

4

O evolucionista e ornitólogo Ernest Mayr considerou que o paradigma de Darwin engloba, pelo menos, cinco teorias independentes: evolução propriamente dita, ancestralidade comum, gradualismo, variação das espécies e seleção natural. Essas diferentes teorias mostram diferentes aspectos do processo evolutivo. Na evolução propriamente dita, o mundo e os organismos estão sempre em modificação ao longo do tempo. O conceito de evolução não era novidade e autores como Buffon (Georges Louis Leclerc), Lamarck (Jean-Baptiste Pierre Antoine de Monet) e o próprio avô de Darwin, Erasmus Darwin, já haviam abandonado a visão de espécies fixas e imutáveis muito antes; o problema era explicar o mecanismo de evolução. Os quatro ramos da Biologia que serviram de base para Darwin, biogeografia, paleontologia, embriologia e morfologia, acumulam, atualmente, um conjunto imenso de dados, endossando a evolução. Além desses, dispomos de dados em outras áreas, como genética, bioquímica , biologia molecular. Nos dias atuais, não há dúvida de


86 que os seres vivos tenham evoluído. Esse não é um ponto de debate na comunidade científica, apesar do que pregam os criacionistas. Quando Darwin embarcou no Beagle, acreditava na estabilidade das espécies (essencialismo – crença em que a diversidade consistia em um número limitado de essência, delimitadas e imutáveis). Porém a sua visita a Galápagos abalou sua certeza. Nessas ilhas, ele pôde observar tentilhões ou pássaros similares a esses e suspeitou serem variedades (Mayr considerava que os (Geospiza) tentilhões na realidade eram (Mimus) tordos-dosremédios). Ao chegar à Inglaterra, Darwin enviou suas coleções para as mãos de vários especialistas. O ornitologista John Gould demonstrou que não existiam variedades e, sim, espécies distintas dessas aves. Darwin compreendeu que todas derivavam de um ancestral comum, o que sugeria a imagem de uma árvore da vida conectando os ancestrais e as espécies atuais (fig 3). Essa teoria de ancestralidade comum obteve aceitação imediata. Subitamente, toda a hierarquia de classificação de Lineu tornavase lógica.

http://www.amnh.org/exhibitions/darwin/images/ exhibit/gallery/lg/darwin_tree_lg.jpg Fig 3 -Árvore da vida

Com a descoberta da similaridade entre o código genético para procariotos e eucariotos, atualmente, passou-se a ter um consenso de que todos os organismos existentes no planeta Terra possuem uma origem única. Na terceira teoria, gradualismo, a transformação evolutiva ocorria gradativamente, nunca aos saltos (saltacionismo - originada por mutações drásticas). Uma nova espécie evoluiria lentamente, através de espécies preexistentes. Essa teoria encontrou forte oposição, inclusive de amigos que o defendiam, como T. H. Huxley, conhecido como o buldogue de Darwin. O gradualismo abria espaço para críticas, como a falta de intermediários que explicassem a transição entre as espécies. Darwin alegou que essas lacunas se deviam a falhas do registro fóssil.

4


87 A variação das espécies tratava da problemática da origem da diversidade orgânica. Darwin introduz o pensamento populacional, propondo que a variação existente dentro de uma espécie é devida às diferenças entre os indivíduos, ou seja, não são os indivíduos que mudam ao longo do processo evolutivo, e sim, as populações. Os tentilhões (tordos-dos-remédios) ilustravam bem os aspectos da origem da diversidade e a origem da adaptação, porém, mesmo assim, em seu livro, é notória a sua confusão acerca de espécies e especiação. Lembrem que Mendel também possuía esse mesmo problema conceitual. Em biologia, inclusive no presente, um dos conceitos mais difíceis de ser trabalhado é o de espécie. O livro Ensaio sobre o princípio da população de Thomas Malthus foi crucial para o desenvolvimento da teoria da seleção natural. Segundo a tese do crescimento exponencial de Malthus: “as populações crescem mais rapidamente do que os recursos dos quais dependem”. De tal modo, uma parcela da variação nas populações ocorre em caracteres que afetam as chances de sobrevivência e reprodução dos organismos. Darwin e Wallace compreenderam esse processo de sobrevivência e reprodução desiguais, independentemente, e uniram uma série de observações e idéias em uma teoria ousada e revolucionária, a teoria da seleção natural.

4

Dentre as cinco teorias, a da seleção natural foi a mais difícil de ser aceita. Ela representava a rejeição de qualquer pensamento teleológico e determinista (determinismo é a crença de que a maioria dos processos na natureza inanimada é estritamente determinada por leis naturais – físicas) no mundo orgânico. Além disso, dois problemas se apresentavam: a ausência de um mecanismo convincente de herança e a aparente falta de direção do processo evolutivo. A natureza da herança e a origem da variação nunca ficaram claras para Darwin, apesar de Mendel ter sido seu contemporâneo. Darwin propôs a teoria da pangênese, na qual todas as partes do corpo fornecem material genético para os órgãos reprodutores e, particularmente, para os gametas, na forma de gêmulas. Essa explicação para a hereditariedade mostrou-se totalmente incorreta. A sua crença parcial na herança por mistura, suas concessões ao ambiente como fonte de indução de variação e especulações sobre caracteres adquiridos herdáveis tornavam impossível a resolução do problema.


88 1.4- O IMPACTO DAS IDÉIAS DE DARWIN Em todas as eras, descobertas científicas modificam as concepções das visões de mundo de uma dada época. Lembrem-se de Galileu que refutou o antropocentrismo e serviu de alavanca para a mecânica cartesiana e de Newton fornecendo o embasamento para a física moderna. A revolução darwiniana abalou as mais arraigadas concepções que possuíamos sobre nós mesmos e sobre a nossa origem. A visão de mundo do homem ocidental jamais seria a mesma depois da publicação de A origem das espécies. Darwin refutou a crença na criação individual de cada espécie, ao estabelecer o conceito da ancestralidade comum, através da qual todos os seres vivos descendem de um ancestral comum. Por extensão, humanos evoluiriam, segundo o mesmo princípio. As noções correntes de um mundo perfeito, constante e em progresso foram profundamente abaladas pela demonstração de que a evolução causa mudança e adaptação, regida de modo contínuo pela seleção natural. Ele utilizou um conceito inteiramente novo, atualmente chamado de pensamento populacional no lugar do pensamento tipológico (essencialismo). A maneira essencialista de pensar é incapaz de acomodar a variação, o que originou uma concepção errônea de raças humanas, conduzindo ao racismo. Os conhecimentos da genética evolutiva e de populações podem ser utilizados para demonstrar, de forma racional, que, em relação à espécie humana, não existem as “raças puras” e, portanto, qualquer filosofia política baseada neste falso conceito é insustentável. Existem vários artigos, tratando do tema raça. Vocês podem ler o artigo “Ambigüidades que limitam uma definição de raça” (Scientific American Brasil edição nº 20 – jan 2 0 0 4 ) e p a r a i s s o , a c e s s e m : http://www2.uol.com.br/sciam/conteudo/materia/materia_38.h tm .

1.5- TEORIAS EVOLUTIVAS E A GENÉTICA MENDELIANA A compreensão dos caracteres particulados de Mendel apontava para uma herança sólida, tendo auxiliado na refutação das teorias evolutivas que rivalizavam com a seleção natural. Estas teorias eram o neolamarkismo (herança de caracteres adquiridos) e outras formas de herança tênue; teorias autogenéticas baseadas no progresso evolutivo com um fim determinado (ortogênese, aristogênese, e outras) e as teorias da evolução saltacional, com rápida emergência de formas de vida (mutacionismo - De Vries).

4


89 Não cabe comentar cada teoria; sobre isso, existe uma extensa bibliografia indicada ao final do fascículo. Apesar da redescoberta das leis de Mendel em 1900, a aceitação da seleção natural ainda levaria bastante tempo para se concretizar.

1.6- A SÍNTESE EVOLUTIVA As idéias de Darwin estavam relegadas a um segundo plano, por volta do final do século XIX. Apenas na década de 1920, a divergência entre geneticistas e naturalistas começou a diminuir, impulsionando a construção da teoria evolutiva mais influente do século XX, a teoria sintética da evolução. Na década de 1930, ocorreu a síntese fisheriana. Os geneticistas populacionais Ronald Aylmer Fisher, John B. S. Haldane (Inglaterra) e Sewall Wright (EUA) mostraram que genes com pequenas vantagens seletivas podiam ser incorporados ao genótipo de populações. Assim, nascia a Genética de Populações. A evolução era definida como a mudança nas freqüências gênicas de uma dada população, ocasionada pela seleção lenta de pequenas mutações. Em conjunto, demonstraram que a variação poderia ser explicada pela herança mendeliana e pela seleção natural. Naquela época, lidava-se com a origem das adaptações, entretanto o problema da origem da biodiversidade continuava.

4

O livro de Theodosius Dobzhansky, Genética e a origem das espécies (1937), conseguiu unir as duas áreas de estudo em biologia evolutiva a evolução filética em populações (anagênese) e a origem da biodiversidade (cladogênese), levando ao início da construção da teoria sintética da evolução ao longo da década de 1940. A síntese evolutiva, conhecida como a segunda revolução darwiniana, tratou basicamente da origem e do significado da biodiversidade, promovendo um consenso entre naturalistas e geneticistas. Os naturalistas aprenderam com os geneticistas que os caracteres são particulados, a herança é sempre sólida e não há influência herdável do ambiente. Os geneticistas, por sua vez, entraram em contato com uma vasta literatura sobre variação geográfica e especiação. Havia, ainda, outro ponto de discórdia: o tipo de variação (gradual ou saltacional), atualmente resolvido através da teoria do equilíbrio pontuado, que apóia a existência de períodos de poucas mudanças (equilíbrio), interrompidos (pontuados) por fases de diversificação.


90 Restou, apenas, um ponto de desacordo entre naturalistas e geneticistas, o objeto de seleção. Atualmente, uma nova visão está sendo construída e concebe-se que a seleção natural pode atuar em diversos níveis de organização biológica: genes, linhagens celulares, organismos individuais, grupos de organismos, populações e talvez, até mesmo espécies. Não é questionada a validade da seleção natural, mas os níveis de organização em que esta pode atuar e como ocorrem as inter-relações. Os construtores dessa síntese foram: Bernhard Rensch, Ernest Mayr, G. G. Simpson, G. L. Stebbins, J. B. S. Haldane, Julian Huxley, R. A. Fisher, Sergei Chetverikov, Sewall Wright, Theodosius Dobzhansky, dentre outros.

2- O PRINCÍPIO DE HARDY-WEINBERG Em 1908, G. H. Hardy (matemático britânico) e Wilhelm Weinberg (médico alemão) publicaram, independentemente, trabalhos descrevendo uma relação matemática capaz de prever freqüências genotípicas de uma população através de suas freqüências alélicas (gênicas). Essa relação é conhecida como princípio ou equilíbrio de Hardy-Weinberg (H-W). Suponhamos que um determinado gene está segregando dois alelos, A e a, sendo a freqüência de A=p e a de a=q. Em termos de meiose, podemos considerar que a probabilidade de um gameta (óvulo ou espermatozóide) levar o alelo A ou a é p ou q, respectivamente. Então, a probabilidade de produzir um indivíduo homozigoto dominante (AA) é p x p = p2 e um homozigoto recessivo (aa) é q x q = q2. Para os heterozigotos, existem duas possibilidades A x a ou a x A, assim a probabilidade de formar um zigoto Aa é 2pq. Essas freqüências previstas são os termos na expressão do binômio (p + q)2.

(p + q)2 = p2 + 2pq + q2 =1 Em uma população em equilíbrio, as freqüências dos genes se mantêm constantes de geração em geração. Cruzamentos ao acaso e população numerosa contribuem para a estabilidade da população. Entretanto ocorrem fatores que podem alterar o equilíbrio genético da população, como: reproduções consangüíneas ou preferenciais, sobrevida e fertilidade desigual (mutação e seleção natural), isolamento de populações e migração. Uma propriedade da segregação mendeliana é o estabelecimento de um novo equilíbrio de genótipos na população, após uma geração de reprodução aleatória.

4


91 2.1- CALCULANDO AS FREQÜÊNCIAS ALÉLICAS (GÊNICAS) E GENOTÍPICAS Ao trabalharmos com populações, analisamos uma amostra representativa de indivíduos. Imaginem uma população humana na qual ocorrem os alelos do grupamento sangüíneo MN. Os genótipos possíveis de serem encontrados em relação a esse loco são: MM, MN e NN. Como não ocorre dominância, há uma perfeita correspondência entre o número de indivíduos das classes genotípicas e fenotípicas correspondentes. Vamos seguir, passo a passo, o cálculo dessas freqüências para uma população imaginária.

Fenótipo

Genótipo

Número de indivíduos Freqüência genotípica observada

MM

L L

M

M

20

20/77 = 0,26

MN NN

M

N

45 12

47/77 = 0,58

77

1,00

L L L NL N

Total

12/77 = 0,16

Passo 1 – Trabalhamos com números relativos e não absolutos. Iremos dividir cada classe pelo N (número total da amostra). Obtemos, dessa maneira, as freqüências genotípicas observadas para essa população (Veja a quarta coluna).

4

Passo 2 – Para calcular as freqüências alélicas, somamos a freqüência de homozigotos com a metade dos heterozigotos. Assim, pA = D + ½ H e qa = R + ½ H. M = p = MM + ½ MN = 0,26 + 0,29 = 0,55 e N = q = NN + ½ NN = 0,16 + 0,29 = 0,45 Passo 3 – Podemos estimar agora as freqüências genotípicas esperadas. Aplicando a fórmula binomial (p + q)2, onde p= 0,55 e q = 0,45. Então, p2 + 2pq + q2 = (0,55)2 + 2 x (0,55) x (0,45) + (0,45)2 = 0,30 + 0,50 + 0,20 = 1. Desafio da Fix: Quando resultados observados e esperados são comparados, verifica-se a existência de diferenças maiores ou menores entre eles. Aplique o teste do qui-quadrado, para verificar se a população se encontra ou não em equilíbrio de HardyWeinberg. Lembrem que não utilizamos números relativos nesse teste e, sim, absolutos. Então, é só multiplicar as freqüências pelo N (77) da população. Preencham a tabela da Fix e enviem o resultado.


92 Tipo sangüíneo

Freqüência genotípica Freqüência genotípica observada esperada

MM

0,26

0,30

MN NN

0,58

0,50

0,16

0,20

Total

1,00

1,00

Tabela da Fix:A população encontra-se ou não em equilíbrio de H-W? Qui-quadrado Qui-quadrado calculado X2c tabelado X2t

Significância (0,05)

População em equilíbrio

X2c menor X2t X

2 c

2

maior X t

(

) Sim

(

) Não

2.2- CALCULANDO AS FREQÜÊNCIAS, QUANDO NÃO É POSSÍVEL DISCRIMINAR OS HETEROZIGOTOS Não é admissível usar o procedimento explicado anteriormente, quando em um loco um alelo domina outro (A > a) e não é possível discriminar os heterozigotos (Aa) dos homozigotos (AA). Vale a pena salientar que este método é menos preciso que o anterior, e só deverá ser empregado, quando não for possível identificar a freqüência dos três genótipos. Suponha que temos conhecimento das freqüências relacionadas aos fenótipos, mas não, dos genótipos. Por exemplo, A_=0,84 e aa=0,16. Como não sabemos a quantidade exata de AA e Aa, tiramos a raiz quadrada dos homozigotos recessivos, visto que aa=q2, então q= aa. Se q2=0,16 então q=0,4. Sendo p + q = 1, obtemos p através da fórmula p= 1 - q, onde p= 1 - 0,4, p=0,6. De posse das freqüências alélicas, podemos calcular as freqüências genotípicas esperadas. Freqüências

Genótipos AA

p2

Aa aa

2pq

Total

1

q

2

(0,6)2= 0,36 2 x (0,6) x (0,4) = 0,48 (0,4)2= 0,16 1,00

4


93 O princípio de Hardy-Weinberg também se aplica aos genes ligados ao X e aos genes com alelos múltiplos. Fogem ao escopo desse fascículo explicações detalhadas sobre esses casos. Busquem exemplos na literatura indicada. Vocês também podem obter na página da Sociedade Brasileira de Genética (SBG) – http://www.sbg.org.br, o E-book do prof. Bernardo Beiguelman, intitulado: “Genética de Populações Humanas”. O livro trata de fatores evolutivos e do problema da consangüinidade. No programa GBOL, disponível no site http://www.ufv.br/dgb/gbol, vocês podem ler e aplicar seus conhecimentos em genética de populações. Existem diversos aplicativos que permitem simular a descendência de populações com diferentes constituições genotípicas admitindo diferentes acasalamentos, além de uma série de exemplos, para avaliar o equilíbrio de Hardy-Weinberg, incluindo o uso do qui-quadrado.

3- PROCESSOS QUE INFLUENCIAM AS VARIAÇÕES GENÉTICAS Fig 4 - Processos evolutivos e sua interação na formação de novas espécies (Adaptado do Griffiths et al, 2006).

As várias forças de estrutura de cruzamento, mutação, recombinação, seleção, deriva e fluxo gênico (migração) agem simultaneamente e moldam População original a composição genética das ê populações, produzindo / / / variação intra e / interpopulacional. A figura Variação devida a mutação e recombinação ê 4 apresenta o panorama dos / / / processos que levam à / evolução e à interação entre / eles na formação de novas Separação geográfica espécies. Efeito do fundador í î Efeito do fundador / / / / / / A variação herdada pode ser estudada pelo confronto de Seleção no ambiente local e deriva genética î í diferenças macroscópicas / / / ( morfologia) ou / microscópicas, desde a / / / / / / Migração comparação de cariótipos è ç / / (cromossomos) até Divergência (recombinação - seleção - deriva) î í diferenças entre seqüências / / / / de aminoácidos em / proteínas ou de è ç Nova espécie 1 nucleotídeos no DNA. Nova espécie 2

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Isolamento reprodutivo


94 3.1- ESTRUTURA DE CRUZAMENTO A transmissão da informação genética ocorre de diversas formas, dependendo do tipo de sistema genético: haplóide sexuado (leveduras como Neurospora crassa), diplóide sexuado (maioria das plantas e animais); haplóide assexuado (bactérias) e diplóide assexuado (dinoflagelados, rotíferos). Em assexuados, o genoma é transmitido como uma unidade, enquanto nos sexuados, os descendentes são uma mistura do grupo de genes parentais.

3.2- MUTAÇÃO E RECOMBINAÇÃO A produção da variação tem início com uma mutação, fonte primordial da mudança. Grande parte da formação de novos genes ocorre por duplicação de genes isolados pré-existentes ou por duplicação total do genoma (poliploidia), ampliando a quantidade de DNA disponível, sem o comprometimento de funções préexistentes. Entretanto, após o estabelecimento de um novo alelo, é a recombinação dos genes parentais que irá gerar a grande quantidade de combinações genéticas em novos genótipos, que formarão os indivíduos a serem selecionados na próxima geração.

3.3- SELEÇÃO Quando Darwin usou a palavra seleção, usava-a no sentido de “escolha do melhor”, e o ambiente, como a força externa de seleção. Atualmente, a seleção é vista como a eliminação dos menos aptos a sobreviverem e numa parcela menor a seleção dos mais aptos. Dessa forma, sobra uma quantidade enorme de fenótipos variados que enfrentam o ambiente com ou sem sucesso. Assim, as características selecionadas são as mais favoráveis dentro de um elenco de variações disponíveis de uma população em um dado momento. Vale a pena lembrar que o ambiente está em processo contínuo de mudança, em conseqüência das ações dos organismos. O surgimento da clorofila causou profunda modificação na Terra. Algas e plantas lançaram grandes quantidades de oxigênio na atmosfera, e surgiu a camada de ozônio. Alguns processos comportamentais causados por nossa espécie trazem modificações ao planeta: o uso indiscriminado de antibióticos e venenos causam resistência a bactérias e insetos, respectivamente; o uso inadequado das fontes de energia, desmatamento e queimadas provocam o efeito estufa; a destruição de habitats e o contato com organismos exóticos podem levar à produção de novos patógenos (vírus do HIV - AIDS). Um exemplo clássico é o das mariposas salpicadas ou sarapintadas (Biston betularia) (fig 5), onde, em ambiente livre de poluição, a forma clara constitui a maioria, e, em ambientes poluídos, a forma escura se sobressai.

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95 http://sti.br.inter.net/rafaas/biologia-ar/ images/acbi0307.jpg Fig 5-Biston betularia

Acessem e leiam o texto do Futuyma “Evolução, ciência e sociedade“ na página da Sociedade Brasileira de Genética (SBG) – http://www.sbg.org.br. O encarte trata de biologia evolutiva. Reflexão da Fix: A metamorfose contínua da Terra resulta da interação dos inúmeros seres existentes em seus ambientes. Se morressem todos os humanos, a vida prosseguiria? E se as plantas morressem?

3.3.1- TIPOS DE SELEÇÃO Existem inúmeras formas de classificar seleção, e cada uma delas foca sua atenção em aspectos ou níveis diferentes:

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1- Natural e artificial - o sucesso reprodutivo direciona a seleção natural, de forma tal que a seleção artificial pode ser limitada pela seleção natural. Um bom exemplo é a seleção artificial para tamanho de corpo no besouro da farinha, Tribolium castaneum. Nesse experimento, Franklin Enfield selecionava as pupas mais pesadas para serem os genitores das próximas gerações, obtendo besouros cada vez maiores, mas, em um dado momento, a seleção natural limitou o aumento corpóreo através da infertilidade (leiam o enfoque técnico das páginas 92 e 93 do livro Fundamentos de Genética do Snustad e Simmons, 2001). A seleção sexual é um componente especial da seleção natural. Esse tipo de seleção consiste em dois processos diferentes. (1) A competição intra-sexual por parceiros, que irá se refletir no dimorfismo sexual (machos maiores que fêmeas em mamíferos, em especial, nos elefantes marinhos) e no desenvolvimento de armas (como chifres, garras, dentes de combate e habilidade de enganar competidores, como em determinados peixes que imitam fêmeas e nadam junto a essas, sem serem banidos pelos machos maiores). (2) A escolha intersexual de parceiros, traduzida por mecanismos indicadores (a produção de ornamentos é custosa, e apenas machos com boa resistência a patógenos são capazes de mantê-los), processo de Fisher (estabilidade de 50:50 no balanço entre os sexos, macho e fêmea) e predisposições sensoriais das fêmeas (preferência por determinadas cores, cantos).


96 2- Seleção estabilizadora, direcional e disruptiva - a Figura 6 representa os três tipos de seleção em relação ao favorecimento de características ou alelos. (1) A seleção estabilizadora conserva os valores intermediários originados pelos heterozigotos Aa (peso de bebês, tamanho de ninhadas), (2) a direcional beneficia valores de uma característica em detrimento da outra, representada pelos alelos A ou a (aumento do tamanho corpóreo de cavalos e do cérebro humano) e (3) a disruptiva elimina heterozigotos e restaura homozigotos AA e aa (gametas de tamanhos diferentes – anisogamia), favorecendo valores extremos.

Escaneado de Snustad e Simmons(2001). Fig 6 - Tipos de seleção

3- Dependente da densidade e dependente da freqüência como os próprios nomes indicam, a primeira se refere à densidade populacional na qual a seleção atua. Maiores densidades trazem menores recursos. O exemplo mais comum de seleção dependente da freqüência é o processo de Fisher. Assim, se há mais machos do que fêmeas, é melhor para os pais produzirem mais fêmeas e viceversa. A população tende a um equilíbrio de 50% para cada sexo. 4- Individual, parentesco e de grupo - as características evoluem, aumentando o sucesso reprodutivo de indivíduos e grupos familiares. A seleção de grupo raramente é efetiva, por ser mais numerosa e apresentar maior variabilidade genética. Desafio da Fix: Imagine-se em uma excursão no pantanal. Um queixada (porco selvagem) corre na direção de três pessoas: alguém do seu núcleo familiar (pai, mãe, irmãos), um amigo e um desconhecido. Você tem a possibilidade de resgatar um deles. Quais seriam suas reações? Discuta com seus colegas.

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97 3.4- DERIVA GENÉTICA A mudança ao acaso na constituição genética de uma população é chamada deriva genética. Ela é maior em populações pequenas do que em grandes, por ser mais provável que uma amostragem pequena apresente maiores desvios do que uma composição total. Novas populações podem ser formadas por um pequeno grupo de indivíduos originários de uma população maior. Esse grupo difere das freqüências genéticas da população parental, devido ao acaso. Assim, alguns alelos podem estar presentes em freqüências altas ou baixas em relação à população inicial. Isso é conhecido como efeito do fundador. De forma similar, se uma catástrofe (tsunami, enchente, furacão, terremoto, erupção vulcânica) eliminasse grande parte de uma população, poucos indivíduos sobreviveriam para se reproduzir, e a composição genética mudaria, como se passasse por um bottleneck ou gargalo genético, havendo perda de genes e aumento da freqüência de outros. Desafio da Fix: Vocês podem tentar realizar a prática sobre deriva. Para isto acessem: www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/vol1Num2.htm Maneira lúdica de se entender deriva alélica.

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No final da década 1960, descobriu-se que havia um grau considerável de variação genética nas espécies, sugerindo a existência de um estoque de variantes genéticas nas populações. O geneticista Motoo Kimura propôs a teoria neutra da evolução molecular, na qual a maior parte das variantes genéticas, criada incessantemente pelas mutações, persiste ou não numa população por deriva (acaso) e não, por efeito da seleção natural. Um argumento a favor dessa teoria é a taxa relativamente constante de substituições de aminoácidos em todas as linhagens de descendência de um ancestral comum. Cada proteína possuiria seu próprio relógio molecular, o qual marcaria o passo das modificações evolutivas. Entretanto, o relógio não é constante o suficiente, ocorre influência do tempo de gerações na evolução sinônima, e por fim, há discordância entre níveis de variação genética e taxas evolutivas. Ohta desenvolveu uma versão modificada da teoria neutra (teoria aproximadamente neutra), de acordo com a qual a maior parte da evolução molecular ocorre à medida que uma mutação quase neutra é substituída por outra. Apesar de o papel do acaso (processo estocástico) ser tema antigo de discussão em evolução, somente nos dias atuais lhe é atribuído o devido valor. O acaso tem função tanto na geração de novos indivíduos, através da mutação e recombinação, como também durante o processo probabilístico de determinação do sucesso reprodutivo desses indivíduos (seleção) e fixação de um alelo por deriva.


98 O perturbador livro do Monod, O acaso e a necessidade, apresenta a origem e a evolução da vida como um “acidente” dentro do grande universo regido pelas leis físicas.

3.5- FLUXO GÊNICO Em contraste com a deriva genética, que ocasiona uma variação aleatória nas freqüências alélicas de populações pequenas, o fluxo gênico é definido como a lenta difusão de genes através de uma barreira. Processo que envolve uma grande população e uma mudança gradativa nas freqüências gênicas. Dessa maneira, os genes das populações migrantes e suas freqüências características vão gradualmente se dispersando no pool gênico da população para a qual migraram.

4- LIMITES E NOVIDADES EVOLUTIVAS 4.1- LIMITES A variação existente em uma população é moldada pela sua história evolutiva, pelo desenvolvimento e pela fisiologia dos organismos. Limites impostos pela química e física não podem ser desprezados. Organismos nos quais estão ausentes sistemas respiratório e circulatório não podem ultrapassar o tamanho de 1mm, limite imposto pela taxa de difusão de oxigênio na água. Animais pesados necessitam de membros mais grossos para a sustentação do peso. Nas brânquias de seres aquáticos circulam grandes volumes de água, causando enorme perda de calor, o que inviabilizaria a homeotermia. A seleção natural pode modificar, apenas, a variação existente em dado genoma. Não há formação de organismos ideais e, sim, mais adaptados para aquele momento (tempo) e ambiente. Características vestigiais constituem evidência morfológica esclarecedora, mostrando seres repletos de pequenas e toleráveis imperfeições, como: mamilos em machos de mamíferos, serpentes com rudimentos de pelve e minúsculas pernas no interior do corpo, besouros dotados de asas sob suas carapaças e incapazes de voar. Espécies aparentemente diferentes têm similaridades subjacentes, devido ao compartilhamento de atributos de seu ancestral comum. Um bom exemplo disso pode ser lido no artigo “Uma nadadeira é um braço é uma asa” da revista National Geographic de novembro de 2006. Esse artigo poderá ser acessado no site: http://www.nationalgeographic.abril.com.br/ngbonline/edicoe s/0611/wings.shtml.

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99 Assim, a evolução de uma espécie é explicada através da história de vida, que é influenciada pela composição genotípica e conectada às trocas de caracteres ou traços. As pressões seletivas atuam nessas variações, dependendo da idade, do tamanho do organismo, da plasticidade fenotípica, da capacidade reprodutiva e do tamanho da prole. Dessa forma, o contexto filogenético, no qual se apresentam os caracteres de uma espécie, representa os efeitos históricos de sua construção. A figura 7 representa a forma através da qual um organismo é desenhado. História de vida (limites) Pressões seletivas

í é ê î Composição è ç Trocas genotípica

î é ê í Contexto filogenético (limites) Figura 7 - Como os organismos são desenhados?

4.2- NOVIDADES EVOLUTIVAS

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Uma novidade evolutiva é uma estrutura que não tem antecedente claro em animais ancestrais nem correspondentes afins (homólogos) em parentes contemporâneos. Dedos, membros, olhos e penas são exemplos de estruturas novas. Atualmente, sabemos que as penas antecederam o vôo e já existiam em dinossauros, provavelmente para aquecimento térmico. Chamamos de exaptação as estruturas preexistentes utilisadas para realizar novas funções. Novidades evolutivas podem advir de três tipos de mudanças. (1) Substituições de aminoácidos, alterando a função protéica, (2) mudanças em seqüências de DNA que regulam genes, ocasionando alterações na forma e função de partes do organismo e a (3) adição de DNA extra por duplicação ou transposição, liberando o DNA novo para atingir novas funções, enquanto as antigas são mantidas pelos genes originais. O campo da biologia do desenvolvimento evolutivo ou evo-devo auxilia na investigação dessas novidades evolutivas através do estudo de um grupo de genes de desenvolvimento conhecidos como genes Hox. Os processos de desenvolvimento envolvem mecanismos complexos pelos quais um organismo cresce, até atingir a plenitude de sua forma e tamanho.


100 5 – EVOLUÇÃO E DIVERSIDADE 5.1- O CONCEITO DE ESPÉCIE Como vimos anteriormente, um dos conceitos mais polêmicos dentro da biologia é o conceito de espécie. Vários autores, desde os tempos de Platão e Aristóteles até Linneu e início do século XIX, identificaram espécies com base, apenas, em suas diferenças morfológicas. Trata-se do conceito tipológico de espécie (CTE). Entretanto, em anos recentes, descobriu-se um número considerável de espécies animais que não eram distinguidas pela morfologia, mas, por suas características não-morfológicas, como por exemplo, o comportamento. Além disso, algumas características intra-específicas podem apresentar notável modificação por sexo, idade, estação do ano ou variação genética comum. Espécies crípticas ou irmãs, por exemplo, podem invalidar um conceito de espécie apoiada, apenas, no grau de diferença. Não existe um conceito que atenda a todas as espécies, pois o sistema de reprodução assexuado ou sexuado é uma barreira para a formação de um conceito geral. O conceito que ancora o reconhecimento de espécies na reprodução é conhecido por conceito biológico de espécies (CBE). A construção desse conceito tem uma longa história que iniciou com Buffon e prosseguiu com Jordan, Poulton, Stresemann, Rensch e Dobzhansky. Coube a Mayr uma definição concisa e utilizada em larga escala em trabalhos que tratam do CBE: “espécies biológicas são grupos de populações naturais intercruzantes e reprodutivamente (geneticamente) isoladas de outros grupos similares”. Dessa maneira, o status de espécie é propriedade de populações e não, de indivíduos. De tal forma, o CBE é inaplicável para organismos assexuados que formam clones e não, populações. Outro problema é a hibridização interespecífica. Em vegetais e fungos, híbridos férteis são comuns. Mas ficaria a pergunta: quanto fluxo gênico pode existir, para que o significado do CBE seja mantido? Os paleontólogos estudavam espécies fósseis e necessitavam de um conceito adequado à discriminação de espécies distribuídas na dimensão do tempo. Simpson criou o conceito filogenético de espécies (CFE): “uma espécie evolutiva é uma linhagem (uma seqüência ancestral-descendente de populações), que está evoluindo, separadamente, das outras, com seu próprio papel e tendências evolutivas uniformes”. O maior problema seria a divisão extrema de espécies. Essa definição só é aplicável para espécies monotípicas.

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101 O conceito ecológico de espécies (CEE), por sua vez, baseado na ocupação de nicho por uma espécie, não é operacional. Populações locais podem diferir em sua ocupação de nicho. Assim, teríamos que considerar duas populações locais como espécies separadas, mesmo se tratando de uma só espécie. O conceito adotado depende em parte do tipo de pesquisa realizada. Taxonomistas podem preferir o conceito tipológico, pesquisadores que trabalham com populações adotam o CBE, e o paleontólogo, por sua vez, não pode deixar de se ater à dimensão do tempo.

5.2- ESPECIAÇÃO Cada espécie biológica reúne o seu conjunto de genótipos balanceados e harmoniosos. Um entrecruzamento entre espécies diferentes leva a um colapso dessa harmonia, refletindo-se em prole com reduzida viabilidade e fertilidade. A aquisição de mecanismos de isolamento previne essas misturas entre diferentes espécies, mantendo o acervo gênico.

5.2.1- MECANISMOS DE ISOLAMENTO

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Existem dois tipos de mecanismos de isolamento reprodutivo, o pré-zigótico e o pós-zigótico. O pré-zigótico impede a união dos gametas de duas espécies e, conseqüentemente, a formação de híbridos na prole de indivíduos pertencentes a espécies diferentes. Esse mecanismo pode ser ocasionado por isolamento ecológico (habitats diferentes), sazonal (estações de reprodução diferentes), comportamental (fraca atração sexual), mecânico (genitálias ou partes florais incompatíveis), gaméticos (incompatibilidade fisiológica de gametas), entre outros. Nos vagalumes, por exemplo, o comportamento de chamada da fêmea é único. Cada espécie emite luz em diferentes intensidades (fraca ou forte), cores (verde a alaranjado) e vezes de acender e apagar a luz. O mecanismo pós-zigótico, por outro lado, inclui a inabilidade de desenvolvimento dos embriões híbridos, a esterilidade de híbridos adultos e a degradação de gerações posteriores de genótipos recombinantes. Na maioria das vezes, isso ocorre devido aos pareamentos inadequados entre cromossomos diferentes, gerando gametas inviáveis. Um exemplo bem conhecido é o da mula, híbrido estéril do cruzamento de égua e jumento. A divergência de seqüências de DNA pode atuar como uma barreira para a recombinação, oferecendo uma base estrutural para o isolamento.


102 5.2.2- TIPOS DE ESPECIAÇÃO Existem vários tipos de especiação, entretanto vamos destacar dois tipos: (1) a especiação geográfica ou alopátrica e (2) a especiação simpátrica. A primeira caracteriza-se pela ocorrência de modificação gradual das populações isoladas geograficamente de suas espécies parentais. Caso se encontrem, vão estar reprodutivamente isoladas, e o fluxo gênico será zero. A segunda é definida como a origem de uma nova espécie através da especialização ecológica dentro dos limites da espécie parental. Dessa forma, envolve fluxo gênico diminuído (diferente de zero) em combinação com a seleção divergente, entre os grupos diferentes. Um exemplo desse tipo de especiação é a poliploidia, causada por um aumento do número de conjuntos de cromossomos, trazendo um isolamento reprodutivo. Desafio da Fix: Vocês podem tentar realizar uma prática sobre o problema das adaptações, representando o que ocorre na natureza em termos de disponibilidade de recursos (quantidade de sementes) e características morfológicas (bicos das aves). Para isto, acessem. www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/vol1Num1.htm Os tentilhões de Galápagos: O que Darwin não viu, mas os Grants viram.

6- MACROEVOLUÇÃO A microevolução descreve processos que ocorrem dentro de espécies e de populações, enquanto a macroevolução descreve padrões através das comparações entre espécies e grandes grupos, como famílias, ordens e filos.

6.1- HISTÓRIA DA VIDA Em seu clássico de 1944, O que é vida?, o físico e filósofo austríaco Erwin Schrödinger inspirou toda uma geração de cientistas. A vida, definiu ele, é uma matéria que, tal como um cristal (um estranho “cristal aperiódico”), repete sua estrutura ao crescer. Porém, a vida é muito mais imprevisível do que qualquer mineral. A vida surgiu por volta de 3,5 bilhões de anos atrás, em nosso planeta e poderá terminar em meros cem milhões de anos, quando o sol vier a morrer. Escutando música com a Fix: existe uma música chamada Planeta sonho, do grupo 14 bis, que trata da problemática da morte do sol. Escute-a e discuta com seus colegas as conseqüências disso.

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103 Grande parte das pesquisas sobre a origem da vida é realizada em laboratórios, buscando compreender os tipos de reações químicas que poderiam ter ocorrido na Terra há 4 bilhões de anos. Embora não saibamos ao certo como a vida começou, existem várias hipóteses que tratam do tema: (1) a sopa primitiva de Oparin e Haldane; (2) a hipótese de que a vida haveria surgido em um substrato sólido, a pirita; (3) a evolução de ciclos químicos em gotículas de água nas nuvens e (4) a proposta de uma origem vinda do espaço, através da presença de matéria orgânica em meteoritos, dentre outras. O ácido ribonucléico (RNA) é cotado como a molécula replicável ancestral, pelo fato de ser mais simples, de fita única, assumir estruturas diferentes e ter papel catalítico (enzimático). O ácido desoxirribonucléico (DNA) o procedeu e, provavelmente, por ser mais estável e ter uma menor taxa de mutação, estabeleceu-se como repositório da informação genética. As células evoluíram como um sistema simples de membranas e uma molécula replicadora. A divisão classificatória mais inicial de vida celular é uma árvore trifurcada em arqués, bactérias e eucariotos. Para saber mais sobre a origem da vida e o mundo de RNA, consulte os capítulos 1 e 2 de Matioli (2001).

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O mundo era domínio absoluto dos unicelulares, mas, há cerca de 1,5 bilhões de anos, surge a vida pluricelular com tipos celulares especializados. Entretanto, o documentário fóssil de plantas e animais pluricelulares só teve início no Cambriano (450 milhões de anos atrás). A explosão de vida nesse período é assunto de intensa pesquisa. Hipóteses recentes examinam mudanças no ambiente externo ou inovações biológicas internas ou consideram a mistura de ambas, embora não haja consenso. A saída dos organismos da água para a terra foi um processo lento. Primeiro os micróbios, depois os fungos e as plantas. Os principais eventos da evolução de plantas terrestres foram a formação de esporos resistentes, o desenvolvimento de tecido vascular, seguido das raízes e folhas. As plantas com sementes constituem os principais grupos atuais de plantas terrestres e estão classificadas em gimnospermas (coníferas) e angiospermas (plantas com flores). Essas últimas proliferaram mais tarde, no Cretáceo (200-250 milhões de anos), e sua origem encontra-se ligada à coevolução com insetos polinizadores. Bem mais tarde (60 milhões de anos), surgem as gramíneas que coevoluiram com os mamíferos herbívoros.


104 Os fósseis de vertebrados mais antigos são os peixes, datando do Cambriano e Pré-Cambriano superior. Assim como as plantas, alguns peixes também conquistaram a terra. A maioria dos peixes ósseos atuais possui nadadeiras raiadas, embora os tetrápodes (anfíbios, répteis, aves e mamíferos) atuais descendam de peixes ancestrais de nadadeiras lobadas (pulmonados e celacantos). Em algum momento da história evolutiva, existiu uma espécie de peixe que originou outras, e por meio de gerações sucessivas e etapas de ramificação da árvore da vida, surgiram muitas espécies, incluindo os peixes atuais e o homem. O grande passo na evolução dos vertebrados terrestres foi o surgimento do ovo amniótico, libertando répteis, aves e mamíferos da dependência da postura na água. Répteis e aves evitam o ataque do sistema imunológico, protegendo o feto com o ovo com casca, expelindo-o do corpo materno. Dentre os mamíferos, os monotremados (ornitorrinco) põem ovos, marsupiais dão a luz prematuramente a seus embriões, e placentários isolam o feto no útero através da placenta, que o alimenta e o protege do sistema imunológico da mãe. O predomínio dos dinossauros impedia que os nossos ancestrais mamíferos se tornassem maiores que um gato doméstico; mas uma catástrofe provocada por um asteróide ou cometa resultou na extinção desses répteis há 65 milhões de anos. Sem a presença desses, os mamíferos puderam conquistar diversos nichos ecológicos, em explosiva diversificação demonstrada pelo registro fóssil. Os mamíferos viventes são divididos em prototérios, metatérios e eutérios ou placentários. Pertencemos a esse último grupo e descendemos de ancestrais primatas arborícolas. A despeito das diferenças morfológicas, o DNA de macacos e humanos é muito semelhante. Ocorre um alto grau de homologia (mais de 95%) entre chimpanzés e humanos. Dessa forma, humanos e macacos são parentes próximos, e esse alto grau de identidade sugere que divergimos de um ancestral comum, bem recentemente no tempo evolutivo, talvez entre 5 a 9 milhões de anos atrás.

6.2- ORIGENS HUMANAS Os fósseis, apesar de escassos, nos deram importantes informações sobre a evolução humana. Todos os primeiros fósseis hominídeos vieram da África. Há 3-4 milhões de anos, surgiu o Australopithecus afarensis, representado pela famosa Lucy. O gênero Homo

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105 apareceu há 2-2,5 milhões de anos. Entre 1,9-1,5 milhões de anos passou a existir um hominídeo de compleição moderna, o Homo ergaster. Há cerca de 1 milhão de anos, o Homo erectus, deixava vestígios fósseis fora da África, encontrados na China e Indonésia. Entre 600 a 200 mil anos, vivia na Europa e África o Homo heidelbergensis com 93% da capacidade cerebral atual. Entre 23030 mil anos surgia o Homo neanderthalensis. De fato, eles podem ter convivido e competido com as populações que evoluíram nos humanos modernos (150 mil anos). Ao comparar fósseis de hominídeos extintos, pesquisadores desenharam várias árvores evolucionárias humanas. Ao longo de milhões de anos, mais de uma dúzia de espécies de hominídeos evoluíram em simpatria. Contudo, há cerca de 30 mil anos, só restava uma espécie de hominídeo: Homo sapiens.Atualmente, podemos estar em qualquer lugar do planeta em horas ou dias, não havendo isolamento para uma nova espécie de humanos surgir. A evolução humana foi marcada por cinco grandes transições: (1) 5 milhões de anos - saída da floresta para a savana; (2) 2,5 milhões - produção das primeiras ferramentas de pedra; (3) 1,5 milhões - produção dos machados de mão, (4) 500 mil anos - domínio do fogo; (5) 50 mil anos - conquista do pensamento simbólico e expressão na forma de pinturas em cavernas, joalheria (entalhes e conchas), escultura, armas intrincadas e enterros elaborados.

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Ocorreram várias mudanças morfológicas depois que nossos ancestrais deixaram as florestas e passaram a viver em savanas: o aumento do cérebro, a mudança nas mandíbulas e nos dentes (nossos ancestrais eram prognatos e possuíam grandes caninos), o bipedalismo (locomoção ereta sobre duas pernas) e suas adaptações (comprimento de braços, posição de crânio sobre a coluna cervical, estreitamento da pelve), dentre outras. A mudança no comportamento social e cultural permitiu que formássemos grupos de indivíduos cada vez maiores. No início, não passávamos de 55 indivíduos (3 milhões de anos atrás Australopithecus afarensis), todavia com o surgimento do gênero Homo (2 milhões de anos) éramos capazes de formar grupos de 80 indivíduos, que foram aumentando para 100 (1 milhão de anos) e 150 (100 mil anos). Atualmente, formamos grupos enormes, entretanto se estima que o número de 150 indivíduos permite um contato social adequado, sendo possível conhecer individualmente cada pessoa. A principal mudança subjacente à cultura humana foi a linguagem, que nos permitiu penetrar no mundo simbólico. A linguagem permitiu estreitar laços com uma quantidade maior de indivíduos, o que seria impossível, apenas, com a catação (grumming).


106 Desafio da Fix: Assistam ao filme BBC Worldwide Ltd 2003. Homens das cavernas. Superinteressante - Editora Abril, 2004. Nesse filme, dividido em episódios, vocês irão entrar em contato com os diversos hominídeos que coexistiram na pré-história. Iniciem a jornada, observando nossa ancestral Lucy (Australopithecus afarensis) e todas as modificações ao longo da nossa jornada para a humanização. Divirtam-se! Os genes determinam o curso da seleção natural, mas as invenções humanas podem alterar as aptidões. A coevolução da cultura e dos genes tornou possível mudanças importantes, como a adoção de novas dietas, a conquista de novos habitats e a adaptação a patógenos. A maioria dos mamíferos, inclusive o homem, pára de produzir a lactase ao se tornar adulta, embora algumas pessoas sejam capazes de continuar bebendo leite por ainda produzir a enzima. Essa capacidade tornou-se comum com a domesticação do gado (10 mil anos atrás). Em regiões de malária, doenças, como a talassemia e a anemia falciforme, são comuns, embora raras ou inexistentes em outras partes do mundo. O gene para a anemia falciforme marca a expansão da agricultura. A floresta devastada dava lugar a plantações. Ao chover, poças eram formadas na terra erodida, auxiliando na proliferação de mosquitos (Anopheles), que portam o Plasmodium falciparum, causador da malária. Fórum: pesquisem sobre a anemia falciforme. Comparem a adaptabilidade de pessoas com genótipos diferentes (HbA HbA, HbA HbS, HbS HbS) em áreas com e sem malária. O que poderíamos esperar em termos de diminuição de freqüência na população para o alelo HbS se a malária for erradicada? Modificamos o ambiente, e, hoje, temos o controle de muitas doenças que nos matariam antes de alcançarmos a idade reprodutiva. Assim, à medida que as diferenças no sucesso reprodutivo humano diminuem, a seleção natural torna-se mais fraca. A biologia evolutiva procura explicar, as diversas características dos organismos, baseada nos princípios da adaptação, do acaso e da história, ocupando, por isso, uma posição central dentro das Ciências Biológicas. Entendendo a história da vida na Terra, os pesquisadores podem criar novos remédios e vacinas, determinando como devem ser administrados. Perceber como surgiu a AIDS, utilizar fósseis como marcadores em formações ricas em petróleo, evitar o uso indiscriminado de antibióticos e venenos, auxiliar na preservação de espécies, dentre outros exemplos, nos faz compreender que somos parte de um complexo e delicado sistema de intercâmbio com toda a natureza e que nossas ações modificam o planeta como um todo.

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107 No nordeste (Bahia), existe um grupo muito atuante nessa área da biologia, Grupo de Pesquisa em História, Filosofia e Ensino de Ciências Biológicas, coordenado pelo prof Charbel Niño El-Hani: http://www.gphfecb.ufba.br/ . Vale a pena conferir!

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Referências

Leitura fundamental GRIFFITHS, A. J. F.; WESSLER, S. R.; LEWONTIN, R. C.;GELBART, W. M.; SUZUKI, D. T.e MILLER, J. H. Introdução à Genética: Rio de Janeiro: Guanabara Koogan S/A, 2006. MATIOLI, S. R. Biologia Molecular e Evolução. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2001. RIDLEY, M. Evolução. Porto Alegre: Artmed, 2006. SNUSTAD, D. P. e SIMMONS M. J. Fundamentos de Genética: Guanabara Koogan S/A, 2001. Leitura complementar DARWIN, C. A origem das espécies. Belo Horizonte-São Paulo: Itatiaia-EDUSP, 1985. FUTUYMA, D. Biologia Evolutiva. Ribeirão Preto: SBG, 1992. MAYR, E. Biologia, ciência única - reflexões sobre a autonomia de uma disciplina científica. São Paulo: Editora Schwarcz Ltda, 2005. MEYER, D. e EL-HANI, C. N. Evolução: o sentido da biologia. Coleção paradidáticos. São Paulo: Editora UNESP, 2005. MONOD, J. O acaso e a necessidade: ensaio sobre a filosofia natural da biologia moderna. Petrópolis: Editora Vozes, 2006. STEARNS, S. C. e HOEKSTRA, R. F. Evolução: uma introdução. São Paulo: Editora Atheneu, 2003. Filme BBC Worldwide Ltd 2003. Homens das cavernas. Superinteressante - Editora Abril, 2004. (solicite pela internet: w w w. s u p e r i n t e r e s s a n t e . c o m . b r / l o j a o u p o r e m a i l : produtos@abril.com.br )


Sites Artigo sobre raça: (Scientific American Brasil edição nº 20 – jan 2004): http://www2.uol.com.br/sciam/conteudo/materia/materia_38. htm . Sociedade Brasileira de Genética (SBG): http://www.sbg.org.br Programa GBOL: http://www.ufv.br/dgb/gbol Prática sobre deriva: www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/vol1Num2.htm Artigo “Uma nadadeira é um braço é uma asa” da revista National Geographic 2006: http://www.nationalgeographic.abril.com.br/ngbonline/edicoe s/0611/wings.shtml. Prática - Os tentilhões de Galápagos: O que Darwin não viu, mas os Grants viram: www.sbg.org.br/GeneticaEscola2/web/vol1Num1.htm Grupo de Pesquisa em História, Filosofia e Ensino de Ciências Biológicas: http://www.gphfecb.ufba.br/


Glossário

Aconselhamento genético - fornecimento de informações genéticas para facilitar uma tomada de decisão informada. Adaptação - uma particularidade de um indivíduo que auxilia na sua sobrevivência e reprodução. Alelismo múltiplo - relação entre dois ou mais alelos. Alelo - forma alternativa de um mesmo gene. Alelo letal - gene que em homozigose provoca a morte do indivíduo. Anagênese - mudança evolutiva em uma linhagem filogenética única. Ancestral comum - relativo aos nossos antepassados, os que nos antecederam e nos deixaram informações que são compartilhadas com todos os seres. Antecipação - tendência de algumas características surgirem mais cedo e com maior gravidade a cada geração subseqüente. Autofertilização - união de gametas oriundos de um mesmo indivíduo. Autofertilizados - ver autofertilização Características qualitativas - características monogênicas cuja variação entre as classes é descontínua, permitindo a rápida distinção entre as diferentes classes fenotípicas. Características quantitativas - características poligênicas cuja variação entre as classes é contínua, permitindo a separação de classes através de divisão arbitrária da variação. Catação (grumming) - processo de limpeza do pêlo de primatas, onde um indivíduo retira piolhos, pulgas, carrapatos, e restos de comida aderidos. Comportamento que amplia os laços de afetividade e cooperação do grupo. Cladogênese - origem e multiplicação de espécies e de táxons superiores. Classificação filogenética. Código genético - sistema utilizado para relacionar as seqüências de nucleotídeos do DNA e do RNA mensageiro e as seqüências de aminoácidos nas proteínas formadas na tradução. Codominância - relação entre alelos, na qual cada um deles se manifesta no fenótipo do heterozigoto. Conformação cis - ou acoplada. Dois alelos dominantes (selvagens) estão presentes no mesmo homólogo. Conformação trans - ou em repulsão. Os alelos se encontram em homólogos diferentes. Crossing - termo inglês para a palavra permuta. Troca de segmentos entre cromátides (não irmãs) pertencentes a cromossomos homólogos.


Cruzamento diíbrido - cruzamento em que analisamos dois genes. Cruzamento monoíbrido - cruzamento em que analisamos apenas um gene. Deriva genética - variação aleatória na freqüência gênica de uma geração para outra em uma população. Determinismo - é a crença de que a maioria dos processos na natureza inanimada é estritamente determinada por leis naturais – físicas. Determinista - ver determinismo. Diplóide - célula ou indivíduo que apresenta dois conjuntos de cromossomos homólogos. Dissomia uniparental - herança de dois alelos homólogos de um dos genitores. Distúrbios multifatoriais - doenças causadas pela interação de fatores genéticos e ambientais. Diversidade - existência, numa dada região, de uma grande variedade de espécies, ou de outras categorias taxonômicas. Doenças comuns - doenças multifatoriais como diabetes e doenças cardiovasculares. Dominância incompleta - interação entre alelos em que o fenótipo do heterozigoto é intermediário ao dos parentais homozigotos. Dominante - caráter que se expressa na presença de outro alelo do mesmo loco gênico, mascarando a expressão do outro. Efeito do fundador - é o fenômeno da perda de variação genética, quando uma nova colônia é formada por um número menor de indivíduos do que o da população original. Epistasia - alteração na expressão de um gene por outro gene (gene encobre o efeito de outro). Equilíbrio pontuado - alternância, numa linhagem filética, de mudanças evolutivas extremamente rápidas e outras normais ou lentas. Especiação - processo evolutivo que acarreta na multiplicação das espécies. Espécies crípticas - ou irmãs, são populações fenotipicamente muito semelhantes ou idênticas que se reproduzem isoladamente uma da outra. Essencialismo – crença em que a diversidade consistia em um número limitado de essência, delimitadas e imutáveis. Pensamento tipológico. Evolução - Darwin definiu-a como “a descendência com modificações”. É a mudança, entre as gerações, nas linhagens das populações. Expressividade variável - amplitude na qual os efeitos gênicos se manifestam e o fenótipo pode variar de leve a severo. Fenótipo - determinado aspecto exibido por um caráter em função da inter-relação entre a composição genética de um indivíduo e seu ambiente. Inclui não apenas características morfológicas, mas também as fisiológicas e comportamentais.


Fertilização cruzada - cruzamento entre indivíduos da mesma espécie. Gargalo genético - perda de genes e aumento da freqüência de outros devido a catástrofes, reduzindo a população reprodutiva e alterando a composição genética. Gene - seqüência de nucleotídeos que codificam um RNA ou um polipeptídeo. Genes Hox - grupo de genes que atuam no desenvolvimento. Auxiliam a determinação e diferenciação celular nas várias regiões do organismo. Genes ligados - genes situados em um mesmo cromossomo. Genes modificadores - gene que atua sobre outro modificando ligeiramente a característica determinada por este. Genes supressores - genes que suprimem a atividade de outros ou revertem o efeito de uma mutação de outro gene, restaurando o fenótipo selvagem. Genótipo - constituição genética de um indivíduo. Geração inicial - o mesmo que geração parental, aquela que inicia uma família. Geração parental - o mesmo que geração inicial, aquela que inicia uma família. Gradualismo - transformação evolutiva originada por mutações lentas e graduais. Grupo de ligação - conjunto de genes situados no mesmo cromossomo. Hemizigoto - célula ou indivíduo que só apresenta um alelo para um determinado loco gênico. Herança - capacidade de transmissão de certo caractere de uma geração a outra. Herança epigenética - alteração na expressão gênica não causada por uma mudança na estrutura do gene. Herança mitocondrial - herança onde os genes são oriundos apenas da mãe através das mitocôndrias. Herança organelar - herança não nuclear, os genes são provenientes das mitocôndrias e/ou cloroplastos. Herança sólida - ou particulada é aquela transmitida por genes. Herança tênue - ou por mistura é aquela onde se acreditava na mistura de informações genéticas. Refutada. Heredograma - diagrama que apresenta gerações de parentes, a relação destes com o probando, e sua situação em relação a uma determinada característica genética. Heterogeneidade genética - termo que significa variação. Na heterogeneidade alélica as mutações diferentes no mesmo gene causam um fenótipo idêntico. Na heterogeneidade de loco, fenótipos similares são causados por mutações em locos diferentes. Heterozigotos - indivíduo que mostra alelos diferentes para o loco gênico considerado.


Hipótese de nulidade - postula não haver diferença entre as populações ou grupos em comparação, com relação ao fator, característica ou condição de interesse. Ver hipótese nula. Hipótese nula - hipótese principal é aquela que iguala o parâmetro a ser testado a algum valor referencial. Ver hipótese de nulidade. Homozigotos - indivíduo com alelos idênticos no mesmo loco gênico. Imprinting parental - expressão diferencial de um gene dependendo do genitor de origem. Inativação do X - processo de compensação de dosagem gênica em fêmeas de mamíferos, onde um dos cromossomos X é quase inteiramente heterocromatinizado e silenciado genicamente. Interferência - processo no qual a presença de um quiasma pode interferir na presença de um segundo crossing na vizinhança. Letal dominante - gene que mata o indivíduo quando em homozigose dominante. Letal recessivo - gene que mata o indivíduo quando em homozigose recessiva. Ligação - situação na qual dois ou mais genes segregam juntos, durante a transmissão para a descendência, em virtude de sua proximidade no mesmo cromossomo. Ligação incompleta - o mesmo que distribuição independente. Macroevolução - evolução em grande escala que ocorre em nível superior ao de espécie. Malformações congênitas - defeitos de nascimento oriundos de processos desenvolvimentais intrinsecamente anormais. Mapa genético - definição da localização das unidades genéticas em cada cromossomo. Mapas citológicos - baseados em características citológicas, como o padrão de bandeamento cromossômico observado ao microscópio. Mapas físicos - determinados pelas distâncias de bases que separam os marcadores moleculares. Metilação - adição de um grupo metil a citosina no DNA, com papel regulatório na expressão gênica. Mosaicismo - presença de duas ou mais linhagens de células originadas de um só zigoto. Mutação - alteração do material genético. Não-disjunção - não separação de cromossomos homólogos ou cromátides irmãs durante a anáfase I e II, respectivamente, levando a uma distribuição desigual destes nos pólos da célula em divisão. Organismos modelos - organismos utilizados para estudos, como por exemplo, Escherichia coli, Arabdopsis thaliana, Neurospora crassa, Drosophila melanogaster. Através deles inferimos processos semelhantes para táxons próximos. Paradigma - sistema de crenças, valores e generalizações que domina uma ciência ou um ramo da ciência em determinada época.


Paramutação - processo pelo qual o RNA pode influenciar a hereditariedade à semelhança do DNA. Penetrância - expressão tudo ou nada de um genótipo mutante. Permuta - troca de segmentos entre cromátides (não irmãs) pertencentes a cromossomos homólogos. Pleiotropia - efeitos fenotípicos múltiplos de um único gene. Poligenia - efeito aditivo de genes que podem determinar aspectos quantitativos do fenótipo. Polimórficos - ver polimorfismo. Polimorfismo - ocorrência simultânea de diversos fenótipos, onde uma população possui mais do que um alelo para determinado loco. Poliploidia - condição na qual o número de cromossomos é um múltiplo inteiro do número haplóide. Pool gênico - ou acervo gênico é a composição genética total de uma população. Princípio da distribuição independente - pares de genes em cromossomos diferentes se distribuem independentemente na meiose. Princípio da dominância - ocorre predominância de um caráter na F1 (primeira geração híbrida) considerado dominante em relação às características alternativas chamadas de recessivas. Princípio da segregação - durante a reprodução sexual os alelos de cada genitor se separam ou segregam, produzindo gametas com apenas um alelo daquela característica estudada. Princípio de Hardy-Weinberg - é a razão das freqüências genotípicas que se originam quando os cruzamentos são aleatórios, a população é grande e os fatores evolutivos não estão atuando. Probando - propósito ou indicador, indivíduo portador de uma anomalia que chama a atenção médica para o estudo da família. Quadrado de Punnett - quadro usado para determinar os genótipos de um dado cruzamento. Quiasmas - pontos de trocas entre cromossomos homólogos, evidência física da permuta. Recessivo - caráter que se expressa apenas em dose dupla do mesmo alelo no loco gênico. Recombinação - evento que ocorre durante a segregação de cromossomos (recombinação cromossômica) ou durante a meiose (recombinação gênica). Relógio molecular - é a teoria na qual moléculas evoluem em uma taxa aproximadamente constante. Repetições de trinucleotídeos - repetições de trincas de nucleotídeos que podem estar em quantidades normais ou anormais, gerando doenças. Saltacionismo - transformação evolutiva originada por mutações drásticas.


Seleção natural - processo pelo qual formas de organismos de uma dada população que estão melhores adaptadas ao ambiente presente aumentam em freqüência em relação as demais, ao longo de uma série de gerações. Sexo heterogamético - indivíduo que produz mais de um tipo de gameta, determinando o sexo da espécie. Sexo homogamético - indivíduo que produz apenas um tipo de gameta. Teleologia cósmica - explicação de processos naturais que conduzem automaticamente a um fim definido ou a uma meta Teoria cromossômica da herança - teoria que uniu as idéias de continuidade e individualidade dos cromossomos, de Sutton e Boveri, respectivamente. Teoria neutra - é a teoria em que a maior parte da evolução em nível molecular ocorre por deriva. Teste dos três pontos - teste no qual um triplo heterozigoto é cruzado com um triplo homozigoto recessivo, fornecendo uma descendência com números variáveis de crossings e freqüências, permitindo determinar a distância entre três locos e a ordem seqüencial dos genes. Unidade de mapa - ou centimorgan (cM) é a distância entre dois locos acarretando uma freqüência de recombinação (FR) de 0,01 (1%). Vitalismo - crença na existência de uma força oculta e invisível nos organismos vivos, responsável pelas manifestações da vida em organismos vivos.


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