Revista Flumen

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ar te_ cultura

edição 1

1º trimestre 2018

R$ 40,00


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create your own world

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COLABORADORES

HELENA SCHIMIDT

FELIPE ROSA

VICTOR ALIPERTI

EQUIPE FLUMEN

BEATRIZ MONTALTO

ISADORA BUSSAB

ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING curso de graduação em design com habilitação em comunicação visual e ênfase em marketing

MILENA DAMASCENO

LETÍCIA SOUZA

ROBERTA PICCININ

projeto integrado do 3º semestre projeto editorial gráfico: projeto iii Cultura e Informação | Marise De Chirico Beatriz Montalto Comunicação e Linguagem | Patricia Amorim Isadora Bussab Marketing II | Giancarlo Ricciardi Letícia Souza Produção Gráfica | Marcos Mello Milena Damasceno Cor e Percepção | Paula Csillag Roberta Piccinin

B E M V I N D O

É com imensa alegria que vimos nascer. Seguramos no colo, choramos de raiva e felicidade, aprendemos a andar e hoje, exatamente nesse momento, proferimos nossas primeiras palavras. Isso não diz respeito apenas a nós, mulheres, editoras da Flumen, mas a todos que estiveram presentes conosco nesta criação, e a você, leitor. Com imenso carinho, trazemos este amor de mãe, entre altos e baixos, para entrar nesse mundo praiano que é a cidade do Rio de Janeiro. Emociona ver e ter nas mãos o resultado de tanta dedicação para um assunto que estava faltando nas bancas. Você vai conhecer sobre arte e moda, um pouquinho sobre política, quem sabe até sobre música! E o nosso dizer, não vai ser difícil ou complexo. Ele vai ser leve e fluido. Nós já aprendemos a caminhar e desbravar os mundos à nossa volta. Porém, agora é o momento de nos perdermos e nos encontrarmos em águas novas, limpas ou barrentas, e recomeçar. Desbrave as ruas que você já conhece com outros olhares, sabendo do novo. E na hora em que você chegar perto, observe a vitrine e o que ela tem a dizer. Com o passar do tempo e das páginas, veremos juntos uma dança na sua mais crua expressão, começando leve e harmônica, chegando ao seu clímax surpreendente, e por fim, seu desfecho calmo. Viemos, nós da revista Flumen, celebrar a conexão entre arte e vida, em suas molduras mais inusitadas, seus encontros mais exóticos e sua natureza mais pura. Não só ela, mas também a crítica, o corpo e a sociedade fluem juntos nessa roda viva. A fim de compartilhar nossa experiência, receba esta revista como um ponto de partida dentro do mundo das linguagens. A Flumen percorre as águas do Rio que evaporam ou condensam, mas continuam presentes. Nós seremos seu ponto de confluência. EQUIPE FLUMEN


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AS ESTAMPAS DE CHITÃO POR ALINE MIGUEL

LETRUX É LETÍCIA LETÍCIA É LETRUX

17_ MADE IN RIO

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GRAFITTI MARCELO MENT - DO SUBÚRBIO DO RIO

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PONTILHISMO DE WILL BARCELLOS

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+18 OS QUADRINHOS ERÓTICOS DE CARLOS ZÉFIRO

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O RIO DE JANEIRO POR MARINA PAPI

60_ MENINOS DA BANDA DÔNICA

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O CHARME DA BANDA TONO

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O PROTAGONISMO DA COMUNIDADE LGBTQ+

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‘DESNUDE’ E O PROTAGONISMO DAS MULHERES

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É SAMBA QUE ELAS QUEREM?

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XARPI E AS PIXAÇÕES CARIOCAS

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52 ‘PENDULAR’, AS FRONTEIRAS DOS RELACIONAMENTOS

O PROJETO ZONA E A SÉRIE AFRO-FEMINISTA

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MARINA BENZAQUEM, 17 ANOS

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FAVELAGRAFIA + RESERVA: CONHEÇA A PARCERIA

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PROJETO SUBÚRBIO CARIOCA SE DESTACA NA FOTOGRAFIA

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LOCALIZA AÍ + ENCARTE

MAM QUER VENDER POLLOCK

MAXWELL ALEXANDRE E A IGREJA DA ARTE

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MC CONTESTA A HISTÓRIA DO BRASIL

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READYMADE: OUTROS NOMES—OUTRXS DEUSXS—

OS LIMITES DA ARTE MARIELLE E O QUARTEIRÃO CULTURAL

118_ DA PERIFERIA DO RIO A 9 PAÍSES

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O JUSTO É O NOVO PRETO

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AGENDA 20_

VITRINE 70_

PORTFÓLIO 134_

COÉ PROSA 144_


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AGENDA_

3_POP UP ART GALERY

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1 à 29 de março

que horas_segunda à sabado das 10h às 22h

domingo e feriado das 15h às 21h shopping quanto_entrada gratuita onde_casa&gourmet

A exposição apresenta obras de cinco artistas com diferentes temas e formas de expressão em um ambiente calmo, que convida ao relaxamento e a contemplação das obras de arte. Os artistas se alternarão em sessões de live painting.

4_A CARA DO RIO quando_de

1_DIÁLOGOS URBANOS

1º de março à 22 de abril à domingo das 12h às 19h onde_centro cultural dos correios quanto_entrada gratuita que horas_terça

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à 22 de abril 09h às 22h onde_shopping bossa nova quanto_entrada gratuita que horas_das

quando_segunda

à sábado 10h às 17h onde_palácio tiradentes quanto_entrada gratuita que horas_das

Exposição do artista Anderson de Souza na qual ele propõe uma interação do espectador com as obras.

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2 RIO EM CONTRASTE

É um projeto fotográfico que tem como base as diferenças culturais, sociais, históricas e também naturais da Cidade Maravilhosa. A exposição conta com a curadoria de Marcello Cavalcanti.

Tudo começou em 2003, quando 25 artistas se reuniram pela primeira vez na mostra A Cara do Rio, na extinta Galeria Matias Marcier. A partir daí, a coletiva passou a fazer parte do calendário da cidade. A exposição conta com a curadoria de Marcelo Frazão e com obras que traduzem o espírito carioca.

5 DISRUPTIVA quando_de

13 de abril à 4 de junho à quarta das 9h às 21h onde_centro cultural banco do brasil quanto_entrada gratuita que horas_segunda

Uma iniciativa do FILE (Festival Internacional de Linguagem Eletrônica), essa exposição está dividida em quatro aspectos que representam o conjunto de novos comportamentos – o corpo vivencial, o corpo cinético, o corpo virtual e o corpo lúdico, também destaca a interatividade em instalações que sugerem a imersão digital, selfies misturados, a emoção real e virtual.

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XARPI E AS PIXAÇÕES CARIOCAS por_Felipe

sinuosas, ondas. Pode ser que a geografia da cidade carioca tenha influenciado, muitos morros”. O grande objetivo do livro é ser um registro histórico e estético de uma manifestação artística genuína. “A caligrafia carioca difere da de outros grandes centros como São Paulo ou Nova York e mais de 95% das pixações registradas através de foto contidas nesse livro já foram apagadas”, explicou o autor. A proposta do livro é fazer um recorte no tempo-espaço, retirando as pixações do suporte original, organizando-as de maneira simples, fora do contexto usual, sem apologia, sem julgamento de valor ou ético, apenas percebendo seu grafismo e sua dinâmica. São mais de 1.400 fotografias de inscrições que estiveram presentes nos muros do Rio nas décadas de 70, 80 e 90, além de uma cronologia do fenômeno ao longo desse período. São grafismos que promovem questionamentos e ressignificados para os autores, para as pessoas impactadas pelo ato do pixo e também na percepção dos locais escolhidos. “A pixação é feita de pixador para pixador.” O livro documenta a expressão na sua versão genuinamente carioca – antes que o tempo apague as marcas que pretendiam ser eternas.

Larozza Marcelo de Carvalho

fotos_João

Nos anos 80 desembarcou no Rio de Janeiro a pixação. O designer e fotógrafo João Marcelo de Carvalho curtia sua infância quando as paredes cariocas começava a ganhar suas primeiras marcas. Muita tinta rolou até que, em 2005, em uma conversa informal, ele decidiu que começaria a documentar o fenômeno carioca. “Meu amigo Clécio Freitas me alertou que eu tinha o know-how suficiente para fazer esse registro. Ele ainda teve a visão de que as pixações dos anos 80 seriam apagadas em pouco tempo.” A conversa com o Clécio rolou em um sábado, já no domingo começaram a ser feitas as primeiras fotos. Oito anos de trabalho depois surgiu o projeto do livro Xarpi, um registro histórico das pixações cariocas do final dos anos 70 até os anos 90. A palavra “xarpi”, pixar escrito ao contrário, faz parte do vocábulo em código criado nas ruas cariocas. A lógica é falar as sílabas de trás pra frente, segredo há tempos revelado, ainda assim uma tradição: a língua do ttk. João teve o primeiro contato com a pixação na Vila Isabel, aos 6 anos de idade. “As pixações naquela época eram legíveis, era o começo. Eu meio que aprendi a ler vendo pixação”, conta o autor. Ele também conta um pouco sobre a diferença entre o pixo paulista e o xarpi carioca: “No Rio de Janeiro em primeiro lugar está a busca pela fama individual do pixador, depois a fama da sigla, grupo de pixadores que ele assina”. Ele também cita as diferenças estéticas: “muitos atribuem a pixação de São Paulo aos logos das bandas de heavy metal e aos arranha-céus. No Rio de Janeiro, os pixos têm formas

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Imagem do livro Xarpi

UM MARCO HISTÓRICO O livro Xarpi está a venda no Mercado Livre ou por contato direto no Instagram @livroxarpi R$ 50,00

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AS ESTAMPAS DE CHITÃO

modelo vivo. Fiz também aulas de materias diferentes como carvão, stencil, grafitti, essas coisas. Aprendi com mestres como Amador Perez, Jack Endewetlt (NY), Sansão Pereira e Renato Alarcão. No streetart, tive aulas com os artistas Bruno Big e Marcelo Ment. Meu trabalho nas artes plásticas alia duas paixões: a pintura de retrato e a criação de estampas. Como surgiu a ideia de misturar as estampas de chita com pinturas de mulheres negras? ALINE MIGUEL As mulheres negras e as estampas de chita sempre me despertaram especial interesse. As mulheres negras, pela sua beleza, força e alegria, e a chita pelo seu colorido vibrante e identidade marcante. Eu desenvolvia pintura das mulheres nas quais a chita aparecia somente como um complemento, um detalhe no trabalho final. Aos poucos, fui fazendo novas experimentações e assim a chita e o retrato foram se fundindo e a estampa virou suporte do retrato.

por_Julia

Pitalunga fotos_Marina Benzaquem

Aline Miguel é designer gráfico do Rio de Janeiro, com especialização em design têxtil. A artista plástica já desenvolveu importantes trabalhos para clientes como Farm, Cantão, Redley, Maria Filó, entre outros. Com sua especialização em técnicas de estamparia, Aline também ministra cursos em instituições como Senac Rio e Pólo Criativo, além de criar fantásticas padronagens florais, transformando um simples tecido num verdadeiro Chitão, autêntico e único, deixando rastros inspiradores de sua expressão. As estampas, após serem criadas, são impressas diretamente em lona e pintadas por cima, compondo lindas pinturas. Neste trabalho específico que tem como tema as mulheres negras, as obras possuem uma alegria genuína e mostram através das cores, sua força para encarar a vida frente às lutas decorrentes das desigualdades sociais do cotidiano brasileiro. A artista faz uma composição vibrante unindo arte, beleza feminina e cultura brasileira. A Flumen teve o prazer de realizar uma entrevista com a artista, por isso, hoje compartilhamos com vocês um pouco sobre a conversa. Gostaríamos que nos contasse um pouco sobre você e sua tragetória no mundo das artes plásticas. ALINE MIGUEL A arte sempre fez parte da minha vida. Desde pequena gostava de desenhar e entrei para o curso de desenho aos sete anos de idade. Ao longo dos anos, fiz aulas de diferentes técnicas de ilustração e pintura, sendo elas de pintura à óleo, tinta acrílica, além de desenho de moda, ilustração publicitária, pastel seco, muitas sessões de

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Pintura retrata mulher e flores em tecido

POR ALINE MIGUEL Artista: Aline Miguel Rio De Janeiro Acesse o trabalho dela: facebook_alinemiguel insta_@alinemiguel.art

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SER CARIOCA É_

Qual é a força existente entre o chitão e a mulher negra brasileira? ALINE MIGUEL A estampa da chita e os negros possuem um passado entrelaçado. Os negros, quando chegaram ao Brasil, escravizados, foram os primeiros a tramar tecidos em teares rudimentares. As primeiras chitas produzidas no Brasil também foram estampadas pelas mãos dos negros através de carimbos de madeira. Eles usavam as próprias roupas que confeccionavam. Chita e negro foram estigmatizados. Chita e negro foram (e ainda são) alvos de preconceito. Chita e negro sobreviveram à exclusão e ganharam mais espaço no âmbito social. A chita foi parar nos principais desfiles de moda e os negros obtiveram uma maior representatividade nos espaços institucionais. Suas histórias foram um entrelace de luta, garra e conquista, e é a força deste enlace que busco transmitir em minhas obras.

por_RIOetc ilustração_Paulo

O que deseja expressar, com este trabalho, especificamente? ALINE MIGUEL Em minhas obras, desejo expressar a força das mulheres negras frente às lutas decorrentes do cotidiano brasileiro. As mulheres negras possuem um colorido de viver que se traduz visualmente nos florais da estamparia de chita. “Ser negro é ser sobrevivente, saber viver a vida, saber ser diferente. É ter música no corpo e alegria na alma. Voltar às suas raízes quando a natureza chama”, conta a música “Ser Negro” do rapper Gutto Bantú. Quais materiais você utiliza e qual deles mais gosta? ALINE MIGUEL Utilizo diversos materiais, como hidrocor, lápis de cor, lápis de cera em papel, tinta acrílica, cola, tesoura, caneta Posca, tecidos de chita etc. No caso de criação da estampa exclusiva, também faço uso de alguns programas gráficos (no computador) para me auxiliar. Não tenho nenhuma preferência específica, adoro trabalhar com todos.

Pintura feita por Aline Miguel

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No dia do aniversário de 450 anos do Rio, o Prefeito oficializou em decreto a Carioquice como Patrimônio Cultural e Imaterial do Rio. Para começo de conversa, vamos estabelecer que Carioca é aquele que nasce na cidade do Rio de Janeiro e, no conceito expandido, aqueles que adotam a cidade para viver porque acabam se apaixonando por esse pedaço de mundo. Já a Carioquice é diferente. Alguns privilegiados até nascem com ela. Mas a grande maioria vai aprendendo ao longo da vida, é um atributo a ser conquistado, com práticas que envolvem simpatia, informalidade, leveza e um certo orgulho às vezes difícil de explicar. Está lá no Decreto: “um estado mental, espiritual, corpóreo, gestual e linguístico; a afirmação desta sociedade sobre este território, buscando valores de justiça, igualdade, fraternidade, liberdade, mas sobretudo temperada pela felicidade e pela alegria”. Portanto, ser carioca define a sua naturalidade, enquanto a carioquice define a sua natureza. Não é fácil dizer se foi o Rio que inventou a carioquice ou se foi a carioquice que inventou o Rio. Um lugar que se expressa num jeito de ser e que a vida inteira flertou com a música,

Mariotti

o cinema, a arte, a fotografia. Uma cidade que foi cultuada, exibida, aplaudida, admirada, ferida, dissecada, mas segue até hoje incompreendida. Por muitos anos recebemos as glórias e carregamos o fardo de simbolizar a nação brasileira. Somos seres que misturam os costumes coloniais da corte com os vícios contemporâneos da cidade partida. Em algum momento no meio desse caminho, o vínculo entre o que somos e o que dizemos ser foi quebrado e o Rio passou a conviver permissivamente com tudo aquilo que, por definição, maltrata nosso orgulho, ameaça a beleza, diminui o encantamento, nos faz algozes das nossas próprias aspirações. Num papo de bar ou nos livros de história, você vai encontrar dezenas de explicações para isso. A minha é a seguinte: a carioquice é a alma de todo carioca, nascido ou não no Rio, um espírito dadivoso que precisa ser cultivado, compartilhado, sentido e praticado. A gente não vê, mas ele se faz presente em cada uma das coisas que vem logo à cabeça quando alguém pergunta o que é a cara do Rio. Olhe para Paulinho da Viola e Fernanda Montenegro que você vai perceber.

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GRAFITTI MARCELO MENT por_Dionísio

Uma de suas marcas registradas é ratar as mulheres em suas criações, elas são imponentes, cheias de personalidade, marcantes e envolvidas por cores vibrantes e detalhes impressionantes! Além da arte de rua, o grafiteiro também trabalha com telas que, por sinal, são um show a parte. Elas já renderam diversas exposições ao artista e o consolidaram ainda mais no mercado internacional. Uma das exposições mais visitadas do artista foi “Coragem”, que aconteceu ano passado no Rio. Neste projeto, ele trabalhou com diversos tipos de materiais, como a madeira com corte a lazer, e desenhou tudo muito organicamente, sem se preocupar em como seria o resultado final das suas obras. Como todo artista, o grafiteiro busca sua inspiração em algum tema, que em muitos casos, são urbanos e críticos à sociedade, como um pedido de reflexão àqueles que passam pelos seus murais. Valoriza o espaço urbano, e sempre estaremos em uma galeria de arte aberta.

Arte Bonin

fotos_Thayná

O artista Marcelo Ment saiu direto do subúrbio do Rio de Janeiro para se tornar um dos principais nomes do graffiti brasileiro. Sua arte de rua é um espetáculo de cores e detalhes. Com suas origens no bairro Vila da Penha, o carioca Marcelo Ment possui uma carreira consolidada na arte urbana, estando na ativa há 18 anos. Nascido em 1977, ele teve seu primeiro contato com a street art em 1992, quando fazia pichações. Porém, mesmo curtindo o que fazia, Ment sentia falta de algo a mais em suas assinaturas. Esse “algo a mais” eram os desenhos. Após passar um tempo trabalhando e pintando com seus irmãos em diversos projetos, ele partiu para criar seus próprios grafites, em 1998. A partir deste momento, ele encontrou nas ruas o suporte que precisava para seguir em frente como artista. Foi um dos pioneiros da cena do grafite do Rio de Janeiro. Com todo esse prestígio, ele também fez diversas parcerias com outros grandes nomes da street art. Um exemplo bem legal é o mural feito no bairro carioca da Lapa, onde ele grafitou junto com Marcelo Eco e o grande Márcio SWK. Com o tempo, a carreira de Ment foi se concretizando cada vez mais e ele foi ganhando respeito mundialmente. O resultado foram colaborações, criações e suas participações em eventos em diversos países da Europa e também nos Estados Unidos. O interessante é notar os protagonistas das obras do artista. Em suas palavras: “Os protagonistas das minhas obras são as situações, elementos da arquitetura dos locais em que estive, o material humano e o comportamento. Apenas sua arte o salva.

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“O lápis de Marcelo”

DO SUBÚRBIO DO RIO Artista: Marcelo Ment Idade: 41 anos O que faz: Arte Urbana Carioca Trabalhos: www.marceloment.com/

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PRA VOCÊ FICAR DE OLHO NAS NOVIDADES

VITRINE

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old skool core lite O clássico nunca sai de moda, e nós adoramos um Vans não é mesmo?

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MAM QUER VENDER POLLOCK

MUSEU QUER VENDER OBRA DO AMERICANO JACKSON POLLOCK por_

Murilo Roncolato

Divulgação

A venda de um quadro do acervo de um museu como o MAM Rio (Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro) seria um procedimento costumeiro, não fosse um detalhe: seu propósito. Isso porque a instituição carioca anunciou sua intenção em vender a tela “Number 16” do pintor americano Jackson Pollock (1912-1956) para garantir a sua própria sustentabilidade financeira pelas próximas décadas.


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Para que a venda seja concretizada o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) deve ainda autorizar o procedimento. No centro do debate, o fato de que a medida contraria princípios éticos acordados pelas maiores associações de museus do mundo. A notícia foi ao ar. Prevendo um agravamento da sua situação financeira, o MAM Rio, que é uma instituição privada sem fins lucrativos, decidiu que colocaria a peça à venda em leilão. A obra faz parte da coleção do MAM Rio desde a década de 1950, quando foi doada ao museu pelo milionário e ex-vice-presidente americano Nelson Rockefeller. O quadro “Número 16”, que por sua vez faz parte de uma série de Pollock, é também um dos poucos elementos do acervo que sobreviveram ao incêndio que consumiu 90% das obras do museu em 1978. Se a obra for arrematada pelos US$ 25 milhões esperados pela direção do museu, o dinheiro deve ser usado para a criação de um endowment, ou fundo patrimonial, o qual faria a gestão controlada do dinheiro e sua aplicação no mercado financeiro.

REAÇÕES

foto: divulgação

Divulgação

Entidade internacional mais importante sobre museus, disse ter recebido a notícia “com tristeza e perplexidade”. A entidade diz saber dos problemas financeiros do MAM Rio, mas condenou a saída escolhida, dizendo que ela contraria os códigos de ética do Icom e da AAM (Aliança Americana de Museus). Segundo a nota, tais códigos “são claros e definem que a venda de uma obra só pode ser adotada se for para o beneficio da própria coleção do museu, ou seja, para aquisição de novas obras que reforcem a política de seu acervo e, consequentemente, a missão do museu.” Em nota, o Ibram (Instituto Brasileiro de Museus), autarquia do Ministério da Cultura responsável pela regulação dos museus federais, que também se disse surpreso, pediu a suspensão da venda do quadro e reforçou os “preceitos éticos” citados pelo Icom e disse que “a situação é ainda mais delicada, por tratar-se da única obra do artista no acervo do MAM Rio”. “O acervo do museu é um bem público e não pode ser considerado como um activo financeiro. O dinheiro ou compensação recebidos pela cedência ou transferência de objectos e espécimes de um acervo do museu devem ser utilizados apenas para benefício da colecção e principalmente em aquisições para a mesma.” O Ministério da Cultura também quis se manifestar. Contrariando a entidade internacional e a sua própria autarquia, com isso ajudando e apoiando a decisão do MAM Rio.

tela ‘number’ 16’, de Jackson Pollock

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O LADO DO MAM

LEGISLAÇÃO E TOMBAMENTO

No Brasil, museus públicos e privados seguem a legislação descrita pelo Estatuto dos Museus, lei de 2009 regulamentada em 2013. De acordo com o advogado Mário Pragmácio, especializado em patrimônio cultural, as leis brasileiras sobre museus seguem uma tradição francesa de “inalienabilidade dos bens móveis”, ou seja, que tende a garantir que uma obra fique sob a guarda do país como parte do seu patrimônio cultural. O oposto a essa tradição seria a americana, “guiada pela liberdade nessas transações”, explica Pragmácio. O advogado disse, “não há qualquer previsão no Estatuto dos Museus sobre isso venda de acervo”, o que deixa museus privados como o MAM Rio livres para gerirem seu acervo como quiserem, inclusive vendendo-o. O museus devem cumprir o que o Estatuto chama de “função social”. “No caso, a venda de uma obra do seu acervo, mesmo justificada, não estaria indo de encontro à valorização e preservação do seu acervo.

Divulgação

Ele disse que o museu é privado e não recebe verba federal ou estadual. Mesmo o dinheiro captado por leis de incentivo, como a Rouanet, são insuficientes. Sobre a escolha da peça a ser vendida, o museu carioca apontou o fato de ela ser mais requisitada por museus de outros países, o que a faz ter mais “relevância no mercado internacional”. Além disso, o museu diz que sua “vocação” é arte brasileira e, assim, aponta o fato de Pollock não ser um artista brasileiro como mais uma razão para a venda. Além disso, sua coleção de pinturas estrangeiras da qual a “Number 16” faz parte não é um dos “carros-chefes” do museu. Por fim, a entidade afirma que a obra seria capaz de gerar o “montante expressivo de recursos” pretendidos pelo museu para sua “manutenção a longo prazo”.

Jackson Pollock finalizando tela ‘number’ 21’.

PREFERÊNCIA E INTERESSE PÚBLICO

Tombar uma obra como patrimônio no Brasil é, assim, o modo mais antigo e direto para se garantir que uma obra seja preservada e não deixe o país. ”A evasão de obras é um velho conhecido problema do campo do patrimônio”, diz Pragmácio. “A Lei do Tombamento de 1937 impede que bens tombados saiam do país, a não ser para exposições de curta duração e intercâmbio cultural. O tombamento não impede a venda da obra; somente impede que o bem saia do país”, explica o advogado. Além do tombamento, a legislação brasileira costumava também obrigar que, antes de um museu colocar uma obra para venda no exterior, ele a oferecesse para o Estado. Era o chamado “direito de preferência”, revogado com a reforma do Código de Processo Civil, em 2015. “Muitos dos museus nacionais que temos hoje foram constituídos a partir dessa prerrogativa do direito de preferência. realidade é outra. No lugar, o Estatuto dos Museus criou um instrumento chamado DIP (Declaração de Interesse Público), que permite que uma obra com “valor cultural de destacada importância para o País” seja declarada de interesse público e, assim, protegida. “A DIP proíbe a evasão do país e, ainda por cima, prevê o direito de preferência. Os efeitos são similares ao tombamento.

Divulgação

tela ‘number’ 13’, de Jackson Pollock

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Qual a importância do código de ética entre museus e como o caso do MAM Rio dialoga com ele? MARIA IGNEZ MANTOVANI O Icom é um organismo internacional que reúne profissionais, museus e instituições museológicas do mundo inteiro. É ele quem define internacionalmente o que é um museu. Mais do que isso, ele tem um comitê permanente que regula as atitudes relacionadas a museus no mundo todo. No código de ética do Icom, que é aprimorado permanentemente, um dos itens diz que museus só podem, eticamente, vender uma obra quando é para o aprimoramento da própria coleção. No caso de um museu de arte que tem uma peça que é dissonante do resto do acervo, seu comitê de política de acervo pode resolver vender essa peça e comprar outra que seria mais adequada e necessária para se cobrir uma lacuna dentro daquela política de acervo que é determinante. Isso faz sentido. No caso do MAM do Rio, o museu é uma entidade de direito privado. O acervo dele não é tombado. Legalmente, não há impedimento a que ele venda esse Pollock que ele quer vender. Mas eticamente a prerrogativa internacional diz que não é esse o caso, pois eles não estão vendendo para reaplicar em uma obra. O Pollock, que não é um objeto estranho no acervo, é importantíssimo dentro do acervo e, mesmo que seja para um endowment, não é essa a função de venda de uma obra num museu. Esse é o ponto. O que pode acontecer com quem desrespeitar o código de ética, posto que ele não é vinculante? Não há exceção para casos como o do MAM, que passa por uma crise? MARIA IGNEZ MANTOVANI O MAM não é o único museu que padece nesse momento e acho que não podemos contar com um exemplo de venda de uma obra para resolver a insolvência do museu, porque isso pode virar um modelo, e eu me preocupo como presidente do Icom no Brasil.

O acervo do museu MAM é um bem público e ele não pode ser considerado como um activo financeiro [...] Murilo Roncolado [...]

Divulgação

Brasileira, graduada em Comunicação Social com especialização em museologia pelo Convênio MASP. Diretora da empresa EXPOMUS, Projetos Culturais, por ela criada em 1981, atuou em cerca de 250 projetos de exposições nacionais e internacionais de arte e cultura brasileira Entre outras atribuições.

MARIA IGNEZ MANTOVANI

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E, aí de repente, um museu vai querer vender uma obra barroca, o outro vai querer vender uma Tarsila do Amaral. De fato não há uma proibição. Mas entre o legal e o ético tem uma diferença. E o estabelecimento desse fio ético é aquilo que a área como um todo recomenda no mundo inteiro. Eu acho que isso é frágil como atitude de um museu. O acervo é uma patrimônio da sociedade, mesmo que ele seja privado, o acervo é de interesse público. Práticas como essa são comuns fora do país como o MinC apontou? MARIA IGNEZ MANTOVANI Vendas ocorrem, mas para comprar outras peças que sejam mais adequadas para o seu acervo. Isso é decidido por comitê, o processo de venda é público, transparente. Não é raro ocorrer, mas o que não se pode conceber é que o acervo seja disposto para se criar um fundo, porque não é isso que salva um museu. Quais alternativas poderiam ser dadas ao MAM Rio para fazer uma gestão dos fundos sem ter de vender a obra? MARIA IGNEZ MANTOVANI Eu acho que tem muitas alternativas de requalificação de gestão, de estratégias que o museu poderia lançar, o museu pode ter ajudado umas organizações com as quais poderiam trocar de experiências etc. O Masp até pouco tempo atrás estava numa situação de insolvência. Houve um momento em que essa insolvência chegou num ponto limite tal que o museu se abriu e teve de rediscutir o seu processo de gestão. E aí houve uma mudança de governança e o museu conseguiu reequacionar suas contas sem vender nenhuma obra. Qual a melhor forma de trazer essas questões a público? MARIA IGNEZ MANTOVANI Veja Inhotim, que teve essas questões recentes. É um instituto que está fazendo trabalhos grandes, repensando suas questões de capacitação, sobrevivência; e ele também é um museu privado. A gente tem que fazer com que os museus sejam entendidos como grandes causas sociais. Causas a serem defendidas. Defender um Pollock é uma coisa linda. O MAM pode usar da mesma questão, mas invertendo o processo e dizer: em vez de vender um Pollock, decidimos abrir nossas relações, chamar as pessoas a participar. O MAM tem uma expressão não só no Rio de Janeiro, mas internacional. Seu acervo é poderoso. Se forem convidados profissionais para ajudar nessa situação, eu duvido que não surja uma contribuição valiosa. Todas as instituições que estão se colocando contra a venda, também se colocam a favor do museu.



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INSPIRADOS POR WILL BARCELLOS por_Dionísio

zir. Era o rei da bagunça em casa e, ao mesmo tempo, o menino que se divertia com pouco, uma folha de caderno e um lápis. Aos 14 anos, visitando uma tia no hospital, conheci um amigo dela que era professor na SBBA (Sociedade Brasileira de Belas Artes) e, na semana seguinte, eu já estava começando a estudar lá, onde permaneci por alguns anos e pude conhecer diversas formas e técnicas de desenho e pintura de telas com tinta à óleo, que foi muito agregador. Quais foram suas primeiras referências? Elas permanecem como as suas principais e mais importantes fontes ao realizar um novo trabalho? WILL BARCELLOS No início, como era muito garoto, me aprofundava mais na técnica do que na teoria e na história da arte. Um fato engraçado sobre minha história com a arte é que, antes mesmo de descobrir quem eram os artistas que hoje uso como referência e inspiração, eu já havia pego amor e gosto estético pela técnica que utilizo até hoje. Por exemplo: eu sempre amei a complexidade da perspectiva e a ilusão de ótica, porém só conheci Escher muito tempo depois. Meu apreço pelos detalhes das pinturas e pela delicadeza da anatomia dos corpos pintados em Art Nouveau veio

Arte Barcellos

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O artista carioca Will Barcellos é um fenômeno do pontilhismo e um dos principais nomes da técnica aqui no Brasil. Conheça quais são suas influências, seu processo criativo, etc. Além de ser um grande artista, Will também é um cara muito gente boa. Batemos um papo bem legal numa entrevista em que ele nos contou suas inspirações, como começou a carreira, sua visão sobre o mercado brasileiro, etc. Confira a conversa abaixo e conheça mais sobre esse gênio brasileiro do pontilhismo. Will, como você enxerga a arte? O que é arte para você e como ela surgiu na sua vida, teve algum motivo? WILL BARCELLOS A arte para mim é como respirar, não sei como viver sem, sempre foi assim. Vejo a arte como meu universo paralelo, a enxergo em tudo à minha volta, nas paisagens, na velhinha sentada no portão, até nos gestos das pessoas… Pesquisar e conhecer o trabalho de outros artistas é meu hobbie preferido, algo que me diverte, encanta e inspira. Conte um pouco da sua história e como ela se encontra com a arte que você faz. Como ela se comunica com sua infância? WILL BARCELLOS Eu sou um cara simples e de origem muito pobre, inclusive morei em uma favela do Rio até os 9 anos. Acredito que meu gosto pela arte vem desde a barriga da minha mãe. Sempre fui aquele moleque criativo, diferente, e que rabiscava tudo que podia. Bastava ter papel nas mãos para construir robôs, cata-ventos, barquinhos ou qualquer coisa que minha imaginação pudesse produ-

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Ilustração Will Barcellos Técnica: Pontilhismo

SOBRE PONTILHISMO Will Barcellos: artista Identidade das obras: perspectiva e complexidade Méritos: Prêmio de Ilustração na Alemanha Nacionalidade: carioca

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A arte para mim é como respirar, não sei como viver sem, sempre foi assim. Vejo a arte como meu universo pararelo [...] [...]

antes de eu ser apresentado ao trabalho de Muchà. E o mesmo aconteceu com o pontilhismo, minha dedicação e prestei muita atenção à técnica vieram bem antes de eu conhecer os grandes nomes do movimento que acredito essenciais. Por que você escolheu trabalhar com o pontilhismo? Tem algum significado especial para você? Como foi seu primeiro contato com a técnica? WILL BARCELLOS Conheci o pontilhismo quando tinha 15 anos. Tinha ido visitar uma exposição feita por alunos na SBBA quando me deparei com um quadro que ilustrava uma cena de uma mulher deitada sobre pedras com o mar em plano de fundo. Só consegui identificar a técnica de pintura quando me aproximei da obra, e fui surpreendido pelos milhares de pontos. Foi o momento mais intenso e mais importante do meu contato com a arte e, ouso dizer que, foi um divisor de águas. Voltei à exposição várias vezes para rever o quadro. Descobri uma paixão que não conhecia, mas sabia que ainda não estava pronto para trabalhar com ela, eu precisava me preparar mais. Como você organiza seu tempo? Você tem alguma atividade além da arte, se formou em algo ou ainda irá se formar? WILL BARCELLOS Acho que só me organizo por que sou compulsivo pelo que faço. Eu trabalho como gestor de uma empresa e, por isso, passo dez horas do meu dia fora de casa. Para conseguir produzir minhas obras, eu acordo muito cedo e pinto por umas 4 horas antes de sair para o trabalho. Ao chegar, costumo ficar até a

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1h da manhã pintando. A dimensão dos meus trabalhos depende muito da minha inspiração. Ter ficado 42 dias pontilhando um trabalho de 2,00 x 1,40 metros foi uma experiência doida, mas quase involuntária. A ideia surgiu, e a concretizei. Ultimamente, tenho trabalhado em tamanhos menores, mas, ainda assim, bastante assustadores por se tratar de pontilhismo. Conta para a gente como é o seu processo criativo. Onde busca inspirações para seus trabalhos e quais são os momentos que você busca para criar? WILL BARCELLOS Não sei se todo artista é como eu, mas me sinto um esquizofrênico ao falar de arte. Minha cabeça está sempre dividida entre a vida real e a arte. O tempo todo trefegam imagens, cores, traços e pontos intensamente pela minha cabeça. Não tenho hora certa para me inspirar e trabalhar, qualquer momento é a hora ideal para produzir algo. Se você for à minha casa e procurar algum rascunho não vai encontrar. Tudo o que eu rabisco ou projeto vira arte, dificilmente algo fica parado ou não flui. Acho que a minha falta de tempo me faz acumular tanta energia que, quando sento para trabalhar, tenho sempre 100% de aproveitamento do meu tempo para criar. Tem projetos novos em vista? Exposição em mente? Vimos que você teve a oportunidade de expor no exterior! WILL BARCELLOS Sim. Agora em maio vou realizar uma exposição na Alemanha. Devo isso graças ao esforço de dois amigos que pegaram meus trabalhos e conseguiram essa oportunidade. E eu estou muito feliz! Tenho focado muito no pontilhismo. É o que quero mostrar nesse ano, mas, como já falei, minha inspiração tem vontade própria. A qualquer momento posso ter um insight e utilizar outra técnica. Eu gosto deste “descontrole” e de não saber como será meu próximo trabalho. Fico aguardando ele se apresentar na minha mente logo. Conheci o pontilhismo quando eu tinha 15 anos. Tinha ido visitar a uma exposição feita por alunos na SBBA e uma obra de uma mulher deitada sobre as pedras e isso logo me encantou.

Ilustração Will Barcellos Técnica: Pontilhismo

Will sempre foi uma criança muito criativa e que não teria se tornado o que é hoje se não tivesse sido resgatado por um professor da SBBA que o concedeu uma bolsa . Após sair da SBBA, Will ficou quase duas décadas sem nenhum contato com seus trabalhos devido a diversas dificuldades. Esse hiato foi interrompido em 2013 quando ele teve sua catarse artística e começou a viver seus “transes” mergulhado em linhas, círculos, respingos e pontos. Desde então, sua obra explodiu e começou a nos encantar na mídia e em exposições dentro e fora do país. Will nos conta que seu maior desejo é retribuir pro mundo o que recebem na sua infância e levar sua arte pra vida de outras crianças e jovens impossibilitados desse contato, “Uma vida tocada pela arte sempre será transformada”, como diz o artista. Ele é um desses artistas que se tornam servos de sua arte, ela não segue padrões, oscila entre o realismo e o surrealismo, entra retratos simples de anônimos e conhecidos até imagens de perspectivas complexas e inimagináveis. Talvez o que mais encante é que cada obra propõe uma viagem única e livre pra nossa interpretação, nos leva a mergulhar em nossa alma através de caminhos coloridos e instigantes de beleza e assombro, de luz e sombra, nada é simples em suas composições, tudo é complexidade. Se você deseja desvendar os caminhos desses pontos, linhas e cores faça como ele e enxergue com os olhos do coração e da sua alma. Existem por aí grandes sábios afirmando que não há necessidade em descobrir qual o dom de cada um, ou com que propósito se veio ao mundo, ou mesmo, quais talentos as pessoas guardam adormecidos dentro de si mesmas. Tudo pode ser aprendido e, com muita técnica e prática, belezas fascinantes podem ser criadas, chegando a um nível de perplexidade semelhante a de um fabuloso artista famoso é a forma de aprender. No entanto, há pessoas que carregam uma voz autoral muito forte e expressam isso desde cedo, crianças que deixam rastros de um dom singular logo no início de suas vidas, outras se redescobrem. Umas são estimuladas a desenvolverem suas particularidades, outras, precisam encarar a vida de outra forma, sobrevivendo em outros ares que não os do coração. Ainda há os que acreditam que tudo o que pertence a nós chegará um dia, independente das reviravoltas, no tempo certo e da maneira perfeita. Conheceu o pontilhismo quando tinha 15 anos. Tinha ido visitar a uma exposição feita por alunos na SBBA quando me deparei com um quadro que ilustrava uma cena de uma mulher deitada sobre pedras com o mar em plano de fundo. Só conseguiu identificar a técnica de pintura quando se aproximou da obra, e fui surpreendido pelos milhares de pontos, foi um divisor de águas. Voltou à exposição várias vezes para rever o quadro e poder se preparar mais. Vivenciou sua arte e amou.

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A ideia de criar essas revistinhas eróticas surgiu depois que Carlos Zéfiro recebeu um pedido de um colega para ampliar os desenhos contidos em duas revistinhas italianas do mesmo gênero.Dali em diante, Carlos Zéfiro resolveu começar a criar suas próprias histórias e desenhos. O ilustrador tirava inspirações de quadrinhos mexicanos e de fotonovelas pornográficas de origem sueca. Zéfiro nunca tinha estudado desenho. Na verdade, naquela época, ele não havia chegado nem a completar o segundo grau, algo que foi conquistar somente aos 58 anos de idade.Sua rotina de ilustrações era desenhar durante à noite, após sua mulher pegar no sono. Para garantir que não seria “pego no flagrante”, Carlos desenhava dentro de um roupeiro velho que ficava no seu quarto. Os “catecismos” de Carlos Zéfiro ganharam popularidade e se tornaram um gênero. Agora, diferentemente de muito do que era lançado dentro gênero erótico, o quadrinista carioca trabalhava com histórias interessan-

CARLOS ZÉFIRO E por_Dionísio

Arte

ilustração_Carlos

Zéfiro

Os quadrinhos eróticos de Carlos Zéfiro fizeram a alegria da molecada nas décadas de 1950, 60 e 70. Conheça mais sobre o trampo desse clássico nacional proibido para menores de 18 anos. Alcides Aguiar Caminha era funcionário público do setor de imigração do Ministério do Trabalho no Rio de Janeiro, casado e pai de 5 filhos. Assim como muitas famílias na época da ditadura, ele teve uma vida dura com muitas privações e foi por trás do seu pseudônimo, Carlos Zéfiro, que conseguia fazer uma graninha extra. Foi assim, praticamente “sem querer”, que ele entrou para história como o precursor dos quadrinhos eróticos no Brasil. Do final dos anos 50 até os anos 70, as revistas de Zéfiro circularam em todo o Brasil de forma clandestina. Durante mais de 30 anos, ele criou as revistinhas de sacanagem em segredo e, curiosamente, elas eram conhecidas em São Paulo como “catecismos”, sendo que eram vendidas e distribuídas pelas bancas dentro de publicações religiosas. Esta necessidade de manter seu nome em segredo se deu em função da Lei 7967 que regia o funcionalismo público. Ou seja, caso o autor das publicações fosse pego, seus quadrinhos seriam considerados um escândalo e a pessoa perderia o emprego.Mas mesmo após a lei ter sido anulada, Alcides manteve o segredo para não provocar situações indesejadas. Somente após Eduardo Barbosa, um quadrinista baiano, se declarar como o verdadeiro Carlos Zéfiro, Alcides entrou em cena e foi tema de uma matéria para a Revista Playboy, onde revelou toda a verdade.

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Quadrinho “A Lavadeira” só para adultos

OS QUADRINHOS ERÓTICOS Artísta: Carlos Zéfiro 1921-1992 Acesse o trabalho dele: http://www.carloszefiro.com/

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tes, que tinham começo, meio e fim. Carlos Zéfiro gostava de criar um envolvimento, e criar enredos que envolviam romance e sedução, e não sacanagem pura como outros quadrinistas começaram a fazer dos anos 70 em diante. Seu processo de trabalho era bem interessante, sendo que os desenhos eram feitos direto no papel vegetal para não que não houvesse a necessidade de fazer o fotolito (transparência usada no processo de produção em série). As publicações eram vendidas para diversas editoras a preço de banana. Como já dissemos, Carlos Zéfiro não havia estudado desenho, e uma forma que encontrou para trabalhar foi copiar posições de fotonovelas e revistas eróticas no papel vegetal. Esta é a razão dos seus quadrinhos terem diversas irregularidades entre os personagens de uma mesma história. Nada disso importava e as criações de Carlos Zéfiro faziam a cabeça da molecada da época, que não tinha acesso a outro tipo de material. Carlos Zéfiro teve um papel importantíssimo nos quadrinhos nacionais e, claro, na iniciação sexual de uma geração. Seus exemplares tinham uma tiragem de aproximadamente 5 mil e geraram grandes sucessos, como “A Pagadora de Promessa” e “As Aventuras de João Cavalo”, que tiveram mais de 30 mil exemplares vendidos. Além do mercado brasileiro, Carlos Zéfiro também criou histórias para editoras na Argentina e Uruguai, participou da primeira bienal de quadrinhos e foi premiado com o troféu HQ-MIX. A proibição de produtos editoriais eróticos ou pornôs no Brasil da primeira metade do século passado estimulava a procura por algo que soltasse pulsões que zanzavam pelo imaginário do corpo. As revistinhas de Carlos Zéfiro mostravam os detalhes dos pecados, colocavam frente a frente o desejo e o objeto do desejo, e convidava o leitor a deixar acontecer as vontades do seu instinto, do amor solitário ao sexo explícito. Transgrediou os parâmetros e as visões dos quadrinhos que anteriormente eram somente infantis.

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Quadrinho “Suzete” só para adultos

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QUEM É MARINA? por_Dionísio foto_Marina

convidada para traduzir nas paredes o mood de Flygrl. Entre criações que unem colagens, desenhos e aquarela, ela deu o seu toque arte ao nosso espaço e bateu um papo com a gente. Então fica a dica, se você é fã de artes plásticas, cores vibrantes ou simplesmente um apaixonado pelo Rio de Janeiro, não deixe de pesquisar um pouco mais sobre seus trabalhos! Com arte no sangue, um dom presente na família de artistas plásticos e poetas, ela pinta como se ainda estivesse brincando na infância, com seus primos e irmã. Tamanha paixão a levou a cursar a faculdade de Design Gráfico, da PUC-Rio, onde começou a experimentar novas ferramentas e técnicas em seus desenhos, em suas pinturas e claro, nas fotografias. As criações lindas repletas de cores alegres e vibrantes, mas que são delicadas ao mesmo tempo, Marina une elementos e meios bem distintos para chegar às obras incríveis que são a cara do Rio de Janeiro.

Arte Papi

Apesar da pouca idade, a artista carioca, Marina Papi vem ganhando cada vem mais destaque entre os apreciadores da arte. Com criações lindas repletas de cores alegres e vibrantes, mas que são delicadas ao mesmo tempo, Marina une elementos e meios bem distintos para chegar às obras incríveis que são a cara do Rio de Janeiro.Misturando pinturas em aquarela, desenhos, fotografias e colagens, essa artista nascida no bairro da Gávea demonstra uma capacidade excepcional de transmitir a energia positiva e o charme que cercam a Cidade Maravilhosa através das suas telas, painéis e animações. É praticamente impossível não ser impactado por uma obra de Marina e não sentir um clima de alto astral, otimismo e energias positivas. Suas criações mesclam animações, fotografias, desenhos, colagens, ilustrações e pinturas em aquarelas. Papi impressiona especialmente pelo fato de conseguir manter um nível de qualidade excelente trabalhando com meios tão distintos entre si. Entre os trabalhos que realizou, estão painéis no Botafogo Praia Shopping, a direção de arte de uma campanha da Vichy Brasil, ilustrações para a revista Vogue Brasil, estampas das sandálias Ipanema e uma ilustração que foi selecionada para comemoração dos 50 anos da Rede Globo, além de muitos outros. A facilidade com que Marina Papi transita entre a pintura em aquarela, a ilustração, a fotografia e as colagens impressiona especialmente pelo fato dela conseguir manter um nível de qualidade excelente trabalhando com meios tão distintos entre si e mesmo assim fazer que fique lindo. Outro ponto que merece destaque é as formas de expressão que ela utiliza para representar a sua cidade natal. O Rio está sempre presente em suas criações. No Clube Melissa Shopping da Gávea, a designer e ilustradora também já foi

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Fotografia e Aquarela

RIO AOS SEUS OLHOS Marina Papi: artista Nacionalidade: carioca Formada em: Design Gráfico www.marinapapi.me/

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PINTOR INCENTIVA EMPODERAMENTO NA FAVELA DO RIO por_

Julia Spence

Maxwell Alexandre é um pintor de 27 anos nascido e criado na Rocinha. Sua exposição individual – intitulada ‘Pardo é Papel‘, devido à cor do papel em que pinta e aos temas raciais que explora – teve lugar no último fim de semana no Complexo Esportivo da Rocinha. O artista faz parte de um pequeno coletivo que iniciou sua própria igreja – embora seja uma igreja de um tipo incomum. Alexandre coloca de forma simples: “É uma igreja da arte. Apenas isso”. Alternativamente, referido como a Igreja do Reino da Arte, ou às vezes A Noiva – uma espécie de oferenda simbólica à divindade da arte.

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MAXWELL ALEXANDRE E A IGREJA DA ARTE


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A exibição de Alexandre fez parte de uma série de exposições mensais organizada pelos artistas e designers da A Noiva para mostrarem seus trabalhos, sempre aberta ao público. Eles nomearam a série de exposições de “Dízimo”, já que 10% das doações são reinvestidas na igreja. Cada exposição está em um espaço de escolha do artista e apresenta obras de sua escolha. “Pardo é Papel” foi o segundo Dízimo de Alexandre, que durou apenas um dia. Designer e membro fundador de A Noiva, Raoni Azevedo, estende a analogia da “Igreja da Arte” com uma referência bíblica que enfatiza a natureza coletiva do trabalho: Alexandre tem pintado há três anos, mas sua trajetória era bastante diferente antes de se tornar um artista. Ele tinha 18 anos quando se alistou no exército como exigido por lei e, após um ano de serviço, ele se tornou um patinador inline profissional. Interessado em arte, ele tentou combinar ambas atividades: “Comecei com a pintura abstrata, porque foi uma transição da minha carreira em patins para arte”. Ele explica que “colocava tinta no chão” e fazia manobras de patins sobre a tela, criando linhas abstratas rápidas, de modo que ele “não teria muito controle sobre o desenho ou a pintura”. Trata-se de tentar imitar os movimentos de patins com a tinta. “Minha questão era como eu poderia colocar o mesmo sentimento na minha pintura”, explica ele. Hoje em dia, o estilo de Alexandre floresceu. Ele exibe seu trabalho em espaços como a galeria A Gentil Carioca, no Centro, e na prestigiada galeria Carpintaria no bairro Jardim Botânico. Regina Casé, atriz e apresentadora de televisão que esteve presente na exposição, expressou sua apreciação pelo trabalho e disse no Instagram que Alexandre “é a coisa mais importante acontecendo no Rio no momento”. Geralmente, ele exibe sua arte em espaços reminiscentes da teoria do cubo branco minimalista, utilizado para apresentar arte abstrata e contemporânea neste caso, Alexandre escolheu realizar esta exposição em seu antigo estúdio no Complexo Esportivo da Rocinha.

A Noiva existe quando nos reunimos. Como está na Bíblia: ‘Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles’. [...]

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O artísta Maxwell Alexandre pintando ao ar livre

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Na verdade, a escolha do espaço é incomum. Entre ringues de boxe, manobras de skates e o persistente cheiro de esgoto, Alexandre exibiu 11 de suas maiores peças, todas com 4,75 x 3,60 metros. A exposição levou cerca de nove horas para ser montada e apenas 30 minutos para ser desmontada. [...] Eu acredito que temos que criticar o racismo face a face, então minha pintura é um soco na cara. Eu prefiro a pintura, porque não é imediata [...]

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As peças eram simplesmente impressionantes, tanto pelo tamanho quanto pelo conteúdo. As peças representavam cenas da vida cotidiana na Rocinha, como por exemplo: a codificação da presença policial e de escolas públicas misturando-as As peças eram simplesmente impressionantes, tanto pelo tamanho quanto pelo conteúdo. As peças representavam cenas da vida cotidiana na Rocinha, como por exemplo: a codificação da presença policial e de escolas públicas. Por exemplo, o público da mostra de arte incluía alguns visitantes da Rocinha, mas haviam mais curadores de galeria, colecionadores e agentes de arte do asfalto. Alexandre suspeita que “vieram poucas pessoas da comunidade, porque eram pinturas e os códigos da pintura são de uma área privilegiada”.

Módulos pintados separados que juntos formam a composição final da obra.

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É O SAMBA QUE ELAS QUEREM? por_Equipe

Dona Ivone Lara. Não ficam de fora também Paulinho da Viola, Dorival Caymmi, Toninho Geraes, Cartola, Fundo de Quintal, Paulo César Pinheiro, João Nogueira, Roque Ferreira e Almir Guineto. Do samba antigo ao pagode mais moderno. Uma verdadeira mistura de todas as gerações. A cantora Teresa Cristina diz que nunca foi preterida pelos sambistas por ser mulher, mas reconhece a existência do problema. “O Brasil é um país machista, e o samba reflete isso porque canta as nossas atitudes. Casos isolados de machismo, independente do setor, devem ser denunciados; só assim diminuirá”, acredita ela. A julgar pelo cenário atual, na luta iniciada por pioneiras como Dona Ivone Lara e Clementina de Jesus, e mantida por figuras como Beth Carvalho, Alcione e Leci Brandão, elas já podem ser consideradas vitoriosas. Como Clementina de Jesus já dizia, “sai de baixo, senão eu vou passar por cima”! E é assim que o Samba que Elas Querem mostra que lugar de mulher é onde ela quiser! Pra saber sobre a agenda de apresentações das manas é só ficar de olho na página delas no Facebook e no Instagram.

Farm Rio Lobo

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Território dominado por homens, o samba por muito tempo não deu vez as mulheres. As rodas, as composições, o palco e o sucesso vibravam sempre no masculino enquanto a importância delas era minimizada. Ainda assim, sambistas mulheres de ontem e hoje deixaram suas marcas na história. Não pediram passagem, mas chegaram junto com suas posturas questionadoras em forma de versos sobre o universo feminino. E foi assim, querendo cantar forte nesse refrão sobre a protagonização do sexo feminino no cenário do samba carioca, surge o Samba que Elas Querem. Quebrando tudo nos tambores, tamborins e pandeiros, chorando a viola e o cavaco, Angélica Marino, Bárbara Fernandes, Cecília Cruz, Duda Bouhid, Isabela Ciavatta, Júlia Ribeiro, Mariana Solis e Silvia Duffrayer formam a roda que nasceu no Bar Dos Irmãos, no Catete, zona sul do Rio de Janeiro. Em julho do ano passado, a proposta se resumia a reunir mulheres pra tocar, sem a pretensão de montar um grupo. Pensavam apenas que no futuro poderiam sentar num bar e fazer a própria roda. “Fizemos a primeira num esquema bem precário, mas foi um sucesso”, conta Cecília Cruz, uma das oito integrantes. “Queremos ocupar o espaço das rodas de samba que também é nosso”. Entre uma música e outra, mandam para o público mensagens para destacar os males do machismo e defendem o feminismo. Na roda de moça não pode faltar o inegável legado deixado por Jovelina Pérola Negra, Clara Nunes, Elza Soares e

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Samba Que Elas Querem durante apresentação

NÓS TEMOS! O SQEQ faz shows gratuitos pelo Rio de Janeiro, para acompanhá-las fica de olho no facebook e no instagram. @sambaqueelasquerem

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LETRUX É LETÍCIA

e eu, outro. E olha que incrível, fizemos um disco!” Se ela tem uma música xodó? Difícil dizer, até mesmo pro público. “Não tem uma música que tenha caído especialmente na graça das pessoas. E isso é uma alegria, porque a gente não quer fazer um disco em que apenas uma música chame atenção, a gente quer um trabalho inteiro. O disco inclusive conta uma história, ele tem uma introdução, todo um crescente, um desenvolvimento, faz uma curva e fecha.” A estreia nos palcos acontece ainda essa semana, amanhã (26) e quinta (27), no Festival Levada, no Centro da Música Carioca Artur da Távola, na Tijuca. Uma belíssima mudança para a artista tijucana. Quem quiser já entrar no clima do show – que vai explorar ainda mais a faceta atriz da Letícia com textos recitados entre as músicas – pode conferir o clipe do primeiro single “Coisa Banho de Mar”. É pra se perder e mergulhar entre Letícias e Letruxes.

por_Fernanda fotos_Cris

Prestes Barros

O novo trabalho de Letícia Novaes, que por 10 anos ao lado de Lucas Vasconcellos integrou a banda de MPB Letuce (falamos sobre o fim aqui), é mais um personagem autobiográfico da cantora e atriz. Pode parecer confuso, mas é bem simples – e a casa 10 em Gêmeos explica bem: “minha vida sempre vai ser muito multifacetada em relação a trabalho. Meu trabalho é gemininano, mais do que dual. Essa coisa de encarar personagem, de ser atriz e escrever, cantar, ser uma banda, agora com outro nome, agora falando de um jeito, é muito divertido pra mim. Acaba sendo uma personagem, claro, mas é claro que também sou eu, Letícia. Eu empresto minha voz, minha cabeça, meu corpo”. “Letrux em Noite de Climão” nasceu de uma vontade crescente de brincar e experimentar, um comportamento, acredita Letícia, natural das novas gerações. “As bandas atualmente são assim. Nenhuma banda vai ser Rolling Stones, sabe? Que há 50 anos tá cantando “Satisfaction” e tudo bem, maravilhoso, uma música maravilhosa. Mas acho que a nossa geração é um pouco mais especulativa.” Nessa busca por novos caminhos, o dela se cruzou com os do tecladista Arthur Braganti e da guitarrista Natália Carrera. Juntos, produziram o novo disco. Aliás, mais uma estreia da Letícia, que pela primeira vez colocou a mão na massa. “O Lucas que sempre produziu os discos do Letuce, com outros parceiros, e desta vez eu estava lá também e falei ‘uau!’. E éramos três pessoas, cada um pensava uma coisa, mas é muito legal conviver com pessoas que não pensam igual a você, né? O Arthur tem um estilo, a Natália, outro,

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Letrux no ensaio fotográfico feito para OuiSimone

LETÍCIA É LETRUX Artista: Letícia Novaes Lançamento: 10 de julho de 2017 Gravadora: Joia Moderna [dist. Tratore] Prêmios: Prêmio Multishow de Música Brasileira - Superjúri: Melhor Disco

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DOCENTES ACREDITAM QUE MÚSICA PODE AUMENTAR INTERESSE PELA HISTÓRIA por_

Cristina Boeckel

A cantora niteroiense MC Carol lançou uma música que tem chamado a atenção pela letra. Em vez de sexo, ostentação ou apologia à violência, temas recorrentes em funks, “Não foi Cabral” desafia a história do Brasil contada na maior parte dos livros escolares. Conversamos com a funkeira e entrevistamos professores para analisarem os versos que falam do descobrimento do país, do genocídio de indígenas e cobra destaque para Dandara, a mulher de Zumbi de Palmares.

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MC CONTESTA HISTÓRIA DO BRASIL

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A música, que começa com um remix do Hino Nacional, contesta o descobrimento, em tom de voz agressivo. A cantora compôs a canção a partir de um convite do projeto Temas de Dança, que estuda a relação entre corpo, dança e história. “Nessa entrevista [ao projeto] eu comecei a falar sobre a minha adolescência na escola e falei que debatia muito com as professoras. Contei que a professora de história era com a qual eu mais debatia. Ela falava coisas que eu não aceitava e me colocava para fora da sala (...) Ela dizia que Pedro Álvares Cabral descobriu o Brasil. E eu falava: professora, Pedro Álvares Cabral não descobriu o Brasil porque já tinha 4 milhões de índios aqui. Como ele descobriu?” O professor Oswaldo Munteal, da PUC-Rio, acredita que a perspectiva crítica da história apresentada em “Não foi Cabral” é válida e afirma que o funk merece ser respeitado como arte desenvolvida no Brasil. Ele afirma que a linguagem do ritmo é própria e que possíveis erros de linguagem são relativos. “É um gênero contra o qual ainda há muito preconceito. E eu acho que este preconceito ainda precisa ser combatido. É música, e dentro deste âmbito, o certo e o errado são relativizados porque dependem da rima, da harmonia, do contraponto, da melodia e da própria composição da música”.

1.VISÃO ‘VÁLIDA’

Para Munteal, a música pode atrair o interesse das pessoas para que partam para um estudo mais aprofundado da disciplina. “Acho que pode despertar um interesse crítico pela história. Porque as pessoas acham que já sabem história e que elas não precisam estudar. E é legal que o funk fale de história do jeito dele, agressivamente, com um jeito de cantar diferente. Eu acho que é uma maneira de expressão respeitável.” Para o professor Flávio Morgado, a visão da história a partir de grupos considerados marginais foi feita justamente a partir de um tipo de música que também é marginalizada. “Ela está se comunicando com o seu público, que muitas vezes também é marginalizado. A música tem uma certa ironia e humor, característicos do gênero. E mesmo com humor, ela tem uma coerência.” O professor José Nazareth Neto Alvernaz, acha que MC Carol tem uma visão válida sobre o tema. “Há alguns livros que, já trabalham com a perspectiva de chegada e não de descobrimento, nós aprendemos a versão dos vencedores, mas os vencidos estão começando a ser ouvidos”, opina.

E eu falava: professora, Pedro Álvares Cabral não descobriu o Brasil porque já tinha 4 milhões de índios aqui. Como ele descobriu? [...]

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2. MORRO DO PREVENTÓRIO

A música também aborda as mortes de índios e de negros na construção do país. “Falando de sofrimento/ Dos tupis e guaranis/ Lembrei o guerreiro/ Quilombo Zumbi”. Carol também questiona a versão oficial para a abolição da escravatura. “A professora batia muito na tecla da história da Princesa Isabel, porque tem uma casa enorme no pé do Morro do Preventório, que é a Casa da Princesa, que era a casa de bonecas, o lugar onde ela brincava. E o Morro do Preventório era um cemitério, onde enterravam os escravos. Aí eu comecei a debater com ela a figura da Princesa Isabel. Na época que ela assinou a Lei Áurea, aquilo já tinha que acontecer. Os ingleses já pressionavam pela libertação dos escravos para eles terem dinheiro e comprar coisas. Então é como se pegassem uma branca, para fazer de conta que ela foi a libertadora dos negros. Mas não foi exatamente isso que aconteceu”.

3. FUNK CULTO Oswaldo Munteal afirma que a música que fala da história do Brasil pode ajudar a amenizar o preconceito contra o gênero. “O funk é uma manifestação do nosso povo. Pode ter vindo dos Estados Unidos, mas ganhou vida aqui e muita coisa também veio de lá, como o rock, que é amplamente aceito.” Alvernaz concorda e ratifica a posição do funk como um gênero musical que pode abrir os olhos de novos estudantes para os encantos do estudo de história. “A letra é simples e tem uma linguagem bem comum de ser entendida e que pode atingir que, muitas vezes, não se interessa por uma leitura mais acadêmica. A música pode ser um instrumento de aprendizagem para boa parte da sociedade.”

Professora me desculpe Mas agora vou falar Esse ano na escola As coisas vão mudar Nada contra ti Não me leve a mal Quem descobriu o Brasil Não foi Cabral Pedro Álvares Cabral

NÃO FOI

Chegou 22 de abril Depois colonizou Chamando de Pau-Brasil Ninguém trouxe família Muito menos filho Porque já sabia Que ia matar vários índios

CABRAL 13 Caravelas Trouxe muita morte Um milhão de índio Morreu de tuberculose Falando de sofrimento Dos tupis e guaranis Lembrei do guerreiro Quilombo Zumbi

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Zumbi dos Palmares Vitima de uma emboscada Se não fosse a Dandara Eu levava chicotada

Sessão de fotos da MC Carol

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MENINOS DA DÔNICA por_Claudia fotos_Pedro

a ideia de chamarmos o Milton para gravar e ser nosso padrinho também. Tom, no começo você não subia ao palco por timidez. Como fez para driblá-la? TOM VELOSO Desde criança sempre fui muito tímido mas por incrível que pareça não foi tão difícil… Quando subi no palco pela primeira vez e gostei. E aí quis continuar subindo. É o “palco vírus”, como se fosse o zika vírus [risos]. Agora não quero mais sair de lá!

Almeida Abrão

A Banda Dônica, que tem como um dos integrantes Tom, filho caçula de Caetano Veloso, já se prepara para abrir o primeiro dia do Lollapalooza neste sábado, em São Paulo. Formada por José Ibarra (vocal e piano), Miguel “Miguima” Guimarães (baixo), André “Deco” Almeida (bateria), Lucas Nunes (guitarra) e Tom Veloso (violão e composições), o quinteto apresenta o repertório do disco de estréia, “Continuidade dos Parques”, às 12h55, no Palco Onix. Com apenas quatro anos de estrada, a banda já se apresentou nos palcos do Rock in Rio no ano passado. Abaixo, a conversa com os meninos, feita por viva-voz, com todos juntos ao telefone.

Ter Caetano como pai ajuda ou atrapalha? TOM VELOSO Não tem como atrapalhar. Meu pai é muito companheiro. Ele ajuda, gosta da banda, fala do que gostou, do que se emocionou… Ele só fala do que ele gosta, não dá ideias nem pitacos. Acho isso nele algo respeitável, muito bom, ele me deixa ter o espaço de criação diferente da visão dele.

Como é para vocês abrir um dos palcos do Lollapalooza? LUCAS NUNES Estamos ansiosos. É um festival muito importante, talvez o evento mais importante que a gente vá tocar. Além de ser um festival que a gente preza muito, por ter bandas alternativas no estilo quer a gente gosta. Como vocês definem o som da Dônica? LUCAS NUNES É um rock progressivo. JOSÉ IBARRA Não é bem isso… É um pouco MPB também. Na verdade abrangemos alguns gêneros, como a música clássica e o progressismo inglês. Vocês têm uma forte influência do Clube da Esquina, como Milton entrou de padrinho? JOSÉ IBARRA Todos eram apaixonados pelo Clube da Esquina e Tom, que tinha contato com o Milton, fez a ponte. Um dia a gente mostrou uma música para ele, e ele adorou. Na hora do disco tivemos

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Clipe da música Bicho Burro

MENINOS DA DÔNICA Banda: Dônica Rio De Janeiro Acompanhe o trabalho deles: facebook_bandadonica insta_@bandadonica

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O CHARME DA BANDA TONO por_Bruno

fazer uma pausa de um mês porque alguém está viajando”, diz Rafael, apontado pelos colegas como culpado pela reunião dabanda. Das onze faixas de Tono, lançado no final de 2010, sete são composições de Rafael Rocha, como “Me sara”, com Bernardo Palmeira, e “So in”. A maioria dos integrantes tem composições no disco. Ana Claudia Lomelino estreia como compositora em “Ele me lê”, feita para celebrar a troca de e-mails com Caetano Veloso – que admira desde a infância. Surpresa maior foi a declaração do ídolo, agora fã , ao falar sobre o Tono em sua coluna no jornal O Globo – “Ana Cláudia é especialmente adorável por ser a única cantora realmente cool (nos dois ou três sentidos) da geração.” “Pra mim, o Tono passa longe da MPB apesar da colaboração mútua entre a banda e diversos artistas relacionados ao termo. Estamos em outro plano e não buscamos categorização”, diz Bem. Para completar o repertório do álbum a única regravação presente, a canção “Negamúsica”, de Itamar Assumpção. “No repertório dos dois discos, essa é a única que não foi composta por nós em sua essência”, diz Bem. “É que nem a poesia, a gente se apropria”, completa Bruno di Lullo.

Duarte Von Kruger

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Desde o lançamento de seu primeiro disco, Tono auge, no final de 2008, a banda carioca Tono, fez jus a seu nome e deu o tom da originalidade de seu trabalho. Com influências que vão de Itamar Assumpção e Jorge Mautner a Michael Jackson, Prince e Talking Heads, eles lançam o seu segundo álbum pelo selo Oi Música. Formada por Rafael Rocha (bateria e voz), Ana Claudia Lomelino, (voz e metalofone), Bem Gil (guitarra), Bruno di Lullo (baixo) e Leandro Floresta (flauta,teclados e sintetizadores), a banda nasceu de encontros esporádicos onde tocavam composições próprias, além de suas preferências musicais. Daí o caráter eclético de seu repertório. “Nós fomos tentando criar uma identidade musical através das diferentes formações, oito, dez, cinco pessoas, até chegar ao primeiro disco”, diz Rafael Rocha. “Gravamos no final de 2008, já com a banda bem experimentada”, completa Bem Gil. Extensa bagagem musical e apropriação de outras linguagens, como as artes plásticas e a fotografia, completam o autêntico trabalho do Tono. Como uma boa banda independente, eles participaram de todo o processo de produção do disco, além de se desdobrarem tocando em outros projetos. “Todos temos as nossas atividades. O Tono é uma convergência, mas o Leandro toca violão, compõe e faz os shows dele. O Bem toca com o Gilberto Gil, eu toco com a Adriana Calcanhoto, Brunão toca com a Silvia Machete, Aninha Claudia é uma pessoa muito plural dentro da banda que traz conceitos da astrologia, faz festas, traz toda uma direção de clima, figurino. Às vezes temos que

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Banda Tono em ensaio fotográfico

O INDEFINÍVEL SOM Artista: Tono Desde 2008 Procure os trabalhos da Banda Tono no Youtube e sigam sua página no Facebook. @tonomusica

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READYMADE: OUTROS NOMES— OUTRXS DEUSXS— flumen.br

A ARTISTA CONTA SOBRE O FEMININO NO CAMPO DAS ARTES PLÁSTICAS por_

Paulo Miyada

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0. TOTENS

Quem passa na rua, vê. Quem viu, é porque passou na rua. Alguns entram na galeria. Outros já se dão por satisfeitos. Uma tríade, três grandes áreas de cor, três corpos-colagens totêmicos, estruturados por rotações ao redor de eixos verticais centralizados. Novas divindades, novas mulheres para um novo Brasil. Gritos renovados ou gozos ininterruptos, que reslumbram na fachada e revelam-se no interior da exposição. Manuela Eichner chegou à Salvador, gostou de estar ali e colocou o que tem de mais vivaz direto na calçada – retribuição de uma energia de sincretismo, ancestralidade e presença sem igual em outras partes do país.


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1. REVISTA “DE MULHER” Muita gente viu pela primeira vez as colagens de Manuela Eichner nas páginas (impressas ou digitais) de revistas voltadas ao público feminino jovem e progressista. Ela, por sua vez, devora uma ampla gama de imagens ao criar suas obras, muitas advindas de revistas ditas femininas, e outras tantas – a maioria das que se encontram recortadas e recombinadas nesta exposição – de revistas especializadas em apresentar corpos nus de mulheres para o prazer escópico masculino. No complexo meio editorial brasileiro, que traduz à sua maneira a sociedade em que vivemos, todas essas poderiam ser chamadas pelo jornaleiro de revistas “de mulher”: de mulher pelada, de mulher moderna, de mulher bela, recatada e do lar. O que essas interpelações do feminino têm em comum, apesar das diferenças óbvias em suas abordagens? Elas partem de uma noção da mulher suficientemente padronizada e domesticada para que caiba em uma categoria supostamente homogênea: o universo feminino. Você sabe do que estou falando, não é mesmo? Não é, mesmo. Se a prática da colagem tem algo a contribuir imediata e implacavelmente para o debate de gênero é a lembrança de que é limitada e violenta a restrição do feminino a uma categoria estável, que supostamente denota sempre o mesmo conjunto de formas e valores. Estar em devir feminino é coisa multidimensional, multifacetada e, potencialmente, composta de signos contraditórios entre si. Claro que se poderia dizer o mesmo do masculino, do andrógino e assim por diante. A diferença é que o feminino por ter sido tão assediado por normatizações – da tradição, do mercado, do machismo – grita hoje a plenos pulmões que não se deixará domesticar e afirmará, com plena potência, o gozo de significados cambiantes e espirais.

2. MONSTRA

As apresentações da obra de Eichner em museus e instituições artísticas tiveram até agora, em comum, sua pesquisa a partir da Monstera Deliciosa. As alcunhas dessa planta criam já saborosos enlaces entre o corpo da mulher e o viço da planta tropical. Eva, costela de Adão, uma monstera deliciosa. As colagens que Manuela produziu sob a sombra dessa planta são experimentações de uma turbulência de signos: a planta que consumimos como decoração, mas assume outra escala e exuberância na mata aberta; as mãos, bocas, gritos e cores que aludem a corpos selvagens; a instalação organizada no espaço, mas que não se deixa penetrar ou mesmo apreender em uma só olhada, exigindo que o espectador a escrutine em idas e vindas.

Colagem analógica, por Manuela Eichner

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[...] O neologismo “monstra”, então, é evocado como elogio de tudo que escapa à docilidade decorativa: alguma interioridade selvagem [...]

No último ano, essa pesquisa convergiu com o projeto Monstra, uma “coreografia-colagem” dirigida por Eichner e Elisabete Finger, cujo cerne é a relação sem mediações entre performers mulheres e mudas de plantas. A domesticidade de ambas, mulheres e plantas, é colocada em questão em uma sequência de atos – os corpos se dobram, acolhem-se uns aos outros, testam equilíbrios e desafiam inércias. Com o tempo, as plantas colocam as dançarinas a nu, ou vice-versa. Agora, em Outros Nomes, Outrxs Deusxs, Manuela desdobra essas pesquisas, concentrando-se sobre a colagem mesma e sobre a possibilidade de construir arquétipos complexos dessa feminilidade outra que se anuncia à contrapelo dos aparatos de controle perversamente atualizados em toda sorte de discurso conservador.

3. COLAGEM, PÓS COLAGEM, RECOLAGEM

A colagem irrompeu no léxico da cultura de vanguarda da virada do século XX como uma atitude de justaposição abrupta de fragmentos da cultura visual de uma época. Sua força advinha do caráter arbitrário dessas junções e, até certo ponto, alimentava-se da própria transformação acelerada dos meios de reprodução gráfica. Se a colagem moderna se tornou possível com o advento da imprensa, seus recursos multiplicaram-se com o desenvolvimento do parque gráfico industrial dos anos 1910 em diante.

Colagem feita pela artísta Manuela, a fim de representar seu lado mulher de ser

É natural, portanto, que a era digital também traga seus insumos para a reinvenção do que pode ser a colagem, já que não apenas a oferta de imagens cresceu vertiginsamente, como também a velocidade e ubiquidade de signos gráficos fez com que, hoje, uma imagem viaje mais rápido e de forma mais pervasiva do que qualquer palavra. É nesse espaço-tempo que Manuela Eichner ataca a colagem. Basta olhar com mais atenção para o modo como se sobrepõem cores e camadas em suas obras para notar a marca de uma inteligência visual criada em uma época digital.Existe corte e sobreposição, mas também enorme desenvoltura para reescalonar elementos, combinar planos cromáticos supersaturados, transbordar o território da elegância da folha de papel em branco e, especialmente, ir e vir do material reunido na prancheta para os softwares de edição de imagem. Todas as obras aqui apresentadas dependem de imagens impressas para sua concepção, porém nenhuma resolveu-se exclusivamente com meios analógicos. Seja no começo, seja no fim – ou até depois do fim –, o processamento digital comparece multiplicando recursos e ferramentas. Isso permite, inclusive, que uma pintura possa ser um dentre tantos estágios de seu pensamento colagista, ou que a versão de papel de uma imagem seja na verdade construída depois do “original” digital. O assunto, porém, não se restringe ao meio técnico – mas abarca o modo como ele renova o caráter indomável e imprevisível do processo de colagem. Se o interesse pela colagem tem crescido nos tempos recentes é porque sua prática tornou-se uma arma no embate com o fluxo atabalhoado de imagens, fórmulas e estímulos.

Trabalho feito para a Skol

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PORTFOLIO POR HELÊ COLAGENS por_

Nara Montenegro

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a arte de reutilizar Um bate papo com a jovem artista Helena, a carioca empoderada e cheia de criatividade.

Como você se interessou pela colagem? Por que ela te interessou para fazer seus trabalhos? HELENA SCHIMIDT Sempre curti a estética da colagem, e comecei a experimentar mais diretamente no meu projeto final da faculdade de design na PUC-Rio em 2015. Eu nunca soube desenhar muito bem, então a colagem sempre foi uma alternativa pra me expressar. O projeto era um conjunto de cartazes sobre mulheres super importantes mas que tiveram suas historias apagadas pela desigualdade de gênero. Acho que sou super critica com meu trabalho (todo designer é um pouco né?), mas sinceramente não fiquei super satisfeita com o resultado. Depois que entreguei o projeto, me formei, e já não tinha mais que lidar com as pressões da faculdade, comecei a colar só por hobby nas horas livres. E assim descobri minha paixão <3. Fiz uma oficina com a Hannah 23 que foi super decisiva pra me encontrar num estilo gráfico e começar a experimentar materiais mais inusitados na colagem.

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Qual seu tipo de foco na hora dos seus trabalhos? Como chegou neles? HELENA SCHIMIDT Eu sou taurina, então sou super metódica pra trabalhar (risos). Gosto de separar os papeis por categorias (figura humana, objetos, texturas, paisagens, animais) e coloco todas as pilhas em cima da mesa, coloco a minha vista todo o material q vou utilizar: linhas, paetês, letraset, carimbos, fita durex de cores variadas, além dos recortes. Coloco música, muitas vezes escolho playlists de mulheres que me inspiram <3, e acho que isso influencia 200% no processo! Notamos que sua pegada é mais sobre mulheres, sempre foi desse jeito, desde o começo você fez trabalhos voltados a esse tema? HELENA SCHIMIDT Como contei pra vocês, meu projeto final já tinha essa temática super feminista. A mulher sempre foi a figura central do meu trabalho e estudo, também porque eu sentia uma grande necessidade de falar sobre nós mulheres, sobre nossas questões e sobre quebrar tabus relativos a gênero que me incomodam. Quem são suas maiores inspirações, não só no seu trabalho, mas na sua vida pessoal também? HELENA SCHIMIDT Uma das minhas maiores inspirações de vida, sem dúvida, é minha mãe. Ela me ensinou a ser uma mulher forte, que luta pelo que quer e é independente. Com certeza minhas amigas são mulheres que me inspiram muito também, eu sempre digo que me acho muito sortuda por estar rodeada de mulheres tão incríveis! Uma das minhas maiores referências na colagem é a Manuela Eichner (@manuelaeichner), já falei pra ela, quando crescer quero ser que nem ela <3 Também admiro muito o trabalho da Mariana Valente (@collagevalente), Ingrid Bittar (@ingridbittar), Elisa Pessoa (@elisapessoa_) e Gabriela Sánchez (emegabez). Elas arrasam! Estamos vendo uma onda de artistas independentes expondo seus trabalhos em espaços menores de coletivos, no instagram e se unindo com outros artistas, o que você acha desse novo mercado? Conta um pouco sobre seu papel nele! HELENA SCHIMIDT No atual cenário político em que vivemos, sabemos que o governo não dá praticamente nenhum incentivo a arte e a cultura, então nós artistas percebemos a necessidade de nos unir, porque o maior clichê “a união faz a força” é real! A gente se une pra criar esse incentivo, pra trocar informação, pra trocar ideia sobre trabalho, pra avisar a galera das feiras de impresso que vão rolar, enfim, pra se ajudar mesmo, e principalmente pra ter um meio de dar visibilidade aos novos artistas brasileiros. Eu participo desde o início do nosso coletivo de colagistas brasileiros (@colagem.analogica.br) e vi ele crescer

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lindamente, e continua crescendo! Hoje contamos com um grupo de mais de 50 membros e já temos mais de mil seguidores no instagram, com o perfil ativo desde fevereiro desse ano. Criamos desafios semanais pra nos incentivar a produzir novas colagens e decidimos os temas de cada semana por votação. Além disso, usamos a página para divulgar o trabalho de todos os artistas e nos comunicamos todos os dias pelo grupo do Whatsapp: seja pra tirar alguma dúvida de material, pedir uma opinião, ou marcar uma reunião da galera de cada estado, estamos sempre juntos e conectados!

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CAPĂ?TULO IV FEITO EM 08 JUNHO DE 2017

SECTION 5 feito em 07 junho 2017

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MEXEU COM UMA, MEXEU COM TODAS FEITO EM15 MARÇO DE 2018

CENSURADA FEITO EM 25 JANEIRO DE 2018

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SEU MACHISMO É TÓXICO FEITO EM 24 MARÇO DE 2018

CADA UM É UM UNIVERSO FEITO EM 12 MARÇO 2018

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por_Felipe

A não necessidade de rótulos estende-se a outras produções que concorreram ao prêmio, como Alguma Coisa Assim. Experimentações sexuais, indo contra a maré repressora atual e dando um salto em relação às primeiras produções brasileiras com personagens gays é sempre bem-vindo. Pensando num panorama não só brasileiro, mas também internacional, parece que os filmes com personagens LGBTQ não buscam mais chocar o público com cenas fortes de sexo, como fizeram Shortbus (2005) e Azul é a Cor Mais Quente (2013). Essas sequências eram feitas com a intenção de demandar a liberdade sexual, o que não parece ser tão mais necessário com a menor erotização dos corpos homossexuais em cena, como foi o caso de Moonlight: Sob a Luz do Luar (2016), vencedor do Oscar. Os longas brasileiros analisados, por exemplo, não mostram o sexo em cena de forma tão explícita e abordam a experimentação. Trata-se, ao mesmo tempo, de uma libertação e de um movimento que tem levado os personagens LGBTQ a, cada vez mais, assumirem o protagonismo nas produções cinematográficas. Legislações contra violência e incitação à violência devem ser aplicadas, independentemente de haver menção específica a LGBT. Países devem encorajar a coleta de informações sobre violência, crimes de ódio.

Divulgação

AGORA A TV É LGBT Ribeiro

As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra, foi o longa-metragem vencedor do Prêmio Félix 2017, premiação do Festival do Rio, criada em 2014, destinada a eleger, por meio de um júri, as melhores obras com a temática LGBTQ. Além do filme de Dutra e Rojas, cinco longas das diferentes mostras da Première Brasil concorreram ao troféu este ano: Alguma Coisa Assim, Até o Próximo Domingo, Copa 181, Entre Irmãs e Vende-se Esta Moto. O prêmio, que teve, ao todo (entre nacionais e estrangeiros), 32 concorrentes deste ano, indica a presença de personagens LGBTQ é uma constante na cinematografia nacional recente. O que chama a atenção, no resultado, é que o prêmio foi para um filme que não tem a temática gay como foco da narrativa. As Boas Maneiras, que trafega entre o fantástico e o horror, traz um casal de lésbicas no centro da trama, mas apresenta o lesbianismo de forma absolutamente natural. Dutra e Rojas inserem as relações homoafetivas, que também estão presentes nas outras obras que concorreram ao prêmio, numa trama cujos conflitos não passam pela questão gay. Uma cena que ilustra a naturalidade do filme em relação aos personagens LGBTQ é aquela em que a personagem de Isabél Zuaa está em um bar e começa a flertar com outra mulher, vivida pela atriz Gilda Nomance. A aproximação é mostrada com leveza. E tampouco há alarde quando Zuaa e Marjorie Estiano se aproximam e iniciam uma relação amorosa. Não há a intenção de debater o seu comportamento sexual, nem suas diferenças sociais e raciais. Elas não precisam dizer que estão juntas, nem rotular o que possuem, são idependentes e suas.

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Cena do Longa metragem “As boas maneiras”

PROTAGONISMO NA TELEVISÃO Direção: Juliana Rojas e Marco Dutra Temática: LGBT Premiação: Festival Rio 2017 Prêmio: Fêlix

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DESNUDE: PRAZER E SEXO por_Andréa

Ao lado da também diretora Anne Pinheiro Guimarães, Carolina Jabor montou uma equipe majoritariamente feminina para produzir a série. Os 9 episódios foram roteirizados, produzidos, dirigidos e filmados apenas por mulheres, sempre com o foco no protagonismo que não é comumente visto em produções que vão desde o pornô até o mais sofisticado erotismo. “Para todo mundo foi uma primeira vez. Isso eu senti na pele. Foi criado um frisson, uma sensação de estar fazendo uma coisa muito empoderada e muito forte. A sensação de todas que estavam ali foi a de que todas estavam contribuindo para um projeto muito especial para as mulheres, para o olhar feminino”, lembra Anne. Em conversa com as diretoras Anne Pinheiro Guimarães e Carolina Jabor contaram detalhes da produção da série e, como, até para elas, trabalhar em um projeto como este as ajudou a pensar sobre a própria condição. “O mais interessante da série foi analisar a nós mesmas e, ao mesmo tempo, ficar atentas ao protagonismo da mulher na produção da série”, afirma Carolina.

Martinelli Vianna

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“Quisera que toda vida humana fosse pura e transparente liberdade”. A frase creditada à filósofa francesa Simone de Beauvoir é o que abre um dos episódios da série Desnude, nova produção audiovisual do Canal GNT, em parceria com a Conspiração Filmes, dirigida por Carolina Jabor e Anne Pinheiro Guimarães, que busca colocar o desejo da mulher em primeiro plano. Vida e liberdade, na maioria das vezes, não são associadas ao prazer e a sexo. Ainda mais quando o assunto é fantasia e sexualidade feminina. Não à toa, uma pesquisa da Universidade de Montreal, em Quebec, Canadá, em 2014, constatou que “homens têm mais fantasias, conseguem descrevê-las sem medo e tem uma vontade enorme de realizá-las”. Em contrapartida, a série começou a ser desenhada depois que o canal promoveu uma pesquisa com mais de mil mulheres anônimas. 76% das entrevistadas afirmaram gostar de assistir conteúdo e filmes sobre sexo em que a mulher é a protagonista. O mapeamento também colheu histórias sexuais, imaginadas ou vividas por essas mulheres que, em alguns momentos, serviram de inspiração para a série. “Todo o audiovisual produzido sobre sexo é feito sob uma ótica masculina. E, culturalmente, o prazer da mulher é meio que condicionado ao prazer masculino, né?”, reitera Carolina Jabor, uma das diretoras da série. Trazer o verdadeiro desejo da mulher à tona e explorar o universo das fantasias sexuais é o objetivo da série que estreou dia 5 de março, no Canal GNT. E isso foi levado muito a sério.

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A atriz Patrícia de Jesus, em uma das cena dos bastidores de ‘Desnude’.

O PAPEL FEMININO Série Desnude GNT Assista online no Globosat Play

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todos os que assistiram a série previamente, gostam muito. Porque eles aprendem também. Quem tem uma mente um pouco mais aberta e se mostra propício a entender melhor as nossas fantasias, o que passa pela nossa cabeça, só tem a aprender. ANNE PINHEIRO Cara, é interessantérrimo. Porque existe uma curiosidade extraordinária neles. E eles falam, eles ficam alvoroçados, interessadíssimos. Quando eu falo da série eu conto sempre quais são as premissas que a gente partiu de alguns episódios. E a reação tem sido muito positiva. Eu não acho que a série é só para mulheres. A série só tem a particularidade de que a protagonista ela é dona do seu próprio desejo. Ela não é o objeto do desejo. Ela é o ser desejante. Essa é a grande diferença.

Todo o audiovisual produzido sobre sexo é produzido sob uma ótica masculina. E, culturalmente, o prazer da mulher é meio que condicionado ao prazer masculino, né?

Como surgiu a ideia do projeto? CAROLINA A gente começou a pesquisar sobre o assunto e percebemos, que as mulheres não são representadas em filmes sexuais e não se veem nessas produções. Todo o audiovisual produzido sobre sexo é produzido sob uma ótica masculina. E, culturalmente, o prazer da mulher é meio que condicionado ao prazer masculino, né? Partimos de um desejo de falar sobre esse tema e o projeto tomou corpo junto. E, então, a gente decidiu fazer um recorte das fantasias. Porque falar de sexo é falar de uma coisa muito ampla. E fantasia é um tema que não é linear. Então ele facilita a linguagem cinematográfica; nossa cabeça também fica muito livre, o que aumenta a liberdade na hora de criar. ANNE PINHEIRO Ao todo, fechamos em 9 histórias, com 9 protagonistas diferentes, com sua sexualidade manifestada de uma forma diferente, com idades diferentes e com universos mentais muito diferentes. A gente quis fazer esse apanhado de fantasias, desde as que se realizam de fato, até às que se realizam só na cabeça. Por que sexo é um assunto que a gente não está acostumada a falar, e não é ensinada a falar sobre isso. Como foi trabalhar em um set de filmagem que só tinham mulheres envolvidas? CAROLINA Esse set majoritariamente feminino era algo que o projeto também pedia, então, além da novidade de estar trabalhando só com mulheres, ele ainda tinha o caráter de que todas as mulheres estavam trabalhando em prol da dramaturgia. Então, essa foi a grande diferença.

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No caso dessa série, além de tudo, tinha a questão das cenas de sexo, então as mulheres ainda ficaram eventualmente expostas, com seus corpos nus. O fato de a gente ser mulher tranquilizava muito o elenco. Isso deu um certo conforto a elas. ANNE PINHEIRO Eu trabalho com cinema há 18 anos. E os sets sempre foram e continuam sendo majoritariamente masculinos. Também, existem algumas funções, por exemplo, que são predominantemente masculinas. Eu nunca tinha trabalhado com uma contrarregra mulher na minha vida. E não porque as pessoas não queriam trabalhar com uma contrarregra mulher, mas é porque não tinham mulheres nesse campo. E existem funções e profissões que foram tradicionalmente pautadas por um único gênero.

Para vocês, diretoras, falar sobre sexualidade feminina é falar sobre liberdade? CAROLINA Eu acho que sim. Eu me sinto mais livre em poder falar sobre isso, também. Esse projeto tem essa característica, sim, de dar uma certa onda em que todo mundo que participou dele. Porque falar da sua própria sexualidade é muito guardada, né? Geralmente a gente não fala e a gente não consome esse tipo de conteúdo. Então, acho que se a série puder proporcionar às mulheres o fato de poder falar mais, procurar mais, perguntar mais, ir atrás de qual é o que você mais se permite. Eu acho que sim, é um aspecto de liberdade. ANNE PINHEIRO Em primeiro lugar é falar sobre liberdade. Pelo menos é o que a gente também buscou: falar sobre o quanto as mulheres podem manifestar o seu desejo livremente no sexo. A liberdade sexual feminina é algo que precisa ser vista e exercitada. Eu fui ler um romance no processo de produção da série, meio bobo, do Ian McEwan, chamado Na Praia. Ele nada mais é do que a história da noite de núpcias de um casal jovem nos anos 1960 e, a partir desse fato, existem vários flashbacks para o passado dos dois e, principalmente, sobre a formação sexual e expectativa sexual de cada um. E foi extraordinário perceber que a educação feminina é uma educação voltada para o silêncio, para o tabu, para a desinformação. E a masculina é o oposto, é uma descoberta, um lugar de expressão masculina. Então, falar de sexualidade feminina é falar sobre liberdade, sim. E é isso que nos interessa.

É estranho pensar que, em 2018, as mulheres ainda não não representadas no universo do audiovisual? ANNE PINHEIRO É estranho pensar que, na verdade, é importante fazer isso. É sobre o discurso da Frances McDormand no Oscar, sabe? Eu não sabia, mas hoje existem atores e atrizes que colocam no seu contrato que a equipe precisa ser mista, variada. E isso é extraordinário. Quando você tem essa experiência, ela muda o olhar, ela muda o cuidado, ela muda a postura das pessoas. Não estou dizendo que todo set precisa ser majoritariamente feminino, a gente precisa ter homens também. Mas estou dizendo que é importante ter mais mulheres e que isso traz experiências fortes e únicas. Vocês, como diretoras, chegaram a ouvir homens para construir as histórias? CAROLINA Eu vou te falar que eu não fui muito atrás de homens para falar sobre, não. Eu até vou procurar que eles assistam, acho importante. Mas as reações me pareceram abertas. Eu acho que eles estão querendo o diálogo. Os homens que a gente convive, que são homens que não são reacionários, conservadores e nem tão machistas assim, eles trazem um desejo de querer ser menos machistas; eles querem ser melhores. Então,

Cena da série Desnude

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FRONTEIRAS DAS RELAÇÕES por_Matheus

Divulgação

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Logo nas primeiras cenas de Pendular, filme de Julia Murat que estreou na quinta-feira 21, o casal interpretado por Raquel Karro e Rodrigo Bolzan traça com uma fita adesiva laranja a divisória de um galpão em São Paulo transformado em estúdio e residência. Um amigo, ao visitar o espaço, brinca que o cenário é semelhante ao de Dogville, clássico de Lars von Trier. De fato, as interdições e fronteiras daquele espaço não são mediadas pelo concreto, mas por uma projeção entre frágil e abstrata. De uma lado, ela, dançarina contemporânea, se dedica à coreografia; do outro, ele, escultor, tenta dar forma a uma nova intervenção que, confessa, não sabe exatamente o que é nem para onde vai. Naquele pêndulo, um lado pesa, e outro precisa flutuar. O jogo de luzes e sombras da fotografia permite observar, naquele cenário de fronteiras indefinidas, fragmentos de corpos em interação com o espaço. Da cidade só ouvimos os ruídos. Do lado de dentro, nunca sabemos quando aqueles corpos estão encenando, ensaiando ou simplesmente flanando: embora atípica, aquela residência parece absorver as urgências do mundo corriqueiro do lado de fora, onde as divisas entre trabalho, descanso, entretenimento e conexões estão dissolvidas em linhas tão perenes como uma fita adesiva. Em uma das cenas, a personagem de Raquel Karro, tentada a coreografar e a levar ao palco (qual?) até o modo como

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dispõe as pernas sobre as cadeiras quando lê, é chamada de ansiosa e workaholic por um parceiro de dança. Demoramos a perceber esses traços naquela artista: ela destoa da imagem dos viciados em trabalho das grandes cidades que circulam pelas grandes avenidas atarefados, presos ao celular, falando alto e paramentados em ternos, vestidos, sapatos de salto alto. Nesses lares onde estabelecemos fronteiras confusas entre ofício e abrigo estabelecemos também as relações afetivas. Naquela engrenagem mediada por uma fita adesiva um casal também circula entre luzes e sombras em busca de uma comunicação que é também ruído. Se nos filmes Como nossos pais e As Duas Irenes, lançados também recentemente, vemos o esgarçamento das relações tradicionais (papai-mamãe-filhinhos e mitos sobre o que fazemos quando não estamos em casa e delegamos os cuidados dessa casa a apenas um dos lados da história), em Pendular as relações, como o exercício artístico - sensível a luz e sujeito a escuridão - se abrem para experimentações, mas não escapam das interdições. “Não está dando”, diz o personagem em uma das cenas ao reivindicar mais espaço para a “sua” criação.

Cena Pendular

“PENDULAR”, JULIANA MURAT Artista: Matheus Pichonelli 28 anos Araraquara - SP Acesse o trabalho dele: @M_Pichonelli

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A partir de então a relação mediada pelos esparadrapos passa a ser compreendida como uma disputa por território, e essa disputa só prescindirá de um conflito aberto e deflagrado se um dos lados ceder. Advinha qual. Ao longo do filme, tentamos acompanhar as distâncias e silêncios de quem não parece disposta a se subordinar às fronteiras, estas mais bem definidas, do que se convencionou a chamar de “conquista”. Esta conquista, afinal, requer o estabelecimento de uma vontade, como uma queda-de-braço sobre desejos, entre elas a sujeição dos corpos às vontades e destinos. O exercício parece simples quando se negocia a disposições dos móveis ou das obras em criação, mas se complica quando se embrenha em questões como maternidade, confinamento, corpos subjugados, etc. É quando dois corpos deixam de ocupar o mesmo espaço e produzem fissão. A crise de criatividade que atinge aquele casal é a crise de um relacionamento fadado ao jogo de imposições. Em uma das cenas, a personagem tenta descobrir para onde levam os cabos que parecem unir aquele galpão com o mundo afora; o marido diz que aquilo não importa, e já não sabemos se ele se refere a cabos de TV, a uma intervenção ou qualquer outra alegoria. Importa? A estética documental do filme, que também dilui fronteiras ao levar para a tela outras linguagens artísticas, como a dança contemporânea em processo de elaboração, tem como inspiração a performance Rest Energy, de Marina Abramovic e seu então marido, Ulay. Nesta encenação, de 1980, o casal segura um arco tensionado somente pelo peso de seus corpos, apontando uma flecha para o coração de Abramovic, numa tensão provisória entre confiança e vulnerabilidade que chega a causar pânico só de ver. Pudera: nas relações contemporâneas, liberais ou tradicionais, o desequilíbrio das relações é o indício do vacilo de quem deveria segurar as pontas da confiança e, em vez disso, impõe sua vontade nas sombras da vulnerabilidade.

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LOJA TRES

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Cena Pendular

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Camilo Rocha

Os usos e limites da arte ficaram no centro da conversa no início de setembro de 2017 por causa da campanha online que resultou no cancelamento da exposição Queermuseu, em Porto Alegre. Ativistas e políticos religiosos e conservadores acusaram a mostra, patrocinada pelo banco Santander, de exibir obras que promovem a pedofilia e a zoofilia e que desrespeitam símbolos religiosos.

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OS LIMITES DA ARTE

NA SEQUÊNCIA DOS DEBATES, QUAIS OS LIMITES DA ARTE, SEGUNDO TRÊS ESPECIALISTAS


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Na esteira desse acontecimento, textos e discussões tomaram conta da imprensa e das redes sociais sobre significados e sentidos da arte. Entre os comentários, há muitos que defendem controle e censura para produções artísticas, com a alegação de que não se deve permitir expressões que ofendam pessoas e crenças. Com tudo, ouviu-se muitas divergências sobre o assunto, e nessa edição convidamos três especialistas para opinar sobre algumas destas questões tão delicadas, são eles: Solange Farkas, curadora e diretora do Videobrasil; Marcello Dantas, curador e diretor da Magnetoscópio; Baixo Ribeiro, fundador da galeria Choque Cultural. A seguir veja as respostas dos três convidados às nossas indagações: Qual a importância da transgressão e da provocação na arte? Ele deve ter limites? Quais seriam e por onde deveriam se pautar? SOLANGE FARKAS A arte é um exercício contínuo de transgressão, principalmente a partir das vanguardas do começo do século 20. Isso dá a ela uma importância social muito grande porque, ao transgredir, ela aponta para novos caminhos e para soluções que ainda não tínhamos imaginado para problemas que muitas vezes sequer conhecíamos. A seleção dos trabalhos dos artistas para a próxima edição do festival [Videobrasil], por exemplo, me fez ver que os artistas estão muito antenados com as diversas crises que estamos vivendo e oferecem uma visão inovadora para o nosso cotidiano e acho que isso é um ótimo exemplo na sociedade. MARCELLO DANTAS O papel da arte é abrir a cabeça das pessoas. Permitir novas ideias, proporcionar reflexão, imagem e revelar algo do inconsciente coletivo. Para isso ela precisa necessariamente existir no território do inexplorado, do desconhecido, da originalidade e do inominável. Esse território nunca pode ser alcançado se a arte for mantida em um cercado conceitual, onde está pré definido o que pode e o que não pode. A arte é sobre o que não sabemos e por isso deve poder ser transgressora, indefinida, incompreendida, subjetiva. Sociedade que não tem isso é uma sociedade pobre, sem alma e sem potencial criativo.

Uma instituição cultural tem que assumir sua posição de fomentar esse diálogo e furtar-se a isso é negar a sua própria razão de existir [...] [...]

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Solange Farkas

Obra de Rogério Nazari, na exposição

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_sense Incompreendido hoje pode ser o gênio de amanhã. Uma sociedade sem transgressores é uma sociedade burra. BAIXO RIBEIRO Através da arte, é possível dialogar em níveis que simples conversas não alcançariam. A arte tem a capacidade de quebrar protocolos, regras e leis. E ainda ser elegante, sutil e sofisticada mas, também, tosca, malcriada ou brega. Não existem limites estéticos. Se percebermos a existência de um limite, é bom que exista uma arte que venha ultrapassá-lo. Faz parte da natureza da sociedade possuir elementos que queiram preservar a ordem e seus antagonistas, que queiram transformá-la. Geralmente o espírito da provocação é excitado por uma sensação de conformismo que tome conta do ar, a subversão é mais intensa quando as leis são mais opressivas, a transgressão é mais legal quando a lei não é legal. Acho que deve haver sempre uma tensão entre essas partes, mas não acho tão importantes estabelecer limites e, sim, procurar equilíbrios. Existem riscos para a liberdade de expressão quando se busca bloquear obras de arte em nome de preceitos morais ou religiosos? SOLANGE FARKAS A liberdade de expressão não deve servir como desculpa para perpetrar as violências, muito menos contra pessoas e grupos que não possuem os meios para se defender. Mas isso não é o caso de religiões que estão solidificadas institucionalmente ou de imperativos morais promovidos pelos detentores do poder maior entre nós. Nesses casos, o ataque da obra de arte é mais um chamado à reflexão do que uma violência eficaz, e é benéfico para toda a sociedade que a arte possa, de um lugar independente, criticar o que se pretende intocável. Não se deve entender que o modo de crítica da arte não seja um "ataque," mas sim uma forma de expressar abertamente o polêmico.

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Entrada da exposição

MARCELLO DANTAS O que está em jogo no Brasil neste momento não tem nada a ver com arte. O Brasil costumava se vangloriar de ser um país tolerante, sincrético, e plural. Contudo um grupo de assaltantes está tentando tomar conta do país. E parte desse processo está em colocar na defensiva aqueles que poderiam ser as forças antagônicas a esse projeto de poder. São ações orquestradas para desestabilizar e enfraquecer as possibilidades de oposição e reflexão. E a tomada de assalto ao território simbólico da cultura e suas instituições têm muito mais a ver com essa dinâmica de desviar a atenção para algo com aparência de emergente e enquanto isso fazer algo do interesse deles acontecer. Foi a mesma coisa no episódio da cura gay. Ninguém em sã consciência acredita que essas pessoas que se dizem religiosos estão realmente preocupados com pedofilia. Na história, pedofilia tem sido quase um monopólio da própria igreja. O impressionante nesse jogo é ver corporações e instituições sérias se sentirem acuadas diante de uma pressão tão obviamente manipuladora como essa e sem base alguma na história da cultura. A qualidade da arte censurada é de fato muito elevada e não tem nenhuma justificativa cultural ou artística para ser vetada. Estamos diante de um jogo de poder e a única alternativa é ir além da defensiva e partir para o ataque a hipocrisia desses que roubam milhões, perdoam estupros e se mobilizam para fechar museus. Onde está a moral nessa história?

Anderson Astor

Protesto feito em prol da continuidade da exposição

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Diante de uma obra que desagrada, é comum as pessoas dizerem "isso não é arte". É possível traçar parâmetros do que é ou não é arte? SOLANGE FARKAS Falando do caso do Queermuseu eu reitero aqui o manifesto do Conselho Internacional de Museus, do qual sou associada. Eles fizeram um manifesto sobre essa questão que fala que o museu pode ser um mediador de conflitos atuando nas grandes questões que incomodam a sociedade, que distanciam os povos. Abrir-se a um conflito não significa nele mergulhar de forma passiva, significa, sim, lutar contra todo tipo de desigualdade, viver o incômodo de posicionar-se em momentos de pressão, de buscar um lugar de gestor do conflito, tentando compor entre realidades diametralmente opostas. Embora não tenha autoridade absoluta para dizer o que é ou não arte, e isso nem seria desejável, os museus e outras instituições culturais podem fornecer às pessoas parâmetros possíveis para que elas mesmas entendam o que é ou não relevante como arte, tanto para cada um como para a sociedade como um todo. Uma instituição cultural tem que assumir sua posição de fomentar esse diálogo e furtar-se a isso é negar a sua própria razão de existir. MARCELLO DANTAS Arte é uma definição subjetiva. Mas o que define arte pra mim é o que me faz exatamente questionar o que é arte, ou onde está ela inserida na dinâmica de um artista. Arte é o processo de descoberta e de encontro entre a poética expressada e a poética compreendida. Essa química tem leis muito dinâmicas e portanto não pode ser pré-definida. No caso de exposições com grande circulação de público deve mesmo existir um cuidado a mais com os símbolos que representam coletividades porque os discursos ofensivos acabam gerando reações incontroláveis que sempre travam o diálogo. Para enriquecer o diálogo, é necessário saber escutar e saber que se você está ofendendo alguém tem que saber ouvir o troco.

Ver corporações e instituições sérias se sentirem acuadas diante de uma pressão tão obviamente manipuladora como essa e sem base alguma na história da cultura [...] [...]

SOLANGE FARKAS

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Juliana Knobel

Renata D'Almeida

Marcello Dantas

BAIXO RIBEIRO

MARCELLO DANTAS

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PROJETO ZONA E

tanto do racismo quanto da misoginia. Este “personagem da vida real” enfrenta diversas questões delicadas todos os dias, como abuso sexual, violência doméstica e policial, estereótipos culturais, desigualdade social, falta de cuidados com a saúde, etc. A mulher negra infelizmente ainda é sub-representada na política e na mídia. Com base nisso, o Pol e o coletivo carioca trouxeram modelos, artistas, atores e drags do meio anarco-humanista da Cidade Maravilhosa para formar o elenco que participou dessa iniciativa tão interessante. Uma curiosidade sobre o coletivo Kolor Rio é que, na realidade, ele foi criado por Kurucz na Hungria, em 2011. Porém, anos depois, o fotógrafo reinventou-o já no Rio, em 2015. A partir daí, passou a incluir ensaios fotográficos autorais. Neste ano de 2016, o grupo está trabalhando com novas zonas e temas como “a princesa consumista”, “mundo albinado”, “scato-Trump”, “música silenciosa”, entre outros.

por_Dionisio fotos_Pol

Arte Kurucz

Recentemente, conhecemos um projeto intrigante chamado ZONA desenvolvido pelo fotógrafo húngaro Pol Kurucz e pelo coletivo carioca Kolor Rio. Pol Kurucz é um fotógrafo que nasceu em Budapeste e foi criado em Paris, na França. Após rodar o mundo, ele se estabeleceu no Rio de Janeiro, onde fundou o coletivo Kolor Rio, onde também trabalham Tamires Melo, Mary Cruz e Carolyna Araujo. Juntamente com sua equipe, Kurucz criou o Projeto ZONA, em que foi diretor de arte, fotógrafo e cenógrafo. Antes de falar sobre o ZONA em si, vale ressaltar a proposta do Kolor Rio, que é muito legal. Eles respiram a cena drag, as lutas sociais, a estética neo-brega do Brasil (e de outros países) para exalar séries de retratos satírico-teatrais que são simplesmente sensacionais! O universo de cores, texturas, temas e poses do grupo flerta, briga e transporta ideias através de uma espécie de provocação que podemos definir como glam-trash, uma das marcas registradas de Pol Kurucz. Apesar de trabalharem com um impacto visual imediato, o objetivo conceitual do coletivo é indireto. Eles utilizam uma combinação que mescla harmonia e desconforto para questionar tabus e o conceito de “normalidade” que existe na sociedade. O projeto ZONA segue essa mesma linha e foi lançado em 2015. A ideia concebida pelo coletivo foi dividir as séries de fotos, formando “zonas” diferenciadas por temas e estilo. A série mais recente, presta uma homenagem à mistura de duas forças marcantes: o feminismo e a cultura afro. A simbologia por trás da mulher negra no Brasil representa uma figura que é refém

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Ensaio de Pol Kurucz com o coletivo Kolor Rio

A SÉRIE AFROFEMINISTA Artista: Pol Kurucz Hungria Acesse o trabalho dele: www.polkurucz.com

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MARINA BENZAQUEM, 17 ANOS por_Julia

Como e quando foi sua introdução na fotografia? MARINA BENZAQUEM Meus pais trabalham com música e moda, isso com certeza influencia até hoje na forma como me relaciono com todo esse universo cultural que convivo, pois desde pequena acompanhei eles de perto em shows e desfiles. Filmes e livros são referências muito fortes pra mim. Também sempre gostei muito de cinema e desde os 11 anos eu editava coisas, era meio nerd, ficava pesquisando e tentando descobrir como eu podia produzir mini filmes. Minha paixão pela fotografia em si só aflorou quando minha mãe entrou para a equipe da Animale e tinha que fazer trabalhos de pesquisa de imagem. Quando eu tinha 14 anos, ela ganhou muitos livros e revistas da Beth Nabuco (diretora criativa da Animale) e eu folheava por curiosidade. Esse material me ajudou muito a desconstruir a imagem fútil e material que eu tinha do universo da moda e me fez perceber a arte que existia ali. Descobri um novo mundo. Tudo é informação e experiência. Tudo se complementa na minha cabeça e se conecta na hora que fotógrafo ou penso em um editorial. Pra mim, a estética está na forma como você vê todas as coisas, sejam elas quais forem.

Pitalunga Benzaquem

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A artista e fotógrafa carioca Marina Benzaquem tem 17 anos, mas seu nome já está no boca a boca de fashionistas. Vitorino Campos, por exemplo, considera Marina “um surto” e já trabalha com ela há três anos. Ela produz, fotografa, edita, posta e participa desde as provas de roupas até o backstage dos desfiles da marca própria de Vitorino. Suas fotos são realistas e caseiras. Para ela, mais do que a construção de uma imagem perfeita, o que vale é a mensagem por trás ou um conteúdo extremamente sensorial, característica que ela diz ser importante para sua geração. Marina é filha de um produtor musical, Mauro Benzaquem, e de uma diretora de marketing, Monica de Souza, da Animale. Além das referências culturais que vieram da família, conta também o fato de que ela nasceu em uma geração praticamente desprovida de tabus, em que as complexidades do sexo e da figura da mulher são assuntos comuns e diários tanto na escola quanto em casa. Ela ainda está no 3º colegial, mas dedica todo seu tempo livre às suas pesquisas e ao trabalho ao lado de Vitorino. Sons, palavras soltas, sensações e cenas de rua são anotadas em seu moleskine para depois virarem fotografia, nua e crua. Leia aseguir as ideias, pensamentos e inspirações de uma menina de 17 anos que quer usar a fotografia para criar conteúdos sensoriais, numa entrevista exclusiva.

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Ensaio feito por Marina

ARTISTA E FOTÓGRAFA Artista: Marina Benzaquem 17 anos Rio De Janeiro Acesse o trabalho dela: marinabenzaquem.tumblr.com

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frequentado desfiles com minha mãe. O Vitorino começou a me seguir no Instagram, se identificou com minha linguagem e me convidou pra trabalhar com ele quando eu ainda estava no primeiro ano do colégio. Desde então, eu faço as redes da marca própria do Vitorino e das parcerias dele, fotografo e participo de provas de roupa ao backstage desde 2014. Eu monitoro tudo online, organizo, planejo, fotografo e edito tudo. Ele me deixa muito solta e livre, confia em mim e me apoia muito quando o assunto é colégio – ele não quer que o trabalho me atrapalhe nos estudos. E me sinto muito acolhida com isso, de ter a oportunidade de fazer os dois e ter ele praticamente como meu mentor!

[...] Tudo se complementa no final: a moda se encontra com a arte, que criar seu próprio espaço [...]

Quais são suas referências e pontos de partida na hora de fotografar? MARINA BENZAQUEM Desde que eu descobri esse novo mundo em 2013, não paro mais de pesquisar e de prestar atenção a tudo que se passa a minha volta. Existem fotógrafos que eu admiro, de Steven Meisel à Harley Weir. Steve, aliás, foi por muito tempo a minha referência mais forte de fotografia de moda, principalmente por causa daquele editorial das mulheres enfaixadas na Vogue Italia. Mas não me apego a estética deles, eu gosto de contar histórias próprias, criar algo singular que tenha a ver comigo, por isso minhas maiores referências são objetos abstratos como uma fala, as conversas com meus amigos, o cotidiano, a rua, poesia, filmes e literatura, muita literatura. Não gosto da ideia de me inspirar no trabalho fotográfico de alguém, de pegar uma foto que já existe e fazer uma releitura em cima dela. Anoto tudo o que imagino de cenas, palavras soltas, coisas que escuto e acho interessante no meu moleskine. Foi até ideia do Vitorino eu organizar meus pensamentos assim; lá é onde começo todo o processo criativo de um editorial e onde eu encontro minhas pesquisas juntas. Eu desenho, rabisco, escrevo e faço colagens. Minhas fotos são muito caseiras e espontâneas, nada pensadas, nada montadas e os ângulos aparecem naturalmente na minha mente. Os editoriais são entre amigos e os cenários são escolhidos na hora. Utilizo meu tempo livre pra fazer pesquisas e, enquanto pesquiso, descubro novas formas de fotografia, além de novas referências e novas paixões por diversos assuntos.

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Além do seu trabalho pessoal e com o Vitorino, o que mais tem tomado seu tempo? MARINA BENZAQUEM Eu estou em processo de desenvolvimento de um projeto online muito especial em parceria com o Clube Melissa, para o Instagram deles. O processo é escolher os produtos mais difíceis e diferentes da coleção atual e fazer fotos mais conceituais deles, já que as fotos que o clube faz são só comerciais. Claro que não posso fugir da identidade da marca, mas colocar o meu olhar e o que eu acredito nesse trabalho é a proposta deles, ter mais a foto pelo conceito. Fora isso, estou prestes a me formar e penso em fazer faculdade de Filosofia ou Cinema, ainda não sei.

Seu olhar não tem filtros e sua fotografia é bem comportamental. Como você define a sua estética? MARINA BENZAQUEM Acho que estética é algo mutável pra ser definida assim. Meu material tem mais a ver com o conceito, tem que ter um conceito forte mais do que uma imagem forte. Fazer pensar é mais interessante e transgressor. Essa é a beleza, é ser algo natural mesmo. Se não tiver uma mensagem e uma voz por trás, não tem significado pra mim. Contar uma história estética de um jeito mais lúdico de coisas que pra mim são questões consideráveis é o que eu busco hoje. Por exemplo, em um dos meus editoriais usei o ‘toque’ como mensagem subliminar. Ouvi durante uma aula de química: a gente só não entra em uma pessoa porque nossos elétrons nos impedem disso – fiquei instigada com essa afirmação, anotei no meu caderninho, li poesias e varias esculturas que me levaram ao assunto e fui lá fazer. O toque tem muito isso, de não tocarmos mais as pessoas, ele se tornou algo raro, é uma característica da minha geração e da globalização. Eu nasci com os toques somente de celulares e computadores, o toque pra mim é algo difícil de acontecer chegando a ser até diferente quando praticado. Também fiz um ensaio chamado Venom, ligado à liberdade sexual da mulher. Li um poema de uma feminista num blog independente que dizia que ela estendeu a mão pra um homem e enquanto estendida, viu a própria cobra. Essa história dá várias interpretações. Apurei com minhas amigas, discutimos sobre o assunto e sobre o significado de cobra nas civilizações antigas como poder da mulher, sexualidade, fertilidade e até sobre o falo. Achei interessante e fiz duas sessões de ensaios entre amigos, tudo bem caseiro e espontâneo, mas muito bem apurado. Você faz o material fotográfico das redes sociais do Vitorino Campos. Como começou a parceria? MARINA BENZAQUEM O primeiro desfile que fui da marca com ele à frente foi no dia do meu aniversário de 15 anos. Minha mãe tinha que ir e acabei indo junto. Naquela época eu ainda estava começando a entender como a moda funcionava, apesar de sempre ter

Que equipamento que você para fotografar? MARINA BENZAQUEM Eu uso filme em algumas ocasiões. A câmera que eu uso é uma Canon T5, bem simples, o que não é considerada tão profissional pra um fotógrafo. Descobri até que é a câmera da Blue Ivy! (Risos). E eu não edito minhas fotos, o que mais mexo é na luz mesmo ou a coloco em preto e branco, mas editar não edito nada, são cruas, acho que tem muito a ver com a característica da minha geração também. O que outras gerações consideram polêmico ou ruim, pra mim é natural e bonito. Acho que as fotos transmitem essa mensagem de uma nova geração.

Ensaio feito por Marina

E para você, o que considera como mais importante? MARINA BENZAQUEM Acredito que, mais do que técnica e olhar, o mais importante é um conteúdo sensorial. A qualidade é boa para uma impressão, mas o que fica é o sentimento e a mensagem. Quanto mais conteúdo relevante você acumular, melhor. Hoje é muito fácil pegar inspiração de outras pessoas, mas pra quem trabalha com imagem a melhor forma é ter referências textuais e sonoras. Tudo se complementa no final das contas: a moda se encontra com a arte, que se encontra com a natureza, há um ponto de interseção entre tudo no mundo, basta você criar o seu próprio espaço e não olhar pro dos outros.

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SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA VAI HOMENAGEAR A VEREADORA ASSASSINADA por_Mariana

Pepe

A Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro vai homenagear a vereadora assassinada Marielle Franco. Ela foi vítima de execução, no bairro do Estácio, no centro do Rio, junto com o motorista Anderson Gomes, que dirigia o carro, que levava a parlamentar para casa, na Tijuca.

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QUARTEIRÃO CULTURAL MARIELLE FRANCO

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Marielle se formou na PUC-Rio, fez mestrado em Administração Pública pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Sua dissertação teve como tema: “UPP: a redução da favela a três letras”. Iniciou sua militância em direitos humanos após ingressar no pré-vestibular comunitário e perder uma amiga, vítima de bala perdida, num tiroteio entre policiais e traficantes no Complexo da Maré. Aos 19 anos, se tornou mãe de uma menina. Isso a incentivou a lutar pelos direitos das mulheres e debater esse tema nas favelas. É devido a essa trajetória impressionante e a tragédia que ocorreu, que o primeiro Quarteirão Cultural da cidade, na região central, será batizado com o nome da parlamentar. Outras áreas também serão beneficiadas, como o Ponto Chic, em Padre Miguel, a Pedra do Sal, na zona portuária, a Praça Tiradentes, no Centro e o Aterro do Flamengo. A placa de inauguração foi instalada na esquina das ruas Álvaro Alvim e Alcindo Guanabara, na lateral da Câmara de Vereadores da Cidade do Rio, onde Marielle exercia seu primeiro mandato. A criação da área foi instituída por decreto do prefeito Marcelo Crivella. O espaço dispensa a necessidade de alvará provisório, cria horários especiais de funcionamento e permite a ocupação das ruas e calçadas com mesas e cadeiras. O perímetro foi definido para facilitar a vida de produtores culturais e comerciantes destas regiões.

2. ATIVIDADES CULTURAIS DESBUROCRATIZADAS

O Quarteirão Cultural tem como meta desburocratizar a realização de atividades culturais e artísticas em ruas localizadas em reconhecidos polos de cultura, gastronomia e lazer do Rio. O funcionamento do Quarteirão Cultural será de quinta a domingo e nos feriados. Os horários são: às quintas, de 18h às 22h; sextas, sábados e véspera de feriado, de 18h às 3h do dia seguinte; domingos e feriados, de 12h às 22h. Nestes horários, será proibido o estacionamento de veículos ao longo da rua Álvaro Alvim e Alcindo Guanabara. De acordo com a secretária municipal de cultura, Nilcemar Nogueira, “as ruas do Rio de Janeiro têm uma vocação cultural e artística forte e consideramos prioritário estimular a ocupação dos espaços públicos pelas diversas linguagens artísticas. Os Quarteirões Culturais surgem com estes objetivos: promover cultura e lazer nas ruas e praças e incrementar a atividade econômica, seja dos produtores culturais, seja do comércio local”.

as ruas do Rio têm uma vocação cultural e artística forte e consideramos prioritário estimular a ocupação dos espaços públicos pelas diversas linguagens artísticas [...]

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Ilustração feita pelo Google como forma de homenagem

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por_Equipe

para apresentar o projeto. A expo Favelagrafia nasceu na hora. A mostra ficou em cartaz entre novembro e dezembro de 2016 e chamou atenção da mídia internacional, inclusive de nomes de peso como a rede norte-americana CNN, que fez reportagem exclusiva. Os mais de duzentos livros produzidos foram vendidos. Nas mídias sociais, celebridades como a cantora Maria Rita e o rapper Swizz Beats, marido de Alicia Keys, compartilharam as fotos postadas. A mais famosa delas, “Alguns lutam com outras armas”, do fotógrafo Anderson Valentim, do Morro do Borel, em que cinco meninos aparecem com os rostos encobertos por camisetas e instrumentos musicais nas mãos, obteve mais de 5 mil curtidas no Instagram. Com o projeto, a relação do grupo e dos moradores com as próprias comunidades mudou. “As fotos ajudaram os moradores a enxergar beleza nas suas comunidades e querer valorizar o que elas têm de bom”, conta Elana Paulino, 34 anos, uma das fotógrafas do projeto, moradora do Morro Dona Marta. O Projeto Favelagrafia está trazendo um novo olhar para as favelas cariocas. Uma nova perspectiva. Aqui, as favelas são mostradas de forma verdadeira, por quem mais entende delas: seus moradores. Nove fotógrafos, cheios de talentos e sonhos.

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FAVELA GRAFIA + RESERVA Reserva

“O Favelagrafia nasceu de uma vontade de mostrar o lado das comunidades ligado a ideias, arte e produção intelectual, pouco explorado pela mídia”, conta Karina Abicali, idealizadora do projeto ao lado de Andre Havt, ambos da NBS Rio + Rio*. “E isso só poderia ser feito através do olhar de quem vive lá. Somente os moradores poderiam capturar o cotidiano de cada uma delas, com verdade e coração”. Segundo pesquisa do Instituto Pereira Passos (IPP), mais de 20% da população da cidade do Rio de Janeiro mora em favelas. São mais de 2 milhões de pessoas. Sendo que quase 80% da população da cidade sequer conhecem alguém ou estiveram em alguma delas; têm um olhar equivocado sobre a rotina, os valores e sonhos da maioria dos moradores, que não condizem com a violência amplamente divulgada. Karina conta que a escolha das comunidades e dos participantes do projeto foi cuidadosa. As nove comunidades ficam em regiões distintas do Rio – Complexo do Alemão, Morro da Babilônia, Morro do Borel, Cantagalo, Morro da Mineira, Morro dos Prazeres, Morro da Providência, Rocinha e Morro Santa Marta. Os fotógrafos nasceram e moram em alguma delas. Eles foram selecionados através do facebook, depois de produzir uma foto da comunidade e um breve texto contando porque gostariam de fotografá-la. Em um mês de trabalho, no início de 2016, foram produzidas mais de 2 mil fotos. Transformá-las em um livro era o objetivo. Montar uma exposição, um sonho. Foi aí que, com cerca de 200 imagens escolhidas, André bateu à porta do MAM-RJ

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Camiseta Reserva assinada por jovens do projeto.

CAMISETAS EM PARCERIA Projeto: Favelagrafia e Loja Reserva Divulgação: Jovens das comunidades do Rio de Janeiro Conscientização: Comunidade sem violência Acompanhe: www.usereserva.com/favelagrafia

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PROJETO SUBÚRBIO CARIOCA por_Marina

os afrodescendentes eram representados em três épocas: período escravocrata, pós-abolição e na atualidade. A parte prática foi um convite a identificar as africanidades no contexto do subúrbio. Pela primeira vez, o projeto foi finalizado com uma exposição dentro da escola, chamada de Afroaceito, graças a uma parceria com a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) que possibilitou a impressão das imagens em papel fotográfico. “Nunca tinha feito um trabalho assim. Estudei em escolas que não tinham aula de Artes ou quando havia era uma coisa muito expositiva. O professor mostrava uma obra famosa e pedia para a gente fazer algo parecido”, conta a aluna Natasha Virgínia dos Santos Brandão, de 17 anos, que escolheu fotografar no Mercadão de Madureira, comércio tradicional do subúrbio carioca, onde é possível encontrar diversos artigos de religiões afro-brasileiras. Alan Luís de Oliveira, de 17 anos, fez da proposta da professora um “desafio pessoal”. Queria conhecer pessoas novas, conversar com elas, retratá-las. Na exposição, expôs a foto de um músico negro e de um xequerê.

Morena Costa Morena Costa

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Usar a fotografia como ferramenta de percepção do entorno da comunidade escolar e estímulo ao olhar dos alunos é o projeto pedagógico desenvolvido pela professora de artes visuais Aparecida Silva há mais de 10 anos no subúrbio do Rio de Janeiro. No trabalho realizado com os alunos, ela faz um convite à valorização dos detalhes do cotidiano, levando-os a refletir sobre sua identidade wcultural. “A fotografia é uma aliada para a ampliação do olhar, principalmente do universo do bairro, que é muito importante. Valorizar o local onde o aluno está inserido, onde ele mora ou trabalha, para ele conhecer e se reconhecer nesse espaço”, afirma. O projeto leva o nome de “Fragmentos do Subúrbio Carioca: Quintino e Adjacência” e revela, através do olhar dos jovens um Rio de Janeiro que não se vê no cartão postal, tão belo quanto. A cada ano, Cida (como é chamada) trabalha com os alunos de uma forma diferente. A professora já realizou uma caminhada fotográfica com os alunos do Colégio Estadual Professor Sousa da Silveira de Quintino Bocaiúva, onde fica a escola, até o bairro vizinho Cascadura, já levou os estudantes para visitar uma exposição fotográfica no centro de cidade e neste ano trabalhou a temática étnico-racial em ensaios fotográficos que eles escolheram a locação. Os alunos tiveram aulas teóricas sobre fotografia, técnicas de enquadramento, luz, contraste, e estudaram sobre como

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Ensaio feito por Marina

SE DESTACA ATRAVÉS DA FOTOGRAFIA Artista: Marina Morena Costa 35 anos Rio De Janeiro Acesse o trabalho dela: marinamorenacosta.wordpress.com

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“Escolhi esse instrumento, porque ele é usado na capoeira, que é uma coisa muito íntima para mim, porque vem dos meus ancestrais e porque eu praticava quando criança.” A turma do 2º ano do ensino médio noturno do Sousa da Silveira tem aulas de Artes somente às sextas-feiras. Concorrer com o cansaço dos alunos, somado ao desejo de se divertir na sexta-feira à noite, é um desafio a mais para a professora Cida. “Muitos trabalham a semana inteira, acordam cedo e têm o hábito de achar que sexta-feira não é dia de escola, é um dia do lazer. Eles vêm, com aquela vontade de já ir embora”, relata. Para a aluna Daudivânia Menezes Gonçalves, de 17 anos, a exposição foi um estímulo importante para ir à escola. Ela conta que já tinha já tinha passado na disciplina e poderia faltar alguns dias, mas depois que soube da exposição das fotos, passou a frequentar todas as aulas e até a chegar mais cedo para tirar dúvidas com a professora. Daudivânia lembra que suas primeiras fotos, feitas em aula, saíram ruins, mal enquadradas. “Sempre aparecia alguém no fundo das minhas fotos, ou um caderno, uma mochila. Tive dificuldades para aprender a enquadrar, mas agora eu sei.” Ela também escolheu o Mercadão de Madureira e teve cinco fotos selecionadas para a exposição. Expor os trabalhos para os colegas e para os pais foi muito significativo para os estudantes. “Eles estavam eufóricos com a exposição. Eles veem as fotografias, como se fossem parte deles. É a primeira vez que o trabalho engloba a escola. No ano que vem, eu posso trabalhar com mais tranquilidade, porque eles viram o produto final. Fazer um slide e apresentar para a classe é uma coisa, mas fazer uma exposição e eles participarem, circularem entre as imagens, conversarem com os colegas sobre as fotos, é outra visão”, define Cida. Formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Cida realizou o Curso de Extensão em História e Cultura Negra do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da Uerj e apresentou na conclusão um plano de aula de Fotografia e Educação, inspirado no projeto pedagógico “Fragmentos do Subúrbio Carioca”.

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LOCALIZA AÍ LOCALIZ LIZA AÍ LOCALIZA AÍ L A AÍ LOCALIZA AÍ LOC A fim de nossos leitores fluirem das páginas para as ruas, a Flumen apresenta o seu próprio mapa de dicas e localizações para você curtir no dia a dia. Desde lojas de parceiros nossos, até coletivos e centro comunitários, este mapa contém as melhores seleções de rolês que você pode encontrar. Selecionados exclusivamente para esta edição, fique de olho em nossas redes sociais para saber das programações desses locais tão queridos!

LEVE-O CONTIGO PARA SUAS NOVAS DESCOBERTAS. Conecte-se com a Flumen: @revistaflumen facebook.com/revistaflumen

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AUTOR É APOSTA INTERNACIONAL DA COMPANHIA DAS LETRAS COM DIREITOS VENDIDOS EM 9 PAÍSES por_

Luiza Caligar

O Sol na Cabeça é um livro que fala a respeito das favelas no Rio de Janeiro, mas que ultrapassa as fronteiras físicas e sociais para falar sobre essa forma singular de humanidade que transita pela capital carioca em seus diversos espectros. O livro (Cia. das Letras, 120 páginas, R$ 34,90) reúne 13 contos que foram elogiados pelo compositor Chico Buarque, pelo colunista Antonio Prata e pelo cineasta João Moreira Salles.

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DA PERIFERIA À 9 PAÍSES: O SOL NA CABEÇA

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_sense O escritor Geovani Martins nasceu em Bangu, morou na Rocinha e no Vidigal. Tem apenas 26 anos, e seu primeiro livro teve os direitos vendidos para nove países diferentes em tempo recorde para a editora, a respeitada Companhia das Letras. A temática dos contos passeia por todo o Rio de Janeiro, mas especialmente pelas favelas, dando voz ora a um menino fascinado por uma borboleta, ora a um cego que pede esmolas no transporte público, passando por estudantes universitários, crianças do morro e traficantes. Em entrevista, Geovani Martins fala sobre a abrangência do realismo de seus contos, suas principais influências literárias e conta dos planos para o futuro. Como começou a escrever? GEOVANI MARTINS Eu sempre li muito, e à medida que fui crescendo eu fui me interessando cada vez mais. Acho que comecei a escrever com 9, 10 anos, alguns versos, coisas mais soltas, músicas. Quando entrei na fase da adolescencia comecei a ler mais literatura nacional, e aí comecei a escrever com regularidade. Então foi uma coisa que aconteceu naturalmente, e eu acho que sempre tive o hábito de escrever para poder fotografar os momentos, tentar eternizar memórias importantes. Pra mim sempre foi muito de necessidade, antes de pensar em ganhar dinheiro com isso eu já escrevia uma quantidade considerável. E aí com a resposta do público às coisas que eu publicava na internet, fui ganhando confiança do público com o passar do tempo. A partir da Flup [Festa Literária das Periferias], quando eu apresentei meus contos, eu passei a considerar essa ideia de viver do que eu escrevia. Você considera seus contos realistas? GEOVANI MARTINS É um realismo imaginativo, que se permite trafegar entre outros limites do fantástico, do absurdo. A vida, ela é assim, tem coisas que acontecem que são tão inacreditáveis que só podiam ser verdade. Meus personagens são todos baseados em pessoas reais, não em uma pessoa, mas várias. Não tem como você se inspirar em pessoas e não ir pra um lugar mágico. Eu acho que eu faço um realismo, que é o lugar de onde eu vejo essas cenas, e acho que está mais próximo do realismo do que outros estilos, mas não é só isso.

A vida, ela é assim, tem coisas que acontecem que são tão inacreditáveis que só podiam ser verdade [...]

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Geovani Martins em uma favela no Rio de Janeiro lendo seu livro

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Quem são seus autores preferidos? GEOVANI MARTINS Meu autor preferido é o Machado de Assis, mas também gosto muito do Jorge Amado. Com o Cortázar, aprendi muito sobre conto; Gabriel García Marquez, Graciliano Ramos, e os músicos, sou muito influenciado pelo Chico Buarque, Caetano Veloso, Racionais, Gilberto Gil, Jorge Ben Jor. São letristas que me dão ideias. Alguma coisa já mudou com a notoriedade do lançamento do livro? GEOVANI MARTINS A minha vida inteira mudou. Eu me mudei no começo do ano, agora moro numa casa que meu quarto é maior do que a minha outra casa. Na rotina de entrevista, de televisão, pessoas falando comigo dentro da livraria. É difícil dizer, porque foi uma mudança muito grande. Eu meio que já esperava alguma mudança mas não tanto, não imaginava que o livro pudesse ter uma repercussão tão grande. Quando eu comecei a escrever eu estava desempregado, minha mãe e minha namorada me apoiaram e aí a decisão foi não procurar outro trabalho. Quando eu comecei a escrever eu estava desempregado, minha

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A intenção era fazer denúncia social? GEOVANI MARTINS A crítica social acompanha as situações. Eu queria contar essas histórias, e determinadas histórias eu não poderia contar sem falar da polícia; e aí eu tento retratar da maneira como eu vi a polícia até hoje, como ouvi até hoje. Mas são coisas que andam em paralelo com as histórias, não tinha como descolar. Eu não quis me prender nisso, eu queria que as histórias fossem para outros lugares, e a crítica viria naturalmente; foi o que acabou acontecendo.

Capa do livro O Sol na Cabeça

Qual dos contos é o seu preferido? GEOVANI MARTINS Eu não tenho um preferido não, mas o que eu mais gostei de escrever, me diverti, me emocionei, o que mexe comigo até hoje é o Roleta Russa [que conta a história de um garoto fascinado pela arma do pai].

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Você pretende publicar um romance depois? É sobre as UPPs no Rio? GEOVANI MARTINS Comecei a escrever no final do ano passado, é uma história que já vinha me acompanhando há algum tempo. É um movimento natural da minha história na literatura de buscar fazer o que eu ainda não sei, e todas essas fases e experiências que eu estou passando. Me inscrevi em contos na Flup [Festa Literária das Periferias], eu já fazia crônicas mas queria fazer algo que eu não dominasse, que eram os contos. E agora que eu terminei esse livro eu tô muito mais próximo de fazer um romance do que outro livro de contos. É uma história que se passa entre 2011 e 2013, ambientada na Rocinha mas circulando pela cidade, que nem O Sol na Cabeça, e pretendo entregá-lo para a editora em 2020. Não é sobre as UPPs. Ele se passa no período da instalação das UPPs, mas é mais uma desculpa pra eu poder ter um recorte daquele tempo e traçar a história daquele período; é uma das coisas que estão ali, mas não o suficiente pra dizer que o livro é sobre isso.

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O JUSTO É O NOVO PRETO

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A MALHA, NO RIO, SURGE COMO UMA ALTERNATIVA DE FUTURO PARA A MODA por_

Karla Monteiro Bessler

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Chove a cântaros, os termômetros marcam um frio glacial para os cariocas. Em São Cristóvão, zona norte do Rio de Janeiro, bairro que tradicionalmente abriga fábricas de grandes grifes locais, o tempo ferve, pelo menos dentro de um galpão de 2.500 m2 da rua General Bruce. Ali, dúzias de operários trabalham em ritmo frenético para deixar nos trinques o espaço que abrigará a plataforma Malha. Menos de dois meses depois, tudo pronto: será inaugurado oficialmente esta semana o novo endereço fashion do Rio. Malha, aliás, é o nome escolhido para traduzir essa teia, um lugar onde os fios que tecem a indústria da moda serão (re)costurados para criar um novo paradigma de produção e consumo.


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O coworking é uma nova perspectiva e uma nova forma de trabalhar. Ele se organiza dentro de um espaço de criação coletiva, o que permite uma troca constante entre os residentes do local além da colaboração e a coexistência de diferentes idéias e projetos em um mesmo espaço. “O ecossistema da moda está construído sobre conceitos como commodities, competição, tendência, sazonalidade, moda descartável e etc. Grande parte do ecossistema ignora noções de sustentabilidade social e ambiental e a importância da colaboração”, diz Herman Bessler, ceo do Templo e sócio-fundador da Malha, ao lado de André Carvalhal, professor de moda que foi gerente de marketing e conteúdo da Farm por quase dez anos (e deixou o emprego para empreender com Herman). Herman fala mais sobre a tônica do novo empreendimento: “Acreditamos em comércio justo, sustentabilidade ambiental e social, produção local independente, revolução tecnológica, com investimento em tecidos biológicos, uso de matéria-prima certificada. Queremos construir uma possibilidade para a moda do futuro”. A empreitada é ambiciosa. A Malha é um clube de fazedores de moda, abrigando sob o mesmo teto toda a cadeia produtiva: criadores, empreendedores, produtores, fornecedores e consumidores. Para juntar esse ecossistema sob o mesmo teto, provém os meios de produção, estimulando a troca e a criação de conhecimento. Ao mesmo tempo, é um espaço de coworking e de cosewing (fábrica compartilhada), uma comunidade, uma escola e um laboratório de experimentação. A ideia é propiciar a convivência para que marcas grandes revejam a sua forma de estar no mercado e que marcas pequenas se beneficiem da estrutura de rede, com acesso a tecnologias como impressoras 3D, costureiras, modelistas, estúdio fotográfico.

UM MERCADO QUE SE QUESTIONA

A previsão é que 500 pessoas circulem diariamente pelo imenso galpão, que está sendo repartido por 42 contêineres marítimos reaproveitados para virar escritórios – ou desks, na linguagem desse mundo compartilhado. O projeto arquitetônico, assinado por Tavares Duayer, enche os olhos. Mistura a dureza concreta das fábricas com paisagismo ar-

Vivemos um mundo com os novos formatos e as novas possibilidades, no qual a maneira de criar perdeu o sentido. A proposta da Malha é reinventar o ciclo, de criar mais [...] [...]

Espaço interno da decoração do galpão

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_sense rojado. Antes mesmo de abrir ao público, o galpão serviu de cenário para um editorial de moda da mig, uma marca de upcycling de jeans (que reutiliza tecido descartado), com produção local e independente e política de descarte zero. No primeiro andar, showroom, área de convivência, desks fixos, estúdio fotográfico e um restaurante café. No segundo andar, fashion lab, salas de reunião, escola e mais desks. O espaço pode abrigar 250 pessoas residentes, além de lojas pop-up e showroom. Segundo os sócios, a Malha já nasce com título: a maior plataforma de moda da América Latina. Nos Estados Unidos, existe a Manufacture New York, no bairro do Brooklyn, que segue a mesma cartilha. As marcas pagam mensalmente para usar o galpão de São Cristóvão. Há três formas de fazer parte: o residente flex, o residente fixo e aqueles que participam apenas do chamado Clube Malha. O flex paga 650 reais por mês e tem direito a um desk flutuante (ou seja, que pode ser ocupado conforme a ordem de chegada a cada dia), com todas as contas inclusas e acesso aos serviços, como o estúdio fotográfico e o cosewing. O custo de um residente fixo é de 3.500 reais por mês e dá direito a seis desks fixos (podem ser customizados, pois o uso é exclusivo), espaço para armazenamento e arara. Para quem não tem uma marca mas também respira este mundo, há o Clube Malha, que custa a partir de 90 reais por pessoa, por mês, e dá acesso aos eventos que terão lugar no espaço. O Bureau de Estilo Renata Abranchs é cofundador e embaixador da Malha. O Re-Roupa é um projeto de transformação de peças também parceiro da Malha. Entre os residentes da Malha estão a Bossa Social (que doa uma peça de roupa a cada vendida), a Lavra Store, a Pano, a Joialerismo, a startup AColetiva (que abriga quatro marcas), entre outros. O espaço consegue abrigar 60 deles. É bastante gente junto.

Espaço interno da Malha

Um dos diferenciais do projeto Malha é a infraestrutura. O local na Rua General Bruce 274 abriga 30 marcas residentes em contêineres e outros 46 residentes flex, marcas ou profissionais flutuantes no salão de coworking escolhidos num processo de “curadoria mútua”: após o residente entrar em contato com a Malha, sua ideia de negócio é avaliada pela equipe para saber se o negócio oferecido é compatível aos valores do projeto. O maquinário de costura, por exemplo, é o de uma fábrica completa, com mais de 200 metros quadrados ocupados pelo cosewing. O investimento total no galpão gira em torno de 2 milhões de reais, sendo que a maior parte do dinheiro veio de patrocinadores. A lista de parceiros inclui a Farm, as Sandálias Ipanema, o ied Rio e a Babilônia Feira Hype. A Farm não terá o seu escritório no galpão de São Cristóvão, mas já prevê a realização de vários eventos em parceria. A Foxton (também do grupo Farm) terá uma loja pop-up no espaço. O tamanho da Malha também a torna local perfeito para sediar eventos e desfiles, o que não deve demorar a acontecer, movimentando a agenda do bairro imperial, também já conhecido como polo da moda carioca. E como o homem não vive só de moda, um restaurante, o Verdin, está em construção e será inaugurado em setembro. Em 15 meses, ideias de utópicas tardes de sábado levantaram-se da mesa, transformaram-se no projeto Malha, e partiram para o trabalho. Nem a chuva fina que cai sobre o Rio numa quarta-feira cinzenta, desmorona ânimos: “Envolvendo toda a galera, extraímos essência e não tendência."

Detalhe nas decorações do galpão chama atenção

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É PAU, É PEDRA! por_Nara

Montenegro Colagens

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“Porque as circunstâncias assim exigem”, disse aquele lá. As mesmas que ao invés de terem sido lapidadas anteriormente, foram deixadas de lado e, agora cabe a nós lidarmos com os resultados desse ato. E aconteceu mais rápido que o esperávamos. O sangue de março fechou o verão, inundando o Brasil com indignação e medo. A noite do dia 14 foi marcada por uma chuva violenta de nove disparos e duas mortes. Uma destas, Marielle, critica assídua da intervenção da polícia militar e contra o encarceramento em massa de jovens negros, recebendo a morte como resultado de sua luta. Diferente do esperado, houve reação popular. O país, antes polarizado, uniu-se na indignação do ato. Como se cala a voz de uma mulher, negra, homossexual, defensora dos direitos humanos, política e organizadora de coletivos sociais? Não há meios de digerir tamanha injustiça. Sua morte, elemento de uma catarse coletiva, demonstra a inquietude (antes somente das minorias) de todo um povo exausto de iniquidades. Nas pesquisas sobre a votação presidencial deste ano, as intenções de voto nulo e branco ocupam o segundo lugar, apontando uma resposta caótica ao já permanente caos na sociedade nacional. Está presente na saúde pública, no sistema carcerário e inclusive nas militâncias. As minorias fortalecem-se gradualmente utilizando-se de campos midiáticos para a sua expressão. O assassinato de Marielle simbolizou uma mobilização social que atingiu tanto a esquerda quanto a direita, independentemente de ideologias, num momento em que o cenário político está fragmentado, e isso por si só consolida um marco. As águas de março fecharam o verão. Uma população revoltada e uma intervenção militar no Rio iniciam um embate social durante o outono. O inverno está a caminho, e historicamente falando, não se ataca um povo no inverno.

“Tribunal de Rua” (2018) Colagem manual digitalizada

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ROSA É A COR MAIS QUENTE por_Felipe

Rosa Colagens

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“Femme Secretes” (2018) Colagem manual digitaliza

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Nós, do mundo de cá, florescemos em suas paredes, suas lamúrias, seus ouvidos. Nossos espinhos perfuram seu concreto, tão duramente imposto àquelas que procuraram além de seus domínios. Nós, filhas da natureza, erradicamos seus limites, crescendo acima de qualquer imposição que nos faça estagnar. Não nos intimida sua obsessão ao arcaico, não nos interessam seus valores obsoletos. Temer? Jamais! Temem vocês que sentem sua força diminuindo sob nossos jovens e resistentes caules. Nossa arte é o alimento de agora e do futuro, e não nos cortem e tirem nossa seiva. Onde morre uma rosa, nascem centenas de brotos. Surgem novas cores, novas flores. Somos agora a(Marielle)s, somos roxas, somos brancas, somos paz. Nosso pólen é o glitter do Carnaval, nosso sol é o amor do próximo, nossa água é o suor que vem do nosso trabalho. Mas não somos azuis! Não somos artificiais, não somos o seu descanso e seu requinte. Não somos frias, não somos austeras. Não somos a cor do seu partido, muito menos de seus homens. O terreno que criaram mantém-se infértil, e não há mão sua que queira salvá-lo. Suas sujas mãos, seu martelo, suas folhas falsas copiosamente tentam moldar-se em uma árvore para que queiramos ser vocês, crescer como vocês. Seus troncos podres, no entanto, não se desenvolvem mais. Suas raízes cederam, e nós tomamos conta do seu cemitério e o transformamos em um digno jardim. E caso não entendam quem somos nós, deixamos explícito: somos elas, as artistas, as mulheres, as bichas, as minorias, as bruxas. Somos a oposição a vocês, ó nada excelentíssimos patronos do arcaico. Se lhes interessa a dor, somos a cura. Se lhes interessa o medo, somos o colo que protege. Se lhes interessa destruir, somos o recomeço. “Podem me prender, podem me bater, podem até deixar-me sem comer, que eu não mudo de opinião”, cantou Nara Leão. Mas não somos excludentes, assim como vocês. Abraçamos até mesmo as almas perdidas e damos vida a elas. Amamos até aqueles que nada amam, porque sabemos o que é viver em um mundo em que amar quem amamos é pecado. A grande ópera Carmen já soava, “se você não me ama, eu te amo. E se eu te amo... se prepare”. E para que entendam a que viemos, pixamos em seus muros cinzas: A REVOLUÇÃO É ROSA.

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