Contos Iluminados contados por Sri Swami Satchidananda

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Contos Iluminados Como dito por Sri Swami Satchidananda



Contos Iluminados



Contos Iluminados Como dito por Sri Swami Satchidananda

Editado por Swami Karunananda Ilustrado por Uma Schreiber com um prefรกcio de Carole King

Buckingham, Virginia


Dados de catalogação na publicação da Biblioteca do Congresso Satchidananda, Swami. Contos Iluminados contados por Sri Swami Satchidananda / editado por Swami Karunananda; ilustrado por Uma Schreiber; com um prefácio de Carole King. 1. Vida Religiosa - Hinduísmo. Copyright © 1996 por Satchidananda Ashram-Yogaville Todos os direitos reservados, incluindo o direito de reproduzir este livro ou partes dele sob qualquer forma. Primeira edição publicada em 1996.

Integral Yoga® Publications

Satchidananda Ashram–Yogaville, Inc., Buckingham, Virginia 23921 www.integralyoga.org


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Para todos os que se questionam, buscam e amam uma boa história— Que possas encontrar a Fonte de todas as maravilhas e sejas preenchido com Amor e Luz.


Tabela de conteúdo Lista de Ilustrações.......................................................................................... x

Agradecimentos ............................................................................................. xi Prefácio..........................................................................................................xii

Prefácio do Editor........................................................................................xiii

Introdução.................................................................................................... xvi A Chave para a Luz.........................................................................................1 Tudo para o Bem.............................................................................................5 Nunca Desistas!...............................................................................................9

O Escultor e o seu Filho................................................................................10 Uma Gota de Mel.........................................................................................13

Duas Pedras...................................................................................................16 O Swami e a Vaca..........................................................................................18 Uma Mentira Perfeita....................................................................................21 Como Construir um Templo.........................................................................22

A Macieira.....................................................................................................24 Assim pensas, Assim Te Tornas.....................................................................25 O Rei Pedinte................................................................................................28 O Carniceiro e o Yogi....................................................................................31 O Santo e o Escorpião...................................................................................34

O Homem Que Venceu a Zanga...................................................................36 O Convidado do Casamento.........................................................................37 O Santo de Imitação.....................................................................................38 O Mangusto Dourado...................................................................................42 O Demónio Que se Transformou Em Cinzas...............................................44 A Leiteira......................................................................................................46 O Rapaz Que Fez Deus Comer o seu Pudim................................................49 Tu És Aquilo Que Comes ............................................................................52


Como Parar Um Elefante .............................................................................54

O Leiteiro Ganancioso .................................................................................57

Podem Ter Tudo ...........................................................................................58

A Conferência Sobre a Luz ..........................................................................59 Os Dois Barqueiros ......................................................................................61

Uma Pedra Para Deus ..................................................................................63

A Raposa e O Piolho ....................................................................................65 O Leão e a Ovelha .......................................................................................66

O Demónio e o Cabelo Encaracolado...........................................................68

O Poder de Maya .........................................................................................71

Uma Verdadeira Entrega ..............................................................................74 O Puzzle .......................................................................................................77

O Mundo É A Tua Projecção .......................................................................79 Deus ou Cão? ...............................................................................................80

Quando Verás Tu Deus? ...............................................................................83

A Iluminação do Rei Janaka..........................................................................84 Quem Sou Eu?..............................................................................................89

Deixa o Sol Brilhar Cá Dentro .....................................................................91

O Karma do Homem Pobre .........................................................................92 A Peregrinação..............................................................................................95 O Horóscopo.................................................................................................98

Levando um Burro para o Mercado .............................................................99

O Segredo da Felicidade .............................................................................102 O Homem Que Não Fazia Nada ...............................................................104

A Última Palha............................................................................................106

Glossário ......................................................................................................108 Sobre o Autor...............................................................................................110


Lista de Ilustrações 1. Tudo para o Bem.......................................................................................7 2. Uma Gota de Mel....................................................................................15 3. Uma Mentira Perfeita .............................................................................20 4. Assim pensas, Assim Te Tornas ..............................................................26 5. O Santo e o Escorpião ............................................................................35 6. O Santo de Imitação ...............................................................................40 7. A Leiteira................................................................................................47 8. Como Parar Um Elefante .......................................................................55 9. Os Dois Barqueiros .................................................................................62 10. O Demónio e o Cabelo Encaracolado ....................................................69 11. Uma Verdadeira Entrega ........................................................................75 12. Deus ou Cão? ..........................................................................................81 13. A Iluminação do Rei Janaka ...................................................................86 14. O Karma do Homem Pobre ...................................................................93 15. Levando um Burro para o Mercado ........................................................99

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Agradecimentos A Integral Yoga® Publications tem o prazer de apresentar este volume de quarenta e sete Contos Iluminados contados por Sri Swami Satchidananda em homenagem ao quadragésimo sétimo aniversário da iniciação de Sri Swamiji na Sagrada Ordem de Sannyas. A publicação deste livro foi possível graças ao serviço dedicado e ao apoio sincero das seguintes pessoas: Swami Sharadananda e Kumari de Sachy, Ed.D. pela assistência editorial; Uma Schreiber pelas lindas ilustrações;

Hari Barker, da Integral Yoga® Publications, pela supervisão na produção do livro; Ganesh MacIsaac pela sua orientação no design e produção;

Gurudas Natarajan por ajudar a preparar o manuscrito para publicação;

Swami Sarvaananda por ajudar a facilitar a preparação final do manuscrito;

Palace Press International para o layout e design, incluindo as letras iluminadas no início de cada história; Abhaya Thiele pela assistência na digitação;

Ramani e Swami Gangeshwarananda pela revisão;

Swami Hamsananda por transcrever e indexar as palestras de Sri Swamiji;

e todas as almas dedicadas que registaram e preservaram estes ensinamentos ao longo dos anos. Agradecemos a todos pelo serviço nobre e amoroso. Que Deus os abençoe com toda saúde, felicidade, paz e prosperidade.

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Prefácio Sri Swami Satchidananda chegou à América numa época em que as pessoas estavam a começar a procurar mais consciência espiritual do que aquela que a sociedade ocidental parecia oferecer. Em 1969, no ano original de Woodstock, eu estava à procura de um método de exercício físico. Eu poderia ter participado numa aula de dança mas, em vez disso, encontrei uma aula de Hatha Yoga oferecida no Instituto de Yoga Integral. Com o tempo, tornei-me professor de Hatha Yoga, comecei a explorar outros ramos do Yoga no Instituto e, ao fazer isso, iniciei uma amizade de longa data com Sri Swami Satchidananda. “Swamiji”, como sempre pensei nele, é um professor genuinamente talentoso. Ele ensina pelo exemplo, praticando o que ensina. Lembro-me dos primeiros satsangs em que participei e que ele conduziu. A presença silenciosa daquele homem alto de cabelos compridos e barba esvoaçante, vestido de laranja, aproximou-nos todos uns dos outros. Durante os nossos períodos de discussão, as suas respostas a perguntas complicadas eram tão simples que nos faziam perguntar: “Como é que eu não sabia disso?” A sua resposta era: “Tu sabias”.

A simplicidade da filosofia de Swamiji, baseada na ciência do Yoga, continua a iluminar milhões em todo o mundo. Tornar-se um octogenário não parece tê-lo abrandado. Esta coleção de Contos Iluminados de Swamiji foi criada para crianças, incluindo aquelas que residem em corpos adultos. Se você não está em busca da iluminação, não se preocupe - as histórias vão entretê-lo e o meu palpite é que a iluminação irá encontrá-lo de qualquer maneira. As histórias são derivadas da herança cultural da Índia, mas cada uma tem uma lição que é universalmente verdadeira qualquer que seja a sua origem religiosa ou cultural. Que possas encontrar paz, alegria e conforto interior. —Carole King xii


Prefácio do Editor Era uma vez, numa terra distante do outro lado do mar, um homem incomum. Ele parecia bastante normal no início e ninguém suspeitava das grandes aventuras e desafios que o aguardavam. Embora parecesse bastante comum por fora, lá dentro ele tinha uma ideia extraordinária.

Ele ouvira falar de um reino misterioso e oculto que continha os maiores tesouros, para além de qualquer coisa que alguém pudesse imaginar. Ele também ouvira dizer que quem ía ao reino experimentava tanta felicidade e alegria que nunca mais voltavam a ser os mesmos. Ele decidiu encontrar esse lugar a qualquer custo e a sua busca iniciou. Com o passar dos anos, ele haveria de matar muitos demónios, conquistar os maiores inimigos e, num dia glorioso, descobrir esse reino transcendental de paz e bem-aventurança.

Foi tão maravilhoso; superou tudo o que já tinha ouvido falar. O homem pensou: “Todo mundo deveria saber sobre este lugar. É tão fantástico. Eu gostaria que todos pudessem experimentar a paz e a alegria que estou sentindo.” Quando voltou para casa, todos sentiram uma grande mudança nele. Ele estava sempre feliz. Nada que acontecesse jamais o entristecia ou assustava. Ele nunca se preocupava com nada e apenas parecia surfar sobre as ondas da vida que sobrecarregavam todos os outros. E ele parecia ter um brilho dourado especial e um brilho nos olhos que eram tão agradáveis. Então as pessoas começaram a procurá-lo - principalmente por se sentirem bem perto dele. De alguma forma, os seus fardos pareciam mais leves na sua presença e o que parecia ser um problema insuperável era facilmente resolvido. A notícia espalhou-se e cada vez mais pessoas vinham ao seu encontro. Um dia, um viajante veio ver o homem e contou-lhe sobre uma terra distante de grande prosperidade e promessa que estava caindo no caos e na confusão. Muitos dos habitantes de lá, especialmente os mais jovens, estavam desesperadamente procurando uma saída para toda a agitação e desespero. xiii


O viajante disse ao homem: “Você deveria ir até lá; Eu organizarei tudo.”

E foi assim que, a 31 de Julho de 1966, Sua Santidade Sri Swami Satchidananda chegou à cidade de Nova York. Ele deixou o idílico paraíso natural do Ceilão (agora Sri Lanka) e encontrou-se na Big Apple, que estava lotada, barulhenta e pouco natural. “O que estou fazendo aqui?” Perguntouse. Mas não teve muito tempo para refletir pois ficou imediatamente cercado pelos homens e mulheres jovens de que o viajante lhe falara. Assim como o viajante havia descrito, esses jovens estavam à deriva, num mar de confusão e ilusão, mas o homem podia ver que os seus desejos de liberdade e felicidade eram fortes e que os seus corações eram puros. Ele ficou totalmente cativado pela sinceridade e determinação deles.

Então, ele começou a ensiná-los sobre o reino extraordinário com todos os seus tesouros e como eles também poderiam encontrá-lo, pois ele existia dentro de seus próprios corações. E muitas vezes ele contava-lhes histórias sobre o reino: sobre outras almas nobres e corajosas que tinham viajado até lá, sobre as provações e tribulações ao longo do caminho e sobre a grande diversão que teriam quando chegassem lá. Havia também histórias sobre como tornar o seu dia-a-dia mais divertido, como com a atitude e abordagem adequadas, cada momento de cada dia poderia ser mais um passo em direção a essa grande descoberta. Foi a maior benção das últimas três décadas ter ouvido esses contos esclarecedores do meu amado Mestre e ter aprendido sobre as possibilidades de crescimento, transformação e, finalmente, liberdade de todo sofrimento. Eu lembro-me da primeira vez que vi Sri Gurudev. Tinha-me formado recentemente na faculdade e estava cheio de uma sensação de vazio e um desejo profundo de paz. Os seus olhos encontraram os meus e, naquele instante, eu soube que ele tinha encontrado tudo o que eu procurava. Era tão incrível estar na sua presença, ver uma grande Luz no meio das trevas e saber que havia xiv


esperança, que a paz que eu procurava poderia ser alcançada; porque aqui estava alguém de pé, diante de mim, que incorporava totalmente essa paz.

Aí, eu soube que o resto da minha vida seria gasto seguindo os seus ensinamentos para que pudesse experimentar essa paz e alegria eu mesmo.

É com a maior alegria que apresentamos esses ensinamentos neste volume de Contos Iluminados contados por Sri Swami Satchidananda. É nossa esperança que as histórias encantem e elevem a todos. Um devoto de Sri Gurudev comentou certa vez: “São histórias que podem ajudar as crianças a dormir e os pais a acordar”. Elas são simples o suficiente para um jovem compreender e ter profundidade suficiente para despertar a consciência do mais fervoroso aspirante espiritual.

As histórias são acompanhadas por ilustrações criadas num estilo indiano, especialmente para este livro. Estamos muito gratos a Uma Schreiber por estas belas e ilustradas representações dos ensinamentos. Deleitam não apenas os olhos, mas ajudam também a imprimir a mensagem das histórias no fundo do coração. Para ajudar o leitor, também incluímos um glossário de termos sânscritos no final do livro. Muitas vezes, quando uma palavra sânscrita é usada numa história, ela é seguida diretamente pelo seu significado entre parênteses. Agora, é hora de se sentar numa cadeira confortável, algures num canto aconchegante. Se tiver crianças ou amigos por perto, reúna-os - porque todo mundo adora uma boa história. Está pronto? Aventura, surpresas e verdadeira sabedoria esperam por si. . —Swami Karunananda Satchidananda Ashram–Yogaville June 1996

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Introdução por Sri Swami Satchidananda Se realmente quer aprender, descobrirá que toda a natureza é um livro de conhecimento. Pode ensinar tudo o que precisa saber. Todo o conhecimento que procura está livremente disponível neste universo. Não precisa ir a uma biblioteca; até a coisa mais pequena pode ensinar-lhe uma grande lição. Os grandes professores entenderam isso; é por isso que eles usaram exemplos da vida quotidiana para transmitir verdades importantes. Isto pode ser visto nas belas histórias e parábolas que eles contaram aos seus alunos.

Foi assim que eles ensinaram - com exemplos muito simples para revelar grandes verdades. Muitos dos grandes sábios e santos eram pessoas simples. Eles raramente citaram as escrituras, porque nem sequer as leram. Eles viviam com a natureza e o que eles mesmos estavam aprendendo diretamente da natureza, traziam na forma de histórias. Assim, quando as pessoas víam as coisas comuns e naturais nas suas vidas diárias, lembravam-se das verdades mais elevadas. Outra razão pela qual a maioria dos grandes professores ensinava em forma de histórias é que as pessoas muitas vezes esquecem a verdade simples, porque é simples. Mas elas podem lembrar-se facilmente de uma história. E lembrando-se da história, também podem lembrar-se do ensinamento. Assim, os grandes professores muitas vezes apresentaram as verdades mais elevadas através de histórias - e as histórias são muito simples. De fato, a verdade em si é muito simples. Às vezes, as nossas mentes complicadas não querem aceitar isso. Eles questionam: “Poderia ser realmente assim tão simples?” Uma mente complicada não quer aceitar coisas simples.

É por isso que o reino - verdadeira paz e alegria - está entre as crianças. Como o grande sábio Sri Ramakrishna Paramahamsa costumava dizer: “Esqueça

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tudo o que aprendeu. Torne-se novamente uma criança e experimentará Deus agora mesmo ”.

Essas histórias são para crianças de todas as idades. Eles contém dentro de si a sabedoria antiga e os ensinamentos universais dos grandes sábios e santos da Índia e são chaves de ouro para o verdadeiro sucesso na vida. Que os possas aplicar bem e experimentar toda a saúde, felicidade, paz e prosperidade.

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A Chave para a Luz m homem chegou um dia a um ashram procurando o caminho da luz. Curvou-se perante o swami e disse: “Estou interessado em conhecer o Self. Quero encontrar paz. Por favor concede-me essa sabedoria.”

O swami sorriu para ele e disse: “Pobre homem, vais morrer daqui a dez dias. É tarde demais.” O homem ficou chocado. “Queres dizer que eu vou mesmo morrer daqui a dez dias?” “Sim, eu vejo a Morte a vir. Está muito perto de ti.”

“O que devo eu fazer, swami? Há alguma coisa que me possas ensinar?”

“Não é assim tão fácil. Muitos praticam durante anos e mesmo assim não encontram a sabedoria.”

Mas o homem continuou a insistir até que finalmente o swami disse: “ Está bem. Talvez eu esteja errado. Vai para casa e se por sorte viveres mais de dez dias volta para mim. E então eu ensinar-te-ei.” O homem voltou para casa com o coração pesado. Alguns amigos vieram visitá-lo e perguntaram-lhe: “Porque estás assim tão triste?”

“Bem o swami do ashram disse que eu irei morrei dentro de dez dias. Realmente não sei que fazer. Eu cometi muitos pecados e não sei como me redimir.” Nesse instante apareceu o contabilista do homem e disse-lhe: “Senhor temos que processar o homem que vos deve dinheiro.”

Mas o homem respondeu: “ Esquece isso. Eu emprestei-lhe dinheiro porque tenho mais do que suficiente. Se eu não tivesse bastante para as minhas despesas, não lhe teria feito o empréstimo. Se ele não me pode pagar agora para quê enviá-lo para a prisão? Se ele pagar, muito bem. Senão diz-lhe que 1


eu anulo a dívida. Ele pode gozar o dinheiro.” O contabilista ficou muito surpreendido porque na véspera o homem lhe tinha dito para ele confrontar o devedor e pedir-lhe a soma total acrescida de juros.

Depois o homem telefonou ao irmão que não tinha visto havia já dez anos e pediu-lhe para ele o vir visitar. O irmão ficou muito surpreendido porque em tempos o homem lhe tinha dito que o iria considerar sempre um inimigo mortal. Após muita hesitação o irmão finalmente disse: “ Está bem. Virei visitar-te amanhã.”

No dia seguinte, o homem que ia morrer sentou-se à janela à espera do irmão. Assim que o viu correu para ele. Abraçou-o e disse: “ Meu querido irmão, por favor perdoa-me. Eu compreendi-te mal todos estes anos. Esqueçamos a nossa inimizade e tornemo-nos irmãos e amigos de novo.” Em seguida, um após o outro, começou a chamar todos os seus inimigos e a fazer as pazes com todos eles. No dia seguinte chamou o contabilista para saber quanto dinheiro tinha no banco. Era realmente muito. Assim pôs uma parte de lado para a educação dos seus filhos e com todo o resto, passou cheques para várias instituições e grupos de apoio que começaram a usar esse dinheiro para ajudar e alimentar os pobres. Todos se começaram a admirar. “O que se passa com ele? De repente tornou-se num homem generoso, com uma mente aberta. Faz amizade com todos e dá tudo para a caridade.” Eles não sabiam que ele pensava morrer daí a dez dias.

Por fim faltavam apenas dois dias. Com a preocupação não tinha conseguido comer e tinha-se tornado muito fraco. Tinha que estar acamado. Ele tinha aprendido algum yoga e não discriminava as religiões por isso convidou um padre Católico para lhe vir ler a Bíblia, um monge Hindu para lhe recitar o Bhagavad Gita e alguns yogis para lhe entoar cânticos. A sua ideia era de ouvir muitas orações bonitas antes de morrer.

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Nesta altura já toda a cidade o tinha ficado a conhecer e todos o louvavam. O seu nome estava por todo o lado. O décimo dia chegou e ele dirigiu-se a todos: “Acabei o meu trabalho. Não me incomodem mais. Vou-me sentar e meditar.” Começou a repetir um mantra e esperou pela Morte.

Olhou para o seu relógio. Era meia-noite do décimo dia. Algo estava errado. O swami tinha dito dez dias. Pediu aos criados que verificassem as portas. Tinha-lhes dado instruções para deixarem todas as portas abertas para que a Morte pudesse facilmente entrar. Então, apesar de se sentir fraco, chamou alguns amigos e pediu-lhes que o levassem ao swami. Por essa altura já havia centenas de pessoas dispostas a fazerem qualquer coisa que ele pedisse. Assim foram todos até ao ashram e quando aí chegaram o homem caiu aos pés do swami dizendo: “Swami, o que aconteceu com a tua previsão? Eu não morri.” “Sim, vejo que não morreste. Algo se deve ter passado mal. O Senhor da Morte provavelmente atrasou-se. Espera aqui mais um dia e vê se ele vem. Se ele não vier, eu ensino-te.”

E assim o homem sentou-se num quarto e meditou. O décimo primeiro dia também passou. Ele levantou-se e disse: “Swami, ainda estou vivo. A Morte não veio. Pelo menos agora, por favor, ensina-me a verdadeira sabedoria.” O swami sorriu para ele e disse: “mas eu já te ensinei.”

“O quê?” disse o homem “Eu não percebo. Tu não me ensinaste nada!”

“Bem, o que tens estado a fazer nos últimos dez dias? Quantas mentiras contaste? Quantos inimigos fizeste? Quantos negócios fizeste no mercado negro?”

“Swami, como poderia eu ter feito essas coisas? Eu fiz as pazes com todos os meus inimigos e dei tudo para a caridade. Eu tornei-me um bom homem porque não havia tempo a perder. Eu sabia que ia morrer e não queria morrer com uma má reputação por isso emendei tudo.” “O que pensavam os outros de ti, dantes?” 3


“Ninguém gostava de mim. Diziam que eu não prestava, que era um muito mau homem.” “E agora, o que dizem eles?”

“Quando saio de casa, todos me tecem louvores e há muitos artigos no jornal sobre mim. Parecem todos gostar todos de mim. Chamam-me um grande homem, um santo.” “Estás contente com isso?”

“Oh sim, swami. Absolutamente! Estou feliz quando gostam de mim e eu gosto de todos.” “Óptimo. Então volta para casa. Sabe que podes morrer a cada minuto e não faças de ninguém um inimigo. Vive da mesma forma que tens vivido nestes últimos dez dias. Esta é a essência do Yoga. Assim conhecerás sempre a paz. Isto é a sabedoria.”

Alguém sabe quando irá morrer? Não. Pode acontecer a qualquer minuto. Por isso para quê criar inimigos? Porquê dizer mentiras? Vivam a Regra Dourada o melhor que puderem. Façam da vossa vida um sacrifício para a humanidade. Este é o objectivo do yoga; esta é a sabedoria máxima. Does anyone know when he or she is going to die? No. It can happen any minute. So why create enemies? Why tell lies? Live the Golden Rule as best you can. Let your entire life be a sacrifice for humanity. That is the goal of Yoga; that is the highest wisdom.

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Tudo para o Bem ra uma vez um rei que tinha um excelente ministro muito sábio. O ministro era muito leal e dedicado ao seu soberano e o rei nunca saia do palácio sem o ministro a seu lado. Estavam sempre juntos.

Um dia estava o rei a cortar uma peça de fruta quando acidentalmente cortou um dedo. Enquanto estava a ser tratado perguntou ao seu ministro porque teria aquilo acontecido. “Eu estava a ter tanto cuidado”, explicou, “mas a faca pareceu saltar sozinha para cortar o meu dedo profundamente”.

O ministrou simplesmente sorriu para ele e disse: “Não se preocupe, Majestade, é tudo para o bem.”

O rei ficou furioso. “Que resposta é essa? Eu cortei o meu dedo! O sangue jorrou e dói-me muito. E tu ficas aí a dizer calmamente: ‘É tudo para o bem’. Se é assim que tu te preocupas comigo, já não te quero mais ao pé de mim!” O rei chamou os guardas e mandou-os levar o ministro para a prisão. Ao ser levado o ministro disse apenas “Como queira Majestade. Sem dúvida isto também é para o bem.” E submeteu-se tranquilamente à prisão.

Dias depois o rei decidiu ir caçar. Embrenhou-se na floresta com um grupo de companheiros. A certa altura começou a perseguir um lindo veado. Como o seu cavalo era o mais rápido depressa se afastou dos outros. Mesmo assim o veado conseguiu escapar. E sem se dar conta o rei tinha-se perdido nas profundezas da floresta. Felizmente o rei já tinha tido muitas aventuras e permaneceu calmo. Mas estava muito cansado e com sede. Avistou perto dali uma grande árvore perto de um ribeirinho. Saciou a sua sede, encostou-se à árvore e adormeceu na sua sombra.

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Após uns momentos acordou com um rastolhar. Abriu os olhos e o que viu fê-lo gelar de medo. Um enorme leão estava ao pé dele, cheirando-lhe o corpo! O rei não sabia o que fazer por isso ficou muito quieto a observar o leão. O leão continuou a cheirá-lo. De repente cheirou uma das mãos do rei, recuou, rosnou e fugiu. O rei estava espantado com a sua boa sorte! E claro tinha-se assustado tanto que a sua adrenalina estava a funcionar bem; ele estava agora completamente acordado! Levantou-se e começou a chamar pelos companheiros de caçada até que os encontrou. “Oiçam”, contou ele, “um leão veio enquanto eu dormia. Era enorme e tinha um ar muito feroz. Estava pronto para me devorar mas algo misterioso aconteceu. De repente fugiu.” “Isso é fantástico!” exclamaram eles “Que sorte!” Mas nenhum deles podia explicar o que tinha acontecido. Então o rei lembrou-se do ministro que sempre tinha sabido explicar tais coisas. Quando voltou para o palácio mandou que lhe trouxessem o ministro. E contou-lhe toda a história com todos os pormenores. O ministro disse apenas “É tudo para o bem, Vossa Majestade”.

“ O que queres dizer com ‘é tudo para o bem?’ Isso não explica porque é que o leão se afastou sem sequer me morder. Qual é a razão disso?”

“Vossa Majestade, o leão é o rei dos animais, tal como vós sois o rei dos homens. Quando alguém vos oferece um fruto terá que estar limpo e intacto. O leão quer a sua comida dessa forma, também. Quando se aproximou e vos cheirou sentiu que algo estava errado. Assim que cheirou o vosso dedo cortado soube que não serias apropriado para o rei dos animais. Por isso vedes, senhor, que o dedo cortado vos salvou a vida. Agora compreendeis que tudo é para o bem?” “Tens toda a razão” respondeu o rei. “Assim que o leão cheirou a minha mão rosnou com desagrado. Depois fugiu. Sabias o que dizias todo este tempo. Peço desculpa por te ter mandado para a prisão. Mas diz-me: quando te levaram 6



preso disseste também ‘Isto também é para o bem” Qual foi o bem que resultou da tua prisão?” “Vossa Majestade”, respondeu o ministro, “ sabeis que normalmente nunca estamos separados. Certamente que eu teria ido convosco na caçada e que vos teria acompanhado para dentro da floresta. E estaríamos a dormir os dois debaixo da árvore quando o leão aparecesse. Ter-vos-ia rejeitado mas provavelmente ter-me-ia devorado porque eu não tenho nenhum corte. Porque me mandaste para a prisão a minha vida foi salva. Por isso, vedes, foi tudo para o bem.”

As adversidades são bênções disfarçadas. Poderão talvez só ver os benefícios muito mais tarde, mas eles estão lá. Tenham fé no desfecho positivo.

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Nunca Desistas! á muito tempo atrás houve um rei na Escócia chamado Robert Bruce. Combateu o seu inimigo seis vezes e seis vezes foi derrotado no campo de batalha. Perdeu tudo; o seu reino, a sua saúde, tudo o que tinha. Perdeu toda a esperança, fugiu e escondeu-se numa gruta. Sentiu que não queria mais viver.

O rei Robert estava a pensar em suicidar-se quando reparou numa aranha a tentar construir uma teia. Para construir a teia, a aranha tinha primeiro que levar o fio central do chão até ao tecto. A aranha saltou, falhou o tecto e caiu. De novo saltou, falhou e caiu. Seis vezes a aranha saltou e caiu. O rei estava a contar. À sétima vez a aranha saltou e conseguiu chegar à sua meta.

“Bem”, disse o rei Robert, “ se uma pequena aranha consegue ter tal tenacidade e esperança e por fim conseguir porque não posso eu? Eu não vou suicidar-me. Eu vou lutar de novo e desta vez vou vencer, tal como a aranha!” Saiu da gruta, reuniu o seu exército e ganhou a guerra. Nunca, nunca desistas! Nem sequer permitas que a palavra “impossível” seja parte do teu vocabulário. Tudo é possível. Essa deveria ser a nossa atitude na vida.

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O Escultor e o seu Filho ra uma vez um grande escultor muito conhecido – o melhor escultor do seu tempo. Era também o escultor do rei e era muito elogiado por ele. O filho do escultor queria seguir as pisadas do pai e até ser melhor do que ele. Por isso o filho trabalhava duramente e de cada vez que fazia uma obra muito bonita chamava o seu pai para a ver. O pai vinha e dizia sempre “Está bem mas podia ser melhor.” E o filho voltava ao trabalho e fazia outra escultura e esta era ainda melhor. De novo o pai vinha e dizia: “É melhor que a anterior mas ainda assim podia ser melhor.” Isto aconteceu muitas e muitas vezes. Gradualmente todos começaram a reconhecer o jovem como um grande artista. Um dia ele fez uma escultura excepcionalmente bonita. O rei, em pessoa, veio vê-la e elogiou-o muito. Mas o jovem não estava completamente feliz porque queria que o seu pai o elogiasse também. Por isso levou a estátua ao pai mas o pai disse simplesmente “Não está mal”. “É tudo o que tens para dizer?”

“Podia ser muito melhor, filho.”

O filho atirou a estátua ao chão dizendo: “Está bem, vou fazer outra!” E com um esforço ainda maior fez uma outra escultura ainda mais espectacular. Podia-se quase ver os lábios moverem-se e ouvi-la falar. Tinha vida. Toda a cidade veio admirá-la e todos diziam: “Nunca ninguém no mundo pode ter feito uma estátua mais bonita do que esta.” Era realmente uma fantástica peça de arte. Vendo isto, o filho do escultor pensou: “Desta vez o meu pai não vai poder encontrar nada de mal no meu trabalho. Eu fiz um trabalho perfeito. Não há nenhuma falha.” E com muito orgulho e alegria convidou o pai para ir ver a estátua. “Está bem, filho, mas podia ainda ser melhor.” 10


Então o filho ficou furioso. Começou a gritar com o pai ”Eu trabalhei tanto e fiz isto tudo e só tens isso a dizer? Nem sequer podes dizer uma palavra de apreciação? Não podes admitir que é bonito? Dizes sempre a mesma coisa: ‘Podia ser melhor! Podia ser melhor! Podia ser melhor! Estou farto disto!” E dito isto, o filho do escultor saiu de casa e viajou para outro país. Aí ficou em reclusão não dando importância ao seu aspecto físico e começando a ter ar de louco. Mas continuou a trabalhar, querendo provar que podia criar esculturas inquestionáveis. Durante esse período fez um trabalho maravilhoso e enviou uma mensagem para o palácio real convidando o rei a vir vê-lo. O rei estava curioso e enviou o seu ministro que era um amante de arte. O ministro viu a estátua e exclamou: “Oh! Eu nunca vi nada assim! O rei tem que ver isto. Vamos levá-la já ao rei.” O rei apaixonou-se também por ela. E disse ao ministro: “Nunca ninguém fez um trabalho assim. Manda colocá-la na praça central. Que todo o reino a venha admirar.”

Uma grande plataforma foi construída para a estátua e fez-se um festival. O rei informou toda a gente. “Temos aqui uma obra de arte. Todos deveriam vir vê-la”. E enviou mensageiros por todo o país e também para os países vizinhos.

Chegaram pessoas vindas de muito longe e elogiaram a escultura. Claro que o pai do artista, sendo ele próprio um escultor, também quis vir vê-la. Assim foi e quando viu a escultura ficou sem fala. “Ah, eu próprio não poderia ter feito tal obra! É fantástica! Quem a fez? Gostaria muito de conhecer o artista e de o felicitar. Esta escultura não tem igual.”

E deixou-se ficar de pé frente à estátua, com lágrimas de alegria no rosto. De repente aparece, correndo, um homem com um ar tresloucado que primeiro se ajoelha aos seus pés e de seguida o abraça. Era o seu filho que se tinha escondido no meio da multidão. Ao ver a reacção do pai ficou muito contente 11


e quis revelar a sua identidade. “Pai, Pai, sou eu o escultor. Sou eu – o teu filho! Fizeste-me tão feliz!” “Meu querido filho como estás tu? O que fazes aqui Eu pensei que te tinha perdido.” “Pai, eu sou a pessoa que fez esta estátua.”

Houve um longo silêncio. “Bem filho, podia ser um pouco melhor.”

“Mas eu ouvi-te admirá-la e dizer que era fantástica. Porque estás a repetir ainda a mesma velha história?” Então o pai explicou: “Filho, se eu tivesse apreciado e elogiado as obras de arte que criaste anos atrás, terias parado por aí. Eu queria que crescesses mais e mais. Por isso fui sempre dizendo ‘podia ser melhor’. Se eu nessa altura te tivesse dito como eram bonitas teria sido o fim do teu crescimento.”

“Pai, desculpa. Agora eu compreendo. Obrigado por me ajudares ao longo de todos estes anos a tornar-me no melhor que podia ser.” Se ouvires sempre elogios, tornas-te satisfeito contigo próprio e deixas de tentar. Assim acaba a tua aprendizagem. Nunca devíamos estar satisfeitos com o nosso crescimento. Como diz o provérbio: “Aquilo que aprendemos é apenas um montinho de barro; aquilo que ainda temos para aprender é a terra toda.”

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Uma Gota de Mel m homem caminhava pela selva quando de repente encontrou um grande tigre. Ele estava quase exausto quando avistou o tigre mas ficou tão assustado que desatou a correr. E atrás dele o tigre a persegui-lo. O homem corria quanto podia mas, de repente, bum – tropeçou num velho poço seco. O poço era muito velho e estava coberto com ervas e videiras. Por sorte o homem não caiu até ao fundo mas ficou agarrado a uma videira.

Ali estava ele agarrado a meio caminho do fundo. Começou a subir mas quando olhou para cima viu que o tigre ainda lá estava. “Ai” , disse ele, “o que posso fazer agora? Não me consigo aguentar muito mais tempo! Tenho que me largar e saltar”.

Quando ia a saltar o homem olhou para baixo e viu uma grande cobra. Tinha uma cobra em baixo e um tigre em cima. Nesse mesmo instante ouviu um barulhinho e um tremor no braço da videira a que estava agarrado. Olhou para cima e viu um ratinho a roer a trepadeira. A qualquer momento a trepadeira podia ser cortada e ele podia cair para baixo. Ai que sarilho! “O que devo fazer?” pensou ele. Nisto sentiu algo a cair-lhe no lábio, uma espécie de gota pesada. Lambeu o lábio e pensou, “O que é isto?” Depressa percebeu que ao cair tinha tocado num favo de mel e que uma gota de mel lhe caía agora no lábio. “Ah”, pensou ele, “é mesmo como o mel que eu comi quando fui pela primeira vez a casa da minha sogra para conhecer a minha noiva. Oh, ela era uma rapariga tão bonita.” E começou a pensar acerca do seu casamento, da festa e de tão feliz que tinha sido a lua-de-mel. Continuou a sonhar: “Ah, mas infelizmente ela divorciou-se. Mas ela até tinha uma irmã. Talvez quando eu regressar peça à irmã para casar comigo.” E começou a planear outro casamento. Uma gota, uma gotinha muito pequenina 13


de mel tinha-o feito esquecer todo o perigo da sua situação presente assim como o seu sofrimento passado e, ali estava ele a ver se fazia os mesmos erros no futuro. As pessoas pensam constantemente na felicidade banal, temporária, efémera. Esquecem todos os sobressaltos e golpes que receberam na vida e repetem sem fim os mesmos erros caindo cada vez mais fundo no poço. Se quiseres acelerar o teu crescimento, aprende com as experiências passadas e fica longe de tudo o que pode perturbar a tua paz.

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Duas Pedras ra uma vez um homem que foi para uma montanha à procura de uma pedra grande com que pudesse fazer uma escultura. Finalmente encontrou uma e levou-a para casa. Mas aí deu-se conta de que a pedra era grande demais e decidiu usar apenas a metade. Partiu-a em dois e começou a trabalhar uma das metades. Assim que começou a esculpir a pedra começou a queixar-se, “Eh, pára lá com isso! Não sabes que me estás a magoar? Eu estava muito bem antes e agora estás aí a esculpir-me. Não me toques mais!” O homem pensou, “Talvez esta pedra tem algum problema. Vou deixá-la em paz e usar a outra metade.” E assim começou a trabalhar na outra metade. Esta não se queixava nada. De facto, sempre que ele parava de trabalhar a pedra dizia, “Porque é que paras? Vá lá, continua. Sei que estás a fazer isso para meu bem. Por favor tira todas as partes indesejáveis.”

Porque, realmente, é assim que se faz uma escultura a partir de uma pedra. Não se põe um nariz aqui ou um olho acolá; vai-se tirando às lascas a matéria desnecessária que cobre o nariz e o olho. Quando toda a matéria desnecessária foi removida pode ver-se a imagem bonita. É por isso que a pedra ia dizendo “Vai, faz isso rapidamente – quanto mais cedo melhor.” E, claro, que o escultor estava muito feliz por trabalhar com uma pedra assim, uma que realmente apreciava o que ele estava a fazer. O escultor trabalhou dia e noite. Em breve a escultura ficou acabada. Era uma imagem linda de Deus e um templo foi construído para ela. A imagem foi colocada e o padre estava prestes a fazer uma puja e verter leite e mel sobre ela. Mas não conseguia chegar ao topo da escultura. Olhou à volta procurando alguma coisa em que se pudesse colocar. Viu a outra metade da pedra e trouxe-a para frente do altar. Subiu para cima dela e fez o culto.

Quando o serviço acabou, o padre foi para casa. Então a pedra que estava no chão olhou para cima para a pedra que estava no altar e disse, “Eh, irmã, o 16


que aconteceu aqui? Todo o dia aquele sujeito esteve em cima de mim, a pisarme com os pés enquanto deitava leite e mel por cima de ti e te decorava com muitas coisas bonitas. Como é que tu estás a ser adorada e eu pisada?”

A outra pedra riu-se e disse, “Parece que ainda não percebeste o que aconteceu. Minha irmã tu podias estar aqui e eu no teu lugar. O escultor escolheu-te a ti primeiro mas, infelizmente, tu não quiseste que te tocasse. Resmungaste. Por isso ele deixou-te sozinha e começou a trabalhar em mim. Eu pensei que devia de haver mais qualquer coisa por detrás daqueles golpes, de todo aquele lascar e lixar. Eu não sabia o que ele estava a fazer mas confiei nele. E esperei, esperei, esperei. Lentamente vi que me estava a transformar numa lindíssima imagem. Com alegria dei-me conta de que se ele não tivesse feito tudo isso eu não seria assim hoje. Por isso vês, eu deixei-me modelar e lascar e encher e polir. Tu não gostaste disso, fizeste-o parar. Por isso hoje és uma pedra de soleira e eu estou aqui como uma divindade.” Deus é como um escultor. Ele tenta fazer sair a parte linda em ti. Mesmo se o processo por vezes magoa, sê paciente e persevera. No fim acabarás a brilhar.

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O Swami e a Vaca avia um swami que tinha um jardim muito bonito com muitos frutos, vegetais e flores por todo o lado. Um dia a vaca do vizinho saltou a vedação e comeu todos os vegetais e todas as flores de que o swami tanto gostava. O swami ficou tão zangado que correu atrás da vaca com um pau e tanto lhe bateu que lhe partiu uma perna.

Quando a vaca voltou para casa, o seu dono foi imediatamente ter com o swami e perguntou-lhe; “Como podes tu bater assim numa vaca e até partirlhe uma perna? É um animal inocente, ignorante. Ela não sabia que o jardim te pertencia. Simplesmente entrou e comeu. Não devias ter feito isso. Eu pensava que eras um homem espiritual.”

O swami tinha estudado muito Vedanta e por isso respondeu imediatamente, “Meu filho, a quem diriges a tua queixa? Eu não fiz nada. Eu não parti a perna da tua vaca. Eu sou Aquilo que sou!” “Então quem partiu a perna?”

“Esta mão partiu a perna. Eu não sou a mão.” “Então quem é responsável por essa mão?”

“Não sabes tu o que dizem as escrituras? Que há muitas divindades presidindo as diferentes partes do corpo; esta mão é dirigida por Lord Indra. Indra funciona através desta mão e quando esta mão bateu na vaca, Indra foi o responsável.” “Está bem, swami”, disse o vizinho, “Eu não posso discutir contigo, é verdade. Peço desculpa. Eu vou aceitar isto como sendo o destino da vaca.” E voltou para casa. Entretanto Indra estava a observar tudo da sua residência celestial e decidiu testar o swami. No dia seguinte, disfarçou-se e foi visitar o jardim. “Que lindo jardim que Deus criou aqui”, disse ele. 18


“O quê?!” disse o swami. “Deves ser estranho aqui. Eu sou a pessoa que fez este jardim. Olha para as minhas mãos! Estão cobertas de calos. Primeiro tive que escavar dezenas de metros para encontrar água. Depois de encaminhar a água sozinho. Para cada árvore tive de escavar um buraco fundo e trabalhei arduamente para as plantar. Foi o trabalho duro que eu fiz com esta mão que fez este jardim crescer.”

“Isso é muito bom”, disse o visitante, “mas ouvi há pouco que quando a mão bateu na vaca, tu culpaste Indra. Não achas que quando a mão plantou as flores o crédito também deveria ir para Indra?” “Quem és tu?” perguntou o swami.

O estranho imediatamente assumiu a sua forma real e replicou, “Eu sou o pobre Indra que tu tens andado a culpar pelas tuas acções erradas.”

O swami imediatamente compreendeu a lição. “Peço muita desculpa. Por favor perdoa-me!”, pediu ele. “Eu nunca mais vou cometer este erro.” Normalmente quando algo de bom acontece, nós ficamos com o crédito. Mas quando algo de mau acontece, tentamos arranjar alguém a quem culpar. Esta espécie de “trânsito nos dois sentidos” não está certa. Deverias ou tomar inteira responsabilidade pelas tuas acções ou então sentir que tudo acontece segundo a vontade de Deus.

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Uma Mentira Perfeita ra uma vez um eremita que vivia numa zona rural distante. Ele levava uma vida tranquila passada a rezar e a meditar. Uma noite, estava ele sentado à porta da sua cabana quando apareceu uma linda jovem ricamente vestida e coberta de jóias. Chorando, correu para ele, “Por favor, salva-me! Há alguém que me persegue e me quer matar para roubar as minhas jóias! Por favor deixa-me esconder aqui…” E, sem pedir sequer licença, a rapariga entrou precipitadamente para dentro da cabana. Minutos depois, um homem com um ar feroz e um punhal na mão apareceu a gritar, “Eh! Tu! Viste uma rapariga a passar por aqui?” O que deveria ter feito o eremita? Deveria ter sido honesto e dizer: “Eu sempre digo a verdade. A rapariga está escondida lá dentro.”

Não. Em vez disso, ele disse, “Que rapariga? Meu filho, não vês que eu sou um eremita? Isto não é um lugar para raparigas.” “Está bem”, disse o homem com o punhal, “Vou naquela direcção à procura dela.” E correu na direcção oposta.

Assim, com a mentira do eremita, salvaram-se três vidas. O homem teria morto a rapariga e não querendo deixar o eremita como testemunha, tê-loia morto também. E muito provavelmente ao ir vender as jóias teria sido apanhado pela polícia e teria sido enforcado. Por isso tivesse o eremita falado a verdade e três vidas se teriam perdido. Por vezes até mesmo o contar uma mentira pode ser um acto generoso e perfeito. Se não vai trazer mal a ninguém e pelo menos algum benefício a alguém, então até contar uma mentira conta como verdade. O motivo e o resultado deveriam ser pensados em relação a qualquer acção e não apenas a acção em si própria.

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Como Construir um Templo

construção.

ouve, em tempos, um rei poderoso e piedoso que tinha muito orgulho tanto nas suas obras como na sua piedade. Decidiu construir o templo mais magnifico que o país jamais vira. E chamou a si os melhores arquitectos e construtores e começou a

Estando o templo quase construído o rei decidiu marcar uma data para a sua consagração. Rezou fervorosamente a Deus para que viesse e estivesse presente na consagração deste belíssimo templo. Ele tinha a certeza de que Deus viria já que nunca tinha havido um templo igual em todo o país, nem mesmo nos países vizinhos. Mas uma noite, o Senhor apareceu-lhe num sonho e disse, “Talvez devesses escolher um outro dia para a cerimónia porque eu estou muito ocupado nesse dia.” “A fazer o quê?” perguntou o rei, incrédulo.

“A consagrar um outro templo”, respondeu o Senhor.

O rei ficou muito espantado ao saber que havia um templo ainda maior que o seu a ser consagrado no mesmo dia. “Onde fica esse templo?” perguntou. E o Senhor disse o nome da pequena aldeia onde se encontrava o templo. Então o rei disfarçou-se e viajou até aquela aldeia para visitar o grande templo. Ao aproximar-se esperava avistar um grande edifício por cima das árvores mas não via nada. Perguntou a um aldeão, “Há aqui algum grande templo?” O homem olhou para ele como se o rei fosse cego ou louco. “Não, senhor, não existe nada aqui.”

“Tens a certeza? Foi-me dito que existe um grande templo nesta aldeia.”~

“Pode ver que não há nenhum templo aqui. Mas o melhor é perguntar ao swami que vive numa cabana no fim da aldeia. Ele é um homem santo e sabe dessas coisas.” 22


E assim o rei foi até à pequena cabana e chamou pelo swami, um pobre sadhu (homem espiritual) cujo nome era Poosalar. “Há algum grande templo nesta aldeia?” perguntou o rei. Poosalar abanou a cabeça. O rei ficou impaciente. “Mas Deus disse-me que um grande templo ia ser consagrado aqui num certo dia”, insistiu o rei. Os olhos de Poosalar encheram-se de lágrimas. E chorou longamente de alegria. De seguida explicou ao rei: “Durante muitos anos eu quis construir um templo a Deus. Mas sou um pobre devoto, mal tenho para comer. Por isso comecei a construir um grande templo na minha mente. Cada dia acrescentei uma pedra, gravei um pilar ou coloquei uma laje de mármore. E convidei Deus a vir à consagração nesse mesmo dia que mencionou. Agora sei que Ele virá mesmo ao meu templo!”

O rei ajoelhou-se em frente de Poosalar. “Eu também tenho construído um templo a Deus. Mas o meu foi construído com orgulho, enquanto o teu foi construído no coração com amor. Por isso, naturalmente, Deus escolheu vir ao teu templo e não ao meu. Depois disso, o rei, ele próprio, tornou-se um grande devoto.

Os nossos actos não são julgados meramente pela aparência externa. Deus olha para os nossos corações e os nossos motivos interiores. Um acto perfeito tem um motivo puro por detrás, livre de qualquer egoísmo e orgulho.

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A Macieira oda a natureza demonstra a alegria de dar. Olhem para uma macieira. Dá milhares de frutos. Se vocês perguntassem à arvora, “Quantos frutos dás numa estação?” poderiam ouvira o seguinte: “Oh, alguns milhares.”

“Ah e as pessoas vêm-te implorar?”

“Não, eu não estou à espera disso. Dou apenas.” “Sem mesmo eles pedirem?”

“Sim, essa é a minha natureza. É uma alegria para mim dar dessa forma.” “E se as pessoas te atiram pedras? O que fazes então?”

“Bem, provavelmente essas pessoas apanham ainda mais frutos.” “E supõe que ninguém vem apanhar os teus frutos?”

“É o problema deles. Eu não quero comer os meus próprios frutos, por isso deixo-os cair.” “Mas as tuas maçãs são deliciosas. Não queres ao menos provar uma?”

Se tiveres ouvidos para ouvir, vais ouvir a árvore rir-se de ti. “Oh, eu não sou como os seres humanos que comem os seus próprios frutos. Apenas os seres humanos correm atrás dos seus próprios frutos e por isso é que são tão infelizes.” Cada pensamento, cada acção, contém um fruto. Não esperes essa recompensa para ti próprio. Pelo contrário, vive uma vida sem egoísmo e guardarás sempre a tua paz.

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Assim pensas, Assim Te Tornas ra uma vez um devoto, um sadhu, que queria passar mais tempo retirado. E construiu uma linda ermida na margem de um rio, começando ali a fazer as suas práticas: japa, meditação, pranayama e várias outras. Meses depois começou a reparar que algo se passava na outra margem do rio. Muitos carros chegavam e partiam, muitas pessoas se juntavam. E toda a noite parecia haver muito divertimento. O sadhu ficou um pouco curioso sobre o que se passava. Rapidamente descobriu que era a casa de uma cortesã. Muitas pessoas ricas chegavam em grandes carros e ali ficavam toda a noite. Então o sadhu começou a pensar, “Porque está ela a desperdiçar assim a sua vida? Foi para isto que nasceu humana?” E sentiu-se muito triste. Começou a pensar nela cada vez mais . E dizia, “Ela não devia estar a fazer aquilo; ela realmente não devia estar a fazer aquilo.”

Aconteceu que a cortesã também olhou para o outro lado do rio e viu a ermida e o eremita. E disse para consigo, “Oh, não sei porque levo esta vida tão feia. Olha para o sadhu. Ele é uma pessoa tão maravilhosa – como ele está feliz, tão meditativo. Oh, como eu queria ter uma vida assim!” Este tipo de transferência de pensamentos entre os dois lados do rio continuou por bastante tempo. E depois aconteceu que o sadhu e a cortesã morreram os dois no mesmo dia. Naturalmente quando ocorre a morte, alguns espíritos amigáveis vêm receber a alma – como “pássaros de um mesmo bando de penas”. Assim, todos os bons, santos espíritos do céu foram para casa da cortesã. E todos os feios, fantasmagóricos espíritos foram para o lado do rio do sadhu. Quando o sadhu viu tudo isso perguntou,”Mas o que está a acontecer? Porque estão vocês aqui? Parece que se enganaram nas moradas. Não são vocês espíritos do inferno?” 25



“Sim, somos do inferno,” responderam eles, “e viemos para o sítio certo. É para lá que vais.”

O sadhu ficou chocado: “Mas não vêm a minha ermida? Não sabem que eu sou um eremita? Olhem para mim, eu sou um homem simples vestido com uma tanga. Não tenho nenhum luxo. Olhem para a minha tabela de sadhana , fiz as minhas práticas regularmente – não falhei um só dia!” O espírito respondeu, “Senhor, isso é verdade: fizeste tudo fisicamente. E se olhares ali para o teu corpo está a ser tratado de uma maneira muito bonita com o todo o tipo de rituais. O corpo da senhora, esse, está a ser deixado para os abutres. Mas a tua mente, infelizmente, estava constantemente ocupada com a vida infeliz, feia da senhora. Pensavas nela constantemente; e ela pensava em ti todo o tempo, desejando ser como tu. Por isso onde vives e o que fazes aparentemente não importa tanto, porque os teus pensamentos estavam sempre noutro lado. Como vês, nós viemos para o sítio certo.” E dito isto os espíritos pegaram nele e levaram-no para o inferno enquanto que a senhora foi para o céu.

Assim pensas, assim te tornas. Os teus pensamentos moldam o teu carácter e por fim determinam o teu destino. É por isso que é tão importante ter pensamentos puros.

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O Rei Pedinte m dia um grande rei foi para a floresta caçar. Passado um tempo reparou num sadhu (devoto) a dançar, a saltar e a cantar. O sadhu vestia só um atanga. Ali perto estava a cabana muito simples onde vivia. O sadhu parecia muito feliz.

O rei aproximou-se dele e perguntou, “Senhor o que te faz tão feliz?”

“Bem, eu tenho Deus. Estou contente. Não desejo nada e por isso sou feliz.”

“Ah”, suspirou o rei. “Eu gostaria de ver mais a tua cara feliz. Queres vir comigo para o palácio? Quero fazer-te uma oferta.”

O sadhu respondeu, “O que me queres tu oferecer? Eu não preciso de nada.”

“Poderás não precisar de nada mas eu gostaria de te oferecer algo. Podes, por favor vir e aceitar isso por mim?” “Está bem. Se é isso que te vai fazer feliz, eu irei contigo. Tens tudo o que precisas?” “Oh sim. Eu sou um rei rico; tenho tudo.”

“Ah, sim? Está bem, vamos então.” E seguiu o rei até ao palácio.

Quando chegaram ao palácio o rei quis mostrar ao sadhu que também era um grande devoto – e não só um rei comum – e por isso levou-o até à sua lindíssima e muito bem decorada sala do altar. Quando entraram o rei disse, “Agora é hora da minha oração da tarde. Por favor senta-te. Acabarei as minhas orações e depois mostro-te o resto do palácio.” “Muito bem.”

O rei fez sentar o sadhu num sítio de onde ele podia confortavelmente ver o rei a executar a puja no altar. O rei queria mostrar-lhe como era capaz de fazer uma puja muito bonita.

(Muitas vezes acontece: as pessoas fazem o seu culto como um espectáculo 28


para os outros, desejando secretamente que os outros digam, “Oh, olha que puja tão bonita!” Têm muito trabalho para repetir todas as orações e cânticos de forma perfeita. Mas Deus não se preocupa com isso. A Deus não importa em que língua cantam ou as palavras que usam. Ele quer ver quão puro é o vosso coração e quão sinceros são.)

A puja do rei demorou quase três horas – com muitas flores, frutos, incenso e luzes. Após a puja é costume apelar a Deus para aquilo que se precisa na vida. Assim quando o rei acabou o culto, fez a sua prece: “Senhor, tu deste-me tudo. Pela Tua Graça eu tenho muito. Há apenas uma coisa que me incomoda. Aquele rei no pequeno país vizinho – sinto-me ameaçado por ele. Se ao menos eu pudesse conquistar aquele país e absorvê-lo no meu território, tudo estaria bem. Por favor, Senhor, concede-me essa bênção.” Acabou o seu pedido e prostrou-se frente ao altar. Quando o rei se levantou viu o sadhu a sair da sala. O rei correu atrás dele. “Swami, swami! Estás a ir embora. Eu ainda não te ofereci nada. Desculpa, se calhar fiz-te esperar tempo demais enquanto fiz a puja mas é assim que eu a faço todos os dias.” “Não, não, não. Não há nada de errado com a tua puja. O problema é que eu não gosto de receber nada de pedintes.” “O que queres dizer? Estás a dizer que eu sou um pedinte?”

“Sim. O que mais fazias tu ali na sala do altar? Disseste-me que tinhas tudo mas, no entanto, ali estavas tu a pedir mais um país para juntar ao teu. Como me podes tu dar alguma coisa? Eu já tenho tudo enquanto tu ainda vives em desejo.” O rei percebeu imediatamente o seu erro e caiu aos pés do sadhu.

“Swami, eu percebo agora.” Disse o rei. “Aqui é o fim dos meus desejos. Eu renuncio a tudo. Por favor deixa-me seguir-te.” 29


Os ministros vieram tentar dissuadi-lo mas o rei disse-lhes calmamente, “Outra pessoa pode tomar conta do reino; para mim tudo isso acabou.” E seguiu o saddhu para fora do palácio. O Contentamento é de ouro. Se a mente está distraída com desejos, é impossível conhecer Deus. Apenas quando a mente está calma, clara e não perturbada por desejos, podes sentir essa Paz Suprema.

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O Carniceiro e o Yogi m caminhante espiritual chamado Kausika estava a meditar debaixo de uma árvore quando sentiu alguma coisa a cair-lhe no ombro. Ele queria saber a fonte da distracção e olhando para cima viu um pássaro sentado num ramo por cima dele. Tinha sido o excremento do pássaro que lhe caíra em cima. Imediatamente ficou muito zangado. “Como te atreves tu a fazer-me isto?” exclamou olhando para o pássaro. E ao fixá-lo, chamas saíram dos seus olhos e reduziram o pobre passarinho a cinzas. “Ah,” pensou, “Eu realmente atingi certos poderes especiais. As minhas meditações têm dado resultados.” Ao meio dia, como era seu hábito, caminhou até uma aldeia próxima para pedir algo para comer. Parou em frente da casa onde muitas vezes recebia esmola mas nesse dia o seu tom de voz estava um pouco diferente. Chamou, “Dá-me alguma comida!”

Imediatamente a mulher dentro da casa reparou na diferença. “Perdoa-me, senhor, mas estou ocupada agora. Virei assim que puder.” “Mas esta mulher não sabe quem eu sou?” pensou Kausika. “Como se atreve ela a fazer-me esperar!”

Passado pouco tempo a mulher veio à porta com a comida. “Sabes, senhor,” disse ela, “Eu não sou um pássaro para tu queimares.” Ele quase desmaiou. “O que disseste tu? Como sabes o que aconteceu na floresta? Eu não contei a ninguém.” “Não precisas; tu estás claramente reflectido na minha mente.”

“Não podes ser uma vulgar dona de casa. Que tipo de sadhana (prática espiritual) fazes tu? Tens um mantra especial? Pareces ter poderes bem maiores do que eu.” “Eu não conheço nenhuns mantras. Sou apenas uma dona de casa e tomo 31


conta do meu marido entrevado. Quando chegaste há pouco eu estava a tratar dele. Por isso te pedi para esperares. Estou a fazer o meu dever tomando conta do meu marido. Deus colocou-me nessa posição e eu estou a cumprir a minha obrigação, o melhor que posso. É tudo o que tenho para dizer.” “É tudo o que tu fazes? Eu quero saber mais.”

“Por favor, eu não sou instruída. Não te posso dizer mais nada. Se quiseres, vai até à próxima aldeia e procura pelo carniceiro de nome Vyadhan. Ele pode contar-te mais.” “Um carniceiro? Queres mesmo que vá ter com um carniceiro?” “Ele pode responder às tuas perguntas.”

Agora Kausika estava realmente curioso e por isso viajou até à próxima aldeia. Quando se aproximou do talho viu um homem grande com uma faca enorme a talhar e a negociar com os clientes com cada cêntimo. “Ele parece mesmo um demónio,” pensou Kausika. “Como me poderá ele ensinar alguma coisa?”

E já estava a pensar ir-se embora quando Vyadhan olhou para ele e disse, “Ah vieste. A senhora da outra aldeia enviou-te. Por favor senta-te. Estou a acabar o meu trabalho e depois podemos conversar.” Kausika estava espantado. O carniceiro parecia saber tudo. Ficou muito sossegado à espera. Viu que não era fácil fazer negócio com Vaydhan. Ela era muito firme com os seus preços nunca cedendo a ninguém.

Quando estava tudo acabado Vyadhan fechou a sua loja e disse a Kausika, “Anda, vamos até minha casa.” Pelo caminho Vaydhan comprou alguns vegetais. “Por favor senta-te” disse ele. “Eu vou cozinhar estes vegetais e dar de comer aos meus pais. Eles estão velhos e cegos. Tenho que tomar conta deles. Mas assim que eu acabar, podemos falar.” Um pouco depois, Vyadhan voltou e disse, “Agora vamos preparar qualquer coisas para nós comermos e depois falamos.”

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“Não. Eu não estou interessado em comer. A minha fome é diferente. Por favor alimenta-me com a tua sabedoria. Eu não percebo nada. Eu costumava pensar que por me sentar debaixo de uma árvore a repetir um mantra estava a fazer sadhana. E consegui alguma coisa com a minha prática. Mas vocês fazem todo o tipo de coisas. Tu és um carniceiro, ela é uma dona de casa. E, no entanto, vocês parecem ter alcançado muito mais do que eu. Vocês parecem saber tudo aquilo que eu tenho na mente – e provavelmente muito mais ainda. Como é isso possível?”

E então Vaydhana explicou: “Eu acredito em Deus. Deus criou tudo e todos. Ele é a própria força vital que funciona em mim, em ti e em tudo. Nós somos todos os Seus instrumentos. Ele é a corrente central. Ele deu-me dois pais idosos para tomar conta. Fez de mim um carniceiro e deu-me esta tarefa para fazer. Por isso eu faço o meu dever sabendo a cada instante que na realidade é Ele que o faz através de mim. É só isso que eu sei. Não faço nada para o meu próprio interesse. Faço tudo pelo interesse dos outros. Faço tudo como Karma yoga, como um serviço e por isso a minha mente está sempre calma e clara. Vocês, pessoas instruídas, poderão dizer que eu sou um yogi. Tudo o que sei é que a Verdade está sempre claramente reflectida na minha mente tranquila.” Se fizeres sempre o teu dever como um serviço altruísta para Deus e a criação, a tua mente guardará a sua paz e irás realizar a Verdade.

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O Santo e o Escorpião m dia, uma santa mulher foi tomar banho a um rio e viu que havia uma cheia. Ao aproximar-se das águas tumultuosas viu um escorpião a ser levado pela corrente. Teve pena dele e pensou, “Oh, vai morrer.” Inclinou-se para a água e tirou o escorpião da água. Enquanto ela o puxava para fora o escorpião mordeu-lhe a mão. Ao ser mordida, ela saltou e o escorpião caiu de novo na água. De novo ela sentiu pena dele, “Oh, desculpa. Não eu não vou deixar que morras.” De novo puxou o escorpião para fora, foi mordida e de novo o deixou cair na água.

Um amigo estava por detrás dela observando toda esta cena. Quando a mulher se inclinava para tirar de novo o escorpião da água o amigo disse-lhe, “De cada vez que tu puxas o escorpião ele morde-te. Porque continuas tu a puxá-lo? Não tens senso comum?” “Bem,” disse a mulher, “Não sei nada do senso comum. Só sei que a minha natureza é sentir pena para uma coisa, ter compaixão e se possível, salvá-la. Isso é a minha maneira de ser.” O amigo replicou, “Mas não vês que o escorpião te morde e que vai continuar a morder-te?”

A santa mulher respondeu, “O que posso eu fazer? Essa é a sua natureza. Eu não posso mudar a sua natureza. E da mesma forma tu não podes mudar a minha.” Devemos aceitar as coisas como elas são, sem pedir nada. O nosso amor deveria ser incondicional.

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O Homem Que Venceu a Zanga ouve, em tempos, um devoto que se retirou para uma gruta e lá ficou mais de dez anos. Durante todo esse tempo não viu ninguém. As pessoas vinham e deixavam comida para ele e quando elas se iam embora, ele comia. Após dez anos resolveu sair e vir ver as pessoas. Todos vieram a correr ter com ele. “Senhor,” perguntaram avidamente, “o que ganhaste por ficar sentado nesta gruta durante dez anos?” Ele respondeu, “Anos atrás eu estava sempre muito zangado. Cada pequena coisa me perturbava. Mas nestes últimos dez anos não tive nenhuma zanga. Eu venci a zanga. Isso é uma grande realização.”

Alguém se levantou e disse, “Senhor como te podes tu lembrar de tudo o que aconteceu nos últimos dez anos? Talvez um dia ficaste um pouco zangado.” “Não, nada disso. Nem uma só vez eu fiquei zangado.”

Outro homem interveio. “Senhor, é realmente difícil de acreditar nisso. Tens a certeza que não houve uma só vez em que ficaste zangado?” De uma forma impaciente, o homem respondeu, “De certeza absoluta que não!” Mas mais uma pessoa perguntou, “Realmente? Não sentiste nem uma ligeira zanga?”

E então ele gritou: “Nunca, nunca, nunca! Vocês, ignorantes, não me ouviram? Eu disse que venci completamente a zanga!” Quando não há ninguém para te irritar é fácil ficar em paz. Deverias ter muitas oportunidades para ficar perturbado e se, mesmo assim, te manténs calmo, então e só então, poderás provar que alcançaste algo.

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O Convidado do Casamento ra uma vez um homem que recebeu um convite para uma festa de casamento. Foi para a festa vestido simplesmente. Mas o dono da casa era um homem muito rico e todos os outros convidados estavam muito elegantemente vestidos. Quando o nosso homem chegou, o porteiro deteve-o e disse, “Eh, quem és tu? Onde pensas tu que vais? Todos olharam para ele e até o próprio dono da casa fez de conta que não o reconhecia.

Então o homem voltou para casa, pediu emprestado um fato muito caro e voltou para a festa. Imediatamente o mesmo porteiro disse, “Por favor, faça o favor de entrar. O dono da casa tem andado à sua procura. Para onde foi? O que lhe aconteceu? Por favor, siga-me.” E levou-o até à mesa de jantar. O homem sentou-se e quando todos começaram a comer ele pegou na sua comida e começou a atirá-la para cima de si próprio. Pegou num pequeno pudim e esfregou-o no casaco, pegou em pão e meteu-o no bolso e entornou a sopa para dentro das calças. “O que estás a fazer? Estás doido?” perguntaram os outros convidados. “Não, claro que não. Estou só a comer.” “Mas não se come dessa maneira!”

“Sim, mas quando eu apareci há pouco, vestido na minha maneira habitual, ninguém me quis dar comida. Agora que estou vestido assim, todos me querem acolher. Por isso, obviamente a comida está a ser oferecida à roupa e não a mim.” Por vezes julgamos os outros de uma forma muito superficial. O nosso sentido de beleza é baseado na sua roupa, na sua maquilhagem ou no seu penteado. Mas esta não é a verdadeira beleza. A verdadeira beleza vem da pureza do coração, de uma mente bem equilibrada que não mostra desvios. Devíamos desenvolver esta beleza interior cósmica e não depender da beleza cosmética. 37


O Santo de Imitação ra uma vez um ladrão que entrou de noite no palácio real para roubar as jóias da rainha. Estava quase a abrir o cofre das jóias quando ouviu passos. Rapidamente se escondeu debaixo da cama; mesmo a tempo porque o rei e a rainha entraram no quarto real.

“Estou muito preocupada com a nossa filha”, disse a rainha. “Já é mais que tempo de ela se casar mas ela recusa casar-se com alguém se não for um sanyasi. Ela diz que só se casa com um homem santo!” “Não te preocupes”, disse o rei. “Amanhã enviarei o meu ministro ao templo para encontrar um homem santo para casar com ela.” “Nenhum swami se interessa pela vida de casado”, disse a rainha.

“Bem, tem que haver um”, disse o rei, “e nós vamos encontrá-lo e ele será o nosso genro!” Entretanto o ladrão debaixo da cama teve uma ideia. “O que tenho que fazer é ir amanhã para o templo, fingir ser um homem santo e metade do reino será meu!” Assim que teve a certeza de que o rei e a rainha estavam a dormir ele fugiu a correr do palácio. Nem se importou mais com as jóias da rainha; ele tinha um plano bem melhor agora.

No dia seguinte bem cedo enrolou um pano cor de laranja à volta da cintura e foi para o templo. Observou com atenção como se sentavam os swamis reais para poder imitá-los de forma convincente.

Depressa o ministro do rei se aproximou do templo. Foi ter com os swamis e respeitosamente inclinou-se em frente de cada um deles. O ladrão estava um pouco preocupado porque pensou que qualquer um deles poderia aceitar a proposta do rei. Ele não podia imaginar porque razão um swami iria recusar desistir da sua vida, pobre e solitária para ganhar tal recompensa. O que 38


poderia ser tão maravilhoso numa vida de renúncia que ele a preferisse a ter uma família, riqueza e poder?

Alguns dos swamis recusaram e voltaram à sua meditação. Outros nem se deram ao trabalho de abrir os olhos. O ministro estava a ficar muito desencorajado, mas tinha de cumprir a sua tarefa e por isso continuou. Finalmente aproximou-se do ladrão. O ladrão endireitou-se, fechou os olhos e tentou o melhor que podia imitar os outros swamis que tinha visto a meditar. Após cinco minutos, começou a pensar o que estaria a acontecer ao ministro. Abriu os olhos e viu o ministro pacientemente à espera à sua frente. O ministro curvou-se em frente do ladrão, tocando com a cabeça no chão, tal como tinha feito com os verdadeiros swamis.

“Perdoa-me Swamiji,” disse ele. “Espero não ter perturbado a tua meditação.”

“Não, não me perturbaste”, respondeu o ladrão. “O que queres que faça para ti?”

O ministro pediu ao ladrão para se casar com a princesa, recebendo assim metade do reino e vindo a ser um dia coroado rei. O ladrão não queria perecer muito ansioso com medo que o ministro suspeitasse dele. Por isso fez uma cara pensativa e disse: “Não sei. Sou muito feliz assim mas gostaria de agradar ao rei. Porque não voltas amanhã e eu dar-te-ei a minha resposta.” O ministro ficou muito contente e, como encorajamento, deixou um saco cheio de moedas de ouro para o falso swami. Nessa noite o ministro fez o seu relatório ao rei. Contou-lhe como tinha sido difícil no templo mas que havia um swami que talvez pudesse ser persuadido.

“Podes pensar nalguma maneira de influenciar a sua decisão?”, perguntou o rei. “Bem, talvez se Sua Majestade fosse em pessoa falar com ele amanhã.” 39



“Muito bem. Fá-lo-ei.”

No dia seguinte o ladrão sentou-se de novo no templo. Pouco depois chegou o ministro, mas desta vez o rei, a rainha e a linda princesa vinham com ele. Todos os quatros se inclinaram perante ele. O rei, ele próprio fez o convite ao swami, oferecendo-lhe a sua filha, metade do seu reino e a promessa de um dia se tornar herdeiro do trono.

O ladrão tinha a intenção de aceitar a oferta do ministro mas ali estava o rei, em pessoa, a falar com ele. Então ele pensou: “Meu Deus! Só por agir como um sanyasi, a princesa, o ministro real, o rei e a rainha estão aos meus pés. Só por imitação – imagina se eu me tornasse num verdadeiro sanyasi…”

E por isso respondeu, “Lamento muito, Majestade, gostaria de poder servilo mas tenho que recusar a sua oferta. Eu não desejo deixar esta vida simples. Não se dê sequer ao trabalho de voltar aqui. Ninguém aqui vai ser tentado pela sua oferta.” O ladrão começou por imitar apenas os verdadeiros devotos mas, por fim, tornouse, ele próprio, num. A boa companhia, ou satsanga, é muito poderosa. Só por estar na companhia certa uma pessoa pode obter a libertação espiritual.

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O Mangusto Dourado xiste uma história muito bonita no Mahabharata, um grande épico religioso da Índia, que nos conta da nobre família Pandava. Uma vez os Pandava estavam a fazer um grande yagna ou ritual de sacrifício. O yagna estava a ser feito com toda a pompa e espectáculo e com grande despesa. Muitas pessoas tinham vindo e estavam a gostar muito. Estavam sentadas a apreciar quando, de repente, viram um estranho mangusto a correr direito a eles. Começou imediatamente a rebolar na comida e nas outras ofertas. Depois levantou-se e fez “Humpf ” enquanto se sacudia, com um ar muito desiludido. Os convidados levantaram-se e perguntaram, “O que é isto? Não pareces um mangusto vulgar. Pareces ser um pouco especial: metade do teu corpo é de uma cor dourada enquanto a outra metade é da cor normal do mangusto. Podes dizer-nos porque és assim?” “Oh, isso é uma longa história,” disse o mangusto. “Eu não sei se vale a pena contá-la.” “Por favor, conta-nos. Nós queremos saber.”

“Está bem. Já que pedem eu conto-vos. Eu era apenas um mangusto vulgar sem esta cor dourada. Um dia, andava eu a deambular quando encontrei uma pequena cabana. Sentei-me fora a observar o que se passava lá dentro.

“Um professor pobre e a sua mulher viviam ali com o filho e a nora. Naquele tempo havia muita fome na região. A comida era rara e eles não tinham nada para comer. Por sorte um dos alunos do professor tinha trazido um pouco de farinha para fazer um rotis, uma espécie de pão chato. E a mulher ia começar a prepará-lo. “Quando tudo estava pronto, o professor saiu de casa e olhou como a ver se não vinha ninguém. Era um hábito dele porque as escrituras dizem: ‘Atithi devo bluwa’, que significa ‘ trata o hóspede como Deus’. Deus vem sob a forma do hóspede. E nesse dia o professor viu alguém a vir. Por isso perguntou, “Senhor, queres algo para comer?” 42


“Oh, claro. Tenho mesmo fome.”

“Foram para dentro. Da farinha a mulher tinha feito quatro rotis, um para cada pessoa. O professor deu a sua parte ao hóspede que a acabou. “Depois a mulher veio e disse: ‘Senhor, posso oferecer-te outra? ‘

‘Oh, claro. Não sei porquê mas hoje estou com muita fome.‘ E comeu aquela também.

“Depois o filho e a nora que tinham estado a observar vieram com a parte deles. ‘Senhor, gostaríamos de te oferecer estas também se as podes comer.‘ “Acho que posso,‘ comeu o pão deles também e disse ‘Muito obrigada. Que Deus vos abençoe’ E foi-se embora. Meia hora depois todos os quatro caíram no chão e morreram porque tinham tanta fome – mas morreram em alegria.

“Eu estava a assistir a tudo isto. Tinha um pouco de fome por isso fui ver se tinham caído algumas migalhas enquanto a mulher fazia o pão. Vi um pouco de farinha no chão. Não servia para comer por isso rebolei-me nela. Quando me levantei vi que metade do meu corpo se tinha tornado dourada e pensei: ‘Oh, há qualquer coisa de misterioso e milagroso aqui, algo divino nas suas acções. Sim, certamente, eles sacrificaram as suas vidas pelo bem de outrem. Fizeram uma linda yagna.’ “E depois, não sei como, tive esta ideia maluca: ‘como vou tornar a outra metade do meu corpo dourada também?’ Desde esse dia rebolo-me em todo o lado. E ouvi que Yudhishthira, o grande Pandava ia fazer uma grande yagna e pensei, ‘Certamente essa será uma oferenda bem maior que a daquelas quatro pessoas.’ Por isso vim a correr até aqui. Mas infelizmente, não funcionou.” Deviam ter visto a cara de Yudhishthira! No yagna Pandava havia sacrifício mas provavelmente misturado com um pouco de orgulho. Mas aquelas quatro pessoas tinham a verdadeira humildade.

O que é realmente importante nas nossas acções é a qualidade de sinceridade do coração – não a pompa e o espectáculo. Se as nossas acções têm o espírito de dedicação, são verdadeiramente divinas. 43


O Demónio Que se Transformou Em Cinzas m homem, que mais tarde ficou conhecido como Basmasura ou o Demónio das Cinzas, foi para o Monte Kailash e começou a meditar sobre Lorde Siva. Ali, ele praticou durante muitos anos e a sua mente tornou-se muito dirigida numa só direcção. Por causa do poder de concentração, Lorde Siva apareceu-lhe e disse, “Estou satisfeito com a tua concentração. Pede o favor que quiseres que eu to concederei.”

Basmasura respondeu, “Se eu puser a minha mão em cima da cabeça de alguém, imediatamente essa pessoa se transformará num monte de cinzas. Este é o favor que eu quero.” Lord Siva replicou, “Tens a certeza que é isso que queres?” E Basmasura respondeu, “Absoluta!”

“Está bem, se é isso que queres, é isso que recebes.” Quando Lorde Siva se começou a afastar, Basmasura chamou-o de volta. “O que queres agora?”, perguntou Lorde Siva, “Já tens o que querias.” “Só quero experimentar o meu poder para ter a certeza de que realmente o tenho. Como não há mais ninguém aqui à volta, gostaria de experimentar em ti.”

Tendo dado o poder a Basmasura, Lorde Siva já não tinha autoridade para o tirar de volta. Por isso Ele tinha que correr para salvar a Sua vida. Com Basmasura muito perto atrás dele, Lorde Siva queria alguém para O socorrer e pensou na Sua contraparte, Lorde Vishnu, o protector, e chamou-o para O ajudar. Imediatamente Lorde Vishnu apareceu e transformou-se numa lindíssima rapariga. Basmasura corria quanto podia para apanhar Lorde Siva mas assim que viu a rapariga estacou. “Quem és tu? Para onde vais? És solteira?” perguntou avidamente.

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“Com certeza” respondeu ela, “senão porque estaria aqui sozinha?”

“Posso te acompanhar então? Posso ser o teu amigo? Posso-te dar um abraço?”

“Bem, eu até gosto de ti,” disse ela, “e pareces ser muito simpático mas o teu cabelo está um pouco despenteado e isso assusta-me.”

“Oh! O que se passa com o meu cabelo? Devia estar bem.” E dizendo isto, Basmasura colocou as mãos na cabeça e imediatamente se transformou em cinzas. Ele tinha-se esquecido de se excluir quando pedira o favor. Foi tal o calor produzido quando ele ardeu que a própria terra começou a ferver. Ainda hoje existe uma grande fonte de água quente a correr no sítio onde Basmasura foi transformado em cinzas. Pureza do coração não é o mesmo que a mente dirigida num só sentido. Mesmo pessoas com mentes maldosas podem concentrar-se e atingir grandes poderes, mas tais poderes não serão de grande ajuda se a tua mente não estiver limpa. Por isso, refina o teu corpo e a tua mente e deixa os poderes acordaram naturalmente no tempo devido. E então tu serás um lindíssimo instrumento nas mãos do Divino.

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A Leiteira ra uma vez uma leiteira que fornecia o leite para um ashram. Ela vinha de uma aldeia vizinha e tinha que atravessar um grande rio para chegar lá, por isso normalmente vinha de barco.

Um dia de chuva ela estava muito atrasada. O swami responsável procurava leite e não tendo encontrado nenhum perguntou ao seu assistente o que se passava. “A leiteira não apareceu hoje”, respondeu o assistente. “Porque não?” perguntou o swami.

“Não sei; ainda estamos à espera dela”, disse o assistente.

Duas horas depois apareceu a leiteira e o swami perguntou-lhe, “Porque estás tão atrasada hoje? Normalmente és tão pontual.”

“Oh, o rio estava muito cheio. Eu tive que esperar até a água descer um pouco e o barqueiro achar que já era seguro atravessar.” Então o swami disse, num tom brincalhão, “Ah, o que é isto? Tu vens até aqui, trazes-me o leite e às vezes até te sentas e ouves a minha palestra. Só com isso as pessoas atravessam o grande oceano da vida. E tu não podes atravessar aquele riozinho?” “Oh, peço desculpa! Eu nunca pensei nisso assim. A partir de agora irei lembrar-me.” E com estas palavras a leiteira voltou para a sua aldeia.

A chuva continuou a cair. E por isso, no dia seguinte, eles estavam à espera que ela se atrasasse de novo mas ela chegou à hora habitual. E todos os dias a seguir ela continuou a ser pontual. O swami admirava-se como ela conseguia ser tão pontual se o rio ainda estava tão cheio. Tendo-lhe perguntado, ela respondeu: “Swami, tu ensinaste-me a maneira. Agora eu sei como atravessar. Já não preciso de esperar pelo barco.” “O quê?”

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“Sim swami, eu não preciso de esperar pelo barco.” “Então como vens tu?”

“Eu penso em ti, o guru, e atravesso a pé.” “Tu caminhas realmente sobre as águas?” “Sim.”

“Sobre a água?”

“Não exactamente. A água sobe até aos meus tornozelos mas não sobe mais. Vê? A bainha do meu vestido nem se molhou.” O swami ficou muito desconfiado. “Eu gostaria de ver isso.”

“Claro. Porque não? Vem comigo; eu tenho que regressar agora.”

E assim foram até à margem do rio. A leiteira começou a atravessar o rio e chamou o swami, “Vem, vem lá.” O swami estava um pouco hesitante mas pensou que talvez resultasse se experimentasse e entrou na água. Quando começou a andar, a água começou a subir à volta dele. “Swami”, disse a leiteira, “só de pensar no teu nome eu consigo andar sobre a água e tu não consegues andar?” “Filha”, disse o swami, “Eu sou apenas uma escada. Eu posso ajudar os outros a subir mas eu próprio não posso subir. Tu tens fé e por isso consegues atravessar. Mas eu não tenho essa mesma fé, pura e infantil.” Virou-se e afastouse, sentindo-se muito envergonhado de ser apenas um estudioso e de apesar de ter estudado muita filosofia ainda não ter atingindo a Verdade.

Deus não pode ser sentido só por se falar de filosofia. Deus é a coisa mais simples na vida e deveria ser abordado de uma forma simples. A maneira mais simples é apenas ter fé. 48


O Rapaz Que Fez Deus Comer o seu Pudim á muitos anos atrás, no sul da Índia, vivia um Brahmin muito ortodoxo. Todos os dias passava muitas horas no culto matinal. Tinha um lindíssimo altar e aí costumava praticar uma grande puja (serviço de culto). Ao mesmo tempo havia uma pequena fraqueza na sua mente. Ele gostava muito de um certo tipo de pudim. Infelizmente a sua situação financeira não lhe permitia ter sempre o pudim. Mas ele queria tanto tê-lo que pensou num pequeno truque para o conseguir todos os dias. Normalmente durante uma puja, quando a comida é oferecida a Deus, corre-se uma cortina em frente do altar para permitir a Deus saborear a comida sozinho. Depois, após uns momentos, o pujari vai buscar a comida abençoada para a partilhar com todos os presentes. Ora o homem costumava pedir à sua mulher para fazer um pequeno pudim para oferecer a Deus na puja da manhã. Mas quando ia para trás da cortina, comia ele próprio a comida e depois, quando voltava, dizia à sua família que Deus tinha aceite o seu culto e tinha comido o pudim. Toda a família ficava muito contente pois pensavam que todos dias, Deus vinha e comia as suas oferendas.

Isto continuou durante vários meses. Até que um dia aconteceu que o homem tinha que se deslocar até uma aldeia distante para um acontecimento importante. Porque era um Brahmin ortodoxo queria que o culto matinal tivesse lugar na mesma em sua casa. Por isso chamou o seu filho pequeno que o costumava ajudar na puja e disse-lhe, “Filho, tens visto como eu faço a puja. Hoje eu não a vou poder fazer e gostaria que a fizesses por mim.” O filho respondeu, “Está bem, Pai. Fico contente com isso.”

E assim o pai partiu e o filho começou a puja. Como sempre a mãe trouxe um pequeno pudim e deu-o ao filho para que o oferecesse a Deus. No momento apropriado dutante a puja, o filho colocou o pudim no altar, correu a cortina 49


e saiu, à espera que Deus comesse o pudim. Após uns momentos o rapaz veio buscar o prato e, para seu grande horror, viu que o pudim ainda lá estava. E pensou, “Devo ter feito qualquer coisa muito errada. Deus não está contente com a minha puja; é por isso que se recusou a comer o pudim hoje. Eu pensei que estava a fazer a puja exactamente como o meu pai!” E gritou para Deus, “Por favor Deus, se o meu pai descobre que eu Te fiz passar fome, vai ficar tão zangado comigo. Por favor come o pudim!”

E o filho colocou de novo o prato, fechou a cortina e afastou-se para esperar. Quando voltou o prato ainda estava cheio. Caiu de joelhos em frente do altar e começou a chorar. “Deus, se Tu não comeres o pudim hoje e se o meu pai volta e descobre isso, vai-me matar! Por favor, come o pudim!” Verificou de novo e o pudim ainda lá estava. Desta vez começou a chorar tanto que desmaiou. Quando recuperou meia hora depois viu que o prato estava vazio. Começou a saltar de alegria. “ Oh, Deus estou tão feliz. Ouviste a minha prece. Agora posso dizer ao meu pai que Tu aceitastes a minha devoção também!” Com muita impaciência o filho esperou pelo retorno do pai. E finalmente o pai chegou muito tarde nessa noite. Assim que o rapaz o viu, correu ao seu encontro dizendo, “Pai, Pai, Deus aceitou a minha devoção também! Ele comeu o pudim tal como Ele faz contigo todas as manhãs. Primeiro recusou mas eu chorei e chorei e chorei e fiz com que Ele o comesse! “

Claro que o pai pensou que, de alguma forma, o rapaz tinha sempre sabido o que ele estava a fazer e que simplesmente tinha esperado por uma oportunidade para fazer a mesma coisa. E, por isso, questionou-o, “Tens a certeza de que Deus comeu o pudim?” “Sim, Pai, sem dúvida!”

“Muito bem. Nesse caso podes fazer a puja amanhã outra vez. Eu gostaria de ver isso.”

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“Está bem, pai. Se Deus comeu o pudim hoje, porque não iria Ele comê-lo amanhã também?”

No dia seguinte o rapaz fez a puja nas Deus não comeu o pudim. E então o rapaz começou de novo a chorar. Estavas prestes a bater com a cabeça no chão quando se ouviu uma voz: “Filho, não chores. Eu gostaria de aceitar a tua oferenda mas não o posso fazer em frente do teu pai. Ele não merece ver-me comer o pudim. Foi por isso que não o comi logo.” O pai ouviu a voz também. E caiu aos pés do seu filho dizendo, “Tu és o meu guru; tu abriste-me os olhos. Eu gostaria de ter a fé e devoção que tu tens. Eu sou apenas um erudito. Fiz a puja correctamente de acordo com as Escrituras mas não tenho a fé inocente que tu tens. Por isso Deus nunca realmente comeu o pudim que eu Lhe ofereci mas aceitou o teu.”

Mesmo o saber de cor todas as escrituras não nos vai trazer a graça de Deus. Deus não se interessa por aquilo que tu sabes; Ele quer o teu coração puro. Uma prece sincera vinda de um coração puro e cheio de fé nunca ficará sem resposta.

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Tu És Aquilo Que Comes m dia, na Índia, um swami foi convidado para almoçar em casa de um homem rico. Habitualmente quando um swami sai, alguns dos seus discípulos vão com ele. E assim todos foram e tiveram um almoço sumptuoso. Foi servido em pratos de prata, com talheres de prata, porque o anfitrião era um homem muito rico. No fim do almoço, o swami abençoou o homem e a sua família, despediu-se e deixou a casa com os seus discípulos.

Tinham andado já um quilómetro quando um discípulo, o mais novo, veio a correr ter com o swami. “Swamiji, fiz um erro terrível!”

O swami perguntou-lhe, “Porquê? O que fizeste?”

“Até tenho vergonha de te dizer porque eu nunca fiz nada assim!”

“Está bem”, respondeu o swami. “Não te preocupes; diz-me só o que foi.”

A mão do discípulo tremia ao tirar uma colher de prata do bolso. “Eu tirei isto de casa do homem”, confessou ele.

O swami sorriu para ele e disse, “Está bem. Tu ainda és novo; és um principiante na prática espiritual. Haverás de te tornar forte com o passar do tempo. Agora leva isso de volta e pede desculpa; nós esperaremos por ti.” Os outros discípulos questionaram o swami: “porque foste tu tão brando com ele? Não achas que devias ser mais rigoroso?” O swami disse, “Desta vez não. Sabem, não é inteiramente o erro dele.”

“Ele roubou a colher e tu dizes que não é erro dele! Como pode ser isso?”, perguntaram eles. Finalmente o swami explicou: “ Conhecem o homem que nos deu de comer? Dantes era banqueiro e costumava cobrar demasiado aos seus clientes. Por isso, de certa maneira, ele é um ladrão. Quando ele nos alimentou com a 52


sua comida, as vibrações do ladrão também vieram com a comida. Vocês são todos um pouco mais velhos e fortes e por isso não ficaram afectados. Mas o jovem discípulo foi afectado pela vibração e por isso tirou a colher.” Tu és aquilo que comes! As vibrações da comida que tu recebes irão afectar-te. Observa se a tua comida está limpa e se vem de uma boa origem.

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Como Parar Um Elefante ra uma vez um rei que tinha um grande elefante. Um ajudante costumava levar o elefante todos os dias até ao rio para tomar banho. Normalmente quando um elefante anda, não está sossegado e com a sua tromba, agarra todas as coisas que vê dos lados. Controlar um elefante pode ser muito difícil. Um dia, quando o ajudante trazia o elefante de volta para o palácio, um rapazinho veio direito a ele. Pegou na tromba nas suas mãos e disse, “Pára! Olha como andas!” O elefante parou. “Anda devagar, com cuidado”, disse ele ao elefante. Largou a tromba e o elefante começou a andar calmamente. No dia seguinte quando o elefante passou no mesmo sítio, o rapazinho veio a correr e parou o elefante para o repreender de novo. Isto aconteceu vários dias de seguida. O ajudante não podia acreditar no que se passava. Contou ao rei que enviou o seu ministro averiguar sobre o rapaz. Passados dias o ministro voltou para fazer o seu relatório. “Senhor, observei o rapaz. Vive com a avó. É apenas um rapazinho normal. Parece um rapazinho vulgar mas não tem medo nenhum. É por isso que ele consegue parar um elefante.” “Eu não acredito”, disse o rei. “O que queres dizer com isso?”

“Senhor, uma mente sem medo nem preocupação pode fazer tudo.”

O rei quis que o ministro provasse a sua opinião. A única maneira era fazer o rapaz preocupar-se com alguma coisa. Então o ministro foi ter com a avó do rapaz. Após ouvir que o rapaz tinha a permissão para fazer tudo o que queria, o ministro perguntou, “Já houve alguma vez que ele pedisse algo que lhe fosse recusado?” “Não. Eu sempre lhe dei tudo o que ele queria. Ele é apenas um rapazinho feliz e com sorte.” “Há alguma coisa de que ele tenha medo?” “Absolutamente nada.”

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O ministro queria provar a sua opinião ao rei e por isso disse, “Está bem. Quando o teu neto chegar hoje a casa dá-lhe a comida habitual mas põe menos sal do que costume. Se ele te falar nisso, diz-lhe que não tens bastante dinheiro para comprar mais sal e que tens de poupar o que te resta.” A avó concordou, “Se é isso que o rei quer eu faça, fá-lo-ei.”

Nessa noite quando o rapaz voltou para casa a avó serviu-lhe logo o jantar. Após umas garfadas, o rapaz disse, “Avó, o que se passa? A comida hoje não está saborosa.” “A avó repetiu o que o ministro lhe tinha dito para dizer e o rapaz respondeu, “está bem, avó. Eu vou-te arranjar algum sal.” Correu até à loja e pediu ao dono que lhe desse um pouco de sal. O dono explicou-lhe que não lhe podia dar sal sem receber dinheiro em troca. “Onde posso eu arranjar dinheiro?”, perguntou o rapaz. “Tens que trabalhar para isso.” “Eu não sei trabalhar.”

“Então não podes arranjar sal.”

O rapaz voltou para casa um pouco deprimido. “Avó, eu não sei o que fazer. O dono da loja quer que eu vá trabalhar para conseguir dinheiro para ele me poder dar o sal. E eu não sei como trabalhar.” “Não faz mal, querido”, disse a avó, “Vai dormir. Amanhã falamos sobre isso.”

O rapaz foi para a cama mas não dormiu toda a noite. Na manhã seguinte o elefante passou como de costume; e como de costume, o rapaz quis pará-lo mas não conseguiu. O elefante empurrou-o para o lado e continuou. Tudo o que o jovem rapaz tinha em mente era, “eu não consigo arranjar um pouco de sal para a minha comida.” Essa pequena preocupação era suficiente para lhe tirar toda a sua força. Nunca te preocupes com nada. A preocupação não traz nenhum benefício a ninguém. Por outro lado, diminui a tua energia e tira-te as tuas capacidades. Pelo contrário, mantém-te calmo e tranquilo e saberás sempre o que fazer. 56


O Leiteiro Ganancioso avia uma vez um leiteiro que vivia numa aldeia onde tinha duas vacas. Costumava ordenhar as vacas e levar o leite para vender na aldeia vizinha. Mas, com o passar do tempo, começou a tornarse ganancioso e começou a juntar água ao leite. Foi juntando sempre mais água até que já tinha o dobro da quantidade. Se tinha um litro de leite, juntava um litro de água e vendia-o como dois litros de leite.

O leiteiro fez isso durante muito tempo e finalmente chegou o dia de receber todo o dinheiro. Tinha 1000 rupias. Quando voltava para a sua aldeia começou a chover. O rio estava a transbordar e ele atou o saco do dinheiro à roupa com muito cuidado e começou a atravessar. Ao chegar a meio do rio, escorregou e caiu; mas lá conseguiu nadar até à outra margem. Imediatamente procurou o dinheiro. Abriu o saco e começou a contar. Só havia 500 rupias! Tinha perdido 500 no rio. O leiteiro estava sentado muito choroso quando se aproximou um homem sábio. “Pareces tão triste e despeitado”. E o leiteiro explicou como tinha perdido o dinheiro a atravessar o rio.

“Ah”, disse o homem sábio, “Eu percebo agora. És um leiteiro. Não te preocupes; ainda tens o dinheiro do leite. O dinheiro da água foi com a água; o dinheiro do leite ficou contigo.” Não é quanto fazes mas como fazes que é importante. Se alguma vez perderes dinheiro de repente, sabe que era dinheiro mal ganho. Dinheiro bem ganho irá trazer-te saúde e felicidade; dinheiro mal ganho nunca pode fazer isso.

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Podem Ter Tudo ma vez um rei decidiu pôr à prova os seus ministros. Pediulhes para levarem todos os seus bens para um parque para fazer uma grande exposição. Havia muitas coisas bonitas e valiosas. Colocaram um trono no meio e depois de se sentar, o rei anunciou:”Antes de o sol se pôr, todos poderão vir e escolher o que quiserem. Mas ninguém pode abandonar o recinto antes de eu o autorizar.” Todos correram para o parque e cada um pegou numa coisa. Enquanto escolhiam, apareceu uma mulher camponesa. Todos olharam curiosos por saber o que iria ela escolher. Ela avançou para o rei e disse, “Senhor, ouvi a vossa oferta. Tem a certeza de que está disposto a dar qualquer coisa dentro deste recinto?” “Sim, porque me questionas tu?” “Só queria ter a certeza.”

“Sim. Podes pedir o que quiseres neste parque.” “Bem, Senhor, é a si que quero.”

Todos ficaram chocados. “Como se atreve ela!” exclamaram.

Mas o rei explicou: “Eu, também, estou dentro do recinto. Todos vocês escolheram coisas mas ela escolheu-me a mim. Quem levar o rei automaticamente recebe o seu reino.” E virando-se para a mulher, disse, “Sim. Eu sou teu e também tudo aquilo que me pertence.” Não corras atrás de pequenas coisas insignificantes. Encontra a paz interior que é a imagem de Deus em ti e terás tudo. Como diz a Bíblia Sagrada, “Procura primeiro o reino de Deus e tudo o resto te será trazido.”

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A Conferência Sobre a Luz ma vez houve um grande encontro numa fábrica de velas. Todas as velas se juntaram, questionando o porquê de existirem. Uma das velas disse: “Bem, certamente que o nosso propósito é de dar luz. Deveríamos ter uma grande conferência sobre luz para discutir como isso pode ser feito.” E assim todas as velas vieram e leram comunicações sobre a luz e como era bom ficar iluminado. Mas, infelizmente estavam a ter a conferência em total escuridão porque nenhuma das velas estava acesa. Após terem passado muitas horas no escuro a discutir a luz, uma pequena vela cansouse. “Que conferência é esta afinal?” perguntou. “Não vamos a lado nenhum assim. Só falamos, mais nada. Vou até lá fora apanhar um pouco de ar.” E saiu da sala. Quando ia a andar pelo corredor reparou numa luz a brilhar num canto. “Oh”, exclamou a pequena vela, “estamos só a falar de luz mas realmente parece haver uma luz ali. Deixa-me ir ver.” Andou até à luz e viu uma outra vela acesa. “Senhora,” disse a pequena vela, “como conseguiste a luz?”

A vela acesa sorriu e disse, “Bem, se realmente queres saber, eu digote. Eu já fui uma vela apagada como tu. Mas um dia, encontrei uma vela acesa. Fui ter com ela e esfreguei-me nela. Ao esfregar-me apanhei uma centelha e fiquei acesa.” “Oh,” disse a pequena vela, “posso fazer isso contigo? “Claro que sim.”

“Mas, senhora, eu não quero tirar-te luz.”

“Não te preocupes com isso,” disse a vela acesa. “Por tu ficares com luz, eu não vou perder nenhuma luz. Eu ainda serei a mesma.”

A pequena vela ficou muito excitada. “Eu devo adorar-te, senhora?” 59


perguntou. “Devo queimar algum incenso ou pôr umas lindas flores?”

“Não precisas de fazer nada disso,” disse a vela acesa. “Vem só esfregarte. Podes ficar agradecida mas primeiro vem buscar a luz.”

E a pequena vela juntou toda a sua coragem e força e aproximou-se devagarinho da vela acesa. Apanhou uma centelha e gritou de alegria, “Agora também tenho luz. E tu tens ainda a mesma luminosidade. Não perdeste nada!” “Foi o que eu te disse que ia acontecer”, explicou a vela acesa.

“Ah, senhora”, disse a pequena vela, “há milhares de velas apagadas ali dentro. Posso me ir esfregar contra elas?”

“Claro. Agora podes fazer isso. És como eu agora; não há mais diferença. Vai.” A pequena vela voltou para a sala da conferência. Uma discussão acesa estava a ter lugar mas quando viram a vela todas pararam de falar. “Eh”, gritaram “onde arranjaste tu essa luz? Podemos também ter alguma?” A vela contou-lhes a história toda e acabou, dizendo, “Quem quiser luz venha-se esfregar contra mim.”

Imediatamente todas avançaram e se esfregaram contra a pequena vela. Finalmente a conferência sobre luz estava cheia de luz! Fazer simplesmente conferências sobre paz quando não existe paz no teu coração nunca trará paz ao mundo. Se quiseres partilhar alguma coisa com os outros, terás primeiro que a ter em ti. Encontra a paz interior e a tua mera presença trará paz aos outros.

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Os Dois Barqueiros á ouviram a história dos dois barqueiros? Sabiam remar mas não possuíam um barco. Um dia decidiram roubar um barco para poderem ir até uma aldeia vizinha. Esperaram até ao cair da noite e depois foram até ao rio. Para celebrar a sua aventura beberam primeiro um pouco. De facto começaram a estar bastante embriagados. Encontraram um barco, pegaram nos remos e começaram a remar. E cantaram e remaram toda a noite. A madrugada foi chegando e podiam ver pessoas a aproximarem-se do rio para se banharem. Estando as pessoas já mais perto um dos barqueiros reparou, “É estranho. Estas pessoas parecem conhecidas; são mesmo iguais às pessoas da nossa aldeia!”

O outro barqueiro disse, “As casas também parecem familiares! Eh! Parece que estamos no mesmo sítio! O que aconteceu?” Os banhistas perguntaram, “O que queres dizer com ‘o que aconteceu? ‘ o que estavam vocês a tentar fazer?”

O barqueiro respondeu, “Nós queríamos visitar a outra aldeia e planeámos voltar bem cedo. Por isso levámos o barco emprestado. Remámos toda a noite. Não percebemos como é que ainda aqui estamos.”

“Vocês, tolos!” exclamaram os banhistas. “Esqueceram-se de desatar o nó. Todo este tempo estiveram presos à margem. Podem ter remado toda a noite mas não foram a lado nenhum!” Para obter sucesso no Yoga precisas de prática e desapego. Podes praticar muito mas se não renunciares a amarras egoístas, nunca chegarás à meta.

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Uma Pedra Para Deus á uma história de um devoto de Lorde Siva de nome Sakkiya. Ele era um completo tolo e no entanto acabou por ser venerado como um santo. Um dia Sakkiya disse, “Todos adoram Deus com todo o tipo de oferendas: deitam leite, mel, ghi e iogurte; colocam gentilmente flores em frente da Sua imagem. Porque é que as pessoas usam todas estas coisas? Dizem que Deus está acima de tudo isto. Muito bem; eu vou venerar Deus com uma pedra. Todos os dias vou pegar numa pedra e atirála à Sua imagem e vamos ver se Deus me vai abençoar e mostrar-se ou não.” Sakkiya procedeu assim mesmo. Até fez um voto, “Não comerei de manhã até Lhe ter atirado uma pedra. Esta será a minha adoração!” Era prática comum não comer antes do culto porque com o estômago cheio não se pode venerar bem. Esta é a razão pela qual as pessoas jejuam em ocasiões especiais. Por isso Sakkiya fez o voto, “Eu atirarei uma pedra como veneração a Deus. Só então comerei.” E fez isso todos os dias.

Mas um dia algo aconteceu. Sakkiya não conseguia encontrar uma pedra. Procurou por todo o lado – encontrou apenas pedras enormes que não conseguia levantar. Correu por todo o lado mas não conseguiu encontrar uma pedra. Era uma grande prova mas mesmo assim ele cumpriu o voto. Os dias passaram; o seu estômago não conseguia estar quieto. Magoava-o muito. Começou a ficar muito fraco sem água nem comida por muitos dias. “Que tolo que eu sou,” disse ele. “Eu não sei porque fiz este voto. Mesmo assim devo cumpri-lo. Mas, meu Deus, estou a morrer…” E, ao dizer isto, desesperado agarrou a cabeça com as mãos. “O que é isto?” Cada dia as suas mãos tinham apanhado pedras por isso conhecia bem a sensação – algo redondo e duro. No instante em que sentiu a cabeça entre as mãos, pensou, “Ah, uma pedra.” Esqueceu-se de que era a sua cabeça. E imediatamente começou a puxá-la. Já não se importava mais com a própria vida. A sua única preocupação era que tinha que ter uma pedra para atirar. Quase a morrer, uma mão oculta deteve-o 63


e ouviu uma voz: “Meu bom devoto, Eu aprecio o teu voto e a tua devoção com um só objectivo. Tu querias fazer alguma coisa para o Meu bem e estás a tentar cumprir isso a todo o custo – até o custo da tua própria vida! Eu aceito a tua veneração e revelo-Me perante ti.” A história de Sakkiya prova que não importa a maneira como tu abordas Deus. Escolhe a maneira que quiseres; tem apenas um objectivo na tua devoção. E então experienciarás a realização de Deus.

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A Raposa e O Piolho ra uma vez uma raposa. Alguns piolhos pensaram que o pêlo da raposa daria uma bela floresta para viverem. Rapidamente, o seu corpo ficou coberto por milhares de piolhos. Era uma coisa terrível. A raposa coçava-se e esfregava-se mas não conseguia livrar-se deles. Um dia a raposa foi até a um lago para beber água. Ao por as patas da frente na água para começar a beber, reparou que as patas dentro do lago já não tinham piolhos. Os piolhos tinham subido pelo corpo acima por causa da água.

A raposa é um animal muito astuto. Pensou, “Ah, esta é a maneira!” Apanhou um pequeno pau, pôs uma ponta na boca e devagar, começou a entrar na água. Todos os piolhos começaram a subir pelas pernas acima para escapar da água. Quanto mais a raposa entrava na água, mais para cima os piolhos iam. Quando a água chegou à barriga da raposa, os piolhos moveram-se para as suas costas. Pouco a pouco a raposa entrou mais fundo até ter os piolhos todos na cabeça. Foi ainda mais fundo, até só ter o nariz e o pau fora da água. Os piolhos passaram para o pau; apenas alguns ficaram no nariz. Então a raposa respirou fundo, reteve a respiração e submergiu o corpo todo. Os poucos piolhos que restavam passaram para o pau. Nesse momento a raposa, simplesmente, deixou ir o pau. Os piolhos afastaram-se flutuando e a raposa saiu do lago totalmente liberta do incómodo. A prática espiritual é como simpáticos pauzinhos para nos vermos livres de todos os nossos “piolhos” – as nossas amarras e hábitos indesejáveis. Ajudam-nos a libertarmo-nos de tudo aquilo que nos prende, para que possamos obter a libertação.

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O Leão e a Ovelha ra uma vez uma leoa que, tentando escapar a um caçador, corria o mais que podia. Ela estava no fim da gravidez e enquanto fugia o bebé leão nasceu. Ela sabia que se parasse para se ocupar da cria seriam os dois mortos, por isso continuou a correr.

Perto de onde o bebé nasceu pastava um rebanho de ovelhas. E, naturalmente as ovelhas aproximaram-se. Ao verem a cria tomaram conta dela. O pequeno leão começou a beber leite da mãe ovelha e cresceu como um cordeiro. Começou a dizer: “Baa, baa, baa”, porque o que poderia dizer? Era tudo o que ouvia. As coisas continuaram assim durante algum tempo. O bebé leão cresceu e fez-se um belo leão mas, apesar de ter o corpo de um leão, agia como uma ovelha. Cero dia, um outro leão apareceu e começou a perseguir as ovelhas. No meio das ovelhas em fuga, o leão-caçador reparou num outro leão fugindo com o rebanho. Correu mais depressa e mordendo-lhe as costas fê-lo parar. “Que tolice é esta? Porque estás tu a fugir?”perguntou. “Baa”, foi tudo o que o outro leão disse. “Eh, amigo, tu não sabes quem és?” “Baa.”

O leão-caçador, incomodado por aquele comportamento de ovelha, agarrou no leão tímido pela juba e levou-o até um riacho ali perto. “Olha aqui! Vê quem tu és e pára de balir!” E ambos olharam para os seus reflexos na água. O leão que balia disse, “Eu sou como tu!” “Sim. Tu és um leão!” “Ah sim?”

“Sim. Olha bem.”

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E, enquanto ele olhava, a sua cauda ergueu-se no ar. Ficou levantada e imediatamente ele começou a rugir. Finalmente o leão tinha compreendido quem era realmente. Tal como o leão tímido nós, também, nos esquecemos da nossa verdadeira natureza. Fomos hipnotizados, de certa forma, desde o nascimento para pensar que somos seres limitados. Um dia iremos compreender que não somos nada menos do que a imagem de Deus. É isto chama-se o acordar espiritual.

O Demónio e o Cabelo Encaracolado ra uma vez um homem que queria realizar feitos extraordinários. Então foi para a floresta ter com um grande yogi que sabia todas as fórmulas de som a que nós chamamos mantras. E pediu ao yogi que lhe desse um mantra que lhe permitisse controlar um demónio. O demónio iria então obedecer-lhe e fazer tudo o que ele pedisse. O yogi disse, “Eu posso fazer isso mas tenho que te prevenir de uma coisa. Tens sempre que lhe dar trabalho ou ele irá devorar-te.”

O homem pensou, “Oh, há muito para fazer neste mundo. Posso arranjarlhe milhares de tarefas.” E, com muita certeza, respondeu, “Não te preocupes. Por favor dá-me o mantra.” E, então, o yogi iniciou-o. Depois o homem foi para um sítio retirado e começou a fazer japa (repetição) do seu novo mantra. Continuou a repeti-lo

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até ter criado a vibração que iria atrair o demónio. Finalmente, um enorme demónio apareceu. Até assustou um pouco o homem. “Mestre”, perguntou o demónio, “porque me chamaste? Dá-me trabalho.”

“Está bem. Constrói um grande palácio e enche-o com a mobília mais bonita.” Ele pensava que o demónio iria demorar bastante tempo a fazer tudo isso e que ele próprio poderia dormir um pouco enquanto o trabalho não estivesse acabado. Ele sentia-se muito cansado após ter feito toda aquela japa. Mas, de repente, o demónio apareceu de novo. “Senhor, o palácio está pronto. E agora?”

“O quê? Já? Hum… Bem, o que posso eu fazer só com um palácio? Preciso de ter uma centena de criados para tomar conta dele.” “Está bem.” E estalou os dedos. “Criados a trabalhar.” “E algumas viaturas?”

Snap! “Aqui estão belíssimos carros na garagem. Rolls Royces, Cadillacs, Thunderbirds – completos com condutores e depósitos cheios de gasolina.” “Bem, tenho fome”, disse o homem.

Snap! E ali estavam pratos delicados numa mesa e algumas criadas para servir. O homem estava perplexo. “O que é isto? No momento em que faço um pedido ele é imediatamente realizado. Nem sequer demora um segundo.” “E agora o quê?” perguntou o demónio. “Não posso ficar sem trabalho.”

O homem estava muito confuso e não sabia o que dizer porque o demónio nem lhe dava tempo para pensar. Tentou dar várias coisas para fazer ao demónio mas tudo ficava acabado muito rapidamente. E aí o demónio disse, “Se não me deres trabalho, terei que te comer.”

O homem foi a correr ter com o seu guru com o demónio atrás dele. E prostrou-se aos pés do yogi. “Oh, por favor, salva-me. Eu não quero mais este demónio. Ele faz tudo imediatamente e não o posso satisfazer.”

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“Filho, eu disse-te mas tu não me ouviste.”

“Por favor, não me faças um sermão agora, não é altura para conselhos. O demónio vem atrás de mim!” “Está bem, Eu vou tratar dele, não te preocupes.”

O yogi arrancou um cabelo encaracolado da cabeça e deu-o ao demónio. “Por favor endireita este cabelo e fá-lo aguentar-se, sozinho, em pé.” O demónio pegou numa ponta do cabelo numa mão e devagarinho com a outra mão foi endireitando o cabelo até chegar à outra ponta; depois largou para o cabelo se aguentar, esticado, sozinho. Mas como pode um cabelo encaracolado aguentar-se esticado só por si? Claro que tombou. De novo o demónio tentou e de novo o cabelo tombou. “Já acabaste?” perguntou o yogi.

“Não. Ainda estou a tentar,” respondeu o demónio.

O guru voltou-se então para o seu aluno e disse, “Sempre que quiseres um trabalho feito diz ao demónio para pôr o cabelo de lado e realizar o trabalho. Depois, quando ele tiver acabado o trabalho, pode voltar para o cabelo. Desta forma, o demónio vai ter sempre algo para fazer.” A mente pode fazer tudo e mais alguma coisa tal como o demónio – é por isso que é tão inquieta. Dá-lhe um cabelo encaracolado. O cabelo encaracolado é a tua japa. Sempre que a mente não estiver totalmente ocupada com qualquer coisa, deixa-a repetir o mantra. Dessa forma, estará sempre calma e sob o teu controle.

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O Poder de Maya evendra, o rei de todos os seres celestiais, ficou certo dia muito curioso acerca de maya, o poder da ilusão. Então, Narada, o devoto celestial de Lorde Narayana, apareceu-lhe. Narada viaja para todo o lado, por todo o cosmos, ajudando pessoas. Devendra perguntou-lhe: “Narada, por favor explica-me o poder de maya. Como é que ela afecta as pessoas? Ela engana toda a gente?” Narada respondeu, “Bem não é possível para mim explicar-te isso. Mas se quiseres experimentar por ti próprio, eu posso-te ajudar.” “Está bem, deixa-me experimentar um pouco.”

Sri Narada disse, “Está bem. Desce até ao mundo como uma pessoa vulgar. Vai viajar. Então poderás ver tudo e experimentar as armadilhas de maya.” E assim aconteceu que Devendra desceu até à terra e ao passar perto de uma aldeia viu alguns leitões. Estavam a chorar e ele perguntou-se porque seria. Olhou à volta e viu que havia um porco morto ali perto. E descobriu que era a mãe dos leitões. Tinha morrido de repente e os leitões não sabiam o que fazer. Nem sequer percebiam que a mãe estava morta e corriam por cima do seu corpo tentando beber algum leite. Tinham muita fome e porque não conseguiam beber leite, estavam a chorar.

Quando Devendra viu isto, imediatamente o seu coração transbordou de compaixão. “Oh, pobres coitados. Eu deveria fazer alguma coisa para os ajudar. Como posso eu ver isto e afastar-me? Mas a única coisa que os pode satisfazer é a mãe. Está bem, então, vou deixar o meu corpo e entrar no corpo da mãe porca.” Quando Devendra entrou no corpo da mão porca, a porca levantou-se como se estivesse a acordar de um sono. Imediatamente todos os leitões ficaram muito contentes. Começaram a correr às voltas e beberam muito leite. Ao ver a sua alegria, Devendra pensou, “Até eles crescerem, eu fico aqui. Porque se os deixo agora eles vão ter o mesmo problema de novo.” 71


Assim Devendra ficou no corpo da porca enquanto os porquinhos cresciam lentamente. Entretanto, a mãe porca encontrou um simpático macho e tornaram-se amigos e após um tempo tiveram outra leva de leitões e depois outra leva e depois mais outra. De cada vez, pelo menos uma dúzia ou mais de leitões nasciam. A família ia crescendo e Devendra estava tão feliz. “Oh, que bom!”, pensou ele, “olha para os meus filhos e os meus netos e bisnetos.” Os anos passaram. Todos os seres celestiais perguntavam, “O que aconteceu a Devendra? Onde está ele?” E começaram à sua procura. Quando Narada apareceu de novo, correram ao seu encontro e perguntaram-lhe, “Narada, o que aconteceu ao nosso rei? Disseste-lhe para ir fazer uma coisa e nunca mais o vimos.” “Ah, querem vê-lo?”

“Claro. Estamos sem rei e queremo-lo de volta.”

“Está bem, vou-vos mostrar onde está o vosso rei. Aí está ele,” disse Narada e apontou para a porca. “Como te atreves tu a apontar uma porca e dizer que é o nosso rei?” “Mas é o vosso rei.”

“Mas ele está a espojar-se na lama, está todo sujo e a comer todo o tipo de coisas nojentas. Não pode ser o nosso rei!” “Sim. Mas é Devendra.”

“Então temos que o ir salvar.”

Sem perder um momento, desceram todos à terra e suplicaram-lhe, “Devendra, por favor, o que estás a fazer nesse corpo de porca? Sai já daí!”

Mas Devendra limitou-se a fazer uns grunhidos de porco e respondeu, “porque me estão a incomodar? Eu sou uma grande mãe e uma grande avó. Olhem para a minha grande família. Eu não sei quem é esse Devendra de quem estão a falar. Eu estou muito feliz aqui. Acham que o vosso Devendra é assim tão feliz quanto eu?” 72


Os seres celestiais olharam para Narada e perguntaram. “Narada, o que é isto? Há alguma maneira de o libertar?”

“A única maneira é livrarem-se da família dele – matar todos os leitões. Talvez assim ele veja a verdade. Pode ser uma coisa um pouco cruel mas, se o querem salvar, não há outra maneira.” “Está bem”, concordaram eles. E assim começaram a matar todos os leitões, um após o outro. De cada vez que um morria, a mãe porca chorava, chorava e chorava. Mas os seres celestiais queriam mesmo tirar o seu rei do corpo da porca e por isso mataram todos os leitões. Depois mataram o pai porco. Por fim, só restava a mãe porca e os seres celestiais perguntaram-lhe, “Estás pronto para sair daí agora?” “O que querem dizer com ‘sair daí’? Tenho que encontrar outro homem para começar uma nova família. Porque é que mataram a minha família? Quem são vocês? Saiam já daqui!” Nesta altura, Narada disse aos seres celestiais, “Têm que fazer mais uma coisa. Cortem-lhe a cabeça.”

E eles cortaram a cabeça da porca. E o espírito saiu lá de dentro. Assim que se libertou, Devendra olhou à sua volta e disse, “O que faço eu aqui? Porque estão todos estes porcos mortos aqui? Porque me trouxeram aqui?” E os seres celestiais explicaram-lhe, “Senhor, estavas naquele corpo.”

“Eu, naquele corpo?! Que horror! Vamos embora. Eu não quero ficar aqui a ver tudo isto.” Então, Narada olhou para ele e sorriu, “Agora, Devendra, tu conheces o poder de maya.” O jogo de maya pode facilmente enganar-te. Enquanto estiveres apanhado por ele, irá parecer-te o paraíso. É por isso que a pessoa maior é aquela que conhece a sua verdadeira natureza e não se deixa cegar por prazeres ilusórios do mundo 73


Uma Verdadeira Entrega ma linda história na antiga epopeia Hindu, o Mahabharata, ensina-nos claramente o que significa verdadeira entrega a Deus.

Os Pandavas e os Kauravas da família real eram primos. Após a morte do pai dos Pandavas, todas as crianças foram criadas numa só casa. Quando cresceram, os Pandavas tornaram-se conhecidos e amados por todos pelas suas virtudes e valor, o que provocou o ciúme dos seus primos. O mais velho dos Kauravas, Duryodhana, não podia suportar a fortuna crescente dos Pandavas e decidiu tramar uma conspiração para os desonrar. Desafiou o mais velho dos Pandava, Yudhistira, para um jogo de dados no qual Yudhisthira perdeu tudo o que tinha, incluindo a sua mulher, a bela rainha Draupadi. Nesses tempos, quando se queria proclamar vitória sobre alguém, fazia-se algo que o desonrasse. Assim, Duryodhana resolveu arrastar Draupadi para a corte e despir-lhe o sari. Fazendo isto iria arruinar a reputação dos Pandavas.

Um sari é um pano de muitos metros que é graciosamente enrolado à volta do corpo e depois pregueado com dobras delicadas. O irmão de Duryodhana começou a puxar o sari de Draupadi e apesar de ela o agarrar firmemente, rapidamente ele conseguiu puxar uma volta e depois quase a segunda volta do sari. Draupadi estava muito assustada. Ela chamava por Deus na forma de Lorde Krihsna.

“Krishna, Krishna!” gritava ela, mas os seus gritos não recebiam resposta. Mais um minuto e o sari estaria todo desenrolado. A sua força nunca poderia igualar a força do seu assaltante. Dando-se conta da situação, pensou para si própria, “Esta é a última volta do meu sari. Se eu a perder também, ficarei desgraçada.” E nesse momento veio-lhe uma grande realização: “O que estou eu a fazer? Não posso mais tomar conta de mim. Lorde Krishna, se tu queres que eu encare esta desgraça, eu aceito-a. Eu confio inteiramente em ti; a minha vida está nas tuas mãos.” E com isto, largou o sari e erguendo as mãos, gritou: “Krihsna!” 74



Draupadi apenas ficou ali chamando e chorando pelo seu amado Senhor enquanto o irmão de Duryodhana puxava, sem mercê, a última volta do seu sari. Mas à medida que puxava, mais pano vinha. Depois da última volta, havia mais uma, e outra e ainda outra. Ele puxou mais e parecia que o sari não tinha fim. Ele continuou a puxar e a puxar. Metros e metros de sari pareciam surgir do nada. Até que o irmão de Duryodhana ficou exausto e não podia puxar mais. Draupadi estava salva! Mesmo Deus não pode vir em tua ajuda enquanto sentires que podes tomar conta de ti próprio. Entrega-te completamente e depende inteiramente de Deus.

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O Puzzle m homem de negócios estava em casa a ter uma reunião com os seus parceiros. Sua filha, uma inteligente menina, estava constantemente a interrompê-los com todo o tipo de perguntas. O homem queria entretê-la para poder continuar com a sua reunião. Olhou à sua volta procurando algo que a divertisse e reparou num mapa do mundo numa revista. Pegou no mapa, cortou-o aos pedacinhos e deu-lhos. “Filha”, disse ele, “Sei que estudas geografia. Aqui tens todos os pedaços de um mapa. Tenta reconstitui-lo.” Sem qualquer hesitação, ela respondeu, “Está bem, pai, vou fazer isso.”

A menina pegou no mapa, sentou-se a um canto da sala e começou a examinar os pedaços. Ela realmente não sabia muito acerca de geografia por isso estava só a olhar para as várias linhas com nomes escritos em pequenino aqui e ali. Era muito confuso. Passado um bocado, aconteceu que virou um dos bocadinhos e viu uma pequena parte de um nariz. Virou outro bocado e viu um dedo. No terceiro pedaço havia um dedo de pé. Então começou a virar todos os pedaços e descobriu que estava a olhar para as diferentes partes do corpo humano.

Era muito fácil para ela juntar de novo o corpo humano, porque ela sabia para onde deviam ir os olhos, o nariz, os braços. Assim, juntou-os todos, colocou uma folha de cartão por cima e, com muito cuidado, virou o todo. Do outro lado estava a imagem do mundo, toda intacta. Correu para o pai, anunciando alegremente, “Olha, pai, já está tudo junto de novo.” O pai nunca tinha esperado que ela fizesse o puzzle tão depressa. E disselhe, “Filha, eu pensei que tu sabias muito pouco de geografia. Dei-te o puzzle

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para fazeres porque queria que tu estivesses entretida durante um tempo. Como conseguiste tu fazê-lo tão depressa?” E a filha disse, “Foi fácil, pai! Vira-o e olha para o outro lado.” O pai virou o puzzle e viu a figura humana.

A filha sorriu. “Agora vês, pai! Eu juntei o homem e, automaticamente, o mundo ficou inteiro de novo!” Endireita o individual e endireitarás o mundo também. A melhor maneira de trazer verdadeira paz para o mundo é encontrando primeiro paz dentro de ti e depois partilhá-la com todos.

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O Mundo É A Tua Projecção ri Ramakrishna conta esta linda história acerca da natureza da mente.

Várias pessoas caminhavam de manhã cedo quando viram um homem deitado à beira da estrada. A primeira pessoa que passou por ele disse, “Deve ter passado a noite toda a jogar no casino; não conseguiu chegar a casa e adormeceu na estrada. Os jogadores são sempre assim.”

A pessoa seguinte a passar disse, “Pobre homem, deve estar mesmo doente. Bem, provavelmente é melhor não o incomodar”. E afastou-se.

A terceira pessoa disse, “Hum! Homem sujo, nem sabias quanto beber. Alguém te deve ter oferecido whisky de graça. Bebeste demais e agora nem consegues levantar-te.” A última pessoa disse, “A um santo, nada importa. Mesmo se estiver deitado no chão, estará a comunicar com Deus. Bem, provavelmente, está acima da consciência física. Não o vou incomodar.” Fez uma vénia ao homem e seguiu caminho.

Todos os quatro viram a mesma pessoa, mas cada um deles o viu de forma diferente, porque cada um deles projectou algo de si próprio. O mundo inteiro não é mais do que uma projecção tua. É baseado nos teus pensamentos e atitudes mentais. Se houver inferno na tua mente, não verás o céu em nenhum lugar. Se houver o céu na tua mente, até o inferno será o céu para ti.

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Deus ou Cão? ra uma vez um homem que, todos os dias, rezava a Deus desta maneira, “Oh Deus, eu quero que Tu venhas em pessoa partilhar uma sumptuosa refeição comigo.” E porque ele pedia isto continuamente, Deus apareceu um dia e disse, “Está bem. Eu venho.”

“Deus, eu fico tão feliz”, disse o homem. “Quando podes vir? Tens que me dar algum tempo para eu preparar tudo.” “Está bem”, disse Deus. “Virei na sexta-feira.”

Antes de Deus se ir embora, o homem perguntou, “Posso convidar os meus amigos?” “Claro”, disse Deus e desapareceu.

O homem estava muito excitado. Convidou toda a gente de quem se lembrou, dizendo, “Deus, Ele próprio, vai vir almoçar a minha casa!” E começou a fazer os preparativos para todo o tipo de pratos deliciosos. Ao meio-dia de sexta-feira, tudo estava pronto. Uma enorme mesa, estava especialmente decorada. Havia uma lindíssima grinalda de flores bem cheirosas e água de rosas para lavar os pés de Deus quando Ele chegasse. Ele chegou. Todos os amigos do homem estavam presentes. O homem sabia que Deus era pontual por isso quando o relógio começou a bater as badaladas do meio-dia, disse, “Hum, o que terá acontecido? Deus não pode vir atrasado. Os homens podem-se atrasar mas Deus não.” Estava perplexo mas decidiu esperar mais meia hora para ter a certeza de que Deus não vinha. Mesmo assim, Deus não apareceu. Os convidados começaram a troçar dele, “Tolo que és! Disseste que Deus vinha. Nós sempre duvidámos. Porque viria Deus almoçar contigo? Vamos embora!”

O homem gritou, “Não, por favor, esperem mais uns minutos!” Mas ao entrar na sala de jantar para verificar de novo viu, com grande horror, um enorme cão preto no meio da tão sofisticada mesa, a comer com grande gula tudo o que estava à vista. 80



“Oh, não!”, gritou o homem. “Deus sabia que o cão vinha profanar a comida. Por isso é que Ele não a quis comer.” E pegou num grande pau e começou a bater no cão com muita raiva. O cão ganiu e fugiu.

“Bem, o que posso fazer agora?” perguntou o homem aos seus convidados. “Agora nem Deus nem vocês podem comer esta comida que foi conspurcada por um cão. Eu sei que foi por isso que Deus não veio.” Lentamente, todos saíram. O homem sentiu-se tão mal que foi até ao seu altar e começou a rezar. Passados uns momentos ouviu um som de gemido. Abriu os olhos e viu Deus à sua frente. Mas Deus estava coberto de pensos e ligaduras. A Sua face estava coberta de golpes e nódoas negras. “Oh Senhor! O que aconteceu?”, perguntou o homem. “Deves ter tido um terrível acidente.” “Não foi nenhum acidente”, disse Deus, “foste tu!” “Porque dizes que fui eu?”

“Porque eu vim pontualmente ao meio-dia e comecei a comer toda a deliciosa comida. E tu vieste e começaste a bater-me. Aleijaste-me e partiste-me os ossos.” “Mas Tu não vieste!”

“Tens a certeza de que ninguém estava comer a tua comida?”

Bem, sim, estava lá um horrível cão preto. Estava em cima da mesa a devorar tudo. Eu bati-lhe e mandei-o embora. Eu tinha a certeza de que Tu não viestes porque sabias do cão.”

“Quem pensas tu que o cão era a não ser Eu? Eu queria realmente gozar a tua comida. Quem melhor do que um cão pode apreciar e comer muita comida? Por essa razão decidi vir sob a forma de um cão.” Por fim o homem compreendeu. Caiu no chão e implorou perdão a Deus.

Tudo é Deus. Não procures Deus apenas no altar ou no Céu. Vê Deus em toda a criação e serve-o em todas as formas à tua volta. 82


Quando Verás Tu Deus? m jovem foi ter com o grande santo Sri Ramakrihsna e disse-lhe, “Senhor, eu quero ver Deus agora mesmo!”

Sri Ramakrishna respondeu-lhe, “Antes de veres Deus, irás tomar banho no Ganges.” Levou o jovem até ao Ganges e disselhe, “Muito bem, mergulha”. Mas quando ele mergulhou, Sri Ramakrishna empurrou-lhe a cabeça para debaixo de água. Imediatamente o devoto começou a debater-se para respirar. Quando sentiu que o jovem já não aguentava mais debaixo de água, Sri Ramakrishna soltou-o.

Enquanto o jovem recuperava a respiração sentado na margem do rio, Sri Ramakrishna perguntou-lhe, “Em que estavas a pensar quando estavas debaixo de água? Estavas a pensar no teu dinheiro, na tua mulher, no teu filho, no teu nome, na tua reputação, na tua profissão?” “Eu só conseguia pensar em ter ar!”

“Muito bem! Quando tiveres esse tipo de ânsia por Deus, irás logo vê-Lo.” Para poder realizar Deus, precisas de um anseio total, dirigido num só sentido. Por isso se ainda não vês Deus, sabe que a mente ainda está a desejar outras coisas.

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A Iluminação do Rei Janaka izem as Escrituras que a verdadeira iluminação pode acontecer no espaço de tempo que seria necessário para um bom cavaleiro, já com o pé no estribo, montar o seu cavalo. Numa fracção de segundo podes encontrar a Verdade. O rei Janaka queria conseguir esse tipo de revelação e assim convidou todos os sábios e santos, todas as pessoas instruídas que o poderiam ajudar a ter essa experiência, a vir para a sua corte. Muitas pessoas de valor vieram e citaram as escrituras, mas mesmo assim Janaka não conseguia ter a experiência que procurava. Um dia, um santo de nome Ashtavakra chegou àquela região. Ele já era santo mesmo antes de nascer. Verdade! Enquanto ainda estava no ventre da mãe, ouviu o seu pai fazer muitas preces e rituais, mas com muitos erros. A criança não conseguiu conter o riso. O pai olhou à volta e pensou, “Quem poderá estar a rir de mim?” E depressa percebeu que era o rapazinho dentro do ventre. “Tu, diabinho!”, disse ele, “ainda não vieste cá para fora e já começaste a criticar-me! O que é que eu estou a fazer mal?” Ashtavakra respondeu de dentro do ventre, “Pai, não estás a recitar correctamente; estás a fazer tantos erros.”

“Meu Deus,” disse o pai, “já me estás a envergonhar. O que irá acontecer quando saíres cá para fora?” E mesmo sendo um grande homem, num ataque de zanga, o pai rogou uma praga ao filho com estas palavras: “Quando saíres do ventre, todos se irão rir de ti. O teu corpo será tão distorcido quanto possível – vai estar dobrado de oito maneiras. De cada vez que deres um passo, o teu corpo vai-se dobrar todo.” E foi assim que ele ficou conhecido como Ashtavakra, que significa “oito dobras”.

Ashtavakra ouviu falar da situação do rei e foi até ao palácio. Quando tentou entrar, os guardas começaram a rir-se dele, perguntando, “O que vais tu fazer ali dentro?” E duvidaram da sua capacidade por causa do seu corpo tão estranho. 84


“Eu tenho que ver o rei; venho ajudá-lo”, disse Ashtavakra.

De novo eles riram-se dele. Astavakra olhou para eles com piedade e disse, “Bem, provavelmente, é por isto que vocês estão aqui fora e não sentados lá dentro. Pobres coitados.” Quando Ashtavakra olhou para eles deste modo, assustaram-se. E, afastando-se, deixaram-no passar.

Infelizmente, enquanto caminhava para o rei, todos na corte se riram também. Ashtavakra ignorou-os, indo directamente ao assunto. “Maharaj,” disse ele, “ouvi dizer que tem um problema.” Imediatamente Janaka o reconheceu. Levantou-se do trono, recebendo Ashtavakra com todo o respeito e certificando-se de que estava sentado confortavelmente. “Sim, senhor,” retorquiu, “esta é a minha dúvida: as escrituras dizem que a sabedoria suprema pode ser conseguida numa fracção de segundo. Eu quero realmente experimentar isso mas ninguém parece ser capaz de o fazer para mim.” “Ah! Quer realmente experimentar isso?” “Sim, quero.”

“Muito bem. Eu posso, certamente fazer isso mas terá que ser apenas entre nós os dois. Não penso que estes carniceiros possam compreender alguma coisa. Por favor, peça-lhes para saírem da sala.

Chamar a alguém “carniceiro” era um grande insulto e as pessoas reunidas na corte ficaram muito zangadas. “Como te atreves a chamar-nos carniceiros?” exclamaram eles. Mas Ashtavakra respondeu calmamente, “Não se zanguem; estou apenas a dizer a verdade.” Os outros exigiram uma explicação para esta afronta e Ashtavakra respondeu-lhes: “Qual é a natureza de um carniceiro? Se lhe trouxerem uma cabra, o que verá ele na cabra? Procurará a alma? Não. O seu 85



interesse é apenas na forma física e no peso da cabra. O carniceiro não se interessa pelo espírito da cabra. O que fizeram vocês quando eu entrei na sala? O que foi que viram que vos fez rir?” Quando ele disse isto, todos compreenderam o seu erro. “Sim, apenas vimos o corpo.”

“Pois, não me viram a mim; viram o corpo. O corpo consiste em ossos e carne. Vocês só estão interessados em carne e ossos; então qual é a diferença entre vocês e um carniceiro? Podem sair agora, não servem para nada.” E eles deixaram a sala, muito envergonhados. Depois Ashtavakra perguntou ao rei o que já tinha lido. Janaka disse, “As escrituras dizem que se eu for um bom cavaleiro e tiver um pé no estribo, no momento em que for a passar a outra perna por cima do cavalo, deverei ficar iluminado.” “Muito bem”, disse Ashtavakra, “vamos seguir exactamente as escrituras. Por favor, tragam-nos um cavalo. Muito bem. Agora põe-te assim. Estás pronto?” “Sim, Estou preparado,” disse Janaka.

“Bem. Agora, leste o verso a esse nas escrituras? Qual era o verso anterior nas escrituras? “

“O verso anterior dizia que quando ouvisses a instrução, ficarias iluminado.” “E qual era a qualificação necessária para ouvir a instrução?”

“As escrituras dizem sannyastam, ou renúncia. Ao renunciar a tudo, tornaste apto para ouvir a Verdade.” “Ah, então também leste isso. Muito bem. Tendo lido isso estás pronto? Renunciaste a tudo?” “Oh”, fez Janaka, “Desculpa. Eu não fiz isso.”

“Então como queres ficar iluminado? Tens que renunciar a tudo aquilo a que chamas teu. Ou, por outras palavras, removeres-te de todas essas identificações: ‘Eu sou o rei’, ‘Eu sou um homem’, ‘Eu sou isto’, ‘Eu sou aquilo’. Separa-te de 87


tudo isso. Podes me dar tudo a mim. Será a tua oferenda ao guru. Dá-mas todas, uma por uma.”

“Está bem”, concordou Janaka. “Eu dou-te o meu reino. Eu dou o meu corpo. Eu dou a minha inteligência. Eu dou o meu ego.”

E então Ashtavakra perguntou, “Estás pronto a ouvir a Verdade?” Mas não houve resposta. Ele nem podia ouvir o que o professor dizia. Janaka estava ali sem sequer dizer, “Sim, senhor.” Realmente, até dizer “ele estava ali “é errado. O corpo estava ali. Ele tinha-se removido de todas essas identificações. Ele tinha-se tornado o puro “Eu”, mais nada. Neste ponto, Ashtavakra disse, “Está bem, agora eu sei que tu deste tudo. Tu és o puro ‘eu’. Mas, infelizmente, como puro ‘eu’ não serves para nada. O espírito precisa de um corpo, uma mente e um intelecto para poder funcionar. Até para me ouvir precisas de ter um pouco de ego e o sentido de audição; por isso eu devolvo-te isso. Mas lembra-te, tu deste-me tudo e eu dou-tos de volta. Não são teus; estou só a emprestar-tos. Agora faz uso do teu corpo e da tua mente e salta para o cavalo.” E saltando ele, Ashtavakra disse, “Tu és Isso! Tu és essa Felicidade Suprema! Tu és a Paz Suprema! Tu és esse Brahman!” E nesse instante, o rei Janaka realizou a Verdade. O “Eu” mundano deve renunciar a tudo e tornar-se o puro “Eu”; em vez de se identificar com o corpo e a mente, deveria isolar-se. Feito isto, podes realizar a Verdade. E depois, enquanto estabelecido na Verdade, podes usar o corpo e a mente ao serviço a humanidade.

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Quem Sou Eu? á uma história dos Upanishads que nos fala do rei dos deuses, Indra e do rei dos demónios. Nessa história, Indra representa o indivíduo refinado, mais desenvolvido espiritualmente enquanto que o rei dos demónios representa alguém que ainda não se purificou. A história conta o seguinte: Cera ocasião, Indra, rei dos deuses, e o rei dos demónios foram ter com o mesmo professor. E ambos fizeram a mesma pergunta: “Mestre, por favor, dizme quem eu sou.”

O professor deu a mesma resposta a ambos. Disse-lhes, “Vão até ao poço, olhem para baixo e vejam o que está reflectido na água.” Assim, ambos foram até ao poço, olharam, e cada um deles viu o seu reflexo físico. Imediatamente, ambos disseram, “Isto sou eu!” e voltaram para casa.

O rei dos demónios começou a enfeitar, a adorar e a satisfazer o seu corpo de todas as maneiras. Dormia bem, comia bem e permitia a todos os seus sentidos tudo aquilo que queriam. Indra, por seu lado, começou a questionar. “Como posso Eu ser aquilo? Sim, eu vi o reflexo do meu corpo mas eu li nas escrituras que o Eu nunca muda. É eterno, sempre puro, sempre limpo. Nunca nasce, nunca morre. Mas um corpo nasce, morre e entretanto muda a cada minuto. Como pode isso ser o Self ? Penso que fiz um erro. Não percebi bem. Vou lá voltar e perguntar.” Nesta altura já tinham passado alguns anos. Indra foi ter com o Mestre de novo. O Mestre perguntou: “Quem é que faz agora a pergunta?” “Bem, a mente”, respondeu Indra. “Então, isso és tu. Vai, agora!”

Indra voltou para casa. De novo se pôs a pensar e a pensar. Doze anos passaram. Ele analisou: “Eu não vejo também como a mente possa ser o Eu. 89


Por vezes ela é muito louca. Não é sempre a mesma. Flutua, excita-se, fica deprimida, esquece. Há muitas mudanças na mente. Isso não pode ser o Self. Acho que devo voltar para o professor de novo.” Desta vez, o Mestre disse, “Quem observa a mente a passar por todas essas mudanças? Isso é o Self.”

Indra voltou para casa, contemplou e compreendeu, “Sim, Isso nunca muda. Isso é sempre a testemunha de tudo. Isso é quem eu sou.” O Self é o eterno, O que nunca muda. Tudo aquilo que muda como o corpo e a mente, nunca pode ser o Self. Uma vez que nós realizamos o nosso verdadeiro Self, veremos o mesmo Self em todo o lado e experimentaremos a Unidade.

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Deixa o Sol Brilhar Cá Dentro ra uma vez uma menina que não queria estar ao sol e por isso disse, “Vai-te embora, sol, eu não te quero!” Entrou para dentro de casa, fechou todas as portas e janelas, sentou-se no escuro e começou a amaldiçoar o sol: “Eu não te quero ver mais! Nem te atrevas a entrar na minha casa!”

Passado um bocado, a menina abriu devagarinho a porta mas o sol começou a tentar entrar. A menina gritou, “Não! Vai-te embora!” e bateu com a porta na cara do sol. Um pouco mais tarde abriu a porta de novo e de novo o sol entrou. A menina gritou, “O que é isto? Não tens vergonha? Não tens nenhum orgulho? Eu estou a insultar-te. Não ficas ofendido? Porque não ficas longe? Porque queres tu entrar na minha casa?”

O sol sorriu e disse: “Essa é a minha natureza. Se alguém abre a porta, eu entro. Eu não espero pelo teu convite e não fico ofendido com os teus insultos. Preciso apenas de uma porta aberta. Se a porta se abre, mesmo que não me queiras, não podes impedir-me de entrar.” Deus é como o sol, brilhando igualmente sobre todos. E tal como o sol, Deus está sempre ali por detrás da porta do teu coração. Se tu abrires essa porta, mesmo só um bocadinho, Deus entrará a brilhar.

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O Karma do Homem Pobre ra uma vez um homem muito, muito pobre. Por causa da sua pobreza começou a apelar a Deus. E dizia, “Oh Lorde Siva” Oh Mãe Parvati! Por favor ajudem-me!” E começou com o hábito de repetir os nomes de Siva e de Parvati.

Um dia caminhava pela estrada. Nessa mesma altura, Lorde Siva e Mãe Parvati também estavam a dar um passeio e ouviram-no. Viram-no a tropeçar pela estrada fora, com um ar muito fraco. Como mãe, Parvati sentiu compaixão por ele e perguntou a Lorde Siva, “Não vês aquele homem? Ele é um dos nossos filhos. Acho que já sofreu tanto. Devíamos ajudá-lo.”

Siva respondeu, “Porque me pedes a mim? Tu és a Mãe de todo o universo. Porque não fazes tu qualquer coisa?” “Mas eu quero saber o que tu achas; devemos fazer algo por ele?”

“Bem,” disse Lorde Siva “ele está a limpar o karma com este sofrimento. No seu último nascimento ele tinha muito dinheiro mas nunca deu um cêntimo para a caridade. Ele nunca ajudou as pessoas pobres. Nunca ajudou alguém que quisesse ter uma boa vida. Gastou todo o seu dinheiro a jogar e a beber, em todo o tipo de luxos e de divertimentos sensuais. Explorou muitas pessoas e cometeu muitos crimes. Fez sofrer muita gente. Por isso, naturalmente, é pobre agora. Tem que passar por este sofrimento; o que posso eu fazer? É o seu destino. Ele não está pronto para receber a tua ajuda agora. Quando chegar o momento certo, ele irá certamente receber ajuda.” “Oh, mas eu sinto que ele já sofreu demais,” disse Parvati. “Não vês que chama constantemente por mim e por ti? Não podes pôr o karma de lado?” “Está bem, então,” disse Siva, “vai lá tentar.”

Parvati ficou muito feliz. Imediatamente pegou num monte de moedas de ouro e deixou-as cair na estrada, uns cem metros mais abaixo. “Não lhas quero dar directamente,” disse ela. “Desta maneira ele vai vê-las e pensar que 92



encontrou um grande tesouro.” E ficaram os dois à espera de ver o homem ficar muito feliz ao encontrar o dinheiro.

Todo este tempo, o homem estava a andar. De repente, veio-lhe um pensamento: “posso ser muito pobre e sofrer muito, mas, no entanto, não serei eu muito melhor do que muitas outras pessoas? Tantas pessoas têm deficiências. Um homem cego nem poderia andar como eu. Deixa-me cá imaginar como seria se fosse cego…”. E, pegando num pau, fechou os olhos e andou cento e cinquenta metros, fingindo ser cego. Depois, largando o pau, exclamou, “Deus, obrigada por me teres dado olhos para que eu possa ver! Eu aceito o meu sofrimento. Estou muito melhor do que se fosse cego.” E continuou pela estrada fora. Parvati olhou para Siva e Siva olhou para Parvati. “O que dizes agora, Parvati?” perguntou Siva. “Querido, tens razão. Mesmo se quisermos dar alguma coisa, isso não é suficiente; uma pessoa tem que o merecer.” Deus é misericordioso; Ele não está cá para nos castigar. Se passarmos por sofrimento, é devido ao nosso próprio karma. Sem purgarmos o nosso karma e até o fazermos, mesmo se alguém quiser ajudar-nos, não seremos capazes de receber essa ajuda.

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A Peregrinação entenas de milhares de pessoas iam em peregrinação a um lugar sagrado. Naqueles tempos não podiam ir de carro ou de avião, todos tinham que andar. Pelo caminho, um senhor estava sentado a observar os peregrinos. De repente, viu um homem estranho a passar, com um ar feio e rude. Parou-o e perguntou, “Eh, quem és tu? Não pareces ser um peregrino.” “Senhor, como me podes ver? Nunca ninguém me pode ver.”

“Isso não importa. O facto de te estar a perguntar significa que te estou a ver. Por isso, diz-me, quem és tu?” “Sou o Mensageiro da Morte.” “E para onde vais?”

“Vou para o lugar santo da peregrinação.” “Ah, estou a ver. Vais orar ali?”

“Não, senhor, essa não é a minha atarefa. Vou ali cumprir a minha tarefa.” “Qual é a tua tarefa?”

“Deus enviou-me para levar algumas vidas. Algumas pessoas têm que deixar os seus corpos e a peregrinação vai fornecer uma boa desculpa para isso. As condições sanitárias não serão muito boas por isso as pessoas podem facilmente ficar doentes.” “Então, o que vais tu fazer exactamente?”

“Bem, vou criar uma epidemia de cólera.” “Quantos vais tu matar?”

“Disseram-me para levar quatrocentas e cinquenta pessoas.”

“Muito bem. Se Deus te disse para fazer isso, então terás que o fazer. Vai lá fazer o teu trabalho, então.” 95


E o homem com um-ar-esquisito continuou o seu caminho. Quando acabou a celebração santa, todos os peregrinos regressaram pela mesma estrada. De novo, o senhor estava lá sentado, observando os peregrinos à medida que passavam. Perguntou a alguns deles, “Como correu tudo?” “Tudo correu bem,” responderam “mas, infelizmente, houve um surto de cólera e muitas, muitas pessoas morreram.” “Ah sim?, E quantas pessoas morreram?” “Aí umas mil e quinhentas.” “O quê?”

“Sim, senhor; mil e quinhentas morreram. Não viu os jornais?”

“Bem”, pensou ele, “deixa-me esperar pelo Mensageiro da Morte e ver o que ele tem a dizer.” O senhor ficou à espera com atenção e quando viu o homemcom-ar-esquisito a aproximar-se, chamou-o, “Eh, pára aí! És o mesmo homem com quem falei anteriormente e que ia para o local sagrado?” “Sim, senhor.”

“E o que me disseste tu?”

“Que eu ia na peregrinação para tirar algumas vidas.” “Quantas vidas disseste tu?”

“Quatrocentas e cinquenta.”

“Sabes quantas pessoas morreram?” “Sim, senhor; eu sei.” “Quantas?”

“Mil e quinhentas.”

“Como pudeste tu fazer tal coisa? A tua tarefa era apenas levar quatrocentas e cinquenta pessoas.” “Senhor, eu fiz a minha tarefa apenas. Eu matei quatrocentas e cinquenta pessoas.” 96


“Então como morreram as outras todas?”

“Morreram por medo. Eu não sou responsável por isso. Elas mataram-se.” O nosso pior inimigo é o medo. Uma pessoa que vive com medo morre a cada minuto. Sê corajoso e diz, “Aquilo que tiver de acontecer, acontecerá; para quê ter medo disso?” O que quer que seja, não temas.

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O Horóscopo ra um dia de felicidade para o rei! Após muitos e muitos anos à espera de um herdeiro, a rainha tinha finalmente dado à luz uma criança. Imediatamente o rei chamou todos os astrólogos para prever o seu futuro. Muitos grandes astrólogos vieram para estudar o horóscopo do menino. Cada um deles estudou o mapa. Os sinais eram bastante claros. “Senhor”, disseram os astrólogos, “o vosso filho não é um menino bom. Por causa dele, ireis morrer quando ele atingir os dez anos de idade. De certa maneira, ele veio para vos matar.” O rei ficou furioso. “Demónios! Nem sabem traçar um horóscopo! Levemnos para a prisão!”

Um dia, um astrólogo vindo de longe chegou ao reino. Quando o rei teve conhecimento disso mandou chamar imediatamente o astrólogo e pediu-lhe para ver o mapa astral do filho. O astrólogo estudou cuidadosamente o mapa e, por fim, disse, “Eu nunca vi um mapa assim. É um horóscopo muito forte. O vosso filho irá viver uma longa vida e será um grande rei. Viverá ainda mais cem anos após a vossa morte.” Ora, este astrólogo era um homem muito esperto. Ele tinha lido o mapa como os outros, mas apresentou a sua informação de uma maneira completamente diferente.

O rei estava encantado. “Cubram este homem de presentes. Ele é um grande astrólogo. Se quiseres alguma coisa, é só pedir.” “Sim”, disse o astrólogo, “Tenho um pedido.” “Com certeza. Qual é?”

“Por favor liberta os outros pobres astrólogos. O seu único crime foi não serem muito espertos. Eles sabem calcular mas não sabem comunicar.” A mera educação não chega. Deverias saber como lidar com as pessoas, como comunicar, como viver em harmonia com os outros. E então poderás ter verdadeira paz e alegria na vida. 98


Levando um Burro para o Mercado ra uma vez um homem idoso que vivia numa aldeia. Ele era um homem muito pobre mas possuía um burro. Um dia ficou sem dinheiro e decidiu vender o burro. Chamou o filho mais novo e disse; “Anda, filho, vamos levar o burro para o mercado para o vender e ganhar algum dinheiro.” “Está bem, pai”, disse o rapaz, “vamos.”

E partiram os dois para o mercado. Passado um tempo, o pai viu que o filho estava a ficar cansado e disse-lhe, “Filho, senta-te no burro. Eu caminho ao lado.”

Depressa chegaram a uma pequena aldeia. Enquanto a atravessavam todas as pessoas da aldeia começaram a rir. “Eh, olhem para aquilo”, disseram. “Aquele rapaz jovem e saudável vai sentado no burro e aquele homem velho e trôpego é que vai a andar. Porque não pode o rapaz andar e deixar o velho ir montado no burro?” Ao ouvir isto, o rapaz disse, “Pai, eles têm razão. Tu devias ir aqui em cima e eu aí em baixo.” E assim fizeram.

Passado mais um tempo, o filho e o pai passaram por outra aldeia. Os aldeões começaram a dizer, “Meu Deus, alguma vez se viu um pai assim – deixando a pobre criança andar enquanto vai montado no burro? Que pai sem coração!”

O pai e o filho olharam um para o outro. E então o rapaz disse, “Pai, eu não sei o que fazer.” “Bem, filho, se calhar tu devias vir também montado no burro. Vamos os dois no burro e assim fica o problema resolvido.”

E assim, os dois montados no burro, chegaram à aldeia seguinte. “Meu Deus,” disseram os aldeões, “olhem para aqueles dois burros montados num burro. O 99


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pobre animal inocente nem pode chorar nem expressar o seu sofrimento. Em vez do burro levar os dois, eles é que deveriam levar o burro.”

“Filho,” disse o pai, “provavelmente eles têm razão. Vamos fazer isso.” Apearam-se os dois, ataram as patas dianteiras do burro com uma corda, as patas traseiras com outra e enfiaram um pau comprido. Cada um deles pegou numa ponta do pau e assim continuaram até ao mercado transportando o burro. Mesmo antes de entrarem na aldeia do mercado tinham que passar por uma pontezinha estreita. Quando iam a passar pela ponte, um par de burros selvagens apareceu a correr e foi contra o burro deles. O burro ficou muito excitado, tentou dar pontapés e caiu ao rio.

O filho olhou para o pai e o pai olhou para o filho. “Pai, que fazemos agora?”, perguntou o rapaz. “Bem, filho, vamos voltar para casa. Já não há mais burro para vender. Nunca deveríamos ter dado ouvidos a toda essa gente. Devíamos ter usado o nosso bom senso. Perdemos o nosso burro e ficámos sem dinheiro. Mas pelo menos aprendemos uma boa lição.”

Não é possível agradar a todos. Em vez disso, satisfaz a tua consciência fazendo as coisas sem motivos egoístas. E assim estarás a agradar a Deus.

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O Segredo da Felicidade á muito, muito tempo atrás, Deus criou todo o cosmos, os planetas e as estrelas, as montanhas e os rios e todas as plantas e os animais; e o grande final da criação foi o ser humano. Quando tudo tinha sido feito, Deus juntou todos os ajudantes que tinham ajudado com a criação e disse: “ Agora criámos tudo mas ainda resta uma coisa para fazer. Eu quero que todos sejam felizes. Eu quero dar-lhes felicidade – mas quero que eles tenham que a procurar. Deixem à vista todas as outras coisas – podem vê-las facilmente e obtê-las. Mas eu quero que eles procurem a felicidade, para que quando a encontrem, compreendam verdadeiramente o seu valor.”

E, então, todos os ajudantes pensaram muito sobre qual seria o bom lugar para esconder a felicidade. Por fim, alguém teve uma ideia: “Já sei. Vamos esconder a felicidade no fundo do mar mais profundo.” Mas quando pensaram melhor, viram que viria o dia em que o ser humano aprenderia a chegar ao fundo do oceano e então não haveria mais desafio. Alguém sugeriu escondê-la no espaço. Mas outro ajudante disse, “Facilmente eles irão até à Lua e até mesmo até Marte, por isso não podemos esconder aí a felicidade.”

Após muita deliberação, voltaram-se para Deus e disseram, “Senhor, não conseguimos pensar num bom sítio para esconder a felicidade, porque, eventualmente, o ser humano irá conseguir chegar a todo o sítio.”

Até que, de repente, um ajudante levantou-se e gritou, “Já sei! Os seres humanos irão sempre procurar a felicidade fora deles, através de dinheiro, poder, posses e feitos de todos os tipos. O melhor lugar para esconder a felicidade é mesmo dentro do seu próprio coração; é o último lugar onde eles se irão lembrar de procurar.”

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Todos concordaram rapidamente, “Oh, mas que grande ideia, mesmo boa!” E Deus pensou assim também – e, foi por isso que Deus escondeu a felicidade no coração. As pessoas que procuram a felicidade por todo o lado podem parecer que a alcançam por um tempo, mas depressa recomeçam à sua procura. Tal felicidade mistura-se e turva-se com muitos problemas, preocupações e desilusões. A verdadeira felicidade não é o resultado de fazer alguma coisa ou de conseguir alguma coisa. Está dentro de nós como a nossa natureza essencial. Tu és a Felicidade personificada.

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O Homem Que Não Fazia Nada m rei estava de visita a um dos templos do seu país. O rei providenciava quase todos os templos e queria ir verificar se tudo estava a ser bem administrado. Chegou na altura em que a prasad (comida abençoada) estava a ser distribuída. Pequenos bolos tinham sido preparados e oferecidos a Deus e estavam agora a ser distribuídos a todos os sadhus (caminhantes espirituais), os devotos e todos os criados que trabalhavam no templo.

O rei estava sentado a observar. Cada pessoa recebia um bolo. A um canto, estava um swami, sentado e sem fazer nada. Ele nem tinha estado no culto mas recebeu um bolo também. Ao ver isto, o rei chamou o homem que distribuía a comida. “Quem é aquele? Não parece fazer alguma coisa. Porque recebe ele prasad? Ele nem veio assistir à puja. O que faz ele aqui?” “Maharaj, ele apenas está sentado aqui. Não sabemos o que ele faz. Nunca o vimos fazer coisa alguma.” “Ah, então ele não faz nada?” “Parece que não, senhor.”

“Deixa-me esclarecer isto”, disse o rei, avançando para onde o swami estava sentado. “Sadhu!” “Sim?”

“Recebes comida aqui todos os dias?” “Sim. Eles dão-me comida.” “E que fazes tu para isso?” “Nada.”

“Então não fazes nada e recebes comida?” 104


“Parece ser o que acontece.”

“Porque deverias tu receber comida se não fazes nada?” “Bem. Maharaj, parece que essa é a tarefa mais difícil.” “Ah, sim? Bem, eu também posso não fazer nada.” “Está bem, Maharaj, podes experimentar.”

E o rei sentou-se em frente do swami com os olhos fechados durante uns minutos e depois disse: “Vês, eu não fiz nada. Disseste que era a coisa mais difícil de fazer.”

“Perdão, senhor, mas não estavas a fazer nada. Estavas a pensar em comprar mais uns cavalos para os teus estábulos.”

Imediatamente, o rei levantou-se e prostrou-se aos pés do sadhu. “Sim, agora eu compreendo. Fazer nada não quer dizer simplesmente estar sentado. A mente também deveria estar completamente parada. Eu estava a fazer alguma coisa – não fisicamente, mas mentalmente. Agora percebo o que queres dizer com ‘fazer nada’. “ E o rei chamou o homem que distribuía a prasad e disse-lhe, “De futuro, dá-lhe dois bolos em vez de um.” A coisa mais difícil na vida não é fazer alguma coisa. Quando tu percebes que nenhuma das coisas no mundo, nenhuma pessoa, nenhuma das posições ou dos feitos te vão fazer feliz, então tu desistes e entregas o ego. Sentes, “Eu não tenho que estar a fazer alguma coisa ou a conseguir alguma coisa para mim.” Isso é sannyas ou renunciação. E então, todo o conhecimento e riqueza virão para ti.

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A Última Palha ão podes dizer exactamente o que irá abrir a tua mente para a Verdade ou quando isso irá acontecer. O conhecimento real ou sabedoria não vem pouco a pouco – é instantâneo. Quando irá acontecer? Ninguém te pode dizer; mas até uma pequena coisa banal poderá trazer-te isso.

Vou contar uma história acerca de um santo chamado Patinatar. O seu pai era um homem muito rico que fazia muito dinheiro com barcos e outros negócios. O pai tinha visto muitos santos e sábios e tinha estudado extensivamente mas nada tinha aberto a sua mente para a Verdade. Repetia regularmente os seus mantras, fazia os seus rituais religiosos com fé, fazia todas as práticas religiosas, mas a sabedoria não tinha acordado nele. Um dia, pediu a seu filho, Patinatar, para levar o seu barco e ir comprar mercadorias. Patinatar foi até a uma ilha e viu as pessoas pobres dali. E gastou todo o seu dinheiro – milhões de euros – para ajudar essas pessoas. Patinatar compreendeu que não podia regressar com um barco vazio e por isso encheu todo o barco com pasta de excremento de vaca, usado para combustível. O excremento de vaca valia cem euros ou menos. E navegou de volta a casa.

Assim que o barco chegou, alguns dos marinheiros foram a correr para o pai e disseram-lhe, “O teu filho enlouqueceu. Gastou todo o dinheiro e voltou só com excremento de vaca.” O pai ficou tão arreliado que nem quis ver o filho. Quando Patinatar chegou a casa, o pai nem estava lá para o receber. Patinatar deu um pequeno embrulho à mãe e disse-lhe, “Por favor dá isto ao meu pai quando ele voltar. Eu vejo-te mais tarde.” E, dito isto, saiu.

Quando o pai chegou a casa, perguntou, “onde está o meu filho?” A sua mulher contou-lhe que Patinatar tinha chegado e saído de novo, e deu o pacote ao marido. Quando o pai abriu o pacote, encontrou uma agulha de coser partida e um bilhete. O bilhete dizia, “Até o olho de uma agulha partida 106


não irá contigo na tua viagem final.” Assim que leio estas palavras, o pai de Patinatar imediatamente tirou as suas roupas elegantes, pôs uma tanga, despediu-se da casa e do seu negócio e partiu. A compreensão tinha despertado nele. Anteriormente tinha lido centenas de histórias religiosas, tinha lido livros, conhecia toda a filosofia mas nada lhe tinha aberto os olhos até ver estas poucas palavras. A compreensão pode surgir com a coisa mais pequena; não tem que ser um grande golpe. A qualquer momento, qualquer coisa poderá ser a última palha para ti. E depois ficas iluminado. Até lá, ainda te estás a preparar; estás a ficar pronto para esse momento.

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Glossário Ashram – uma comunidade spiritual onde, os que andam em busca de, praticam e estudam sob a orientação de um mestre espiritual

Bhagavad Gita – uma escritura hindu onde o Senhor Krishna instrui o seu discípulo Arjuna nos vários aspectos do Yoga Brahman – a Consciência Suprema não manifestada ou o Deus Absoluto Brahmin – casta sacerdotal hindu

Devendra – outro nome para Indra, o chefe dos deuses

Guru – (lit. removedor das trevas); guia espiritual, professor Indra – rei, senhor ou chefe dos deuses

Japa – repetição concentrada de um mantra ou Nome Sagrado Karma – lei da ação e reação

Karma Yoga – serviço altruísta; trabalho feito sem expectativa de recompensa Karma Yogi – aquele que faz Karma Yoga

Krishna – encarnação de Lorde Vishnu; professor no Bhagavad Gita Mahabharata – épico hindu que contém o Bhagavad Gita Maharaja – rei

Mantra – (lit. aquilo que torna a mente estável); uma fórmula de som para meditação Maya – poder ilusório de Deus

Narayana – Lorde do Universo; Lorde Vishnu Parvati – esposa do Lorde Siva

Pranayama – a prática de controlar a força vital, geralmente através do controlo da respiração Prasad – oferta consagrada

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Puja – serviço de adoração

Pujari – aquele que realiza o puja

Ramakrishna Paramahamsa, Sri (1836-1886) – Santo da Índia, guru de Swami Vivekananda Roti – um pão Indiano

Rupee – unidade básica da moeda Indiana Sadhana – prática espiritual

Sadhu – buscador espiritual, muitas vezes um mendigo errante Sannyas – renúncia

Sannyasi – membro da Sagrada Ordem de Sannyas; um monge Hindu Sannyastam – renunciar

Sari – vestido tradicional usado pelas mulheres Hindus

Satsanga – (lit. companhia dos sábios); encontro espiritual ou grupo Siva – divindade Hindu principal; Deus como Auspicioso

Swami ou Swamiji – (lit. mestre de si mesmo); Lorde; Título religioso Hindu geralmente para um sannyasi; um termo de respeito

Upanishads – as porções finais de cada um dos Vedas, (as escrituras primárias do Hinduísmo), que dão a filosofia não dualista Vedanta Vedanta – filosofia Hindu não dualista encontrada nos Vedas

Vishnu – Deus como Preservador; encarnado em várias formas, tal como o Lorde Rama e o Lorde Krishna Yagna – sacrifício

Yoga – (lit. união); união do indivíduo com o Absoluto; qualquer percurso de esforço que resulte em tal união; estado de espírito imperturbável sob todas as condições Yogi – aquele que pratica Yoga

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Sobre o Autor Sri Swami Satchidananda nasceu numa família altamente espiritual no sul da Índia em 1914. Na sua juventude, trabalhou nos campos da agricultura, mecânica, eletrónica e cinematografia. Ao mesmo tempo, a atmosfera ricamente devocional da família alimentou a sua aspiração espiritual.

Em 1949, Sri Swamiji foi iniciado na Sagrada Ordem de Sannyas (vida monástica). Nos anos seguintes, ensinou Hatha e Raja Yoga na Universidade Florestal de Yoga Vedanta em Rishikesh e fez extensas palestras por toda a Índia. Em 1953, foi convidado para o Ceilão (atual Sri Lanka) e passou treze anos servindo no ashram que lá estabeleceu. Durante esse período, também organizou e serviu em outros centros de Yoga no Sri Lanka, Índia, Malásia, Cingapura, Hong Kong, Japão e Filipinas. Em 1966, Sri Swamiji fez sua primeira tour mundial. A visita de dois dias pretendida para Nova York foi estendida para cinco meses porque foi rodeado por centenas de estudantes ansiosos pelos seus ensinamentos e orientação. O Yoga Integral ® Internacional foi fundado sob a sua direção. Hoje existem muitos centros e professores de Yoga Integral em todo o mundo.

Sri Swamiji foi nomeado como patrono e conselheiro em várias organizações de Paz, Yoga e Inter-religiosas em todo o mundo. Recebeu muitas honras pelo seu serviço, incluindo o Prémio Martin Buber por Excelente Serviço para a Humanidade, o Prémio Inter-religioso Juliet Hollister e o Prémio de Paz U Thant.

Sri Swamiji defendeu o princípio de que “A Verdade é Uma, Caminhos há Muitos”. Patrocinou inúmeras atividades inter-religiosas em todo o mundo. Em 1986, estabeleceu o Santuário Universal da Luz da Verdade (LOTUS), dedicado à Luz de todas as fés e paz mundial, no Ashram SatchidanandaYogaville® na Virgínia, EUA. Inspirado pela visão de Sri Swamiji de um centro espiritual modelo, Yogaville é um lugar para onde as pessoas de todas as fés e origens podem ir para estudar e praticar os princípios do Yoga Integral. Para mais informações: www.IntegralYoga.org 110



Aqui está um livro de histórias para todos - com leões e reis, ladinos e santos, ummenino que pode parar um elefante e uma leiteira que pode andar na água! Preenchidos com sabedoria, aventura e surpresas, estes contos intemporais, contados por Sri Swami Satchidananda, lembram-nos do que é importante na nossa era moderna. O estilo de ensino de Sri Swamiji combina simplicidade, franqueza e humor, refletindo a autoridade de quem fala de experiência direta. Através da sua narração, as histórias ganham vida, deliciosamente expressando o profundo discernimento espiritual de Sri Swamiji. Seleccionadas de palestras que ele deu ao longo de muitos anos, elas esclarecem-nos sobre como levar vidas tranquilas, pacíficas e úteis e, finalmente, alcançar a realização espiritual. Tanto crianças como adultos irão deliciar-se com as ilustrações criadas no Estilo indiano, especialmente para este livro. Cada ilustração, encantando o leitor com suas cores vibrantes e detalhes intrincados, abre o portal para uma terra de mistério e maravilha. Esta coleção de Contos Iluminados de Swamiji foi criada para crianças, incluindo

aquelas que residem em corpos adultos. Se você não está em busca da iluminação, não se

preocupe - as histórias vão entretê-lo e o meu palpite é que a iluminação irá encontrá-lo de qualquer maneira. As histórias são derivadas da herança cultural da Índia, mas cada

uma tem uma lição que é universalmente verdadeira qualquer que seja a sua origem religiosa ou cultural.

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~ Carole King

I S B N 978-0-932040-48-0

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780932 040480

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