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Capítulo 5 Desapegue-se das suas coisas

Mizuta Masahide, discípulo do famoso poeta de haicais Bashô, escreveu:

Desde que minha casa pegou fogo Tenho uma vista melhor Da lua nascente.

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Essa sim é uma pessoa desapegada das suas coisas! Mesmo sem precisar chegar a tais extremos, seria bom se cultivássemos uma noção parecida de desapego. Desenvolver essa postura vai facilitar (e muito!) a organização da casa — sem falar em como alivia a dor de quando as coisas são tiradas de nós por outros meios (como roubos, enchentes, incêndios ou empresas de cobrança). Portanto, vamos passar este capítulo fazendo exercícios mentais para enfraquecer o poder das coisas sobre nós. Para atingir nossos objetivos, vamos precisar nos alongar, nos aquecer e entrar em forma para a tarefa que vem aí. Nas próximas páginas, vamos fortalecer nossos músculos minimalistas — e ganhar a força e a flexibilidade psicológica necessárias para um embate contra nossas coisas. Vamos começar com algo fácil para nos animar: imaginemos a vida sem nossas coisas. Essa é fácil — nem precisamos imaginá-la, podemos apenas nos lembrar dela. Muitos se recordam da juventude como uma das épocas mais felizes e despreocupadas da vida, por mais que morássemos numa caixa de fósforo (às vezes com mais duas ou três outras pessoas) e tivéssemos pouca renda disponível. Por mais que não pudéssemos comprar roupas de marca, relógios caros ou equipamentos

eletrônicos. Todas as nossas posses cabiam em algumas poucas caixas e não precisávamos nos preocupar com o conserto do carro, a manutenção da casa ou mesmo em ir à lavanderia. As poucas coisas que possuíamos vinham em segundo plano em relação à nossa vida social. Éramos livres de responsabilidades! Você acha que essa liberdade é coisa do passado? Não necessariamente. Muitos têm a chance de reviver uma vida “livre de coisas” uma ou duas vezes por ano — quando tiram férias. A palavra inglesa vacation, por exemplo, vem do latim vacare, que significa “estar vazio”. Não é de admirar que gostamos tanto de fugir de tudo! Pense na última vez que acampou, por exemplo. Você carregou na mochila tudo aquilo de que precisava para seu conforto e sobrevivência. Preocupou-se pouco com a aparência e se contentou muito bem com as roupas que carregou nas costas. Cozinhou o jantar numa panela portátil, sobre uma fogueira ao ar livre, e comeu com um prato, um copo e um garfo, nem um pouco chique. Sua barraca, o mais simples dos abrigos, o manteve quente e seco. Suas mínimas posses estavam em sincronia com suas necessidades, deixando-o com tempo de sobra para relaxar e comungar com a natureza. Assim, por que precisamos de tanto a mais quando voltamos para a vida “real”? Bom, na verdade, não precisamos — e é esse o objetivo destes exercícios. Vamos reconhecer que muitas das coisas que nos cercam não são imprescindíveis para nossa saúde e nossa felicidade. Agora que você relaxou, vamos passar de nível: finja que vai morar no exterior. Mas nem pense em ligar para a empresa de aluguel de depósitos da sua cidade — essa é uma mudança definitiva. Você não pode simplesmente guardar as coisas à espera do seu retorno. Além disso, transportar objetos pelo globo é complexo e caro; portanto, você vai ter de reduzi-los ao indispensável. Examine o que há em sua casa e decida exatamente o que irá levar. Sua velha guitarra detonada entraria na lista? E sua coleção de bichinhos de cerâmica? Você dedicaria o precioso espaço de carga à blusa feia que ganhou três Natais atrás, aos sapatos que apertam os pés depois de quinze minutos de uso ou à pintura a óleo que herdou, mas de que nunca gostou? Claro que não! Não é ótimo? É incrível a quantidade de coisas de que podemos nos desfazer quando surge uma “justificativa”!

Certo, agora que você entrou no clima, vamos enfrentar uma mais difícil: é madrugada e você é acordado pelo som agudo do alarme de incêndio. Minha nossa! Você só tem alguns minutos — talvez segundos — para decidir o que vai salvar enquanto corre para fora de casa. Sem dúvida você terá pouca chance de tomar decisões aqui e vai precisar se basear em seus instintos. Se tiver tempo, talvez você pegue alguns documentos importantes, o álbum de fotos de família e, quem sabe, o laptop. O mais provável, porém, é que tenha de sacrificar todas as coisas para salvar você, sua família e seus animais de estimação. Nesse momento, você não vai ligar nem um pouco para todas aquelas coisas que tanto consumiram sua atenção no passado. Ufa! Vamos parar um pouco depois dessa para diminuir o ritmo dos batimentos cardíacos. Na verdade, vamos diminuí-los muito, mas muito mesmo… até que parem de vez. Como assim? Por mais que odiemos pensar nisso, o tempo que temos na Terra vai acabar um dia, e infelizmente isso pode ocorrer inclusive antes do esperado. E o que vai acontecer depois? As pessoas vão bisbilhotar todas as nossas coisas. Nossa! Que bom que não estaremos aqui, porque sem dúvida isso nos deixaria muito envergonhados. Goste ou não, as coisas que deixamos para trás se tornam parte do nosso legado — e imagino que nenhum de nós queira ficar para a história como um acumulador de tralhas. Você não prefere ser lembrado como alguém que levava uma vida leve e elegante, que conseguia viver com o básico e alguns itens especiais? Tire um tempo para catalogar mentalmente o seu “espólio”. Que história as suas coisas contam sobre você? Tomara que não seja: “Caramba, ela gostava muito de caixas de pizza” ou “Que estranho, não sabia que ele colecionava calendários velhos”. Faça um favor aos seus herdeiros e não os obrigue desocupar uma casa cheia de bagunça depois que você se for. Caso contrário, quando olhar lá de cima, é provável que veja estranhos apalpando suas “preciosidades” num enorme “família vende tudo”. Certo, prometo, chega de drama — este é um livro feliz! A questão é que um choque que nos tire de nossa rotina (seja durante as férias, seja um desastre natural) ajuda a colocar as coisas em perspectiva — e, nesse último caso, é muito melhor imaginar do que de fato passar pelo desastre. Esses cenários

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