O Bairro da Saudade: hierarquias e atmosferas nos cemitérios

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Autora: Ana Luísa Pires Pedreira Orientador: Carlos Henrique Magalhães de Lima Banca examinadora: Elane Ribeiro Peixoto

O presente trabalho de pesquisa é produto da disciplina Ensaio Teórico em Arquitetura e Urbanismo, ministrada no Departamento de Teoria e História da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília – FAU-UnB.


“O que é que tem do outro lado do muro? Está cortando essa cidade no meio Pro outro lado, é tudo só novidade Pro nosso lado, o bairro chama saudade” Trecho da música “Passado/Futuro” da banda O Terno


Dedico estes trabalho trabalho aos meus tios-avรณs Uara e Marlene.

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Resumo O presente trabalho de pesquisa tem como objetos de estudo os cemitérios, mais especificamente sua organização hierárquica interna. Sabe-se que a desigualdade - econômica, racial, de gênero, religiosa - permeia diversos espaços da cidade, sendo um deles o cemitério. Estudou-se o caso do Cemitério São João Batista, localizado cidade do Rio de Janeiro. Na análise, as subdivisões dentro dos cemitérios são traduzidos para uma linguagem gráfica de tipo e materialidade dos túmulos e mausoléus, com o auxílio de conceitos presentes no campo de estudos arquitetônicos das atmosferas de Peter Zumthor. Neste sentido, busca-se investigar e refletir se sobre a como a hierarquização das necrópoles contribuem de alguma maneira para a imagética desses locais e para a atração ou repulsão de visitantes. Os resultados da análise apontam para para uma forte hierarquização dos espaços que contribui positivamente para a atração de visitantes e turistas, mas denuncia a desigualdade do país até no espaço da morte. palavras-chave: cemitérios, atmosferas, hierarquias 5


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Sumário

1.Introdução 2.Breve histórico dos cemitérios e monumentos fúnebres 3.Métodos de pesquisa 3.1 - Objetivos 3.2 - As atmosferas de Peter Zumtho 3.3 -Análise gráfica

4.Estudo de caso: Cemitério São João Batista 4.1 - Os primeiros cemitérios públicos do Rio de Janeiro 4.2 - Contexto urbano e paisagem 4.3 - Mapeamento de tipologias 4.4 - Mapeamento de materiais

5.Reflexões e Conclusões 6.Referências bibliográficas

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1. Introdução

Este trabalho se originou a partir do seguinte questionamento: como as diversas desigualdades sociais refletem nos espaços da morte. Rolnik (2017) afirma que desde o século XIX é possível notar desigualdade socioterritorial dentro das necrópoles brasileiras. No decorrer das análises, o propósito de pesquisa derivou para uma questão reflexiva a respeito desses espaços, sobre as atmosferas de cemitérios, mais especificamente, daqueles projetados e construídos no final do século XIX. Justifico essa derivação, de uma preocupação de caráter social, urbanístico, para outra, de aspecto relacional e reflexivo, porque observei que, ao longo da história,cemitérios não são apenas projeto reúne também das sensações e conteúdos de uma sociedade. . Essas sensações estão relacionadas com diversos fatores, como folclore local e religião predominante. Por exemplo, Áries (2012) cita como a relação com cemitérios se transforma na mesma medida que a imagem da morte no decorrer do tempo. Tais sensações e relações, são descritas por Zumthor (2009) como atmosferas. Atmosfera é uma categoria estética, relacionada com a qualidade arquitetônica de um ambiente baseado nos

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sentimentos que aquele lugar evoca. Para o arquiteto, é importante notar as atmosferas dos espaços, pois a primeira impressão que temos ao entrar em um local é a que irá ditar nossa relação com ele, uma vez que essa primeira impressão pode causar um ligação emocional ou recusa imediata. O que cabe destacar nesse conceito, são os diversos temas que o compõe, indo desde categorias concretas como a materialidade e a própria forma daquela arquitetura até mais abstratas como intimidade e sedução. Justamente por essas razões acredito esse ser um parâmetro interessante de análise de um objeto arquitetônico como o cemitério, pois não basta compreender os traçados e partidos arquitetônicos, é preciso um olhar para além do construído e entender o campo sentimental e espiritual desses espaços. Assim, é impossível compreender a história e papel dos cemitérios no Brasil, sem antes compreendermos também a história e papel da religião neste país de grande fé em que o Estado é laico desde 1889, mas que ao mesmo tempo possui mais de um quinto dos representantes políticos filiados a Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional (BRASIL, 2019). De acordo com Gaarder, Hellern e Notaker (2000), é difícil adquirir uma compreensão adequada de políticas nacionais ou internacionais sem que se leve em consideração o fator religião. Portanto, para uma análise mais precisa é necessário levar em consideração a forte influência do catolicismo, enraizado no Brasil, desde sua colonização no século XVI.Outra questão pertinente é a imensa desigualdade econômica que marca o Brasil. Além disso, o peso do racismo que estrutura nosso cotidiano é responsável por vitimar precocemente muito mais as pessoas negras e pobres. O número de homicídios assombrosos é algo com o qual a sociedade brasileira convive há décadas. Apesar da morte ser inevitável, não devemos naturalizá-la. Tampouco se pode fazer o mesmo com a violência. Mesmo na hora da morte, as desigualdades sociais e raciais ainda estão presentes, não somente no sentido de como se morre, mas quem morre e o porquê. Esses aspectos foram essenciais para compreender a organização 10


espacial do estudo de caso, através da tipologia tumular e da materialidade, nota-se visualmente uma hierarquização dentro do cemitério, assumindo que túmulos maiores e de materiais mais nobres são de famílias ou indivíduos com melhores condições financeiras em vida. Por fim, se por um lado encontramos raras exceções de cemitérios com função de parques públicos, museus e até cinemas ao ar livre (CORRÊA, 2016), por outro também encontramos aqueles abandonados e rodeados por grandes muros escondendo seu interior. Rodrigues (1997) atribui o afastamento da população brasileira dos cemitérios às mudanças radicais nos funerais e sepultamentos após as reformas higienistas em meados do século XIX, constatando “um estranhamento entre o mundo dos vivos e o mundo dos mortos”. Não por coincidência, averiguamos que os cemitérios são geralmente planejados às margens das cidades e bairros desde as civilizações mais antigas. Um exemplo dessa situação são as necrópoles egípcias, sempre situadas às margens oeste do rio Nilo, enquanto as cidade ficavam situadas às margens leste do rio; mas não precisamos ir tão longe para visualizar este fato, o cemitério passa a ser uma das funções a ser organizadas pela técnica moderna, que envolve, entre outros instrumentos, o zoneamento Funcional. No projeto para o Plano Piloto de Brasília1, Lucio Costa propõe: “Os cemitérios localizados nos extremos do eixo rodoviário-residencial evitam aos cortejos a travessia do centro urbano.” Este ensaio, busca também humanizar o espaço morte e mostrar a riqueza histórica e artística de um cemitério e tentar, mesmo que minimamente, aproximá-lo dos leitores.

1 -O projeto da capital brasileira tem claras influências do Movimento Higienista, vindo do período pós-pandemia da Gripe Espanhola, em 1918. São exemplos as grandes áreas verdes livres, as superquadras com baixa densidade demográfica e os blocos residenciais com cobogós para ventilação e insolação salubre.

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2. Breve histórico dos cemitérios e monumentos fúnebres

Os primeiros vestígios de locais de enterro datam do tempo dos povos pré-históricos, que já sentiam necessidade em marcar os túmulos com rochas. Ao longo da História Antiga também podemos citar diversos monumentos fúnebres como as tumbas dos reis persas, as necrópoles do antigo Egito e o cemitério real de Ur. O espaço fúnebre está então presente em todas as civilizações e impérios, demonstrando a importância que damos no local de celebração dos nossos mortos, independente da religião ou época. Ao caminharmos por esses monumentos, percebemos que a grande parte tem função de homenagear grandes políticos ou figuras nobres relevantes da época. É importante notar que devido a sua escala monumental, muitas dessas construções habitam nosso imaginário até hoje, como a as pirâmides de Gizé no Egito, o Taj Mahal na Índia e Mausoléu de Qin Shi Huang Di, na China. Mas e aqueles que não eram da nobreza ou da política, onde e como foram enterrados? No Império Persa surge o termo “mausoléu” derivado de Mausolo, nome de um governante do século IV a.C, seu túmulo foi uma das sete maravilhas do mundo antigo. A palavra tem portanto uma conotação de nobreza e monumentalidade e que poucos terão tal tipo arquitetônico como tumba. Na Grécia Antiga e também no Império Romano, o culto aos mortos era de tamanha importância que se tornou uma questão 12


jurídica. As sepulturas, feitas em terras privadas, possuíam pequenos altares e o status de templos (MOCHI, 2020). Existiam locais de veneração de ordem pública e privada para um mesmo túmulo, pois o culto aos mortos deveria ser uma atividade contínua pelas gerações futuras e, portanto, não poderiam vender as terras em que seus antepassados estivessem enterrados ou em que houvesse um templo fúnebre construído. A questão foi apenas resolvida em 450 a.C. com a Lei das Doze Tábuas. Aí já percebemos que só aqueles com terras possuíam uma sepultura familiar, os demais eram mais comumente cremados ou enterrados nos cemitérios fora dos muros das cidades, costume possivelmente herdado dos Etruscos (CORNELL; MATTHEWS, 1996) e mantido por lei2. O que acaba por segregar espacialmente o local de enterro e culto entre as classes. Nas proximidades das muralhas e ao longo das principais vias, surgem também as catacumbas romanas devido ao avanço ilegal do cristianismo no Império Romano. A necessidade das catacumbas denuncia não só a falta de espaço na cidade para cemitérios públicos, como também a falta de democratização do espaço mortuário já nessa época (ÁRIES, 2012). Na Idade Média, com a consolidação da Igreja católica sobre a Europa, o clero e os nobres passaram a ser enterrados dentro dos templos cristão, já os camponeses eram enterrados ao redor das igrejas. A questão é que a vida urbana nessa época se concentrava justamente ali e logo os cemitérios passaram a ser espaço de comércio, cortejos civis e tribunais jurídicos (ARIÉS, 2012). Com o alastramento da Peste, em 1348, o solo ao redor das igrejas fica saturado e os corpos dos pobres voltam a ser enterrados em locais afastados do centro urbano, por questões sanitárias. As terras foram compradas pela Igreja e não pelo senhor feudal e as valas eram coletivas e sem qualquer zelo pelo morto. A elitização dos espaços fúnebres alonga-se pelos séculos seguintes, com a nobreza e a burguesia financiando as artes na construção de capelas e templos para suas famílias. Um marco 2-Sendo esta, provavelmente, a primeira vez que vemos o Estado intervir no espaço da morte, mas ainda de forma superficial, determinado apenas que não deveriam haver enterros dentro dos limites da cidade.

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fundamental disso é a construção da Basílica di San Lorenzo, em Florença, projetada por Brunelleschi, onde a maior parte da poderosa família Médici está sepultada. Os cemitérios acabam se tornando atrativos turísticos e museus a céu aberto, devido à riqueza artística e econômica das obras nas sepulturas. Aí já estava começando a separação das funções de quem administrava os locais de enterro, com mais iniciativas privadas e governamentais e menos da Igreja, enquanto instituição, tais iniciativas são fomentadas pela chegada da primeira Revolução Industrial. A realidade era: cidades superlotadas e sem infraestrutura básica, com esgotos a céu aberto, longas jornadas de trabalho sob condições precárias em fábricas e o alastramento de doenças. Isso causou a morte de muitos indivíduos, principalmente daqueles parte do proletariado, e em consequência, a superlotação rápida de cemitérios e a até a decomposição de corpos a vista, obrigando o Estado Inglês a intervir diretamente na situação dos enterros. Em 1855, cria-se uma lei tratando da retirada de corpos das ruas, e a forma rigorosa que deveriam ser tratados e enterrados, a lei também especulava locais fora do perímetro urbano para os cemitérios. Até o final do século XIX, as classes mais abastadas ainda eram enterradas dentro de templos ou em necrópoles em locais nobres das cidades, como o Cemitério da Recoleta em Buenos Aires e o Cemitério do Père-Lachaise, em Paris, com exuberantes mausoléus e estátuas espalhadas nas necrópoles. Contudo, adversidades surgem nos espaços cemiteriais com a Primeira Guerra Mundial, em 1914 e a Gripe Espanhola em 1918 (PIOVEZAM; GRASSI, 2014). Os cemitérios já existentes estavam superlotados, era necessária a criação de novos cemitérios, que surgiram às pressas para comportar a grande quantidade de corpos. Áries (2012) afirma que tais mudanças são mais notáveis na América do Norte, Inglaterra e Noroeste da Europa, que adotam simplicidade, compacidade e austeridade nos sepulcros dos cemitérios, onde antes se notava a extravagância barroca. Esse estilo ficou conhecido como “cemitério inglês”, com túmulos 14


marcados apenas por dois elementos a “pedra sepulcral”ao chão e uma pedra fundamental fixada verticalmente. Isto pode ser resultado da urgência do momento ou talvez pelas influências do movimento Modernista, que pregava justamente a perda de qualquer adorno nas construções. Lúcio Costa no seu relatório do Plano Piloto chega a mencionar como seria o cemitério de Brasília, seguindo esses preceitos modernos: “Terão chão de grama e serão convenientemente arborizados, com sepulturas rasas e lápides singelas, à maneira inglesa, tudo desprovido de qualquer ostentação.” Chegamos então na contemporaneidade, onde cada vez mais se percebe o afastamento da população do espaço na morte. Lucas (2006) afirma que hoje os cemitérios brasileiros são áreas desvalorizadas e constantemente saqueadas e com degradação de sua arte por falta de conservação, esse fenômeno pode ser fruto de diversos fatores como a influência modernista, o escamoteamento da morte na cultura ocidental citada por Fuchs (2019), onde tornou-se desconfortável falar da morte, ou ainda a falta de políticas de preservação dos cemitérios. A partir desses estudos, decidiu-se estudar dois aspectos complementares nos cemitérios: o primeiro a hierarquização social e o segundo as atmosferas. Os aspectos se complementam, pois suas análises foram extraídas a partir da composição formal e material dos túmulos, no sentido de compreender a organização espacial e encontrar fatores de aproximação ou afastamento em um cemitério. Dino (2019) cita que a essência da arquitetura é ser um instrumento para despertar as sensações e os sentimentos nas pessoas e, portanto, evocar emoções, não apenas cumprir uma função. Por isso compreender tais aspectos possibilitam explorar as necrópoles como espaços públicos e atrativos turísticos e aproximá-las da população, isso é também uma forma de recuperar a arquitetura como espaço que desperta emoções.

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3. Métodos de Pesquisa

3.1. Objetivos A história nos mostra que nem todos morrem da mesma forma e as diferentes classes e grupos sociais são velados e enterrados das mais variadas maneiras. O culto aos mortos também sofre alterações com o tempo. Sendo ora de grande importância, como na Grécia Antiga, ao ponto de causar problemas jurídicos, como também de modo despreocupado e secundário na Idade Média com feiras ocorrendo em cima dos cemitérios. Sabemos que aqueles que mais morrem precocemente são as camadas mais frágeis da população, como os cemitérios vão receber essa população? Ainda existe essa gradação e, até segregação social dentro desses espaços? Qual impacto visual dessa hierarquização? Na escala urbana, para lidar com a superlotação de cemitérios surge a tendência de memoriais verticais, suprindo cidades já no limite de sua expansão horizontal, qual impacto visual isso traz? Com essas questões em mente, este ensaio busca compreender: 1.Como funciona cemitérios; 16

a

gradação

hierárquica

desses


2.Quais as tipologias mais comuns de túmulos em cada setor interno; 3.Quais as materialidades mais comuns em cada setor interno; 4.Como as tipologias e materialidades afetam as atmosferas dos cemitérios; 5.Como a verticalização desses espaços vem acontecendo. Foi estudado o caso do Cemitério de São João Batista, no Rio de Janeiro. Por não ser um trabalho comparativo, mas reflexivo, o caso é estudado a partir de: 1. Breve análise histórica e da localização desse espaço no Rio de Janeiro 2.Análise Gráfica, materialidade

subdividida

em

tipologias

e

3. Leitura visual, baseada no conceito de atmosferas de Peter Zumthor A partir dessas análises busca-se compreender quais setores dos cemitérios contém tipologias mais elaboradas e quais possuem tipologias mais simples determinado hierarquias sociais dentro dentro das alas internas, entender o porquê pelo fato de suas materialidades e formas serem diferentes geram atmosferas diferentes que podem atrair ou intimidar a visita de determinadas alas dos cemitérios.

3.2. As atmosferas de Peter Zumthor O conceito de atmosferas foi apresentado pelo arquiteto Peter Zumthor em 1ºde junho de 2003 durante uma palestra no Festival da Música e Literatura da Alemanha. Para Zumthor, “atmosfera” trata-se de uma categoria estética que ele descreve como uma “primeira impressão” transmitida pelo espaço.

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O arquiteto divide o conceito em 9 temas e 3 anexos, são eles: temas: 1. o corpo da arquitetura: os componentes que formam aquele espaço fisicamente 2. a consonância dos materiais: escolha dos materiais e a relação entre eles 3. som do espaço: reverberação do som na superfície dos materiais 4. a temperatura do espaço: observar os materiais que retiram mais ou menos do nosso calor corporal 5. as coisas que me rodeiam: objetos do cotidiano que compõem o espaço 6. entre a serenidade e a sedução: o movimento instigado dentro daquela arquitetura 7. a tensão entre exterior e interior: escolha do que se quer mostrar e o que não se quer mostrar 8.degraus da intimidade: sentimento de ser intimidado ou abraçado pelo ambiente, relacionado com a escala e dimensões 9. a luz sobre as coisas: composta pela profundidade, materiais, superfícies e reflexão anexos: 1. espaço envolvente 2. harmonia 3. a forma bonita Pelo caráter de análise interna de cemitérios deste ensaio, os anexos não serão tratados, pois falam da relação de um objeto arquitetônico com seu arredor e da sua forma física, aspectos esses que não se aplicam à um cemitério. 3.3. Análise gráficas As análises gráficas serão organizadas pelas alas do cemitério 18


para compreender qual tipologia e materiais são mais utilizados naquele setor do cemitério. Através dessa análise também é possível comparar os tipos e materiais mais presentes ao longo das épocas, uma vez que cada ala do cemitério teve um período de atividade determinado. A primeira parte da análise consiste em observar as tipologias de túmulos, estas foram classificadas da seguinte forma:

imagem 1: ilustração das tipologias de túmulos. Fonte: autoral

1.mausoléus 2.túmulos estilo sarcófago 3.túmulos verticais No presente estudo de caso não existem lápides enterradas, apenas afloradas para fora da terra, e por tais tipologias não foram incluídas na classificação. A segunda parte consiste em catalogar os materiais mais utilizados pela necrópole.

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4. Estudo de caso: Cemitério de São João Batista

4.1. Os primeiros cemitérios públicos do Rio de Janeiro Os primeiros cemitérios públicos no Rio de Janeiro são inaugurados a partir da segunda metade do século XIX. O contexto histórico em que esses cemitérios surgem é de interesse neste ensaio, para entender o porquê de suas localizações, quem era enterrado ali e principalmente compreender o afastamento da população desses espaços. Durante o século XIX, através de sucessivas leis, foram abolidos 0 tráfico de escravos e o regime de escravidão, o que fez com que vários cemitérios para pretos novos3 fossem fechados (Pereira, 2007). Também ao longo desse século o Brasil urbanizou-se com grande velocidade, com várias cidades ultrapassando os cem mil habitantes no final do século. Uma das consequências disso foi o espraiamento de viroses e doenças sobretudo de cólera e febre amarela, uma vez que a infraestrutura urbana não era suficiente para a nova população, que vivia amontoada em cortiços e que assolaram diversas regiões do país, estas foram o estopim para a Corte sancionar e executar os primeiros decretos fúnebres no Rio de Janeiro, em 1850. O Decreto nº 583, de 5 de Setembro de 1850, por exemplo, 3-Termo utilizado para se referir à escravizados que morriam logo após a entrada dos navios da Baía de Guanabara

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determinava o número e localização de cemitérios públicos a serem criados nos então subúrbios do Rio de Janeiro. Aí está a primeira grande intervenção estatal nos espaços cemiteriais. Nela trata-se não só da localização dos cemitérios, como na lei inglesa de 1855, como também de questões de taxas, serviços fúnebres, locais de tratamento para possíveis epidemias e, pioneiramente, espaço de enterro destinado para a “pobreza enferma”. Estas legislações, são a primeira afirmação do cemitério como um espaço público e equipamento urbano vital. Mochi (2020) afirma: “eis que historicamente se tem, por viés da higiene urbana, com o cunho de ordem jurídica para o bem administrar a cidade, que nasce o espaço do cemitério”. Tais decretos já eram discutidos pela Corte desde o início do século com a chegada da Família Real à cidade em 1808, porém, em 1836 na Bahia, a proibição dos enterros nas igrejas em 1836 provocou a Cemiterada, um movimento popular causou a destruição de um cemitério construído fora de Salvador. Rodrigues (1997) especula que esse movimento retardou as reformas cemiteriais tão exigidas pelos higienistas. A política de higienização se populariza no Rio e outras cidades com a difusão do saber médico pela imprensa e pelos esforços do poder público na adoção de medidas de salubridade, influenciados por ela, também vieram decretos que proibiam o enterro de corpos em locais intramuros e nem mesmo dentro das igrejas. A combinação dessa política e das epidemias causou na população medo da contaminação e da morte, esvaziando cortejos fúnebres e distanciamento dos cemitérios (RODRIGUES, 1997). Em meio a este contexto, é inaugurado o Cemitério São João Batista (CSJB) em 4 de dezembro de 1852 pelo próprio Dom Pedro II. Localizado no bairro do Botafogo, na zona Sul do Rio de Janeiro, ocupa uma área de aproximadamente 183.123 metros quadrados e foi projetado pelo arquiteto Francisco Joaquim Béthencourt da Silva. Este estudo de caso foi selecionado pela relevância nas artes tumulares, sendo o primeiro cemitério na América Latina a ter mapeamento pelo Google Street View, antes mesmo do famoso 21


Cemitério da Recoleta em Buenos Aires. Outros fatores foram sua dimensão temporal, uma vez que apesar de ter sido inaugurado em 1852 continua ativo até os dias atuais e também por ser o segundo cemitério público do Rio de Janeiro, influenciou diversos projetos de cemitérios posteriormente, assumindo que possui semelhanças e podendo usá-lo como exemplo para este estudo de caráter reflexivo. Atualmente existem visitas guiadas pelo historiador Milton Teixeira são promovidas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ pelo cemitério, tornando-o um ótimo exemplo de como aproximar os vivos do espaço dos mortos (SÃO... 2015).

4.2 - Contexto urbano e paisagem O CSJB foi alocado aos pés dos Morros da Saudade e São João Batista, há aproximadamente 7 km lineares até o perímetro urbano do Rio da época. Apesar dessa distância parecer curta, vale lembrar que no século XIX a maior parte da população se deslocava a pé, alguns poucos por cavalo ou jegue, também não haviam estradas abertas, apenas caminhos marcados para essa parte do território. No diagrama observa-se a distância entre a mancha urbana em 1852 e o local do cemitério, o que enfatizou o distanciamento intencional da população com o espaço da morte, desencorajando a prática do cortejo fúnebre, citados por Rodrigues (1997). Apesar disso, a fotografia mostra e a rápida expansão urbana do Rio de Janeiro fez com que em menos de 30 anos o entorno imediato do cemitério já estivesse consolidado. Hoje o perímetro imediato em volta do Cemitério é de uso comercial, com ruas de grande movimento e alguns edifícios residenciais ao redor. Isso contribui com o segundo tema de Zumthor (2009) “som do espaço”, cercado de usos de grande circulação, no Cemitério se escuta os ruídos que vêm de fora dos muros, o que traz de certa 22


forma um conforto e evita o sentimento de solidão e isolamento ao visitante. Outro fator que também afasta essas sensações é a presençada Ladeira dos Tabajaras, favela situada na porção sudoeste do terreno. Ela se expande em direção ao Cemitério e já ocupa uma parte do campo visual do ponto de vista interno do cemitério. As habitações em cima do morro de São João Batista quase se mesclam na paisagem com os muros de túmulos verticais e remete ao quinto tema do conceito de atmosferas “as coisas que me rodeiam”, que fala sobre a presença de objetos do cotidiano

imagem 2: Diagrama de relação de distância do São João Batista ao perímetro urbano, 1852. Fonte: autoral. Dados: imagineRio.org

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imagem 3: ocupação urbana já presente em volta do cemitério (canto inferior direito), 1880. Fonte: imagineRio.org

em um espaço. A presença da favela humaniza o cemitério, traz a cidade para dentro da necrópole, mas agora através do sentido visual. Os portões e muros no perímetro também são elementos de análise interessantes do ponto de vista da integração visual. Em muitos cemitérios, tenta-se esconder o interior, cercando-o de muros altos ou cercas-vivas densas, contudo, no caso do CSJB os muros opacos só estão presentes em parte do perímetro, em certos trechos existe uma balaustrada estilizada que revela as várias esculturas que compõem os túmulos. Ai se faz presente o sétimo tema “tensão entre exterior e interior”, que instiga a 24


curiosidade e atrai os olhares para dentro do cemitério, além de novamente trazer o espaço cotidiano para o espaço dos mortos. Ainda na questão dos limites do CSJB também é interessante observar que na parte sul não há muros ou qualquer tipo de cerca, existe apenas a delimitação criada pela própria topografia acidentada. Portanto a ideia do que é paisagem e cemitério não existe, e deixa a natureza permear o projeto. Gressler e Günther (2013), citam a natureza como um fator indispensável em ambientes restauradores, ou seja aqueles que aliviam estresse,

imagem 4: Imagem Relação da Favela dos Tabajaras e túmulos verticais na paisagem. Fonte: Google Street View com alterações autorais

imagem 5: Imagem Relação dos muros com a rua. Fonte: Google Street View com alterações autorais

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sendo também um fator que estimula a permanência naquele local. Mas o elemento que talvez tenha mais atraído sucesso para a boa relação entre os vivos e o cemitério é o Cristo Redentor. Inaugurado em 1931, a estátua não é apenas uma atração turística, ela representa também a fé brasileira, que como citada antes é de grande relevância para o estudo de um espaço espiritual, como um cemitério. A bela visão do Cristo de dentro do CSJB, pode ser um fator que atrai turistas e também que retira a imagética de cemitério-assombrado, perpetuada pelo folclore, uma vez que o Cristo “olha e abençoa” aquele local (CEMITÉRIO...2014). Locais turísticos “instagramáveis” são cada vez mais valorizados, reforçando a ideia de Pallasmaa (2005) o sentido da visão é mais valorizado em detrimento aos demais. imagem 6 (página seguinte): Colagem paisagem do ponto de vista interno. Fonte: Google Street View com alterações autorais

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4.3 - Mapeamento de tipologias O mapeamento de tipologias foi uma análise essencial para compreender a hierarquização, sabendo que aqueles com maior poder aquisitivo, tendem a executar locais de memória maiores e mais rebuscados para seus familiares. O cemitério possui obras de grandes escultores desde o neoclássico até o Art Nouveau como Rodolfo Bernardelli, Hildegardo Leão Velloso e Jean Magrou (PIOVEZAM; GRASSI, 2014). Sabe-se que o cemitério começou a ser ocupado dos fundos para a frente (CEMITÉRIO...2014), com exceção dos mausoléus e túmulos de figuras notáveis que foram sendo alocados ao longo dos principais eixos de circulação, o que por si só já demonstra um tratamento diferente para aqueles que podiam pagar por um túmulo mais elaborado. Os eixos principais possuem entre 7 e 3 metros de largura, são arborizados e convidativos para uma caminhada. A via principal foi nomeada “Vieira Souto” remetendo à avenida da Praia de Ipanema, local nobre do Rio. Nesta via estão localizados os túmulos mais famosos de todo o cemitério, como os túmulos de Tom Jobim, Luís Carlos Prestes e Santos Dumont (CEMITÉRIO... 2015). O mesmo não ocorre há medida que aproxima-se do fundo do cemitério, corredores cada vez mais estreitos, tendo inclusive impossibilitado o mapeamento pelo Google Street View de todo o cemitério. A situação fica pior ao caminharmos por entre as paredes altas de túmulos verticais, que combinadas às passagens estreitas, ficam intimidadoras e claustrofóbicas em alguns pontos. Isso relaciona-se ao oitavo tema de Zumthor (2009) “degraus da intimidade”, em que a relação de escala nos eixos principais favorece o desejo de se aproximar do espaço, enquanto no caso dos túmulos verticais, afasta. Os túmulos verticais aparentam serem utilizados desde de 19604, mas a tipologia parece ganhar força a partir de 2010, quando possivelmente a ocupação horizontal do cemitério já estava mais 4 tais constatações foram feitas a partir da observação dos epitáfios.

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consolidada. Já os túmulos-sarcófagos apresentam datas desde 1852 até pelo menos 2005. Os mausoléus não contém datas nas suas fachadas externas e geralmente abrigam várias gerações de uma mesma família, assumindo portanto que ainda estão em uso. É interessante notar que a tipologia vertical já está presente no CSJB há pelo menos seis décadas, antes mesmo do começo do discurso científico em defesa da verticalização dos cemitérios nos anos 200o (THOMPSON, 2015). Isso pode se dar por dois fatores, o primeiro pelo terreno acidentado em que o cemitério foi implantado, que pede por esse tipo de solução para um melhor aproveitamento. O segundo, uma possível intenção presente desde a fundação do cemitério de destinar os espaços da periferia para a população no geral, deixando os locais de destaque para os nobres, políticos e celebridades. No caso de um cemitério, as tipologias serão, geralmente, o próprio “o corpo da arquitetura”5. Os diversos túmulos e esculturas que formam o CSJB o tornam mais interessante e atrativo, comparado com um cemitério no estilo inglês, por exemplo, em que há uma padronização e simplificação das lápides. Contudo, este mesmo fator denuncia a desigualdade social dentro do espaço da morte. imagem 7 (página seguinte): Mapeamento de tipologias. Fonte: Autoral 5. Primeiro tema do conceito de atmosferas de Peter Zumthor (2009).

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4.4 - Mapeamento de materiais O mapeamento de materiais deu-se em duas etapas: a primeira feita caminhando, virtualmente, pelo cemitério e identificando os diversos tipos de materiais usados nos túmulos e selecionando aqueles mais frequentes. A segunda, observando imagens de satélite do local e marcando zonas de maior concentração de certos materiais. A segunda etapa, tratou de inserir os materiais predominantes em cada ala do cemitério em forma de mapa. Nem todos os tipos de materiais encontrados foram inseridos no mapa devido a qualidade da imagem de satélite, em que é possível apenas distinguir por contraste visual materiais claros, escuros e coloridos, mas não suas nuanças. A análise material é essencial para a percepção da atmosfera do ambiente, uma vez que influenciam diretamente três temas do conceito, são eles a consonância dos materiais, a temperatura do espaço e a luz sobre as coisas. Na primeira etapa os materiais mais encontrados na necrópole foram:

imagem 8: relação de materiais. Imagens de uso livre com alterações pela autora

1. granito/mármore branco polido 2. granito/mármore preto polido 3. granito/mármore avermelhado/marrom polido 4. granito/mármore cinza polido

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5. pedras com acabamento natural 6. argamassa branca ou aparente Podemos refletir aqui sobre a consonância dos materiais, se olharmos isoladamente para essa combinação, parece um tanto cansativa, pois existem poucas texturas e cores diferentes, o que acaba se tornando monótono e pouco instigante. Contudo, quando combinadas com as diferentes formas de túmulos, esculturas e mausoléus, é possível perceber que os artistas A partir das observações feitas na segunda etapa, formulei o seguinte mapeamento: Fica claro com este mapeamento, que o material menos nobre, a argamassa branca, fica localizada nas periferias e ao fundo, sendo principalmente utilizada para a tipologia de túmulos verticais. Da rua, é possível observar apenas túmulos de cor clara, o que pode ser um atrativo para visitas não programadas ao cemitério, uma vez que o branco traz sentimentos de calma e paz. Este mapa também nos mostra que as alas tendem a ter um tipo de material predominante, com poucas exceções em que há uma divisão equilibrada dentre os tipos de materiais. Uma das razões disto pode ser o fato de que cada ala foi ocupada em um determinado período, portanto os materiais predominantes ali teriam relação com a moda e disponibilidade na região de cada revestimento neste intervalo de tempo. Os materiais brancos e pretos são predominantes em detrimento aos coloridos, passando a ideia de sobriedade no espaço, o que contribui negativamente para o tema da “ temperatura do espaço”, uma vez que os mármores e tons sóbrios são conhecidos por serem frios, o que não gera o sentimento de aconchego e abraço pelo ambiente, distanciando novamente os vivos do espaço da morte. imagem 9 (página seguinte): Mapeamento de materiaiss. Fonte: Autoral

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5. Conclusões e reflexões

Neste ensaio, investigou-se duas características do Cemitério São João Batista, aprimeira, sua organização espacial e a segunda, sua atmosfera. A primeira, visando buscar reflexos de uma sociedade desigualitária no espaço da morte e a segunda, no sentido de compreender melhor as características que ditam a qualidade de um espaço fúnebre. Estudar e determinar aspectos atrativos em cemitérios é o primeiro passo para explorar seus potenciais enquanto espaço público, área verde ou até ponto turístico. A partir das análises e mapeamentos é possível concluir que existe uma gradação e segregação social bem marcada dentro do cemitério. Os setores mais visíveis pelo público externo foram intencionalmente planejados para abrigar os túmulos mais grandiosos, elaborados e nobres, enquanto as periferias, de terreno mais acidentado, ficaram reservados para a maior parte da população em sepulcros simplórios. Na mesma lógica, os materiais mais caros e chamativos também estão nos mesmo setores de destaque e os cemitérios verticais são uniformemente cobertos pela mesma argamassa branca. Isso afirma que os cemitérios recebem as camadas mais frágeis da população como um reflexo da realidade das cidades brasileiras: amontoadas e nas periferias. 34


Porém, as tipologias exuberantes são com certeza o principal atrativo de turistas e visitantes, principalmente pelo fato de nelas estarem sepultadas figuras notórias e celebridades do país e de serem propriamente obras de arte, com esculturas e curadoria da matéria prima. Sendo de certa forma certeiro posicionar as mais interessantes e chamativas logo na entrada no cemitério, para fins turísticos. Além disso, os cemitérios, hoje, praticamente não permitem mais sepultamentos em jazigos perpétuos e mausoléus6, utilizando lápides no estilo inglês ou mesmo apenas a placa tumular. Isso traz um certo ar de novidade e exôtico aos locais que ainda possuem tais tipologias. Quanto a materialidade, vejo que ainda é um fator negativo para a atmosfera do cemitério. Existe uma variação mínima de tons e texturas levando a monotonia em várias alas que não se destacam pelas tipologias grandiosas. Tomando o tema “entre a serenidade e a sedução” não há fatores que instiguem a curiosidade de um visitante á ir além das primeiras fileiras após a entrada, que criem o desejo do espaço ser explorado. Na escala urbana, a tendência da verticalização dos sepulcros tem efeitos positivos. Um deles é a mimetização do cemitérios na paisagem em locais que já existe um entorno verticalizado, ou como no caso do CSJB, uma ocupação dos morros pela favela. Isso traz uma naturalização do espaço da morte, trazendo ele para a paisagem cotidiana da cidade, se fazendo ser lembrado. Por fim, o fator da religião no Brasil, deve ser visto da seguinte forma, o pluralismo religioso energizado pelo reavivamento de religiões tradicionais e da incorporação de novas formas de religiosidades que estamos vivendo não implica no recuo do cristianismo (PIERUCCI, 2000). O que significa que a cremação não é um opção para a maior parte da população. Isso mostra 6-Constatação feita a partir de ligações feitas para diversas empresas administradoras de cemitérios na região do Distrito Federal.

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que os espaços da morte continuarão a serem expandidos tanto verticalmente quanto horizontalmente, tornando-se cada vez mais presentes na cidade. O projeto para estes novos espaços pode e deve contribuir positivamente para a exploração do cemitério enquanto equipamento público, tornando-os mais instigantes e convidativos. O conceito de atmosferas destrinchado por Peter Zumthor (2009) é interessante para ser aplicado nos cemitérios, pois não trata exclusivamente de aspectos físicos e construtivos, mas também do imaterial, das sensações e sentimentos que um espaço pode transmitir. Tratando-se de um cemitério, não há muito o que se edificar, o verdadeiro atrativo é sua atmosfera. A reflexão que esta pesquisa proporcionou se situa entre a produção material e simbólica dos cemitérios, espaços que, em diferentes culturas, sempre foi assinalado por assimetrias e desigualdades, relacionadas a valores sociais e cerimoniais. No caso analisado, identificamos duas questões principais fortemente relacionadas com o histórico de formação do Rio de Janeiro. A primeira, diz respeito à localização do cemitério no espaço urbano, em local que por muito tempo não teve expressiva urbanização sendo posteriormente aglutinado pela malha urbana. A segunda, corresponde à própria disposição interna dos túmulos, e nisso a noção de atmosferas de Peter Zumthor nos auxiliou muito a identificar e tentar compreender as gradações. Assim, este estudo se coloca em continuidade a pesquisas que seguiram e que poderão seguir direções semelhantes, e a análise e conceitos aqui explorados podem apontar para uma relação mais próxima e menos segmentada entre cemitérios e espaços urbanos, contribuindo para a vida pública positivamente.

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