Flamínio, J. et al. (2017) Aplicabilidade do Programa Nacional de Vacinação: Perspetiva Epistemológica, Ético-Deontológica e Legal, Journal of Aging & Innovation, 6 (3): 12 - 27
REVISÃO NARRATIVA/ NARRATIVE REVIEW
DEZEMBRO 2017
Aplicabilidade do Programa Nacional de Vacinação: Perspetiva Epistemológica, Ético-Deontológica e Legal
Aplicabilidad del Programa Nacional de Vacunación: Perspectiva Epistemológica, Ética-Deontológica y Legal
Applicability of the National Vaccination Program: Epistemological, Ethical-Deontological and Legal Perspective
Autores José Flamínio 1, José Moreira 2, Pedro Fonseca 3, Ricardo Jorge4, Lucília nunes 5 1, 2, 3, 4
Escola Superior de Enfermagem São João de Deus, 5 Instituto Politécnico de Setúbal, Escola Superior de Saúde, Doutora
em Enfermagem
Corresponding Author: jafonsomoreira@gmail.com
RESUMO Este trabalho aborda os desafios da aplicabilidade do Programa Nacional de Vacinação (PNV), analisando-o do ponto de vista epistemológico, ético-deontológico e legal. O PNV durante os seus quarenta e cinco anos de existência demonstrou ser um sucesso, evidenciando numerosos ganhos em saúde que nos permitiu passar da cauda dos principais indicadores de saúde da Organização Mundial de Saúde (OMS), para a dianteira. Desta forma verificamos que a adoção de comportamentos de saúde centrados na pessoa, assumem cabal importância na promoção da saúde e adoção dos estilos de vida saudáveis visando o bem estar comum, sendo a adesão à vacinação umas das, e mais eficazes formas de o fazer.Do ponto de vista ético-deontológico e jurídico a nossa abordagem assenta em três pontos essenciais: a recomendação do PNV à imposição, a responsabilização pessoal e pelos dependentes e a repercussão das escolhas individuais na comunidade. Os direitos dos utentes devem ser identificados, respeitados e promovidos no âmbito dos deveres dos profissionais de saúde, neste caso os enfermeiros. Por fim a vacinação não é obrigatória com a exceção das vacinas do tétano e difteria, pelo que a adesão dos utentes é o principal ativo na aplicabilidade do PNV. Descritores: Vacinação; Cuidados de enfermagem; Programas de vacinação.
ABSTRACT This paper focus on challenges of the Portuguese National Vaccination Program (PNV) applicability, analyzing this issue from the epistemological, ethical-deontological, and legal point of view. The PNV during its forty-five years of existence proved to be a success, evidencing numerous gains in health that allowed us to move from the tail of the main health indicators of the World Health Organization (WHO) to the front. Therefore, we verify that the adoption of person-centered health behaviors take full importance in promoting health and adoption of healthy lifestyles for the common good, and adherence to vaccination is one of the most effective ways of doing that. From an ethicaldeontological and legal point of view, our approach is based on three essential points: the recommendation of the PNV to its imposition, personal responsibility and for those who depend, and the repercussion of individual choices in the community. The users of health care rights should be identified, respected and promoted funder the duties of health professionals, in this case nurses. Finally, vaccination is not mandatory with the exception of tetanus and diphtheria vaccines, so that adherence of users is the main asset in the applicability of the PNV. Descriptors: Vaccination; Nursing care; Immunization programs. Autores Dados curriculares JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951
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Introdução
felicidade variável, ainda que possa ser a
Neste artigo procuramos enfatizar a
demanda existencial que nos liga a todos.».
aplicabilidade do PNV nas questões em que assentam
as
normativas
das ferramentas mais efetivas e de menor custo
comparativamente ao domínio da proteção
benefício, são utilizadas no controlo e prevenção
individual
da
das doenças infeciosas, assumindo um papel
comunidade, atendendo aos domínios ético,
importante nos países em desenvolvimento,
epistemológico e jurídico.
sendo por isso irrefutável que as políticas de
e
da
Tornou-se
orientações
As vacinas são consideradas como uma
saúde
em
contexto
importante
abordar
o
vacinação contribuam substancialmente para
enquadramento conceptual epistemológico do
potenciar
o
aumento
PNV, com uma perspetiva histórica em Portugal,
consequente redução na incidência de doenças.
a sua caracterização, e uma contextualização
O paradigma preventivo de vacinação tem
abordagem ético-deontológica sobre a sua
mudanças nas relações com a imunização,
aplicabilidade, enquadrando a recomendação do
melhoria
PNV com a sua responsabilização, enfatizando
populações e pelo surgimento de declarações
as escolhas individuais e da comunidade nos
universais de proteção do ser humano.
éticos
associados
às
vacinas,
e
Segundo
últimas
condições
Lessa
décadas
e
sido
das
nas
imunizações
epistemológica. Depois procedemos a uma
conflitos
desafiado
das
sanitárias
(2013,
p.226),
por
das
"O
explicando as dificuldades de se ter uma
paradigma preventivo de vacinação tem sido
perceção vinculativa sobre os fundamentos da
desafiado nas últimas décadas por mudanças
vacinação e do inter-relacionamento entre o
nas relações com a imunização, melhoria das
campo das ciências humanas e biomédicas.
condições sanitárias das populações e pelo
Finalmente, no campo jurídico-legal, no domínio
surgimento
da
proteção do ser humano".
saúde
pública,
as
atitudes,
os
de
declarações
universais
de
comportamentos, os ambientes e os estilos de
O PNV é um programa universal, gratuito
vida da sociedade que são condições basilares
e acessível a todas as pessoas presentes em
para a saúde.
Portugal. Desde 1965, ano em que se iniciou o
Na busca permanente da excelência no
PNV, milhões de crianças e de adultos foram
exercício profissional o enfermeiro maximiza e
vacinados com enorme impacto na saúde pública
potencia o bem-estar aos utentes suplantado às
uma vez que as doenças para as quais há
necessidades individuais inerentes. Segundo,
vacinas no PNV permitem irradia-las e controlá-
Nunes (2008, p. 72), «o facto de sermos ao
las. O PNV em Portugal tem sido uma história de
mesmo tempo um ser-que pensa e um ser-que-
sucesso, cuja aplicabilidade
quer acarreta consequências no reino da ação,
profissionais de saúde em todo o país e à
(...) procuramos o sentido de “uma vida boa com
população, aliada à relação de confiança
e para os outros, em instituições justas”, sendo o
estabelecida. Os princípios, os objetivos e os
entendimento que temos do conteúdo da
resultados do PNV deverão ser salvaguardados,
se deve aos
visando os ganhos em saúde na obtenção da JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951
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efetividade das vacinas e das taxas de cobertura
"Em 1965 no nosso país foi implementado
vacinal. (Diário da República, 2ª série, despacho
o PNV, financiado na sua totalidade pelo
nº 17067/2011).
Ministério da Saúde, tem como finalidade ser um
As vacinas, o PNV e os Referenciais de
Programa universal, gratuito e acessível, sem
Formação e de Competências no domínio da
barreiras, para todas as pessoas presentes em
vacinação podem sofrer alterações influenciadas
Portugal. Engloba as vacinas consideradas de
por fatores externos e internos.
primeira linha, em que, da sua aplicabilidade se
A realização da parte escrita do trabalho
obtêm os maiores ganhos de saúde" (Afonseca,
obedeceu ao novo acordo ortográfico da Língua
2011, p.16). O PNV em Portugal tem sido uma
Portuguesa.
história de sucesso e replicado por outros países. Na Introdução documentada no primeiro PNV era
Perspetiva epistemológica
referido que o panorama epidemiológico das
A vacinação e a imunização são conceitos
doenças evitáveis por vacinações específicas em
muitas vezes utilizados como sinónimos. A
Portugal, há muito que nos colocava em situação
vacinação expressa a aplicabilidade de vacinas.
desprimorosa em relação aos restantes países
Imunização representa um sentido mais amplo
da Europa (Freitas, 2007).
estando associada à aquisição de imunidade
após
a
administração
de
substância
imunobiológica.
O PNV iniciou-se assim entre outubro e
novembro de 1965 com distribuição de vacinas à totalidade da população e de modo gratuito,
Apesar de existirem vários registos
segundo um conjunto de documentos de
históricos que evidenciam tentativa de atuação
Orientação
relativa a vacinação, é a Edward Jenner que se
recomendado. "Para efeito de apresentação de
atribui o mérito da descoberta da vacinação. No
prova da vacinação foi criado, ainda em 1965, o
ano de 1888 foi fundado o Instituto Pasteur, com
Boletim Individual de Saúde para registo das
incidência
doenças
vacinas efetuadas que deveria ficar na posse do
infeciosas, onde a vacinação teve progressos
utente, considerando que se encontrava já
notáveis graças às escolas alemã e francesa
estabelecida em legislação a obrigatoriedade da
nesta área (DGS, 2002).
administração
principal
na
luta
das
Técnica
de
e
algumas
um
calendário
vacinas
para
Em 1965 no nosso país foi implementado
determinados casos nomeadamente a Vacina
o PNV, financiado na sua totalidade pelo
Anti-Variólica (entre 1894 e 1977), Vacina Anti-
Ministério da Saúde, tem como finalidade ser um
Tetânica e Anti-Diftérica, com a confirmação à
Programa universal, gratuito e acessível, sem
entrada na escola primária, secundária ou de
barreiras, para todas as pessoas presentes em
outro estabelecimento de ensino - desde 1962
Portugal. Engloba as vacinas consideradas de
(Feliciano, 2002).
primeira linha, em que, da sua aplicabilidade se
obtêm os maiores ganhos de saúde.
A primeira vacina a ser introduzida no
PNV foi a da poliomielite. Posteriormente em 1966 seria implementada a da tosse convulsa,
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difteria, tétano e varíola. A vacinação da BCG para
tuberculose
foi
facto
deve-se
não
apenas
à
integrada
diminuição da morbi-mortalidade que as doenças
progressivamente no PNV." (Afonseca, 2011, p.
infetocontagiosas, mas, também, à proteção
17).
global que a sua administração massiva veio
treze
a
Este
Atualmente o PNV inclui vacinas para
conferir às mesmas. "Uma elevada taxa de
doenças:
pertussis
cobertura de vacinação duma população irá
poliomielite,
impedir a circulação dos agentes infeciosos
difteria,
tétano,
designada de tosse convulsa, tuberculose,
sarampo,
parotidite,
rubéola,
(bactérias ou vírus) que provocam as doenças (a
hepatite B, infeções por Haemophilus influenzae
este conceito chama-se imunidade de grupo)
tipo B, doença invasiva causada por Neisseria
levando à erradicação ou eliminação de doenças
meningitidis do serogrupo C, vírus do papiloma
como
humano e vacina conjugada de 13 valências
erradicada do mundo em 1980), à poliomielite
(serótipos 1, 3, 4, 5, 6A, 6B, 7F, 9V, 14, 18C, 19A,
(declarada eliminada da Europa em 2002) e à
19F, 23F) para infeções pneumocócicas (Pn13).
difteria (sem casos em Portugal desde 1993)
Assistimos deste modo a uma atualização
(DGS, 2004).
constante do PNV, perspetivando-se para o ano de 2017 alterações ao mesmo.
já
aconteceu
à
varíola
(declarada
O último estudo realizado à população portuguesa sobre a sua imunidade relativa às
"Assistiu-se a uma história de sucesso na
doenças prevenidas pela vacinação no âmbito do
redução da morbilidade e da mortalidade pelas
PNV – 2º Inquérito Serológico Nacional 2001-
doenças-alvo de vacinação ao longo dos anos
2002 – demonstrou que a maioria da população
graças à eficácia da Vacinação. Desde o início do
portuguesa está imunizada para várias doenças
PNV já foram vacinados cerca de 10 milhões de
abrangidas
crianças bem como vários milhões de adultos."
sarampo, rubéola), devido à prática continuada
(Afonseca, 2011, p. 20).
de
pelo
vacinação
PNV
universal,
(tétano,
que
poliomielite,
resultou
em
Assistiu-se a uma história de sucesso na
elevadas coberturas vacinais mantidas ao longo
redução da morbilidade e da mortalidade pelas
dos anos, que rondaram 96-97% para as vacinas
doenças-alvo de vacinação ao longo dos anos
administradas no primeiro ano de vida, 94-95%
graças à eficácia da Vacinação. Desde o início do
para as administradas durante o segundo ano de
PNV já foram vacinados cerca de 10 milhões de
vida e aos 5-6 anos de idade (Freitas, 2004).
crianças bem como vários milhões de adultos. As vacinas permitem salvar mais vidas e
Os cuidados de saúde primários são, segundo
o
Conselho
Internacional
de
prevenir mais casos de doença do que a maioria
Enfermeiros (CIE), “(...) a base de contato com o
dos tratamentos médicos. A sua implementação
sistema nacional de saúde para os indivíduos, as
em Portugal tem vindo a ser responsável por uma
famílias e a comunidade, trazendo os cuidados
significativa melhoria do estado de saúde das
de saúde o mais possível para os locais onde as
populações (DGS, 2005).
pessoas vivem e trabalham (...).” (CIE, 2008, p.4). A criação dos cuidados de saúde primários
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representou uma inovação para a prestação e
profissional tem conhecimento especializado
organização dos cuidados de saúde em Portugal.
num dado domínio, mas o utente também se
De uma organização quase totalmente voltada
especializou sobre o seu corpo e sobre o
para os hospitais, passou-se a olhar para os
contexto da sua vida.” (Reis 2005, p.32). Essa
centros de saúde como porta de entrada no
parceria epistemológica significa que o utente é
sistema de saúde (Biscaia et al, 2006).
parte integrante em todo o processo. Ao invés de
No âmbito do enquadramento conceptual
pensar pelo utente, o profissional de saúde
para o exercício profissional emanado pela
acompanha o raciocínio deste e promove a
Ordem dos Enfermeiros (OE), o mesmo centra-
reflexão, a autonomia e a tomada de decisão.
se na relação interpessoal de uma pessoa e/ou
Este modelo de relação entre o profissional e
grupo
utente tem implicações nas metodologias de
de
pessoas
(família/comunidades),
distinguindo-se o seu cuidado pela formação e
educação para a saúde utilizadas.
experiência, permitindo estabelecer com o utente
Perspetiva ético-deontológica
o respeito pelas suas capacidades e valorização do
seu
papel,
na
da implementação da vacinação no âmbito do
prossecução do seu projeto de saúde. Cada
PNV, remete-nos para a emergência de dilemas
pessoa procura o equilíbrio em cada momento,
éticos por parte dos enfermeiros.Caracterizando-
de acordo com os vários desafios que se lhe
se a Enfermagem como uma disciplina e
colocam, sendo a sua saúde encarada como
profissão, o conjunto de situações complexas
reflexiva no contexto de um processo dinâmico e
éticas de exigência de tomada de decisão
contínuo.
são
fundamentada, remete-nos para um campo
influenciados pelo ambiente que o rodeia, bem
próprio no agir dos enfermeiros que nasce da
como nos seus processos intencionais baseados
própria prática e das preocupações profissionais
nas crenças, valores e vontades de índole
relativamente aos destinatários dos cuidados,
individual (OE, 2011). O profissional de saúde
apresentando-se deste modo a “Ética de
assume o papel de facilitador do processo
Enfermagem”, segundo Nunes (2004). Para a OE
preventivo ou de aprendizagem ajudando o
(2001), referente aos Padrões de Qualidade dos
utente na tomada de decisão, informando-o
Cuidados
sobre os fatores de risco de uma determinada
Morgado et al (2014), a reflexão e a tomada de
doença. Depois de ter conhecimento dos fatores
decisão assumem relevância crescente na
de risco e da necessidade de mudança de estilo
Enfermagem,
de vida e até mesmo da reformulação dos seus
relacional que o enfermeiro estabelece com a
objetivos pessoais, a pessoa poderá se o
pessoa e / ou grupo de pessoas no decorrer do
pretender
seu
Os
tornando-o
seus
envolver-se
proactivo
A obrigatoriedade e/ou a recomendação
comportamentos
no
processo.
Pode
ciclo
de
Enfermagem,
enunciada
enquadrando-se
de
vida,
com
no
as
por
espectro
respetivas
afirmar-se que há uma parceria epistemológica
características (valores, crenças e desejos)
entre o profissional de saúde e o utente “Ambos
individuais.
têm algo a oferecer e conhecimento a propor. O
O processo da vacinação, tem implícito o fornecimento de informação e o questionamento
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fornecimento de informação e o questionamento
dependentes
por parte daqueles a quem se prestam cuidados,
comunidade.
(crianças
e
idosos)
e
na
visando a qualidade de assistência de saúde.
- A adesão ao PNV possibilita a adoção
Torna-se primordial que a dimensão ética
de comportamentos corretos com reflexo de
assuma a relevância devida no processo de
beneficência individual e comunitária de forma
tomada de decisão e clarificação por parte dos
justa e equitativa, diminuindo a vulnerabilidade
enfermeiros no seu desempenho profissional.
dos intervenientes na comunidade.
Tendo em conta estes aspetos, temos
- A não adesão ao PNV levará a
como referencial três pressupostos importantes
consequências no âmbito da responsabilidade
relativamente ao PNV, ou seja:
pela saúde individual, dos descendentes diretos
- Da recomendação do PNV à sua
Segundo Morgado et al (2014, p.116) “no
imposição; - Responsabilização pessoal e pelos
- Repercussão das escolhas individuais
cuidado à pessoa (...) quer no contexto das relações
na comunidade. Compreendemos, portanto, a importância os
contexto da prática de enfermagem emergem direitos, deveres e o respeito por valores quer no
dependentes;
que
e das gerações futuras.
princípios
implementação
do
éticos
estabelecem
PNV,
entre
os
na
quais
multidisciplinares
que
devem
ser
considerados na tomada de decisão ético-
deontológica. Para
Deodato
(2006),
referido
por
destacamos, e que são abordados também por
Morgado et al (2014), um problema ético emerge,
Mendes (2009), o princípio da beneficência,
quando apresentado primeiramente, mas para a
orientado para a realização do bem; da justiça,
qual a reflexão ética sobre os valores e princípios
através de uma distribuição justa e equitativa; da
em causa possibilita uma solução adequada,
vulnerabilidade, invocando a solidariedade e
fundamentada nos princípios éticos e deveres
equidade.
referidos,
deontológicos, sendo assim, um problema ético
acrescentamos o princípio da responsabilidade,
tem solução através do respeito pelos princípios
assumindo através deste as decisões que se
éticos. O mesmo autor faz a destrinça entre
tomam tendo como implícito as repercussões e
problema ético e dilema ético, evidenciando que
consequências das escolhas, tanto a nível
para o dilema ético as soluções encontradas
individual como comunitário.
colocam em questão os princípios éticos ou os
Aos
princípios
Através da recorrência a estes princípios, é possível abordar os três pressupostos chave
deveres profissionais. No que diz respeito à identificação dos problemas éticos identificados na prestação dos
que enunciamos anteriormente. ou
cuidados de Enfermagem, segundo Nunes
recomendado à pessoa, possibilitando assim a
(2006), destacamos as categorias: informação; a
opção pelas escolhas individuais, levando a
decisão do destinatário dos cuidados; o respeito
repercussões
pela pessoa e a proteção da saúde. Entre estas
-
Deverá
o
PNV
individuais,
ser
dos
imposto
que
estão
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quatro enuncia
três
categorias, das
Deodato
referidas
(2010)
anteriormente
Assume-se assim o respeito pelas decisões individuais,
singularidades,
fundamentos
e
(informação; a decisão do destinatário dos
opções que levam à tomada de escolhas por
cuidados; o respeito pela pessoa). Para perfazer
parte de cada um e que com as quais podemos
a quinta categoria acrescentamos os problemas
não concordar.
éticos estabelecidos na relação doente/família,
Relativamente ao princípio da proteção
evidenciados por Fortes (2004) e referidos por
da saúde, a não implementação do PNV pode ser
Morgado et al (2014).
constatado como a não utilização de uma
Aplicaremos,
seguidamente,
estas
categorias à temática do PNV.
“ferramenta” validada para alcançar o bem individual
e
o
bem
comum.
Na
relação
No que diz respeito à informação, verifica-
estabelecida com os doentes e a família,
se por vezes que a mesma relativamente às
evidenciados por Fortes (2004) e referidos por
vacinas é não fundamentada, ao seu propósito, e
Morgado et al (2014), realçamos que na situação
aos ganhos individuais e comunitários da sua
do PNV, sugerimos a substituição da designação
implementação, a prevalência de determinados
de doente, possivelmente por utente, realçando
mitos sobre veracidade da evidência científica
assim a possível determinação e escolha do
possivelmente não transmitida ou transmitida de
projeto terapêutico (neste caso tendo em vista a
forma não esclarecedora por parte do emissor.
promoção) estabelecido entre o indivíduo e a
Nunes (2006, p. 264) refere que “a informação é
família, remetendo-nos para a implicação das
um garante, um meio para que as pessoas
escolhas no seio dos dependentes.
possam decidir sobre si, de forma livre e
A opção da escolha pela não adesão ao
esclarecida.”
PNV,
tem
como
consequência
o
A decisão do destinatário dos cuidados
ressurgimento de doenças já controladas.
encontra-se associada à informação veiculada,
Verifica-se assim a prevalência de mitos e
visto que através da informação transmitida
dúvidas por parte dos individuais perante as
acerca da temática do PNV, através de
evidências da ciência. Como exemplo
esclarecimento de dúvidas e reforço de opiniões,
enunciamos
pretende-se apoiar e promover uma decisão que
potenciam a dúvida relativamente à adesão
neste caso seria a adesão ao PNV, de uma forma
ao PNV, segundo a DGS (Boletim de
pessoal
dependentes
Vacinação - n.º 4, 2012, p. 1-2), “As
representados (crianças e idosos). Citamos
doenças começaram a diminuir antes das
Nunes (2006, p.274), ao referir a Pessoa
vacinas, devido às melhores condições de
enquanto “ser social e agente intencional de
higiene”,
comportamentos baseados nos valores, nas
vacinação estão praticamente eliminadas,
crenças e nos desejos da natureza individual, o
pelo que não há razão para vacinar o meu
que torna cada pessoa num ser único, com
filho”, “É preferível ficar imunizado pela
dignidade própria e direito a autodeterminar-se”.
doença do que pelas vacinas”, “As vacinas
ou
destinada
aos
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“As
algumas
abordagens
doenças
evitáveis
que
pela
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podem
causar
reações
graves,
dependentes, junto da comunidade em que o
doenças e até a morte”, “Administrar múltiplas
indivíduo se insere. Magalhães (2001, p.224)
vacinas
doenças
refere “que ser pessoa é ser responsável e poder
diferentes podem sobrecarregar o sistema
ser responsabilizado pelo seu bem e pelo dos
imunitário”, “Preferia que o meu filho não
outros e pelo mundo onde se situa”.
simultaneamente
adversas
para
apanhasse todas essas vacinas hoje”. Através da
Como Renaud (2001, p.16) refere, “a
refutação das dúvidas e dos mitos, contribuímos
emergência de uma nova forma de compreender
para os dois motivos principais para vacinar,
a ética social (...) pode ser caracterizada, a
sendo estes a proteção individual e a proteção da
montante do agir, pelo facto de juntar uma
comunidade.
multiplicidade de pessoas implicadas na tomada
Perguntamos então: como é que o
de decisão; a jusante, ela ocupa-se apenas dos
momento em que vivemos atualmente se pode
atos que têm uma repercussão social clara, ainda
questionar e contestar a ética do passado, e de
que a própria posição no ato seja individual.”
que modo é que a ética de hoje prepara o futuro?
A convivência numa sociedade plural,
Quando enunciamos “da recomendação
reflete-se na relação que os diferentes decisores
do PNV à sua imposição”, evidenciamos a
e participantes, estabelecem entre si. Para
necessidade
decisões
Renaud (2001, p.13) “A ética social no sentido
coletivas, nos casos em que o agir interfere com
clássico de uma ética que diz respeito à
variados decisores e agentes responsáveis,
sociedade sucede a uma ética social cujo sujeito
sendo que uma das características dos regimes
de decisão mudou de palco, passando do plano
democráticos, caracteriza-se pela recusa de
individual para o plano coletivo.”
imposição de uma determinada conceção do
Constata-se
bem (Renaud, 2001). O mesmo autor enuncia a
individual pode não se implementar de
ética da discussão, no intuito da focalização,
forma generalizada, verificando-se tomadas
sendo o foco um consenso tão abrangente
de posição diferenciadas. Como Renaud
quanto possível entre os membros de um grupo,
(s.d.) refere, podem verificar-se situações
apresentando-se
a
em que o bem da pessoa não corresponde
possibilidade concreta de formar consenso no
exatamente ao bem particular, existindo
que diz respeito aos atos que implicam efeitos
assim grupos sociais que se apresentam
sociais importantes. Neste caso concreto o
como entidades isoladas ou de escala
consenso emergente seria a decisão de opção
reduzida e cujos interesses particulares se
pelo PNV.
sobrepõem ao bem das pessoas. Nestas
de
serem
o
seu
tomadas
limite
como
Enunciar a “responsabilização pessoal e
também
que
a
adesão
situações, a definição de bem comum pode
pelos dependentes” e a “repercussão das
referir-se
escolhas individuais na comunidade”, leva-nos a
indivíduos ou ainda ao bem da maioria dos
pensar no facto que pode ter a escolha individual
cidadãos, mas não precisamente ao bem de
de ser vacinado e possibilitar a vacinação dos
todos. Para reforçar esta ideia, citamos
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a
um
grande
número
de
Magalhães (s.d., p.218), “Já os antigos VOLUME 6. EDIÇÃO 3
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Magalhães (s.d., p.218), “Já os antigos diziam
de 21 de Abril, Diário da República), encontramos
que para haver Bem, tem que estar tudo bem;
várias referências a conceitos e características
Que para o “todo” estar mal, basta que algo
dos cuidados de enfermagem tendo em atenção
esteja mal”.
a implementação do PNV, referenciando-se
Quando
falamos
em
precaução
necessidades, conhecimentos e competências
realçamos a ancoragem deste princípio ao
de atuação perante o indivíduo, família, grupos e
princípio da responsabilidade de Hans Jonas
comunidade, adequando a atuação consoante as
(1979), citado na Tomada de Posição sobre a
necessidades.
Segurança
Universal dos Direitos do Homem, evidencia-se a
do Cliente (OE, 2006,
p.
3),
Enunciado
na
Declaração
relativamente à sua admoestação a “de modo a
dignidade
que os efeitos
da tua ação não sejam
fundamental dos direitos humanos, realçando-se
destruidores da possibilidade da vida humana na
que os seus intervenientes são dotados de razão
terra”. Sendo que a responsabilidade resulta de
e de consciência, devendo agir uns para com os
um dever para com o futuro da humanidade,
outros em espírito de fraternidade (Art. 1.º). A
sendo por isso necessário criar condições para
abordagem à dignidade humana remete-nos o
que tal aconteça, potenciando gerações futuras.
reconhecimento da autonomia de cada pessoa
Surge a preocupação de uma responsabilidade
delinear os seus planos de vida e as suas
de cuidado para como o futuro, de cariz individual
próprias normas de excelência. Decorrente da
e coletivo (OE, 2006). A preocupação com as
dignidade do ser humano, decorre o direito à
gerações futuras, remete-nos para a criação de
autodeterminação, na operacionalização da sua
condições favoráveis, onde podemos incluir o
autonomia. Quando se protege a autonomia
PNV, atuando ao nível da prevenção, incidindo
estamos a apoiar a defesa dos direitos da
na gestão do risco.
pessoa, indo de encontro ao respeito pela
Abordando
agora
a
como
o
caráter
de
igualdade
perspetiva
dignidade da pessoa através da promoção da
deontológica e como refere Campbell (1996),
sua capacidade para pensar, decidir e agir (OE -
citado por Ferreira (2005, p. 50), “As exigências
Enunciado
da prática profissional nunca poderão separar-se
Informado, 2007).
da ética e do código deontológico da profissão,
de
posição,
Consentimento
A possibilidade de escolha pela adesão
pois poder-se-á dizer que esta relação é um bem
ao
pessoal, mas também uma arte do bem comum
fundamentada, possibilita a opção consciente
para todos”. A ética profissional insere-se na
dos seus atos, na promoção da sua capacidade
ética social, isto é, na ciência das normas
reflexiva de decidir e agir no que se pensa que é
implícitas à atuação moral, exigindo assim a
melhor para si com repercussão nos que a
profissão determinados comportamentos que se
rodeiam.
dirigem por normas específicas (Ferreira, 2005).
autodeterminação, o enfermeiro assume o dever
Perante o Regulamento do Exercício
de “informar o indivíduo e a família no que
Profissional do Enfermeiro (Dec. Lei n.º 104/98
respeita aos cuidados de enfermagem” (Art.
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PNV,
No
possibilitando
respeito
pelo
informação
direito
105º, alíneas a, b, c). VOLUME 6. EDIÇÃO 3
à
Página 21
105º, alíneas a, b, c).
é
sempre
uma
decisão
assumida
Tendo presente o cumprimento das
enfermeiro. Segundo Figueiredo (2004) o código
normas deontológicas e as leis que regem a
deontológico
profissão, “o enfermeiro é responsável para com
válidos e universais, possibilita a orientação,
a comunidade na promoção da saúde e na
permitindo a reflexão individual, a liberdade e o
resposta
em
exercício da vontade própria do enfermeiro, não
cuidados de enfermagem”, assumindo o dever de
retirando deste modo a dimensão humana do ato
conhecer as necessidades da população e da
implementado pelo enfermeiro.
adequada
às
necessidades
comunidade em que está profissionalmente inserido,
participando
na
orientação
fundamentado
em
pelo
princípios
Concluindo, e segundo (Mendes, 2009),
da
os enfermeiros na sua prática, na especificidade
comunidade tendo em vista a solução de
da natureza dos cuidados de enfermagem (neste
problemas detetados, colaborando para isso
caso específico enquadramos a implementação
como outros profissionais em programas que
do PNV) adequados às necessidades reais e
respondam às necessidades da comunidade
potenciais da pessoa ou grupo, tendo por
(Art. 101º, alíneas a, b e c).
fundamento a evidência científica, na ética e
Segundo a DGS (Boletim de Vacinação - n.º 2, 2012) os profissionais de saúde são
deontologia
profissional,
podem
garantir
cuidados de qualidade.
fundamentais para a execução e o sucesso dos programas de vacinação, visto que são a linha da frente,
com
pais,
A vacinação foi alvo de transformações ao
educadores e cuidadores que tomam a decisão
longo do tempo, aceite pelos estados modernos
sobre a vacinação das crianças e dependentes.
como um meio de segurança de eleição nas
Os enfermeiros são das fontes de informação em
políticas sanitárias para lidar com epidemias e
que a população mais confia. Para continuar e
doenças infeciosas (Cunha e Durand, 2008).
melhorar esta credibilidade social é necessário a
Além de imposta ou patrocinada pelo Estado,
formação
dos
como um dos meios privilegiados de gestão de
profissionais envolvidos na vacinação, devendo
saúde pública, através da implementação de
ser uma preocupação constante dos serviços de
planos
saúde.
infraestrutura que a acompanha – globalizou-se,
e
contacto
direto
permanente
com
o
Perspetiva jurídica
atualização
nacionais
de
vacinação
–
e
a
O enfermeiro no que diz respeito à vida e
sobretudo desde que a Organização Mundial de
à qualidade de vida, aquando a implementação
Saúde (OMS) lançou, em 1974, o Expanded
do PNV, assume o dever de respeitar a
Programme on Immunization. A vacinação em
integridade biopsicossocial, cultural e espiritual
Portugal não é obrigatória, com exceção daquela
da
esforços
contra o tétano e difteria a “todos os indivíduos
profissionais para valorizar a vida e a qualidade
domiciliados no País, dos 3 aos 6 meses de
de vida (Art. 103º alíneas b, c). A tomada decisão
idade, com administração de doses de reforço,
na enfermagem, tendo implícita regras e normas,
pela primeira vez, entre os 18 e os 24 meses e,
pessoa,
participando
nos
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VOLUME 6. EDIÇÃO 3
Página 22
pela segunda vez, entre os 5 e os 7 anos de idade” (Decreto-Lei nº 44/198, Art.1º, 1962). O
PNV
proposto
pela
DGS
Reportando-nos à Lei de Bases da Saúde, Base III, a legislação sobre a saúde é de
inclui
interesse público, pelo que a sua inobservância
recomendações para um conjunto de 12 vacinas,
leva a uma responsabilidade penal, contra-
a que acresce a vacinação contra a gripe, e não
ordenacional, civil e disciplinar. Assim, e de
é muito diferente do que se propõe nos países da
acordo com o Dec-Lei 44/198, os indivíduos
União Europeia. No entanto, e de acordo com a
sujeitos à vacinação que voluntariamente não
Base XIV, nº 1, b) da Lei de Bases da Saúde, os
tenham cumprido as obrigações definidas serão
utentes têm direito a decidir receber ou recusar a
convocados para comparecer, em dia, hora e
prestação de cuidados que lhes é proposta, salvo
local designados (Decreto-Lei nº 44/198, Art. 5º,
disposição especial da lei. Com estes dois
1962). As autoridades administrativas e policiais
pressupostos podemos constatar que, o Estado
deverão prestar o seu concurso às autoridades
diz às pessoas aquilo que é recomendado para
sanitárias, sempre que forem solicitadas, sendo
benefício do próprio organismo a fim de se
as
conseguir atingir um nível elevado de segurança
punidas nos termos do Art. 28.º do Decreto-Lei nº
coletiva no corpo social. Uma eventual exceção,
13/166, de 28 de Janeiro de 1927 (Decreto-Lei nº
prende-se com alguma resistência à vacinação
44/198, Art. 10º e Art. 11º, 1962).
transgressões
ao
regime
estabelecido
detetável entre grupos minoritários tais como, os
Para efeito de apresentação de prova, foi
ciganos portugueses e os adeptos de sistemas
criado em 1965, o Boletim Individual de Saúde,
dietéticos alternativos (ex. macrobiótica), bem
em que se registam as vacinas efetuadas. É
como sobre suspeitas infundadas acerca de
fundamental o registo completo dos atos vacinais
alguns componentes das vacinas.
no Boletim Individual de Saúde e na ficha de
Este é, pois, um contexto onde mais se
vacinação individual ou Sistema de Informação
podem evidenciar algumas das formas de
para as Unidades de Saúde (SINUS) para a
desconfiança em relação a aspetos importantes
correta interpretação do estado vacinal de cada
das políticas de segurança sanitária e de saúde
um em qualquer altura e em qualquer serviço.
pública.
Que
noções
estão
em
jogo
na
Para o exercício livre e esclarecido dos
aceitabilidade da vacinação em geral, ou na
direitos que a lei confere é essencial que as
aceitação de certas vacinas e na recusa de
pessoas estejam o melhor esclarecidas e
outras? A lei portuguesa é bastante clara neste
formadas possível, naquilo que diz respeito aos
âmbito. A vacinação contra o tétano e difteria
aspetos
será apenas dispensada nos indivíduos que
beneficiárias. De acordo com a Lei n.º 15/2014
apresentem certificado médico comprovativo de
de 21 de Março (que emana da Base XIV, n.º 1
contra-indicação ou quando esta seja verificada
alínea b, da Lei de Bases da Saúde, Lei n.º 48/90
pela autoridade médico-sanitária, e logo que
de 24 de Agosto), no seu Capítulo II (Direitos do
cesse esse motivo a mesma volta a ser
utente
obrigatória (Decreto-Lei nº 44/198, Art. 6.º, 1962).
(Consentimento ou Recusa) o consentimento ou
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da
dos
vacinação
serviços
de
de
que
saúde),
vão
Art.
ser
3.º
a recusa da prestação dos cuidados de saúde VOLUME 6. EDIÇÃO 3
Página 23
a recusa da prestação dos cuidados de saúde
saúde, estimulando assim nos indivíduos e nos
devem
grupos
ser
declarados
de
forma
livre
e
sociais
a
modificação
dos
esclarecida, podendo o utente dos serviços de
comportamentos nocivos à saúde pública ou
saúde, em qualquer momento da prestação dos
individual, e da vacinação, em particular.
cuidados de saúde, revogar o consentimento.
No seguimento desta abordagem jurídica
Em 1998 foi criada a OE tendo sido
aos desafios da aplicabilidade do PNV, importa
aprovado o seu Estatuto – a segunda alteração
ainda refletir acerca do quadro legal na tomada
foi publicada na Lei n.º 156/2015 de 16 de
de decisão acerca da saúde dos menores e
Setembro (2015), procedendo da Lei nº 2/2013
incapazes, citando a Base XIV no seu n.º 3, da
de 10 de Janeiro; e no Art. 105º regulamenta o
Lei de Bases da Saúde e a Lei n.º 15/2014 de 21
“Dever de informação”, no qual os Enfermeiros se
de Março no seu Capítulo II, artigo 11.º que dela
comprometem a, informar o indivíduo e a família
emana, a lei terá que prever as condições em
no que respeita aos cuidados de enfermagem,
que os representantes legais dos menores e
respeitar, defender e promover o direito da
incapazes podem exercer os direitos que lhes
pessoa ao consentimento informado, e atender
cabem,
com responsabilidade e cuidado todo o pedido de
assistência, com observância dos princípios
informação ou explicação feito pelo indivíduo em
constitucionalmente definidos, isto quer dizer que
matéria de cuidados de enfermagem tal como,
excepto nas condições que a lei prevê, no caso
informar sobre os recursos a que a pessoa pode
dos menores e pessoas incapazes de decidir por
ter acesso, bem como sobre a maneira de os
elas próprias, os pais ou os representantes
obter.
destas pessoas, tomam as decisões respeitantes
designadamente
o
de
recusarem
Do ponto de vista da prática profissional
à saúde destes. Logo, no que diz respeito à
em relação à aplicabilidade do PNV, este artigo
vacinação, isto também se verifica e assume
reveste-se de suma importância pois não só
grande
prevêem a proteção dos direitos dos utilizadores
incumprimento da primovacinação durante a
do Serviço Nacional de Saúde garantindo a
infância, contemplada no PNV atual. Se os pais
qualidade
tiverem
dos
cuidados
prestados
pelos
importância
uma
posição
no
cumprimento
antagonista
ou
face
à
Enfermeiros, como também podem contribuir
vacinação, podem recusar algumas vacinas para
para uma maior adesão ao PNV.
os seus filhos, pois segundo o Parecer n.º
Neste aspeto, o quadro legal é um ativo
11/2011 da Mesa do Colégio da Especialidade de
importante na promoção em geral das políticas
Saúde Infantil e Pediátrica, da OE (pág. 2) que
de saúde conforme está estabelecido na Lei de
cita o Dec-Lei 44/198, de 20.02.1962 (Artigo 1.º)
Bases da Saúde, Base II, nº1, alínea a) que diz,
“a vacinação em Portugal não é obrigatória com
que a promoção da saúde e a prevenção da
exceção das vacinas contra o tétano e a difteria,
doença
no
que ainda não tendo sido a revogado o decreto
planeamento das atividades do Estado e onde é
de lei respetivo se mantém em vigor.” Deixando
incentivada a educação das populações para a
de fora muitas outras vacinas importantes na
fazem
parte
das
prioridades
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persecução dos objetivos de, promoção da VOLUME 6. EDIÇÃO 3
Página 24
persecução dos objetivos de, promoção
A abordagem ético-deontológico assenta
da saúde e prevenção da doença que fazem
em três pontos essenciais, da recomendação do
parte das prioridades no planeamento das
PNV à imposição, a responsabilização pessoal e
atividades do Estado conforme está preconizado
pelos dependentes e a repercussão das escolhas
na Base II, n.º1, alínea a) da Lei de Bases da
individuais
Saúde referido anteriormente.
constatam-se os direitos dos indivíduos na sua
na
comunidade.
Efetivamente,
Em relação às restantes vacinas em
condição de seres humanos plenos de dignidade,
Portugal, os pais ou os representantes de outros
à tomada de decisão em saúde, na escolha da
incapazes de decidir por si podem mesmo
adesão ou não ao programa de vacinação
recusá-las, o que se impõe como um desafio ao
recomendado ou na tomada de decisão pelos
cumprimento e aplicabilidade do PNV.
seus
dependentes,
bem
como
a
sua
responsabilização ao nível dos efeitos que as Conclusão
suas decisões podem ter na comunidade (por
Ao longo deste trabalho refletimos acerca
exemplo a manutenção da imunidade de grupo).
da aplicabilidade do PNV, pois consideramos que
Observamos
este, apesar de ser um vincado sucesso desde
profissionais, neste caso os dos enfermeiros, que
que foi implementado no nosso país na década
passam pelo respeito e fomentação da tomada
de sessenta do século XX, ter contribuído para
de
uma das grandes conquistas do SNS, que foi a
disponibilização de toda a informação solicitada
drástica diminuição da mortalidade infantil e ter
e considerada pertinente, no respeito pela
ajudado a erradicar doenças como a poliomielite,
dimensão
provando a sua eficácia e segurança ao longo
comunidades em que estão inseridos ou dos
destes últimos quarenta e cinco anos, enfrenta
grupos de influência ideológica com os quais se
hoje vários desafios, de novos paradigmas
identificam, na investigação numa ótica da
sociais, culturais e organizacionais na tomada de
melhoria dos cuidados e na formação dos seus
decisão, até ao surgimento de novas ideias
pares.
crenças e estilos de vida que se mostram antagonistas à vacinação.
também
decisão
dos
individual
os
deveres
utentes,
dos
através
mesmos,
dos
da
das
O desafio final à aplicabilidade do PNV é o próprio quadro legal português, uma vez que
Ao analisarmos o PNV do ponto de vista
conforme está estabelecido no Decreto Lei nº
ético, epistemológico e jurídico, verificamos que
44/198, de 20.02.1962 (Art.1.º) a vacinação em
a
adoção
de
saúde
Portugal não é obrigatória com exceção das
assumem
cabal
vacinas contra o tétano e difteria, e que por ainda
importância na promoção da saúde e adoção dos
não ter sido a revogado se mantém em vigor.
estilos de vida saudáveis, visando o bem-estar
Muitas outras vacinas que estão recomendadas
comum, sendo a adesão um dos instrumentos
no PNV e que são fundamentais na persecução
principais e mais eficazes na persecução desses
dos objetivos das políticas de saúde pública, que
objetivos.
assentam naturalmente na prevenção, ficam de
centrados
de
comportamentos
na
pessoa,
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fora por isso do ponto de vista legal as pessoas VOLUME 6. EDIÇÃO 3
Página 25
fora por isso do ponto de vista legal as
Conferência
Internacional
sobre
Cuidados
pessoas têm o poder de decisão sobre si e os
Primários de Saúde - Declaração de
seus dependentes, exceto na vacinação contra o
Alma-Ata, URSS, 6-12 de setembro de
tétano e difteria.
1978
Isto leva-nos a concluir que a pessoa é o
Conselho Internacional de Enfermeiros (2008).
ativo principal no sucesso ou no insucesso da
Servir
aplicação do PNV e que cabe aos profissionais
qualidade: Os Enfermeiros na vanguarda
guiar a pessoa em respeito pela sua autonomia e
dos cuidados de saúde primários. Edição
individualidade,
portuguesa da Ordem dos Enfermeiros.
de
encontro
às
melhores
decisões pessoais e coletivas na realização dos objetivos das políticas de saúde públicas.
a
Comunidade
e
garantir
a
Decreto-Lei nº 44198 de 20.02.1962, Ministério da Saúde e Assistência, Portugal. Decreto-Lei n.º 104/98 de 21 de Abril, Diário da
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