limpeza de feridas

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REVISÃO SISTEMÁTICA / SYSTEMATIC REVIEW

JULHO, 2012

LIMPEZA DE FERIDAS CRÓNICAS: ABORDAGEM BASEADA NA EVIDÊNCIA CHRONIC WOUND CLENSING: EVIDENCE BASED APPROACH LIMPIEZA DE LAS HERIDAS CRÓNICAS: UN ENFOQUE BASADO EN LA EVIDENCIA

Autores

Vítor Santos1, José Marques2, Ana Sofia Santos3, Bruno Cunha4, Marisa Manique5 1Enfermeiro

Especialista, MsC, Centro Hopitalar Oeste Norte (CHON); 2,3,5Enfermeiro CHON, 3Enfermeiro, Hospital

Beatriz Ângelo. Corresponding Author: 10459chon@gmail.com

RESUMO Cada vez mais se constata a importância de uma efectiva limpeza das feridas crónicas na preparação do leito de feridas crónicas. É fundamental enraizar na prática clínica conhecimentos decorrentes da evidência cientifica que nos orientem acerca de como limpar de forma o mais eficaz possivel as feridas, com indicação para esse efeito, bem como, saber quando essa limpeza deve deixar de ser uma rotina e ser adaptada ou talvez mesmo não ser efectuada. Assim, apresenta-se uma abordagem estruturada da limpeza de feridas crónicas, tendo-se recorrido a revisão sistemática de literatura na base de dados EBSCOhost, de modo a legitimar a evidência obtida, com o maior rigor científico, de modo a construir mais uma ferramenta de trabalho a disponibilizar a quem trata de feridas. Palavras chave: feridas, limpeza, biofilme ABSTRACT It is increasingly noted the importance of an effective cleaning of chronic wounds in wound bed preparation. It is rooted in fundamental clinical knowledge from the scientific evidence to guide us on how to clean up wounds on the most effective way possible, if indicated, as well, as knowing when this cleansing stops being a routine and should be adapted or may not even be made. Thus, it presents a structured approach to the cleaning of chronic wounds, having been resorted to systematic literature review on the EBSCOhost database, in order to legitimize evidence obtained, with greater scientific rigor in order to build more tools to provide the work of those who treat wounds. Keywords: wound, cleansing, biofilm

Introdução

um conceito, que proporciona uma abordagem

O desenvolvimento da investigação científica,

estruturada no tratamento de feridas crónicas.

nos últimos anos, tem permitido uma constante

As componentes da preparação do leito da

actualização de conhecimentos na área do

ferida e da ferramenta TIME (tratamento do

tratamento de feridas. No entanto, a utilização

tecido, controlo da inflamação e infecção,

de produtos sofisticados e dispendiosos, no

equilíbrio da humidade e avanço epitelial/

tratamento de feridas, apenas se justifica se for

margens) endereçam as diferentes

possível garantir a formação de um leito da

anormalidades fisiopatológicas subjacentes às

ferida saudável, através da sua adequada

feridas crónicas. A limpeza das feridas crónicas

preparação5. A preparação do leito da ferida é

é um procedimento transversal a todos os componentes desta ferramenta, embora surja

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mais frequentemente associada ao “T”, no que

métodos quantitativos como qualitativos).

respeita ao tratamento do tecido.

Excluíram-se também todos os artigos pagos. A

Frequentemente, se verifica que a preparação

revisão bibliográfica resultou da pesquisa

do leito da ferida, através da utilização de

eletrónica na Base de dados EBSCO,

soluções e métodos adequados, é

seleccionando as bases CINAHL e Medline.

desvalorizada e realizada de modo diferente,

Em todas as pesquisas foram procurados

pelos profissionais de saúde.

artigos científicos publicados em texto integral

Com esta prática recomendada, baseada numa

(09-06-2011), publicados entre 1999 e 2011,

revisão sistemática da literatura, pretende-se

assim na primeira pesquisa usamos as

uma abordagem estruturada da limpeza de

seguintes palavras-chave: Chronic Wound*

feridas crónicas.

AND Cleansing OR Cleaning. Através desta

METODOLOGIA Uma vez definida a nossa problemática continuámos a desenvolver o processo de revisão sistemática, recorrendo à formação de uma pergunta de investigação, o que permitiu

pesquisa obtivemos um total de 291 artigos, a partir dos quais foram selecionados 8 artigos. Assim, como resultado da pesquisa efetuado, reunimos um total de 7 artigos acerca da temática em estudo

definir os critérios de inclusão/ exclusão: (P) Em relação à pessoa com ferida, quais as

PORQUÊ LIMPAR E COMO LIMPAR AS

intervenções (I) com vista à limpeza dessa

FERIDAS CRÓNICAS?

mesma ferida (O)? Com esta revisão

As feridas crónicas têm um impacto

sistemática de literatura pretende-se

financeiro significativo nos sistemas de saúde e

sistematizar a evidência disponível no concerne

afectam negativamente a qualidade de vida.

às boas práticas para a limpeza de feridas.

Logo, a limpeza de feridas, constitui uma

Os critérios de inclusão utilizados privilegiam as

importante componente na sua abordagem

revisões sistemáticas da literatura, guidelines e

(Moore, 2008). É necessário remover os tecidos

RCT’s; possuam delimitação temporal inferior a

mortos e corpos estranhos antes de serem

20 anos, exceto no caso dos autores de

aplicados os penso (Moore, 2008). A presença

referência de anos precedentes, que poderão

de tecido necrótico, o excesso de exsudado,

também ser incluídos; estejam disponíveis

resíduos dos apósitos e resíduos metabólicos

integralmente.

na superfície desta, podem impedir a

Os critérios de exclusão abrangem os estudos

cicatrização e aumentar o potencial de infecção

que não obedecem aos critérios de significância

(Barr, 1995, citado por Williams,1999).

(importância que o artigo tem para o tema em

Contudo, há dúvidas acerca dos

estudo, para os clientes, para a enfermagem

melhores métodos de limpeza (Moore, 2008).

enquanto profissão e ciência), exequibilidade

Clínicos e investigadores recomendam um

(disponibilidade ou recursos para desenvolver a

elevado número de métodos, o que poderá levar

pesquisa) e testabilidade (a formulação do

a algumas incertezas e dúvidas (Moore, 2008).

problema deve ser mensurável tanto por JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

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Blunt (2001), citado por Moore e

prática. No que respeita técnicas salientam-se

Cowman (2008), defende que a limpeza da

três técnicas para limpeza da ferida (Williams,

ferida pode ter um impacto positivo na sua

1999):

cicatrização, no entanto, é uma prática que é

• Swabbing: pode danificar o novo

realizada sem sustentação evidente. Além disto,

tecido de granulação formado,

Briggs & Closs (2006), citados por Moore e S.

devendo ser evitado se possível;

Cowman (2008), encontraram outros estudos

• Irrigação: as pressões aplicadas

que referem que a limpeza da ferida, contribui

nos tecidos é uma componente

para um aumento da dor durante o tratamento.

muito importante, visto que as

Defende-se ainda, que deve ser dada mais

altas pressões podem danificar o

atenção à escolha do tratamento a usar e à

tecido de granulação e

possibilidade deste causar efeito negativo na

epitelização. Deste modo, deve

qualidade de vida do paciente.

ser usada uma pressão óptima,

Um estudo de Mahe et al (2006), citado por Moore e Cowman (2008), verificou ainda

que permita não danificar os tecidos;

que os antissépticos são usados para limpeza

• Banho: São formas de banho

da ferida, mesmo sabendo que estes não são

agressivas que utilizam a

considerados como a primeira linha de limpeza.

turbulência da água para remover

Logo, uma larga proporção das feridas não é

detritos. Aconselha-se antes o

gerida de maneira efectiva, destacando-se a

uso do duche, que ultimamente

necessidade de esclarecer a melhor prática.

tem sido usado em feridas

Desta forma, torna-se evidente que existe pouca

crónicas;

informação que permita clarificar a importância da limpeza da ferida, na gestão das feridas

No que respeita a soluções, a primeira escolha

crónicas.

para as feridas que não estão contaminadas são

Segundo Magson-Roberts (2006), citado

a Água Esterilizada, Solução Salina normal ou

por Cabete et al (2006), existem três

Água da Torneira (Williams, 1999). Se os

componentes essenciais para o sucesso na

profissionais de saúde usam antissépticos como

limpeza de feridas. São eles: a técnica, a

agentes bactericidas e bacteriostáticos, a sua

escolha do equipamento e o agente de limpeza.

efectividade deve ser avaliada devido aos

Contudo, a limpeza é, muitas vezes,

efeitos nocivos que estes poderão causar ao

inconsistente entre os Profissionais de Saúde e

tecido saudável (Williams, 1999). O Hipoclorito

entre os diferentes estabelecimentos de saúde,

de Sódio não deve ser usado, por danificar o

não existindo uniformidade quanto ao tipo de

tecido (Williams, 1999).

soluções e técnicas utilizadas. A prática

De salientar ainda a importância a dar à

ritualista, sobrepõe-se à Prática Baseada em

temperatura da ferida, pois a actividade mitótica

Evidências científicas, o que é atribuído à falta

abranda quando a temperatura das feridas

de conhecimento na gestão dos cuidados à

baixa. A ferida após a limpeza, pode demorar 40

ferida e à falta de directrizes para orientar a

minutos para retomar a sua temperatura original

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e três horas para a actividade mitótica retomar a

CONCLUSÃO

sua plenitude (Williams, 1999). Desta forma, as

Posto isto, como fruto da revisão

soluções devem ser aquecidas e as feridas não

sistemática da literatura efectuada, propõem-se

devem ficar muito tempo expostas ao ar, pois

como esquema de actuação para a limpeza de

também arrefecem desta forma (Williams,

feridas crónicas:

1999).

1- No que diz respeito aos solutos de Também a gestão dos biofilmes surge

limpeza, considera-se a Solução

como um aspecto cada vez mais importante a

Salina, como a solução ideal, pelas

ter em conta na abordagem da ferida crónica,

suas propriedades isotónicas e por

aquando da sua limpeza, pois a presença de

não interferir no processo de

bactérias, apesar da irrigação da ferida com

cicatrização. Este soluto, não causa

Soro Fisiológico, que tem sido defendida como o

dano no tecido, não provoca

método mais adequado de irrigação, leva muito

sensibilização ou alergia, nem altera

frequentemente à formação destes biofilmes,

a flora bacteriana normal da pele

conhecidos por serem resistentes a este método

(Atiyeh et al., 2009; Bee et al., 2009;

de limpeza e irrigação, bem como ao tratamento

Fernandez et al., 2010);

com antibióticos (Horrocks, 2006). Os biofilmes consistem em diferentes tipos de bactérias que

2- N o e n t a n t o , v á r i o s a u t o r e s

se agregaram na superfície da ferida numa

recomendam a Água da Torneira

matriz de polissacarídeo extracelular (Horrocks,

para limpeza de feridas crónicas,

2006).

afirmando que esta é eficiente ao O produto terapêutico de eleição

nível do custo efectivo e de fácil

actualmente para este tipo de casos, é a

acessibilidade, não se verificando

solução de Polihexametileno Biguanida (PHMB)

efeitos adversos (Atiyeh et al., 2009;

com Betaína, uma solução de limpeza incolor

Bee et al., 2009; Fernandez et al.,

que contém agentes hidratantes e PHMB um

2010; Cutting, 2010)

antisséptico não citotóxico, sendo indicada para

3- Convém referir que só pode ser

feridas crónicas. A betaína é um alcalóide

usada se for potável e deve correr 15

surfactante que tem alta solubilidade em água e

segundos antes de ser utilizada

induz um efeito de stress osmótico aumentando

(Joanna Brigs Institute, 2006), além

a solubilidade e melhorando a limpeza, através

de que, deve ter em conta a natureza

da baixa tensão superficial induzida pelo

das feridas e o estado geral da

surfactante, que ajuda na remoção de detritos e

pessoa (Fernandez et al., 2010).

bactérias (Cutting, 2010).

a. Em Feridas Crónicas pode ser

Deste modo, conclui-se que a limpeza e

feita a limpeza com Água

irrigação da ferida devem criar condições

Potável, se a Solução Salina

óptimas de forma a não complicar a

estiver indisponível (Joanna

cicatrização, removendo os detritos antes da

Brigs Institute, 2006), assim

aplicação do novo apósito.

como também pode ser

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utilizada a água fervida e

( W i l l i a m s , 1 9 9 9 ) ,

arrefecida (Joanna Brigs

nomeadamente

Institute, 2006; Atiyeh, 2009)

queratinócitos e fibroblastos

b. Alguns estudos, referem que

(Atiyeh,

nos

2009).

Os

não existem diferenças

queratinócitos que existem na

estatisticamente significativas

camada basal da epiderme,

em feridas limpas com

são mais sensíveis a agentes

Solução Salina, comparadas

de limpeza tais como:

com a Água (Cutting, 2010;

Peróxido de Hidrogénio,

Moore, 2008). Sendo assim,

Solução

para as feridas que não estão

Iodopovidona (Atiyeh, 2009).

de

Dakin,

contaminadas pode ser

b. Apesar de ser considerado

utilizada Água Esterilizada,

inócuo o Peróxido de

Solução Salina Normal ou

Hidrogénio danifica uma série

Água da Torneira (Williams,

de componentes celulares. É

1999)

necessário aplicar grandes concentrações, devido a

4- Por outro lado, vários autores

actividade da catálase das

desaconselham o uso de

principais bactérias

antissépticos em feridas abertas,

patogénicas (Atiyeh, 2009)

uma vez que podem conter

c. O Hipoclorito de Sódio não

detergentes, tornando-se agressivos

deve ser usado por danificar o

para o tecido em formação. Deste

tecido (Williams, 1999).

modo, afectam as células normais,

d. Relativamente à utilização de

alterando negativamente o tecido

soluções de Iodopovidona,

normal de reparação (Atiyeh, 2009).

estudos demonstram, que

Contudo, outros autores referem que

mesmo soluções diluídas são

estas soluções podem ser usadas

tóxicas para os fibroblastos

apenas a título excepcional e com

humanos. Esta solução inibe

precaução, uma vez que a sua

fortemente o crescimento

toxicidade pode superar qualquer

celular,

benefício (Atiyeh, 2009).

concentrações superiores a

que

em

a. Se os profissionais usam

0,1% inibe fortemente a

antissépticos como agentes

actividade mitótica (Balin,

bactericidas, a sua

2002). Além disto, verifica-se

efectividade deve ser

uma menor taxa de

avaliada, devido aos efeitos

cicatrização de feridas em

nocivos que estes poderão

doentes tratados com altas

causar ao tecido saudável

concentrações

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de

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Iodopovidona (Atiyeh, 2009;

detritos do leito da ferida, para

Balin, 2002).

a profundidade, mas por outro

e. A solução de PHMB com

lado, a pressão insuficiente é

Betaína, é adequada para a

ineficaz, para remover os

preparação do leito da ferida,

detritos ou exsudado (Bee,

remoção do biofilme, gestão

2009). Considera-se que a

de odores, redução do nível

irrigação com pressão

de exsudado, bem como

compreendida entre 5 – 8 psi,

redução da dimensão da

é o método mais eficaz de

ferida (Atiyeh, 2009; Horrocks,

limpeza (pressão obtida com

2006). Além disto, é altamente

uma seringa de 20 ml

histocompatível, não

adaptada a uma agulha ou

citotóxica, sendo uma das

catéter de 18 G) (Atiyeh, 200;

soluções mais utilizadas

Bee, 2009)

actualmente, incluindo em feridas infectadas com MRSA (Atiyeh, 2009).

6- Relativamente ao equipamento, verifica-se que os profissionais de saúde, devem privilegiar o uso de

5- No que diz respeito às técnicas

luvas e compressas de tecido-não-

utilizadas na limpeza de feridas

tecido, em oposição às pinças ou às

crónicas, verifica-se que esfregar e

compressas de gaze. Estas, podem

irrigar, são as técnicas mais comuns

deixar resíduos no leito da ferida,

de limpeza (Bee, 2009). No entanto,

atrasando a cicatrização. Além disto,

esfregar uma ferida não remove da

as pinças não são ser fáceis de usar

superfície as bactérias, mas

pela maioria dos profissionais e não

redistribui-as, podendo ainda,

impedem a contaminação da ferida

introduzir corpos estranhos e

(Williams, 1999). A irrigação da ferida

traumatizar os novos tecidos de

prevalece como método mais eficaz

granulação e epitelização (Bee,

(Moore, 2008; Williams, 1999)

2009; Williams, 1999).

a. Pelo contrário, a lavagem por irrigação, assegura uma limpeza adequada do leito da ferida (Bee, 2009; Williams, 1999)

b. Outro factor a ter em conta, é a pressão durante a irrigação (Bee, 2009). A pressão

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