Julho 2013

Page 1

VOLUME 2 . EDIÇÃO 3


EDITORIAL

JULHO, 2013

O Journal of Aging and Innovation é a revista de divulgação de artigos científicos da Associação Amigos da Grande Idade - Inovação e Desenvolvimento e foi indexada na Latindex em

Em tempos Nacional conturbados, este é um

Maio de 2013.

exemplo de grande empenho e desenvolvimento

Esta revista é uma criação da Associação com

que esta associação sem apoios, ou patrocínios

um ano e meio de vida, sendo já considerada

conseguiu tornar uma realidade e que agora

uma referência nacional e internacional para a

obtém mais um reconhecimento Internacional do

investigação na área social e de saúde.

seu trabalho.

Através desta indexação é possível a divulgação

Ao invés do Povo desgraçado e sem objetivos

técnica, profissional, científica e cultural que são

que fazemos transparecer atualmente, levamos

publicados nos países da América Latina, Caribe,

nos séculos XV a XVII a civilização à maior

Espanha e Portugal. A Latindex surgiu em 1995

parte do mundo, nos dias de hoje levamos ideias

na Universidade Nacional Autónoma do México

e conhecimento Cientifico aos 4 cantos do

(UNAM) e tornou-se uma rede de cooperação

Mundo sobre o envelhecimento.

regional desde 1997 e conta com 6938 revistas

Fica o nosso desafio, PUBLIQUE NA NOSSA

científicas.

REVISTA:

Agora a nossa revista foi reconhecida e segundo esta organização internacional cumpre 100% dos

http://www.associacaoamigosdagrandeidade.com/revista/ submeter-manuscrito/

critérios de qualidade. Depois de Indexada na Biblioteca nacional, no Google Académico, agora a Latindex, vem reconhecer a qualidade

Diretor do Journal of Aging and innovation,

das centenas de pessoas, que contribuem para

César Fonseca

este projeto de sucesso em Portugal. Nos primeiros 3 meses após esta indexação tivemos cerca de 22.000 visualizações em especial nos países d América latina.


Fernandes, R., et al. (2013) Quality of life in Oncology. Journal of Aging & Inovation, 2 (3): 03-15

REVISÃO NARRATIVA / NARRATIVE REVIEW

JULHO, 2013

QUALIDADE DE VIDA EM ONCOLOGIA QUALITY OF LIFE IN ONCOLOGY CALIDAD DE VIDA EN ONCOLOGÍA

Autores

Rui Fernandes1, Carla Fernandes2, Sandra Costa3, Eduardo Pinheiro4, Filipa Aguiar5 1

Licenciado em Enfermagem, Especialista em Enfermagem de Reabilitação, Mestre em Ciências da

Dor, Centro Hospitalar Lisboa Norte, Unidade de Infecciologia Respiratória, 2 Licenciada em Ciências Farmacêuticas, Clínica de Santo António – Amadora,3 Licenciada em Enfermagem, Especialista em Enfermagem de Reabilitação, Hospital Beatriz Ângelo, Serviço de Urgência Pediátrica,4 Licenciado em Enfermagem, Especialista em Saúde Infantil e Pediátrica, Hospital Beatriz Ângelo, Serviço de Pediatria. 5 Licenciada

em Enfermagem, Especialista em Enfermagem Médico-cirúrgica, Centro Hospitalar Lisboa Norte,

Unidade de Oncologia Pneumológica. Corresponding Author: ruidpf1@gmail.com RESUMO O propósito do artigo é, através de pesquisa bibliográfica e análise reflexiva, abordar a importância, o impacto e levantamento de estratégias adequadas no cuidado ao doente e família com dor crónica oncológica tendo como foco a qualidade de vida (QdV). Centramos atenção na evolução histórica do conceito de qualidade de vida e a importância actual na definição do tratamento adequado à pessoa e família; na contextualização da noção de QdV num indivíduo saudável, QdV na pessoa com doença oncológica e qualidade de vida relacionada com a saúde (QdVRS). Seus campos de implicação e abrangência; ética clínica e QdV; instrumentos de medição da QdV e sua importância na prática do cuidar. Relevamos que na prestação de cuidados de saúde, a QdVRS é cada vez mais aceite como um objectivo principal. Numa fase mais avançada da doença o enfoque dirige-se da cura para a paliação, sendo o objectivo maior, o incremento do bem-estar com melhoria ou preservação da QdV. A QdV só pode ser medida e descrita em termos individuais, dependendo do estilo de vida actual, das experiências passadas e em esperanças, sonhos e ambições. Palavras-chave: Oncologia, Qualidade de Vida e Qualidade de Vida Relacionada com a Saúde

Abstract The purpose of the article is, by using literature review and reflective analysis,to discuss the importance, impact and bring up of appropriate strategies on patient and family care with chronic oncological pain, focusing on quality of life (QoL). Our attention was focused: on historical evolution of QoL concept and the current importance of appropriate treatment to patient and family; in the contextualization of the concept of QoLin a healthy person; QoL on person with oncological disease and quality of life related to health (HRQoL); clinical ethics and QoL; QoL measurement instruments and its importance in care practice. We emphasize that on the provision of health care, the HRQoL is increasingly accepted as a major objective. In a more advanced stage of the disease the focus goes from cure to palliation, the main objective being to increase in welfare with improvement or preservation of QoL. The QoL can only be measured and described on an individual basis, depending on the current lifestyle, past experiences and hopes, dreams and ambitions Keywords: Cancer, Quality of Life and Quality of Life Linked to Health JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 04

HISTORIA

capazes de proporcionar cuidados físicos, psicológicos, sociais e espirituais aos doentes e

Actualmente, podemos afirmar que qualidade de

suas famílias. Trata-se de um processo de

vida (QdV) “está na moda”. Assistindo-se a uma

personalização, abandonando o modelo

valorização crescente desta nas ciências

biomédico, não considerando unicamente o

biomédicas.

corpo enfermo, mas sim o ser humano numa

Até ao século XX raramente foi mencionada

perspectiva holística, ou seja, como um todo

embora a preocupação sobre este tema tenha já

(Pimentel, 2006).

referências na antiguidade quando Aristóteles

Esta mudança na abordagem da pessoa com

falava no conceito de “boa vida” (Pimentel,

doença crónica facilitou o aparecimento da

2006).

investigação da qualidade da sobrevivência dos

A definição de saúde da Organização Mundial

doentes crónicos. Expandiu-se a palavra

de Saúde (OMS), em 1948, será próxima de

“tratamento” incluindo-se a paliação. A

u m a d e f i n i ç ã o d e Q d V, d a n d o g r a n d e

biomedicina das doenças crónicas cria nessa

importância às dimensões física, mental e social

altura alicerces para o aparecimento da QdV

(Fayers, 2000).

como parte integrante da Medicina (Schou,

A popularização da QdV ocorreu após a

1999).

segunda guerra mundial, quando nos anos 60

Enquanto a sobrevivência aumentou para os

os políticos passaram a utilizar a expressão nos

doentes com diversos tipos de neoplasias, a

seus discursos (Frisch, 2000). Nas décadas de

mortalidade não sofreu grandes alterações, e

60 e 70 ocorreram mudança de valores e

começou a ser importante avaliar a QdV

objectivos sociais, com uma diminuição dos

simultaneamente com a sobrevivência

interesses materiais e um incremento dos

(Fallowfiel, 1990). Os objectivos da terapêutica

valores, das necessidades sociais e

oncológica não podem limitar-se, por exemplo, à

psicológicas (De Haes, 1985).

redução da massa tumoral ou à sobrevivência

A QdV é um campo de investigação

mas sim fazer da QdV como parte integrante

relativamente recente da Medicina, mais

(Jones, 1987).

precocemente desenvolvido nas doenças

A QdV emergiu como um elemento central na

oncológicas e cardiovasculares, e

oncologia nos anos 80, motivada pelo

posteriormente em muitas outras áreas da

crescimento acentuado da tecnologia médica

Medicina. O seu aparecimento ficou a dever-se

usada na terapêutica do cancro e ao

ao uso da expressão pelos políticos, surgindo

crescimento da complexidade das decisões

na literatura médica em 1960 (Elkington, 1966).

médicas (Macguire, 1989). Este avanço

A partir do final da década de 60 começaram a

tecnológico da medicina tem permitido que

surgir, nos “hospícios” ingleses as unidades de

doentes com doença crónica, embora não

cuidados paliativos e as clínicas de dor. A

alcançando a cura, vivam mais tempo. Esse

Organização Nacional de Hospícios Americana,

número tem vindo a aumentar (Gerhardt, 1990).

fundada em 1977, define como seu objectivo um

É recente a integração da QdV como objectivo

conjunto de serviços paliativos e de suporte

principal em Medicina, mas pode-se constatar

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 05

que algumas instituições e organizações

avaliação dos sintomas ou do desempenho

internacionais já sugerem que a mesma seja

físico (Fallowfiel, 1990).

considerada como objectivo (Pimentel, 2006). A maioria dos grupos cooperativos de

Contextualização

investigação em oncologia tem um grupo de

Apesar de toda a evolução da medicina,

trabalho dedicado à qualidade de vida

actualmente, ainda cerca de 50% dos doentes

relacionada com a saúde (QdVRS)

morre da sua doença oncológica, pelo que, em

A “European Organization Research Treatment

determinado momento, o enfoque se dirige da

of Cancer” (EORTC) iniciou, em 1986, o

cura para a paliação (Jordhoy, Fayers, Loge,

desenvolvimento de um questionário para

Ahlner-Elmqvist, & Kaasa, 2001), sendo o

avaliação da QdV em doentes oncológicos.

objectivo maior o incremento do bem-estar. A

Também em França, é iniciada a avaliação da

abordagem tem como objectivo principal a

QdV, promovida pela Sociedade Francesa de

melhoria ou preservação da QdV.

Oncologia (Schraub, 1987).

Durante o século XX ocorreu, nos países

Nos Estados Unidos da América, em 1990, o

desenvolvidos uma alteração no padrão das

National Cancer Institute (NCI), com o objectivo

doenças. Os principais problemas de saúde

de estudar a implementação da QdV nos

passaram das patologias agudas para as

ensaios clínicos em oncologia, constitui um

doenças crónicas, que persistem, recidivam e

grupo de trabalho para esse efeito. Da mesma

necessitam de tratamentos/cuidados por longos

forma, o “Medical Research Council” em

períodos; onde se incluem as doenças

Inglaterra, fez integrar a medida de QdV nos

oncológicas. Para muitos doentes o cancro

ensaios clínicos (Quality of life and clinical trials,

deixou de ser uma doença rapidamente fatal,

1995).

tornando-se crónica que dura meses ou anos,

A “Food and Drug Administration” recomendou

com tratamentos complexos e muitas vezes com

formalmente que nos ensaios clínicos se

muitos e severos efeitos adversos (Pimentel,

deveriam privilegiar os critérios ligados aos

2006).

doentes (sobrevivência e QdV) em detrimento

Em todas as sociedades, é evidente um

dos critérios ligados à doença oncológica (taxas

aumento da incidência e mortalidade por cancro,

de resposta e duração), (Beitz, Gnecc & Justice,

devido a uma mudança de estilo de vida, ao

1996).

envelhecimento da população ou aumento da

A “Multinational Association of Supportive Care

esperança de vida e a melhores técnicas de

in Cancer” (MASCC), dedica um relevante

diagnóstico (DGS, 2005). O cancro é a segunda

interesse ao estudo da QdVRS, incluindo uma

causa de morte logo após as doenças

sub-secção dedicada ao desenvolvimento desta

cardiovasculares nos países industrializados

área do conhecimento.

(Breslow, 1972) e (Bailar & Gornik, 1997).

Na prestação de cuidados de saúde, a QdVRS é

Em Portugal, a doença oncológica representa

cada vez mais aceite como um objectivo

uma causa importante de morbilidade e

principal, tão ou mais importante que a

mortalidade, sendo diagnosticados anualmente 40 a 45 mil novos casos de cancro. Pode

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 06

afirmar-se que em Portugal, tal como na União

oncológico é necessário que, além da avaliação

Europeia (UE), o risco de um indivíduo vir a

clássica, seja efectuada a avaliação da QdV.

desenvolver um cancro durante a vida é cerca

Para os indivíduos saudáveis a noção da QdV

de 50%, e de este ser a causa de morte é de

reporta-se a termos como riqueza, lazer,

25% (DGS, 2005). Contrariamente aos restantes

autonomia, liberdade, ou seja, tudo o que

países da EU, em Portugal a mortalidade por

proporciona um dia-a-dia agradável. Num

cancro continua a aumentar, o que nos torna o

doente a QdV é um conceito relativo, que se

país da EU em pior situação neste aspecto

refere ao nível de satisfação em função das

(Boyle & Ferlay, 2005) e (DGS, 2005).

suas possibilidades actuais condicionadas pela

A doença oncológica é, sem dúvida, um grave

doença e terapêuticas, comparadas com

problema de saúde pública, implicando custos

aquelas que pensa serem possíveis ou ideais

elevados (não só económicos, mas também

(Nordenfelt, 1994).

sociais). A nível individual não existe nenhuma

O conceito de qualidade de vida ligado à saúde

dimensão da vivência que não seja afectada. O

é diferente do conceito de QdV global. Cada

cancro altera a percepção do indivíduo perante

pessoa tem a sua escala de valores mas

o ambiente que o rodeia e as experiências

podem-se encontrar elementos comuns à

associadas a ele resultam num desequilíbrio

generalidade dos doentes. Não existe uma

espiritual (White, 2004). Esta doença está

única definição de Qualidade de Vida

associada a perdas e o seu diagnóstico e

Relacionada com a Saúde (QdVRS), mas pode

tratamento têm consequências psicológicas com

ser descrita, de forma funcional, como a

importantes repercussões na QdV (White 2004).

percepção dos doentes sobre as suas

O sucesso da terapêutica oncológica é

capacidades em quatro grandes dimensões:

habitualmente descrito em termos de tempo livre

bem-estar físico e actividades quotidianas, bem-

de doença, sobrevivência, complicações e

estar psicológico, relações sociais e sintomas

toxicidade, embora a complexidade da doença

(Pimentel, 2006).

oncológica não se esgote nestes parâmetros. A

O interesse dos médicos em geral e dos

percepção que o doente oncológico tem acerca

oncologistas em particular pela QdV tem vindo a

de tudo que ocorre e está ligado à sua doença,

aumentar, mas ainda não está cimentada como

é muito mais globalizante: há a assunção do

uma componente importante na prática clínica.

papel central da sua vivência. O choque do

Um inquérito efectuado em Portugal (Pimentel,

diagnóstico, a dor e o stress das terapêuticas,

2002) a 396 médicos, onde apenas 82

as restrições ao seu desempenho físico e

responderam, constatou-se que 95% referiam

intelectual, as limitações nas actividades diárias,

que QdV é fundamental para proporcionar bons

a estigmatização social, o lidar com situações

cuidados e 93% concordavam que a QdV é útil

que põem em risco a vida e que vão diminuir a

para tomar decisões a nível individual.

esperança de vida. Todos estes parâmetros têm

Contrariando esta belíssima percentagem, neste

de ser tidos em conta (Cabana et al., 1999) e

grupo de médicos apenas 40% refere utilizar a

(Lorenz et al., 1999). Sempre que se estabelece

QdV na prática clínica, 73% confere maior

uma estratégia terapêutica para um doente

relevo à toxicidade e aos efeitos adversos do

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 07

que à QdV e 35% confiam na experiência

Não existe uma definição clara do conceito de

profissional para avaliar a QdV.

QdV. Existem inúmeras propostas de definição.

Dos resultados deste inquérito pode-se concluir

Uma das referências mais antigas, e que mais

que, na abrangência da prestação de cuidados

se pode assemelhar com uma definição de QdV

aos doentes oncológicos, a QdV ainda não é, de

é de Aristóteles (384-322 a.C.) que escreveu: “

facto, uma realidade considerada.

Quer a pessoa mais modesta ou mais

Uma vez que muitos dos doentes têm que viver

refinada… entende “vida boa” ou “ estar bem”

a sua doença crónica durante toda a vida, a

como a mesma coisa que “estar feliz”. Mas o

avaliação da QdV constitui um aspecto

que é entendido como felicidade é discutível…

importante de qualquer plano de tratamento

Uns dizem uma coisa e outros, outra e a mesma

(Bennett, 2002). A avaliação da QdV nos

pessoa diz coisas diferentes em tempos

doentes oncológicos é cada vez mais

diferentes: quando está doente pensa que a

valorizada, também devido à preocupação com

saúde é a felicidade; quando está pobre

a autonomia e direitos dos doentes e com o

felicidade é riqueza (Fayers & Bottomley, 2002)

papel dos factores psicossociais (Sales, 2001).

Nos séculos XVI-XVII, Coménio, falou da

Uma causa profunda de perturbação da

relação entre saúde, educação e higiene com o

qualidade de vida é certamente a dor, sobretudo

objectivo de estabelecer fundamentos para o

a crónica. A dor não atinge unicamente um

prolongamento da vida, manifestando maior

órgão, irradia para todo o corpo, perturba as

preocupação com o destino que atribuímos à

actividades, diminui a concentração intelectual,

nossa vida do que com a sua duração em anos.

transforma o psíquico, provoca stress no grupo

De salientar que, já nessa época, se identifica a

familiar e empobrece as relações sociais

preocupação pela saúde e QdV e contra os

(Barnett, 2001)

problemas decorrentes dos excessos cometidos

Quer no dia-a-dia, quer na realização de

com o corpo (Pimentel, 2006).

ensaios clínicos, a integração de QdV não se

Tiel, McNeiel e Bush, propuseram uma definição

verifica com a frequência desejada,

de QdV, como sendo um conceito global, que

privilegiando-se a avaliação de parâmetros que

inclui as vertentes psicológica, social e física e,

alguns autores designam por “informação dura”,

incorpora tanto os aspectos positivos de bem-

ou seja, o estádio da doença, a taxa de

estar, como os aspectos negativos da doença

respostas e a sobrevivência. Pelo contrário, os

(Pimentel, 2006).

aspectos físico-funcionais, psicológicos, sociais,

Esta definição diz-nos que dentro da QdV

económicos, e outros que constituem o que se

existem quatro dimensões: física e desempenho

designa por “informação branda”, subjectiva e

(que pode ser dominante em caso de existência

considerados erradamente de medição

de dor, ou efeitos adversos decorrentes da

impossível, são negligenciados ou esquecidos

terapêutica), psicológica e bem-estar, social e

(Pimentel, 2006).

espiritual (frequentemente esquecida, relacionada com a religião e o nível de cultura

Definição de qualidade de vida

do indivíduo). Esta última dimensão existe mesmo quando a pessoa não tem crença

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 08

religiosa, resultando da reflexão que o doente

que o indivíduo tem do seu lugar na vida, no

faz da sua própria vida (Pimentel, 2006).

contexto da cultura e do sistema de valores nos

Levine e Croog propuseram uma definição

quais vive, em relação com os seus objectivos,

multidimensional: a funcionalidade ou a

os seus desejos, as normas e as suas

interacção do indivíduo com o meio, nas suas

inquietudes. É um conceito muito amplo que

diversas vertentes social, física, emocional ou

pode ser influenciado de maneira complexa pela

intelectual e a percepção subjectiva que engloba

saúde do indivíduo, pelo estado psicológico e

o sentido geral de satisfação do indivíduo e da

pelo seu nível de independência, a suas

sua própria saúde, em relação com a das outras

relações sociais e as suas relações com os

pessoas que o rodeiam (Lima, 2002). Este

elementos essenciais ao seu meio”(Taylor,

conceito enquadra-se na definição de saúde da

2001)

OMS: “um estado de completo bem-estar físico,

Assumindo-se e percebendo-se que a QdV é

mental e social e não meramente a ausência de

um sentimento individual, significando diferentes

doença”( Brunier, Carson & Harrison, 1995).

coisas para diferentes pessoas, quando a

Em 1984, Calman propõe que a QdV só pode

queremos ver numa perspectiva de saúde,

ser medida e descrita em termos individuais,

entramos noutro conceito que é o da QdVRS.

dependendo do estilo de vida actual, das

Quando se aborda o conceito de QdVRS em

experiências passadas e em esperanças,

relação a um indivíduo extremamente doente,

sonhos e ambições (Pimentel, 2006).

devemos ter em consideração que qualquer

Há quem defina a QdV como uma avaliação

aspecto da vida está quase sempre relacionado

subjectiva à vida, como um todo, englobando a

com a saúde (Hardman, Maguire, & Crowther,

subjectividade e a necessidade de uma

1989).

avaliação multidimensional e global (Gerhardt,

Os doentes dão uma importância muito grande

1990), outra definição baseia-se na avaliação e

à saúde. Na avaliação da QdV global, a

a satisfação do indivíduo com o seu nível

percepção individual do estado geral de saúde é

funcional e global, comparando o que ele

o mais importante em relação a todas as outras

entenda ser possível, desejado e ideal,

vivências (Cano, Gillis, Heinz, Geisser, & Foran,

realçando o valor que cada um dá à sua vida

2004).

actual (Gerhardt, 1990). Daqui, podemos retirar

Em 1990 Tchkmedylan (Tchekmdyian et al 1990)

que a definição e significado de QdV é diferente

propõe o seguinte esquema para definir a

de pessoa para pessoa, sustentado numa

QdVRS, as suas dimensões e respectivas

perspectiva multidimensional não sendo

componentes.

possível uma conceitualização universal,

Actualmente verifica-se uma intensa actividade

implicando uma flexibilidade e compreensão tal

de investigação da QdVRS em oncologia,

que permita ser aplicado a todos os doentes,

utilizando vários modelos de QdVRS e, apesar

independentemente da fase da doença em que

de algumas indefinições e incertezas,

se encontram (Herrmann, 1997).

obtiveram-se alguns consensos (Pimentel,

Numa tentativa de definir QdV, a OMS, propôs

2006):

em 1993, que fosse considerada “ a percepção JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 09 Esquema – Dimensões e respectivas componentes da qualidade de vida relacionada

Definição – QdVRS é um conceito

Medida: existem instrumentos de medida da

multidimensional, que traduz o bem- estar

QdVRS validados e que permitem a sua

subjectivo do doente, nas vertentes física,

avaliação de forma normalizada.

psicológica e social, as quais se podem

Necessidade: a QdVRS deve ser considerada

subdividir noutras dimensões. O domínio físico

como o objectivo principal, nas doenças

refere-se à percepção que o doente tem da sua

crónicas e incuráveis.

capacidade em realizar as suas actividades

A QdVRS é uma componente da QdV do

diárias. O domínio social refere-se à capacidade

indivíduo constituída pelos componentes que se

do doente se relacionar com os membros da

relacionam com a saúde (doença ou

família, vizinhos, amigos e outros. Por fim, o

terapêutica), devendo abranger os sintomas

domínio psicológico incorpora aspectos do bem-

produzidos pela doença ou tratamento, a

estar emocional e mental, como depressão,

funcionalidade física, os aspectos psicológicos,

ansiedade, medo e raiva.

sociais, familiares, laborais e económicos, já

Subjectividade: a QdVRS depende da

que todos se inter-relacionam e influenciam

percepção individual, crenças, sentimentos e

mutuamente (Pimentel, 2002).

expectativas. A natureza da subjectividade da

Constatam-se assim, vários domínios que

QdVRS implica que os questionários devam ser

afectam de forma decisiva a QdVRS, em

completados pelo próprio doente e não por outra

especial a do doente oncológico (Ahmedzai,

pessoa.

1995) e (Pimentel 2002):

Dinamismo: a QdVRS é dinâmica, mudando ao

Sintomatologia física, como a dor, a anorexia, a

longo do tempo, dependendo das modificações

fadiga, a qualidade do sono;

no doente e das modificações em seu redor.

Funcionalidade física, com alteração da mobilidade e actividade física;

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 10

Papéis sociais e funcionamento social, com

saúde e os doentes devem determinar que nível

aspectos da independência, capacidade de

de QdV é desejável, como pode ser atingido e

continuar a trabalhar seja fora ou dentro de

quais os seus riscos e vantagens. As

casa, interferências nas actividades de lazer;

considerações sobre a QdV focam-se nas

Função cognitiva, em que se engloba a

consequências a longo prazo da aceitação ou

capacidade de concentração, a memória, a

da recusa das recomendações da intervenção

confusão e a desorientação;

médica; contrariamente à avaliação dos riscos e

Estado emocional, com ansiedade, depressão,

benefícios considerados no âmbito do

sentimento de culpa e revolta, cólera;

tratamento médico que são relativamente

Sexualidade, com interferência na imagem

imediatos (Jordhoy et al., 2001).

corporal, libido e actividade sexual;

A referência à QdVRS pode ser usada em vários

Económico-financeiro, no qual se devem incluir

sentidos, podendo a sua invocação provocar

os problemas relacionados com os familiares

confusão. Para que tal não aconteça será

que o ajudam directamente;

importante realçar algumas distinções:

Espiritualidade, em que intervêm o prognóstico, as dúvidas, a dignidade e o sentimento de estar

O julgamento de uma má QdV pode ser feito por

em paz;

aquele que a vive ou por um observador.

Autonomia, com a capacidade de manter o

Acontece frequentemente que as vidas que os

controlo das situações e decisões da

observadores consideram de má qualidade são

capacidade de escolha;

vividas bastante satisfatoriamente pelos

Satisfação, de uma forma geral.

próprios. Assim, se os doentes podem avaliar e

Ética clínica e qualidade de vida

exprimir a sua própria QdV, outras pessoas não

Depois de terem sido consideradas as

devem presumir ou julgar, mas antes procurar

indicações médicas e as preferências do doente

saber a opinião do doente. Da mesma maneira

deve seguir-se uma discussão sobre a QdV do

quando a avaliação da própria pessoa não é, ou

doente antes da doença actual e a QdV que

não pode ser, conhecida por outros, esses

pode ser esperada com e sem tratamento

mesmos devem ser muito cautelosos ao

(Jordhoy et al., 2001)

aplicarem os seus próprios valores.

O objectivo mais fundamental dos cuidados de

Uma má QdV pode significar, de um modo geral,

saúde é a melhoria da QdV daqueles que deles

que as experiências do doente ficam aquém do

necessitam e que a eles recorrem. O alívio da

padrão que o próprio considera como desejável.

dor e a recuperação funcional são aspectos

Em cada caso a experiência em causa é

particulares deste conceito. O objectivo de se

diferente (pode ser dor, perda de mobilidade,

atingir a melhor QdV possível no doente deve

existência de muitos e debilitantes problemas de

servir como ponto de orientação e meta desde a

saúde, perda da capacidade mental e da alegria

fase de diagnóstico (Jordhoy et al., 2001).

da interacção das relações humanas, perda da

A avaliação da QdV deverá estar englobada em

alegria de viver, etc…). Uma má QdV pode

todas as discussões acerca da prestação de

reportar-se a situações diferentes.

cuidados mais adequados. Os profissionais de JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 11

A avaliação da QdV, tal como a própria vida,

de forma diferente certas formas de vida e cada

muda ao longo do tempo. Assim, os prestadores

pessoa avalia a sua QdV de forma única.

de cuidados devem ser prudentes, não tomando

Portanto, as avaliações da QdV, quer sejam

decisões com base em condições que poderão

pessoais, quer de um observador, são

ser transitórias.

subjectivas no sentido de que reflectem as

A avaliação pode reflectir um enviesamento e

crenças e os valores pessoais, os gostos e as

um preconceito. Julgar-se que um doente com

antipatias de quem faz o julgamento. Assume-se

atraso mental tem má QdV ou pessoas de uma

que não existem critérios objectivos claros em

determinada raça ou nível social pode reflectir o

relação aos quais se possam aferir os juízos de

nosso enviesamento.

valor e/ou acerca dos quais todas as pessoas

A avaliação pode reflectir condições sócio-

possam estar de acordo na avaliação da QdV.

económicas em vez da vida experimentada pelo

Poderá existir uma larga concordância,

doente, como por exemplo, a falta de cuidados

praticamente universal sobre as descrições

domiciliários, de reabilitação ou educação

seguintes: (Jordhoy et al., 2001).

especial. Os prestadores de cuidados podem contribuir para ultrapassar estes obstáculos e

Qualidade de vida restrita é uma descrição

influir na melhoria da QdV (Jordhoy et al., 2001).

objectiva apropriada a uma situação em que

Quando há necessidade que pessoas

uma pessoa sofre de deficiências graves da

autorizadas, tal como os parentes próximos,

saúde física ou mental, ou seja, as capacidades

procuradores com poderes duradouros, de

funcionais da pessoa afastam-se da

tomarem decisões pelo doente, estas devem

normalidade humana. A avaliação pode ser feita

seguir os desejos previamente conhecidos ou,

pela própria pessoa ou por observadores,

se eles não são conhecidos, devem decidir no

podendo a avaliação do observador e a da

melhor dos interesses do doente; a QdV que ele

pessoa diferir.

escolheria se o pudesse fazer (Jordhoy et al.,

Qualidade de vida mínima é uma descrição

2001).

objectiva apropriada para uma situação em que

Ao avaliar se um procedimento ou tratamento

um doente ou um observador encara uma

seria no melhor interesse do doente, o

pessoa cuja situação física geral se deteriorou

representante deve ter em conta factores como

consideravelmente, cuja capacidade de

o alívio do sofrimento, a preservação ou

comunicar com os outros está gravemente

recuperação da função, assim como a qualidade

restrita e que sofre desconforto e dor.

e extensão da vida conseguida. Uma avaliação

Qualidade de vida abaixo do mínimo é uma

rigorosa abrangeria a consideração dos desejos

descrição objectiva apropriada para uma

actuais, as oportunidades da satisfação futura e

situação em que um doente apresente uma

a possibilidade de desenvolver ou recuperar a

extrema debilitação física assim como uma

capacidade de autodeterminação (Jordhoy et

perda completa e irreversível da actividade

al., 2001).

sensorial e intelectual. Poderia, este estado, ser

Dado que avaliação da QdV é tão subjectiva,

descrito como não tendo qualidade, visto que a

observadores diferentes avaliarão certamente

pessoa não tem capacidade para a avaliação

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 12

pessoal. Esta aplica-se a pessoas num estado

Os fármacos utilizados no alívio da dor, como na

vegetativo persistente.

maior parte dos medicamentos, têm riscos e,

Muitas pessoas, ao depararem-se com estas

face a uma morte eminente, um regime de

possíveis situações futuras, principalmente as

doses e os riscos mais elevados que comporta

duas últimas, diriam “antes queria estar morto”.

podem ser tolerados (Jordhoy et al., 2001).

Esta é uma assunção cautelosa, porque as

A dor é apenas uma das componentes de um

pessoas parecem julgar diferentemente quando

fenómeno que também é psicológico, social e

imaginam uma situação e quando se encontram

espiritual, geralmente designado por sofrimento.

nela (Jordhoy et al., 2001).

Os profissionais devem concentrar-se no alívio

A QdV dos doentes terminais é aumentada por

da dor na sua componente fisiológica,

uma adequada prestação de cuidados

psicológica, social e espiritual. Os profissionais

paliativos. Os doentes não devem ser mantidos

de saúde devem ter atenção a estas

num regime inadequado para controlar a dor e

componentes e procurar ajuda em outros peritos

outros sintomas por causa da ignorância dos

para corresponder às necessidades do doente e

profissionais de saúde ou devido a um medo

família (Jordhoy et al., 2001).

infundado de toxicodependência (Jordhoy et al., 2001).

Medição da qualidade de vida

As tentativas para conseguir um alívio adequado

Enquanto se assiste a uma crescente prática de

da dor podem ter um outro efeito acessório,

avaliação da QdVRS, medi-la constitui uma das

nomeadamente a obnubilação da consciência

tarefas mais difíceis.

do doente com redução da sua capacidade de

Tal como para qualquer outro aspecto da

comunicar com a família e os amigos. Este

investigação clínica, o conceito de níveis de

duplo efeito pode ser eticamente perturbador

evidência aplica-se à medida de QdVRS (Payne

para os profissionais de saúde. Uma atenção

& Gonçalves, 2004)

com sensibilidade às necessidades do doente

Um baixo nível de evidência corresponde às

em conjunto com um tratamento médico

avaliações feitas utilizando um único item para

adequado, devem conduzir tanto quanto

avaliar QdVRS ou instrumentos desenvolvidos

possível ao objectivo desejável, ou seja, um

para um trabalho em particular, sem que tenha

máximo alívio da dor e uma mínima diminuição

sido feita a prévia validação (Pimentel, 2004).

da consciência e da comunicação. Caso o

Um nível médio de evidência pode ser atingido

doente consiga exprimir as suas preferências,

utilizando instrumentos validados de uma forma

estas devem ser seguidas (Jordhoy et al., 2001).

genérica, mas ainda, sem utilização em

O alívio da dor e a manutenção das funções são

populações oncológicas, ou medindo uma única

ambos objectivos dos cuidados de saúde. No

dimensão da QdVRS (Pimentel, 2004).

entanto, quando o objectivo de prolongar a vida

O nível mais elevado de evidência obtém-se

não pode ser atingido, o alívio da dor e outros

quando se utilizam instrumentos que avaliem as

sintomas torna-se o objectivo prioritário durante

várias dimensões da QdVRS e que estejam

o tempo de vida que resta ao doente (Jordhoy et

validadas na população oncológica, como por

al., 2001). JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 13

exemplo o FACT-G ou o QLQ-C30 da EORTC

BARNETT, K. – A theoretical contract of the

(Pimentel, 2004).

concepts of touch as they relate to nursing –

Apesar da avaliação da QdV ser considerada

Nursing Research, vol. 21, nº 2, 1972, pp:

fundamental, trazer benefícios e ser importante

102-110.

para avaliar o resultado dos tratamentos médicos (Bonica, 1985) e (Levi et al, 1999),

BEITZ, J.; GNECCO, C.; JUSTICE, R. – Quality-

existe também alguma confusão e dúvidas

of-life end points in cancer clinical trials: the U.S.

acerca de como deve ser avaliada. Isto parece

Food and Drug Administration perspective – J.

reflectir as importantes limitações conceptuais e

Natl. Cancer Inst. Monogr., nº 20, 1996, pp: 7-9.

metodológicas do conceito de QdV (Wright, 2002). O desenvolvimento de instrumentos de

BENNETT, P. – Introdução clínica à psicologia

avaliação de medida da QdVRS baseia-se nos

da saúde – Lisboa: Climepsi, 2002.

princípios de construção e validação de testes. O questionário deve ser prospectivo e reflectir o

BONICA, J.J. Treatment of cancer pain: current

que se pretende medir, isto é, a QdVRS.

status and future needs. In: FIELDS,

Os questionários podem ser auto-administrados,

DUBNER R.; CERVERO, F. Advances in pain

administrados com a ajuda de um entrevistador

research and terapy: proceeding of the Fourth

ou assistidos por computador (Kuuppelomaki,

World Congress on Pain, New York, Raven,

1998).

1985. V.9, p.589-615.

H.L.;

Os principais objectivos dos questionários de avaliação da QdVRS são: avaliar o doente, o

BOYLE, P.; FERLAY, J. – Cancer incidence and

seu prognóstico, o impacto da terapêutica

mortality in Europe, 2004 – Ann. Oncol., vol. 16,

utilizada, distinção entre doentes ou grupos de

nº3, 2005, pp:481-8.

doentes, além de comparar modalidades de tratamento com taxas de cura similares (Beitz et

BRESLOW, L. – A quantitative approach to the

al., 1996) e (Gouveia, 2004).

World Health Organization definition of health: physical, mental and social well-being – Int. J.

BIBLIOGRAFIA

Epidemiol., vol. 1, nº 4, 1972, pp: 347-55.

AHMEDZAI, S. – Recent Clinical Trials of Pain Control: Impact on Quality of Life – European

BRUNIER, G.; CARSON, M. G.; HARRISON,

Journal of Cancer, vol. 31A, suppl. 6, 1995, pp:

D.E. – What do nurses know and believe about

2-7.

patient with pain? Results of hospital survey – J. Pain Symptom Manage, vol. 10, nº 6, 1995.

BAILAR, J. C.; GORNIK, H. L. – Cancer undefeated – N. Engl. J. Med., vol. 336, nº 22,

CABANA, M. D.; et al. – Why don’t physicians

1997, pp: 1569-74.

follow clinical practice guidelines? A framework for improvement – Jama, vol. 282, nº 15, 1999, pp: 1458-65.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 14

CANO, A.; GILLIS. M.; HEINZ, W.; GEISSER,

GERHARDT, D. – Qualitative research on

M.; FORAN, H. – Marital functioning, chronic

chronic illness: the issue and the story – Soc.

pain, and psychological distress – Pain, nº 107,

Sci. Med. Vol. 30, nº11, 1990, pp: 1149-59.

2004, pp: 99-106. GOUVEIA, J.L.R.V., Diferenças ao nível do DE HAES, J. C.; VAN KNIPPENBERG, F. C. –

género na adaptação psicossocial a curto prazo

The quality of life of cancer patients: a review of

no pós enfarte agudo do miocárdio.

the literature – Soc. Sci. Med., vol. 20, nº 8,

Universidade do Minho, Braga, 2004, pp:

1985, pp: 809-17.

123-131.

DGS/DSIA/Divisão-de-estatística, Elementos

HARDMAN, A.; MAGUIRE, P.; CROWTHER, D.

Estatísticos Saúde/2003 – Portugal – Lisboa:

– The recognition of psychiatric morbidity on a

Direcção-Geral de Saúde, 2005, 162.

medical oncology ward. J. Psychosom Res., 1989, 33(2), pp: 235-9.

ELKINGTON, j. R. – Medicine and quality of life – Ann. Intern. Med., vol. 64, 1966, pp: 711-714.

HERRMANN, C., International experiences with the Hospital Anxiety and Depression Scale – a

FALLOWFIELD, L. J. – The Quality of Life: the

review of validation data and clinical results.

Missing measure of Health care. London –

Journal of Psychosomatic Research, 42, 1997,

London: Souvenir Press, 1990.

pp: 17-41.

FAYERS, P. M.; MACHIN, D. – Quality of life:

JONES, D. R.; FAYERS, P. M.; SIMONS, J. –

assessment, analysis and interpretation -

Measuring ans Analysing quality of life in cancer

Chichester:Wiley, 2000, xii, pp:404.

clinical trials; a review, in The Quality of Life of Cancer patients – editado por N. K. Aaronson e

FAYERS, P.; BOTTOMLEY, A. – Quality of life

J. Beckmann, New York: Raven Press, 1987.

research within the EORTC-the EORTC QLQC30. European Organisation for Research and

JORDHOY, M. S.; FAYERS, P.; LOGE, J. H.;

Treatment of Cancer – European Journal of

AHLNER-ELMQVIST, M.; KAASA, S. – Quality

Cancer, vol. 38, suppl. 4, 2002, pp: S125-33.

of Life in Palliative Cancer Care: Results from a Cluster Randomized Trial – Journal of Clinical

FRISCH, M. B. – Improving mental and physical

Oncology, vol. 19, nº 18, Setembro, 2001, pp:

health care throught Quality of Life Theraphy

3884-3894.

and assessement, in Advances in quality of life theory and research - editado por E. Diener e D.

KUUPPELOMAKI, M.; LAURI, S. – Cancer

Rahtz, Kluwer Academic Publishers: Dordrecht,

patients`reports experiences of suffering –

2000, pp: 207-242.

Cancer Nursing, vol. 25, nº 5, 1998, pp: 364-369.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 15

LEVI, F. et al – Trends in mortality from cancer in

PIMENTEL, F. L.; et al. – Survey of Portuguese

the European Union, 1955-94 – Lancet, vol. 354,

Physicians On Quality of Life Information – Qual.

nº 9180, 1999, pp: 742-3.

Life Res., vol. 11, nº 7, 2002, pp: 654.

LIMA, D. – Neuroanatomia da dor – in Dor: do

Quality of life and clinical trials – Lancet North

neurónio à pessoa, editado por Toscano Rico e

Am. Ed., vol. 346, nº 8966, 1995, pp:1-2.

António Barbosa, Departamento de Educação Médica da Faculdade de Medicina de Lisboa,

SALES, C. A.; et al. – Qualidade de vida de

Permanyer Portugal , ISBN: 972-733-013-4, pp:

mulheres tratadas de cancer de mama:

21-38.

funcionamento social – Revista Brasileira de Cancerologia, vol. 47, nº3, 2001, pp: 263-272.

LORENZ, W.; et al: - Second step: testingoutcome measurements – World J. Surg., vol.

SCHOU, K.; HEWISON, J. – Experiencing

23, nº 8, 1999, pp: 768-80.

cancer: quality of life in treatment. Facing death – Buckinggham, Philadelphia: Open University

MACGUIRE, P.; SELBY, P. – Assessing quality

Press, 1999, vii, pp: 197.

of life in cancer patients – Br. J. Cancer, vol. 60, nº 3, 1989, pp: 437-40.

SCHRAUB, S. et al. – Assessment of the quality of life – Bull Cancer, vol. 74, nº 3, 1987, pp:

N O R D E N F E L T, L . – C o n c e p t s a n d

297-305.

measurement of quality of life in health care – Philosophy and medicine, Dordrecht: kluwer

TAYLOR, E. J. – Spiritual assessment – in

Academic, vol. 47, 1994, viii, pp: 283.

Textbook of Palliative Nursing, editado por Betty Rolling Ferrel e Nessa Coyle, Oxford University

PAY N E , R . ; G O N Ç A LV E S , G . R . –

Press, 2001, ISBN: 0-19-513574-1, pp: 397-406.

Pathophysiology of pain in cancer and other terminal diseases – in Oxford Textbook of

TCHEKMDYIAN, N. S.; et al – Treatment of

Palliative Medicine, 3ª edição, editado por Derek

cancer anorexia with megestrol acetate: impact

Doyle et al , Oxford University Press, 2004,

on quality of life. Oncology (Huntingt), vol. 4, nº

ISBN: 0-19-851098-5, pp: 288-298.

5, 1990, pp: 185-92, discussão 194.

PIMENTEL, F. L. – Qualidade de Vida e

WHITE, C. A. – Meaning and its measurement in

Oncologia – Coimbra, Almedina, 2006, pp: 9-30.

psychosocial oncology – Psychooncology, vol. 13, nº 7, 2004, pp: 468-81.

PIMENTEL, F. L. – Qualidade de vida em oncologia – Permanyer Portugal, 2004, ISBN:

WRIGHT, J. M. – The double-edged sword of

972-733-149-1, pp: 13-20, 47-60.

COX-2 selective NSAIDs – Canadian Medical Association Journal, vol. 167, nº10, 2002, pp: 1131-1137.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Saraiva, S. (2013) Alzheimer's Disease, better known for better intervene . Journal of Aging & Inovation, 2 (3): 16-25

REVISÃO NARRATIVA / NARRATIVE REVIEW

JULHO, 2013

DOENÇA DE ALZHEIMER, CONHECER MELHOR PARA MELHOR INTERVIR ALZHEIMER’S DISEASE, BETTER KNOWN FOR BETTER INTERVENE ENFERMEDAD DE ALZHEIMER, MÁS CONOCIDO POR INTERVENIR MEJOR

Autora

Simone Saraiva1 1

Enfermeira, Pós-Graduada em Gestão de Feridas Crónicas, Pós-Graduada em Cuidados Paliativos,

Lar Monterey - Lisboa Corresponding Author: simone_raquel@hotmail.com

RESUMO A doença de Alzheimer é uma doença degenerativa atualmente incurável mas que possui tratamento. O tratamento permite melhorar a saúde, atrasar o declínio cognitivo, tratar os sintomas, controlar as alterações de comportamento e proporcionar conforto e qualidade de vida à pessoa que a possui e sua família. Objetivo: Com este trabalho, pretende-se, sobretudo, conhecer melhor esta doença e tudo o que nela está implícito. Este conhecimento vai levar também a criar intervenções de enfermagem mais apropriadas a este tipo de doentes. Metodologia: Para a elaboração deste trabalho os recursos utilizados foram a consulta bibliográfica relacionada com o tema em estudo e à consulta webliográfica recorrendo à pesquisa eletrónica no motor de busca Google. Conclusão: Com a informação recolhida sobre a Doença de Alzheimer, foram elaboradas intervenções de enfermagem ao individuo que apresenta esta, tendo por base a mais recente evidência científica. PALAVRAS-CHAVE: Doença de Alzheimer, Diagnóstico, Tratamento, Intervenções de Enfermagem Abstract Alzheimer's disease is a degenerative disease currently incurable but who has treatment. The treatment allows improving health, delaying the cognitive decline, treating the symptoms, controlling changes of behavior and provide comfort and quality of life the person that owns it and his family. Objective: With this work, it is, above all, know this disease better and everything in it is implicit. This knowledge will also lead to create nursing interventions most appropriate to this type of patients. Methodology: For the elaboration of this work the resources used were the bibliographic consultation related to the topic under study and consultation webliografica using electronic searches in the search engine Google. Conclusion: With the information gathered on the Alzheimer's Disease, were drawn up nursing interventions to individual who presents this, based on the most recent scientific evidence. KEYWORDS: Alzheimer's Disease, Diagnosis, Treatment, Nursing Interventions

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 17

Introdução

não só físicos, como a dor, mas também dos psicossociais e espirituais.

O aumento da esperança média de vida e o

Apesar de atualmente, a maioria da população

acréscimo das doenças crónicas progressivas e

pensar que os cuidados paliativos são só para

incuráveis na população adulta e idosa, aliados

os doentes oncológicos, em fase terminal, já se

à busca incessante da melhoria da qualidade de

começa a mudar esse pensamento tão restritivo

vida, estão intimamente relacionados com o

e segundo António Barbosa e Isabel Galriça

progresso dos cuidados de saúde. Um dos

Neto (2010, p. 247)3, “os cuidados paliativos

problemas de saúde atuais é as demências,

devem, pois, ser oferecidos com base num

como a doença de Alzheimer, que representam

conjunto de necessidades e não com base nos

um grande custo económico para as intuições

diagnósticos. É preciso garantir a justiça e a

de saúde e são causa de sofrimento e

equidade no acesso aos cuidados de saúde,

diminuição da qualidade de vida para as

nomeadamente paliativos, para este numeroso

pessoas que as possuem, como também para

grupo de doentes incuráveis, dentre os quais

as suas respetivas famílias. Para além destes

queremos destacar os doentes com demência

problemas, o facto de estes doentes serem

avançada”. Isto leva a que a dicotomia entre

tratados como os doentes agudos, leva a que as

cuidados curativos e cuidados paliativos esteja a

intervenções por parte dos profissionais de

esbater-se pois, o ideal é existirem ações

saúde não sejam as mais corretas e por vezes

paliativas nos doentes agudos que

exista mesmo obstinação terapêutica. Estas

posteriormente necessitaram de cuidados

situações levam-nos a pensar que, na área da

paliativos, como os doentes com alzheimer e

saúde, deve existir outro tipo de intervenções

ações curativas nos doentes paliativos, como

terapêuticas, o que nos remete para os

por exemplo uma cirurgia ortopédica por fratura

cuidados ao individuo conforme as suas

do colo do fémur, num doente oncológico. Ou

necessidades, aceitando a sua incurabilidade,

seja existir o modelo integrado em vez do

ou seja, as intervenções realizadas à pessoa

modelo separado que é o modelo que ainda

com doença devem ser paliativas.

persiste na maioria das nossas instituições.

Isto remete-nos para a prestação de cuidados

A doença de Alzheimer é uma demência.

paliativos que, segundo a Organização Mundial

Segundo Letícia Lessa Mansur et al (2005, p.

de Saúde (2002), citado pela Associação

300)6 pelos critérios do DSM IV (APA, 1994),

Nacional de Cuidados Paliativos (2006, p. 2, 3)1

considera-se dementes os indivíduos que

são uma abordagem que visa melhorar a

evidenciam deterioração cognitiva

qualidade de vida dos doentes que enfrentam

particularmente da memória, a qual afeta as

problemas decorrentes de uma doença

atividades da vida cotidiana. A DA se insere

incurável com prognóstico limitado, e/ou doença

entre os quadros progressivos irreversíveis, cujo

grave (que ameaça a vida), e suas famílias,

declínio cognitivo tem bases estruturais, com

através da prevenção e alívio do sofrimento,

tempo de evolução variável, sendo a sobrevida,

com recurso à identificação precoce, avaliação

em média, de 8 anos após o início dos

adequada tratamento rigoroso dos problemas

sintomas.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 18

Já António Barbosa e Isabel Galriça Neto (2010,

incontinência e infecções de repetição

p. 248)3 dizem que a demência pode definir-se

(respiratórias, urinárias e/ou de feridas).

como uma síndrome de instalação progressiva

Nos doentes com demência avançada, como

em que ocorre deterioração cognitiva e

perdem a capacidade de se expressarem bem

intelectual, que depois persiste, acompanhada

verbalmente, a avaliação do sofrimento e o

por um progressivo declínio funcional e da

controlo de sintomas estão dificultadas, contudo

autonomia da pessoa doente, com implicações

António Barbosa e Isabel Galriça Neto (2010, p.

claras na sua sobrevida, já que eventualmente

250)3 afirmam que os sintomas mais frequentes

virá a falecer devido a essa mesma patologia ou

serão as alterações comportamentais, a dor

às limitações que a mesma determina

abdominal (atenção à obstipação, à retenção

(imobilismo, alterações da deglutição e

urinária e aos fecalomas), as dificuldades na

infecções associadas). Este quadro demencial

alimentação, a febre e as infecções, e a

tem na sua origem diferentes etiologias

retenção de secreções respiratórias, também o

possíveis, sendo a demência de Alzheimer

delirium e a agitação, assim como o apoio aos

responsável pela maioria dos casos, …em cada

prestadores de cuidados merecem destaque

10 doentes com demência, 6 terão a doença de

nas intervenções terapêuticas.

alzheimer … no entanto há uma pequena

Por tanto, uma boa avaliação prognóstica é

percentagem de doentes que pode apresentar

fundamental para se fazer corretamente os

demência de múltiplas causas.

diagnósticos de intervenção no doente e

A fase evolutiva e prognóstico no caso da

consequentemente as intervenções mais

demência de Alzheimer, segundo António

adequadas a utilizar.

Barbosa e Isabel Galriça Neto (2010, p. 250)3, de acordo com a escala Fast proposta por Reisberg para avaliação e estadiamento

Doença de Alzheimer

funcional, existem 7 estadios, …O estadio 5

A doença de Alzheimer é uma doença

corresponde a doença moderada (o doente

degenerativa que, lenta e progressivamente,

requer assistência nas tarefas complicadas,

destrói as células cerebrais. Chama-se assim

como escolher a roupa adequada, e na higiene

porque foi Alois Alzheimer, um médico

pessoal), o 6 o de doença moderadamente

psiquiatra, e neuropatologista, alemão, quem

severa (para além do anterior, surgem

em 1906 descreveu pela primeira vez os

problemas de incontinência urinária e/ou fecal) e

sintomas e as características neuropatológicas

no 7, doença severa, ocorre redução acentuada

da doença de Alzheimer, tais como placas e

do vocabulário que se limita a meia dúzia de

tranças neurofibrilhares no cérebro. A doença

palavras inteligíveis ao longo do dia, perda

afecta a memória e o funcionamento mental (por

mímica facial, incapacidade de andar e perda de

exemplo o pensamento e a fala, etc), mas pode

equilíbrio da cabeça. A fase avançada da

igualmente levar a outros problemas, tais como

doença caracteriza-se claramente por

confusão, alterações de humor e desorientação

problemas de mobilidade, dificuldade na

no tempo e no espaço2.

alimentação (disfagia ou recusa alimentar), JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 19

Nesta doença a perda de memória e de

aumento está a ser exponencial, sobretudo nos

faculdades intelectuais é ligeira no início, sendo

países de baixo e médio desenvolvimento.

mesmo impercetível por parte do indivíduo e dos

O diagnóstico desta doença não é linear pois

familiares, contudo ao longo da sua progressão

não existe um teste especial para determinar se

vai-se tornando percetível de tal modo que

alguém tem doença de Alzheimer. O diagnóstico

começa a afetar as atividades de vida diárias do

é feito por um processo de exclusão, bem como

indivíduo o que leva a que este passe a ser

por uma observação cuidadosa do estado físico

dependente para estas mesmas atividades. Por

e mental da pessoa, mais do que por a doença

exemplo, uma mulher, quando se encontra

parecer ser evidente no momento2.

numa fase intermédia da doença, perde a

Há de facto três diagnósticos possíveis: doença

capacidade de controlo dos esfíncteres o que

de Alzheimer possível, provável ou certa. Um

leva à incontinência urinária e, tendo o

diagnóstico de possível doença de Alzheimer

autocuidado da higiene diminuído, leva a que

baseia-se na observação dos sintomas clínicos

esteja dependente de um cuidador para que

e na deterioração de duas ou mais funções

este autocuidado lhe seja prestado. Isto impede

cognitivas (por ex. a memória, a linguagem ou o

que outras doenças oportunistas se manifestem,

pensamento), sempre que uma segunda doença

como por exemplo a infecção urinária. Por tanto,

está presente, que não se considera ser a causa

a doença de Alzheimer é uma doença não

de demência, mas faz com que o diagnóstico de

infeciosa nem contagiosa mas sim uma doença

doença de Alzheimer seja menos certo. O

terminal que causa uma deterioração geral na

diagnóstico é classificado como provável, com

saúde do indivíduo que a possui2.

base nos critérios acima mencionados, na

Na doença de Alzheimer a causa mais comum

ausência de uma segunda doença. A única

de morte é a pneumonia, porque à medida que

maneira de confirmar com certeza o diagnóstico

a doença avança, o sistema imunitário vai

de doença de Alzheimer, é a identificação das

deteriorando com progressiva perda de peso, o

características placas e tranças no cérebro. Por

que aumenta o risco de infeções da garganta e

esta razão, o terceiro diagnóstico, o da doença

dos pulmões2.

de Alzheimer de certeza, só pode ser feito por

Esta doença no passado era considerada uma

biópsia cerebral ou depois de se ter efectuado

forma de demência pré-senil, contudo na

uma autópsia2.

atualidade sabe-se que esta doença afeta

O diagnóstico precoce, por tudo o que foi acima

também pessoas com idade inferior a 65 anos e

referido acerca desta doença é importante para

é designada quer de demência pré-senil, quer

que a prestação dos cuidados prestados, à

d e d e m ê n c i a s e n i l d o t i p o A l z h e i m e r,

pessoa com a doença de Alzheimer, sejam os

dependendo da idade da pessoa que a possui.

mais adequados possível de modo a que a

A Organização Mundial de Saúde (OMS) diz-nos

qualidade de vida esteja garantida.

que a doença de Alzheimer deve ser

Nos cuidados de enfermagem, a promoção de

considerada uma prioridade mundial pois, ao

uma melhor qualidade de vida à pessoa tem um

longo dos anos e a nível mundial, o seu

especial relevo, e tem como objetivo ideal promover a recuperação da qualidade de vida

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 20

da pessoa antes de requerer cuidados. No caso

doença de Alzheimer, promovendo acima de

dos cuidados paliativos como nem sempre é

tudo a qualidade de vida nos estadios em que a

possível atingir este patamar mas, é possível

pessoa se encontra perante a mesma doença.

proporcionar uma qualidade de vida baseada

É preciso não esquecer que este tipo de

nas necessidades apresentadas pelo doente.

doentes se encontra em todos os serviços de

Isto só é possível com a aquisição do

saúde e, por isso, há necessidade de que todos

conhecimento científico por parte dos

os profissionais de saúde estejam despertos

enfermeiros e restantes profissionais de saúde,

para tais necessidades e, de saber quais as

onde a prática baseada na evidência se torna

intervenções a realizar à pessoa com doença de

um ótimo recurso. Para além de melhorar a

Alzheimer para que a qualidade de vida seja

qualidade de vida das pessoas, a prática

proporcionada ao máximo nível de que esta

baseada na evidência implicará menos gastos

necessita.

económicos, fazendo com que os cuidados de

Então as necessidades da pessoa com doença

enfermagem passem a ser eficientes. Tal,

de Alzheimer deve ser uma prioridade com que

significa menos custos diretos e indiretos à

os enfermeiros se devem preocupar, quando

instituição e também ao próprio utente, família

tratam da pessoa com esta doença, a qualidade

do utente e todas as entidades intervenientes no

de vida e as suas necessidades devem ter a

processo de tratamento deste.

maior atenção por parte dos enfermeiros e de

Aqui, a investigação tem um papel fundamental

toda a equipa multidisciplinar.

para o constante desenvolvimento tecnológico e científico dos cuidados de enfermagem, promovendo a qualidade dos mesmos. Sobre

Intervenções de Enfermagem

isto, é importante referir que os enfermeiros

Como já foi referido, a doença de Alzheimer nas

contribuem no exercício da sua atividade para a

fases mais avançadas da doença tem indicação

área de gestão, investigação e formação com o

para cuidados paliativos pois, é uma doença

intuito de melhorar e evoluir a prestação dos

progressiva e incurável. Como tal, as

cuidados de enfermagem: os enfermeiros

intervenções de enfermagem centram-se não só

concebem, realizam, promovem e participam em

na comunicação, no trabalho da equipa

trabalhos de investigação que visem o

multidisciplinar e da pessoa e família, como

progresso da enfermagem, em particular, e da

também no controlo de sintomas.

saúde, em geral8.

O tratamento desta doença passa, não só pela

Para que tudo isto seja alcançado, subsiste

prevenção e tratamento desta, mas também

então a necessidade de haver um trabalho de

pelo tratamento dos sintomas proporcionando

pesquisa por parte dos profissionais de saúde

assim uma melhor qualidade de vida e indo de

em realizar estudos de caso, promovendo

encontro às necessidades que o doente vai

também a pesquisa científica pois, só assim irão

apresentando. Por isso, ir-se-á abordar as

alcançar a informação necessária para a

intervenções aos sintomas mais comuns da

prestação de cuidados de enfermagem

doença de Alzheimer.

centrados nas necessidades da pessoa com JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 21

Existe evidência de que a dor é genericamente

secundários dos fármacos – ainda mais sendo

subavaliada e subtratada nestes doentes.

eles tratáveis – para não recorrer a um acertado

Deverão ser sempre valorizadas a linguagem

controlo sintomático da agitação, pilar central da

não verbal – postura, fácies -, as mudanças nas

promoção da dignidade e qualidade de vida

vocalizações, padrão respiratório, e as

destes doentes e seus familiares… Por outro

mudanças no padrão habitual de interacções

lado, não é demais sublinhar a necessidade de

interpessoais… Dentre as várias escalas de

o regime terapêutico contemplar medicação

avaliação da dor para não comunicantes,

pautada (“a horas certas”) e depois sempre com

queremos aqui destacar a escala DS-DAT

um SOS disponível3.

(Disconfort Scale for Dementia of Alzheime’s

No caso de agitação psicomotora convém

Type), proposta por Hurley e que avalia 9

sempre descartar a presença de dor não

categorias de comportamentos (da expressão

tratada, de fecalomas e/ou retenção urinária3.

facial, aos vocalizos, à tensão e linguagem

Os antipsicóticos neurolépticos, sobretudo os

corporal), cada uma de 0 a 4, sendo as

atípicos (risperidona, olanzapina, clozapina…),

pontuações totais mais baixas as relacionadas

desprovidos de efeitos extra-piramidais, são a

com maior conforto… Os princípios

base para o tratamento correcto destes

preconizados pela OMS e largamente difundidos

sintomas perturbadores, e devem ser

para o tratamento da dor crónica – “tratamento

progressivamente titulados3.

pela escala analgésica, pela boca e pelo relógio,

Nestes doentes é inevitável que surjam

em função da intensidade da dor” – aplicam-se

problemas alimentares, associados à dificuldade

também a estes doentes. A utilização de

de deglutição (para sólidos e líquidos) e à

opióides não deve ser negligenciada, no caso

recusa alimentar. Convém insistir em medidas

de se tratar de dor moderada a severa,

não invasivas, como o alimentar o doente lenta

considerando que estes doentes já têm

e pacientemente à mão, em quantidades bem

normalmente tendência, pelo imobilismo, a

menores que as habituais, mas suficientes para

desenvolver obstipação, pelo que a introdução

as suas necessidade reduzidas, recorrer aos

de laxantes pode ser imprescindível. No caso do

pequenos snacks, aos espessantes para

doente não deglutir, preconiza-se o recurso a

líquidos e às gelatinas… A alimentação por

vias de administração alternativas à via oral,

sonda nunca deverá ser vista como substituta

como a subcutânea e a transdérmica3.

da alimentação oral, mesmo e, sobretudo,

Importa sublinhar que a dor não tratada é muitas

quando esta se torna uma tarefa muito

vezes o factor que está na base de alterações

demorada que exige muita paciência3.

do comportamento e de agitação3.

A evidência existente demonstrada claramente

A existência de demência torna os indivíduos

que a alimentação por sonda, longe trazer bem-

mais susceptíveis à ocorrência de delirium, bem

estar para o doente, aumenta a mortalidade e

como à ocorrência de efeitos secundários de

não traz outros benefícios esperados, como, por

vários fármacos (anticolinérgicos, opióides,

exemplo a prevenção da aspiração de

neurolépticos, por exemplo). Não se devem usar

secreções, a diminuição das infecções

doses subterapêuticas ou invocar os efeitos JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 22

respiratórias ou a cicatrização de úlceras de

éticos, apesar de ser uma medida invasiva. Esta

pressão3.

será justificada se os benefícios ultrapassarem

Os mesmos autores referem que nas fases mais

os malefícios e deverá ter sempre em conta a

iniciais das demências a colocação da

origem das infeções e a irreversibilidade dos

gastrostomia percutânea (PEG) é preferível à

fatores que as predispõem, assim como a

sonda nasogástrica (SNG) por ser menos

ausência de melhorias significativas para o

invasiva, mas este procedimento deve ser

conforto do doente.

afastado, nas fases mais avançadas, por risco

Como a doente apresentou infeções de variadas

de arritmias fatais e morte peri-operatória3.

origens, nos dois episódios de internamento, a

No caso de o doente manifestar diminuição de

utilização de antibioterapia foi essencial para

apetite, deve-se descartar algumas causas

que a qualidade de vida e conforto lhe fossem

reversíveis como a obstipação, alterações das

proporcionados.

preferências alimentares, má higiene oral (a sua

Já a hipotermia ocorre quando a temperatura

ausência provoca desconforto e o não prazer no

normal do corpo, que é 37ºC. desce para menos

saborear dos alimentos) ou dor não tratada3.

de 35ºC (95ºF). A hipotermia é normalmente

Nos doentes com demência terminal existem

causada pela longa permanência num ambiente

vários factores que dispõem a ocorrência de

frio. A hipotermia é muitas vezes desencadeada

febre e de infecções associadas: o imobilismo e

pela exposição prolongada à chuva, ao vento, à

as alterações da integridade cutânea

neve ou a imersão em água fria5.

associadas, à incontinência, à diminuição das

Durante uma exposição prolongada ao frio, o

defesas imunitárias e as dificuldades de

mecanismo de defesa do organismo tenta evitar

deglutição. As infecções respiratórias, urinárias

a continuação da perda de calor. A pessoa

e de feridas são as que nestes doentes se

começa a tremer para tentar manter os órgãos

verificam com maior frequência3.

principais a uma temperatura normal. O fluxo

Define-se “tratamento da pneumonia com intuito

sanguíneo para a pele é restringido e são

curatico “ e “tratamento paliativo”: o primeiro diz

libertadas hormonas para produção de calor5.

respeito a um tratamento que tem a cura de

Sem tratamento, as pessoas que tenham

infecção como objectivo primário (o que se torna

hipotermia podem ficar bastante mal de repente,

cada vez mais o tópico com a reincidência das

perder os sentidos e morrer.

infecções), e no segundo a cura não é só

Se estiver no exterior, tente abrigar-se e

objectivo mas sim o tratamento dos sintomas

proteger-se do ambiente. Tire a roupa molhada

resultantes da pneumonia, pelo desconforto que

e cubra os pés e as mãos para evitar mais

possam causar. Neste último caso, os

perda de calor.

antibióticos também poderão ser utilizados,

Para proteger os órgãos principais do

preferencialmente em concomitância com

organismo, aqueça primeiro o centro do corpo.

medidas como a oxigenoterapira, os

Utilize um saco cama, um cobertor de

antipiréticos e os opióides3.

emergência, contacto pele com pele ou

A antibioterapia em cuidados paliativos deve ser

camadas secas de cobertores, roupa, toalhas ou

ponderada segundo os vários aspetos clínicos e

lençóis5.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 23

Na insuficiência cardíaca principal causa é a

hemodiálise (tratamento realizado pelo filtro de

isquemia cardíaca ou o enfarte do miocárdio.

uma máquina ao sangue 3 vezes por semana

Enfarte significa morte tecidual, que no caso do

no hospital), diálise peritoneal (tratamento feito

coração se refere a parte do músculo cardíaco.

em casa diariamente por uma máquina através

Logo, quanto mais extenso for o enfarte, mais

de um cateter colocado no abdómen) ou

músculo morrerá, consequentemente, mais

transplante do rim11.

fraco fica o coração. Se o infarto necrosar uma

Hemodiálise na maioria das vezes representa

grande área, o paciente morre por falência da

uma esperança de vida, já que a doença é um

bomba cardíaca10.

processo irreversível. Contudo, observa-se que

O tratamento é feito com restrição de sal

geralmente as dificuldades de adesão ao

e água, diuréticos, anti-hipertensivos (…

tratamento estão relacionadas à não aceitação

Captopril, Enalapril, Losartan, etc.) e

da doença, à percepção de si próprio e ao

medicamentos que aumentam a força cardíaca

relacionamento interpessoal com familiares e ao

como a digoxina. Os obesos devem emagrecer,

convívio social9.

os fumadores têm que largar o cigarro, álcool

O enfermeiro como coordenador da equipe deve

deve ser evitado e exercícios supervisionados

coordenar a assistência prestada, identificando

para reabilitação cardíaca são indicados. A

as necessidades individuais de cada cliente,

pressão arterial deve ser controlada com

proporcionando meios de atendimento que

rigor10.

visem uma melhor adequação do tratamento,

A fibrilhação auricular é a disritmia auricular

garantindo assim uma qualidade de vida melhor,

mais rápida. É criada, e mantida, por um ou

aproveitando todos os momentos para criar

mais focos ectópicos de disparo rápido. As

condições de mudanças quando necessário9.

aurículas despolarizam caoticamente a frequências de 350 a 600 pulsações/minutos…

Com este processo de análise e extração de

Entre os fármacos usados…contam-se o

evidência relevante, foi encontrada informação

diltiazem, a digoxina, e os beta-bloqueadores…

importante que suporta as intervenções do

Na fibrilhação auricular com resposta ventricular

enfermeiro ao doente com doença de Alzheimer.

lenta, pode ser necessária a atropina para

Como é referido no tratamento da infeção, por

aumentar a frequência cardíaca e o débito

vezes a utilização de antibioterapia não é um

cardíaco7.

tratamento agressivo face aos benefícios em

A insuficiência renal é a incapacidade parcial ou

contraste com os malefícios.

total do(s) rin(s) desempenhar(em) a(s) sua(s)

Assim com a evidência obtida, verifica-se que a

função(ões).

delineação das intervenções de enfermagem

A insuficiência renal pode ser classificada em

segundo as intervenções terapêuticas e

aguda ou crónica. Na aguda a insuficiência renal

paliativas são onde o papel do enfermeiro ganha

aparece em poucos dias e tem cura enquanto

destaque como elemento ativo na atualização

que na crónica a doença vai-se desenvolvendo

dos seus conhecimentos e prestação de

e quando é detectada já é irreversível. Na

cuidados. Desta forma é garantida a qualidade

segunda situação o doente tem que fazer JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 24

de vida e conforto ao doente, sem esquecer a

Referências Bibliográficas

dignidade que se mantém intacta. 1.Associação Nacional de Cuidados Paliativos Conclusão

(2006). Organização de Serviços em Cuidados

Com o desenrolar deste trabalho foram

Paliativos. Recomendações da ANCP. p. 2, 3.

identificados vários aspetos a ter em conta na intervenção do enfermeiro, no que respeita às

2.Associação Portuguesa dos Familiares e

necessidades da pessoa com demência, neste

Amigos dos Doentes de Alzheimer (2006).

caso particular com doença de Alzheimer, de

Manual do Cuidador. Lisboa: Ponticor -

modo a maximizar a qualidade de vida, conforto,

Realizações Gráficas, Lda., p. 18, 21, 22.

dignidade e autonomia, conforme a fase da doença em que o doente se encontra. As

3.Barbosa, António & Neto, Isabel Galriça

intervenções identificadas incluem o uso de

(2010). Manual de Cuidados Paliativos. Lisboa:

antibioterapia, bem como outros aspetos

Faculdade de Medicina da Universidade de

relevantes, apesar de a doente já estar numa

Lisboa, p. 247, 248, 250, 251, 252, 253, 254,

das fases mais avançadas da doença, sendo já

255, 256.

uma doente para cuidados paliativos. Foi a partir da evidência cientifica existente e

4.Conselho Internacional de Enfermeiros (2006).

atual que foi recolhida a informação para a

Classificação Internacional para a Prática de

elaboração das intervenções no âmbito de

Enfermagem CIPE. Versão 1.0. Lisboa: Ordem

enfermagem para doente com doença de

dos Enfermeiros.

Alzheimer. A prática baseada na evidência, “tem sido

5.Hipotermia. (2008). Queen’s Printer and

descrita, como fazer bem as coisas certas” (Muir

Controller of HMSO, p. 1, 2.

Gray, 1997; citado por Craig & Smyth, 2004, p. 4)4, o que nos alerta para a importância de fazer

6.Mansur, Letícia Lessa, et al. (2005).

as coisas não só de uma forma eficaz, mas

Linguagem e Cognição

sempre com a melhor qualidade possível. Este

Alzheimer. Psicologia: Reflexão e Crítica, p. 300.

na Doença de

trabalho de prática, e muitos outros que tem vindo a ser feitos, vêm contribuir para este

7.Marek, Phipps & Sands (2003). Enfermagem

aspeto importante de procurar basear as nossas

Médico-Cirúrgica. Loures: Lusociência, p.759.

intervenções em evidência comprovada cientificamente, caminhando no sentido de uma

8.Ordem dos Enfermeiros (2003). Competências

prática com progressivamente mais qualidade.

do enfermeiro de cuidados gerais. Divulgar,

Tal permite uma abordagem mais segura e

artigo 9.º, n.º4, p. 7, 8.

eficaz deste desafio com melhores cuidados ao utente e de forma a maximizar a qualidade de

9. Souza, Emilia Ferreira, et al. (2007).

vida, o conforto e a promoção da dignidade do

Diagnósticos de enfermagem em pacientes

doente.

com tratamento hemodialítico utilizando o

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 25

modelo teórico de Imogene King. Rev Esc Enferm USP, p. 630. 1 0 . h t t p : / / w w w. m d s a u d e . c o m / 2 0 0 9 / 0 2 / insuficiencia-cardiaca.html, consultado a 27/05/13. 11.http://www.conhecersaude.com/adultos/3055insuficiencia-renal-aguda-cronica.html, consultado a 27/05/13. 10.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Neto, M., Corte-Real, J. (2013) The Elder institutionalized: Depression and social support. Journal of Aging & Inovation, 2 (3): 26-41

ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

JULHO, 2013

A PESSOA IDOSA INSTITUCIONALIZADA: DEPRESSÃO E SUPORTE SOCIAL THE ELDER INSTITUTIONALIZED: DEPRESSION AND SOCIAL SUPPORT EL ANCIANO INSTITUCIONAL: DEPRESIÓN Y APOYO SOCIAL

Autores Maria João Neto1, Judite Corte-Real2 1

Mestre em Psicologia Clínica. Instituto Superior de Psicologia Aplicada-Instituto

Universitário (ISPA-IU)., 2 Professora no Instituto Superior de Psicologia Aplicada - Instituto Universitário (ISPA-IU). Corresponding Author: marianeto85@gmail.com

RESUMO Neste trabalho, pretendeu-se averiguar a prevalência da depressão, em pessoas idosas institucionalizadas, bem como, a sua rede de suporte social. Os resultados da aplicação da Escala da Depressão Geriátrica (GDS) e do Questionário de Apoio Social (SSQ-6) em 25 pessoas idosas institucionalizadas, revelam que 48% dos inquiridos apresentam depressão ligeira e 24% depressão grave. Relativamente à rede de suporte social, verifica-se que a maioria dos participantes (56%) inclui uma a duas pessoas na sua rede de apoio, 40% mais do que duas pessoas e apenas um inquirido menciona não ter ninguém. Constatou-se uma correlação significativa, negativa moderada entre a depressão e satisfação com o suporte social: quanto maior a satisfação com o suporte social, menor a pontuação na escala de depressão. Atendendo a que mais de 50% da população idosa, institucionalizada, apresenta sintomatologia depressiva, seria pertinente estudar variáveis contextuais que contribuam para o bem-estar destas pessoas. Palavras-chave: envelhecimento; depressão; institucionalização; suporte social.

Abstract The study has the objective to determine the prevalence of depression in institutionalized elderly, as well as their social support network. The results of application of the GDS and the SSQ-6, in 25 institutionalized elderly, shows that 48% of respondents have mild depression and 24% severe depression. For the social support network, it appears that most participants (56%) includes one or two people in your support network, 40% more than two people and only one surveyed stated they had none. There was a moderate negative significant correlation between depression and satisfaction with social support: the greater the satisfaction with social support, lower scores on the depression scale. Since over 50% of institutionalized elderly population presents symptoms of depression, it would be pertinent to study contextual variables that contribute to the welfare of these people. Keywords: aging; depression; institutionalization; social support.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 27

Introdução

através dos quais podemos promover uma maior qualidade de vida para a pessoa idosa.

O envelhecimento é um processo complexo de

Na nossa sociedade considera-se,

mudanças biológicas, psicológicas e sociais,

frequentemente, o idoso como um ser

que se iniciam no momento do nascimento e se

dependente e doente, condenando-o, por vezes

prolongam ao longo da vida. O envelhecimento

a uma solidão extrema (Ribeirinho, 2005), a que

é definido pela OMS como o “prolongamento e

acrescem dificuldades de natureza financeira

término de um processo representado por um

que diminuem a sua qualidade de vida.

conjunto de modificações fisiomórficas e

Se a quarta idade traz consigo várias patologias

psicológicas ininterruptas à ação do tempo

e um decréscimo das competências de

sobre as pessoas”. A OMS descreve ainda a

adaptação (Baltes & Smith, 1997), por outro

pessoa idosa como: “ (…) todo o indivíduo com

lado, verifica-se que o suporte familiar é cada

idade superior a 65 anos independentemente do

vez mais reduzido, devido ao crescente

estado de saúde e sexo" (OMS).

aumento de mulheres no mercado de trabalho e

A importância de estudos sobre o

consequente indisponibilidade das famílias, para

envelhecimento, tem vindo a crescer ao longo

cuidarem das suas pessoas idosas, optando-se

das últimas décadas, pelo aumento da

frequentemente pela institucionalização.

esperança média de vida, que tem levado a um

Segundo Slepoj (2000) a “família baseia-se hoje

crescimento significativo de pessoas idosas na

mais na satisfação de desejos do que na

população, em geral. Atualmente, verifica-se a

assistência recíproca” (p.89); fatores como o

existência de um número progressivamente

envelhecimento da população e consequente

superior de pessoas muito idosas, situadas por

aumento de pessoas idosas dependentes, a

alguns autores na denominada quarta idade, ou

integração das mulheres no mundo profissional,

seja, pessoas com idades superiores a 80 anos

o menor número de filhos, a focalização dos

(Oliveira, Freire & Giaretta, 1999).

indivíduos no sucesso profissional, entre outros,

A par do aumento exponencial da população

levaram à desresponsabilização do papel da

idosa, em Portugal, tem-se verificado uma

família como cuidadora primária, passando o

diminuição da população mais jovem nas

“dever” dos filhos de prestarem assistência aos

últimas décadas, chegando aquela a

seus pais, para um novo grupo profissional, o do

representar, em 2006, 17,3% da população total

“cuidador formal”(Casado & López, 2001, cit. por

e a população jovem apenas 15,5% (INE, 2007).

Martinéz, 2005).

Como consequência do envelhecimento

Os cuidados formais distinguem-se dos

populacional, o número de pessoas idosas

informais por estes serem prestados por

dependentes, por vezes institucionalizadas, tem

familiares ou pessoas próximas, enquanto que

aumentado, assim como perturbações de

os primeiros são disponibilizados por

natureza depressiva, podendo-se observar,

organizações (públicas ou privadas, com ou

nesta área, prevalências entre os 15% e os 50%

sem fins lucrativos) em lares, centros de dia ou

(Segal, 2005). Estes fatores, requerem que se

em regime de apoio domiciliário. Considera-se

reflita sobre o envelhecimento e os mecanismos

que os cuidadores formais têm competências

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 28

técnicas e/ou clínicas que os capacitam para um

de dia (onde são disponibilizados

trabalho baseado na abordagem holística do

essencialmente serviços associados à

envelhecimento (Hye-cheon et al., 2009),

alimentação, higiene e outros cuidados básicos,

requerendo-se destes profissionais

durante o dia, permitindo à pessoa idosa

competências multidisciplinares e aptidões

manter-se em sua casa ou com a sua família,

práticas, que proporcionem saber reconhecer

mesmo que esta não lhe possa prestar cuidados

problemas cognitivos, sociais e familiares

durante o dia), serviços de apoio domiciliário

(Kaskie, Gregory & Gilder, 2009), assim como

(este tipo de cuidados incluem desde a

facultar cuidados de saúde, além de satisfazer

satisfação das necessidades básicas a cuidados

as necessidades básicas da pessoa idosa.

de saúde, permitindo-se à pessoa idosa

Segundo autores como Vieira (2003) as

continuar a viver em sua casa), até aos lares de

instituições voltadas para o cuidado de pessoas

terceira idade, com um carácter mais

idosas “têm uma função social indiscutível, por

permanente, onde se prestam uma variedade de

vezes vital, na organização e no funcionamento

serviços, como o alojamento temporário ou

da sociedade” (p. 23).

permanente, alimentação, cuidados de saúde,

A institucionalização, uma realidade cada vez

higiene e conforto, atividades de convívio e

mais presente na vida da pessoa idosa, tem

animação social, assim como ocupação dos

sido um tema muito focado pela literatura

tempos livres (Despacho Normativo nº 12/98 de

científica, dadas as mudanças havidas neste

25 de Fevereiro, Carvalho, 2006).

domínio, desde há algumas décadas e a

Embora a institucionalização seja geralmente

necessidade de se conhecerem os fatores a ela

rejeitada e temida pela maioria das pessoas

associados, o seu impacto na vida das pessoas

idosas, existem famílias que por motivos

idosas, assim como a necessidade de se

financeiros ou emocionais, não têm capacidade

fomentar o conhecimento de práticas que

de cuidar dos seus familiares; assim embora

promovam o bem-estar destas pessoas.

possa ser considerada negativa, a verdade é

Em 2004 os dados oficiais apontavam para

que a institucionalização frequentemente pode

56.535 pessoas idosas, institucionalizadas, em

promover uma maior sensação de segurança

1 5 1 7 L a r e s d e Te r c e i r a I d a d e l e g a i s ,

(Pimentel, 2001), principalmente se resultar de

representando 3.2% das pessoas idosas (INE,

perdas na autonomia, causadas por patologias

2007). Em Portugal, a institucionalização é feita

físicas, perda de cônjuge, carências de apoio

maioritariamente através de entidades privadas

social, isolamento ou vivências habitacionais

lucrativas e não lucrativas; destas últimas

negativas (Pimentel, 2001).

ressalvam-se as IPSS (Instituições Particulares

Na sequência da institucionalização, algumas

de Solidariedade Social) que surgiram em 1976

famílias mantêm um contacto regular com a

e, são até hoje, as instituições que

pessoa idosa, por telefone ou através de visitas;

disponibilizam um maior número de serviços

outras, com maior frequência, abandonam-na ou

para a população idosa, desde centros de

excluem-na do meio familiar, o que potencia

convívio (focados na prevenção do isolamento e

fortemente a sua solidão. Barroso e Tapadinhas

manutenção das relações sociais), aos centros

(2006) verificaram uma predominância da

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 29

solidão, em pessoas idosas em situação de

mesmo tentativas de suicídio; recusa em

institucionalização, em relação aos não

alimentar-se; delírios e/ou alucinações

institucionalizados, observando-se nalguns

(Wilkinson et al., 2003). Em termos clínicos a

estudos uma diferença de 50% na depressão,

perturbação é diagnosticada quando estão

no sentido de ser superior nas pessoas

presentes cinco ou seis sintomas dos referidos.

institucionalizadas (Black, Rabins, German,

A depressão pode interferir com o dia-a-dia do

McGuire, & Roca, 1997; Rabins, et al., 1996).

indivíduo, levando a uma maior tendência para

A depressão, considerada uma perturbação do

ver a vida de forma pessimista, a alguma

humor, revela-se como de difícil diagnóstico em

incapacidade em sentir alegria ou satisfação,

pessoas idosas (Martins, 2008), devendo,

observando-se perturbações nas relações e

frequentemente segundo este autor, ser

atividades sociais, em domínios como o sexual

considerada presente quando houver

ou profissional, o que por sua vez contribui para

sintomatologia depressiva, dissociada de

a depressão decorrente da sensação de

causas orgânicas e quando os tratamentos

fracasso nessas áreas. Porém, há pacientes

clínicos não promovem melhorias da situação.

que não aparentam tristeza, veiculando os

A dificuldade de diagnóstico está relacionada

sintomas para perturbações somáticas, como

com reações normais às perdas físicas e

dores físicas, de cabeça, cansaço, perturbações

cognitivas que ocorrem com o envelhecimento

do apetite ou do sono, inibição ou problemas

(Conn, 2005; Giron et al., 2005; Mulsant &

dermatológicos, entre outros.

Ganguli, 1999; Salzman, 1999; Tierney, McPhee

As ideações suicidas são muito frequentes na

& Papadakis, 2003).

depressão grave e é relevante notar que as

A depressão varia a nível da severidade e

tentativas de suicídio são prevalentes em

duração, podendo mesmo tornar-se

indivíduos em tratamento, porque existe um

incapacitante, sendo geralmente recorrente e

retorno de energia e capacidade de agir que a

acompanhada por sintomatologia física e

pessoa não tem quando está em depressão

psicológica. Numa fase inicial de depressão o

profunda (Gleitman, 1999).

indivíduo apresenta sintomas típicos como:

Sabe-se que a depressão nas pessoas idosas é

humor triste constante, perturbações do sono,

uma perturbação que é sub-diagnosticada e por

perdas a nível do apetite, de peso

isso insuficientemente tratada (Demétrio, 2005;

(excecionalmente aumento), do interesse ou

Conn, 2005; Giron et al., 2005; Mulsant &

prazer pelas atividades comuns, ou ainda de

Ganguli, 1999; Salzman, 1999), estando

energia e consequente fadiga, pensamentos de

também relacionada com um risco severo de

autorrecriminação e culpa, perturbações de

suicídio (Conwell, 1997).

concentração e de tomada de decisões,

Tem-se verificado uma alta prevalência de

diminuição da libido e por vezes ansiedade,

depressões atípicas nas pessoas idosas, pelo

irritabilidade, agitação e/ou lentidão (APA, 2002;

que muitas vezes não se enquadram nos

Sabanés, 1994; Wilkinson, Moore & Moore,

critérios de classificação definidos por manuais

2003). Em casos de depressão grave podem

como o DSM-IV e o CID 10 (Cohen & Eisdorfer,

ainda ocorrer ideações suicidas, planos ou

1997 cit. por Martins, 2008).

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 30

Uma das características das depressões

idosas institucionalizadas, verificando-se um

atípicas é a “depressão sem tristeza” (Gallo,

maior risco de morbilidade e mortalidade

Rabins, Lyketsos, Tien, & Anthony, 1997), com

(Morley & Kraenzle, 1994; Parmelee, Katz, &

presença de apatia, perturbações percebidas a

Lawton, 1991, 1992; Rovner et al., 1991).

nível cognitivo, ansiedade, somatização e

Aranha (2004) salienta, na prevalência de

preocupação excessiva com o corpo (Martins,

doenças e mortalidade, o facto da pessoa idosa

2008); será também importante referir ainda a

não ter familiares próximos, pelo que é

associação entre a depressão e a demência,

presumível que pouco apoio social, ou de pouca

uma vez que estas se têm mostrado

qualidade, constitui um fator que afeta a saúde

frequentemente concomitantes, com quase um

da pessoa idosa (Hoolyman & Kiyak, 1997, cit.

terço de pacientes com demência a apresentar

por Rigo & Teixeira, 2005). Serra (1999)

depressão (Maynard, 2003).

considera o suporte social como a quantidade e

Vários estudos apresentam diversos valores de

coesão das relações sociais que envolvem de

predominância da depressão em pessoas

modo dinâmico um indivíduo e Saranson,

idosas, devido ao conceito de depressão

Levine, Basham e Saranson (1993) definem-no

adotado, em cada estudo e ao uso de diferentes

como “a existência ou disponibilidade de

métodos de avaliação (Kerber, Dyck, Culp &

pessoas em quem se pode confiar, pessoas que

Buckwalter, 2005); as percentagens referidas

nos mostram que se preocupam connosco, nos

variam entre 12.6% e 44% (Jones, Marcantonio

valorizam e gostam de nós”(p. 127).

& Rabinowitz, 2003; Rovner et al., 1991).

O suporte social pode ser descrito pelo tamanho

Mulsant e Ganguli (1999) revelam que a

da rede social, pela presença de relações

depressão atinge aproximadamente 15% dos

sociais, frequência de contacto com membros

idosos não institucionalizados, subindo para

da rede social, necessidade de apoio

30% a 40% em indivíduos com doença de

transmitida ou tipo e quantidade de apoio que o

A l z h e i m e r. O s v a l o r e s a p r e s e n t a d o s

indivíduo precisa e

predominam no sexo feminino, sendo duas

1990). Outros aspetos que caracterizam a rede

vezes superior aos homens; porém acredita-se

social de apoio são a extensão da utilização da

que a discrepância entre os sexos não seja tão

rede social, a dependência, os comportamentos

grande, uma vez que os homens tendem a

de reciprocidade, a proximidade/intimidade entre

mascarar a sintomatologia depressiva.

os membros e a satisfação com a rede em

Blazer (2003) indica que 4% das pessoas idosas

geral.

manifestam depressão major e 20%

O suporte social é particularmente importante

apresentam sintomatologia depressiva

para as pessoas idosas, sendo que é nesta

significativa; Costa (2005) refere 50% dos

população que frequentemente se verificam as

idosos institucionalizados com alguma forma de

maiores lacunas, pois existe uma elevada

sintomatologia depressiva. Assim, embora a

quantidade de pessoas idosas que vivem

depressão possa apresentar-se associada a

sozinhas ou em instituições, sem apoio familiar.

vários fatores decorrentes do envelhecimento, a

A rede social de suporte é considerada

sua prevalência parece agravar-se em pessoas

importante porque: “alivia o stress em situação

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

recebe (Dunst & Trivette,

Volume 2. Edição 3


Página 31

de crise, pode inibir o desenvolvimento de

constituem a rede social de apoio da pessoa

doenças e quando o indivíduo está doente tem

idosa institucionalizada) e variáveis

um papel positivo na recuperação da

sociodemográficas como a idade e habilitações

doença” (Rodin e Salovey, 1989, cit. por Santos,

literárias.

Ribeiro, & Lopes, 2003, p. 186). O indivíduo pode ter uma perceção alterada, positiva ou

Método

negativa, do suporte social que tem e daquele

Participantes

que efetivamente lhe é dado.

O grupo de participantes é composto por 25

Saranson, Saranson e Pierce (1990)

pessoas idosas, residentes num lar, com idades

discriminam o suporte social em três categorias:

compreendidas entre os 63 e os 93 anos, sendo

“1) o modelo de rede, que se focaliza na

a média etária de 80,84 anos. A maioria (84%) é

integração social dos indivíduos num grupo e

do sexo feminino, viúva (84%) e com baixa

nas inter-relações que mantêm; 2) o modelo de

escolaridade (52% não tem escolaridade e 44%

suporte recebido, que incide no que a pessoa

tem o 1º ciclo). A categoria profissional

recebe ou refere ter recebido e 3) o modelo de

predominante é referente ao grupo dos

suporte disponível, que diz respeito ao suporte

Agricultores e Trabalhadores Qualificados da

que a pessoa acha que está disponível, se ela

Agricultura e Pescas. A maioria (80%) dos

precisar. Por seu lado, Serra (1990) descreve

participantes tem filhos (60% têm entre 1 a 2

seis tipos de apoio social: afetivo, emocional,

filhos e os restantes 3 a 4 filhos) e está

percetivo, instrumental, informativo e através da

institucionalizada há menos de 4 anos (80%),

convivência.

verificando-se em 48% dos casos que esta é

Dunst & Trivette (1990) revelam que o suporte

recente (menos de 1 ano).

social pode ser formal (e.g. lares de idosos), ou

A maioria dos participantes sofre de doenças

informal (e.g. família, amigos). Na literatura,

crónicas (80%), sendo os problemas mais

encontram-se vários estudos relacionando o

frequentes os de ossos (24%), auditivos (20%),

suporte social e a saúde, como o de Demaray,

diabetes (16%) e os problemas de coração

Malecki, Davidson, Hodgson & Rebus (2005),

(12%).

Seiffge-Krenke (1995), e de Singer & Lord

Da totalidade, 88% referiu receber visitas,

(1984), que afirmam que o apoio social poderá

maioritariamente dos filhos ou outros familiares

ser um fator de proteção das perturbações

(64%) e amigos (20%); destes 50% recebem

causadas pelo stress. Neste sentido,

visitas semanalmente e 36,40%

considerando pertinente a associação entre o

quinzenalmente.

suporte social, depressão e institucionalização, propusemo-nos realizar um trabalho empírico, a

Instrumento

fim de averiguarmos, qual a incidência de

Foram utilizados questionários adaptados para a

depressão

idosas

população portuguesa, nomeadamente, a

institucionalizadas, tentando-se perceber e

Escala da Depressão Geriátrica de Yesavage et

relacionar esta variável com o suporte social

al. (1983) e o Questionário de Apoio Social

(grau de satisfação e número de pessoas que

(SSQ-R), Versão Reduzida (SSQ6) de Moreira

em

pessoas

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 32

et al. (2002), versão portuguesa do "Social

minutos, tendo os instrumentos sido

Support Questionnaire" de Saranson, Levine e

apresentados sempre na mesma ordem,

Basham (1983).

primeiro o GDS e seguidamente o SSQ-6.

A Escala de Depressão Geriátrica (GDS) é muito utilizada como instrumento de diagnóstico

Resultados

de depressão em pessoas idosas. Apresenta 30

Tratamento Estatístico dos Dados

itens, sendo cotada de forma dicotómica (Sim/

O tratamento de dados foi efetuado através do

Não), atribuindo-se um ponto para cada

software PASW Statistics 18. Recorreu-se ao

resposta compatível com depressão. O score

teste exato de Fisher, para cruzar um conjunto

final determina a severidade da depressão do

de variáveis com os níveis de depressão (3

indivíduo: 0 a 10 pontos indica inexistência de

níveis: ausência de depressão, depressão

depressão evidente; 11 a 20 pontos depressão

ligeira e grave). As variáveis não dicotómicas

moderada e dos 21 aos 30 pontos depressão

foram reagrupadas no sentido de se organizar 2

severa.

grupos (ex. na idade, foi calculada a mediana e

O Questionário de Apoio Social (SSQ6), inclui

criados dois grupos a partir desse valor),

apenas seis questões, permitindo contudo

obtendo-se assim tabelas de contingência.

avaliar duas dimensões de apoio social

Recorreu-se ainda ao coeficiente de correlação

percebido: o número de pessoas disponíveis

não paramétrico de Spearman para

para darem apoio (SSQ-N) e a satisfação com

correlacionar o score total de depressão, com o

esse apoio (SSQ-S). Em cada questão pede-se

score total de satisfação com o suporte social.

a indicação do número de fontes de suporte

Usou-se ainda este coeficiente, para relacionar

social percebido (podendo-se obter um número

a satisfação com o suporte social, com o

mínimo de 0 – correspondente a nenhum

número de pessoas da rede de apoio.

- e

máximo de nove) e seguidamente a avaliação da satisfação com esse suporte, podendo esta variar em seis pontos de uma escala tipo Likert

GDS – Escala de Depressão Geriátrica

(de “Muito Satisfeito” a “Muito Insatisfeito”).

Os scores obtidos na GDS variam entre os 4 e os 25, sendo a média de 14,68 e o desvio

Procedimento

padrão de 6,5. Os dados revelam que apenas

Após se obter a autorização da coordenadora

28% dos participantes não apresentam

técnica, de um lar, para o desenvolvimento do

depressão; dos restantes, 48% revelam

estudo, foram selecionados os utentes aptos a

depressão ligeira e 24% uma depressão grave.

participar, sendo excluídos os que manifestavam

Efetuou-se uma análise de frequências aos itens

problemáticas neurológicas, como a Doença de

com

Alzheimer.

seguidamente, exposta, na tabela 1 e 2.

respostas

sim

e

não,

A recolha dos dados foi realizada no gabinete

Os resultados obtidos com a GDS revelam que

médico da instituição, individualmente, com

muitos dos participantes, se sentem muitas

cada utente e sem interrupções. A aplicação dos

vezes com vontade de chorar (84%),

questionários teve uma duração média de 20

aborrecidos (80%), inquietos ou nervosos

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 33

(72%), afligem-se muitas vezes com pequenas

tensão e pressão, as respostas mais frequentes

coisas (72%), colocaram de lado muitas das

foram "ninguém" (28%) e os auxiliares do lar

atividades e interesses (68%) e têm dificuldade

(24%), verificando-se percentagens algo

em começar novas atividades, preferindo ficar

idênticas nestes itens, em repostas à questão

no lar, em vez de sair e fazer coisas novas

relativa às pessoas com quem podem contar

(68%). Muitos dos participantes responderam

para os consolar: "ninguém" (32%), filhos (28%)

ainda preocuparem-se muitas vezes com o

e auxiliares do lar (28%).

futuro (68%), sentirem-se muitas vezes

A esmagadora maioria dos participantes refere

desamparados (64%), desanimados e abatidos

algum familiar (tabela 3), como a pessoa com

(60%) ou inúteis (56%).

quem podem contar quando precisam de ajuda

Por outro lado, embora a maioria dos inquiridos

(76% - Q1), ou para se preocuparem com eles

respondesse não ter facilidade em tomar

(76% - Q4), o mesmo não acontecendo noutros

decisões (56%,), nem ter esperança no futuro

aspetos, nomeadamente nas questões “com

(52%), foram poucos os participantes que

quem podem contar para se sentirem relaxados

responderam não gostarem de estar vivos ou

(Q 2), melhor quando estão em baixo (Q 5),

de se levantarem de manhã (12%), ou ainda,

para os consolar quando estão muito

não estarem bem-dispostos a maior parte do

preocupados (Q 6) e para “os aceitar como

tempo (20%).

são” (Q3) , onde se verifica que a percentagem de referência a um familiar é substancialmente

Questionário de Apoio Social

mais baixa (inferior a 50%); como foi acima

As respostas ao questionário de apoio social,

referido, nalgumas destas questões

revelam que 48% dos participantes, referiram

relativas ao apoio para se sentirem relaxados ou

que as pessoas com quem realmente podem

serem consolados, quando estão preocupados),

contar quando precisam de ajuda são os filhos;

há uma grande percentagem a referir não ter

as outras respostas com maior frequência

ninguém para esse tipo de apoio (28% a 32%)

incidiram nos amigos (28%) e irmãos (20%). A

ou a referir as auxiliares do lar (24% a 32%).

maioria dos inquiridos (60%) refere também os

Relativamente ao grau de satisfação com o

filhos, como as pessoas com quem

apoio recebido, nas questões 1 e 3 todos os

podem contar para se preocuparem com eles,

participantes revelaram satisfação (satisfeitos ou

para se sentirem melhor quando estão em baixo

muito satisfeitos), na 2 (relativa a com quem

(nesta questão, 24% dos utentes mencionam os

podem contar para se sentirem relaxados) dois

filhos, 20% ninguém, 16% os amigos e 12% os

participantes (8%) revelaram insatisfação e nas

auxiliares do lar) ou ainda as pessoas que os

questões 4, 5 e 6, apenas 1 participante (4%)

aceitam totalmente (os filhos obtêm, neste item,

mostrou descontentamento; a maioria dos

32% das respostas, os amigos 24% e outros

participantes (56%) refere 1 a 2 pessoas na sua

utentes 20%).

rede de apoio, 40% mais do que duas pessoas

Por outro lado, no que concerne às pessoas

(as

e apenas um inquirido indica não ter ninguém.

que os utentes referem como importantes para se sentirem mais relaxados em situações de JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 34

apresentando doenças crónicas, sendo a Relação entre a Depressão, Suporte Social e

maioria do género feminino, viúvas, refletindo a

Variáveis Sociodemográficas

já esperada superioridade feminina (Netto,

O teste de Fisher (tabela 4) revelou a existência

2000). Caracterizam-se também por terem

de uma relação significativa entre a idade e a

filhos, possuírem baixa escolaridade e

depressão (p≤0,05); existem mais casos de

profissões na área da agricultura e pesca, dado

depressão grave, no grupo de pessoas idosas

a instituição se situar numa zona rural

com mais de 84 anos e de ausência de

piscatória.

depressão no grupo com idade até 84 anos. O

Constatou-se a prevalência de uma depressão

mesmo teste aplicado à relação

ligeira em grande parte dos casos (48%), o que

entre as habilitações literárias e a depressão

revela concordância com os resultados obtidos

revelou a existência de uma relação significativa

noutros estudos, como os de Weyerer, Hafner,

entre as habilitações e a depressão uma vez

Mann, Ames e Graham (1995) no Reino Unido e

que p≤0,05, constatando-se mais casos de

de Brodaty et al. (2001) na Austrália, que

depressão grave, no grupo não escolarizado e

referem índices de 48% e 42%, respetivamente.

de ausência de depressão no grupo

Martins (2008) afirma que o envelhecimento por

escolarizado.

si só propicia o aumento da sensibilidade

O teste de Fisher foi aplicado de igual forma

afetiva, devido a alterações neurológicas e

para testar a correlação entre a depressão e

fisiológicas, a que se associam fatores de

variáveis como o número de pessoas da rede de

exclusão social, que também contribuem para

apoio, tendo-se obtido

um p> 0,05, ou seja,

aumentar a probabilidade de desenvolvimento

uma relação estatisticamente não significativas

de um processo depressivo, na pessoa idosa. A

entre esta variável e a depressão.

mesma autora, após a análise de vários

Relativamente à correlação entre a satisfação

estudos, salienta que a percentagem de

com o apoio social e a depressão utilizou-se a

pessoas idosas com perturbações depressivas é

correlação não paramétrica de Spearman,

elevada, agravando-se estes valores nas que

obtendo-se uma correlação significativa,

residem em lares, pois a institucionalização

negativa moderada de - .46, p = .02≤ 0,05 entre

poder ser vivenciada, como stressante, podendo

a satisfação e o total da depressão: quanto

contribuir, segundo autores como Vieira (996)

maior a satisfação com o apoio social menor o

para o desenvolvimento de depressões, dado

score na escala de depressão.

que a pessoa idosa começa a experienciar alterações no seu meio social, tendo de adotar

Discussão

um novo estilo de vida; Beekman et al. (1995) e

Considerando estudos de autores como Marinho

Osborn et al. (2003), evidenciam, por outro

(2010), Martins (2008) e Papadopoulos (2005),

lado, a influência das doenças crónicas no

o grupo de participantes apresenta

estado de saúde mental da pessoa idosa, o que

características muito comuns à generalidade

nos remete para

das pessoas idosas institucionalizadas: pessoas

inquiridos

com uma média de idade de 80,84 anos,

crónicas, podendo estas constituir um fator que

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

o facto da maioria dos

deste estudo possuírem doenças

Volume 2. Edição 3


Página 35

poderá contribuir para a elevada percentagem

nível de instrução, à prevalência de depressão

de participantes, com depressão.

na população idosa (Chou & Chi, 2005;

Os resultados obtidos na análise das

Papadopoulos et al. 2005).

frequências dos itens da GDS, com cotação

Embora os testes realizados no nosso estudo,

“sim”, revelam, de acordo com Cohen e

não tenham denotado uma relação significativa,

Eisdorfer (1997) alguns dos sintomas de uma

entre a depressão e o número de pessoas da

depressão atípica (e.g. apatia, queixas

rede de apoio, existem autores como Irigaray e

subjetivas de comprometimento cognitivo,

Schneider (2007), Jefferson e Greist (1997) cit.

ansiedade, somatização, excesso de

Irigaray e Schneider (2007), Papalia et al.

preocupação). Estes autores referem que a

(2006), que acreditam que a composição da

institucionalização contribui para alguns dos

rede social da pessoa idosa e o tipo de relações

sintomas, que surgem nas pessoas idosas,

estabelecidas, ajudam a minimizar e a enfrentar

como a falta de vontade em realizar atividades

a depressão. No entanto, como defende

de seu interesse, a dificuldade em começar

Goldstein (1998), citado em Resende et al.

novas atividades e a preferência por não sair da

(2006), o mais importante na rede social de

instituição.

apoio não é o número de elementos, mas sim a

Relativamente às frequências obtidas nos itens

qualidade das relações; a manutenção do

da GDS com cotação de 1 para “não”, são de

contacto com o mundo existente fora da

salientar as respostas concernentes à

instituição, pode revelar-se

capacidade de decisão que se mostrou

pessoa idosa.

negativa. Martins (2008) salienta que a

A rede social de apoio destes participantes, é

satisfação das necessidades da pessoa idosa

constituída maioritariamente por cuidadores

institucionalizada é escrupulosamente planeada,

formais (as funcionárias da instituição

limitando-se o seu poder de decisão e de

acolhedora) e pelos familiares mais próximos,

influência institucional. Deste modo, a falta de

nomeadamente, os filhos. De acordo com os

decisão poderá ser condicionada pelo ambiente

seis tipos de apoio social defendido por Serra

institucional, embora possa também resultar de

(1999), infere-se que as auxiliares do lar e os

outros fatores associados a doença.

familiares desempenham um papel de grande

Verificou-se que as pessoas idosas mais velhas

relevância no domínio do apoio afetivo,

(mais de 84 anos), apresentam mais casos de

auxiliando a pessoa idosa institucionalizada

depressão grave, o que é congruente com o que

sempre que necessita de ajuda ou revelando

defende Bergdahal et al. (2005), que refere a

preocupação com o seu bem-estar, o que pode

existência de uma associação entre os sintomas

contribuir para o desenvolvimento de um

depressivos e o aumento da idade. Por outro

sentimento de pertença; os familiares, poderão

lado, a existência de mais casos de depressão

ainda fornecer apoio instrumental,

grave, no grupo dos participantes não

nomeadamente financeiro.

escolarizados e sua ausência

no grupo

Os participantes encontram-se maioritariamente

escolarizado, coaduna-se com os resultados

satisfeitos com o apoio recebido, verificando-se

obtidos noutras investigações, que associam o

uma correlação, significativa, entre o índice de

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

positiva para a

Volume 2. Edição 3


Página 36

depressão e o grau de satisfação com a sua

período; outros possíveis trabalhos nesta área,

rede social, ou seja, observa-se que quanto

poderiam comparar pessoas idosas

maior é a satisfação com a rede social, menor o

institucionalizadas e não institucionalizados,

score na escala de depressão. Assim, a

procurar conhecer a opinião das famílias, de

satisfação da pessoa idosa institucionalizada,

cuidadores informais e formais, nomeadamente

com a rede de suporte social, pode ter um papel

as auxiliares dos lares. Considerando

preponderante no sentido de evitar ou atenuar o

o exponencial aumento da população idosa em

desenvolvimento de sintomas depressivos

todo o mundo, pensamos ser

(Marinho, 2010).

incrementar a investigação nesta área, de forma

fundamental

Este trabalho apresenta limitações de ordem

a garantir melhores condições de vida às

metodológica, pelo reduzido número de

populações idosas, em situação de

participantes e processo de amostragem de

institucionalização.

conveniência, associado a um

não

balanceamento de características, como o

Referências Bibliográficas

género sexual; estes factos traduzem-se na pouca representatividade da amostra e

APA - American Psychiatric Association (2002).

impossibilita a extrapolação e generalização dos

DSM-IV-TR. (4ª ed.). Lisboa: Climepsi Editores.

resultados à população em geral. Por outro lado, verificou-se ser necessário relembrar, ao longo

A r a n h a , V. C . ( 2 0 0 4 M a r ç o / A b r i l ) .

da aplicação dos questionários, por diversas

Envelhecimento e saúde: aspectos psicológicos.

vezes, a confidencialidade das respostas, dado

Revista Racine, São Paulo, 14, 50-58.

o fator desejabilidade social, associado à dependência dos participantes de terceiros

Baltes, P. B. & Smith, J. (1997). A systemic-

(tornou-se evidente a preocupação dos

holistic view of psychological functioning in very

inquiridos, relativamente à possibilidade

old age: Introduction to a collection of articles

da Coordenadora Técnica da instituição

from the Berlin Aging Study. Psychology and

conhecer os resultados, ou mesmo a Segurança

Aging,

Social).

10.1037/0882-7974.12.3.395

12(3),

395-409.

doi:

Para complementar os resultados obtidos neste trabalho, seria importante desenvolverem-se

Barroso, V. L & Tapadinhas, A. R. (2006). Orfãos

estudos, com grupos de maior dimensão e igual

Geriatras: Sentimentos de solidão e

número de participantes de cada género sexual,

depressividade face ao envelhecimento –

de forma a tornar possível averiguar possíveis

Estudo comparativo entre idosos

diferenças relativas a esta variável. Seria

institucionalizados e não institucionalizados.

também pertinente realizarem-se estudos

Psicologia.pt - O Portal dos Psicólogos. Retirado

longitudinais, a fim de se obter uma melhor

em 15 de Julho de 2009, de http://

compreensão sobre a influência do tempo de

w w w. p s i c o l o g i a . c o m . p t / a r t i g o s / t e x t o s /

institucionalização na depressão, ou sua

TL0091.pdf.

estabilidade ou mudança/evolução durante esse JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 37

Beekman, A. T., Deeg, D. J., van Tilburg, T.,

Gerontologia: Viver para Sempre. Odivelas:

Nordstrom, M., Mapletoft, E., & Miles, T. (1995).

CIDAE.

Major and minor depression in later life: a study of prevelance and risk factors. Journal of

Chou, K., & Chi, I. (2005). Prevalence and

Affective Disorders, 36(1), 65-75. doi:

correlates of depression in Chinese oldest-old.

10.1016/0165-0327(95)00061-5

International Journal of Geriatric Psychiatric, 20(1), 41-50. doi: 10.1002/gps.1246

Bergdahal, E., Gustavsson, J., Kallin K., Wagert, P., Lundman, B., Bucht, G., & Gustafson Y.

Cohen, D. & Eisdorfer, C. (1997). Depressão. In

(2005). Depression among the oldest old: the

E. Calkins, A. B. Ford e P. R. Katz (1997).

Umea 85 + study. International Psychogeriatric

Geriatria prática (pp. 301-311). Rio de Janeiro:

Association, 17(4), 557-575. doi: 10.1017/

Revinter.

S1041610205002267 Conn DK. 2005. Collaborative care depression Black, B., Rabins, P., German, P., McGuire, M.,

management for older adults: level of

& Roca, R. (1997). Need and unmet need for

comorbidity does not affect outcome. Evidence-

mental health care among elderly public housing

Based Mental Health, 8(4), 105. doi:10.1136/

residents. The Gerontologist, 37(6), 717-728.

ebmh.8.4.105

doi: 10.1093/geront/37.6.717 Conwell, Y. (1997). Management of suicidal Blazer, D. G. (2003). Depression in late life:

behavior in the elderly. Psychiatric Clinics of

R e v i e w a n d c o m m e n t a r y. J o u r n a l s o f

North America, 20(3), 667-83. doi: 10.1016/

Gerontology. Series A, Biological Sciences and

S0193-953X(05)70336-1

Medical Sciences, 58(3), M249-M265. doi: 10.1093/gerona/58.3.M249.

Costa, A. (2005). A depressão nas pessoas idosas portugueses. In C. Paúl & A. Fonseca

Brodaty, H., Draper, B., Saab, D., Low, L.,

(Eds.), Envelhecer em Portugal: Psicologia,

Richards, V., Paton, H., et. Al. (2001).

saúde e prestação de cuidados (pp. 159-176).

Psychosis, depression and behavioural

Lisboa: Climepsi.

disturbances in Sydney nursing home residents: prevalence and predictors. International Journal

Cristovão, M. R. (1997). Percepção do

of Geriatric Psychiatry, 16(5), 504-512. doi:

Enfermeiro no Cuidado ao Idoso. Dissertação de

10.1002/gps.382

Mestrado. Lisboa: Universidade Católica.

Carvalho, M. (2006). Orientações da Politica de

Demaray, M. K., Malecki, C. K., Davidson, L. M.,

Cuidados às Pessoas Idosas e Dependentes.

Hodgson, K. K. & Rebus, P. J. (2005). The

Modelo de Cuidados em Portugal e nalguns

relationship between social support and student

países Europeus. I Congresso Internacioal de

adjustment: A longitudinal analysis. Psychology

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 38

in the Schools, 42(7), 691-706. doi: 10.1002/pits.

Idade. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do

20120

Sul, 29(1), 19-27. doi: 19-27. 10.1590/ S0101-81082007000100008

Demétrio, F. T. (2005). Depressão e doenças clínicas. SNC em foco, 1 (Suppl 1), pp. 12-9.

Jones, R. N., Marcantonio, E. R. & Rabinowitz, T. (2003). Prevalence and correlates of

Dunst, C., & Trivette, C. (1990). Assessment of

recognized depression in U.S. nursing homes.

social support in early intervention programs. In

Journal of the American Geriatrics Society,

S. Meisels, & J. Shonkoff (Eds.), Handbook of

51(10), 1404-1409. doi: 10.1046/j.

early childhood intervention (pp. 326-349). New

1532-5415.2003.51458.x

York: Cambridge University Press. K a s k i e , B . , G r e g o r y, D . & G i l d e r, R . Gallo, J. J., Rabins, P. V., Lyketsos, C. G., Tien,

(2009).Community Mental Health Service Use

A. Y., & Anthony, J. C. (1997, Maio). Depression

by Older Adults with Dementia. Psychological

without sadness: Functional outcomes of

Services,6(1), 56–67. doi: 10.1037/a0014438

nondysphoric depression in later life. Journal of the American Geriatrics Society, 45(5), 570-578.

Kerber, C. S., Dyck, M. J., Culp, K. C. & Buckwalter, K. (2005). Comparing the Geriatric

Giron, M. S. T., Fastbom, J., & Winblad, B.

Depression Scale, Minimum Data Set, and

(2005). Clinical trials of potential

Primary Care Provider Diagnosis for Depression

antidepressants: to what extent are the elderly

in Rural Nursing Home Residents. American

represented: a review. International Journal of

Psychiatric Nurses Association, 11(5), 269-275.

Geriatric Psychiatry, 20(3), 201-207. doi:

doi: 10.1177/1078390305281345

10.1002/gps.1273 Marinho, S. (2010). O suporte social e a Gleitman, H. (1999). Psicologia (4ª ed.). Lisboa:

depressão no idoso. Porto: Universidade

Fundação Calouste Gulbenkian.

Fernando Pessoa. Faculdade de Ciências Humanas e Sociais.

Hye-cheon, K., Bursac, K., Bursac, Z., DiLillo, V., White, D. & West, D. (2009). Brief report: Stress,

Martins, R. (2008, Abril). A Depressão no Idoso.

Race, and Body Weight. Health Psychology,

Revista Millenium, 34, 119-123. Retirado em 15

28(1), 131–135. doi: 10.1037/a0012648

de Julho de 2009, de http://hdl.handle.net/ 10400.19/364

INE - Instituto Nacional de Estatística. (2007). Dia Internacional do Idoso. Lisboa: INE.

Martínez, J. L. (2005). Entrenamiento En Manejo del Estrés en Cuidadores de Familiares Mayores

Irigaray, T., & Scheneider, R., (2007).

Dependientes: Desarrollo Y Evaluación de la

Prevalência de depressão em idosas

Eficacia De Un Programa. Universidad

participantes da Universidade para a Terceira

Complutense de Madrid: Madrid.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 39

A. (2003). Factors associated with depression in Maynard, C. K. (2003, Março). Differentiate

a representative sample of 14217 people aged

depression from dementia. The Nurse

75 and over in the United Kingdom: results from

Practitioner, 28(3), 18-27.

the MRC trial of assessment and management of older people in the community. International

Moreira, J. M., Andrez, M., Moleiro, C., Silva, M.

Journal of Geriartric Psychiatry, 18(7), 623-630.

F., Aguiar, P., & Bernardes, S. (2002).

doi: 10.1002/gps.896

Q u e s t i o n á r i o d e A p o i o S o c i a l ( Ve r s ã o Portuguesa do "Social Support Questionnaire"):

Papadopoulos, F., Petridou, S., Argyropoulou,

Tradução e estudos de validade. Revista

V., Kontaxakis, V., Dessypris, N., Anastasiou A.,

Iberoamericana de Diagnóstico y Evaluación

… Lyketsos, C. (2005). Prevalence and

Psicológica, 13, 55-70. Retirado em 15 de Julho

correlates of depression in late life: a population

de 2009, de http://www.aidep.org/03_ridep/

based study from rural Greek town. International

2_volumen13.html

Journal of Geriatric Psychiatry, 20 (4), 350-357. doi: 10.1002/gps.1288

Morley, J. E. & Kraenzle, D. (1994, Junho). Causes of weight loss in a community nursing

Papalia, D. E., Olds, S. W., & Feldman, R. D.

home. Journal of the American Geriatrics

(2006). Desenvolvimento humano. Porto Alegre:

Society, 42(6) 583-585.

Artmed.

Mulsant, B. H. & Ganguli, M. (1999).

Parmelee, P. A., Katz, I. R., & Lawton, M. P.

Epidemiology and diagnosis of depression in

(1991). The relation of pain to depression among

late life. The Journal of clinical psychiatry

institutionalized aged. Journal of Gerontology,

60(Suppl 20), 9-15. Retirado em 15 de Julho de

46(1), 15-21. doi: 10.1093/geronj/46.1.P15

2009, de http://focus.psychiatryonline.org/ article.aspx?articleid=52787#Abstract

Parmelee, P. A., Katz, I. R., & Lawton, M. P. (1992). Depression and mortality among

Netto, M. (2000). Gerontologia: A velhice e o

institutionalized aged. Journal of Gerontology,

envelhecimento em visão globalizada. São

47(1), 3-10. doi: 10.1093/geronj/47.1.P3

Paulo: Editora Atheneu. Pimentel, L. (2001). O Lugar do Idoso na Oliveira, S., Freire, S. & Giaretta, V. (1999).

Família: Contextos e Trajectórias. Coimbra:

Análise da depressão em idosas

Quarteto.

institucionalizadas. XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica. São Paulo:

Rabins, P., Black, B., German, P., Roca, R.,

Universidade do Vale do Paraíba.

McGuire,M., Brant, L., & Cook, J. (1996). The prevalence of psychiatric disorder in elderly

Osborn, D. P. J., Fletcher, A. E., Smeeth, L.,

residents of public housing. Journals of

Stirling, S., Bulpitt, C. J., Breeze, E.,… Tulloch,

Gerontology, Series A– Biological Sciences &

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 40

Medical Sciences, 51A(6), 319-324. doi:

Retirado em 15 de Julho de 2009, de http://

10.1093/gerona/51A.6.M319

www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/10513856

Resende, M., Bones, V., Souza, I., e Guimarães,

Santos, C. S., Pais Ribeiro, J. & Lopes, C.

N., (2006, Fevereiro). Rede de relações sociais

(2003). Estudo de adaptação de escala de

e satisfação com a vida de adultos e idosos.

satisfação com o suporte social (ESSS) a

Psicologia América Latina, Nº5.

pessoas com o diagnóstico de doença oncológica. Psicologia, Saúde & Doenças, 4(2),

Ribeirinho, C. (2005). Concepções e Práticas de

185-204. Retirado em 15 de Julho de 2009, de

Intervenção Social em Cuidados Sociais no

http://www.scielo.oces.mctes.pt/pdf/psd/v4n2/

Domicílio. Dissertação de Mestrado. Lisboa:

v4n2a02.pdf

Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa. Saranson, I. G., Levine, H., Basham, R. & Rigo, Mª L. N. R. & Teixeira, D. C. (2005).

Saranson, B. R. (1983). Assessing social

Efeitos da atividade física na percepção de bem-

support: the social support questionnaire.

estar de idosas que residem sozinhas e

Journal of Personality and Social Psychology,

acompanhadas. UNOPAR Cientifíca. Ciências

44(1),

biológicas e da saúde, 7(1), 13-20. Retirado em

0022-3514/83/4401-0127500.75

127-139.

doi:

15 de Julho de 2009, de http://sumarios.org/ s i t e s / d e f a u l t / f i l e s / p d f s /

Saranson, B. R., Saranson, I. G., & Pierce, G. R.

efeitos_da_atividade_fisica_na_percepcao_de_

(1990). Social support: an interactional view.

b

New York: Wiley.

e

m

-

estar_de_idosas_que_residem_sozinhas_e_aco mpanhadas.pdf

Segal, D. L. (2005). Relationships of Assertiveness, Depression, and Social Support

Rovner, B. W., German, P. S., Brant, L. J., Clark,

Among Older Nursing Home Residents.

R., Burton, L., & Folstein,M.F. (1991).Depression

Behavior Modification, 29(4), 689-95. doi:

and mortality in nursing homes. Journal of the

10.1177/0145445503259391

American Medical Association, 265(8), 993-996. doi:10.1001/jama.1991.03460080063033

Seiffge-Krenke, I. (1995). Stress, coping, and relationships in Adolescence. Mahwah, NJ:

Sabanés, F. (1994). A Depressão. Lisboa: Lello

Lawrence Erlbaum Associates.

& Irmão Editores. Serra, A. V. (1999). O Stress na Vida de Todos Salzman C. (1999). Practical considerations for

os Dias. Coimbra: Edição do Autor

the treatment of depression in elderly and very elderly long term care patients. Journal of

Singer, J. E., & Lord, D. (1984). The role of

Clinical Psychiatry; 60(Suppl 20), 30-33.

social support in coping with chronic or lifethreatning illness. In A. Baum, S. Taylor, & J.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 41

Singer (Eds.), Handbook of psychology and health (Vol. IV, pp. 269-278). New Jersey: Laurence Erlbaum Associates, Inc., Publishers. Slepoj, V. (2000). As relações de família. Lisboa: Editorial Presença. Sousa, L., Figueiredo, D. & Cerqueira, M. (2004). Envelhecer em família. Porto: Âmbar. Tierney, L. M., McPhee, S. J., & Papadakis, M.A. (2003). Current Medical Diagnosis & Treatment (42ª ed.). New York: Lange Medical Books/ McGraw-Hill. Vieira, E.B. (2003). Instituições geriátricas: avanço ou retrocesso (1ª ed.). Rio de Janeiro: Revinter. Wilkinson, G., Moore, B. & Moore, P. (2003). Tratar a Depressão. Lisboa: Climepsi Editores. Yesavage, J., Brink, T., Rose, T., Lum, O., Huang, V., Adey, M., & Leirer V. O. (1983). Development and validation of a geriatric depression screening scale: a preliminary report. Journal of Psychiatric Research, 17(1), 37-49. doi: 0022.3956/83/010037 Weyerer, S., Hafner, H., Mann, A., Ames, D., & Graham, N. (1995). Prevalence and course of depression among elderly residential home admissions in Mannheim and Camden, London. International psichogeriatrics, 7(4), 479-493. Retirado em 15 de Julho de 2009, de http:// www.ipaonline.org/ipaonlinev3/publications/ archive/7_4toc.asp#Prevalence%20and %20Course%20of

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Gama, M. (2013) Expectations of Filial Responsability and Guidance od Responsability in Care for the Elderly. Journal of Aging & Inovation, 2 (3): 42-62

ESTUDO DE CASO / CASE STUDY

JULHO, 2013

EXPECTATIVAS DE RESPONSABILIDADE FILIAL E ORIENTAÇÃO DA RESPONSABILIDADE NO CUIDADO AOS IDOSOS EXPECTATIONS OF FILIAL RESPONSABILITY AND GUIDANCE OF RESPONSABILITY IN CARE FOR THE ELDERLY EXPECTATIVAS DE RESPONSABILIDAD FILIAL Y LA ORIENTACIÓN DE LA RESPONSABILIDAD EN EL CUIDADO DE LOS ANCIANOS

Autora Marta Gama1 1

Enfermeira no Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE

Corresponding Author: gama.mm@gmail.com RESUMO: Muitos desenvolvimentos demográficos e estruturais ocorreram nas relações intergeracionais, os quais provocaram um impacto nas ligações familiares, tais como o aumento da longevidade e as alterações da dinâmica estrutural e social da família, tendo sido colocado em causa a vitalidade das obrigações familiares e solidariedade familiar, nomeadamente entre pais e filhos adultos. Assim, com este estudo pretendeu-se verificar a presença de solidariedade entre pais e os seus filhos adultos, assim como as expectativas de responsabilidade filial dos pais e as suas opiniões e preferências no que se refere à orientação da responsabilidade para família/ serviços públicos no cuidado aos idosos. De forma a alcançar os objectivos, foi aplicado um questionário a 97 alunos, da Universidade Sénior da Póvoa de Santa Iria, com 55 ou mais anos e que tivessem pelo menos um filho adulto. Foi possível chegar à conclusão de que existe solidariedade entre pais e filhos adultos, assim como os pais consideram que existe uma responsabilidade mista (família/Estado) no cuidado aos idosos e que preferem os apoios formais em detrimento dos informais (familiares) – contrariando a orientação familística. Contudo, apesar disso continuam a apresentar expectativas elevadas em relação à responsabilidade que os filhos devem ter para com os pais, nomeadamente a nível da dimensão de apoio emocional, sendo a dimensão de apoio instrumental a excepção. Desta forma, é possível concluir que há uma tendência por parte da população inquirida em preferir a complementaridade de apoios formais e informais, com consequente especialização de tarefas: instrumental e emocional, respectivamente. Palavras-chave: Solidariedade familiar; normas filiais; preferências no cuidado; familismo; responsabilidade dos serviços públicos. Abstract: Intergenerational relations have been affected by demographical and structural changes that had impact on family relationships. The increase in life expectancy and the changes in the families’ structural and social dynamics have put at risk the vitality of family obligations and solidarity, namely between parents and adult children. Therefore, this research aimed at studying the existence of solidarity between parents and adult children as well as the parents’ expectations towards their children’s responsibilities and their views and preferences on family and welfare state responsibility as far as elderly people are concerned. In order to achieve this, a questionnaire was devised and subsequently applied to 97 participants attending the Universidade Sénior in Póvoa de Santa Iria, aged 55 or older, with at least one adult child. The results indicate that there is solidarity between parents and adult children and that parents consider that both the family and the state should share the responsibility towards elderly people. Moreover, the study proves that formal support is preferred to the detriment of an informal one (family), which contradicts the familistic approach. However, parents evince high expectations as far as children responsibility towards them is concerned, specially in terms of emotional support. This does not apply, however, to the instrumental support domain. In conclusion, the study indicates that the participants tend to prefer the complementariness of formal and informal support with subsequent task specialisation: instrumental and emotional, respectively. Keywords: Family solidarity; filial norms; care preferences; familism; welfare state responsibility.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 43

Introdução

vitalidade das obrigações familiares e à força

O envelhecimento da população é um fenómeno

das ligações familiares.

progressivo que se prevê, através dos estudos

A imagem transmitida pelos media sobre as

demográficos, que vá continuar e,

relações entre as gerações, a qual reflecte a

inclusivamente aumentar. Este dado coloca

opinião pública, está associada à separação

exigências e desafios a nível económico, social,

entre os membros, no que diz respeito aos

de investigação e de intervenção. Em paralelo

jovens, encarados como individualistas flexíveis

ao processo de envelhecimento da sociedade,

que mudam de trabalho frequentemente, o que

também é possível verificar alterações nas

faz com que estes se afastem cada vez mais

estruturas familiares, nas ligações sociais e no

dos seus pais. Desta maneira, segundo esta

modo de viver da população idosa.

ideia, os filhos nem têm tempo ou vontade para

A orientação da vida social da família e o valor

estar com os seus pais (Szydlik, 2008). Tendo

ligado à sociabilidade fazem desta o principal

em conta estas perspectivas, é sugerido que

ponto de referência do processo do

com o aumento da população idosa a viver só e

envelhecimento, sendo que as necessidades

os seus filhos a residirem em diferentes cidades,

dos idosos são melhor entendidas dentro do

acabe por haver um risco de isolamento social a

contexto da família. De facto, a família é uma

partir do momento em que os filhos se afastam

célula fundamental, enquanto lugar privilegiado

e abandonam as suas obrigações sociais e o

de trocas intergeracionais. É aí que as gerações

seu compromisso para com os seus pais idosos,

se encontram, se interajudam e completam de

confiando no Estado. Embora a orientação

forma intensa.

individual para o ‘Estado’ ou para a ‘família’

Ao longo dos últimos dois séculos, drásticas

como prestadores de apoio estar intimamente

alterações ocorreram na natureza e força das

relacionada com a cultura, as preferências

ligações familiares. Nos dia de hoje, torna-se

individuais e normas (se existir uma opção

uma prioridade das necessidades individuais o

disponível) também vão variar (Motel-Klingebiel,

comprometimento para com a sobrevivência e o

Tesch-Roemer e Kondratowitz, 2005).

bem-estar económico da família. A orientação

Estas afirmações baseadas no fim da família

instrumental relativamente à família tem sido

extensa de outrora, foram no entanto

gradualmente substituída por uma orientação

prematuras. Estudos de relações familiares

mais individualista e afectiva, dando-se uma

intergeracionais revelaram que os filhos adultos

enorme ênfase às necessidades individuais e

não estavam isolados dos seus pais, pois não

felicidade pessoal. Este desenvolvimento

só mantinham contacto frequente com estes,

levantou preocupações no que diz respeito à

assim como existia uma troca de inter-ajudas,

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 44

mesmo quando estavam separados por longas

responsabilização familiar no cuidado aos

distâncias geográficas (Lowenstein e Ogg, 2003;

idosos e das preferências pelo apoio familiar em

Dykstra, 2006; Szydlik, 2008). Também

detrimento do apoio formal;

Bengtson (2000 in Lowenstein e Ogg, 2003) refere que os sociologistas familiares têm

A centralidade deste tema relaciona-se com a

comprovado empiricamente que a família

importância de conhecermos as bases de

contemporânea mantém coesão familiar

solidariedade familiar intergeracional,

intergeracional, não se verificando uma

estabelecidas entre pais e filhos, na vida adulta,

substituição do apoio familiar pelos serviços

assim como conhecer as crenças normativas,

públicos, mas antes um encorajamento

expectativas e preferências dos pais (indivíduos

daqueles por parte destes (Lowenstein e Ogg,

com 55 ou mais anos). É evidente que os

2003; Kohli, Künemund e Vogel, 2005).

resultados do estudo não podem ser

Portanto, com todas as alterações

extrapolados para a população portuguesa em

demográficas, sociais e familiares que

geral, contudo é possível extrair deste

decorreram ao longo das últimas décadas,

informações muito ricas sobre as solidariedades

torna-se imperativo assegurar e contribuir para a

intergeracionais, expectativas e orientação da

verdadeira realidade de solidariedade e coesão

responsabilidade no cuidado aos idosos.

existente na família, assim como analisar as expectativas e as preferências dos indivíduos no

SOLIDARIEDADE

FAMILIAR

que diz respeito às crenças normativas sobre o

INTERGERACIONAL - CONSTRUÇÃO DO

apoio, tendo como pergunta de partida para o

MODELO TEÓRICO

presente estudo: “Quais são as expectativas dos indivíduos com 55 ou mais anos em relação às

Na década de 70, Vern Bengtson e os seus

responsabilidades filiais e as suas opiniões/

colegas começaram a elaborar uma construção

preferências no que diz respeito à orientação da

da solidariedade orientada para o indivíduo e

responsabilidade para o apoio familiar e de

apontada às relações entre as gerações

serviços públicos?”

familiares (Black e Bengtson, 1974, in

Feita a apresentação do tema, importa delinear

Hammarström, 2005). Esta construção de

os objectivos do estudo e os principais eixos

solidariedade foi originalmente desenvolvida

que compõem o estudo, o qual tem como

para sumarizar vários comportamentos e

objectivos:

sentimentos que pareciam caracterizar as

Analisar a solidariedade familiar actual existente

relações pai-filho ao longo do curso de vida e

entre os filhos adultos e os seus pais, no que diz

focava-se em questões de coesão ou

respeito à proximidade geográfica, a nível de

integração, conceptualizando a solidariedade

contacto estabelecido, à proximidade afectiva, a

familiar como uma interacção entre as três

nível do consenso e do apoio instrumental;

dimensões de solidariedade associativa,

Identificar a existência de uma orientação

afectiva e consensual. Black e Bengtson (1974,

famílistica, através do apoio de crenças

in Hammarström, 2005) inspirados pelo conceito

normativas sobre a responsabilidade filial, da

de solidariedade mecânica de Durkheim e

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 45

enfatizando a similaridade de valores, os seus

Bengtson e os seus colegas (Bengtson, Landry

pressupostos basearam-se no facto da

e Mangen, 1988; Bengtson e Roberts, 1991)

similaridade ideológica entre membros

identificam assim seis dimensões do modelo de

familiares (solidariedade consensual) reforçar e

solidariedade:

ser reforçada por altos níveis de afectos e associação. Estas dimensões foram assumidas

•Solidariedade estrutural

como tendo elevados níveis de correlação entre

Um dos aspectos mais facilmente observados e

elas e assim constituindo dimensões de uma

objectivamente determinados da solidariedade

construção única de ordem superior

familiar ou coesão aparenta ser a estrutura de

(Hammarström, 2005).

relações familiares intergeracionais. Dentro do

O modelo original no qual a solidariedade

contexto do sistema de família intergeracional, a

constitui uma construção única de ordem

estrutura familiar é vista como uma função de

superior foi abandonado, através da

oportunidade. A estrutura familiar é definida

investigação levada a cabo por Bengtson e

como o padrão de papéis relacionais (redes de

Roberts (1991). Para além das três dimensões

parentesco: número de filhos e netos; estado

de solidariedade originais (associativa, afectiva

civil dos membros familiares; género dos filhos e

e consensual), os autores incluíram mais três

netos; idade dos filhos em cada núcleo familiar)

dimensões - solidariedade normativa, funcional

ressaltados por constrangimentos espaciais

e estrutural – colocando a solidariedade

(proximidade: a actual distância em quilómetros

consensual como uma variável independente.

da casa do inquirido à casa do avô, pai, filho ou

Neste estudo, Bengtson e Roberts (1991)

neto referido; e as categorias funcionais, que

concluíram que a solidariedade não poderia ser

são indicadoras do quão difícil ou do tempo

vista como uma construção única uma vez que

consumido por uma visita ao parente).

a única correlação significativa encontrada foi entre o afecto e a associação, enquanto o

•Solidariedade afectiva

consenso diferia das outras componentes da

A construção do afecto, em particular, a

solidariedade. Desta forma, Bengtson e Roberts

solidariedade afectiva entre membros da família,

(1991) reformularam o modelo de modo a

é um assunto familiar e complexo. Na nossa

apenas comprometer conexões entre as

existência do dia-a-dia todos nós somos tocados

diferentes dimensões de solidariedade,

pelo afecto nas nossas relações interpessoais.

deixando assim de olhar para a solidariedade

A solidariedade afectiva deriva da construção

como uma composição simples e linear de

geral do sentimento, sendo este um padrão de

associação, afecto e consenso. Assim,

sentimentos socialmente definido que indica

Bengtson (2001: 8) afirma que a utilização da

uma relação particular com um objecto social e

construção teórica de solidariedade

é acompanhado por um comportamento

intergeracional é para “[…] caracterizar as

socialmente apropriado. É nominalmente

dimensões comportamentais e emocionais da

definida como a natureza e extensão do

interacção, coesão, sentimento e suporte entre

sentimento positivo em relação a outro membro

os pais e filhos, avós e netos, ao longo da vida”.

da família. Os tipos e quantidades de

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 46

sentimento positivo determinam a qualidade das

familiar, como por exemplo: poder, igualdade e

relações entendidas por cada membro da

justiça na família.

família.

•Solidariedade Normativa •Solidariedade associativa

As normas familiares podem ser definidas como

A solidariedade associativa é definida como o

aqueles padrões de comportamento que

grau segundo o qual os membros da família

governam e medeiam as interacções

partilham actividades com outros membros da

intrafamiliares e as expectativas da família como

família. A um nível teórico, esta definição inclui

um sistema social. Tais normas moldam

uma partilha de actividade intergeracional. O

expectativas e atitudes e definem

contacto entre membros da família é por vezes

comportamentos próprios e equitativos de

face-a-face, enquanto que noutras alturas a

acordo com o tipo e grau de obrigações filiais. A

associação é limitada ao contacto indirecto (por

responsabilidade filial refere-se às obrigações

escrito, ou por telefone).

que os filhos adultos sentem em responder às necessidades básicas dos seus pais,

•Solidariedade consensual

enfatizando o dever, protecção e equidade.

Na solidariedade familiar são analisadas várias

Assim, a solidariedade normativa diz respeito às

características da família em busca de traços

expectativas referentes às obrigações filiais e

que promovem a sua coesão. Uma destas

parentais, bem como às normas sobre a

dimensões é o grau de similaridade de valores e

importância dos valores familísticos,

a opinião consensual entre os pais e os seus

conceptualizando o grau de percepção de

filhos. A dimensão consensual foca-se em

responsabilidade filial (familismo).

valores, opiniões e orientações entre as gerações.

Apesar das normas estabelecerem padrões de comportamento e estabelecerem as

•Solidariedade funcional

expectativas que guiam o comportamento, elas

O apoio instrumental, como a troca de dinheiro,

não são uniformemente aplicadas. Diferentes

bens e serviços é um aspecto chave na

normas podem ser utilizadas por certos

solidariedade familiar, sendo a troca definida

indivíduos ou as mesmas normas poderão ser

como acto de dar e receber assistência entre

aplicadas de formas distintas, dependendo do

membros familiares de diferentes gerações. O

nível atribuído ou atingido pelo indivíduo dentro

foco reside na quantidade de assistência que as

do grupo. Género, idade e status ocupacional,

pessoas dão e recebem do sistema familiar

mudanças demográficas, mudanças na

intergeracional. Dar e receber é um aspecto de

sociedade, estrutura familiar, bem como o

interdependência entre membros familiares.

aumento da natureza multicultural da nossa

Apesar de a troca ser uma componente de

população são características que influenciam a

solidariedade familiar ela é causa e

mudança e a forma como as normas serão

consequência de outros aspectos da dinâmica

aplicadas, pelo que as normas familiares não são estáticas.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 47

Roberts (1991) sugeriram que um passo lógico SOLIDARIEDADE

N O R M AT I VA :

no desenvolvimento da teoria é examinar as

E X P E C TAT I VA S E O R I E N TA Ç Ã O D A

trocas dinâmicas nas relações intergeracionais e

RESPONSABILIDADE FILIAL/FAMILIAR E

como elas se relacionam nas normas familiares.

DOS SERVIÇOS PÚBLICOS

As obrigações familiares são culturalmente descritas como expectativas normativas, as

Bengtson e seus colegas distinguiram seis tipos

quais podem ser definidas em termos de dever

de solidariedade, sendo as expectativas sobre

e sentimentos de obrigação altruísta baseados

como os membros familiares se comportam uns

no parentesco ou razões morais, a nível social,

com os outros uma importante dimensão da vida

ou em termos de reciprocidade e afectividade, a

familiar, a qual foi denominada de solidariedade

nível individual (Wijckmans e Bavel, 2010).

normativa. A solidariedade normativa refere-se

Tanto as normas gerais como as crenças

às normas que dão ênfase à primazia das

pessoais podem afectar a conduta individual, e

relações na família, sendo definida como o grau

ambas estão inter-relacionadas (Ganong e

de consenso intergeracional em relação à

Coleman, 2005; Gans e Silverstein, 2006).

responsabilidade familiar e de força do comprometimento no desempenho dos papéis e

É importante focalizar as obrigações familiares

no reconhecimento das obrigações familiares

uma vez que estas são indicativas do actual

(Bengtson, Landry e Mangen, 1988; Bengtson e

funcionamento das famílias. Primeiramente,

Roberts, 1991). Em todas as conceptualizações

sentimentos de obrigação podem ter um

de solidariedade normativa, as expectativas de

importante impacto nas provisões de apoio, pois

responsabilidade filial desempenham o papel de

quanto mais forte for o sentimento de obrigação

componente central, independentemente do

de um membro familiar a prestar um

consenso destas expectativas. Este conceito

determinado tipo de apoio a outro membro

refere-se à dimensão que os membros

familiar, é mais provável que aquele membro

familiares jovens e de meia-idade são

familiar preste realmente esse apoio em caso de

esperados que prestem assistência aos seus

necessidade (Lee, Neetzer e Coward, 1994).

pais idosos, e que dêem prioridade às

Ikkink, Tilburg e Knipscheer (1999) chegam

necessidades destes em relação às suas (Lee,

mesmo a afirmar que as normas não são

Netzer e Coward, 1994). Já Van der Pas (2006)

efectivas até que as necessidades de apoio

define expectativas filiais como a reflexão de

surjam por parte dos pais idosos. Em segundo

normas sociais gerais, um conjunto de crenças

lugar, sentimentos de obrigação são uma

sobre como as pessoas se devem comportar em

importante medida para avaliar trocas actuais na

determinadas situações. Assim, pode-se

família, pois os membros familiares irão avaliar

concluir que as expectativas de

o apoio que recebem dos membros familiares à

responsabilidade filial consistem em crenças

luz do que sentem que esses outros membros

normativas sobre os deveres e obrigações dos

familiares estariam obrigados a dar (Lee,

filhos adultos para com os seus pais idosos, em

Neetzer e Coward, 1994). Se os membros

momentos de necessidades. Bengston e

familiares não corresponderem às expectativas,

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 48

isto poderá implicar uma redefinição desta

familiares intergeracionais entre a gerontologia e

relação familiar em particular ou a uma

a sociologia familiar. Uma das razões principais

redefinição dos próprios sentimentos de

para este interesse nas relações familiares ao

obrigação familiar, possivelmente levando a uma

longo de gerações poderá ser as exigências de

anulação do apoio. Neste sentido, expectativas

crescimento nas famílias geradas pela alteração

sobre as obrigações familiares e trocas

na estrutura etária da população juntamente

familiares actuais são interdependentes e

com as restrições nas despesas públicas

muitas vezes reforçam-se mutuamente.

relativamente a pagamentos financeiros para cuidados de saúde aos mais idosos. Assim, para

A maior critica à ideia de que as pessoas

guiar a investigação pretendida, é adoptado

geralmente têm um forte sentimento de

neste estudo o paradigma da solidariedade

obrigação familiar é apresentada por Finch e

intergeracional, por duas razões principais.

Mason (1991), em que na maioria dos casos, da

Primeiramente, o paradigma da solidariedade

amostra britânica, não existia um consenso

representa na sociologia da família um dos

claro da subsistência das normas familiares. Em

esforços a longo prazo para desenvolver e

muitos casos, os inquiridos sugeriram que as

testar uma teoria da integração familiar, sendo

pessoas não eram obrigadas a tomar conta dos

que o modelo da solidariedade guiou muitas das

seus parentes, mas que essa função de apoio

pesquisas sobre as relações intergeracionais

deveria ser tomada, por exemplo, pelo Estado.

adultas ao longo das últimas décadas (por

Emerge assim, uma outra conceptualização da

exemplo, Lee, Netzer e Coward, 1994;

solidariedade normativa no que diz respeito às

Lowenstein e Ogg, 2003; Dykstra [et. al.], 2006;

expectativas de responsabilidade familiar versus

Lowenstein, 2007). Em segundo, as medidas

responsabilidade do Estado Providência. Desta

baseadas nas dimensões de solidariedade

forma, na orientação do Estado Providência as

incluem uma ferramenta válida e confiável de

crenças normativas dos indivíduos inclinam-se

forma a avaliar a força das obrigações familiares

para a responsabilidade do Estado e as suas

intergeracionais (Bengtson, Landry e Mangen,

preferências favorecem os serviços formais

1988; Bengtson e Roberts, 1991). Desta forma,

relativamente ao apoio familiar. Na situação

é delineado o modelo de análise do presente

oposta, temos a orientação da responsabilidade

estudo, o qual se pode observar na figura n.º 1.

familiar em que as crenças normativas dos indivíduos inclinam-se para a responsabilidade familiar e as suas preferências favorecem os serviços informais relativamente aos serviços formais (Motel-Klingebiel, Tesch-Roemer e Kondratowitz, 2005). Ao longo dos últimos 30 anos, e primeiramente na Europa Ocidental e nos Estados Unidos, aumentaram o número de estudos de relações JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 49

que 14 destes alunos apenas leccionam no pólo que se situa em Vila Franca de Xira, os quais não foram abrangidos pelo estudo. A escolha da amostra teve como critério os indivíduos terem pelo menos um filho adulto vivo, com idade superior a 18 anos. Foi METODOLOGIA A população alvo a partir da qual foi efectuado o estudo, foram os alunos da Universidade Sénior da Póvoa de Santa Iria, em que o total de alunos que frequenta a Universidade é de 343 indivíduos com uma idade de 55 ou mais anos e/ou reformados a residir em localidades do concelho de Vila Franca de Xira (Póvoa de Santa Iria, Vialonga, Forte da Casa e Alverca), sendo

comunicado em cada sala de aula, durante uma semana em Novembro de 2010, a minha presença na Universidade Sénior e o objectivo da mesma, sendo que colaboraram no estudo apenas aqueles que se disponibilizaram para responder ao questionário, perfazendo no total 97 questionários completos e 3 incompletos. A recolha de dados circunscreveu-se apenas a um único período no tempo (Novembro de 2010), sendo a sua configuração definida de desenho transversal. Dado que o estudo visa analisar as expectativas de responsabilidade filial, de uma população específica, e a sua

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 50

orientação da responsabilidade familiar e do

solidariedade normativa - avaliando as

Estado no cuidado aos idosos, o seu carácter é

expectativas de responsabilidade filial, através

naturalmente descritivo. Assim, para a análise

do instrumento utilizado por Van der Pas (2006),

dos dados utiliza-se o método quantitativo,

e a orientação da responsabilidade familiar /

recorrendo-se ao inquérito por questionário de

Estado Providência através do instrumento

administração directa como técnica de recolha

descrito por Daatland e Herlofson (2003).

de dados.

Posteriormente, a informação retirada dos

No que se refere à elaboração do questionário,

questionários foi codificada e inserida na base

pode-se dizer que neste estão implícitos três

de dados do SPSS, para descrição dos

subconjuntos. A primeira parte do questionário é

resultados e análise interpretativa dos mesmos,

composta por variáveis de caracterização,

à luz dos pressupostos teóricos.

(género, idade e estado civil), assim como por variáveis socioeconómicas (habilitações

CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO

literárias, situação perante o trabalho,

INQUIRIDA

rendimento mensal, contexto familiar) e variável de estado de saúde.

Do total de 97 inquiridos que constituem a

Na segunda parte do questionário analisam-se

amostra foi possível obter um conjunto de

as cinco dimensões do modelo de solidariedade

informações sociográficas dos indivíduos que

intergeracional no que diz respeito à relação

leccionam na Universidade Sénior. Desta forma,

com o filho ‘focal’, sendo que é pedido ao

a amostra é constituída por 44 homens e 53

inquirido que seleccione um dos dois critérios

mulheres com uma idade compreendida entre

explícitos: 1 – é o filho que ajuda mais o pai nas

55 e 81 anos, com uma média de 65 anos. É

AVD’s; 2 – é o filho que o pai vê mais

possível verificar que são os homens que

frequentemente. Tal como afirmam Lee, Neetzer

apresentam uma idade mais elevada, em

e Coward (1994: 561) este “procedimento de

relação às mulheres.

selecção garante que o filho focal é aquele com

No que diz respeito ao estado civil, verifica-se

quem o pai tem o máximo de oportunidades de

que a maioria dos inquiridos são casados (75,

troca de ajuda”. Assim os instrumentos

3%), assumindo algum destaque os viúvos

utilizados para avaliar as dimensões de

(17,5%) e por último, salienta-se a fraca

solidariedade intergeracional são de duas fontes

expressividade dos divorciados (6,2%) e

distintas: para avaliar as dimensões de

separados (1%). É possível verificar que no que

solidariedade estrutural, associativa, afectiva e

se refere aos inquiridos viúvos, 28,3% são do

consensual recorre-se ao instrumento utilizado

género feminino face aos 4,5% do género

no Projecto OASIS por Lowenstein e Ogg (2003)

masculino. É possível verificar que a faixa etária

e para avaliar a dimensão de solidariedade

em que se evidencia maior prevalência de

funcional recorre-se ao instrumento empregue

viúvos é entre os 70 e 74 anos de idade

por Lee, Neetzer e Coward (1994).

(representando 35,3% do total de viúvos).

Na terceira parte do questionário analisa-se a

Em relação ao agregado familiar é possível

sexta dimensão do modelo de solidariedade -

observar que a maioria dos inquiridos coabita

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 51

com o cônjuge/companheiro (47, 4%), tendo

semelhança entre géneros, contudo os homens

também importante expressividade os que

tendem a considerar o seu estado de saúde

coabitam com cônjuge/companheiro e filho

melhor em relação às mulheres.

(25,8%) e ainda os que vivem sós (20,6%),

Do total da amostra, 51,5% dos inquiridos

sendo que do total da população inquirida

afirmaram apresentar um problema de saúde

verifica-se que 26,4% mulheres e 13,6%

com uma duração de mais de 6 meses, sendo

homens vivem em situação isolada, sendo que a

as doenças mais referidas, por ordem de

maioria dos que vivem sós são viúvos (70%).

importância, a hipertensão, diabetes,

Quando questionados sobre o nº de filhos, foi

osteoporose, doenças do foro cardíaco, gástrico

possível constatar que quase metade da

e reumático, hipercolesterolémia, doença

população tem apenas um filho (48,5%), e ainda

oncológica, problemas de coluna, alergias,

com grande expressividade os que têm dois

hipotiroidismo e apneia do sono. Contudo,

filhos (41,2%), tendo pouco destaque os que

apenas 19,6% dos inquiridos afirmou limitação

têm três e quatro filhos (respectivamente, 7,2 e

causada pela doença/ problema de saúde nas

3,1%) (Anexo III). A maioria dos inquiridos

AVD’s, em que 52,6% referiu que essa limitação

afirmou ter netos (75,3%), revelando com maior

não era severa.

expressividade os que apresentam um e dois netos (respectivamente, 26,8 e 30,9%). No que se refere às características profissionais e económicas, verifica-se que 28,9%

SOLIDARIEDADE INTERGERACIONAL

apresentam habilitações literárias a nível do 3.º

ENTRE PAIS E FILHOS ADULTOS

Ciclo de escolaridade e que 82,5% são reformados. O rendimento económico da população constitui um indicador importante para determinar a dependência económica face a terceiros. É possível verificar que o rendimento mensal médio da população inquirida se situa entre os 700 e 1000 euros, sendo que 23,7% da nossa amostra apresenta um rendimento mensal superior a 1500 euros, para além de que as mulheres tendem a apresentar um rendimento mensal inferior ao dos homens. Por fim, no que diz respeito ao estado de saúde, a maioria dos inquiridos refere considerar o seu estado de saúde razoável (59,8%) ou bom (33%), tendo fraca expressividade a classificação de muito bom e mau (respectivamente 4,1 e 3,1%). Verifica-se uma JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Primeiramente, é feita uma caracterização sociográfica do filho adulto, verificando-se que 51,5% são do género masculino e 48,5% são do género feminino, com idades compreendidas entre os 20 e os 54 anos de idade (uma média de 36 anos de idade), em que a maioria são licenciados (62,9%) e estão empregados (90,7%) e 52,6% são casados, verificando contudo uma forte expressividade a nível dos solteiros (30,9%). Visto a população analisada ser independente e não necessitar de ajuda nas actividades de vida, quase a totalidade dos inquiridos com mais de um filho (98%) optou pelo critério do “filho que vê com mais frequência”, sendo que apenas um indivíduo optou pelo critério do “filho que o ajuda mais nas suas AVD’s”.

Volume 2. Edição 3


Página 52

A nível da solidariedade estrutural, pode-se

afirma apresentar um grau baixo de proximidade

verificar que os filhos adultos vivem

afectiva.

razoavelmente próximos dos seus pais, uma vez

A nível da solidariedade consensual apesar da

que cerca de metade da amostra (48,5%) vive a

maioria dos inquiridos considerar que os seus

menos de 10 minutos ou entre 10 e 29 minutos

valores e opiniões são bastante e muito

do seu filho, verificando-se ainda que 24,7% dos

semelhantes (36,1 e 25,8%, respectivamente)

filhos adultos reside com os seus pais.

com os do seu filho adulto, 19,6 e 13,4% dos

No que diz respeito à solidariedade associativa,

inquiridos consideram que apenas são um

é possível constatar que os pais vêem

pouco semelhantes ou que não são muito

frequentemente o seu filho, sendo que mais de

semelhantes, respectivamente.

metade dos inquiridos vê o seu filho uma vez

No que diz respeito à solidariedade funcional,

por dia ou mais ou algumas vezes por semana

pode-se verificar que os apoios, mais referidos

(62,9%). Contudo 10,3% dos inquiridos referem

pela população inquirida, que os filhos adultos

ver os seus filhos mais ocasionalmente,

prestaram nos últimos 12 meses, foram

nomeadamente aqueles que vivem no

presentes sem ser dinheiro (42,3%), conselho

estrangeiro, embora haja um caso em que o

numa decisão (37%) e ajuda nas tarefas

inquirido refere que “ só me visita se precisa de

domésticas ou pequenas tarefas (33%). É de

mim ou quando eu convido e mesmo assim por

salientar que 19,6% dos pais referiram não ter

vezes recusa o convite”.

recebido ajuda por parte do seu filho adulto.

Ainda no que se refere à solidariedade

Quanto aos apoios que os pais prestaram ao

associativa, ao analisar a frequência com que os

seu filho adulto, nos últimos 12 meses, foram

inquiridos estabelecem contacto telefónico com

por ordem de importância presentes sem ser

o seu filho é possível verificar que estes falam

dinheiro (48,3%), assistência financeira em

frequentemente com o seu filho, sendo que a

presente ou empréstimo, ajuda nas tarefas

maioria dos inquiridos estabelece contacto

domésticas (42,3%) e conselho numa decisão

telefónico com o seu filho uma vez por dia ou

(38,1%). Verifica-se também uma forte

mais ou algumas vezes por semana (74,2%).

expressividade no que diz respeito a tomar

Ainda a referir que 13,4% dos inquiridos

conta das crianças (28,9%). Apenas 5,2% dos

nomearam outra situação, sendo a situação

pais referiram não ter ajudado o seu filho adulto,

“quando necessário” a opção de 11,3% uma vez

sendo que foram os pais que prestaram mais

que a maioria destes inquiridos reside com o

apoio ao seu filho adulto, em relação ao apoio

seu filho, não tendo grande necessidade de

prestado por este aos seus pais.

estabelecer contacto telefónico frequentemente.

Apenas 24,7% dos inquiridos afirmou ter um dos

No que concerne à solidariedade afectiva pode-

seus pais vivo, sendo que 70,8% destes

se verificar que mais de metade dos inquiridos e

inquiridos presta algum tipo de apoio a um dos

o seu filho adulto têm uma proximidade afectiva

seus pais ou a ambos (correspondendo a 17,5%

muito elevada ou extremamente elevada

do total da população inquirida), situando-se

(52,6%), existindo apenas um inquirido que

70,6% na faixa etária dos 55 aos 64 anos de idade. No que diz respeito ao tipo de apoio

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 53

prestado: acompanhamento, visitas, apoio nas

pessoal) a idosos com necessidades e as

tarefas domésticas, apoio financeiro e apoio no

preferências pessoais dos inquiridos no que diz

transporte foram os apoios mais enunciados,

respeito às suas preferências habitacionais e na

por ordem de importância.

proveniência de apoio em caso de necessidade.

Assim 70,8% dos inquiridos, que tem um dos

Verificou-se que a nível da dimensão emocional

seus pais vivo, presta apoio a este ajudando

pode-se verificar que a maioria dos inquiridos

simultaneamente o seu filho adulto, pois metade

concorda com as afirmações, ou seja tem uma

destes inquiridos dá apoio ao seu filho adulto

grande expectativa a nível da dimensão

em tarefas domésticas, dá presentes sem ser

emocional, sendo que apenas a afirmação “os

em dinheiro e assistência financeira em

filhos devem sentir-se responsáveis pelos seus

presente ou empréstimo (58,8%, 52,9% e

pais” originou mais divergência, pois 27,8% dos

47,1%, respectivamente), e 1/3 dos inquiridos

inquiridos não concorda nem discorda, 17,5%

dá apoio ao seu filho adulto tomando conta dos

discordam e 4,5% discordam totalmente da

netos.

afirmação. No que diz respeito a nível da dimensão

SOLIDARIEDADE NORMATIVA

instrumental é possível verificar que a opinião dos inquiridos é bastante divergente. Apenas é

A pesquisa da solidariedade normativa é feita

possível verificar que a maioria dos inquiridos

através primeiramente do estudo das

concorda e concorda totalmente em que “os

expectativas de responsabilidade filial e

filhos devem cuidar dos seus pais doentes” (55,

posteriormente da orientação da

7 e 17,5%, respectivamente) e que “em situação

responsabilidade familiar versus Estado no

de emergência, os filhos devem acolher os seus

cuidado aos idosos.

pais em sua casa” (54,6 e 16,5%,

Desta forma, para a análise das expectativas de

respectivamente). Pelo contrário não

responsabilidade filial foram redigidas 16

apresentam expectativas no que concerne às

afirmações, inseridas em quatro dimensões

restantes afirmações, pois os inquiridos não

(emocional, instrumental, informativa e

concordam nem discordam com estas,

contacto), em que os inquiridos tinham de

chegando mesmo a discordar que os filhos

indicar se discordavam totalmente,

devem providenciar apoio financeiro, abdicar do

discordavam, não concordavam nem

seu tempo livre, ajustar a sua situação

discordavam, concordavam ou se concordavam

profissional e a sua situação em sua casa para

totalmente. Sendo assim, a apresentação dos

ajudar os pais (17,5%, 26,8%, 36,1% e 22,7%,

resultados vai ser apresentada através das

respectivamente).

quatro dimensões.

No que se refere à dimensão de contacto, é

Quanto à análise da responsabilidade familiar e

possível verificar que os pais apresentam altas

do Estado no cuidado aos idosos foi estudado a

expectativas, uma vez que a maioria concorda

quem os inquiridos impunham responsabilidade

que “os filhos devem telefonar regularmente” e

no apoio instrumental (apoio financeiro, apoio

que “os filhos que vivem perto dos seus pais

nas tarefas domésticas e apoio no cuidado

devem visitá-los pelo menos uma vez por

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 54

semana” (66% para ambas as afirmações). Contudo quase a maioria dos inquiridos (47,4%) não concordou nem discordou que “os filhos devem viver próximo dos seus pais”, sendo que 7,2% discordaram e 6,2% discordaram totalmente. Por fim, quanto à dimensão informativa é possível constatar que os inquiridos apresentam altas expectativas no que concerne a esta dimensão, uma vez que em todas as afirmações a maioria concorda que os filhos devem aconselhar, controlar a qualidade de cuidado e familiarizar os seus pais com serviços prestadores de cuidados de saúde (54,6%, 67% e 71,1%, respectivamente).

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO Com a caracterização da população inquirida é possível verificar que a maioria dos inquiridos é casada. Contudo constata-se com alguma expressividade que uma parcela da população inquirida é viúvos, sendo na sua grande maioria inquiridos do género feminino. Este resultado pode relacionar-se com a sobremortalidade masculina, referida por Carrilho e Patrício (2005), em que a esperança de vida é mais elevada nas mulheres do que nos homens. É possível verificar também que a faixa etária em que se evidencia maior prevalência de viúvos é entre os 70 e 74 anos de idade (representando

No que diz respeito à responsabilidade atribuída

cerca de 1/3 do total de viúvos), idade próxima

pela população inquirida à família ou ao Estado,

da esperança de vida para os homens.

a nível dos apoios financeiro, nas tarefas

A nível do agregado familiar verifica-se que

domésticas e no cuidado pessoal a idosos que

metade da população inquirida reside com

necessitam de apoio, foi possível verificar que a

cônjuge/companheiro e ¼ desta reside com

maioria dos inquiridos (77,3%, 79,4% e 76,3%,

cônjuge/companheiro e filho, tendo de se ter em

respectivamente) considerava que tanto o

conta que a média de idade da população

Estado como a família deviam suportar essas

inquirida é de 65 anos. Contudo mesmo assim,

responsabilidades.

ainda é possível verificar alguma expressividade

Quanto às preferências pessoais habitacionais,

dos que vivem sós, verificando-se que são as

a maioria dos inquiridos refere preferir residir

mulheres as que mais vivem em situação

numa instituição (54,6%), contudo mais de 1/3

isolada e que a maioria dos que vivem sós são

dos inquiridos refere preferir residir com os seus

viúvos. Esta situação está provavelmente

filhos (38,1%), caso não pudesse viver de forma

associada à sobremortalidade masculina e à

independente.

maior esperança de vida feminina (Guerreiro,

Também a nível das preferências pessoais no

2003). Também é possível verificar que tanto os

que diz respeito à proveniência de apoio em

inquiridos como os seus filhos adultos têm

caso de necessidade de ajuda a longo prazo, a

predominantemente um ou dois filhos,

maioria dos inquiridos referiu que preferia

justificando a baixa acentuada da fecundidade

receber ajuda de serviços organizados (73,2%),

ao longo das últimas décadas, pois tal como

sendo que apenas 23,7% preferia que esta

afirmam Carrilho e Patrício (2005) em 2004 a

viesse de familiares.

descendência média é de 1,4 filhos por mulher,

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 55

assim como se verifica uma diminuição média

(1999) apoiando o argumento de que a

do tamanho da família.

coresidência é mais comum nos países

Através da análise da solidariedade familiar

mediterrâneos. Hank (2005) também refere a

intergeracional foi possível constatar que os

predominância da coresidência nos três países

filhos adultos não estavam isolados dos seus

mediterrâneos comparados com os outros

pais, pois não só mantinham contacto frequente

países investigados. Contudo também tem de

com estes, assim como existia uma troca de

se ter em conta a faixa etária dos inquiridos que

inter-ajudas, à semelhança do que

abrange os indivíduos com 55 ou mais anos, ou

demonstraram outros estudos empíricos

seja o estudo ainda engloba indivíduos de meia-

(Lowenstein e Ogg, 2003; Dykstra, 2006;

idade, sendo que nesta fase da vida muitos dos

Szydlik, 2008). Assim, é possível verificar que os

filhos adultos ainda residem com os pais, como

resultados da solidariedade estrutural

se verifica no estudo em que dos 25 inquiridos

demonstram que os filhos adultos vivem

que reside com o seu cônjuge e o seu filho, 16

próximo dos seus pais, contrariando a ideia de

destes encontram-se entre a faixa etária dos 55

que os membros familiares vivem cada vez mais

aos 64 anos de idade. Este facto está

afastados uns dos outros, sendo que cerca de

relacionado com os filhos saírem cada vez mais

metade da população inquirida vive a menos de

tarde de casa dos pais uma vez que demoram

10 minutos ou entre 10 e 29 minutos do seu filho

mais a ter a sua independência financeira

adulto. Estes resultados vão de encontro aos do

devido ao “alongamento da formação escolar e

estudo de Dykstra [et al.] (2006) em que a

do correspondente atraso de entrada na vida

média de distância entre os membros familiares

adulta activa.” (Almeida [et. al.], 1998: 46) e

mostrou-se ser relativamente baixa, assim como

consequentemente também está relacionado

o de Hank (2005) em que a maioria dos

com o aumento da idade média do primeiro

inquiridos vivia próximo do seu filho e o de

casamento (Fernandes, 1997, Almeida [et. al.],

Lowenstein e Ogg (2003) no qual mais de

1998, Carrilho e Patrício, 2005).

metade dos pais viviam entre 10 a 30 minutos

No que diz respeito à solidariedade associativa,

dos seus filhos. Contudo no que se refere à

verificou-se que os pais estabelecem contacto

coabitação é possível verificar que ¼ da

face-a-face e telefónico frequentemente com o

população inquirida reside com o seu filho

seu filho, sendo que a população inquirida

adulto e o cônjuge, ao contrário de outros

estabelece mais frequentemente contacto

estudos como de Rein (1994) e de Lowenstein e

telefónico do que contacto face-a-face. Estes

Ogg (2003), nos quais se verificou um declínio

resultados vêm de encontro com a realidade

da coresidência entre as gerações, apesar dos

empírica que comprovou que os pais e filhos

filhos adultos residirem próximo dos seus pais

adultos estabelecem contactos regulares (Rein,

idosos. Neste último estudo é necessário ter em

1994; Gil, 1999; Lowenstein e Ogg, 2003; Hank,

conta que foi em Espanha que se verificou um

2005; Dykstra [et. al.], 2006, Hatton-Yeo, 2007 e

maior nível de coresidência (cerca de ¼ da

Szydlik, 2008).

população espanhola inquirida), verificando-se

No que concerne à solidariedade afectiva, mais

valores semelhantes também no estudo de Gil

de metade dos inquiridos e o seu filho adulto

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 56

têm uma proximidade afectiva muito elevada ou

acontecer que o apoio não seja reconhecido

extremamente elevada, o que vem de encontro

pelo receptor tal como afirmou Dykstra [et. al.]

com os estudos realizados por Lowenstein e

(2006) ao constatar que os filhos referiram

Ogg (2003) e Szydlik (2008).

prestar mais apoio aos pais do que os pais

A nível da solidariedade consensual apesar da

referiram receber por parte dos filhos. Também

maioria dos inquiridos considerar que os seus

Ikkink, Tilburg e Knipscheer (1999) afirmaram na

valores e opiniões são bastante e muito

sua investigação que tanto os filhos como os

semelhantes com os do seu filho adulto, cerca

pais tinham tendência a reportar que davam

de 1/3 da população inquirida considera que

mais ajuda do que recebiam. Do mesmo modo,

apenas são um pouco semelhantes ou que não

foi possível constatar que houve mais pais a

são muito semelhantes. À semelhança também

afirmar que não receberam nenhum apoio por

no estudo de Lowenstein e Ogg (2003) foi

parte dos seus filhos, do que o contrário. É

possível verificar que era em Espanha que os

possível verificar que noutros estudos empíricos

indivíduos apresentavam um menor índice de

também os inquiridos referem, com alguma

consenso, em comparação com os outros

expressividade, não receber qualquer tipo de

países (Noruega, Inglaterra, Alemanha e Israel).

apoio por parte dos seus filhos (Lowenstein e

No que diz respeito à solidariedade funcional, foi

Ogg, 2003 e Szydlik, 2008).

possível verificar que foram os pais que

A nível dos apoios especificamente verifica-se

prestaram mais apoio, em relação ao apoio que

que existe uma relativa similaridade de troca de

os filhos adultos prestaram aos seus pais. Este

apoios entre pais e filhos adultos a nível do

resultado vem contra a investigação de Dykstra

conselho, tarefas domésticas, presentes sem

[et. al.] (2006), no qual se verificou que existe a

ser dinheiro e transporte, o que não se verifica a

mesma quantidade de ajuda de pais para filhos

nível do apoio financeiro. São os pais que

como dos filhos para os pais, e contra os

prestam mais apoio financeiro aos seus filhos

estudos de Attias-Donfut (1993, in Rein, 1994) e

adultos do que o contrário, tal como se verificam

Lowenstein e Ogg (2003), em que foi possível

nos estudos empíricos de Attias-Donfut (1993, in

concluir que os pais claramente prestavam

Rein, 1994), Gil (1999) e Dykstra [et. al.] (2006).

menos apoio do que recebiam por parte dos

Outro tipo de apoio também prestado aos filhos

seus filhos adultos. Uma das possíveis razões

adultos referido por mais de ¼ dos pais está

para este resultado pode estar relacionada com

relacionado com o cuidado aos netos. Nos

a faixa etária da população inquirida (com 55 ou

estudos de Gil (1999) e Szydlik (2008) verifica-

mais anos) em que esta poderá prestar mais

se que os pais prestam este tipo de apoio aos

apoio aos seus filhos ou estes podem depender

seus filhos, verificando-se contudo resultados

mais dos seus pais, sendo que em todos os

superiores nas investigações levadas a cabo por

estudos empíricos a idade dos pais é mais

Dykstra [et. al.] (2006) e Attias-Donfut, Ogg e

avançada. Outra razão possível depreende-se

Wolff (2005).

com o facto de serem apenas os pais a

Verifica-se que apenas ¼ da população inquirida

relatarem a troca de ajudas existentes entre eles

pertence à geração ‘pivô’, ao contrário do que

e os seus filhos adultos, sendo que pode

era esperado, uma vez que segundo Attias-

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 57

Donfut, Ogg e Wolff (2005) na actualidade esta

inquirida está pouco de acordo que os filhos

geração é numericamente muito elevada, muito

devam providenciar apoio financeiro, abdicar do

devido ao aumento da esperança de vida.

seu tempo livre, ajustar a sua situação

Contudo grande maioria destes inquiridos

profissional e a sua situação em sua casa para

pertence a uma geração ‘pivô’ activa, em que

ajudar os pais. Estes resultados vão ao encontro

afirma prestar algum tipo de apoio a um ou

do estudo realizado por Van der Pas (2006) em

ambos os pais em simultâneo com a ajuda

que o autor concluiu que os pais interpretavam o

prestada ao seu filho adulto (tarefas domésticas,

papel filial como aquele que inclui uma grande

presentes, assistência financeira e cuidar dos

quantidade de discussão de assuntos e contacto

netos, por ordem de importância). Já na

com os filhos, assim como os pais apreciavam

investigação levada a cabo por Attias-Donfut,

bastante estar familiarizados com os recursos

Ogg e Wolff (2005) apesar de se verificar um

de saúde disponíveis e em receber apoio

elevado número de indivíduos pertencentes à

emocional dos seus filhos. Também foi possível

geração ‘pivô’, apenas 1/5 destes pertencia a

verificar no estudo de Van der Pas (2006) que a

uma geração ‘pivô’ activa. Quanto à idade em

maioria dos pais não estava de acordo com os

que se encontra esta geração, verifica-se que a

filhos terem de ajustar as suas situações

maioria pertence à faixa etária dos 55 aos 64

laborais e familiares para os ajudarem, como

anos de idade, estando ligeiramente em

também achavam que os filhos não tinham o

desacordo com Attias-Donfut, Ogg e Wolff

dever de lhes prestar assistência financeira.

(2005), os quais afirmam que nos países

Ao contrário do que era esperado, no que se

mediterrâneos esta geração aumenta a partir do

refere à responsabilidade atribuída pela

final dos 60 anos de idade.

população inquirida à família/Estado a nível de

Com estes resultados pode-se concluir que

apoio instrumental a um idoso que necessita de

existe solidariedade entre pais e filhos,

cuidado, foi possível concluir que a maioria

verificando-se que, de uma maneira geral, os

considera que existe uma responsabilidade

pais não estão distantes fisicamente nem

mista, ou seja, responsabiliza tanto o Estado

afectivamente dos seus filhos adultos,

como a família a nível dos três domínios (apoio

estabelecendo contactos frequentes, e que

financeiro, apoio nas tarefas domésticas e apoio

existe uma troca mútua de inter-ajudas de pais

no cuidado pessoal). Já estudos empíricos

para filhos e vice-versa. Também se conclui que

demonstram que os países do Sul da Europa,

apesar de a geração ‘pivô’ ser uma minoria da

como Espanha, Itália ou Grécia, apresentam um

população inquirida, grande parte desta

padrão semelhante uma vez que estão mais

pertence a uma geração ‘pivô’ activa.

inclinados a responsabilizar a família pelo

No que diz respeito às expectativas de

cuidado, estando mais divergentes no que se

responsabilidade filial, verificou-se que, de uma

refere ao apoio financeiro a idosos que

maneira geral, os pais apresentam elevadas

necessitem desse apoio (Lowenstein e Ogg,

expectativas tanto a nível das dimensões

2003; Lopes, 2006; Fokkema, Bekke e Dykstra,

emocional, contacto como informativa. Contudo

2008). No mesmo seguimento é possível

a nível da dimensão instrumental, a população

constatar com os resultados obtidos no estudo

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 58

que a seguir à responsabilização mista, a

receber apoio por parte de familiares ao invés

responsabilidade recai sobre o Estado e só por

de serviços formais, ao contrário dos inquiridos

último recai sobre a família.

dos quatro restantes países analisados.

Também ao contrário do que era esperado, são

Assim, pode-se concluir que a população

os resultados obtidos a nível das preferências

inquirida não apresenta uma orientação

pessoais no cuidar em caso de necessidade.

familística, não só por demonstrar preferência

Assim, quanto às preferências pessoais

pelo apoio formal em detrimento do apoio

habitacionais, a maioria dos inquiridos referiu

informal e de considerar tanto o Estado como a

preferir recorrer a serviços formais (instituição)

família responsáveis no cuidado aos idosos,

caso não pudesse viver de forma independente,

mas também por se verificar que apresenta

apesar de mais de 1/3 dos inquiridos preferir

baixos níveis de expectativas de

residir com os seus filhos. Estes resultados vão

responsabilidade filial no que diz respeito ao

contra os resultados de Lopes (2006), a qual

domínio instrumental, sendo que não abdica do

concluiu que a maioria dos inquiridos dos países

apoio que espera receber por parte dos seus

do sul da Europa, como Grécia, Espanha e

filhos nomeadamente no domínio emocional e

Portugal, preferiam a co-habitação com os seus

informativo, nos quais apresenta elevados níveis

filhos e uma minoria preferia os serviços

de expectativas de responsabilidade filial. De

formais. No mesmo sentido, Daatland e

certa forma, estes resultados acabam por ir ao

Herlofson (2003) concluíram que a maioria dos

encontro da teoria de complementaridade de

inquiridos espanhóis preferiam co-residir com

apoios, pois pode-se depreender que os

um filho, ao contrário dos inquiridos dos

inquiridos demonstram preferência para que

restantes países analisados (Noruega, Israel,

haja complementaridade entre o apoio familiar e

Alemanha e Inglaterra).

serviços públicos, sendo que os serviços ao

No que concerne às preferências pessoais no

partilharem a sobrecarga do cuidado com a

que diz respeito à proveniência de apoio em

família reforçam o comprometimento desta,

caso de necessidade de ajuda a longo prazo,

assim como os destinatários do cuidado

também foi possível verificar que a maioria dos

também estão mais receptivos a aceitar a ajuda

inquiridos referiu que preferia receber ajuda de

familiar uma vez que se sentem menos um peso

serviços organizados, sendo que menos de ¼

para a família, tal como sustentam Lowenstein e

da população inquirida preferia que esta viesse

Ogg (2003) e Van der Pas (2006). Estes

de familiares. Estes resultados não vêm ao

resultados também podem levar-nos à variante

encontro das conclusões de Lopes (2006) a qual

da hipótese de complementaridade – a teoria de

refere que os idosos preferem principalmente o

especialização familiar, na qual as redes formal

cuidado familiar, verificando um elevado índice

e informal especializam-se em distintas

de preferências na proveniência de apoio

competências, sendo que as famílias se

familiar em países do Sul da Europa, como

concentram no apoio emocional e os serviços

Portugal, Espanha, Grécia ou Itália. Também

públicos no apoio instrumental (Van der Pas,

Daatland e Herlofson (2003) verificam que são

2006). Lowenstein e Ogg (2003), assumem que

os inquiridos espanhóis que mais preferem

este modelo se baseia na ideia Parsoniana da

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 59

diferenciação estrutural da família moderna, pois

ambivalência, permitindo assim obter um quadro

o apoio sócio-emocional substitui o apoio

completo da relação familiar.

instrumental no cerne da família pós moderna.

Com este estudo pretendeu-se verificar a

Desta forma, pode dizer-se que os objectivos

presença de solidariedade entre gerações,

propostos inicialmente foram alcançados.

assim como as expectativas de

Porém, existem algumas limitações no estudo,

responsabilidade filial dos pais com 55 ou mais

nomeadamente no que se refere à opção de

anos e as opiniões e preferências no que se

considerar apenas o filho ‘focal’ na avaliação da

refere à orientação da responsabilidade da

solidariedade intergeracional, uma vez que não

família/ responsabilidade estatal no cuidado aos

é possível ter noção da solidariedade existente

idosos. Foi possível verificar que os pais

entre pais e com cada um dos seus filhos

consideram que existe uma responsabilidade

adultos. Os critérios utilizados para a “escolha”

mista (família e Estado) e que preferem os

do filho ‘focal’ também acabam por apresentar

apoios formais em detrimento dos informais

fraquezas, pois os pais podem dar e receber

(familiares), sendo que apesar disso continuam

apoio de um filho com o qual estejam menos

a apresentar expectativas elevadas em relação

vezes em contacto.

à responsabilidade que os filhos devem ter para

Ta m b é m a a v a l i a ç ã o d a s o l i d a r i e d a d e

com os pais, à excepção do apoio instrumental.

intergeracional apenas segundo a opinião dos

Os resultados obtidos devem fazer com que

pais acaba por não poder mostrar a verdadeira

haja uma reflexão sobre os serviços públicos

realidade de troca de inter-ajudas entre pais e

disponíveis à população idosa portuguesa e

filhos adultos. Assim como, as solidariedades

perceber que cada vez mais se torna imperativo

afectiva e consensual poderiam ter sido

a intervenção do Estado na promoção de novas

avaliadas por um método qualitativo, a

políticas públicas no cuidado aos idosos e um

complementar ao método quantitativo, uma vez

aumento do número e qualidade das estruturas

que são dimensões em que se baseia a relação

institucionais de apoio aos idosos. Com este

humana, sendo possível obter resultados mais

estudo verificou-se o desejo de uma

fiáveis e fidedignos.

complementaridade de apoios (formais e

Possíveis recomendações a futuros estudos

informais), pois assim os idosos não sentem que

passariam por a avaliação da solidariedade

sobrecarregam a sua família, ficando mais

intergeracional não ser realizada somente

receptivos em receber ajuda da família. Ao

através da opinião dos pais, como também dos

verificar-se uma menor expectativa a nível da

seus filhos, permitindo obter uma fonte de

dimensão de apoio instrumental e maior a nível

informação mais rica e um confrontamento de

das dimensões emocional/informativo, e pelo

respostas (pais-filhos e filhos-pais). Outra

facto dos pais preferirem que o apoio

sugestão seria a avaliação da relação

instrumental provenha de serviços públicos,

intergeracional, não avaliando apenas a

pode-se dizer que está presente a hipótese de

solidariedade como também outras dimensões

especialização familiar, uma vez que os pais

das relações intergeracionais, como o conflito e

demonstram vontade em que a família e os serviços desempenhem papéis diferentes no

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 60

cuidar, em que as famílias concentram as suas

 BENGTSON, Vern L., ROBERTS, Robert E.

tarefas no apoio emocional/informativo e os

L. – Intergenerational solidarity in aging

serviços públicos no apoio instrumental.

families: An example of formal theory

O mito da família portuguesa familística sofre

construction. «Journal of Marriage and

mutações, nomeadamente a nível das suas

Family» 58: 4 (1991) 856-870.

preferências pessoais no cuidado na velhice,

 CARRILHO, Maria, PATRÍCIO, Lurdes - A

sendo que estamos perante uma sociedade em

Situação demográfica recente em Portugal.

que o cuidado familiar domina presentemente.

«Revista de Estudos demográficos». n.º 38,

Embora não seja possível extrapolar os

INE (2005) 111-140.

resultados obtidos para a realidade nacional,

 DAATLAND, Svein O., HERLOFSON,

deve-se valorizar os mesmos, pois as

Katharina – ‘Lost solidarity’ or ‘changed

preferências pessoais da população inquirida

solidarity’: A comparative European view of

justificam uma inter-ligação dos apoios formais e

normative family solidarity. «Ageing &

informais de forma integrada, assim como uma

Society» 23 (2003) 537-560.

remodelação e expansão dos serviços/apoios formais aos idosos.

 DYKSTRA, Pearl A., [et. al.] - Family Solidarity in the Netherlands. Amsterdam: Dutch University Press, 2006.

BIBLIOGRAFIA

 FERNANDES, Ana Alexandre - Velhice e sociedade. Oeiras: Celta Editora, 1997.

 ALMEIDA, Ana Nunes de [et. al.] - Relações

 FERNANDES, Ana Alexandre – Questões

Familiares: Mudança e Diversidade. In:

Demográficas: demografia e sociologia

VIEGAS, J., COSTA, A. (org.) - «Portugal:

da população. Lisboa: Edições Colibri,

que Modernidade?» Oeiras: Celta Editora,

2008.

1998. pp.45-78.

 FINCH, Janet, MASON, Jennifer –

 ATTIAS-DONFUT, Claudine, OGG, Jim,

Obligations of kinship in contemporary

WOLFF, François-Charles - Family Support.

Britain: Is there normative agreement?

In: BÖRSCH-SUPAN, A. [et.al.] (eds.) -

«British Journal of Sociology» 42: 3 (1991)

«Health, Ageing and Retirement in Europe:

345-367.

First Results from the Survey of Health,

 F O K K E M A , Ti n e k e , B E K K E , S u s a n ,

Ageing and Retirement in Europe.

DYKSTRA, Pearl A. – Solidarity between

Mannheim: MEA, 2005. pp. 171-178.

parents and their adult children in

 BENGTSON, Vern L. – Beyond the nuclear

Europe. Amsterdam: KNAW Press, 2008.

family: the increasing importance of

 GANONG, Lawrence, COLEMAN, Marilyn –

multigenerational bonds. «Journal of

Measuring intergenerational Obligations.

Marriage and Family» 63: 1 (2001) 1-16.

«Journal of Marriage and Family» 67 (2005)

 BENGTSON, Vern, LANDRY, Pierre,

1003-1011.

MANGEN, David – The measurement of

 GANS, Daphna, SILVERSTEIN, Merril –

intergenerational relations. Beverly Hills:

Norms of filial responsibility for aging parents

Sage, 1988. JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 61

across time and Generations. «Journal of

 IKKINK, Karen Klein, TILBURG, Theo van,

Marriage and Family» 68 (2006) 961-976.

KNIPSCHEER, Kees – Perceived

 GIL, Ana Paula Martins – Solidariedades

instrumental suppot exchange in

Intergeracionais e Instituições de Velhice.

relationships between elderly parents and

Évora: [s. n.], 1998. Dissertação de

their adult children: Normative and structural

Mestrado em Sociologia – Família e

explanations. «Journal of Marriage and

População apresentada à Universidade de

Family» 61: 4 (1999) 831-844.

Évora.

 KILLIAN, T., GANONG, L. – Ideology,

 GIL, Ana Paula Martins - Redes de

context, and obligations to assist older

solidariedade intergeracional na velhice.

persons. «Journal of Marriage and Family»

«Cadernos de Política Social». Associação

64: 4 (2002) 1080-1088.

Portuguesa de Segurança Social, n.º 1 (1999) 93-114.

 KOHLI, Martin, KÜNEMUND, Harald, VOGEL, Claudia – Intergenerational family

 GIL, Ana Paula Martins – Heróis do

transfers in Europe: A comparative

Quotidiano. Dinâmicas Familiares na

analysis. Draft Paper for the Research

Dependência. Lisboa: [s. n.], 2007.

Network on Ageing at the 7th European

Dissertação de Doutoramento em Sociologia

Sociological Association Conference. Torun,

apresentada à Faculdade de Ciências

9-12 Setembro, 2005.

Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

 LEE, Gary R., NETZER, Julie K., COWARD, R a y m o n d T. – F i l i a l r e s p o n s i b i l i t y

 GUERREIRO, Maria das Dores - Pessoas

expectations and patterns of

Sós: múltiplas realidades. «Revista

intergenerational assistance. «Journal of

Sociologia – problemas e Práticas». n.º 43

Marriage and Family» 56: 3 (1994) 559-565.

(2003) 31-49.

 LOPES, Alexandra Cristina Ramos da Silva

 HAMMARSTRÖM, Gunhild – The construct

– Welfare arrangements, safety nets and

of intergenerational solidarity in a lineage

familial support for the elderly in

perspective: A discussion on underlying

Portugal. London: [s.n.], 2006. Tese

theoretical assumptions. «Journal of Aging

apresentada a London School of Economics

Studies» 19 (2005) 33-51.

and Political Science.

 HANK, Karsten – Spatial proximity and

 LOWENSTEIN, A., Ogg, J.(org) -

OASIS

contacts between elderly parents and

Project – Old Age and Autonomy: The

their adult children: A european

Role of Survice Systems and

comparison. Discussion Papers 510. Berlin,

Intergenerational Family Solidarity. Haifa:

2005.

Center for Research and Study of Aging,

 H AT T O N - Y E O , A l a n - P r o g r a m a s

2003.

intergeneracionales, solidaridad

 LOWENSTEIN, Ariela – Intergenarational

intergeneracional y cohesión social.

Solidarity: Strengthening economic and

«Colección Estudios Sociales» n.º 23 (2007)

social ties. Paper for UN Social Policy

123-140. JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 62

Division Expert Group Meeting. New York, 23-25 Outubro, 2007.

 MOTEL-KLINGEBIEL, Andreas, TESCHROEMER, Clemens, KONDRATOWITZ, Hans-Joachim Von – Welfare states do not crowd out the family: Evidence for mixed responsibility from comparative analyses. «Ageing & Society» 25 (2005) 863-882.

 NU - World Population Prospects: The 2006 Revision. New Work: Economic & Social Affairs, 2007.

 OMS - Active Ageing, A Policy Framework: A contribution of the World Health Organization to the Second United Nations World Assembly on Ageing. Madrid, 2002.

 REIN, Martin – Solidarity between generations: A five-country study of th social process of aging. Laxenburg: IIASA, 1994.

 SILVERSTEIN, Merril, GANS, Daphna, YANG, Frances M. - Intergenerational support to aging parents: The role of norms and needs. «Journal of Family Issues» 27: 8 (2006) 1068-1084.

 SZYDLIK, Marc – Intergenerational Solidarity and Conflict – two scenarios: conflict and autonomy. «Journal of Comparative Family Studies» Janeiro 1 (2008) 97-114.

 VAN DER PAS, Suzan – Intergenerational relationships of older adults: family structure, contact and norms. Amsterdam: Thela Thesis, 2006.

 JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Esperança et al. (2013) Provision of care for grandchildren and their implications on Quality of Life of Grandparents. Journal of Aging & Inovation, 2 (3): 63-81

ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

JULHO, 2013

PRESTAÇÃO DE CUIDADOS A NETOS E SUAS IMPLICAÇÕES NA QUALIDADE DE VIDA DOS AVÓS Provision of care for grandchildren and their implications on Quality of Life of Grandparents Cuidar a los nietos y sus implicaciones en la Calidad de Vida de los abuelos

Autores

Orlanda Esperança1, Manuela Leite2, Prazeres Gonçalves3 1

Masters Program in Psychogerontologist, Institute of Health Science/CESPU, Gandra,

Portugal 2 PhD, Psychology Department, Investigation Unit of Psychology and Health (UniPSA), Investigation Center of Health Science (CICS), Institute of Health Science/CESPU, Gandra, Portugal,3 PhD, Science Department, Investigation Unit of Psychology and Health (UniPSA), Investigation Center of Health Science (CICS), Institute of Health Science/CESPU, Gandra, Portugal Corresponding Author: orlandafesp@hotmail.com RESUMO OBJETIVOS: O principal objetivo consistiu na análise das repercussões da prestação de cuidados a netos, na Qualidade de Vida dos avós. MÉTODO: Foram aplicados, dois protocolos de investigação a 300 indivíduos. O protocolo A aos AC (N=150) e o B aos ANC (N= 150). Ambos eram compostos pela escala da Qualidade de Vida “WHOQOL- Bref”, e o A contemplava ainda o questionário “Avós/Avôs Cuidadores”. A amostra foi recolhida na região Norte do país. RESULTADOS: Os AC apresentam uma elevada Satisfação nos cuidados prestados (M=3.38), um bom Relacionamento com os pais do Neto (M=2.60), e Funcionamento Familiar (M=2.54). Destacam-se as Atividades de Ócio (M=2.47) pelo valor mais elevado nas tarefas de cuidados. A idade dos Avós correlacionase de forma negativa, fraca e significativa com os Cuidados Básicos (p<.001) e Instrumentais (p<.001). A idade dos netos também se correlaciona de forma negativa e estatisticamente significativa com os Cuidados Básicos (p=.001), a Satisfação para com os Cuidados (p=.012), e Funcionamento Familiar (p=.008). No que diz respeito à QV, os AC apresentam melhor QV comparativamente com os ANC, quer total (p=.001), quer nas várias dimensões: Meio Ambiente (p=.013), Física (p=.001), Relações Sociais (p<.001), Psicológica (p=.024). De forma geral, as várias dimensões do WHOQOL- Bref e do questionário Avós/Avôs Cuidadores, demonstram correlações positivas, e estatisticamente significativas com: Apoio no Estudo (p=.003), Atividades de Ócio (p<.001), Relacionamento Pais do neto (p=.044), e Funcionamento Familiar (p<.001). Por oposição, constataram-se correlações negativas, fracas e significativas com as Dificuldades nos Cuidados (p<.001), e com os Problemas de Saúde (p<.001), na medida em que tendem a diminuir. CONCLUSÃO: A prestação de cuidados a netos parece desempenhar um papel positivo na QV dos avós cuidadores, proporciona-lhes um sentimento de utilidade e continuidade PALAVRAS-CHAVE: Avós, netos, cuidados, qualidade de vida.

Abstract OBJECTIVES: The main aim was based on the analysis of the impact of caring for grandchildren on Grandparents' Quality of Life. METHODS: Two research protocols were implemented to 300 individuals. The A protocol to the CG (N = 150) and B to NCG (N = 150). Both were composed by the scale of the Quality of Life "WHOQOL-Bref", and the A contemplated also the quiz “Caregivers Grandparents ”. The sample was collected in the northern region of the country. RESULTS: The CG show high satisfaction towards the care provided (M = 3.38), a good relationship with the grandchild’s parents (M = 2.60), and Family Functioning (M = 2.54). It is highlighted the Leisure Activities (M = 2.47) for its higher value concerning the tasks of care. Grandparents' age correlates negatively, poorly and significantly with the Basic Care (p <.001) and Instrumental (p <.001). Grandchildren’s age also correlates statistically in a negative and significant way with Basic Care (p = .001), the Satisfaction with Care (p = .012), and Family Functioning (p = .008). Concerning the QL, the CG show better QL when compared with the NCG, not only totally (p = .001) but also in the following dimensions: Environment (p = .013), Physics (p = .001), Social Relationships (p <.001), Psychological (p = .024). In general, the several dimensions of the WHOQOL-Bref and of the questionnaire Caregivers Grandparents, show positive correlations, and statistically significant with the: Study Support (p = .003), Leisure activities (p <.001), Relationship grandchild’s parents (p = .044), and Family Functioning (p <.001). In contrast, were verified negative, weak and significant correlations with the Difficulties in Care (p <.001), and with the Health Problems (p <.001), which tend to decrease. CONCLUSION: Taking care of grandchildren seems to play a positive role in the Caregivers Grandparents’ QL, it gives them a sense of usefulness and continuity. KEYWORDS: Grandparents, grandchildren, health, quality of life.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 54

Introdução

num mesmo ambiente e espaço (Triadó, 2005), repercutindo-se no envolvimento e participação

Os progressos alcançados pelo

dos avós na vida familiar (Dias, Costa, &

desenvolvimento em geral, e pelas ciências da

Rangel, 2005), e nas relações entre avós, pais e

saúde em particular, são os responsáveis pelas

netos nas situações de cuidado e educação das

atuais tendências demográficas. Nas últimas

crianças (Dias, Hora, & Aguiar, 2010).

décadas, o aumento da esperança de vida,

Por sua vez, estas mudanças conduziram a

associada a uma diminuição da taxa de

transformações profundas na forma como se vê

natalidade, tem conduzido ao envelhecimento

o papel dos avós, sentindo-se a necessidade de

da população (DGS, 2006).

redefinir e reajustar, os diversos papéis no seio

Com o aumento significativo da esperança

da família (Osuna, 2006). Nunca os avós foram

média de vida, é cada vez mais comum a

tão jovens e ativos, encontrando-se muitas das

coexistência de várias gerações de uma mesma

vezes ainda integrados no mercado de trabalho,

família, pais, filhos, avós e até mesmo famílias

acarretando uma sobreposição de papéis e

onde há bisavós (Castiello, Villarejo & Truchado,

responsabilidades para estes avós. Estes estão

2007). Desta forma, as oportunidades de

mais presentes na vida dos netos, pela

interação e manutenção da relação avós netos

possibilidade de acompanhamento nas várias

[RAN] aumentaram (Triadó, Martinez & Villar,

fases do seu ciclo desenvolvimental, desde o

2000). Tal como nos referem Dias, Costa e

seu nascimento, infância, adolescência, até à

Rangel (2005): «…a maior expetativa de vida do

idade adulta (Ferland, 2006; Triadó, 2005).

ser humano tornou possível a convivência entre

Tornar-se avô/avó, é cada vez mais uma

avós e netos por um longo período, o que não

experiência da meia-idade, e não apenas dos

ocorria há algumas décadas atrás. Existe,

mais velhos (Szinovacz, 1998). Isto representa

inclusive, a possibilidade da convivência com a

uma transformação na imagem estereotipada

quarta geração, a dos bisavós…» ( p. 159).

dos avós, coligada à idade avançada e saúde

A vivência dos avós enquanto tema de

precária. Estes deixam de ser vistos como

investigação, emergiu na década 40 e 50,

passivos, debilitados e pouco disponíveis,

aumentando consideravelmente na década 80

passando a ser considerados elementos ativos

(Smith, 1991). Segundo Gratton e Haber (1996),

(Pinazo, 1999), constituindo uma fonte de

este interesse deve-se: ao aumento da

produção de bens ou serviços: voluntários como

esperança média de vida, ás novas estruturas

cuidar dos netos e remunerada através de

familiares, à participação da mulher no mercado

trabalho sénior (Rozario, Morrow & Hinterlong,

de trabalho, que levam à necessidade de

2004). Ao cuidar dos netos, permitem maior

encontrar espaços de supervisão para os seus

disponibilidade e otimização do desempenho

filhos, sendo os avós uma das alternativas

profissional aos filhos. Para além disso, a sua

possíveis (Dias & Silva, 1999). Estes fatores,

“jovialidade”, proporciona-lhes um maior

conduziram a alterações nas estruturas

contexto relacional (Castro, 1998).

familiares, através da verticalização familiar,

São várias as investigações, que têm salientado

possibilitando a convivência de mais gerações

duplo contributo dos avós no desenvolvimento

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 55

dos netos: direto enquanto parceiros interativos,

voltadas para o processo de envelhecimento

prestadores de cuidados primários e apoio

(Sampaio, 2008). Espera-se que sejam os

emocional, confidentes, companheiros,

principais agentes socializadores das crianças,

transmissores do legado familiar e nacional,

precedido dos pais, tendo em consideração que

fornecedores de estimulação cognitiva e afetiva;

a transformação das mesmas num ser social,

e indireto enquanto fontes de apoio social e

constitui uma tarefa familiar (Gomes, 1994). É

material aos pais dos netos (Creasey &

claro que a proximidade geográfica entre os pais

Koblewski, 1991; Hamm & Milan, 2003; Smith,

e os avós, facilita este processo (Dias & Silva,

1995; Tinsley & Parke, 1987; Tomlin, 1998). São

2003).

ainda considerados, veículos de transmissão

Além da função socializadora, os avós são fonte

intergeracional de competências parentais

de apoio emocional e instrumental (Araújo &

(Smith, 1995).

Dias, 2002), sobretudo das crianças em idade

Os papéis assumidos pelos avós, tendem a ser

escolar, assumindo muitas vezes, papeis

diferentes dos desempenhados pelos pais,

vinculados ao acompanhamento dos netos na

geralmente associados à função de educadores

escola na ausência dos pais. Não obstante, a

(Castro & Ruschel, 1998). Os avós, podem

casa dos avós constitui um espaço para a

desempenhar um papel mais tolerante,

construção, e a vivência das relações de

assumindo uma posição única que lhes permite

amizade, cumplicidade, afeto e brincadeira

dar amor, conselhos e ser companheiro (Hamm

(Barros, 1987).

& Milan, 2003). É esta possibilidade de

Segundo Barranti (1985), a relação dos avós

acompanhamento dos netos, isenta de

com os netos está associada a um papel

responsabilidades parentais, que torna

caloroso e amigável, caracterizado pela

indubitavelmente o estatuto dos avós tão

gratuidade de atenção amor e carinho. A criança

especial (Ferland, 2006).

que convive e dialoga com os avós, aprende a

Para os avós, os netos são objeto de um amor

valorizar a sua cultura e os valores, tendo em

incomensurável, e fonte de renovação de si

consideração o contínuo entre o processo de

mesmos e da família, representando uma

viver e envelhecer (Mendes, 2004).

oportunidade de fazer tudo o que não se pôde

Nas trocas geracionais, os avós atuais têm

fazer com os próprios filhos (Ferland, 2006).

características diferentes das gerações

Para além disso, o vínculo com os netos tende a

anteriores, sendo os avós mais jovens

ser idealizado, servindo como uma defesa

tendencialmente mais divertidos e participativos.

contra as aflições perante a morte inevitável. É a

Os mais velhos, para além de se revelarem

oportunidade de reparar a própria vida através

mais distantes, reclamam ajuda por parte dos

da imortalidade genética por meio de uma

netos (Pinazo, 1999).

identificação seletiva das qualidades dos netos

Efetivamente não se pode escolher o momento

(Colarusso,1990).

em que se será avó, mas pode-se escolher o

Os avós da contemporaneidade, são mais ativos

tipo de relação que se deseja estabelecer com

e saudáveis que os predecessores, assumem

os netos. Tal dependerá de fatores como a

novos papéis, muito além de demandas

relevância do papel de avó/ avô no seu sentido

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 56

de identidade, ou seja, a necessidade de se ser

cresce a sua relação com os avós evolui. Nos

relembrado no futuro; a necessidade de dar

primeiros anos de vida da criança (0 aos 5

continuidade geracional à família; o valor que

anos), o laço afetivo entre avós-netos manifesta-

atribui ao facto de lhe ser permitido participar na

se através de ternura e de afeto que se

educação dos netos e pela importância atribuída

estabelece sobretudo durante o jogo e

ao reviver experiências de vida passadas

atividades quotidianas. O amor e afeto podem

(Ferland, 2006).

assumir diversas formas, e deixar recordações

Tendo por base estes pressupostos Osuna

muito variadas na memória do neto. Dos 5 aos

(2006), considera a existência de quatro estilos

12 anos, em idade escolar, a criança gosta de

de avós, que variam ao longo da vida e diferem

contar coisas sobre si e sente-se interessante

entre si, segundo cada neto. São elas: (1) a

quando os avós lhe dedicam o tempo

permissiva – que se preocupam em fazer o que

necessário para a ouvirem. Neste período os

é moralmente correto com seus netos,

seus interesses expandem-se, a criança é

mimando-os e sendo tolerantes; (2) a simbólica

curiosa em relação ao que passa ao seu redor e

– preocupa-se em fazer o que é moralmente

tem uma sede de conhecimentos que procura

correto; (3) a individualista – vê nos netos o

satisfazer, podendo esta, ser satisfeita pelos

caminho para se manter ou converter em

avós. Contudo, dos 12 aos 18 anos, no mundo

solitária; e (4) a tirana – coloca ênfase no aspeto

da adolescência e construção da sua

da relação em ser avó-general.

personalidade, há um distanciamento dos pais

Para Neugarten e Weinstein (1964), os avós

por uma emancipação afetiva e financeira. As

podem ser categorizados como: (1) Formais: os

prioridades são dirigidas aos amigos, tendo

que apresentam um comportamento rígido,

menos tempo para os avós, podendo no entanto

tradicional e autoritário; (2) Brincalhão: estilo

o adolescente, nomear um dos avós como

relaxado e não autoritário na relação com os

confidente.

netos, percepcionando-os como fonte de prazer;

Salienta-se o facto de nem sempre a RAN, se

(3) Substituto: os que assumem

pautar pelo regozijo e harmonia. Se por um

responsabilidades e os cuidados diários dos

lado, a presença das avós pode ser percebida

netos: (4) Reservatório de sabedoria: prestam

como prazerosa e educativa, por outro, pode ser

informação sobre as raízes familiares e são os

considerado como conflituosa, já que implica

guardiões da história familiar; e (5) Distante:

confronto de poder e autoridade pelas

raramente vêem os netos, eventualmente em

diferenças na conceção das práticas educativas

ocasiões como natal, aniversários, casamentos

exercidas pelos pais (Falcão & Salomão, 2005).

e funerais.

Também para os avós, nem sempre constitui

A dialética relacional entre avós e netos para

fonte de prazer. A inserção da mulher no

Ferland (2006), assume diferentes contornos à

mercado do trabalho, e subsequentes

medida que o desenvolvimento se produz, pelo

reestruturações familiares, transformaram o

que é imperativo entender os diferentes tipos de

caráter voluntário e esporádico do papel de

relacionamento numa perspectiva

alguns avós, em atos diários que envolve

desenvolvimental. Á medida que a criança

esforço físico, emocional e económico de forma

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 57

significativa (Miguel, Palomares, & Blanco,

cuidados a um dos netos era condição

2012). Nestas circunstâncias, os avós são

obrigatória. Nos ANC, estes não podiam prestar

impelidos a assumirem a responsabilidade de

cuidados de forma sistemática a nenhum dos

criar e educar os netos, seja auxiliando os filhos

netos no momento da recolha da amostra.

em tarefas domésticas, seja substituindo-os na

Na caracterização da amostra, verifica-se em

tarefa de educar e cuidar dos netos (Triadó,

ambos os grupos um predomínio do género

Villar, Solé, Osuma & Celdrán, 2006).

feminino (AC 84.7%; ANC 56.7%), e da

Por conseguinte, apesar do relacionamento

condição de casado (AC= 74.7%; ANC= 68%),

intergeracional, e o prazer no papel de avó

precedido dos viúvos (AC= 16%; ANC= 21.3).

poderem ajudar a melhorar a qualidade de vida

No que concerne à idade, os AC apresentam

do idoso, compensando a vida solitária parece

uma média de 64.78 anos (DP=7.02), oscilando

que na forma de estabelecimento da RAN, o

entre os 39 e os 77 anos. Análogamente, os

grau de responsabilização no seu

ANC apresentam uma média de idades de

desenvolvimento e educação, poderão influir no

62.61 anos (DP=6.57; Min:45 anos, Max: 83

nível de satisfação para com o desempenho do

anos).

papel de avós e subsequentemente na sua

As habilitações literárias, revelaram que no

qualidade de vida (Emick & Hayslip, 1999 in

grupo AC o grau de escolaridade é igual ou

Veleda, Neves, Baisch, , Santos, & Soares,

inferior a 6 anos (65.3%) com uma média de

2006).

6.10 anos (DP=3.94), e no grupo ANC a maioria

OBJETIVOS

apresenta um grau igual ou inferior a 5 anos

O principal objetivo, consistiu na análise das

(62.3%) com uma média de 4.84 anos

repercussões da prestação de cuidados a netos

(DP=3.74). Salienta-se o nível baixo de

na Qualidade de Vida dos avós, tendo-se

analfabetismo (AC=8%; ANC=10%).

definido como objetivos específicos, a

Quanto ao estatuto ocupacional, a amostra é

compreensão da frequência dos cuidados

maioritariamente reformada

prestados aos netos, sentimentos, perceções,

40.70%;ANC= 42%), seguindo-se a condição de

satisfação e dificuldades decorrentes dos

doméstica no grupo AC (25.3%), e

mesmos.

trabalhadores a tempo inteiro no grupo ANC

MÉTODO

(30%). Note-se que no grupo AC (76.7%) não

Amostra

possuem uma atividade profissional. A análise

Trata-se de uma mostra de conveniência,

do rendimento mensal familiar, revelou que o

recolhida em vários pontos da região Norte do

grupo AC aufere melhores rendimentos,

país. É constituída por 300 sujeitos, divididos

comparativamente com o grupo ANC, tendo em

em dois grupos, Grupo de avós que prestam

consideração a percentagem de rendimentos

cuidados aos netos – avós cuidadores (AC)

inferiores a 300€ (AC=10%; ANC=19.3%), e

(n=150), e o grupo de avós não cuidadores

superiores a 1200€ (AC=26.7%; ANC=16.7%).

(ANC) (n=150). Como critério de inclusão, foi

No que concerne à avaliação subjetiva do seu

defenido para ambos os grupos, a condição de

estado de saúde, verifica-se no grupo AC que a

ser avô, sendo que no grupo AC a prestação de

maior parte dos sujeitos consideram ter uma

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

(AC=

Volume 2. Edição 3


Página 58

saúde “regular” (48%), precedida de

facetas consta numa descrição de um estado,

“boa” (35.3%) e “excelente” (11.3%). Apenas um

comportamento, capacidade, perceção ou

número muito reduzido (4.7%) consideram o seu

experiência subjetiva, que compõem os 4

estado de saúde “mau”. Ao nível da “perceção

domínios descritos. É constituído por 26 itens,

comparativa do estado de saúde com pessoas

sendo que, 24 itens conduzem à avaliação de

da mesma idade” a maioria avalia a sua saúde

uma dimensão específica da QV e os restantes

como similar à saúde dos indivíduos da sua

2 itens representam questões gerais (uma

idade (78%), sendo que (17.3%), consideram-na

referente à avaliação global da QV e outra à

superior.

satisfação com a saúde) que não são

Quanto à caracterização dos netos alvos de

contabilizadas nos domínios. As respostas ao

cuidados, 56% são do género feminino, com

questionário são obtidas através da escala do

idades compreendidas entre 1 e 13 anos,

tipo Likert, em que o participante indica a sua

representando uma média de idades 7.49 (DP=

concordância ou discordância, pontuada de 1 a

3.2).

5. O resultado de cada domínio é calculado com

A

linhagem

dos

netos

é

predominantemente materna (58%).

base na média dos resultados obtidos nas

Instrumentos

questões que constituem o instrumento.

Como meio de operacionalização do presente

O Q u e s t i o n á r i o Av ó s / Av ô s C u i d a d o r e s

estudo, e coerentemente com os objetivos e

(Esperança & Leite, 2010), corresponde à

natureza da investigação, foram elaborados e

versão portuguesa do questionário “Abuelos

aplicados dois protocolos de investigação:

Cuidadores” (Triadó, Celdrán, Conde, Montoro,

Protocolo A, direcionado aos AC, e Protocolo B

Pinazo & Villar, 2008).Trata-se de um

para os ANC. Ambos os protocolos eram

instrumento que permite descrever e caraterizar

constituídos comummente pelo Consentimento

os cuidados prestados por avós/avôs aos seus

Informado, o questionário Sociodemográfico e o

netos, através de várias dimensões (e.g. tipo de

WHOQOL – Bref, sendo que, o protocolo A

cuidados, intensidade, circunstâncias,

contemplava ainda o questionário “Avós/avôs

satisfação, dificuldades, estado de saúde,

Cuidadores”.

ajudas nos cuidados prestados, funcionamento

O Questionário Sóciodemográfico (Esperança &

familiar, e comportamentos problemáticos do

Leite, 2010), permitiu a caracterização dos avós,

neto cuidado).

sendo uma mais-valia para a análise das

Procedimento:

variâncias sociais e demográficas.

Para operacionalização do presente estudo,

O Questionário da Qualidade de Vida -

tomou-se em linha de conta determinados

WHOQOL- Bref (Vaz Serra, Canavarro, Simões,

procedimentos, nomeadamente, a tradução e

Pereira, Gameiro & Quartilho, 2006), teve como

retroversão do questionário Abuelos Cuidadores

objetivo avaliar a QV Total (máximo de 100

para a língua portuguesa, a aplicação dos

pontos), agrupada em quatro dimensões

instrumentos, e por fim o tratamento estatístico

individualizadas: meio ambiente, física,

dos dados recolhidos.

psicológica, relações sociais. É composto por 24

O processo de tradução e retroversão foi

facetas da QV, sendo que, cada uma das

realizado em duas fases. Primeiramente, a

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 59

Tradução Inicial, consistiu na tradução direta da

No que concerne à prestação de cuidados aos

versão original espanhola do questionários

netos, verifica-se que esta ocupa em média 5.34

Abuelos Cuidadores para a língua portuguesa.

dias/semana (DP=1.37), num total médio de

Na segunda fase, realizou-se a Retroversão,

24.37 horas/semana (DP=12.089). As “questões

sendo a mesma efetuada por um tradutor oficial

laborais dos filhos” (66.7%), surgem como

para a língua espanhola, sem conhecimento do

principal causa da prestação semanal de

questionário original e sem formação na área da

cuidados aos netos, verificando-se que a

saúde. Este processo determinou a

maioria considera possuir uma relação de

compatibilidade e adequabilidade do

qualidade com os pais dos netos (“boa” - 47.3%;

instrumento à lingua portuguesa, mantendo-se

“excelente” -39.3%). Apenas uma ínfima parte

por conseguinte, a integridade do instrumento

(N=4) descrevem a relação como “má” ou “muito

inicial.

má”, e que provavelmente decorre/motiva a

A recolha dos dados ocorreu em vários pontos

custódia legal dos netos.

da região Norte do país, sendo a entrega e

A Tabela 1, sintetiza os resultados obtidos no

recolha dos protocolos efetuada pela

questionário “Avó/avôs Cuidadores”, permitindo-

investigadora. Explicado os objetivos e obtido o

nos analisar a média de frequência de respostas

consentimento informado, estes foram auto-

a um conjunto de itens que caracteriza, os

preenchidos pelos avós, exceptuando os

cuidados prestados pelos AC aos netos, assim

analfabetos os quais foram preenchidos pela

como, um conjunto de aspetos inerentes da

investigadora após leitura em voz alta.

prestação de cuidados.

Tabela 1- Distribuição de frequências das dimensões do Questionário Avós/Avôs Cuidadores, desenvolvidas pelos AC (N=150). Media (1-4) 2.26 2.21 2.28 1.96 2.47 2.38 1.68 1.62 1.94 2.60 3.38 1.32 2.54 1.99

Dimensões do Questionário Avó/Avôs Cuidadores Tarefas de cuidados Cuidados Básicos Cuidados Instrumentais Apoio Estudo Atividades Ócio Disciplina Comportamentos problemáticos do neto Ajuda nos cuidados Sentimento de Responsabilidade Relacionamento Pais do Neto Satisfação nos cuidados Dificuldades decorrentes nos cuidados Funcionamento Familiar Problemas Emocionais

No tratamento dos dados recorreu-se ao software informático SPSS, versão 21,

Relativamente às Tarefas de Cuidados levadas

utilizando-se a estatística descritiva (M, DP,

a cabo pelos AC, as Atividades de Ócio

frequências) e inferencial paramétrica (teste t

(M=2.47) foram as que obtiveram valores mais

para amostras independentes) e correlacional

elevados, seguindo-se a Disciplina (M=2.38);

(do tipo Pearson).

Cuidados Instrumentais (M=2.28), Cuidados

RESULTADOS

Básicos (M=2.21), e finalmente o Apoio ao

Caracterização da RAN

Estudo (M=1.96).

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 60

Nas Atividades de Ócio, o maior destaque está

Analogamente, o nível de Ajuda nos Cuidados,

associado a atividades como: “passearem

também é baixa (M=1.62), e quando existe,

juntos” (M=3.35), assim como “verem

estas provêm essencialmente da “ajuda do

televisão” (M=2.91) (70%). Paralelamente, as

parceiro” (M=2.62) e de “outros familiares com

menos executadas pelos AC, prendem-se

que convivem” (M=2.58), sendo escassos os

essencialmente com tarefas de “pintar/desenhar

casos em que recebem “assistência legal/

juntos” (M=1.75).

jurídica” (0.7%); “ajuda do estado ou outras

Ao nível dos Cuidados Básicos, constatamos

instituições” (7.3%); ou “ajuda económica ou

que a tarefa mais executada pelos AC é “dar-lhe

material dos meus filhos” (28.7%).

de comer” (M=2.68) (66%), e as menos

No que concerne ao Sentimento de

executadas estão associadas a “dar-lhe

Responsabilidade, verifica-se um resultado

banho” (M=1.93), e “acordá-lo de

moderado (M=1.94), constatando-se que grande

manhã” (M=1.97).

parte dos AC (M=2.45), se considerarem na

Quanto aos Cuidados Instrumentais, as tarefas

“obrigação de cuidar do neto(a)”. Para além

incidem sobretudo na preparação da comida

disso, 95.3%, nunca se sentiram “incomodados/

(M=2.88), e vigilância (M=2.64), por oposição a

as quando cuido do meu neto(a) em lugares

“lavar e passar roupa” (M=1.97) e “levá-lo ao

públicos” (), nem consideram ser “uma desonra

médico” (M=1.82).

para a minha família ter de cuidar do meu

Em termos de Disciplina, verifica-se que os AC

neto(a)” (98.7%).

tendem a não castigar (M=1.73), nem dar

O Relacionamento com os Pais do neto é

palmadas (M=1.57), apesar de exercerem ações

considerado como bom (M=2.60), sentindo-se

de repreensão (M=2.41). Contudo, são os

apoiados pelos mesmos na prestação de

elogios (M=3.29), e as recompensas (M=2.89),

cuidados aos netos (M=3.17), falando com os

os mais frequentes na ação disciplinar.

mesmos acerca de assuntos que afetam o neto

No Apoio no Estudo, os AC tendem

(M=2.99), orientando-os quanto forma de

essencialmente a controlar a execução dos

tratamento (M=2.29). Por conseguinte, o nível

trabalhos de casa (M=2.07), com uma menor

de conflituosidade é relativamente baixo

implicação ao nível de “ajuda a fazer os

(M=1.94), comparativamente às outras

TPC” (M=1.85).

dimensões.

Relativamente à caraterização dos

O nível de Satisfação nos Cuidados é elevado

Comportamentos Problemáticos do neto alvo de

(M=3.38), considerando que “o neto(a) é a

cuidados, verifica-se uma média baixa (M=1.68)

alegria da minha casa” (M=3.51), e de aferirem

da ocorrência dos mesmos, encontrando-se

que se “deixasse de tomar conta do neto(a)

associados à sua irrequietude (“muito

sentiriam muito” (M=3.53).

irrequietos” (M=2.37). Salienta-se a baixa

Quanto às Dificuldades Decorrentes dos

ocorrência de problemas mais disruptivos, tais

Cuidados, verifica-se que os AC não

como “Insulta ou diz palavrões” (M= 1.16); “é

apresentam grandes dificuldades (M=1.32).

agressivo” (M=1.20).

Salienta-se o facto de a maioria ter classificado como “nunca” as afirmações: “o dia em que

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 61

deixar de cuidar do neto(a) será uma

Os Cuidados Básicos, correlacionam-se de

libertação” (96%); “cuidar do meu neto/a tem

modo positivo, fraco e significativo com um

criado problemas de espaço na minha

aumento: das Atividades de Ócio (r=.312; p<.

casa” (97.3%).

001), da Disciplina (r=.343; p<.001), os

Quanto ao Funcionamento Familiar, estes

Comportamentos Problemáticos dos netos (r=.

consideram possuir um bom funcionamento

186; p=.023), Sentimento de Responsabilidade

(M=2.54), coligado à existência de confiança

(r=.218; p=.003), Relacionamento com os pais

uns nos outros (M=3.15), e há existência de

d o n e t o ( r = . 2 0 7 ; p < . 0 11 ) e c o m o

sentimentos negativos na família (M=1.53).

Funcionamento Familiar. Ressaltando uma

Relativamente a Problemas Emocionais, os AC

correlação positiva, moderada e significativa

(M=1.99) revelam uma avaliação bastante

com o aumento dos Cuidados Instrumentais (r=.

positiva apesar da média, isto, tendo em

682; p<.001).

consideração que (62%) nunca se sentiram

De igual modo, os Cuidados Instrumentais

sozinhos; (66.7%) nunca consideraram “que a

correlacionam-se de modo positivo, fraco e

vida não vale a pena ser vivida”, (46.7%) não se

significativo com o aumento: do Apoio no Estudo

consideram menos úteis à medida que

(r=.296; p<.001), das Atividades de Ócio (r=.

envelhecem, e (59.3%) consideram por vezes

336; p<.001), da Disciplina (r=.470; p<.001),

que “à medida que envelhece, as coisas são

Sentimento de Responsabilidade (r=.298; p<.

melhores do que se esperava”.

001), Problemas de Saúde (r=.167; p=.041) e Funcionamento Familiar (r=.260; p=.002). Ou

Estudo Correlacional entre As dimensões do

seja, quanto mais evidentes, e necessários os

Questionário Avós Cuidadores e outras

Cuidados Instrumentais, maior é a tendência

Variáveis

para aumentar os cuidados ao nível do Apoio no

A Ta b e l a 2 , a p r e s e n t a - n o s o e s t u d o

Estudo, assim como, as Atividades de Ócio,

correlacional entre as várias dimensões do

Disciplina, o Sentimento de Responsabilidade e

questionário “Avós/Avôs Cuidadores”

funcionamento familiar.

Tabela 2- Estudo Correlacional do tipo Pearson, entre as dimensões do Questionário Avós/Avôs Cuidadores. Dimensões do questionário Avós/ Avôs Cuidadores CB

CI

AE

AO

DSP

KN

AJC

STR

RPN

STF

PS

DFC

CB

1

CI

.682*** 1

AE

.061

AO

.312*** .336***

.395***

1

DSP

.343*** .470***

.211**

.340***

1

KN

.186*

.170*

-.006

.120

.267**

1

AJC

.140

.106

.055

.084

.184*

-.036

1

STR

.218**

.298***

.100

.074

.280**

-.038

.416

1

RPN

.207*

.123

.225**

.156

.174*

-.002

.300***

.362***

1

STF

.130

.128

.012

.391***

.219**

-.139

.056

.096

-.099

1

DFC

-.041

.056

-.072

-.196*

-.015

.329***

-.035

-.003

-.197*

-.430*** 1

PS

.142

.167*

-.118

-.104

.098

.360**

-.142

-.088

-.286*** .034

.381***

1

FM

.244**

.260**

.045

.243**

.448***

-.030

.160

.187*

-.007

-.141

-.090

.296***

1

.498***

* p<0.05, ** p<0.01, *** p<0.001 JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 62

Em termos de Apoio no Estudo, verifica-se a

significativa, à medida que esta aumenta,

existência de uma correlação positiva, fraca e

aumenta paralelamente o Sentimento de

significativa com as necessidades de apoio em

Responsabilidade (r=.416; p<.001), o

termos de Disciplina (r=.211; p=.009), Atividades

Relacionamento com os pais do neto (r=.300;

Ócio (r=.395; p<.001) e Relacionamento com os

p<.001) e o Funcionamento Familiar (r=.161; p=.

pais do neto (r=.225; p=.006).

046). O Aumento da Responsabilidade, leva ao aumento do Relacionamento Familiar (r=.362;

Por outro lado, as Atividades de Ócio, levam a

p<.001) e Funcionamento Familiar (r=.187; p=.

uma maior: Satisfação nos cuidados prestados

022), sendo igualmente pautadas com

(r=.391; p<.001), exigência em termos de

diferenças significativas.

Disciplina (r=.340; p<.001), e Funcionamento Familiar (r=.243; p=.003), sendo estas relações

O facto dos AC evidenciarem um

estatisticamente significativas. Por sua vez o

Relacionamento positivo com os pais do neto

aumento das Atividades de Ócio diminui de

alvo de cuidados, reflete-se numa associação

modo significativo as dificuldades decorrentes

negativa, fraca e significativa a diminuição das

dos cuidados prestados (r=-.191; p=.016).

Dificuldades nos Cuidados decorrentes dos

Ao nível da Disciplina, estão patentes

cuidados prestados pelos AC aos netos (r=-.

correlações positivas, fracas e significativas, à

197; p=.066), e diminuição dos problemas de

medida que esta aumenta, tendem a aumentar

saúde dos AC (r=-.286; p<.001).

os Comportamento problemático dos netos (r=.

A Satisfação com os Cuidados prestados,

267; p=.001), bem como, a Ajuda nos Cuidados

correlaciona-se de forma negativa, fraca e

(r=.184; p=.024), o Sentimento de

significativa com a diminuição das Dificuldades

Responsabilidade

nos Cuidados

(r=.280; p<.001), o

(r=-.430; p<.001) e de

Relacionamento com os pais do neto (r=.174;

forma positiva, fraca e significativa com o

p=.034) , a Satisfação nos cuidados prestados

aumento do Funcionamento Familiar (r=.498;

(r=.219; p=.007) e o Funcionamento Familiar

p<.001).

(r=.448; p<.001). As Dificuldades decorrentes dos cuidados, Os Comportamento Problemático do neto,

contribuem para a diminuição do funcionamento

revelou uma correlação positiva, fraca e

familiar (r=-.141; p=.040), por oposição, ao

significativa com: as dificuldades nos cuidados

aumento de Problemas de Saúde dos AC (r=.

prestados

381; p<.001), de modo significativo.

(r=.329; p<.001), e problemas

de saúde (r=.360; p<.001). Ou seja, os comportamentos problemáticos, tendem a

A tabela seguinte, permite-nos um estudo

aumentar as dificuldades nos cuidados, e ao

correlacional entre as várias dimensões

nível dos problemas de saúde nos AC.

avaliadas pelos questionário “Avós/Avôs Cuidadores” e as idades dos avós e netos.

No que concerne à Ajuda nos cuidados, esta correlaciona-se de forma positiva, fraca e JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 63 Tabela 3 – Correlação linear de Pearson entre a idade dos AC (N=150) e dos netos com as dimensões do Questionário Avós/Avôs Cuidadores. Idade

Avós/Avôs Cuidadores

Avós

Tarefas de Cuidados Cuidados Básicos Cuidados Instrumentais Apoio Estudo Atividades Ócio Dimens ões do Disciplina Questi Comportamentos problemáticos do Neto onário Ajuda nos cuidados Avós/ Avôs Sentimento de responsabilidade Cuidad Relacionamento com Pais do Neto ores Satisfação com os cuidados Dificuldades nos cuidados Funcionamento familiar Problemas de Saúde Problemas emocionais

-.335*** -.354*** .027 -.016 -.088 -.018 -.146 -.052 .149 -.045 -.063 -.160 -.101 -.086

Netos -.274** -.003 .452*** .012 .089 -.052 .003 .043 .020 -.204* .097 -.215** .018 .072

* p<0.05, ** p<0.01, *** p<0.001

A análise da Tabela 3 permite-nos constatar que

Cuidados (r=-.204; p=.012), e diminuição do

são poucas as dimensões que apresentam

Funcionamento Familiar

correlações estatisticamente significativas entre

Por sua vez, o aumento da idade dos netos,

as várias dimensões do questionário, e a idade

revela uma correlação positiva, fraca e

dos AC e respetivos netos.

significativa com o Apoio ao Estudo

(r=-.215; p=.008).

(r=.

452; p<.001). Verificam-se correlações negativas, fracas e estatisticamente significativas com a idade dos

Estudo comparativo entre os AC e ANC no

AC ao nível dos Cuidados Básicos (r=-.335; p<.

que concerne aos resultados obtidos no

001), Cuidados Instrumentais (r=-.354; p<.001).

WHODOL-Bref

Com o aumento da idade dos AC, há uma diminuição destes cuidados por parte dos avós.

Na caraterização da QV dos grupos, AC e ANC

Analogamente, o mesmo é corroborado em

(Tabela 4), os resultados encontrados revelam

relação à idade dos netos ao nível dos Cuidados

diferenças estatisticamente significativas entre

Básicos pela sua diminuição (r=-.274; p=.001),

ambos os grupos.

paralelamente à diminuição da Satisfação nos Tabela 4- Teste t Student para amostras independentes, AC e ANC, relativamente ao WHOQOL – Bref e respetivas dimensões. WHOQOL - Bref QV Total Relações Sociais D i m Psicológica ens ões Física

Meio Ambiente

Tipo de Avó/Avô AC, N= 150 ANC, N= 150 M (DP) M (DP) 89.05 (10.50) 84.03 (14.80) 58.56 (19.64) 49.28 (22.31)

t (298)

P

3.39 3.82

** ***

60.33 (9.93)

57.39 (12,35)

2.28

*

66.33 (13.96)

60.45 (17.07)

3.27

**

56.13 (11.52)

52.35 (14.45)

2.50

*

* p<0.05, ** p<0.01, *** p<0.001 JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 64

Ao nível da escala de QV Total, os resultados

Relativamente ás Tarefas de Cuidados, levadas

médios da escala revelam que os AC (M= 89.05;

a cabo pelos AC aos seus netos, constatamos

DP= 10.50) apresentam uma QV Total superior,

correlações positivas, fracas e estatísticamente

aos ANC ANC (M= 84.03; DP= 14.80), sendo

significativas entre o Apoio ao Estudo ao nível

estas diferenças estatisticamente significativas (t

da QV Total (r=.243; p=.003), bem como nas

(298)=3.39, p=.001). O mesmo se verifica

dimensões: Ambiente

relativamente às diferentes dimensões da QV:

Psicológica (r=.222; p=.006) e Relações Sociais

Relações Sociais (AC M= 58.56; DP=19.64;

(r=.172; p=.035). As Atividades de Ócio, também

ANC M= 49.28; DP= 22.31); Psicológica (AC M=

se correlacionam de forma fraca a moderada,

60.33; DP= 9.98; ANC M= 57.39; DP=12.35);

positiva e estatísticamente significativa com a

Física (AC M= 66.33; DP= 13.96; ANC M=

QV Total (r=.466; p<.001); dimensão Física (r=.

60.45; DP=17.07); e Meio Ambiente (AC M=

236; p=.004), Psicológica (r=.312; p<.001); e

56.13; DP= 11.52; ANC M= 52.35; DP=14.45). À

nas Relações Sociais (r=.395; p<.001).

semelhança da QV Total,também todas as

Destacando-se ainda, uma correlação positiva e

dimensões apresentam diferenças

moderada na dimensão Meio Ambiente (r =.526,

estatísticamente significativas: Relações Sociais

p<.001).

(t (298)=3.82, p<.001); Psicológica (t

O Relacionamento com os pais dos netos,

(298)=2.28, p=.024); Física (t (298)= 3.27, p=.

revelam uma correlação positiva, fraca e

001); e Meio Ambiente (t (298)=2.50, p=.013)

significativa com a QV Total (r=.165; p=.044), e

A Tabela 5, apresenta-nos os resultados obtidos

na dimensão Física (r=.244; p<.001). Quanto

no estudo correlacional, entre as dimensões dos

melhor tende a ser o relacionamento com os

cuidados prestados (avós/avôs cuidadores) e a

pais dos netos, melhor tende a ser a QV dos

qualidade de vida (Whoqol-Bref) dos AC.

AC.

(r=.289; p<.000),

Tabela 5- Estudo Correlacional de Pearson, entre as dimensões do Questionário Avós/Avôs Cuidadores e a escala WHOQOL – Bref, no grupo AC.

Total

WHOQOL – Bref Dimensões Amb. Física Psic.

Social

.040 .066 .243** .466*** .037 -.087 .019 .051 .165* .427*** -.476*** .360*** -.329*** -.377***

-.043 .026 .289*** .526*** .066 -.073 -.013 .056 .049 .392*** -.357*** .327*** -.099 -.193*

.072 .046 .172* .395*** .175* .014 .006 -.023 .040 .502*** -.403*** .405** .142 -.197*

Avós/Avôs Cuidadores Tarefas de Cuidados: Cuidados Básicos Dim Cuidados Instrumentais ens Apoio Estudo ões Atividades Ócio Que stio Disciplina

nári Comportamento problemático do Neto o Ajuda nos cuidados Avô s/ Sentimento de Responsabilidade Avó Relacionamento com Pais do Neto s Satisfação com os cuidados Cuid Dificuldades nos cuidados ador Funcionamento familiar es Problemas de Saúde Problemas emocionais

.040 .096 .106 .236** -.094 -.075 -.012 .058 .244** .193* -.326*** .237** -.502*** -.405***

.079 .030 .222*** .312*** .052 -.093 .101 .039 .122 .342*** -.460*** .196* -.183* -.336***

* p<0.05, ** p<0.01, *** p<0.001

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 65

Na Satisfação decorrente dos cuidados

018), Física (r=-.405; p<.001), Psicológica (r=-.

prestados, está patente uma correlação positiva,

336; p<.001) e Relações Sociais (r=-.197; p=.

fraca igualmente significativa ao nível global, QV

016). A QV tende a aumentar face à diminuição

Total (r=.427; p<.001), e na dimensão Física (r=.

dos problemas emocionais.

342; p<.001) e Meio Ambiente (r=.392; p<.001). Destacando-se uma correlação positiva e

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

moderada na dimensão das Relações Sociais

O objetivo do presente estudo, incidiu, na

(r=.502; p<.001).

compreensão das atribuições e frequências dos

Quanto às Dificuldades inerentes, depara-se

cuidados prestados aos netos, sentimentos e

com diferenças significativas nos cuidados

perceções (satisfação e dificuldades) inerentes

prestados aos netos. Pois evidencia-se uma

à prestação de cuidados, no sentido de

correlação negativa e fraca na QV Total (r=-.476;

perceber o impacto que os mesmos têm na QV

p<.001), e respetivas dimensões: Meio

dos AC. Neste contexto, realizou-se uma análise

Ambiente (r=-.357; p<.001), Física (r=-.326; p<.

comparativa com um grupo de ANC, ao nível da

001), Psicológica (r=-.460; p<.001) e Relações

QV.

Sociais (r=-.403; p<.001), igualmente

De acordo com Araújo e Dias (2002), as

significativas. O registo torna evidente que

atividades realizadas entre avós e netos,

quanto menor são as dificuldades nos cuidados,

depende de um conjunto de variáveis, das quais

maior tende a ser a QV dos AC.

se destaca a idade e género dos avós e netos, a

Ao nível do Funcionamento Familiar, verificamos

linhagem familiar, a situação profissional e as

uma correlação positiva, fraca e significativa, de

relações familiares.

forma análoga em toda a escala, ao nível global

Iniciemos a discussão, caraterizando

QV Total (r=.360; p<.001), ambiente (r=.327; p<.

sumariamente os AC, comparativamente aos

001), física (r=.237; p<.001), psicológica (r=.196;

ANC. Trata-se de uma população relativamente

p=.016) e social (r=.405; p<.001), sendo todas

jovem tendo em consideração a esperança

significativas.

média de vida atual; feminina; instruída, sendo

Relativamente aos Problemas de Saúde, a

ínfimos os casos de analfabetismo. Vários

tendência revela uma correlação negativa, fraca

possuem inclusive o grau de licenciatura. Para

e significativa, relativamente à QV Total (r=-.329;

além disso, os rendimentos médios auferidos

p<.001),

e nível Físico (r=-.502; p<.001). De

indicam-nos uma situação económica razoável,

forma negativa e moderada ao nível Psicológico

o que por sua vez poderá eventualmente

(r=-.183; p=.025). Quanto menores os

justificar o nível de inatividade profissional, o

problemas de saúde, maior tende a ser a QV

que lhes permite uma maior disponibilidade

dos AC.

efetiva para se dedicarem à prestação de

Por sua vez, ao nível de Problemas Emocionais

cuidados. Aliás parece-nos ser a situação

vivenciados pelos AC, sobressai uma correlação

profissional o grande motivador da prestação de

negativa, fraca e significativa, face à QV Total

cuidados aos netos, advinda da disponibilidade

(r=-.377; p<.001), e respetivas dimensões

dos avós e da indisponibilidade parental

associadas: Meio Ambiente

motivada pelas questões laborais,

(r=-.193; p=.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 66

transformando os avós num recurso

De acordo com o estudo desenvolvido por

imprescindível na conciliação da vida familiar e

Triadó, Villar, Solé, Osuna e Celdrán (2006), à

profissional (Pérez, 2004; Miguel et al, 2012).

medida que ambos avançam na idade, diminui o

A sobre saliência da linhagem materna na nossa

nível de prestação de cuidados. Por

amostra, comparativamente à paterna, vai de

conseguinte, a disparidade de faixas etárias dos

encontro à literatura (e.g. Triadó & Villar, 2005),

netos da nossa amostra (1 aos 13 anos),

que revela uma tendência preferencial

justifica a variabilidade de ações de cuidado

direcionada para os avós maternos (Castañeda,

levada a cabo pelos avós, dos quais se

Sánchez, Sánchez & Blanc, 2004), motivado

destacam ao nível dos cuidados básicos “dar de

pela existência de um laço privilegiado entre

comer”; dos cuidados instrumentais “preparar a

mãe e filha, facilitando o relacionamento dos

comida” e “vigiá-lo”; no apoio ao estudo o

netos com os avós maternos (Gauthier, 2002).

“controlo dos TPC”; nas atividades de ócio, o

Dias e Silva (2003), referem que as avós

“passear” e “ver TV”, e na disciplina, ações

maternas são consideradas como figuras mais

muito mais positivas (e.g. elogios e

importantes e menos distantes que as avós

recompensas), comparativamente às coercivas,

paternas. Para além disso, os avós maternos

sendo típico nos avós. Recorde-se que a

parecem mais envolvidos na educação dos

isenção de responsabilidades parentais

netos quando comparados com os avós

(Ferland, 2006), lhes permite assumir uma

paternos (Van Rast, Verscueren & Marcoen,

postura mais descontraída e prazerosa para

1995), o que explica a intervenção dos AC nas

com os netos, o que por sua vez se verifica nos

várias esferas da vida dos netos, desde os

elevados níveis de satisfação decorrente dos

cuidados básicos, e instrumentais, ao apoio ao

cuidados prestados e do funcionamento familiar.

estudo e mesmo ao nível da disciplina.

O baixo nível de comportamentos problemáticos

É claro que a qualidade da relação estabelecida

por parte dos netos, também contribuirá para

entre os avós e os pais (geração intermédia),

esta satisfação, assim como, os níveis baixos de

influiu nos resultados obtidos, tendo em

dificuldades associados á prestação de

consideração que os mesmos funcionam como

cuidados, evidenciados no estudo correlacional

mediadores do contato nesta relação entre avós

entre as várias dimensões avaliadas.

e netos (RAN), podendo inibi-la ou facilita-la

O estudo correlacional entre as dimensões do

(Goodman, 2007), uma vez que, a qualidade da

questionário “Avós/avôs Cuidadores”, e a idade

RAN está associada às relações bem sucedidas

dos netos e dos avós, demonstra-nos que á

com a geração intermédia (Stella, 2010), o que

medida que aumenta a idade dos avós, diminui

se verifica na nossa amostra.

a prestação de cuidados básicos e

A idade dos avós e dos netos influenciam os

instrumentais. Estes resultados vão de encontro

níveis de cuidados, tendo em consideração que

á literatura, que nos refere que os avós mais

a mesma determina a capacidade dos primeiros

novos apresentam uma maior proximidade

em prestar cuidados, e as necessidades de

emocional, aumentando a probabilidade de

cuidados dos segundos, em consonância com a

serem mais ativos e comprometidos na relação

fase de desenvolvimento em que se encontram.

(Triadó, 2000). No que concerne á idade dos

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 67

netos, verificam-se correlações estatisticamente

Meio Ambiente, Psicológica e Relações sociais,

significativas e negativas com os cuidados

provavelmente motivado pelo aumento do

básicos, satisfação para com os cuidados e

sentimento de auto-eficácia.

funcionamento familiar, sendo perfeitamente

O mesmo se verifica com as atividades de ócio,

compreensível, tendo em consideração que a

correlacionando-se de forma positiva,

relação avós netos assume contornos diferentes

estatisticamente significativa com todas as

consoante as necessidades desenvolvimentais

dimensões da QV. Este efeito positivo,

destes (Silverstein e Marenco, 2001). Os netos

provavelmente advém do facto de as mesmas

pré adolescentes parecem ser mais fáceis de

constituírem um meio privilegiado de contacto

cuidar e de conviver com os avós, enquanto

com os netos, consolidando os laços de

que, os netos mais velhos tendem a

afetividade. Para além disso, permite-lhes

desenvolver outros laços, nomeadamente com

simultaneamente dissipar sentimentos de

os seus grupos de pares (Bales, 2002). Note-se

solidão frequentemente associados á terceira

que, á medida que a idade avança, os avós

idade (Emick & Hayslip, 1999 cit in Veleda,

passam a ser percepcionados como distantes e

Neves, Baisch, Vaz, Santos, & Soares, 2006).

menos como guardiões, guias familiares e

A satisfação para com os cuidados, assim como,

mediadores de conflitos (Triadó, Martinez &

o bom funcionamento familiar, também se

Villar, 2000).

correlacionam de forma positiva e

No que concerne á QV, verifica-se que os AC

estatisticamente significativa com todas as

apresentam níveis mais elevados e

dimensões da QV. Tal seria de esperar, tendo

estatisticamente significativos de QV Total e em

em consideração o elevado nível de satisfação

todas as suas dimensões (Física, Psicológica,

com os cuidados; a qualidade da relação entre

Relações Sociais e Meio Ambiente),

os avós e a geração intermédia, permitindo-lhes

comparativamente aos ANC. Tendo em conta

desempenhar um papel ativo na vida dos netos;

estes resultados, podemos considerar que a

o baixo nível de dificuldades na prestação de

prestação de cuidados a netos promove a

cuidados, assim como, uma valorização positiva

qualidade de vida dos avós. Tais ilações são

do seu estado de saúde em geral (físico e

suportadas pelo elevado número de correlações

psicológico). Estes resultados, explicam

estatisticamente significativas entre as várias

inclusive a existência de correlações negativas e

dimensões da QV e do questionário “Avós

estatisticamente significativas entre algumas

cuidadores”.

dimensões da QV e as dificuldades nos

Uma análise detalhada das mesmas,

cuidados; problemas de saúde; e problemas

demonstra-nos que o apoio ao estudo promove

emocionais.

a QV Total, permitindo aos avós contribuir para o desempenho escolar e formação do carácter

CONCLUSÕES

da criança, bem como, com o seu

A prestação de cuidados a netos parece

desenvolvimento pessoal (Harwood, Hewstone,

desempenhar um papel positivo na QV dos avós

& Raman, 2006). Aliás, o apoio ao estudo

cuidadores, proporciona-lhes um sentimento de

também surge como promotor das dimensões

utilidade e continuidade.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 68

Bibliografia

Castro, O., & Ruschel, A. (1998). O vínculo intergeracional: o velho, o jovem e o poder.

Almeida, A. (2008). Relações intergeracionais:

Retrivied February, 8, 2013, from http://

A relação avós netos e crenças acerca dos

redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/

adolescentes. A perspectiva dos avós.

188/18811311.pdf

Dissertação de mestrado. Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da

Colarusso, C.A. (1990). The Third Individuation.

Universidade do Porto.

The effect of biological –parenthood on separation-individuation Processes in Adulthood.

Araújo, M., & Dias, C. (2002). Papel dos avós:

Psychoanalityc Study of the Child, 45,179-194.

apoio oferecido aos netos antes e após situações de separação/divórcio dos pais.

Creasey, G. L., & Koblewski, P. (1991)

Estudos de Psicologia, 7(4), 91-101.

Adolescent Grandchildren´s relationships with maternal and paternal grandmothers and

Bales, S. (2002). The relation between the

grandfather. Journal of Adolescence, 14,

grandparent-grandchild bond and children views

373-387.

of them selves and grandparents. Dissertação de Doutoramento: Indiana University.

Dias, C., & Silva, C. (1999). Avós e avôs: percepção do papel. Revista Symposium – Nova

Barranti, C. (1985). The grandparent grandchild

Fase, 51-67.

relationship: family resource in an era of voluntary bonds. Family Relations, 34, 343-352.

Dias, C.M.S.B., Hora, F.F.A., & Aguiar, A.G.S.,

Barros, M. L. (1987). Autoridade e Afeto: avós,

(2010). Jovens criados por avós e por um ou

filhos e netos na família brasileira. Rio de

ambos os pais. Psicologia- Teoria e Prática, 12

Janeiro: Jorge Zahar Editor.

(2), 188-199.

Castañeda, P., Sánchez, D., Sánchez, A., &

Dias, C. M. S. B.; Costa, J. M.; & Rangel, V. A.

Blanc, S. (2004). Cómo perciben los nietos

(2005). Avós que criam seus netos:

adultos las relacines com sus abuelos. Annuario

circunstâncias e consequências. In Feres

de Psicologia, 35(1), 107-123.

Carneiro, T. (Org.). Família e casal: efeitos da contemporaneidade. Rio de Janeiro: PUC Rio,

Castiello, M. S., Villarejo, P.C., & Truchado, E.B.

158-176.

(2007). Las personas mayores y las situaciones de dependência. Revista de Ministerio de

Dias, C. M., & Silva, M.A. (2003). Os avós na

Trabajo e Inmigración, 70, 13-43.

perspectiva de jovens universitários. Psicologia em estudo, 8, 55-62.

Castro, O. P. (1998). Velhice que idade é esta? Uma construção psicossocial do

Direcção-Geral da Saúde (2006). Programa

envelhecimento. Porto Alegre: Síntese

Nacional para a Saúde das pessoas Idosas.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 69

Retrivied February, 3, 2013, from http://

Mendes, M. G., & Alves, J. F. (2004). Percepção

www.dgs.pt/.

de auto-eficácia na influência sobre os adolescentes: o ponto de vista dos avós. Kairós

Ferland, F. (2006). Os avós nos dias de hoje:

Gerontologia, 7 (2), 83-94.

Prazeres e armadilhas. Lisboa. Climepsi Editores.

Miguel, J., Palomares, J., & Blanco, F. ( 2012). Abuelas cuidadoras en el siglo XXI: recurso de

Falcão, D.V.S & Salomão, N. M. R. (2005). O

conciliación de la vida social y familiar.

papel dos avós na maternidade adolescente.

Portularia, XII Extra, 231-238.

Estudos de Psicologia, Campinas, 22 (2), 205-212.

Neugarten, B., & Weinstein, K. (1964). The champing American grandparent. Journal of

Gauthier, A. (2002). The role of grandparents.

Marriage and the Family, 26, 199-204.

Current Sociology, 50 (2), 295-307. Osuna, M. J. (2006). Relaciones familiares em la Goodman, C.C. (2007). Family Dynamics in

vejez: vínculos de los abuelos y de las abuelas

Three-Generation Grand families. Journal of

com sus nietos y nietas en la infancia. Revista

Family Issues, 28, 355-379.

Multidisciplinar Gerontologia, 16 (1), 16-25.

Gratton, B., & Haber, C. (1996). Three phases in

Pérez, L. ( 2004). Envejecer en femenino.

the history os American grandparents: Authority,

Boletín n. 9, Perfiles y Tendencias del

burden, companion. In Szinovacs (Ed.)

Observatorio de Personas Mayores. Madrid:

Handbook of Grandparenthood. London:

Imerso.

Greenwood Press. Pinazo, S. (1999). Influencia de los abuelos em Gomes, J. V. (1994). Socialização primária:

la socializacion familiar de los nietos. Revision

tarefa familiar? Cadernos de Pesquisa, 91,

de la literatura científica. Revista Espanhola de

54-61.

Geriatria e Gerontologia, 34 (4), 231-236.

Harwood, J., Hewstone, M., & Raman, P. (2006).

Rozario, P., Morrow-Howell, N. & , Hinterlong, J.

The family and Communication Dynamics of

(2004). Role Enhancement or Role Strain:

Group Salience. The Journal of Family

Assessing the Impact f the Multiple Productive

Communication, 6, 181-200.

Roles on Older Caregiver Wellbeing. Research on Aging, 26 (4), 413-428.

Hamm, B., & Millam, A. (2003). Across the generations: grandparents and grandchildren.

Sampaio, D. (2008). A razão dos Avós. Lisboa:

Canadian Social Trends. Statistics Canada, 11,

Editorial Caminho.

2-7.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 70

Silverstein, M., & Marenco, A. (2001). How

Triadó, C. (2005). Las abuelas y los abuelos

American enact the grandparent role across the

cuidadores: tareas de cuidado, necesidades y

family life course. Journal of family issues, 22,

consecuencias para la salud y el bienestar

493-522.

psicológico. Memoria Científico-técnica Del proyeto. Espanha: Madrid,

Smith, P.K. (1995). Handbook of Parenting, 89-112. New Jersey: Lawrence Erlbaum

Triadó, C., Celdrán, M., Montoro, J., Pinazo, S.,

Associates.

& Villar, F. (2008). Envejecimiento productivo: la provisión de cuidados de los abuelos a los

Smith, P. (1991). Introduction: The Study of

nietos. Implicaciones para su salud y bienestar.

grandparenthood. In P. K. Smith (Ed.), The

Imserso

Psychology of Grandparenthood: international perspective, 1-14. London: Routledge.

Triadó, C., Martinez, G., & Villar, F (2000). El rol y la importância de los abuelos para sus nietos

Stella, A. (2010). Avós e netos: relações

adolescentes. Anuario de Psicologia,

intergeracionais: a matriliniaridade dos afectos.

31,107-118.

Lisboa: Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas.

Triadó, C., Villar, F., Solé, C., Osuna, M. J., & Celdrán, M. (2006). Percepciones cruzadas

Szinovacz, M. E. (1998). Handbook of

entre abuelos y nietos en uma muestra de

grandparenthood. Westport: Greenwood Press.

díadas: una aproximación cualitativa. Revista

Tinsley, B.J., & Parke, R.D. (1987).

Española de Geriatría y Gerontología, 41(2), 99-110.

Grandparents as interactive and social support agents for families with young infants.

Van Rast, N., Verscueren, K., & Marcoen, A.

International Journal of Aging and Human

(1995). The meaning of grandparents as viewed

Development, 25, (4), 259-277.

by adolescent grandchild: Empirical study in Belgium. International Journal of Aging and

Tomlin, A.M. (1998). Grandparents influences on

Human Development, 41, 311-324

grandchildren. In M. E. Szinovacz (Ed.), Handbook of grandparenthood. Westport:

Vaz Serra, A., Canavarro, M.C., Simões, M.R.,

Greenwood Press.

Pereira, M., Gameiro, S., Quartilho, M.J. (2006). Estudo psicométricos do instrumento de

Triadó, C. (2000). El rol de abuelo: como

avaliação da qualidade de vida da Organização

percieben los abuelos las relaciones com sus

Mundial de Saúde (WHOQOL-100) para

nietos. Revista Española de Geriatria Y

português de Portugal. Psiquiatria Clínica, 27 (1)

Gerontologia, 55, (S2).

41-49.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 71

Veleda, A., Neves, F., Baisch, A., Vaz, M., Santos, S. & Soares, M.(2006). Os significados e contribuições da convivência entre avós e netos para o desenvolvimento da criança. Psychologica, 43, 24-40.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Apóstolo et al. (2013) The effect of cognitive stimulation on depressive symptomatology and quality of life of elderly people. Journal of Aging & Inovation, 2 (3): 82-91

ARTIGO ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE

JULHO, 2013

EFEITO DA ESTIMULAÇÃO COGNITIVA NA SINTOMATOLOGIA DEPRESSIVA E QUALIDADE DE VIDA DE IDOSOS. The effect of cognitive stimulation on depressive symptomatology and quality of life of elderly people Efecto de la estimulación cognitiva en la sintomatologia depressiva y calidad de vida de ancianos

Autores

João Apóstolo1, Anabela Carvalho2, Cátia Tavares3 , Daniela Cardoso4, Maria Carvalho5, Tiago

Baptista6 1 2,3,5,6

Enfermeiro, PhD, Professor Adjunto, Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, UICISA

Enfermeiros, colaboradores da UICISA:E – Unidade de Investigação em Ciências da Saúde.

Enfermagem, 4 Enfermeira, Research Grant Holder Portugal Centre for Evidence-Based Practice: an Affiliate Centre of the Joanna Briggs Institute (UICISA:E) Corresponding Author: apostolo@esenfc.pt RESUMO Objetivo: avaliar o efeito da estimulação cognitiva (EC) na sintomatologia depressiva e na qualidade de vida (QdV) de idosos residentes na comunidade na região centro de Portugal. Métodos: Estudo de natureza quase-experimental, pré-teste e pós-teste, sem grupo de controlo, em 33 idosos (idade média 74,45, DP 6,97 anos). Utilizadas a escala de depressão geriátrica (GDS-15) e EUROHIS-QOL-8. Os idosos, em 2012, foram sujeitos a 14 sessões de estimulação cognitiva (programa “Fazer a diferença”), de 45 a 60 minutos cada, 2 vezes por semana, durante 7 semanas. Resultados: A avaliação realizada no pré-teste permitiu classificar 27,30% dos idosos com perturbação depressiva, valor que reduziu para 15,20% no pós-teste. Adicionalmente 60,61% dos idosos melhoraram a sintomatologia depressiva. A diferença de médias da GDS-15 do pré para o pós-teste foi de -1,64. Esta diferença é evidente nos indivíduos com escolaridade igual ou superior a 5 anos. Apesar de 60,61% percecionarem uma melhor QdV após a intervenção, os resultados não permitem afirmar sobre a eficácia da EC nesta variável. Conclusões: É possível concluir que a EC é eficaz na melhoria da sintomatologia depressiva, especificamente nos idosos com escolaridade superior a 5 anos. Sugerem-se novos estudos randomizados controlados, com amostras de maior dimensão, com manutenção e follow-up em que sejam estudadas as diferenças em função de variáveis sociodemográficas reforçando e clarificando estes resultados. Não obstante, aconselha-se a implementação da EC como componente do cuidado a idosos. PALAVRAS-CHAVE: Estimulação cognitiva; Idoso; Idoso de 80 Anos ou mais Depressão; Qualidade de vida. Abstract Aim: to evaluate the effect of cognitive stimulation (CS) in depressive symptomatology and quality of life (QoL) community elderly residents in the central region of Portugal. Methods: Quasi-experimental study with pre- and post-test, without a control group, in 33 elders (mean age of 74.45, SD 6.97). The Geriatric depression scale-15 and EUROHIS-QOL-8 were used. The elders, in 2012, were subjected to 14 sessions of cognitive stimulation ("Making a difference” program), 45 to 60 minutes each, twice a week for 7 weeks. Results: The assessment in pre-test allowed classifying 27.30% of elderly with depressive disorder, a figure which fell to 15.20% in the post-test. Additionally, 60.61% of the elderly improved depressive symptoms. The mean difference of the GDS-15 from pre to post-test was -1.64. This difference is evident in individuals with education less than 5 years. Although 60.61% perceive better QoL after intervention results do not allow stating the effectiveness of EC this variable. Conclusions: It is possible to conclude that the CS is effective in improving depressive symptomatology which is evident in individuals with education superior to 5 years. We suggest new randomized controlled trials with larger samples, maintenance and follow-up in which the differences are studied as a function of sociodemographic variables strengthening and clarifying these results. Nevertheless, we recommend the implementation of the CS as a component of elderly care. KEYWORDS: Cognitive stimulation; Aged; Aged, 80 and over; Depression; Quality of life.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 83

Introdução

(WHOQOL Group, 1994). É um conceito

Portugal, em conformidade com outros países

subjetivo dependente do nível sociocultural, da

industrializados e desenvolvidos, apresenta uma

faixa etária e das aspirações pessoais do

população envelhecida decorrente do aumento

indivíduo. No estudo desenvolvido em 999

da esperança média de vida.

idosos do Reino Unido, as relações sociais e a

A sintomatologia depressiva é comum entre os

saúde foram consideradas as áreas mais

idosos mas é frequentemente não diagnosticada

importantes para a QdV, sendo referidos ainda

ou não tratada. Diferentes números de

outros aspetos como o papel social, bem-estar,

prevalência são relatados na literatura

habitação, finanças e independência (Bowling et

internacional. Em Portugal, os resultados são

al., 2003).

escassos, mas um estudo piloto revelou que

Em consonância com a posição anterior, nos

54,79% dos idosos residentes na comunidade

adultos mais velhos, tem sido relatada uma

apresentavam perturbação depressiva -

grande variedade de fatores relacionados com a

Geriatric Depression Scale-15>5 (Apóstolo,

QdV, incluindo sintomas depressivos, função

2013).

física, saúde percebida, condições ambientais e

A evidência revela que as pessoas com

idade (Halvorsrud et al., 2010). Os resultados do

depressão têm maior risco de desenvolverem

estudo destes autores revelaram que a QdV é

distúrbios cognitivos e demência (Rosness,

pior nos idosos com sintomas depressivos.

Barca e Engedal, 2010) e que os idosos com

Os resultados de Woods et al. (2006)

perturbação depressiva apresentam maior

evidenciam que a participação em atividades de

incapacidade ao nível da memória verbal e

estimulação cognitiva (EC) está associada a

visual, capacidade de execução e velocidade de

melhorias na QdV, em áreas funcionalmente

processamento da informação, bem como

relevantes, incluindo ganhos nas relações

atrofia cerebral, por exemplo no hipocampo,

interpessoais, níveis de energia e habilidades

amígdala e córtex orbito frontal medial,

para realizar tarefas. Mais ainda, as melhorias

associado a perdas cognitivas (Egger et al.,

na pontuação de QdV foram mediadas pela

2008). Revela ainda que estes idosos são

melhoria da cognição. As mulheres e as

confrontados com um conjunto de

pessoas com baixo valor basal de QdV

consequências negativas, incluindo declínio

beneficiam mais com a intervenção.

funcional, perda de energia para realizar as

A EC pode representar uma potencial e

atividades de vida diária, marcada incapacidade

promissora intervenção para a redução dos

e fragilidade e diminuição da qualidade de vida

sintomas depressivos e da vulnerabilidade

(QdV) (Fiske, Wetherell & Gatz, 2009).

depressiva (Raes, Williams e Hermans, 2009;

A QdV é definida pela Organização Mundial de

Niu et al., 2010). Os investigadores, apesar de

Saúde (OMS) como a perceção do indivíduo

reconhecerem que os efeitos neuroprotectores

sobre a sua posição na vida, dentro do contexto

da EC na promoção da plasticidade cerebral e

dos sistemas de cultura e valores nos quais está

da reserva cognitiva são desconhecidos, não

inserido e em relação aos seus objetivos,

descartam a hipótese da promoção da

expectativas, padrões e preocupações

neurogénese (La Rue, 2010).

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 84

Uma recentemente revisão sistemática da

Hipótese do estudo: Idosos residentes na

literatura revelou que um pequeno número de

comunidade submetidos ao programa de

estudos evidenciou que a EC pode ser

estimulação cognitiva “Fazer a Diferença”

associada, entre outras, a melhorias na QdV e

apresentam níveis de sintomatologia depressiva

na comunicação dos idosos. No entanto os

mais baixos e de QdV mais elevados.

resultados não suportam a eficácia da EC no

Amostra: Idosos residentes na comunidade,

humor (Woods et al., 2012).

selecionados em dois Centros de dia de

Outros estudos como o de Fernández-Prado et

carácter rural e numa coletividade de carácter

al. (2011) mostraram alterações significativas no

urbano, do Concelho de Coimbra, Portugal. Nos

grupo submetido a treino cognitivo, o que

Centros de Dia foram selecionados todos os

demonstra um melhor desempenho cognitivo e

indivíduos que o frequentam. Na coletividade

da perceção da QdV.

foram abertas, publicamente, inscrições para a

A EC permitirá maximizar as funções cognitivas

participação no PEC-FD. Apesar de a amostra

intactas e os recursos das funções que, embora

ser não probabilística, estes locais estão

diminuídas, não estejam totalmente perdidas, de

inseridos em contexto rural, semi-rural e urbano

modo a prolongar a independência e a QdV do

da região centro de Portugal, garantindo um

indivíduo (Mitchell & Shiri-Feshki, 2009; Woods

painel representativo da população.

et al. 2012).

Características da Amostra

Assume-se que a EC possa ajudar a diminuir a

A análise de poder feito à priori determinou um

sintomatologia depressiva presente nos idosos

tamanho de amostra de 31 sujeitos. Devido ao

com carência de socialização, falta de

atrito foram selecionados 45 idosos (38

participação de atividades sociais e físicas. A

mulheres e 7 homens) segundo os seguintes

participação destes em atividades voltadas para

critérios de inclusão: reformados, idade superior

a memória e para o exercício das funções

a 60 anos e capacidade para participar em

cognitivas permitirá retardar o desenvolvimento

atividades de grupo durante pelo menos 45

da doença e/ou a produção de formas de

minutos. A média de idades dos participantes foi

adaptação às novas situações vivenciadas

de 75,29 anos (mínimo 63 e máximo 92) DP de

(Souza e Alvarengas, 2010).

7,64 anos.

Neste enquadramento, temos por objetivo

Por apresentarem mais de três faltas ao

avaliar o efeito da aplicação do Programa de

programa ou não concluírem a avaliação do

Estimulação Cognitiva – “Fazer a

pós-teste não foram incluídos na análise 12

Diferença” (PEC-FD) na sintomatologia

indivíduos (11 mulheres e 1 homem). Os 33

depressiva e na QdV de idosos inseridos em

participantes incluídos na análise apresentavam

coletividades e centros de dia e verificar a

as seguintes características: 27 mulheres e 6

relação entre o estado mental e a sintomatologia

homens; média de idade de 74,45 anos (mínimo

depressiva.

63 e máximo 87) e DP 6,97 anos. Os diferentes

Metodologia

níveis de escolaridade nos três locais

Estudo Quase-experimental, com pré-teste e

distribuem-se da seguinte forma: na

pós-teste.

Coletividade, 41,67% tinham 4 ou menos anos

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 85

de escolaridade; 29,17% de 5 a 9 anos; 12,50%

de QdV composta por oito itens, e desenvolvida

de 10 a 12 anos e 16,67% completaram o

a partir dos instrumentos genéricos

ensino superior. No Centro de Dia A, 85,71%

WHOQOL-100 e WHOQOL-Bref. Cada um dos

tinham 0 a 4 anos e 14,29% apresentavam

domínios (físico, psicológico, das relações

escolaridade superior. Já, no Centro de Dia B, a

sociais e ambiente) encontra-se representado

totalidade da população (100%) tinha 4 ou

por dois itens. O resultado é um índice global,

menos anos de escolaridade.

calculado a partir do somatório dos oito itens,

Os participantes selecionados na comunidade,

sendo que a um valor mais elevado corresponde

antes e durante a aplicação do PEC-FD,

uma melhor perceção da QdV. Todas as escalas

participaram em outras atividades recreativas e

de resposta têm um formato de cinco pontos,

de lazer, nomeadamente, Ginástica, Yoga, Chi

variando, por exemplo, entre “Nada” e

Kung, Hidroginástica, Natação e Canto coral.

“Completamente” (Pereira et al., 2011).

Instrumentos de Avaliação

Na amostra do estudo que apresentamos a

No contexto destes resultados, o instrumento de

EUROHIS-QOL-8 apresentou valores de alfa de

colheita de dados é composto pelas versões

Cronbach de 0,74 e 0,76 no pré e pós-teste

portuguesas das escalas Geriatric Depression

respetivamente.

Scale-15 (GDS-15), EUROHIS-QOL-8 e por

Intervenção

questões sobre história prévia de sintomatologia

O programa de EC "Making a Difference: An

depressiva e utilização de medicação

Evidence-based Group Programme to Offer

antidepressiva.

Cognitive Stimulation Therapy (CST) to People

Geriatric Depression Scale – 15 (GDS-15): é

with Dementia" (Spector, et al. 2006), adaptado

uma versão curta da escala original que foi

para português por Apóstolo e Cardoso (2013)

elaborada por Sheikh e Yesavage (1986),

foi usado como intervenção de EC.

versão portuguesa (Apóstolo, 2011). É uma

O programa foi aplicado ao longo de sete

escala de heteroavaliação composta por quinze

semanas, de Maio a Junho de 2012, com duas

itens, com duas alternativas de resposta (sim ou

sessões semanais de cerca de 45 a 60 minutos

não – itens 1, 5, 7, 11 e 13 são invertidos)

cada, ocorrendo em locais adequados. As

consoante o modo como a pessoa se tem

sessões foram organizadas e geridas pelos

sentido ultimamente, em especial na última

autores em cinco grupos de seis a oito idosos.

semana. É calculado um score global e uma

Os temas principais das 14 sessões foram: 1ª

pontuação superior a 5 pontos indica a

Jogos físicos; 2ª Sons, 3ª Infância; 4ª

existência de perturbação depressiva (Cavaleiro

Alimentação; 5ª Questões atuais; 6ª Retratos/

et al., 2013).

Cenários; 7ª Associação de palavras; 8ª Ser

Na amostra em estudo a GDS-15 revelou

Criativo; 9ª Classificação de objetos; 10ª

consistência interna aceitável (Alfa de Cronbach

Orientação; 11ª Usar o dinheiro; 12ª Jogos com

de 0,78 e 0,79 no pré e pós-teste,

números; 13ª Jogos com palavras; 14ª Jogos de

respetivamente).

equipa (Quiz).

EUROHIS-QOL-8 (Power, 2003) versão

Análise Estatística

portuguesa (Pereira et al., 2011) é uma medida JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 86

Para verificar os pressupostos para a utilização

medicação antidepressiva. Durante as sete

de testes paramétricos, utilizámos o teste

semanas em que durou a aplicação do

Kolmogorov-Smirnov, assumindo que a variável

programa não houve alteração da terapêutica

em questão segue distribuição normal na

antidepressiva.

população. As medidas estatísticas utilizadas

A avaliação realizada no pré e no pós-teste

foram o teste t para amostras emparelhadas

27,30% e 15,20% dos idosos, respetivamente,

bem como estatísticas descritivas de resumo

apresentavam sintomatologia depressiva

(média e desvio padrão) e frequências absolutas

(GDS-15>5) verificando-se, portanto, uma

e relativas. Foi ainda utilizado o teste de

melhoria da condição clínica dos idosos com a

Wilcoxon para comparar a evolução dos sujeitos

aplicação do programa.

em relação à escolaridade, uma vez que o

Os dados apresentados na tabela 1 resultam

tamanho da amostra por grupo é reduzido.

dos testes de hipótese das variáveis

Procedimentos Éticos

sintomatologia depressiva e QdV. São expostos

O projeto foi aprovado pelas instituições e pela

os valores da média e desvio padrão avaliados

Comissão de Ética da Unidade Investigação em

no pré-teste (t1) e pós-teste (t2) bem como a

Ciências da Saúde – Enfermagem, da Escola

análise da evolução, com recurso aos valores

Superior de Enfermagem de Coimbra (Ref. Nº

obtidos nos testes t para amostras

P12-11/2010).

emparelhadas.

Cumpridos os princípios éticos subjacentes e

A diferença de médias, avaliadas em t1 e t2

pedido consentimento informado por escrito.

evidência que o programa foi eficaz em relação

Resultados

à sintomatologia depressiva (diferença de

A avaliação diagnóstica, realizada no pré-teste,

médias da GDS-15 foi de -1,64), mas não há

permitiu verificar que 45,45% afirmaram história

evidência dessa eficácia na melhoria da QdV

prévia de depressão e 39,39% afirmaram tomar

percebida.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 87

Efetuámos, ainda, uma análise mais detalhada

Na tabela 3, é possível verificar, que só em

com o objetivo de observar o efeito, no sentido

relação aos indivíduos com escolaridade

clínico, da estimulação cognitiva nas variáveis

superior ou igual a cinco anos há evidência da

em causa (tabela 2).

eficácia da intervenção na sintomatologia

No respeitante à sintomatologia depressiva é

depressiva.

possível verificar que 60,61% dos indivíduos

Examinando a evolução dos casos, no que diz

evoluíram positivamente, 21,21% evoluíram

respeito à variável sintomatologia depressiva

negativamente e 18,18% não sofreram qualquer

apresentaram uma evolução positiva 59,09%

evolução. Relativamente à QdV verifica-se que

dos idosos com escolaridade igual ou inferior a

60,61% dos indivíduos evoluíram positivamente,

4 anos e 63,64% dos idosos com escolaridade

30,30% evoluíram negativamente e 9,09% não

igual ou superior a 5 anos. No respeitante à

sofreram qualquer evolução.

QdV apresentaram uma evolução positiva

Não obstante o reduzido número de sujeitos em

54,55% dos idosos com escolaridade igual ou

cada grupo analisámos, ainda, a evolução da

inferior a 4 anos e 72,73% dos idosos com

sintomatologia depressiva e da QdV em função

escolaridade igual ou superior a 5 anos.

da escolaridade.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 88

Discussão

baixo do revelado pelo estudo de Apóstolo

Algumas limitações deste estudo carecem de

(2013) já referido na introdução.

ser referenciadas e discutidas. A amostra é não

A evidência não permite afirmar sobre a eficácia

probabilística, mas apesar desta fragilidade, os

da intervenção na QdV percebida. No entanto

locais selecionados estão inseridos em contexto

não se deve menosprezar os resultados obtidos,

rural, semi-rural e urbano da região centro de

já que 60,61% percecionam uma melhor QdV.

Portugal, garantindo um painel representativo da

Adicionalmente, a melhoria da QdV percebida é

população. A perda de 12 elementos da amostra

maior nos que têm escolaridade igual ou

e a diferença nas características dos idosos dos

superior a 5 anos.

três locais alvo do estudo podem constituir

Como já foi referido na parte introdutória deste

fragilidade nesta investigação. Ainda, como

artigo os estudos apresentam ainda algumas

limitação, é de referir a falta de homogeneidade

lacunas sobre a eficácia da EC quer no humor,

da amostra relativamente ao sexo (amostra

quer na QdV pelo que são necessários mais

maioritariamente feminina). A falta de grupo de

estudos. A recentemente revisão sistemática da

controlo que permitiria um estudo randomizado

literatura que sintetiza a evidência nesta

controlado teria também acrescentado robustez

temática revelou, num pequeno número de

ao estudo.

estudos, que a EC pode ser associada a

É ainda de considerar o reduzido número de

melhorias na QdV e na comunicação dos

sujeitos por grupo de escolaridade fazendo com

idosos. No entanto os resultados não suportam

os resultados decorrentes desta análise deva

a eficácia da EC no humor (Woods et al., 2012).

ser lida no contexto desta fragilidade. Assim há

Outros estudos, não incluídos naquela revisão,

necessidade de mais investigação comparando

como o de Almeida et al. (2010), com idosos

a eficácia do programa em função da

residentes na comunidade, evidencia que os

escolaridade dos indivíduos, bem como de

idosos que participam de grupos de convivência

outras variáveis sociodemográficas, como o

apresentam melhor QdV e menor ocorrência de

sexo, o estado civil ou suporte social dos idosos.

depressão quando comparados a idosos que

De facto, os fatores de risco para perturbação

não participam de grupos de terceira idade.

depressiva nos idosos são, entre outros, o sexo

Ainda, os resultados de Fernández-Prado et al.

feminino, a baixa escolaridade, estado civil

(2011) revelaram a eficácia da EC na perceção

(divorciado ou viúvo) e fraca rede social (Luppa

da QdV.

et al., 2012).

Os aspetos mais valorizados pelos idosos

Em relação ao objetivo e à hipótese do estudo,

responsáveis pela QdV dos idosos estão

os resultados sugerem que há diferença nos

relacionados com as suas relações sociais e a

valores do pré e pós-teste na avaliação

saúde. Analisando o conteúdo das atividades

realizada com a GDS (a diferença de médias da

proporcionadas pelo PEC-FD pensamos que é

GDS-15 foi de -1,64; 60,61% dos indivíduos

nestes aspetos que mais poderá haver

evoluíram positivamente). A avaliação realizada

mudanças significativas nos grupos e indivíduos

no pré-teste permitiu classificar 27,30% dos

que neles participam.

idosos com perturbação depressiva, valor mais JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 89

De facto, a nossa avaliação da implementação

acerca desta problemática, que é diminuta em

do programa ao logo das 14 sessões permite-

Portugal, possibilitando que novos dados

nos concluir sobre o êxito que tem nos

beneficiem o impacto sobre a prática clínica,

participantes. Este deve-se à interação do

assumindo por base a evidência nacional e o

grupo, ao desenvolvimento de relações

confronto dos resultados nacionais com os

pessoais positivas entre os participantes e à

internacionais.

dimensão lúdica proporcionada pelas atividades,

Do mesmo modo, em próximos trabalhos, será

que ao mesmo tempo permitem a estimulação

apresentada a aplicação do PEC-FD seguido de

das diferentes funções cognitivas (memória,

manutenção.

linguagem, praxia, gnosia e função executiva). Estas atividades lúdicas e de interação do grupo

Referências bibliográficas

podem ajudar a substituir os processos de

Almeida, E. A. D., Madeira, G. D., Arantes, P. M.

pensamento negativo, característicos de

M., & Alencar, M. A. (2010). Comparação da

sintomas depressivos, por um estilo cognitivo

qualidade de vida entre idosos que participam e

mais positivo, como é apoiado por Apóstolo

idosos que não participam de grupos de

(2010).

convivência na cidade de Itabira MG; Comparsion of quality of life among elderly that

Conclusão

participate and do not participate of senior

É possível concluir que a EC é eficaz na

conviviality groups in the city of Itabira MG,

melhoria da sintomatologia depressiva o que é

Brazil. Rev. bras. geriatr. gerontol, 13(3),

evidente nos indivíduos com escolaridade mais

435-443.

elevada. (diferença de médias da GDS-15 foi de -1,64; 60,61% dos indivíduos evoluíram

Apóstolo, J. & Cardoso, D. (2013).

positivamente).

Operacionalização do programa de estimulação

Apesar de não ser evidente que a EC é eficaz

cognitiva em idosos “Fazer a diferença”. Com

na QdV, 60,61% dos mesmos evoluíram

base em: Spector, A; Thorgrimsen, L; Woods, B

positivamente na QdV percebida.

& Orrell, M, (2006). Making a Difference: An

Face a estes resultados sugerimos o

Evidence-based Group Programme to Offer

desenvolvimento de novas investigações que

Cognitive Stimulation Therapy (CST) to People

invistam na compreensão da diferença de

with Dementia, ISBN: 978-989-98289-0-2

resultados obtidos, como já referido na discussão, utilizando amostras homogenias, de

Apóstolo, J. (2011). Adaptation into European

maior tamanho para que se possam estudar as

Portuguese of the Geriatric Depression Scale

diferenças em função das variáveis

(GDS-15). Referência - Suplementos à Revista

sociodemográficas referidas e aumentar a

Referência 2011 - Actas da XI Conferência

validade externa do estudo.

Iberoamericana de Educação em Enfermagem

Não obstante as limitações apresentadas, o

da ALADEF, Coimbra, 452-452.

desenvolvimento deste estudo proporciona a abertura de novas vertentes de investigação JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 90

Apóstolo, J. (2013). Depressive disorders in

Fiske, A., Wetherell, J. L., & Gatz, M. (2009).

older people. 4th International Nursing Research

Depression in older adults. Annual review of

Congress. Prague, Czech Republic.

clinical psychology, 5, 363.

Apóstolo, João L. A. (2010). O conforto pelas

Halvorsrud, L., Kalfoss, M., Diseth, Å., &

imagens mentais na Depressão, Ansiedade e

Kirkevold, M. (2012). Quality of life in older

Stresse. Ed. 1, Coimbra - Portugal: Imprensa da

Norwegian adults living at home: a cross-

Universidade de Coimbra/ Escola Superior de

sectional survey. Journal of Research in

Enfermagem de Coimbra. ISBN:

Nursing, 17(1), 12-29.

978-989-26-0036-9 La Rue, A. (2010). Healthy brain aging: role of Bowling, A., Gabriel, Z., Dykes, J., Dowding, L.

cognitive reserve, cognitive stimulation, and

M., Evans, O., Fleissig, A., & Sutton, S. (2003).

cognitive exercises. Clinics in geriatric medicine,

Let's ask them: a national survey of definitions of

26(1), 99-111.

quality of life and its enhancement among people aged 65 and over. The International

Luppa, M., Sikorski, C., Luck, T., Ehreke, L.,

Journal

Konnopka, A., Wiese, B., ... & Riedel-Heller, S.

of

Aging

and

Human

Development, 56(4), 269-306.

G. (2012). Age-and gender-specific prevalence of depression in latest-life–systematic review

Cavaleiro, A., Queirós, P., Azeredo, A., Apóstolo,

and meta-analysis. Journal of affective

J. & Cardoso, D. (2013). Perturbações Afectivo-

disorders, 136(3), 212-221.

Emocionais no Contexto de Cuidados em Cuidados Continuados. Journal of Aging and

Mitchell, A. J., & Shiri-Feshki, M. (2009). Rate of

Inovation, 2(1), 4-17.

progression of mild cognitive impairment to dementia–meta-analysis of 41 robust inception

Egger, K., Schocke, M., Weiss, E., Auffinger, S.,

cohort studies. Acta Psychiatrica Scandinavica,

Esterhammer, R., Goebel, G., ... & Marksteiner,

119(4), 252 - 265.

J. (2008). Pattern of brain atrophy in elderly patients with depression revealed by voxel-

Niu, Y. X., Tan, J. P., Guan, J. Q., Zhang, Z. Q.,

based morphometry. Psychiatry Research:

& Wang, L. N. (2010). Cognitive stimulation

Neuroimaging, 164(3), 237-244.

therapy in the treatment of neuropsychiatric symptoms in Alzheimer’s disease: a randomized

Fernández-Prado, S., Conlon, S., Mayán-

controlled trial. Clinical rehabilitation, 24(12),

Santos, J. M., & Gandoy-Crego, M. (2012). The

1102-1111.

influence of a cognitive stimulation program on the quality of life perception among the elderly.

Pereira, M., Melo, C., Gameiro, S., & Canavarro,

Archives of gerontology and geriatrics, 54(1),

M. C. (2011). Estudos psicométricos da versão

181-184.

em Português Europeu do índice de qualidade de vida EUROHIS-QOL-8. ISPA.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 91

WHOQOL Group (1994). Development of the Power, M. (2003). Development of a common

WHOQOL: Rationale and current status.

instrument for quality of life. In A. Nosikov & C.

International Journal of Mental Health, 23(3),

Gudex (Eds.), EUROHIS: Developing Common

24-56.

Instruments for Health Surveys (pp. 145-159). Amsterdam: IOS Press.

Woods, B., Aguirre, E., Spector, A. E., & Orrell, M. (2012). Cognitive stimulation to improve

Raes, F., Williams, J. M. G., & Hermans, D.

cognitive functioning in people with dementia.

(2009). Reducing cognitive vulnerability to

Cochrane Database Syst Rev, (2): [cerca de (80)

depression: A preliminary investigation of

p]. Retrieved from: http://web.ebscohost.com/

MEmory Specificity Training (MEST) in

ehost/detail?vid=7&hid=15&sid=0cf33f34-

inpatients with depressive symptomatology.

d

Journal of Behavior Therapy and Experimental

a1ed85e43a1d89e8%40sessionmgr13&bdata=J

Psychiatry, 40(1), 24-38.

mxhbmc9cHQtYnImc2l0ZT1laG9zdC1saXZl#db

3

2

5

-

4

5

2

0

-

=chh&AN=CD005562 Rosness, T. A., Barca, M. L., & Engedal, K. (2010). Occurrence of depression and its

Woods, B., Thorgrimsen, L., Spector, A., Royan,

correlates in early onset dementia patients.

L., & Orrell, M. (2006). Improved quality of life

International journal of geriatric psychiatry, 25(7),

and cognitive stimulation therapy in

704-711.

dementia. Aging and Mental Health, 10(3), 219-226.

Sheikh, J. I. & Yesavage, J. A. (1986) – Geriatric Depression Scale (GDS): Recent evidence and development of a shorter version. Clinical Gerontologist. Vol. 5, p. 165-173. Souza, A. R., & Alvarenga, M. R. M. (2010). O EFEITO DOS ESTÍMULOS COGNITIVOS PA R A I D O S O S C O M S I N TO M A S DEPRESSIVOS. ANAIS DO SEMINÁRIO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA-SEMEX, 1(1). Spector, A., Thorgrimsen, L., Woods, R. T., & Orrell, M. (2006). Making a difference: an evidence-based group programme to offer Cognitive Stimulation therapy (CST) to people with dementia. Hawker Publications.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Dinis, A. (2013) Honey in Wound Treatment - Case Studies. Journal of Aging & Inovation, 2 (3): 92-106

ESTUDO DE CASO / CASE STUDY

JULHO, 2013

O MEL NO TRATAMENTO DE FERIDAS - ESTUDOS DE CASO HONEY IN WOUND TREATMENT - CASE STUDIES MIEL EN EL TRATAMIENTO DE HERIDAS - ESTUDIOS DE CASO

Autores

Ana Raquel Dinis1 1

Enfermeira, Farmácias Holon

Corresponding Author: araqueldinis@gmail.com

RESUMO O mel tem adquirido importância no tratamento de feridas devido às suas propriedades particulares, nomeadamente acidez, actividades antibacteriana, anti-inflamatória e antioxidante, e acções osmótica, desbridante e desodorizante. Quando utilizado em apósitos é denominado mel medicinal, sendo produzido segundo critérios rigorosos. Deste modo é possível a sua utilização segura. Existem diversos estudos sobre a aplicação de apósitos com mel em feridas agudas e crónicas, verificando-se bons resultados no tratamento de abcessos, queimaduras, enxertos, feridas infectadas, úlceras de perna, úlceras de pressão, feridas cirúrgicas e suas deiscências e úlceras de pé diabético. Neste artigo são apresentados quatro casos onde a aplicação de apósitos com mel em feridas multitratadas se mostrou bastante eficiente. Embora seja necessária mais investigação, os apósitos de mel deverão ser considerados uma alternativa eficaz no tratamento de diferentes tipos de ferida, particularmente aquelas multitratadas e complexas. PALAVRAS-CHAVE: Mel; feridas; cicatrização; estudo de caso

ABSTRACT Honey has gained importance in wound treatment due to his particular properties such as acidity, antibacterial, antiinflammatory and antioxidant activities and osmotic, debriding and deodorizing actions. When used in wound dressings it is called medical grade honey and is produced using quality control criteria. Thus it can be used safely. There are several studies about the use of honey as a wound dressing in acute and chronic wounds with good results in the treatment of abscesses, burns, donor sites, graft sites, infected wounds, leg ulcers, pressure ulcers, surgical wounds with and without dehiscence and diabetic foot ulcers. This article presents four cases where honey dressings application proved to be quite efficient. Although further research is needed, honey dressings should be considered as an effective alternative treatment for different wound types, particularly chronic wounds and those with multiple treatment. KEYWORDS: Honey; wounds; healing; case study JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 93

Introdução

a dor e o trauma associados à mudança do

Há milhares de anos que o mel é utilizado pelo

mesmo. Por outro lado, este ambiente húmido

Homem nas mais diversas situações. Existem

promove um desbridamento autolítico, sendo

textos com mais de 4000 anos, onde é relatada

também benéfico para a cicatrização, sem

a utilização de mel no tratamento de feridas

permitir contudo um crescimento bacteriano no

(Cooper et al, 2009). Recentemente assistiu-se

leito da ferida (Cooper et al 2009, Seckam &

a um renascer do interesse pelo mel devido às

Cooper, 2013).

suas propriedades promissoras. No quotidiano, o enfermeiro depara-se, por vezes, com a

Actividade antioxidante

apresentação tardia de feridas, frequentemente

O mel apresenta uma grande quantidade de

num estado avançado de infecção e inflamação.

antioxidantes. Estes neutralizam os radicais

Para prevenir o agravamento da infecção são

livres, moléculas altamente reactivas

usados os diversos apósitos disponíveis.

causadoras de dano celular e produzidas

Contudo, o uso constante dos mesmos produtos

durante a fagocitose. Estes radicais promovem

provoca habituação e consequente estagnação

oxidação, a qual vai activar protéases que

da evolução da ferida. O desenvolvimento de

destroem citoquinas, factores de crescimento e

diferentes apósitos contendo mel constitui,

matriz extracelular, essenciais ao processo de

assim, uma nova oportunidade no tratamento de

cicatrização (Cooper et al 2009).

diversos tipos de ferida, com especial ênfase nas feridas multitratadas.

Acidez do mel A acidez do mel é benéfica para o tratamento de

As propriedades do mel

feridas. Um meio ácido permite a dissociação de

O mel é um produto natural composto por

mais oxigénio ligado à hemoglobina para o leito

hidratos de carbono (75-80%), dos quais se

da ferida, o qual é essencial para o crescimento

destacam a glicose e a frutose, por água (17%),

de fibroblastos. A acidez também diminui a

aminoácidos, minerais e vitaminas, os quais

actividade das protéases melhorando, assim, a

variam com o tipo de planta a partir do qual foi

cicatrização.

colhido o néctar. Estão descritas diversas propriedades do mel, as quais são abordadas em seguida (Cooper et al, 2009; Molan, 2011; Seckam & Cooper, 2013).

Na prática clínica, na presença de inflamação, a aplicação de mel no leito da ferida sobre um terminal nervoso mais sensibilizado pode causar dor, a qual desaparece habitualmente ao fim de

Acção osmótica

pouco tempo (Cooper et al, 2009; Molan 2011).

A acção osmótica do mel leva à saída de linfa

Acção desbridante

dos tecidos profundos, melhora a oxigenação e permite um maior aporte de nutrientes às células do leito da ferida. Adicionalmente mantém o leito da ferida suficientemente húmido para que o apósito não adira, diminuindo assim JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

A existência de tecido desvitalizado no leito da ferida é prejudicial à cicatrização. A melhoria do fluxo linfático devido à acção osmótica do mel vai permitir a chegada de maior quantidade de plasminogénio ao leito da ferida. Volume 2. Edição 3


Página 94

Concomitantemente, o mel inactiva o inibidor do

Vários estudos demonstraram que o mel de

activador do plasminogénio (PAI), permitindo

Leptospermum seleccionado consegue manter

que exista mais plaminogénio a ser convertido

níveis significativos de actividade antibacteriana

em plasmina, a qual digere a fibrina, sendo esta

mesmo em feridas altamente exsudativas.

última a responsável pela aderência do tecido desvitalizado ao leito da ferida. O resultado final é a promoção do desbridamento autolítico (Molan, 2011; Seckam & Cooper, 2013). Actividade anti-inflamatória Existem diversos estudos que suportam a actividade anti-inflamatória do mel, havendo evidência que esta não se deva directamente às suas propriedades antibacterianas. A presença de um estado inflamatório moderado e de curta duração é imprescindível para iniciar o processo de cicatrização. Quando essa inflamação é excessiva, o número de neutrófilos e macrófagos aumenta, bem como as espécies reactivas de oxigénio (ROS) por eles produzidas, as quais causam dano celular. Por outro lado, o peróxido de hidrogénio, uma ROS, atrai mais neutrófilos, formando-se um ciclo vicioso. A actividade antioxidante do mel é capaz de quebrar este ciclo diminuindo, assim, a inflamação. Por outro lado, a acção desbridante do mel também contribui para a diminuição da inflamação, visto que o tecido desvitalizado estimula a resposta inflamatória (Cooper et al, 2009; Molan 2011). Actividade antibacteriana A actividade antibacteriana do mel deve-se ao seu alto teor de açúcar, baixo pH e produção enzimática de peróxido de hidrogénio. Em 1988, Peter Molan constatou que o mel de manuka (Leptospermum scoparium da Nova Zelândia) possui uma potente actividade antibacteriana não dependente de peróxido de hidrogénio. JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

O mel possui actividade antibacteriana de largo espectro, sendo eficaz contra estirpes multirresistentes. Um estudo in vitro, realizado em 2009, sobre o efeito do mel em bactérias planctónicas e biofilmes sugere que o mel possui um efeito bactericida contra estes agentes patogénicos das feridas. Existem vários estudos sobre este assunto, porém necessitam de ser validados após o desenvolvimento de um teste fiável para detecção de biofilmes (Cooper et al, 2009; Seckam & Cooper, 2013). Acção desodorizante As bactérias metabolizam preferencialmente glicose. Porém, na sua ausência as bactérias anaeróbias metabolizam aminoácidos, resultando na produção de compostos de enxofre, aminas e amónias, causadoras de cheiro fétido nas feridas. A metabolização da glicose produz compostos com odor neutro, sendo este o motivo pelo qual a aplicação de mel nas feridas promove uma rápida diminuição de odor (Cooper et al, 2009). Prevenção de cicatriz hipertrófica As espécies reactivas de oxigénio formadas durante o processo inflamatório estimulam a actividade fibroblástica, responsável pela produção de fibras de colagénio necessárias à cicatrização. Em situações em que a inflamação é prolongada há uma hiperprodução das ROS, que pode levar à hipergranulação e à fibrose. Atendendo a que o mel previne a formação de radicais livres, existe uma diminuição do risco

Volume 2. Edição 3


Página 95

de formação de cicatriz hipertrófica (Cooper et

terapia compressiva antes de ser implementado

al, 2009).

o tratamento com mel.

O mel no tratamento de feridas

Caso 1 – Sra. M. F. G.

De modo a utilizar com segurança produtos com

Mulher de 60 anos, com úlcera no maléolo

mel no tratamento de feridas é necessário

interno da perna esquerda, a realizar tratamento

cumprir alguns requisitos tais como, avaliação

desde 22/09/2010. Tem como antecedentes

da quantidade de mel no produto e sua

pessoais relevantes insuficiência venosa e

actividade antibacteriana, esterilização com

acidente de viação, em 1974, com traumatismo

radiação gama e seu registo como dispositivo

da perna esquerda. Foram utilizados vários

médico.

apósitos, nomeadamente hidrofibra simples e

Cooper (2009) refere diversos estudos sobre a aplicação de apósitos com mel em feridas agudas e crónicas, nos quais se obtiveram resultados promissores no tratamento de abcessos, queimaduras, enxertos de pele (região dadora e receptora), feridas infectadas, úlceras de perna, úlceras de pressão, feridas cirúrgicas, deiscências de feridas cirúrgicas e úlceras de pé diabético. As diversas propriedades do mel permitem que este seja aplicado em tecido de epitelização,

com prata, apósito não aderente com iodopovidona, entre outros, que a utente não tolerou devido a queixas álgicas intensas no local da lesão. O tratamento foi complementado com terapia compressiva desde o início. A 05/11/2010, altura em que iniciou tratamento com mel, a lesão apresentava essencialmente tecido desvitalizado e algum tecido de granulação, exsudado seroso em pequena quantidade, sem odor e sem edema. Tratamento implementado

granulação, desvitalizado e necrótico. Porém, a

Limpeza com solução salina e aplicação de

frequência da troca de apósitos deverá ser

apósito hidroactivo em poliuretano com 30% de

estipulada de acordo com o nível de exsudado.

mel medicinal e ligadura de longa-tração. A

É necessário atender à aplicação de apósitos

22/11/2010 foi mudada terapia compressiva

com mel em feridas com tecido necrótico

para meia de compressão. A 02/12/2010 devido

espesso, uma vez que ao estar afastado do

ao aparecimento de uma nova lesão foi alterado

fluido intersticial o mel irá desidratar ainda mais

o tratamento para apósito de alginato não

o tecido devido à sua acção osmótica.

aderente impregnado com mel medicinal de

Estudos de caso Para este estudo foi efectuada uma colheita de dados dos utentes e caracterização da ferida, com registo de evolução escrito e fotográfico.

manuka, mantendo-se a meia de compressão. A 10/01/2011 as lesões encontravam-se encerradas. A utente mantém utilização da meia de compressão. (Figuras 1 a 4)

Foram utilizados dois tipos de apósitos com mel medicinal. Os casos apresentados já realizavam

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 96

1

Figura 1 – 05/11/2010 – Dimensões: (1) 3x1,5cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 7.

3

1

2

Figura 2 – 02/12/2010 – Dimensões: (1) 1,5x1cm; (2) 1x0,9cm; (3) 1x1cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 3.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 97

1

3

2

Figura 3 – 20/12/2010 – Dimensões: (1) 0,5x0,3cm; (2) 0,6x0,3cm; (3) encerrada. Exsudado ausente. Dor 5.

1

3 2

Figura 4 – 10/01/2011 – Lesões encerradas.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 98

Caso 2 – Sr. J. S.

A 12/11/2010, dia em que iniciou tratamento

Homem de 77 anos, com úlcera na face externa da perna direita, a realizar tratamento desde 01/2008. Como antecedentes pessoais relevantes apresenta insuficiência venosa e

com mel, a lesão apresentava essencialmente tecido de granulação, exsudado hematopurulento em moderada quantidade, cheiro fétido e pele perilesional ruborizada.

doença cardíaca. Durante os quase três anos de evolução da lesão foram aplicados inúmeros apósitos como: hidrofibra simples e com prata, apósito não aderente com e sem iodopovidona, sulfadiazina de prata, entre outros, sem sucesso na cicatrização.

Tratamento implementado Limpeza com solução salina e aplicação de apósito de alginato não aderente impregnado com mel medicinal de manuka. Foi mantida a terapia compressiva com ligadura de compressão. Após 10 semanas com este tipo de tratamento a lesão encerrou e o utente iniciou utilização de meia de compressão. (Figuras 5 a 8)

1

Figura 5 – 12/11/2010 – Dimensões: (1) 6x6cm. Exsudado hemato-purulento em moderada quantidade. Dor: 4.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 99

1 3

2

Figura 6 - 13/12/2010 – Dimensões: (1) 3,5x1cm; (2) 1x0,9cm; (3) 2,8x2,4cm. Exsudado seropurulento em moderada quantidade. Dor: 4.

1 3 2

Figura 7 – 13/01/2011 – Dimensões: (1) encerrada; (2) 0,5x0,3cm; (3) 1,3x0,3cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 2.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 100

3

1

2

Figura 8 – 31/01/2011 - Lesões encerradas.

Caso 3 – Sra. R. S. Mulher de 84 anos, com úlceras no maléolo interno da perna direita, a realizar tratamento desde 07/12/2010. Os antecedentes pessoais relevantes são a arritmia cardíaca e a insuficiência venosa. Realizou tratamento com hidrofibra com prata, hidrogel e placa hidrocoloide, não tolerando nenhum devido a intensas queixas álgicas. A 31/12/2010 apresentava duas lesões com tecido desvitalizado, pele perilasional ruborizada, exsudado seroso em pequena quantidade e sem odor, tendo-se iniciado tratamento com mel.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Tratamento implementado Limpeza com solução salina e aplicação de apósito hidroactivo em poliuretano com 30% de mel medicinal e meia de compressão. Na região perilesional foi aplicado um spray protector cutâneo. A 13/01/2011 devido à maceração da pele perilesional, foi alterado o tratamento para apósito de alginato não aderente impregnado com mel medicinal de manuka, mantendo-se a meia de compressão. A 14/03/2011 as lesões encontravam-se encerradas. A utente mantém utilização da meia de compressão. (Figuras 9 a 12)

Volume 2. Edição 3


Página 101

2 1

Figura 9 – 31/12/2010 – Dimensões: (1) 2x0,8cm; (2) 0,8x0,5cm. Exsudado seroso em moderada quantidade. Dor: 7.

2 1

Figura 10 – 13/01/2011 – Dimensões: (1) 1,5x1,2cm; (2) 0,4x0,3cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 2.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 102

2 1

Figura 11 – 10/02/2011 – Dimensões: (1) 1,4x0,5cm; (2) encerrada. Exsudado seroso em moderada quantidade. Dor: 5.

2 1

Figura 12 – 14/03/2011 – Lesões encerradas.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 103

Caso 4 – Sra. E. S. Mulher de 77 anos, com duas úlceras na face

Tratamento implementado

interna da perna esquerda, a realizar tratamento

Limpeza com solução salina e aplicação de

há 11 anos. Os antecedentes pessoais

apósito de alginato não aderente impregnado

relevantes são insuficiência venosa, hipertensão

com mel medicinal de manuka. Foi mantida a

arterial e dislipidémia. Destacam-se, também,

terapia compressiva com ligaduras de curta-

como antecedentes familiares trombose venosa

tracção. Ao fim de doze semanas com este

profunda na mãe e úlcera de perna no pai.

tratamento, a lesão proximal encontrava-se

Durante os anos de tratamento foram utilizados

encerrada e a lesão distal com

incontáveis tipos de apósitos, sendo o último a

aproximadamente metade do tamanho. (Figuras

hidrofibra com prata. A 24/01/2011, quando

13 a 16)

iniciou tratamento com mel, a lesão proximal apresentava tecido de granulação e desvitalizado e a lesão distal essencialmente tecido desvitalizado, pele perilesional ruborizada, o exsudado era seroso em pequena quantidade e sem odor.

1

2

Figura 13 – 24/01/2011 – Dimensões: (1) 1,5x1,5cm; (2) 1,5x1cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 4.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 104

1

2

Figura 14 – 07/02/2011 – Dimensões: (1) 1,2x1cm; (2) 1,6x0,6cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 4.

1

2

Figura 15 – 24/03/2011 – Dimensões: (1) encerrada; (2) 1,7x0,4cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 3.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 105

1

2

Figura 16 – 11/04/2011 – Dimensões: (1) encerrada; (2) 1x0,4cm. Exsudado seroso em pequena quantidade. Dor: 3.

Considerações finais Os casos apresentados, embora distintos, evoluíram favoravelmente podendo constatar-se que o mel apresenta, globalmente, propriedades vantajosas para a resolução de feridas com diferentes características. A rápida cicatrização foi uma surpresa positiva, principalmente no segundo caso onde se verificou o encerramento

de tecido, levando a uma rápida cicatrização. Infelizmente verificou-se um aumento da dor no leito da ferida em dois dos casos, no momento da mudança do apósito. Torna-se, assim, fundamental escolher o tipo de apósito em conformidade com as características das feridas, para que se possa optimizar o tratamento com o mínimo de efeitos adversos.

em 10 semanas de uma lesão com quase três

Um processo cicatricial mais rápido acarreta

anos de evolução.

benefícios para o utente devolvendo-lhe

O apósito hidroactivo em poliuretano com 30% de mel medicinal revelou uma rápida acção desbridante e redução da dor no local da ferida. Porém, a sua humidade excessiva, bem como o tipo de adesivo foram prejudiciais para a pele perilesional, ainda que tenha sido aplicado um

autonomia e qualidade de vida e, também, para a Instituição de Saúde através da diminuição dos gastos em recursos materiais e humanos. Os apósitos com mel devem, portanto, ser considerados como opção, particularmente nas feridas multitratadas.

spray protector cutâneo. O apósito de alginato

No futuro será importante a realização de mais

não aderente impregnado com mel medicinal de

ensaios clínicos com grupos de controlo e

manuka teve uma boa resposta nos vários tipos

amostras significativas, de modo a validar as

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Página 106

vantagens e desvantagens no uso de mel nos diferentes tipos de ferida, comparativamente a outros apósitos usados como tratamento de primeira linha. Embora existam indícios de que o mel possa desempenhar um papel importante na eliminação e prevenção da formação de biofilmes é necessária maior investigação sobre este problema particularmente importante e de difícil solução.

Referências bibliográficas Cooper, R., Molan, P., White, R. (2009). Honey in Modern Wound Management. Malta: Wounds UK. Molan, P. C. (2011). The evidence and the rationale for the use of honey as a wound dressing. Wound Practice and Research 19(4), 204–220. Seckam, A., & Cooper R. (2013). Understanding how honey impacts on wounds: an update on recent research findings. Wounds International , 4 (1), 20-24.

JOURNAL OF AGING AND INOVATION (EM LINHA) ISSN: 2182-696X / (IMPRESSO) ISSN: 2182-6951

Volume 2. Edição 3


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.