Cartilha Uso Sustentavel

Page 1

USO SUSTENTÁVEL DA CAATINGA

ELABORAÇÃO GINA KAROLLI FREITAS MACIEL Enga Agrônoma FRANCISCO MOREIRA DA SILVA Engº Agrônomo REVISÃO MAGNUM DE SOUSA PEREIRA Engº Agrônomo – Coordenador de Projetos da Associação Caatinga LIANA MARA MENDES DE SENA Bióloga – Técnica de Projetos da Associação Caatinga

Guia prático para um manejo mais sustentável na caatinga


APRESENTAÇÃO

A caatinga estende-se por todo o semiárido nordestino ocupando 11% do território nacional. Com sua vegetação de rara biodiversidade, abriga uma grande diversidade de espécies da flora com aproximadamente 940 espécies catalogadas.

Fonte: IBGE (2009)

BRASIL, A vegetação Fonte: da caatinga possui um 2010. papel fundamental na vida do sertanejo, fornecendo produtos madeireiros (lenha, carvão e estacas) e não-madeireiros (frutas, mel, plantas medicinais, sementes), além de servir de alimento para os animais de criação (gado, caprinos e ovinos). 1

MATA

CONSERVADA No entanto, o uso inadequado dos recursos florestais da caatinga, associado ao aumento populacional e a não preocupação com a conservação LENHA destes recursos resultou na destruição da biodiversidade, ESTACA acarretando perda da qualidade de vida das populações rurais.

FORRAGEM

MADEIRA

Queimadas, corte indiscriminado da madeira e troca da mata por plantações, contribuem para a destruição da caatinga, tornando a vida no semiárido mais difícil. Associado aos fatores já mencionados, a falta de informações técnicas sobre o manejo florestal contribui ainda mais para o aumento da degradação ambiental. Esta cartilha tem o objetivo de levar informações importantes a médios e pequenos produtores rurais sobre o uso racional da caatinga através do manejo florestal como alternativa viável para a produção sustentada de produtos florestais. 2


MANEJO SUSTENTÁVEL DA CAATINGA

O que é manejo sustentável? É o uso planejado e adequado dos recursos da Caatinga, permitindo que uma mesma área possa fornecer, de maneira constante, os recursos necessários sem a necessidade de destruição de outras áreas.

Área manejada com o uso de plano de manejo sustentável da madeira. Corte do primeiro talhão. Fonte: APNE, 2010

Com o manejo sustentável, a caatinga poderá continuar fornecendo produtos para o consumo e geração de renda dos sertanejos: água, fertilidade do solo para plantio de alimentos, lenha, carvão, madeira para estacas e construção, remédios, artesanato, etc.

3

Como manejar a caatinga? É necessário identificar os recursos existentes e definir como manejá-los de forma a obter a maior produção sustentável nos aspectos econômico, social e ambiental. Caso contrário, o mau uso da caatinga pode conduzir a desertificação da área. O uso não planejado da vegetação leva a um estado de difícil recuperação do solo. Foto: Associação Caatinga

Aspectos importantes para o manejo florestal: - Existência e disponibilidade de vegetação com qualidade suficiente para possibilitar uma produção regular; - Capacitação técnica para quem irá trabalhar com os produtos florestais; - Existência de mercado consumidor para os produtos gerados pelo manejo florestal. 4


ETAPAS DO MANEJO FLORESTAL SUSTENTÁVEL

2. Inventário Florestal da área para manejo da madeira

Para se realizar o manejo florestal de forma correta, é necessário seguir as seguintes etapas:

Para conhecer as espécies existentes na propriedade, sua quantidade, tamanho e volume disponível é realizado um estudo da área chamado inventário.

1. Planejamento da Propriedade É a organização da propriedade visando garantir a produtividade, a qualidade do solo e a manutenção dos recursos naturais. Para que possa ser efetivo, o planejamento envolve o conhecimento geral da propriedade, e a delimitação de áreas existentes, tais como: Área de Preservação Ambiental (APP); Área de Reserva Legal (RL); Área de Agricultura e Pastagem; Área para Manejo de Madeira; Estradas de acesso Reserva Legal: constitui uma área contendo no mínimo 20% da área da propriedade rural. Áreas de Preservação Permanente são áreas protegidas por lei que incluem margens de rios, açudes e lagoas; topo de morro; áreas de declive, entre outras classes. Ambas possuem de uso limitado e racional, e destinamse a manter os processos ecológicos, conservar a biodiversidade e servir de abrigo para fauna e flora local. 5

O inventário consiste na identificação e medição das árvores, o que mostrará a representatividade da área que se quer manejar. Na área que será explorada é necessária uma amostragem com tamanho de aproximadamente 20 x 20 m chamado de parcela. Em cada parcela, serão contadas as espécies e registrado o porte das árvores (através da medição da altura e diâmetro do caule) em uma caderneta de campo, estimando a quantidade de madeira que será cortada. Equipamentos utilizados no inventário Florestal:

A

B

C

D

A – Caderneta de campo para anotação das medidas das espécies, B – GPS utilizado para marcação das parcelas do inventário e também dos talhões; C – Régua de medição de diâmetro de tronco, D – Trena para medir altura das árvores.


GPS: é um aparelho que oferece posicionamento geográfico por satélite.

Após o inventário, a área é dividida em partes chamadas de talhões, onde cada talhão terá o seu ciclo de corte. A mata existente nas margens de rios, açudes e lagoas (entre 30 e 50 metros) deve ser mantida, sendo proibido por lei o uso destas áreas para extração vegetal. A exploração desta mata compromete a disponibilidade de água, pois o espelho d´água fica exposto aos raios solares e ao vento, causando a sua evaporação. Além disso, a perda da mata ciliar causa erosão e assoreamento deixando mais raso, ou causando o completo desaparecimento, do rio ou açude, como mostra a figura abaixo: IMPORTANTE:

3. Organização da Exploração O tipo de exploração mais utilizado nos manejos florestais, e que será abordado nesta cartilha, é tipo corte raso. Corte Raso: As árvores são cortadas, independente de tamanho ou espécie, deixando parte do tronco. O corte na altura correta é fundamental para a regeneração da árvore. A altura do corte depende do formato do tronco da árvore, mas em geral a altura é de aproximadamente 30 cm a partir do solo. Principais tipos de corte raso: Em Talhões Alternados: explora-se um talhão por período, a depender do ciclo de corte; Em Faixas Alternadas: exploram-se faixas dentro de um mesmo talhão, alternadamente, criando uma rotação de ciclo de corte dentro do mesmo talhão;

Figura mostrando o corte em áreas alternadas dentro de um mesmo talhão 7

8


Corte no 1º Ano

Corte no 10º Ano

Corte no 8º Ano

Corte no 5º Ano

Corte no 3º Ano

Corte no 4º Ano

Corte no 6º Ano

Corte no 2º Ano

Corte no 7º Ano

Corte no 9º Ano

Importante: independente do tipo de corte utilizado, os restos (galhos e folhas) da exploração ficam espalhados na área garantindo a proteção do solo, a rebrota e a reciclagem dos nutrientes.

5. Regeneração Natural

Esquema de corte em talhões alternados (manejo de um talhão por vez)

A figura acima representa uma fazenda que será manejada em 10 anos para utilização de recursos madeireiros. Respeitando-se a reserva legal, a área de pastagem e agricultura, o restante será dividido em dez partes e a cada ano irá ser utilizada uma parte. Ou seja, um talhão a cada ano. No 1º ano será cortado o 1º talhão e assim suscessivamente, ao final do 10º ano, o 1º talhão cortado já estará regenerado para um novo corte.

9

Após a exploração do talhão, a área deve ser mantida em repouso, ou seja, não realizar nenhuma ação na área para que ela possa se regenerar naturalmente. Nas operações de manejo florestal o processo de regeneração é de grande importância, devido à reconstituição da vegetação através da rebrota dos tocos e raízes e germinação de sementes que ficam no solo e retornam o crescimento no início das chuvas. Com este processo, a área em alguns anos estará pronta para ser utilizada novamente.

10


CAUSAS E EFEITOS DO MANEJO INCORRETO A Caatinga quando não é bem manejada pode causar efeitos devastadores. Isso devido à fragilidade do solo e da vegetação. Os principais efeitos do uso incorreto da caatinga são:

Desmatamento

Assoreamento de rios Queimadas descontroladas Erosão dos solos

CAUSA

Extinção do banco de sementes do solo e não o retorno da mata 11

Desertificação Imagens: Ewerton Torres

12


DIVERSIFICAÇÃO DO USO No sertão nordestino a sobrevivência de muitas famílias é garantida pela exploração de produtos nãomadeireiros, contribuindo para a geração de emprego e renda através de espécies forrageiras, apícolas, frutíferas, medicinais, oleaginosas, ornamentais e produtoras de fibra. Contudo, a caatinga, se bem manejada, pode oferecer muitas formas de uso que ajudam na conservação da mata e dos recursos naturais. Meliponicultura A criação de abelhas nativas da caatinga que não possuem ferrão, (o que simplifica a sua criação) é chamada de meliponicultura. A abelha mais utilizada para é a jandaíra. O mel com alto valor medicinal e de mercado. Produção de mudas da caatinga O crescente aumento do desmatamento vem ocasionando a falta de recursos naturais para os diversos setores que utilizam a madeira como principal matéria prima para o desenvolvimento de suas atividades. Com isso, a produção de mudas de espécies nativas torna-se fundamental para os projetos 13

de recuperação florestal que visam minimizar os efeitos negativos ocasionados pelo homem.

Mudas de espécies nativas produzidas nos viveiros da Associação Caatinga.

Agrofloresta É um sistema de produção que imita o que a natureza faz normalmente. Deixa o solo sempre coberto pela vegetação e muitos tipos de plantas juntas, umas ajudando as outras, sem problemas com pragas nem doenças, sem causar erosão e dispensa o uso de venenos. Unidade demonstrativa de Agrofloresta – Itatira – CE 14


Sistema Agrosilvipastoril Consiste no conjunto de técnicas agrícolas e manejo de animais em áreas florestais. Tal ação permite um uso mais efetivo da área e maior ganho de renda com um menor impacto ao meio ambiente.

BIBLIOGRAFIA

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. Manejo florestal sustentado da caatinga. Brasília: Governo Federal, 1996. SAMPAIO, E. V. S. B., et al. Espécies da flora nordestina de importância econômica potencial. Recife: Associação Plantas do Nordeste, 2005. MAIA, G. N. Caatinga: árvores e arbustos e suas utilidades. São Paulo: D&Z Computação Gráfica e Editora, 2004. Ministério do Meio Ambiente. Curso sobre análise de planos de manejo florestal sustentável no bioma Caatinga. Paraíba: Secretaria de Biodiversidade e Florestas, Departamento de Florestas, 2008.

Criação de carneiros em um Sistema Agrossilvipastoril

Ministério do Meio Ambiente. Manejo sustentável dos recursos florestais da caatinga. Guias técnicos, vol 1. Natal: Secretaria de Biodiversidade e Florestas, Departamento de Florestas, 2008.

Produtos Artesanais Fonte de renda utilizada muitas vezes por mulheres, que acrescentam uma renda extra para a família a produção de diversos produtos artesanais como: sabonete, vassoura e chapéus de palha de carnaúba, jóias de sementes entre outros produtos.

15

16


Que as técnicas apresentadas nesta cartilha possam contribuir para práticas mais sustentáveis dos recursos naturais da caatinga, melhorando a qualidade de vida das famílias sertanejas e de suas futuras gerações!

ESSA CARTILHA FOI PRODUZIDA NO ÂMBITO DO PROJETO COMUNIDADES RURAIS SUSTENTÁVEIS: MANEJO FLORESTAL E SILVICULTURA SUSTENTÁVEL EM GENERAL SAMPAIO/ CE REALIZADO PELA ASSOCIAÇÃO CAATINGA

Realização:

Apoio:

A Associação Caatinga é uma instituição não governamental sem fins lucrativos com a missão de CONSERVAR A BIODIVERSIDADE DA CAATINGA. Há 12 anos desenvolve projetos para criação e gestão de áreas protegidas, o fomento à pesquisa, a educação ambiental e o desenvolvimento sustentável.

Patrocínio:

www.acaatinga.org.br (85) 3241 -0759


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.