Edição 8 de A CASA em revista

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A CASA FOTO ARTE



A CASA EM REVISTA - ed.8


Capa Diรกrio ร ntimo Alice Sauma


Editorial

A CASA em revista é uma publicação virtual de artes visuais com ênfase na fotografia contemporânea. Nasce dentro

do isolamento social necessário para evitar o coronavírus.

Inicialmente voltada para artistas que participam de projetos, encontros ou cursos A CASA, busca dar visibilidade em

tempos de pandemia para a emergente produção destes artistas, também servir de portfólio e ajudar a colocar novos

nomes e trabalhos em circulação dentro do sistema de arte. Além de ensaios fotográficos e trabalhos relacionados à

imagem, cada edição terá uma entrevista com um artista convidado, que apresentará também um ensaio, projeto ou

produção de sua autoria, escolhido e selecionado por ele mesmo.

Que felicidade receber em nossas páginas Rogério Assis,

um fotógrafo humanista, homem de posições firmes, um brasileiro que podemos nos orgulhar. Suas raizes

paraenses transformam fotos em poesia, deixando explicito seu amor aos povos indígenas, comunidades camponesas e ribeirinhas, e claro a floresta. Bem vindos a oitava Revista.


Diário Íntimo Alice Sauma

O ato de fotografar para mim, muitas vezes, funciona como uma forma de reflexão, olhar para dentro, um momento íntimo. Nessa série em desenvolvimento, falo um pouco de identidade, mudanças, incertezas e sensações do meu dia a dia. Diário íntimo é onde me liberto de mim mesma e deixo fluir em imagens a minha busca interior e constante por evolução, transformação, pertencimento.











Solidão em Dó Arlete Bonelli Fruto da solidão. E eu sobrevivente de tanto caos, vejo-me diante da escuridão, mas não me rendo à sombra. Sigo com minhas imagens tecendo vínculos que revelam liberdade e aprisionamento. No compasso descompassado busco com meu olhar o que me é caro e que ainda existe lá do lado de fora.











Ensaio Sobre a Cegueira Lucas Lima

A cegueira, como a ausência de luz, trazendo à tona a escuridão foi questionada por Saramago quando escreveu seu livro homônimo a esse ensaio. Apesar disso, a questão central do seu livro sempre foi a natureza humana, que se manifesta em múltiplos caminhos quando todos deixam de ver. Na ruptura das aparências, cada gesto ou atitude se manifesta de acordo com o caráter de cada um, assim sendo, desnudam as diversas facetas da nossa humanidade.









United in Dance Luciano Siqueira ‘United in Dance’ é o primeiro trabalho sob demanda de Siqueira e também o primeiro realizado pelo coletivo International Cross Art, que reúne artistas 25 artistas de 10 países – Noruega, México, Estados Unidos, Canadá, Brasil, Alemanha, França, Japão, Irã e Peru. United in Dance tem a proposta de estabelecer laços artísticos através da dança, tendo seu conceito sido desenvolvido pela fotógrafa norueguesa Lisa Karina Bakke. As fotografias originais foram tomadas pela artista no México e na Noruega e posteriormente refotografadas por Siqueira em seu ateliê no Brasil. A ressignificação do trabalho partiu da interpretação do artista ao observar a obra de Bakke pela primeira vez. Siqueira fotografou pequenos fragmentos das imagens e desenvolveu uma narrativa visual ligada pelo movimento.











Intolerância Oscar Cardoso

Ao visitar a Mesquita de Córdoba o que assombra é o Isla-mismo sendo subjugado pelo Cristianismo. Da beleza da luz dos arcos passa-se à escuridão inquisitorial. Imagens assusta-doras, pinturas, esculturas, encaminham para o ápice da ima-gem dourada da cruz de Cristo. A violência da imposição de uma visão de mundo ocidental católico culmina numa pergun-ta historicamente atual: As imagens do poder da fé e do ódio são aquelas que gover-naram, governam e governarão o mundo ?











Uruboros

Tadeu Figueiredo Ao passo que o passageiro e o eterno possuem aspectos semelhantes, ambos são intangíveis e imutáveis, por este motivo sempre retomarão seu ciclo infindável. No que há de mais certo da vida, seu vai e vem, muito embora seus atores não sejam os mesmos, as cenas aparecem repetidas vezes, o que lhes impõe uma direção definida, à exclusão de outras, no mesmo cenário com novos atores... ainda assim a assombração perigosa, que permanece viva, quer pela influência que lhe resta sobre a moral, quer pelos obstáculos que a sobrevivência de seus conceitos enfraquecidos opõem ao surgimento de um sistema de valores fundado em novos pressupostos, tendo deste modo seu eterno retorno.











Recuerdos de Animitas VeruRolan Ensaio fotográfico (2019) composto de dípticos que reúnem animitas fotografadas no período de 2005 a 2018 e fotos antigas do arquivo pessoal da fotógrafa. Inspirado na noção de tempo real de Bergson, que tem como propriedades fundamentais a sucessão, a continuidade, a mudança, a memória e a criação. Na tentativa de integrar estas propriedades, o projeto parte do conceito de que são as memórias (recuerdos) que nos permitem estabelecer relações entre vivências presentes e passadas, fazer a travessia, encerrar os lutos, para podermos criar e recriar o nosso futuro, seguir em frente com a aventura da vida.











Outro Equador Vitor Vogel Quarenta e quatro mil e setenta e seis quilômetros de uma linha imaginária para dividir igualmente o globo terrestre. Cruze o Atlântico nesta trilha imaginada e lá encontrará um povo mestiçado pela violência e unido pelo sonho. Tal qual o nosso. Num devaneio perpétuo procuro Outro Equador. Fotografias realizadas em 2014 na ilha de São Tomé. Imagens revisitadas em 2020 como um meio de memória de uma República Democrática banhada pelo Atlântico Sul.











Foto AndrĂŠ Klotzel


Artista Convidado

RogĂŠrio Assis -10%


Entrevista A CASA: Olá Rogério. Obrigado por participar da nossa Revista. Pode nos contar um pouco como que a fotografia entrou em sua vida? Quais seus ídolos e referências artísticas? ROGÉRIO ASSIS: Ainda criança, lá pelos 10 anos, meus pais mudaram para fora da cidade de Belém, fomos viver em um condomínio dentro de uma antiga fazenda, hoje região metropolitana. As poucas famílias que viviam lá eram de estrangeiros que vinham trabalhar na Amazônia nos anos 70, um desses vizinhos, geólogo, tinha um laboratório fotográfico em casa. A primeira vez que vi uma imagem surgindo numa bandeja cheia de água foi um momento má-gico pra mim, desde então comecei a me interessar por fotografia. Meu padrinho, advogado, tinha a fotografia como hobby, aquele monte de equipamento que ele tinha e deixava eu brincar quando o visitava, também despertou minha curiosidade. Não tenho ídolos, nem gosto desse termo, mas teve muito artista bacana que influenciou meu trabalho, não só fotógrafos mas músicos, pintores, escultores, escritores…


Vou citar apenas os 3 fotógrafos que foram determinantes na minha opção profissional: Miguel Chikaoka, mestre e guru para além da fotografia, João Bittar, que me deu minha primeira oportunidade de trabalho em São Paulo e Octávio Cardoso, meu querido amigo de infância que abandonou a engenharia pela fo-tografia e me mostrou que isso era uma possibilidade profissional para além do hobby que era minha referência de infância. Dos grandes mestres, Koudelka e Bresson são meus favoritos. Mas tive também a sorte de trabalhar em 3 redações (Angular, Estadão e Folha) com grandes mestres do fotojornalismo, fora os colegas de outras redações com quem, mesmo indiretamente, aprendi muito. A lista é grande e como não quero esquecer de citar nenhum, vou ficar devendo os nomes. A CASA: Você é paraense. Consegue nos dizer porque a fotografia paraense é tão forte e tão respeitada? Qual o segredo? ROGÉRIO ASSIS:

Não sei o segredo, mas o principal responsável

pela difusão da fotografia no Pará foi e ainda é, Miguel Chikaoka. Fora o Luiz Braga que já era um fotógrafo reconhecido quando Miguel chegou por lá, acredito que todos os outros profissionais de fotografia paraenses, passaram pela mão ou tiveram alguma influência do mestre Miguel em suas carreiras.


A CASA: Seu livro Zoé é belíssimo. Conta pra gente como foi essa aproximação e a relação deles com a fotografia. ROGÉRIO ASSIS: Essa história é meio comprida, tá lá no meu livro, vou tentar resumi-la aqui. Estive em 2 oportunidades com os Zo’é, na primeira expedição de contato e reconhecimento da etnia pela FUNAI, em 1989 e 20 anos depois para realizar o projeto do livro. Na primeira oportunidade, fui pego de surpresa junto com a equipe da produtora na qual eu trabalhava em Belém. Estáva-mos gravando uma entrevista com o então presidente da FUNAI, Cel. Cantídio Guimarães, quando ele recebeu um chamado de Brasília com o aviso: “encontraram os índios”. Daí foi uma corre-ria pra fretar um avião, voar até Santarém e de lá, de helicóptero, seguir as coordenadas até o local onde eles tinha sido encontrados. Lá chegando, fomos (como de praxe em todas as etnias quais já tive o prazer de documentar) super bem recebidos. Curiosidade e respeito de ambas as partes. 20 anos depois foi praticamente a mesma coisa. Os Zo’é são muito hospitaleiros, um tanto vaidosos e gostam de ser fotografados. A CASA: Sua fotografia tem forte caráter humanista. Você acredita que a fotografia e a arte possam ser fatores de transformação da sociedade?


ROGÉRIO ASSIS: Em 2018 participei pela primeira vez da residência, LAB VERDE. Uma experiência que reúne arte, ciência e meio ambiente, na Amazônia. Lá conheci Lucy Orta, a curadora convidada a analisar o trabalho dos artistas participantes. Ela começou a palestra dizendo: “Arte que não questiona nada e não mobiliza pela transformação do mundo, só serve pra enfeitar parede”. Sempre acreditei, mais ouvir de alguém com o talento, a capaci-dade de mobilização e o currículo dela, só reforçou minha crença. Toda vez que saio de casa pra fazer um trabalho, acredito que aquilo sirva para romper preconceitos, conscientizar e transfor-mar a sociedade. Se não for pra isso, prefiro ficar no sofá chapa-do assistindo TV. A CASA: Você pode explicar para a gente sobre o que se trata esse projeto -10%? ROGÉRIO ASSIS: Em todos esses anos que venho trabalhando na Amazônia a escuridão da floresta em mata fechada sempre me chamou atenção. São muitas e longas caminhadas no meio do mato e na mai-oria das vezes temos que fotografar com iso acima de 3.200 mesmo com sol a pino, calor e muita umidade. Em 2018 quando participei pela primeira vez do Lab Verde, o ornitólogo e pesquisador do INPA, Mario Cohn-Haft mencionou durante sua palestra que a quantidade de luz do sol que atinge o solo em florestas nativas preservadas, não ultrapassa 10%, em alguns casos não passa de 0,5%, segundo ampla pesquisa realizada pelo INPA na


região amazônica. Essa informação foi fundamental para dar inicio a minha pesqui-sa visual que, até então era apenas intuitiva. Desde então tenho procurado registrar esse fenômeno que é fundamental para desenvolvimento da biodiversidade do planeta. É um trabalho em andamento que espero não termine nunca, sendo assim sempre terei um pedaço de floresta pra fotografar e nós, seres vivos, te-remos a biodiversidade garantida para seguirmos vivos como espécie. A CASA: Como é sua relação com mercado de arte? Como você vende suas obras? Se um jovem colecionador quiser ter um Rogério Assis, como deve fazer? ROGÉRIO ASSIS: Não tenho relação com o mercado arte, já trabalhei com algu-mas galerias sem nenhum sucesso, acredito que meu trabalho ou talvez meu discurso, não sejam adequados a um mercado tão elitista como o dos consumidores e colecionadores de arte. Com o incentivo e o suporte do meu filho, Pedro, resolvi então criar minha própria loja virtual. A idéia é atingir a todos que te-nham interesse em fotografia e não apenas os que tem grana pra consumir arte oferecida pelo mercado de galerias. Então dispo-nibilizei boa parte do meu acervo


com preços que variam de R$250 a R$7.000, dependendo do trabalho e da tiragem, se limitada ou não. Não estou aqui querendo demonizar o trabalho dos galeristas pelos quais tenho maior respeito, alguns bons e queridos amigos atuam nesse mercado. Só que pra mim não funcionou, mas co-nheço muita gente que tem sucesso e prefere trabalhar dessa maneira. Acho honesto, desde que tudo que for combinado entre as partes seja cumprido. A CASA:

Quais conselhos você daria para quem quiser iniciar a

produzir e viver de fotografia? Tem alguma fórmula mágica? ROGÉRIO ASSIS: Toda vez que me perguntam isso eu sempre brinco dizendo: “a melhor maneira de viver de fotografia é fazendo outra coisa”. Mas falando sério, se alguém procura a fotografia com o foco na grana, tá fazendo uma grande cagada. Não que não seja possível, mas não é o caminho mais fácil para o almejado pote de ouro. Posso falar da fotografia documental e do fotojornalismo, onde sempre atuei. Quem escolhe esse caminho não deve pensar em grana como objetivo principal. Como falei anteriormente, se não for pra romper preconceitos, conscientizar ou transformar a so-ciedade, esquece a fotografia e vai tentar a carreira de banqueiro, miliciano,


politico de direita ou qualquer outra atividade na área do capitalismo selvagem. O sucesso financeiro dessas profissões é inquestionável. Não existe formula ou pulo do gato como muitos imaginam. Fotografia é trabalho duro para construir uma trajetória compatível com o que você acredita. CASA: Suas fotos são comercializadas pelo mundo. Qual sua relação com o mercado de arte, galerias, colecionadores? Dica A CASA:

Para quem se interessar em adquirir os trabalhos

desse grande artista Rogério Assis, é só visitar o site e a lojinha virtual https://rogerioassis.46graus.com/loja/













Artistas

Alice Sauma Arlete Bonelli Lucas Lima Luciano Siqueira Oscar Cardoso Tadeu Figueiredo VeruRolan

Artista

Convidado

Vitor Vogel

RogĂŠrio Assis


Conselho Editorial Greice Rosa Marcio Menasce Marco Antonio Portela

Projeto Grรกfico Bruno Almeida


acasafotoarte.com


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