ESTE FOLHETO É PARTE INTEGRANTE DO ACERVO DO BEHETÇOHO EM FORMATO DIGITAL, SUA UTILIZAÇÃO É LIMITADA. DIREITOS AUTORAIS PROTEGIDOS.
INFORMAÇÕES SOBRE O PROJETO O Acervo Eletrônico de Cordéis do Behetçoho é uma iniciativa que pretende dar consequências ao conceito de (com)partilhamento dos artefatos artísticos do universo da oralidade, com o qual Behetçoho e Netlli estão profundamente comprometidos.
INFORMAÇÕES SOBRE A EQUIPE A equipe de trabalho que promoveu este primeiro momento de preparação e disponibilização do Acervo foi coordenada por Bilar Gregório e Ruan Kelvin Santos, sob supervisão de Edson Martins.
COMPOSIÇÃO DA EQUIPE Isabelle S. Parente, Fernanda Lima, Poliana Leandro, Joserlândio Costa, Luís André Araújo, Ayanny P. Costa, Manoel Sebastião Filho, Darlan Andrade e Felipe Xenofonte
ABDORAL RODRIGUES JAMACURU
A BATALHA CONTRA O FOGO
1998
Poeta de versos rimados, repentistas, cordelistas peço licença acanhado por querer entrar na pista de quem faz versos rimados, de derrota ou de conquista.
Nessa linha da poesia eu não tenho experiência, sou poeta vanguardista, tá bem claro, tá na cista, é por isso que vos peço um tiquim de paciência.
Da poesia sou amante, me perdoem esse pecado não quero ser arrogante nem quero ser desastrado mas peço, não tenham pena se eu fizer um verso errado.
O assunto é o seguinte: um fogo que teve aqui quem quiser que fique ouvinte, sucedeu no cariri na floresta de requinte de mangaba e de piqui. O assunto fere e dói, de falar fico dormente. Dá umquê queme corrói, que me deixa até doente, das tripas se faz um mói, imagine a minha mente.
Eu vi o mato ardendo a labareda avanando vi o bicho passar correndo, o verde cinza cirando, em cima o fogo lambendo, embaixo o povo rezando.
Por aqui tem um atalho gritava que tava rouco um falador papagaio. O fogo ficava louco queimando tudo que é gaio, já tinha bicho até broco. No outro lado um ferreiro, soltando um canto metal, abri depressa um berreiro dizendo isso vai mal. Se não vier um socorro isso aqui vira mingau.
A ave ia alarmando: quem tá falando é o ferreiro, para o Crato e o Juazeiro. Aqui tem fogo pegando por isso que estou chamando, suba aqui quem for bombeiro.
Dotô Willian Brito, presidente do IBAMA que te poeta tem fama, sentiu-se logo aflito, pensou consigo tô frito nesse fogo que inflama.
Veio avião do governo, Vicelmo a notícia espalha, vêi soldado da milícia, veio gente de Barbalha, só não vi por lá ladrão, que gente assim atrapalha.
O fogo fazia medo, eu me lembro do assombro. Corria Zefa e Zé Pêdo com um filho em cada ombro. Tinha gente sem dedão de tanto levar um tombo.
O bicho não dava ouvido, a coisa fazia dó. De choro, grito e grunhido já tinha bicho cotó de tanto queimar o rabo, rato virou-se em mocó. Corria tamanduá. onça. cotia e sofreu. tatu, peba e guará, e quase que lá morreu um tal de Jesus meu Deus que do canto se esqueceu.
Bicho de muita perna. piôi de cobara e imbuá, pediam: carona preá, pois nós corre devagar e esse fogo tá chegando como quem quer nos queimar.
O pop camaleão, corria de norte a sul, pulava do galho ao chão. Imitando o papacu, sonhava pegar carona nas asas do urubu.
Mais alto que andorinha voava esperto o cancão. de baixo da fumaça vinha, sufocando o gavião. o fogo mais aumentava faltava chuva no chão.
Se via muitos incetos correndo sem lugar certo cigarra, formiga e cupim, abelha puxando o mel faz pena ver tanto o bichim voando da terra pro céu.
Voando baixo se via a nambu e o zabelê, tanajura que subia sem anunciar chover, mangangá batia as asas, fugindo pra não morrer.
Vi o cavalo do cão num sobe e desce formoso deixar e tinhoso no não dizendo muito fogoso? Fique no fogo seu cão, bicho véio desastroso.
Tinha também o canário que de nada era otário fugia com toda gente dizendo não sou genário, nem tão pouco eu sou Jesus para morrer nesse calvário.
Pegou fogo o jatobรก, a mangaba, o cajui, pitombeira e araรงa, a ameixa e o piqui, o pau dรณia, o visgueiro, janaguba e murici.
E o fogo prosseguia, nada, nada respeitava. Descia, depois subia, qualquer um ele zombava, nem IBAMA nem bombeiro, o danado respeitava. Seguia se alastrando, destruindo o taquaral. Crescendo ia dizendo, vou fazer um carnaval, vou deixar tudo fervendo, tรก me ouvindo Abidoral?
Ao ouvir tal heresia foi tomada a decisão, vou cuidar desse encrenqueiro falou grosso um gavião. Vou voar por cima dele pilotando um avião. Foi então que entrou na luta o Prefeito e a Reitora, muita gente da labuta, só faltou a promotora, veio o homem lá da roça e uma santa protetora.
Travou-se ao fogo uma guerra pro incêndio debelar, veio água da nascente e de todo crajubar, veio gente da cidade, daqui, dali e de lá.
E a luta continua, o jacu deu uma cagada, e o fogo foi miando, o gambá uma mijada e o bicho foi chiando e a brasa apagada.
No final veio a caipora, que protege toda mata. com os pés virado a fora disse: o fogo, desacata, mas eu nele dou um jeito aplicando uma gravata.
E foi esse o seu fim, a cidade virou festa. O fogão virou foguim, houve até uma seresta, só faltou chegar a chuva pra crescer nova floresta.
Não sei se isso foi crime, se foi mesmo vigarice. só pensar nisso deprime falar nisso que eu disse. Um ato desse define um grande grau de burrice.
Por isso caro leitor que todo dia respira, cultive muito o amor que DEUS um dia lhe inspira, que gente, planta e bicho, DEUS botou, é DEUS que tira. FIM