A briga da cana com o café

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ESTE FOLHETO É PARTE INTEGRANTE DO ACERVO DO BEHETÇOHO EM FORMATO DIGITAL, SUA UTILIZAÇÃO É LIMITADA. DIREITOS AUTORAIS PROTEGIDOS.


INFORMAÇÕES SOBRE O PROJETO O Acervo Eletrônico de Cordéis do Behetçoho é uma iniciativa que pretende dar consequências ao conceito de (com)partilhamento dos artefatos artísticos do universo da oralidade, com o qual Behetçoho e Netlli estão profundamente comprometidos.

INFORMAÇÕES SOBRE A EQUIPE A equipe de trabalho que promoveu este primeiro momento de preparação e disponibilização do Acervo foi coordenada por Bilar Gregório e Ruan Kelvin Santos, sob supervisão de Edson Martins.

COMPOSIÇÃO DA EQUIPE Isabelle S. Parente, Fernanda Lima, Poliana Leandro, Joserlândio Costa, Luís André Araújo, Ayanny P. Costa, Manoel Sebastião Filho, Darlan Andrade e Felipe Xenofonte


JOSÉ CAETANO DA SILVA

A BRIGA DA CANA COM O CAFÉ

1982



Quem confia no Pai Eterno de viver não perde a fé Maria mãe de Jesus vinde ajudar a José pra escrever uma briga da cana com o café Vieram da terra estranha pra um país diferente chegaram aqui no Brasil um atrás outro na frente com muitos anos depois foram para São Vicente

Cada qual o mais valente um pelo outro passou com um olhar carrancudo o café lhe perguntou: está me achando bonito? E a briga começou


A cana disse pra ele tenha santa paciência eu não sei quem é você e nem sua procedência por isso venha com calma bote a mão na consciência

Disse o café: muito bem quem pergunta quer saber eu sou lá do estrangeiro por isto esclarecer tomei conta do Brasil só saio quando morrer. Resido em Pernambuco terra dos canaviais moro também no Pará São Paulo e Minas Gerais vim passear no Brasil agora não volto mais


O seu nome por bondade? Pra eu saber como é parece que lhe conheço pela folha e pelo o pé se o espírito não engana você é o cabra café

Cabra não, me respeite Café da Silva Caiena da família Guimarães dizer isto vale a pena pra derribar meu cartaz você é muito pequena

Porque sou o gostosão da família sertaneja sou da xícara e da tijela sou do bule e da bandeja os padres gostam de mim mas nunca fui à Igreja.


Também foi só neste canto que eu nunca pude entrar o resto é comigo mesmo não tem hora pra chegar garoto de sete anos eu começo a conquistar O cabra estando com fome me tomando fica esperto sou perto mas sou gostoso se está com sono eu alerto seja puro ou sem mistura de todo jeito dou certo

Quero saber do seu nome seja de qualquer maneira e disse-lhe, sim senhor meu nome é Cana Vieira sou a mulher mais querida da família brasileira


De sábado à segunda-feira vou lhe dizer como sou de agosto a setembro me procurando eu estou as ordens de q qualquer um pra onde chamam eu vou Disse o café: eu já sei com quem você se agarra você é destas perdidas quando vai pra uma farra quando entra numa festa só vem pra casa na marra Disse ela: você também que só vive a passear e mais, eu sou diferente não gosto de palhaçar no meio do povo grande sou bom da turma tomar


Assim eu posso provar quando você se apavora na cabeça de quem bebe um esculhamba outo chora mas com café amargoso depressa o cabra melhora

Disse a cana: eu já sei você já quer se exibir quer ser melhor do que eu que é me diminuir mas estuo lá no meu canto não mando ninguém bulir

Não vou atrás de ninguém quem gosta é quem me procura sou cachaça giribita filha de cana madura tenho ainda três irmãos álcool, açúcar e rapadura


Também esta criatura dá de toda qualidade você só ficou no mundo pra fazer perversidade arranjou tanto apelido que não sei nem da metade

Disse a cana: camarada eu não quero amolação a minha família é grande desde a cidade ao sertão só tem que somos queridos do pé rapado ao barão Da barraca do cigano aos bares da capital desde o mais sofisticado ao mais ruim litoral se aparecer quem beba não importo fazer mal


Sou irmã da Alencarina Ipióca e Canaã a Dandiz e a papudinha Cariri, Maracanã Tiquira, Chora na Rampa Tatuzinha e Jaçanã

Amansa Corno, Serra Grande Acarape e Bagageira Ibiapaba e Serrana Curió e Bagaceira Dois de Ouro, Redenção Itapetinga, Inchadeira

Disse a cana a minha raça é doida que só o cão você que é muito bom não gosta de confusão mas pegando um descuidado dá logo uma congestão


E todo cheio de razão e só quem quer ser perfeito mas quando faz mala um ou mata ou deixa um defeito não fale mal de ninguém se enxergue, dê-se respeito

Disse o café baixe a voz escute o que estou dizendo tenho visto velho bêbado chorando, se maldizendo e a culpa toda é sua do que vive acontecendo Mas o único responsável Destas coisas é seu Matim trouxe sua mãe para cá para perturbar a mim até que ela não é má mas você é muito ruim


Você perturba o silêncio só pratica o que não presta descasa pai de família desmoraliza uma festa diabo era quem queria ser mãe duma praga desta

Quando vou pra uma festa só vou porque sou chamada quando eu c chego o dono diz: pode esquentar a negrada bebendo eles gastam muito e topam qualquer parada Mesmo assim meu camarada deixe esta moda feia se importe com a sua vida não entre na vida alheia não faça hora comigo que já estou de cuca cheia


Disse o café quem farreia: vive com muito defeito e depois que enche a cara insulta qualquer sujeito você é que é a culpada do mundo estar deste jeito

Quem bebe lava seu peito esquece as mágoas que tem vamos lá pro Guimarães que na fábrica tudo tem café, massa e colorau milho pilado e xerém. FIM



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