Algo biográfico

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ESTE FOLHETO É PARTE INTEGRANTE DO ACERVO DO BEHETÇOHO EM FORMATO DIGITAL, SUA UTILIZAÇÃO É LIMITADA. DIREITOS AUTORAIS PROTEGIDOS.


INFORMAÇÕES SOBRE O PROJETO O Acervo Eletrônico de Cordéis do Behetçoho é uma iniciativa que pretende dar consequências ao conceito de (com)partilhamento dos artefatos artísticos do universo da oralidade, com o qual Behetçoho e Netlli estão profundamente comprometidos.

INFORMAÇÕES SOBRE A EQUIPE A equipe de trabalho que promoveu este primeiro momento de preparação e disponibilização do Acervo foi coordenada por Bilar Gregório e Ruan Kelvin Santos, sob supervisão de Edson Martins.

COMPOSIÇÃO DA EQUIPE Isabelle S. Parente, Fernanda Lima, Poliana Leandro, Joserlândio Costa, Luís André Araújo, Ayanny P. Costa, Manoel Sebastião Filho, Darlan Andrade e Felipe Xenofonte


JOSÉ ESMERALDO DA SILVA

ALGO BIOGRÁFICO

1992


Agostinho Esmeraldo da Silva

O nome acima declinado é o nome do meu saudoso pai, que por mim foi escolhido para ser, da Academia dos Cordelistas do Crato, o pratono da minha cadeira nº11 ele nasceu aos 20 de março, dia do aniversário do reverendo padre Cícero Romão Batista. O pai de pai era José Esmeraldo da silva, tronco da família Esmeraldo, senhor do engenho, agricultor e criador. Graças ao meu saudoso avô, José Esmeraldo da silva o meu pai, por haver herdado algo de suas qualidades, deu também, aos seus rebentos, ótimos exemplos. Naqueles idos o governo respeitava os cidadãos dando-lhes até patente: o governador do tempo do meu pai, concedeu-lhe a patente de major, título que, quando nasci, já havia sido abolido. Contudo, ainda ouvi, diversas vezes, alguém o chamando de major Agostinho, o meu pai


morreu em extrema pobreza mas deixou para os seus, a riqueza da conformidade, exemplo que ele dava sempre, aos seus familiares. Crato, 02 de agosto de 1992 JosĂŠ ESMERALDO da Silva



Querido povo do Crato Com licença, eu me apresento Sou Judas Iscariotis Não venho fazer lamento E não vim pedir perdão Pois quem comete traição Tem que sofrer o tormento Eu venho é pra ser punido Porque sou um réu confesso Sei que fui covarde e vil Por isso perdão não peço Mas venho abraçar vocês Quem trai não pode ter vez Diante o rei d’universo

Venho também pra pedir Um pouco de atenção Porque antes de morres Diante da multidão Eu mostro que não compensa Qualquer tipo de ofensa Principalmente a traição


Dês que vi a luz do dia Naquela manhã de agosto Que pouco tinha alegria, O meu viver é sem gosto: Quem, de vocês, avalia Que eu, se à vez, um dia ria, No outro dia tinha desgosto.

Só fui feliz em menino, Quando, brincando, pulava, No tempo de pequenino, Que este mundo eu revirava, Se o parceiro era franzino Ou ele falava fino, Ou eu logo o derrubava.

Nesta vidinha tetéia, Com vaquinha se brincava, No colinho da mãe veia, E com ela eu conversava, Talvez ninguém faça ideia, Que com estreia ou sem estreia Mãe veia, de mim, cuidava.


Eu logo que rapazote, Trabalhava todo dia, Corria e dava pinote E por qualquer coisa ria, Quer só ou quer de mangota, Eu dava trote e mais trote Em quem azia anraquia. A gente alegre fazia Brincadeira do trabalho, Um queria, outro queria No mato, mandar um malho, Pois só assim causaria Na gente grande alegria, Por nada, ali, se vê falho.

(Se brincava de cavalo, E nele a gente montava, Se pulava tanto valo Eu extasiado eu ficava, E só para o meu regalo Até ao cantar do galo Eu, no terreiro ainda estava).


(Se brincava de reizado Até o quebrar da barra, O povo tão animado, Grita: Só saio na marra, Aí alguém assombrado, Corria pra todo lado: Era assim a nossa farra).

Se fazia cercadinho Pra nele o gado ir pastando, O filho de meu vizinho La, as reses, pastorando E quer que andasse sozinho Pisando por entre espinho Andava mais gargalhando. Por esta razão a gente Via tudo mais perfeito, A meninada contente Eu, de lado, satisfeito, E mesmo estando doente Nunca fico descontente Nem certa parada enjeito.


E esta calma que eu tinha, Se comparar não podia, Às vezes correndo eu vinha Transbordando de alegria, Olhando o voo da andorinha, Que voejava baixinha, Quando a natureza ria. (Era por isso que a gente Achava o dia pequeno, Um conversava contente, Com seu olhar tão sereno, Outro cantava repente, Numa toada tolente, Em clima bastante ameno).

E a gente se aglomerava Todo dia, lá na roça, Lá mesmo a gente almoçava Era uma velha palhoça, Se um, ali, resmungava A tropa, dele zombava, Fazendo, do pobre, troça.


Eu, ao ver tanta riqueza, Logo assim que fui crescendo, Vi Jesus nesta grandeza, Como inda hoje estou vendo, É, pois, toda esta beleza, Para ornar a natureza, Por isso, a Deus, graças rendo.

( Ali, nossa brincadeira, Era sempre no terreiro, De se esconder, de bicheira Também pelo taboleiro, A gente, a rir, na carreira, Numa grande zuadeira Pra ver quem chega primeiro).

Quem vencer esta parada, Seu nome fica na história, Nem que vá madrugada, Quero é saber da vitória, Para ela ser comentada E também ficar gravada Mui tempo em minha memória.


( Toda noite se brincava De cinturão, de soldado, A gente não se cansava Corria pra todo lado, E eu, para o Céu, mirava E quanto mais eu olhava, Mais ficava, ali, pasmado).

Olhando pra o Firmamento Vejo o Céu todo estrelado, E fico neste momento Mirando pra todo lado Aí faço um juramento, De honrar qualquer Mandamento, Que for, por Deus, inspirado.

Eu vejo correndo estreito, Por ser corretos de terra, Não posso estar satisfeito Pois aqui quando alguém erra É quem quer ter direito E nem sequer tem respeito Com quem sofre e não se emperra.


Eu também sou vicentino Desde minha tenra idade, Foi logo desde menino, Desde minha mocidade Foi com a ajuda do Divino, Que me deu este destino De me tornar um confrade.

( Dirigi Comunidade, Percorri muitos Estados, Estou sentindo a saudade Daqueles tempos passados, Recordando aquela idade Tempos de Felicidade Que já foram consumados).

De família, fui arrimo, Por meu pai tê falecido, O que mais na vida estimo É ter meu dever cumprido, Um verso deste só rimo Porque, às vezes, me animo Té com o que tenho sofrido.


E, pois, por me ter casado, Tive que correr estreito, Pra ver meu povo cuidado, E tudo bem satisfeito, Foi preciso ter suádo, E andado pra todo lado Pra eu não perder meu conceito. Toda minha rapazice, Foi consagrada ao ensino, Já hoje em minha velnice Amo ao grande e ao pequenino, Mas mais amo a criandice Hei de ser como menino. Mas continúo recordando O bom tempo que ensinava, A criançada cantando, Era assim que se estudava, E eu, atento, escutando, A minha atenção prestando Ao aluno que malandrava.


E como paroquiano, Todo meu dever cumpria E a gente todo ano Uma campanha fazia, E, assim, como Cigano Quase com o mesmo plano, A um e a outro pedia.

Era assim em toda festa, Ano ia e ano vinha, Eu jamais quebrava a testa, Sempre arranjava galinha, A lembrança que me resta E que em muita festa desta Sempre a vitória era minha.

E quando mudava o disco Inda melhor eu achava, Na festa de São Francisco Quando se candidatava Alguém, eu sem temer risco Nem que fosse por um trisco Este alguém eu coroava.


Pra torre de nossa Igreja, Um relógio foi comprado, Foi, pra mim, grande peleja Vê meu sonho efetivado, Que feliz meu povo esteja E que meu esforço seja Por meu bom Deus compensado. Descrever biografia Contando fato por fato, Notando dia por dia, Registrando ato por ato, Sei que ninguém conseguia Pois se nem mesmo eu faria, Do meu relato um relato.

Não foi este meu passado Narrado como eu queria, Ele não foi divulgado Da forma que eu pretendia Não fui capaz de ter dado, Dado por dado do dado Da minha Biografia.

FIM



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