BoletimADUFPB
EDIÇÃO
157
QUARTA-FEIRA, 22 DE MARÇO DE 2017
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA - JOÃO PESSOA - PARAÍBA www.adufpb.org.br - adufpb@terra.com.br
A Economia Política da Reforma da Previdência MARCELO SITCOVSKY *
A Proposta de Emenda ConsƟtucional (PEC) nº 287 apresentada pelo governo Michel Temer, que pretende realizar uma profunda reforma da previdência, pode simplesmente parecer aos desavisados mais uma medida de austeridade, como parte do novo regime fiscal aprovado no final de 2016, quando da aprovação da PEC 55, atualmente Emenda ConsƟtucional 95. Todavia, ela é mais do que isso. Essa proposta e a reforma trabalhista expressam o maior ataque aos direitos do trabalho já proposto no Brasil e, ainda, encobrem um brutal processo de expropriação do fundo público. Todas as vezes que se pretende realizar reformas restriƟvas de direitos, a exemplo da PEC 287, os governos de plantão acionam uma velha conhecida: a tese do déficit orçamentário. O objeƟvo é gestar no seio da sociedade brasileira uma cultura de crise, que, ao se espraiar, constrói o clima favorável e jusƟfica as medidas de ajustes. Concretamente, trata-se daquilo que Antônio Gramsci analisou como sendo o processo de construção de hegemonia, fazer com que ideias e valores parƟculares sejam incorporados e vividos como universais. A agenda adotada pelo governo Temer e que deve ser replicada nos estado e municípios expressa às ideias, valores e, fundamentalmente, as necessidades de um setor muito específico da economia nacional e acima de tudo mundial - refiro-me aos financista e renƟsta. As medidas já colocadas em práƟca e propostas pelo atual Ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, pretendem ampliar e aprofundar tendências que vinham dominando as orientações do Estado brasileiro no que se refere às contas públicas, às políƟcas sociais, em suma, ao fundo público. O que não está revelado no texto da PEC 287 e, da mesma forma, esteve oculto quando da aprovação da emenda consƟtucional que limitou os invesƟmentos públicos? Incialmente cabe registrar que, a despeito do enorme esforço dos defensores da Auditoria Cidadã da Dívida, que desenvolvem um trabalho de muita qualidade, denunciando o esquema que se alimenta da dívida, a maioria da população não tem dimensão de como essa dívida foi adquirida. O Estado
brasileiro se recusa a fazer uma auditoria, mas o povo deste país conhece bem os efeitos da dívida, na exata medida em que ela prejudica o desenvolvimento das políƟcas sociais tão necessárias para a população do país. Os dados oficiais do orçamento geral da União executado em 2015, portanto do próprio governo federal, comprovam que dos R$ 2,268 trilhões, 42,43% foram desƟnados para pagamento de juros e amorƟzação da dívida. Ao observarmos a proposta orçamentária de 2017, não só o orçamento da União aumentou, aƟngindo R$ 3,399 trilhões, como também se ampliou a faƟa desƟnada ao pagamento dos serviços da dívida. A Emenda ConsƟtucional 95 já tem seus efeitos devidamente revelados – possibilitará a expropriação de 50,66% do orçamento geral da União à serviço das poucas famílias detentoras dos ơtulos da dívida. Mas o que tem a PEC 287 com isso? A cultura da crise que novamente ganhou lugar na sociedade brasileira tem na proposta de reforma da previdência sua máxima expressão. O governo Temer tem divulgado sistemaƟcamente, com apoio inclusive de parte significaƟva da grande mídia, a existência de um déficit nas contas da Previdência Social, que, em 2016, teria chegado a R$ 151,9 bilhões. Os mais incautos assumem esses números como verdade absoluta. Duas questões se colocam imediatamente. A primeira se refere ao fato de que o governo federal, para apresentar esses dados, comete o que consideramos uma fraude contábil, pois desconsidera para efeito de cálculos da receita aquilo que está previsto na Constituição Federal de 1988, que estabelece um orçamento da Seguridade Social e não da Previdência isoladamente. A segunda questão refere-se à existência de dois processos que são responsáveis pelo desvio de recursos da Seguridade Social, portanto também da Previdência. Refiro-me a Desvinculações de Receitas da União (DRU), que, anualmente, tem sequestrado dinheiro que deveria ser investido em Saúde, Previdência e Assistência Social e, ao invés disso, é repassado para o pagamento dos serviços da dívida. O outro processo diz respeito à dívida de empresas com a Previdência Social, que, atualmente, acumula um montante de R$ 426 bilhões, o que equivale a quase três vezes do suposto déficit divulgado pelo governo.
Έ*Ή Professor do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal da Paraíba – UFPB. Atualmente, presidente da Associação dos Docentes da UFPB ADUFPB, seção sindical do ANDES-SN.