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8 minute read
Entrevista
by AESabesp
Por
Murillo Campos
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Luís Sérgio Valentim Diretor de Meio Ambiente do Centro de Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo: “A relação entre saúde e saneamento já está mais do que comprovada.” A relação entre saneamento e saúde pública em tempos de pandemia Luís Sérgio Valentim, diretor de Meio Ambiente do Centro de Vigilância Sanitária do Estado de São Paulo, vê o saneamento como ferramenta de saúde preventiva essencial no combate à covid-19 e conta o que espera para o setor no cenário pós-pandemia
Apandemia do novo coronavírus evidenciou a importância do setor de saneamento. O acesso à água para adoção de hábitos de higiene, como limpeza das mãos, tornou-se fundamental como meio de prevenção da covid-19. “Sem dúvida ne nhuma, o setor de saneamento ganha uma relevância bastante grande neste contexto de pandemia”, diz Luís Sérgio Valentim, diretor da Divisão de Meio Ambiente do Centro de Vigilância Sanitária do Esta do de São Paulo.
Segundo o diretor, há décadas o saneamento tem papel de destaque no combate a doenças, assim como para promoção da saúde e bem-estar da população, fato destacado no contexto atual. “A relação entre saúde e saneamento já está mais do que comprovada”, afirma Valentim, que vê a necessidade de mais investimentos no setor para uma sociedade justa e saudável.
Na entrevista a seguir, ele comenta sobre o papel do saneamento no enfrentamento ao coronavírus, a relação com a saúde pública e o que espera para o setor no cenário pós-pandemia.
Revista Saneas: Neste período de panÉ preciso quer doença que possamos pensar, espedemia, o saneamento tornou-se peça fundamental para garantir condições investimentos cialmente as infectocontagiosas, têm uma relação muito grande com o saneamento. de higiene à população e, consequenmaciços em Agora, com esta pandemia em que estemente, de prevenção ao coronavírus. tamos preconizando a higienização intenNeste sentido, qual a importância das saneamento para siva das pessoas e das superfícies, temos ações que o setor vem desenvolvendo para promoção da saúde da sociedade? que possamos ter que ter de fato um serviço de saneamento bastante ativo e que possa dar conta das Luís Sérgio Valentim: Não há dúvida uma condição de necessidades da população. Entendendo nenhuma de que o saneamento é um isto, logo no começo da pandemia, enelemento fundamental no nosso prosaúde favorável” tramos em contato com a Sabesp e as cesso civilizatório e na estruturação agências reguladoras para que pudéssede uma sociedade justa e saudável. Limos estreitar esta relação, de modo que damos dentro da Secretaria da Saúde ficássemos atento à eventuais deficiências com questões do saneamento e este é um tema que permeia de saneamento em áreas mais vulneráveis e que pudéssemos intera história da saúde pública no Brasil e em São Paulo, particuvir nisto de forma mais rápida possível. larmente. O Código Sanitário de 1894 já abordava de maneira Mas creio que São Paulo avançou muito na universalização dos intensa estas questões. Estava explícito ali a importância do saserviços de saneamento e está numa condição bastante favorável neamento para melhoria das condições de vida da população e para garantir que a população tenha acesso à água e possa fazer da proteção da saúde. Portanto, isto permeia nossa história na uso dela, de acordo com o que está preconizado pelas autoridades questão de saúde pública. de saúde pública.
Dentro deste contexto, falamos que a pandemia vem tornar a importância do saneamento ainda mais clara, porque estamos tratando de uma das principais medidas de proteção da população neste momento: a higienização intensa das mãos, rosto, corpo de maneira geral, equipamentos, superfície etc. Então, é preciso que tenha água com qualidade e potabilidade e que as estruturas de coleta, afastamento e tratamento de esgoto também sejam universais. A coleta de resíduos, em geral, torna-se também fundamental neste contexto. O saneamento ganha uma preponderância neste momento que, para nós, é bastante evidente.
Revista Saneas: O saneamento atua, então, como uma ferramenta de saúde preventiva? Luís Sérgio Valentim: Sempre. A relação entre saúde e saneamento já está mais do que comprovada. Cem anos atrás, tínhamos uma taxa de mortalidade infantil imensa. Entre outros fatores, o saneamento foi um dos mais preponderantes na redução de mortalidade infantil e de doenças variadas, como as infectocontagiosas. Há cem anos, aqui em São Paulo, uma a cada quatro crianças não completava um ano de vida. Hoje, esta taxa é muito diferente. Uma a cada cem não completa um ano de vida por outros motivos, que não o contato com o esgoto de maneira geral. Então, houve de fato avanços tremendos no setor e qualRevista Saneas: E quanto maior o índice de saneamento, menor o risco de doenças de veiculação hídrica... Luís Sérgio Valentim: Sem dúvida, mais uma vez a história das nossas doenças evidencia isto. Reduzimos bastante as doenças infectocontagiosas, principalmente aquelas relacionadas à qualidade da água, potabilidade e ao contato da população com os esgotos. Houve um avanço grande neste sentido. Cada vez mais temos que investir em melhorias das condições de saneamento, preservação e qualidade dos mananciais, tratamento de esgoto e drenagem urbana. É preciso investimentos maciços em saneamento para que possamos ter uma condição de saúde favorável.
Revista Saneas: O senhor mencionou o estreitamento da relação com a Sabesp, que vem promovendo ações para ajudar no combate ao coronavírus. O que representa estas iniciativas? Luís Sérgio Valentim: As medidas que estão sendo adotadas especificamente por conta da pandemia, de aumentar as condições de reservação das populações mais vulneráveis e geralmente periféricas, são muito importantes. A educação sanitária e a conscientização de maneira geral também são importantes para nós que fazemos saúde pública. Agora, é fundamental que a companhia de fato possa atender a população, no sentido de fornecer sistemati
camente água dentro dos padrões de potabilidade e faça a coleta e tratamento eficiente dos esgotos. Isto é fundamental.
Revista Saneas: A crise hídrica enfrentada em 2014 no Estado de São Paulo fez com o que o setor ficasse mais preparado para atuar na pandemia? Luís Sérgio Valentim: Acho que sim, a crise hídrica foi também uma oportunidade de aprendizado. Mas isto não quer dizer tenhamos superado todos os grandes desafios. Com a pandemia, deixamos um pouco de lado um debate fundamental, no que diz respeito às mudanças climáticas e ao modelo social econômico que queremos para reduzir vulnerabilidades e enfrentar estes novos desafios que vem. Desafios completamente diferentes com o que lidamos até pouco tempo atrás. Precisamos avançar em modelos de gestão integrada de recurso hídricos, fortalecer os comitês de bacias, incorporar a sociedade numa discussão mais ampla, de uso e ocupação dos espaços, desenvolvimento urbano, proteção dos mananciais e investimentos em saneamento. Acho que estes são desafios que permanecem no campo de discussão do debate público.
Revista Saneas: O senhor acredita que o saneamento será mais valorizado no cenário pós-pandemia? Luís Sérgio Valentim: O saneamento ganha um certo protagonismo por conta realmente destas condições e da necessidade de termos acesso à água, serviços de coleta e tratamento de esgoto, drenagem urbana de acordo com a dimensão das nossas cidades, além da coleta e tratamento de resíduos. Então, todos estes fatores ganham de fato protagonismo numa situação pandêmica, como esta que estamos vivendo.
Existe uma série de questionamentos que chegam na secretaria, por exemplo, limpeza urbana mais intensa, processo de desinfecção urbana, coleta de determinados resíduos por conta, inclusive, destas novas situações. Temos tentado orientar, já publicamos uma série de comunicados neste sentido, sempre alertando a população para a importância dos procedimentos e a utilização dos serviços de saneamento de maneira adequada, dando a devida importância. Mas sem dúvida nenhuma, o setor de saneamento ganha uma relevância bastante grande neste contexto de pandemia.
Revista Saneas: Com relação à população, qual deve ser o comportamento para os próximos meses? Luís Sérgio Valentim: No pós-pandemia, acho que vamos ter um ganho muito grande de conscientização e maior educação da população no sentido de fazer uma higiene compatível com a proteção de saúde. Acho que isto ficará como um legado depois de superarmos este momento bastante difícil de pandemia. Vamos nos proteger do coronavírus, mas também, na medida que a sociedade terá mais consciência da necessidade de higiene, de outros vírus, bactérias, protozoários etc. Mas é preciso uma mobilização da sociedade em exigir sempre do poder público investimentos maciços em saneamento. Isto é fundamental para que possamos ter uma condição de salubridade compatível com o grau de desenvolvimento da nossa sociedade.
Revista Saneas: Muito se fala em um “novo normal” após o fim desta pandemia. O senhor acredita nesta mudança e como seria? Luís Sérgio Valentim: Vamos de fato sair desta um tanto quanto diferente e espero que melhor. Estamos em momentos conturbados, do ponto de vista epidemiológico, econômico e até político, mas creio que alguns aspectos se sobressaem. A importância do papel do estado como um ente de equilíbrio, regulador de processos sociais, estruturação de um modelo mais razoável de uma sociedade saudável, ambientalmente sustentável e harmônica. Acho que esta crise evidencia o papel do estado sem tirar a importância dos demais setores. É preciso harmonia no sentido de dar um rumo à sociedade adequada às nossas aspirações.
Neste contexto, o saneamento irá se sobressair também como um investimento público, a importância do coletivo de você investir, afinal vivemos numa sociedade que está extremamente urbanizada. Vivemos no coletivo, muito mais do que uma geração atrás. Temos uma interdependência muito grande. A importância do ato de cada cidadão é reflexo na qualidade de vida de todo mundo, isto é bastante evidente. Esta pandemia mostra isto. Se o seu vizinho não se cuidar, é possível que você também sofra as consequências.
O uso das estruturas de saneamento vão neste sentido também, uma consciência do uso adequado. Na crise hídrica vimos isto, a questão do respeito ao uso da água, adequado de acordo com as necessidades. Este equilíbrio é fundamental. É o grande desafio numa sociedade que historicamente tem tantos desequilíbrios sociais, econômicos, educacionais e até de acesso ao saneamento. Esta crise mostrará mais fundo esta necessidade de um caminhar coletivo, no qual o poder público e os entes de saneamento têm papel importante nestes desafios.
Seja o que for este novo normal, ele tem que vir por meio de um esforço coletivo de integração da sociedade, no sentido de exigir qualidade de vida, distribuição de renda mais adequada, acesso igualitário ao saneamento, investimentos públicos e acesso às demandas essenciais para a população.