Editorial
Sumário
Editorial A cena da Praça de São Pedro vazia e chuvosa com o Papa
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Editorial
03
Missão no Mundo
05
Missão no Brasil
07
Igreja
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Central
14
Espiritualidade
16
Missionários
17
Testemunhos
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Colabore
Francisco rezando sozinho e dando voz ao clamor da humanidade comoveu e moveu o mundo inteiro. A partir daquele dia de março de 2020, o Papa Francisco, passou a ser uma eloquente manifestação de humana solidariedade e consolação de Deus. Mas este e outros gestos eloquentes que se multiplicaram mundo afora, podem ser acolhidos como um convite a fechar os olhos e as mãos diante das vítimas da Covid-19, à espera de uma vacina pretensamente milagrosa. A humanidade não chegará à cura de si mesma se continuar acorrentada ao pensamento individualista, ao nacionalismo corrosivo, à intolerância selvagem e às práticas econômicas destruidoras da casa comum. É neste horizonte que a edição da Revista Bertheriano provocou alguns dos seus colaboradores com a pergunta: A pandemia do Covid-19 seria uma quaresma sem páscoa, uma cruz
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sem ressurreição? Esta pergunta se justifica, pois o vírus resiste e a pandemia se alastra; as nações continuam priorizando a economia sobre as vidas humana; governantes menosprezam a tragédia e a melhora dos serviços de socorro às vítimas; muita gente resiste a mudar seus hábitos de diversão e de consumo; e o próprio vírus se reinventa de forma assustadora. Não temos a pretensão de dar respostas superficiais nem definitivas à pergunta que habita nossa mente e nosso coração.
Seja bem-vindo
Oferecemos uma partilha de vivências, interrogações, iniciativas e lições. E uma convicção fundamental: se as nações, as
à nova versão da
igrejas, os organismos políticos e econômicos, e a população
Revista Bertherianos, reelaborada
como um todo, não mudarem seus hábitos e se recusarem a
com muito carinho para propor-
viver como uma família de criaturas, mesmo com a ajuda de
cionar a você um momento rico e
vacinas, a quaresma terminará fatalmente numa sexta-feira
agradável de leitura, sintonizan-
pouco santa e sem fim.
do-se com nosso carisma, através de cada matéria compartilhada por meio deste material.
Por Pe. Itacir Brassiani, msf Coordenador Provincial do Brasil Meridional
Expediente Essa é uma publicação da: Província Brasil Meridional dos Missionários da Sagrada Família Produção:
Responsáveis Conselho Provincial
Edição Aline Oliveira
Pe. Itacir Brassiani msf Coordenador Provincial Pe. Domingos de Sá Filho msf Vice Provincial Ir. Irio Luiz Conti msf Conselheiro Provincial Pe. Lotário José Niederle msf Conselheiro Provincial
Revisão de texto Ariane Miranda Editoração Editora Acadêmica do Brasil Capa e diagramação Letícia Sales
Contato e Pedidos Província dos Missionários da Sagrada Família (Brasil Meridional) Rua da Floresta, 1043 - Bairro Petrópolis Cx. Postal 3056 - CEP: 99051-260 Passo Fundo - RS - Brasil Fone: (54) 3313-2107 E-mail: secretaria@msagradafamilia.com.br Site: www.misafala.org Impressão e tiragem Passografic / 1.800 exemplares
Missão no mundo
Muito a fazer, e muito mais a aprender! Acompanhe a jornada do Ir. Moacir Filipin em Moçambique Saí de Passo Fundo no dia 20 de janeiro e cheguei
compartilhar um jantar na casa deles, na companhia
em Nampula dia 24. Foi uma viagem demorada e
do Fr. Ricardo e do Fr. Carvalho. Na manhã seguinte,
tensa, com um pernoite em Addis Abeba (Etiópia),
saboreei um esperado chimarrão em nosso semi-
e dois dias de espera em Maputo, devido ao ciclone
nário, ainda em construção. Finalmente, em Mecu-
previsto para o dia 24 de janeiro.
buri, encontrei o Pe. Celso, a comunidade das Irmãs
Após quase um ano de espera, por conta da pan-
Franciscanas do Coração de Jesus, e a direção e alu-
demia, finalmente cheguei à missão, em Mecubu-
nos da Escola Familiar Rural. Mas, apesar disso, aqui
ri, no dia 25 de janeiro. Continuamos inseguros e
em Mecuburi me senti um pouco mais “estrangeiro”,
vulneráveis à Covid-19, tanto que, estando aqui já
pois predomina a língua Macua.
há um mês, não tive oportunidade de participar de
Outra boa sensação foi chegar no “pequeno paraí-
nenhuma celebração nas comunidades. Por decre-
so” que é a sede da missão, em Mecuburi. Encontrar
to presidencial, todos os cultos comunitários estão
uma casa e um ambiente externo tão bem estrutu-
suspensos desde o dia 3 de fevereiro.
rados e organizados me deixou muito feliz. Quanto trabalho, zelo e dedicação para termos este ambien-
Se “a primeira impressão é a que fica”, posso afirmar que começo bem minha nova missão!
te! Sinto-me motivado a dar continuidade a este belo trabalho. Tive uma boa impressão também da Escola Fami-
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liar Rural, concebida e mantida pela nossa missão. O impacto deste trabalho é perceptível na comunidade
Vim com a intenção de somar forças com os co-
local. E é grande a procura por parte dos jovens, ra-
legas que aqui estão, dando continuidade às ações
pazes e moças. É uma aposta que vale a pena, apesar
iniciadas em 2007 pelo Pe. Neiri e continuadas por
dos enormes desafios que temos pela frente. Sem
vários coirmãos.
ajuda de fora não há como sustentar o projeto, mas
Em um país onde quase 60% da população vive na
sabemos que iniciativas como esta certamente po-
pobreza extrema (menos de R$ 10,00 por dia!), po-
dem contar com ajuda de parceiros, especialmente
de-se imaginar os problemas e dificuldades. Basta
da AMISAFA.
sair para as ruas e abrir os olhos. Há muito a fazer e,
Aqui temos muito a fazer, mas muito mais a apren-
mais ainda, a aprender, para encontrar saídas. Mas
der. Muito foi feito, muito mais poderemos fazer.
quero falar das boas impressões e sensações vivi-
“Aquele que planta não é nada, e aquele que rega
das até o momento.
também não é nada: só Deus é que conta, pois é ele
A primeira sensação é a de ser plenamente aco-
quem faz crescer” (1Cor 3,7)
lhido. Por causa do idioma, chegar em Maputo foi alegria ao ser recebido no aeroporto pela missioná-
Por Ir. Moacir Filipin, msf
ria Édina e seu esposo Júlio, e pelo Pe. Pedro Léo e de
Mecuburi/Moçambique
Crédito fotos: banco pessoal
como estar no meu próprio país. Foi grande minha
Missão no mundo
A festa da Páscoa na República Centro-Africana Conheça como são realizadas as celebrações de Quaresma e Páscoa no coração da África Sou originário da República Centro-Africana, um
co e deriva do verbo pasah, que significa "poupar".
dos 54 países que compõem o continente africano.
Daí vem o substantivo pesah, que traduzimos como
Sou formado em filosofia e postulante dos Missio-
"cordeiro pascal". Em latim, esta ideia é traduzida
nários da Sagrada Família, que conheci através de
por pascha, e representa o sacrifício do cordeiro
uma religiosa malgaxe, em missão na República
pascal na saída do Egito. E o Novo Testamento rein-
Centro-Africana.
terpreta tudo isso a partir da vida, morte e ressurreição de Jesus.
Cheguei ao Brasil em abril de 2019 para realizar
Para os cristãos de todo o mundo, a festa da Pás-
enquanto espero o visto para que possa ir ao Chile
coa é a festa mais importante de todo o ano litúrgico.
e fazer meu ano de noviciado, partilho algo sobre o
Os cristãos da República Centro-Africana celebram
meu país de origem e o nosso modo de celebrar a
com alegria este mistério da morte e ressurreição
Quaresma e a Páscoa.
de Cristo. Este momento marca a passagem da mor-
A República Centro-Africana é um país sem lito-
te para a nova vida, da vitória de Cristo sobre a morte
ral, e está localizado no coração da África. Tem uma
e as forças do mal. É um dia importante para que os
área de 623.000 km2 e uma população de 5 milhões
fiéis, mesmo aqueles que perderam a fé, voltem à
de habitantes. Desde a independência da França,
Igreja para celebrar a ressurreição de Cristo.
em 1960, tem experimentado um difícil processo de
Mesmo que haja um ritual comum, cada Diocese
desenvolvimento, apesar de ser rico em recursos
do meu país organiza esta festa de acordo com suas
naturais, e está classificado entre os países mais
orientações. Após a celebração da Eucaristia, os
pobres do mundo. A população é composta por 80
cristãos católicos centro-africanos se reúnem com
comunidades étnicas, e predominam três religiões:
suas famílias para comemorar este dia, compar-
cristãos (73,5%); muçulmanos (13,8%); animistas e
tilhando as refeições, seguidas de danças e muitas
outras (13.7%). A Igreja tem lá uma história de ape-
outras manifestações de alegria e confraternização.
nas 125 anos de evangelização. Como em outras partes do mundo, os cristãos
Por Raymond Jucaël Adou-Ousse
centro-africanos começam com o ritual de prepa-
Postulante - Passo Fundo/RS
ração e celebração da páscoa com o dia das cinzas, que marca o início da Quaresma.
Cobrir-se de cinzas significa exalar a própria dor em meio às provações, mas também manifestar a consciência e o pesar pelo pecado e a esperança na infinita misericórdia de Deus. Durante a Quaresma, os fiéis são convidados a percorrerem um retorno a si mesmos e uma conversão materializada em renúncias e abertura a Deus e aos outros. A Quaresma é interrompida pela Festa das Palmeiras, que lembra a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém a fim de culminar sua missão salvadora. Mulheres, crianças e homens se reúnem e acompanham Jesus numa caminhada de fé, rumo a Jerusalém. Como sabemos, a palavra Páscoa vem do hebrai-
Crédito fotos: banco pessoal
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minha vocação nos passos do Pe. Jean Berthier, e,
Crédito fotos: banco pessoal
Missão no Brasil
Quando o barco para... Quando o barco para,
les 15 dias iniciais terminassem logo. No entanto,
à margem daquilo que seria o seu principal objetivo
de 15 em 15 dias, o vírus cruel foi chegando onde
no viés da missão, alguém pergunta o que aconte-
somente as emoções o haviam acolhido pelos no-
ceu para que aquela tão presente visita, de lon-
ticiários e falácias. Muito antes da chegada do vírus,
gos anos, não acontecesse. Com o barco parado, a
os ribeirinhos haviam somatizado os sintomas da
âncora não se move, a partida é incerta. Em 2020,
enfermidade pelo medo.
além do barco, pararam tantas coisas, tantos projetos, tantos sonhos ficaram às margens, e tantas
Quando o barco para,
vidas ceifadas também pararam, definitivamente.
a visita aos ribeirinhos foge ao controle do padre, do querer de alguém. Entretanto, da nossa parte faltou
Quando o barco para,
ousadia para estar mais presente, ser mais ativo e
até a compreensão de parar e ancorar muda. Anco-
proativo junto àqueles que lhes foram confiados. À
rar seria a chegada na esperança da partida imedia-
pergunta “quando será feita visita?”, a resposta foi
ta, um voltar e recomeçar. No entanto, em contexto
sendo adiada mês a mês: iniciou em março e seguiu
de pandemia, o sentido da parada foi ir mais além,
o calendário da probabilidade do término da pan-
e significou se posicionar diante de um invisível,
demia. Antes do mês de março, os ânimos projeta-
cruel, impiedoso e assassino vírus. Parar foi a solu-
vam uma grande visita, um contato mais intenso e
ção plausível para a vida continuar. Isso significou
direto com lideranças específicas, preparando-as
perder tempo para ganhar a vida, não só a vida de
para a ousada e esperada formação catequética no
quem vai em missão, mas também de quem fica e
mês de novembro. Os dias e os meses passaram, e a
de quem recebe a missão.
resposta era “para quando tiver permissão dos órgãos de saúde”.
Quando o barco para, o povo pergunta quando será o momento de alçar a
Quando o barco para,
âncora e voltar a produzir banzeiros nas barrentas
cessa nossa presença junto ao povo, perde-se o vín-
águas e sinuosas curvas do Rio Juruá. Entre espe-
culo estabelecido, distanciamo-nos afetivamente
rança e medo, os ribeirinhos aguardam a possibi-
dos momentos próprios de cada comunidade na vi-
lidade de um novo encontro, de novas partidas e
vência da fé, na celebração da vida e de cada arraial,
chegadas. Havia a grande expectativa de que aque-
na festa dos santos e na fiel devoção.
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Missão no Brasil
Quando o barco para,
da vida é contínuo, e mesmo onde o barco, o vara-
perde-se a contemplação do olhar sofrido das Ma-
douro, a trilha não levam o missionário, Jesus dá
rias, Raimundas, dos Antônios, dos Josés e de tan-
a volta, caminha sobre as águas, chega mais rá-
tas outras mulheres e homens batalhadores que
pido. Jesus chega ali, onde o amor se faz canção,
reluzem o dinamismo da vida nas margens dos
o Evangelho se faz semente a germinar na vida,
igarapés, dos lagos e do Rio Juruá.
na ação de cada filho, pai, mãe e cada irmão. Ali a criança precisa de mim, precisa de você, dei-
Quando o barco para ,
xemo-la crescer; o jovem precisa crescer, deixe-
a criança assustada não corre a gritar “o padre che-
mo-lo florescer; o adulto e o idoso querem viver,
gou, o padre chegou”, e os bombons que outrora
deixemo-los transcender.
pedira não têm o mesmo sabor. Barco parado não
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conduz pescadores, não corta as águas para cum-
Quando o barco para,
prir sua missão.
a comunidade repensa a missão e percebe outras formas de evangelizar nestas águas e neste chão
Quando o barco para,
amazônico, sabendo que se, em algum canto, tem
todos têm tempo para cuidar de si, porém poucos
gente que desconhece a mensagem do Reino,
estão preparados para essa árdua tarefa e, con-
também tem gente sedenta pela mensagem de
sequentemente, questionam a fé, duvidam de si
salvação. E o missionário descobre que a riqueza
mesmos ao terem abaladas as frágeis estruturas
do Reino de Deus é justamente o encontro com
emocionais. Entre esperança e medo, a incerteza
cada pessoa e cada irmão no qual brilha a ima-
de uma quaresma estarrecedora e a certeza de
gem de Nosso Senhor Jesus Cristo.
uma páscoa transformadora, pois do barco vem o pão, o trabalho e a missão, mas somente de Jesus
Quando o barco para...
a salvação. Quando o barco para,
Crédito fotos: banco pessoal
as águas da fé e dos rios seguem seu curso, o alento
Por Pe. Aniceto Francisco dos Santos, msf Carauari/AM
A proposta da Campanha da Fraternidade deste ano é a solução do problema para a desunião As cirandas são utilizadas para celebrar a vida em to-
E qual o motivo para tanta surpresa? Simples:
das as suas fases. Com isso, ela é uma dança capaz de
ela convida “comunidades de fé e pessoas de boa
fazer emergir o respeito ao próximo. Na sua base per-
vontade para pensar, avaliar e identificar cami-
cebemos que ninguém está acima de ninguém. Todos
nhos para a superação das polarizações e das
estão olhando no mesmo nível, respeitando o espaço e
violências que marcam o mundo atual”, como
o tempo de cada um, construindo pontes e não muros.
aponta seu texto base.
Se o desejo é dançar no mesmo compasso e construir
Infelizmente, esse comportamento leva a uma
uma sociedade mais humana, justa e fraterna, não se
onda de outras ações, que vão da produção de
torna possível construir sozinhos, essa missão passa
fakenews e de conteúdos que tentam desme-
pelas mãos de todas as mulheres e todos os homens
recer membros da Conferência Nacional das
de boa vontade, como afirma o Papa Francisco. Nessa
Igrejas Cristãs - CONIC. Ou seja: enquanto quem
toada, a Campanha da Fraternidade Ecumênica tem
espera por mudanças faz campanha visando à
sido realizada, a cada cinco anos, com a proposta de
fraternidade, os contrários iniciaram uma con-
congregar diversas denominações cristãs, sempre de
tra-campanha. E ela é um desserviço, revelando
forma ecumênica, atraindo para o diálogo sobre temas
o desejo intencional de se dividir ainda mais o
que tocam a todos como: dignidade humana, paz, eco-
povo.
nomia, meio ambiente, valorizando as riquezas em co-
Bom, afinal de contas, o que fazer em meio a
mum entre as Igrejas.
tanta desunião? Certamente ficar dentro de sua
Entretanto, como fruto do delírio coletivo acirrado
bolha é muito mais cômodo para quem tripudia
por meio do bizarro contexto político em que o Brasil se
a vivência prática do Evangelho, refutando o fato
encontra, não é surpresa nenhuma que haveria críticas
de que a sociedade brasileira tem assistido aos
à proposta da Campanha da Fraternidade de 2021. Afi-
mais agressivos problemas na área da saúde, da
nal, ela convida à verdadeira conversão – algo que nem
economia, da política, e tantos outros.
todo cristão, mais de nome do que de obras, é capaz de
E é por isso que a finalidade da ciranda é unir
vislumbrar.
todos os povos para uma cultura de paz, de en-
Ironicamente, a proposta da CF deste ano é a solução
contro com o diferente, rompendo com o discur-
do problema para tanta desunidade: o tema escolhido
so de toda polarização. Que a cultura do confli-
foi “Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor” e o
to se transforme em cultura de amor, capaz de
lema “Cristo é a nossa paz: do que era dividido, fez uma
construir uma sociedade onde caibam mulheres
unidade” (Ef. 2.14). Para a sociedade brasileira atual, não
com plenos direitos, a diversidade religiosa, dos
haveria nada mais assertivo, pois traz muitos aspectos
povos indígenas, os direitos das pessoas LGB-
positivos. Pois a questão toda está quando se fala na su-
TQIA+ e de quem quer que tenha seus direitos
peração de polarizações. A proposta da CF 2021 é jus-
restringidos.
tamente o que causa alarde no pseudo-cristão (aquele que adora fazer escândalo e chamar quem fala de pro-
Por Fr. Igor Pereira, msf
blema social ou de pobreza dentro do âmbito teológico
Belém/PA
de comunista) e isso o motiva a ataques contra o ecumenismo. Ao pretender educar o povo para a vida em frauma exigência central do Evangelho – a proposta da CF 2021 chocou.
Crédito fotos: CNBB
ternidade, a partir da justiça e do amor – que é
Igreja
Ciranda de todos os povos para uma cultura de paz!
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Crédito foto: banco de imagens freepick
Igreja
Cuidar da saúde e promover a cidadania Em favor da saúde e prevenção das pandemias, Igreja suscita projetos que fomentam o uso da “máscara social”
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Muitos/as se perguntam como será a sociabili-
Os momentos fortes na vida social são novos impul-
dade depois da Covid-19. Cuidar e ser cuidado são
sos para resistir às situações adversas, como também,
as constantes da vida promotoras da sociabilida-
motivos para avançar e qualificar o processo humano.
de humana. E espiritualidade cristã e missioná-
A Campanha da Fraternidade quer suscitar o espírito
ria nos impele a sermos protetores e cuidadores
do “Bem Viver” e promover o reconhecimento dos Di-
da vida. Mas quem cuida daqueles/as que vivem
reitos Humanos, sem “as máscaras” da razão indolente
à margem da sociedade, com ou sem Covid-19?
e fascista, que exclui as pessoas do convívio social por
Quem cuida dos trabalhadores/as da saúde?
causa de etnia, sexo, religião, classe ou orientação se-
Logo que chegou a notícia do novo coronavírus, as instituições comprometidas com a pessoa hu-
xual. Esse é o vírus para o qual ainda não se encontrou uma vacina preventiva e curadora.
mana tomaram todos os cuidados técnico-sa-
Todos/as nós, independentemente de credo ou orien-
nitários para proteger vidas, em nome da saúde,
tação sexual, somos chamados/as a dar uma resposta
procurando integrar os saberes, cientes de que
humana às demandas da sociedade. Ser cristão e dis-
cuidar é um ato que exige compromisso com a
cípulo/a missionário/a de Jesus implica em engajar-se
vida do outro.
na proteção e promoção da vida.
Com esta motivação, a Igreja católica incremen-
A indagação sobre como será a vida social no pós-Co-
tou suas iniciativas de caráter solidário com pes-
vid-19 faz sentido, e pode ser vista como um ato peda-
soas carentes e mais vulneráveis. Além de seguir
gógico que leva a um novo aprendizado para encarar
rigorosamente as medidas de prevenção em seus
a vida em sua integralidade. Nossa resposta deve ser
espaços, a Igreja está suscitando projetos que fo-
o compromisso ético de esperança e de solidariedade
mentem o uso da “máscara social” em favor da
com as pessoas que vivem desprotegidas do seu direi-
saúde e prevenção das pandemias. E pede que
to humano à saúde.
todos ajudemos a cuidar da vida como um dever moral.
Em tempos de Covid-19, é de se esperar que esta ação direta se expresse na continuidade e na intensificação
Temos ciência de que é possível cansar, fracas-
do respeito mútuo e da solidariedade entre as pessoas,
sar e até cair na decepção e na solidão. Mas quem
especialmente da sociedade brasileira, tão ferida, nos
não passou pela experiência da solidão, não está
seus direitos civis e políticos, pela Covid-19 e pelas au-
habilitado para a vivência solidária.
toridades constituídas mas, muitas delas, destituídas de empatia e humanidade.
A vida humana não se prolonga eternamente na história, mas as máscaras e o álcool-gel reúnem dois valores ao mesmo tempo: proteção e cuidado, caridade e solidariedade.
Por Pe. José André da Costa, msf Professor e Pároco em Caldas Novas/GO
Igreja
Pastoral da Comunicação no "novo normal" Veja a readaptação da Pascom durante a pandemia Na paróquia Santa Maria Madalena, de União dos
ção, e cremos: suas palavras e escritos foram o que
Palmares/AL, a Pastoral da Comunicação começou de
nos motivaram muito naquilo que atualmente fa-
forma simples: trabalhávamos com a missão de trans-
zemos.
mitir uma ou outra celebração especial, algumas mis-
Sabemos que não está sendo fácil para ninguém,
sas dominicais e a festa da padroeira, que ocorre todo
mas esperamos que toda essa realidade possa me-
ano entre o final de janeiro e início de fevereiro. Para
lhorar, e que o “novo normal” gere em nós uma
nós, esse sempre foi o momento de fazer alguma coisa
nova postura diante da vida e diante da fé: que se-
diferente. Quando começamos, dois ou três agentes já
jamos novos homens e mulheres, transformados
davam conta de transmitir e divulgar as atividades de
pela única novidade que de fato faz o novo aconte-
nossa comunidade.
cer, Jesus Cristo, nosso Senhor.
Chegou 2020, e veio junto com ele o coronavírus. Em
Conforme a CNBB, “Pastoral da Comunicação”
nossa arquidiocese, o dia de São José foi a nossa última
nasce da junção de duas realidades que interagem
celebração presencial na matriz. Da participação ati-
reciprocamente: a comunicação e a ação pastoral.
va, abraços e proximidade, passamos ao isolamento e
O universo da comunicação abrange as distintas
participação à distância em todas as atividades.
dimensões da realidade humana, enquanto o uni-
Readaptar: nunca passou pela nossa cabeça que essa
verso da pastoral envolve a dimensão sócio ecle-
palavra seria agora uma constante em nossa vida pas-
sial, relacionada aos diferentes ambientes da Igreja
toral, que faria parte da nossa vivência da fé. Mas, como
em sua missão de evangelizar.”
na canção “segura na mão de Deus e vai...”, nós “fomos” Conheça nosso trabalho:
e nos reinventamos. Se antes nossa atuação pastoral da comunicação era pontual, agora nossa responsabilidade aumentou: ca-
@pascomsmm
tequese, lives musicais, programas de entrevista, reza
p.santamariamadalena
do terço, novenas... Enfim, todas as pastorais que antes tinham sua organização por conta própria, passaram a
Por Wilquer Correia e Ir. Wanderson Alves, msf
se comunicar pela pascom. Todo aprendizado traz junto dores e alegrias. E ver
União dos Palmares/AL
a igreja vazia, nas primeiras celebrações no início da pandemia, doeu bastante. Hoje temos as celebrações presenciais, mas com certeza, nem se compara ao que vivíamos antes. Vários agentes choravam, outros nem conseguiam ir, enfim, mexeu profundamente com todos nós. Nosso pároco, Pe. George, nos animava dufortaleçamos a nossa fé, para que nós possamos nos aproximar mais de Deus, a partir do nosso coração, a partir de nossas famílias”. A comunicação e a arte são dimensões únicas em nossa vida e, quando esses registros comunicativos e artísticos falam de algo tão essencial que é a Boa Notícia de Cristo, acreditamos que algo fundamental sempre fica no coração das pessoas. O saudoso (e agora santo) Papa João Paulo II foi um arauto da comunica-
Crédito foto: Site Unifatea (Nelson Antoine/ Shutterstock)
rante a travessia: “Meus irmãos, tudo isso é para que
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Central
Reflita sobre a dimensão pascal da vida e fé cristã durante a pandemia 10 10
Na Encíclica Evangelii Gaudium, o Papa Francisco dá a sua resposta à pergunta formulada no título acima, no seguinte teor: “Há cristãos que parecem ter escolhido viver uma Quaresma sem Páscoa. Reconheço, porém, que a alegria não se vive da mesma maneira em todas as etapas e circunstâncias da vida, por vezes muito duras” (n. 6). Na presente etapa da minha vida, fazendo parte do grupo de risco dos idosos e convivendo circunstancialmente com a experiência da quarentena frente ao drama da Covid-19, ensaio também uma resposta ao desafio proposto. Provido do tradicional método brainstorm, dou livre fluxo ao pensamento, dentro do horizonte psíquico e espiritual do meu vivido existencial, do meu Sitz im Leben. O Papa Francisco contextualizou sua observação sobre uma Quaresma sem Páscoa no âmago da Alegria do Evangelho, título e conteúdo da sua sempre atual Encíclica. Já o contexto do meu “vivido existencial” são os até hoje onze meses de quarentena, de quase “quaresma” prolongada. À luz da gramática moderna, é possível identificar uma similitude de étimos nos significantes de quaresma e quarentena. Preciso é, porém, que se deslinde o(s) significado(s) destes significantes. Mesmo mantendo presente o contexto da “alegria” do texto papal, meu pensamento flui, súbito e sápido, para o contexto da “liberdade”. Paradoxalmente, posso ser “livre”, confinado em quarentena? Não seria já uma resposta antecipada à questão da Quaresma sem Páscoa? Não se introduz sub-repticiamente o pensamento sartriano da necessidade de saber o que fazer da nossa eventual não-liberdade? Ou quiçá, mais radicalmente, o imperativo nietzschiano de ser o que se é, “humano, demasiado humano”? Imperativo kantianamente categórico?
Além disso, a espiritualidade da Quaresma me convida a ver o sagrado no profano, a laicidade ombreando com o clericalismo, a ideologia de gênero buscando foros de cidadania, o diálogo e o igualita-
Central
Obviando estes pensamentos fugidios de cariz filosófico-humanista, direciono o leme do meu pensar para a espiritualidade bíblico-teológica, mais condizente com a questão da Quaresma sem Páscoa.
rismo sendo compromissos da CNBB e do CONIC na atual CF ecumênica, o Reino de Deus se sobrepondo à institucionalidade da Igreja, a diaconia-serviço sendo tarefa de todo batizado (incluindo Papa, Cardeal, Bispo, Sacerdote e Religioso), sem falar do negacionismo a ser vergado na luta contra a Covid-19
Retorno, então, à condição de octogenário que re-
e a resistência urgente ao neoliberalismo na eco-
siste ao império absolutista da quarentena e busca
nomia, e ao neonazifascismo na política e ideologia
refúgio físico, social e espiritual. O amparo físico,
hegemônica do poder executivo. Tudo isso é “misté-
encontro na sombra benfazeja de um pé de cina-
rio pascal da fé”, é dimensão pascal da espirituali-
momo, no fundo do nosso quintal. A ajuda social é
dade quaresmal.
garantida pela assistência solícita dos filhos e, má-
Este contexto de fé e espiritualidade da Quaresma
xime, pela convivência diuturna, dialógica e amoro-
sem ou com Páscoa, trouxe à tona o trio economia,
sa da esposa. O recurso espiritual, finalmente, é ab-
política e ideologia familiar ao estudioso das estru-
sorvido por momentos de oração e meditação, por
turas sociais. Ao constatar que a liturgia do tempo
leituras variadas e pelo estudo perquiridor de her-
comum optou, neste início de ano, pelo Evangelho
menêutica bíblico-teológica. Sobre este horizonte
de Marcos, dediquei parte das minhas leituras na
da espiritualidade, concentro agora minha análise
quarentena ao reestudo do relato da prática de Je-
e minha predileção, coincidentes com a questão
sus na ótica de Marcos. Muitas conclusões me ocor-
acima intitulada.
reram, inclusive com os significados e denotações
O princípio básico da espiritualidade da Quaresma
dos três níveis (econômico, político e ideológico)
consiste em transformar a Quaresma sem Páscoa
presentes na sociedade de classes da Palestina do
em Quaresma com Páscoa, isto é, identificar a di-
século I dC, úteis para a compreensão genuína do
mensão de pascalidade na Quaresma, decorrente,
segundo evangelho sinótico.
por sua vez, da dimensão pascal da vida e da fé cris-
Devido ao espaço limitado deste artigo, menciono
tãs. Simples assim? Nem tanto, pois, a circunstância
somente o caráter subversivo da Ressurreição de
existencial de viver em momentânea quarentena,
Jesus na Páscoa e a curiosa existência das reticên-
talvez, ainda sem adoração do Santíssimo na Quin-
cias (...) após Mc 16.8 que as modernas edições do
ta-feira Santa, sem procissão do Senhor Morto, na
Evangelho apresentam, sinalizando que o relato da
Sexta-feira Santa, sem Vigília Pascal, no Sábado
prática de Jesus não termina com a morte do Naza-
Santo. Em situação de grandes aglomerações, me
reno e que o túmulo vazio indica a vitória do Cruci-
está ensinando que preciso fazer a experiência
ficado sobre a morte, com a ordem aos discípulos:
mística das noites escuras do “deserto”, exercitar o
“proclamai o Evangelho a toda a criatura” (Mc 16,15)
enfrentamento das “tentações” de poder e de orgu-
para alvíssaras de felicidade (“Boa-Nova”) e liberda-
lho, a luta contra a mediocridade (Santo Afonso) ou
de de todas as nações, assistidas pelo Espírito que o
contra a ideologia dos compromissos meramente
Pai haveria de enviar, pois, segundo Paulo: “Onde se
terrenos (Bonhoeffer, num campo de concentra-
acha o Espírito do Senhor aí está a liberdade” (2Cor
ção).
3,17b). Na quietude do meu retiro quaresmal, balbu-
A vida quaresmal, na dimensão pascal ao longo de todo o ano e não apenas numa curta fração do tem-
cio: por que não inverter? Onde se acha liberdade, aí está o Espírito.
po no infinito da eternidade, me ensina a identificar Deus em todas as coisas e todas as coisas em Deus (aprendizagem dos exercícios espirituais de Loyo-
Prof. Bertilo Brod
la), pois, em Deus “vivemos, nos movemos e existi-
Erechim/RS
mos”, segundo Paulo no Areópago (cf. At 17,28).
11 11
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Central
12 12
Quarentena da Covid-19 não será uma quaresma sem fim! Uma experiência de 40 dias isolados
tempo de cultivo e repouso e cuidado de si, em tempo de contemplação e estudo, num grande retiro. Outros, talvez, tenham aproveitado este tempo para fazer o que sempre desejavam fazer e não tinham tempo, foram inibidos pelo medo, distraídos pelo ativismo, não foram capazes de silenciar e continuam no mesmo. Quando o Vaticano interferiu na vida acadê-
A Covid-19 gerou o isolamento social e um novo
mica de Leonardo Boff, impondo um tempo
modo de percebermos a realidade como um todo.
de “silêncio obsequioso”, o cardeal Arns disse:
Este tempo está sendo uma oportunidade para
“Espero que ele consiga fazer deste silêncio um
“cozinhar-se na própria banha”, compreender
tempo de cultivo e usar a sabedoria que leve a
o tempo da semente lançada na terra e a neces-
sua obra e missão a uma grande fecundidade”.
sidade de decidir entre apodrecer e germinar,
Foi isso que aconteceu com Nelson Mandela,
brotar, tornar-se planta, amadurecer e produzir
na África do Sul. Em 1964, ele foi condenado
frutos.
à prisão perpétua por sua luta contra o racis-
Poderíamos também comparar isso que esta-
mo. Foi libertado por pressão internacional em
mos vivendo com a experiência de Jesus nos 40
1990, e recebeu o “Prêmio Nobel da Paz” em
dias no deserto, como um tempo de cultivo muito
1993 pela sua luta contra o regime de segre-
intenso. Dando asas à imaginação, visualizo Jesus
gação racial. E tornou-se presidente da África
no deserto olhando para o seu passado, conduzi-
do Sul (1994-1999). Aqueles anos passados na
do pelo Espírito, plasmando o seu projeto de vida,
prisão foram um intenso e incessante proces-
morte e ressurreição.
so de cultivo e pacificação de sua própria inte-
É de se esperar que muitos, com sabedoria, tenham conseguido transformar esta vivência em
rioridade na busca de sonhos e projetos que se tornaram realidade.
tra a dominação branca e lutei contra a dominação negra. Eu tenho prezado pelo ideal de uma sociedade democrática e livre, na qual todas as pessoas possam viver juntas em harmonia e com
Central
Ao sair da prisão, Mandela faz um discurso chamando o país para a reconciliação: “Eu lutei con-
iguais oportunidades. É um ideal pelo qual eu espero viver e que eu espero alcançar. Mas caso seja necessário, é um ideal pelo qual eu estou pronto para morrer”. Diante disso, penso que poderíamos afirmar que estes tempos marcados pela Covid-19 são um tempo fértil para a gestação de uma nova páscoa, para dedicar-se ao essencial, para mergulhar dentro de si e auscultar-se, e movidos pela Palavra de Deus, que desperta a solidariedade, nos faz missionários, nos chama a ser sal da terra e luz do mundo, estender-nos a toda a humanidade e perceber que o planeta todo precisa de nosso cuidado e de nossa ação transformadora. Estes tempos exigentes podem se converter em um tempo de terra fértil para iniciativas renovadoras para enfrentar as questões e desafios mais fundamentais. Creio que, pelo fato de muitas pessoas terem mais tempo para parar e sabiamente silenciar e viver “um deserto fértil”, brotarão, nos mais diversos ambientes, iniciativas que geram mudanças de vida e de atitudes, iniciativas de solidariedade que ajudam a gerar o mundo novo que tanto almejamos. Queira Deus que, nesta quaresma, muitos vivam uma verdadeira e contínua conversão aos valores fundamentais da convivência humana.
13 13 E que a Campanha da Fraternidade
Ecumênica
nos ajude a ver com amor aqueles que são diferentes e gere iniciativas coletivas para o bem do Brasil, da humanidade e do nosso planeta,
libertando-nos
dos vírus destruidores do poder, da corrupção e do individualismo. E oxalá possamos, no fim deste tempo de travessia, cantarmos
juntos:
“Somos
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gente nova!”
Por Pe. Hilário Dewes, msf Passo Fundo/RS
Espiritualidade
Pistas para uma espiritualidade de travessia do “mar Vermelho”
Acredito que este deve ser um caminho espiritual que devemos adotar para vivermos a Quaresma como preparação para a Páscoa. Caminhamos até aqui, segunda Quaresma na pandemia, mas, por mais que os profetas do caos apocalíptico insistam em bradar males, doenças, pecados, mortes, temos que ir além. Jesus sofreu, morreu, mas ressuscitou.
Prepare-se para o ciclo pascal com um caminho espiritual fortalecido no livro de Êxodo
O povo de Israel aterrorizou-se diante do exército de morte do faraó, mas prevaleceu a mão de Deus: “O Senhor disse a Moisés: ‘Por que clamas a mim por socorro? Dize aos israelitas
Estamos iniciando o ciclo pascal, com o tempo da qua-
que se ponham em marcha. Quanto a ti, ergue
resma. Fazemos isso já no segundo ano da pandemia
a tua vara, estende a mão sobre o mar e divide-
pela Covid-19. No ano passado, com as igrejas fechadas,
-o, para que os israelitas passem em seco pelo
e este ano celebraremos com poucas pessoas para evi-
meio do mar. As águas se dividiram e os israe-
tar aglomerações, cuidando do distanciamento, fazendo
litas entraram pelo meio do m ar a pé enxuto,
uso do álcool para higienização e vários outros cuidados
enquanto as águas formavam uma muralha à
necessários.
direita e outra à esquerda” (Ex 14,21-22). O resto
Em meio às desolações, desespero e dores onde pode-
capítulo 14 por inteiro.
então no livro do Êxodo para resgatar a tensão que foi
Fique bem claro que não estou negando a
a travessia do mar Vermelho. A história do êxodo dos
dramaticidade da pandemia em nossos dias.
filhos de Israel, do primeiro ao último capítulo, (Ex 1,1-
Muitos amigos(as), familiares, seres humanos
40,38), parece relatar uma "quaresma sem páscoa". Mas
perderam sua vida para a Covid-19. É fato. Mas,
não foi isso o que aconteceu.
precisamos afirmar sempre e continuamente:
Os filhos de Israel, segundo o livro do Êxodo, entra-
celebramos o ciclo pascal como um conjunto
ram em desespero, pois em determinado momento se
– quaresma, tríduo pascal e tempo pascal. Por
vêem entre o faraó e seu exército e o mar. Por isso, cri-
isso, não é hora de anunciar o desespero, mas
ticam duramente Deus e Moisés: “Aterrorizados, os is-
consolar nosso povo (cf. Is 40,1): “Consolai, con-
raelitas clamaram ao Senhor e disseram a Moisés: ‘Foi
solai o meu povo’ diz o vosso Deus”.
por não haver sepulturas no Egito que nos trouxeste para morrermos no deserto? Que vantagem nos deste
Por Pe. Francisco Ary Carnaúba, msf
tirando-nos do Egito? Não te falávamos assim no Egito:
Porto Alegre/RS
‘Deixa-nos em paz para servir os egípcios?’ Era melhor servir como escravos aos egípcios do que morrermos no deserto”, (Ex 14,10b-12). Porém, neste momento a posição confiante de Moisés foi essencial para devolver esperança ao povo:
“Não temais! Permanecei firmes e vereis a vitória que o Senhor hoje vos dará. Pois os egípcios que hoje estais vendo, nunca mais tornareis a ver. O Senhor combaterá por vós; e vós, ficar tranquilos”, (Ex 14,13-14).
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da história nós conhecemos, mas vale a pena o
ríamos buscar uma espiritualidade de consolação, fui
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Espiritualidade
Jesus no caminho da cruz
A cruz aparece não mais como uma possibilidade para Jesus, mas como uma certeza Com a ajuda do profeta Isaías, Jesus tomou consci-
nova compreensão da cruz, tão bem expressa por
ência de que a manifestação do Reino de Deus seria
São Paulo quando fala aos cristãos de Corinto: “Os
diferente do que ele imaginava no início da sua mis-
judeus pedem sinais, os gregos buscam sabedoria,
são: a vitória do Servo Sofredor viria pela resistên-
mas nós anunciamos o poder do mistério da cruz,
cia, condenação e morte. A cruz aparece não mais
que para os judeus é escândalo e para os gregos é
como uma possibilidade, mas como uma certeza.
loucura” (cf. 1Cor 1,10ss).
Contudo, Jesus continua focado no Reino de Deus,
O momento da prisão, da paixão e da morte de
que já está presente, atuando no mundo, e não
Jesus na cruz é o auge da crise dos discípulos: eles
muda sua relação com o Pai, cada vez mais íntima e
dormem enquanto Jesus está no horto em profun-
profunda. A noção que Jesus tem de Deus é a do sal-
da agonia e dor; Pedro o nega quando é perguntado
mista (Sl 144): “Misericórdia e piedade é o Senhor,
pelos soldados se ele o conhecia; Judas negocia a
ele é amor, é paciência, é compaixão. O Senhor é
vida de Jesus com as autoridades; quase todos eles
muito bom para com todos, sua ternura abraça toda
fogem na hora de sua morte. Todos dão a nítida im-
criatura”.
pressão de estarem decepcionados, de terem perdi-
A ternura e misericórdia de Deus continuarão sem
do quase tudo o que tinham buscado até então.
limites na compreensão de Jesus. Mas, a partir das
A crise dos primeiros discípulos continua sendo
resistências que enfrenta, Jesus dá nova direção
vivida hoje, por muitos cristãos, por falta de uma
à sua vida e missão, e muda o modo de anunciar o
compreensão mais profunda do verdadeiro sen-
Reino: as parábolas se referem a essa nova realida-
tido da vida, pela falta de uma compreensão mais
de, e se direcionam mais para o futuro julgamento
evangélica do sofrimento e da cruz que carregam
e para o fim dos tempos; ele diminuiu os milagres
seguindo Jesus, da compreensão da própria morte,
e começa a falar constantemente de sua paixão e
e por falta de fé na ressurreição sobre a qual, hoje,
morte.
temos provas históricas muito convincentes.
Depois de perguntar o que os discípulos pensam
Contudo, na experiência de sofrimento ou de
dele, Jesus começa a falar da sua paixão e morte na
aproximação da morte, muitas pessoas descobrem
cruz. Mas os discípulos têm dificuldade de compre-
o verdadeiro sentido da vida e são confirmadas na
ender isso, e até tentam levá-lo por outro caminho.
sua esperança. Quem passa pelo sofrimento tem
Isso gera uma grande crise, e Jesus passa a mostrar
uma maravilhosa oportunidade de crescer moral e
com clareza o seu caminho e as exigências para se-
espiritualmente, mesmo nas experiências dolori-
gui-lo: “Quem quer ser meu discípulo renuncie a si
das. É claro, que isso depende da capacidade de se
mesmo, tome a sua cruz e siga-me, pois quem qui-
abandonar, incondicionalmente, nas mãos de Deus.
ser salvar a sua vida vai perdê-la, mas quem perder a sua vida, por causa de mim, vai encontrá-la”. A partir deste momento, Jesus insiste na vigilância e nas exigências do seguimento, com uma
Por Pe. Euclides Benedetti, msf Pároco/Santo Ângelo/RS
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Missionários
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Testemunhos
Pe. Milton Sulzbacher msf: uma vida doada pelos empobrecidos Sua história de doação aos mais pobres é um exemplo de discipulado de Jesus Cristo Conheci o Milton nos encontros de estudos em Palmitos/SC nos anos 2003 e 2004. Ele trabalhava na Paróquia
diabo usa para impedir a revolução do Reino de Deus, conduzida por Jesus Cristo.
católica, e participava nos encontros de estudos sobre a
O Padre camponês Milton morreu dentro deste
realidade brasileira influenciada pelo capital e sobre o
processo missionário, como discípulo do Deus
movimento de resistência dos camponeses.
que se tornou classe camponesa em Jesus de Na-
Em 2004, eu deixei o trabalho da Pastoral Popular Lu-
zaré, para acabar com a sociedade de classes. Ele
terana em Palmitos e assumi a paróquia luterana de
morreu de Covid-19, num país que mostrou que é
Condor/RS. Reencontrei o Milton anos depois, e ele me
soberano e reconquistou o poder usurpado pelo
contou que se tornara Missionário da Sagrada Família
imperialismo estadunidense, aliado à elite lacaia
e estudava teologia. A partir da realidade de exploração
e subserviente local, nas eleições do ano passado.
em que vivem os agricultores, o Milton estudou teologia
O Milton quis servir ao Reino de Deus num país
para fortalecer o anúncio do Deus que se fez camponês
que resiste ao imperialismo, e isso nos anima
sem-terra e palestino empobrecido em Jesus de Nazaré.
a resistir também aqui no Brasil aos interesses
Quando foi ordenado padre, ele me convidou para a ce-
imperialistas assentados no Palácio do Planalto,
lebração.
mas já questionado pelo povo, que pede o impea-
O anúncio do Evangelho se resume no projeto de insurgência evangélica do Reino de Deus.
chment de seu morador por causa da omissão no enfrentamento da pandemia que já ceifou mais de 250 mil vidas no Brasil. A pandemia está mos-
A partir da fé, o Milton se jogou nessa luta contra o reino classista do mundo, e partiu para o país mais pobre da América do Sul, que havia organizado o campesinato indígena e o operariado que tomou o poder do Estado, que foi comandado por um indígena.
trando que os interesses do Mercado colocam a vida humana em segundo lugar. A Covid-19 mata e muda constantemente, como o capitalismo. A vida e morte do Padre Milton na Bolívia nos diz que a vida é maior que o Mercado, e que a coragem é maior que o medo. Sua doação evangélica no país mais pobre da América do Sul é exemplo de discipulado de Jesus Cristo. A vida vem de Deus
Um camponês empobrecido de Palmitos se colocou a serviço da revolução evangélica do Reino de Deus na Bo-
e é de Deus. O capital está a serviço da morte e é coisa do diabo.
lívia, que continua sendo um grande sinal de resistência aos interesses do imperialismo estadunidense. O Padre
Por Pastor Günter Adolf Wolff (IECLB)
Milton colocou sua vida a serviço da luta contra o reino
Palmitos/SC
do mundo, o capitalismo, que é um instrumento que o
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Testemunhos
A Pandemia na vida de um pastoralista A dura realidade de lidar com um inimigo tão desconhecido A notícia veio de longe. Inicialmente sem importância.
Lidar com um inimigo tão desconhecido, foi sen-
Quase ninguém lhe deu atenção. Mas, como a notícia se
do um grande desafio. Ficar se cuidando quando
emenda, logo, todo mundo ficou sabendo que se tratava
o inimigo poderia estar longe, era expor-se ao
de uma pandemia e vinha na montaria da morte. Chegou
ridículo. Não se cuidar quando o inimigo pode-
ao Brasil no meio do carnaval, nesta hora da folia e da
ria estar no trinco da porta de nossa casa, era um
alegria, não teria lugar para ela e deixaram para depois.
apelo para estar num estado de alerta constan-
As consequências foram desastrosas.
te. Assim ficamos um tempo sem as celebrações
A situação ficou pior, quando a pandemia foi tratada com desdém, a ignorância se impôs à ciência, o negacio-
Foi uma experiência que exigiu um grande es-
nismo negou a dura realidade, o preconceito fortalecido
forço de adaptação. Em seguida, porém, veio a
pela ideologia reinante, dificultou qualquer tipo de nego-
orientação da CNBB. Com todo o cuidado, volta-
ciação, principalmente na hora de adquirir a vacina ou a
mos a celebrar com a presença dos fiéis, exigin-
“IFA” para sua fabricação.
do-lhes o uso de máscara, álcool em gel e o devido
As mortes foram se multiplicando e as imagens divulgadas pela mídia, cada vez mais chocantes e provocando
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presenciais, apenas pela internet.
muita angústia, afinal, eram irmãos e irmãs que estavam morrendo em tão grande quantidade.
distanciamento, o que continuamos fazendo até hoje. Mas o descaso de muitas pessoas frente à pandemia, a falta de empatia com o coletivo, geraram em mim preocupação e indignação. Sucessivos
Foi no meio desta dura realidade que cada um viveu sua dura experiência da pandemia.
equívocos do governo federal, no enfrentamento à Covid-19, enquanto eram negados por grande parte da população, em mim eram revoltantes.
Na medida que pessoas da comunidade eram contami-
Vive-se um momento de grande preocupação,
nadas e perdiam suas vidas, devo confessar, o medo foi
não só pelas mortes de milhares de pessoas pela
tomando conta de mim, principalmente por ser do grupo
pandemia, mas também pela morte à cultura,
de risco. Medo de ser contaminado e não resistir, de ter
pelo desprezo à ciência, pela piora na educação e
que abandonar tudo o que ainda sonhava fazer.
pelo empobrecimento cada vez maior dos pobres.
Ao mesmo tempo, um desejo inconsciente de ser con-
Nunca se repetiu tanto: precisamos manter viva a
taminado e poder dizer que era forte e resisti. Na medi-
esperança, mas a nossa razão, exige razões para
da que ia me distanciando para não ser contaminado,
tal.
um sentimento de culpa invadia minha alma de ser um pastor que estava abandonando suas ovelhas, que não estava dando a vida por elas. No meio a tudo isso, surgiu
Por Pe. Euclides Benedetti, msf
um tripé de proteção: máscara, álcool em gel e distancia-
Santo Ângelo/RS
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mento.
Colabore
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