Agrotóxicos: envenenando a vida

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envenenando a vida



editorial O uso intensivo de agrotóxicos tem levado à contaminação do solo, da água, do ar e dos alimentos, causando profundos desequilíbrios nos ecossistemas, e prejudicando a saúde humana. Crescem a cada dia registros de intoxicações e mortes ligadas ao uso dos agrotóxicos, que frequentemente afetam trabalhadores agrícolas e a população camponesa e urbana. O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Segundo dados do Sindicato Nacional para Produtos de Defesa Agrícola (Sindage), em 2008 o nosso país ultrapassou a marca dos 700 milhões de litros de agrotóxicos legalmente comercializados. Em 2009, esse número subiu para 1 bilhão. O uso dos agrotóxicos no Brasil é tão intenso que, fazendo uma distribuição da quantidade de veneno utilizado no ano de 2009 por habitante no país, chegamos a cifra de que cada um de nós consumiu uma média de 5,2 litros de agrotóxicos ao longo do ano. Frente a esta situação preocupante lançamos este caderno de formação com intuito de denunciar para a sociedade os problemas gerados pelos agrotóxicos, e ao mesmo tempo anunciar que existem outras alternativas possíveis para a produção de comida saudável.

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Ficha técnica Projeto Cese - Ciclos: Assessoria e Capacitação jurídica aos direitos humanos e ambientais dos trabalhadores rurais de áreas de reforma agrária do Distrito Federal e Entorno afetados por grandes projetos de Irrigação e Monoculturas. Endereço Ciclos: SCS Edf Arnaldo Villares, S 212 - Brasilia - DF Data publicação dezembro de 2009; Tiragem - 1.000 exemplares Diagramação: Bernardo Vaz O conteúdo dos artigos é de responsabilidade do autor e expressa sua visão sobre assuntos atuais. Os textos podem ser reproduzidos em qualquer tipo de mídia desde que sejam citados os créditos do autor.


Sumário 4 Brasil: campeão no consumo de veneno 8 Desmata, adoece e mata 12 A classificação dos agrotóxicos 16 A lixeira do mundo 22 Prejuízos para saúde 24 A beleza que não se põe na mesa 26 A herança maldida do agronegócio 30 Conclusão 35 Até quando vamos engolir isto?


agrotóxicos até quando vamos engolir isto?

A

Lei dos Agrotóxicos (Lei nº 7.802, de 12 de julho de 1989) está fazendo 20 anos e foi fruto de uma grande mobilização da sociedade, tendo sido aprovada pela representação popular no Congresso Nacional. Apesar dos avanços conquistados com a definição desta Lei que regula sobre o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, pouco tem sido implementado para efetivar ações de prevenção e controle dos efeitos nocivos destes produtos e ainda são tímidas as sanções e pu4

nições aplicadas àqueles que descumprem a lei. Ao mesmo tempo, o Brasil assumiu, em 2009, a posição de maior consumidor mundial de agrotóxicos e continua sendo a “lixeira do mundo”, usando venenos já proibidos em vários países (da União Européia, nos Estados Unidos, no Japão e na China) por causarem impactos à saúde e ao ambiente. O modelo de desenvolvimento baseado no agronegócio promovido pelo governo brasileiro levou o país a ser um


grande produtor para exportação de soja, Os agrotóxicos são substâncias químicana-de-açúcar, milho, algodão, carnes e cas naturais ou sintéticas, utilizadas para café, em detrimento da produção susten- matar, controlar ou combater de algum tável de alimentos básicos. Este modelo modo as pragas, doenças e ervas invasoras exclui as famílias agricultoras, concentra das lavouras. É possível evidenciar a cona renda, a terra e os recursos naturais, de- tribuição de diversas políticas públicas, em grada severamente o ambiente, e “exporta” especial o crédito rural, no financiamento água, solo, recursos minerais e a saúde de subsidiado dos venenos agrícolas. Do mesmilhões de trabalhadores. mo modo, o setor industrial de agrotóxiVendemos commodities à custa da cos se beneficia da redução de impostos, o morte silenciosa dos trabalhadores e dos que estimula ainda mais o consumo. Este consumidores. A atividade agropecuária reali- O uso de agrotóxicos é promovido zada no âmbito do agro- pela modernização conservadora da negócio usa agrotóxicos agricultura e defendido pelas grandes de forma desrespeitosa, e corporações e pelo Estado brasileiro. muitas vezes criminosa. Estes venenos contaminam a nossa água, modelo onera o orçamento público, com nossos solos, o ar que respiramos, contri- crescentes gastos na assistência à saúde, buindo para a extinção da biodiversidade em atividades de controle do uso de agroe ameaçando os modos de produção cam- tóxicos e na recuperação ambiental. Ao poneses e tradicionais, com impacto sobre contrário, há uma fragilidade das políticas a cultura alimentar. públicas no que diz respeito ao apoio a alEsta situação faz com que diferentes ternativas sustentáveis para a agricultura. grupos da população brasileira – trabalhaEste caderno de formação busca prodores rurais, moradores do entorno dos blematizar o assunto junto a comunidades grandes empreendimentos agrícolas, traba- rurais de agricultores familiares, assentalhadores das fábricas de venenos, moradores mentos de reforma agrária e em comunide seu entorno, como também consumido- dades urbanas, especialmente onde resires, sejam expostos aos agrotóxicos e consu- dem trabalhadores diaristas que trabalham mam alimentos e água contaminados, com o na região no período de safra ou manejo agravante de estarem expostos a venenos de das grandes culturas do agronegócio local. alto risco. Tais impactos são distribuídos de Pretendemos contribuir para a formaforma desigual entre os diferentes territórios ção de consciências e opinião critica à rese segmentos sociais, o que tem sido denun- peito do modelo tecnológico da agricultura ciado como injustiça ambiental. brasileira e das suas conseqüências para a 5


qualidade dos alimentos ofertados, bem como motivar os trabalhadores/as do campo e da cidade para a produção e consumo de alimentos saudáveis, livres de agrotóxicos.

Buscamos contribuir para a construção de um modelo de desenvolvimento que privilegie a vida, exigindo o comprometimento do Estado em relação ao controle dos agrotóxicos, efetivando o cumprimento da lei, implementando um controle social eficaz na regulação e monitoramento dos riscos socioeconômicos e ambientais dos agrotóxicos na perspectiva da total eliminação de seu uso. Também nos pautamos no reconhecimento e a potencialização das experiências de produção de base ecológica existentes em todo o país, como alternativas concretas ao uso dos agrotóxicos. É necessária a implementação urgente de políticas públicas voltadas para a promoção da transição do atual modelo agrícola para uma produção orientada pelos princípios da Agroecologia. Nossa contribuição almeja a garantia do acesso a uma alimentação saudável e pelo efetivo cumprimento da Lei de Segurança Alimentar e Nutricional (Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006), pelo acesso à terra e aos recursos naturais, como direitos fundamentais do povo brasileiro.

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Horta agroecol贸gica em assentamento de Sergipe.

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BRASIL: campeão mundial de O

Brasil é o maior mercado de agrotóxicos do mundo e representa 16% da sua venda mundial. Em 2008, foram vendidas aqui 780 mil toneladas, com um faturamento estimado da ordem de 8 bilhões de dólares. Ao longo dos últimos 10 anos, na esteira do crescimento do agronegócio, esse mercado cresceu 176%, quase quatro vezes mais que a média mundial, e as importações brasileiras desses produtos aumentaram 236% entre 2000 e 2007. As 10 maiores empresas do setor de agrotóxicos do mundo concentram mais de 80% das vendas no país. Esses produtores viram ameaçadas suas novas metas de faturamento com o anúncio da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de que se propõe a reavaliar o uso de 13 produtos agrotóxicos, vários deles já proibidos há anos nos EUA,

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na União Europeia, e em países como Argentina, Nigéria, Senegal, Mauritânia, entre outros, como o acefato e o endossulfam. Os motivos dessa proibição são evidentes: a contaminação de alimentos, de trabalhadores rurais, e do meio ambiente, causando, literalmente, o envenenamento dos consumidores, a morte de trabalhadores rurais e a destruição da vida animal e vegetal. Em solicitação ao Ministério Público para a proibição de um desses agrotóxicos – o Tamaron – os então deputados federais Fernando Dantas Ferro, Adão Preto e Miguel Rosseto denunciam que 5 mil trabalhadores rurais morrem, a cada ano, intoxicados por venenos agrícolas, sendo que muitos mais são afetados de maneira grave pela ingestão dos componentes químicos desses produtos.


Frente à disposição da Anvisa de reavaliar produtos como Gramoxone, Paraquat, Tamaron, Mancozeb, Monocrotfos, Folidol, Malation e Decis, o SINDAG – Sindicato das Indústrias de Defensivos Agrícolas – recorreu ao Judiciário, solicitando que não sejam publicados os resultados das reavaliações. Houve mesmo iniciativas no Judiciário que pretendiam proibir os estudos da Anvisa que verificavam a segurança das substâncias de 99 agrotóxicos. O fato é que o setor ruralista, a bancada ruralista e os fabricantes de agrotóxicos se puseram a campo contra a iniciativa da Anvisa, e mesmo contra a própria Anvisa e o seu papel fiscalizador. Segundo documento obtido pela ABRANDH – Ação Brasileira Brras asil ileeiira pela pel elaa Nutrição N tr Nu tri riç ição ição ão e Direitos Dir ireeiito tos os HumaHuma Hu uma manos, nos, no s, o Ministério Min nis istéériio daa Agricultura Aggrric ric icu ulltu ura r quer qu ueeerr ser ser se o responsável reesp pon on nsá sável sá vel pe ve pela pela la aavaliação valiiaç va ação ção ã e registro reggistr isstr tro dos dos do produtos prod pr dut utos os agrotóxicos. agr grot otó óxxic icos os.

Em 2002, com o início do funcionamento do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos, coordenado pela Anvisa, surgiram informações preocupantes. Das 1.198 amostras recolhidas em nível nacional, 17,28% apresentavam índices de contaminação acima do permitido para se preservar a saúde. O tomate, o morango e a alface são os mais contaminados. Se você come amendoim, batata, brócolis, citros, couve, couve-flor, feijão, melão, pimentão, repolho, entre outros alimentos, cuidado! Eles contêm acefato, um agrotóxico que pode causar danos ao cérebro e ao sistema nervoso e provocar câncer no longo prazo. O acefato é proibido em toda a União Europeia. Segundo IDEC dee De Defesa Segu Se Segu gund ndo o IID ndo DEC C – IInstituto n ti ns titu tuto tu uto od D efesa feessaa do consumidor brasileio Consumidor, Con onsu su um miido dor, r, “o “o cons co ons nsum u id dor or b raasi sile lleeiiro exposto o está est stá tá eex xpos po p ost sto a um sto m risco risco isco is co sanitário san anittário áriio ár o inain naaceitável, medidas dos ceit ce itáv ável el, que que ex qu eexige xige igge me m ed diida dass rigorosas riigo gorosa rosa ro sas do d os

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conseqüências são ainda indecifráveis nos ecossistemas e organismos biológicos. Essas grandes corporações nos adoecem e nos ofertam medicamentos produzidos também em suas fábricas. Lucram com o fechamento de um ciclo de malefícios. Tenta-se criar um mito, de fácil disseminação no senso comum, de que sem esses produtos não haverá capacidade de suprir as necessidades alimentares da população humana: os efeitos colaterais dos agrotóxicos são apregoados como uma espécie de mal menor ante a possibilidade de fome mundial. Desconsiderando que, mais do que uma questão de produção São vários os trabalhos científicos que comprovam de alimentos, a fome que recai sobre grande parcea alta toxicidade e os danos neurológicos ocasiola da população mundial nados por esses compostos, inclusive triplicando é conseqüência do insano o índice de suicídios nas populações mais diretacaráter concentrador do mente expostas aos mesmos. sistema capitalista. Ademais, a criatividade humana tem priorizados os aspectos meramente produtivistas e colocam-se em segundo plano plena capacidade para o desenvolvimento os riscos intrínsecos a essas substâncias. de tecnologias de produção agrícola que Não fosse assim, os produtos com princí- prescindam dos agrotóxicos, como mospios ativos baseados em moléculas de or- tram as crescentes vivências e experiências ganofosforados - de elevada toxicidade e com agroecologia mundo afora. A disproibidos em grande número de países do seminação de tais experiências encontra mundo - não teriam ainda uso autorizado como principal obstáculo a insensibilidade no Brasil, como é o caso do Metamidofós, governamental para um maior estímulo e incentivo à pesquisa, ao ensino e ao desenAcefato etc. As empresas produtoras de agro- volvimento de programas de extensão rural tóxicos lucram com o veneno na nossa voltados para essa outra visão tecnológica. A política governamental optou pelo alimentação, com a intoxicação de trabalhadores rurais e com a contaminação do agronegócio e suas nefastas conseqüências: nosso ambiente. E são as mesmas que nos monoculturas, desmatamento, poluição impõem os transgênicos, produtos cujas por agrotóxicos e adubos industrializados, órgãos governamentais responsáveis, inclusive com a punição dos infratores”. Essa denúncia decorre do levantamento e análise da Anvisa, feito de junho de 2001 a junho de 2002, onde nada menos que 81,2% das amostras analisadas (1051 casos) exibiam resíduos de agrotóxicos e 22,17% apresentavam índices que ultrapassavam os limites máximos permitidos. O poder público tem a obrigação constitucional de tutelar e assegurar a saúde e a qualidade ambiental. Mas, em relação aos agrotóxicos, esse importante preceito constitucional é, na prática, negligenciado. São

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concentração de renda e terras, empobrecimento do camponês, enfim, uma opção que não supera o histórico papel periférico de exportador de matérias-primas pelo Brasil. Trata-se de opção em evidente contradição com um novo paradigma de produção agrícola, mais limpa social e ambientalmente, voltada às necessidades humanas, e não apenas aos lucros de poucos. No ano de 2009 foi realizado o terceiro Seminário nacional sobre Agrotóxicos, que contou com ampla presença de diversos segmentos: ONGs, Movimentos Sociais, Universidades, governo, ministério publico, personalidades de atuação no campo de agricultura, saúde e meio ambiente. A partir deste seminário constituiu-se o Fórum Brasileiro de Combate aos Agrotóxicos, que tem buscado manter cotidianamente o debate, critica e sistematização das informações para permitir que estas cheguem mais facilmente à população. O fórum tem participação mista, entre representantes do executivo, judiciário e da sociedade civil, havendo também participação representativa do legislativo brasileiro. Até o momento O Fórum esta organizado com encontros e seminários nacionais,com

grupos de trabalhos que dinamizam os principais temas, e está iniciando a organicidade nos estados, sendo os pioneiros o PE, RS, CE e SP, onde tem se buscado reproduzir a estrutura orgânica do fórum nacional. Enquanto uma das primeiras constatações e encaminhamentos do Fórum Nacional tem-se a percepção de que a extrema gravidade do uso abusivo e nocivo dos agrotóxicos não é assunto comum de domínio popular, nem mesmo nas camadas mais informadas e com facilidade de optar por outro padrão alimentar, optando por alimentos orgânicos. Apesar das informações alarmantes, há enorme alienação e passividade quanto à forma de escolher e selecionar os alimentos, geralmente não havendo informações básicas e nem mesmo preocupações quanto à origem e forma e produção dos alimentos. Portanto, um dos principais desafios do Fórum Brasileiro de Combate aos Agrotóxicos é promover as informações e o debate para o nível local, internalizando e interiorizando as informações, popularizando-as e massificando-as, fazendo-as chegarem as pessoas de forma mais simples e facilmente apropriadas.

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Crianças sofreram superexposição ao Agente Laranja no Vietnã, durante a Segunda Guerra Mundial.

Desmata, adoece e mata A indústria bélica, a indústria química e os agrotóxicos. 13


D

urante milhões de anos, o ser humano se alimentou através da caça, da pesca e da coleta de frutos e raízes. Quando começou a domesticar as plantas e animais, deu origem à Agricultura. Isto aconteceu há mais de 10.000 anos atrás. De lá até 1.850 não se usava nenhum adubo químico para produzir alimentos. Foi nesta época que o químico Justus Von Liebig (1803 – 1873) criou a Agroquímica predizendo que: “um dia todos os campos serão fertilizados artificialmente com os adubos saídos das fabricas”. Grandes empresas passaram a produzir fertilizantes, principalmente na Alemanha. Durante a Primeira (1914-1918) e a Segunda (1939-1945) Guerra Mundial, a química, que estava começando a ser utilizada na agricultura, foi aperfeiçoada para a guerra, dando origem a armas químicas tóxicas e mortais, como o “agente laranja”, dentre outras substancias.

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Depois destas Guerras, as grandes indústrias bélicas, sem ter onde escoar seus produtos, e desejosas de lucro, passaram a produzir insumos para o novo tipo de agricultura: a “agricultura moderna”. Ao invés de tanques de guerra, produziram trator; e ao invés de substancias tóxicas contra países inimigos, produzem substancias tóxicas contra insetos, doenças, inços, etc. Assim surgiram os agrotóxicos (chamados de “defensivos agrícolas” até a década de 80 e só depois chamados também de agrotóxicos), que passaram a ser utilizados em todo o mundo a partir de fortes campanhas (a chamada Revolução Verde) principalmente nos anos 1960 -1970; quando governos (principalmente militares e submissos aos EUA) indústrias de insumos, instituições de ensino, pesquisa e órgãos de extensão rural, com apoio da grã de mídia, se jogaram na difusão da agricultura química.


“De todos os fatores industriais produzidos para a agricultura, os agrotóxicos são os que causam maior fascínio, pelo poder de combater e aniquilar a ameaça ao Homem - a praga - embora, inconscientemente, não saibamos que este fascínio se dá pelo poder da morte.” Sebastião Pinheiro.

O modelo (pacote) da agricultura química, portanto, foi implantado nas Universidades, direcionando as pesquisas agrícolas, e a formação de agrônomos que depois davam assistência aos agricultores. Também houve direcionamento do credito agrícola para a compra de insumos. E este é o modelo de agricultura que predomina ate os dias de hoje. Aliás, cada vez mais incentivado. E seus piores efeitos são escondidos por quem os promove, fabrica e vende: a degradação dos recursos naturais (biodiversidade), água, solo, etc., prejuízos sócio econômicos (êxodo rural), empobrecimento e endividamento dos agricultores, baixa qualidade de vida, etc) e aumento das despesas dos Governos na área da saúde publica. Os primeiros agrotóxicos utilizados em grande escala no final do século XIX foram de origem mineral, especialmente misturas e compostos de cobre, arsênico e mercúrio. Como exemplo mais representativo se tem a Calda Bordaleza ( Sulfato de Cobre com Cal) que se utilizava como fungicida desde 1882 e teve grande êxito contra o Mildio da Videira na França. Porém os compostos que tiveram maior êxito comercial foram os Sais de Arsênico como o “Verde de Paris”(acetoarsenito de cobre) empregado pela primeira vez em 1868 contra o besouro da batata nos Estados Unidos, e junto com o Arseniato de Plo-

mo foi o inseticida de maior venda naquele país ate o final da Segunda Guerra Mundial, quando foram substituídos pelo DDT. O uso de inseticidas arsenicais causou problemas de envenenamento em usuários e em consumidores o que motivou que se estabelecessem as primeiras tolerâncias de resíduos de arsênico e plomo em alimentos nos meados da década de 1920 nos EUA, pratica que continuou com a posterior aparição dos agrotóxicos modernos. Os agrotóxicos modernos são filhos da Primeira e sobre tudo da Segunda Guerra Mundial. Neste período se desenvolveu uma intima interação entre industria química e necessidades militares, dando lugar a que gases tóxicos utilizados como armas químicas foram testados como fumigantes agrícolas e substancias extremamente toxicas e instáveis para serem utilizadas na agricultura foram testadas para uso militar.; de maneira similar, a busca de inseticidas mais eficazes que protegiam as tropas do ataque de piolhos e mosquitos transmissores do Tifo e do Paludismo respectivamente, deram origem a produção em grande escala de novos compostos químicos que depois se utilizariam massivamente para fins civis.

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A classificação dos agrotóxicos O

termo “agrotóxico”, ao invés de “defensivo agrícola, passou a ser utilizado, no Brasil, para denominar os venenos agrícolas, após grande mobilização da sociedade civil organizada. Mais do que uma simples mudança da terminologia, esse termo coloca em evidência a toxicidade desses produtos ao meio ambiente e à saúde humana. São ainda genericamente denominados praguicidas ou pesticidas. Devido à grande diversidade de produtos, cerca de 300 princípios ativos em 2 mil formulações comerciais diferentes, é importante conhecer a classificação. Existem dos agrotóxicos duas categorias importantes:

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1) Quanto à sua ação e grupo qúimico 2) Quando à sua toxidade Esta última classificação está a cargo do Ministério da Saúde, porém sofre influência das grandes indústrias de agroquímicos e tornou-se questionável. Para se ter uma ideia, no inicio da década de oitenta 96% dos agrotóxicos registrados no Brasil estavam classificados nas classes I e II. Em fevereiro de 1990, por influencia e interesses da ANDEF (Associação Nacional de Defesa Vegetal que representa as grandes indústrias de agroquímicos), foram modificados os critérios de classificação toxicológica, e a quase totalidade dos produtos das classes I e II passaram para as classes III e IV.


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Ex: inceticida = inceto + cida (cida = morte em Latim)

Inceticidas: Combate insetos, larvas

Herbicidas: Combatem ervas invasoras.

e formigas. Subdividem-se em 4 grupos distintos.

Se subdividem principalmente em:

– Organofosforados: Ex.: Folidol, Azodrim, Malation, Tamaron. – Carbamatos: Ex.: Carbaril, Temik, Furadan; – Organoclorados: Foram muito utilizados, porem hoje seu uso é restrito ou proibido. Ex.: Aldrin, DDT, Mirex; – Piretróides: Ex.: Decis, Protector, K-Otrine, SBP;

- Paraquat: Ex: Gramoxone. - Glifosato: Ex.: Round-up. - Pentaclorofenol. Ex.: Clorofen, Pó da China. - Derivados do ácido fenoxiacético. Ex.: 2,4 D e Tordon. - Dinitrofenóis. Ex.: Dinoseb, DNOC.

Fumigantes: Combate insetos e bactérias. Ex.: fosfetos metálicos (Fosfina) e brometo de metila.

Fungicidas: Combate fungos. Subdividem-se principalmente em: – Etileno-bis-ditiocarbamatos: Ex.: Maneb, Macozeb, Dithane, Zineb; Trifenil estânico. Ex.: Duter, Breslan; – Captan: Ex.: Ortocida, Merpan; Hexaclorobenzeno;

Acaricidas: combate ácaros; Nematicidas: combate nematóides; Mulusquicidas: combate caramujos Raticidas: combate roedores;

2 Categoria Toxicológica

Cor da faixa de identificação

Legenda ao centro da faixa de identificação

I

Vermelha

Extremamente Tóxico

II

Amarelo

Altamente Tóxico

III

Azul

Moderadamente Tóxico

IV

Verde

Ligeiramente Tóxico 17


A Dose letal O quadro abaixo relaciona as clastox ses toxicológicas com a “Dose Letal 50” (DL5 (D L50) 0) comparando-a com a quantidade (DL50), suficien para matar uma pessoa adulta. suficiente A DL D 50 é um calculo estatístico que express a quantidade de ingrediente ativo expressa agro do agrotóxico que mata 50% dos animais expe de experimentação expostos (geralmente a que se administra o veneno por ratos) ao via oral ou através da pele. Expressa-se em miligra miligramas do ingrediente ativo por Kg de peso corporal. Indica sua perigosidade conside considerando somente a toxicidade aguda (a que intoxica com poucos minutos ou horas d de exposição) porem não nos diz nad da sobre so nada a toxicidade crônica ( aquela apr que apresenta os efeitos ao médio e longo c prazo, como por exemplo o câncer).

Categoria toxicológica e cor da faixa

Valor de DL 50 (via oral) Mg/Kg de peso corporal

Quantidade letal para ser humano adulto

I Vermelho

5

Algumas gotas

II Amarelo

50

Uma colher

III Azul

500

30 gr. ou duas colheres

IV Verde

5000

380 gr.

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Mais um pouco sobre alguns grupos químicos

Inseticidas Organofosforados Os agrotóxicos organofosforados – derivados do acido fosfórico - possuem origem nas investigações alemãs sobre gases neurotóxicos para serem usados com armas químicas na Segunda Guerra Mundial. Estas armas químicas possuíam efeito aterrador, causando perda completa do controle muscular ao afetar a transmissão nervosa e provocar a morte de suas vitimas. Em 1941 foi sintetizado o primeiro inseticida organofosforado que se chamou “Schradán” ou “Pestox” sendo utilizados amplamente a Alemanha e posteriormente suspensos devido ser altamente tóxico. Neste mesmo ano se sintetizou o “Paraoxón”, onde se derivou o paratión etílico, que foi comercialiado pela Bayer em 1947 com o nome de E605.

Cabe destacar que o agente químico Zjylon-B usados nas mortais câmeras de gás, nos campos de concentração nazistas, foi sintetizado originalmente pela empresa alemã Degesch como inseticida, sendo que os nazistas removeram o forte cheiro característico de sua presença. Com a produção em grande escala de paration etílico na Alemanha se iniciou a era dos praguicidas organofosforados que se estendeu e generalizou em outros países sobre tudo nas décadas de 1950 e 1960 com centenas de novos compostos, muitos dos quais permanecem no mercado ate hoje, por exemplo o paration metílico, o malation da Cyanamid introduzido em 1950, o clorpirifos introduzido pela Dow Chemical em 1965 e centenas de outros compostos mais. A maior parte dos agrotóxicos no mercado mundial são organofosforados.

Inseticidas Organoclorados O desenvolvimentos dos agrotóxicos organoclorados – que possuem diversos átomos de cloro em sua molécula – também teve um forte vinculo militar. Antes do DDT a experimentação com os gases tóxicos – usados na Primeira Guerra Mundial – para avaliar sua utilização como inseticidas agrícolas permitiu que o gás lacrimógeno cloropicrin fosse autorizado para uso civil como fumigante em tecidos, casas e armazéns de grãos. De maneira similar, o paradicloro19


Carro de vaporização de DDT em Bahrain Golfo Pérsico, 1952. Foto de Walter Sanders

benceno (PDB), um produto secundário da fabricação de acido pícrico, um explosivo de grande demanda na Europa durante a Grande Guerra, se emprego como fumigante para arvores frutíferas. O DDT ( dicloro-difenil-tricloroetano) foi sintetizado em 1874 e descobertas suas propriedades para a agricultura somente em 1939, sendo autorizado para uso em 1940 para inseticida agrícola e contra piolhos, pela empresa Ciba-Geigy. O DDT foi utilizado pela primeira vez em 1943, na Itália, para combater uma epidemia de tifo tratando exitosamente mais de 3 milhoes de civis e militares. Posteriormente foi de grande utilidade para o êxito militar das tropas norte americanas contra Japão nas Ilhas do Pacifico Sul pois resultou em arma efetiva contra os mosquitos transmissores do Paludismo. 20

Ao terminar a Segunda Guerra Mundial as empresas que receberam os contratos do exercito para a fabricação do DDT (Monsanto, Dupond, Merck e Hercules) exerceram pressão para que rapidamente se autorizasse seu uso civil, dada a sobre produção que haviam alcançado. Assim foi autorizado o uso do DDT na agricultura, inicialmente no algodão, apresentando baixa toxidade aguda porem com severos danos de toxidade crônica a médio e longo prazo. Agora se sabe que as autoridades militares da época receberam informações das evidencias cientificas dos efeitos crônicos do DDT tais como acumulação na gordura do tecido humano e no leite materno, de ocasionar problemas no fígado e rins e de ter impacto negativo sobre a vida silvestre. Muitos dos documentos que discutia sobre os efeitos crônicos do DDT e as recomendações para uma maior avaliação foram classificados como confidenciais e o debate publico não se abriu senão décadas depois com a publicação em 1962 do livro Primavera Silenciosa de Rachel Carson. A produção de DDT, “a bomba atômica dos inseticidas”como se anunciava em


seu tempo, aumento vertiginosamente nos EUA e outros países e sua popularidade cresceu ao utilizar-se contra todo e qualquer tipo de pragas agrícolas, florestais e domesticas. A OMS – Organização Mundial de Saúde recomendou seu uso para o cambate internacional contra o paludismo e em 1948, Paul Mueller recebeu o Premio Nobel de Medicina e Fisiologia pelas contribuições do DDT a saúde publica. A maior parte dos praguicidas organoclorados já foram proibidos no mundo por sua grande persistência no meio ambiente e armazenamento nos tecidos graxos porem em alguns países ainda se comercializam determinados produtos a base de DDT.

Inseticidas Carbamatos O primeiro dos carbamatos se introduziu no mercado desde 1951 porem foi na década de 1960 que este tipo de compostos tiveram seu maior auge, devido as crescientes restrições que enfrentávamos praguicidas organoclorados e organofosforados. Entre os carbamatos que se segue utilizando se encontram: propoxur – introduzido pela Bayer com nome de Baygon em 1959 -, carbofuran, metomilo y bendiocarb, entre outros. Com o surgimento no mercado dos praguicidas organofosforados e carbamatos, se tratou de reduzir os problemas de persistência ambiental que ocasionavam

os organoclorados, porém são em geral de maior toxidade para os humanos e a vida silvestre.

Herbicidas Exemplos de herbicidas modernos se encontra o 2,4 –D, introduzido desde 1944 por ICI e igual ao Paraquat sintetizado por esta mesma empresa em 1958; a atrazina introduzida por Ciba Geizy em 1959, e o flifosato introduzido por Monsanto em 1974; O 2,4 D, misturado com o 2,4,5- T, produzido por Dow Chemical, se usou como desfoliante na guerra de Vietnam entre 1962 e 1972; Este composto ficou conhecido mundialmente como o “Agente Laranja”, pela sua cor e causou uma grande quantidade de malformações e outros efeitos crônicos entre os soldados expostos e a população camponesa vietnamita. O uso de agrotóxicos se converteu na forma dominante para controle de pragas tanto no campo com nas cidades, de maneira que se utilizam contra pragas agrícolas e florestais e as que afetam os grãos armazenados, também contra pragas domesticas no interior das residências, nos jardins, quintais, edifícios, portos, assim como contra os mosquitos e outros insetos vetores que transmitem enfermidades como a Dengue.

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A lixeira do mundo nquanto a Justiça proíbe a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) de fazer a avaliação toxicológica de agrotóxicos comercializados no país, o Brasil importa toneladas de substâncias que foram vetadas pelos próprios países que as produzem. Essas substâncias são usadas para fabricar cerca de cem agrotóxicos utilizados em culturas de frutas, feijão, grãos, batata e café, entre outros. Entre os possíveis efeitos decorrentes da ingestão dessas substâncias, apontados pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e pelas agências da União Européia e dos Estados Unidos, estão problemas no sistema nervoso, câncer e danos ao sistema reprodutivo. Os mais afetados são os trabalhadores da agricultura, que manipulam diretamente os produtos. Há também risco para o consumidor dos produtos agrícolas.

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Segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU), o Brasil é o principal destino dos produtos proibidos no exterior. Um exemplo do fenômeno é o paraquate, substância permitida para as culturas de abacate, abacaxi, algodão, arroz, aspargo, banana, batata, beterraba, cacau, café, cana-de-açúcar, chá, citros, coco, couve, feijão, maçã, milho, pastagens, pêra, pêssego, soja, sorgo, trigo e uva. O Brasil importava 82 toneladas do produto em 2006, ano em que ele foi proibido pela União Européia sob a suspeita de ser carcinogênico. Em 2008, os registros até julho mostram que, hoje, o país compra uma quantidade 311 vezes maior. Entre os países que comercializam o produto estão Reino Unido e Dinamarca -a substância também é proibida no país nórdico.


“O Brasil está virando um grande depósito de porcarias. Os agrotóxicos que as empresas não conseguem vender lá fora, que têm indicativo de problemas, são empurrados para a gente”. – Rosany Bochner, especialista em toxicologia da Fiocruz.

Algumas substâncias proibidas no exterior e permitidos no Brasil. • Cihexatina – alta toxicidade aguda, suspeita de carcinogenicidade para seres humanos, toxicidade reprodutiva e neurotoxicidade; • Acefato – neurotoxicidade, suspeita de carcinogenicidade e de toxicidade reprodutiva e a necessidade de revisar a Ingestão Diária Aceitável; • Glifosato – larga utilização, casos de intoxicação, solicitação de revisão da Ingestão Diária Aceitável (IDA) por parte de empresa registrante, necessidade de controle de impurezas presentes no produto técnico e possíveis efeitos toxicológicos adversos; • Abamectina – toxicidade aguda e suspeita de toxicidade reprodutiva do IA e de seus metabólitos;

• Lactofem – carcinogênico para humanos; • Triclorfom – neurotoxicidade, potencial carcinogênico e toxicidade reprodutiva; • Parationa Metílica – neurotoxicidade, suspeita de disrupção endócrina, mutagenicidade e carcinogenicidade; inclusão na lista de substâncias perigosas da Convenção de Roterdã; • Metamidofós – alta toxicidade aguda e neurotoxicidade; inclusão na lista de substâncias perigosas da Convenção de Roterdã; • Fosmete – neurotoxicidade; • Carbofurano – alta toxicidade aguda; • Forato – alta toxicidade aguda e neurotoxicidade;

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Prejuízos na

saúde

O

s agrotóxicos foram desenvolvidos para dificultar ou exterminar formas de vida; justamente por essa característica, são capazes de afetar a saúde humana. “O desenvolvimento de moléculas cada vez mais poderosas em seus efeitos biocidas não poupa as estruturas biológicas de seres que não são seus alvos”, diz Lia Giraldo, especialista em saúde ambiental, pesquisadora do Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães (CPqAM/Fiocruz). Lia defende a recuperação do conceito de veneno para essas substâncias. “Existe

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um verdadeiro sistema de ocultamento do risco, via permissividade de venda e de uso”. Para ela, o modelo produtivo da agricultura estabeleceu um clima favorável ao uso indiscriminado de agrotóxico. Co-organizador do livro É veneno ou é remédio? (Editora Fiocruz), sobre o tema, Frederico Peres explica que os efeitos dos agrotóxicos podem ser agudos ou crônicos. Os agudos são mais frequentes em trabalhadores rurais, com sintomas que aparecem até 24 horas depois da exposição: espasmo muscular, convulsão, náusea, desmaio, vômito, dificuldade respiratória. Os crônicos decorrem da exposição prolongada a baixas doses das substâncias, inclusive via alimentação, podendo surgir anos após o contato. O inseticida Dicloro-Difenil-Tricloroetano (DDT), por exemplo, foi proibido a partir da década de 1970 em todo o mundo: descobriu-se que interferia na cadeia alimentar animal, contribuía para o desenvolvimento de câncer em seres humanos e se espalhava facilmente pelo ar. Muitas outras substâncias foram e são apontadas por cientistas como cancerígenas, como os fenoxiacéticos (encontrados em herbicidas) e os ditiocarbamatos (que tem ação fungicida). No Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox/Fiocruz) e no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), foram registrados


“Esses dados são apenas a ponta do iceberg, já que representam em sua maioria os casos agudos graves, que também são subnotificados” — Valcler Rangel Fernandes (Fiocruz)

19.235 casos de intoxicação por agrotóxico, em 2007, no território nacional. Para cada notificação, a Organização Mundial da Saúde calcula que ocorram 50 outros casos. Os efeitos crônicos relacionados aos agrotóxicos quase nunca são contabilizados pelos sistemas de informações oficiais.

Trabalhadores vulneráveis Os habitantes de áreas rurais, especialmente os trabalhadores da agricultura familiar, são os mais vulneráveis. As grandes lavouras são altamente mecanizadas, com pulverização feita por tratores ou aviões; nas pequenas, é comum que o próprio agricultor dilua, manipule e aplique o agrotóxico, acompanhado dos filhos ou da mulher. O último Censo Agropecuário, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2006, informa que a agricultura familiar respondia por 84,4% das propriedades rurais do Brasil. Somente 1,8% de todos os produtores brasileiros adotavam a agroecologia — livre de produtos químicos.

Em 70% das que recorriam a agrotóxicos, estes eram aplicados por pulverizador costal, equipamento que mais expõe o trabalhador — trata-se de pequeno tanque que, preso às costas, lança o veneno. Em visitas a lavouras, Frederico observa que são pouco comuns as medidas de proteção — uso de equipamentos de segurança, aplicação da dosagem correta, consumo de produtos autorizados, obediência às regras de armazenagem e descarte de embalagens. Além dos efeitos agudos, os trabalhadores podem apresentar efeitos crônicos, apresentando sintomas anos depois do início do contato. “Mesmo produtos menos tóxicos causam efeitos crônicos”, afirma. Nesses casos, é comum que profissionais de saúde não relacionem o sintoma à exposição ao agrotóxico, o que aponta para a necessidade de treinamento, de acordo com Frederico. As pessoas que moram no entorno das plantações também correm risco. Bruno Dominguez Radis nº 95 – Julho de 2009

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perigo chega à mesa do con sumidor por meio de alimentos com resíduos das substâncias. Desde 2001, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária monitora essa contaminação no Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para). O relatório do Para de 2009 indicou que das 3.130 amostras analisadas, 907 (29%) eram insatisfatórias: em 2,8% havia agrotóxicos em níveis acima do limite máximo de resíduos, 23,8% tinham agrotóxicos não autorizados para a cultura e 2,4% apresentavam as duas irregularidades. Além disso, 3,9% das amostras continham ingredientes ativos banidos do Brasil, ou que nunca foram registrados, e 25,1%, substâncias que se encontram em processo de reavaliação toxicológica. Foram investigados até 234 ingredientes ativos de agrotóxicos

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Os resultados, publicados no site da Anvisa (www.anvisa.gov.br), são preocupantes, considera o gerente-geral de Toxicologia da agência, Luiz Claudio Meirelles. “O alimento com resíduo de agrotóxico não é visível como mofo em pão”, compara, observando que o Para é importante por apontar um risco que o consumidor não enxerga. Apesar de não serem identificáveis pelo consumidor, nem causarem sintomas agudos, vegetais con taminados podem gerar efeitos crônicos — consequência de anos de contato com as substâncias. Lavar os alimentos não é suficiente para livrá-los dos agrotóxicos, explica Frederico Peres. Cozinhar ou descascar esses produtos diminui em até 70% os resíduos, mas não os elimina. Fonte: Radis nº 95 – Julho de 2009


Pesquisa da ANVISA revela Pimentão

64,36%

Resultados insatisfatórios das amostras que apresentaram contaminação por agrotóxicos acima do limite permitidos ou resíduos não autorizados para uma determinada cultura em 2008.

Morango

36,05% Uva

32,67% Cenoura

30,39%

Alface

19,8%

Tomate

18,27%

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Existe uso seguro de agrotóxicos? As estimativas feitas pelas agências internacionais de saúde são extremamente preocupantes, indicando não só problemas de intoxicações agudas determinadas pelo contato direto com produtos altamente tóxicos e de conseqüências imediatas podendo levar o indivíduo à morte, mas também e principalmente problemas crônicos determinados pelo contato tanto direto como indireto a produtos muitas vezes de baixa toxicidade aguda e por tempo prolongado.

No quadro abaixo estão relacionadas as diversas rotas que podem levar estas substâncias ao nosso organismo. Sua análise nos faz perguntar se pode haver “uso seguro” como apregoado pela indústria. E como as consequências dos agrotóxicos para a vida também são graves, extensas, de longo prazo e algumas irreversíveis ou ainda desconhecidas, não seria o caso de priorizar a eliminação total do risco, como propões a Agroecologia?

Rotas de exposição humana aos agrotóxicos Ar Ar Deriiva De v do doss dee leeitte, e, ovos vo os, s, ettcc Cu ulttur uras as

Gado Ga do o, ga g liinh n a, ssu uinos inoss, et in ec

So olo o/ssed edim im mento ento en to

Água Ág uaa super up per erfi fici fi c al ci al

Peix Pe Peix ixes ess

Água Á Ág gua u subbtteerr errân rrân rr ânea nea ea

Água Ág ua ua potá po tááveel

Pessoa Pe Pess sssoaas

Co ont ntat a o di at dire reeto o Fonte: Vermeire et al. (2003); UNEP / IPCS (1999), modificado.

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Saúde que vem da agroecologia Além dos benefícios óbvios da não-utilização de químicos no cultivo para o homem e o ambiente, ressalta-se que estudos têm sugerido que o alimento cultivado de forma ecológica possui maior valor nutricional, sendo, portanto, mais rico em nutrientes essenciais à vida humana. Isto justifica-se pois são cultivados em solo equilibrado e rico em adubos naturais. Já os alimentos produzidos de forma convencional, em solos desequilibrados, desgastados, com adubos químicos e agrotóxicos, tem menor valor nutricional e tem mais elementos prejudiciais a saúde. além de serem “produtos que têm mais vitaminas e mais minerais, outro lado extremamente importante é a saúde de quem produz, porque temos que imaginar o que acontece com os trabalhadores do campo que têm que lidar com agrotóxicos todo dia. O agricultor que trabalha numa propriedade orgânica está livre desse perigo de contaminação”.

Cultivo agroecológico

Cultivo convencional

65% mais Cálcio

88% menos Ferro no Agrião

73% mais Ferro

84% menos Magnésio na Couve

118 % mais Magnésio

50% menos Cálcio na Brócolis

178% mais Molibdênio

50% menos Vitamina C na Beterraba

91% mais Fósforo

45% menos vitamina C no Espinafre

125% mais Potássio

41% menos vitamina C no Milho

60% mais Zinco

40% menos Vitamina C na Couve – Flor

Maior teor de outros minerais

29% menos Vitamina C na Batata Doce

Maior teor de vitaminas

Mais resíduos prejudiciais: Agrotóxicos, Antibióticos, Hormônios, Mercúrio (metal pesado) e Nitratos ( Cancerígeno)

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A herança maldida do agronegócio por Manuela Azenha / Viomundo

R

Raquel Rigotto é professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará. Coordenadora do Núcleo Tramas – Trabalho, Meio Ambiente e Saúde, Raquel contesta o modelo de desenvolvimento agrícola adotado pelo Brasil e prevê que para as populações locais restará a “herança maldita” do agronegócio: doenças e terra degradada. Desde 2008, o Brasil ultrapassou os Estados Unidos para se tornar o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Segundo dados da Organização das Nações Unidas, é também o principal destino de agrotóxicos proibidos em outros países. Na primeira parte da entrevista, Raquel fala sobre o “paradigma do uso seguro” dos agrotóxicos, que a indústria chama de “defensivos” agrícolas. De um lado todo mundo sabe que eles são nocivos. De outro se presume que haja um “modo seguro” de utilizá-los. O aparato legislativo existe. Mas, na prática… Raquel dá um exemplo: o estado do Ceará, que é onde ela atua, não dispõe de um laboratório para fazer exames sobre a presença de agrotóxicos na água consumida pela população. Ela começa dizendo que em 2008 e 2009 o Brasil foi campeão mundial no uso de venenos na agricultura.


Viomundo – O Brasil continua sendo o maior consumidor de agrotóxicos do mundo? Raquel Rigotto - Os dados de 2008 e 2009 apontaram isso, eu não vi ainda os de 2010. Mas nos anos anteriores tivemos esse triste título. V – Por que a senhora acha que o Brasil vai nesse contra-fluxo? Os Estados Unidos e a UE proibindo o uso de agrotóxicos e o Brasil aumentando o consumo? RR - É um fenômeno que tem muito a ver com o contexto da reestruturação produtiva, inclusive da forma como ela se expressa no campo. Nós estamos tendo na América Latina, como um todo, uma série de empreendimentos agrícolas que se fundam na monocultura, no desmatamento, são cultivos extensivos, de área muito grande, então isso praticamente obriga a um uso muito intenso de agrotóxicos. Então tem a ver com a expansão do chamado agronegócio na América Latina, como um todo. V – Existem pesquisas que comprovam os malefícios dos agrotóxicos? RR – Sim, os agrotóxicos antes de serem registrados no Brasil, eles são analisados pelo Ministério da Saúde, da Agricultura e do Meio Ambiente e eles são classificados de acordo com sua toxicidade para a saúde humana e de acordo com o seu impacto para o meio ambiente. Então desde o começo, quando eles são registrados, a gente já sabe que eles são produtos nocivos. Isso já vem descrito nas monografias que as próprias indústrias fabricantes apresentam para os ór-

gãos dos governos. Aqueles que são classificados como grupo 1, por exemplo, do ponto de vista da toxicidade para a saúde humana, são aqueles que são extremamente tóxicos, depois vêm os altamente tóxicos e os moderadamente tóxicos ou os pouco tóxicos. Já sabemos desde o início que são substâncias nocivas à vida e têm impacto não só sobre as pragas mas sobre as pessoas e os ecossistemas. Agora, para além disso nós temos uma larga gama de estudos mostrando os impactos ambientais dos agrotóxicos, as contaminações de água, de ar, de solo, de redução da biodiversidade, de contaminação de alimentos, e também do ponto de vista da saúde humana, que vai desde a intoxicação aguda até os chamados efeitos crônicos. V – Se a nocividade desses produtos é algo comprovado, por que eles não são banidos? RR - Na verdade, o que se construiu foi o que a gente chama de paradigma do uso seguro. Quer dizer, se reconhece que há uma nocividade mas também se propõe estabelecer condições para o uso seguro. Aí você tem limitações desde os tipos de cultivos em que cada produto pode ser usado, o limite máximo de tolerância dele no ambiente de trabalho, até mesmo na água de consumo humano, o tipo de equipamento de proteção que deve ser fornecido aos trabalhadores e também a informação que eles devem ter. Você tem um amplo aparato legislativo que criaria condições para um suposto uso seguro desses produtos. Mas a partir das experiências nossas aqui de cultivo na fruticultura irrigada para exportação no Ceará, a gente vem questionando muito se existe esse uso

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seguro. Por exemplo, o governo estadual, que tem o órgão estadual de meio ambiente, que deteria a atribuição de acordo com a legislação federal de monitorar os impactos ambientais dos agrotóxicos, não dispõe de um laboratório que seja capaz de identificar a contaminação da água por agrotóxicos. Na pesquisa, enviamos as amostras para Minas Gerais porque no Ceará não tem órgãos públicos que o façam. E nem mesmo no setor privado tem instituições de segurança. E existem uma série de outras evidências de que essas condições do uso seguro não estão vigendo. V – Hoje o mundo precisa dos agrotóxicos? RR – Vivemos um discurso de que os agrotóxicos redimiriam o mundo da fome. Isso nós experimentamos historicamente e própria ONU e a FAO reconhecem que houve o aumento da produção daquilo que chamamos hoje de commodities, como a soja, o açúcar, a cana, mas isso não implicou segurança alimentar e redução dos padrões de desnutrição e subnutrição entre os mais pobres. Ampliou-se a produção dessas commodities mas sequer a gente pode chamá-las de alimentos porque o problema da fome persiste. Quem produz alimentos, quem produz comida realmente no Brasil, é a agricultura familiar. No ano de 2008, mais de 50% dos agrotóxicos consumidos no Brasil foi nas plantações de soja. Essa soja é em grande parte exportada para ser transformada em ração animal e subsidiar o consumo europeu e norte-americano de carne. Então isso não significa alimentação para o nosso povo, significa concentração de terra, redução de

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biodiversidade, contaminação de água, solo e ar e contaminação dos trabalhadores e das famílias que vivem no entorno desses empreendimentos. Além das enormes perdas para os ecossistemas, o cerrado, a caatinga e até mesmo o amazônico, que está sendo invadido pela expansão da fronteira agrícola. Então é claro que deixar de usar agrotóxico não é algo que se possa fazer de um dia para o outro, de acordo com o que os agrônomos têm discutido, mas por outro lado nós temos muitas experiências extremamente positivas de agroecologia, que é a produção de alimentos utilizando conhecimentos tradicionais das comunidades e saberes científicos sensíveis da perspectiva da justiça sócio-ambiental. Esses sim, produzem qualidade de vida, bem viver, soberania e segurança alimentar, e conservação e preservação das condições ambientais e culturais. V - Como a senhora avalia a política do governo Lula em relação aos agrotóxicos? RR – O governo Lula teve um papel muito importante na expansão do agronegócio no Brasil. Para dar dados bem sintéticos, o financiamento que o governo disponibilizou para o agronegócio anualmente foi em torno de 100 bilhões de reais e para a agricultura familiar foi em torno de 16 bilhões de reais. Então há um desnível muito grande. O governo Lula foi omisso em relação às legislações vigentes no Brasil desde 1997, que concedem uma isenção de 60% do ICMS para os agrotóxicos. Ou seja, existe um estímulo fiscal à comercialização, produção e uso dos agrotóxicos no país. Isso, evidentemente, atrai no espaço mundial investi-


mentos para o nosso país, investimentos que trabalham com a contaminação. Também poderíamos falar das políticas públicas, continuamos com o Sistema Único de Saúde, que apesar de ser da maior importância enquanto sistema de universalidade, equidade, participação e integração, ainda é um sistema completamente inadequado para atender a população do campo. Ainda é um sistema cego para as intoxicações agudas e os efeitos crônicos dos agrotóxicos. E com raríssimas exceções nesse enorme país, é um sistema que ainda não consegue identificar, notificar, previnir e tratar a população adequadamente. Existe uma série de hiatos para a ação pública que precisam ser garantidos para que se possa respeitar a Constituição Federal no que ela diz respeito ao meio ambiente e à saúde. V – Alguns agrotóxicos tem sido revistos pela ANVISA. Como esse processo tem corrido? RR – A ANVISA pautou desde 2006, se não me engano, a reavaliação de 14 agrotóxicos. Segundo estudos inclusive dos próprios produtores, as condições relatadas no momento do registro tinham se alterado e, portanto, pensaram em reavaliar as substâncias. Esse processo vem correndo de forma bastante atropelada porque o sindicato da indústria que fabrica o que eles chamam de “defensivos agrícolas”, utiliza não só de suas articulações com o poder político no Senado Federal, com a bancada ruralista, mas também de influências sobre o Judiciário, e gerou uma série de processos judiciais contra a ANVISA, que é o órgão do Ministério da Saúde

responsável legalmente por essas atribuições. Mas alguns processos já foram concluídos. V – A senhora acha que essa reavaliação pode ser vista como um avanço na política nacional? RR – A ANVISA é um órgão que tem lutado com competência para cumprir aquilo que a legislação exige que ela faça mas às vezes ela tem encontrado falto de apoio dentro dos próprios órgãos públicos federais. Muitas vezes o próprio Ministério da Agricultura não se mostra comprometido com a preservação da saúde e do meio ambiente como deveria, a Casa Civil muitas vezes interfere diretamente nesses processos, o Ministério da Saúde muitas vezes não tem compreensão da importância desse trabalho de reavaliação dos agrotóxicos. A ANVISA é uma das dimensões da política pública, no que toca às substâncias químicas, que vem tentando se desenvolver de maneira adequada, mas com muitos obstáculos. No contexto mais geral, a gente ainda enxerga poucos avanços. V – As perspectivas daqui pra frente, no governo Dilma, não trazem muita esperança, então… RR – Acho que vamos ter a tarefa histórica, enquanto pesquisadores, movimentos sociais e profissionais da saúde, de expôr ao governo Dilma as gravíssimas implicações desse modelo de desenvolvimento agrícola para a saúde da população como um todo. Porque não são só os agricultores ou os empregados do agronegócio, os atingidos por esse processo. Aqui no nosso caso [do Ceará],

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por exemplo, o rio que banha essas empresas V – Por que o Brasil com tamanha e empreendimentos, que é o rio Jaguaribe, é biodiversidade, terra fértil e água necessita o mesmo cuja água é trazida para Fortaleza, de tanto agrotóxico? para abastecer uma região metropolitana RR – Porque a monocultura, que é a escode mais de 5 milhões de pessoas. Essa água lha do modelo do agronegócio, ao destruir pode estar contaminada com agrotóxicos e a biodiversidade e plantar enormes extenisso não vem sendo acompanhado pelo SUS. sões com um único cultivo, cria condições Nós temos toda a questão das implicações favoráveis ao que eles chamam de pragas, da ingestão de alimentos contaminados por que na verdade são manifestações normais agrotóxicos na saúde da população. Em que de um ecossistema reagindo a uma agressão. medida esse acento dos cânceres, por exemQuando surgem essas plo, na nossa população, pragas, começa o uso de como causa de morbida- Em que medida esse acento agrotóxico e aí vem todo de e de mortalidade cada dos cânceres, por exemplo, o interessa da indústria vez maior no Brasil, não na nossa população, como química, que tem fatutem a ver com a ingestão rado bilhões e bilhões diária de pequenas doses causa de morbidade e de de dólares anualmente de diversos princípios mortalidade cada vez maior no nosso país vendendo ativos de agrotóxicos, esse tipo de substância e que alteram o funciona- no Brasil, não tem a ver com alimentando essa cultura mento do nosso corpo e a ingestão diária de pequenas de que a solução é usar facilitam a ocorrência de mais e mais veneno. processos como esse, já doses de diversos princípios Nós temos visto na área comprovado em diverativos de agrotóxicos? da nossa pesquisa, no sos estudos. Então é precultivo do abacaxi, eram ciso que o governo esteja atento. utilizados mais de 18 princípios ativos difeNós temos uma responsabilidade de preserrentes de agrotóxicos para o combate de cinvar essa riqueza ambiental que o nosso país co pragas. Depois de alguns anos, a própria tem e isso é um diferencial nosso no plano empresa desistiu de produzir abacaxi porinternacional hoje. Não podemos deixar que que, ainda que com o uso dos venenos, ela nossa biodiversidade, solos férteis, florestas, não conseguiu controlar as pragas. Então é clima, luz solar, sejam cobiçados por empreum modelo que, em si mesmo, é insustensas que não têm critério de respeito à saútável, é autofágico. As empresas vêm, degrade humana e ao meio ambiente quando se dam o solo e a saúde humana e vão embora instalam naquilo que elas entendem como impunemente. Fica para as populações lopaíses de terceiro mundo ou países subdecais aquilo que alguns autores têm chamado senvolvidos. de herança maldita, que é a doença, a terra degradada, infértil e improdutiva.

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Denúncia e mobilização O

modelo agrícola brasileiro revela uma grande contradição. Enquanto bate recordes seguidos de produtividade, contribuindo com cerca de 30% das exportações brasileiras, 40% da população brasileira sofre com a insegurança alimentar, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O Brasil, um dos países mais desiguais e com uma das maiores concentração de terras do mundo, ganhou o posto de maior consumidor de agrotóxicos do planeta. Lugar conquistado pelo segundo ano consecutivo, superando os Estados Unidos, segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgados recentemente. Curiosamente, o avanço da tecnologia nes-

ses últimos dez anos não reduziu o consumo de agrotóxicos no Brasil. Pelo contrário, a moderna tecnologia dos transgênicos, por exemplo, estimulou o consumo do produto, especialmente na soja, que teve uma variação negativa em sua área plantada (- 2,55%) e, contraditoriamente, uma variação positiva de 31,27% no consumo de agrotóxicos, entre os anos de 2004 a 2008. Para os mais céticos é preciso afirmar que o comportamento nas demais culturas produzidas no Brasil também acompanhou a curva ascendente. Assim, levantamentos do IBGE e do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindag), ambos de 2009, apresentam o crescimento de 4,59% da área cultivada no período entre

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2004 e 2008. Por outro lado, as quantidades vendidas de agrotóxicos, no mesmo período, subiram aproximadamente 44,6%. Isso equivale dizer que se vendeu agrotóxicos num ritmo quase 10 vezes superior ao crescimento da área plantada no Brasil naquele período. E os números não levam em conta a enorme quantidade de agrotóxico contrabandeado para o país. Se o consumo de agrotóxicos seguir esse ritmo, os brasileiros estarão cada vez mais expostos aos seus males no ambiente, no trabalho dos agricultores e na dieta. A contaminação de alimentos na mesa do brasileiro é uma realidade, segundo dados do Programa de Análise de Resíduo de Agrotóxico em Alimentos (PARA), da Anvisa. Destaca-se, para os 26 estados brasileiros, os níveis de contágio nas culturas de pimentão (80%), uva (56,4%), pepino (54,8%) e morango (50,8%), acompanhados ainda da couve (44,2%), abacaxi (44,1%), mamão (38,8%) e alface (38,4%), além outras 12 culturas analisadas e registradas com resíduos de agrotóxicos. O fato é ainda mais preocupante, pois das 819 amostras que apresentaram ingredientes ativos (IAs) não autorizados, 206 amostras (25,1%) apresentaram resíduos que se encontram em processo de reavaliação toxicológica no Brasil. Desse universo, 32 amostras contém ingredientes ativos banidos ou nunca sequer registrados no Brasil, como o heptacloro, clortiofós, dieldrina, mirex, parationa-etílica, monocrotofós e azinfós-metílico. Com 70 milhões de brasileiros em estado de insegurança alimentar, segundo o

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IBGE, e com o consumo de apenas 1/3 de frutas, verduras e legumes necessárias a uma alimentação saudável, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a solução para o país passa pela reforma agrária e pela conversão do modelo agroquímico e mercantil para um modelo de base agroecológica, com controle social e participação popular. O Estado Brasileiro e suas políticas públicas ainda são vacilantes em relação ao o inciso V do artigo 225º da Constituição Federal. O item transcorre sobre o “controle da produção, a comercialização e o emprego de substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”, como é o caso do uso de agrotóxicos. As medidas paliativas, como lavagem das hortaliças ou frutas, estão longe de amenizar as verdadeiras causas desse grave quadro de contaminação. Inclusive muitos desses produtos possuem atuação sistêmica, estando em todas as partes da planta. Com a contaminação ambiental e alimentar, promovida essencialmente pelo uso de agrotóxicos no Brasil, é dever do Estado operar urgentemente políticas públicas efetivas para se fazer cumprir o direito coletivo com uma agricultura responsável e comprometida com o seu povo. E não apenas com os objetivos do lucro fácil e irresponsável em termos socioambientais. Fernando Ferreira Carneiro é porfessor do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da UnB. Vicente Eduardo Soares e Almeida é pesquisador da Embrapa Hortaliças



O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Segundo dados do Sindicato Nacional para Produtos de Defesa Agrícola (Sindage), em 2008 o nosso país ultrapassou a marca dos 700 milhões de litros de agrotóxicos legalmente comercializados. Em 2009, esse número subiu para 1 bilhão. O uso dos agrotóxicos no Brasil é tão intenso que, fazendo uma distribuição da quantidade de veneno utilizado no ano de 2009 por habitante no país, chegamos a cifra de que cada um de nós consumiu uma média de 5,2 litros de agrotóxicos ao longo do ano.

PROJETO CESE - CICLOS Assessoria e Capacitação jurídica aos direitos humanos e ambientais dos trabalhadores rurais de áreas de reforma agrária do Distrito Federal e Entorno afetados por grandes projetos de Irrigação e Monoculturas.


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