Saúde do Campo - Por uma saúde que se planta

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saúde do campo por uma saúde que se planta

Brasil é o país que mais usa agrotóxicos Saneamento ecológico, produção e habitação saudáveis

Agroecologia: a emancipação é quando se luta antes do tempo



Foto: Bianca Ruckert

A Emancipação é quando se luta antes do tempo Eduardo Stotz

Mudanças climáticas, saúde e desenvolvimento Paulo Roberto de Abreu Bruno e Mario D. Lorenzo Perón

Brasil é o país que mais usa agrotóxicos no mundo Fernando Ferreira Carneiro e Vicente Eduardo Soares e Almeida

A contribuição do MST para a Saúde do Campo André Rocha

Brincando e construindo uma nova história Mercedes Zuliani

Educação Profissional na perspectiva da Educação do Campo Roseli Caldart

Saneamento ecológico, produção e habitação saudáveis Alexandre Pessoa

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ITAC Instituto Técnico de Estudos Agrários e Cooperativismo Convenio 1772/2008 - Ministério da Saúde/FNS/ITAC

Revista Saúde do Campo: por uma saúde que se planta. Ano I - Número 1 - Novembro de 2010

Expediente Coordenação: Gislei Siqueira Organização: André Rocha Revisão: Mayrá Lima Colaboradores: Eduardo Stotz, Paulo Roberto de Abreu Bruno, Mario D. Lorenzo Perón, Fernando Ferreira Carneiro, Vicente Eduardo Soares e Almeida, Mercedes Zuliani, Roseli Caldart, Alexandre Pessoa. Projeto gráfico e diagramação: Bernardo Vaz Tiragem: 2.610 exemplares Impresso no Brasil


Esse protagonismo dos movimentos é imprescindível para a construção de um sistema de saúde de qualidade e um país com justiça social.

As Políticas de Saúde no Brasil e as Populações do Campo e da Floresta

Historicamente no Brasil, as políticas públicas nunca levaram em consideração a

realidade específica da vida das populações rurais. Com o Sistema Único de Saúde (SUS), houve um avanço, pois pelo menos tiveram o direito à saúde, garantido na constituição como um dever do Estado. O sistema de saúde, porém, foi e está sendo organizado do mesmo modo que na área urbana. Em 2006, articulou-se o Grupo da Terra - um fórum que reúne o Ministério da Saúde e outros ministérios e instituições do governo federal, pesquisadores, organizações não-governamentais e movimentos sociais. Este grupo foi o responsável pela construção da Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo e Floresta (PNSIPCF). É evidente que a PNSIPCF é um avanço e está na contramão dos históricos erros cometidos frente às populações rurais. Por esse motivo, talvez, sua aprovação ainda se arraste nas instâncias de pactuação do SUS. Esta política nasceu das experiências práticas e concretas dos movimentos sociais que tem seu campo de atuação relacionado à questão agrária, que trazem presente - e de modo muito forte - a questão da saúde ambiental e da defesa e luta pelo SUS. Esse protagonismo dos movimentos é imprescindível para a construção de um sistema de saúde de qualidade e um país com justiça social. Em junho de 2010, ocorreu em Fortaleza-CE o Seminário de Saúde do Campo: por uma saúde que se planta. A atividade contou com a participação de camponeses e camponesas, profissionais de saúde e educadores (as) populares. Discutiuse a influência da questão agrária e da saúde ambiental nas condições de vida das populações do campo e como SUS e a política podem interferir para melhorar a realidade do campo brasileiro. Esta revista socializa alguns textos que trazem presente a discussão desses temas. Boa leitura e bom estudo a todas e todos, Equipe Itac

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A frase, dita por Dona Maria, fruto de uma

reflexão que certamente não começou naquele momento, mas teve a oportunidade de se expressar no seminário sobre saúde do MST–Pará, realizado em julho de 2008, no Assentamento “Mártires de Abril”, em Mosqueiro, resume de modo admiravelmente simples o sentido geral da luta pela reforma agrária nesta sociedade, pensando na sua superação. Lutar antes do tempo significa assumir com amplitude e vigor a estratégia do MST: ocupar, resistir, produzir. Sem dúvida, o momento da produção nesta estratégia ainda é um esforço incipiente na trajetória do MST - que agora completou 25 anos. Uma ilustração desta incipiência

A emancipação é Eduardo Navarro Stotz Cientista Social, professor do Departamento de Endemias da Escola Nacional de Saúde Pública ENSP / FIOCRUZ

é a própria experiência do Lote Agroecológico de Produção Orgânica – (LAPO), situado no Assentamento “Mártires de Abril”. Ao perguntar a Mamede, trabalhador rural e criador desta experiência, o que ele tinha aprendido nesses últimos anos - ouvi dele depois de pensar um pouco enquanto caminhávamos de volta ao assentamento, a resposta: “depende se foi nos últimos 10 ou nos últimos três anos”. A continuação o diálogo foi a seguinte: Eduardo: qual foi a dos últimos 10? Mamede: foi a experiência do MST. Eduardo: e a dos últimos três? Mamede: foi a agroecologia! Deu para sentir a alegria dele ao me


Foto: Arquivo Romaria da Terra e das Águas

quando se luta antes do tempo “apresentar” o sítio. E a felicidade de me dar esta resposta. Trata-se, contudo, de um aprendizado ainda solitário, apesar da divulgação dentro e fora do Assentamento. Talvez o aspecto mais importante da experiência da agroecologia seja referente ao método. Para os pesquisadores Paulo Petersen e Luciano Silveira, a natureza do conhecimento agroecológico é caracterizada pela complexidade do agro-ecossistema de difícil sistematização científica. Quer dizer, se a unidade de estudo da Agroecologia é o agroecossistema, o nível local é a principal referência; este, por sua vez, depende do manejo agro-ecológico, pois o conhecimento é influenciado pelas peculiaridades locais, descobertas por quem observa e experimenta, ou seja, o agricultor.

Daí, concluem: (...) as generalizações de conhecimentos sobre manejo só devem ser realizadas criteriosamente sob pena de se gerar um quadro de desarmonia técnica, ambiental e sócio-cultural. (p. 123)

Agroecologia é uma ciência que somente pode desenvolver-se em estreita colaboração com os agricultores. Um exemplo: Mamede tinha observado que o solo no Pará era pobre, em contraste com o do Nordeste, onde apesar da escassez de água, o solo é rico. Ele observou e experimentou o solo como terra de plantio e criação por onde passou em sua vida de lavrador, algo que aparece também na avaliação científica, mas de outra forma, como veremos adiante.

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Amazônica. Nas condições atuais, na grande Do ponto de vista político, um dos granmaioria de suas microrregiões, a tecnologia des desafios do MST e dos demais movimendo fogo-machado-foice é imbatível, quanto tos e organizações da Via Campesina consiste a custo de produção. Essa técnica continuano reconhecimento do saber dos camponeses rá a ser empregada até que se ofereça uma sobre a produção agropecuária como uma das tecnologia alternativa, a exemplo do que bases da formulação da política pública. Isso já ocorre no Sul, no Sudeste e no Centroporque se deparam com o saber competenOeste. E qual tecnologia poderia substituir te dos técnicos governamentais, formados o emprego do segmento machado-foicenum processo de longo afastamento da prá-fogo? A de máquinas, equipamentos, fertica que, quando organizada, faz-se mediante tilizantes, defensivos e sementes melhoradas. Com ela, se recuperam as áreas experimentos científicos nos quais se isolam empobrecidas e se reduz substancialmente variáveis e se dispõem de recursos completaa exploração de novas áreas. Essa tem sido a mente fora da consciência e das possibilidahistória da agricultura moderna, que econodes dos camponeses. miza terra e trabalho. Por que, então, ela não Experiências como a do LAPO, na medida é adotada na Região Amazônica? em que forem sistematizadas, Porque, naquela região, os prepoderão se contrapor à visão Agroecologia é uma ços dos insumos modernos são dominante na Embrapa que ciência que somente muito elevados. E, se não for rehoje representa o ponto de vismovido este obstáculo – o dos pode desenvolvercustos elevados –, a agricultura ta científico praticamente initinerante continuará reinando, questionável no meio técnico se em estreita sem competição. (p. 3-4) governamental e, portanto, na

colaboração com os

formulação da política econôA mesma linha é seguiagricultores mica. Mas há pessoas abertas da por Alfredo Kingo Oyama que se integram na vertente Homma, pesquisador da agroecológica dessa e de outras instâncias Embrapa Amazônia Oriental, no capítulo detécnicas de assessoria aos formuladores da dicado à Amazônia também referido à “mopolítica agrícola no país. dernização da agricultura itinerante”. Neste sentido, é importante entender de Traduzindo em miúdos, “modernização” que modo a “agricultura familiar” é apresensignifica o abandono do sistema agrícola traditada nesse meio. Comecemos pela posição cional, baseado na derrubada e queima da flooficial da Embrapa, expressa por Eliseu Alves, resta para ampliação constante de novas árepesquisador e assessor do diretor-presidenas, em favor de outro sistema, dito moderno te da Embrapa e editor da Revista Política ou convencional, com aração e gradação, conAgrícola. Na sua Carta Agrícola sobre a agriservação do solo (correção da acidez do solo, cultura na Amazônia, escreve: reposição de nutrientes por meio de adubação Quando a terra é muito fértil, as culturas da agricultura itinerante podem permanecer por um período muito longo. Em terras pouco férteis, porém, como é o caso da Amazônia – onde, contudo, há exceções importantes –, logo a terra é esgotada. Esse tem sido o padrão da agricultura da Região

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Agroecologia e Saúde

química), etc. É interessante observar que, às vezes, são incluídos elementos de outros sistemas, como a rotação de cultivos (agricultura tradicional) e o plantio direto (agricultura orgânica) de modo a tornar o sistema mais acessível, do ponto de vista econômico, aos agricultores, como no caso do chamado Sistema


Foto: Mercedes Zuliani

Bragantino, no Nordeste do Pará, considerado modelo pela Embrapa Amazônia Oriental. Para Homma, tal substituição de sistema agrícola permitirá a fixação do agricultor na mesma terra e, assim, preservará a floresta, uma vez que o agricultor familiar típico da Amazônia derruba 2 hectares de floresta densa a cada 2 a 3 anos de cultivo. Sabemos que a escolha de sistema decorre de razões econômicas, pois, como observa o mesmo autor, o custo de recuperação de áreas degradadas com a tecnologia da Embrapa estava, em 2006, na faixa de 800 reais por hectare, enquanto o uso dos métodos tradicionais custava apenas 300 reais por hectare. É interessante que, no tema “Agroecologia”, o Estado do Pará apareça como o maior produtor nacional de mandioca, com uma área plantada de 273.614 hectares em 2002. Respondia, então, por 70% da produção da Região Norte. A produtividade média

de 13,5 t/ha de raízes foi considerada muito abaixo do potencial da planta, estimado em 90 t/ha. O sistema agrícola proposto pela vertente agroecológica da Embrapa é assim referido na obra citada: Entre essas tecnologias, destacam-se a produção e a aplicação da matéria orgânica no próprio local de cultivo via plantio direto de mandioca sobre a palhada de leguminosas arbóreas, bem como a formação de áreas de repouso com as leguminosas por apenas 1 ano para a rotação com a mandioca, com a finalidade de paralisar o ciclo de preparo da terra mediante derruba a e queima de florestas ou capoeiras. Até o momento, as leguminosas recomendadas e utilizadas são o guandu, a acácia mangium e o ingá, com resultados ainda não publicados, elevando em média, a produtividade da mandioca para 20,0; 40,0 e 60 t/ha respectivamente, sem uso de calagem e de fertilizantes químicos. Esses resultados possibilitam maior oferta

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desenvolvimento social. Pode ser organizada em lotes particulares, até com alguma exploração de força de trabalho numa produção voltada para o mercado e com vistas ao lucro do proprietário. Os camponeses aprendem, embora de Pode, alternativamente, ser organizada modo diferente dos pesquisadores científicoem moldes coletivos, não apenas do ponto de -técnicos. Enquanto estes últimos foram eduvista da produção, mas do conjunto da ativicados teoricamente por uma ciência analítica dade econômica, isto é, da unidade entre proe reducionista que usa a lógica formal para dução, distribuição e consumo, para projetar comprovar seus argumentos, os camponeses uma nova sociabilidade no nível local. Penso raciocinam com referentes concretos, isto é, aqui na destinação do excedente produzido com os aspectos particulares do mundo manum lote de produção-escola agrícola. Com nifestos por e na sua prática social. Graças a o aumento da produtividade agrícola é possíesse aparentemente “pensamento concreto” vel pensar na satisfação de necessidades dos – uma formulação que, aliás, mal disfarça o produtores tanto do ponto preconceito sócio-cultural contra o campesinato - a As vivências somente podem se de vista individual como coletivo. Há necessidades Agroecologia tem se detransformar em experiências que somente podem ser senvolvido cada vez mais nos últimos 20 anos. significativas para os movimentos atendidas socialmente, a exemplo da educação e Se esse conhecimento populares do campo se forem da cultura. Pressenti essa precisa, como assinalamos estruturadas em redes sociais, possibilidade como um atrás - ser sistematizado dentro de seus próprios li- capazes de promover encontros destino das pequenas cidades quando me dedicava mites - deve ser também para sistematizá-las no plano à pesquisa em Sumidouro compartilhado com os de(RJ), um município com mais agricultores interessateórico e político. predomínio de economia dos em aprender a produzir camponesa. Essas pequenas cidades podem, de modo sustentável e socialmente solidário. na época atual, apoiar-se no imenso desenPenso no problema da falta de pessoas para a volvimento científico-tecnológico existente lida no seu sítio agro-ecológico de produção para criar oportunidades próprias de cultura orgânica, já apontado por Mamede. Ele podee “lazer”, ao invés de consumir a porcaria dos ria suprir esta necessidade se contasse com enlatados da cultura de massa ou aturar sua aprendizes que, com o tempo da experiência, transformação em paraísos de eco-turismo. poderiam ensinar, uma vez que, sabemos com Ao se buscar essa alternativa, vivenciamPaulo Freire, ninguém sabe tudo. -se novas relações sociais, ainda que de modo Falar em sistema agrícola baseado na parcial e temporal, como sementes de ouagroecologia significa dizer que segue os tra sociedade que somente germinará numa pressupostos da Agroecologia, a começar da nova primavera dos povos. A Via Campesina identificação de qual seja, nas áreas de assenjá dispõe de muitas experiências situadas tamento, o tipo de agroecossistema no qual nessa perspectiva, a exemplo da COPAVI, se trabalha, vive e deseja expandir. Mas a cido Assentamento Carlos Marighela, do ência admite mais de uma possibilidade de de mandioca e de seus produtos no mercado, com maior geração de renda e melhoria de qualidade de vida para os pequenos agricultores familiares. (p.93)

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Agroecologia e Saúde


Assentamento Cristo Rei, da Associação dos pequenos Agricultores Rurais Organizados em Cooperação Mútua (Aparcom) e em outras experiências analisadas por Anderson Martins da Silva e outros/as companheiros/as do Grupo de Pesquisa Cooperação Ressignificando Relações Sociais. As vivências somente podem se transformar em experiências significativas para os movimentos populares do campo se forem estruturadas em redes sociais, capazes de promover encontros para sistematizá-las no plano teórico e político. Aí há algo a se aprender com a Articulação do Semi-Árido (ASA). Certamente não devemos ter ilusão de que sejam formas de emancipação social dos trabalhadores. Para se contrapor à lógica capitalista, essas experiências em articulação têm de se tornarem um contra-poder. Temos consciência de que essa possibilidade não é discernível ainda. Nem por isso vamos cair no fatalismo. Se a emancipação social é um horizonte, devemos perseguí-lo não como uma ilusão, mas como alusão às nossas necessidades e impulso de nossas expectativas. Somente nos libertaremos na luta contra a opressão. Foi o que nos disse a companheira Maria, do Assentamento Mártir de Abril, na frase-síntese do seminário sobre saúde dos trabalhadores rurais: A emancipação é quando se luta antes do tempo.

Obras citadas: ALVES, Eliseu. Agricultura itinerante ou moderna na Região Amazônica? Revista de Política Agrícola, Ano XVII – Nº 2 – Abr./Maio/ Jun. 2008. HOMMA, Alfredo Kingo Oyama. Agricultura familiar na Amazônia: a modernizzação da agricultura itinerante. In: Ivan Sérgio Freire de Sousa (org.) Agricultura familiar na dinâmica da agropecuária. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica, 2006. PETERSEN, Paulo e SILVEIRA, Luciano. Construção do conhecimento agro-ecológico: reflexões a partir da experiência da AS-PTA no Agreste da Paraíba. In: SILVEIRA, L, PETERSEN, P e SABOURIN, E (orgs.) Agricultura familiar e agroecologia no semi-árido: avanços a partir do Agreste da Paraíba. Rio de Janeiro: AS-PTA, 2002. SILVA, Anderson Martins da. Cooperação: vivenciando novas relações sociais no campo. In: PALUDO, Conceição e THIES, Vanderlei Franck (orgs.) Desenvolvimento do campo em construção. Ijuí: Editora Unijuí; Ronda Alta: Fundep, 2008.

Rio de Janeiro, em 06 de fevereiro de 2009.

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Foto: Arquivo Cáritas Internacional

Este artigo discute algumas interfaces entre desenvolvimento econômico, mudanças climáticas e processos de saúde-doença, inserindo-as no contexto dos debates mais recentes promovidos por diferentes movimentos sociais. Observa-se que tais interfaces são profundamente marcadas pelo desenvolvimento do capitalismo global, principalmente, a partir da superação da Guerra Fria, e correspondem a uma profunda crise ambiental.

Mudanças cli Paulo Roberto de Abreu Bruno Departamento de Saneamento e Saúde Ambiental Escola Nacional de Saúde Pública Fiocruz, Ministério da Saúde, Brasil

Mario D. Lorenzo Perón Dirección de Planeamiento Secretaría de la Gestión Pública Buenos Aires, Argentina


imáticas, saúde e desenvolvimento Tópicos para um debate necessário e urgente Os seres humanos, ao longo de sua existên-

cia, desenvolveram capacidades que os distinguiram extraordinariamente dos demais organismos vivos. Capazes de analisar grande parte desses organismos, descrevem-os e, inclusive, interferem nos seus destinos. Entretanto, integram com eles um conjunto de elementos que denominam como biosfera ou biota. Nessa condição, relacionam-se com os outros componentes do planeta não considerados organismos vivos. Sendo assim, fazem parte

de um grande sistema que envolve, além dos organismos vivos, a atmosfera, a hidrosfera e a terra, ou seja, a abiota. Portanto, neste sistema em que estamos envolvidos, todos os componentes interagem e intervêm, uns sobre os outros. Nele coexistem condições físicas com uma variedade imensa de organismos. Nessas condições, biota e abiota compõem uma unidade que os ecólogos chamam de ecossistema. Na abordagem científica, uma totalidade é compartimentada para que possa ser analisada e descrita. Por conseguinte, são analisadas

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as relações entre as partes identificadas e, desse modo, constrói-se a idéia de sistema. Essa idéia de sistema pode ser observada noutras dimensões, como no ciclo hidrológico onde – a partir da evaporação dos oceanos, rios, lagos e da transpiração dos vegetais – ocorre a condensação que possibilita a precipitação, formadora de correntes superficiais e de águas subterrâneas. Tal exemplo proporciona o entendimento sobre diversos processos que se desenvolvem (em) e envolvem tantos outros sistemas. Porém, a abordagem que lhe orienta não se trata da única existente. Há, além de outras tantas, aquela que se mantém vigorosa entre diversos povos indígenas do mundo, com ênfase entre os andinos, na qual a Terra é compreendida como um organismo vivo e uno. Os gravíssimos problemas que afetam o ecossistema – ou, la Pachamama – fazem com que o diálogo entre os conhecimentos científicos e aqueles que remetem à ancestralidade de vários povos indígenas (ainda existentes) se intensifiquem na busca de, senão solucioná-los, ao menos reduzir os seus impactos. Evento exemplar desse diálogo, a Conferencia Mundial sobre Cambio Climático y la Madre Tierra, ocorrida em abril deste ano em Cochabamba (Bolívia), traduziu-se no histórico Acuerdo de los Pueblos. No presente artigo são problematizados alguns aspectos relacionados às mudanças climáticas e ao desenvolvimento de determinados processos de saúde-doença. O que coloca em pauta outras dimensões desses processos, como aquelas que os determinam a partir das condições econômicas e sociais. Dessa forma, o modo de produção capitalista é analisado a partir de algumas das suas interfaces com os diferentes componentes do ecossistema. Ademais, são considerados alguns pontos tratados na Conferencia Mundial sobre Cambio 12 Ecossistemas e mudanças climáticas

Climático y la Madre Tierra, que dizem respeito ao necessário diálogo entre conhecimentos científicos e ancestrais em busca de caminhos alternativos àqueles que promovem a acelerada destruição do planeta.

Ecossistema e mudanças climáticas. Ou ¿Por qué llora la Madre Tierra? A idéia de totalidade que envolve homem, natureza e a terra, presente em diferentes concepções indígenas, principalmente nas de origem andina, utilizada para referir-se a algo que a ciência denomina como ecossistema é fundamental para a compreensão do significado das chamadas “mudanças climáticas”. Nela, quaisquer possibilidades de (ou a) ocorrência de estados de desequilíbrio apresentam-se como trágicas. Assim, no ciclo hidrológico, por exemplo, uma evaporação mais intensa provocada pelo aumento da temperatura poderia resultar em desastres com significativos danos ambientais, sociais e econômicos. Há nessa situação algo além da ruptura de um ciclo natural – questão que será discutida adiante – porém, antes, é preciso aprofundar o entendimento sobre os processos que dão origem às “mudanças climáticas”. A expressão “mudanças climáticas” diz respeito às transformações identificáveis no estado do clima, posteriores à alteração no valor médio ou na variabilidade das suas propriedades que permanece por um período duradouro, correspondente a decênios ou a períodos mais longos. Refere-se a todas as mudanças do clima ao longo do tempo, resultantes da variabilidade natural ou da atividade humana (IPCC, 2007). Em 1988, alertados pela ocorrência de mudanças climáticas, a Organização Metereológica Mundial (OMM) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente


Mudança de temperatura

Mudança de precipitação

Mudanças climáticas Aumento do nível do mar

Desastres Sistemas terrenos

Formadores de processos climáticos Gases de efeito estufa

Ecossistemas

Concentrações

Recursos hídricos

Impactos e vulnerabilidade

Aerosóis Emissões

Segurança alimentar

Assentamentos e sociedade

Saúde Humana

Sistemas HUMANOS

Fig. 1. Esquema adaptado de IPCC (2007, p. 26).

(PNUMA) criaram o Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudanças Climáticas (IPCC, sigla em inglês). Os estudos realizados pelos integrantes desse grupo evidenciaram que as principais causas das mudanças climáticas relacionavam-se a ações humanas. Com base nesses estudos evidenciou-se, por exemplo, que em 2005 as concentrações atmosféricas de Dióxido de Carbono (CO2) e Metano (CH4) excederam em muito o intervalo natural de valores dos últimos 650 mil anos. De tal modo que a emissão desenfreada desses gases, juntamente com a de aerossóis1, encon-

trava-se na base dos processos que levam às mudanças climáticas (IPCC, 2007, p. 5). Desde a década de 1970 a utilização de gases clorofluorocarbonados (CFCs) na indústria de refrigeração e de aerossóis, começou a alterar a composição do Ozônio (O3) da estratosfera. Os CFCs têm a capacidade de destruir a fina camada de Ozônio que envolve a Terra e de reagir com esse gás, o que produz níveis mais elevados de radiação Ultravioleta sobre a superfície terrestre e coloca em risco o fitoplancton marinho, as plantas, os animais e seres humanos (Duran, 2010, p. 24)

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Na figura acima são observadas algumas possíveis inter-relações entre os impactos das ações humanas nas mudanças climáticas e as respostas daí resultantes. Nela, os formadores dos processos de mudanças climáticas estão representados pela emissão de gases de efeito estufa2 e dos aerossóis, assim como pela concentração desses gases.

O efeito estufa produz mudanças nos níveis de precipitação e estes, uma vez alterados, desequilibram os recursos hídricos3, o que resulta em impactos e situações São considerados gases causadores do “efeito estufa” o CO2, o CH4, o Óxido Nitroso (NO2) e outros gases residuais (Durán, 2010). Entretanto, apesar de residuais, esses outros gases produzem mais impactos, por unidade de molécula, para o efeito estufa que o CO2. Assim, cada molécula de CH4 é 20 vezes mais impactante que uma de CO2, enquanto a do NO2 200 vezes mais e a dos CFCs 14.000 vezes (IPCC, 1990). 3 As atividades humanas, principalmente às associadas ao sistema urbano-agro-industrial, se apropriam de cerca de 50% da água doce líquida do mundo. Esta água é, em geral, devolvida contaminada ao ciclo hidrológico, o que provoca uma degradação maior desse recurso (McNeill, 2

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de vulnerabilidade, relacionados à segurança alimentar, aos assentamentos e saúde humanos. Tais condições favorecem a ocorrência de desastres associados às mudanças climáticas, que atuam sobre o próprio efeito estufa. Conforma-se, nesse contexto, um novo ciclo cujo caráter fundamental diz respeito à redução gradativa da biocapacidade de recuperação da biosfera, assim como de outros componentes do ecossistema. Considerando-se que a atmosfera corresponde a uma delicada e delgada cobertura gasosa de uns 100 km em torno da Terra, que permite o desenvolvimento da vida, a concentração dos gases de efeito estufa produz danos significativos não apenas no seu equilíbrio, mas, sobretudo, no âmbito de toda biosfera (Duran, 2010). No conjunto de gases causadores de efeito estufa emitidos em 2004, os estudos do IPCC identificaram a presença de 56,6% de CO2 resultantes do uso de combustíveis fósseis; outros 20,1% provenientes de desmatamentos, degradação de biomassa etc.; 14,3% de CH3; 7,9% de N2O2 e 1,1% de gases fluorados. E, no que diz respeito especificamente à emissão de CO2, 25,9%, provinham do fornecimento de energia; 19,4% da indústria; 17,4% da silvicultura (que inclui o desmatamento); 13,5% da agricultura; 13,1% dos transportes; 7,9% de prédios residências e comercias; e 2,8% de esgoto e de águas residuais (IPCC, 2007). Tal composição de gases de efeito estufa resulta, predominantemente, da organização econômica e social que caracteriza produção humana em escala mundial. Todavia, seria inapropriado atribuir a responsabilidade por um estado de degradação ambiental a uma categoria genérica como à “espécie humana”. Sendo assim, cumpre assinalar a existência de um sistema de poder que estruturou e 2003, Naredo, 2002, Diamond, 2007, apud Duran 2010, p. 17).

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condicionou parte considerável da espécie humana e se apropriou de grande parte dos recursos do planeta para seu próprio benefício. De fato, esse sistema tem nome e história.

Desenvolvimento capitalista e mudanças climáticas O capitalismo na sua fase inicial – período histórico situado entre a segunda metade do século XVI e o início do século XVII – desenvolveu-se principalmente na Inglaterra (Dobb, 1983). Por conseguinte, no século XIX, tornaram-se frequentes nesse país determinados impactos da produção capitalista sobre a hidrosfera, na poluição do leito de rios por dejetos industriais; na atmosfera, pela contaminação causada pela densa fumaça negra lançada pelas chaminés das fábricas; e sobre a biosfera, na extinção de bosques e na degradação da vida de camponeses transformados em operários (Engels,2008). Com base numa ideologia que apartava “Homem” da “Natureza” e atribuía ao primeiro a supremacia sobre a segunda, o capitalismo desenvolveu-se nos séculos XIX e XX motivado pela crença de que a biosfera seria um espaço inesgotável, palco apropriado para um crescimento contínuo e um progresso indefinido (Duran, 2010). No cerne dessa ideologia, viceja o culto ao individualismo sobre o terreno fértil da propriedade privada dos bens materiais. É interessante observar que tal ideologia integra um conhecimento que se pretende universal e não um saber histórico e espacialmente situado, ou seja, europeu (Porto-Gonçalves, 2001). Orientadas por essa ideologia, as associações de monopolistas capitalistas, em primeiro lugar, partilharam entre si o mercado interno inglês e tomaram para si a produção do país. Contudo, no desenvolvimento


do capitalismo nas décadas iniciais do século XX, o mercado interno entrelaçava-se com o externo, constituindo a base para a formação de cartéis internacionais (Lênin, 2000). E, para que pudesse expandir-se para além do seu espaço original, esse mercado contou com a introdução de meios de transporte – estradas de ferro, navegação etc. – noutras partes do planeta (Luxemburg, 1970). No lastro da infra-estrutura criada a partir dos interesses dos cartéis internacionais – com o desenvolvimento de tecnologias que permitiram a exploração e a utilização de combustíveis fósseis, como o petróleo – a mobilidade motorizada explodiria ao longo do século XX, sobretudo na sua segunda metade e, especialmente, nas suas duas últimas décadas. Essa explosão dar-se-ia fortemente nos espaços urbanos-metropolitanos, onde ¾ de todo petróleo mundial passaram a ser consumidos (Heinberg, 2006 apud Duran, 2010). Nesse contexto, a edificação de prédios, a construção de infra-estrutura urbana e metropolitana, com suas redes viárias, aéreas e hidroviárias, necessárias aos negócios das grandes corporações, somente seriam possíveis graças à existência de combustíveis fósseis (petróleo principalmente, gás e carvão) em abundância, recursos naturais e força-de-trabalho sub-valorada. Dessa forma, o transporte motorizado, associado a uma tecnologia cada vez mais complexa de extração de materiais da superfície e da crosta terrestre, incrementaria a capacidade de cargas dos / nos territórios (Duran, 2010). Com efeito, o atual sistema urbano-agro-industrial capitalista põe em movimento a cada ano uma tonelagem de materiais muito superior que qualquer força geológica existente. De fato, ¾ partes em peso de todas as transferências de materiais dizem respeito à construção, com a edificação dos espaços urbanizados e metropolitanos a criar uma 15


demanda de materiais – aço, alumínio, cimento, vidro, plásticos, pedras etc. – de alto impacto nos seus locais de extração e de elevado consumo energético (Duran 2010, p. 9). Portanto, a expansão do mercado capitalista se dá acompanhada de processos de urbanização, na medida em que a circulação de mercadorias depende das condições de transporte para se realizar plenamente. Tais processos de urbanização têm como justificativa o desenvolvimento regido pela busca de aumento da produtividade, num ritmo incessante que tende para o infinito (Porto-Gonçalves, 2001, p.242). Entretanto, esse raciocínio precisa ser aprofundado, visto que tais processos dão-se sempre acompanhados pela constituição de espaços periféricos aos centros urbanos, onde a idéia de desenvolvimento convive com condições de vida marcadas, em diversos aspectos, pelo atraso e pela precariedade. Com efeito, esse processo de criação de espaços de exclusão social remete às origens do capitalismo (Engels, 2008), porém, não é restrito a elas, reproduzindo-se de forma global onde Quem mais sofre o castigo, como de costume, são os pobres, gente pobre, países pobres, condenados à expiação dos pecados alheios. O economista Lawrence Summers, doutorado em Harvard e guindado às altas hierarquias do Banco Mundial, deu seu testemunho em fins de 1991. Num documento para uso interno da instituição, que por descuido foi publicado, Summers propunha que o Banco Mundial estimulasse a migração de indústrias sujas e lixos tóxicos “para os países menos desenvolvidos” – uma razão de lógica econômica relacionada com as vantagens comparativas desses países (...): salários raquíticos, grandes espaços com muita sobra por contaminar e a escassa incidência de câncer entre os pobres, que têm o costume de morrer cedo por outras causas. (Galeano, 1999, p. 225) Lançada no alvorecer da Guerra Fria, a 16 Ecossistemas e mudanças climáticas

idéia de desenvolvimento econômico corresponde a um fenômeno criado pelo homem, sem contrapartida nos processos da natureza. Evidentemente, inexistem espécies vivas que se comportam de forma orientada para um crescimento ilimitado. Enquanto o desenvolvimento econômico tem como meta o aumento infinito do Produto Interno Bruto (PIB) por habitante, na natureza a referência é o processo de evolução biológica, onde as formas de desenvolvimento referem-se à mudança, transformação, “sucessão de qualidades” (Cavalcanti, 1996, p. 324). Em agosto de 2010 a grande mídia brasileira destacou o fato de o Brasil apresentar-se como um dos quatro maiores produtores de veículos automotores do planeta. Dado que, sob o ponto de vista neoliberal, indicaria um nível de desenvolvimento econômico significativo e colocaria o país entre as chamadas “economias emergentes”, deveria, contudo, considerar que a noção de desenvolvimento econômico é mais complexa do que aparenta ser. Assim, caberia indagar: que racionalidade orientaria o desenvolvimento econômico de grandes metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro, cujas condições de vida de grande parte das suas populações são demasiadamente precárias, nas quais a poluição atmosférica e da água constitui-se num estado constantemente associado ao aparecimento de diferentes enfermidades? Em estudos realizados em 2005, observou-se que na cidade de São Paulo o “uso de energia” era responsável por 76,14% das emissões lançadas na atmosfera, enquanto 23,48% resultavam da disposição de resíduos sólidos. Na categoria “uso de energia” a gasolina automotiva contribuía com 35,7% das emissões, seguida pelo óleo diesel (32,6%); gás liquefeito de petróleo (GLP, 10,9%); querosene de aviação (8,8%); óleo combustível (1,83%); gasolina de aviação e óleo lubrificante (0,6%) (UFRJ, 2010).


No Estado do Rio de Janeiro, o conjunto das emissões em 2005 teve o CO2 como o principal gás de efeito estufa emitido, além de 58.512,7 Gg 4 de dióxido de carbono (CO2), 427,9 Gg de metano (CH4) e 6,7 Gg de óxido nitroso (N2O)6.5 Tais resultados indicam que, em termos gerais, o uso de energia era principal fonte de emissões (62,4% do total), seguida por outras fontes de energia, como a eletricidade, o gás natural, o óleo diesel, o coque, a gasolina, o GLP etc. (SEA, 2007, p. 11). Todos esses dados corroboram com os do IPCC (2007), que sugerem que os aumentos da concentração mundial de CO2 se devem principalmente à utilização de combustíveis de origem fóssil e, em menor escala, porém considerável, às mudanças no uso da terra. Percebem-se, com base nessas informações, as causas estruturais das mudanças climáticas, fundamentalmente, associadas ao modo de produção capitalista. Porém, não convêm desconsiderar a contribuição individual – e nesse aspecto, a ideologia burguesa com seu culto ao individualismo, ao consumismo e ao descarte desenfreado, constitui-se num poderoso estimulante – para a degradação ambiental e, por extensão, da saúde humana. 1 Gg (gigagrama) = 109 gramas Os óxidos de nitrogênio, designados genericamente por N0x, constituem uma série de sete compostos, dos quais três importantes na atmosfera. O óxido nitroso (N2O – protóxido de nitrogênio ou gás hilariante), gás incolor, o mais abundante dos compostos atmosféricos, não é importante enquanto poluente apesar de jogar papel destacado no ciclo do nitrogênio. O monóxido de nitrogênio, ou óxido nítrico (NO), é um gás incolor que reage espontaneamente com o oxigênio, e muito fortemente com o ozônio, formando dióxido de nitrogênio. Forma-se nos processos de combustão, por exemplo, nas caldeiras e motores de combustão interna, aumentando sua produção com a elevação da temperatura e participando ativamente das reações atmosféricas que são a causa do smog fotoquímico. O dióxido de nitrogênio é um gás avermelhado fortemente tóxico (vapores nitrosos). Nas temperaturas correntes, o vapor é uma mistura de NO2 e do dímero N2O4 – com o aumento da temperatura, o N2O4. (OMS, 1987, apud Duchiade, 1992).

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Mudanças climáticas e processos de saúde-doença Estudos realizados desde a década de 1990 focalizam as relações entre contaminação ambiental e processos de saúde-doença em diferentes centros urbanos (Duchiade, 1992, Gouveia et al, 2002, Bakonyi et al 2004). Esses estudos guardam entre si, por exemplo, evidências de que a variação de alguns índices de morbi-mortalidade relacionam-se aos níveis de poluição atmosférica. Outros autores desenvolvem abordagens numa perspectiva mais abrangente, que, além da questão ambiental, incluem como determinantes de processos de saúde-doença aspectos sociais. Nessa linha de raciocínio indicam três grupos principais de determinantes socioambientais: I. Vinculados ao subdesenvolvimento, ou seja, relacionados ao saneamento ambiental, e que poderiam levar à ocorrência das diarréias, entre outros agravos; 2. Associados ao contato humano, direto ou indireto, com o desenvolvimento industrial, serviços urbanos e fronteiras agrícolas, que ocasionariam doenças relativas à absorção de produtos tóxicos,; 3. Articulados ao fenômeno da globalização e da crise ambiental global, expressos na urbanização desenfreada, na degradação ambiental e na mudança do clima (Franco Netto et al, p. 56-7). Para o conjunto de enfermidades articuladas ao fenômeno da globalização e da crise ambiental global o IPCC identifica três mecanismos principais que podem afetar a saúde humana. O primeiro deles corresponde aos efeitos diretos dos eventos climáticos extremos e afetam a saúde à medida que atuam sobre a fisiologia humana ou provocam traumas físicos

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e psicológicos em acidentes, como nas tempestades, inundações e secas. O segundo se refere aos efeitos sobre o meio ambiente, com a alteração de fatores determinantes da saúde humana. Nesse caso, os exemplos mais relevantes dizem respeito à produção de alimentos, à qualidade da água e do ar e à ecologia de vetores (mosquitos, p. ex.) de agentes infecciosos. Enquanto o terceiro trata dos efeitos dos eventos climáticos que provocam rupturas socioeconômicas, culturais e demográficas importantes. Inclui-se nesse caso a migração de populações que dependem da agricultura de subsistência, da pesca ou da coleta, desencadeada por secas prolongadas (Confalonieri, Marinho, 2007). Nesse sentido, é lícito supor que a variabilidade climática produz consequências diretas e/ou indiretas sobre determinados processos de saúde-doença. De tal modo que nas situações de seca a escassez de água estará relacionada à dificuldade de higiene, à insegurança alimentar, à contaminação do ar, assim como, poderá resultar numa maior incidência de asma, alergias, IRA etc. Por outro lado, a maior intensidade das chuvas poderá resultar em inundações, contaminação da água para consumo humano e no incremento de criadouros de vetores. Consequentemente, a incidência de doenças como as diarréias, a dengue, a malária e o cólera tende a aumentar. Além disso, o aumento da temperatura poderá resultar em incêndios florestais e estresse ambiental, e no aumento da incidência das IRAs, malária e dengue (Jenkins, 2010). A magnitude dos efeitos dos eventos climáticos sobre a saúde humana dependerá, fundamentalmente, de fatores moduladores próprios das condições ambientais e do grau de efetividade relativo à proteção humana determinada pelas ações governamentais e suas políticas específicas de saúde (Confalonieri, Marinho, 2007). Devendo ser compreendida 18 Ecossistemas e mudanças climáticas


Foto: Bernardo Vaz

como resultados de processos históricos e sociais que se dão diferentemente da simples ruptura de um ciclo natural. Nesse sentido, a mitigação dos impactos das mudanças climáticas sobre os grupos humanos, principalmente, sobre aqueles que vivem em condições de profunda vulnerabilidade social e ambiental – que ocupam espaços deteriorados pelo desenvolvimento urbano-industrial, pela exploração extrema de “recursos naturais” (água, vegetação, minerais etc.) ou periféricos aos centros de urbanização – depende, em parte substancial, da ação dos grupos que controlam governos nacionais. No entanto, tais governos, ou melhor, aqueles que exercem controle sobre as principais economias do planeta, não têm tido boa vontade para com as populações mais expostas às alterações do clima. Prova disso foi verificada na COP-15 em dezembro de 2009 em Copenhague, onde as grandes potências, capitaneadas pelos Estados Unidos, não definiram metas para a redução dos gases de efeito estufa, o que sugere um predomínio dos interesses das grandes corporações sob a representação dos chefes de Estado. Além disso, em recentes desastres naturais – como os ocorridos no Paquistão e na China – observa-se que os grupos humanos mais afetados são, justamente, aqueles que se encontram em situação de precariedade social, econômica e ambiental. Porém, como a história não é linear, ela se faz por rupturas provocadas pela acumulação de energias, de idéias e de projetos que, num dado momento, introduzem uma ruptura e então o novo irrompe com vigor a ponto de ganhar hegemonia sobre todas as outras forças. Instaura-se então outro tempo começa-se uma nova história (Boff, 2010). Ainda que não vivamos plenamente a nova história, predita por Boff, trilhamos pelos 19


caminhos abertos pelas contradições produzidas na COP-15, pelos representantes das “superpotências” e pelos dos “países emergentes” (Brasil, China, Índia e África do Sul). Pois, daí nasceu a proposta de uma conferência que pretendia dar voz aos povos excluídos das decisões que afetam do planeta. E essa proposta partiu, justamente, do governante do país que concentra a maior população indígena do continente sul-americano.

Conferência Mundial de los Pueblos sobre Cambio Climático y la Madre Tierra Coube, portanto, ao indígena boliviano Evo Morales, presidente do Estado Plurinacional da Bolívia, a convocação da Conferencia Mundial de los Pueblos sobre Cambio Climático y la Madre Tierra (CMPCC). Realizada em Tiquipaya, Cochabamba, a conferência contou com a participação de mais de 35 mil pessoas de 140 países que, voluntariamente, atenderam à convocatória lançada por Evo. Essas pessoas, organizadas em 17 grupos de trabalho6 lograram êxito ao produzirem documentos que têm servido, inclusive, de referência para as Nações Unidas (CMPCC, 2010). Em Cochabamba, enfatizou-se a culpa do capitalismo nos países centrais e as condutas das multinacionais pelo aquecimento global e a agressão à Mãe Terra (Pachamama). Em contrapartida, as discussões sobre os problemas nos países emergentes, ou seja, em nossos países, especialmente a região da América do 1. Causas estruturais; 2. Harmonia com a natureza; 3. Direitos da Mãe Terra; 4. Referendo; 5. Tribunal Justiça Climática; 6. Povos Indígenas; 7. Dívida Climática; 8. Visão Compartida; 9.Protocolo de Kioto; 11. Adaptação; 12. Financiamento; 13. Desenvolvimento e Transferência de Tecnologia; 14. Florestas; 15. Perigos – Mercado de Carbono; 16. Estratégias de ação e; 17. Agricultura e Soberania Alimentar.

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20 Ecossistemas e mudanças climáticas

Sul, foram bastante pontuais (referidas a pontos específicos, e não à política dos governos). Assim se passou com relação aos casos do Brasil, Argentina, Uruguai, Bolívia. Referindose particularmente a este último, o país anfitrião, está sofrendo enormemente com o fenômeno La Niña, que traz seca e a escassez de água em geral. Setecentos mil hectares de florestas nativas foram consumidos pelo fogo e o ar ficou irrespirável para a metade da Bolívia. O governo nada fez porque não estava preparado, e claramente pôde-se notar a falta de vontade política para apagar os 31.000 focos de incêndio existentes, afetando cerca de dois milhões de hectares entre junho e agosto de 2010. Finalmente, a água apagou a maioria, depois de haverem durado todo o mês de agosto. Houve muita destruição de áreas naturais essenciais à vida. O motivo teria sido o “chaqueo”, ou seja, o incêndio para ganhar mais terras para cultivo. A responsabilidade pelos focos de incêndio foi atribuída aos pequenos camponeses e às comunidades rurais, inclusive de população indígena. Mas o curioso é que o governo de Evo Morales e García Linera fez muito pouco. Evo disse que ele também havia sido “chaquero”, que esta é uma prática comum e que se deve saber como fazê-la. A culpa na verdade foi dos piromaníacos e do capitalismo dos países centrais, por provocarem as secas, produto do aquecimento global.7 Considerando o caso do Brasil. Lula afirma que em poucos anos o país alcançará a posição de potência mundial agro-alimentar. A maioria dos especialistas diz que isto representa uma concentração de terras em unidades produtivas que podem incorporar tecnologias Leonel (2000) discute o uso controlado do fogo por populações indígenas do Brasil na agricultura de subsistência.

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de alto custo, automação e gestão biológica dos solos e de sementes, etc. Bem, como ter “costas suficientes” para suportar as flutuações de um mercado cada vez mais instável e especulativo. Ou seja, esse “Brasil-potência”, com 350 milhões de toneladas de cereais para exportação, percorre mais ou menos o mesmo caminho de uma meta da Argentina de 150 mil toneladas para 2016. Nesse contexto, não há previsão de espaço para os sem-terra, os expulsos, os que arrendam pequenos lotes, os proprietários rurais de pequeno e médio porte. Todos deverão desaparecer. E o campo se tornaria inabitável. Isto já é realidade em muitos povoados na Argentina que sofrem com a fumigação com glifosato e a invasão pelo vento de todo tipo de sementes modificadas, resistentes e inibidoras de outras culturas, como as hortaliças (RENACE, 2010). A saída para os pequenos produtores estaria em uma mudança da organização produtiva, na direção de uma estrutura em rede, não só da cadeia de produção, que geralmente é dominada por uma multinacional em cada uma das suas extremidades. De maneira distinta, esta rede estaria formada por correntes horizontais que difundiriam (espalhariam) avanços tecnológicos a partir de qualquer ponto de sua trama. Assim, seria possível uma mudança na produção e processamento de alimentos para agregar valor, qualidade e diferenciação. Uma mudança por fora dos mercados massivos e especulativos das commodities. Hoje, uma soja ou um milho não-transgênico, livre de tóxicos, já não é uma commodity.8 Grandes parcelas das populações de países como Itália, França, Alemanha, entre Commodity é um termo de língua inglesa que, como o seu plural commodities, significa mercadoria, é utilizado nas transações comerciais de produtos de origem primária nas bolsas de mercadorias.

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outros, estão ativamente contra a disposição da União Européia de permitir os cultivos com sementes geneticamente modificadas para resistir aos agrotóxicos. Essas seriam as mudanças necessárias para não desaparecer (e avançar…). No terreno da proteção e da segurança, também é necessário articular os sistemas de seguro destinados aos produtores mais pobres, para resistir às mudanças climáticas locais e financeiras globais, igualmente destrutivas. Isto seria possível por haver fundos e garantias disponíveis como apoio. E não se deve confiar tanto nos governos, mas tentar buscar ajuda, acordos e convênios com grupos e setores que contestam o sistema atual. Eles podem apoiar com seus recursos, mas também com os seus contatos através da outra rede global, a da informação.

Considerações finais Depois de empreenderem diversos programas de “ajuste estrutural” na década de 1980, diversos países pobres, atrelados às normas do Fundo Monetário Internacional (FMI), foram estimulados a percorrerem caminhos indicados pelos Estados industrializados. Tal opção resultou num crescimento econômico, baseado numa profunda desigualdade social. Além disso, em nome do desenvolvimento tecnológico e científico, muitos desses países sacrificaram sua diversidade ambiental, cultural e étnica, sob processos de homogeneização social e produtiva. Pois identificavam a diversidade étnica e cultural como um impedimento ao desenvolvimento, devido às “formas atrasadas” de sua organização social e dos seus sistemas de produção, a sua não-racionalidade econômica e à precária utilização da ciência e da tecnologia no interior dos seus processos produtivos (Vieco, 2001, p. 49). Os resultados desses empreendimentos 21


políticos estão às nossas vistas e são visíveis também os paliativos adotados para superá-los. Nesse contexto, a questão das mudanças climáticas tende a ser tratada, principalmente pela grande mídia e por muitos governantes, como algo decolado da história. Somos, porém, resultado das contradições da própria história. Nessa condição os autores do presente artigo se conheceram no GT 16 – Estratégias de Ação e, a partir de então, dialogam sobre a possibilidade de criação de um espaço de discussão capaz de manter viva a chama acesa em Cochabamba. Um diálogo que deverá abranger, necessariamente, as perspectivas indígena e camponesa, com suas filosofias do Bem Viver e críticas aos Estados Nações, monolíticos e uninacionais, conforme ressaltam Almeida e Tamari (2009). O que equivale à continuidade das análises sobre os impactos socioambientais das mudanças climáticas e, sobretudo, da efetivação de ações que apontem caminhos novos para grupos sociais em situação de vulnerabilidade. Nesse sentido, o GT 16 aprovou um cronograma de ações que inclui as Jornadas de Mobilização em Defesa da Mãe Terra, sob responsabilidade da Via Campesina e de movimentos indígenas, para o período de 12 a 16 de outubro de 2010; a Mobilização e Vigília Permanente, durante a Conferência de Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas – realizada em Cancún, México – entre 29/11 e 11/12/2010; além da 2ª Conferencia Mundial de los Pueblos, em local a ser definido (na América do Sul), em 2011. Tentativas coletivas em busca de um mundo melhor.

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negativa em sua área plantada (- 2,55%) e, contraditoriamente, uma variação positiva de 31,27% no consumo de agrotóxicos, entre os anos de 2004 a 2008.

Fernando Ferreira Carneiro Professor do Departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências da Saúde da UnB. Vicente Eduardo Soares e Almeida Pesquisador da Embrapa Hortaliças

Para os mais céticos é preciso afirmar que o comportamento nas demais culturas produzidas no Brasil também acompanhou a curva ascendente. Assim, levantamentos do IBGE e do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindag), ambos de 2009, apresentam o crescimento de 4,59% da área cultivada no período entre 2004 e 2008. Por outro lado, as quantidades vendidas

Brasil é o país que mais usa agro O modelo agrícola brasileiro revela uma

grande contradição. Enquanto bate recordes seguidos de produtividade, contribuindo com cerca de 30% das exportações brasileiras, 40% da população brasileira sofre com a insegurança alimentar, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O Brasil, um dos países mais desiguais e com uma das maiores concentração de terras do mundo, ganhou o posto de maior consumidor de agrotóxicos do planeta. Lugar conquistado pelo segundo ano consecutivo, superando os Estados Unidos, segundo dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) divulgados recentemente. Curiosamente, o avanço da tecnologia nesses últimos dez anos não reduziu o consumo de agrotóxicos no Brasil. Pelo contrário, a moderna tecnologia dos transgênicos, por exemplo, estimulou o consumo do produto, especialmente na soja, que teve uma variação

de agrotóxicos, no mesmo período, subiram aproximadamente 44,6%. Isso equivale dizer que se vendeu agrotóxicos num ritmo quase 10 vez superior ao crescimento da área plantada no Brasil naquele período. E os números não levam em conta a enorme quantidade de agrotóxico contrabandeado para o país. Se o consumo de agrotóxicos seguir esse ritmo, os brasileiros estarão cada vez mais expostos aos seus males no ambiente, no trabalho dos agricultores e na dieta. A contaminação de alimentos na mesa do brasileiro é uma realidade, segundo dados do Programa de Análise de Resíduo de Agrotóxico em Alimentos (PARA), da Anvisa. Destaca-se, para os 26 estados brasileiros, os níveis de contágio nas culturas de pimentão (80%), uva (56,4%), pepino (54,8%) e morango (50,8%), acompanhados ainda da couve (44,2%), abacaxi (44,1%), mamão (38,8%) e alface (38,4%),


além outras 12 culturas analisadas e registradas com resíduos de agrotóxicos. O fato é ainda mais preocupante, pois das 819 amostras que apresentaram ingredientes ativos (IAs) não autorizados, 206 amostras (25,1%) apresentaram resíduos que se encontram em processo de reavaliação toxicológica no Brasil. Desse universo, 32 amostras contém ingredientes ativos banidos ou nunca sequer registrados no Brasil, como o heptacloro, clortiofós, dieldrina, mirex, parationa-etílica, monocrotofós e azinfós-metílico.

otóxicos no mundo Com 70 milhões de brasileiros em estado de insegurança alimentar, segundo o IBGE, e com o consumo de apenas 1/3 de frutas, verduras e legumes necessárias a uma alimentação saudável, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a solução para o país passa pela reforma agrária e pela conversão do modelo agroquímico e mercantil para um modelo de base agroecológica, com controle social e participação popular. O Estado Brasileiro e suas políticas públicas ainda são vacilantes em relação ao o inciso V do artigo 225º da Constituição Federal. O item transcorre sobre o “controle da produção, a comercialização e o emprego de substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente”, como é o caso do uso de agrotóxicos.

contaminação. Inclusive muitos desses produtos possuem atuação sistêmica, estando em todas as partes da planta. Com a contaminação ambiental e alimentar, promovida essencialmente pelo uso de agrotóxicos no Brasil, é dever do Estado operar urgentemente políticas públicas efetivas para se fazer cumprir o direito coletivo com uma agricultura responsável e comprometida com o seu povo. E não apenas com os objetivos do lucro fácil e irresponsável em termos socioambientais.

As medidas paliativas, como lavagem das hortaliças ou frutas, estão longe de amenizar as verdadeiras causas desse grave quadro de

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A questão ambiental vem sendo discutida no mundo

todo, principalmente pela preocupação com o aquecimento global e o futuro do planeta. Neste sentido, os estudos sobre o meio ambiente vêm ganhando importância em várias áreas do conhecimento. Na área da saúde não é diferente. Somente nos últimos anos, a temática tem sido tratada com mais relevância, colocando em foco a Saúde Ambiental. O Ministério da Saúde adota o conceito definido na Instrução Normativa nº 01/2005, da Secretaria de Vigilância em Saúde: “saúde ambiental compreende a área da saúde pública afeta ao conhecimento científico e a formulação de políticas públicas relacionadas à interação entre a saúde humana e os fatores do meio ambiente natural e antropogênico que a determinam,

do MST para André Rocha Fisioterapeuta, com especialidade técnica em Saúde Ambiental para as Populações do Campo, pela EPSJV-FIOCRUZ

condicionam e influenciam, com vistas a melhorar a qualidade de vida do ser humano, sob o ponto de vista da sustentabilidade” Para Freitas e Porto (2006, p. 57-58), “o processo de industrialização e o desenvolvimento da economia global baseiam-se em uma lógica na qual o crescimento a curto prazo se sobrepõe ao crescimento a longo prazo, degradando os ecossistemas e os serviços por eles oferecidos”, colocando em xeque dimensões básicas da definição de desenvolvimento sustentável. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST - sempre se preocupou com o Meio Ambiente, porém colocando os homens e as mulheres na centralidade da discussão, como demonstra o documento “Nossos Compromissos com a Terra e com a Vida”, no qual afirma que “os seres humanos são preciosos, pois sua inteligência, trabalho e organização podem


Foto: Bernardo Vaz

Saúde Ambiental: a contribuição a saúde das populações do campo proteger e preservar as formas de vida” (MST, 2009), comprometendo-se em combater qualquer prática que agrida o meio ambiente. O objetivo deste texto é expor o que significa saúde ambiental para o MST, construído ao longo dos seus 25 anos e, mais especificamente, a partir das experiências vivenciadas e reflexões realizadas no “Curso de Especialização Técnica em Vigilância em Saúde Ambiental para a População do Campo”. A práxis da saúde ambiental pode ser dividida em dois eixos: produção saudável e saneamento ecológico. Esses eixos são diretrizes da luta e do trabalho em saúde ambiental, que precisam ser realizados pelos movimentos sociais, garantindo políticas públicas que respeitem a realidade dos sujeitos sociais do campo.

Produção saudável O eixo da produção saudável tem por base a Agroecologia, incluindo a produção orgânica, sem agrotóxicos, sem adubação química e sem transgênicos, de modo que garanta segurança e soberania alimentar das famílias camponesas. Para tanto, inclui-se na discussão a saúde do trabalhador e a geração de renda, sempre levando em consideração o armazenamento, distribuição e comercialização da produção. O modelo capitalista de agricultura dominante, hoje conhecido como agronegócio, impõe as/aos camponesas/es o uso de venenos, de hormônios e fertilização química do solo, além uso de sementes transgênicas. Essas práticas prejudiciais à saúde e ao meio

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ambiente precisam ser superadas pela classe trabalhadora, sendo a Agroecologia um caminho para uma vida saudável. Para o MST e a Via Campesina, Soberania alimentar vai além da segurança alimentar, que por si só não questiona o modelo atual de produção agrícola, pois bastaria que as pessoas tivessem alimentos em quantidade, frequência e nutrientes necessários. Não questiona o modo como foi produzido ou mesmo os danos que deixou ao meio ambiente. Neste conceito, cabe inclusive alimentos transgênicos. Já o conceito de soberania alimentar, defendido pela Via Campesina, é “o direito dos povos de definir usa próprias política e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito a alimentação para toda a população com base na pequena e média produção, respeitando suas próprias culturas e a

diversidade de modos camponeses, pesqueiros e indígenas de produção agropecuário, de comercialização e de gestão dos espaços rurais, nos quais a mulher desempenha um papel fundamental.” (Declaração final do Fórum Mundial de Soberania Alimentar, assinada pela Via Campesina, Havana, Cuba/2001, citada por Campos, 2006, p. 154/155). Ou seja, é um conceito mais abrangente, que inclui o conceito de segurança alimentar, mas que se contrapõe ao agronegócio.

Saneamento ecológico Este segundo eixo é baseado na Permacultura, com objetivo de facilitar as atividades de vida e o trabalho diário sem prejudicar o meio ambiente. Com esse conhecimento, pode-se construir habitações saudáveis, embelezar os assentamentos e

Transgênicos e machismo Pode não parecer, mas existe uma estreita relação entre os transgênicos e o machismo. Como a produção orgânica necessita de bastante trabalho, a família toda precisa participa do processo produtivo na roça. Se esta produção for agroecológica, esse trabalho coletivo é mais necessário ainda. Quando se implementa uma matriz tecnológica, baseada em transgênicos, poucas pessoas dão conta das tarefas de cuidados na roça, estabelecendo-se, geralmente, uma divisão sexual do trabalho, na qual a mulher cuida do trabalho dentro da casa e o homem das atividades ditas “produtivas”; em que a mulher só participa nos momentos de maior exigência, como nas épocas de colheita. Muitas vezes, esse trabalho não é pago pelas cooperativas, que consideram somente o trabalho do homem.

28 Saúde ambiental


acampamentos, cuidar da água (armazenando, tratando e reaproveitando), tratar e utilizar dos dejetos humanos (fezes e urina), tratar e utilizar dos dejetos animais, controlar os vetores, bem como reduzir, reutilizar e reciclar o lixo. Os princípios básicos do saneamento ecológico são três: conservar água, proteger o meio ambiente da contaminação de resíduos que não tenham sido tratados e reconhecer a urina e as fezes como recursos, contribuindo para a produção de alimento e renda. Estudos mostram o quão rico em nutrientes é a urina humana. Wolgast (1993) calculou que cada pessoa urina em média, anualmente, cerca de 4,5 kg de nitrogênio, mais de 0,5 kg de fósforo, e cerca de 1,2 kg de potássio. Esses nutrientes são suficientes para adubar por um ano o cultivo dos grãos consumidos por uma pessoa.

Considerações finais

Referências Bibliográficas BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância Saúde (2005). Instrução Normativa Nº 01, de 07 de Março de 2005. Diário Oficial da União Nº 55 de 22 de março de 2005 - seção 1. CAMPOS, C. S. S. Campesinato autônomo – uma nova tendência gestada pelos movimentos sociais do campo. Rev. Lutas & Resistências, n. 1, p. 146-162, UEL/Gepal, Londrina, setembro de 2006. FREITAS, C. M.; PORTO, M. F. Saúde, ambiente e sustentabilidade. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2006. 124 p. MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Nossos compromissos com a terra e com a vida. 2009. Wolgast, M. Clean waters: thoughts about recirculation. Uppsala, Sweden: Creanom HB. 1993.

A luta do MST não termina quando se conquista a terra. Os desafios apenas mudam de natureza, pois o capitalismo tem muitas armas, muitos modos de se reproduzir. Neste sentido, o setor de saúde do MST tem alguns grandes desafios. No campo da saúde ambiental, os desafios são: lutar contra o envenenamento da terra pelos agrotóxicos, contra o envenenamento dos corpos dos seres humanos por causa de alimentação inadequada ou insuficiente, lutar a favor vida e do meio ambiente, cuidando dos seres humanos e da natureza e embelezando os acampamentos e assentamentos. Para isso, a agroecologia e a permacultura são ferramentas importantíssimas. E assim garantir soberania e segurança alimentar para as/ os camponesas/es e o povo brasileiro.

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Com a finalidade de transformar as relações

sociais, promover a saúde e a cultura dos e das Sem Terrinha do Acampamento Luiz Carlos Prestes, Irituia - PA, foi criado o espaço coletivo do brincar (brinquedoteca, biblioteca e oficina do brincar) Oziel Alves Pereira.

Como surgiu? Surgiu da necessidade de ampliar o repertório do brincar das crianças Sem Terra e estimular seu desenvolvimento e o seu protagonismo como sujeitos sociais que transformam a vida, o mundo, ou seja, que brincando constroem uma nova história.

Brincand Mercedes Zuliani Terapeuta Ocupacional, Especialista em Movimentos Sociais pela UEPA

Como funciona? Para a construção deste espaço toda a coordenação do acampamento e os setores foram envolvidos, debatendo e planejando as ações e as possibilidades desse espaço. Há um coletivo de brinquedistas que é responsável pelo trabalho com as crianças. A juventude teve e tem papel fundamental e continua assumindo a tarefa de brinquedistas, animadores e impulsionadores do brincar. As crianças brincam, pintam, cantam, pulam e se organizam nos dois dias da semana que funciona a brinquedoteca. O que mudou na relação das famílias acampadas? É com a ajuda das crianças, que as


Foto: Mercedes Zuliani

do e construindo uma nova história Brinquedoteca Oziel Alves Pereira - Irituia, Pará famílias devem se orientar para construir o novo e também adquirir responsabilidades para a formação destes e destas pequenas, orientá-los, formá-los em luta. As famílias do acampamento disseram que houveram mudanças depois da brinquedoteca: “É muito bom. As crianças vão brincar e se divertir.” E, para as outras crianças Sem Terrinha do Brasil, as crianças do acampamento mandam uma mensagem: que tenham um espaço coletivo do brincar como esse para se divertir, aprender e ensinar. Assim nós conquistamos a saúde das/ dos Sem Terrinha: brincadeiras, criatividade, organização e luta! Pátria Livre! Amazônia Livre!

“Saúde para nós é brincar, rir, se alimentar e cuidar de nós mesmos!” Coletivo de crianças presentes na ciranda da jornada de Abril de 2008, em Belém – PA.

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Este texto busca fazer uma síntese propo-

sitiva de conceitos e compreensões fundamentais articuladoras de uma concepção de Educação Profissional, que vise interpretar e orientar a construção de práticas e de políticas voltadas para a formação profissional de trabalhadores inseridos nos processos de produção agrícola, ou ao modo de vida social que ela gera ou implica. Tem por base as experiências e reflexões feitas no âmbito da Educação do Campo, notadamente em torno de práticas dos movimentos sociais camponeses em diálogo com o debate atual sobre educação profissional, nos seus vínculos necessários tanto com a educação básica quanto com a educação superior. A perspectiva da abordagem é a de pensar a

Educação Profissional Roseli Caldart Da Unidade de Educação Superior do Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária, Veranópolis, RS. Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Texto produzido para exposição no Fórum Mundial de Educação Profissional e Tecnológica, debate temático (12) sobre “Educação Profissional do Campo”, Brasília, DF, 23 a 27 de novembro 2009.

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formação dos trabalhadores, considerados como classe e como sujeitos de um projeto histórico com objetivos de justiça, igualdade social e emancipação humana. A síntese foi organizada em forma de ideias-chave para facilitar sua exposição e discussão. 1 Três textos anteriores serviram de base para elaboração desta síntese: Documento do Seminário sobre Educação Profissional para as Áreas de Reforma Agrária da Região Sul: Que Educação Profissional, para que trabalho e para que campo? Cadernos do Iterra ano VII, n. 13, setembro 2007, pág. 179-201. Educação do Campo: notas para uma análise de percurso. Revista Científica da EPSJV/ FIOCRUZ, Trabalho, Educação e Saúde. Rio de Janeiro, v.7, n.1, pág. 35-64, mar/jun 2009. E “Educação Profissional no contexto das áreas de Reforma Agrária”, documento elaborado para o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), com primeira versão em dezembro 2008.

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Foto: Bernardo Vaz

na perspectiva da Educação do Campo Proposições para o debate de concepção 1

Compreendemos a “Educação Profissional do Campo”, expressão que está na chamada temática desta mesa, como indicadora aqui de uma reflexão sobre educação profissional feita desde os parâmetros político-pedagógicos da Educação do Campo. A ideia fundamental na compreensão da perspectiva desta proposição é de que não se trata de pensar uma educação profissional em separado para o campo, específica para seus sujeitos e fragmentada do debate geral (isso seria desastroso em relação aos objetivos de transformação social e de emancipação humana que nos orientam), mas sim de trazer para o debate geral de concepção e de políticas públicas de educação profissional questões que têm sido formuladas desde a

realidade, esta sim específica, do trabalho no campo, dos embates de projetos de desenvolvimento, de modos de fazer agricultura e das experiências de formação profissional dos seus sujeitos.

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A especificação “do campo” nos parece necessária hoje, pensando no contexto da sociedade brasileira atual, para colocar algumas questões no debate da educação profissional que possivelmente não entrem de outra forma. Ou seja, não se trata de buscar uma resposta específica ao campo (seja como projeto social ou como concepção de escola ou de educação profissional), mas sim de considerar as questões do campo, ou dos trabalhadores que vivem do trabalho vinculado à produção agrícola,

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na composição da resposta geral sobre que formação é necessária aos trabalhadores para que se assumam como sujeitos de um trabalho construtor da sociedade e de novas relações sociais que inclusive possam superar a contradição entre campo e cidade, própria do capitalismo.

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Na base da formulação destas questões, encontra-se uma análise da realidade atual do campo, principalmente do desenvolvimento/expansão das relações capitalistas na agricultura e suas contradições. O projeto hoje hegemônico de desenvolvimento do campo, que significa, na verdade, um projeto de expansão do capital no campo, tem como característica principal o controle da agricultura pelo capital financeiro internacionalizado 2 e como traço fundamental de seu paradigma tecnológico uma tendência de crescente artificialização da agricultura, transformando-a num ramo da indústria e buscando subordinar a natureza aos interesses das empresas capitalistas ou da valorização do capital. 3 Da análise das contradições

Este controle é feito através: - da compra de ações pelos bancos de empresas que atuam em diferentes setores relacionados à agricultura; - de empresas que compram outras empresas para dominar os mercados produtores e o comércio de produtos agrícolas, aproveitando-se do processo de “dolarização da economia mundial”; - das regras impostas pelos organismos internacionais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC), o Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e acordos multilaterais, que normatizaram o comércio de produtos agrícolas de acordo com os interesses das grandes empresas; - do crédito bancário voltado ao financiamento da “agricultura industrial” e – do abandono pelos governos de políticas públicas de proteção do mercado agrícola e da economia camponesa e da aplicação de políticas de subsídios justamente para a grande produção agrícola capitalista. O resultado visível dessa lógica é de que em duas décadas, aproximadamente 30 grandes empresas transnacionais passaram a controlar praticamente toda a produção e o comércio agrícola do mundo. E a consequência estrutural é um processo acelerado de marginalização da agricultura camponesa, cada vez mais sem papel nessa lógica de pensar o desenvolvimento do país (Stedile, 2008). 3 Esse paradigma tecnológico impõe: - a privatização da ciência e da tecnologia, com a consequente privatização do saber; - a homogeneização e especialização da 2

34 Formação profissional

percebidas no projeto hegemônico, especialmente desde seu paradigma tecnológico, depreende-se a existência de um contraponto de lógicas ou de modos de produção agrícola, de repercussões sociais locais imediatas, mas também de impacto a médio e longo prazo para a própria sobrevivência do planeta, da humanidade. 4

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Estamos nos referindo à polarização entre uma agricultura voltada para a produção de alimentos (lógica do trabalho para reprodução da vida), que, no contraponto, vem sendo identificada como “agricultura camponesa”, dada sua forte ligação com a “condição camponesa” e o “modo camponês de fazer agricultura” (Ploeg, 2008) e uma agricultura voltada para o negócio hoje, sobretudo, para produção de ‘commodities’ (lógica do trabalho para reprodução do capital), chamada de “agricultura capitalista” ou de “agronegócio” (ou ainda de agricultura industrial dada a sua subordinação à lógica de produção da indústria). Enquanto que na primeira lógica há uma conexão direta entre produção e consumo, ou seja, entre a produção de alimentos e as necessidades alimentares das populações (o que não quer dizer eliminar a produção de excedentes ou mesmo em escala nem a relação com o mercado), na segunda lógica há

produção agropecuária e florestal negando a biodiversidade; - o domínio de poucas empresas privadas multinacionais na produção agropecuária e florestal e a imposição política e econômica das sementes transgênicas; - a apropriação privada da biodiversidade e da água. Nesse paradigma as sementes transformaram-se em negócio e a vida vegetal e animal em uma mercadoria (Carvalho, 2007). 4 Os próprios dados da FAO (órgão da ONU para a agricultura e alimentos), divulgados recentemente, a propósito do dia mundial da alimentação em 16 de outubro, nos alertam para as consequências da lógica predominante hoje no mundo: pela primeira vez na história mais de um bilhão de pessoas estão subnutridas no mundo inteiro. 100 milhões a mais do que no ano passado, significando que uma em cada seis pessoas passa fome todos os dias. E a grande ironia é o dado de que 70% das pessoas que passam fome no mundo vivem nas áreas rurais. Alguma coisa está muito errada, não está?


uma progressiva desconexão entre produção e consumo, ou seja, a lógica se inverte: produz-se para o mercado que então precisa induzir o consumo. Só que neste caso, o mercado nem é principalmente o de alimentos, mas o de máquinas, de fertilizantes, de agrotóxicos, de sementes. Ou seja, é preciso produzir alimentos não da forma que seriam mais adequados para o consumo humano, mas sim da forma que gerem mais lucro e mais valor para o capital. 5

5

Note-se que, na sociedade capitalista atual, há uma forte dominação econômica e uma hegemonia cultural da agricultura capitalista sobre a camponesa (ainda vista por muitos como relacionada ao atraso e em vias de extinção ou de subordinação total à lógica do capital). Mas a polarização não foi eliminada, ao contrário, vem sendo acirrada à medida que as contradições da lógica capitalista vão ficando mais explícitas. São essas contradições que têm gerado revoltas, indignação, mobilizações, que podem vir a acelerar sua superação. A crise atual da produção e distribuição de alimentos, aliada à crise climática, tende a aumentar e tornar cada vez mais evidente a insustentabilidade do modelo industrial de agricultura e da produção de alimentos tratada somente como negócio, abrindo brechas para a construção de um projeto alternativo, constituído desde o outro pólo, que é o do trabalho. 6 – Desde

5 É esta lógica que permite o contra-senso de que junto com o crescimento da fome, da subnutrição e da pobreza nas áreas rurais (dados da FAO) possa acontecer um grande crescimento das vendas de máquinas agrícolas cada vez mais sofisticadas. 6 Algumas contradições importantes do domínio do capital sobre a agricultura e a natureza, foram resumidas por Stedile (2008): - o modelo de produção da agricultura industrial é totalmente dependente de insumos, como fertilizantes químicos e derivados do petróleo, que tem limites físicos naturais e tem, portanto, sua expansão limitada a um médio prazo; - o controle sobre os alimentos, feito por algumas empresas apenas, tem gerado preços acima do seu valor e isso provocará fome e revolta da população sem renda suficiente para comprá-los;

a educação cabe perguntar: que processos formadores e deformadores do ser humano são produzidos por este contraponto, nessa dinâmica em que se move o campo, mas que envolve toda a sociedade?

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Desde o pólo do trabalho (classe trabalhadora), o que hoje se afirma como um projeto alternativo de desenvolvimento do campo, não tem ainda uma formulação precisa, acabada, exatamente porque está sendo construído nos embates e se desenha pelo contraponto ao projeto hegemônico e seus impactos social e ambientalmente

- o capital está controlando os recursos naturais, representados pela terra, água, florestas e biodiversidade, o que afeta a soberania nacional; - a agricultura industrial se baseia na necessidade de uso cada vez maior de agrotóxicos, como forma de poupar mão-de-obra e de produzir em monocultivo de larga escala, produzindo alimentos cada vez mais contaminados, que afetam a saúde da população; - o modo de produzir em grande escala expulsa a mão-de-obra do meio rural e faz com que aumente as populações de periferias das grandes cidades sem alternativa de emprego e renda, aprofundando a desigualdade social; - as empresas estão ampliando a agricultura baseada nas sementes transgênicas ao mesmo tempo em que aumentam as denúncias e ficam mais visíveis suas consequências sobre a destruição da biodiversidade, sobre o clima e os riscos para a saúde humana e dos animais; - a agricultura industrial, de monocultivo, destrói necessariamente a biodiversidade, o que altera sistematicamente o regime de chuvas e ajuda o aquecimento global; - a privatização da propriedade das águas seja dos rios e lagos ou do lençol freático restringirá o consumo para as populações de baixa renda, trazendo graves consequências sociais; - a ampliação e o uso da agricultura industrial para produção de agrocombustíveis, aumentam ainda mais o monocultivo, o uso de fertilizantes de origem petroleira e não resolve o problema do aquecimento global e da emissão de gás carbônico; - o projeto de redivisão internacional do trabalho e da produção transforma muitos países do hemisfério sul em meros exportadores de matérias primas, inviabilizando projetos de desenvolvimento nacional que possam garantir emprego e distribuição de renda para suas populações; - as empresas do agro, aliadas com o capital financeiro estão avançando também para a concentração e centralização nas redes de distribuição de supermercados, destruindo milhares de pequenos armazéns e comerciantes locais; - a agricultura industrial precisa utilizar cada vez mais hormônios e remédios industriais para a produção em massa de animais para abate, em menor tempo, trazendo consequências na saúde da população consumidora.

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destruidores. Alguns aspectos mais consensuais que têm sido destacados especialmente nos debates dos movimentos camponeses (notadamente dos que integram a Via Campesina): a soberania alimentar como princípio organizador da agricultura, a democratização da propriedade e do uso da terra, recolocando a reforma agrária em pauta, uma nova matriz produtiva e tecnológica, com base na agroecologia e uma nova lógica organizativa da produção, tendo por base a cooperação.

a) Soberania alimentar quer dizer uma produção voltada para atender as necessidades do povo com políticas públicas voltadas para este objetivo. A soberania alimentar se refere ao direito dos povos e dos países de definir suas próprias políticas agrícolas e produzir alimentos em seus territórios, destinados a alimentar sua população antes de decidir sobre a necessidade de sua exportação (Moreno, 2007). Implica dar prioridade para a produção de alimentos sadios, de boa qualidade e culturalmente apropriados, mantendo a capacidade dos camponeses de produzir alimentos desde um sistema de produção diversificado e sustentável (Martins, 2006). 7 Defender a soberania alimentar Precisamos ter presente neste debate a disputa que existe hoje entre os termos segurança alimentar e soberania alimentar, com “acepções diametralmente distintas e de forma alguma intercambiáveis”. “O conceito de Soberania Alimentar foi apresentado pela Via Campesina, a articulação internacional dos camponeses, durante a Conferência Mundial sobre a Alimentação (em comemoração aos 50 anos da FAO), em Roma 1996, para propor outro princípio de construção da lógica da produção e do comércio internacional de alimentos, desafiando a concentração de poder do sistema agro-alimentar e priorizando a autodeterminação política dos povos. A segurança alimentar diz respeito à obrigação dos Estados de garantir o acesso aos alimentos nutricionalmente adequados e em quantidades apropriadas’ (sem questionar sua origem, admitindo a ajuda alimentar, por exemplo)...” (Moreno, 2007). O conceito de soberania alimentar hoje representa o próprio embate entre os projetos do agronegócio e da agricultura camponesa. “A idéia de

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36 Formação profissional

significa recolocar o papel da agricultura camponesa sustentável e da produção local para solução dos problemas da produção de alimentos no mundo. Supõe a democratização do acesso a terra e uma nova matriz tecnológica. b) Democratização da propriedade e do uso da terra: a Reforma Agrária deve voltar à agenda prioritária do país como forma de reverter o processo de expulsão do campo e disponibilizar a terra para a produção de alimentos, e não para produzir para a exportação e para combustíveis (Via Campesina, 2008). A Reforma Agrária é condição hoje em nosso país para garantia da soberania alimentar. Função social da propriedade da terra, revisão dos índices de produtividade para fins de desapropriação e limite máximo de propriedade são questões relacionadas a esta agenda. c) Nova matriz produtiva e tecnológica que combine produtividade do trabalho com sustentabilidade sócio-ambiental. O modelo dominante baseado na monocultura de exportação é insustentável. O princípio da sustentabilidade sócio-ambiental deve estar assegurado junto com o desenvolvimento das forças produtivas em vista do aumento da produtividade do trabalho, diminuição de sua penosidade e soberania alimentar exige divisão de poder para tomada de decisão sobre o que produzir e onde produzir. Os governos nacionais perderam este poder desde que o agronegócio passou a determinar os projetos de desenvolvimento rural no mundo. (...) Além da democratização de controle das decisões, defender a soberania alimentar significa defender a produção local, o que choca com os interesses da produção agro-exportadora. Então compreende-se bem porque o agronegócio defende a segurança alimentar. Porque esta é tão somente uma política compensatória que garante parcialmente alimentos industrializados para as populações pobres, mas não garante à população faminta, o direito de produzir seu próprio alimento. Porque para produzir alimentos é preciso terra - território...”, daí sua associação necessária com a Reforma Agrária (Fernandes, 2008).


geração de excedente. Temos avançado na construção de experiências significativas no campo da agroecologia que apontam na perspectiva da sustentabilidade neste sentido mais amplo. (Mauro, 2008). Esta nova matriz tecnológica afirma uma concepção de mundo e de desenvolvimento rural que propõe um convívio harmonioso com a natureza, que preserve toda a biodiversidade. Ela projeta: - o reconhecimento e a valorização dos saberes do povo; - a garantia da biodiversidade na produção rural pela combinação de cultivos e criações; - a diversidade e variedade de sementes varietais e de mudas pela autonomia de produção de sementes camponesas; - a introdução de uma matriz produtiva que facilite a preservação, conservação e recomposição da biodiversidade (Carvalho, 2007). d) Nova lógica organizativa da produção. A pequena parcela individual está longe de ser uma solução para o campo. Pois muitas vezes ela é sinônimo de forças produtivas atrasadas, baixa produtividade do trabalho, relações sociais retrógradas (individualismo, machismo, isolamento, etc.), dificuldades de acesso aos serviços básicos, extensas jornadas de trabalho, dupla jornada das mulheres; trabalho infantil... A cooperação é o princípio organizador da produção (bem como de outras esferas da existência social) que pode possibilitar uma maior organização e convivência social, melhor divisão de trabalho e maior qualificação, aumento na produtividade do trabalho e do excedente econômico gerado e agregação de valor via processos de verticalização da produção (Mauro, 2008).

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Pensar a educação profissional desde a perspectiva da Educação do Campo implica

hoje em assumir a existência deste contraponto de lógicas, preparando os trabalhadores para a análise dessa realidade e das contradições reais envolvidas. É do enfrentamento das questões centrais colocadas pelo contraponto de lógicas que se projetam, nos parece, “novidades qualitativas” para o debate da educação profissional e da educação dos trabalhadores como um todo.

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Mas quais então as questões principais que esta realidade, este embate coloca para o debate específico da Educação Profissional? Primeiro não podemos esquecer do velho debate originário da Educação do Campo, que se relaciona ao acesso dos camponeses à educação e particularmente à educação escolar, incluída nela os cursos de educação profissional. O último censo agropecuário (2006) novamente nos alerta para um dado alarmante: em nosso país 30% dos trabalhadores rurais são analfabetos e 80% não chegou a concluir o ensino fundamental. Esse dado faz parte da lógica do projeto hegemônico. Não há, pois, debate sério sobre educação profissional do campo se não for considerada a necessidade urgente de políticas de universalização da educação básica e de democratização do acesso à educação superior. O debate sobre o acesso traz junto a necessidade de uma rediscussão das finalidades educativas, ou dos objetivos da educação profissional. Considerando a especificidade da formação social brasileira (que ainda não conseguiu universalizar o acesso à educação básica), a preparação de profissionais vinculados à produção agrícola tem uma tradição ligada a duas vertentes: preparar trabalhadores assalariados das empresas de agricultura capitalista ou formar extensionistas para o trabalho de assistência técnica aos agricultores, vinculados a órgãos

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públicos ou mesmo a empresas. Ou seja, no Brasil, de modo geral, os cursos técnicos em agropecuária, ou correspondentes e os cursos superiores de agronomia - veterinária e correlatos - não são voltados, ou pedagogicamente organizados, para formar agricultores. Mesmo quando os são, os próprios camponeses ou seus filhos que conseguem ter acesso a estes cursos entendem que o seu objetivo é deixar de ser camponeses, ou deixar de ter como trabalho a produção agrícola.

11 Do ponto de vista das políticas públicas, é importante considerar que o chamado “sistema federal de ensino agrícola” surgiu para atender as demandas de implementação da chamada “revolução verde” e muitas escolas agrotécnicas foram criadas para atender diretamente as necessidades da expansão do capital no campo em determinado local, por exemplo, a de preparação de mão-de-obra necessária para as agroindústrias de uma determinada região. 8 Por isso mesmo não existe no Brasil uma política de educação profissional para a agricultura camponesa. Porque isso seria atender a uma demanda vinda do pólo do trabalho e não do capital e, portanto, portadora de outro tipo de exigências de formação. E também por isso, camponeses que conseguem estudar nas escolas ditas “agrícolas”, via de regra, deixam de ser agricultores e deixam o campo. O embate atual de lógicas e a explicitação das contradições envolvidas no projeto dominante de desenvolvimento do campo cada vez põem em questão esta opção e pressionam pelo menos para a existência de alternativas desde o outro pólo (os dados do censo agropecuário 2006, que apontam Um aprofundamento sobre o percurso histórico da política do “ensino agrícola” no Brasil pode ser encontrado na tese de doutorado de Francisco José Sobral: A formação do técnico em agropecuária no contexto da agricultura familiar. Campinas: UNICAMP, 2004.

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38 Formação profissional

para a importância da agricultura familiar na produção de alimentos no país, tensionam nesta perspectiva). Que alterações isso deverá trazer para o projeto político-pedagógico e mais especificamente para o currículo dos cursos de educação profissional voltados para a produção agrícola?

12 A Educação Profissional do Campo não é a mesma coisa que escola agrícola. Ela inclui a preparação para diferentes profissões que são necessárias ao desenvolvimento do território, cuja base de desenvolvimento está na agricultura: agroindústria, gestão, educação, saúde, comunicação..., mas sem desconsiderar que a produção agrícola é a base da reprodução da vida e, por isso, deve ter centralidade na formação para o trabalho do campo.

13 A rediscussão das finalidades educativas inclui a afirmação de que é necessário pensar uma educação profissional voltada à preparação de trabalhadores para a produção agrícola. Na perspectiva da Educação do Campo, isso significa hoje, fundamentalmente, preparar trabalhadores para o enfrentamento do contraponto de paradigmas. Isso inclui uma compreensão teórica rigorosa da realidade atual, especialmente das contradições reais envolvidas no embate de projetos. E inclui um preparo científico, tecnológico, que não isole a formação profissional em um dos pólos (porque na realidade isso não é uma escolha determinada pela vontade), mas que de um lado leve os trabalhadores a compreender cientificamente os fundamentos da própria polarização e, de outro, assuma o desafio da construção teórico-prática do projeto alternativo.

14 Hoje, isso significa tomar como objeto de estudo e de práticas a construção de uma nova matriz científico-tecnológica para o trabalho no campo produzida desde a lógica


da agricultura camponesa sustentável, situando esta matriz no contexto mais amplo de transformações das relações sociais e do sistema hegemônico de produção. Trata-se de pensar uma educação profissional que seja parte da formação específica para o trabalho no/do campo desde uma lógica de desenvolvimento, cuja centralidade está no trabalho (todos devem trabalhar), na apropriação dos meios de produção pelos próprios trabalhadores e na terra como meio de produzir vida e identidade (e não como negócio).

15 Do ponto de vista da organização do trabalho pedagógico, trata-se de assumir a soberania alimentar, a reforma agrária, a agroecologia e a cooperação como eixos articuladores e organizadores do currículo para a formação profissional dos trabalhadores da agricultura, admitindo-se que esta transformação curricular será produto do próprio processo formativo em andamento, dado que não temos uma tradição deste caminho nos cursos de educação profissional predominantes.

16 De

modo geral, não se considera que o “modo camponês de fazer agricultura” (Ploeg, 2008) deva ser estudado, nem que ele necessite de uma formação científica e tecnológica para ser praticado, bastando aos camponeses (e só a eles, porque não se imagina formar camponeses, já que se entende que sua lógica de produção e trabalho deve ser eliminada) o saber da experiência. A educação profissional pensada desde a perspectiva política e teórica da Educação do Campo defende sim a valorização do saber da experiência camponesa (porque sem ela perdemos a sabedoria e a ciência da produção de alimentos voltada para a reprodução da vida), mas justamente superando o seu caráter de conhecimento tácito, ou seja, que não se formula teoricamente e não

dialoga com a ciência e a tecnologia (o que segundo Kuenzer apud Moll, 2009 tem sido uma marca das políticas e programas de educação profissional em geral no Brasil), processo necessário inclusive para que seja objeto de práticas educativas de novos camponeses.

17 Do ponto de vista da concepção de formação e educação dos trabalhadores, trata-se de vincular esta discussão específica com o debate geral da educação profissional, que visa a formação dos trabalhadores na perspectiva de superação das relações sociais capitalistas. Interessa pressionar o sistema pelo direito ao trabalho e a uma educação profissional pública de qualidade e potencializar os debates sobre a necessidade de alargamento do conceito de formação profissional, relacionados aos debates sobre as finalidades da educação básica e da educação superior. É muito importante não perder de vista que, na perspectiva do projeto histórico dos trabalhadores, a educação profissional (no sentido estrito desta expressão) não esgota a formação para o trabalho e que a formação para o trabalho não esgota a educação a que a classe trabalhadora tem direito e a de que necessita para cumprir seu papel na história.

18 O desafio é pensar a educação profissional como formação específica para o trabalho, que visa superar a dicotomia entre trabalho manual e trabalho intelectual e atender as exigências de inserção de todas as pessoas no trabalho socialmente produtivo, próprio de seu tempo histórico. Trata-se de preparar para um trabalho cada vez mais complexo, sem ignorar as inovações tecnológicas, mas fazendo a sua crítica (e superação) desde o princípio de que as tecnologias que nos interessam são as que efetivamente se constituem como forças produtivas, e não destrutivas da vida.

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19 Consideramos, nesse sentido, que uma categoria chave a ser retomada neste diálogo, entre o debate geral e específico, é a da politecnia, ou da formação politécnica, entendida como a formação para o trabalho que busca romper com as dicotomias entre “geral e específico, político e técnico ou educação básica e técnica. O conceito de politecnia pressupõe a possibilidade de que o processo de trabalho se realize sem ter que se dissociar atividades manuais e intelectuais (Saviani, 2003). Implica na apropriação dos fundamentos científicos e tecnológicos dos processos produtivos e das relações sociais de produção, dos conhecimentos das formas tecnológicas em que se baseiam os processos produtivos contemporâneos e das diferentes linguagens que lhe são próprias; na formação para uma cultura tecnológica e para uma cultura científica, bem como para sua crítica; na produção de tecnologias e de ciência. Trata-se de uma educação tecnológica (no sentido alargado que está originariamente em Marx), que inclui a articulação entre conhecimentos do trabalho em si e das formas de gestão e organização do trabalho, sem o que não é possível a participação nas decisões sobre as relações de trabalho. E que supõe uma articulação necessária entre instrução intelectual e inserção no trabalho produtivo.

de trabalho específicos (Ploeg, 2008, afirma que nesta relação direta com a natureza está um distintivo fundamental entre o trabalho rural e urbano), criadores de uma cultura com traços específicos e também de formas de luta social com características específicas. 9

21 Do ponto de vista da concepção de métodos educativos ,essa discussão se desdobra em questões pedagógicas fundamentais como a necessidade e o modo de relacionar teoria e prática, constituindo a formação profissional como práxis; a forma de construir um currículo que articule, em um mesmo processo, formação para o trabalho, formação cultural, formação política, formação ética e formação científica; conhecimentos gerais e específicos, parte e totalidade, conhecimentos de produtos e de processos, diferentes tipos e formas de conhecimento. E é importante pensar como a alternância (de tempos e espaços formativos), uma característica das experiências pedagógicas da Educação do Campo, contribui, ou pode ser potencializada de modo a contribuir nessa perspectiva de integração curricular.

22 É desafio pedagógico permanente articular no dia a dia dos cursos, ou das atividades formativas as práticas organizativas, o trabalho, a inserção nas lutas, o conhecimento, em um projeto educativo integral, coerente, que produza nas pessoas valores, convicções, visão de mundo, consciência organizativa, capacidade de ação, sentido mais pleno de ser humano. Pretendemos um processo que, afinal, mexa com a totalidade da vida,

20 Um desafio teórico-pedagógico específico à formação politécnica dos trabalhadores do campo é articular a compreensão dos princípios científicos e tecnológicos que estão na base da organização da produção moderna (que envolve o trabalho do campo e da cidade) com uma compreensão mais profunda dos processos produtivos agrícolas, que implicam uma interação necessária entre o ser humano e a natureza na sua dinâmica viva, flexível e não completamente planejável, que então desenha processos

40 Formação profissional

Estes processos de trabalho são “o locus onde o homem e a natureza viva se encontram e onde ciclos diferentes são integrados conjuntamente em um todo coerente e, por isso, muitas vezes estético (...). Uma vez que a natureza viva não pode ser completamente planejada nem controlada, existirão sempre surpresas – boas ou más. A arte de dominar essas surpresas e de transformá-las em práticas originais (...) é frequentemente um elementochave do processo de trabalho” (Ploeg, 2008, pág. 42).

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com as questões da vida: para que as pessoas entendam e ajam sobre o que são, o que pensam, como agem, porque pensam como pensam e agem como agem.

23 A Educação Profissional do Campo precisa refletir sobre como se garante no currículo dos cursos o vínculo entre conhecimento e prática de trabalho, na busca de superar a cisão entre trabalho manual e trabalho intelectual; sobre como se combina capacitação técnica com domínio científico e tecnológico dos processos produtivos em que esta área de trabalho se insere. Precisa, ademais, construir um projeto político-pedagógico de perspectiva politécnica que supere também a falsa antinomia entre preparar, principalmente a juventude, para ficar ou para sair do campo. A educação não deve ser pensada como definidora desta decisão, porque de fato não é. Ficar ou sair não é algo a ser julgado como bom ou ruim em si mesmo. É preciso que se eduque os trabalhadores do campo para que tenham condições de escolha; e para que ficando, ou saindo possam ajudar na construção de um projeto social, onde todos possam produzir com dignidade suas condições materiais de existência. O movimento dialético entre particularidade e universalidade é o que deve orientar o trabalho pedagógico onde quer que ele aconteça.

24 Note-se

que este debate de concepção se refere tanto aos cursos de nível médio como aos de nível superior. Os objetivos, ou as expectativas (até onde ir com a profissionalização) e, portanto as estratégias pedagógicas, é que serão diferentes, talvez mais em função dos sujeitos envolvidos, sua faixa etária, as demandas do contexto de trabalho em que se inserem, do que pela estrita diferenciação dos níveis de escolarização. Na projeção específica de cada curso, é preciso considerar se a dimensão da formação

profissional se coloca como foco principal (que justifica a própria realização do curso), ou como uma das dimensões da formação pretendida.

Referências Bibliográficas CARVALHO, Horacio Martins de. Desafios para a agroecologia como portadora de uma nova matriz tecnológica para o campesinato. Texto inédito, julho 2007. FERNANDES, Bernardo Mançano. Soberania alimentar como território. Trabalho apresentado no “Workshop Food Sovereignty: theory, praxis and power”, realizado no St. Andrews College, University of Saskatchewan, Saskatoon, Saskatatchewan, Canadá, novembro 2008. KUENZER, Acacia Z. As políticas de educação profissional: uma reflexão necessária. In.: MOLL, Jaqueline e colaboradores. Educação Profissional e Tecnológica no Brasil Contemporâneo. Porto Alegre: Artmed, 2010, pág. 253-270. MARTINS, Adalberto. Plataforma política para uma agricultura soberana e popular. Documento elaborado como subsídio para as discussões da Jornada de Agroecologia, Cascavel/PR, junho 2006. MAURO, Rogério A. Notas de palestra na mesa sobre Reforma Agrária e Agricultura Camponesa. Seminário Nacional de Educação Profissional do Pronera, junho 2008. MORENO, Camila. Agroenergia X Soberania Alimentar: a Questão Agrária do século XXI. CPDA/UFRRJ, 2007. PLOEG, Jan Douve Van Der. Camponeses e impérios alimentares. Lutas por autonomia e sustentabilidade na era da globalização. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008. SAVIANI, Dermeval. O choque teórico da politecnia. Revista Trabalho, Educação e Saúde, vol 1, n.1, Rio de Janeiro: EPSJV, março 2003. STEDILE, João Pedro. A ofensiva das empresas transnacionais sobre a agricultura. V Conferência Internacional da Via Campesina, Maputo, Moçambique, 19 a 22 de outubro 2008. VIA CAMPESINA. Carta de Maputo: V Conferência Internacional da Via Campesina. Maputo, Moçambique, 19 a 22 de outubro de 2008.

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Saneamento significa ação de sanear, ou seja,

de “tornar saudável”. Em fins da década de 50, referindo-se às intervenções de água potável e esgoto sanitário, o termo saneamento “básico” foi cunhado no Brasil para estabelecer o que era mínimo e, portanto, fundamental para a vida humana, frente aos reduzidos recursos governamentais destinados a estas atividades. Essa expressão ganhou força nas décadas de 70 e 80 com a implantação do Plano Nacional de Saneamento (Planasa), que atuava no sistema de abastecimento de água (prioritariamente), do esgotamento sanitário e em poucas ações de drenagem dos centros urbanos. Em meados da década de 80, após críticas referentes à necessidade de se ampliar o conceito e as intervenções, passaram a

Saneamento ecológico, p Alexandre Pessoa Professoar da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio - EPSJV / FIOCRUZ

ser contempladas as atividades: abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos, manejo das águas de chuva (Costa, 1994). Mesmo tendo ampliado suas atribuições, o saneamento básico, de forma geral, ainda mantém a visão equivocada e insuficiente de que as ações, exclusivamente de prevenção de doenças, deveriam ser desempenhadas e controladas apenas pelos engenheiros, arquitetos e técnicos em geral. Infelizmente, essa visão alienada e alienante dificulta o acesso das comunidades, enquanto sujeitos políticos dos territórios, às técnicas, reforçando assim a hegemonia exercida pelas classes dominantes. Essa visão é predominante na sociedade e reproduzida pela grande maioria das escolas,


Foto: Bernardo Vaz

produção e habitação saudáveis: promoção da saúde ambiental do campo universidades e órgãos públicos. A grande maioria dos territórios no país, ainda hoje, não possui o saneamento básico que permita o controle da poluição das águas e do solo, permanecendo insalubres as moradias e os ambientes. A história do saneamento no país é marcada pela disputa de influência e de recursos entre o modelo assistencialista, de tratamento médico individualizado, e as ações preventivas de saneamento público, das quais o saneamento rural, de forma geral, foi historicamente excluído, bem como nas comunidades de baixa renda das cidades. Frente aos graves problemas ambientais e sanitários pelos quais as comunidades ainda sofrem pela falta de prioridade política e, procurando ampliar as intervenções

necessárias para a promoção da saúde ambiental, estabeleceu-se uma nova definição, a do saneamento ambiental. Envolvendo o conjunto de ações técnicas e socioeconômicas, entendidas fundamentalmente como de saúde pública, tem por objetivo alcançar níveis crescentes de salubridade ambiental. Compreende o abastecimento de água em quantidade e qualidade (potável) necessárias para diversas atividades humanas, além da coleta, transporte e tratamento do esgoto sanitário, o manejo adequado das águas pluviais (chuvas), o manejo dos resíduos sólidos e emissões atmosféricas, o controle ambiental de vetores (animais que transmitem doenças) e o manejo ambiental do uso e ocupação do solo, tendo como finalidade promover e

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melhorar as condições de vida urbana e rural (Brasil, 2005). O entendimento da saúde como ausência de doenças é largamente difundido no senso comum e restringe as ações à assistência médica. Entretanto, este modelo é insuficiente na explicação do surgimento das doenças na sociedade, bem como na garantia da saúde, em seu sentido amplo. A partir da compreensão de sua produção social e de suas relações com a produção econômica, a promoção da saúde, em sua análise dos determinantes sociais, considera os aspectos históricos, econômicos, sociais, culturais, biológicos, ambientais e psicológicos que configuram determinada realidade sanitária. Em 1986, a 8a Conferência Nacional de Saúde definiu saúde, no sentido amplo, como “resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso aos serviços de saúde”. Afirma ainda que “o pleno exercício do direito à saúde implica em garantir (...) moradia higiênica e digna; qualidade adequada do meio ambiente...” (Brasil, 1986). Sendo assim, é principalmente resultado das formas de organização social e de produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida. A força política da Reforma Sanitária no Brasil incorporou na Constituição Federal do Brasil, em seu art.6, a saúde como direito social, definindo que: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução dos riscos de doença e de outros agravos e o acesso universal igualitário a ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (Brasil, 1988). O atual movimento pela saúde ambiental reforça as definições acima, integra e dialoga com as áreas de saúde, meio ambiente e 44 Promoção de saúde

saneamento e, desta forma, fortalece a relação existente entre a saúde coletiva e a necessidade de formação de ambientes saudáveis e sustentáveis.

Tecnologia Social Os espaços onde ocorrem a produção e reprodução da força de trabalho são, de acordo com Milton Santos (2008), constituídos pelas pessoas, suas organizações, instituições, empresas, meio ecológico e pela infraestrutura existente - saneamento, transporte, energia, habitações, equipamentos sociais, sistemas de comunicação, etc. Portanto, suas condições físicas e ecológicas são produzidas socialmente, pelos conflitos e interações nos territórios. Nas constantes transformações que ocorrem nos territórios, a tecnologia exerce um papel fundamental, seja na concentração de renda, seja na sua distribuição. Como não é neutra, depende da correlação entre as forças hegemônicas e contra-hegemônicas. O desafio está na radical democratização do conhecimento técnico e na superação do modelo de desenvolvimento pautado na produção em massa, para a produção pelas massas. A tecnologia social, a partir do seu enfoque crítico e emancipatório, pode ser compreendida como o desenvolvimento de técnicas, produtos e metodologias reaplicáveis, a partir de diferentes formas de interação com as comunidades, que representem soluções para a diminuição das desigualdades sociais. Diferencia-se pela aplicação de técnicas simples, escolha e apropriação pela comunidade, custos reduzidos dos produtos e serviços, baixo impacto no meio ambiente, pequenas e médias escalas, efeito de renda, relações socioambientais, uso intensivo de mão-de-obra e insumos naturais e respeito às culturas locais e regionais.


O Saneamento ecológico

Foto: Bernardo Vaz

Na tentativa de aproximar as ações de saneamento com as tecnologias sociais e considerando a técnica como um patrimônio da humanidade, o saneamento ecológico pode ser compreendido a partir dos saberes e práticas locais, pelo manejo adequado das águas, do solo, dos resíduos, da energia, da biodiversidade e de suas interdependências, através da troca entre estes saberes e os conhecimentos acumulados pela arquitetura, permacultura, agroecologia, engenharia e demais técnicas que possam, através de abordagens facilitadoras e integradoras, contribuir para práticas autogestionárias que permitam a autonomia dos assentamentos e acampamentos. Nesse

sentido, o resgate de técnicas tradicionais de manejo dos recursos naturais fortalece a cultura local, permite sua apropriação e desenvolvimento criativo para a construção coletiva de espaços saudáveis. A interação técnica com a cultura local, as condições de vida, as relações ecológicas, os materiais existentes disponíveis, as próprias condições do solo, suas declividades, condições climáticas, o nível e a extensão da poluição, dentre outros fatores, interfere diretamente no desenvolvimento das técnicas necessárias para o saneamento ecológico, através do cuidado com a terra e com as pessoas. A título de exemplo, temos os sistemas integrados de pequena e média escala, de manutenção individualizada ou coletiva, que

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podem utilizar fontes alternativas de água, de forma econômica: usos múltiplos da água, reuso, reciclagem de resíduos sólidos (em vez de serem tratados como lixo) e tratamento de esgotos por processos biológicos que permitam o retorno dos seus nutrientes para a produção ou meio ambiente. Incluem mapas falantes, biomapas, canteiro experimental, planejamento por setores, aproveitamento de águas pluviais, energia solar e eólica, proteção de mananciais, filtros artesanais de água, compostagem, banheiro seco, sistema de tratamento fossa-filtro-zona de raízes, biofiltros, separação e transformação de óleos em sabão, etc. Para a devida apropriação das comunidades campesinas, o saneamento ecológico deve ser visto, não somente em ações de prevenção de doenças no ambiente físico, mas também nas promotoras da saúde nos ambientes físicos, socioculturais, políticos e econômicos. Para isso, através de diagnósticos participativos que avaliem o caminho das águas, dos resíduos e efluentes, viabilizando economia de energia, espaço e tempo, dos recursos e esforços humanos para a sua devida manutenção e sustentabilidade socioambiental.

A Produção saudável Na produção agrícola, o uso intensivo de agrotóxicos no Brasil (atualmente é o maior consumidor no mundo) tem gerado graves problemas de saúde naqueles que o manipulam diretamente, além da contaminação dos alimentos por esses produtos, desenvolvidos para serem biocidas eficientes, ou seja, venenos. A estruturação do latifúndio, através do agronegócio, atua como grande indutora e patrocinadora da ampla utilização, no país, do pacote tecnológico: transgênico – agrotóxico – fertilizante – monocultura – indústria química – capital financeiro, modelo este 46 Promoção de saúde

concentrador de terra, de renda e de poder. Esta tecnologia traz, além de uma relação de dependência no campo, riscos à saúde ambiental com a contaminação do solo, dos rios, das águas subterrâneas e de chuva, devido à pulverização dos agrotóxicos. Pode vir, inclusive, a comprometer a utilização da coleta de águas de chuvas no campo, por trazer consigo os agrotóxicos presentes no ar. O seu combate, além das mobilizações de denúncia junto à sociedade em geral, se dá através da transição agroecológica, do uso da permacultura, produção agrossilipastorial, agroecossistemas e de técnicas que possam fortalecer a agricultura familiar. A constituição de Territórios Livres dos Agrotóxicos se coloca como uma necessidade para a soberania alimentar, o saneamento rural e a luta pela terra contra o latifúndio e sua estruturação através do agronegócio.

Habitação saudável O conceito de habitação saudável inclui as dimensões sanitária, sociocultural, econômica e psíquica, com adequação dos espaços dentro das residências e no seu entorno, além dos demais espaços de convívio. Este sistema complexo é identificado por fatores associados ao ambiente, em especial à habitação, ao trabalho, à escola, à unidade de saúde e aos espaços de lazer, entendidos como microambientes, componentes da vida social. Para isso, não existe um padrão habitacional que deva ser seguido por todos. Pelo contrário, as moradias devem refletir as singularidades dos territórios, suas condições ambientais e socioculturais. As diversas experiências autogestionárias de produção social da moradia dos movimentos sociais urbanos e rurais, muitas delas utilizando técnicas tradicionais com materiais alternativos, fortalecem a noção de lar e de cuidado.


Foto: Centro de Permacultura

A própria habitação, enquanto caminho para a promoção da saúde do campo, transforma-se em um instrumental de intervenção que traz, em seus pilares, estratégias para a abordagem ampliada dos problemas de saúde e de seus determinantes, considerando a necessidade da mobilização social no território. Dentro de realidades distintas, o movimento pela busca constante de melhorias na habitat-ação permite processos educativos de sociabilidade necessários para uma a formação da consciência sanitária, ambiental e política.

Considerações Finais O saneamento ecológico, a produção e a habitação saudáveis são promotores de saúde e, enquanto tecnologias sociais, ao serem tratadas de forma planejada e integrada, podem reverter a lógica da poluição. Deve-se compreender que a maioria dos resíduos é fruto da matéria-prima mal utilizada e evidenciar uma práxis cotidiana que amplie a consciência

sanitária, ambiental e política a fim de viabilizar ações através da construção coletiva e da economia dos recursos disponíveis e das energias necessárias. A adoção dessas sociotécnicas apresenta uma alternativa ao modelo altamente poluidor, degradante e insustentável desenvolvido pelo grande capital. A educação ambiental popular e a mobilização social em saneamento e saúde, atuando de forma crítica e emancipatória, fazem-se necessárias para a promoção do ser humano e o desenvolvimento rural. É fundamental que as populações do campo, enquanto sujeito do processo histórico, promovam a apropriação e desenvolvimento de tecnologias sociais nos acampamentos e assentamentos, lutando por políticas públicas efetivas nos territórios, de forma a interferir, através de uma análise crítica, na elaboração dos projetos e programas visando ao desenvolvimento local rural, em defesa de um projeto de sociedade ambientalmente sustentável e socialmente justo.

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Referências Bibliográficas: Batistella, C. Saúde, Doença e Cuidado: complexidade teórica e necessidade histórica. In Fonseca, A.F. (Org.) O território e o Processo Saúde –Doença. Série Educação Profissional e Docência em Saúde: a formação e o trabalho do agente comunitário de saúde. Rio de Janeiro: EPSJV/Fiocruz. 2007, 266p.; Brasil. Ministério da Saúde. VIII Conferencia Nacional de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 1986 (Anais); Brasil. Constituição Federal da República. Brasília: Governo Federal, 1988; Brasil. Ministério das Cidades. Política e plano municipal de saneamento ambiental: experiências e recomendações. Organização Panamericana da Saúde: Ministério das Cidades, Programa de Modernização do Setor de Saneamento. Brasília: OPAS, 2005. 89 p. Brasil. Ministério das Cidades Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental. Programa de Educação Ambiental e Mobilização Social em Saneamento (PEAMSS). Caderno metodológico para ações de educação ambiental e mobilização social em saneamento. Brasília, DF: Ministério das Cidades, 2009. 100p. Costa, A.M. Análise Histórica do Saneamento no Brasil. Dissertação (Mestrado em Saúde Pública). ENSP, Fiocruz, Rio de Janeiro, 1994. 163f; Czeresnia, D; Freitas, C.M.de. (Orgs) Promoção da saúde: conceitos, reflexões, tendências. Rio de Janeiro: editora Fiocruz, 2003. 229p.; Fundação Banco do Brasil. Tecnologia social: uma estratégia para o desenvolvimento. Rio de Janeiro: 2004. 216p. Santos, M. Espaço e Método. 5ed. São Paulo: Editora USP, 2008. 120p.;

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Agroecologia Vida, que é vida? Produção é para a alimentação? O que será agroecologia? Falar, falar e falar em alimento saudável é agroecologia e biodiversidade? Buscar construir arquitetos, da nova agricultura, esses serão os guardiões da nova biodiversidade. Ser educadores, formadores e semeadores desse novo jeito de produzir a vida. Partir dos conceitos de produção e reconstrução da segurança e soberania alimentar para o povo. Produzir para além da alimentação saudável; necessitamos construir ambientes saudáveis. É tempo de fazer agroecologia. (Paulo Engelmann, camponês, Rio Grando do Sul)

Instituto Técnico de Estudos Agrários e Cooperativismo


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