2 1 s o l i tude
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índice
9 Solitude
mergulho em 42 Um si pela arte
caminho da 84 Obeleza
10 Abertura
arte 44 Tempo, e solitude
88 Na cozinha
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trabalho e vocação 26 Solitude,
60 Alinet
100 Interior 101 Um antídoto 102 Cidade Luz
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76 Olhe através
105 Ase opalavras caminho
e 80 Aqui agora
106 English Translations
escuta 82 aLagarta José González
116 Lade Negra Goya
direção criativa creative direction
equipe team
Carol Lancelloti Leo Pope
Alinet Bel Petri Cinthia Pascueto Crib Tanaka Fabiane Secches Fabíola Greco Fernanda Sala Fernanda Ventura José Carlos Suzuki Mari Naccaratti Paulinha Alves Tamires Ribeiro Thiago Tomé Veronica Fantoni Viviana Borlido
colaboradores collaborators Aline São Thiago Bruna Valença Bruna Venâncio Carol Aquino Carol Delgado Carol Incerti Cintia Paiva Géssica Hage Giovana Oliveira Jacqueline Sorelli Joana Castro Kauany Maria Kim Latieule Kristina Pavlov Mariana Ferrari Monika Dolna Olga Novikova Roberta Pope Shelley Kyne Taís Barcia Tatiana Ruediger Thiago Blumenthal Vanessa Mello Vitor Pessoa
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Solitude
A
cordo em silêncio total. O ar frio da manhã não intimida. Saio para ouvir o barulho do rio e sentar na grama úmida. Naquele momento, longe de casa, observando o dia começar e a natureza tomar seu rumo independente, entendo que o tempo do ser humano não tem valor ou função. É como se estivesse em uma zona neutra e sagrada, que não pode ser influenciada ou interrompida pelos ruídos de minha rotina habitual. Tudo ao redor parece acontecer em câmera lenta mas, na verdade, quem desaprendeu o estado natural das coisas fui eu. Como dançarinos que se concentram no escuro da coxia, ou crianças que não param de desenhar enquanto adultos resolvem problemas sem fim, naquele momento, nada mais importa. Trata-se de um feliz encontro com a solitude. Curioso – vocês devem pensar – uma revista que desde sempre foi produzida coletivamente escolher um tema como esse. Acontece que o estado de solitude é de extrema importância para a sociedade contemporânea, não só para sermos pessoas melhores mas também para o processo criativo. Tem sido difícil ser artista – focar, expressar-se e ser ouvido. Vivemos em tempos estranhos, desconexos, onde um argumento raso em uma rede social vale mais do que atitudes e experiências. E a falta de contato com nós mesmos está nos afastando uns dos outros. Por isso, solitude pode ser tudo o que precisamos quando o que vem de fora não traz mais respostas; e o que vem de dentro urge. A solitude pode ser simples. Não é preciso um retiro espiritual ou fuga. Muitas vezes, basta desconectar. Palavras e belas fotografias em outras publicações fizeram parte de minha formação como criativa ao longo dos anos, provando que pequenas experiências podem abrir grandes possibilidades e nos transformar significativamente como indivíduos. aLagarta espera ser essa pequena grande diferença na vida de quem nos acompanha. Uma experiência real. Fazemos, então, um convite à solitude; essa entrega voluntária e extraordinária que acontece quando algo especial e feito com amor nos inspira, resultando em uma jornada preciosa para dentro de nós mesmos.
Carol Lancelloti
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é preciso um caminho para se estar só – a frase se repetia na minha cabeça, enquanto eu ia num novo compasso, tempo-ritmo líquido, acompanhada apenas de certezas. abracei a mochila, abarrotada do que acredito ser suficiente: as roupas que mais repito, um chinelo, um caderno em branco e o amuleto: um anel antigo, lembrete do que deixei para trás. o novo era o tamanho do meu espaço. podia sentir aqueles pequenos frios, que antecedem expectativas, na pele. e uma fogueira subindo pelo rosto. meu corpo ganhava quatro estações, enquanto eu sabia, como quem sonha sonhos repetidos, que só é preciso um caminho para se estar. só.
Crib Tanaka
Carol Incerti
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Grã
direção de Carol Lancelloti e Leo Pope fotografia de Carol Lancelloti
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beleza e styling Carol Lancelloti e Fernanda Ventura modelo Tamires Ribeiro 24
Todas as peรงas acervo pessoal Todos os acessรณrios CLIN
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Solitude, trabalho e vocação texto de Carol Aquino, foto de Sonia Lancelloti
sol·i·tude /säl∂ ̦ t(y)oōd ̛ substantivo 1. o estado ou situação de estar sozinho “ela degustou suas últimas horas de liberdade e solitude”
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Estar sozinho não necessariamente significa estar solitário. Por erros do dia a dia – talvez costume – falamos sobre solitude mas utilizamos “solidão” em seu lugar. Entretanto, muitos derivam felicidade em estarem sozinhos. Tempo para reflexão íntima, concentração, produtividade, simplesmente curtir o ambiente ao seu redor. O prazer de estar consigo mesmo. Solitude traz à tona uma reflexão sobre si mesmo, o mundo ao seu redor, como encontrar a paz interior em meio ao caos da vida moderna. Entregar-se a esses momentos é cada vez mais raro. A dicotomia do universo perfeito exibido nas mídias sociais em contraposição à dureza da vida real é uma das discussões que permeiam o mundo das tendências. A linha tênue separando os dois reside no equilíbrio em que cada um encontra
entre expor-se (ou ser exposto) e retrair-se, olhar para si próprio. Não à toa, notícias como a saída das mídias sociais da blogueira e modelo australiana Essena O’Neill repercutem tanto, ou serviços como o AccountKiller.com são criados para auxiliar pessoas a deletarem seus perfis online de forma simples. Cada vez mais o papo do suicídio online surge em conversas casuais. Uma pesquisa feita nos Estados Unidos pelo Barna Group, companhia de pesquisas qualitativas da Califórnia, apontou que 16% dos cristãos entrevistados disseram que iriam parar de usar mídias sociais durante a Quaresma de 2015, mostrando como a desconexão com o mundo virtual já se apresenta de formas variadas no inconsciente coletivo. Estar online a todo momento cria um vazio interior, solidão. Uma persona sociável, cheia de eventos interessantes, fotos lindas e vídeos cativantes. Passa, porém, a maior parte de seu tempo criando estes “momentos perfeitos”, sem verdadeiras lembranças para guardar. Se antes nos entregávamos de corpo e alma à novidade da conectividade, agora buscamos um uso mais equilibrado. Permitimo-nos curtir momentos de felicidade sem a preocupação de retratar tudo ao mundo exterior; nosso mundo interior já é o suficiente para nos satisfazer.
JOMO is the new FOMO Foi a sentença enunciada por uma residente de Shoreditch, bairro (já nem tão) vanguardista de Londres. JOMO é o acrônimo de “joy of missing out”: a alegria em perder algo momentâneo, eventos, encontros, a estreia de uma nova série, a edição limitada do tênis feito por Kanye West, e por aí vai. Simplesmente por estar vivendo no presente, sem preocupar-se com o que os outros estão fazendo. Ela é a hashtag do momento e substitui FOMO, o “fear of missing out” – o medo de perder esses momentos tidos como únicos. FOMO ainda circula por aí, e quem pesquisar nas redes sociais verá que ele ainda tem sua força. Contudo, o palpite é que seus dias estão contados. FOMO, aliás, é a base de inúmeros artigos de psicologia e revela uma característica intrínseca da natureza humana: o instinto de sobrevivência. Os mais ágeis, fortes, inteligentes e perspicazes saem na frente. Darwin em sua melhor expressão. O problema é que não precisamos mais sobreviver como nossos ancestrais. Logo, os gatilhos psicológicos são inconscientemente utilizados e nos dão uma sensação de que, se não soubermos de todos os eventos que acontecerão no final de semana, não sobreviveremos à essa “batalha” da vida contemporânea. JOMO, por um outro lado, é a nossa personalidade mais sadia, que sabe dividir o real do ficcional, viver o momento presente sem ansiedade e obtendo prazer na atividade escolhida. A realidade é que ainda nos encontramos em um estado de “sonambulismo”. Sempre meio conectados, meio desligados. Estamos ainda alimentando o FOMO mas aspiramos ser estandartes do JOMO. (Nota da autora: perceba, aliás, a diferença entre “ser” e “estar” que é tão perfeita no português e captura de forma poética a nuance entre solidão e solitude). O prognóstico, mesmo que não aparente neste momento, tende a uma relação cada vez mais saudável com a conectividade. A proliferação de apps, serviços e produtos voltados para pessoas que buscam a solitude é reflexo de que há um mercado em plena expansão. Ele busca atender a essa demanda crescente de pessoas que querem continuar aproveitando os benefícios da tecnologia sem ter que abrir mão de forma extremada de sua conectividade. Apps para quem busca solitude ou não e demonstram essa tendência de redescobrimento do eu-interior e plenitude
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tais como o Stop, Breathe & Think, Calm e o Mindfulness Training são sucesso de downloads nas app stores. Eles te ajudam a controlar a ansiedade e focar mais no seu eu-interior. Mas o meu preferido é o Headspace, que ensina de forma simples a meditação – sem necessidade de incenso, roupas boho ou viagem inspiracional ao Tibet. E se você busca entender-se de forma mais profunda, o Movisol ou o Intuitive Delight traçam linhas psicológicas para cada um aprender um pouco mais sobre sua personalidade através de testes simples. O Movisol investiga a sua personalidade e te ajuda a identificar quem você é, sem a conotação binária e simplista de introvertido/extrovertido. Já o Intuitive Delight utiliza as definições psicológicas de Myers-Briggs (autores clássicos da psicologia) para caracterizar a sua personalidade e auxiliar a enxergar perante o mundo. Para aqueles que precisam focar no trabalho sem distrações, o LeechBlock é um add-on do Firefox que ajuda a bloquear sites de mídias sociais, entre outros, te ajudando a não procrastinar. Já o SelfControl é um aplicativo para Macs que bloqueia sites estabelecidos pelo usuário por até 24 horas. WriteRoom e Dark Room, para Macs e Windows respectivamente, são softwares que transformam os computadores em máquinas de escrever. Tudo é desativado a não ser os processadores de texto. O Concentrate faz com que tarefas fiquem mais fáceis ao bloquear no computador tudo aquilo que é inútil para completar aquela tarefa. O TrackTime diz quanto tempo você utiliza cada aplicativo do seu computador, enquanto o Time Out te avisa a dar um tempo a cada determinado número de minutos, para que você não fique como um zumbi por horas a fio olhando para a sua tela. Como foi mencionado no início do texto, solitude não quer necessariamente dizer solidão – e diversos apps atacam essa dualidade de frente, mostrando que quem curte viajar ou estar sozinho às vezes busca uma companhia. O Tripr te ajuda a encontrar parceiros de viagem, ou somente companheiros para momentos específicos da sua viagem solo. O Wandermates dá uma mãozinha extra às viajantes do sexo feminino e dá dicas sobre segurança e privacidade, e o EatWith te arranja companheiros para jantar durante uma viagem. Se o seu forte é comida, apps como Grouper, HomeDine e Grubwithus te dão alternativas para comer com desconhecidos, seja em festas organizadas pelo app (Grubwithus) ou num cenário com possibilidade de romance (Grouper). As inovações não param somente nos apps; a busca por solitude reverbera no design, arquitetura, música, moda, arte, em praticamente tudo à nossa volta. Um grande exemplo disso são as cores escolhidas pela Pantone para o ano de 2016. Ano especial, já que a empresa pela primeira vez decidiu optar por duas tonalidades (ao invés de somente uma) para encapsular os sentimentos dos consumidores ao redor do globo. Intituladas “Rose Quartz” (Quartzo Rosa) e “Serenity” (Serenidade), a Pantone descreve a escolha destas cores como uma representação da busca dos consumidores pelo eu-interior e bem-estar como antídotos ao stress do dia a dia. Elas fornecem uma sensação calmante de ordem e paz. Um fato interessante para quem tenta entender tendências de forma mais holística é perceber que essas cores são o estandarte de um movimento da
Permitimo-nos curtir momentos
de felicidade sem a preocupação de
retratar tudo ao mundo exterior; nosso mundo interior já é o suficiente para nos satisfazer.
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internet intitulado Seapunk. Apesar de pronunciar-se através de manifestações consideradas “frenéticas” como gifs e Vines, o Seapunk tem como base um retorno aos primórdios da internet – ou seja, o retorno ao conhecido, à ordem. A expressão gráfica do movimento abusa de tons pastéis (rosa, azul e lilás em particular) e evoca um web-design similar aos dos anos 90. Ele, que foi concebido na internet, saiu das telas e mostra suas expressões através dos cabelos coloridos “de sereia”, dos looks parecidos com os da série Um Maluco no Pedaço, do aumento do uso de emojis e até mesmo dos recentes comerciais epilépticos e supercoloridos da MTV. O Seapunk não vem de hoje, já circula pela web há quase 10 anos. Destaques de como o movimento foi incorporado pelo mundo pop são o clipe de Azealia Banks (Atlantis) e a apresentação de Rihanna no Saturday Night Live (Diamonds in the Sky). Seu espaço na mídia convencional cresceu exponencialmente nos últimos anos, ao encontrar eco em milhares de pessoas que sentem nostalgia. A apropriação da Pantone pode ter sido um pouco grosseira e até ofensiva, especialmente para quem segue o Seapunk de perto. Porém, a ideia central de normalidade, retorno ao conhecido, ao conforto, é o elo de ligação entre as cores do ano, o Seapunk e a solitude. Para finalizar, porém não menos importante: para aqueles que têm interesse em descobrir tendências, vale a pena ficar de olho nas relações de privacidade, segurança na internet e proteção de dados pessoais. Este é um debate que cresce no Brasil, especialmente temas como os dados que empresas como facebook captam e utilizam para vender espaço de propaganda, ou como pop-ups/banners são pesados (sem contar invasivos!) e acabam com os pacotes de dados de celulares/tablets. Estes são alguns temas que, por diversos aspectos, estão intimamente relacionados à diminuição na conectividade e busca pelo momento presente no mundo real. E já que solitude está intimamente conectada à reflexão, nada melhor que encerrar este artigo com um extrato de uma carta que Rainer Maria Rilke, um dos grandes poetas do século XX, escreveu a um poeta iniciante prestes a entrar no exército alemão. Este último pedia auxílio a Rilke, procurando direcionamento e inspiração para sua carreira como potencial poeta. O que é necessário, afinal, é somente isso: solitude, vasta solitude interna. Andar dentro de si mesmo e não encontrar ninguém por horas – isso é o que você deve conseguir fazer. Ser solitário como você era quando criança, quando os adultos andavam ao seu redor envolvidos em assuntos que pareciam grandes e importantes porque eles pareciam tão atarefados e porque você não entendia nada do que eles estavam fazendo. E quando você percebeu que as atividades deles eram decadentes, suas vocações petrificadas e não mais conectadas com a vida, por que não continuar a olhar tudo ao seu redor como uma criança, como se você estivesse olhando algo não familiar, fora do seu mundo, da vastidão de sua solitude, o que é em si mesmo um trabalho e uma vocação? (extraído de Letters to a Young Poet, Letter 6, tradução livre) Que essas preciosas palavras encontrem abrigo dentro de todos nós.
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poema de
fotos de Bruna Valença, styling de Kauany Maria produção de Cintia Paiva, beleza de Jacqueline Sorelli
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33 Boina e poncho Acervo Boutique, Calça Akomb Brincos e anel Trocando em Miúdos, Sandália acervo pessoal
Vestido Acervo Boutique Brinco Trocando em MiĂşdos
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38 Arranjo de flores e camisola Acervo Boutique Brincos e anel Trocando em MiĂşdos
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na página ao lado Chapéu Acervo Boutique, Colar Trocando em Miúdos Macacão Acervo Boutique, Bota acervo pessoal
assistente de fotografia Vitor Pessoa, modelo Joana Castro (Amazing Models)
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42 ARE YOU REALLY HERE, 2014. Materiais: espelho de duas faces, alumínio revestido a pó, tubos de neón, aço com revestimento em pó, transformadores. Dimensões: 100 x 100 x 10 cm Exibições: Playing future, Kunsthalle Kiel, DE, 2015. Cortesia: KÖNIG GALERIE, Berlin, 303 Gallery, Nova Iorque, e Galleri Nicolai Wallner, Copenhagen.
Um mergulho em si pela arte texto de Mariana Ferrari, foto Estúdio Jeppe Hein
Visitar uma exposição de arte é abrir-se ao desconhecido, enxergar novas formas, ideias e visões de mundo inesperadas. Para mim, um dos melhores momentos de solitude. Seja em um museu, em uma galeria, a céu aberto, estar em meio a produções artísticas me alimenta a alma e ajudar a criar e encontrar significado no dia a dia contemporâneo. Há cerca de um ano tive a chance de tirar um período sabático e morar em Nova York, a cidade que não dorme e que transpira arte, não só nos museus e galerias, mas no estilo de vida de seus moradores, na moda e na gastronomia. Abri os olhos para a arte que existe livre e é feita por quem quiser durante a própria vida. A experiência de ser estrangeira te deixa mais vulnerável a rever conceitos, conhecer algo novo e descobrir paixões e potenciais em si mesma. Experimentar a solitude fora da zona de conforto é uma das situações mais transformadoras da vida. Por lá, tive a chance de ver grandes obras de artistas que hoje admiro ainda mais. Como Yoko Ono, a japonesaaquarianafeminista que se mantém produtiva, do alto de seus 83 anos. O MoMA, Museu de Arte Moderna de NY, exibiu uma retrospectiva de sua carreira onde éramos recebidos com uma maçã sobre um pedestal de vidro escrito “apple”. Uma daquelas obras com potencial de serem menosprezadas pela “facilidade” da estética. Mas quem se entregava a ler e ouvir o que Yoko pensou ao criá-la descobria muito mais. Afinal, em 1966 isso era uma transgressão aos valores artísticos e até hoje traz para nós uma reflexão sobre democratização da arte e transitoriedade da vida. Quem diria que algo tão simples despertaria pensamentos muito profundos? Ah, e essa obra também foi um dos motivos que gerou a aproximação entre Yoko e o ex-beatle John Lennon, casal que fez da vida a dois também uma forma de arte, principalmente política. Ao sair da exibição, encontrei algumas amigas bem mais
novas que eu, e pude trocar uma ideia sobre o trabalho de Yoko. Mesmo não tendo visitado a mostra, sabiam da importância do livro Grapefuit, criado em 1961. Nele, lemos 150 pequenos textos de Yoko que são como “instruções” pra fazer arte, uma reunião das ideias mais possíveis às mais improváveis, todas guiadas pela imaginação da autora. Uma obra que ultrapassa as paredes do museu e influencia pessoas até hoje. Outro artista que expôs em NY enquanto eu lá estive foi Jeppe Hein. O dinamarquês construiu no parque ao lado da Brooklyn Bridge, uma das pontes mais antigas da cidade, a instalação Mirror Labyrinth, um labirinto de espelhos. Ao visitá-lo, mesmo não estando sozinha, eu vivenciei solitude em sua melhor forma. Tive alguns minutos para olhar para mim, ver meu reflexo se misturando ao horizonte de arranha-céus de Manhattan, uma experiência que encarei com total presença no momento – o que, além de ter dado uma boa pausa no dia a dia frenético, acabou por despertar uma reflexão sobre a realidade. Pude perceber que a escolha do espelho, nesse caso, e as ideias minimalistas e conceituais das obras de Hein, no geral, permitem aos espectadores conectarem-se com seu profundo “eu” e extraírem o significado do que veem e sentem. O interessante é que muitos de seus trabalhos também estimulam as interações sociais. Uma contradição? Quis saber como Hein vivencia isso como artista.
Experimentar a solitude fora da zona de conforto é uma das situações mais transformadoras da vida. Por email, ele respondeu: “Solidão e diálogo formam grande parte do meu processo criativo. Durante o projeto conceitual de uma obra de arte, estou em constante troca com pessoas diferentes: minha equipe de criação, minha galeria, gestores, minha família, curadores, visitantes e residentes. Silêncio e solidão são necessárias para resolver as coisas mas, principalmente, eu preciso de paz interior para manter o equilíbrio e concentrar a minha energia como pessoa e como artista. Na verdade, é semelhante à maneira como você experimenta o meu trabalho: ele te incentiva a comunicar-se com os outros, mas também oferece-lhe um momento para ouvir a si mesmo”. Quis trazer essas duas experiências internacionais para mostrar o potencial da arte em ajudar a reconectar-nos com nossa própria essência. É uma pena que a educação brasileira, em geral, não seja muito voltada para o ensino e a apreciação da arte. Mesmo com esse déficit, no entanto, estamos em um caminho de evolução, alcançando cada vez mais reconhecimento. Se o seu caminho nunca foi muito pavimentado pelas artes, mas sua alma sempre buscou se alimentar delas, abra os olhos, conecte-se com seu poder criador e aproveite as oportunidades culturais que se desenrolam a todo mundo, aqui ou lá fora. Seja para criar, para ver e, especialmente, para viver arte.
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Tempo, arte e solitude texto de Bruna Venâncio, ilustração de Paula Bonet Quando você se dedica à arte, seja como artista ou como apreciador, descobre rapidamente que o tempo é primordial. Não dá para ler poesia de verdade, se você não separa um tempo da vida para fazer isso. Não tem como aprender a tocar um instrumento, entender a harmonia de uma música, se você não estabelece isso como prioridade, se não define um tempo considerável de seu dia ou de sua semana para dedicar-se a isso. Estamos acostumados com a rapidez com que os dias passam e com que as informações chegam até nós, mas, aos poucos, temos percebido a importância do tempo. E a arte tem muito a ensinar sobre isso. É claro que não faz sentido pensar em desenvolver algum talento artístico por algum motivo que não seja a sua vontade de aprender arte. A arte existe para que possamos registrar a nossa realidade, propondo ou não mudanças. No limite, ela nos coloca em contato com as nossas fraquezas, enquanto seres humanos, nos ajuda a romper com ideias do senso comum e a recuperar a consciência de que somos humanos. Ela definitivamente não é autoajuda ou existe
sofreu mudanças quando os artistas, conhecidos como modernistas, influenciados pelas vanguardas artísticas da Europa, propuseram uma revisão da arte como a estávamos criando. Entre outras coisas, queriam que nos expressássemos de forma “mais brasileira”, pois não encontravam, na arte em curso, uma expressão que tivesse identificação com as massas. Quando os recursos estéticos que temos para representar determinadas ideias não dão mais “conta do recado”, é sinal de que as formas precisam ser revistas. Citamos a literatura e ela é, talvez, o melhor exemplo de que as mudanças no conteúdo exigem ajustes na forma. Basta dar uma boa olhada na produção de poesias dos anos 60, aqui no Brasil, para se ter uma ideia de que até a palavra foi (quase) destituída de tomar parte no texto poético e outras formas de expressão mais visuais ocuparam o seu lugar. A poesia visual pretendia acompanhar o leitor da época, mais acostumado a ler imagens, na sua rapidez ao transmitir as ideias, do que palavras. Sobre o momento em que vivemos, é sempre complicado
Aos poucos, temos percebido a importância do tempo. E a arte tem muito a ensinar sobre isso.
para nos ensinar a como viver a vida. Ainda assim, quando paramos para enxergar o traço, quando tentamos desenvolver o risco, quando paramos, de verdade, para ouvir uma música ou para aprender a tocá-la, somos capazes de apurar o olhar e os demais sentidos de tal forma que não é mais possível enxergarmos a nossa realidade da mesma maneira. Numa entrevista, a ilustradora Paula Bonet disse que, quando desenha o rosto de alguém, parece que passa a conhecer ainda mais essa pessoa, assim como ela mesma (já que ela pinta o rosto dela também, de vez em quando), independentemente de quão próximas elas são. De fato, quando desenhamos o rosto de alguém, enxergamos traços que sempre estiveram ali, mas que nunca demos conta de reparar. Uma das coisas que alunos de desenho mais relatam é justamente o fato de terem passado a observar melhor, de terem aprendido a olhar. Ler poesia é parecido. Isso porque você se pega tendo que ler o texto várias vezes, como se tivesse desaprendido a ler, como se, na primeira leitura, não tivesse botado reparo nas palavras que sempre estiveram ali. A arte tem esse poder de fazer a gente olhar com mais cuidado para as coisas. A propósito, as grandes transformações na moda e na arte surgiram justamente por mudanças na capacidade de olhar. Chanel, por exemplo, tinha uma imagem muito diferente das pessoas da época do que era uma mulher elegante e, por meio de sua marca, cunhou muito do que entendemos até hoje por elegância, livrando-nos, por exemplo, da sandice do espartilho. Aqui no Brasil, a nossa literatura
comentar, sobretudo, o que diz respeito à arte. Afinal, precisamos olhá-la com uma certa distância para poder analisá-la, e, por isso, o tempo é tão importante para a arte e para as ciências humanas. O que dá para afirmar é que as mudanças que acontecem na nossa vida irão influenciar a nossa produção artística atual; aliás, de acordo com Ernst Fischer, em A Necessidade da Arte, “não podemos deixar de reconhecer que as transformações artísticas de conteúdo e forma são (...) produzidas a partir de modificações econômicas e sociais. Em última instância, é o novo conteúdo que determina as formas”. E, se olharmos para a nossa sociedade, até a forma como lidamos com a vida profissional, como entendemos a importância dela para nós, tem mudado o suficiente para que repensemos modelos de trabalho. Da mesma maneira, o novo olhar sobre o consumo tem causado mudanças para o mundo da moda e criado uma nova consciência sobre o que compramos. No caso de quem está buscando momentos de reclusão voluntária, nos quais nos voltamos para nós mesmos, a arte pode ajudar a construir uma espécie de caminho inverso. Por mais que ela represente a realidade e, por isso mesmo, venha depois dela, existe a possibilidade de recorrermos primeiramente a ela para descobrirmos como é que enxergamos o mundo. A arte pode ser o primeiro passo para que você passe mais tempo consigo mesmo, para que passe a conhecer-se com maior profundidade e, só então, consiga entender o seu entorno.
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Taís
direção Carol Lancelloti e Leo Pope
fotografia Leo Pope
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lingerie Tulli short Acervo
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lingerie Tulli
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kimono, hot pant e acessรณrios Acervo
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styling e beleza Carol Lancelloti e TaĂs Barcia
modelo TaĂs Barcia
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Alinet
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direção Carol Lancelloti fotografia Carol Lancelloti e Géssica Hage
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chapĂŠu Mich Dulce, top Moon Lee, vestido Three Floor
VESTIDO Monika Dolna Couture
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jaqueta Olga Novikova, top Laura Theiss, saia Youjia Jin
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CHAPéu Harvy Santos, CHEMISE Youjia Jin, CALÇA Emma J. Shipley
guarda-chuva Duchesse, jaqueta Steven Tai, vestido-lenรงo Emma J. Shipley
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acessรณrio Harvy Santos, chemise acervo Alexa Chung para Marks and Spencer, Saia BySun
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Acessรณrio de cabeรงa, Harvy Santos Chemise, acervo Alexa Chung para Marks and Spencer Saia bordada, BySun
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macaquinho HOUSE OF QUEENS, Vestido rendado Laura Theiss, blusa chiffon Olga Novikova
styling Kim Latieule beleza Kristina Pavlov agradecimentos especiais Olga Novikova e Monika Dolna The Bridge House
Olhe através
Inspirações, criações e trajetória da Garimporio texto de Cinthia Pascueto
76 Apartamento no Jardim Botânico da arquiteta Natasha Frota foto MCA Estúdio
Poltrona Lurdinha, Coleção Davó foto Divulgação
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onheci o então trio criativo da Garimporio no ano passado, quando a designer de interiores Natasha Frota, a arquiteta Rafaela Lucena e a designer de produto Andrea Brito assinaram um dos espaços de maior destaque na mostra de decoração “Morar Mais por Menos”, no Rio de Janeiro. O loft de estilo nova-iorquino, mas com bossa brasileira e recheado de elementos alternativos, ideias de reaproveitamento e conceitos ainda visionários para a tradicional “arte de morar” foi o cartão de visitas desse grupo que se apresentou ao mundo fazendo barulho e levantando bandeiras. A principal delas foi o conceito de wabi-sabi, uma visão estética japonesa centrada na aceitação da transitoriedade e na beleza da imperfeição. Em tradução literal, wabi significa “quietude” e sabi “simplicidade”. Nesse quesito, chamaram a atenção o acabamento das paredes, que parecem manchadas pela ação do tempo e móveis que ganharam novos arranjos e funções. Em paralelo, o trio – agora dupla, com a saída de Andrea – lançou sua primeira coleção, batizada Davó: móveis garimpados nos acervos de família e em brechós ganharam nova vida, com direito a banho de cobre e capa de crochê. São ideias que se alinham com o despertar de um consumo consciente, que começa no design e na produção, lançando sobre os materiais e objetos um olhar criativo, transformador. Confira nas próximas páginas a entrevista e as fotos de projetos da Garimporio.
aLagarta: Contem-nos um pouco sobre a história de vocês. Natasha: Sou de Goiânia, cresci por lá rodeada do jeito simples típico do interior. Vim para o Rio quando tinha 18 anos. Depois de passar por alguns cursos, me formei em jornalismo, mas me encontrei de corpo e alma no design de interiores. Estou concluindo minha terceira graduação, em arquitetura e urbanismo. Eu não poderia fazer outra coisa senão criar, projetar. Rafaela: Eu nasci e vivi em Brasília até os 18 anos. Sempre quis ser arquiteta, mesmo sem ter contato com algum arquiteto. Talvez por ter nascido numa cidade projetada e nova me fez viver e ver a arquitetura de forma diferente. Vim para o Rio estudar, estagiei em escritórios pequenos e no final do curso comecei o estágio no Bernardes Jacobsen, onde trabalhei por quase seis anos antes de sair em carreira solo. aLagarta: Quais são suas maiores influências? Natasha: A casa da minha mãe foi uma grande influência. Eu brincava de arrumar a casa desde sempre. Nunca tivemos projeto de arquitetura no nosso apartamento, mas de algum jeito a estética era tão harmoniosa e inovadora na mistura de materiais, de cores, de móveis. A sala azul era linda, tão natural! Tinha uma atmosfera gostosa e aconchegante. Como também a casa da minha avó, onde aconteciam os grandes encontros de família. Era uma casa que
tinha uso, sabe? Acho que sempre busco trazer essa atmosfera nos projetos – da mesa cheia de gente, do café com pão de queijo no final da tarde. Imagino o espaço sendo vivido.A fotografia me influenciou muito na forma de olhar, no enquadramento, na composição, no equilíbrio de formas. Quando penso num espaço/projeto sempre levo isso em consideração. A fotografia também faz com que a gente olhe para o outro, trabalhe essa percepção do entorno. O olhar curioso é muito importante para o desenvolvimento do nosso trabalho. As viagens também alimentam a minha jornada e aumentam o meu repertório de cada dia. Conhecer novos lugares, novos olhares, me permite voar! Os encontros com culturas diferentes enriquecem tanto a alma da gente e nos fazem perceber que não tem certo ou errado. Existem diferentes formas de fazer, de usar. Tudo depende do que é solicitado, do objetivo. As viagens nos levam a desconstruir, a pensar fora da caixa. Rafaela: Eu também sempre gostei de mudar a casa da minha mãe toda de lugar. Ela ia trabalhar e eu mexia em tudo! Mudava meu quarto para o de hóspedes, os móveis da sala de lugar... Nunca consegui morar num espaço que não mude. Meu marido brinca: se eu não mudar de marido, tá bom! Viajar pra mim também é uma necessidade de alma. Volto renovada, recarregada.
aLagarta: Como vocês se conheceram? Como começou a Garimporio? Rafaela: Minha mãe é prima da mãe da Natasha, então somos primas também! Quando tive o segundo filho, resolvi curtir meu momento maternidade e optei por dar um break na arquitetura. Fiquei parada durante três anos. Voltei à ativa na construção da minha casa, na mesma época em que a Natasha se formou em design de interiores. Pedi que ela me ajudasse no projeto e começamos a trabalhar juntas. Deu tão certo que estamos aqui até hoje! aLagarta: O que é a Garimporio? Natasha: Somos um escritório de arquitetura e design. Nós contamos histórias através dos espaços e móveis que desenvolvemos. Gostamos de criar projetos com alma, casas com história. aLagarta: O que vocês buscam realizar e transmitir através da Garimporio? Natasha: Acolher, contar uma história e ressignificar o jeito de morar. A forma e a função, premissas básicas de uma boa arquitetura/design, vêm acompanhadas de um componente fundamental: a emoção, o sentir. Acreditamos que todo espaço ou objeto é vivo e as pessoas se relacionam de forma afetiva com o lugar que habitam e as coisas que o compõem. Buscamos criar projetos personalizados, povoados de histórias, de percursos, do jeito único de cada um. Partimos sempre do outro, da troca. Fazemos arquitetura e objetos com alma!
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Cadeira Hilda, Coleção Davó foto Divulgação aLagarta: Como é o processo criativo de vocês? Natasha: Tudo acontece através do olhar e perceber, dessa pesquisa diária da vida. Olhamos o mundo, as pessoas ao nosso redor, os nossos ídolos na profissão e os percebemos de alguma maneira, que junto com as vivências e experiências de cada uma, vão gerar ideias, novas criações. A vida como um todo é uma grande fonte de inspiração. Desde uma folha caída no chão ao pôr do sol que vai emocionar a alma com sua energia, inspirar com sua paleta de cores. aLagarta: Vocês têm algum método que auxilia nesse processo? Natasha: Pra mim funciona o estado de estar atenta às coisas ao meu redor. Esse exercício de ver através. De procurar nas entrelinhas. Esse olhar curioso em relação à vida, ao outro ajuda muito no meu processo criativo. Temos que estar abertos, sensíveis para poder captar, aprender e então fazer conexões. aLagarta: A coleção Davó tem uma relação muito forte com a memória afetiva e familiar não só pelo resgate de peças antigas, mas também pelas técnicas utilizadas, como o crochê, e pelo batismo em homenagem às avós de vocês. Qual o peso da memória no trabalho da Garimporio? Rafaela: Essa coleção não surgiu de caso pensado. Primeiro escolhemos os materiais que queríamos trabalhar, como o cobre, o crochê e o concreto. Depois escolhemos os tons pastéis. Quando colocamos tudo isso em composição com os móveis, foi que percebemos ali um universo que poderia ser o da avó! Natasha: Mesmo o conceito tendo acontecido dessa maneira, acredito que a história e o valor afetivo tem um peso muito forte em todos os trabalhos que desenvolvemos, principalmente quando estamos falando da casa. O lar tem que ter memória, a história de quem habita, afeto e amor. Enxergo a casa como nosso templo! aLagarta: Poderia dizer que a Garimporio tem uma vertente mais próxima ao “slow fashion”, com uma pegada sustentável? Por quê? Natasha: Talvez. Na coleção Davó exploramos bastante o conceito de “upcycling”, essa nova forma de fazer design a partir do reúso criativo de materiais de descarte – que no caso eram os próprios móveis abandonados, que ninguém queria. Gostamos dessa experiência, é um bom caminho para o design ter a consciência de não produzir aleatoriamente, usar o que já existe. aLagarta: Esta edição d’aLagarta tem como tema “Solitude” – um isolamento (ou reclusão) voluntário, quando o indivíduo busca estar em paz consigo mesmo. Qual a relação de vocês com o estado de solitude? Natasha: Acho importante esse isolamento em ocasiões oportunas. Às vezes preciso me retirar para “esvaziar o pote”, fazer a limpeza da alma, recarregar. Mas esse estado de paz não vem só do isolamento. Acredito que é alcançado quando estamos no nosso propósito, nos respeitando, quando se está onde se quer estar, por inteiro. Isso também tem que acontecer no cotidiano, quando estamos rodeados de gente, de informação.
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aLagarta: Vocês já buscaram a solitude em algum momento? Como foi? Natasha: Já cogitei frequentar um retiro de meditação Vipassana onde você fica dez dias sem falar com ninguém. Mas nunca de fato consegui chegar a esse nível de solitude. O contato com a natureza me traz um pouco dessa paz, dessa limpeza. Geralmente vou à praia dar um mergulho no mar ou para serra em Teresópolis, onde a família do meu marido tem uma casa. Lá é um desses lugares que você vai para limpar
a alma e reenergizar-se na natureza, ficar em silêncio, na calma, sem pressa. Também adoro ficar em casa, no meu canto, quietinha e segura, quando preciso recarregar minhas energias. Rafaela: Também preciso me recarregar na natureza ou praticando meditação. aLagarta: Qual a importância dessa reclusão para o processo criativo? Natasha: Acho importante esvaziar a mente, os conceitos, para que entre novas ideias e a percepção flua de uma maneira mais natural e verdadeira. Eu gostaria de ter mais momentos de reclusão.
Temos que estar abertos, sensíveis para poder captar, aprender e então fazer conexões. Acima, o apartamento no Jardim Botânico da arquiteta Natasha Frota. foto MCA Estúdio Abaixo, Banqueta Celina, Coleção Davó foto Divulgação
aLagarta: A casa pode ser esse lugar de isolamento, onde se busca a paz interior? Natasha: Com certeza. Porque ali é permitido ser você, ficar quietinha, entender-se, resgatar-se, descansar. Rafaela: Sim, mas com duas crianças em casa, nem sempre consigo. Preciso ir a outro lugar para acontecer esse momento! aLagarta: Qual o papel do lar nessa reclusão voluntária? Natasha: Acho que a casa da gente tem que nos abraçar. A casa deixa a gente segura, confortável, aconchegada e em paz. aLagarta: O que torna o lar seu lugar de refúgio? Rafaela: Lar é o local onde há harmonia, onde as pessoas vivem e sentem-se bem.
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Aqui e agora
Gabriela Machado e a solitude que liberta
texto de Fernanda Sala, foto de Pat Kilgore
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A tinta vermelha encharcada no pincel constrói a forma, as linhas, na tela branca. Cada pincelada é conduzida pela mão da artista que está prestes a traçar seus primeiros percursos poéticos. No momento de solitude, ela permite que esse tom tome vida, pulse, grite, exista. Ora forte, ora suave, o vermelho deixa de ser somente cor e se transforma, lentamente, em instrumento para o sentimento. Imersa na solidão criativa, a artista se conecta com o momento. A cena acima narra o cotidiano criativo de Gabriela Machado. Natural de Joinville, Santa Catarina (hoje vive na cidade do Rio de Janeiro), ela é conduzida pela relação entre natureza e corpo, tinta e epiderme, tela e movimento. “Minha poética vem de tudo o que está à minha volta, o olhar é construído por onde eu passo, por aquilo que eu vejo”, diz. Mas para permitir que essa poética se liberte, ela sente que precisa se isolar do mundo e entrar no estado de introspecção. A partir daí, o percurso flui e se materializa na profusão de cores que se harmonizam entre o bruto e suave, dando movimento e leveza às formas que parecem dançar na tela. Em seu ateliê, tempo, ócio e espaço se combinam para permitir que toda a alquimia de sentidos imantados no coração e no corpo da artista, transborde. E para que ela se sinta confortável para criar, a atmosfera de seu ateliê deve ser de tranquilidade. Gabriela diz que gosta de ficar sozinha para permitir que a inspiração a envolva por completo. Um reflexo disso é o desenvolvimento da série Vermelha, para a qual a artista passou quase dois anos em uma instalação pintando telas com a cor. De acordo com ela, o uso do vermelho vem da pulsação, “de fazer a obra se tornar viva”. Além das telas, Gabriela criou também uma escultura de papel higiênico suspensa no teto do ateliê, que servia de espaço para mergulhar no trabalho. A artista: a inspiração de Gabriela vem da natureza e das coisas simples. A história da sua família, seus gatos e plantas, a música e até mesmo seus passeios
O trabalho, na realidade, nunca está pronto. Ele faz parte de uma obra e de um pensamento. O momento de parar é aquele em que a própria obra pede.
pela feira do bairro trazem referências para a pintura, tornando-a efêmera. “Com certeza, toda a história da minha família e da casa em que morei na minha infância, que era toda pintada com afrescos nas paredes, fazem parte, hoje, da minha poética”, explica. Além disso, Gabriela se vale também da influência de artistas como o escultor romeno Constantin Brâncusi; o italiano Giorgio Morandi e o suíço Alberto Giacometti. De acordo com ela, foram artistas que mantiveram a vida e a obra na mesma esfera. Poética: “Cada artista tem sua forma própria de construir sua poética. No meu caso, meu trabalho vem do fazer e não de um projeto a priori”, diz ela. Seu olhar tenta tirar a verdade, a essência do que vê e sente – na maioria das vezes, invisível aos olhos físicos. “Só posso dizer que estar conectada com o frescor do fazer me torna uma pessoa mais perspicaz às coisas que estão ao redor de todos,” completa. Solitude: A solitude liberta o artista. Mas não é aquela liberdade no sentido estrito da palavra, de livrar-se das coisas, mas sim a que permite encontrar a verdade, face a face. De alcançar voos maiores dentro de si através da desconstrução, da renúncia dos valores do mundo. Portanto, o sentido de liberdade vem de se perceber e sentir-se e, a partir daí, transformar-se. A solitude é capaz de tornar toda essa busca pela essência, possível. O final dessa transcendência está na beleza do olhar de quem cria, que garante o frescor da arte. “O trabalho, na realidade, nunca está pronto. Ele faz parte de uma obra e de um pensamento. O momento de parar é aquele em que a própria obra pede”, diz. Assim, a solitude permite que Gabriela voe cada vez mais alto, alcançando horizontes de possibilidades e ideias. Impossível imaginar sua vida sem a arte. “Não consigo imaginar nenhuma outra realidade fora do que vivo aqui e agora”, encerra a artista.
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aLagarta escuta
José González texto de Vanessa Mello
Assim que soube o tema da edição, logo pensei em José González para essa coluna musical. Solitude me remete à calmaria e ao momento de esvaziamento da mente, para que a inspiração venha e o processo criativo flua. E a sonoridade de González tem tudo a ver com essa proposta! Nascido na Suécia, mas filho de pais argentinos, o cantor e compositor é dono de um vocal suave e de músicas calmas, sem urgência. É um folk/indie orgânico com voz e violão em ritmo tranquilo. Uma delícia para silenciar nossa mente! Desde a estreia em carreira solo com o álbum Veneer, em 2003, a beleza em relação ao som de José González sempre esteve relacionada ao minimalismo do cantor, com vocais que praticamente sussurram em nossos ouvidos, acompanhados de um violão simples e acústico, e um punhado de sentimentos. Meu destaque vai para a linda faixa Heartbeats. Apesar de ser hipnotizante, a sonoridade do seu segundo álbum, In Our Nature, de 2007, parece uma continuidade do seu primeiro registro. Para alguns, esse minimalismo extremo em dois álbuns seguidos significou uma limitada capacidade criativa. Até que veio a banda Junip, seu projeto paralelo com os músicos Tobias Winterkorn e Elias Araya, para nos mostrar as novas experiências de González, mais ritmadas e aceleradas. Uma prova de que é capaz de fazer mais, diferente e muito bem feito! A verdade é que a banda Junip foi o maior salto na carreira de González e trouxe a obra-prima Line of Fire, música que anunciou a última temporada de Breaking Bad.
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Divulgação
Solitude me remete à calmaria e ao momento de esvaziamento da mente, para que a inspiração venha e o processo criativo flua. E a sonoridade de González tem tudo a ver com essa proposta!
A banda também fez parte da trilha sonora do filme A Vida Secreta de Walter Mitty, protagonizado por Ben Stiller, que conta a história de um homem com uma vida comum e sem graça. Minutos antes de Walter sair de sua zona de conforto e questionar a sua vida para dar a volta por cima, José Gonzalez toca ao fundo. Apesar do longo hiato em sua carreira solo, os dois álbuns sensacionais pela banda Junip – Fields (2010) e Junip (2013) – não interferiram seus projetos individuais. Vestiges & Claws, de 2015, é o retorno de sua carreira solo, agora mais energética! González trabalhou sem ajuda de um produtor por não querer músicas polidas e “limpas” demais, e procurou inspiração em produções brasileiras, no folk/rock americano e no blues africano. O resultado é um registro absolutamente lindo, que explora temas como solidariedade, envelhecimento e a inevitabilidade da perda. E traz o que já era esperado pelos seus fãs: uma voz particular e muito violão, só que agora com guitarras, mais percussão e backing vocals. Pra ouvir em momentos de ócio criativo: Let It Carry You, Leaf Off / The Cave e Afterglow. Ouvindo com calma sua trajetória musical, não é difícil entender por que José González é considerado um dos artistas mais relevantes de sua geração. Cada música é um respiro, uma pausa na velocidade do mundo. Vale ouvir!
O caminho da beleza texto de Fabiane Secches, ilustrações de Thiago Thomé
I’m going to put myself in the way of beauty. Cheryl Strayed
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Na primeira cena de Livre, uma bela e silenciosa paisagem invade a tela. A suposta paz associada à natureza, no entanto, é perturbada pelo som de uma respiração ofegante, que poderia ser de prazer ou de dor. A cena de abertura nos dá uma pista do filme a que vamos assistir: a jornada que a protagonista Cheryl Strayed (Reese Witherspoon) se dispõe a percorrer em um longo hiking pela Pacific Coast Trail, trilha que atravessa a costa oeste dos Estados Unidos, poderia ser uma metáfora para outra ainda mais espinhosa, o caminho solitário de Cheryl em direção a si mesma após um longo período de autodestruição. Se soa óbvio demais, a verdade é que o simbolismo funciona – e o roteiro do inglês Nick Hornby também. Depois de perder a amada mãe de uma maneira repentina (pouco após o diagnóstico de um agressivo câncer na coluna), Cheryl viu toda sua vida ruir. Enquanto vivenciava um prolongado e complexo processo de luto, destruía seu próprio casamento e se colocava
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em risco ao fazer sexo com desconhecidos de maneira desprotegida e usar drogas cada vez mais pesadas. O filme foi inspirado no livro autobiográfico Livre – A Jornada de uma Mulher em Busca do Recomeço (editora Objetiva). O título de autoajuda poderia nos afastar da leitura, mas Cheryl é uma escritora habilidosa, que se implica inteiramente. Em ambos, livro e filme, acompanhamos sua trajetória entre obstáculos que parecem intransponíveis: o deserto, a neve, a sede, a fome e, principalmente, os espaços mais obscuros da sua mente. Fragmentos de memórias, algumas dolorosas e outras reconfortantes, serão sua fiel companhia durante todo percurso. São mais de 1700 km de uma longa jornada concreta por diferentes geografias, cada uma exigindo habilidades e superações diferentes. Durante três meses, dos quais na maior parte do tempo está completamente sozinha, Cheryl tem que se haver consigo, com suas feridas mais profundas. A enorme mochila nas costas, recheada de objetos inúteis, sequer faz sombra ao monstruoso peso interior que carrega. O que mais gosto em Livre é que, apesar de todos os clichês sobre superação que o permeiam, existe uma bonita verdade pulsando. Não se trata do esforço físico ou da natureza ensinando lições. Ao embrenhar-se trilha adentro, Cheryl está às voltas com seus pensamentos e sentimentos por uma porção de tempo considerável. É com muita raiva e hostilidade pela vida e por si mesma que ela vai precisar lidar. No lugar do imaginário de uma sabedoria zen que supostamente viria da simplicidade do mundo selvagem, vemos Cheryl ter de se confrontar com o que há de mais selvagem em si. A jornada não é de serenidade e autoconhecimento; é, antes, uma jornada de ira, de exorcização. Há muita energia circulando que não encontra saída, e não encontraria mesmo no suor e nas feridas causadas pela empreitada. Não encontraria mesmo nas unhas que vão caindo sanguinolentas pelo caminho. Seu corpo é pequeno como recipiente de tantos afetos – assim como as botas apertadas, que comprou um número menor do que deveria. Quando descobre que errou no cálculo e que poderia solicitar um par maior, Cheryl diz que pensou que os machucados causados por elas eram inevitáveis. O que ocorre é que algo nesse processo sinaliza novas possibilidades de sofrimento – e de não sofrimento. É essa criatividade recém descoberta que permite à energia contida novas formas de ligação e organização. Uma porta que se abre e sugere que a vida não precisa ser apenas repetição. Vale lembrar aqui que, para a psicanálise, o luto é mais do que um estado de pesar e sofrimento. Para Freud, o luto também é um trabalho psíquico que busca reordenar o investimento da libido (termo que usarei aqui como sinônimo de energia afetiva), libido essa que antes era investida no objeto perdido. De outro lado, o luto também é, segundo Lacan, um trabalho de reordenamento da posição que o próprio sujeito ocupava em relação àquilo que foi perdido. Ou seja: se antes Cheryl amava a mãe e se sentia amada como filha, agora está órfã de ambas posições. Não é apenas o seu amor pela mãe que vaga sem objeto vivo, mas também o seu desejo de ser amada (da forma que foi amada por ela), agora interdito pela morte que as separou. São dois trabalhos diferentes e ambos muito exigentes. “Vou andar até voltar a
ser a mulher que minha mãe acreditou que eu era”. Cheryl diz, em dois momentos distintos, que a mãe era o amor de sua vida e que com a mãe não apenas se sentia importante, sabia que era importante. Estas são duas faltas enormes, muito dolorosas, com as quais precisa lidar. Os homens com quem se relacionava sexualmente poderiam garantir, ao menos temporariamente, que se sentisse importante de outra forma. Mas não foi o bastante, e então as drogas vieram. Quando seu casamento também acabou, um novo luto a ser vivido foi acrescentado ao anterior, e o agravou. Através dessa jornada extrema, tão real quanto simbólica, Cheryl consegue ligar seu afeto também a novos objetos – inclusive a si mesma. Foi preciso experimentar novas maneiras de sentir tristeza e raiva para se permitir novas maneiras de sentir alegria e amor. A superação, ao final, não vem travestida de final feliz hollywoodiano. Naquele momento, pouco mudou do lado de fora – Cheryl não tem emprego, família ou qualquer dinheiro (apenas 2 centavos em sua conta) quando termina a trilha. Sabemos que, atualmente, ela é uma escritora respeitada, que se casou de novo e que tem dois filhos. Sabemos que essa história se transformou em um livro, que o livro se transformou em um filme, e isso talvez seja final feliz suficiente. Para mim, no entanto, não se trata dos feitos externos que obteve depois, mas de uma nova posição interna que essa jornada lhe permitiu: quando para de buscar explicações e justificativas para as suas ações do passado, e quando também para de se desculpar por elas, sai do papel de vítima e de carrasco e cogita duas hipóteses aparentemente contraditórias, mas que não se excluem: “What if I was never redeemed? What if I already was?” (“E se eu nunca puder ser redimida? E se eu já tiver sido?”). E termina: “How wild it was, to let it be.” (“Que selvagem foi isso, deixar ser/acontecer”).
O caminho da beleza não é o caminho da retidão, da salvação. O caminho da beleza é o caminho da verdade. O caminho da beleza não é o caminho da retidão, da salvação. O caminho da beleza é o caminho da verdade – e nada é mais genuíno do que acolher nossas contradições. Como escreveu Adrienne Rich, que é citada logo no início: “her wounds came from the same source as her power” (“suas feridas vieram do mesmo lugar que sua força”). Afinal, o caminho da morte também é o caminho da vida.
87 Livre (Wild, EUA, 2014). Direção de Jean-Marc Vallée. Roteiro de Nick Hornby, inspirado em livro homônimo de Cheryl Strayed. Com Reese Witherspoon, Laura Dern, Thomas Sadoski, Knee McRae e elenco. Duração aproximada de 115 minutos.
Na cozinha
com Fernanda Ventura
Sabe aquele momento em que é preciso esvaziar a cabeça dos pensamentos rotineiros e ocupá-la com uma mistura de sensações que preenchem a alma e nos proporcionam uma satisfação gostosa?! Então, esse é o momento ideal de ir pra cozinha testar novas receitas e se divertir com os ingredientes. O que fazer? Talvez fazer pão seja a melhor maneira de inovar, mesmo quando se trata da mesma receita, sem aquela obrigação de ter que dar certo. Fazer um pão é aproveitar o momento, é deixar fluir. Na minha cozinha, dificilmente um pão sairá igual na próxima vez (a tendência é sair cada vez mais gostoso...). A massa reage de acordo com o dia, com o tempo, com o humor, com tudo! Dá para acrescentar e substituir ingredientes de acordo com o momento, dá pra ser feliz espalhando farinha pela cozinha! Coloca uma música e vai! Tem tudo pra dar certo.
Pão de cerveja preta Uma receita superfácil do tradicional pão irlandês com toques brasileiros, que resulta em um sabor deliciosamente complexo e diferente. Na hora de escolher a cerveja, quanto mais amarga, maior o contraste com o melado (um dos ingredientes), e particularmente mais saboroso! 500g de farinha integral 2 colheres de chá de fermento químico em pó 25g de aveia integral 2 colheres de sopa de açúcar demerara 1 colher de chá de sal 50g de manteiga sem sal 1 colher de sopa de melado (capricha na colher!) 400ml de cerveja tipo stout (sugestão: Colorado Demoiselle) 80g de nozes picadas (a gosto)
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Fazer um pão é aproveitar o momento, é deixar fluir.
Pré-aqueça o forno em temperatura média e unte uma forma de tijolo grande (aquelas de pão de forma). Numa vasilha grande, misture a farinha de trigo, o fermento, a aveia, o açúcar e o sal. E em panela pequena, derreta a manteiga com o melado em fogo baixo, depois remova do fogo e adicione a cerveja. Adicione a mistura de cerveja à mistura de farinha, misture bem e acrescente as nozes. Coloque na forma e asse no forno médio por mais ou menos 40 minutos.
Os acompanhamentos e a mistura de sabores: Para acompanhar aquele cafezinho despretensioso da tarde, duas belas fatias de pão com manteiga irão te fazer sorrir. Se o momento for propício para uma leitura, experimente cortar alguns pedaços do pão e passar pasta de amendoim (sim, pode combinar, e muito, se quiser arriscar!) para beliscar e adoçar o dia enquanto lê. Ou então, para relaxar assistindo a um filme no final do dia, ou curtir uma musiquinha, nada melhor que uma cerveja gelada (de sua preferência) com finas fatias de pão e uma pastinha para acompanhar (sugiro uma pastinha de cottage com ervas e tomatinhos cereja cortados e passados no azeite).
Dicas valiosas - O pão fica ainda mais saboroso após esfriar por completo - Guarde-o num saco plástico para conservar
Cozinhar é o mais privado e arriscado ato. (Mia Couto, O Fio das Missangas)
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fotos de Tatiana Ruediger
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modelo Tatiana Ruediger
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Interior Se eu puder falar comigo mesmo, vou pedir um tempo para conversar sobre algumas coisas que andei esquecendo por aí. Não, não foi exatamente o celular que perdi. Foram outras coisas que têm a ver com a vida superconectada que a gente adotou meio que sem perceber nos últimos tempos. O que deixei em algum lugar foi o carregador da bateria da vida. O carregador da alegria que a cada encontro pessoal com os amigos fazia a gente se sentir renovado e rindo à toa no caminho de volta para casa. O carregador de sentimentos, que, a cada abraço, a cada beijo, fazia a gente esquecer o mundo inteiro ao redor e só se preocupar com um mundo particular girando lentamente sob as estrelas. Se eu puder enviar uma mensagem a mim mesmo, vou pedir um aplicativo para fazer uma viagem que venho adiando sistematicamente por conta da correria que a vida nos impôs sem lembrar bem para que nem para onde. Não uma viagem para longe. Não uma viagem de férias. Mas aquela volta ao meu interior, ao Eu que está sozinho respirando uma vida tranquila lá dentro de mim, onde a rotina cheia de agendas, multiconexões e networks não conseguiu um espaço. Vou esvaziar minhas malas, colocar toda a bagagem no fundo do armário e conhecer de alma limpa todo o espaço vazio que se coloca à minha frente. Abro a janela imaginária. A música do silêncio preenche a sala sem paredes. A leve brisa agita a roupa invisível do varal. Os pés descalços caminham em passos lentos em direção desconhecida. O papel em branco, o vazio transparente da alma. O sorriso que acalma o mar revolto, a lágrima que impulsiona o barco. A vida segue. A vida às cegas, bela e desafiadora.
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José Carlos Suzuki
Um antídoto Pro que a gente é não tem nome, você diz. Mas eu dou nome a tudo, você sabe. Você, silêncio, brisa, mansidão. Eu, barulho, maresia, explosão. Você, outono de folhas amarelas espalhadas pelas calçadas. Eu, todas as cores e andorinhas fazendo verão. Você é caminho pra dentro. Eu abro as portas, janelas, gavetas e entro. Você, linha da vida na palma da minha mão. Eu, muita areia pro seu caminhão. Era pra ser, torto assim, confuso assim, fugindo assim. Era pra ser, a partir de algum momento até quem sabe o que a gente hoje chama de cotidiano, aqui ou em outro lugar, dia a dia, mês a mês, ano a ano. Ou talvez não fosse, não força, não fossa. Mas aí meu pensamento dançou com o seu e deu bossa. Como é que faz pra voltar atrás se eu já nem me lembro mais? Deu liga, deu tilt, deu briga. E entre páginas de poetas marginais e álbuns de músicos mineiros inteiros, medo, saudade, crise, sorte e desejo: tudo numa tacada só. Eu, seu livro de história com trilha sonora. Você, o lugar onde eu gosto de estar.
Veronica Fantoni
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Cidade Luz Era março de 2015, eu tinha 25 anos de idade e uma ansiedade que mal cabia dentro dos meus 1,56m de altura. Ao lado do meu namorado, de algumas malas e de um carrossel de sentimentos, embarquei em um avião que me levaria ao outro lado do oceano e à realização de um sonho. Mas calma, não vamos nos apressar. Essa história não deveria começar aqui, não deveria começar assim. Essa história começou muito antes disso, quando eu “descobri” Paris. Quando descobri que é possível apaixonar-se por uma cidade ou, ao menos, apaixonar-se pela sensação que uma cidade causa na gente. Desde muito tempo, tanto quanto eu nem me lembro, Paris era um sonho para mim. Eu sempre admirei a cidade por todos os estereótipos que já conhecemos, mas que me encantavam e inspiravam de um jeito que nenhum outro lugar no mundo conseguia. E quando comecei a me interessar pelo universo da moda e a estudar mais sobre ele, a cidade então ganhou um significado ainda mais importante na minha vida. Era um amor difícil de explicar para os outros, mas muito claro para mim. Apesar de tudo isso, era muito difícil pensar em Paris, ou em qualquer outro tipo de viagem desse porte, como algo próximo de acontecer. Como uma estudante de jornalismo ainda em começo de carreira, com muito pouco dinheiro no banco e uma vida nova que incluía aluguel, comida e transporte para arcar, as prioridades eram outras. Passaram-se alguns anos a mais de sonhos, de trabalho, de contas a pagar, de decisões a tomar e de experiências sendo vividas, antes das coisas começarem a se ajeitar. E foi assim, meio sem perceber, que um dia eu olhei e vi que o sonho que antes parecia tão longe agora estava mais perto. Bem mais perto. Ali na esquina, praticamente, esperando para ser realizado. Era março de 2015.
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Sabe... É engraçado pensar nisso agora. Antes de ir viajar, eu imaginava que amaria Paris pelo que era. Pela torre gigante que estendia sua sombra sobre o Champ de Mars, pelos cafés e pâtisseries espalhados pelas ruas. Pelas floriculturas das esquinas, pelo idioma encantador, pelos croissants e macarons. Só não imaginava que amaria a cidade por tudo aquilo que Paris, mais do que nas ruas e lojas, nos monumentos e museus, me faria descobrir dentro de mim. A viagem foi aquilo que eu imaginava que seria. Com todo o encanto e beleza que eu supunha que teria e com todos os momentos mágicos que eu pensava que viveria. Mas foi muito mais do que isso também. Paris me mudou por dentro. Ela me fez pensar de uma forma muito mais clara sobre tudo que eu queria da minha vida dali para frente. Era como se cada nova descoberta na cidade me ensinasse não apenas sobre ela, mas sobre eu mesma. Sobre como eu era uma pessoa privilegiada em muitos aspectos por estar ali e por estar vivendo aquilo, sobre como eu deveria aproveitar as oportunidades que a vida e outras pessoas me davam para realizar meus sonhos. Por mais que eu tenha feito essa viagem com meu namorado, e tenha sido maravilhoso viver todos aqueles momentos com ele, muitas das coisas que vivi em Paris foram parte de uma experiência pessoal. Um momento de ser sincera comigo mesma como nunca havia sido antes, e de escolher o que faria, dali para frente, com as experiências e aprendizados. Mudei muito nessa viagem e acredito que sempre mudarei quando voltar para lá. Porque Paris tem esse poder sobre mim, essa força cósmica, esse carma. Um não sei quê que me faz mais do que bem, que me renova. Obrigada, Cidade Luz.
Paulinha Alves
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As palavras e o caminho O dicionário me convida à solidão. Mas na minha ficção de todo dia solitude é substantivo de desenhar estradas e curvas. Aprendi com as mulheres que enfeitiçam palavras antes de mim. Acredito na oração que usa lápis, borracha e papel. Lápis, pois nem tudo precisa ser rasura ou cicatriz. Quem ensinou foi uma mestra na dança das letras, Cristiane Lisbôa. É dela uma obra prima da solitude como tempo presente feminino: Papel Manteiga para Embrulhar Segredos – Cartas Culinárias. Antônia, na, e a partir da, escola de culinária nada ortodoxa, com gosto de especiarias e maresia. A descoberta do amor – por si, por seu dom e pelo moço que dança à luz da lua – e a cumplicidade das cartas para Bisa. Porque tem um brilho extra em sair do casulo e saber que a luz do sol esteve ali o tempo todo. É bom ter alguém com quem contar quando mergulhamos pra dentro. Também arquiteta de caminhos, Carola Saavedra nos apresenta Nina e o desafio de descobrir-se em movimento para reexistir todos os dias, em O Inventário das Coisas Ausentes: O corpo de Nina tem uma força inexplicável, como se fosse capaz de suportar qualquer peso, qualquer golpe, qualquer desencanto. O corpo de Nina, Antônia, Carola e Cristiane. O meu. O teu. Precisamos receber de braços, e abraços, abertos, de tempos em tempos, a densa leveza da solitude. Até que nossa solidez se desmanche no ar.
Carol Delgado
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english translation Solitude {p. 9}
filled with what I believe to be enough: the clo-
search of its balanced, ‘healthy’ use. We allow
by Carol Lancelloti
thes that I wear the most, flip-flops, a new no-
ourselves to enjoy happy moments without the
I wake up in total silence. The cold morning air
tebook and the amulet: an old ring, a reminder
need to report everything to the outside world.
does not intimidate me. I go out to listen to
of what I left behind. the new was the size of my
Our inner world being knowledgeable of them
the sound of the river and to sit on the damp
space. I could feel those little chills, that antici-
is already enough to satisfy our needs.
grass. At that moment, far from home watch-
pate expectations, on my skin. and a fire rising
‘JOMO is the new FOMO’.
ing the start of the day and nature taking its
through my face. my body gained four seasons,
This was stated by a resident of Shoreditch,
independent course, I see that a human being’s
while I knew, like those who dream repeated
a neighbourhood once known for being the
time doesn’t have value or use. It’s as if I was
dreams, that it only takes one path to be. alone.
epicentre of the hipster movement – and now already becoming a bit mainstream and passé.
in a neutral and sacred zone, which couldn’t be Solitude, work and calling {p. 26}
JOMO is the acronym for ‘joy of missing out’:
by Carol Aquino
the happiness in losing something momenta-
happen in slow motion, but I was actually the
noun
neous, an event, a date, the première of a new
one who had unlearned the natural state of
The state or situation of being alone
TV series, the limited edition of the new pair of
things.
“she savoured her last hours of freedom and
kicks by Kanye West, and so forth. To simply
As dancers that concentrate in the backstage’s
solitude”
live in the present, and not worrying what are
darkness, or children that keep drawing while
Being alone doesn’t necessarily mean feel-
others doing at this very moment. JOMO is the
adults solve their endless problems, at that mo-
ing lonely. Linguistic mistakes – or maybe just
new hashtag trending and substitutes FOMO,
ment, nothing matters. It’s a happy encounter
growing accustomed – we often talk about sol-
the ‘fear of missing out’. Obviously, FOMO is
with solitude.
itude yet use loneliness in its place. However,
still present and whomever searches for it on
Curious – you might think – that a magazine
many derive happiness in being alone. A time
the internet will still see its strength. But some
that has been produced collectively, has cho-
for reflection, to concentrate, to be productive,
say its days are done.
sen a theme like this. The reason for it is that
to just enjoy the space around you. The plea-
FOMO is already the basis for several psychol-
the state of solitude is extremely important to
sure of being by yourself.
ogy studies and triggers an intrinsic character-
contemporary society, not only so we can be
Solitude brings with it time to reflect about
istic of human behaviour: the survival instinct.
better people but also for the creative process.
yourself, the world around you, how to find
The more agile, stronger, intelligent and astute
It has been hard to be an artist – to focus, to
inner peace amidst the chaos of modern life.
lead the pack. Survival of the fittest – Darwin
express yourself and to be heard. We’ve been
Giving in into these moments is becoming rar-
at his greatest. The main issue with this trig-
living in strange times, disconnected, where a
er and difficult. The dichotomy of the perfect
gering is that we don’t need to survive like our
shallow argument on a social network has more
universe portrayed in social media versus the
ancestors once did. Therefore, the psychologi-
value than attitudes and experiences. The lack
harshness of real life is one of the main discus-
cal cues are unconsciously followed and give us
of contact within ourselves has been moving us
sions permeating the world of trend forecast-
a feeling that if we aren’t aware of every single
farther apart from each other. That’s why sol-
ing. The thin line between both resides in the
event that’s happening in a particular weekend,
itude can be everything we need when what
balance each finds between exposing him or
we won’t survive this ‘battle’ of contemporary
comes from the outside no longer brings an-
herself (or even being exposed) and retracting
life. JOMO, on the other hand, is our healthier
swers, and what comes from within urges.
back, looking inwards, back to themselves. It’s
personality, that comprehends that knowing (or
Solitude can be simple. It doesn’t have to be a
not a coincidence that news like blogger and
doing) everything is impossible, and knows how
spiritual retreat or an escape. Oftentimes, dis-
model Essena O’Neill completely leaving social
to live in the present without anxiety, actually
connecting is enough.
media have so much repercussion, or even ser-
feeling pleasure in whichever activity chosen.
Words and beautiful photos were part of my
vices like AccountKiller.com are created to help
We’re unfortunately still in a state of ‘somnam-
studies as a creator over the last years, proving
people to delete their online profiles in an eas-
bulism’; always half connected, half discon-
that these small experiences can open great
ier way. There’s a growing trend of ‘online sui-
nected. We’re still feeding our FOMO yet aspir-
possibilities and significantly transform us as
cide’ in casual conversations between friends.
ing to be the poster boys and girls of JOMO.
individuals. aLagarta hopes to be this little big
A research conducted in the US by Barna Group
The prognosis might not be apparent as of yet,
difference in the life of everyone who has been
stated that 16% of all Christians interviewed
but eventually we will have a healthier rela-
following us. A real experience.
said that they were going to stop using social
tionship with connectivity. The proliferation of
This is an invitation to solitude, this voluntary
media during Lent 2015 – an evidence that
apps, services and products targeting people
and extraordinary surrender, which happens
disconnecting from the virtual world is already
in search of solitude is a reflex that there’s a
whenever something special, inspiring and
showcasing itself through several different
market in expansion at the moment. It’s sup-
made with love results in a precious journey
ways in the collective unconscious.
plying the growing demand of people who wish
within ourselves.
Being online 24/7 creates an internal ‘empti-
to continue reaping the benefits of technology
ness’, loneliness. A sociable person, full of in-
without completely cutting themselves off from
Overture {p. 10}
teresting events to attend, beautiful images to
the internet.
by Crib Tanaka
showcase and captivating videos; yet, spends
Apps for those that are in search of solitude or
you need a path to be alone – the phrase repea-
most of his/her time creating these *perfect
not, but showcase this trend towards looking
ted itself in my head, while I was going in a new
moments*, without real memories to keep. If
inwards like Stop, Breathe & Think, Calm and
compass, liquid time-rhythm, accompanied
previously we would surrender, body and soul,
Mindfulness Training have very high download
only with certainties. I hugged the backpack,
to the novelty of connectivity, now we’re in
numbers at app stores. They help to control
influenced or interrupted by the noises of my usual routine. Everything around me seems to
106
anxiety and focus on your inner self. My favou-
their choice as a representation for consumers’
to start his career in the German army. He was
rite is Headspace, which teaches meditation in
search for their inner selves and wellbeing as
asking advice on inspiration for his potential fu-
a very simple way – no need for incense, boho
antidotes for daily stress. They are supposed to
ture career as a poet.
outfits or inspirational trip to Tibet. If you’re
bring a calming sensation of order and peace.
“What is necessary, after all, is only this: soli-
looking to understand yourself in a deeper way,
This choice of colours brings forward an inter-
tude, vast inner solitude. To walk inside your-
Movisol or Intuitive Delight trace psychological
esting fact to those that try to look into trend
self and meet no one for hours - that is what
profiles such that people can learn more about
forecasting in a holistic manner, as these are
you must be able to attain. To be solitary as
their own personalities through simple tests.
the colour pillars from the online-based Sea-
you were when you were a child, when the
Movisol assists you in finding your personality
punk movement. Even though its language was
grownups walked around involved with matters
traits, going further than that binary and sim-
often manifested through fast and repetitive
that seemed large and important because they
plistic introverted/extroverted definition. Intui-
Gifs and Vines, Seapunk has a basis on the ear-
looked so busy and because you didn’t under-
tive Delight uses the Myers-Briggs psychologi-
ly manifestations of the internet – the return
stand a thing about what they were doing.
cal definitions to characterize your personality
to the familiar, the ‘order’. The movement’s
And when you realize that their activities are
and assist you to see yourself in the world.
graphics expressions overtly use pastel tones
shabby, that their vocations are petrified and
For those that need to focus on work without
(pink, blue and lilac in particular) and emulates
no longer connected with life, why not then
distractions, LeechBlock is a Firefox add-on
the web-design of the 90s.
continue to look upon it all as a child would, as
that help block social media websites, among
The movement, conceived within the internet,
if you were looking at something unfamiliar, out
others, helping you leave procrastination be-
came off the screens and shows its ‘live’ ex-
of the depths of your own world, from the vast-
hind. SelfControl is an app for Macs that blocks
pressions through the mermaid hair trend, the
ness of your own solitude, which is itself work
websites pre-established by the user for up to
‘Fresh Prince of Bel Air’ looks, the increase in
and status and vocation?” ?” – taken from “Let-
24 hours. WriteRoom and Dark Room, for Macs
the use of emojis or even the recent seizure-in-
ters to a Young Poet, Letter 6”.
and Windows respectively, are softwares that
ducing and overtly coloured MTV adverts. The
May these precious words find shelter within all
transform computers into type-writers. Every-
Seapunk movement isn’t particularly new; it’s
of us.
thing is disabled apart from word processors.
been around the web for almost 10 years now.
Concentrate makes tasks easier by blocking
Highlights of how it was incorporated by the
everything within the user’s computer that is
mainstream media and the pop universe are
unnecessary to complete a specific task. Track-
Azealia Banks’ ‘Atlantis’ videoclip and Rihanna’s
Visiting an art exhibition means to open your-
Time says how much time you spend on every
presentation of ‘Diamonds in the Sky’ on Satur-
self to the unknown, to see new forms, ideas
application on your computer, and TimeOut
day Night Live. Its space on conventional media
and unexpected visions of the world. For me,
tells you to give yourself a break at specific in-
has grown significantly over the past few years,
one of the best moments of solitude. Wheth-
tervals, such that you don’t become a zombie,
finding echo in thousands of people who feel
er in a museum, in a gallery, roofless, being
staring at your screen for hours in a row.
nostalgia.
amongst artistic productions feeds my soul and
As previously mentioned here, solitude doesn’t
Pantone’s appropriation could even be seen
helps me to create and find some meaning in
necessarily mean loneliness – and several apps
as a tad blunt – even offensive, especially for
my daily contemporary routine.
tackle this duality, evidencing that there are
those who closely follow Seapunk’s develop-
About a year ago I had the chance of taking
people that enjoy travelling or being alone
ment. However, the central theme of normalcy,
a sabbatical period and lived in New York, the
sometimes like to spend time with others. Tripr,
return to the ‘known’, to ‘homely comfort’, is
city that doesn’t sleep and perspires art, not
for instance, helps you find travel partners or
the connecting link between the choice of the
only in museums and galleries, but in the life
just buddies for specific parts/locations of your
colours of the year, the Seapunk movement and
style of their residents, in the city’s fashion and
solo trip. Wandermates focuses on female trav-
solitude.
gastronomy scenes. I opened my eyes for the
ellers, giving tips about safety and privacy,
To end it in a high note: for those who are inter-
art that exists free and it is made by who wants
while EatWith helps in finding people to have
ested in trend forecasting, it’s worth to monitor
to create during their own life. The experience
dinner with during a trip. And if you’re inter-
the relationship between privacy, internet safe-
of being foreign makes you more vulnerable
ested in fine dining with potential new friends,
ty and data protection. This is a debate that will
to reviewing concepts, knowing something
apps like Grouper, HomeDine and Grubwithus
only grow stronger in Brazil, especially ideas
new and discovering passions and potentials
give you alternatives to eat with strangers,
around data that companies such as Facebook
in yourself. Experimenting solitude out of the
being in parties organised by the app (Grub-
gather and use to sell targeted advertising, or
comfort zone is one of the most transforming
withus) or in a more romantic setting (Grouper).
how pop-ups and banners are sucking up (nev-
situations in life.
The innovation doesn’t stop at apps or soft-
ermind just sucking…) consumers’ mobile data
There, I had the chance to see great works from
wares; the search for solitude already perme-
packs. These are just a few ideas that, for sev-
artists that I admire even more today. Like Yoko
ates through design, architecture, music, fash-
eral reasons, are intimately linked to the search
Ono, the japanese-aquarian-feminist who is
ion, arts, practically everything around us. A
to disconnect and a search for living the real
still productive, at the age of 83. MoMA, The
great example of this are the colours chosen by
moment.
Museum of Modern Art in New York City, ex-
Pantone for 2016. It’s a special year, as for the
Since solitude is deeply related to thinking,
hibited a retrospective about her career where
first time the company decided to choose two
nothing better than to end this article with a
we were greeted with an apple on a pedestal of
colours (rather than just one) to encapsulate
small excerpt from a letter that Rainer Maria
glass written “apple” on it. One of those piec-
consumers’ feelings around the globe. Entitled
Rilke, one of the great poets of the 20th cen-
es that has the potential for being overlooked
‘Rose Quartz’ and ‘Serenity’, Pantone describes
tury, wrote to an aspiring poet that was about
by the “easy” of its aesthetics. But whoever
A dive within yourself through Art {p. 42} by Mariana Ferrari
107
english translation dedicated themselves to read and hear what
to listen to yourself as well”.
first time around, you hadn’t noticed words that
Yoko thought when she created it found out
I wanted to bring these two international expe-
always have been there. Art has this power of
much more about it. After all, in 1966 this was
riences to show the potential of art in helping
making us look more carefully to things.
a transgression to the artistic values and until
us to reconnect to our own essence. It’s a pity
Incidentally, big changes in fashion and art
today it brings us a reflection on the democra-
that the Brazilian education, in general, doesn’t
happened due to this capacity in observing..
tization of art and transience of life. Who would
focus on teaching and appreciating art.
Chanel, for example, used to have a different
have thought that something so simple would
Even with this deficit, however, we are in an
image than people from her time of what was
stir up very deep thoughts? Oh, and this work
evolution path, reaching even more recogni-
an elegant woman and, through her brand,
was also one of the motives that led to the ap-
tion. If your way never was very paved by the
coined what we understand to this day as ele-
proch between Yoko and former Beatle John
art, but your soul always sought feed it, open
gance, freeing us, for example, of the nonsense
Lennon, a couple who made life also a form of
your eyes, connect yourself to your creator
of the corset. Here in Brazil, our literature suf-
art, mainly politics.
power and enjoy the cultures opportunities that
fered changes since the artists, known as mod-
When leaving the exhibition, I met some
unfold to everyone, here or out there. Be that
ernists, influenced by artistic vanguards from
friends that are younger than I am, and I could
to create, to see and, especially, to live art.
Europe, proposed an art review as we were creating it. Among other things, they wanted us
exchange some ideas about Yoko’s work with Time, art and solitude {p.44}
to express ourselves in a “more Brazilian” way,
by Bruna Venâncio
because they couldn’t find, in current art, an
fruit book, created in 1961. In the book, we
When you are dedicated to art, as an artist or
expression that the masses could identify to.
can read 150 small texts written by Yoko that
as an appreciator, you quickly find that time
When the aesthetic resources that we have to
are like “instructions” to make art, a reunion of
is essential. You can’t read real poetry. if you
represent specific ideas no longer work, it’s a
possible and also most unlikely ideas, all guided
don’t set aside time to do it. There is no way
sign that the form needs to be reviewed.
by the author’s imagination. A work that goes
to learn how to play an instrument, understand
We mention literature, and it is perhaps the
beyond the walls of the museum and influences
the harmony of a song, if you don’t set it up as
best example that changes in the content re-
people to this day.
a priority, if you don’t set a considerable time
quire adjustments on their form. A good look
Another artist that exposed in NY while I was
of your day or week to be dedicated to do it.
at the production of poetry from the Sixties in
there was Jeppe Hein. The Danish builted an
We are used to the speed of days going by and
Brazil is enough to have an idea that even the
installation called Mirror Labyrinth, a maze of
how fast information comes to us, but we have
word was (almost) deprived of taking its place
mirrors, in the park next to the Brooklyn Bridge,
come to realize, gradually, the importance of
on the poetic text, and other forms of more vi-
one of the older bridges of the city. When I vis-
time. And art has a lot to teach us.
sual expression occupied its place. Visual po-
ited it, even though I wasn’t alone, I had felt
Of course there is no sense in thinking about
etry intended to accompany the reader of the
solitude in its best way. I had some minutes to
developing some artistic talent for any reason
time, more used to reading images, quicker in
look at me, watching my reflection mixing with
besides your desire to learn about art. Art ex-
transmiting ideas than words.
the skyscrapers of Manhattan, an experience
ists so we may register our reality, proposing
Regarding the moment that we live in, it’s al-
that I faced with total presence on that mo-
changes or not. To its limits, it put us in contact
ways complicated to comment, especially,
ment – what, besides giving a good pause on
with our weakness, as human beings, helping
what is said about art. After all, we need to look
the frantic daily, finally awakened a reflection
us to break with ideas and common sense and
at it from a distance and then analyze it, and,
about the reality.
to recover the consciousness that we are hu-
therefore time is so important to arts and hu-
I could see that the choice of the mirror, in
man beings. It definitely isn’t self-help nor does
man sciences. What we can assure is that the
this case, and the minimalists and conceptual
it exist to teach us how to live. Nevertheless,
changes that happen in our lives will influence
ideas from the works of Hein, in general, allow
when we stop to see outlines, when we try to
our current artistic production; in fact, accord-
the audience to connect with the deep self and
develop a streak, when we really stop to listen
ing to Erns Fischer, in The Necessity of Art, “we
extract the meaning of what they see and feel.
to a song or to learn how to play it, we are ca-
have to recognize that artistic transformations
The interesting is that many of his works stim-
pable of sharpening the sight and other senses
of content and form are (…) produced by eco-
ulate the social interactions as well. A Contra-
in a such way that it is no longer possible for us
nomic and social modifications. Ultimately, it’s
diction, perhaps? I wanted to know how Hein
to see our reality the same way.
the new content that defines the forms”. And,
experience this as artist.
In an interview, illustrator Paula Bonet said that
if we look to our society, even in the way that
By email, he replied: “Solitude and dialogue
when she draws someone else’s face, it seems
we deal with our professional life, how we un-
both form a big part of my creative process.
that she gets to know the person better as well
derstand the importance of it, it has changed
During the conceptual project of art work, I am
as herself (since she paints her face too, once in
enough to make us rethink the current working
in constant exchange with different people: my
a while), no matter how close they are. Indeed,
models. In the same way, a new look towards
creation team, my gallery, the managers, my
when we draw someone’s face, we see features
consumption has caused change to the fash-
family, trustees, visitors and residents. Silence
that have always been there, but we never no-
ion world and has created a new consciousness
and solitude are necessary to solve the things
ticed. One of the things that students in draw-
about what we buy.
but, mainly, I need inner peace to keep the bal-
ing lessos frequently report is that they start to
When someone is seeking voluntary moments
ance and focus my energy as a person and as
be better observers, and have learnt to look.
of reclusion, when we turn to ourselves, art can
an artist. Actually, is similar to the way that you
Reading poetry is similar. Because you catch
help build a sort of reverse path. Although it
experience my work: it encourages you com-
yourself having to read the text over and over,
represents reality and, therefore, comes after
municating to others, but offers you a moment
as if you had forgotten how to read, as if, the
it, there is the possibility that we might first re-
them. Even not having visited the exhibition, they knew about the importance of the Grape-
108
aLagarta: What is Garimporio?
sort to art to find out how we see the world.
study, and my internships were in small offices
Art can be the first step for you to spend more
and at the end of university I started an intern-
time with yourself, to start to get to know your-
ship at Bernardo Jacobsen, where I worked for
self deeply and, only then, you can understand
six years before going out in a solo career.
furniture that we develop. We like to create
your surroundings.
aLagarta: What are your biggest influences?
projects with soul, houses with stories.
Since I can remember, I loved arranging the
convey through Garimporio?
Natasha: We are an architecture and design office. We tell stories through the spaces and
Natasha: My mom’s house was a big influence.
aLagarta: What do you hope to achieve and
Inspirations, creations and trajectory of the
house. The apartment never had an architec-
Garimporio
tural project, but somehow the aesthetics was
Natasha: To welcome, to tell a story and to give
by Cinthia Pascueto
so harmonious and innovative in the mix of ma-
I met the creative trio that formed the Garim-
terials, colors, furnitures. The blue living room
architecture/design, are accompanied by fun-
porio last year, when interior designer Natasha
was so beautiful, so natural! It had a delicious
damental components: emotion, feeling. We
Frota, architect Rafaela Lucena and product
and cozy atmosphere. Like my grandmother’s
believe that all spaces or objects are alive and
designer Andrea Brito signed one of the most
house as well, where the big family meetings
people connect affectively with the place they
prominent spaces at the decoration show
used to happen. It was a house that had use,
live in and the things that compose it. We seek
“Morar Mais por Menos” (Live More with Less
you know? I think I always seek bringing this at-
to create customized projects, filled with sto-
– acho legal incluir a tradução), in the Rio de
mosphere to the projects – people around the
ries, paths, and each person’s particular way.
Janeiro. The New York style loft, with a Brazil-
table, with coffee and cheese bread late after-
The starting point is always the other person,
ian touch and filled with alternative elements,
noon. I imagine the space being lived in.Pho-
the exchange. We make architecture and ob-
ideas of reutilization and visionary concepts for
tography has a big influence in my way of look-
jects with soul!
the traditional “art of living” were the special
ing, framing, in my compositions, and helped
features of the group, that introduce itself to
me to find balance in forms. When I think about
aLagarta: How is your creative process?
the world making a lot of noise and reaffirming
a space/project I always take this into consider-
and perceiving, from life’s daily research. We
Look through {p. 76}
new meaning for the way of living. The shape and the function, basic assumptions of good
Natasha: Everything happens through looking
concepts. The wabi-sabi, a Japanese ethical
ation. Photography also makes us look at each
look at the world, people around us, our idols in
view focused in the acceptance of the transient
other and work our surrounding perception.
our professions and we realize, somehow, that
and in the beauty of imperfection, was one of
Curiosity is very important for the development
together with each of our experiences, it will
them. In literal translation, wabi means “quiet-
of our work.Travelling also feeds my journey
generate ideas, new creations. Life itself a big
ness” and sabi “simplicity”. In this regard, they
and increases my daily repertoire. Getting to
source of inspiration. From a leaf on the ground
brought attention to the wall’s finishing touch
know new places, new views – it allows me to
to the sunset that thrills the soul with its ener-
that looks stained by the action of time and
fly! Being in contact with different cultures en-
gy, inspiring with its palette of colors.
furniture that gained new arrangements and
riches our souls so much and makes us realize
functions.
that there is no right or wrong. There are dif-
aLagarta: Do you have any methods that as-
In parallel, the trio – now, a duo since Andrea’s
ferent ways of making, of using. It all depends
departure, – launched their first collection,
on what is asked, and on the goal. Travelling
surroundings always works for me. It’s an ex-
named Davó: furnitures found in family collec-
lead us to deconstructing, to thinking outside
ercise of seeing through. Of reading between
tions and thrift stores gained new life, with cop-
the box.
the lines. This curious look about life, to others,
per bath and crochet covers. These are ideas
Rafaela: I also always liked changing things
helps a lot in my creative process. We have to
around in my mom’s house. She used to go
be open, sensitive, to collect, learn and then
sumption, which starts in design and produc-
work and I moved everything! I moved my room
make connections.
tion, launching a creative and transformative
to the guests’ room, changed the living room
look over the materials and the objects. Check
furniture… I could never live in a space that
aLagarta: The Davó collection has strong re-
out on the following pages the interview pic-
doesn’t change. My husband makes fun of me
not just by rescuing antique pieces, but also
tures of Garimporio’s projects.
saying: as long as you don’t change husbands,
by the use of techniques, such as the crochet,
aLagarta: Tell us a little bit about your history.
it’s okay! Travelling for me is a necessity of the
and because of the tribute of the name to your
Natasha: I’m from Goiânia; I grew up there,
soul, as well. I come back renewed, reloaded.
grandma (Davó = Grandma’s). What is the im-
surrounded by a simple way of living in the
portance of memory in Garimporio’s work?
countryside. I came to Rio when I was 18 years
aLagarta: How did you meet each other? How did Garimporio start?
Rafaela: My mom and Natasha’s mom are cous-
pose. First we choose the materials that we
aligned with an awakening of conscious con-
old. After taking some courses, I graduated in
sists you in this process?
Natasha: The state of being attentive to my
lation with the affective and familiar memory
Rafaela: This collection didn’t emerge on pur-
ins, so we are cousins as well! When I gave birth
wanted work with, such as copper, crochet and
in Interior Design.I am finishing my third grad-
to my second child, I decided to enjoy my ma-
concrete. After that we choose pastel colors.
uation, in architecture and urbanism. I couldn’t
ternity moment and chose to take a break from
When we put all this in composition with the
do anything other than create, and design.
architecture. This break lasted three years. I
furniture, we realized that it could be grandma’s
Rafaela: I was born in Brasília and lived there
went back to work for the construction of my
universe!
until I was 18 years old. I always wanted to be
house, around the same time that Natasha
an architect, even without having contact with
graduated in Interior Design. I asked her to help
Natasha: Even though the concept happened
this way, I believe that history and affective
any architects. Perhaps having been born in
me on the project and we started working to-
value has a very strong presence in the work
a planned, new city made me live and see ar-
gether. It turned out so right, that we are here
that we develop, especially when we talk about
chitecture in a different way. I came to Rio to
until today!
houses. A home has to have a memory, it has
Journalism, but I found myself, body and soul,
109
english translation to tell the story of who lives in it, it has to have
always possible. I need to go elsewhere so this
nature and the simple things. Her family story,
affection and love. I see a house as our temple!
moment might happen!
her cats and plants, music and even her walks
aLagarta: Could you say that the Garimporio
aLagarta: What’s the function of home on this
through the neighborhood fair bring references
voluntary reclusion?
for painting, making it ephemeral. “Certainly,
with a sustainable footprint? Why?
Natasha: I think that our house has to embrace
my entire family story and the house which I
us. The house makes us feel secure, comfort-
used to live on my childhood, that was all paint-
explore very much the upcycling concept, this
able, snuggled and in peace.
ed with frescoes on the walls, they’re part of my
new way of making design starting with the
aLagarta: What makes home become your fa-
poetry today”, she explains.
vorite place for refuge?
Besides that, Gabriela has the influence of
Rafaela: Home is the place in which you can
artists like the Romanian sculptor Constantin
has a strand closer to the slow fashion concept,
Natasha: Maybe. In Davó’s collection, we did
creative reuse of discard material – that were actually abandoned furniture, that no one wanted. We like this experience, is a good way
find harmony, where people live and feel good. Here and now {p. 80}
these artists maintained life and work in the
Gabriela Machado and the solitude that liber-
same sphere. Poetics: “Each artist has their
tude – a voluntary isolation (or reclusion), when
ates
own form to build their poetics. In my case, my
the individual seeks on be in peace with your-
by Fernanda Sala
work comes from making and not from a prio-
self. What is the relationship between you and
The red ink drenched on the brush builds the
ri project”, she says. Her vision tries take the
the solitude state?
forms, the lines, on the white canvas. Each
truth, the essence of is seen and felt – mostly,
Natasha: Isolation, I consider, is important in
stroke is conducted by the artist’s hand that
invisible to the physical eye. “All I can say is that
timely occasions. Sometimes I feel the need
is ready to trace her early poetic journeys. At
being connected with the freshness of making,
to withdraw, then “empty the pot”, making the
the solitude moment, she allows this tone to
makes me an aware person to the things that
soul clean, recharging. But this peace state
take life, to pulse, to yell, to exist. Sometimes
are all around”, she finishes.
doesn’t come only by the isolation. I believe
strong, sometimes soft, the red stops being just
Solitude: Solitude frees the artist. But is not
that is reached when we are in our propose,
a color and transforms, slowly, in an instrument
the freedom in the strict sense of the word, to
respecting ourselves, when we are where we
for feeling. Immersed in the creative solitude,
be free from things, but the kind that enables
want to be, fully. This has to happen daily as
the artist connects to the moment.
us to find the truth, face to face. It’s about the
well, while we are surrounding with people, and
The scene above narrates Gabriela Machado’s
resignation and deconstruction of the world’s
information.
everyday creative routine. Born in Joinville,
values so one can achieve larger flights inside
aLagarta: Did you search at any moment for
Santa Catarina (the artist now lives in the city of
him or herself. Therefore, the sense of free-
the solitude? How was it?
Rio de Janeiro), she is conducted by the relation
dom comes from perceiving and feeling and,
Natasha: I cogitated to attend a meditation
between nature and body, paint and epidermis,
from that, transforming. Solitude is capable of
retreat Vipassana, where you stay for 10 days
screen and movement. “My poetics comes from
making all this search for the essence possible.
without speaking. But I never really could get
everything around me, the look is built from
The end of this transcendence is in the beauty
in to this solitude level. The contact with the
where I step, from what I see”, says.But to allow
of the creator’s vision, which ensures the art’s
nature brings me a little bit of this peace, and a
that this poetics frees itself, she feels she needs
freshness. “The work, in reality, is never done.
sense of cleaning. Usually I will go to the beach
to isolate herself from the world and enter an
It is part of a larger piece and of a thought. The
to diving at sea, or to Teresópolis, at a moun-
introspective state. From there, the course
moment to stop is when the work itself asks for
tain range, where my husband’s family has a
flows and materializes itself in the profusion of
it”, she says.
house. There is one of these places that you
colors that harmonize between the brute and
So, solitude allows Gabriela to fly higher, reach-
go to clean the soul and energise yourself in
soft, giving movement and lightness to the
ing horizons of possibilities and ideas. It is im-
nature, remaining in silent, calm, and leisurely.
shapes that seem to dance on the screen. At
possible to imagine her life without art. “I can’t
I also love staying at home, in my own space,
her studio, time, idleness and space combine
imagine another reality out of what I live here
quietly and secure, when I need recharging my
to allow all the alchemy of sense magnetized
and now”, she adds.
energy.
in the heart and on the artist body, overflows.
Rafaela: Also I need recharging myself in na-
Her studio must provide tranquility atmo-
ture or practicing meditation.
sphere, so she can feel comfortable to create.
aLagarta: What is the importance of this reclu-
Gabriela says that she likes to stay alone and
As soon as I heard the edition’s theme, I im-
sion to your creative process?
allow the inspiration to completely involve her.
mediately thought of José González for this
Natasha: I think important to empty the mind
A reflection of this is the development of the
column. Solitude brings me to the lull and to
and the concepts, so new ideas and percep-
series Red, for which the artist spent almost
emptying the mind, so that inspiration can
tions can flow in a natural and real way. I would
two years inside an installation painting can-
come and the creative process can flow. And
like to have more reclusion moments.
vases with the color. According to her, the use
the sound of González has everything to do
aLagarta: Can the house be this isolation place,
of red comes from pulse, “of making the piece
with this proposal!
where you search inner peace? Why?
become alive”. In addition to the canvases, Ga-
Born in Sweden, but from Argentinian parents,
Natasha: Certainly, because there, you are al-
briela also created a toilet paper sculpture sus-
the singer and songwriter is owner of a smooth
lowed to be you, to be quiet, understood, and
pended on the studio’s ceiling, which served as
vocal and calms songs, without urgency. It is an
rescued; to breathe.
a space to dive into the piece.
organic folk/indie sound with voice and acous-
Rafaela: Yes, but with two kids at home, it’s not
The artist: Gabriela’s inspiration comes from
tic guitar that comes in a calm rythm. A delight
domly, but using what already exists. aLagarta: This issue of aLagarta is about soli-
110
Brâncusi; the Italian Giorgio Morandi and the Swiss Alberto Giacometti. According to her,
to consciousness design and not produce ran-
aLagarta listens to: José González {p. 82} by Vanessa Mello
The way of beauty {p.84}
hostility with life and with herself.
by Fabiane Secches
Instead of an imaginary zen wisdom that would
neer, in 2003, the beauty of José González’s
I’m going to put myself in the way of beauty.
supposedly come from the simplicity of the wild
sound has always been related to the singer’s
Cheryl Strayed
world, we see Cheryl facing what is wildest in
minimalist style, with vocals that practically
In the first scene of Wild, a beautiful and silent
herself. The journey is not about serenity and
whisper in our ears, accompanied by a simple
landscape invades the screen. The supposed
self-knowledge; before that, it is an angry jour-
acoustic guitar, and a handful of feelings. My
peace associated with nature, however, is dis-
ney, and an exorcism. There is a lot of energy
highlight goes to the beautiful song Heartbeats.
turbed by the sound of puffy breath, which
circulating and it doesn’t find a way out, even
Despite being hypnotizing, the sonority of
could be of pleasure or ache. The opening
with all the sweating and wounds caused by the
his second album, In Our Nature, from 2007,
scene gives us a clue of the movie that we’re
journey. It couldn’t find a way out even with the
seemed a continuation of his first record. For
about to watch: the journey that the protago-
nails that drop bloody on the way. Her body is
some, this extreme minimalism in two albums in
nist Cheryl Strayed (Reese Witherspoon) takes
small as a container with so many emotions –
a row meant a limited creative ability.
on a long hike through Pacific Coast Trail, a
as are the tight boots, that she bought a size
And then the band Junip came along, a side
trail that crosses the west coast of the United
smaller. When she finds out that she misscal-
project with the musicians Tobias Winterkorn
States, could be a metaphor to another even
culated and that she could request a larger pair
and Elias Araya, to show us González’s new ex-
more thorny, Cheryl’s lonely road towards
of shoes, Cheryl says that she thought that the
periences, more rhythmic and accelerated. A
herself after a long period of self-destruction.
injuries caused by them were unavoidable.
proof that he’s capable of doing more, different
If it sounds too obvious, the truth is that the
What happens is that something on this pro-
and very well done!
symbolism works – as does British author Nick
cess signals new possibilities of suffering – and
The truth is that the band Junip was the biggest
Hornby’s script.
not suffering. It’s that new found creativity that
step in González career and brought the mas-
After suddenly losing her beloved mother (just
makes it possible for the energy contained to
terpiece Line of Fire, song that announced on
after the diagnosis of an aggressive spinal
transform itself into new connections and orga-
the last season of Breaking Bad.
column cancer), Cheryl saw her life fall apart.
nization. A door that opens and suggests that
The band is also part of The Secret Life of Walter
While experiencing a long and complex process
life doesn’t need to be only repetition.
Mitty’s soundtrack, a film starred by Ben Stiller,
of mourning, she destroyed her own marriage
It is important to note that, for psychoanalysis,
which tells the story of a man with a common
and put herself at risk when having unprotect-
mourning is more than a sorrow and a suffer-
and boring life. Minutes before Walter gets out
ed sex with strangers and increasingly using
ing state. For Freud, mourning is a psychic work
of his comfort zone and starts questioning his
heavier drugs.
that aims to reorder the investment of libido (a
life, José González plays in the background.
The movie was inspired in the autobiographic
term that I will use here as synonymous of af-
Despite the long hiatus in his solo career,
book Wild – From Lost to Found on the Pacific
fective energy), which was once invested in the
the two amazing albums by the band Junip
Crest Trail (Alfred A. Knopf publishing compa-
lost object. On the other hand, mourning is too,
– Fields (2010) and Junip (2013) – didn’t stand
ny). The selfhelp translated title in Portuguese
according to Lacan, a job of reordering the po-
in the way of his individual projects. Vestiges
could keep us away from the reading, but Cher-
sition that the subject itself occupied in relation
& Claws, from 2015, is the return of his solo
yl is a skilled writer, that fully implies herself.
to that was lost. In other words: if Cheryl loved
career, now more energetic! González word-
On both the book and the movie, we follow her
her mother and used to feel loved as a daugh-
ed without any production help because he
trajectory between obstacles that look insu-
ter, now she is an orphan of both positions. It’s
didn’t want songs too polished and “clean”, and
perable: the desert, the snow, thirst, hunger
not just the love for her mother that wanders
searched for inspiration in Brazilians produc-
and, mainly, the darkest places inside her mind.
without a living object, but also the desire of
tions, in American folk/rock and in the African
Fragments for memories, some of them painful
being loved (the same way she was loved by
blues. The result is an absolutely beautiful re-
and others, heartwarming, will be her faithful
her mother), now interdicted by death that
cord, that explores themes as solidarity, aging
company during her path. There are more than
separated them. There are two different works
and the inevitability of loss. And it brings what
1700 km of a long concrete journey through
going on and they both are very demanding. “I
was expected from his fans: a peculiar voice
different landscapes, each one requiring differ-
will walk until I am the woman that my mother
and a lot of his acoustic guitar, only now with
ent skills and overcoming challenges. During
believed that I was”.
electric guitars, more percussion and backing
three months, of which she is completely alone
Cheryl says, in two different ocasions, that her
vocals. To listen in creative leisure moments:
most of the time, Cheryl has to get in touch
mother was the love of her life and also that
Let It Carry You, Leaf Off / The Cave e Afterglow.
with herself, with her deepest wounds. The
with her mother she felt not just important, but
Listening calmly his musical path, it is not dif-
huge backpack on her back, stuffed of useless
she knew that she was important. These are
ficult to understand why José González is con-
objects, doesn’t even overshadow the mon-
two big empty and very painful losses, which
sidered one of the most relevant artists of his
strous inner weight that she bears.
she needs to deal with. The men who she used
generation. Each song is a new breath, a pause
What I like the most in Wild is that, despite of
to have sexual relatations with could ensure, at
in the speed of the world. Worth listening to!
all the clichés about overcoming that permeate
least temporarily, that she felt, somehow, im-
the story, there is a beautiful and pulsing truth.
portant. But it wasn’t enough, and then came
It is not about the physical effort or nature
the drugs. When her marriage ended too, a
teaching lessons. While embroiling herself into
new mourning was added to the previous, and
the path; Cheryl is involved with her thoughts
it worsened. Through this extreme journey, as
and feelings for a considerable time. Neverthe-
real as it’s symbolic, Cheryl is able to connect
less, she needs to deal with the anger and the
her affection to new objects– including herself.
to silence our mind! Since his debut solo career with the album Ve-
111
english translation It was necessary to try new ways of feeling sad-
day, the time, the mood, and everything! You
ness and rage to allow new ways of feeling joy
can add and replace ingredients according to
and love.
the moment, you can be happy spreading flour
If I can talk to myself, I’m going to ask for some
The overcoming, at the end, doesn’t come as
through the kitchen!
time to discuss about some things that I’ve lost
a usual Hollywood happy ending. At that mo-
Turn up some music and go! Everything will
in the way. No, it wasn’t exactly the cellphone
ment, little has changed outside – Cheryl has
work out just fine.
that I lost. It was other things that are related
no job, no family or any money (just 2 cents in
Black Beer Bread
by José Carlos Suzuki
to a super connected life that we have adopt-
A super easy recipe of the traditional Irish
ed without notice lately. What I left some-
We know that, currently, she is a respected
bread with Brazilian touches that results in a
where was life’s battery charger. The happi-
writer that got married again and has two chil-
delicious, complex and different flavor. When
ness charger that with each personal meeting
dren. We know that her story was transformed
choosing the beer, the more bitter, the higher
with friends made we feel renewed and laugh
into a book, then the book transformed into a
the contrast with honeyed (one of the ingredi-
randomly on the way back home. The feelings
movie, and that perhaps is enough as a happy
ents), and it is particularly tastier!
charger, that, in each hug, in each kiss, made
ending. For me, however, it is not about of the
500g of integral flour
us forget the whole world around us and only
external effects that she obtained afterwards,
2 tea spoons tea of yeast chemical powder
worry about our private world turning slowly
but about new internal position that this jour-
25g of integral oat
under the stars.
ney allowed her to take: when she stopped
2 soup spoons of demerara sugar
If I can send a message to myself, I will ask for
seeking explanations and justifications for her
1 tea spoon of salt
an app to make a trip that I have been system-
past actions, and when she stopped finding ex-
50g of salt free1 soup spoon of honeyed (bring
atically putting off because of the rush that life
cuses for them, leaving the victim and execu-
it on with that spoon!)
imposes on us without even remembering what
tioner role, considering two apparently oppos-
400ml of stout beer (suggestion: Colorado
for. Not a far away trip. Not a holiday trip. But
ing assumptions, but that do not exclude each
Demoiselle)
the one back inside, to the Self that is alone
other: “What if I was never redeemed? What if
80g of chopped walnuts (to taste)
breathing peacefully life within me, where
I already was?”. And ends: “How wild it was, to
Preheat the oven to an average temperature
the routine full of meetings, connections and
let it be.”
and grease a big brick (those for bread loaf).
networks failed to find room. I will empty my
The way of beauty is not the way of righteous-
In a big bowl mix the wheat flour with the bak-
bags, put all the luggage deep in the closet and
ness, of salvation. The way of beauty is the way
ing powder, oats, the sugar and salt. Then, melt
through my clear soul, get to know all the emp-
of truth – and nothing is more genuine than
the butter in a small pot with honeyed on low
ty space that is in front of me.
welcoming our contradictions.
heat, remove it from the fire and then, add the
I open the imaginary window. The music of
Adrienne Rich wrote, which is quoted early on
beer.
silence fills the room without walls. The light
the movie: “her wounds came from the same
Add the beer mixture to the wheat flour mix-
breeze shakes the invisible hanged clothes.
source as her power”
ture, mix well, and add the walnuts.
Bare feet walk in slow steps toward to the un-
The path of death is the way of life, after all.
Put it in the form and cook it in the oven for
known.
-----
about 40 minutes, average temperature.
A blank paper, the soul’s transparent empti-
Wild, EUA, 2014. Direction of Jean-Marc
Valuable tips
ness. The smile that calms down the scrambled
- The bread becomes even tastier after cooling
sea, the tear that boosts the boat. Life goes on.
onymous book of Cheryl Strayed. With Reese
down completely
Blindly, beautiful and challenging.
Witherspoon, Laura Dern, Thomas Sadoski,
- To conserve it, keep it in a plastic
Knee McRae and cast. Approximate duration of
The siders and the mixed flavors:
An antidote {p. 101}
coffee in the afternoon, two beautiful bread
For what we are there’s no name, you say. But
In the kitchen {p. 88}
slices with butter will make you smile.
I name everything, you know. You, silence,
by Fernanda Ventura
If it’s a good time for reading, try cutting the
breeze, meekness. Me, noise, sea spray, ex-
Do you know that moment when to empty the
bread in pieces and pasting peanut butter on it
plosion. You, autumn of yellow leaves spread
mind of routine thoughts is needed and occu-
(yes, it can work, a lot, if you willing to risk it!)
through the sidewalks. Me, all the colors and
py it with a mixture of sensations that fill in the
to sweeten the day while you read.
swallows doing summer. You are the way in.
soul and give us a tasty satisfaction?!So, this is
Or, to relax watching a movie at the end of the
I open the doors, windows, drawers and en-
the ideal moment to go to the kitchen to test
day, or to enjoy some music, nothing better
ter. You, life line on my palm. Me, way out of
new recipes and have fun with the ingredients.
than a cold beer (your preference) with thin
your league. It was meant to be, crooked like
What to do?
slices of bread and pastries to go along (I sug-
this, confuse like this, running away like this.
Maybe making bread might be the best way
gest cottage pastry with herbs and cherry to-
It was meant to be, from some moment un-
of innovating, even when it is about that same
matoes sliced and pressed in olive oil)
til who knows what we named today as “daily
recipe, without that obligation of having to go
Cooking is the most private and risky act.
life”, here or somewhere else, day after day,
right. Making bread is to enjoy the moment, to
(Mia Couto, String of Beads)
month after month, year after year. Or maybe it
her account) when she ends the trail.
Vallée. Script of Nick Hornby, inspired by hom-
115 minutes.
112
Inside {p. 100}
To go along with that unpretentious small black
by Veronica Fantoni
let it flow.
wasn’t, don’t pushing it, no blues. But then my
In my kitchen, a new bread never comes out
thought danced with yours and resulted in bos-
like the one before (it tends to be tastier each
sa. How can we go back if I can even remember
time…). The dough reacts according to the
anymore? It was linked, it crashed, it became
a fight. And all between pages of marginal po-
The trip was just what I imagined it would be.
capable of supporting any weight, any blow, any
ets and albuns of musicians from Minas Gerais,
With all the charm and beauty that I supposed
disenchantment.
fear, missing, crisis, luck and desire: everything
it would have and with all the magical moments
Nina’s body, Antônia, Carola and Cristiane.
in a single shot. Me, your history book with a
that I thought I’d live. But it was a lot more than
Mine. Yours. We need to receive with open
soundtrack. You, the place where I really like
that too. Paris changed me inside. It made me
arms, and hugs, from time to time, the dense
to be.
think more clearly about everything I wanted
lightness of solitude. Until our solidity dissolves
for my life from that point.
in the air.
City of Light {p. 102}
It was like each new discovery in the city would
by Paulinha Alves
teach me not only about itself, but about
It was March of 2015, I was 25 years old and
myself. About how I was a privileged person
the anxiety could barely fit into my 1,56m
in many ways for being there and living that,
If inside earth is colder, but down there is
height. Alongside my boyfriend, some bags
about how I should enjoy the opportunities
warmer, I should open all the senses beyond
and a carousel of feelings, I boarded a plane
that life and other people gave me to fulfil my
limit.
that would take me to the other side of the
dreams.
Almost beyond, when I’m almost sleeping.
ocean and to the realization of a dream. But
Although I made this trip with my boyfriend,
Because in those minutes I do a lot more than
calm down, let’s not rush. This story shouldn’t
and it was wonderful to experience all those
in the whole day.
start here, it shouldn’t start like this. This story
moments with him, a lot of the things that I lived
I cry and say what I shouldn’t have if I was
started long before this, when I “discovered”
in Paris were part of a personal experience. It
awake with working clothes sitting on the
Paris. When I found out that it is possible to fall
was a moment to be honest with myself like I
commute.
in love with a city or, at least, to fall in love with
never was before, and choose what would do,
It was when we went by the Consolação
the sensation that a city causes.
then on, with the experiences and learning.
cemetery.
Since a long time, so long I can’t even
I changed a lot on this trip and I believe that I’ll
You said that in this state I make everyhing up.
remember, Paris was a dream to me. I always
always change when I go back there. Because
I just saw a white sphere and I was already
admired the city for all the stereotypes that we
Paris has this power over me, this cosmic force,
sleeping.
already know, but that enchanted and inspired
this karma. It has that one thing that I don’t
me in a way that no other place in the world
exactly know what it is, that makes me feel
could. And when I started to be interested in
more than good, that renews me.
the fashion world and studied more about it,
Thank you, City of Light.
Backcover illustration and words {p. 116} by Bel Petri
the city then gained an even more important meaning in my life. It was a difficult kind of love to explain to others, but so very clear to me.
The words and the way {p. 104} by Carol Delgado
Despite all this, it was really hard to think
The dictionary invites me to loneliness. But in
about Paris, or any other kind of trip like this,
my every day fiction, solitude is the noun of
as something close to happening. As a student
drawing roads and curves. I learned with the
of journalism, still beginning my career, with
women that bewitch words before me. I believe
very little money in the bank and a new life that
in the prayer that uses a pencil, an eraser and
included rent, food and transport to bear with,
paper.
the priorities were others.
A pencil, because not everything needs to be
A few years passed while I was dreaming,
erasure or scar. The person who taught me this
working, paying bills, making decisions and
was a master in the dance of letters, Cristiane
experiencing life, until things started to fall into
Lisbôa. It’s hers the masterpiece about solitude
place. And then, without even realizing, one
as a female present time: Parchment Paper to
day I opened my eyes and I saw that the dream
wrap secrets – Culinary Letters. Antônia, at, and
that once looked so far away from me, was
from, an unorthodox cooking school, with the
closer now. Much closer. Around the corner,
taste of spice and ocean mist. The discovery of
practically, waiting to come true. It was March
love – for herself, her gift and for the boy who
of 2015.
dances in the moonlight – and the complicity in
You know… It’s funny to think about it now.
the letters to her great grandmother. Because
Before traveling, I imagined that I would love
there is extra brightness in getting out of the
Paris for what it was. For the giant tower that
cocoon and to learn that sunlight was there all
extended its shadows over the Champ of Mars,
along. It’s good to have someone to trust while
for the cafes and patisseries scattered through
we dive into ourselves.
the streets. For the flower shops on the corners,
Also an architect of paths, Carola Saavedra in-
the enchanting language, the croissants and
troduces us to Nina and the challenge of dis-
macaroons. I just didn’t imagine that I would
covering herself in movement to keep exist-
love the city for everything that Paris, more
ing every day, in the Inventory of The Missing
than the streets and stores, monuments and
Things:
museums, would make me discover inside me.
Nina’s body has inexplicable force, as if it was
113