1999-siram

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Vieira, Alberto (1999), A Siram e as Luzes da Festa

COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO: Vieira, Alberto (1999), A Siram e as Luzes da Festa, Funchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/1999-siram.pdf, data da visita: / /

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A SIRAM E AS LUZES DA FESTA


TÍTULO A SIRAM e as Luzes da Festa COORDENAÇÃO DA EDIÇÃO Alberto Vieira FOTOGRAFIA Vicentes Photographos- Fotographia Museu "Vicentes " DESIGN ALSDesign EDITOR SIRAM Rua da Sé, nº.42 9000- Funchal Tele.: (351)(91)230350 Fax.: (351)(91)230351 Email: siram@mail.madinfo.pt Homepage: http: //www.madinfo.pt/siram/ EXEMPLARES TIPOGRAFIA ISBN: DL:


A SIRAM E AS LUZES DA FESTA

Funchal, 1999


“Os analfabetos do futuro serão aqueles que se recusem a aprender, reaprender e voltar a aprender”.

“Só terão êxito as empresas que considerarem os seus produtos absoletos antes que os outros o façam”.

Alvin Toffler

Bill Gates

A leitura de Toffler, na década de oitenta, quando concluíamos a nossa formação universitária, despertou-nos para a compreensão do fascinante mundo novo pejado de constantes e inebriantes mudanças em que hoje vivemos. Se na década de oitenta havíamos já aprendido que a sempre inevitável mudança comporta em si mesma enormes perigos, mas também um sem número de novas e fascinantes oportunidades, estamos hoje certos de que a melhor forma de obviar aos perigos da mudança e, simultaneamente, potenciar a aproveitar as suas oportunidades, é sermos nós próprios os agentes da mudança. No nosso mundo empresarial a mudança tem um nome: inovação. Foi com este espírito que criámos e temos vindo a construir e a expandir por todo o território nacional as mais de dez empresas que constituem o GRUPO SIRAM. Orgulhamo-nos da quota parte do nosso contributo para o desenvolvimento da animação turística e do produto turístico Madeira. A inovação tecnológica e a constante renovação dos nossos quadros dirigentes, técnicas e procedimentos são os responsáveis pela inequívoca liderança que o mercado nos atribui. Com a presente edição comemoramos 10 anos de experiência nas iluminações decorativas da cidade do Funchal e prestamos homenagem àqueles que ao longo dos anos nos confiaram a tarefa de executar um dos mais belos e mais importantes cartazes turísticos da Madeira: “As Luzes da Festa”. Sílvio Santos Presidente do Conselho Administração das empresas GRUPO SIRAM

de do


As festividades do Natal e fim de ano são um marco importante no quotidiano da Região Autónoma. Toda a animação e diversão parece que se transferem para este momento, tanto assim é que ele mereceu o epíteto de festa. Mas festa para o madeirense é sinónimo também de mesa farta de iguarias, de iluminações de garridas cores e o começo do novo ano com as cascatas do fogo de artifício. É este jogo de luz e fogo que dá corpo à nossa celebração festiva de Dezembro, partilhada por residentes e forasteiros. O fogo é grandioso e efémero, reduz-se aos poucos minutos de entrada do novo ano, mas ao contrário as iluminações são nossas companheiras em toda a celebração festiva. Elas dão luz aos recantos da cidade, traçam o contorno de casas e edifícios públicos, assinalam o traçado das estradas, descem em cascada pelos viadutos ou ajeitam-se em formas coloridas a lembrar-nos o sol, as flores e outros demais motivos de ocasião. Tudo isto conjuga-se numa sinfonia colorida dando à cidade do Funchal o necessário ambiente para a celebração da festa. Hoje a tecnologia permite que as estilizações feitas de lâmpadas de coloridas cores apresentem efeitos que nos fazem lembrar obras de arte. Na verdade a luz eléctrica é algo de significativo em termos de conforto humano, mas também na criação desta ambiência. Até ao seu advento foi substituída pelas luminárias, uma tradição festiva que se perde na memória dos tempos. Dezembro é sinónimo da Festa e esta de luz e fogo, e, por sua vez, de SIRAM, a empresa que nos últimos anos tem permitido que as iluminações se transformassem numa verdadeira obra de arte.


I PARTE

O NATAL E FIM DE ANO NA MADEIRA UM ESPECTテ,ULO DE LUZ


DA FESTA AO FIM DO ANO

Para o madeirense a época mais festiva é sem dúvida a que abrange o Natal e Fim de Ano. Deste modo o Natal é apenas designado de Festa, isto é, como que a querer dizer que o grande momento festivo acontece sempre em Dezembro. Deste modo na ilha as festividades religiosas do nascimento de Cristo aliam-se às profanas que marcam a mudança do ano. Neste último caso a tradição local alia-se à alheia, expressa na presença habitual de milhares de turistas. Durante muito tempo para os madeirenses as festividades da chamada festa tiveram como motivo as celebrações religiosas em torno do nascimento de Cristo. O ritmo do tempo girava em torno deste momento, uma vez que a celebração da passagem do ano foi por muito tempo apenas uma manifestação urbana. A festa madeirense apresenta algumas especificidades. Em primeiro lugar estão as missas do parto que antecedem o Natal e são o seu prenúncio no meio rural. Depois toda a gastronomia que fazia com que este momento seja de mesa farta, de carnes e doçaria. Nos últimos anos o Natal e o Fim de ano associaram-se no quotidiano madeirense passando a ser uma manifestação única de vivência da festa que alastra desde a cidade ao campo. Em qualquer dos casos o espectáculo, as tradições que o envolvem, inebriam-nos num misto de luz e cor. As iluminações públicas, o fogo de artifício são as evidências deste folguedo que assume sempre um carácter colectivo de catarse para residentes e forasteiros. Esta folia que no nosso século foi apropriada pelas festas da cidade acontece pela congregação do turismo com a vivência local. Para o madeirense a grande evidencia foi sempre o Natal, mas paulatinamente o fim-de-ano foi-se impondo e deixando de ser só para os turistas. A tradição do fogo de artifício aliado às diversas manifestações que assinalavam o momento com o cortejo, contribuíram para esta mudança de atitude. A afirmação plena desta manifestação festiva deverá ser dos anos trinta, uma vez que em 1932 foi criada uma Comissão das festas da cidade, presidida pelo Dr. Alberto Araújo, que tinha por missão coordenar todas as suas actividades de diversão e o lançamento do fogo de artifício na passagem de ano. A partir daqui os festejos, apoiados pelos comerciantes da cidade, ganharam uma nova dimensão. A manifestação espontânea de populares e hotéis no lançamento do fogo de artifício, que já em 1911 era usual, passa a estar subordinada a esta estrutura que paulatinamente a transformou no maior cartaz turístico da cidade. Por outro lado os festejos passaram a contar com um momento solene no dia 30 ou 31 que constava sempre da recita ou concerto no teatro e de um cortejo folclórico regional pelas ruas da cidade. O colorido da luz ganha cada vez mais adeptos. Assim em 1937 a passagem do ano foi considerada um espectáculo grandioso sendo saudada com seis vapores no porto. Já em 1938 a aposta estava numa marcha luminosa. Estava aberto o caminho para a plena afirmação das lâmpadas que passam a abrilhantar os espaços públicos, a iluminar as árvores e a definir o contorno dos edifícios públicos e igrejas. Mais tarde o avanço tecnológico permitiu a estilização figurativa que atinge no presente o clímax. Todavia o início da Segunda Guerra Mundial veio apagar por muito tempo o colorido dos festejos e a presença dos vapores na Pontinha. No após guerra os mesmos retornam mas só voltam a ganhar o brilhantismo que os caracterizou em 1949.


Os festejos do fim do ano, que estão agora sob a alçada da Secretaria Regional do Turismo e Cultura, são o corolário das múltiplas vivências do passado em que o madeirense se mistura com o forasteiro. Deste modo o historial do fogo de artifício do fim do ano, das iluminações e as tradições natalícias locais não é um fenómeno isolado e enquadram-se no fenómeno turístico que marcou a vida da ilha a partir do século XVIII.


O TURISMO E OS INGLESES

A vivência do réveillon deve estar associada à presença inglesa na ilha. A eles associa-se o colorido do fogo de artifício a partir do século XVIII, não obstante esta manifestação estar já associada aos grandes momentos festivos da vida dos madeirenses. O Funchal do século dezoito era um dos paradeiros habituais de doentes da tísica pulmonar, cientistas e funcionários da Coroa britânica em trânsito de e para as Colónias. Durante a curta estância na ilha alojavam-se em casas de compatrícios ou de famílias madeirenses proprietárias de quintas, que disponibilizavam quartos. Estes forasteiros, na sua maioria britânicos, no seu meio recreavam as tradições de origem, ocupando parte do seu tempo em saraus dançantes nos diversos casinos, clubes e casas particulares. A passagem do ano era um dos momentos mais celebrados e, embora sejam raras as notícias sobre a forma da sua realização sabemos que existiram desde o século XVIII. Já no decurso do século XIX a assiduidade da presença dos forasteiros ingleses é cada vez mais evidente e levou à criação das primeiras unidades hoteleiras. Todavia, nesta época não eram as festas do fim do ano que chamavam a atenção dos turistas. Aliás, parece que nos inícios da segunda metade do século a crise do vinho havia provocado a debandada de muitos ingleses, apagando-se certamente o colorido dos saraus e dos foguetes da noite de fim de ano e terá sido o banqueiro João José Rodrigues Leitão, natural de Ponte de Barca, quem decidiu reaver a tradição inglesa. Particulares, hotéis e comerciantes de fogo aliam-se para fazer reviver esta manifestação. E a tradição não mais se perder por força dos populares, hotéis e casinos que teimaram em animar a passagem do ano. Assim sucedia em princípios do século, sendo de salientar a iniciativa do Reid's Hotel em animar este momento para os seus turistas com o tão proclamado fogo que desde 1922 passou a ser lançado do ilhéu. Note-se que o descobrimento do Atlântico aconteceu em dois momentos. O primeiro, que decorre até ao século XV conduziu à revelação de novos espaços agrícolas, mercados, rotas e portos comerciais. Já no segundo, a partir do século XVIII, o europeu partiu à procura do quadro natural do mundo Atlântico e do desfrute das belezas e clima com a definição de ilhas e espaços litorais como health resorts e hotéis. Na verdade, o homem do século dezoito perdeu o medo do mundo circundante e fez dele o motivo de experiência, deleite e estudo. Estes dois momentos marcaram uma atitude distinta do europeu e tiveram reflexos evidentes na produção literária que envolve o processo. A par disso a opção dos viajantes, que dão forma ao Grand Tour europeu da época moderna, é diferente daqueles que primeiro sulcaram o oceano à procura de ilhas e portos de abrigo. Da primeira já temos conhecimento quase suficiente, enquanto a segunda ainda se mantêm no quase total esquecimento. Contribuir para a alteração deste estado de coisas chamando a atenção dos investigadores para este inovador domínio é o objectivo que nos persegue agora. No século XVIII as ilhas assumiram um novo papel no mundo europeu. Assim de espaços económicos passam também a contribuir para alívio e cura de doenças. O mundo rural perde importância em favor da área em torno do Funchal, que se transforma num hospital para a cura da tísica pulmonar ou de quarentena na passagem do calor tórrido das colónias para os dias frios e nebulosos da vetusta cidade de Londres. O debate das potencialidades terapêuticas da climatologia propiciou um grupo numeroso de estudos e gerou uma escala frequente de estudiosos. As estâncias de cura surgiram primeiro na bacia mediterrânica europeia e depois expandiram-se no século XVIII até à Madeira e só na centúria seguinte chegaram às Canárias. As intermináveis filas de


aristocratas, escritores, cientistas que desembarcavam no calhau e iam encosta fora à procura do ar benfazejo das ilhas foi um retrato comum da Madeira no século XIX. Dos visitantes da ilha merecem especial atenção três grupos distintos: invalids (=doentes), viajantes, turistas e cientistas. Enquanto os primeiros fugiam ao Inverno europeu e encontravam na temperatura amena o alívio das doenças, os demais vinham atraídos pelo gosto de aventura, de novas emoções, da procura do pitoresco e do conhecimento e descobrimento dos infindáveis segredos do mundo natural. O viajante diferencia-se do turista pelo aparato e intenções que o perseguem. Ele é um andarilho que percorre todos os recantos na ânsia de descobrir os aspectos mais pitorescos. Na bagagem constava sempre um caderno de notas e um lápis. Através da escrita e desenho ele regista as impressões do que vê. Daqui resultou uma prolixa literatura de viagens, que se tornou numa fonte fundamental para o conhecimento da sociedade oitocentista das ilhas. O turista ao invés é pouco andarilho, preferindo a bonomia das quintas, e egoísta guardando para si todas as impressões da viagem. Deste modo o testemunho da sua presença é documentado apenas pelos registos de entrada dos vapores na alfândega, das noticias dos jornais diárias e dos "títulos de residência", pois o mais transformou-se em pó. A presença de viajantes e "invalids" na ilha conduziu obrigatoriamente à criação de infra-estruturas de apoio. Se num primeiro se socorriam da hospitalidade dos insulares, num segundo momento a cada vez mais maior afluência de forasteiros obrigou à montagem de uma estrutura hoteleira de apoio. Aos primeiros as portas eram franqueadas por carta de recomendação. A isto juntou-se a publicidade através da literatura de viagens e guias. Os guias forneciam as informações indispensáveis para a instalação no Funchal e viagem no interior, acompanhados de breves apontamentos sobre a História, costumes, fauna e flora. A Madeira firmou-se, partir da segunda metade do século dezoito, como estância para o turismo terapêutico, mercê das então consideradas qualidades profiláticas do clima na cura da tuberculose, o que cativou a atenção de novos forasteiros. Aliás, a ilha foi considerada por alguns como a primeira e principal estância de cura e convalescença da Europa. Note-se que no período de 1834 a 1852 a média anual de Invalid's oscilava entre os 300 e 400, na sua maioria ingleses. Em 1859 construiu-se o primeiro sanatório. O último investimento neste campo foi dos alemães que em 1903 através do principie Frederik Charles de Hohenlohe Oehringen constituiu a Companhia dos Sanatórios da Madeira. Da sua polémica iniciativa resultou apenas o imóvel do actual Hospital dos Marmeleiros. Não temos informações seguras quanto ao desenvolvimento da hotelaria nas ilhas, pois os dados disponíveis são avulsos. Os Hotéis são referenciados em meados do século XIX mas desde os inícios do século XV que estas cidades portuárias de activo movimento de forasteiro deveriam possuir estalagens. A documentação oficial faz eco desta realidade como se poderá provar pelas posturas e actas da vereação dos municípios servidos de portos. No caso da Madeira assinala-se em 1850 a existência de dois hotéis (the London Hotel e Yate's Hotel Family) a que se juntaram outros dez em 1889. Em princípios do século XX a capacidade hoteleira havia aumentado, sendo doze os hotéis em funcionamento que poderiam hospedar cerca de oitocentos visitantes. A preocupação destes visitantes em conhecer o interior da ilha, nomeadamente a encosta norte levou ao lançamento de uma rede de estalagens que tem a sua expressão visível em S. Vicente, Rabaçal, Boaventura, Seixal, Santana e Santa Cruz. A ilha dispõe ainda hoje de uma unidade hoteleira de luxo que remonta a esta época. O Reid's Hotel foi construído em 1891 pela família Reid e teve o nome de New Reid's Hotel, para se diferenciar


dos outros (The Royal Edimburgh Hotel, Hotel Santa Clara, Miles Hotel, Hotel Monte e German Hotel) que já explorava. William Reid fixou-se no Funchal em 1844 dedicando-se de parceria com W. Wilkinson a montar um serviço de apoio aos inúmeros visitantes que chegavam à ilha para um período de repouso ou na busca desesperada das qualidades terapêuticas que o clima da cidade propiciava. Os seus filhos, William e Alfred deram continuidade à obra. Tenha-se ainda em conta um conjunto de melhoramentos que tiveram lugar no Funchal para usufruto dos forasteiros. Assim, desde 1848 com José Silvestre Ribeiro temos o delinear de um moderno sistema viário, a que se juntaram novos meios de locomoção: em 1891 o comboio do Monte, em 1896 o carro americano e finalmente o automóvel em 1904. A partir de finais do século XIX o turismo, tal como hoje o entendemos, dava os primeiros passos. E foi como corolário disso que se estabeleceram as primeiras infra-estruturas hoteleiras e que o turismo passou a ser uma actividade organizada e com uma função relevante na economia. Deste momento ainda persiste na ilha da Madeira uma unidade hoteleira: Hotel Reids. E mais uma vez o inglês é o protagonista principal. Este momento de afluência de estrangeiros coincide ainda com a época de euforia da Ciência nas Academias e Universidades europeias. Desde finais do século XVII as expedições científicas tornaram-se comuns e a Madeira (Funchal) ou Tenerife (Santa Cruz de Tenerife e Puerto de La Cruz) foram portos de escala, para ingleses, franceses e alemãs.


O FIM DO ANO A 31 de Dezembro celebra-se a passagem do ano de acordo com o nosso calendário gregoriano. E tal como os rituais pagãos de passagem nós continuamos a celebra-los do mesmo modo. O fogo, a luz são elementos fundamentais e apresentam um poder de purificador e de estigmatização do mal. Entre nós não sabemos a data exacta em que se começou a comemorar a passagem de ano, mas certamente deve ser uma manifestação muito remota que se foi adaptando às exigências dos tempos e às influências dos forasteiros. O Padre Fernando Augusto da Silva refere-nos estes festejos em 1923, explicando que era costume não muito antigo. Todavia dados avulsos apontam que esta era uma vivência muito antiga. De acordo com alguns esta tradição teria começado no século XIX por iniciativa do morgado João José Rodrigues Leitão, que aproveitava o seu aniversário, a 31 de Dezembro, para fazer um farto banquete animado com fogo de artifício. Diz-se ainda que os seus amigos replicavam das suas casas gerando-se um espectáculo espontâneo de fogo de artifício em todo o anfiteatro do Funchal, incentivado por António de Andrade júnior, o principal vendedor de fogo de artifício na cidade. Em princípios do século XX a passagem do ano era já um importante momento de diversão, com saraus dançantes e espectáculos, e um espectáculo de luz e cor com os fogos de artifício lançados por particulares. Entretanto o Reid's Palace Hotel, a partir de 1921, decidiu celebrar a meia-noite de 31 de Dezembro com um baile e fogo de artifício queimado, primeiro nos jardins do hotel e depois no molhe e ilhéu da Pontinha. Tenha-se em conta que de acordo com o testemunho de Isabella de França em 1853 os grandes festejos prendiam-se com a evocação natalícia, sendo o dia da noite de Natal um verdadeiro espectáculo de fogo de artifício e de rebentar de bombas. Deste modo a viragem para a afirmação da passagem do ano ocorrerá em finais do século. Um dos mais evidentes testemunhos destes festejos surge na década de trinta pela pena de Ferreira de Castro através dos quadros ilustrativos da ilha que fez integrar no seu romance Eternidade. Aos poucos esta manifestação espontânea foi criando a sua estrutura organizativa e aquilo que era o capricho de alguns transformou-se nas festas da cidade. Para isso foi necessária uma comissão que desde 1932 teve a seu cargo a organização dos principais actos. A folia que assinalava a passagem do ano tinha por palco os salões e hotéis, nomeadamente Reids e Savoy, mas iniciativa desta “Comissão de Festas da Cidade” saiu para a rua. Esta abertura dos festejos do fim do ano sucedeu em 1932 com um cortejo luminoso. Entretanto em 1936 foi criada a Delegação de Turismo da Madeira que terá a seu cargo também a manutenção destes festejos. Na verdade a Madeira era então uma estância privilegiada de turismo invernal e a aposta nestes festejos contribuirá para reforço dos aliciantes oferecidos aos visitantes. Pompa e circunstância dominaram as passagens do ano da década de trinta até que a II Guerra Mundial, a partir de 1939, veio apagar a alegria esfuziante do madeirense. O Natal de 1939 e o dos anos que se seguiram foi de luto. As dificuldades no campo e na cidade eram evidentes. Os hotéis fecharam por falta de turistas pelo que ninguém se lembrava de evocar a passagem do ano, estando todos de olhos postos no que se passava no centro da Europa. Deste modo até 1946 não se celebrou oficialmente a passagem do ano. Apenas em 1945 já acabado o pesadelo da guerra tivemos os primeiros festejos com fogo de artifício. O retomar das festas da cidade sucedeu apenas em 1946. Mesmo assim estas eram quase só reservadas aos madeirenses uma vez que os hotéis permaneciam encerrados e os turistas teimavam em não aparecer. O Reid's Hotel só abriu as portas em 8 de


Dezembro de 1949. Todavia no ano anterior a Casa da Madeira em Lisboa havia trazido ao Funchal um grupo de 600 excursionistas para assistir aos festejos do fim-do-ano. A partir de então foi imparável a afirmação do turismo e dos festejos do fim do ano como o principal cartaz turístico. Para isso contribuiu o empenho do Presidente da Delegação de Turismo o Prof. José Raphael Basto Machado. Durante muito tempo os festejos do fim-do-ano resumiram-se ao fogo de artifício, aos saraus dançantes e desfiles etnográficos. O colorido das lâmpadas é uma novidade já entrados no século XX. Note-se que a luz eléctrica chegou ao Funchal em 1897 por mão dos ingleses. Em 1949 terminada a concessão aos ingleses a câmara cria os serviços municipalizados de electricidade que não são capazes de assegurar um adequado serviço. Deste modo em 1952 tal missão passa para a alçada da Comissão Administrativa dos Aproveitamentos Hidráulicos da Madeira, um serviço público com a função de proceder à produção, transporte e distribuição de energia eléctrica em toda a ilha. O consumo e a exigência da energia eléctrica aumentam de acordo com o incremento do turismo e obrigam a elevados investimentos. As décadas de cinquenta e sessenta marcadas crise da energia foram fatais.


A SIMBÓLICA DA LUZ E DO FOGO

O fogo é um elemento importante do ritual religioso e na Antiguidade ele dominava muitos dos ritos ditos pagãos. A ele associa-se o poder benfazejo de purificação e afastamento do mal. Para os cristãos ele confunde-se com a luz e metamorfoseia-se na imagem de Cristo. As festas que assinalavam a mudança dos solstícios de Inverno e Verão eram marcadas pela presença do fogo, através de fogueiras ou de luzes, no caso utilizavam-se as luzernas de óleo ou azeite. Os rituais perduraram, pois apenas mudaram aos instrumentos para alimentar o fogo e a luz. Assim juntaramse mais tarde as velas e, com o advento da energia eléctrica, as lâmpadas coloridas. Alguns resquícios desta tradição perduram ainda hoje nas célebres fogueiras da noite de Natal. O Natal do mundo Cristão é uma recuperação dos antigos cultos agrários que celebravam a 25 de Dezembro o nascimento do sol, o início do solstício de Inverno. Deste modo até ao dia 31 de Dezembro, quer gregos quer romanos, festejavam o retorno do Novo Sol. O aspecto mais significativo desta celebração estava nas fogueiras que se ateavam por todo o lado. Elas tinham a função de fortalecer os raios solares para que o seu poder benfazejo se mantivesse até ao solstício do Verão. A importância desta manifestação levou a que o Cristianismo no tempo do papa Libério (352-366) recuperasse esta tradição estabelecendo o 25 de Dezembro como o dia do nascimento de Cristo, identificando-o com o Sol da vida. As iluminações da árvore de Natal prendem-se também com este ritual, pois apresentam a mesma simbólica das velas de Natal. A sua chama é o símbolo de purificação, iluminação e fertilidade. Para o cristianismo a chama da vela tem um valor simbólico muito forte, é personificação de Cristo, no sentido de que este é a luz do mundo. As velas acesas colocavam-se na janela das casas para guiar o espírito de Cristo na escuridão da noite. Os incêndios foram o grande problema que só foi contornado a partir da década de oitenta do século XIX com o aparecimento da luz eléctrica No Natal a luz hoje irradia sob a forma de sol ou em construções estilizadas de estrelas. Também as estas está ligado um poder simbólico e culto religioso, pois de acordo com a tradição antiga elas exorcizam o demónio e as forças do mal. Na simbólica cristã não são menos importantes. Senão vejamos. Foi uma estrela que guiou os reis magos e a estrela de quatro pontas é conhecida como a estrela de David, o símbolo do judaísmo.


AS ILUMINAÇÕES DO NATAL E FIM DE ANO

As centenas de milhares de lâmpadas e milhões de micro-lâmpadas que anualmente se acendem em Dezembro para embelezar o anfiteatro do Funchal, bem como outras que por todo o mundo dão brilho ao momento natalício, não estão longe desta secular tradição. Todavia, hoje os objectos são distintos. As fogueiras e velas foram substituídas pelo garrido das hodiernas lâmpadas. Os efeitos de luz e cor perderam este poder mitológico e firmaram-se mais pelo impacto visual e como elementos indispensáveis de criação da ambiência natalícia. As iluminações de fim de ano acontecem neste intervalo de tempo e evoluem de acordo com a capacidade criativa do homem e disponibilidades técnicas. Dos inúmeros testemunhos literários que temos dominam as descrições do fogo de artifício. Sucede assim em Isabela de França (1853-54) e Ferreira de Castro (1932-33). Somente em Luís Forjaz Trigueiros, em testemunho do réveillon de 1936 se dá conta das iluminações: Ao oceano é um formigueiro de pequenas luzes imóveis, da Pontinha ao Reid's, milhares de lâmpadas coloridas, debruam o litoral da ilha, até onde a vista se perde. Também os tradicionais arraiais vivem do colorido das iluminações e fogo de artifício. Desta tarefa ocupavam-se em princípios do século presente alguns empresários, sendo de destacar Honorato Rodrigues, Manuel Andrade e António Lino Barreto. Nestes eram tradicional às 11 horas do sábado da festa uma exibição de fogo preso, tradição que hoje se perdeu. Temos informações que os arraiais madeirenses eram abrilhantados com efeitos decorativos, lâmpadas multicolores e fogo de artifício. Nas iluminações são referidos os balões venezianos, lanternas e vidros coloridos de copos. Com estes últimos faziam-se desenhos nas fachadas das igrejas, o que atribuía um desusado brilho ao ambiente que deslumbrava os romeiros. Tenha-se em atenção que o fogo de artifício desde a Antiguidade que está envolvido em determinados rituais e em momentos festivos de diversa ordem. Mas o fogo de artifício moderno parece que começou em Florença a partir do século XIV. A Itália, aliás, foi pioneiro no desenvolvimento do fogo preso que teve um grande incremento a partir do século XVII. Diz-se que o primeiro espectáculo de fogo de artifício ocorreu em 1575 no castelo de Kenilworth em honra da rainha Elisabete. Este tipo de celebração tornou-se muito popular em Inglaterra e certamente a comunidade britânica na ilha contribuiu para que a mesma tradição fosse reforçada nas diversas manifestações festivas, nomeadamente na passagem do ano. Era também tradição na Madeira celebrar todos os momentos festivos de carácter religioso e político com iluminações e fogos de artifício. Deste modo o nascimento de um príncipe, a coroação de um rei, a proclamação da independência nacional em 1640 ou os festejos em honra de São Tiago Menor obedecia a este ritual de três dias de festa. Até ao advento da energia eléctrica as iluminações consistiam em velas ou candeias de azeite colocadas em lanternas na parte exterior das janelas dos edifícios públicos. A mais antiga referência a este tipo de comemoração sucede em 1640 com a celebração da restauração da monarquia. No século XVIII sucederam-se outras manifestações sendo de referir em 1761 com os festejos em honra do nascimento do príncipe D. José que consistiram em 3 dias de luminárias públicas e fogo de artifício. Já em 1777 foram os inimigos de João António de Sá Pereira que celebraram de forma efusiva a sua saída com iluminações e fogos artificiais.


Sabemos por ordem de 1825 que a estas iluminações públicas estavam sujeitos os tribunais e demais repartições públicas. A falta de interesse deverá ter motivado esta recomendação isto numa época em que havia muito por comemorar. Já em 1821 a nova constituição fora celebrada com iluminações, seguindo-se em 1874 por altura da inauguração das comunicações telegráficas. O novo século abre com a visita do Rei D. Carlos que é recebido de forma efusiva no cais e ruas da cidade. De acordo com os testemunhos da época as iluminações da entrada da cidade e da Praça da Constituição foram o principal motivo de atenção dos visitantes Em 1922 tivemos festejos duplos para celebrar o descobrimento da Madeira e a chegada de Gago Coutinho e Sacadura Cabral. No primeiro caso foi fogo preso no ilhéu e iluminações desenhando o contorno do ilhéu e Pontinha, sendo notada a ausência de luminárias nos edifícios públicos. Já no segundo momento tivemos quatro dias de festa com iluminações das ruas e casas comerciais. A década de trinta assinala a afirmação das gambiarras e o colorido da luz ganha uma posição de relevo nos festejos do fim do ano. A luz eléctrica começa a expandir-se no meio urbano. A cidade perdeu o ar sombrio e os festejos de Natal e fim de ano ganham mais vida, afirmando-se como um cartaz turístico. O colorido da luz e do fogo é o emblema dos festejos de fim de ano, aquele que é considerado o principal cartaz turístico da região. Hoje estas ganharam uma nova dimensão nas festividades, sendo conjuntamente com o fogo de artifício o principal atractivo para os milhares de turistas que o Funchal acolhe nesta quadra. A dimensão que as mesmas assumiram e as exigências deste final de século conduziram com os serviços passassem a ser prestados por empresas especializadas. E no caso das iluminações é evidente o protagonismo da SIRAM nos últimos dez anos. A partir de 1989 com a criação da Siram as iluminações do Natal e Fim do Ano ganharam outro colorido e dimensão. O material até então usado era absoleto e artesanal, oferecendo poucas condições de segurança e os efeitos desejados. O aparecimento da Siram conduziu a um importante avanço e inovação tecnológica nas iluminações no sentido de possibilitar uma maior segurança e racionalização do consumo energético. A partir daqui acabaram-se os frequentes cortes de energia eléctrica que aconteciam durante este período e melhoram as possibilidades e os efeitos das iluminações. Ao mesmo tempo foi notória a melhoria nos efeitos visuais propiciados pelas lâmpadas com o recurso a motivos de cariz regional. As iluminações de 1999 são o testemunho claro desta aposta da Siram num lugar cimeiro das iluminações festivas nas ilhas. Tudo isto é fruto da capacidade de resposta demonstrada no enfrentar dos novos desafios que o progresso da luminotecnia tem propiciado nos últimos anos.


II PARTE

GRUPO SIRAM BREVE HISTORIAL


A SIRAM – Sociedade de Iluminações da Região Autónoma da Madeira, Lda., actualmente com a denominação social Grupo SIRAM – Investimentos e Participações, Lda., foi constituída em Junho de 1987 com o objectivo de executar as tradicionais iluminações e decorações dos chamados arraiais madeirenses, que constituem hoje uma das mais importantes expressões da religiosidade do povo das ilhas e uma das mais significativas oportunidades de lazer e de saudável ocupação dos seus tempos livres. A partir do ano 1989 e até hoje a empresa mãe Grupo SIRAM - Investimentos e Participações, Lda. e as suas associadas SIRAM Som, Lda. SIRAM Iluminações, Lda. e SIRAM Construções, Lda., têm assumido a responsabilidade pela montagem da iluminação, da sonorização e da ornamentação dos mais importantes cartazes turísticos da Região Autónoma da Madeira: Festas de Natal e Fim de Ano, Festas de Carnaval, Festa da Flor, Festa da Vindima, etc. A actual empresa Grupo SIRAM foi constituída no dia 8 de Junho de 1987, com o capital social de 470.000$00, com a denominação social inicial SIRAM – Sociedade de Iluminações da Região Autónoma da Madeira, Lda., e com o objecto de “execução de instalações eléctricas e sonoras provisórias”, tendo a sua sede na cidade do Funchal. A empresa só conseguiu iniciar a sua actividade, com a dimensão pretendida, em Setembro de 1989, ano a partir do qual, e até hoje, passou a ser responsável pela montagem das iluminações decorativas das Festas de Natal e Fim do Ano da cidade do Funchal. A partir desse ano, a empresa entrou num processo de desenvolvimento de novas áreas complementares de negócio e viu o seu capital social aumentado em 1990 para 60.000.000$00 e em 1998 para 100.000.000$00. Actualmente, o capital social do Grupo SIRAM encontra-se concentrado em dois empresários: Sílvio Santos, que detém 75% do mesmo, e Luís Severim, que detém os restantes 25%. Por escritura de 31 de Dezembro de 1994 foi reformulado totalmente o contrato social da sociedade salientando-se particularmente as seguintes alterações: Alteração da denominação social para Grupo SIRAM - Investimentos e Participações, Lda, do objecto social para “O investimento através da coligação e participação em outras sociedades” e do modelo de gestão da sociedade. A partir de 1991 a empresa iniciou uma estratégia de diversificação das suas áreas de negócio. A empresa criou um grupo de novas empresas para actuarem em novas áreas de negócio e participou no capital social de sociedades anónimas criadas por outros grupos empresariais. Assim, foram constituídas as seguintes sociedades, nas quais o GRUPO participou sempre com maioria absoluta no respectivo capital social e detém hoje, directa e indirectamente, a totalidade do mesmo. A SIRAM Som, Lda. foi criada em 1991, com o capital social de 1.500.000$00, actualmente, aumentado para 16.500.000$00, e com o objectivo de fornecer todos os meios audiovisuais (sonorização, tradução simultânea, iluminação especial, projecção de imagens, tratamento especial de som e de imagem, etc.) para todo o tipo de congressos, conferências e seminários que se vêm realizando na Madeira. A SIRAM Som, Lda. tem vindo também a responsabilizar-se pela sonorização dos mais importantes acontecimentos sociais da região, desde os maiores espectáculos musicais, organizados pelas mais variadas organizações cívicas e culturais, aos mais espectaculares comícios e outros encontros políticos, organizados pelos principais partidos da região, passando pelas feiras regionais e pela animação no interior das próprias unidades hoteleiras.


A SIRAM Iluminações, Lda. foi criada em 1995, com o capital social de 400.000$00, actualmente aumentado para 71.000.000$00, e com o objectivo de fabricar e fornecer equipamentos eléctricos específicos para as tradicionais iluminações decorativas, recorrendo a um misto de tecnologia e artesanato, cujos surpreendentes efeitos conjugados emprestam aos motivos decorativos e às ornamentações da cidade aquela rara e extraordinária beleza que tem transportado o nome e fama do destino turístico da Madeira a todos os cantos do mundo. A SIRAM Iluminações, Lda. tem vindo também a responsabilizar-se pela montagem das tradicionais ornamentações e iluminações decorativas de muitos dos arraiais típicos madeirenses que se realizam, especialmente durante o Verão, um pouco por toda a Ilha da Madeira. A SIRAM Construções, Lda. foi constituída em 1991 com um capital social de 50.00.000$00, hoje totalmente concentrado e controlado pela empresa mãe. Actualmente tem um capital de 100.000.000$00, em consequência do aumento de capital efectuado em 1995. A esta sociedade forma atribuídos os negócios das iluminações decorativas de maior vulto e exigência técnica, das redes eléctricas, das instalações de utilização, das telecomunicações e da construção civil. Esta empresa foi criada com o objectivo de construir os motivos decorativos e todos os seus suportes, bem como proceder à realização de obras de construção civil necessárias à sua colocação e fabricar os elementos de decoração para os mais variados acontecimentos públicos no sector da animação turística, liderando o mercado regional nalgumas áreas específicas das suas competências e tendo já levado o nome e a tecnologia madeirenses para mercados externos, em particular, para mercado Continental e Açoriano. A SIRAM Construções, Lda. tem vindo a ser responsável pelas montagens das iluminações decorativas das Festas de Natal e Fim de Ano realizadas na cidade do Funchal, desde 1993, altura em que assumiu os trabalhos tradicionalmente efectuados pela empresa mãe, tendo também realizado a iluminação desta época do ano, em Ponta Delgada e Angra do Heroísmo, Açores, desde 1997 e 1998, respectivamente. Este grupo de empresas madeirenses, que emprega mais de uma centena de trabalhadores, tem vindo com o seu pessoal e com os seus equipamentos a contribuir directa e indirectamente para o sucesso da Região Autónoma da Madeira enquanto destino turístico, uma vez que são elas as responsáveis pelo fornecimento de toda a logística de animação turística às principais realizações dos sectores público e privado que visam o entretenimento da população local e dos turistas que nos visitam e a atracção de novos turistas através das imagens captadas pelas suas câmaras de vídeo e foto e por via da chamada promoção boca-ouvido. As empresas do Grupo SIRAM, perante o crescimento do mercado turístico da Região, em particular na sua componente de incentivos e congressos, e pela necessidade de satisfazer a sua clientela cada vez mais exigente e criativa, tem vindo a realizar um significativo conjunto de investimentos complementares visando, simultaneamente, acompanhar a constante inovação e modernização que norteiam o sector e a expansão da sua capacidade de resposta eficaz às necessidades de todos quantos no negócio do turismo procuram os seus serviços e logística para a tão importante quanto imprescindível animação turística na Madeira. A entrada em funcionamento de novas infra-estruturas de apoio a feiras e aos congressos, o Centro Internacional de Feiras e Congressos integrado no Parque Científico e Tecnológico da Penteada; o desenvolvimento das instituições ligadas à educação e à investigação científica como a Universidade da Madeira, o CITMA e a AREAM, entre outras; o crescimento do parque hoteleiro


regional e dos centros desportivos, culturais e de lazer em toda a ilha; a ampliação do Aeroporto de Santa Catarina e a prevista remodelação do Porto do Funchal; exigirão à Região o reforço da sua capacidade logística para a satisfação das novas necessidades de todo o tipo de animação (turística, científica, cultural e social) para todo este enorme volume de investimentos na criação de novos espaços e na construção de novas infra-estruturas. Atentas a estas novas realidades e necessidades regionais, as empresas do Grupo SIRAM desenvolveram um projecto integrado de investimentos complementares, que vão desde a construção de novas instalações para a produção e tratamento de todo o enorme conjunto de inovadores materiais e equipamentos que o futuro e mais desenvolvido mercado turístico da Região movimentará, à aquisição de novos e sofisticados equipamentos entre: bancadas, palcos, cobertura de recintos, sistemas de iluminação robotizadas, sistemas de sonorização controlados remotamente com recurso a novas tecnologias de fibras ópticas, novos sistemas de projecção e de tradução simultânea, etc. Os projectos encontram-se dimensionados para alcançar a prazo níveis de produtividade que assegurem a sua competitividade pelo que, com uma estratégia comercial adequada que assegure vendas efectivas, não se colocarão interrogações insolúveis de rendibilidade do projecto. Contudo, o Grupo optou, não só pela dinamização das empresas já existentes, mas pela criação de novas empresas, cujas actividades vêm complementar a actividade desenvolvida, criando sinergias proveitosas para o seu eficaz desempenho. Desta forma foram criadas a montante, a empresa Galvimade – Estruturas Metálicas Galvanizadas, Lda, cujo objectivo principal é o da produção e montagem das estruturas metálicas aplicadas nas tradicionais festas; a empresa Carpifunchal – Carpintarias da Madeira, Lda., tendo por actividade a produção e montagem de estruturas de madeira a aplicar nas actividades de animação e espectáculos, e a empresa Halogéneo – Sistema de Iluminação, Lda, com o objectivo de produção de sistemas de iluminação (letreiros luminosos) a incorporar nas actividades de construção civil e cuja montagem será auxiliada pelos serviços de electricidade do Grupo. Foi também criada a jusante a empresa Fábrica de Sons – Produção de Espectáculos, Lda., com o objectivo de organizar e produzir espectáculos, complementando a actividade do Grupo, uma vez que dispõe do apoio das diversas associadas para a montagem da logística necessária à realização dos eventos que organiza.


O ano de 1994, para além de constituir o mais importante ano de viragem do GRUPO, em termos de concentração e consolidação do seu capital social, marca também um importantíssimo ponto de viragem, em termos de expansão dos negócios sociais das empresas do GRUPO para fora da Região. No ano de 1994 a associada SIRAM Construções, Lda. lançou-se na busca de novos mercados e conseguiu com eficácia levar a acabo uma dupla estratégia de expansão, através do desenvolvimento do mercado e do produto. O primeiro foi alcançado com a adjudicação pela EDP – Electricidade de Portugal, SA de uma série de obras de manutenção de iluminação pública na zona centro do país, mais concretamente no distrito da Guarda, enquanto o segundo surgiu com a adjudicação pela Portugal Telecom, S.A. de uma série de obras de montagem de redes de telecomunicações nas Ilhas da Madeira e Porto Santo A empresa manteve assim a sua sede no Funchal e instalou três delegações no Continente Português, nomeadamente, em Lisboa, Porto e Viseu. Actualmente estas delegações foram autonomizadas através da criação de uma nova empresa, a SIRAM Portugal – Electricidade e Telecomunicações, Lda., que desenvolve todos os trabalhos a efectuar no Continente Português. A partir de 1997, a associada Siram Construções, Lda. alargou novamente a área de actuação através da entrada no mercado açoriano, sendo responsável, pela realização, nesse mesmo ano, das iluminações decorativas das Festas de Natal e Fim do Ano na cidade de Ponta Delgada. Durante 1998 a empresa continuou a efectuar trabalhos de iluminações decorativas na Região Autónoma dos Açores, tendo-se assistido ao alargamento da área de intervenção geográfica, através da execução das iluminações decorativas das Festas de Natal e Fim de Ano novamente em Ponta Delgada e também em Angra do Heroísmo. O alargamento e desenvolvimento da actividade neste mercado e a tendência para o seu crescimento, possibilitaram, ainda em 1998, a criação de uma nova empresa, a SIRAM Açores – Electricidade e Telecomunicações, Lda., cujo objectivo principal é o de desenvolver os trabalhos de iluminações decorativas a realizar nesta área geográfica. As potencialidades do mercado açoriano possibilitaram, também o desenvolvimento do produto, tendo-se, em 1999, procedido à aquisição da empresa Palco - Produção e Realização de Espectáculos, Lda., a qual explora já naquele mercado os segmentos da organização e produção de espectáculos e do fornecimento dos equipamentos de som e luminotécnia para os mesmos. Com estas duas experiências de expansão para novos mercados bem sucedidos, o Grupo passou a estar presente em todo o território nacional e encontra-se preparando para novos passos, agora no sentido da internacionalização.


A NOITE DE SÃO SILVESTRE Podeis imaginar o que será a Noite de São Silvestre no Funchal, a sua animação, o carácter dessa festa nocturna, e a grandiosidade do seu fogo de artifício? Não, leitor. Por maior que seja o vosso poder visionário, por mais completas que sejam a vossa imaginação e até sugestão, não fareis ideia do espectáculo, e ficareis sempre muito aquém da realidade. Imaginai um cataclismo tremendo, um vulcão que entrasse repentinamente em actividade, e que incendiasse toda a baía, toda a cidade, e toda a parte das serranias que se vêem do Funchal. Não há sítio onde não haja fogo. Não há pedaço de céu onde não haja lume, janelas onde não cintilem faúlhas, telhados que não jorrem cinzas incandescentes, largos e esplanadas onde não haja estoiros e ribombos fragorosos, casas que não pareçam pastos de chamas, navios que não faísquem mil luzes e reflexos, como se estivessem em labaredas, montanhas donde não se despenhem cataratas gigantescas de fogo, como se fosse lava vulcânica, corrente e avassaladora, e serras donde não se elevem colossais jactos inflamados, assombrosos fogachos de matérias incandescentes e explosivas, e formidáveis chamas tragicamente coloridas e intensas. É noite de Ano Novo. A cidade está em festa. Não há janela sem iluminação, porta que não esteja aberta, mesa que não esteja família que não esteja contente. Pobres e ricos, todos acorrem às ruas, aos restaurantes, aos hotéis, às casas dos seus amigos, às esplanadas dos seus jardins, às torres das suas casas, aos terraços das suas varandas, aos cumes dos seus telhados, aos cais, aos navios fundeados na baía, aos barquitos de vela e de remos, aos miradouros públicos, e a todos lugares donde a visibilidade e os horizontes sejam vastos e agradáveis. A característica canja de galinha, manjar imprescindível esta madeirense, passa fumegante a todas as mãos e a todas as mesas, servida em chávenas finas, ou em tigelas graciosas. Os célebres e dulcíssimos bolos de mel de cana, abundam por toda a parte e constituem uma verdadeira tentação para as crianças e adultos. As salas e as ruas estão cheias de odores capitosos. Todos têm as suas Iguarias confortantes e saborosas. Até os mais desprotegidos têm a sua mesa lauta, mercê da generosidade espontâneas pessoas mais abastadas. Abrem-se garrafas de variados espumantes. Estralejam rolhas de pressão. Saboreiam-se preciosos e perfumados vinhos leira. Ouve-se um vozear geral. Ecoam risadas, fazem-se amistosos, formulam-se votos de felicidade, confessam-se, desejos e aspirações. Toda a gente fala, come com apetite, bebe e ri em simpática comunicabilidade e alegria. As ruas passam penosamente os carros de bois, circulam com dificuldade os automóveis, move-se uma massa compacta, e ininterrupta de gente. Vai principiar o número culminante da festa. Anuncia-se o começo do fogo de artifício, por uma largada colossal de muitas centenas de balões gigantes, de várias cores. O céu principia a coalhar-se de fogos que se movem. Há qualquer coisa de grandioso e solene no momento. Existe um sentimento de expectativa em toda a gente. Há silêncio, admiração e surpresa. Lá longe, num e noutro ponto, eis alguns balões que se incendeiam e se desfazem em labaredas.


Outros atingem alturas enormes, tornam-se quase invisíveis, e flanam airosamente na atmosfera. Sucede-se nova largada de balões. As pintas de luz multiplicam-se. O céu torna-se rubro, afogueado, pletórico de fogachos, e como que movediço, instável e dançante. O estrondear espantoso e inesperado de uma grandiosa salva de morteiros estremece tudo e todos, e ecoa repetidamente, em varias gradações de som, desde as encostas próximas, até às mais recuadas e distantes. Um calafrio prolongado percorre o sistema nervoso das pessoas. A loucura começa. Lá em baixo na baía, declara-se uma batalha naval Os navios de excursão e de escala, engrinaldados e ornamentados por bandeiras, flâmulas e festões de luzes de inúmeras cores, alvejam-se uns aos outros por meio de jactos artificiosos de Bengala, tal como monstros flamívomos. As numerosas embarcações pequenas que vogam no porto em todas as direcções, seguem-lhes o exemplo. Há fogos cruzados, fogos que se perdem nas águas, fogos que atingem as alturas e que tingem o céu e o mar. Em volta, numa ascensão potente e vertiginosa, os foguetes sobem ao ar, lançados de todos os pontos altos que rodeiam o Funchal. Os busca-pés assobiam raivosos como se fossem serpentes assanhadas. Cada vez em maior número, os morteiros estoiram atroadoramente nos ares. O seu eco infernal e prolongado parece o estrepitoso desabar das serras, do casario, e de toda a Ilha, sobre a e sobre o mar. O Castelo do Pico está a arder. Há fogo no Pico dos Bar, no Pico de S. Martinho, no Balcão da Montanha, na levada Santa Luzia. O fogo da terra pega-se ao céu. Tudo arde. Tudo a, tudo se despedaça, desfaz e pulveriza, como se fosse uma ira colossal, a semear lume em toda a volta, a salpicar luzes de todas as cores, e a jorrar jactos de cinza e brasas, em todas as direcções. As serras, os bairros da cidade, o mar e o céu mudam constantemente de cor, iluminados pela feéria de luminosidade e pela contínua e grandiosa das mutações, as quais vão do vermelho intenso ao verde pálido, ao azul eléctrico, à poalha de oiro, uva de prata. Rasga-se uma cascata, subitamente, lá no alto. Aí vem uma te de lava incandescente, descendo a encosta, ameaçando erigir a cidade e despenhar-se nas águas da baía. Outras as sucedem-se. Outras torrentes descem em diferentes das montanhas. A violência do estrondear ininterrupto, à maneira de bombardeamento de guerra, sistemático e contínuo, rivaliza com a idade dramática do clarão geral, que tudo ilumina, desde o mar e a cidade, até às mais pequenas particularidades das montanhas. E como se isto não fosse bastante, ainda há a juntar a cooperação particular de toda a gente. E assim, não há postigo, janela, mirante, ou telhado, onde não se queimem fósforos de cor, valverdes, estalinhos, bombas e foguetes minúsculos. Não há largo, quintal, clareira, terraço ou jardim, onde não se queimem foguetões de lágrimas e onde não haja fiadas de balões e de lâmpadas Depois da apoteose final, em que, a cidade do Funchal, à maneira da antiga Pompeia dos seus últimos dias, parece viver a sua hora derradeira de trágico-festivo cataclismo, começa a debandada do povo.


A fumarada e o cheiro a pólvora, que enchem os ares, vão-se dissipando pouco a pouco com o frescor da madrugada. As ruas movimentam-se de novo, por algumas horas. O transito é extraordinário. A festa continua. Para muitos só acaba de manhã, depois de longas e fartas ceias de despedida. É assim a noite de S. Silvestre no Funchal. É assim que os Madeirenses se despedem do ano que acaba e festejam o ano que começa. (Edmundo Tavares, Terra Atlântida. Impressões da Madeira, Lisboa, 1948)


Fatal na cidade: luzes, músicas, mostruários de lojas cheios de brinquedos, cestos abarrotando de fruta... Tudo aparência, visões especiosas para os olhos ingénuos da gente nova, mas não de toda. No campo, nas freguesias rurais, donde não se vê a cidade, porque a montanha a encobre com seus refolhos, pelas azinhagas, no adro da igreja, à porta de casais não se ouve falar do Natal e festa, a Festa do Menino Jesus. A palavra Natal posto que inda não entrasse em uso, não seja termo comum, não se generalizasse, já pretende substituir a Festa, mormente na convivência da gente grada e mais letrada com a privança dos jornais e senhores tornaviagem, naturais da cidade e seus arredores. Fala-se da Festa, do porco da Festa. E a vizinha Gertrudes armou uma bonita lapinha na Festa. Não há iluminações, mostruários a desafiar os olhos do rapazio e de gente grande, mas há frisos de luminárias, cana-vieira na assomada das lombas, quando amortiça luz do céu. E essas archotadas anunciam a festa de igreja no dia imediato. Na cidade compram-se pinheiros, verduras para embrincar os presépios. Na aldeia vai-se às abas da serra buscar o alegra-campo e galhos de loiro, e das paredes rústicas trazem-se os fetos-cabrinhas para alindar a escadinha dos pastores e do Menino. Todos se provêem de frutas. Rico e pobre. A laranja e o pero não custam dinheiro. De resto, pede-se e dá-se. E na *Festa+, há festa de igreja com três padres e cantores de fora. A festa profana é feita de pifes, gaitas e machetes. Acabou-se, este ano, infelizmente, por virtude da conturbação dos tempos, com a nota ruidosa, álacre, comunicativa, do estoirar das bombas que se perde na noite das arraigadas, vivificadoras tradições madeirenses. Ao abrir de Novembro, nas freguesias do Norte da ilha, estrugiam, retinindo no coração das montanhas, o grito seco das bombas Mas o que é tradicional da *Festa+ só temporariamente poderá faltar. Para o ilhéu da Madeira, a *Festa+ é a quadra por excelência do bem-estar do corpo e do espírito. No campo e na cidade, passado o dia de Reis, já se pensa na *Festa+ que há-de vir, já se fazem projectos: CPara a Festa, quem lá chegar... CPara a Festa terás o que prometi! CMãe quando se compra o porquinho para a Festa? CE a lapinha, mãe? Vai-se guardar o Menino Jesus... CSim, agora para a Festa... E o ano tem a *Festa+ como fundamento de marcação do tempo: CFaz 5 anos para a Festa; foi 1 mês depois da Festa; faz dois anos, 3 meses antes da Festa. E a Festa é a principal coluna da memória para assinalar o tempo. Meditemos na legenda a inscrever nela e que nos sirva de padrão até à outra *Festa+. (Y) Com a entrada do ano novo parece que deixámos para trás um caminho que não voltamos a percorrer. Foi mais uma longa viagem que fizemos, que vivemos, na qual houve dias de prazer e horas de aborrimento. Mas o percurso não se efectuou em linha recta. A estrada apresentou-se, para uns com muitas curvas e para outros muito estreita, de difícil transito, pois o conseguir romper através dela não se tornou possível sem roçar nos muros.


Todavia, por bom ou mau caminho, quem chegou ao fim da jornada esqueceu pelo menos durante um dia as agruras da comprida marcha de longos meses. É que nesse dia viveu entregue à paz do lar, na doçura de um ambiente propiciatório às recordações que se acham impregnadas de saudade. Comparo esta nossa viagem, até o Natal, à jornada da Alma que depara uma estalagem onde se gozam as delícias do paraíso, segundo reza o Auto de Gil Vicente. A *Festa+ madeirense não é exactamente o que as necessidades da época vieram trazer: as festas do fim do ano com a orgia das luzes e do fogo da meia-noite. Não se trata das inovações da noite de São Silvestre: os cartazes de turismo roubados a Vulcano que têm muito de psicologia prática. A *Festas madeirense é a que se perpetua em continuidade de uma tradição essencialmente religiosa, juntou o elemento profano. É a que tem carácter individual, bem que um individual com manifestações comuns. É a *Festa+ que há umas centenas de anos as famílias colonizadoras introduziram com a lapinha de escada que ostenta no topo o Menino Jesus. E na cidade, espontaneamente, os fósforos de cores, os potes, as estrelinhas começaram a enfeitiçar a noite, queimados às janelas das casas, de compita com as bombas estralejando aqui e além. Este aspecto profano também conta na tradição religiosa porque anda associado a ela. Mas não se circunscreveu ao Funchal. Por todas as povoações o fogo de artifício é complemento jubiloso da *Festa+ do Menino Jesus. (Horácio Bento de Gouveia, Canhenhos da Ilha, Funchal, sd)


Era velho costume da ilha saudar o ano nascente e fazer ao morto coruscantes funerais com uma festa, pirotécnica. Antes mesmo de cair a meia-noite sobre o último santo do calendário, portas e janelas da cidade, fossem de vivendas modernas, de antigos e austeros, palácios ou de pobres casebres, começavam a esparrinhar fogo na grande encosta, enchendo a escuridade de lumaréus, fogachos rabiantes, rútilas serpentinas, jactos de luz que se cruzavam, derramando estrelas e lágrimas, flamas de vida errante e efémera, dando sempre lugar a outras, a muitas outras, que se entrançavam com todas as cores do arco-íris e se perdiam num espectáculo demoníaco, fantasmagórico e inesquecível. Tudo ardia, tudo fulgurava; já não existia a noite, já não existia a terra; vivia-se num outro mundo, um mundo de fogo crepitante, que arremessava estilhaços de constelações e de astros, por entre os quais vagueavam serpentes vermelhas e caiam, lentamente, lentamente, flores extravagantes, pétalas rubras, como se se estivessem a desfolhar os inesgotáveis jardins do céu. A noite era uma apoteose aos génios do mar. De quando em quando, para se admirar as luminosidades aéreas, havia uma síncope no fogo lançado de varandas e janelas; mas logo ele volvia a incandescer a encosta inteira, brotando da terra em altos repuxos de luz, fortes como veios de água rompendo por entre os répteis de lume que voavam em seu redor e as faúlhas que saltavam do braseiro imenso. A noite cada vez faiscava mais: pintava com todas as cores a sua negra pele e incendiava-se toda, apoteoticamente. Ignescia entre o casario, iluminando torres, recortando araucárias solitárias, copas verdes, vultos disformes saídos da escuridão e, depois, abria-se em cima, aonde chegavam os foguetões, em cataratas de fulgores, de jóias coloridas, de pedras preciosas, numa prodigalidade de deus que lançasse, lá do alto, os seus fabulosos tesouros. E a festa alongava-se a toda a baía. Não era preciso sequer peca aquática para que o mar se enchesse de cintilações. Foguete solto em terra, se dava curva maior, vinha chorar as suas lágrimas policromas sobre a vasta enseada. E, então, quanto em cima ardia e reverberava, obtinha um espelho deformador na água acordada e inquieta. As alegorias de fogo tornavamse ainda mais faustosas e iam descendo vagarosamente para as profundidades marítimas, em busca do colo das sereias. Mas já outras estavam na superfície, a substituir as irmãs perdidas entre os navios que silvavam ao ano novo, as lanchas que andavam em vadiagem festiva, com bandeirolas e balões, e a gente que se debruçava, ruidosa e pasmada, em todas as amuras. Lá em riba, no Terreiro da Luta, o torneio era mais original ainda. Havia bruma na montanha e os foguetões subiam abrindo energicamente um risco vermelho no céu. Ao estoirarem, a névoa revolvida esgarçava-se em absurdos contornos, um farrapo verde aqui, um farrapo azul acolá, este rúbido, aquele doirado de fogo, como se todo o algodão, um instante vislumbrado, fosse arder lá nas alturas. Outras vezes, não se via sequer o traço do foguete na ascensão; de repente, a grande massa de névoa estremecia, iluminava-se por dentro e através dela vinham descendo, caprichosamente, as figuras siderais da pirotécnica, esmaecidas nas suas cores, como vistas através de uma camada de água e como se tudo se passasse num sonho, como se tudo fosse irreal. E, de novo, a bruma voltava a esfarrapar-se em labaredas ou a rasgar-se em abismos, onde corriam estrelas fugazes, astros relampejantes, uma chuva de oiro e prata, tão copiosa e irisada, que céu estival, por mui constelado que estivesse, seria pobrezinho ante a montanha em tal ignição e magia. [Ferreira de Castro, Eternidade, Lisboa, 131 ed. (Escrito 1932-1933)]


O dia de Natal caiu nesse ano num domingo. Fui à igreja, como habitualmente, e, cerca de uma hora depois de eu ter vindo para casa, entrou no pátio do nosso hotel uma banda de tambores e pífaros a tocar o *Deus Guarde a Rainha+. numa sensação curiosa ouvir numa terra estrangeira esses acordes tão conhecidos! Aqueles músicos têm o costume de, neste dia, dar uma volta por todas as casas respeitáveis, na esperança de gratificação. Nas casas portuguesas tocam qualquer dos muitos hinos nacionais ou peças políticas (já se sabe, do partido então vitorioso); mas, onde residem ingleses, é sempre o *God save the Queen+. Ao descrever os festejos paroquiais, referi-me a fogos de artifício, tanto de dia como à noite, os quais constituem parte tão importante das celebrações religiosas. Mas no dia de Natal, a Festa por excelência, não se ouve outra coisa senão explosões por todos os lados, foguetes, estalos, tiros de espingarda e de pistola, ao alvo ou às cegas - em suma, fogo e barulho por todos os meios possíveis. [Isabella de França, Jornal de uma Visita à Madeira e a Portugal 1853-1854, Funchal, 1970.]


A PASSAGEM DO ANO

Nesta noite de final de ano toda a cidade foge para o Casino, para os hotéis, para os pontos altos. O Oceano é um formigueiro de pequenas luzes imóveis e, da Pontinha ao Reid's, milhares de lâmpadas coloridas debruam o litoral da Ilha, até onde a vista se perde. Onde está a cidade de ontem que se espreguiçava ao sol em requebros indolentes? Durante todo o dia o Funchal em festa transfigurou-se, e as próprias árvores, que se recortam agora na sombra e na atmosfera quase tropical, parecem cantar no céu os hinos duma inesperada Primavera. ...Meia noite. A grande féerie vai começar. Das montanhas vão desaguar no Oceano rios luminosos e vivos. José Pedro e Ricardo olham a sua volta e ouvem e vêem uma espantosa sinfonia de cores, de lâmpadas que circundam todos os carreiros, todas as estradas, todos os vales. Lá em cima, nos pontos mais altos, o Pico da Cruz e o Pico dos Barcelos estão desenhados a rubro, numa profusão de cores que estonteia. Para o Oriente, para o Ocidente, para onde quer que se voltem, tudo refulge em clarões de vitória. Meia noite. Ricardo faz um sinal a José Pedro, que virava as costas à Ilha; *olha a terra+, diz num orgulho de madeirense. De facto, toda a Madeira é um grito de fogo que sobe para o céu triunfalmente. Das montanhas que limitam o horizonte, pela encosta, nas povoações, nas vilas, nos povoados, desde onde pode divisar-se ao olhar humano, sobem no ar peças de fogo de artifício que desenham no espaço jardins surpreendentes. São flores prateadas e douradas que irrompem de toda a parte e que vem morrer em lumes cintilantes no Oceano. Lá em baixo, na baía, não param um minuto as sereias dos paquetes, que lançam agora, no céu, os seus holofotes potentes. Longe, do outro lado da montanha, José Pedro adivinha os jardins do Reid's, braseiro magnífico latejando em mil vibrações luminosas. No ponto mais alto da serra surgem festões prodigiosos que se projectam no espaço, como se saíssem duma cratera subitamente aberta. Não há nenhuma casa, nenhuma aldeia que não vibre em convulsões supremas. E na própria Sé, envolta num manto luminoso, a sua cruz recorta-se dominando a cidade numa sugestão de paz e de glória. No relógio luminoso da Montanha I937 já desapareceu. O novo ano inscreve-se, numa apoteose de luz, dominando a ilha. Riscam-se no céu parques luxuriantes, jardins suspensos de sonho; e o fogo crepita sobre a cidade, despenha-se no Atlântico, comunga com o Mar, numa união fecunda, eterna como a própria Vida. A pouco e pouco extinguem-se as últimas crateras luminosas pela serra. Exausto do espectáculo estranho, José Pedro olha agora para as Desertas, que mal se distinguem ao longe, fita o céu negro e hermético. Não diz, porém, uma palavra e é Ricardo quem interrompe o seu silencio: CO milagre do fogo... José Pedro pensa; vê, pela última vez que ainda morrem na encosta, ouve ainda as sereias dos navios ancorados no porto, adivinha as danças e musica na cidade. E apenas responde: - Diz-se que na passagem do ano se deve manifestar um desejo novo, um desejo íntimo. Foi o que eu fiz. [Luís Forjaz Trigueiro, "Considerações sobre uma ilha da Madeira e a Passagem do Ano"[1936],in Cabral do Nascimento. Lugares Selectos de Autores Portugueses que escreveram sobre o Arquipélago da Madeira, Funchal, 1949]


Donde viria a predilecção do madeirense pelo fogo de artifício? Tornou-se vulgar o espectáculo sempre fascinante duma chuva de estrelas coloridas sobre a ilha. Em qualquer ponto da montanha, onde haja uma capelinha; em todos os sítios que se avistam da estrada,Clá estão, de quando em quando, os renques de lâmpadas a assinalar a festa, que nem chegamos a saber qual seja. E, dum momento para outro, sobem na escuridão as girândolas luminosas, como se fizessem parte da noite madeirense. Mas o grande deslumbramento é a passagem do ano, quando o maravilhoso anfiteatro do Funchal se incendeia de estrelas de mil cores e das encostas sobem jogos de fogo alucinantes. Dir-se-ia a evocação poética das labaredas que há cinco séculos lhe destruíram o arvoredo. Enche-se a atmosfera dos silvos das sereias e do buzinar dos automóveis, mas o fogo domina tudo e cria a exaltação colectiva dos acontecimentos excepcionais. Vista do mar, naquela hora, a Madeira é uma floresta de luz multicolor a flutuar no Oceano. Uma realidade fabulosa e efémera! Contemplada da cidade, a baía, toda ela reflexos prodigiosos, com as silhuetas dos navios a refulgir, é outro sonho visível, réplica do mar ao espectáculo fantasmagórico da terra. Para o madeirense, a festa do fim do ano é a conclusão natural das FestasCo NatalCque toda a ilha celebra com entusiasmo e amor. Não há casa, por muito pobre que seja, onde o Natal não seja assinalado por uma limpeza maior, um arranjo mais cuidado, umas lapinhas ou, simplesmente, a imagem do Menino Jesus exposta sobre a cómoda ou sobre a mesa e rodeada de flores e de alegra-campo, de mistura com todos os objectos a que se atribua um valor decorativo. É, todavia, no Funchal que as Festas assumem o seu esplendor máximo: na animação das ruas, desde semanas antes; na especial decoração das montras; no fulgor da iluminação, intensificada pelas casas comerciais, que iluminam as suas fachadas e armam, algumas, os seus *pinheiros+ no passeio que lhes fica defronte; numa indefinível euforia que se espalha no ambiente. Tudo toma um ar festivo; gastam-se as economias corajosamente amealhadas durante o ano para estrear qualquer coisa nas Festas ou gastar em presentes. Bolos-de-mel, broinhas; anonas e abacates, já fora da sua época e por isso mais apreciados; *carne de vinho e alhos+ Cpalavras de todos os dias que têm, porém, um sentido mais forte, imediato, quando chega o Natal, mesmo até para aqueles que se limitam a pensá-las, sem possibilidades de lhes dar concretização... O Natal faz nascer uma esperança em cada coração. Não apenas a dum Mundo em PazCaspiração natural, constante e veemente de todos os homens e mulheres de boa-vontadeCmas a esperança humaníssima de qualquer coisa que melhore a vida, conforme as necessidades de cada um. Quantos se contentariam com um bom jantar, um mimo, um agasalho, um brinquedo que lhes alegrasse os filhos. . . O Natal traz, a alguns, essa probabilidade. Tudo isso conta na claridade que irradia da Palavra Natal. Tudo isso conta na alegria difusa das Festas da Madeira. A *rochinha+ ou *lapinha+ madeirense, inspirada na própria paisagem, é, a um tempo, ingénua e original: o mesmo presépio das províncias portuguesas, mas diferente de todos eles, com dois Meninos JesusCo que está na gruta, deitadinho sobre palhas, e outro, mais crescido, vestido de seda, imagem tutelar de todos os lares da ilha, que é colocado, como soberano, no alto da fantasiosa construção. Casinhas, pastores, ovelhas, e as mais variadas figuras criadas pelos barristas populares, todos os presépios têm. Mas a Madeira junta a tudo isso os melhores frutos da época, a verdura dos seus campos e a delicadeza das suas * searas+. Vão-se perdendo certas praxes e tradições de cunho medieval que caracterizavam, nas diversas freguesias, o Natal da ilha: mascaradas, cantares e folguedos exclusivos da ocasião. Prevalece, contudo, imutável, o ambiente de festa que abre um parêntesis na monotonia quotidiana e dão aos ilhéus de todas as classes, tenham ou não tenham Fé, um espairecimento diferente, às vezes uma ilusão de optimismo e mudança. . . (Maria Lamas, Arquipélago da Madeira Maravilha Atlântica, Funchal, 1956)


Noite de 31 de DezembroCVela toda a gente nesta noite, sendo rara a casa que não receba parentes e amigos. A magia do fogo e a esperança dum novo ano feliz são motivos irresistíveis de folguedos e expansões. A cidade fascina de iluminações irisadas, subindo e descendo montes, abraçando casas, contornando povoações. Por sobre o verde-negro da paisagem, rompendo as trevas da noite, cintila uma estranha constelação de lenda oriental. Todas as portas e janelas da encosta, abertas de par em par, olham sobre a cidade relampejando jorros de luz projectados na baía. A vida, a música e a alegria animam esses olhos em vivas expressões de esperança e felicidade. O movimento de transportes e peões acelera-se na cidade, ganhando cada qual o seu posto em terra ou no mar, em miradoiros de meia encosta e da montanha, em torres, telhados e terraços. E quanto mais se aproxima a meia-noite, mais cresce a vaga luminosa que sobe do hemiciclo do Garajau ao Hotel Reid's e vai morrer no Terreiro da Luta, quebrando suavemente aos pés da Senhora da Paz, no cimo da Montanha, a confundir o fulgor da terra com o do céu. De segundo em segundo, a impaciência insofrida dos mais febricitantes rompe o espaço, aqui e além com clarões de festa e explosões de miríades de estrelas coloridas, ribombar de morteiros e estralejar de foguetes. O Funchal é já um imenso leque aberto lantejoulado de milhares de cores, riscando o espaço fios de ouro e de prata, que engrinaldam casas e jardins. Redobra a vida, cresce o entusiasmo, aumenta a ansiedade. Os corações fremem de inquietação pela primeira badalada da meia-noite na Catedral. O momento enfim chegou. Fica parado o último olhar e suspensa a respiração. Um frisson inexprimível passa em todos os corpos, prende-se a fala, afloram lágrimas, a alegria e a comoção dão largas as vibrações da alma. A noite desaparece, ardem a terra e o céu num vulcão de assombro, arte, beleza e delírio. Do mar à serra, a cidade vibra numa orgia de luz e cor em glorificação ao ano novo. Por toda a parte se levantam florestas de mágicas colorações; cachoeiras de neve luminosas enchem os vales; marulha nas encostas a claridade ofuscante duma radiação solar; maravilhas de fantasia estranha transformam essa pura realidade numa visão de sonho. Sinos, apitos e sirenes atordoam os ares; orquestras e filarm6nicas enchem o espaço de harmonias entusiásticas; gritos, vivas, hurras, palmas, abraços, beijos, preces e lágrimas ressoam por toda a parte na mesma comunhão de sentimentos. Transatlânticos de diferentes nacionalidades, surtos no porto, associam-se à festa espelhando-se nas águas do Oceano à claridade furtadores de seus fogos e iluminações. Os passageiros na coberta entoam hinos, cantam e dançam ao retinir de taças que se levantam num delírio de votos e saudações. Tal é a vida dos primeiros cinco minutos de cada ano na Madeira: uma epopeia de sonho e beleza que nenhuma pena pode descrever, mas que a retina apreende num momento e a sensibilidade guarda para sempre. O escritor inglês Clarence Winchester, que assistiu a este espectáculo em 1938, escreveu dele estas impressões: *Tenho assistido em várias partes do mundo à queima de fogos de artificio, em Hollywood. por exemplo, onde o espectáculo é de grande beleza, de beleza que eu julgava insuperável. Mas a despedida do ano na Madeira é um acontecimento único, sem par. A recordação que eu tinha dos espectáculos anteriores, semelhantes, dissipouse. Na minha mente só prevalece a lembrança dessa feérie extraordinária e indescritível. Assisti à passagem do ano no Reid, e logo que principiaram os fogos de artifício, isoleime num dos recantos do jardim, emocionado, recolhido, como se assistisse a um acto religioso+. Extinto o fogo, desloca-se a festa para o interior das habitações. A canja fumegante e rescendente faz honras ao ano novo; o vinho e os licores evolam aromas de qualidade e velhice; a mocidade exuberante de vida e de ilusões rodopia ao ritmo da dança


acompanhada por pianos, rádios ou grafonolas. Mais um ano entra em todos os corações e em todas as casas como promessa de nova vida, nova sorte e felicidade nova. A partir de 1938, o conjunto de todos os festejos populares de 31 de Dezembro, iluminações, ornamentações públicas, fogos, músicas, bailes e ceias solenes constituiriam programa suficiente para dar categoria social a tais comemorações, por isso as distinguiram com a pomposa classificação de Festas da Cidade oficializadas pela Câmara Municipal do Funchal. [Eduardo Pereira, Ilhas de Zargo, Funchal, 1968, II vol. pp.516-518]


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