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A VINHA E O VINHO NA HISTÓRIA E HISTORIOGRAFIA DAS ILHAS ALBERTO VIEIRA

O vinho é uma presença indelével no devir histórico da cristandade Ocidental e esta comunhão perfeita que não pode ser ignorada. O vinho acompanhou os primeiros cristãos nas catacumbas, expandiu-se com a Europa monástica e perseguiu a diáspora cristã além oceano. A dupla presença no acto litúrgico e alimentação traçou-lhe o caminho e o protagonismo. As ilhas atlânticas são exemplo disso. Mesmo em casos onde a cultura teria dificuldades em se adaptar, como foi o caso de Cabo Verde, os europeus fizeram aí chegar algumas cepas. Apenas na Madeira e nas Canárias a fama se igualou à dimensão comercial, pautando um animado movimento com os mercados americanos. Aliás, a concorrência entre estes dois vinhos foi feroz. Primeiro foi a disputa do mercado inglês a que se seguiu no século XVIII o norte-americano. No último a Madeira conseguiu usufruir de uma melhor posição mercê dos favorecimentos dos tratados e leis de navegação. Já nos Açores as condições endafoclimáticas retiraram-lhe valor em algumas das ilhas, exceptuando-se o caso das ilhas do Pico e Graciosa onde o produto se igualou ao madeirense e canariano. Em qualquer dos casos o mercado do vinho insular foi feito a pensar no mundo colonial, não obstante os seus apreciadores terem-se iniciado no velho continente e terem aí algum lugar de destaque. Recorde-se o caso do vinho da Madeira e Canárias que desde o século XV teve presença assídua nas mesas da aristocracia europeia e o verdelho do Pico que corria nos palácios do czares das Rússia. As ilhas identificam-se perante a História norte-americana por aquilo que lhes concede, isto é o vinho. A partir do século XVIII as ilhas -Açores, Canárias e Madeira - ao conhecidas pela documentação e historiografia como as ilhas do vinho1. Esta visão unitária vai ao encontro do papel comum e competitivo que o vinho lhes atribuiu no mercado americano. Note-se ainda que em alguns dos registos alfandegários norte-americanos do século XVIII o vinho da Madeira surge juntamente com o dos Açores2.

A HISTÓRIA DO VINHO Sem dúvida que no universo do vinho das ilhas aquele que mais se evidenciou foi o da Madeira. O luzidio rubinéctar que continua a correr nos cálices de cristal é, não só, a materialização da pujança económica presente, mas também, o testemunho de um passado histórico de glórias. Prende-o à ilha da Madeira uma tradição de mais de cinco séculos. Nele reflecte-se a época de resplendor e os momentos de crise. No esquecimento de todos fica, quase sempre, a parte amarga da labuta diária do colono no campo e nas adegas, o árduo trabalho das vindimas, os borracheiros no seu passo cadenciado — denunciado pelo eco dos seus cantares — por entre as encostas da ilha. Para recriar esta ambiência torna-se necessário agarrar os restos materiais e documentos e fazê-los reviver a labuta sazonal, ou antes, desbobinar o filme do quotidiano de luta que se esconde por entre a ferrugem, a traça e o pó. 1 . GUIMERÁ RAVINA, Agustin, "Las islas del vino (Madeira, Azores y Canarias) y la America inglesa durante el siglo XVIII", in Colóquio Internacional de História da Madeira, Funchal, 1989, pp.900-934. 2 . A. D. Francis, The Wine Trade, Edinburg, 1973, p.216; Ch. M.Andrews, The Colonial Period of american History, H. Haven, 1964, p.112


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