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FOI DITO QUE ALGO TÃO PEQUENO QUANTO O BATER DE ASAS DE UMA BORBOLETA PODE CAUSAR UM TUFÃO NO MEIO DO MUNDO
FOI DIT PEQUEN DE ASA PODE C MEIO D
caos S U M Á R I O
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Teoria do Caos
CIÊNCIA DAS SURPRESAS, DO NÃO-LINEAR E DO IMPREVISÍVEL
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No princípio, havia o Caos A ORIGEM DO UNIVERSO CONTADA ATRAVÉS DA TEOGONIA DE HESÍODO
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DESORDEM URBANA
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A TENDÊNCIA AO CAOS NA BUSCA PELA ORDEM NAS CIDADES
PÁ G . 3 4 G E N E A L O G I A D O S D E U S E S
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CAOS E COSMOS
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A ORDEM E A DESORDEM NO MUNDO, A DUALIDADE DO SER
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TRAZER ORDEM ATRAVÉS DO CAOS
c ARTE, POR SI MESMA, É UMA TENTATIVA DE
caos
1 MIT em diversas tradições mitológicas, vazio primordial de caráter informe, ilimitado e indefinido, que precedeu e propiciou o nascimento de todos os seres e realidades do universo 2 p. ext. FIL na tradição platônica, o estado geral desordenado e indiferenciado de elementos que antecede a intervenção do demiurgo 3 mistura de coisas ou ideias em total desarmonia; confusão <a casa está um c.> <sua cabeça ficou um c. depois da separação> 4 FÍS comportamento de um sistema dinãmico que evolui no tempo, de acordo com uma lei determinista, e é regido por equações cujas soluções são extremamente sensíveis às condições iniciais, de modo que pequenas diferenças acarretarão estados posteriores extremamentes diferentes c. primordial COSM suposto estado de mistura e irregularidade dos elementos no espaço, antes de se separarem e ordenarem para formar o Universo ETIM lat. châos,i ‘caos, confusão; os infernos; escuridão’
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NO PRINCÍPI
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HAVIA O C
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Q Saúdo-vos, filhas de Zeus! Concedam-me o feitiço de vossos cantos. Celebram a linhagem sagrada dos interminavelmente Imortais, os nascidos de Gaia e do estrelado Urano, aqueles que nasceram da tenebrosa Noite e os que criaram o salgado Ponto. Digam, também, como nasceram no início os deuses, a terra, os rios, o ilimitado mar de agitadas ondas e, ali em cima, os reluzentes astros e o amplo céu. E os descendentes daqueles, os deuses doadores de bens, como se partiram as riquezas, como se dividiram as honras e como, pela primeira vez, habitaram o muito íngreme Olimpo. Inspirem-me isto, Musas que desde o princípio habitais as mansões olímpicas e digamme o que era primeiro.
AOS
AURÉLIO MENA HORNERO
UANDO OS GREGOS ABRIRAM seus olhos para o mundo, viram o céu e a terra e, entre eles, inúmeros seres de vários tipos e linhagens: uns animados - deuses e homens, bestas e plantas, semideuses e monstros -, inanimados outros - montanhas e rios, mares e desertos. Logo, perguntaram-se sobre a genealogia e a linhagem das coisas, dos deuses, dos humanos e da natureza toda - do mesmo modo que os reis de Micenas controlavam a vida de um território, muitas vezes por travar luta contra outros reinos, imaginavam que assim surgia o mundo. É a partir deste fio que começam a puxar e o novelo a desfazer, pouco a pouco, cortando e cosendo, remendando e montando contos e relatos procedentes de idades e lugares diversos, acomodando-os ao parecer de cada momento, em um presente contínuo que, no entanto, atualiza o acontecido há milhares de anos. As diferentes teorias da criação, reunidas sob o termo “cosmogonia”, buscam uma explicação sobre a existência dos primeiros deuses e dos humanos - assim como ocorre na concepção judaico-cristã - pois, para os gregos, era óbvio que os homens eram produtos do engenho e poder de seus deuses. A ideia da grandiosa mãe, dentro de uma concepção religiosa matriarcal, em que o conceito de paternidade ainda não tinha sido descoberto, permaneceu durante muito tempo na mentalidade grega, igual o que se sucedeu em todas as culturas primitivas. Admirada e temida, obedecida e abençoada por todos, a matriarca, única divindade existente, cuja missão era defender o lar e a fecundidade materna, recebia um culto público e doméstico.
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Contudo, quando se conheceu claramente a relação entre coito, gravidez e parto, aquele modelo explicativo se rompeu e o mundo se fez em pedacinhos; todos os elementos percorreram sem ordem nem hierarquias, e se abriram à novas teorias sobre a origem. O sol não se iluminava, a lua não saía pelas noites e o mar não possuía margens. O frio e o calor, a seca e a umidade, o pesado e o leve, tudo chocava-se entre si. O Caos era, pois, o nada ou a antimatéria, um magma formado por todos os elementos em completa desordem, as essências e os atributos. Seja qual foi a explicação desta complexa concepção, logo surgiram várias narrativas que se ocuparam de esclarecer a passagem desde o Caos até os deuses conhecidos. Um dos relatos mais célebres que dá este primeiro passo, estabelecido como a versão tradicional dos acontecimentos, foi o descrito por Hesíodo. Segundo o qual, após o Caos, surge Gea, ou Gaia, sua filha, personificação da Mãe Terra, quem “sem que tenha havido comércio, deu à luz ao estrelado Urano com suas mesmas proporções, para que contivesse por todas as partes e fosse, assim, habitação sempre segura para os felizes deuses.” Esta é a versão sobre tal narrativa:
No princípio, havia o Caos. Depois Gaia, de amplos seios, sede irresvalável sempre de todos os imortais que têm a cabeça do Olimpo nevado. Nas profundezas da terra de caminhos largos, existiu Tártaro. Por último, Eros, o mais belo entre todos os deuses imortais, que afrouxa os membros e cativa todos os eternos e todos os homens, o coração e a sensata vontade de seus peitos. Do Caos, surgiram Êrebo e a negra Noite.
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Ambos, Caos e Gaia, foram os pais das primeiras criaturas vivas: hecatônquiros, ciclopes e titãs - estes, trancafiados logo por Urano por serem monstruosos e pelo deus temer que fosse destronado. Gaia, enojada e contrariada por tal façanha, incentivou os titãs e seu filho Cronos a derrotar Urano. No entanto, os fatos foram, ao que se parece, mais complexos. No princípio, não existia a Terra, somente um conglomerado informe e composto dos quatro elementos, água, terra, céu e ar. Reinava Caos, uma divindade sem rosto, ao lado de sua filha e esposa, Nyx, a negra deusa da Noite, vista da Escuridão. Noite primitiva que reina nas esferas celestes da qual surgiu Érebo, o silencioso e gelado lugar onde vagam os espectros e habita o esquecimento. Érebo destronou seu pai e tomou seu lugar para dividir o leito com sua mãe, Nyx. Deste caso, geraram as Parcas, que controlavam o destino, Hypnos, inspirador do Sonho, e Tânatos, portador da Morte - todos, perversas divindades que, sigilosamente, perseguem os humanos desde as sombras. Também, Nêmesis, a terrível deusa da vingança, Eros, o impulsivo deus do amor (embora alguns dizem que este deus nada tem a ver com a criança que acompanha Afrodite), e uma legião de deuses, ou demônios, sem forma, que logo passaram a habitar e a parasitar os corações dos humanos - para o bem ou para o mal. Finalmente, tiveram Éter, o ar, e Hemera, o dia. Também, estes últimos destronaram seus pais e se propuseram, com a ajuda de seu irmão Eros, transformar o mundo caótico em algo belo. Era o início da criação entendida, não como em gênesis, do nada, mas como uma organização dos elementos. Por fim, desta união, Éter e Hemera, nasceu Gaia, a Terra, um lugar sem limites fornecidos, provido com todo o necessário para construir a morada dos seres vivos. Eros embelezou Gaia com todos os presentes da natureza virgem. Ela, então, correspondeu ao separar, de seu ventre, Urano, o Céu, de igual extensão que ela mesma, e Pontos, as incomensuráveis águas marinhas.
COMO EM OUTRAS CULTURAS, GAIA, A MÃE TERRA, ESTÁ RELACIONADA COM O ASPECTO FEMININO DO COSMOS E, CONSEQUENTEMENTE, COM A FECUNDIDADE TERRESTRE E DAS FÊMEAS, COM A GUERRA E A MORTE, COM AS DEUSAS CIBELE, HERA, DEMÉTER, MAIA, SÊMELE, HÉCATE E OUTRAS MAIS. É A PRIMEIRA, ENTRE OS DEUSES, A TER ASPECTO HUMANO, NENHUM OUTRO ANTIGO DEUS O TEVE. NA VERDADE, A EXCEÇÃO DE GAIA, MUITOS DESSES DEUSES FORAM DEGENERADOS E SE CONVERTERAM EM DEMÔNIOS OU ENTIDADES PARASITTAS, QUE SOBREVIVERAM ALIMENTANDO-SE DO FLUIDO VITAL DE OUTROS SERES VIVOS. NO MITO MAIS DIRETAMENTE REFERIDO, ENCONTRAMOS GAIA COMO FILHA DE CAOS, MÃE E ESPOSA POR UM TEMPO DE URANO, OU SEJA, O CÉU PERSONIFICADO. SEGUNDO OUTRAS VERSÕES, GAIA SERIA RESULTADO DA UNIÃO ENTRE TÁRTARO, REGIÃO ESPECTRAL DAS PROFUNDEZAS, E EROS, O AMOR. HESÍODO CONTA E ORDENA A LINHAGEM DE GAIA EM TRÊS GERAÇÕES DIVINAS QUE ORIGINARAM O UNIVERSO: GAIA E URANO, CRONOS E REIA E, POR ÚLTIMO, OS OLÍMPICOS, O REINADO DE ZEUS E HERA.
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é possível a ordem no mundo?
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Em que lugar, então, ocupa o caos visto como a escuridão (a noite, se assim preferir), o qual não é livre uma vez que “do Caos, surgiram Êrebo e a negra Noite”, se somente
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EXISTE UMA PROBLEMÁTICA humana em relação à impressão generalizada que se tem da física, quando se afirma que o universo é, na verdade, caótico: todo o cosmos é sempre ordenado A realidade que nos subjuga a física, ao lado de outras ciências, diz-nos que todo o sistema transita da ordem para a desordem de maneira natural - pode-se atestar qualquer um que queira manter uma casa limpa e organizada: a tendência natural das coisas, mesmo que não se faça nada com elas, é a desordem. Esta primeira ideia de caos que, praticamente, remete-nos à "tudo sucede segundo a discórdia" de Heráclito - e o faz porque, na verdade, essa etapa da ordem à desordem é a ocorrência de discórdia essencial -, teria uma influência significativa em nossa perspectiva a respeito do mundo e, portanto, obriga-nos a nos enviar, não tanto para a física contemporânea, mas para algo muito mais anterior: a teogonia grega formulada por Hesíodo. A dualidade, como princípio essencial do mundo, seria a base de todo o pensamento grego, o qual sempre partiu de um antagonismo imprescindível e é o mesmo que temos realizado (ordem-caos) para todas as categorias do planeta - o binarismo é um conceito herdado da visão grega de mundo. A primeira e mais clara das oposições que poderíamos encontrar no universo grego é quando Hesíodo nos escreve sobre os deuses da luz e da escuridão - "os filhos da escura Noite, Hypnos e Thanatos, terríveis deuses; nunca o radiante Hélio os ilumina com seus raios
no subir ao céu, nem no descer do céu" - e nos aproxima de um conceito clássico de ordem e caos através de outra dicotomia não menos antiga, a de luz e escuridão. Em seguida, neste confronto, encontramos uma das referências fundamentais para as quais estamos interessados: a impossibilidade existencial de um aspecto sem o outro. Para os gregos, e nós, por extensão, o dualismo sempre parte de uma relação dialética em que há uma tese e uma antítese, duas formas opostas em si mesmas apenas nas suas perfeitas sínteses de um entendimento completo, assim como tal; a luz só faz sentido quando ilumina aquilo que é escuro, porém, a escuridão só nos é presente quando existe luz que lança sombras para permitir o breu. Agora, portanto, para encontrar uma oposição clara entre a ordem e o caos, devemos fazer frente ao confronto entre deuses e titãs ou, o que representa o mesmo, à oposição polar entre a esfera da ordem e o caos absoluto através de sua representação mítica. A Titanomaquia ocorre quando os titãs se veem livres sobre o planeta e, tanto ciclopes, como deuses, devem enfrentá-los para frear seus poderes de destruição quase infinitos. "Os ciclopes, gigantes de um só olho, filhos de Urano e Gaia", segundo Hesíodo, eram "semelhantes aos deuses (...), no entanto, o vigor, a força e os recursos disponíveis guiavam seus atos", enquanto os titãs, irmãos dos deuses e ciclopes, eram criações monstruosas. Os titãs se comportavam um tanto como animais e devastavam tudo a frente sem racionalidade alguma - pode-se relacionar tal fato à Tifão, titã responsável pelos ventos fortes e ferozes. No entanto, os ciclopes, assim como os deuses, demonstravam conhecimento da técnica e, portanto, no sentido aristotélico, poderíamos dizer que foram seres civilizados e próximos da ideia da humanidade grega, já que "presentearam a Zeus o trono e criaram o raio". Por outro lado, os deuses, ao perceberem a incapacidade de derrotar os titãs, pediram veemente ajuda aos ciclopes "os quais por muito tempo haviam enfrentado uns contra os outros" em outra aristotélica demonstração da virtude humana: a busca e o cultivo da amizade. Em trecho de Hesíodo, os deuses imploram aos ciclopes que "demonstrem suas terríveis forças e invencíveis braços na luta fatal contra os titãs, para recordar a doce amizade". Porém, para onde tudo isto nos leva? O fato de que ambos os deuses e ciclopes,
pessoas (pelo menos parcialmente) civilizadas e racionais, lutam contra uma força natural e destrutiva que ceifa tudo em seu caminho, enquanto o caráter eminentemente humano tende à ordem e a moderação, forjar armas e amizades, as forças da natureza estão imbuídas com o caos, que os leva a progredir sem remissão: ordem e caos, humanidade e natureza, estão separados pelo próprio abismo de seus métodos. São duas forças completamente opostas e irreconciliáveis, o que impossibilita toda a concordância ou compreensão entre um ou outro, pois, na verdade, o homem já está além da natureza e do caos. De acordo com este ponto de vista, o homem não tem nenhuma relação com o caos, a natureza, o pensamento ilógico, os sentimentos ou tudo que se define pela desmedida própria daquilo que não guarda a ordem estrita com a qual se constrói um oásis de ordem dentro de um universo hiper caótico. Sob esse paradigma, no qual o homem faz do cosmos um lugar hostil por si próprio, como pode, se é que é possível, para o homem viver no cosmos? É possível, tal e como temos visto, através de uma oposição diametral existente como equilíbrio. Se há, entre os deuses, uma oposição clara entre ordem e caos, entre os homens deve ser, por lógica, uma oposição equivalente; o homem na natureza, fora de seu próprio âmbito humano, perceberia impossível derrotar ou, mesmo, sobreviver durante muito tempo aos efeitos do caos - equivalente ao fato dos deuses incapazes de derrotar os ferozes e brutais titãs. Assim, tanto homens como deuses, percebem a necessidade de criar uma comunidade absolutamente própria ante a qual podem responder e se proteger da caótica natureza a que não estão e nunca estarão aptos. Os deuses precisam se aliar e oferecer morada aos ciclopes para se defender como quando narra Hesíodo, "após tantos tormentos sob dolorosa cadeia, viestes à luz, saído de uma escuridão tenebrosa por decisão nossa" -, da mesma maneira que os homens necessitam de aliança entre si para poder sobreviver em um cosmos que sobrepassa as suas capacidades inatas. Apenas na ordem social, na lógica estruturada da mentalidade humana, é dada a iluminação que eleva o homem.Agora, cabe outra pergunta igualmente legítima: Em que lugar, então, ocupa o caos visto como a escuridão (a noite, se assim preferir), o qual não é livre uma vez que “do Caos, surgiram Êrebo e a negra Noite”, se
somente é possível a ordem no mundo? Como fonte necessária para que os homens possam avançar seus caminhos e não estagnar num perpétuo status quo, o qual não podem prosseguir nem retroceder, apenas permanecer na mais enfadonha das existências. Porém, visto que “da Noite nasceram o Éter e o Dia”, podemos concluir a mais fascinante das visões gregas: da noite surge o dia, assim como do caos nasce a ordem. Tudo que existe no dia, na polis, no mundo da técnica e da razão humana, necessariamente se originou dentro da noite, onde a possibilidade é sempre condição de si: na noite, como no caos, não há nada porque está repleta de possibilidades de ser. Essa é a importância do caos, ou da noite, como força catártica que permite a criação, em si mesma, da ordem humana que crê sua própria natureza em um cosmos hostil. Em apenas permitir o livre fluxo do caos no mundo, podemos ampliar os limites da nossa racionalidade no universo.
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NOITE
ESCURIDÃO
HEMERA DIA
GAIA TERRA
ÉTER
CÉU SUPERIOR
URANO CÉU
Nasce por geração espontânea de Gaia.
O pênis, tão logo cortando-o com o aço atirou do continente no undoso mar, aí muito boiou na planície, ao redor branca espuma da imortal carne ejaculava-se, dela uma virgem criou-se.
AFRODITE AMOR
Nasce quando Cronos corta os órgãos genitais de Urano e arremessa-os ao mar; da espuma (aphros) surgida, ergueu-se Afrodite.
CAOS
E o sábio Zeus, pai dos Deuses e dos homens, sob cujo trovão até a ampla terra se abala.
TÁRTARO INFERNO
TITÃS DEUSES ANCIÃOS Céos, Crio, Cronos, Oceano, Hiperião, Jápeto, Mnemosine, Febe, Reia, Tétis, Teia, Têmis
CRONOS
REIA
CICLOPES GIGANTES DE UM OLHO SÓ Brontes, Estéropes, Arges
HÉSTIA
DEMÉTER
HERA
HADES
PODESIDON
Cronos engoliu todos os seus filhos assim que nasceram, com exceção de Hades e Poseidon. Assim como havia destronado seu pai Urano, Cronos estava destinado a ser deposto por um de seus filhos - um oráculo do qual Reia teve conhecimento e pode evitar. Quando Zeus estava prestes a nascer, Reia procurou Gaia e concebeu um plano para salvá-lo, para que Cronos fosse punido por suas ações contra Urano e seus próprios filhos. Reia deu à luz a Zeus na ilha de Creta, e entregou a Cronos uma pedra enrolada em roupas de bebê, que ele prontamente engoliu.
HECATÔNQUIROS GIGANTES DE CEM BRAÇOS E CINQUENTA CABEÇAS Briareu, Coto, Giges
ZEUS
E eles lembrados da graça benéfica deram-lhe o trovão e o raio flamante e o relâmpago que antes Terra prodigiosa recobria.
Após chegar à idade adulta, Zeus forçou Cronos a vomitar, primeiro, a pedra que lhe havia sido dada em seu lugar - em Pito, sob os vales do monte Parnaso, como um sinal para os mortais: o Ônfalo, “umbigo” - e, em seguida, seus irmãos, de acordo com a ordem em que haviam sido engolidos. Após a batalha contra os titãs, Zeus dividiu o mundo com seus irmãos mais velhos, Poseidon e Hades: Zeus ficou com o céu e o ar, Posidão com as águas e Hades com o mundo dos mortos (o mundo inferior).
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CAOS E COSMOS OSCAR LOPEZ AS MITOLOGIAS DOS POVOS primitivos descrevem o universo numa luta crucial entre duas forças antagônicas - as de um princípio ordenador, que rege o espaço, e as de forças desconhecidas, que tendem a desintegrá-lo. Os gregos, a essa primeira força, deram o nome de Cosmos, uma ideia filosófica que designa, originalmente, a ordem certa do estado e de toda comunidade. O termo, Kosmos, foi introduzido pelos pitagóricos e seu significado inicial afirmava que a natureza estruturava o processo de todos os domínios da existência, desde a matéria até as matemáticas ou, até Deus, não meramente o universo físico. O ponto de partida destes filósofos foi o problema da origem, a physis, que tinha um sentido metafísico e tratava tanto do enigma do início do universo, como do que se derivou dele, os seres. Sua grande entrada é o modo como resolveram tal incógnita mediante o pensamento teórico e como envolveu toda a Grécia. Escreveu Anaximandro de Mileto, filósofo pré-Socrático, que o universo está construído mediante rigorosas proporções matemáticas, de aplicações absolutas, e, por isso, o mundo se revela como um Cosmos, ou seja, uma comunidade de coisas submetidas à ordem e à justiça. Esta ideia significou uma mudança radical frente a mitologia e a religião, pois firmava uma nova ideia de divindade que superava o medo à fugacidade e à destruição que se vivia na época. Era um conhecimento que buscava superar os limites do que é dado na aparência sensorial e na compreensão
do que se deriva daquela origem e existe atualmente (ta onta, seres) mediante a investigação empírica (história). Foi algo fundamentalmente novo, pois submeteu o pensamento teórico causal ao reino dos mitos relativos ao nascimento do mundo e, assim, ao surgimento da filosofia científica, a maior façanha histórica da Grécia.
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izia-se que a natureza do ser dominava um princípio chamado isonomia (do grego, “igualdade ante a lei”), em oposição ao de pleonexia (do grego, “avareza”). Esta afirmação era reflexo da nova experiência política da lei do direito a qual estavam vivendo e era fonte autêntica de toda crença relativa ao sentido do mundo. Isto implicava que o Estado incluía o homem e lhe fornecia uma nova existência de bíos politikos ao lado de sua vida privada - o que o levou a distinguir o privado (idíon) do que é público (koinón). Assim, o ser humano não era puramente ignorante nem, também, político, pois se colocava, com auxílio dos demais, em ajudar a polis.
Na doutrina de Hesíodo existem duas forças que unem e separam, o amor e o ódio. Essa cosmogonia, o mito do nascimento do universo, desenvolveu uma grande influência em Platão e Sócrates para a formulação do “eu racional” e, consequentemente, ao surgimento do conceito de verdade com validade universal. Nas sociedades tradicionais, existe um rígido sistema de regulamentos que funcionam através de ritos e doutrinas postas ao serviço da ordem. No entanto, a desordem não é percebida como inerente à ordem da vida. Nas sociedades modernas, a relação entre ordem e desordem é precária, pois o estilo de vida acelerado apresenta desafios e pressões, além de instabilidade de conhecimento, códigos e valores que levam à incerteza - em especial, entre os jovens. Por isso afirmou Georges Balandier (1920 - 2016), sociologista francês, que tudo pode levar a uma era de “contágio entrópico, de implosões e explosões sociais em cadeia e loucuras desastrosas”. Atualmente, o problema cosmológico se apresenta de uma forma paradoxal: conhecemos a estrutura e a evolução do universo, entretanto, uma grande perplexidade nos esmaga. As leis que acreditamos absolutas, são somente válidas para um universo reversível, em outros, existem diferentes leis. Além disso, nossa concepção de mundo está ligada ao imaginário, ou seja, às nossas estruturas mentais e ao universo absoluto. Esse mundo é um legado de Newton, Kepler e Galileu e se apresenta de ordem impecável, equilibrado, postulado há 2500 anos por Parmênides com a ideia de cosmos estático. É um universo apoiado ao princípio da identidade que impôs a concepção dinâmica de Heráclito, talvez por razões políticas, que apoiava a evolução e a contradição dentro de toda a realidade. Assim, criou-se um processo cósmico e humano em termos de ordem imóvel, que operava na natureza, na sociedade e no próprio universo e, portanto, impuseram-se as ideias de determinismo, estabilidade e regularidade, ao mesmo tempo que se anularam as de instabilidade, novidade e desequilíbrio. A nova física que coloca a instabilidade dinâmica associada à ideia de caos, é uma física do não-equilíbrio, que substitui a anterior e a estreita ideia de cosmos material. É, também, muito semelhante à velha ideia de physis dos jônios (a imagem de um mundo sem imagem) que, no fim, é desmentida devido à teoria do Big Bang. Mais próximo está René Thom (1923 -
2002), matemático francês, com sua ideia de mudança/ruptura e mostra um universo envolto em um turbilhão de fogo que se congela, desintegra-se e, em seguida, milagrosamente volta a se formar. Para Hubble (1889 - 1953), astrônomo estadunidense, o cosmos é um universo singular e único em sua gênese, evolução e lei. Suas regras são produzidas a partir da sua própria individualidade e carrega a ideia de evento que foi apagado pela física clássica. Hoje, sabemos que o espaço teve uma gênese e começou quando, em uma temperatura elevada, dilatou-se uma nuvem de fótons. A partir daí, surgiram as primeiras partículas: elétrons, neutrinos, nêutrons e prótons. Ao abaixar a temperatura, deram-se as primeiras núcleossínteses e se formaram núcleos de deutério, hélio e hidrogênio. Portanto, a gênese é um cosmogênese que se associa a uma morfogênese e a uma termogênese e, assim, tudo é, como dizia Heráclito, “metamorfose de fogo”. A consideração de caos leva uma nova coerência à uma ciência que, não só fala de leis, mas, também, de acontecimentos e não está condenada a negar o surgimento do novo e sua própria atividade criativa. O caos é sempre consequência de instabilidades e a maioria dos sistemas físicos assim são - assim como as ciências humanas se movem pela noção de incerteza. Sendo o tempo nossa dimensão existencial fundamental, o paradoxo de tempo ocorre a partir das ideias de instabilidade e caos. Caos se expressa na physis e, o cosmos, por meio da tétrade desordem/interação, encontro/ ordem/desordem e das transformações, organizações e desorganizações completas que faltavam na física anterior. A relatividade e as novas teorias físicas nos mostram um universo em expansão que ainda nos é desconhecido. Toda criação está unida a uma ruptura de formas, ou catástrofe, em uma cascata de eventos intermináveis em que a ordem, a organização, liga-se à desordem, ao desequilíbrio e à instabilidade, e todas permanecem juntas. Morre, então, a antiga ideia de ordem que explicava o todo. O cosmos se organiza para se desintegrar ao calor, o que explica a aparição de estrelas e átomos pesados e o surgimento de uma nuvem ardente de fótons, que expande e esfria. Galáxias, sóis, estrelas são formadas dividindo-se e nascendo novamente. Assim, a cosmogênese é uma termogênese, o universo nasce com o calor que comporta desordem, turbulências, agitações e esfriamentos.
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e à instabilidade, e todas permanecem juntas.
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Toda criação está unida a uma ruptura de formas, ou catástrofe, em uma cascata de eventos intermináveis em que a ordem, a organização, liga-se à desordem, ao desequilíbrio
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desordem é a companheira da ordem e não há uma somente, senão muitas ordens e desordens, ou seja, o universo está em constante criação. A ordem não apareceu só, isolada, mas surgiu ao mesmo tempo que a desordem, na catástrofe térmica e nas condições singulares do processo constitutivo do universo. Ela expulsou das ciências as ideias de jogo, gasto, singularidade e incerteza. Já, a desordem, as fez ressurgir e, portanto, reviver a fonte do pensamento complexo. Assim, ambas não são absolutas, substanciais, porém, relativas e as suas relações são complementares, concorrentes e antagônicas e, por isso, necessitam uma da outra para combate e contradição. Nasceram juntas no antecomeço, o que deu origem a tudo sem cessar, numa incerteza chamada caos. Ordem, palavra mestra da ciência clássica, reina desde o átomo até a Via Láctea. O universo, autossuficiente, sustenta-se em perpetuidade. A desordem foi excluída da ciência durante milênios, pois era limitada e parcial e, assim, existia apenas uma ordem física, uma biológica e uma ordem social. No entanto, com a termodinâmica, todo essa ideia se destruiu ao descobrir que a energia era uma unidade indestrutível. De acordo com o Segundo Princípio, esta energia se degrada, pois a energia de calor não pode ser convertida totalmente e, todo trabalho, ao liberar calor, contribui para a degradação. O calor é a energia própria dos movimentos desordenados das moléculas, de modo que qualquer aumento da entropia é um aumento de desordem interna e leva à degradação irreversível dentro dos sistemas físicos fechados. Assim, a desorganização é identificada com a maior probabilidade para um sistema fechado. Porém, a evolução física, biológica e antropológica desmente este princípio entrópico. Em 1900, a desordem se tornou matriz microfísica do quantum de energia e foi implantada no subsolo da matéria - as partículas, ao não serem objetos elementares identificáveis e mensuráveis, dissociam-se, tornam-se indeterminadas
para o olho do observador. Então, a desordem está presente no microtecido de todas as coisas, sóis e planetas, sistemas abertos ou fechados, coisas inanimadas ou seres vivos. Mas, já não é uma desordem de degradação ou perturbação. É um distúrbio constitucional que faz parte da physis de todo ser físico. Forma parte da ordem e da organização, no entanto, não é nem um, nem outro. Em 1923, foi descoberto que o universo se desloca e, toda sua extensão, corresponde a uma expansão que, talvez, é de ordem explosiva. O cosmos nasce, gira, se decompõe, não é algo estável ordenado. A desordem é uma desordem de gênese, de criação. Agora, a desordem não é parasita da ordem e do resíduo da realidade, mas, parte de seu tecido. Não é nenhuma desordem de degradação, nem de desorganização, porém, integra a physis, “uma desordem, ao invés de degradar, não existe”. De acordo com Edgar Morin, filósofo francês, o loop tetralógico ordemdesordem-interação-organização está no começo da physis e emerge através dos jogos cosmológicos. “É o princípio imanente da mudança, das organizações e das desorganizações que faltava à Física. Na origem e no fundamento do ser solar, está o loop, o dizer, o todo retroativo, produtor e organizador de si”. A ideia de loop é uma ideia dinâmica de circuito e de rotação, como a que ocorre na relação indivíduo-espécie-sociedade ou, como nos seres vivos, cujas formas se dão a partir de múltiplos e diversos circuitos. Significa que, em todos os organismos vivos, ocorre um jogo circular e não simplesmente linear, tal como acontece no movimento do ar ou na circulação sanguínea - cada um regenera ao outro e contribui para o desenvolvimento do organismo, tudo graças ao poder de recursão própria dos seres vivos. Ciclos e cadeias físicas, químicas e biológicas, como os processos de matéria/energia, vida/morte, em seus constantes movimentos, constituem o grande “circuito plural”. Por tal motivo, não existe apenas uma evolução, mas, também, involuções e regressões, um muro que se coloca entre nós e seu fundo mais íntimo. Além de todo o cosmos conhecido, existe um proto-cosmos incógnito que está oculto à nossos olhos e, quanto mais o estudamos, menos o conhecemos. Porém, o problema de ambos é o mesmo e, a ciência ,em sua arrogância, teve de reconhecer as verdades
cabalísticas e religiosas. No universo existe um jogo duplo: o progresso na organização e na ordem, associado a um mesmo tempo a um processo contínuo de degradação e de dispersão. Portanto, não há apenas progresso e, sim, regressões, involuções e catástrofes.
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ossa primeira percepção de realidade, seja na infância, como na vida adulta, é caótica. Quando nos deparamos em um lugar novo, sua aparência nos deslumbra de tal maneira que não alcançamos em dar uma forma concreta. O mesmo ocorre com crianças, afirmam psicólogos, que geram uma impressão dos objetos através da gestalt (figura) incompleta e, assim, o rosto da mãe e de quem os rodeia, é mais um caos de impressões que qualquer outra coisa - a ideia de ordem vem mais tarde. Por este motivo, o mais original é o caos que, quando corrigido, converte-se em ordem. Os mitos foram as primeiras respostas à inquietude do homem sobre o mundo e, a magia, foi a única forma possível de lidar com o acaso, o “tremendo deus que não tem rosto”. Há alguns anos, nascia uma nova ciência, a Caologia, que é responsável por estudar a desordem, a turbulência, a desorganização e, até mesmo, o inesperado. O primeiro autor que se atreveu a falar do caos, foi Henri Poincaré (1854 - 1912), matemático, físico e filósofo francês. Seus tópicos de estudo não são apenas temas elevados, mas o cotidiano é objeto de indagação e, como afirmou Balandier, “a trivialidade se torna um mistério”. Assim, por exemplo, interessa-se pelo gotejamento de uma torneira, pela água de uma cascata, pela fumaça de um cigarro, pelas nuvens; todos estes elementos são caracterizados por serem desordenados ou informes e por se igualarem a fenômenos tais como ataques cardíacos, convul-
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sões, desemprego, pois, ao invés de serem confusos, são tratados como “atraídos por certos estados”. Por trás de tudo isso, existe uma incerteza, e seu estudo promete muitas realizações, porém, também, certo dogmatismo ao desconhecer o papel da ordem do velho cosmos que inauguraram os gregos. Na física clássica, embora a questão de tempo já havia sido introduzida, não existia distinção entre passado e futuro (pois era baseado na ideia de Deus, hoje, sabe-se que tempo e Deus têm papéis diferentes na física, na química, na biologia e nas ciências humanas), tampouco, permitia-se entender o conceito de “flecha do tempo”. Portanto, como afirmou Prigogine (1917 - 2013), químico russo, o tempo é um paradoxo e está ligado às ideias de caos e instabilidade e os paradigmas evolutivos da ideia de irreversibilidade. A física clássica foi baseada no estudo da gravitação e do eletromagnetismo e, hoje, são dadas outras formas de interação e, até mesmo, da sua unificação. Prigogine também levantou a ideia de que o reaparecimento do paradoxo do tempo, que rompeu os fenômenos simétricos, deve-se à duas conclusões. Primeiro, estruturas dissipativas como, por exemplo, a óptica dos raios laser e a cidade, que revelam o papel criador dos fenômenos irreversíveis e da flecha do tempo, pois contrastam com as estruturas de equilíbrio que são mortas. Enquanto a cidade está cheia de indivíduos que estabelecem relações entre si e o meio ambiente, suprimidas estão estas cidades, que morrem como tantas vezes aconteceu. Estes fenômenos ocorrem porque há um movimento desordenado incessante por receber fluxos de matéria e energia, fluxos de calor e químicas. Segundo, a formação de estruturas estacionárias do não-equilíbrio que foram preditas por Turing (1912 - 1954), matemático britânico. Aqui se levanta o problema do caminho que pode ser analisado por descrição estatística e para deslocar as noções de caos, instabilidade e probabilidade. Assim, a irreversibilidade é uma propriedade fundamental, a presente instabilidade em escala microscópica. E o caos é uma descrição probabilística e realista, mais próxima do que as anteriores. Nos sistemas instáveis, o tempo entra de maneira contínua.
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caos nos leva a algumas representações estatísticas irredutíveis que, de acordo com Prigogine, é a própria definição de caos e podem ser estendidas aos sistemas quânticos. Poincaré coloca o contratempo das ressonâncias e das divergências da mecânica clássica - desde cedo era conhecido que o sistema planetário possui ressonâncias que levam a divergências. Hoje, podemos eliminar as diferenças e tornar o problema convergente, o que resolve a dificuldade da irreversibilidade. As divergências de Poincaré marcam a barreira entre sistemas dinâmicos reversíveis e os sistemas dissipativos de simetria temporal quebrada. Eliminar as divergências de Poincaré é um passo essencial na resolução do paradoxo do tempo. “Nas ciências naturais, o ideal seria alcançar a certeza, associada a uma descrição determinista”, enquanto as ciências humanas estão dominadas pela noção de incerteza; ambas, a gestão de tempo é distinta. Assim, o tempo cósmico é uniforme, por exemplo, durante cinco minutos, enquanto no tempo musical há acelerações, diminuição de velocidade, antecipação de tópicos, o mesmo não acontece com o tempo de uma pessoa tranquila que está na espera de algo como emprego, amor, etc. Portanto, o tempo é a nossa dimensão existencial fundamental e, nele, estamos apoiados.
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aos é um conceito claro e substancial, que leva à indistinção e à luta e retorna ao antigo Polemos de Heráclito a se instalar em nosso mundo. Como afirmou Thom, “nossos modelos atribuem toda morfogênese a um conflito, a uma luta entre dois ou mais distúrbios ou vários atratores”.
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Então, como entender a relação do Caos-Logos, que “fala a língua do delírio”? Em suma, o caos está subjacente como infraestrutura de nossa physis e a transformação deste caos, em organização. Igualmente, os sóis manifestam a inseparabilidade de caos e cosmos e são máquinas que produzem átomos pesados, isto é, organização completa. Com a física de partículas, ou seja, o estudo das partículas elementares, sabemos que os átomos e os sóis são ambos núcleos duros sobre os quais repousam o real. O átomo é um verdadeiro viveiro subatômico de elétrons, prótons e fótons. Daí a necessidade de conciliar um pensamento que liga a ordem com a estabilidade, uma concepção que rejeita o irracional e o imaginário a fim de realizar, a todo custo, uma sociedade da razão. A ideia de Cosmos é enriquecida, hoje, com suportes tecnológicos que nos permitem conhecer estrelas distantes, o mais profundo de nosso planeta e de nosso corpo, mas, paradoxalmente, nossa estreiteza mental. Parte, então, a necessidade de uma torção mental ou, como disse Chopra, uma “crise de percepção” que leva a superar a visão analítica e fragmentada da realidade que temos vivido nos últimos séculos e foi aumentada pelo consumismo predatório capitalista. Não devemos somente a nós mesmos (antropocentrismo), mas às rochas, rios, plantas, animais e ao mesmo céu estrelado, como falado pelos índios, e reflete a filosofia perene de todos os povos. É este conhecimento que não é dominação, porém, consciência, saber compartilhado de todos os indivíduos. Podemos recordar a imagem da música do século XVII, em que o concerto era um grupo de músicos em busca da harmonia e não, como hoje, alguns instrumentos na luta uns contra os outros, e é essa a harmonia infinita que governa o universo inteiro. A teoria do caos nos diz que nossas intervenções na natureza, por obra do homem, têm limites e que ela, assim como as árvores na sua rede retroalimentadora, é muito forte, mas pode entrar em colapso quando abusada. No mundo conturbado em que vivemos, esta visão totalitária é o que tem levado muitos, em especial, os jovens, a dúvida de que existe uma ordem e, até mesmo, um sentido do universo. A verdade é oposta.
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19 A 21 DE MAIO MESC/FLORIANÃ&#x201C;POLIS
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dualidade. Bem e mal, objetivo e subjetivo, acima e abaixo.
ENQUANTO A MAIORIA DAS ciências tradicionais lida com fenômenos supostamente previsíveis como a gravidade, a eletricidade ou as reações químicas, a teoria do caos trata de coisas não-lineares que são efetivamente impossíveis de prever ou controlar, como a turbulência, o clima, o mercado de ações, os estados cerebrais, etc. Estes fenômenos são freqüentemente descritos pela matemática fractal, que captura a complexidade infinita da natureza. Muitos objetos naturais exibem propriedades de fractal, incluindo paisagens, nuvens, árvores, órgãos, rios, etc., e muitos dos sistemas em que vivemos apresentam um comportamento complexo e caótico. Reconhecer a natureza caótica, fractal de nosso mundo pode nos dar nova percepção, poder e sabedoria. Por exemplo, ao compreender a dinâmica complexa e caótica da atmosfera, um piloto de balão pode “orientar” um balão para um local desejado. Ao compreendermos que nossos ecossistemas, nossos sistemas sociais e nossos sistemas econômicos estão interligados, podemos esperar evitar ações que podem acabar sendo prejudiciais ao nosso bem-estar a longo prazo.
SILBIA LÓPEZ DE LACALLE
Ao nosso redor advertimos uma tendência geral à desordem: um vidro rompe-se, a água de um copo derrama-se - nunca ocorre o contrário. Mas essa desordem não implica confusão. As leis do caos oferecem uma explicação para a maioria dos fenômenos naturais, desde a origem do Universo à propagação de um incêndio ou à evolução de uma sociedade. Aproxima-se uma crise de percepção. A complexidade do mundo levou o ser humano a simplificar a realidade, a abstrair a natureza para fazê-la cognoscível e, tristemente, a cair na armadilha da dualidade. Bem e mal, objetivo e subjetivo, acima e abaixo. Mas a tendência a ordenar tudo choca com a mesma realidade, irregular e descontínua. Muitos cientistas já renunciaram à ilusão da ordem para dedicarem-se ao estudo do caos, que aceita o mundo tal como é: uma imprevisível totalidade. Em meados do século passado, a evolução da ciência viu-se alterada por uma reflexão comparável a esta: conhecemos o movimento dos planetas, a composição das moléculas, os métodos para explorar a energia nuclear…, mas ignoramos porque as zebras têm listras ou o motivo porque em um dia chove e no seguinte faça sol.
A busca de uma explicação dos fenômenos naturais que observamos, complexos e irresolúveis mediante fórmulas, configurou o que se conhece como Teoria do Caos, uma teoria que, embora não negue o método da ciência clássica, propõe um novo modo de estudar a realidade. Uma rápida olhada ao redor adverte a tendência geral à desordem: um vidro rompe-se, a água de um copo derrama-se, nunca ocorre ao contrário. Mas, contrariamente ao que se pensa, essa desordem não implica confusão. Os sistemas caóticos caracterizam-se por sua adaptação à mudança e, em consequência, por sua estabilidade. Se jogarmos uma pedra em um rio, seu leito não é afetado. Não sucederia o mesmo se o rio fosse um sistema ordenado, em que cada partícula tivesse uma trajetória fixa: a ordem se derrubaria. As leis do caos oferecem uma explicação para a maioria dos fenômenos naturais, desde a origem do Universo à propagação de um incêndio ou à evolução de uma sociedade. Então, por que está a humanidade tantos séculos submergida no engano da ordem? O problema parte do conceito clássico de ciência, que exige a capacidade para predizer, de forma certeira e precisa, a evolução de um determinado objeto. Descartes assegurava que, se fosse fabricada uma máquina tão potente que conhecesse a posição de todas as partículas e que utilizasse as leis de Newton, para saber sua evolução futura, poderia ser predita qualquer coisa do Universo. Essa afirmação, tão reducionista como audaz, ilustra a euforia científica depois da descoberta de Netuno, graças às leis de gravitação de Newton. Um marco científico que impôs a ordem, o determinismo e a predição no trabalho investigador e limitou os objetos aos fenômenos que coincidiram com o padrão prévio. Os demais (turbulências, irregularidades, etc.) ficaram relegados à categoria de ruído, quando esse ruído abarcava a maioria do observável. Os físicos dedicaram-se – e dedicam-se – a decompor sistemas complexos, corrigindo o que não se enquadrava com a esperança de que as pequenas oscilações não afetassem o resultado. Nada mais longe da realidade.
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O FANTASMA DA NÃO LINEARIDADE No final do século passado, o matemático e físico Henri Poincaré questionou a perfeição newtoniana relacionada com as órbitas planetárias, o que se conhece como o problema dos três corpos. Apresentava uma atração gravitatória múltipla, que até então se resolvia com as leis de Newton e a soma de um pequeno valor que compensasse a atração do terceiro elemento. Poincaré descobriu que, em situações críticas, esse puxão gravitatório mínimo podia realimentar-se até produzir um efeito de ressonância que modificaria a órbita ou inclusive lançaria o planeta fora do sistema solar. Esse devastador fenômeno assemelha-se ao acople do som, quando um microfone e seu alto-falante estão próximos: o som que emite o amplificador volta ao microfone e ouve-se um apito desagradável. Os processos de realimentação correspondem em física às equações iterativas, em que o resultado do processo é utilizado novamente como ponto de partida para o mesmo processo. Dessa forma, constituem-se os sistemas não lineares, nos quais efeito e causa se identificam plenamente. Somavam-se as partes e obtinha-se a realidade. Poincaré introduziu o fantasma da não linearidade, em que origem e resultado divergem, e as fórmulas não servem para resolver o sistema. Havia sido dado o primeiro passo para a Teoria do Caos.
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As leis do caos oferecem uma explicação para a maioria dos fenômenos naturais, desde a origem do Universo à propagação de um incêndio ou à evolução de uma sociedade. Então,
por que está a humanidade tantos séculos submergida no engano da ordem?
DIRIGINDO A COMPLEXIDADE O caráter não linear e interativo dos sistemas da natureza permite que instruções muito simples originam estruturas complexas. A física da complexidade busca regras simples que expliquem esses organismos complexos. O astrofísico Ignacio García de la Rosa parte da pirâmide da evolução (que inclui quarks, núcleos atômicos, átomos, moléculas simples, biomoléculas células, organismos e sociedades) para tratar a complexidade: a maior parte da matéria – assinala – encontra-se nos estágios inferiores e não forma elementos mais desenvolvidos, de modo que a pirâmide vai se fechando. Nós somos uma minoria em comparação com todo o material que há no Universo. A pirâmide vai da abundância do simples à complexidade do escasso. Esse conceito tem relação com o da linguagem, que parte das letras e passa pelas palavras, frases, parágrafos, capítulos, livros, etc., com a peculiaridade de que as letras não têm nada a ver com as palavras e assim sucessivamente. Do mesmo modo que “z” não está aparentada com o conceito de “azul”, as moléculas que dão origem a uma zebra não determinam sua constituição. As estruturas complexas têm propriedades alheias aos ingredientes anteriores, o que apresenta um problema para a ciência, que perde sua capacidade de predição. Na física clássica pressupõe-se que os objetos são independentes da escala que emprega para medi-los e que existe a possibilidade de relacioná-los com sua medida exata. Não assim na geometria fractal e na lógica difusa, instrumentos empregados pelos cientistas do caos. Bart Kosko, autor da chamada lógica difusa, afirma de modo incisivo que quanto mais de perto
se olha um problema no mundo real, tanto mais difusa torna-se sua solução. Mas se a precisão esfuma ainda mais o objeto de estudo, que estratégia deve ser empregada para estudar os sistemas complexos? Aqui intervém a teoria da totalidade, que concebe o mundo como um todo orgânico, fluido e interconectado. Se algo falta, não se deve buscar a “parte danificada”, como no caso de um televisor ou de uma lavadora, mas sim, há que se revisar o sistema por completo, por se tratar de uma unidade indissolúvel. O grande erro histórico da ciência consiste em observar a natureza de modo fragmentado e explicar tudo mediante a soma das partes, ignorando duas questões primordiais: a impossibilidade de “colocar a totalidade no bolso”, porque o bolso também faz parte dela, e a dependência que existe entre o observador, o observado e o processo de observação. O homem integra a realidade, de modo que sua mera presença altera o objeto de estudo. A obsessão por interpretar o caos do ponto de vista da ordem deve dar passagem a uma interpretação global, que salva as fronteiras das diferentes disciplinas e aceita o paradoxo que converte o simples e o complexo, a ordem e o caos, em elementos inseparáveis. De fato, o mais complexo que concebeu o homem, o fractal de Mandelbrot, criou-se a partir de uma equação iterativa muito simples: o caos é uma inesgotável fonte de criatividade, da qual pode também surgir a ordem (e vice-versa). As civilizações antigas acreditavam na harmonia entre o caos e a ordem, e definiam o caos como um “tipo de ordem implícita”. Talvez seja o momento de dar-lhes atenção.
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O EFEITO
modificar os sistemas climáticos de Nova York no mês que vem.
BORBOLETA "Espero que Deus não seja tão cruel para fazer com que o mundo esteja dirigido por fórmulas não lineares", comentavam alguns cientistas na década de 50. Resultou que, com efeito, a natureza se regia por elas. Em consequência, como indica Ignacio García de la Rosa, astrofísico do Instituto de Astrofísica das Ilhas Canárias (IAC), o termo “não linear” é um pouco injusto. Seria como chamar os animais elefantes e não elefantes, mas como naqueles tempos não se podia estudar esses sistemas, reduziu-se a terminologia. Neste caso, a panaceia manifestou-se em forma de computador que, ainda que não pudesse resolver a natureza não linear mediante fórmulas, permitia realizar simulações. Em 1960, o meteorologista Edward Lorenz deu, sem se propor, o segundo passo até a Teoria do Caos. Entusiasta do tempo, dedicava-se a estudar as leis atmosféricas e a realizar simulações a partir de seus parâmetros mais elementares. Um dia, para estudar com mais detalhamento uma sucessão de dados, copiou os números da impressão anterior e os introduziu na máquina. O resultado o comoveu. Seu tempo, a escassa distância do ponto de partida, divergia algo do obtido anteriormente, mas ao cabo de poucos meses – fictícios – as pautas perdiam a semelhança completamente. Lorenz examinou seus números e descobriu que o problema estava nos decimais. O computador guardava seis, mas para economizar espaço ele só introduziu três, convencido de que o re-
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sultado apenas se ressentia. Essa inocente atuação fixou o final dos prognósticos a grande prazo e manifestou a extrema sensibilidade dos sistemas não lineares: o chamado “efeito borboleta” ou “dependência sensível das condições iniciais”. Trata-se da influência que a mínima perturbação no estado inicial pode ter sobre o resultado final ou, como reúne o escritor James Gleick: se com seu adejo, hoje agita o ar de Pequim, uma borboleta pode modificar os sistemas climáticos de Nova York no mês que vem. Qualquer variação, seja em um milésimo ou um milionésimo, constitui um pequeno ajuste, que modificará o sistema até o ponto de fazê-lo imprevisível. A iteração oferece resultados estáveis até certo ponto, mas quando supera o sistema, se derruba no caos. Os cientistas J. Briggs e F.D. Peat aplicam essa ideia ao ciclo vital humano: pode-se abordar nosso envelhecimento como um processo no qual a iteração constante de nossas células no final introduz uma dobra e uma divergência que altera nossas condições iniciais e lentamente nos desintegra.
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(...) se com seu adejo, hoje agita o ar de Pequim, uma borboleta pode
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ENTROPIA SOCIAL STEPHANIE BROWN
UM PACIENTE JÁ ATRASADO jogou seu celular no sofá e alegou “você pode por favor me ajudar a controlar meu celular? Está arruinando a minha vida.” O que supostamente era para nos ajudar está nos machucando. O que supostamente era para nos libertar, escraviza-nos. Esse é o paradoxo do vício. Qualquer que seja a atração, parece tão bom, tão positivo, tão útil e tão inofensivo que, então, ficamos viciados. Assim é a sociedade. Pegados em uma espiral caótica e frenética de um novo vício, as pessoas estão perseguindo dinheiro, poder, sucesso e um ritmo de vida mais raípodo e selvagem. Como qualquer outra dependência, as pessoas estão fora de controle em seus comportamentos, sentimentos e pensamentos, mas acreditam que são normais. Este é o progresso. Você sempre se move para a frente e não há limites para o quão longe você pode ir ou quão rápido você pode chegar lá. Não faça uma pausa, não reflita. Você ganha ou perde. Você vai se atrasar e falhar se você parar de se mover. Rápido a qualquer custo é o mantra de uma sociedade estressada e angustiada hoje. O excesso de agendamento e a reserva dupla foram sinais de progresso e de pertencimento há duas décadas. As práticas que costumavam causar constrangimento tornaram-se orgulhosamente racionalizadas como multitarefa, uma nova habilidade para dominar. Você faz malabarismo com 10 pratos enquanto se gaba da sua semana de 90 horas e exibe que você é dependente de remédios para conseguir dormir. Isso é sucesso. O progresso é igual velocidade, que equivale à sucesso, uma receita para o vício. A sociedade agora está dominada por crenças, atitudes e modos de pensar que elevam os valores de impulso, gratificação instantânea e perda de controle
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por uma necessidade de agir, uma necessidade de estar online, roboticamente sempre verificando. A multitarefa estimula o caos interno e a atenção fragmentada. Também pode interromper e diminuir a aprendizagem, a produtividade e até mesmo as amizades. Desligar sua atenção reduz sua eficiência e habilidade. Você não pode se concentrar em nada. Então, tente interromper seu comportamento impulsivo. Desligue seu telefone por uma hora por dia para se concentrar em um livro, conversar com sua família ou amigos, ou para cozinhar uma refeição. Um pequeno começo é o seu melhor próximo passo e conta. Pesquisadores observaram que esse impulso para a velocidade está mudando a maneira como as pessoas pensam. A necessidade de ser eficiente e instantâneo leva a uma diminuição do consumo de informação e as pessoas se tornem scanners e “descodificadores” de informações, cruzando horizontalmente na tela para pegar bytes em vez de sondar uma compreensão mais profunda. Talvez, o maior custo que já encontramos seja o dano para as relações humanas. Ao invés de aumentar os vínculos estreitos, a tecnologia facilitou o evitamento do contato pessoa a pessoa - o que leva muito tempo para um vínculo. Nós mantemos a ilusão de que estamos conectados mais próximos do que nunca devido aos números de likes do Facebook que acumulamos. Mas é tudo muito rápido, agora, neste instante. Tudo é impulso. Nosso sentido de conexão existe na ação, não numa experiência acumulada e aprofundada. Baby Boomers sabem o que perderam. A geração mais jovem está crescendo com uma pressão interna viciante e o estresse crônico como normal. Quando não puderem ir mais rápido e não conseguirem diminuir a velocidade, será difícil abrir as peças de desenvolvimento que perderam em nossa fúria para o progresso.
para as ações e reações de primeira linha. “Eu quero isso agora!” ou “faça agora!” são mantras pessoais da sociedade atual, jovem ou velha. Adicione à ação instantânea a crença de que não há limites para o poder humano, nem limites de ação ou de sucesso. Alimentados pela grandiosidade e onipotência dessas crenças, as pessoas estão elevadas nas emoções das possibilidades infinitas e não percebem a necessidade de parar ou diminuir o ritmo. Quais são os custos do vício em velocidade? Vivemos sob um peso de demandas, reais e imaginárias, que são debilitantes. Vemos um aumento alarmante nos distúrbios relacionados ao estresse de todos os tipos para todas as idades - começando com crianças em idade escolar primária que estão lutando com obesidade, depressão, ansiedade, distúrbios de atenção e todos os tipos de dificuldades de aprendizagem, uma lista de problemas para todas as idades. Em um círculo vicioso, o veloz ritmo de vida promove a superestimulação e o excesso de velocidade, que se tornam estressores crônicos que levam a distúrbios comportamentais de humor e de atenção. Não podemos ver que estamos causando nossos problemas de saúde física, emocional e comportamental à medida que nos esforçamos para ir mais rápido e depois fazer uso de medicamentos para tratar as conseqüências imprevistas. Acreditamos que podemos seguir aceleradamente e que há algo de errado se não conseguimos acompanhar. Também vemos mudanças em nossa atenção e pensamento. Os avanços tecnológicos deveriam liberar o pensamento criativo, mas a massa de informações recebidas realmente reduziu nossa atenção e nossa criatividade. As pessoas têm menos tempo para refletir sobre qualquer coisa à medida que se tornam dominadas
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DESORDEM URBANA MAYARA SIMEÃO
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HÁ MUITO SE FALA DA crise das nossas cidades, aí incluídos a arquitetura e não faltaram pesquisas, interpretações, diagnósticos, propostas de solução para os seus problemas. Falou-se, e ainda se fala, em caos urbano para designar (e justificar) o sentimento de impotência diante da enormidade dos desafios colocados pelas metrópoles contemporâneas. Quando proferimos a palavra caos, estamos, implicitamente, evocando o seu oposto, o cosmos, ou seja, um conjunto organizado e harmonioso. Desejávamos isto, idealizávamos este cosmos e, de início, o representávamos por uma forma perfeita, que abarcava todo o espaço e desafiava o tempo.
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LONDRES
o cosmos, ou seja, um conjunto organizado e harmonioso.
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A força dos fatos foi nos mostrando a impossibilidade de tal controle, não sem deixar um travo de frustração, compensada aqui e ali por oportunidades profissionais de âmbito bem mais restrito. Já que não é possível consertar, ou seja, “concertar” a cidade toda. De fato, ao encontrar eventualmente um arquiteto e perguntar-lhe sobre o que anda fazendo como profissional, não é raro ouvir como resposta: “o que faço não é bem arquitetura...”. Isto mostra que, sofrendo o empuxo da realidade, eles se recolhem a um território protegido cada vez menor (o que torna o “mundo de fora” mais e mais ameaçador), sem, no entanto, pormos em xeque aquela idealização original que nos impele a sermos forjadores de cosmos. Não se trata, portanto, de um traço geracional, e sim de uma convicção que se manifesta de vários modos: seja no apoio propriamente profissional a práticas urbanas não convencionais, a micropolíticas espaciais, seja em suas atividades como docente e pesquisador.
“ Quando proferimos a palavra caos, estamos, implicitamente, evocando o seu oposto,
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NOVA DELHI
A escolha do campo empírico é quase aleatória. Quase, porque sabe de antemão que não é nas situações urbanas ilusoriamente equilibradas e assépticas que encontrará o que o impulsiona, mas antes nas áreas enjeitadas, nos espaços receptores de ordens díspares e atravessados por fluxos de natureza e intensidade variadas. Ali sempre haverá o que projetar, o que fazer. Sua presença não é conspícua e sua duração não se mede em anos, décadas ou séculos. Não são avaliados pelas qualidades intrínsecas de sua forma, mas pelo seu papel conjuntivo, pelo que promovem.
STEPHEN HESSEN
DUSTIN TSAI
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HONG KONG
de ordens dĂspares e atravessados por fluxos de natureza e intensidade variadas.
YIN QUON
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(...) não é nas situações urbanas ilusoriamente equilibradas e assépticas que encontrará o que o impulsiona, mas antes nas áreas enjeitadas, nos espaços receptores de ordens díspares e atravessados por
ALDAS KIRVAITIS
Um ato mínimo pode ser a centelha que dinamiza os espaços mais banais, e este ato atinge a condição. É uma postura generosa e confiante (que não se limita a uma crença mobilizadora, aliás sempre necessária) para a qual encontra respaldo na filosofia. Por isso, a iconoclastia acaso pressentida em sua fala não deve ser tomada como mero repúdio em geral; como revanche sórdida que se compraz em torturá-la e emasculá-la, ou, numa hipótese melhor, em acuá-la, pela crítica asfixiante, a um beco de onde nunca mais poderá sair.
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ONDE NINGUÉM MANDA, MANDAM TODOS. ONDE TODOS MANDAM, NADA MANDA. É O CAOS.
ONDE NINGU MANDAM TO TODOS MAN MANDA. Ã&#x2030; O
NOZ É UMA PUBLICAÇÃO TRIMESTRAL E INDEPENDENTE NÚMERO 01 JUNHO DE 2017 TIRAGEM 5 MIL EXEMPLARES IMPRESSÃO EDITORA NOZ C O N TAT O C O N TAT O @ N O Z . C O M . B R T O D O O C O N T E Ú D O O N L I N E E M W W W. A B R A S U A C A S C A . C O M . B R C O L A B O R A D O R E S D E S S A E D I Ç Ã O A L D A S K I R VA I T I S - M AYA R A S I M E Ã O - D A R I O O L I V E I R A - A D R I E N M I L L O T - A N T H O N Y D E L A N O I X - C E C I LY M U L L I N S - M I C H A E L K R U K - Y I N Q U O N - D U S T I N T S A I - S T E P H E N H E S S E N - A U R É L I O M E N A H O R N E R O - Á LVA R O A R B O N É S - O S C A R L O P E Z - J A M E S J E A N - S I L B I A L Ó P E Z D E L A C A L L E
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S T E P H AN I E BR OW N - V L ADI M I R BARTAL I N I
P R O J E T O A C A D Ê M I C O D E S E N V O LV I D O P A R A A D I S C I P L I N A D E P R ÁT I C A P R O J E T U A L E M D E S I G N G R Á F I C O I I I A N O 2 0 1 7/ 1 O R I E N TA Ç Ã O M A R C B O G O, P E D R O F R A N Z C U R S O D E S I G N G R Á F I C O I N S T I T U I Ç Ã O U N I V E R S I D A D E D O E S TA D O D E S A N TA C ATA R I N A P R O J E T O G R Á F I C O A L I C E D A S I LVA , M A N U E L A L U Z I M P R E S S Ã O G R Á F I C A B O A I M P R E S S Ã O D I M E N S Ã O 2 2 , 5 C M X 2 9, 5 C M M I O L O P Ó L E N B O L D 7 0 G / M 2 C A PA C O L O R P L U S 2 4 0 G / M 2 E N C A R T E J A M E S J E A N COLOR PLUS 80 G/M2 OUTROS ENCARTES PÓLEN BOLD 70 G/M2
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