popular
Acesso era para ser fácil
páginas 12 e 13
Chance para quem vive na rua
Jornal Popular do VI Semestre do Curso de Jornalismo da Famecos / 2013-2
A poderosa chefona
24 milhões de mulheres são líderes de família página 31
FOTO LUIZA MUTTONI/FAMECOS
páginas 8 e 9 FOTO CASSIANA MARTINS/FAMECOS
Rhuan Reis na Feira
Primeira compra de livros
páginas 4 e 5
FOTO DANIELE SOUA
Cleonice é a principal fonte de renda do lar
Elas são boas motoristas FOTO DANIELE SOUZA/FAMECOS
Páginas 18 a 21
18 TRABALHO
Mulheres no volan NO COMANDO Eles têm pressa, elas paciência. Eles são mais imprudentes, elas mais cautelosas. Eles querem chegar logo ao destino, elas seguem no próprio ritmo sem ligar para a competição
N
a guerra dos sexos no trânsito, as mulheres se mostram melhores motoristas, mas aproveitam pouco as oportunidades. Apenas 30% dos condutores do Rio Grande do Sul são do sexo feminino. A parcela mais significativa é a das condutoras da categoria B, que permite pilotar carros. É o caso de Viviane Waszak, 41 anos, taxista há sete. Ela entrou para esse mercado por precisar de dinheiro. “Antes, eu trabalhava no aeroporto. Fiquei desempregada, e meu pai era taxista. Aproveitei a chance para acrescentar renda até conseguir um serviço fixo e fui ficando”, relata. Quando começou a trabalhar no Sarandi, em 2006, foi desrespeitada por uma senhora, que era fiel ao ponto da região. “Com ela, eu não pego táxi. Não gosto de mulher ao volante”, disse a idosa, sem sequer saber se Viviane era boa ou má motorista. Cerca de 10 meses depois, essa passageira foi obrigada a ir até o ponto, pois não conseguia contato com nenhum taxista, e se deparou apenas com Viviane no local. Então, ela pediu desculpas à trabalhadora e disse que precisaria ir ao Hospital de Clínicas. A taxista respondeu com um sorriso no rosto: “A senhora vai ficar tranquila? Se ficar, eu lhe levo”. Depois da viagem, as duas voltaram a se encontrar e se tornaram amigas. Além das situações de preconceito, Viviane também viveu momentos tensos. Certa vez, por volta das 9 horas, foi assaltada por um rapaz que se mostrava simpático e conversador. “Ele estava com uma camisa do Inter, cheguei a brincar e dizer que ele era dos meus, porque também sou colorada”, relata. Quando chegaram ao destino, o jovem apontou uma arma para a taxista. “Ele ficou mais nervoso do que eu, estava tremendo”, lembra. Apesar do susto, o assaltante levou apenas o dinheiro da
única viagem que Viviane havia feito naquela manhã. “Dei sorte, ele não viu minha conta de luz e o dinheiro para pagá-la no porta-luvas”. Viviane afirma que nunca sofreu acidente, nem foi multada, mas teve problemas ao alugar a primeira permissão de táxi. “O motorista que trabalhava para mim recebeu três multas em 42 dias. Depois, descobri que ele era usuário de drogas. Cheguei a estar a ponto de desistir do meu aluguel”, conta. Para cada 100 mulheres, há 27,6 infrações, enquanto para o mesmo número de homens são 41,1. O grande número de faltas cometidas pelas mulheres diz respeito à desatenção, como estacionar em local indevido ou conduzir veículo utilizando fone ou calçado inadequado. Os homens costumam adotar atitudes imprudentes, como não utilizar cinto de segurança ou dirigir sob influência de álcool ou substância entorpecente. Atualmente, Viviane trabalha das 6h às 17h, mas já chegou a trabalhar 16 horas por dia. Afinal, qual a razão para o cenário se mostrar desfavorável às mulheres como motoristas profissionais? Segundo o sociólogo Eduardo Biavati, o problema não é o machismo. “No caso dos táxis, as licenças (permissões) de trabalho da Prefeitura são objeto de grande disputa e concentração de mercado e isso talvez inviabilize a entrada de novatas. O controle dos alvarás talvez funcione, na prática, como um filtro de seleção que deixa de fora as mulheres, privilegiando homens jovens”. Biavati também afirma que o desgaste físico devido à rotina é outro fator que dificulta o acesso e o interesse das mulheres pela profissão e ressalta: “Além disso, trata-se de uma profissão de alta exposição às diversas violências urbanas. Esse sim é, a meu ver, um determinante de exclusão”, conclui. (Alysson Mainieri e Daniele Souza)
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a constante
TRABALHO 19 DANIELE SOUZA
Entregar encomendas é coisa de motogirl Ana Margarete da Silva, 35 anos, agarrou oportunidade e pilota moto como profissão há nove anos. O marido, Alaídes Marques, é dono de loja que produz chaves e carimbos, e trabalha junto com ela e mais um funcionário. Ana é motogirl e responsável pela tele-entrega, principalmente, dos carimbos encomendados por empresas. Assim que pintou a chance de expandir a firma e atender via telefone para entregar os pedidos feitos pelos clientes, Ana Margarete decidiu tirar a carteira de habilitação do tipo A, para guiar motocicletas. O marido atende, principalmente, quem pede chaves ou telefona solicitando para destrancar portas de imóveis e veículos. Ela busca materiais e entrega produtos aos clientes. A motogirl está sempre atenta no trânsito, cada vez mais perigoso. Em cima de sua moto, ela diz que nunca foi multada, nem se acidentou, mas leva sustos
com imprudência de outros motoristas: “Tomo bastante cuidado. Graças a Deus, não tenho nenhum trauma”. Por duas vezes, Ana Margarete e Alaídes foram assaltados andando de moto. “Nas duas vezes, eu estava de carona com meu marido”, conta. Margarete garante que poucas vezes sofreu preconceito, pois acredita que muito se deve ao fato dela dirigir defensivamente. Com horários flexíveis, por trabalhar junto ao esposo, de segunda a sexta-feira, a motorista cuida, paralelamente, da família, e consegue aproveitar bem os fins de semana. O casal tem uma filha, de 10 anos. Ana consegue dividir bem o tempo entre tarefas e descanso. Almoça com a criança e volta, ao fim da tarde, para casa, quando passa mais tempo com a pequena: “De manhã, ela estuda, depois almoçamos. De tarde, ela fica na creche, e, à noite, ficamos juntas”, conta. ALYSSON MAINIERI
Ana aproveitou oportunidade junto com marido SEGUE
20 TRABALHO
“Sempre gostei” G
isele Vasconcellos, 31 anos, é uma trabalhadora exemplar da Carris. Após concluir o ensino médio, fez concurso para ser cobradora da companhia. “Fui muito incentivada a fazer a prova”, comenta. Após a aprovação, deu os primeiros passos para realizar seu grande sonho, dirigir ônibus. “Sempre gostei da ideia de ser motorista”, afirma. Na função de cobradora, Gisele observava as atitudes dos colegas motoristas, em especial de Álvaro Tadeu, seu marido. Logo, ela tratou de tirar carteira de condutora da categoria E, que permite dirigir veículos articulados de grande porte, pois queria estar preparada para conduzir qualquer tipo de automóvel da Carris. Em 2008, conseguiu permissão e foi aprovada no exame prático. “Foi o ano em que mais aprovaram mulheres”, conta. Em Porto Alegre, existem 31 mulheres motoristas de ônibus. Nesse mercado dominado por homens, Gisele é uma das 14 motoristas da Carris. O preconceito existe, tanto na empresa, como entre passageiros. “Às vezes, se tenta conseguir alguma coisa internamente e não se alcança por ser mulher”, revela. Alguns passageiros também fazem comentários indesejáveis. Porém, Gisele ri, por exemplo, quando fazem piadas com um cobrador homem, enquanto ela está ao volante. A bem-humorada motorista compara que, quando está acom-
panhada de uma cobradora, os passageiros são ainda mais educados, sentem-se seguros e respeitados. Apesar do predomínio dos homens, a motorista se diz confortável atrás do volante. “É uma coisa que eu faço com prazer. Mesmo com o trânsito hoje muito complicado, dirigir é uma coisa que eu gosto de fazer”, relata. A paixão por conduzir a população é tanta que Gisele só tirou a carteira tipo B e comprou carro, junto com o marido, depois de ser motorista de coletivos. “Dirijo meu carro porque eu preciso, mas prefiro estar no volante do ônibus. Me sinto sem visão no carro, e no ônibus enxergo tudo”, compara. O casal prefere esse tipo de veículo. Quando eles precisam sair juntos de carro, um empurra a tarefa para o outro. “Ele quer que eu dirija, e eu quero que ele faça isso. É uma preguiça”, confessa, rindo. A motorista afirma que nunca foi multada ao guiar um ônibus. O único fato adverso aconteceu há dois anos, quando descia pela Avenida Cristóvão Colombo, em via preferencial, e um carro invadiu o caminho, fazendo com que o ônibus batesse no veículo. Apesar de se considerar muito cuidadosa no trânsito, Gisele percebe que falta reconhecimento por parte das pessoas, exceto do atual diretor da Carris, que a elogia bastante. “Isso passa batido”, acredita.
Gisele sempre sonhou ser motorista de ônibus
FOTOS DANIELE SOUZA
TRABALHO 21