Juiz absolve Afonso Lobo em processo da Maus Caminhos

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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO AMAZONAS Processo N° 0000876-60.2018.4.01.3200 - 4ª VARA - MANAUS Nº de registro e-CVD 00113.2018.00043200.2.00765/00128

Autor: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL. Réu: AFONSO LOBO MORAES. Objeto: FALSO TESTEMUNHO OU FALSA PERÍCIA (ARTS. 342 E 343) - CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO DA JUSTIÇA - DIREITO PENAL. Classe: AÇÃO PENAL DE COMPETÊNCIA DO JUIZ SINGULAR. SENTENÇA TIPO D I – REATÓRIO Trata-se de denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal em desfavor de AFONSO LOBO MORAES pela prática, em tese, do crime tipificado no art. 342, §1º, do Código Penal, em razão da prestação de afirmações supostamente falsas, na ocasião da audiência de instrução realizada nos autos do processo n. 41-09.2017.4.01.3200, em trâmite neste Juízo Federal, no qual figurava como testemunha. Denúncia recebida em 22.01.2018 (fl. 14). Resposta à acusação e documentos apresentados pela defesa do réu a fls. 23/598, sustentando, preliminarmente, a ausência de distribuição automática da denúncia. Alega, no mérito, a atipicidade da conduta do réu, em razão de ter prestado depoimento na condição fática de investigado em outro processo, o que violaria o direito de não produzir prova contra si mesmo e de permanecer em silêncio (art. 5º, LXIII, da Constituição Federal). Requer a suspensão do curso do processo, até o advento de sentença na ação penal n. 41-09.2017.4.01.3200, processo em que teria sido praticado o falso testemunho. Assevera, ademais, a violação à Súmula Vinculante n. 14 do Supremo Tribunal Federal, em razão da inexistência, nestes autos, de documentos relacionados na Nota Técnica n. 271/2016/CGU-Regional/AM/CGU-OS, em que se fundou a denúncia. Alega, ainda, a ausência de justa causa para a ação penal, requerendo, ao final, a rejeição da denúncia ou a absolvição sumária do réu. Subsidiariamente, protesta pela produção de todos os meios de prova, em especial a pericial e a testemunhal. Despacho determinando vista dos autos ao MPF, para manifestação sobre os argumentos deduzidos e os documentos apresentados pelo réu (fl. 600). Manifestação do MPF a fls. 611/614, sustentando a ocorrência de conexão entre a presente ação penal e aquela originária do suposto falso testemunho (autos n. 4109.2017.4.01.3200), na forma do art. 76, II e III, do Código de Processo Penal. Ademais, refutou as ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 1/10


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demais alegações deduzidas pela defesa do réu. II – FUNDAMENTAÇÃO a) Preliminar Consoante a certidão expedida à fl. 628, a denúncia foi inicialmente autuada como representação criminal e, por via de distribuição automática efetivada em 16.10.2017, foi atribuída ao acervo do Juiz Federal Substituto da 4ª Vara, sob o n. 12957-75.2017.4.01.3200. Recebida a denúncia (até então atuada como representação criminal - reitere-se), foi determinada a baixa daqueles autos, com a consequente autuação como ação penal, nos termos da decisão de fl. 14. Neste contexto, por não haver conexão com qualquer outro processo, a presente ação penal foi distribuída por dependência à representação criminal n. 12957-75.2017.4.01.3200, a qual foi livremente distribuída em consonância com o princípio constitucional do juiz natural (CRFB, art. 5º, LIII), evidenciando-se, portanto, não haver qualquer vinculação entre este feito e a ação penal n. 41-09.2017.4.01.3200. Rejeito, assim, a irregularidade apontada pela defesa do réu e reafirmo a competência deste juízo para apreciação do caso. Passo ao exame das hipóteses de absolvição sumária. b) Mérito De acordo com o art. 397 do CPP, o juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar: I – a existência manifesta de causa excludente da ilicitude do fato; II – a existência manifesta de causa excludente da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; III – que o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou IV – extinta a punibilidade do agente. A defesa requer a absolvição do réu com base no inciso III, que permite a análise antecipada do mérito, antes mesmo da instrução processual, quando o fato narrado pela acusação seja evidentemente atípico. O tipo penal imputado ao réu está previsto no art. 342 do Código Penal nos seguintes ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 2/10


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termos: Art. 342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa. § 1o As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração pública direta ou indireta. § 2o O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade.

No caso em mesa de julgamento, o réu é acusado de fazer afirmações falsas durante sua oitiva como testemunha nos autos da ação penal n. 41-09.2017.4.01.3200, em audiência realizada em 26.06.2017 perante a 4 ª Vara da Seção Judiciária do Amazonas. Seriam basicamente dois pontos falsos que se extrairiam, segundo o MPF, do depoimento do réu, ouvido naquela oportunidade como testemunha, conforme se extrai das seguintes passagens da denúncia: • “Ou seja, AFONSO LOBO MORAES disse que, seguindo orientações técnicas advindas de conversa com o Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, os recursos advindos do repasse da complementação da União do FUNDEB eram integralmente alocados em conta tesouro do estado do Amazonas no código 146, pois o repasse do estado era maior do que a própria complementação da União.” fls. 4-v; • “Segundo AFONSO LOBO, na relação de Ordens Bancárias do Governo do Estado do Amazonas ficam todas as OBs geradas pelo Estado, quer seja canceladas ou não. Continuou declarando que na informação de “execução orçamentária” constante do Portal da Transparência ficam as informações corretas quanto ao que o Instituto efetivamente receber, que seria apenas R$ 205 milhões, aproximadamente. Diante disso, o ora denunciado sugere que a CGU se equivocou a extrair esses valores da Seção “Relação de Pagamentos”, quando deveria ter buscado informações 'no item Execução Orçamentária, onde tem informação consolidada' (minuto 27:50)” - fls. 6.

Na própria denúncia, o MPF aponta as informações verdadeiras que maculariam as alegações da testemunha, tornando-as falsas: ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 3/10


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• “Acontece que, passada a aludida audiência de instrução e julgamento supracitada, a Superintendência da Controladoria Regional da União no Estado do Amazonas oficiou o Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, o qual afirmou inexistir orientação daquela corte nos moldes em que, em juízo, declarou a testemunha AFONSO LOBO MORAES, conforme Informação n. 41/2017-DICREA, datada de 10/07/2017, que consta (...)” - fls. 5/5-v; • “Entretanto, como se infere da Nota Técnica nº 1427/2017, da CGU, segundo o próprio órgão, a CGU retirou as informações sobre os 275 milhões de reais, citadas na Nota Técnica nº 271/2016/CGU-Regional/AM/CGU-PR, de 24/02/2016, do campo 'Ordens Bancárias da Relação de Pagamentos' do Portal da Transparência Fiscal do Governo do Estado e, como o próprio nome sugere ('Relação de Pagamentos'), nesse relatório deveriam constar todos os pagamentos efetivos, e não ordens bancárias efetivadas e canceladas, como dito por AFONSO LOBO – fl. 35 da NF 1.13.000.001634/2017-22. A CGU ainda afirmou que a pesquisa ao Portal da Transparência do AM realizada na data de 31/12/2015 retomou 21 OBs emitidas em 2014 (Quadro 2) e 72 OBs emitidas em 2015. Somadas as OBs para cada ano totalizam, respectivamente, R$ 71.647.172,29 (2014) e R$ 204.584.771,49 (2015) e, que, por sua vez, juntas alcançaram os R$276.231.943,78 que são contestados por AFONSO LOBO (fls. 35-36 da NF NF 1.13.000.001634/2017-22). Desta forma, demonstra-se claramente a forma utilizada pela CGU para chegar ao montante de R$ 276.231.943,78, ressaltando-se que, na ocasião da confecção da Nota Técnica nº 271/2016/CGU-Regional/AM/CGU-PR de 24/02/2016, eram esses os valores e OBs constantes do próprio Portal da Transparência do Governo do Amazonas. No entanto, em pesquisa realizada no mesmo endereço eletrônico (Portal da Transparência do Amazonas), em 25/07/2017 (data posterior ao depoimento de Afonso Lobo), observou-se uma alteração no relatório gerado pelo site, com supressão de 20 OBs, referentes ao ano de 2014, quando comparado com à pesquisa realizada em 31/12/2015. Na pesquisa atual, o relatório retoma somente uma OB emitida em 2014 e mantém as 72 OBs emitidas em 2015. A OB referente a 2014 que permanece no relatório de pagamentos é a 2014OB03795, no valor de R$ 1.373.786,95. Assim, com os dados atualmente constantes do Portal da Transparência do AM, após a alteração efetuada, tem-se que a somatória dos valores pagos ao INC – em 2014 e 2015 – resulta num montante de R$205.958.558,44, coincidentemente um valor bem próximo ao declarado por AFONSO LOBO em juízo. (…) Fixado o exato ponto da controvérsia, fica fácil perceber que mais um vez o denunciado apresentou informação inverídica ao Juízo. Conforme observado pela CGU, 'a partir das informações obtidas por meio dos Sistemas Bancários é possível ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 4/10


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demonstrar que os valores que foram transferidos ao Instituto durante o ano de 2014 totalizam R$ 71.647.172,29, exatamente o valor que constava do Portal da Transparência antes da exclusão das vinte OBs de 2014'. (...)” - fls. 5/6.

A tese defensiva é de que o réu, à época dos fatos, já era investigado pela suposta prática dos crimes pelos quais foi convocado a depor na condição de testemunha. Nessa ordem de ideias, não seria possível tomar seu compromisso de dizer a verdade, previsto no art. 203 do CPP, quando, na verdade, ele faria jus ao direito de não produzir prova contra si mesmo (nemo tenetur se detegere), podendo inclusive permanecer em silêncio, na forma do art. 186 do CPP. Como cediço, tanto o direito ao silêncio como o direito de não autoincriminação encontram fundamento normativo na Constituição e em tratados de direitos humanos, como o Pacto de São José da Costa Rica, no âmbito do sistema regional, e o Pacto de Direitos Civis e Políticos, no âmbito do sistema universal de proteção dos direitos humanos. Confira-se: Constituição Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado; (grifei) Pacto de São José da Costa Rica Artigo 8. Garantias judiciais 1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. 2. Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência enquanto não se comprove legalmente sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: (...) g. direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada; 3. A confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza. (grifei) ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 5/10


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Pacto de Direitos Civis e Políticos ARTIGO 14 1. Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de justiça. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida publicamente e com devidas garantias por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei, na apuração de qualquer acusação de caráter penal formulada contra ela ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil. A imprensa e o público poderão ser excluídos de parte da totalidade de um julgamento, quer por motivo de moral pública, de ordem pública ou de segurança nacional em uma sociedade democrática, quer quando o interesse da vida privada das Partes o exija, que na medida em que isso seja estritamente necessário na opinião da justiça, em circunstâncias específicas, nas quais a publicidade venha a prejudicar os interesses da justiça; entretanto, qualquer sentença proferida em matéria penal ou civil deverá torna-se pública, a menos que o interesse de menores exija procedimento oposto, ou processo diga respeito à controvérsia matrimoniais ou à tutela de menores. 2. Toda pessoa acusada de um delito terá direito a que se presuma sua inocência enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. 3. Toda pessoa acusada de um delito terá direito, em plena igualmente, a, pelo menos, as seguintes garantias: (...) g) De não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada. (grifei)

Do cenário normativo apresentado, verifica-se que se tratam de um direitos históricos, compartilhados por diversos Estados, e de singular importância no processo penal. Pois bem. A confirmação da tese defensiva exige analisar se o réu era investigado pelos fatos que motivaram sua convocação como testemunha e, bem por isso, estaria dispensado de assumir o compromisso de dizer a verdade, sendo-lhe assegurado o direito de não produzir prova contra si mesmo e poder permanecer em silêncio, sem que isso importasse em prejuízo pessoal (leia-se, responsabilização por falso testemunho). Com efeito, os documentos colacionados pela defesa a fls. 44/90 (Informações Policiais 26/2017, 27/2017 e 38/2017, datadas respectivamente de 2.3.2017, 2.3.2017 e 6.3.2017) comprovam que, no início do ano de 2017, o réu já era investigado no âmbito do inquérito policial n. 139/2017 (operação “Maus Caminhos”) — instaurado em 16.3.2017, conforme consta a fls. 255, por fatos relacionados àqueles que nortearam o depoimento prestado pelo acusado naquela ação penal no dia 26.6.2017. ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 6/10


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Inclusive, posteriormente, o réu foi denunciado por suposta prática criminosa relacionada ao conteúdo do seu depoimento, em processo autuado sob o n. 867-98.2018.4.01.3200 (conduta do réu individualizada às fls. 187/207). Salienta-se que a fls. 193 há menção expressa ao depoimento ora tratado, conforme se extrai da seguinte passagem: “193. Outro fato, ainda mais recente, que denota a condição de membro da ORCRIM foi a disposição de Afonso Lobo Moraes em se apresentar perante este r. Juízo e servir de testemunha de defesa de Mouhamad Moustafa no processocrime nº 41-09.2017.4.01.3200, que versou sobre a mesma organização criminosa ora tratada, porém referente a outros núcleos. 194. Em seu testemunho (Doc. 4), o ora denunciado mentiu ao asseverar que apenas recursos estaduais foram utilizados para pagamento do INC, negando que tanto recursos do FNS quanto do FUNDEB abasteceram os cofres do Instituto, como será pormenorizado no item VI. Não pode outra razão, Afonso Lobo foi denunciado por crime de falso testemunho (Doc. 5). 195. Em troca de todos esses favores prestados pelo ex-Secretário à ORCRIM, Mouhamad o retribuia de forma sistemática com o pagamento de vantagens de variadas espécies (propina), denotando de forma insofismável o animus societatis scelerum. (...)” (grifei)

Não se trata de avaliar se as declarações do réu foram, ou não, falsas. Trata-se, na verdade, de reconhecer que as perguntas feitas quando do depoimento se ligavam diretamente a investigação em trâmite contra a testemunha, redundando, meses após, em denúncia pela prática do crime de organização criminosa, em conjunto com a parte que o arrolou como testemunha naquela ocasião (Mouhamad). E, nesse específico contexto fático, não resta materializado o crime do art. 342 do CP, por ausência da elementar do tipo “testemunha”. Sobre o tema, confira-se o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça: Habeas Corpus. 2. Falso testemunho (CPM, art. 346). 3. Negativa em responder às perguntas formuladas. Paciente que, embora rotulado de testemunha, em verdade encontrava-se na condição de investigado. 4. Direito constitucional ao silêncio. Atipicidade da conduta. 5. Ordem concedida para trancar a ação penal ante patente falta de justa causa para prosseguimento. (grifei) (HC 106876, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 7/10


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14/06/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-125 DIVULG 30-06-2011 PUBLIC 01-07-2011 RB v. 23, n. 574, 2011, p. 46-50) PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. FALSO TESTEMUNHO. INOCORRÊNCIA. LEI 1.579/52, ART. 4º, II (CP, ART. 342). COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO. TESTEMUNHA. PRISÃO EM FLAGRANTE. CPP, ART. 307. I. - Não configura o crime de falso testemunho, quando a pessoa, depondo como testemunha, ainda que compromissada, deixa de revelar fatos que possam incriminá-la. II. - Nulidade do auto de prisão em flagrante lavrado por determinação do Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito, dado que não se consignou qual a declaração falsa feita pelo depoente e a razão pela qual assim a considerou a Comissão. III. - Auto de prisão em flagrante lavrado por quem não preenche a condições de autoridade (art. 307 do CPP). IV. H.C. Deferido. (grifei) (HC 73035, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 13/11/1996, DJ 19-12-1996 PP-51766) HABEAS CORPUS. IMPETRAÇÃO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO CABÍVEL. UTILIZAÇÃO INDEVIDA DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. NÃO CONHECIMENTO. 1. A via eleita se revela inadequada para a insurgência contra o ato apontado como coator, pois o ordenamento jurídico prevê recurso específico para tal fim, circunstância que impede o seu formal conhecimento. Precedentes. 2. O alegado constrangimento ilegal será analisado para a verificação da eventual possibilidade de atuação ex officio, nos termos do artigo 654, § 2º, do Código de Processo Penal. FALSO TESTEMUNHO. IMPOSSIBILIDADE DE OBRIGAR O DEPOENTE A DIZER A VERDADE SOBRE FATOS QUE POSSAM INCRIMINA-LO. DIREITO AO SILÊNCIO E À NÃO AUTOACUSAÇÃO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. 1. A Constituição Federal assegura a todos os investigados o direito ao silêncio e à não auto-incriminação, motivo pelo qual, ainda que compromissada em juízo, a testemunha não é obrigada a dizer a verdade sobre fatos que possam ensejar a sua acusação pela prática de algum crime. Doutrina. Precedentes. 2. No caso dos autos, verifica-se que ao testemunhar em juízo, o paciente, ao contradizer o depoimento por ele fornecido no curso do inquérito policial, não pretendeu isentar o acusado de tráfico de drogas de culpa, mas sim eximir-se da prática do delito previsto no artigo 28 da Lei 11.343/2006, o que revela a atipicidade da sua conduta. 3. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para determinar o trancamento da Ação Penal n. 300398850.2013.8.26.0348. ..EMEN:Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 8/10


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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO AMAZONAS Processo N° 0000876-60.2018.4.01.3200 - 4ª VARA - MANAUS Nº de registro e-CVD 00113.2018.00043200.2.00765/00128

votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do pedido e conceder "Habeas Corpus" de ofício, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Gurgel de Faria, Reynaldo Soares da Fonseca e Felix Fischer votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Ribeiro Dantas. (grifei) (HC - HABEAS CORPUS - 326956 2015.01.39228-6, JORGE MUSSI, STJ QUINTA TURMA, DJE DATA:13/11/2015 ..DTPB:.)

No mesmo sentido, decidiu o Tribuna Regional Federal da 3ª Região: PROCESSUAL PENAL E PENAL: HABEAS CORPUS. INQUÉRITO POLICIAL. TRANCAMENTO. EXCEPCIONALIDADE. ORDEM CONCEDIDA. I - É cediço o entendimento no sentido de que o trancamento de ação penal ou de inquérito policial é medida de caráter excepcional, sobretudo na via estreita do habeas corpus. II - Logo, se não restar comprovada, de plano, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade, ou a ausência de indícios de autoria e materialidade, é indispensável a continuidade da persecução criminal. III - Diversa é a hipótese dos autos porquanto, à luz do princípio do "nemo tenetur se detegere", o investigado/acusado não é obrigado a produzir provas contra si mesmo, sob pena de ofensa a diversos princípios constitucionais, entre eles a presunção de inocência e a ampla defesa. IV - O ora paciente, embora ouvido como testemunha e compromissado a dizer a verdade, consta dos autos que a imputação do crime poderia recair sobre ele, tanto que a própria autoridade impetrada aduz que sua participação deveria ter sido na condição de corréu. V - Tais fatos denotam que o ora paciente, ainda que ouvido como testemunha, poderia ser prejudicado pelo teor de suas declarações, a evidenciar que, embora rotulado de testemunha, em verdade encontrava-se na condição de investigado. VI Não comete o crime de falso testemunho o agente que, compromissado como testemunha em processo criminal, presta declarações falsas em processo em que foi ouvido para obtenção de provas que pudessem implicar em sua responsabilização penal. VII - Ordem concedida para determinar o trancamento do inquérito policial.Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conceder a ordem para determinar o trancamento do inquérito policial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. (grifei) (HC HABEAS CORPUS 59605 0021381-54.2014.4.03.0000, DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO, TRF3 - DÉCIMA ________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 9/10


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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO AMAZONAS Processo N° 0000876-60.2018.4.01.3200 - 4ª VARA - MANAUS Nº de registro e-CVD 00113.2018.00043200.2.00765/00128

PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/10/2014)

Ao contrário do que aduz o MPF em sede de réplica a fls. 612/613, entendo que não se pode interpretar o exercício do direito silêncio e da garantia de não se produzir prova contra si mesmo, no âmbito do processo penal, de acordo com os parâmetros do processo civil. Como demonstrado, tais princípios possuem base constitucional e convencional própria, constituindo o parâmetros de aplicação das normas infraconstitucionais. Dito de outro modo, se a Constituição e os Tratados de Direitos Humanos garantem ao réu o direito ao silêncio e de não produzir prova contra si mesmo no processo penal, não é o Código de Processo Civil que irá conduzir a interpretação diversa. Logo, assiste razão à defesa técnica na tese formulada na resposta à acusação a fls. 23/40, evidenciando-se que o fato narrado não constitui crime, caracterizando-se, com exatidão, a previsão contida no art. 397, III, do CPP, impondo-se a absolvição sumária do réu. Reputo prejudicadas as demais alegações e requerimentos apresentados pela defesa. III – DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE o pedido formulado na denúncia pelo Ministério Público Federal e ABSOLVO sumariamente o réu AFONSO LOBO MORAES da imputação da prática do crime de falso testemunho, nos termos do art. 397, III, do Código de Processo Penal. Com o trânsito em julgado, oficie-se à Polícia Federal, para que proceda à baixa dos registros cartorários do absolvido, efetuando-se a consequente baixa na distribuição e arquivamento do feito. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Manaus, 17 de setembro de 2018. (assinado digitalmente) Luís Felipe Pimentel da Costa Juiz Federal Substituto

________________________________________________________________________________________________________________________ Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO LUÍS FELIPE PIMENTEL DA COSTA em 17/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006. A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 16343333200241. Pág. 10/10


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