CONFIANÇA E TERNURA
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FILHAS
DE MARIA
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REVISTA DAS
AUXILIADORA
dma Revista das Filhas de Maria Auxiliadora Via Ateneo Salesiano, 81 - 00139 Roma tel. 06/87.274.1 • fax 06/87.13.23.06 e-mail: dmariv2@cgfma.org
Diretora responsável Mariagrazia Curti
Redação
Giuseppina Teruggi Anna Rita Cristaino
Colaboradoras
Tonny Aldana • Julia Arciniegas Patrizia Bertagnini • Mara Borsi Carla Castellino • Piera Cavaglià Maria Antonia Chinello Emilia Di Massimo • Dora Eylenstein Maria Pia Giudici • Palma Lionetti Anna Mariani • Adriana Nepi Maria Perentaler • Loli Ruiz Perez Debbie Ponsaran Maria Rossi • Bernadette Sangma Martha Séïde
Tradutoras
francês • Anne Marie Baud japonês • inspetoria japonesa inglês • Louise Passero polonês • Janina Stankiewicz português • Maria Aparecida Nunes espanhol • Amparo Contreras Alvarez alemão • inspetorias austríaca e alemã EDIÇÃO EXTRACOMERCIAL
Instituto Internacional Maria Auxiliadora Via Ateneo Salesiano 81, 00139 Roma c.c.p. 47272000 Reg. Trib. Di Roma n. 13125 de 16-1-1970 Sped. abb. post. – art. 2, comma 20/c, lei 662/96 Filial de Roma n. 1/2 janeiro-fevereiro de 2014 Tip. Instituto Salesiano Pio XI Via Umbertide 11 00181 Roma
USPI
ASSOCIADA UNIÃO IMPRENSA PERIÓDICA ITALIANA
Edição em Português
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SUMÁRIO Editorial Dossiê
Eventos especiais para 2014
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Giuseppina Teruggi
Palavras e gestos de confiança e ternura
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Primeiro plano ...................................................................................................................................... Espiritualidade Missionária
“Eis-me, envia-me!”
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Alma e direito
Um filho a todo custo
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Cultura ecológica Fio de Ariadne
A terra, nossa casa comum In/Gratidão
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Em busca .................................................................................................................................................. Viver com paixão
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Pastoralmente
JMJ: etapa de um longo caminho
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Um olhar sobre o mundo
Unidas por uma sociedade melhor
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EJS culturas
Comunicar ................................................................................................................................................ Faz-se para dizer Mulheres no contexto
Conectar O reflexo da ternura na economia
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Vídeo
A primeira neve
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Livro
A alma do mundo
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Música e teatro Camilla
As atividades teatrais na formação
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Almas de oração
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LHAS DE MARIA AUXILIADORA
EDITORIAL neste número
Eventos especiais para 2014 Giuseppina Teruggi
Estamos no início de um ano particularmente significativo: um ano que nos levará à celebração do Capítulo geral 23º, no próximo mês de setembro. Entre os eventos que as participantes do Capítulo viverão, é relevante o encontro com Madre Ângela Valese, a pioneira das missões da América, cujo centenário de morte ocorre este ano. A parada em Lu Monferrato (Alessandria), sua terra natal, no final dos Exercícios espirituais em Mornese, quer significar uma homenagem à sua memória e ao enraizamento do carisma salesiano em terras americanas. Madre Valese vai nos acompanhar numa nova Rubrica, para um interessante percurso missionário. Nos primeiros meses do ano, os nossos Confrades Salesianos também viverão o evento capitular que, já faz algum tempo, os vê empenhados no aprofundamento do tema: “Testemunhas da radicalidade evangélica”. E, assim como para as FMA, o Capítulo se ocupará da eleição do Superior geral que, com o seu Conselho geral, é chamado a animar e a governar a Congregação no próximo sexênio. O ano de 2014 introduz também o período culminante de preparação ao Bicentenário do nascimento de Dom Bosco. A estreia do Reitor-Mor, Dom Pascual Chávez Villanueva, coloca-se na perspectiva desse evento,
e pretende sustentar o compromisso da Família Salesiana no aprofundamento da experiência espiritual de Dom Bosco, fonte da santidade salesiana. A Igreja abre o novo ano com a primeira Jornada mundial pela paz celebrada pelo Papa Francisco, com o tema: “Fraternidade, fundamento e caminho para a paz”. Nos meses seguintes, outras Jornadas mundiais acompanharão os fiéis a eventos que remetem aos valores fundamentais da vida segundo o Evangelho. Estão previstas pelas Nações Unidas, em âmbito mundial, várias iniciativas que colocam em evidência o tema do Ano internacional da agricultura familiar. No encontro de agosto de 2013 em Cesuna, o grupo de redação da Revista DMA teve presente as propostas mundiais, eclesiais e salesianas de 2014, com especial atenção aos temas de fundo que introduzem no horizonte do CG 23º. Podemos sintetizá-los na ótica da construção de relações para a evangelização, com particular referência às palavras e aos gestos do Papa Francisco. Para cada Dossiê, escolheu-se proceder com a metodologia do Ver, da análise da situação com suas luzes e suas sombras; Julgar, a partir da questão “o que diz Deus sobre isto?”; Agir, para responder à pergunta “o que Deus está nos pedindo para fazer a fim de colaborar na construção do seu Reino?”. gteruggi@cgfma.org
dma damihianimas REVISTA DAS FILHAS DE MARIA AUXILIADORA
ANO LXI ● JANEIRO – FEVEREIRO DE 2014
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DOSSIÊ DMA
Palavras e gestos de confiança e ternura Giuseppina Teruggi
A recente Encíclica “Fidei Donum” e o Sínodo dos Bispos sobre a Nova Evangelização são eventos que reforçam na Igreja o empenho de permanecer “no poço de Sicar, como Jesus” e de sentar-se “ao lado de homens e mulheres deste tempo para tornar presente o Senhor em suas vidas, de modo que possam encontrálo”. Como fma, deixamo-nos iluminar pelo itinerário eclesial para renovar o nosso ser e o ser relacional como caminho de Evangelização, conscientes de que é prioritária a coerência de vida. De fato, a Nova Evangelização realiza-se unicamente na sincronia de palavras e gestos, como declara o Papa Francisco. Com este tema condutor iniciamos as reflexões dos Dossiês, que nos acompanharão no decorrer do ano.
“Proclamar o evangelho com a palavra” Muitos sinais e eventos nos convencem de que estamos vivendo uma época singular na história da Igreja, guiada pelo Espírito mediante figuras extraordinárias de Pontífices. Hoje, em particular, é o Papa Francisco que está surpreendendo homens e mulheres de todo o mundo. Desde o início do seu pontificado dirigiu um premente convite à Igreja: anunciar o Evangelho com a coerência de vida. «Eu repito aquilo que sempre afirmava São Francisco de Assis: Cristo nos enviou para anunciar o Evangelho também com a palavra. A frase é assim: “Anunciai o Evangelho sempre. E, se for necessário, com as palavras”. O que quer dizer isso? Anunciar o Evangelho com a autenticidade de vida, com a coerência de vida. Mas neste mundo onde as riquezas fazem tanto mal, é necessário que nós padres, nós Irmãs, todos nós, sejamos coerentes com a nossa pobreza! Mas quando se percebe que o interesse primordial de uma instituição educativa ou de uma paróquia é o dinheiro, isso não é bom. É uma incoerência! Devemos ser coerentes, autênticos. Desta forma, façamos aquilo que diz São Francisco: preguemos o Evangelho com o exemplo, depois com as palavras! Mas, antes de tudo é em nossa vida que os outros devem poder ler o Evangelho! Também aqui
sem medo, com os nossos defeitos que procuramos corrigir, com os nossos limites que o Senhor conhece, mas também com a nossa generosidade ao deixar que Ele aja em nós» (Cf Encontro com os seminaristas, os noviços e as noviças -– Roma, 6/07/2013).
Palavras e gestos da nova Evangelização É pelo seu estilo, pelos seus gestos, antes ainda que pelas palavras, que o Papa Francisco fala ‘urbi et orbi’. «A nossa vida é uma viagem e quando paramos a coisa não vai», afirmava na homilia do dia seguinte à sua eleição. Partindo da palavra de Deus, focalizava o conceito de movimento: «Caminhar, edificar, confessar. Caminhar sempre na presença do Senhor, à luz do Senhor, procurando ser irrepreensível, como Deus pedira a Abraão em sua promessa». E ainda: «Eu desejo que todos nós depois desses dias de graça tivéssemos a coragem, isso mesmo, a coragem, de caminhar na presença do Senhor, com a cruz do Senhor, de edificar a Igreja no Sangue do Senhor derramado na cruz e de confessar a única glória, Cristo crucificado, e assim a Igreja irá adiante».
Desde o início, o Papa Francisco tencionou fazer a Igreja caminhar nas vias do Evangelho, assumido e vivido não “à água de rosas”, mas capaz de impregnar a vida e de transformá-la. Ficamos fascinados com a homilia do início do seu pontificado, no dia 19 de março na Praça São Pedro, quando deu logo a perceber uma humanidade calorosa. «Não devemos ter medo da bondade; nem sequer da ternura! E aqui acrescento, então, outra 5
observação: o ato de cuidar, de custodiar pede bondade, pede para ser vivido com ternura. Nos Evangelhos, São José aparece como um homem forte, corajoso, trabalhador, mas emerge de sua alma uma grande ternura, que não é a virtude do fraco, antes, ao contrário, denota fortaleza de alma e capacidade de atenção, de compaixão, de verdadeira abertura ao outro, de amor. Não devemos ter medo da bondade, da ternura!».
Confiança e ternura: o quê? Como? Vivemos em um tempo de fortes oportunidades humanas e tecnológicas, mas também marcado pelos limites que, às vezes, impedem de experimentar a beleza da relação entre as pessoas, o gosto de ficar juntos, a doçura de sentimentos profundos e arejados. Tende-se hoje a privilegiar em tudo a rapidez, a pressa e vai-se acentuando um “racionalismo” que pretende encontrar em cada coisa, de imediato, uma explicação. E isso passa por “sabedoria”. Com frequência as relações são postadas à base da vantagem, do interesse pessoal, do medo que cria distâncias. Em um livro publicado há alguns anos com o título “Teologia da ternura, um ‘evangelho’ a ser descoberto” (Ed. Dehoniane, Bologna, 2000), o teólogo Carlo Rocchetta explica o significado do termo ternura, que está ligado à atitude da confiança. De fato, pode haver um mal-entendido sobre o termo se for confundido com a afetação, com a tendência ao sentimentalismo, com uma espécie de romantismo barato. Corre-se também o risco de fazer a ternura passar por fraqueza e de se falar dela como sinal de imaturidade. A ternura é “força, sinal de maturidade e de vigor interior, que desabrocha apenas no coração livre, capaz de oferecer e de receber amor”. É a mesma acepção dada pelo Papa Francisco na sua primeira homilia pública. Podemos então afirmar que a ternura é a força mais humilde e, ao mesmo tempo, mais poderosa para introduzir germes de novidade no mundo. Acontece a alguns, atribuir-lhe uma conotação prevalentemente feminina e, seja como for, escassamente viril. Mas, observa o teólogo, «Trata-se de um preconceito infundado, que deve ser desmascarado com energia. Seria como dizer que a sensibilidade e a capacidade de expressar o afeto, a atenção à vi da, a doçura do amor de Deus ou a delicadeza evangélica da caridade, constituem atitudes barradas no horizonte masculino. Na realidade, o sentimento de ternura diz respeito, de modo total e incancelável, tanto ao homem quanto à
mulher, à sua humanidade e à sua vocação ao amor e à comunhão». É precisamente a integração harmônica entre o masculino e o feminino que enfatiza este sentimento. Além do mais, para os crentes, é Deus a fonte inexaurível e o vértice de toda a ternura, que se constrói na confiança recíproca e favorece o desabrochar de sentimentos profundos, livres, delicados. Esta atitude calorosa e humana constitui uma força positiva para a vida de fé, porque sustenta a formação de uma personalidade rica de humanidade, configurada à humanidade do Senhor Jesus. O cristianismo, sem ternura, corre o risco de apresentar-se em chave redutiva, aproximando-se do que é “apenas ritualista e moralista”.
Gestos de beleza da Igreja O caminho da ternura pode constituir uma dimensão importante para o futuro da Igreja, um aspecto que pode fascinar também os que não são crentes, um caminho para muitas comunidades eclesiais saírem das águas rasas que hoje estão singrando. Permite redescobrir o sentido extraordinário de ser cristãos na magnitude de uma vida realizada na beleza, no amor, na solidariedade, na atenção gentil, sobretudo aos pobres, aos pequenos, aos indefesos. Alguns falam da ternura como o “sonho de Deus para a humanidade”. O CG 21º (2002) propôs a todas as fma o empenho de viver a comunhão, “sonho de Deus para a humanidade”. Eu acredito que possa existir complementaridade e integração entre ternura e comunhão, realidades intercambiais. Uma não existe sem a outra. Por isso, também nós podemos pressagiar «uma Igreja de ternura que viva o mandamento novo do amor como sua ‘norma normans’ e faça da ternura a sua alma e o seu sinal distintivo. Uma Igreja que, assim como o carpinteiro de Nazaré, se faça pobre, superando a tentação de ser igreja do domínio e das condenações. Uma Igreja da amizade, anti-autoritária e anti-centralizadora, onde a lógica do ‘dominium mundi’ é substituída pela lógica do ‘servitium mundi’, a lógica da ternura». É um caminho a ser tomado para a construção de uma nova humanidade onde vantagem, egoísmo, violência, desconfiança não podem prevalecer. A confiança em Deus, a confiança sempre renovada no irmão e na irmã, a ternura, o amor são forças que dão esperança à humanidade. E são caminhos de evangelização.
Enraizados em bases sólidas O falar e o agir de Jesus estão impregnados de gestos de ternura, de misericórdia: os Evangelhos têm uma abundância de testemunhos do seu “passar entre 6
as pessoas fazendo o bem a todas”. O Mestre não nega sua confiança a ninguém, a não ser que se encontre diante de corações endurecidos pelo preconceito, pela rejeição da sua pessoa e da sua palavra. Na verdade “a sua ternura expande-se sobre toda criatura” (Sl. 144). «Deus não pode não amar», afirmava o Irmão Roger, prior de Taizé, observando que, para o crente, o chamado hoje a abrir caminhos de confiança a partir das noites da humanidade, é insistente. «Há pessoas – dizia – que, doando-se si mesmas, testemunham que o ser humano não está fadado ao desespero. Sua esperança permite olhar o futuro com uma profunda confiança. Por intermédio do seu testemunho, não vemos surgir nas situações mais inquietantes do mundo, sinais de uma inegável esperança?». Estas pessoas sabem que “nem as desgraças, nem a injustiça provêm de Deus”, porque Deus é Amor. Ele olha para cada criatura com infinita ternura e com profunda compaixão. Nossa confiança em Deus é reconhecível quando se exprime com o simplicíssimo dom de nos mesmos aos outros: a fé torna-se então confiável e se comunica, antes de tudo, quando é vivida. «Ama e dize-o com a tua vida», escrevia S. Agostinho três séculos depois de Cristo. À raiz do carisma salesiano existe uma confiança ilimitada, sobretudo nos jovens e nas jovens. Eles literalmente “roubaram o coração” de Dom Bosco! «O Senhor mandou-me para os jovens», dizia, «por isso é preciso que eu me poupe nas outras coisas e preserve a minha saúde para eles». «Minha vida é consagrada ao bem estar da juventude pobre e jamais vou me desviar do caminho que o Senhor traçou para mim».
Madre Mazzarello dedicou sua vida às meninas de Mornese e do mundo todo, enfrentando todas as dificuldades para poder fazer-lhes o bem. O estilo escolhido pelos nossos Fundadores para “estar com os jovens”, é a amorevolezza, síntese harmônica de confiança e ternura, amor educativo manifestado e percebido. De fato, é indispensável «que os jovens não apenas sejam amados, mas saibam que são amados». E cada
qual, em Valdocco e em Mornese, percebia efetivamente que era o mais amado, a mais amada! Na casa salesiana, a educação/evangelização “é coisa do coração” !
Como guardiões de um carisma educativo caracterizado pela amorevolezza, percebemos uma forte sintonia com o estilo que o Papa Francisco está indicando para a Igreja. Uma Igreja próxima das pessoas: «Porque a Igreja é mãe, e não conhecemos uma mãe por correspondência. A mãe nos abraça, nos toca, nos beija, nos ama. Quando a Igreja, empenhada em mil coisas, negligencia esta aproximação e se comunica apenas com os documentos, é como uma mãe que fala com seu filho por escrito» (Cf Entrevista à TV brasileira ‘O Globo’, 28 de julho de 2013). Para o Papa, é preciso uma Igreja “mais facilitadora do que controladora da fé”. Existem, às vezes, «pastorais ‘distantes’, pastorais disciplinares que privilegiam os princípios, as condutas, os procedimentos organizativos, sem aproximação, sem ternura, sem calor humano. Ignora-se a ‘revolução da ternura’ que provocou a encarnação do Verbo. Existem pastorais organizadas com tal dose de distância que são incapazes de realizar o encontro: encontro com Jesus Cristo, com os irmãos». «Como são as nossas homilias? – pergunta o Papa – Aproximam-nos do exemplo de Nosso Senhor, que ‘falava como quem tem autoridade’ ou são meramente preceptivas, distantes, abstratas?» (Cf Discurso ao Comitê de coordenação do Celam, 28 de julho de 2013).
No concreto da vida A ternura é uma atitude madura, que nos torna atentos às riquezas do outro e que nos permite participar, com o calor da nossa sensibilidade, de suas emoções, de seus sentimentos. Ela se exprime com o 7
estilo da cordialidade, da acolhida, da atenção aos pequenos gestos de afeto que revelam confiança, alegria, valorização do outro. Ser terno é saber saudar e responder com um sorriso, evitar levantar a voz nos momentos difíceis, saber escutar, fazer uma inesperada demonstração de afeto. É estar continuamente atento para fazer o outro feliz por meio de mil gestos ditados pela fantasia do amor. Tanto nas circunstâncias usuais da vida como nas extraordinárias. Há algum tempo, as crônicas falaram muito de Eleonora, morta na estrada enquanto socorria um homem gravemente ferido, depois de uma briga com alguns compatriotas. Eleonora estava passando por acaso e não hesitou em parar improvisamente o seu carro quando percebeu que se tratava de uma pessoa necessitada de socorro. Enquanto estava inclinada sobre o homem, o seu agressor jogou o próprio carro com toda velocidade sobre os dois... «Disseram-me – afirma Mariella, a mãe de Eleonora – que o homem morto tinha quatro filhos e não consigo deixar de pensar neles, nas dificuldades pelas quais eles estão passando. Então pensei: se Eleonora morreu para ajudar o pai, que amava tanto as crianças, seguramente quereria que se fizesse alguma coisa para ajudar os seus filhos, também economicamente». E decide com o seu marido que as doações coletadas no funeral de sua filha sejam transferidas aos órfãos. «Perguntam-me se sinto ódio – confidencia -, mas eu não sinto nada. Não sei por que, não sei se é por Eleonora, que amava a todos, principalmente os últimos, mas não sinto raiva. Não me sinto nem sequer de falar em perdão. O que quer dizer perdão? É o Pai eterno que perdoa. A única coisa que eu posso fazer é ajudar as quatro crianças órfãs. E não me interessa encontrá-las ou saber quem são, se são grandes, onde moram ou o que fazem». Eleonora, médica ginecologista de 44 anos, é descrita por todos como uma pessoa «amável, expansiva, generosa, que queria o bem dos outros, sempre pronta a ajudar. Uma mulher corajosa e
excessivamente altruísta! Sua enorme sensibilidade a impelia com naturalidade para os mais humildes. Vivia intensamente a caridade. Em sua carreira fez nascer centenas de crianças e assistiu muitas mães, colocando-se gratuitamente à disposição de quem estava em dificuldade financeira ou sem os meios necessários». O mundo em que vivemos nos habitua à pressa, a não ter tempo para gestos e palavras de ternura, de conforto. Talvez a coisa mais importante a ser feita é exatamente encher o nosso tempo com estes gestos, escolhendo o desafio da solidariedade, do dom gratuito e discreto. Como o de Meghan, jovem atleta americana empenhada nos 3.200 metros. No belo mês da competição observa que uma de suas adversárias encontra-se em dificuldade por causa de um ataque de cãibra. Decide renunciar à vitória e acompanhar a jovem até a meta. Terminarão a competição respectivamente como a última e a penúltima, mas sua derrota é acolhida com caloroso aplauso pelo público que reserva a Meghan o tratamento de vencedora! São sem número os gestos e as palavras de atenção aos outros, às vezes desconhecidos, mas não menos preciosos. Gestos e palavras de confiança e ternura que perfumam a vida com o perfume do bem. gteruggi@cgfma.org ● O que são para mim, no concreto da vida,
ternura e confiança? ● Qual e quanto esforço estou disposta a fazer para sair de mim mesma, para oferecer a quem vive ao meu lado o perfume da ternura, para continuamente voltar a tecer a confiança? ● Estou convencida de que um estilo impregnado de confiança e de ternura é caminho de evangelização? Como eu o exprimo?
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ANO LXI ● JANEIRO – FEVEREIRO DE 2014
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MARCA
PÁGINA
O primeiro dia do Papa Francisco Tudo quanto o Papa sublinha e propõe às/aos jovens em formação, é um reflexo do seu estilo de vida, jamais desmentido, e que constitui o fio vermelho de toda a sua existência. Percebemos isso assim que foi eleito Sucessor de Pedro, na tarde de 13 de março de 2013. É interessante a crônica do seu primeiro dia como Papa. A primeira missa de Jorge Mário Bergoglio eleito Pontífice é quase uma estreia como Papa, apontando para um pontificado com um claro estilo. Na Capela Sistina, assim que foi eleito, não sobe ao trono. No momento do juramento de obediência dos cardeais ao Papa, é ele que vai em direção ao Cardeal Ivan Dias, impedido de movimentar-se pela doença. Apresenta-se na galeria de São Pedro sem a murça e com a sua simples cruz de Bispo, ao lado de um mestre de cerimônias com um rosto um tanto perplexo. Dirige-se aos fiéis na praça depois da fumaça branca começando com “Boa tarde...”, em seguida pede que rezem por ele. Mesmo depois da eleição, toma o carro junto com os outros cardeais. Quando fazem o brinde, brinca com os seus eleitores: “Deus vos perdoe pelo que fizestes”. Deixa o carro oficial, de chapa ‘Scv1’ –
Estado da Cidade do Vaticano 1 – também quando no início da manhã, vai rezar a Nossa Senhora na Basílica de Santa Maria Maior, pelo primeiro compromisso público do Pontificado. Aos confessores dominicanos que prestam o seu serviço na Basílica, recomenda a misericórdia. Ao sair saúda com a mão os estudantes da vizinha escola secundária que acenam seus braços, das janelas. Voltando ao Vaticano, faz desviar o carro em direção à Casa internacional do clero onde pernoitara antes do Conclave. Desce, vai pegar a valise, agradece o pessoal. E, para surpresa geral, paga a conta do quarto. À noite, de novo na capela Sistina para a Missa com os cardeais, pronuncia a homilia, com um italiano calmo e mesclado de acento espanhol. Renuncia a viver permanentemente nas estâncias pontifícias. Aliás, em Buenos Aires morava em um apartamento, tomava o metrô e, em Roma, chegava às congregações gerais dos Cardeais a pé: era um dos poucos sem o solidéu vermelho, esquivando-se, sem ser notado, dos jornalistas à caça de papáveis.
dma primeiro plano: Aprofundamentos bíblicos, educativos e formativos
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ESPIRITUALIDADE MISSIONÁRIA
«EIS-ME, ENVIA-ME!» Maike Loes A fma chamada à vocação missionária ad gentes, compromete-se a responder sim com a vida e com a generosidade do «vado io» (C 32), compromete-se a renovar a identidade carismática, a viver com radicalidade a Palavra, a reavivar o ardor missionário para que as/os jovens “afastados” do mundo todo tenham vida. Toda vocação missionária nasce da Missio Dei. «Deus amou tanto o mundo que deu o seu Filho unigênito» (Jo 3, 16). Por isso, cada vocação missionária tem suas raízes e seu fundamento em Jesus, Palavra do Pai. Com o desejo de reunir todos os filhos dispersos (cf. Jo 11, 52), Jesus entrega aos seus discípulos o mandato missionário, mostrando com as palavras e as obras que Deus é amor: «Ide ao mundo todo e pregai o evangelho a toda criatura» (Mc 16, 15). O empenho de difundir a fé pertence a qualquer discípulo de Cristo. A vocação missionária é uma vocação especial. Deus prepara cuidadosamente o coração de um/a missionário/a para que seja no mundo expressão visível do Seu amor. O missionário/a é um homem/mulher de caridade, que anuncia, mais com a vida do que com as palavras, que toda pessoa é amada por Deus e que somos feitos por Amor e para o amor. É dotado/a de um coração universal que consegue superar as fronteiras e as divisões de nacionalidade, etnia, cultura, ideologia, religião. Há espaço para todos: não exclui, não rotula, não divide, mas abraça, acolhe, faz-se um com e para os outros. Pertence à «igreja do avental», como a definia Tonino Bello, vive a dimensão do serviço sempre, em todo lugar, para todos! Um missionário/a aprende continuamente, e aprende com humildade, a inserir-se no mundo sócio-cultural e religioso daqueles aos quais é enviado/a, assumindo a sua língua, conhecendo as
expressões significativas da cultura local, descobrindo os valores presentes naquela realidade (cf RM 53). A vocação missionária, antes ainda de ser ação, é testemunho e exige uma específica espiritualidade e comunhão íntima com Cristo. O missionário/a sabe que sua força interior provém do Espírito, é Ele a fonte da qual continuamente extrai as próprias energias para realizar sempre e em qualquer lugar a vontade do Pai. As nossas Constituições, já no primeiro artigo, revelam o quanto o nosso Instituto é missionário: «Dom Bosco fundou o nosso Instituto [...] e imprimiulhe um forte impulso missionário». Por isso, «a dimensão missionária – elemento essencial da identidade do Instituto e expressão da sua universalidade – está presente em nossa história desde as origens». Procurando manter vivo o impulso missionário da primeira hora, as fma são chamadas a trabalhar pelo Reino de Deus que está em toda parte, nos países cristãos e nos países descristianizados ou ainda não evangelizados (C 6), «entre as populações às quais ainda não chegou o anúncio da Palavra, para que possam encontrar em Jesus Cristo o significado profundo das suas aspirações e dos seus valores culturais» (C 75).
Ângela Vallese: um episódio infantil revela a sua vocação Ângela Vallese nasceu no dia 8 de janeiro de 1854 em Lu Monferrato, uma aldeia pequena, mas fecunda por dar muitas vocações à Igreja. Ângela guardará no seu coração, para sempre, a lembrança desta graça: ter nascido no ano da proclamação do dogma da Imaculada Conceição. A família é pobre materialmente, entrementes não lhes faltam os valores cristãos e o afeto. Aos seis anos começa a frequentar a escola, mas depois de quatro anos deve deixá-la porque a família precisa de ajuda econômica, então Ângela aprende a profissão de costureira e desafia a pobreza oferecendo 10
o dom do seu trabalho para dar conforto aos seus entes queridos. Ângela frequenta a igreja de sua aldeia, com seus pais, como fazem muitas outras crianças. Tem cerca de sete anos quando, de longe, chegam dois missionários para falar ao povo sobre a Obra da Propagação da Fé e da Santa Infância. Ângela escuta tudo com muita atenção e fica tocada ao saber que existem pessoas que ainda não conhecem Jesus e crianças necessitadas de ajuda. É a primeira a oferecer-se para fazer a coleta, imaginando como aquele dinheiro poderá servir para levar Jesus às crianças pobres e esquecidas, abandonadas à morte sem a possibilidade de conhecêLo e sem serem batizadas. Talvez devido ao seu aspecto delicado e angélico, as pessoas dão a ela mais ofertas do que às suas companheiras. Uma única e espontânea oração brota do seu coração: “Conceda-me o Senhor, salvar tantas almas quantas são as moedas que recolho!” Naquele momento Ângela intui muito bem o que deseja fazer quando for grande. Nela faz caminho o desejo íntimo de fazer Jesus conhecido e de levá-lo a muita gente! Apesar de ser apenas uma criança, não tem medo do sacrifício, sabe prestar-se aos trabalhos mais pesados e se torna também catequista. O pároco, percebendo o bom pano, confia-lhe o ensino do catecismo aos seus coetâneos e até para alguns maiores do que ela. Com a idade de quinze anos começa a frequentar o grupo das Filhas de Maria Imaculada. Sabe conjugar a
vida cotidiana com o empenho na virtude, a dedicação à oração e ao recolhimento, que recomenda com grande afeto também às suas irmãs menores, das quais ela cuida. E chega o dia em que conhece Dom Bosco! Já tem vinte anos quando descobre que este sacerdote abrira uma casa para as Irmãs, em Mornese. Ângela não duvida: “Eis onde me quer o Senhor, eu o sinto!”. No dia 15 de novembro de 1875 alcança Mornese e conhece o Instituto fma nascido há apenas três anos. Madre Mazzarello acolhe com bondade materna esta filha humilde e simples, que reflete no olhar a inocência do coração, e entrevê nela um tesouro de virtude e de sabedoria. Os passos são rápidos: em 24 de maio de 1876 faz a vestição, em 29 de agosto do mesmo ano, a primeira profissão. Um ano depois, no dia 14 de novembro de 1877, com apenas 23 anos, parte para a América, como guia da primeira expedição missionária fma, cheia de entusiasmo missionário, contagiada pelo ar que se respirava em Mornese. E aqui “o Senhor lhe concede salvar tantas almas quantas moedas havia recolhido” quando criança. Nos seus 36 anos de vida missionária, Ângela soube traduzir o evangelho na vida. “Quem comanda seja como aquele que serve”, é o seu mote de mulher incansável, capaz de enfrentar viagens, mudanças, distâncias, solidão, desapegos, pobreza e dificuldades de todo gênero. maike@cgfma.org
ALMA E DIREITO
Um filho a todo custo! Rosária Elefante As mãos sobre a vida. É possível dar um preço ao próprio filho? A resposta hoje não é óbvia, infelizmente. O processo de “regularização” habituou-nos há muito tempo a palavras que parecem sair de um romance de
ficção científica, mas que na verdade cristalizam uma realidade surreal que acontece já faz anos em muitos países. Barriga de aluguel, maternidade substituída, contrato de mãe a prazo, são paráfrases que compreendem as hipóteses nas quais uma mulher, “aluga” o próprio ventre por nove meses como incubadora natural para a 11
operação antinatural de criar um filho ordenado por outros e a eles destinado por contrato. Pois bem, além da venda de gametas (óvulos e/ou espermatozoides) para casais inférteis ou homossexuais, a moda agora é exatamente “alugar” uma mulher para o período gestacional, usando o seu corpo como uma “máquina”, a fim de obter uma “coisa”: o filho que naturalmente nunca chegaria. Tendo acontecido o parto, em seguida o casal comprador retira a mercadoria (o filho) desembolsando de 8 mil a 60 mil dólares (ou mais) dependendo do poder de resgate exercido sobre a “mãe contratada”. Estados Unidos, Grã Bretanha, Índia, Ucrânia e Guatemala: são países onde este comércio é florescente. Qual é a diferença? Apenas uma questão de preço. É exatamente a relação de força – econômica, geográfica, social – entre os genitores aspirantes (se assim podem ser definidos) e a gestante real que dita as condições e desloca a escolha da mãe momentânea no mapa mundi. Isso se chama comercialização da vida humana não apenas e sobretudo para o filho, mas também para a exploração das mulheres, a humilhação de seus corpos, para a autêntica desfiguração do rosto feminino, até atingi-lo na magnífica essência imaculada da procriação: o senso materno, o liame de sangue e psicológico com um criatura que brota, cresce, movese e vive dentro de uma mãe.
É proibido proibir
A dignidade humana e cristã da procriação, de fato, não consiste em um “produto”, mas em seu liame com o ato conjugal, expressão do amor dos cônjuges, da sua união não apenas biológica, mas também espiritual. A Instrução Donum vitae lembra-nos, a este propósito, que “pela sua íntima estrutura, o ato conjugal, enquanto une com profundíssimo vínculo os esposos, torna-os aptos à geração de novas vidas, segundo leis escritas no
Reflitamos por um momento. Um casal paga dinheiro a uma mulher que o embolsa por uma vida humana “comissionada”, “produzida” e mesmo “vendida”, talvez também em base a determinados requisitos selecionados. O posto para o parto está aberto. Com o véu das “nobres intenções” é direito conclamado “proibido proibir”. Sim porque agora tudo isso, em cada uma de suas fases, é um direito: ao filho, à maternidade, à paternidade, à progênie. Direito e liberdade. Isso nada mais é do que uma prática contratual normal. Com menos de 7 mil dólares a vida de uma jovem indiana “contratada” nos casebres muda radicalmente, o importante é que tenha saúde e que, no caso de má formação da “mercadoria” não faça história e aborte rapidamente sem dizer uma palavra. É inútil dizê-lo: o filho deve ser saudável. O silêncio ensurdecedor que paira sobre esta prática odiosa, é insuportável! É como se estivéssemos substancialmente aceitando tudo. Certamente é melhor não falar. Parece ser quase oportuno não fazê-lo. Talvez com muita evidência viesse para fora o nihilismo absoluto. Como se justifica a distorção entre a dignidade feminina tão ventilada e reivindicada e a condição aviltante na qual vivem milhares de mulheres no mundo para contentar o desejo de um filho por parte de qualquer um que tenha dinheiro e se sinta justificado tanto legal como culturalmente, a encomendá-lo? Um filho não tem preço. rosaria.elefante@virgilio.it
próprio ser do homem e da mulher” (n. 126). (...) A Igreja presta muita atenção ao sofrimento dos casais com infertilidade, cuida deles e, precisamente por isso, encoraja a busca médica. A ciência, todavia, nem sempre é capaz de responder aos desejos de tantos casais. Gostaria então de lembrar aos esposos que vivem a condição da infertilidade, que nem por isso a sua vocação matrimonial fica frustrada. Os cônjuges, pela sua vocação batismal e
matrimonial, são sempre chamados a colaborar com Deus na criação de uma humanidade nova. Realmente, a vocação ao amor é vocação ao dom de si e esta é uma possibilidade que nenhuma condição orgânica pode impedir. Então, onde a ciência não encontra uma resposta, a resposta que ilumina vem de Cristo. (Discurso de Bento XVI aos participantes da Assembleia da Pontifícia Academia para a Vida, fevereiro de 2012).
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CULTURA ECOLÓGICA
A terra, nossa casa comum Júlia Arciniegas, Martha Seide
A humanidade é parte de um vasto universo evolutivo. A terra, nossa casa comum, é viva com uma comunidade singular de vida. A proteção da vitalidade, da diversidade e da beleza do planeta é um dever sagrado. (Cf. Carta da Terra) O grito da terra É fato indiscutível que a crise ambiental já assumiu uma dimensão global. A poluição nas suas diversas formas, a mudança climática, a crise dos recursos hídricos, a redução irreversível da biodiversidade, a exaustão de tantos recursos alimentares, petrolíferos, geológicos reduzem progressivamente a qualidade de vida. Diante desta degradação ambiental progressiva cresce também a consciência e a necessidade de construir uma cultura ecológica que reforce a aliança entre o ser humano e o ambiente. Por isso é urgente recuperar a capacidade de reconhecer na criação um dom a ser valorizado e respeitado.
«E Deus viu... que tudo era bom» No livro do Gênesis encontra-se sete vezes a expressão: «E Deus viu... que tudo era bom»; e isto foi dito para a luz, para a terra, para os astros do céu, para os animais e enfim para o ser humano, enquanto homem e mulher (Cf. cap. 1). A obra criada é boa porque o Criador a produz por amor, para uma boa finalidade. O bem verdadeiro é aquele que flui de um ato livre de amor. Portanto, esta bondade não diz respeito apenas à dimensão moral, mas inclui a capacidade das criaturas de refletir a glória e a perfeição de Deus. Neste sentido o valor da criação representa um valor em si, em referência ao Criador. “O mundo sub-
humano alcança o seu pleno significado a partir de sua referência ao homem. Ao mesmo tempo, o homem alcança o seu pleno significado em seu relacionamento com Deus” (Haffner, Para uma teologia do ambiente, 123). O Novo Testamento apresenta o Senhor Ressuscitado como o mediador de toda a criação: por meio d´Ele cada coisa foi criada e n´Ele tudo encontra sentido e plenitude (Jo 1, 1-3; Col 1,15; Hb 1,3). De fato, o Verbo que se fez carne em Jesus Cristo operava, desde o princípio, como sabedoria criadora do Pai. A própria Páscoa do Senhor, revela uma dimensão cósmica: a terra é envolvida na ressurreição, de modo a ser orientada para a plenitude de vida. A criação é o primeiro grande dom de Deus, a primeira expressão radical do seu amor poderoso: um cosmo ordenado e precioso, capaz de sustentar aquela realidade misteriosa e frágil que é a vida (Cf CEI, Jornada para a salvaguarda da criação 2006).
Uma herança a ser custodiada Um dos desafios do século XXI é construir uma cultura ecológica centralizada no relacionamento entre homem e habitat, entre a ecologia humana e a ecologia ambiental. «Hoje é forte a demanda de converter-nos de consumidores-exploradores a guardiões da criação. É de dentro da pessoa que deve partir a inversão da marcha com grande senso de responsabilidade» (Circ. 934, p. 10). Custodiar é tomar cuidado, é responsabilizar-se pelo mundo em que vivemos, favorecer um relacionamento mais equilibrado do homem com a natureza. Não se trata apenas de reforçar a conservação dos ecossistemas e do ambiente natural, mas de rever em profundidade as modalidades com que as nossas sociedades geram bem-estar e desenvolvimento econômico e social. Muitas já são, hoje, as ações que podem ser empreendidas para pôr em prática comportamentos 13
concretos voltados à redução do consumo da natureza, à destruição dos recursos naturais e ao desperdício dos bens ambientais primários como a água, a terra, o ar, a biodiversidade, a energia. Ao mesmo tempo, são numerosas as iniciativas a serem promovidas para ativar percursos de desenvolvimento capazes de conferir dignidade e bem-estar a grande parte da humanidade que hoje está excluída. Além disso, custodiar a criação em âmbito econômico, político e social é também orientar com apropriados instrumentos normativos e sustentar com recursos adequados todas aquelas medidas que permitem aliviar a pegada ecológica, isto é o peso de uma comunidade sobre o ambiente natural, e melhorar a condição e a qualidade da vida das pessoas (Cf. CEI, 8ª Jornada para a custódia
da criação 2013).
Para custodiar a criação, enfim, ocorre educar e educar-nos a uma cultura ecológica por um estilo de vida mais sustentável.
O que podemos fazer? A nossa vida cotidiana nos apresenta um conjunto de oportunidades para traduzir em atitudes concretas a convicção de que a terra é um dom sagrado a ser administrado para o bem da humanidade. O Ofício JPIC da Ordem dos Frades Menores nos oferece sugestões interessantes e operativas. Para realizar este processo, por ex., no nível da gestão dos resíduos, são ainda válidos os três R ecológicos: Reduzir, Reutilizar e Reciclar.
Reduzir: o uso de produtos “usa e descarta”, o plástico, os tabuleiros feitos de poliéster, o excesso de embalagens, o material poluente, etc. Reutilizar: bolsas, caixas, sacos de papel e de plástico e outros recipientes...; dar prioridade aos produtos com etiqueta ecológica, escolher produtos fabricados com material reciclado e produtos com recipientes reutilizáveis. Reciclar: cartões, papel, jornais, plástico, garrafas, recipientes...; vidro e alumínio, lixos domésticos. Finalmente: é indispensável colocar em prática, a coleta diferenciada dos lixos.
CONTRA LUZ A Educar-nos e educar Que produtos “usa e descarta” utilizamos com mais frequência? Quais poderemos substituir ou evitar? Que produtos poderemos reciclar e reutilizar? Efetuamos regularmente diferenciada?
a
coleta
Tomamos decisões concretas a respeito?
FIO DE ARIADNE
In/Gratidão Maria Rossi
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Diante de situações de sofrimento geralmente emergem sentimentos de compaixão junto com o desejo de socorrer, ajudar e aliviar os obstáculos. Às vezes é possível intervir apenas com uma sofrida oração de intercessão. Outras vezes, tendo os meios e permitindo-o as circunstâncias, a compaixão se transforma em gestos de acolhida, de defesa, de apoio, de ternura. São gestos concretos que provêm de um profundo sentimento humanitário e de compaixão diante de quem muitas vezes sofre injustamente. São marcados pelo desejo de aliviar, de possibilitar um crescimento sereno e, também, pelo entusiasmo de poder contribuir com uma causa importante. Nascem com a insígnia da gratuidade, mas não se pode ignorar que «o desejo de fazer o bem, inconscientemente contém um pedido de receber em troca ao menos a gratidão» (PARSI Maria Rita, Ingrati. A síndrome rancorosa do Beneficiado, Mondatori, Milano 2012).
Um peso insuportável Uma pessoa que ajuda, acolhe, dá amor e ternura, expõe-se, torna-se vulnerável e pode encontrar-se em dificuldades consideráveis. Pode ficar bloqueada e sucumbir sob o peso dos diversos aspectos da ingratidão, sobretudo quando começa com o entusiasmo e a ingenuidade do jovem neófito, com pouca consciência das próprias dinâmicas intrapsíquicas e escasso conhecimento das possíveis respostas de quem é beneficiado. A experiência da ingratidão manifesta-se cedo na vida. Não é raro ouvir crianças e principalmente adolescentes, que confidenciam as suas primeiras experiências com o sofrimento de uma traição: «O ano passado ela era minha amiga e eu trazia merenda também para ela. Este ano vai com outra menina e conta para todos os meus segredos». «Desde pequena ela vinha à minha casa, brincávamos e fazíamos as tarefas juntas. Agora não vem mais, fala mal de mim e de minha família». E estas experiências incidem, com muita frequência, negativamente nos resultados escolares e nas relações interpessoais. Mas também podem tornar-se ocasião de crescimento pessoal. Para os adultos e os idosos, mais ainda que para os adolescentes e jovens, a ingratidão pode ser um fardo insuportável. As pessoas com as quais se abriu o coração e se compartilhou a vida (o parceiro, um amigo/a, uma filha/o, uma pessoa querida, uma Instituição de pertença) e nas quais se investiu muito emocionalmente, quando respondem com a deturpação da realidade, com traições, calúnias, humilhações, rejeições e abandonos (reais ou assim percebidos), podem infligir danos comparáveis aos provocados por um tsunami. Podem desorientar, colocar em discussão a própria identidade, provocar o
o fechamento em si, fazer perder o sentido da vida e do dom. Frases como estas, o comprovam: «É muito triste, realmente eu não esperava»; «Não precisa acreditar nem ajudar ninguém»; «Eis o que você ganhou: depois de anos de sacrifícios, deixaram-na em apuros. É melhor pensar em si mesma e deixar que os outros se arranjem». E coisas piores.
Beneficiados e benfeitores A ingratidão é definida como um “comportamento que menospreza ou renega a substância humana e moral do benefício recebido” (Devoto-Oli). É uma atitude de vida muito generalizada que, segundo as ocasiões e as idades, pode emergir não apenas no beneficiado, mas também no benfeitor. Segundo a Autora citada, faz parte do nosso estar no mundo e nasce com o dom da vida: grande dom de amor, mas não pedido e que comporta a expulsão do útero materno que mantinha um perfeito bem-estar e uma incondicional proteção. «Nascemos de um ato de traição visceral, tanto maior quanto maior foi o amor que o precedeu. E nascendo, passamos para uma vida autônoma que não pedimos». A marca do amor contém o da ambivalência e o rancor do beneficiado está «em nossas cordas originariamente: devemos aprender a reconhecê-lo também em nós mesmos para controlá-lo e evitar que se volva para dimensões patológicas». O acolhimento incondicional e os cuidados maternos que seguem o nascimento ajudam a curar a ferida inicial. O amor dos pais torna-se «aquela ginástica emotiva que ajuda os filhos a serem bons beneficiados, isto é, pessoas capazes de pedir com serenidade, se tiverem necessidade, e de dizer “obrigado” a quem lhes dá, capazes de reconhecer o dom recebido porque o amor fará com que isto lhes seja possível. O desconforto da ambivalência transforma-se em rancor quando não sabe transformar-se em gratidão, se lhe faltou o modelo e o alimento». Aqueles que, ou por falta de cuidado e de amor ou por falta de autoconhecimento e reflexão, não superaram a ambivalência do amor, poderiam: ou ser incapazes de reconhecer os benefícios recebidos, porque entendidos como ressarcimento do que lhes foi irreparavelmente tirado, ou tornar-se benfeitores até as últimas consequências para mostrar aos outros como se faz para beneficiar. Os beneficiados que entendem o dom como um ressarcimento do que lhes foi tirado, com suas pretensões e a deturpação da realidade, podem tornarse um pesadelo e também um perigo. Para não se deixar arrastar, para não permitir que sentimentos de ódio e de vingança se enraízem na alma e para não se fechar e parar, é necessário distanciar-se emocionalmente e, podendo, também fisicamente, e confiar-se Àquele que conhece até mesmo o dom de 15
um copo de água. Maria Rita Parsi escreve: «O destino dos ingratos, o que eles merecem, é o esquecimento». Somos todos beneficiados e benfeitores. E se não é fácil ser um bom beneficiado, é também difícil ser um bom benfeitor. Alguns benfeitores (entre estes podemos estar também nós) tendem a fazer sentir muito o peso de sua ajuda e a doar para tornar-se pessoa serviçal ou, de alguma forma, para agradar, e em seguida receber favores. O interesse, especialmente se for dissimulado, provoca, em quem recebe, humilhação, desconforto, embaraço e também rejeição do benefício. Alguns benfeitores podem experimentar a inveja e sentir-se empobrecidos pelo sucesso profissional ou pelo prestígio alcançado pelo beneficiado; outros ainda, podem fechar-se em um triste ressentimento e tornar-se incapazes de encontrar serenidade e gosto no ato de doar. Um dom é, de certa forma, um peso que nem todos conseguem suportar serenamente e muito menos agradecer. Cacciaguida, no décimo sétimo canto do Paraíso na Divina Comédia, referindo-se à acolhida que experimentará no exílio, diz a Dante: «Tu experimentarás sim como tem gosto de sal/ o pão do outro, e como é difícil atalho/ o descer e o subir pela escada do outro».
Aprender com os ingratos A experiência da ingratidão pode trazer prejuízos irreparáveis, mas poderia também tornar-se uma ocasião importante de crescimento. A Autora citada escreve: «Devo agradecer a muitas, muitas pessoas ingratas. Algumas delas o foram de modo realmente incompreensível, outras, de modo decididamente indigno. Eu as encontrei e as encontro continuamente na minha vida. Foram e são meus verdadeiros mestres. Delas aprendi e aprendo cotidianamente tudo aquilo que agora conheço... sobre os meus limites, os meus vazios, as minhas misérias, indignidades, incompetências, ineficiências». A ingratidão pode ajudar a conhecer melhor a própria humanidade e também a dos outros. O conhecimento profundo de si mesmo permite manterse aberto, disponível, desinteressado e, ao mesmo tempo, a acertar as contas com a parte obscura de si mesmo; permite perceber que o desejo de fazer o bem contém inconscientemente a petição de receber um agradecimento em troca e isso pode ser sentido como um peso excessivo.
Às vezes, constrangido pela necessidade, alguém pode demonstrar-se grato, mas se este alguém sente excessivamente o peso do benefício que considera como ressarcimento da privação, pode ou ignorar o benfeitor ou voltar-se contra ele e causar-lhe sofrimento e dor. Partindo da indignação, do sofrimento e da desorientação que a falta de gratidão provoca, pode-se aprender a ser prudentes, realistas e humildes, a não prodigalizar-se em fazer o bem com bonomia inconsciente, mas a preparar-se responsavelmente para qualquer eventualidade. Diz Buñuel, «Não faça o bem se você não está pronto para suportar o mal que lhe advirá em troca». Também Dom Bosco aprendeu com os ingratos. Depois que os jovens alojados foramse embora, levando os cobertores e os lençóis e até mesmo o colchão de palha, aconselhado por Mamãe Margarida, decidiu continuar a acolher, mas com maior prudência. A experiência da ingratidão traz consigo a tentação de fechar-se e de desistir. Mas a consciência iluminada pela fé, da própria humanidade e da humanidade do outro ajuda a continuar com humildade a acreditar que o bem que se faz tem um grande valor independentemente do reconhecimento. «Os ingratos para mim, escreve a Autora citada, são a lama sem alma nem luz. Eles são a minha parte sem luz que devo iluminar e que, graças a eles, poderei transformar em ouro. O ser humano autêntico é aquele que olha para as estrelas. Mesmo na lama e a partir da lama da qual provêm». Um bom benfeitor é uma pessoa autenticamente humana «que aspira a fazer o bem porque percebe nele a Beleza. E vibra cada vez que o bem acontece, experimentando uma realização interior que, como energia emocionalmente forte e segura, conecta-se com a sua mente, o seu corpo, o seu imaginário». A gratidão tem um grande valor educativo. Dom Bosco quis mesmo que ela fosse evidenciada com uma festa. Quem reconhece serenamente o benefício recebido, reconhece-se a si mesmo e sua própria condição. E isso lhe confere identidade, liberdade e capacidade de ser um bom benfeitor, uma pessoa generosa que não somente doa, mas que também aceita receber e se mostra agradecida. rossi_maria@libero.it
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ANO LXI ● JANEIRO – FEVEREIRO DE 2014
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hino à vida
SE O INVERNO DISSESSE: TENHO NO CORAÇÃO A PRIMAVERA, QUEM LHE ACREDITARIA? KAHLIL GIBRAN hino à vida
A VIDA, COM QUALQUER LINGUAGEM USADA, SEMPRE EXPRIME A VIDA. MARY HASKELL
hino à vida
DO AMOR BROTA A VIDA E A VIDA DESEJA E PEDE AMOR SEM ASSINATURA? hino à vida
dma em busca: Leitura evangélica dos fatos contemporâneos
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EJS - CULTURAS
Viver com paixão Mara Borsi
A espiritualidade salesiana encoraja os jovens a enfrentarem os desafios e as demandas da vida cotidiana, com alegria e sacrifício. É uma espiritualidade que os encontra no seu nível e sabe como identificar o movimento do Espírito nos seus corações. Hoje vivemos uma época marcada pelo mito embriagador da eficiência e da qualidade: se você estiver no pico do desempenho, vale; se não estiver, não vale. A vida deve ser bela, perfeita, inteligente, rica de sucesso, a vida vale se aparece. A consequência desta visão da existência é a reprodução de máscaras. Faz-se de tudo para que a fragilidade, a fraqueza e o limite, não apareçam. A espiritualidade salesiana educa para amar a vida na sua inteireza, com suas luzes e sombras, como também com a sua lentidão: se a negas perdes a cor e o sabor da vida, daquela vida autêntica, entende-se.
emoção que estão experimentando, em uma palavra, a estarem presentes naquilo que fazem, no fragmento de vida que tem lugar. Os que vivem a espiritualidade salesiana, na escola da Encarnação de um Deus que habitou o fragmento e morou em nossa pobreza e fraqueza, acreditam na presença de Deus que cerca continuamente de amor e de proteção os seus filhos e reconhecem que não há necessidade de abandonar a vida ordinária para procurar o seu Rosto. Antes, é exatamente ali que O encontramos. Assumir com coerência o aspecto ordinário da existência; aceitar os desafios, os questionamentos, as tensões do crescimento; procurar a recomposição dos fragmentos na unidade realizada pelo Espírito no Batismo; trabalhar pela superação das ambiguidades presentes na experiência cotidiana; fermentar com o amor, cada escolha: é esta a passagem obrigatória para descobrir e amar o cotidiano como uma realidade nova na qual Deus age com sua misericórdia e magnanimidade. mara@cgfma.org
João Bosco e Maria Mazarello, por intermédio de seus filhos e filhas e de todos aqueles que compartilham a mesma espiritualidade, também hoje ensinam numerosas moças e moços a viverem com paixão, a lerem a página da vida que estão vivenciando, o rosto de quem estão encontrando, a
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ANO LX I ● JANEIRO – FEVEREIRO DE 2014
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Os desafios e as demandas da vida cotidiana Nove horas da manhã, aula de religião com os alunos do 5º ano do Ensino Fundamental. O professor vê uma mão levantada e dá a palavra ao jovem estudante que começa dizendo: «Como se faz para salvar a alma?». O professor sentiu um arrepio na espinha. A questão chega e desmancha o plano da aula. O silêncio penetra fundo, os olhos dos alunos correm do rosto do companheiro ao do professor. Estupor à espera de uma resposta. Na mente do professor muitos pensamentos se sobrepõem, correm velocíssimos e brota do coração uma invocação ao Espírito: fechar rapidamente a questão e ir para a lição programada ou percorrer o caminho do inesperado. Começa a contar a história de Laura Vicuña, jovenzinha que oferece os seus sofrimentos e também sua vida pela conversão da mãe às exigências do Evangelho. A certa altura o professor pede aos seus alunos que abram os olhos e pensem em alguém que conheçam e que poderia estar tomando uma decisão errada para a própria vida. O professor insiste: “como vocês se sentem?, por que se sentem assim?”. Começa uma partilha que leva os alunos a expressarem suas preocupações com os familiares, os amigos, os conhecidos. Um diálogo vivaz e cada vez mais profundo que pouco a pouco leva a compreender que a preocupação está enraizada no amor.
O professor faz entender que é este o amor que Laura Vicuña tinha pela sua mãe. Para salvar uma alma, portanto, pode-se ser generosos como ela, e por meio dessa generosidade pode-se colocar uma especial intenção pela conversão daqueles que amamos. Outra mão levantada e o estudante, para tornar mais solene aquilo que está para dizer, fica em pé: “Isto significa que devemos dar a nossa vida para salvar uma alma?”. O professor explica que nem todos são chamados a dar a própria vida como Jesus, Laura e tantas outras testemunhas do Evangelho, mas pode-se ser generosos de muitos outros modos, e começa com uma enxurrada de exemplos, de situações concretas que a partir da vida cotidiana falam de disponibilidade, sacrifício, atenção aos outros. Ajudar os irmãos e as irmãs menores nas tarefas da escola, oferecer a própria disponibilidade para limpar a casa dos avós etc., os exemplos parecem não acabar mais. E assim acontece que, em um agradável dia de outono os estudantes do 5º ano de uma pequena escola elementar católica no Sul dos Estados Unidos, acolhem o desafio de serem mais generosos, vão além de uma aula simplesmente desejada e vivida. O professor toca com a mão a ação do Espírito Santo e renova a sua oferta de tempo e de talento pela salvação e educação das novas gerações. Jeanette Palasota fma, Estados Unidos
PASTORALMENTE
JMJ: etapa de um longo caminho Mara Borsi, Palma Lionetti
A mensagem chave da JMJ do Rio, que foi nova na forma e na substância, é fazer-se companheiros de viagem dos jovens que, como os discípulos de Emaús,
parecem desconfiados de uma Igreja que é percebida distante. Fazer-se companheiros de caminhada falando de Deus por meio dos gestos de partilha. 19
As palavras e os gestos do Papa Francisco no decurso da JMJ do Rio de Janeiro revelaram ao mundo um pouco do roteiro que pretende traçar para o futuro da Igreja. Os jovens não constituem uma realidade estanque, eles são parte integrante da sociedade. O Papa demonstrou isso personalizando o programa de uma JMJ herdada de outros. As paragens no centro de tratamento e reabilitação para os toxicosdependentes, a visita a uma das 1.100 favelas da cidade, o encontro com oito detentos, duas moças e seis rapazes, quiseram dizer que também as novas gerações não estão isentas de lidar com a dor, o limite, a pobreza, o pecado, o delito, o sofrimento, o resgate pessoal e social. O próprio Papa fazendo o balanço deste grande evento lembrou a todos que as jornadas mundiais da juventude não são “fogos de artifício”, momentos de entusiasmo com um fim em si mesmos, mas são etapas de um longo caminho. A consciência da importância de conjugar a pastoral dos eventos, dos quais a JMJ é o vértice, com a pastoral da vida cotidiana, isto é, com a proposta de itinerários educativos que favorecem a interiorização da fé, fez-se sempre mais clara nestes anos, nos dirigentes da pastoral juvenil. Todavia, continua-se a experimentar um hiato entre a experiência forte das grandes convocações e o cotidiano, pensando na experiência salesiana, por exemplo, as do Movimento Juvenil Salesiano, já realizadas em todos os contextos. Persiste uma certa dificuldade para acompanhar os jovens na experiência universitária, no mundo do trabalho, para os poucos que conseguem entrar, interceptar a realidade juvenil, principalmente, a que está na periferia dos grandes eventos.
Entrar na noite O Papa Francisco falando dos jovens aos bispos brasileiros disse: «Precisamos de uma Igreja que não tenha medo de entrar na sua noite... Capaz de encontrá-los no seu caminho... Capaz de inserir-se na sua conversa». Não se pode ignorar a noite das mulheres e dos homens de hoje, rumo aos quais a Igreja é chamada a encaminhar-se sem medo e preconceitos. Um mandato a ser respeitado e concretizado pelo fato de que Francisco escolheu a JMJ do Rio de Janeiro para dizer a todos os crentes em Jesus que são chamados a serem servidores da comunhão e da cultura do encontro, sem presunções, guiados pela humilde e feliz certeza de quem foi encontrado, alcançado e transformado pela verdade que é Jesus Cristo e, por isso, não pode deixar de anunciá-lo. O Papa ofereceu aos jovens um exemplo pessoal, uma indicação concreta de como viver como cristãos, hoje, colocando em primeiro lugar os sofredores, os
excluídos, os esquecidos, os descartados pela sociedade. A mensagem chegou clara e forte.
O que ficou depois Martina 18 anos: «Eu esperava muito, mas encontrei muito mais. Levei para casa uma carga formidável. Quero, como catequista, comunicar às minhas crianças aquilo que vivi». Maria Elena, 20 anos: «Ficou em mim a vontade de sorrir e de comunicar o amor. Ficaram, porém, principalmente, os claros objetivos de nunca deixar de procurar, na fé, e de servir o próximo no cotidiano». Clara, 19 anos: «Compreendi que o Papa Francisco acredita em nós, uma geração sufocada que não tem como, nem espaço para se exprimir. Ele despertou em nós uma confiança incondicional. A confiança é o tesouro que ficou em mim». Gabriel, 22 anos: «A alegria e a consciência de que ‘agora toca a nós’». Fausto, 25 anos: «Descei das varandas, disse-nos o Papa. Isso me dá a coragem de não ser o espectador». Luca, 28 anos, educador: «empenho, trabalho pastoral, cotidianidade. Consciência de que aquilo que se faz não é por nada inútil ou muito pequeno, mas torna melhor um pedaço de mundo. Partilha da vida nas nossas casas, nos ambientes educativos, nos momentos ordinários que, às vezes acontecem, tornam-se excepcionais, porque faze3m brilhar a simplicidade e o amor. Oásis de sentido nos desertos da banalidade, sorrisos, abraços, gestos que demonstram o sinal do amor de Jesus».
Na vida de todos os dias Para conjugar os grandes eventos com a vida cotidiana, para projetar de modo sensato a pastoral juvenil é necessário insistir na centralidade da figura de Jesus. É a humanidade de Jesus que “ensina a viver” e educa a nossa humanidade. Ler com os jovens, como comunidade crente, os Evangelhos, procurando descobrir qual a humanidade que move Jesus nos seus encontros com os outros, como fala Jesus, que vida interior Ele revela. Testemunhar a fé e, portanto, mostrar a fé como o caminho para dar sentido à vida, capaz de dar sabor, direção e significado à vida dos jovens. Em lugares abandonados, nós construiremos com tijolos novos. Há mãos e máquinas e barro para novos tijolos e cal para novas argamassas. Onde os tijolos caíram construiremos com pedras novas; onde as vigas estão podres construiremos com madeira nova; onde palavras não são pronunciadas construiremos com nova linguagem. Existe um trabalho comum, uma Igreja para todos e um empenho para cada um, cada um no seu trabalho. Thomas Stearns Eliot – Cori da “La rocca”
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UM OLHAR SOBRE O MUNDO
Unidas por uma sociedade melhor Anna Rita Cristaino “Acredito firmemente que a salvação da Índia depende da abnegação e da emancipação das suas mulheres” (M. Gandhi). Este ano a rubrica “Um olhar sobre o mundo” será um diário de viagem, com o relato de encontros e a escuta de histórias que se abrem às diversas culturas do mundo. A primeira etapa é Bangalore, na Índia. Visitamos esta cidade e os Estados de Karnataka, Andhra e Kerala com a intenção de olhar para esta terra com os olhos das mulheres... Isso nos dá a possibilidade de entrar nesta grande Nação com uma perspectiva rica de sugestões e principalmente nos dá a possibilidade de captar o quanto a contribuição das mulheres é importante para o crescimento do País. Bangalore é a capital do estado de Karnataka na ponta sudoeste da índia. É a terceira cidade mais populosa da Índia com mais de seis milhões de habitantes e uma das cidades da Ásia que está se tornando velozmente cosmopolita pela presença de numerosas sociedades para ações multinacionais e é sede de mais de 100 universidades de pesquisa e técnicas. A indústria da tecnologia das informações, porém, prospera à custa da população rural. Somente um percentual de 28% de Bangalore é urbano e a maior parte da sua população baseia-se em empresas agrícolas. A diferença econômico-cultural torna-se sempre maior e o foco nas tecnologias de alto nível com relação aos princípios da economia agrária deu dois rostos para a mesma cidade. O primeiro é vibrante, inovador e extremamente moderno, mostra o sucesso de uma nação em desenvolvimento. O segundo mostra a gente que vive marginalizada, pelas ruas, com serviços públicos inadequados e com enormes diferenças de renda, com saúde precária e poucas oportunidades. Particularmente as mulheres e as crianças estão sofrendo com esta situação. Para as mulheres trata-se de lutar contra a pobreza, mas também contra as discriminações dos que gostariam de relegá-las apenas aos trabalhos domésticos sem lhes dar voz. Alfabetizar as mulheres, portanto é absolutamente necessário para conferir-lhes a consciência das próprias potencialidades.
Encontramo-nos com Ir. Anna Thekkekandathil, fma da Inspetoria INK, que nos fez um relato: «Vendo as condições de extrema pobreza das mulheres, dos jovens e das crianças nos vários estados da índia, especialmente em Karnataka, Andhra Pradesh e Keerala, nas favelas e nas aldeias, criamos uma ONG chamada Centro para o Desenvolvimento e o Empowerment das Mulheres, (CDEW), a fim de promover a condição das mulheres por meio de diversas intervenções e atividades». Como em toda a Índia, aqui as Filhas de Maria Auxiliadora fizeram a escolha de diminuir a pobreza e de promover a alfabetização por meio de uma campanha na qual as mulheres adquirem as habilidades básicas para tornarem suas vidas mais sustentáveis. Para as fma as mulheres são o trunfo para a diminuição da pobreza e melhoria dos padrões de vida da família em termos de alimentação, cuidados sanitários e instrução das crianças. Trabalha-se em favor de sua dignidade e de seus direitos por meio da promoção da autoconsciência, a participação social, a instrução, a formação cultural, a autonomia econômica e a assistência sanitária. O CDEW é o órgão oficial de ação social das fma da inspetoria. Nasceu em 2003 como uma organização de voluntariado e planifica o seu trabalho seguindo 5 estratégias do empowerment: organização, instrução, autossuficiência econômica, cuidado da pessoa e capacitação para tomar decisões. Em nossa viagem encontramos mulheres com rostos marcados pelo sofrimento e pela dor, mas também pela determinação de fazer alguma coisa para tornar o seu futuro e o de seus filhos, melhor. Mulheres cujo olhar é intenso, que conhecem a preciosidade de cada átimo da vida, que passaram por momentos difíceis, mas que souberam levantar-se encontrando em si mesmas a força para melhorar as próprias condições. Entre estas está Mahalakshmi: «Sou proveniente da aldeia Palipalem, em Kottapatnam Mandal. Os meus pais dispuseram para mim um matrimônio combinado aqui em Mahendra Nagar, Ongole. Meu marido possuía um forno para a produção de tijolos. Um dia, durante uma briga com um vizinho, foi apunhalado e morreu no local. Tenho quatro filhos: 3 moças e um rapaz. 21
Naquele tempo o caçula tinha apenas 6 meses. Quando meu marido ainda estava vivo, eu quase não saía de casa, nem mesmo para ir ao mercado. Alguns dos meus vizinhos haviam me aconselhado a vender o forno e a comprar búfalas para ter com que viver. Com crianças tão pequenas, precisei lutar para sustentar minha família. Não sabia como. Então, uma das organizadoras do Centro de Desenvolvimento das Mulheres “Auxilium Akhila Vikas”, a Senhora Rani, veio visitar a minha família.
Ela me pediu para fazer parte do seu Grupo de AutoAjuda para poder reservar algum dinheiro e depois receber um empréstimo do grupo e do banco. Tornada membro do grupo aprendi muitas coisas: ganhei confiança em mim mesma e comecei a apreciar o valor do trabalho árduo. Depois de 6 meses tomei o meu primeiro empréstimo do grupo e comprei uma outra búfala. Mandei os meus filhos para a escola, sabendo que, quanto mais iam adiante no estudo mais se tornava dispendioso. Com a ajuda de outro empréstimo do banco pude comprar outra búfala. Atualmente tenho três búfalas com as quais posso obter uma renda razoável para cuidar da minha família. Antes nós morávamos em uma cabana, mas pouco a pouco consegui construir uma casa de tijolo. Dois dos meus filhos continuam os seus estudos, duas filhas se casaram. Fazer parte do grupo ajudou-me a ter confiança em mim mesma, a crescer na dignidade e a trabalhar sem precisar depender dos outros para progredir na vida. No início eu era muito tímida, mas depois, tomando consciência das minhas potencialidades, comecei a falar em público, a expressar o meu pensamento e a contar a minha história». Saguna também é uma mulher determinada, que precisou lutar para se fazer aceita e para demonstrar que, não obstante a impossibilidade de ter filhos, sua vida não era inútil. «Agora sou líder do Grupo de AutoAjuda Laxmi. Casei-me com 25 anos. Não tive filhos e por isso todos os meus vizinhos e minha sogra me olhavam com desprezo e me maldiziam como mulher estéril. Meu marido trabalhava em uma loja como contador e eu era dona de casa. Sentia-me fortemente desmoralizada e não recebia ajuda de ninguém. Um
dia, uma das Irmãs do Centro de Desenvolvimento das Mulheres “Auxilium Akhila Vikas”, juntamente com uma organizadora da comunidade, vieram visitar a minha família e me aconselharam a fazer parte do Grupo de Auto-Ajuda Laxmi. Pouco a pouco pude superar a minha dor e me encorajaram a abrir um pequeno negócio. Então, fiz um empréstimo e comprei arroz por atacado para vendê-lo a varejo. Isso me ajudou a gradualmente esquecer o meu sofrimento. Depois de haver reembolsado o primeiro empréstimo os membros do grupo aconselharam-me a fazer outro, e assim pude ampliar o meu comércio de arroz. Agora, com um trabalho intenso, tomei consciência da minha potencialidade interior e construí boas relações com os meus vizinhos. Encontrei muitos clientes para os quais pude vender o meu arroz. Embora não seja tão jovem decidi adotar uma menina, mesmo enfrentando a crítica do meu marido e de muitos dos meus vizinhos. Eu os desafiei dizendo que diariamente, com a venda dos poucos pacotes de arroz poderia criar a menina. Pouco a pouco meu marido cedeu. O nome de minha filha é Sri Harsavardhini. Agora, meu marido sente-se feliz por ter esta filha e lhe quer muito bem». Ir. Padma Latha também trabalha nos centros de desenvolvimento e partilha conosco sua experiência: «As Mulheres adquiriram poder e consciência. Saíram de sua escravidão. Agora são independentes e podem pensar por si mesmas. Adquiriram muitas habilidades e melhoraram a própria vida. Podem motivar os seus filhos aos estudos, percebem suas capacidades e cuidam dos seus direitos. Por meio dos grupos de SHG, as mulheres cresceram em todos os níveis e adquiriram segurança, autoestima e confiança. Têm mais conhecimentos e esperanças. Hoje as mulheres são mais livres, e posso dizer que o caminho feito com elas foi um caminho de libertação». No decurso dos anos o CDEW realizou com sucesso diversos projetos e programas: a formação e o crescimento de cerca de 700 Centros de AutoAjuda que formam uma federação; programas de geração de Renda, construção de casas, escolas, programas de promoção da alfabetização para crianças pobres em três Estados alcançando cerca de 3000 crianças, programas de prevenção e informação sobre o HIV/AIDS. A construção de mais de 500 poços para a coleta da água da chuva para os mais pobres em Kanakakkunnu e Kattappana, programas para crianças excluídas da escola. Dez mil pessoas curadas do alcoolismo com os grupos dos Alcoólatras Anônimos. O trabalho do CDEW de Bangalore é relatado no vídeo da Missão Dom Bosco “Unidos por uma sociedade melhor”.
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dma comunicar:
informações, notícias e novidades do mundo da mídia
FAZ-SE PARA DIZER
Conectar Maria Antonia Chinello
Na comunicação, assim como na nova evangelização, é determinante deixar o canal aberto para que se estabeleça a escuta recíproca, pressuposto do diálogo. O dicionário da língua italiana explica que a palavra “conectar” significa: «Unir duas ou mais coisas; ligar as ideias, colocá-las em uma sucessão lógica; colocar em contato uma coisa com a outra; pôr em relação uma coisa com a outra; conversar; unir-se um ao outro; estabelecer ligação com alguém». As definições procedem do ato de colocar em sucessão ou em relação objetos, ideias para a união entre as pessoas. No horizonte contemporâneo, empresas privadas, organizações, entidades públicas privilegiam sempre mais a abordagem sistêmica no estudo, na programação e no desenvolvimento de soluções para o marketing, a gestão, a formação. Em um contexto marcado pela incerteza e pela complexidade, para adquirir visão do todo é necessário unir-se, e exprimir uma visão dinâmica das relações, focalizar a interdisciplinaridade, o trabalho de equipe a partilha dos conhecimentos, para superar os limites de um
saber setorial, de uma visão parcial e estática da realidade, dos problemas, das ideias e do confronto. Conectar diz ação comunicativa no tempo da Rede: ligações com ou sem fios que unem dois ou mais extremos tanto em nível técnico, como no nível pessoal das ideias, convicções, emoções, ações. As relações estão no centro do sistema e da troca de conteúdos, sempre mais ligados a quem os produz ou os relata. Ocorre entender que conceitos como: pessoa, autor, relação, coerência, responsabilidade, amizade, intimidade, outro, próximo... evoluem precisamente com o advento da rede. A conexão significa disponibilidade para entrar em contato, para manter o canal aberto, para estar presente com anéis, SMA, post e tweet: um-a-um-sempre-disponível”, “todos-sempre-alcançáveis”. Se a conexão não engata na realidade, o reverso da medalha é o fechamento, porquanto: «Se a Rede, chamada a conectar, na realidade acaba por isolar, então atraiçoa a si mesma, o seu significado. O nó problemático consiste no fato de que conexão e compartilhamento de rede não se identificam com “encontro”, que é uma experiência muito empenhativa em nível de relação». 23
A conexão é chamada a ser espaço de comunhão, abrindo caminho para novos encontros, assegurando sempre a qualidade do contato humano.
Conexão lugar de comunhão A existência do homem é “dita” não para o isolamento e a autossuficiência, mas unicamente para a vida de relação com o seu Criador, o que constitui o seu ser mais profundo. Deus mesmo não é solidão, mas relação porque é “amor” (1 Jo 4, 8). Relação, amor, significam vida: Deus criou o homem para torná-lo participante de sua própria vida. A conexão exprime a Rede como o contexto no qual a fé é chamada a expressar-se, não por uma simples vontade de “estar lá”, mas por uma conaturalidade do cristianismo com a vida dos homens, assim como Jesus, o Verbo que «cumpriu a sua missão descendo, baixando em cada uma das nossas obscuridades, com humildade e com um profundo amor pelos homens, por todos nós pecadores. Então, a Igreja também não poderá seguir outro caminho senão o da kènosis para revelar ao mundo o Servo do Senhor» (Comunicar o Evangelho em um em mudança, 63). A Igreja é casa e escola de comunhão, morada hospitaleira que cria espaço, levando “os pesos uns dos outros”, abrindo-se ao diálogo e não fechando o contato, porque «Aquilo que nós ouvimos... nós o anunciamos também a vós, para que também vós estejais em união conosco... Estas coisas nós vos escrevemos, para que a nossa alegria [a nossa e a de todos vós] seja perfeita» (1 Jo 1, 1-4) É graças à escuta, à experiência e à contemplação do Verbo, que nossa vida e nós mesmos somos transformados para nos tornar capazes de comunicar tudo quanto recebemos.
WhatApp Messenger É uma aplicação de mensagens instantâneas móveis multi-plataforma que permite trocar mensagens com os próprios contatos sem precisar pagar os SMS. WhatApp Messenger está disponível por iPhone, BlackBerry, Android, Windows Phone e Nokia. Podem-se trocar mensagens, compartilhar fotos, vídeos, registros de áudios e levantamentos da própria posição geográfica com qualquer pessoa que tenha um smartphone conectado à Rede. Porque se serve da mesma taxa Internet usada para os e-mails e a navegação web, não há custos adicionais para mandar mensagens e permanecer em contato com os próprios amigos. A aplicação é atualizada periodicamente nas várias plataformas, melhorando as ofertas e as oportunidades. Também esta aplicação, que se propaga entre os jovens (e não jovens), exige responsabilidade no uso e na produção dos conteúdos. Não faltam casos noticiosos onde moças e rapazes difundem, às vezes inconscientemente, autorretratos, vídeos, mensagens comprometedoras para si e para os outros. Quanto se deseja que seja reservado, termina, em vez, por viajar na Rede, sem parar. Não é difícil imaginar as consequências. mac@cgfma.org
MULHERES NO CONTEXTO
O reflexo da ternura na economia Bernadette Sangma
Escutar os pensamentos e as propostas alternativas de algumas mulheres no setor da economia mundial em um momento de forte crise nos faz antegozar a capacidade de resgate da lógica feminina. Elas
oferecem orientações inéditas para transitar de uma economia organizada em torno dos interesses individualistas, competitivos e centrados no lucro, para aquela economia de cuidados expressa em termos de 24
ternura e de atenção, sob medida, para as pessoas e não para o mercado do lucro. É a economia do cuidado, de Rianne Eisler.
A partir da janela das mulheres Observando a atual crise econômica financeira do mundo de hoje, muitas mulheres estudiosas e ativistas fazem a sua análise da situação e concordam que na raiz de tudo está um sistema individualista centrado em prioridades enganosas, em poderes opressivos e anômalos. Tal sistema ignorou as necessidades humanas fundamentais causando a marginalização de uma vasta categoria de pessoas e gerando o aumento da pobreza, a degradação ambiental, a violação dos direitos humanos e a desigualdade. Outras consequências são as seguintes: a escalada da guerra, do terrorismo e do conflito violento que vemos pelo mundo todo. Já estamos habituados à contagem das vítimas. Infelizmente, por detrás daqueles números, há pessoas inocentes com nomes e sobrenomes cuja vida foi violada de modo irreversível. Cito dois exemplos. Na Síria, uma mulher fugiu com seu filho rumo à fronteira do Líbano. Está no nono mês de gravidez. Certo dia seu marido morrera atingido por uma bala, enquanto voltava para casa. Agora a mulher está sozinha com o seu segundo filho nascido faz pouco tempo, felizmente são e salvo porque foi assistido por um grupo humanitário. Durante o ataque terrorista do Westgate em Nairobi, no Quênia, dois jovens noivos estavam fazendo suas últimas compras para o casamento previsto exatamente para duas semanas depois. Enquanto estavam comprando o que precisavam, foram surpreendidos pelos terroristas. Os dois foram mortos. O jovem é filho único de uma mãe, que o havia criado sozinha. Dois episódios que falam de dor cruciante, consequência de sistemas que esqueceram o humano e o substituíram pelo ódio, a injustiça, a vingança e a violência.
As Crianças: ponto de partida da economia A economia do cuidado, de Riane Eisler é tão original quanto humana, tocante e projetada ao futuro. A autora propõe pensar em uma nova economia focalizando a atenção não sobre os estoques, o vínculo, os derivados ou sobre outros instrumentos financeiros, mas sobre as crianças. As políticas e as práticas econômicas devem ter como ponto de partida o bem-estar das crianças e a sua validade deveria ser medida pelos seguintes indicadores: a saúde das crianças, o seu acesso à educação, a qualidade de vida. Continuando o discurso Riane sustenta que é preciso perguntar-se qual é o tipo
de sistema econômico que ajuda ou bloqueia as crianças na realização de sua grande potencialidade, no processo de conscientização, na empatia, no cuidado e na criatividade, ou seja, na capacidade de se tornarem plenamente humanas.
Rumo a uma economia feita com carinho Riane Eisler ensaia alguns passos necessários para caminhar rumo a uma economia sustentável em harmonia com a natureza. O modelo que propõe fundamenta-se no princípio da parceria evidenciando que ela orienta para a construção de relações de respeito recíproco e de accountability. O primeiro passo que Riane sugere é aproveitar o atual momento de perda e regressão como oportunidade para reformular a economia.
Riane sugere pensar fora das linhas, fora das categorias sociais e econômicas como o capitalismo, o socialismo e os outros “ismos”. De fato diz, citando Einstein, que não podemos resolver os problemas com a mesma lógica do sistema que os criou. O passo importante será colocar os fundamentos para uma economia do cuidado. Esta se apoia na convicção de que a verdadeira riqueza das Nações não se baseia nas finanças. A verdadeira riqueza das Nações é constituída pelo povo e pela natureza! Passa depois a sugerir o que poderia ser designado como o coração do modelo que propõe, isto é, o desenvolvimento de novas medidas econômicas que deem visibilidade e valor real ao trabalho de cuidar das pessoas e da natureza. Citando os Estados Unidos, Riane diz que lá paga-se por um hidráulico 50 a 100 dólares por hora, enquanto as babás recebem em média 10 dólares por hora. Diz Riane com muita 25
ênfase que tal diferença não é lógica, mas patológica porque quando as necessidades humanas fundamentais são negligenciadas, cresce o desespero e a destruição ecológica com as derivadas tensões sociais e os conflitos. Um dos passos importantes para esta economia do cuidado é o aumento da capacidade de rendimento das mulheres. Citando o estudo intitulado “Mulheres, homens e a qualidade global de vida”, onde são levadas em consideração as medidas estatísticas de 89 Nações para ressaltar o status das mulheres com relação ao índice da qualidade de vida, Riane afirma
que o estudo evidenciou que o status da mulher constitui o seu melhor índice. Riane Eisler é uma mulher de grande atualidade. Ler as suas publicações é respirar o frescor de um modo de pensar fora das linhas. Os seus livros “Crianças de amanhã. O plano para uma parceria na educação no vigésimo primeiro século” e “A verdadeira riqueza das nações” poderiam oferecer muitas sugestões às comunidades educativas na realização de uma educação e de uma economia de transformação radical. sangmabs@gmail.com
VÍDEO
A PRIMEIRA NEVE de Andrea Segre – Itália - 2013
Mariolina Parentaler
De regresso do grande sucesso da crítica e pelos prêmios obtidos com o magnífico ‘Eu sou Li’, o diretor Andrea Segre (sólido passado como documentarista) tenta novamente com o cinema de ficção: “A primeira neve”, filme esplêndido. Apresentado no festival de Veneza de 2013 na seção Horizontes, estreia nas salas italianas, ligado ao projeto ‘A primeira escola’. Ainda uma vez Segre relata um presente onde o enxerto entre a cultura italiana e a dos imigrantes no nosso país é passagem necessária para a redescoberta da própria identidade e a passagem para um futuro novo. Tendo abandonado o Vêneto, sobe para as montanhas de um Trentino extraordinariamente fotografado por Luca Bigazzi e, no esplêndido, não contaminado vale dos Mocheni, descreve o encontro entre Dani imigrante do Togo e uma família do local na qual Michele, de 11 anos, é órfão de pai. É o bosque o lugar central do seu encontro, onde os dois se procuram, se rejeitam, se conhecem. Um espaço no qual a natureza se torna ‘teatro’ e Segre continua eficazmente a sua busca pessoal do relacionamento entre seres humanos e lugares que hospedam os eventos. Um espaço, entre luzes e sombras, onde é possível encontrar uma solidão que se transforma em encontro, caminho comum.
Um perfil de vida da nossa sociedade Pais, mães, filhos: é disso que fala “A primeira neve”. Fala de uma pesada herança no próprio passado, de uma ‘passagem alpina’ – áspera e simbólica ao mesmo tempo – que conduz ao futuro. Fala de lutos e vazios consequentes a serem preenchidos, de diferenças a serem niveladas, de casas a serem encontradas e construídas. O filme fala do hoje, e não há nenhum escândalo no fato de que o hoje seja constituído pela sobreposição inevitável e necessária dos aspectos mais tradicionais da cultura italiana, como os ligados a uma família que vive em um perdido Vale do Trentino, e os mais instáveis de um migrante dos nossos dias: um imigrado que mal sobreviveu ao trauma das barcaças que – apesar de tudo – ainda não sabe qual será a sua nova ‘casa’, o habitat existencial no qual realizar-se. «Documentário e ficção são somente dois modos de relatar alguma coisa no cinema – explica o diretor. Às vezes a linha fronteiriça é muito sutil. Neste filme, por exemplo, eu fui ao lugar no qual a história se passa, para conhecer as pessoas e
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entender como vivem o seu cotidiano. E muitas vezes eu percebi que a ficção começava no momento em que a narrativa deste filme terminava. O filme é construído exatamente pelo diálogo entre a direção do documentário e a ficção, entre a relação direta com a realidade e a escolha de momentos mais íntimos construídos com atenção aos detalhes da encenação. Assim acontece também no trabalho com os atores: pessoas do lugar e profissionais interagem, com o privilégio de trabalharem neste caso com a energia e a imprevisibilidade de crianças e jovens». É assim que Segre reúne os dois protagonistas: no Vale dos Mocheni que a câmera capta, exaltando a genuína beleza natural do lugar. Dani deixou o Togo, mas na aterrissagem perdeu a mulher parturiente. A grande tristeza impede-lhe ainda de se fazer pai daquela criança recém-nascida e sonha com outra meta: Paris. Michele, em vez disso, é um adolescente do lugar ferido afetivamente pela morte prematura do pai. Vive com o avô carpinteiro-apicultor e a mãe viúva. Eles dois são as peças principais de um quebra-cabeça de personagens que, previsivelmente, sem choques, com o passo regular e cadenciado do montanhês, encontrará composição e harmonia, revelando a figura de uma casa que é a casa do coração e dos afetos.
Duas peças que se encaixam, mas Segre nunca força este encaixe previsível. Deixa que todas as peças que espalha sobre a mesa na abertura do filme se estudem mutuamente enquanto os espectadores as observam, filtrados por uma regência participativa, mas não invasiva. Deixa que se aproximem progressivamente em nome das polaridades opostas e complementares que se atraem e que caracterizam todo o filme. Se Dani aprende novamente a ser pai, a ser homem, graças a um garoto que por sua vez reaprende a ser filho, é porque aprenderam a se escutarem um ao outro. Cresce-se apenas escutandose, encontrando-se. Olhando o diferente em nome de um senso comunitário que vai se alargando e se redefinindo para que todos possam sentir-se em casa. Dani chegou a uma Itália da qual não conhece as tradições e não aceita as ofensas de um racismo servil. Traz dentro de si a marginalização assim como o pequeno Michele, pela dor que vivem e que parece impossível elaborar. Ambos têm necessidade de que aquela primeira neve lhes ofereça uma nova visão do mundo, exterior e interior. m.perentaler@fmaitalia.it
PARA FAZER PENSAR
SOBRE O TEMA DO FILME Relatar o relacionamento com o pai, com os genitores, com os filhos e a dor de perdê-los. Tanto para quem nasceu na Itália – Vale dos Mocheni, uma entre as mais isoladas do Trentino – como para quem pode chegar quem sabe de onde. Trata-se de uma situação dramática, duas crises muito profundas, que encontram, porém uma reviravolta exatamente no momento em que os dois protagonistas se encontram nos seus modos de ser diferentes, mas complementares. «É um caso que quase chegou ao limite – evidencia Segre, em Notas de direção – mas por outro lado é aquilo que fazem a literatura, a narrativa e também o cinema: procurar em histórias particulares, às vezes, minoritárias-mínimas, tendências e dinâmicas profundas, universais, nas relações humanas. E foi o que também eu tentei fazer no pequeno vale do Trentino. “A primeira neve” relata a superação de uma dor insuperável por meio da partilha, do diálogo, do afeto, da escuta. Talvez a palavra “partilha” tenha sido a
chave. Caracteriza também o nosso modo de fazer cinema com um grupo de trabalho em que todos conhecem a fundo a história, falam dela e discutem sobre ela. Clareza, escuta e precisamente a partilha tornaramse as características principais da abordagem produtiva, do caminho que percorremos e que queremos indicar». SOBRE O SONHO DO FILME Trazer para a tela temas reais e sociais. Inovar, promover o sistema do cinema e mais em geral o sistema da produção cultural, que hoje estão ‘em luta’. «O cinema é um elemento fundamental para a educação de um país. Mas o cinema é uma coisa e o espetáculo comercial é outra – assinala Segre ao apresentar “A primeira neve”. Os filmes do mainstream comercial, aqueles que não vão aos festivais e não buscam qualquer tipo de relação com a qualidade, focalizam exclusivamente o espetáculo. Repetem também, na sua produção e no seu roteiro, figuras estereotipadas, gostos homologados, modos abusivos 27
de construir uma narrativa, de modo que o espectador os possa consumir rapidamente. Cito sempre o exemplo de um garoto de 14 anos que em uma projeção de “Eu estou, ali” em Udine, levantou-se no final da projeção do filme e diante de 300 companheiros de escola quis agradecer-me. Dizia não saber da existência deste tipo de cinema: desde quando tinha 9 anos era trazido à multissala do centro comercial para ver aquilo que era proposto devendo
acostumar-se com aquele gosto. Àquele garoto e aos companheiros que o aplaudiram devemos garantir a possibilidade de conhecer outro tipo de produção narrativa, cultural, ética e estética neste país. “A primeira neve” nasce ‘com e para’ os talentosos meninos protagonistas no Vale dos Mocheni e, como para eles, assim também para todos no mundo».
O LIVRO
Alejandro Palomas A alma do mundo Adriana Nepi
Romance singularíssimo, fruto de uma fantasia que poderíamos considerar ousada, onde as situações, mesmo na sua objetiva inverossimilhança, apresentam uma plausível lógica interna. Dois cônjuges anciãos, Otto e Clea, ricos e solitários (um filho morreu há tempos, uma filha está longe, separada da vida dos pais idosos) se percebem desanimados pelo vazio no qual transcorrem os seus dias e juntos decidem dar uma outra direção à monótona uniformidade de uma vida que se tornou sem sentido. Sabem que existe uma vila elegante, situada em posição agradável, chamada Buenavista, que não quer ser uma casa de repouso para idosos: a patroa a organizou de modo a torná-la uma agradável Casa família. A cada hóspede é dado uma espécie de zelador que se oferece como uma verdadeira dama de companhia, e que para este não fácil dever, deve possuir qualidade e competência. Os dois velhos cônjuges não se propõem uma verdadeira separação, mas experimentar, partindo por assim dizer do zero, tecer uma nova amizade, dando um sentido àquele seu viver juntos. São muito diferentes: Otto está bem envelhecido, com oitenta e seis anos é ainda vivaz e desembaraçado e goza a vida momento por momento com sorridente otimismo. Clea, caráter forte e exuberante, sofre em segredo, regendo com ostentada arrogância, o drama todo feminino da velhice: junto com a perda da atração
física, percebe com impaciência as inexoráveis limitações da idade avançada. Foi ela que escolheu a pequena aventura que estão apenas começando e que deverá durar apenas poucos meses. No passado, quando ainda era jovem, renunciou a uma carreira promissora de valente violoncelista para ficar ao lado do marido, famoso regente de orquestra, e segui-lo nas frequentes transferências: uma escolha feita por amor, mas que deixou nela um forte arrependimento. Os dois viverão em apartamentos separados e suas relações se limitarão às da boa vizinhança, com encontros casuais e esporádicos. Designaram para os dois temporariamente a mesma assistente, não havendo no momento entre o pessoal disponível, outra pessoa capacitada. De manhã estará à disposição da senhora Clea Ross, à tarde oferecerá sua companhia ao senhor Otto Stephens. Exceto a diretora da casa, ninguém saberá que os dois hóspedes são marido e mulher.
Encontro com Ilona A esta altura entra também em cena outro personagem, Ilona, que terá um peso determinante sobre o êxito da singular experiência empreendida pelos cônjuges anciãos; a jovem mulher traz nos ombros um passado de sofrimento: primeiro, os anos do regime comunista, que a marcaram fortemente, 28
tanto no físico como no caráter que se tornou esquivo e desconfiado, depois a fuga da terra de origem, o duro esforço de inserção num país diferente na língua e na cultura, uma história de amor, lá na Espanha, com um violoncelista de nome Miguel, que terminou em nada pelo improviso chamado à Hungria para cuidar da mãe gravemente enferma, a desilusão do abandono súbito ao retornar para a Espanha, enfim o desembarque em Buenavista com o seu diploma de enfermeira, a solidão e a perspectiva de um futuro incerto e angustiante. Toda quinta-feira, que é o seu dia de tempo livre, viaja sem dar explicações. Suscita alguma curiosidade aquele seu pontual e misterioso desaparecimento: para onde vai? Sabem que ela é uma fugitiva húngara, que não tem na Espanha nem parentes nem uma família própria... Na realidade a pobrezinha persegue a ilusória esperança de trazer de volta Miguel, o violoncelista que deveria ter-se casado com ela: do qual espera um filho! Um dia, porém deve render-se à evidência: no seu laboratório Miguel não está mais só, percebe-o de longe, ternamente perto de uma jovem mulher... Uma vida, a de Ilona, que parece um cruel sucederse de frustrações, que, porém não lhe endureceu a alma. Ao lado dos dois originais assistidos, Ilona é uma presença muito discreta, mas longe de ser ausente. A sensibilidade e a intuição, combinadas com uma longa experiência de dor, torná-la-ão finalmente mediadora da renovada amizade entre os dois senhores idosos.
Ela aprendeu durante a convivência com o violoncelista, a construir os delicados instrumentos de corda. Otto se servirá dela para reaproximar-se da mulher, colaborando na construção de um violoncelo, com o qual procura reparar o que para ela parece ter sido um erro: impedir-lhe a vocação musical. Sem este vistoso estratagema, para desatar o nó da história bastava talvez a necessidade de dedicação materna suscitado na velha senhora pela presença de Ilona, que se tornou querida como uma filha, enquanto também Otto experimenta para com ela uma ardorosa simpatia, junto com a esperança de se tornar avô. Na realidade o cansaço de viver que oprimia a velha senhora, a incapacidade do cônjuge, que tanto a ama, para preencher aquela sensação de vazio revelam-se por aquilo que são: necessitados de ter alguém para proteger e amar, que restitua sentido e calor à vida. Passados os três meses que haviam sido prograrmados para a extravagante experiência, chega para o senhor Stephens e a senhora Clea Ross o momento de partir. A diretora de Buenavista comunicao a Ilona, sem nenhuma consideração, preocupada apenas em não perder um bom elemento do seu pessoal. Parece um último e duro golpe para a jovem mulher que se sentia já ligada a eles quase por um vínculo de família, mas eis: no cenário de relâmpagos, trovões e chuva de pedras de um temporal cenográfico, finalmente conclui-se a o evento com um final feliz. Finalmente, sob um céu sereno, partem juntos os velhos senhores e em breve Ilona os alcançará, como uma filha reencontrada, na grande e elegante casa.
MÚSICA E TEATRO
Atividades teatrais na formação artística Sara Cecilia Sierra, Wolf Rüdiger Wilms
Com os artigos desta rubrica dedicados ao teatro, este ano queremos incentivar a olhar para o vasto campo das
atividades teatrais e a aceitá-las com a sua significativa função pedagógica e artística. 29
Apostamos no teatro? Se nós concebemos a pessoa como um ser em evolução, marcada pela cultura, então vale a seguinte definição: por cultura entende-se como a pessoa joga, aprende e trabalha, a ponto destas três formas de crescimento serem consideradas como atividades fundamentais. Na sociedade moderna tais formas de atividade eram concebidas como fases da vida sistematicamente consecutivas. Na sociedade pós-moderna pode-se falar, na maioria dos casos, de atividades dominantes que acompanham a biografia de uma pessoa nas suas várias etapas. Por esta razão acreditamos possível o cruzamento destas atividades em cada fase da vida. Na tradição de Dom Bosco o teatro é projetado em primeiro lugar como jogo: apostamos no teatro (como apostamos no futebol ou no xadrez). Quem atuou no teatro ou o dirigiu algumas vezes, provavelmente fez a experiência de como a realização de uma produção teatral de boa qualidade supõe um trabalho dispendioso, com o qual as atrizes, os atores e os diretores em geral também aprendem muito. Assim, fazer teatro pertence àquelas formas de atividade nas quais, jogar, estudar e trabalhar compõem uma unidade, com o predomínio intocável do jogo.
A mais humana de todas as artes Há, todavia outro problema fundamental a ser resolvido: quando a atuação teatral de uma contexto pedagógico se converte em arte? Neste caso é válida a seguinte disposição: uma atividade humana alcança a qualidade de uma atividade artística quando a exercemos de um modo estético, é como dizer: se construímos ou modelamos algo de cênico. A legitimação do teatro pedagógico baseia-se no seu valor formativo o que, por sua vez, está ligado à qualidade estética da atualização. Isto oferece ao sujeito que desempenha o seu papel, um acordo consigo mesmo por meio da arte. Neste sentido “atuar no teatro” é uma forma de autoformação. Na sociedade pós-moderna vivemos uma tendência à estetização total da realidade. O pensamento e a ação pedagógica, inclusive, sucumbem sob esta pressão. Os pedagogos apresentam as suas estratégias didáticas para a estética, colocando-as em cena ou apresentando-as de modo performativo. Outros transformam a classe em laboratório de estudo e criam com isto um cenário. Dado que o teatro – ao menos segundo Bertolt Brecht – é a mais humana de todas as artes, não é estranho que seja contemplado como remédio universal que deve dar nova vida à escola ao lado das outras formas de
ensino, academicamente pomposos, mas muitas vezes com conteúdos distantes da realidade.
A magia do momento estético Outro problema de fundo é esclarecer a questão da relação entre teatro pedagógico e teatro profissional. No início da expansão do teatro feito por principiantes, do teatro amador e do teatro pedagógico, a comparação dos principiantes e dos amadores com os profissionais provocava juízos que colocavam em nível inferior aqueles que não eram profissionais aos olhos dos espectadores. No passado existiram e ainda existem diretores de teatro pedagógico que se esforçam, com provas e muito trabalho, para diminuir a diferença de qualidade nos grupos amadores, os quais, todavia se saem bem, em casos excepcionais. Por outro lado os profissionais olham para o teatro amador e para o teatro pedagógico como uma ameaça à sua pretensão de monopólio artístico. Mas, a pedagogia do teatro desligou-se, em grande parte, da simples imitação do teatro profissional e, ao menos em parte, desenvolveu uma estética própria qualitativamente distinguível daquela, motivo pelo qual formou o seu próprio público que se sente igualmente atraído. Antes de um ator profissional entrar no palco no exercício de sua profissão, adquire um poder artesanal muito grande. No teatro pedagógico necessariamente ensinam-se às crianças e aos jovens as atitudes teatrais fundamentais. Uma particularidade estética da atividade teatral no trabalho com jovens, talvez já a partir dos préadolescentes, é a possibilidade de uma perda parcial da consciência da realidade. Conhecemos este fenômeno chamado “flow” no qual os jovens atores podem gerar a magia do momento estético. Perdem-se nesta situação, estão “totalmente em si” e se deixam cair em uma sensibilidade e profundidade global, na qual se sentem ligados ao mundo todo e ao cosmo. Diretores de teatro especializados podem criar estes efeitos nas pegadas de uma elevada cultura de ensaios, porém os jovens, em geral, são muito abertos para estes momentos, que podem reativar-se completamente nas apresentações públicas. Abrir-se e mostrar indefesas as próprias fragilidades emocionais contribui essencialmente para a criação de um espaço comum entre atores e espectadores, marcados por uma emoção intensa. Esta prova de credibilidade no seu desempenho é outra coisa na qual não há que temer a comparação com os profissionais, apesar de, com isto, naturalmente, não se livrarem da obrigação de seguir um cuidadoso modelo teatral.
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CAMILLA
Almas de oração
Caras amigas, também desta vez – ajudada pelo bom Deus – fomos capazes de colocar o pé no ano novo, que traz consigo, como sempre, muito desejo de renovação. Pois bem, até mesmo nas idosas como eu, a paixão por algo de inédito impele o coração e as pernas trêmulas a novas metas! A reflexão que lhes proponho parte da ideia de que cada meta para a qual tendemos pressupõe um ponto de partida que não pode ser senão o coração de cada um dos nossos entusiasmos. Nestes dias de festa dediquei-me a uma observação cuidadosa da oração na minha comunidade e preciso confiar a vocês, que me entendem, algumas considerações. Deixem que eu gaste uma palavra para o primeiro encontro da manhã que, agora, parece o encontro das quatro ou cinco insones da comunidade: sabe-se que à noite muitas ficam até tarde empenhadas em uma pastoral cada vez mais noturna e virtual, mas muitas Irmãs da minha geração ficavam até tarde remendando roupa, estudando, ajustando e programando e, no dia seguinte, logo cedo, lá estavam diante de Jesus, como se nada fosse! Não julgo: provavelmente hoje organiza-se melhor e, para meditar com toda calma, consegue-se retalhar o tempo necessário à margem de jornadas frenéticas de trabalho.
Gostaria de gastar a segunda palavra falando do modo com o qual ocupamos o espaço para a oração; compreendo muito bem que agora muitas das nossas capelas são grandes para um número exíguo de pessoas que devem ocupá-las, mas diante do Crucifixo conseguimos dispor-nos tão cuidadosamente distantes umas das outras a ponto de despertar, em quem observa, uma legítima interrogação sobre a autenticidade daquele “atrairei todos a mim” declarado pelo Senhor. Gasto a última palavra para as vozes que elevamos a Deus quando rezamos juntas; deveriam ser uníssonas, mas muitas vezes destaca-se entre elas a de uma Irmã mais zelosa que talvez pense que Deus tenha dificuldade para ouvir; deveriam estar concordes, mas frequentemente há um coração (e então também uma voz) que consegue iniciar sempre meio segundo antes das outras com a finalidade – eu acredito – de mostrar a Deus (quando não às Irmãs) que ela existe. Em suma, talvez a novidade da vida tenha início com uma oração bem cuidada em cada detalhe, para que o Pai Eterno não se sinta mal quando custamos para abrir os lábios diante d´Ele e reencontramos improvisamente toda a nossa loquacidade, quando saímos da igreja. Palavras de C.
No próximo número DOSSIÊ: FIO DE ARIADNE:
Palavras e gestos: respeito e misericórdia Diante do outro
UM OLHAR SOBRE O MUNDO:
Nunca Vidomegon
PASTORALMENTE:
Medo dos jovens?
FAZ-SE PARA DIZER
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CORAGEM, SOU EU, Nテグ TENHAIS MEDO... MARCOS 6,50
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