Edição 72 Agosto

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Ano IV - Nº 72 - Agosto de 2018

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Conectados em Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes LGBTI

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VISIBILIDADE LÉSBICA Há vinte e dois anos atrás em 29 de agosto de 1996, ocorreu o 1º Seminário Nacional de Lésbicas (SENALE) com o tema “Visibilidade, Saúde e Organização” para falar sobre sexualidade, prevenção de ISTs e HIV/AIDS, trabalho e questões relacionadas à cidadania de lésbicas, criou-se então um marco fundamental para a luta de mulheres lésbicas e bissexuais que têm seus direitos violados por sua orientação sexual no Brasil e assim, o dia 29 de Agosto passou a ser o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. Passados vinte e dois anos, ainda é necessário visibilizar as histórias, vivências, existências e resistências lésbicas nas suas mais complexas nuances inclusive aquelas entre crianças e adolescentes. Ainda hoje a invisibilidade lésbica atua como uma força discriminatória cruel e potente, pois é através da negação da possibilidade de existência que direitos são cerceados e violências são perpetradas, aquilo que não é reconhecido não tem direitos

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Por Mariana Merequi Rodrigues

assegurados. É necessário visibilizar essas questões pois de acordo com a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos o índice de violência contra crianças e adolescentes teve um aumento de 10% em relação aos dados registrados em 2016, liderando o índice de denúncias analisadas pelo órgão. Em 2017, foram feitas 84.049 denúncias de violações contra crianças e adolescentes e muitas denúncias envolvem mais de um tipo de violação, a violência sexual ficou em 3º lugar com 20.330 casos. Foram

contabilizadas 130.224 crianças e adolescentes vítimas de violações em 2017 e 166.356 casos de violações, porém não é possível dizer ao certo quais dessas violações foram motivadas por conta da orientação sexual dessas crianças e adolescentes.

EXPEDIENTE COORDENAÇÃO Lídia Rodrigues SECRETÁRIA EXECUTIVA Cecília Góis ASSESSORES DE CONTEÚDO Paula Tárcia

Rodrigo Corrêa Rosana França DIAGRAMAÇÃO Tatiana Araújo

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Em Março de 2018 foi lançado o Dossiê do Lesbocídio, um trabalho pioneiro que buscou articular diversos marcadores de violência com crimes de ódio cometidos exclusivamente contra meninas e mulheres lésbicas. O trabalho coletou denúncias ocorridas entre os anos de 2014 a 2017 e analisou os dados de crimes de ódio que resultaram em mortes, tanto de assassinatos quanto de suicídios. É Importante apontar que as violências letais ocorridas em 2017, 53% foram cometidos contra lésbicas com até 24 anos, sendo que 23% das mortes eram de lésbicas de até 19 anos sendo que 29% das mortes aconteceram dentro das residências das vítimas e do total analisado 57% dos casos de 2017, as lésbicas assassinadas e “suicidadas” eram negras. Com exceção do Dossiê do Lesbocídio, os índices sobre violência contra a população LGBT, os cruzamentos feitos com dados de idade e orientação sexual possuem menos análises e isso com certeza não quer dizer que as violências não estejam ocorrendo, elas acontecem e muitas vezes são letais. Isso quer dizer que os estupros corretivos (aquelas violações que acontecem com o intuito de “corrigir” o desejo ou a orientação sexual daquela pessoa) ocorridos até mesmo no âmbito familiar e/ou de um círculo próximo de convivência não estão sendo contabilizados estatisticamente como violência, isso quer dizer que não reconhecemos a adolescente que é privada de liberdade dentro de casa pelos pais ou cuidadores por sua orientação sexual, isso quer dizer que estão sendo invisibilizadas essas violências que são muitas vezes

violência doméstica também. É importante ressaltar também os efeitos das violências cotidianas, físicas e psicológicas, na saúde mental de lésbicas que diariamente enfrentam o racismo, a misoginia, o sexismo atrelados a lesbofobia nas mais diversas esferas de suas vidas, seja na escola, no ambiente doméstico, ou nos seus espaços de sociabilidade. Muitas das vezes o fato de não poder contar com o apoio familiar influência na decisão de fazer uma denúncia e receber os cuidados necessários para o enfrentamento dessas violências. O Brasil é reconhecido internacionalmente por suas políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres e de proteção aos direitos humanos; isso significa compreender a promoção de políticas públicas como práticas sociais coletivas e definidas principalmente pela existência de recursos públicos e por mecanismos de intervenção do Estado. Desta forma quando analisamos a insuficiência de dados de violência (principalmente oficiais) contra crianças e adolescentes em razão de sua orientação sexual a luta pela visibilidade torna-se urgente e

fundamental para reconhecer e prevenir esse tipo específico de violência. Ainda é necessário pautar a visibilidade para crianças e adolescentes lésbicas para que possamos avançar na conquista de direitos, para que haja um arcabouço jurídico-legal de proteção mais amplo e que sejam elaboradas e normatizadas ações institucionais, projetos ou programas que garantam uma sociedade mais justa, saudável e sem violência para que as nossas crianças e adolescentes possam se desenvolver e se expressar livremente. Visibilizar é Resistir, e nós RESISTIMOS! Referencia : Dossie Lesbocidio http://dossies.agenciapatriciagalvao. org.br/dados-efontes/pesquisa/dossie-sobrelesbocidio-no-brasil-2014-2017peres-milena-cristina-carneiro-et-al/ http://agenciabrasil.ebc.com.br/direi tos-humanos/noticia/201804/disque-100-registra-142-mildenuncias-de-violacoes-em-2017

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MURALIDADE

FIQUE

por dentro Origem do Dia Nacional da Visibilidade Lésbica No Brasil a Visibilidade Lésbica é comemorada dia 29 de agosto. A criação desta data tem como principal objetivo visibilizar a luta das mulheres e combater a lesbofobia, ou seja, o preconceito contra mulheres lésbicas. O machismo e outras formas de preconceito são os principais alvos a serem combatidos pelos movimentos que lutam pelos direitos LGBT’s. No entanto, sem deixar de lado a importância da luta por uma igualdade entre os diferentes gêneros sexuais, o Dia da Visibilidade Lésbica dá destaque a luta histórica por direitos negados ao longo da história ao papel da mulher que, além de enfrentar o preconceito por ser lésbica, ainda carrega uma discriminação histórica por ser mulher (misoginia). Esta data foi criada em 1996, durante a realização do 1º Seminário Nacional de Lésbicas (SENALE), organizado pelo Coletivo de Lésbicas do Rio de Janeiro (COLERJ). A partir de então, o dia 29 de agosto passou a representar um marco na luta das lésbicas pela visibilidade de seus direitos e posicionamento na sociedade como mulher lésbica, enfrentando não apenas a

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dICIONÁRIO DE DIREITOS HUMANOS Lesbofobia: Discriminação contra lésbicas, respectivamente, em razão de sua orientação sexual diversa do que é imposto pela sociedade por sentirem atração sexual e afetiva por pessoas do mesmo sexo. Misoginia: Repulsa, aversão, desprezo ou ódio contra as mulheres. Esta forma de aversão mórbida e patológica ao sexo feminino está diretamente relacionada com a violência que é praticada contra a mulher.

notÍcias

da rede

10° Edição do SENALESBI A 10ª Edição do SENALESBI, aconteceu na Bahia de 09 a 12 de Agosto de 2018, o foco dos debates foram de formação e diálogos para construção de propostas de intervenção com base nas organizações comunitárias, políticas e sociais norteadas pelos eixos centrais propostos: Racismo, Capitalismo, Sexismo, Heteronormatividade Compulsória. A ideia foi que esses quatro eixos temáticos que orientaram o SENALESBI fossem agrupagados para serem trabalhados de maneira conjunta. Os temas de debates sugeridos foram: Lésbicas, bissexuais negras e periféricas; Feminismos, organização política, lesbianidades, bissexualidades e transexualidades; mulheridades e convergências políticas; Racialidades e relações raciais, lesbianidades, bissexualidade e transsexualidade; Opressões e violações: Impactos na saúde das lésbicas, bissexuais e transexuais; Coletividades, sustentabilidade e auto-organização; Conjuntura política; Novas estratégias e ativismo nas redes sociais; Movimentos LBT’s e suas agendas inegociáveis no Brasil. Todos os dias do SENALESBI foram dias de muita formação e fortalecimentos para luta!!!

Olá pessoal! Vocês sabem que o dia 29 de agosto é o dia Nacional da Visibilidade Lésbica? #todxscontraalesbofobia www.anamovimento.blogspot.com

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entrevista

Jozeli Souza, iniciou a sua trajetória no movimento social, na adolescência, em busca de melhorias na comunidade onde nasceu e foi criada, na Pedreira Prado Lopes. Participou de grupos de jovens, se inserindo em discussões e decisões nos espaços políticos de Belo Horizonte na área da Infância e da Juventude e se engajau na luta do enfretamento à violência sexual de crianças e adolescentes, luta que a conduz até os dias de hoje. Atualmente faz parte do Coletiva Brejo das Sapas, um espaço de auto cuidado, que propõe dialogar sobre diversidade sexual, gênero, raça e classe, possibilitando um espaço de encontro para as mulheres negras, lésbicas, bissexuais e trans.

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Campanha Ana: Você é uma das criadoras do Coletivo Brejos das Sapas. Poderia nos dizer qual o objetivo desse espaço em Belo Horizonte. Jozeli Souza: Promover um espaço de sociabilidade negra, lésbica, bissexual e trans de Belo Horizonte e do entorno por meio da ocupação política e cultural de um local situado em um bairro de elite branca. A Brejo das Sapas propõem atividades voltadas para a reconstrução da auto estima juntamente com auto cuidado, trabalhando temas de extrema importância, pois falar das dores se torna importante para encontrar espaço para reconstruir o sorriso. C. Ana: A violência sexual como ferramenta para punir e “transformar” lésbicas, bissexuais e homens trans em mulheres “de verdade” é uma constante contra as meninas? E quais os motivos dessa ocorrência? Jozeli S.: Neste caso estamos falando a respeito do chamado “estupro corretivo”, que está intimamente ligado ao machismo, onde o homem se acha superior a mulher e as meninas e acredita que pode “corrigir”, utilizando da violência sexual como forma de obrigar a sexualidade imposta, por ele dita correta. Essa forma de violência está atrelada a cultura do estupro e ao falocentrismo. C. Ana: Você poderia nos explicar o que é lesbofobia? E em que essas atitudes podem contribuir com a violência sexual? Jozeli S.: É uma forma de violência voltada para as pessoas que se identificam ou são entendidas como lésbicas, que vivem a sua sexualidade fora do padrão imposto socialmente no caso a heterossexualidade, compreendendo que a crítica ao

padrão da heterossexualidade é pela forma como ela é imposta como sendo a única forma de exercer a sua sexualidade, e tudo que for contra a esse padrão é visto como anormal, pecado, feio. E essa forma de pensar só reforça a Lesbofobia, condenando e odiando as mulheres lésbicas por amarem outras mulheres. C. Ana: Em que sentido, no seu ponto de vista, os movimentos da infância e das mulheres lésbicas podem contribuir com a proteção das adolescentes que se reconhecem ou se identificam como lésbicas, bi e transexuais? Jozeli S.: Reconhecer a sexualidade e a afetividade dessas adolescentes já é um bom caminho para quebrar o tabu e o preconceito, e compreender que existem outras formas de amar e existir na vida para além da heterossexual, é estar em constante diálogo com essa nova geração que está mais aberta para romper com alguns padrões que ao longo dos anos vem imponto a forma como devemos agir e se portar com os nossos direitos sexuais e reprodutivos. Por isso, se faz necessário a formação contínua das crianças e adolescentes a respeito da vivência de uma sexualidade saudável e segura, e isso só se faz por meio da educação sexual, buscando uma auto proteção. Há alguma questão que gostaria de acrescentar? Jozeli S.: Que a Lesfobia mata, e o seu silêncio também, então sempre que presenciar algum tipo de violência não silencie, não seja mais um cúmplice dessa violência. Pois toda forma de amar é digna, lutamos por respeito e pelo direito de existir.

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Fica dica

Livros Triângulo Rosa

Filmes Flores Raras Baseado na história de amor real entre a poetisa americana Elizabeth Bishop e a arquiteta brasileira Lota de Macedo Soares, o filme mostra os bastidores deste relacionamento intenso, ambientado em Petrópolis, entre os anos de 1950 e 1960. A trajetória coincide com o surgimento da Bossa Nova e a construção da capital Brasília.

Identificados como “triângulos-rosa”, milhares de homossexuais foram enviados para os campos de concentração pelo regime de Hitler. Rudolf Brazda, que recebeu a matrícula 7952, ficou preso em Buchenwald – e é seu último sobrevivente gay. Hoje com 97 anos, ele nos traz um relato ímpar, sustentado por um rigoroso trabalho de pesquisa histórica e marcado pela dor e pela esperança de quem sobreviveu aos horrores do nazismo.

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Aimée & Jaguar Durante a Segunda Guerra Mundial, a judia Felice Schragenheim resolve correr o risco de permanecer em Berlim por causa de seu grande amor: Lilly Wust, a pacata esposa de um soldado alemão e mãe de três filhos. Aimée e Jaguar são os codinomes que ambas adotam para manter a relação em sigilo.

ana.movimento@gmail.com

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Cofinanciador

Brasil

União Europeia

Esta publicação foi produzida com o apoio da União Europeia. O conteúdo desta publicação é da exclusiva responsabilidade da Associação Barraca da Amizade e não pode, em caso algum, ser tomado como expressão das posições da União Europeia.

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