EDIÇÃO
97 ISSN 0104-3072
REVISTA DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ODONTOLOGIA VOL. XVII - Nº 4 - AGO/SET 2009
Saúde
Tabaco, Tabaco, epidemia global Ta baco, epidemia Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
191
192
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nยบ 4 - Agosto/setembro 2009
ISSN 0104-3072
E . . .D. . I. .T. . O . . .R. . I. .A. . L. R
E
V
I
S
T
A
Boca fechada para o cigarro
NACIONAL NACIONAL Revista da Associação Brasileira de Odontologia Conselho Editorial Científico Presidente: Norberto Francisco Lubiana Diretor científico: Ricardo Lombardi de Farias Secretária-executiva: Patrícia Meira Bento Conselho Consultivo Carlos de Paula Eduardo, Edela Puricelli, Edmir Matson, Geraldo Bosco Lindoso Couto, Heitor Panzeri, José Mondelli, Luciano Loureiro de Melo, Maria Carméli Correia Sampaio, Maria Fidela de Lima Navarro, Ney Soares de Araújo, Nilza Pereira Costa, Orivaldo Tavano, Orlando Ayrton de Toledo, Roberto Vianna, Salete Maria Pretto e Tatsuko Sakima. A Revista ABO Nacional é uma publicação bimestral da ABO Nacional. Sede administrativa : Rua Vergueiro, 3153, conjs. 82 e 83 - Vila Mariana - São Paulo - SP - CEP 04101-300 Telefax. (+55 11) 5083.4000. Web: www.abo.org.br E-mail: abo@abo.org.br Adress to correspondence: Rua Vergueiro, 3153, conjs. 82 e 83 - São Paulo - SP - Brasil - CEP 04101-300 Web: www.abo.org.br Registrada no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), sob o Número Internacional Normalizado para Publicações Seriadas (ISSN) 0104-3072. A Revista ABO Nacional está indexada nas bases de Filiada à dados Bibliografia Brasileira de Odontologia (BBO) e Literatura Latinoamericana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs).
Produção e Redação: Edita Comunicação Integrada Alameda Santos, 1398 - 8º conj. 87. Telefax (+11) 3253.6485. CEP 01418-100. São Paulo (SP) - Brasil. Email: edita@editabr.com.br Diretores: Joaquim R. Lourenço e Zaíra Barros. Editora responsável: Zaíra Barros (MTb:8989). Repórter: Antonela Tescarollo (MTb: 41547), Diego Freire (MTb: 49.614). Copydesk: Ricardo Palmiéri Barros. Imagens: Fotoabout. E-mail: rsm@fotoabout.com. Diagramação/artes: Edita/Victor Cruz. Diretor de Produção Gráfica: Joaquim R. Lourenço. Publicidade: MN Design (+11) 2975.3916. Impressão: Vitor Mango . Tiragem: 30 mil exemplares. Os conceitos e opiniões emitidos em artigos assinados são de inteira responsabilidade dos autores e não expressam necessariamente a posição da ABO Nacional. A ABO Nacional não se responsabiliza pelos produtos e serviços das empresas anunciantes, as quais estão sujeitas às normas de mercado e do Código de Defesa do Consumidor. É permitida a reprodução dos artigos não científicos desde que citada a fonte. Os artigos científicos ficam sujeitos à autorização expressa dos autores. Solicita-se permuta – Requests exchange – Si solicita lo scambio – Se solicita canje – On demande l’ èchange – Wir bitten um Austausch
A
o colocar um cigarro na boca, o fumante dá início a uma série de relações de causas e efeitos que tem como consequência final, invariavelmente, a deterioração de sua saúde – começando pela própria boca e envolvendo todo o organismo, do cérebro a quase todos os órgãos. Os efeitos sistêmicos do tabagismo não se limitam ao corpo de quem fuma: trata-se de um problema social, que afeta todos ao redor e representa grave problema de saúde pública mundial. O cirurgião-dentista, como profissional de saúde bucal, onde o problema começa, tem responsabilidade especial no combate ao tabagismo, e a reportagem desta edição da Revista ABO Nacional traz informações preciosas ao ideal de ambientes 100% livres da fumaça do tabaco e de ampla promoção da saúde integral. A ABO tem larga experiência no combate ao tabagismo. Antecipou-se às legislações estaduais que baniram o uso de cigarro e derivados de tabaco em ambientes de uso coletivo ao decretar, em 2007, todos os seus ambientes 100% livres de fumaça de cigarro. A medida envolveu congressos, clínicas, escritórios, salas de aula, e foi tomada em consonância com a Federação Dentária Internacional (FDI), que, em resolução oficial, enfatizou não haver nenhum nível seguro de exposição ao ar contaminado por fumaça de tabaco. Dessa forma, as 321 unidades da Rede ABO, em todo o território nacional, são orientadas a realizar em suas regiões campanhas de combate ao fumo e de prevenção e diagnóstico precoce do câncer bucal, destacando o tabaco como fator de risco, voltadas para profissionais e população em geral. O esforço precisa envolver a todos. Ao longo da reportagem desta edição, os dados apurados chamam a atenção para a necessidade de se desenvolver ações para proteger as pessoas e o meio ambiente dos perigos do tabaco. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca) e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), mais de 200 mil brasileiros morrem todo ano vítimas de doenças relacionadas ao tabagismo. Grande parte das mortes é causada pelo câncer bucal, que, ano passado, teve cerca de 9 mil casos registrados. Em todo o globo, entidades fortalecem suas ações antitabagismo e refletem sobre novas estratégias de combate ao problema. A ABO apoia uma das mais expressivas, a Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, implementando suas ações em todo o Brasil. Já podemos comemorar algumas importantes conquistas, como a elevação da tributação de produtos derivados de tabaco, a regulação da publicidade da indústria do cigarro e as leis municipais e estaduais que limitam o fumo, mas ainda é preciso muito mais. A Revista ABO Nacional se une aos esforços do mundo para por fim a esta verdadeira epidemia global em que o tabagismo se transformou. Norberto Francisco Lubiana Conselheiro da FDI Diretor-executivo da Fola Presidente da ABO Nacional
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
193
D I R E T O R I A
A B O
N A C I O N A L
Suplentes: Arnaldo Mário Frias Zúniga/PA, Júlio Medeir os Barros Fortes/PI e Jander Ruela Pereir a/MT Conselho fiscal Ef etivos: Paulo M. O. da Fontoura/RJ , Osmar Cutrim Fróz/MA e Luciano Teixeira da Silva/AP Associação Brasileira de Odontologia - ABO Nacional, registrada no Conselho Nacional Serviço Social sob nº 110.006/54, em 12 de janeiro de 1955. Filiada à FDI e à Fola/Oral. Conselho Executivo Nacional (CEN) Presidente: Norberto Francisco Lubiana/ES Vice-presidente: Luiz Roberto Craveiro Campos/DF Secretário-geral: Newton M. de Car valho/MG 1 o secretário: Ermenson Luiz Jorge/PR Tesoureiro-ger al: Sinval Santos P. Silva/ES 1o tesoureiro: Geraldo A.Vasconcelos Fº/PE
Vice-presidentes Re gionais Norte: Marco Aurélio Blaz Vasques/RO Nordeste: Eliar do Silveira Santos/CE Sudeste: Paulo M. O. da Fontoura/RJ Sul: Mário Thaddeu Filho/RS Centro-Oeste: Viviam Louise Dias Elias/MS
Diretores do Departamento de Avaliação de Produtos Odontológicos (Dapo) Heitor Panzeri/SP e Elza Helena G. Lara/SP Diretor científico da Revista ABO Nacional Ricardo Lombardi de Farias/PB Repr esentantes no Comissão Nacional de Convênios e Credenciamentos (CNCC) Efetivo: Ricardo Calazans Duarte/RN Suplente: Francisco das C.Pinheiro/RN Conselho Deliberativo Nacional (CDN) Presidente: Osiris Pontoni Klamas/PR Vice-presidente: J osé Barbosa Porto/CE
Assessores da Presidência Avilmar P. Galvão/BA, Ricardo Calazans Duarte/RN e João Alfredo Silva/MT Assessor internacional Roberto de Carvalho Bra ga Vianna/RJ
A B O
N O S
E S T A D O S
ABO/Acre Pres. Stanley Sandro da Silva Mendes R. Marechal Deodoro, 837, s.4 69900-210 - Rio Branco - AC Telefax(+68) 3224.0822
ABO/Maranhão Pres. Marvio Martins Dias Av. Ana Jansen,73 65051-900 - São Luiz - MA Tel. (+98) 3227.1719/Fax 3227.0834
ABO/Rio de Janeiro Pres. Paulo Murilo O. da Fontoura Rua Barão de Sertório,75 20261-050 - Rio de Janeiro - RJ Tel. (+21)2504.0002 /Fax: 2504.3859
ABO/Alagoas Pres. Tiago Gusmão Muritiba Av. Roberto M. de Brito, s/n.-Jatiuca 57037-240 Maceió - AL Telefax(+82) 3235.1008
ABO/Mato Grosso Pres. Jander Ruela Pereira Rua Padre Remeter, 170 78008-150 - Cuiabá - MT Telefax(+65) 3623.9897
ABO/Rio Grande do Norte Pres. Pedro Alzair Pereira da Costa Rua Felipe Camarão, 514 59025-200 - Natal - RN Tel. (+84) 3222.3812/Fax: 3201.9441
ABO/Amapá Pres. Daíz da Silva Nunes Rua Dr.Marcelo Cândia, 635 CP 635 68906-510 - Macapá - AP Tel. (+96) 3244.0202/Fax 3242.9300
ABO/Mato Grosso do Sul Pres. Viviam Louise Dias Elias Rua da Liberdade, 836 79004-150 - Campo Grande - MS Telefax (+67) 3383.3842
ABO/Rio Grande do Sul Pres. Flávio Augusto Marsiaj Oliveira Rua Furriel Luis Antônio Vargas, 134 90470-130 - Porto Alegre - RS Tel.(+51) 3330.8866/Fax: 3330.6932
ABO/Amazonas Pres. Alberto Tadeu do Nascimento Borges Rua Maceió, 863 69057-010 - Manaus - AM Tel. (+92) 3584.5535/3635-231
ABO/Minas Gerais Pres. Carlos Algusto Jayme Machado Rua Tenente Renato César, 106 30380-110 - Belo Horizonte - MG Tel. (+31) 3298.1800/Fax 3298.1838
ABO/Rondônia Pres. Paulo Jorge Alves Martins Rua D.Pedro II, 1407 78901-150 - Porto Velho - RO Tel. (+69) 3221.5655/Fax: 3221.6197
ABO/Bahia Pres. Delcik Santos Dutra R.Altino Serbeto Barros, 138 41825-010 - Salvador - BA Tel. (+71) 2203.4066/ Fax 2203.4069
ABO/Pará Pres. Lucila Janeth Esteves Pereira Rua Marquês de Herval, 2298 66080-350 - Belém - PA Tel. (+91) 3277.3212/Fax 3276.0500
ABO/Roraima Pres. Luiz Carlos Schwinden R. Barão do Rio Branco,1382 69301-130 - Boa Vista - RR Tel. (+95) 3224.0897/ Fax: 3224.3795
ABO/Paraíba Pres. Patrícia Meira Bento Av. Rui Barbosa,38 58040-490 - João Pessoa - PB Telefax(+83) 3222-7100
ABO/Santa Catarina Pres. Nádia Maria Fava Rua Dom Pedro I, 224 88090-830 - Florianópolis - SC Telefax (+48) 3248.7101
ABO/Paraná Pres. Osiris Pontoni Klamas Rua Dias da Rocha Filho, 625 80040-050 - Curitiba - PR Tel. (+41)3028.5800/Fax 3028.5824
ABO/São Paulo Pres. José Silvestre Rua Dr. Olavo Egídio, 154 - Santana 02037-000 - São Paulo - SP Tel. (+11) 2950.3332/Fax: 2950.1932
ABO/Pernambuco Pres. Fernando Luiz Tavares Vieira Rua Dois Irmãos, 165 52071-440 - Recife - PE Tel. (+81) 3442.8141
ABO/Sergipe Pres. Martha Virgínia de Almeida Dantas Av. Gonçalo Prado Rollemberg, 404 49015-230 - Aracajú - SE Tel. (+79) 3211.2177 Fax: 3214.4640
ABO/Piauí Pres. Júlio Medeiros Barros Fortes Rua Dr. Arêa Leão, 545 - SUL 64001-310 - Teresina - PI Tel. (+86) 3221.9374
ABO/Tocantins Pres. Luiz Fernando Varrone Av. LO15 602 Sul - Conj. 02 Lote 02 70105-020 - Palmas - TO Tel. (+63) 3214.2246/Fax: 3214.1659
ABO/Ceará Pres. José Barbosa Porto R. Gonçalves Lêdo, 1630 60110-261 - Fortaleza - CE Tel. (+85) 3311.6666/Fax 3311.6650 ABO/Distrito Federal Pres. Wesley Borba Toledo SGAS 616 - lote 115-L/2 Sul 70200-760 - Brasília - DF Tel. (+61) 3445.4800/Fax 3445.4848 ABO/Espírito Santo Pres. Luiz Carlos Bourguignon dos Santos R. Henrique Rato, 40 - Fátima 29160-812 - Vitória - ES Telefax(+27) 3337.8010 ABO/Goiás Pres. Rafael de Almeida Decurcio Av.Itália, 1184 74325-110 - Goiânia - GO Tel. (+62) 3236.3100/Fax 3236.3126
194
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nยบ 4 - Agosto/setembro 2009
195
196
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nยบ 4 - Agosto/setembro 2009
S . . . .U. . . .M. . . .Á. . .R . . . .I . . O .. Summary
198
221 Artigo original
SAÚDE
Tabaco, epidemia global HEALTH
Tobacco, a global epidemic
199 Prejuízos da cabeça aos pés
240 Relato de caso
Avaliação da alteração dimensional de modelos de gesso obtidos de moldes de alginato desinfetados com soluções de mamona
205 Tabaco, nem se for sem fumaça
211 A lição de casa do Brasil 215 216
INSTRUÇÕES AOS AUTORES INSTRUCTIONS TO AUTHORS ARTIGOS CIENTÍFICOS SCIENTIFIC ARTICLES
Artigo original Tratamento das lesões cariosas em dentina de molares decíduos: uma pesquisa entre odontopediatras
Maria do Socorro Aragão Ricardo Lombardi Farias Eduardo Dias-Ribeiro Andréa Sarmento Queiroga Juliana Mariano Massuia
243 Revisão Conduta frente a lesões na face decorrentes de mordida humana ou de animal doméstico
226 Artigo original Condições de acessibilidade para usuários cadeirantes em Unidades Básicas de Saúde do município de Linhares (ES) Health BasicUnits access conditions for wheelchair handicap from Linhares city (Espirito Santo State)
208 É proibido fumar
Geographic tongue mimicking a candidiasis – Case Report
Dimensional alteration of gypsum casts obtained by disinfected alginate impressions with castor oil derived solutions Iara Augusta Orsi Fabíola Rejane Zanin Carla Moreto Santos
202 O mundo contra o tabaco
Língua geográfica mimetizando uma candidíase - Relato de Caso
Management of human and pet animals bite injuries to the face Jônatas Caldeira Esteves Nilesh Joriel Moniz Ronaldo Rodrigues de Freitas
248 Revisão
Mardilei Canal Rigotti Ludmilla Awad Barcellos Maria Helena Monteiro de Barros Miotto Margareth Pandolfi
232 Artigo original Estudo da articulação temporomandibular por meio de ressonância magnética Magnetic resonance image study 253 of the temporomandibular joint
A utilização do óxido nitroso e oxigênio na Implantodontia Nitrous oxide and oxygen use in Implantology Evandro Tonial Andreolla Edivaldo Romano Coro Geninho Thomé Ana Cláudia Moreira Melo Ivete Aparecida de Mattias Sartori PAINEL HIGHLIGHTS FDI’2009
Fabio Ritto Marcelo Daniel Brito Faria
Brasil: 5 vezes vitorioso em Cingapura
Treatment of primary molar decay 236 Artigo original 255 AGENDA Prevalência das lesões orofaciais lesions in dentin: a research among DENTAL CALENDAR em casos de maus-tratos the pediatric dentists infantojuvenil na cidade de SUPLEMENTO ESPECIAL Eliane Batista de Medeiros São Luís (Maranhão) Aronita Rosenblatt
Prevalence of the lesions orofacial in cases of maltreatments infanto-juvenile in São Luís’ city (Maranhão) Rubenice Amaral da Silva Amanda Pereira Palitó Maria Carmen Fontoura Nogueira da Cruz
INDEXADA
Capa, gráficos e produção: Edita Comunicação
BBO Lilacs
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
1998 1998
Abrasividade em cremes dentais e hipersensibilidade dentinária Problema emergente na Odontologia
197
S ○
A ○
○
○
○
Ú ○
○
○
D ○
○
○
○
E ○
○
○
T Ta abaco, baco, eepidemia pidemia global Tem se falado muito de tabaco e, especialmente, maneiras de controlá-lo, evitá-lo e restringi-lo. A situação é resultado do grande volume de informação científica e estatística sobre o tema. Já se sabe, por exemplo, que substâncias tóxicas do produto atingem praticamente todos os órgãos e que fumantes passivos têm risco 30% maior de desenvolver câncer de pulmão que os não expostos à fumaça. Na saúde bucal, os efeitos também são expressivos, sendo o tabagismo um dos principais fatores de risco para o câncer bucal e para lesões que podem se malignizar, além de causar danos para a gengiva e tecidos de suporte, manchas nos dentes e na mucosa, piora na cicatrização e até xerostomia. Estes males são causados também pelo tabaco sem fumaça, que pode ser aspirado, mascado ou aplicado sobre a mucosa, e que parece ser uma saída para a indústria tabagista driblar as restrições ao seu produto. Neste contexto, o cirurgião-dentista pode desempenhar importante papel de profissional de saúde e promover, no dia a dia do consultório, informações, orientações e conselhos para os pacientes pararem de fumar, ou ainda melhor, para que nunca comecem o vício. Em nível mundial, órgãos e entidades como a OMS, FDI, ABO, Aliança de Controle do Tabagismo, entre outras, iniciaram movimento para combater o que chamam de epidemia global. Ponto alto desta luta foi o estabelecimento da Convenção-quadro para o Controle do Tabaco, tratado internacional no qual os países signatários concordam em implementar medidas para prevenir e reduzir o uso do tabaco, a dependência da nicotina e a exposição à fumaça do tabaco. O Brasil ratificou o tratado em 2005, e, para cumprir o compromisso assinado, trocou as mensagens e imagens de advertência das embalagens de cigarro por outras mais impactantes e elevou os impostos sobre o produto, deixando-o mais caro. Mas uma importante medida está engavetada há mais de um ano e meio no Congresso: a lei federal que proíbe o fumo em ambientes públicos fechados. Enquanto esta proposta não é analisada, Estados e municípios correm por fora e já estão aprovando ou colocando em discussão as suas leis antifumo. Depois de São Paulo, veio Rio de Janeiro, Rondônia, Paraná, Curitiba, Salvador e outros. E, apesar de toda a polêmica que envolve a questão, a lei está sendo bem recebida - 94% dos paulistas apoiam a medida – e deverá ajudar muito a mudar um padrão de comportamento nocivo a todos. Antonela Tescarollo e Diego Freire
198
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
S A Ú D E
Prejuízos da cabeça aos pés O tabaco foi responsável por 1 bilhão de mortes em todo o mundo no século passado. Tal feito foi possível porque as mais de quatro mil substâncias tóxicas do produto atuam em praticamente todos os órgãos do corpo, sendo o gatilho de inúmeras e graves doenças
S
egundo o pneumologista Ricardo Meirelles, da Divisão de Tabagismo do Instituto Nacional do Câncer (Inca), o cérebro é um dos principais órgãos afetados pelo tabagismo, já que a nicotina causa dependência. Um cigarro contém de 0,6 a 1,1 mg de nicotina ácida. Quem fuma 20 cigarros por dia, tragando cada um cerca
Pneumologista Ricardo Meirelles, do Inca
de 10 vezes, recebe mais de 70 mil doses de nicotina por ano – com o agravante da velocidade com que o ciclo de dependência à nicotina acontece. Suas substâncias chegam ao cérebro em menos de 10 segundos, e seus efeitos duram apenas uma hora. “De repente, o fumante é acometido pela ‘fissura’, ansiedade por mais tragadas”, explica Meirelles. A grande armadilha do cigarro é o prazer. Isso porque o cérebro de quem fuma tem mais receptores de nicotina que dependem de suas substâncias para funcionar adequadamente. Estimulados por elas, esses receptores liberam substâncias neurotransmissoras que dão sensação de bem-estar ao organismo, como a serotonina e a dopamina, que diminuem o apetite, estabilizam o humor e aliviam os efeitos da abstinência; a norepinefrina e a acetilcolina, que dão sensação de alerta ao cérebro; a vasopressina e o glutamato, que melhoram a memória; e a betaendorfina, que reduz a ansiedade. Assim, o dependente de nicotina acredita que o hábito de fumar é de-
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
sestressante e companheiro. Foi graças a esse mecanismo que o cigarro conquistou um dos públicos mais fieis da indústria: estima-se que 60% dos que fumam por mais de seis semanas continuam fumando por mais de 30 anos. Feito o prejuízo no cérebro, as chances de ele se estender a outros órgãos é enorme. Muitas das mais de quatro mil substâncias tóxicas às quais os fumantes são expostos são cancerígenas, o que faz do tabagismo o maior fator de risco evitável de câncer, dos mais variáveis: de pulmão, laringe, pâncreas, fígado, bexiga, rim, leucemia mielóide e, associado ao consumo de álcool, câncer de cavidade oral e esôfago. “Fumar de um a nove cigarros por dia é o suficiente para aumentar em seis vezes as chances
199
S A Ú D E
de um câncer se desenvolver”, alerta o pneumologista Ricardo Meirelles. O câncer de pulmão é o mais fortemente associado ao tabagismo. Os casos de morte pela doença entre fumantes são 15 vezes mais frequentes do que entre pessoas que nunca fumaram. Ex-fumantes também padecem mais da doença – suas chances são quadriplicadas. E os efeitos são cumulativos: quem fuma de um a 14 cigarros por dia tem risco oito vezes maior de desenvolver câncer de pulmão; de 15 a 24, 14 vezes mais; acima de 25, 24 vezes. Assim, deixar de fumar o quanto antes pode fazer diferença – a cessação aumenta a sobrevida média em nove anos. Segundo o Inca, 90% dos
TABACO X MEIO AMBIENTE Poluição domiciliar Fumar em ambientes fechados leva o nível de partículas suspensas no ar além do limite aceitável (60 mcg/cm³). Em uma festa, pode atingir 200 mcg/cm³; em bares e restaurantes, 400 mcg/cm³
Desmatamento e agrotóxicos Matas são desmatadas para o plantio do fumo e produção de lenha para abastecer os fornos que secam as folhas de tabaco. No cultivo do fumo são empregados potentes agrotóxicos, que contaminam o solo, os animais e o próprio agricultor
Onde há fumaça, há fogo Cerca de 20% dos incêndios são provocados por pontas de cigarros jogadas nas matas
Tobacco, a global epidemic
RÉSUME - HEALTH
Much has been said about tobacco and especially about ways to control, avoid and restrict it. The situation is the result of the large volume of scientific information and statistics on the subject. It is already known, for example, that toxic substances of the product reach almost all organs and that second hand smokers have 30% higher risk of developing lung cancer than those not exposed to the smoke. In oral health, the effects are also significant, and smoking is one of the main risk factors for oral cancer and lesions that can become malignant, besides causing damages to the gums and supporting tissues, staining the teeth and mucosa, worsening in healing and even xerostomia. These illnesses are also caused by smokeless tobacco, which can be inhaled, chewed or applied to the mucosa, and seems to be the solution to the tobacco industry to circumvent the restrictions on their product. In such context, the dentist can play an important role in health care and promote, on their daily practice, information, guidance and advice to patients to quit smoking, or even better, to never start the habit. World-wide, agencies and entities such as WHO, FDI, ABO, Alliance for Tobacco Control, among others, began the movement to fight what they call a global tobacco epidemic. The high point of this struggle was the establishment of the WHO Framework Convention on Tobacco Control, an international treaty in which the signatory countries agree to implement measures both to prevent and reduce tobacco use, nicotine addiction and exposure to tobacco smoke.Brazil ratified the treaty in 2005, and to comply with the signed agreement, exchanged warning messages and pictures of cigarette packages for new and more impactful ones, and raised taxes on the product, making it more expensive. But one important measure is blocked for more than a year and a half in the Congress: the federal law that prohibits smoking in enclosed public places. While this proposal is shelved, states and municipalities are now, in parallel, approving or putting into discussion their anti-smoking laws. After the State of São Paulo has implemented its smoke-free places, it was the turn of Rio de Janeiro, Rondônia, Paraná, Curitiba, Salvador and others. And despite all the controversy involving the issue, the law is being well received - 94% of São Paulo citizens support it - and it shall help to change a pattern of harmful behavior to everyone.
200
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
S A Ú D E
casos de câncer no pulmão são causados pelo tabagismo. O hábito ainda responde a 30% das mortes decorrentes de outros tipos de câncer, 25% das mortes por doença coronariana – angina e infarto do miocárdio; 85% das causadas por bronquite e enfisema; e 25% das doenças vasculares (entre elas, derrame cerebral). Também há indícios científicos que relacionam o tabagismo ao aumento do risco de mortes prematuras, catarata, osteoporose e, portanto, fraturas. Perigo no ar O tabagismo é um problema de saúde pública, também, porque seus efeitos não se limitam a quem fuma. O fumante passivo também é mais vulnerável a doenças como câncer de pulmão e infarto, e filhos de fumantes, quando comparados a quem não tem histórico de tabagismo na família, apresentam maior frequência de infecções e outros problemas respiratórios, além de taxas ligeiramente menores de aumento da função pulmonar à medida que o pulmão amadurece. Segundo o Inca, entre não-fumantes cronicamente expostos à fumaça do tabaco nos ambientes, o risco de câncer de pulmão é 30% maior do que entre os não-fumantes nãoexpostos. Eles também apresentam risco 24% maior de desenvolverem doenças cardiovasculares. Mulheres e crianças são os mais vulneráveis. O risco também é grande no ambiente de trabalho, onde a maioria dos trabalhadores ainda não é protegida da exposição involuntária à fumaça do cigarro (veja pág. 208). O risco levou a OMS a considerar a exposição fator de risco ocupacional.
CICLO VICIOSO ● ● ● ●
1 cigarro tem de 0,6 a 1,1 mg de nicotina ácida Quem fuma 20 cigarros por dia recebe mais de 70 mil doses de nicotina por ano As substâncias chegam ao cérebro em menos de 10 segundos Os efeitos duram apenas 1 hora. Depois, o organismo pede que o ciclo recomece
O “BEM” QUE O TABACO FAZ O tabaco faz com que o cérebro libere substâncias neurotransmissoras que dão sensação de bemestar ao organismo. Entre elas: ● ● ● ●
Norepinefrina e acetilcolina, que dão sensação de alerta ao cérebro Serotonina e dopamina, que diminuem o apetite e estabilizam o humor Vasopressina e o glutamato, que melhoram a memória Betaendorfina, que reduz a ansiedade
FUMANTE PASSIVO O não fumante exposto à fumaça do tabaco tem: ● ● ● ●
30% mais chances de desenvolver câncer de pulmão 24% mais chances de desenvolver doenças cardiovasculares Maior frequência de infecções e outros problemas respiratórios Menor progresso da função pulmonar
O tabagismo é também considerado doença pediátrica: 90% dos fumantes têm seu primeiro contato com cigarro antes dos 19 anos de idade, a maioria aos 15. Segundo a OMS, a cada dia 100 mil jovens começam a fumar, e, segundo o Banco Mundial, 80% deles vivem em países em desenvolvimento – como o Brasil.
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
CQCT: Brasil está entre os signatários
201
S A Ú D E
O mundo contra o tabaco Além das consequências à saúde, o tabagismo provoca enormes custos sociais, econômicos e ambientais. O tratamento de doenças associadas ao tabaco consome até 15% do orçamento da saúde. Os danos se estendem ao meio ambiente, com a poluição gerada pela fumaça e o desflorestamento necessário para a obtenção da folha de tabaco. O problema exige uma solução global
A
Organização Mundial da Saúde (OMS) considera o tabagismo uma epidemia global, que deve ser combatida com o desenvolvimento de um tratado internacional de controle do tabaco e a percepção de que a globalização está acelerando seu crescimento, exigindo soluções transnacionais no lugar de estratégias localizadas. Nesse cenário foi criada a Convenção-quadro para o Controle do Tabaco (CQCT), tratado internacional no qual os países signatários – entre eles, o Brasil – concordam em empreender es-
202 202
forços para erradicar o tabagismo do planeta. Ao ratificarem a CQCT, os Estados assumem o compromisso de implementar medidas legislativas, executivas e administrativas, entre outras, para prevenir e reduzir o tabagismo, a dependência da nicotina e a exposição à fumaça do tabaco, além de cooperar com outros Estados na elaboração de políticas, protegendo-as dos interesses comerciais da indústria. A CQCT é o primeiro tratado de saúde pública iniciado pela
Assembleia Mundial da Saúde, órgão executivo da OMS. As negociações começaram em outubro de 1999, e foram concluídas em março de 2003, aprovadas por unanimidade pelos ministros da Saúde dos 191 Estados membros. A Odontologia é representada na CQCT pela Federação Dentária Internacional (FDI), e a ABO Nacional tem trabalhado com base em suas definições para eliminar os riscos do tabaco em todo o território nacional. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca) e a Organização Pan-
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
S A Ú D E
ABO decretou seus ambientes livres de fumaça desde 2007
Americana de Saúde (Opas), mais de 200 mil brasileiros morrem todo ano vítimas de doenças relacionadas ao tabagismo. Antecipando-se às legislações estaduais que baniram o uso de cigarro e derivados de tabaco em ambientes de uso coletivo – públicos ou privados –, a ABO decretou, em 2007, todos os seus ambientes – congressos, clínicas, salas de aula etc. –, em todo o Brasil, 100% livres de fumaça de cigarro. A medida foi tomada em consonância com a CQCT e com a FDI, que, em resolução oficial, enfatiza que “não há nenhum nível seguro de exposição ao ar contaminado por fumaça de tabaco”, chamando a atenção para a necessidade de se “promulgar leis sem exceções para proteger as pessoas dos perigos da fumaça do cigarro alheio”. As 321 unidades da Rede ABO também realizam em suas regiões campanhas de combate ao fumo e de prevenção e diagnóstico precoce do câncer bucal, destacando o tabaco como fator de
18,3 milhões de fumantes precisam de tratamento
Fonte: Inquérito domiciliar sobre comportamentos de risco e morbidade referida de doenças e agravos não transmissíveis. MS/SVS/INCA-Brasil,2002-2005
Fonte: Inquérito domiciliar sobre comportamentos de risco e morbidade referida de doenças e agravos não transmissíveis. MS/SVS/INCA-Brasil,2002-2005
risco, voltadas para profissionais e população em geral. Estratégias O desafio brasileiro é grande: cálculos do Instituto Nacional de Câncer (Inca) mostram que 18,3 milhões de fumantes necessitam de tratamento. Esse número corresponde a 97% dos 80% interessados em parar de fumar. Os 3% restantes são aqueles que conseguem parar espontaneamente, sem ajuda profissional e sem medicamentos. Segundo o pneumologista Ricardo Meirelles, da Divisão de Tabagismo do Inca, “o objetivo, agora, é diminuir a fila. Há muita gente interessada em se tratar e ainda não dá para atender a demanda”. O médico defende que o controle do tabagismo precisa ir além
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
do setor público. A ideia é compartilhada pelo Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas, que define ações antitabagismo em três níveis: individual, institucional e social – este, englobando a abertura e ampliação de oportunidades que permitem às pessoas usar e expandir as suas próprias capacidades ao máximo. A CQCT traz orientações que envolvem os três níveis. Entre elas: Artigo 6 – Tributação e vendas Aumentos de impostos sobre o tabaco são incentivados. O Tratado estabelece que “cada parte deve ter em conta os seus objetivos de saúde pública relativos ao controlo do tabaco” ao decidir sobre a tributação do tabaco e suas políticas de preços, reco-
203
S A Ú D E
Fonte: Inquérito domiciliar sobre comportamentos de risco e morbidade referida de doenças e agravos não transmissíveis. MS/SVS/INCA-Brasil,2002-2005
nhecendo que “o aumento de impostos é um meio eficaz e importante de reduzir o consumo de tabaco por vários segmentos da população, especialmente os jovens”. Comércio de tabaco em duty free é desencorajado. As partes podem proibir ou restringir as vendas isentas de produtos de tabaco nesses espaços. Artigo 8 – Fumantes passivos Não fumantes devem ser protegidos em locais de trabalho, transportes públicos e recintos
públicos fechados. O Tratado reconhece que a exposição à fumaça do tabaco tem sido cientificamente comprovada como causa de morte, doença e incapacidade. Ela exige que todas as partes programem medidas eficazes para proteger não fumantes contra o fumo em lugares públicos. “As evidências indicam que só a proibição total do tabaco é eficaz para proteger os não fumadores.” Artigo 10 – Produto regulado Os produtos do tabaco devem ser regulados. As partes concor-
dam em estabelecer diretrizes que todas as nações possam utilizar na regulação do conteúdo dos produtos do tabaco. As partes devem exigir que os fabricantes divulguem para o governo o conteúdo de seus produtos de tabaco. Artigo 11 – Embalagem e rotulagem Rótulos de advertência são necessários. O Tratado estabelece que as etiquetas de advertência de saúde devem cobrir 50% ou mais das principais áreas de exibição de cada pacote, o que para um pacote de cigarro padrão significa tanto a frente quanto a parte de trás. As advertências de saúde podem incluir imagens ou pictogramas. Rótulos enganosos devem ser proibidos. Investigações revelam que os cigarros que são rotulados como “light”, “low tar”, “leve” e com “baixo teor de alcatrão”, entre outros termos, são tão perigosos quanto os indicados como regulares, e, portanto, estes termos enganam os consumidores sobre os riscos envolvidos no uso desses produtos. Artigo 13 – Publicidade, promoção e patrocínio A CQCT exige que todas as partes comprometam-se com a proibição total da publicidade do tabaco, sua promoção e seu patrocínio, no prazo de cinco anos após a ratificação do tratado. A proibição deve incluir a publicidade transfronteiriça originária dentro do território de um país.
Partes devem se comprometer com metas do tratado
204
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
S A Ú D E
Tabaco, nem se for sem fumaça
Com as crescentes restrições para fumar, começa crescer o interesse pelo chamado tabaco sem fumaça. Não importa: fumado, aspirado ou mascado, tabaco faz muito mal para a saúde, em especial para a da boca. E nesta luta pela saúde pública, o CD pode atuar de diversas formas
J
á estão bastante claros os males que o tabaco causa especialmente para a saúde bucal e todo o sistema estomatognático, mas em tempos de discussão de lei antifumo, seus motivos e implicações, é válido relembrar os efeitos desse hábito e/ou vício e reforçar o importante papel de promotor de saúde que o cirurgiãodentista deve assumir neste contexto. Antes de falar sobre os danos do tabaco, é preciso lembrar que
ele pode ser não apenas fumado, mas também consumido de outras formas, aspirado, aplicado sobre a mucosa e mascado. Essas apresentações em pó (rapé), pasta, folhas, entre outras, do produto também são conhecidas como tabaco sem fumaça. Com o cerco se fechando para o cigarro, cigarrilha, charuto e afins, a atenção de consumidores e do mercado parece já estar se voltando para o tabaco sem fumaça, que também faz mal à saúde, em es-
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
pecial à da boca. Essa tendência foi confirmada pela pesquisadora Stella Bialous, consultora da área de Políticas contra o Tabagismo da Organização Mundial da Saúde (OMS). Em entrevista ao Blog Núcleo de Saúde, do Jornal O Estado de S. Paulo, publicada em maio, ela diz que a indústria está investindo em cigarros sem fumaça, não combustíveis, que são como saches de chá, mas para colocar na boca. Já há também
205
S A Ú D E
CD Jacks Jorge Júnior
umas balinhas, parecidas com as de menta ou outras do tipo, mas que são de nicotina. E tudo isso, claro, em belas e atraentes embalagens. Na China foi criado ainda o cigarro eletrônico, que libera uma fumaça de vapor, mas permite que o fumante consuma nicotina. Este produto foi proibido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil e é desaconselhado pela OMS. Efeitos colaterais Os cirurgiões-dentistas devem conhecer e estar atentos aos
Carcinoma de lábio, em estágio inicial
206 206
diversos danos que o tabaco pode causar na boca, e, principalmente alertar seus pacientes tabagistas sobre eles. Segundo o cirurgiãodentista Jacks Jorge Júnior, doutor em Patologia Bucal pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), instituição em que é professor adjunto, e pós-doutor pela Eastman Dental Institute University College London, um dos mais importantes – mas com certeza não o único – efeitos do tabaco para o sistema estomatognático é o carcinoma espinocelular, tumor que afeta a mucosa bucal e também pode ocorrer por onde mais a fumaça passar, como orofaringe, nasofaringe e pulmão. “Manchas brancas não raspáveis, as leucoplasias, e manchas vermelhas, as eritroplasias, também estão associadas ao tabagismo e podem se malignizar com o passar do tempo”, diz Jorge. As lesões iniciais do câncer bucal também se caracterizam por feridas que não cicatrizam e não têm causa aparente, enquanto as avançadas são reconhecidas pela presença de grandes ulcerações, áreas de necrose, odor fétido, nódulos endurecidos na região cervical e perda da mobilidade da língua. O paciente também pode manifestar rouquidão e dificuldade de falar e de deglutir alimentos, além de mobilidade e perdas den-
Leucoplasia em ventre de língua, em estágio intermediário
Imagem impactante em maço de cigarros (Brasil)
tárias em caso de lesões que envolvam o rebordo alveolar. “Recentemente tem havido o aparecimento de lesões de câncer em pessoas jovens e em pessoas fora do perfil clássico de risco, o que aumenta a responsabilidade dos profissionais de saúde, em particular do cirurgião-dentista, no sentido de examinar adequadamente seus pacientes”, alerta o especialista da Unicamp. Mas mesmo sem chegar à gravidade do câncer bucal, o uso do tabaco causa outros sérios problemas para a saúde, o bem-estar e a estética relacionados à boca: afeta a gengiva e os tecidos de suporte dental, piorando os quadros de doença periodontal; impregna dentes e restaurações estéticas com tons de marrom e negro; a mucosa também pode apresentar manchas marrons as-
Carcinoma de língua, pequeno, em estágio bem precoce
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
S A Ú D E
ce que não há formas adequadas e sem efeitos colaterais de aumentar a salivação.
Da China, o cigarro eletrônico
sociadas à precipitação de melanina; e o lábio apresenta mais rugas. Jacks Jorge também alerta que o fumante pode não ter cicatrização pós-cirurgia adequada e maior prevalência de xerostomia, além de menor capacidade gustativa e olfativa, sentindo menos os alimentos, bebidas e perfumes. Ações odontológicas Em nível odontológico, não há como evitar todos estes efeitos do tabagismo, apenas tratá-los, na medida do possível. “No caso das lesões malignas já instaladas e das malignizáveis, o cirurgiãodentista tem papel fundamental ao contribuir para o diagnóstico
precoce delas, para que sejam tratadas rapidamente e de acordo com o grau de alteração celular e tecidual, aumentando as chances de cura do pacientes com menos sequelas e melhor qualidade de vida”, explica Jorge. Se o CD não tiver treinamento em diagnóstico bucal, ou preferir não executar estes procedimentos, o especialista indica que ele encaminhe o paciente com sintomas suspeitos a algum serviço de saúde que conte com estomatologista. O paciente confirmado com câncer bucal também deve receber tratamento odontológico diferenciado e completo, para que não sofra com os efeitos indesejados do tratamento do câncer. Em relação aos problemas gengivais e periodontais, o paciente tabagista deve receber o mesmo tratamento que os demais, porém a resposta a ele nem sempre é tão positiva. As pigmentações podem ser polidas ou passar por outro tratamento estético, como o clareamento, alertando o paciente de que elas deverão voltar se ele continuar a fumar. Com relação à xerostomia ocasionada pelo fumo, o especialista da Unicamp esclare-
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
CD, promotor de saúde São muitos os setores envolvidos no atual movimento mundial de luta conta o tabaco, visando a grandes avanços em saúde pública, e o cirurgião-dentista, como profissional de saúde, deve ter um papel mais atuante ainda. Ele deve conhecer bem os danos e as alterações que o fumo causa para a saúde bucal e para todo o organismo e explicar isso de maneira clara, didática e até por meio de imagens para os pacientes. “Há muitos materiais de divulgação sobre tabagismo disponíveis na internet. Palestras e outras atividades educativas para crianças, talvez, seja o modo mais eficaz de prevenir o uso do tabaco, e pode ser aplicado em todas as situações em que um profissional de saúde, incluindo o cirurgião-dentista, interage com a população”, recomenda Jacks Jorge. E ele ainda apresenta mais argumentos para os dispostos a trabalhar para o controle do problema: “Não há níveis seguros para o consumo de derivados do tabaco, em qualquer de suas formas de uso. E também não há qualquer benefício no tabagismo, ao menos para o fumante, e a meta deve ser sempre eliminar o uso completamente”.
CD tem papel fundamental no diagnóstico de lesões
207
S A Ú D E
É proibido fumar A lei antifumo no mundo Em vigor desde...
Califórnia (EUA)
1996 1
Nova York (EUA)
2003
Irlanda
2004
Buenos Aires
2005
Uruguai
2006
Ontário e Quebec
2006 2
São Francisco, Chicago e Washington (EUA) 2006 Grã-Bretanha
2007 3
França
2007
Israel
2007
1- Em bares e restaurantes 2- Províncias mais populosas do Canadá 3- Inglaterra, País de Gales e Escócia
O Brasil está cada vez mais próximo de um grupo que até agora tem 11 países, 47 estados e províncias e muitas outras cidades pelo mundo que impõem restrições para o uso do tabaco. Apesar das polêmicas em torno da lei antifumo, a medida vem sendo bem aceita onde entra em vigor e deve mudar um padrão de comportamento
D
epois de pelo menos 11 países, 24 estados norte-americanos, 12 províncias e territórios canadenses, sete estados australianos, quatro províncias argentinas, entre outros muitos lugares pelo mundo terem criado legislações que restringem o uso do tabaco em locais fechados, o Brasil segue a
208 208
tendência mundial e começa a adotar medidas mais efetivas contra o fumo. O assunto passou a ter maior destaque no País com a aprovação, no Estado de São Paulo, de lei que proíbe o fumo em ambientes coletivos fechados, como bares, restaurantes, casas noturnas, condomínios, entre
outros, e que entrou em vigor em 7 de agosto último. A partir disso, as discussões em torno das restrições contra o tabaco e suas consequências na sociedade, na economia, na qualidade de vida das pessoas e na saúde pública se intensificaram e ocuparam importante espaço nos
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
S A Ú D E
jornais, televisão, revistas, rádios e nas conversas entre amigos. Logo depois que a medida começou a valer em São Paulo, leis semelhantes foram aprovadas no Estado do Rio de Janeiro, em Curitiba (PR), e depois em todo o Paraná, e devem entrar em vigor ainda este ano nesses locais. E há ainda outras cidades e Estados brasileiros que estão discutindo e alguns aprovando leis nestes termos, como Rondônia, Rio Grande do Sul, Amazonas, Salvador (BA), Maringá (PR), Goiânia (GO), Juiz de Fora (MG), entre outras. Segundo a Aliança de Controle do Tabagismo (ACT), com estas novas leis aprovadas, “1/3 da população brasileira estará protegida contra a exposição ao fumo passivo em ambientes fechados”. Parte desta população é formada pelos garçons, barmen e outros trabalhadores de bares, restaurantes, casas noturnas, grupo que sofre com a exposição diária à fumaça e já vem se articulando em favor da lei. Pelo que vem acontecendo com São Paulo, apesar das controvérsias que envolvem a lei antifumo, ela está sendo bem recebida pela população. Segundo pesquisa telefônica realizada pelo governo do Estado um mês após sua vigência, 94% dos paulistas apoiam a medida. Mesmo entre os fumantes, a maioria, 87%, é favorável à legislação. Para Paula Johns, diretora
SP: 94% apoiam lei antifumo em vigor
executiva da ACT, organização não-governamental voltada à promoção de ações para a diminuição dos impactos gerados pelo tabaco, a aceitação da lei deve continuar boa, gerando mudanças num padrão de comportamento. “Está sendo feito um esforço inicial de fiscalização, mas depois a medida deve ser adotada como uma norma e não será mais preciso a fiscalizar.” Contra e a favor Os contrários à lei alegam que é uma forma do Estado interferir na liberdade individual, que é inconstitucional, pois se contra-
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
põe à lei federal, e que irá trazer prejuízo aos proprietários de bares, restaurantes e outros estabelecimentos, argumentos que têm sido usados em ações judiciais que tentam barrar as leis de combate ao fumo, porém rejeitadas até agora. “Essas ações usam argumentos muito frágeis. Não há embasamento que comprove a diminuição no lucro dos estabelecimentos. As provas já apresentadas disso têm o dedo da indústria tabagista por trás, são levantamentos bancados por ela. Estudos independentes não demonstram impacto econômico”, diz Paula.
209
S A Ú D E
Ela ainda coloca que a lei antifumo é menos polêmica do que parece ser. “A lei proíbe o fumo em locais fechados do mesmo jeito que somos proibidos de fazer outras coisas em público. Na vida em coletivo, temos muitas restrições”. Paula também aponta que certas discussões desviam o foco da verdadeira razão da medida, como o aspecto da delação, já que é divulgado que as pessoas podem denunciar quem descumpri-la e o Estado de São Paulo, inclusive, colocou um canal para denúncias (0800 771 3541). “É uma lei como outra qualquer, você pode denunciar quem estiver descumprindo qualquer lei.” Os defensores da proibição do fumo em locais fechados também reforçam o lado do que é permitido na lei: fumar ao ar livre, em casa, no carro, em quartos de hotel e outros, e que a lei protege o direito
à saúde do cidadão, garantido pela Constituição e que está acima do direito de fumar. E a queda de braço continua Quanto ao argumento que coloca em dúvida a constitucionalidade das leis estabelecidas em níveis estaduais e municipais, Paula diz “não ser válido, pois a constituição permite que seja legislado sobre assuntos de saúde locais”. E foi assim que o Supremo Tribunal Federal (STF) agiu rejeitando a ação direta de inconstitucionalidade contra a lei antifumo em São Paulo movida pela Associação Brasileira de Restaurantes e Empresas de Entretenimento (Abrasel), em maio. No âmbito federal, em que vale a lei de 1996, que permite a existência de fumódromos em locais fechados, um projeto de lei que estabelece ambientes livres
de fumaça está parado há mais de um ano e meio na Casa Civil. A proposta foi feita pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão, e apoiada em documento por 43 entidades governamentais e nãogovernamentais brasileiras, entre elas, a ABO Nacional. No entanto, contrariamente ao desejo do Ministério da Saúde a Advocacia Geral da União (AGU) enviou ao STF, em agosto, parecer recomendando que a lei antifumo aprovada em São Paulo seja declarada inconstitucional, justamente por ela se contrapor à legislação federal. “O parecer da AGU, além de não observar o mérito da questão, ignora o tratado internacional (da Organização Mundial da Saúde) para controle do tabaco assinado pelo Brasil. A verdadeira lei inconstitucional nesse tema é a federal, defasada e ineficaz”, diz Paula Johns, diretora-executiva da ACT.
Narguilé equivale à inalação de 100 a 200 cigarros
O
tradicional cachimbo d´água usado há milênios nos países do Sudeste Asiático e Oriente Médio, condenado pela OMS, agora é a nova onda entre os jovens, com bares e restaurantes aderindo à moda. Em virtude da mistura de inúmeras essências, o narguilé tem aromas variados. É feito com um fumo especial, usualmente com melaço - um subproduto do açúcar. Alguns dos sabores mais conhecidos são pêssego, maçã-verde, coco, flores e mel. É aspirado via um tubo que reduz a pressão no interior do aparelho, fazendo com que o ar aquecido pelo carvão passe pelo fumo, produzindo a fumaça. Esta desce até a base, onde é resfriada e filtrada pela água, que retém algumas partículas sólidas. A fumaça segue pelo tubo até ser consumida pelo usuário com o sabor da essência escolhida. Segundo dados da Comissão de Tabagismo da Sociedade Paulista de Pneumologia e Ti-siologia (SPPT), o narguilé causa ainda mais males do que o cigarro, pelo potencial de transmitir também doenças infecciosas já que é usado por mais de uma
210
pessoa ao mesmo tempo, sem a devida esterilização. É proibido para menores de 18 anos, assim como o cigarro. Efeitos na saúde Também conhecido como hookah nos países de língua inglesa, ou por shisha no norte da África, o narguilé pode causar diversas doenças, sendo as respiratórias as mais observadas. Especialistas em doenças respiratórias advertem que 50 tragadas são suficientes para viciar, devido à nicotina. Recentes estudos, contrariam a crença popular de que a água ajudaria a fil-trar as impurezas do fumo, tornando-o menos nocivo. A OMS alerta que a fumaça inalada em uma sessão de narguilé, que pode durar entre 20 minutos e uma hora, corresponde à inalação de 100 a 200 cigarros, sendo consumidos até 10 litros de fumaça. Por conter diversas toxinas, pode até causar câncer de pulmão, além de doenças cardíacas, tuberculose, herpes, hepatite e outras. A única forma de minimizar os males causados pelo narguilé é evitar o uso e não aspirar a fumaça, alerta a SPPT.
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
S A Ú D E
A lição de casa do Brasil
Em 2005 o País passou a fazer parte do tratado internacional Convençãoquadro para o Controle do Tabaco. Agora, o governo brasileiro precisa tomar medidas efetivas nesta área para, assim, cumprir o compromisso de que assinou embaixo Imagens fortes em maços de cigarro são estratégia de prevenção adotada pelo Brasil em consonância à CQCT
E
xatamente no dia 3 de novembro de 2005 o governo brasileiro ratificou seu compromisso com a Convenção-quadro para o Controle do Tabaco (CQCT), primeiro tratado internacional de saúde pública desenvolvido sob a orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS). O tratado foi desenvolvido entre 1999 e 2003 e também envolveu 191 países, sendo que o Brasil foi um dos líderes neste processo (mais informações sobre a CQCT na pág. 202).
A CQCT apresenta medidas para reduzir a epidemia do tabagismo em proporções mundiais, assim como as diretrizes para que os países participantes possam implementá-las, a partir de temas como propaganda, publicidade e patrocínio, advertências, marketing, tabagismo passivo, tratamento de fumantes, comércio ilegal e impostos, entre outros. Os progressos e as experiências de cada país devem ser apresentados nas Conferências das Partes, realizadas a cada dois anos, para
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
que o processo possa ser revisto e monitorado. Desde que assinou o tratado, entre as principais medidas do governo brasileiro no intuito de
Maços só com figuras que chocam para provocar reação
211
211
S A Ú D E
EUA: FDA proíbe venda de cigarro com sabor
C
omo resultado efetivo da nova legislação assinada pelo presidente dos EUA, que amplia o controle do governo americano sobre a indústria do cigarro no país, foi proibida a venda de cigarros com sabor (cravo, baunilha, chocolate e outros), pela Food and Drugs Administration (FDA). A nova legislação dá poderes sem precedentes à FDA, que regula a fabricação e a comercialização de remédios, alimentos e, agora, cigarros. Esta é a primeira medida de impacto da FDA contra
cumpri-lo estão as imagens de advertência usadas nas embalagens de cigarro lançadas em 2008 - agora mais impactantes. Segundo o governo federal, as fotos e mensagens foram selecionadas com base em estudo sobre o grau de aversão que a campanha pode alcançar. O cigarro brasileiro também ficou mais caro, entre 20% e 25%, pelo aumento dos impostos que incidem sobre ele. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também proibiu o comércio e a importação do cigarro eletrônico, que, apesar de livrar os fumantes passivos da fumaça, continua representando risco para quem fuma, pois tem nicotina. Além disso, o
o fumo e o objetivo é desestimular o vício entre os jovens. Estão previstas ainda pela nova lei, o controle do nível de nicotina, do tamanho dos anúncios dos produtos, a proibição do uso de termos como light e a colocação obrigatória de alertas nas embalagens dos cigarros. Segundo estimativa do Congresso americano, a FDA poderá a partir de agora determinar medidas para reduzir o fumo entre os menores em até 11% na próxima década. Entre os adultos, a estimativa é de que a redução seja de 2%.
produto é desaconselhado pela OMS e não pode ser considerado um tratamento antitabagismo, como vinha sendo anunciado. Mas ainda falta muito a ser feito pelo Brasil nesta área e uma das medidas mais urgentes é uma lei que proíba o uso do tabaco em ambientes públicos fechados válida para todo o País. No entanto, um projeto de lei neste sentido está esperando para entrar em votação no Congresso Nacional há mais de um ano e meio. Para Paula Johns, diretora executiva da Aliança de Controle do Tabagismo (ACT), o Brasil também precisa evoluir muito ainda em relação às regras de propaganda dos produtos deriva-
dos do tabaco. “A publicidade deve ser restrita aos pontos de venda, mas qualquer lugar pode ser ponto de venda. Isso é uma forma de normalizar o produto. As empresas não podem distribuir cigarros, mas distribuem como brinde junto de outros produtos, por exemplo. Em alguns países, como Tailândia, Canadá e Austrália, é proibida qualquer propaganda de fumo.” Mais informações Site da Convenção-quadro: www.fctc.org Site da ACT: www.actbr.org.br Decreto em que o Brasil ratifica a CQCT: www2.mre.gov.br/ dai/m_5658_2006.htm
Advertência: apelo tem foco na família, na morte e na impotência para conscientizar a população
212
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
S A ร D E
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nยบ 4 - Agosto/setembro 2009
213
214
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nยบ 4 - Agosto/setembro 2009
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
215
Rev. ABO Nac.
Instruções aos autores A Revista ABO Nacional é uma publicação bimestral da Associação Brasileira de Odontologia, dirigida à classe odontológica e aberta à publicação de artigos inéditos de investigação científica, relatos de casos clínicos, resumo de teses, artigos de revisão e/ou atualização, bem como reportagens sobre assuntos diversos relacionados à Odontologia. Os artigos devem ser enviados em cópia impressa e gravados em mídia digital regravável (CD ou disquete), em arquivo de editor de texto compatível com Windows (para PC). 1 - Apresentação dos artigos Os artigos devem ser inéditos, não sendo permitida a sua apresentação simultânea em outro periódico. Reservam-se os direitos autorais do artigo publicado, inclusive de tradução, permitindo-se, entretanto, a sua reprodução como transcrição e com a devida citação da fonte. Todos os artigos são analisados pelo Conselho Editorial Científico que avaliam o mérito do trabalho. Aprovados nesta fase, os artigos são encaminhados ao Conselho Consultivo (revisão por pares) que, quando necessário, indicam as retificações que devem ser feitas antes da edição. Quando houver mais de cinco autores justificar a efetiva contribuição de cada um deles. Os artigos devem atender à política editorial da Revista e às instruções aos autores baseadas no “Uniform Requirements for Manuscripts Submitted to Biomedical Journals”* (estilo Vancouver), elaborado pelo International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE). O idioma do texto pode ser o português, o inglês ou o espanhol, desde que tenha título, palavras-chave e resumo traduzidos para o português, pelo autor. Exigem-se declaração assinada pelo autor, responsabilizando-se pelo trabalho, em seu nome e dos coautores; carta anexa, constando nome, endereço, telefone e e-mail do autor que ficará responsável pela correspondência; duas vias (original e cópia) acompanhadas cada uma das respectivas imagens. Recomenda-se que os autores retenham outra cópia em seu poder. Os artigos devem ser digitados (fonte Times New Roman, corpo 12) e impressos em folha de papel tamanho A4, com espaço duplo e margens laterais de 3 cm e ter até o máximo de 15 laudas com 30 linhas cada (incluindo ilustrações). As ilustrações (gráficos, quadros, desenhos e fotografias) devem ser apresentadas em folhas separadas e numeradas, em algarismos arábicos. Cada tipo de ilustração deve ter a numeração própria seqüencial de cada grupo. As legendas das fotografias, desenhos e gráficos devem ser claras, concisas e localizadas abaixo das ilustrações e precedidas de numeração correspondente. As ilustrações devem ser mencionadas no texto em seguida onde foram citadas, limitadas até o número máximo de 10. As imagens referentes aos trabalhos devem ser apresentadas na dimensão 12 x 9 em contraste correto, em papel. Porém, dá-se preferência a imagens digitalizadas, que devem ter resolução de, no mínimo, 300 DPIs. Não são aceitas imagens no formato cromo ou slides. Não se adota o procedimento de publicação de foto do autor. As tabelas devem ser numeradas, consecutivamente, em algarismos arábicos. As legendas das tabelas e quadros devem ser colocadas na parte superior das mesmas. Não traçar linhas internas horizontais ou verticais. As notas explicativas devem vir no rodapé da tabela. Para unidades de medida usar somente as unidades legais do Sistema Internacional de Unidades (SI). Quanto às abreviaturas e símbolos, utilizar somente abreviaturas padrão. O termo completo deve preceder
a abreviatura quando ela for empregada pela primeira vez, salvo no caso de unidades comuns de medida. As notas de rodapé são indicadas por asteriscos e restritas ao indispensável. 2 -Ética Estudos que envolvam seres humanos, bem como prontuários clínicos, devem ter o consentimento por escrito do paciente e aprovação da Comissão de Ética da Unidade (Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde e seus complementos). 3 - Preparo dos manuscritos Página de identificação: título do artigo e subtítulo em português e inglês (conciso, porém informativo); nome do(s) autor(es), indicando em nota de rodapé um título e uma única filiação por autor, sem abreviaturas e endereço eletrônico. Resumo/Abstract: deve ressaltar o objetivo, o método, os resultados e as conclusões do trabalho. Usar a terceira pessoa do singular e verbo na voz ativa. Os resumos devem ter até 250 palavras, no máximo. Os resumos dos artigos originais devem conter informação estruturada constituída de Introdução – Material e Métodos – Resultados – Conclusões. Para outras categorias, o formato do resumo deve ser o narrativo. Palavras-chave/Key words: identificam o conteúdo dos artigos. Consultar: Descritores em Ciências da Saúde (DeCS/Bireme) disponível em http://decs.bvs.br; Descritores em Odontologia (DeOdonto/SDO-FOUSP); “Medical Subject Headings” (MeSH/Index Medicus). 4 - Estrutura do texto INTRODUÇÃO – Deve ser concisa, explanar os pontos essenciais do assunto e o objetivo do estudo baseado em referências fundamentais. MATERIAL E MÉTODOS – Descreve a seleção dos indivíduos que intervieram na pesquisa, incluindo os controles e os métodos relacionados às etapas da pesquisa. Os métodos e os equipamentos (apresentar nome, cidade, país do fabricante entre parênteses), bem como os fármacos incluindo os nomes genéricos e produtos químicos, devem ser identificados no texto. RESULTADOS – Apresentar os resultados, sempre que possível, subdividido em itens e apoiado em gráficos, tabelas, quadros e figuras. DISCUSSÃO – Enfatizar os aspectos novos e importantes do estudo e não repetir em detalhes, o que já foi citado em Introdução e Resultados. CONCLUSÃO (ÕES) – Vincular as conclusões aos objetivos do estudo e respaldadas pelos dados. Quando for conveniente incluir recomendações. AGRADECIMENTOS – Quando necessários, devem ser mencionados os nomes dos participantes e/ou instituições que contribuíram para o trabalho. Para relato de casos apresentar: INTRODUÇÃO, RELATO DE CASO, DISCUSSÃO e CONCLUSÃO. 5 - Referências (estilo Vancouver) Citar as referências, no máximo 30, por ordem
alfabética de autores e numeradas em ordem crescente (www/nlm.nih.gov/bsd/uniform_require ments.html) Os títulos dos periódicos devem ser abreviados de acordo com o “List of Journals Indexed in Index Medicus” (www.nlm.nih.gov/) Publicações com dois autores até o limite de seis citam-se todos; acima de seis, acrescentar em seguida a expressão et al. Exemplos: Artigo de periódico Brinhole MCP, Teixeira R, Tosta M, Giovanni EM, Costa C, Melo JAJ, et al. Intubação submental: evitando a traqueostomia em cirurgia bucomaxilofacial. Rev Inst Ciênc Saúde. 2005; 23(2):169-72. Artigo de periódico em formato eletrônico Abood S. Quality improvement initiative in nursing homes: the ANA acts in an advisory role. Am J Nurs [serial on the Internet]. 2002 Jun [cited 2002 Aug 12];102(6):[about 3 p.]. Available from: www.nursingworld.org/AJN/2002/june/ Wawatch.htm Livro Newman MG. Carranza periodontia clínica. 9ª ed. Rio de Janeiro : Guanabara Koogan; 2004. Livro em formato eletrônico Marzola C. Transplante e reimplante [CD-ROM]. São Paulo: Pancast; 1997. Dissertação e tese Ferreira TLD. Ultra-sonografia – recurso imaginológico aplicado à Odontologia [dissertação de mestrado]. São Paulo: Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo; 2005. Comunicação pessoal e citação de citação (apud) devem ser evitadas. Quando consideradas essenciais, devem ser citadas no texto e indicadas em notas de rodapé, sem fazer parte da lista de referências. Identificar os autores no texto em algarismos arábicos em forma de potenciação correspondente às referências. Citar os nomes dos autores no texto com seus respectivos números sobrescritos e data entre parênteses só quando for necessário enfatizálos. Quando houver dois autores mencionar ambos ligados pela conjunção “e”, acima de dois, cita-se o primeiro autor seguido da expressão et al. Exemplos: A prótese adesiva foi introduzida há poucas décadas3. Loe et al.2 (1965) comprovaram que o acúmulo de placa bacteriana está relacionado com o desenvolvimento da gengivite. Recomenda-se que incluam também a bibliografia nacional existente. A exatidão das referências é de responsabilidade dos autores.
Enviar originais dos artigos para: Sede Administrativa da ABO Nacional Rua Vergueiro, 3153, Conj. 82 - 04101-300 - São Paulo - SP - Brasil - Telefax: (+5511) 5083-4000 E-mail: abonacional@uol.com.br
* Uniform Requirements Rev. for Manuscripts Submitted Biomedical Journals. Bethesda 2009 : NLM; 2005 [updated 2005 Oct; cited 2005 Oct 24]. Available from: http://www.icmje.org/215 ABO Nac. - Vol.to17 nº 4 - Agosto/setembro
216
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Artigo original
Tratamento das lesões cariosas em dentina de molares decíduos: uma pesquisa entre odontopediatras Treatment of primary molar decay lesions in dentin: a research among the pediatric dentists Palavras-chave: Cárie dentária/terapia. Cárie dentária/diagnóstico. Doença crônica. Key words: Dental caries/therapy. Dental caries/diagnosis. Chronic disease.
Eliane Batista de Medeiros* Aronita Rosenblatt**
RESUMO
Introdução - O objetivo do estudo foi comparar a conduta terapêutica frente à lesão de cárie crônica (caso clínico 1) e à lesão de cárie aguda (caso clínico 2) entre 75 Odontopediatras da cidade do Recife e suas associações com os dados pessoais e profissionais do entrevistado. Materiais e Métodos - O desenho do estudo foi transversal, observacional e a amostra censitária. Os casos clínicos foram apresentados na forma de fotografia 10 x 15 e sua respectiva radiografia periapical e as informações coletadas através de entrevista e registradas em um formulário. Para avaliar a significância estatística da associação, foram utilizados o teste exato de Fisher-Freeman-Halton e o teste qui-quadrado com o nível de confiança de 5% e o valor de p<0,05. Resultados - Os resultados mostraram que 76% e 97,3% dos profissionais indicaram tratamento invasivo para o caso clínico 1 e 2, respectivamente. Os odontopediatras que trabalhavam simultaneamente em local público e privado indicaram menos tratamento invasivo para a cárie crônica (45,5%) do que os que apenas trabalhavam em local público (86,5%) ou privado (80%). Conclusão - Apesar da lesão de cárie crônica ser um processo de defesa da polpa, a maioria dos odontopediatras recifenses ainda realiza tratamento invasivo desnecessário. ABSTRACT
Introduction - The AIM of the present study was to compare treatment decisions for arrested caries lesion (clinical case 1) and for active caries lesion (clinical case 2) among 75 pedodontists from the city of Recife in relation to their educational background and type of employment. Materials and Methods - All information was collected by interview. The clinical cases consisted of a photograph and a periapical radiograph. The Fisher-FreemanHalton and the chi-square tests were used to examine the differences in proportions and correlations between variables. The level of significance was set at 5% and p valor <0.05. Results - The results showed that of the dentists interviewed, 76% and 97.3% would employ an invasive approach for clinical case 1 and 2, respectively. In relation to type of employment, pedodontists who worked both publicly and privately were found to be less likely to employ an invasive procedure for clinical case 1 (45.5%) than those who worked only publicly (86.5%) or privately (80%). Conclusions - In spite of the arrested caries is a defense process of the pulp most of Recife’s pedodontists still employ an unnecessary invasive approach for it INTRODUÇÃO * Professora Adjunta da Disciplina de Odontopediatria da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). E-mail: elibmedeiros@yahoo.com.br ** Professora Titular da Disciplina de Odontopediatria da Faculdade de Odontologia da Universidade de Pernambuco. E-mail: rosen@nlink. com.br
A prevalência da cárie dentária vem sofrendo um declínio nas últimas décadas. Algumas das possíveis razões para esse fato são: a utilização do flúor nas suas diversas formas e as mudanças no diagnóstico da cárie. Embora tenha havido
uma melhora substancial na saúde bucal em vários locais e em todos os grupos sociais, uma quantidade significativa de pessoas ainda sofre de problemas odontológicos. Mudou não só a prevalência, mas também, a velocidade de progressão das lesões, ou seja, hoje existem muito menos
Rev. ABO Nac. - Vol.uma 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009 de molares decíduos: pesquisa entre odontopediatras 216 Medeiros, Eliane Batista de et al. Tratamento das lesões cariosas em dentina
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
cavidades de cárie, situando-se a maioria na superfície oclusal, e as lesões progridem de forma mais lenta14. Para se estabelecer o tratamento das lesões cariosas, faz-se necessário acrescentar a distinção da atividade da lesão para assim refletir melhor a sua natureza dinâmica10,13,16. Segundo Levine7 (1973) a lesão cariosa crônica, embora seja um processo de cicatrização natural, ainda não está evidente porque o seu progresso é mais lento. Apesar de a presença de tais lesões estar associada à melhoria na higiene bucal, alteração na dieta e autolimpeza, há evidências de que o tecido orgânico na lesão crônica é intrinsecamente mais resistente ao processo carioso. Esse mesmo estudo, observou que as lesões cariosas crônicas em dentina são caracterizadas por uma zona superficial rica em flúor, o que auxilia contra os ataques cariosos subseqüentes. Young e Massler17 (1963) relataram, ainda, que a dentina da cárie crônica é mais resistente à solução ácida e ao ataque das enzimas proteolíticas, do que a da cárie ativa e sadia. Quanto ao tratamento frente a um processo carioso crônico, ainda existem algumas controvérsias. Alguns autores acreditam que as lesões inativas/crônicas não requerem nenhum tipo de intervenção, apenas a manutenção da boa higiene bucal 9, 13. O aparecimento de tecido dentinário escurecido em processos cariosos crônicos é um processo de defesa da polpa e indicativo de procedimento conservador para o complexo dentina–polpa. Isto é, a camada dentinária escura deve ser preservada, e a conduta terapêutica de escolha é a adoção de sistemas restauradores adesivos ao esmalte e à dentina. A remoção da dentina reacional escurecida se constitui em uma agressão adicional, somada à remoção cirúrgica de tecido vital10. Deste modo, o objetivo desta pesquisa foi verificar a conduta clínica realizada frente à lesão de cárie crônica e à lesão de cárie aguda em dentina de molares decíduos, dos odontopediatras da cidade do Recife e suas associações com a faculdade de graduação, tempo de formado,
217
Rev. ABO Nac.
titulação do profissional e seu local de trabalho. MATERIAIS E MÉTODOS
Tratou-se de um estudo observacional, transversal. A população estudada foi constituída de 75 cirurgiões-dentistas. Para participar da pesquisa, o profissional atendeu aos seguintes critérios: a) Estar registrado no CRO – PE como odontopediatra até setembro de 2002; b) residir na Grande Recife (Recife, Olinda e Jaboatão dos Guararapes); c) possuir atividade clínica em Odontopediatria na cidade do Recife; d) não estar direta ou indiretamente envolvido com a pesquisa, para evitar vieses e comprometer os resultados da pesquisa. Foi considerada perda da amostra, quando o cirurgião-dentista não autorizou sua inclusão no estudo e/ou quando a pesquisadora não conseguiu localizar o profissional por mudança de endereço e/ ou telefone. Foi obtida, no CRO - PE, uma listagem com os nomes, endereços e telefones de todos os odontopediatras registrados, perfazendo um total de 116 profissionais. De acordo com essa listagem, e após contato por telefone, verificou-se que 26 odontopediatras não preenchiam os critérios de inclusão. Totalizou, dessa forma, uma amostra de 90 odontopediatras para a realização da pesquisa. Dentre os 90 odontopediatras selecionados para a pesquisa, oito não aceitaram participar da pesquisa, e sete não foram localizados. Obtida uma perda de 16,6%. A população finalizou, então, em 75 odontopediatras. Exame clínico para a seleção dos casos clínicos
Os dentes foram selecionados após a realização do exame clínico bucal em escolares da rede pública do Recife. Em seguida, em ambiente odontológico, foram realizados, o exame radiográfico e a fotografia digital. Os critérios clínicos de Miller12 (1959) foram utilizados para o diagnóstico clínico
da atividade das lesões cariosas em dentina adaptados por outros estudos4, 10, 13 : Lesão de cárie crônica: possui pigmentação superficial escura; a consistência da camada superficial é dura e até mesmo ebúrnea; normalmente é assintomática; seu progresso é lento e intermitente; o tipo de dentina sob a camada superficial é assintomática, esclerótica e pigmentada. Lesão de cárie ativa: possui pigmentação superficial clara; a consistência da camada superficial é macia, friável com massa necrótica; normalmente é sensível ao frio, a doces e a ácidos; seu progresso é rápido, geralmente expõe a polpa; o tipo de dentina sob a camada superficial é sensível e descalcificada. Os dois casos clínicos selecionados estavam presentes na mesma criança - uma menina de cinco anos de idade. A lesão de cárie em dentina do elemento dentário 74 apresentava-se escurecida, com aspecto endurecido tendo a criança e o acompanhante relatado não haver qualquer queixa de dor, o que caracterizava lesão de cárie crônica (caso clínico 1). Figuras 1 e 2. A lesão cariosa em dentina do elemento 75 apresentava-se com uma pigmentação mais clara, acastanhada, com uma consistência amolecida e uma extensa destruição coronária com comprometimento pulpar, tendo o acompanhante da criança e a própria relatado uma sensibilidade térmica, confirmada durante a profilaxia realizada pela pesquisadora, caracterizando lesão de cárie aguda (caso clínico 2). (Figuras 1 e 2) Procedimentos técnicos
Para a realização deste trabalho, concedeu-se aos participantes da pesquisa a prévia autorização por meio da assinatura dos termos de consentimento livre e esclarecido pelos diretores das escolas e creches e pelos responsáveis da criança. Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade de Pernambuco pelo Parecer nº 172-02. Os dados foram coletados no local de trabalho dos odontopediatras por meio de visitas aleatórias a várias instituições que
Rev.deABO - Vol. das 17 nº 4 - Agosto/setembro Medeiros, Eliane Batista et al. Nac. Tratamento lesões cariosas em dentina2009 de molares decíduos: uma pesquisa entre odontopediatras
217
218
Rev. ABO Nac.
Fig. 1 - Fotografia das lesões de cáries crônica e aguda
possuíam o atendimento odontológico especializado e simultaneamente, agendamento da entrevista por telefone no local e hora da disponibilidade dos profissionais. Inicialmente foi realizado o estudo piloto com 10 odontopediatras para a validação do formulário e testar a fidedignidade das respostas das entrevistas verbais. As informações coletadas foram registradas em um formulário padronizado, elaborado para esse estudo. Esse documento constou de duas partes: a primeira, com perguntas direcionadas à identificação geral do pesquisado, no qual foi preenchida a idade, o gênero do cirurgião-dentista, a faculdade onde se formou, o ano da graduação, títulos obtidos em Odontopediatria e o local de trabalho. A segunda parte foi preenchida após a apresentação dos dois casos clínicos – a lesão cariosa aguda e a lesão cariosa crônica - na forma de uma única fotografia 10 x 15, tirada com a câmara Ricoh KR-Super II e sua respectiva radiografia periapical. Adicionalmente, descreveu-se o seguinte:
A paciente G. M. S., 5 anos de idade, peso 17 kg, baixo status socioeconômico, higiene oral mal praticada (presença de biofilme visível durante os dois exames clínicos e escovação realizada 1-2 vezes ao dia pela própria criança) apresentava ausência de sintomatologia dolorosa no primeiro molar inferior esquerdo decíduo (74) e presença de sintomatologia espon-
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Fig. 2 - Radiografia das lesões de cáries crônica e aguda
tânea no segundo molar inferior esquerdo decíduo (75). Com base na fotografia, na radiografia e no relato do caso, os odontopediatras responderam sobre o seu diagnóstico e a sua conduta terapêutica em relação a esses casos clínicos que foram anotados. O tratamento relatado pelo profissional foi categorizado em invasivo e não invasivo, levando em consideração o fato de ter havido ou não o uso da broca. Tratamento não invasivo: utilização de curetas com o intuito de remover detritos da superfície dentinária e/ou aplicação de flúor. Tratamento invasivo: a utilização de brocas com o intuito de remover toda a lesão cariosa e/ou realização de tratamento endodôntico. Os dados foram apresentados em tabelas de contingência, e as associações entre variáveis foram avaliadas pelo teste quiquadrado ou pelo teste exato de FisherFreeman-Halton. O nível de significância adotado foi 5%. Quando uma associação foi estatisticamente significante, realizou-se uma análise dos resíduos ajustados para identificar as possíveis fontes de associação. RESULTADOS
A população estudada constou de 75 odontopediatras, com idades variando entre 26 a 67 anos, maior predominância da faixa etária entre 31 a 40 anos (38,7%) e a média de 39,2 anos. Sessenta e nove (92%) pertenciam ao gênero feminino.
Em relação à instituição de graduação em Odontologia, 39 (52%) dos profissionais formaram-se em Universidade Federal e 36 (48%) em Universidade Estadual. Verificou-se que para 60 (80%) dos profissionais a maior titulação em Odontopediatria foi de especialista, seguido de 10 (13,3%) de Mestre e de cinco (6,7%) de Doutor. Dos pesquisados, oito (10,7%) estavam formados a menos de cinco anos; 21 (28%) entre 6 a 15 anos; 32 (42,7%) entre 16 a 25 anos e 14 (18,7%) a mais de 26 anos. Entre os odontopediatras pesquisados, 37 (49,3%) trabalham mais tempo durante a semana no setor público, 26 (34,7%) no setor privado e 12 (16,0%) em ambos os setores. As Tabelas 1 e 2 descrevem o diagnóstico relatado pelos odontopediatras para os casos clínicos 1 e 2. Dos odontopediatras pesquisados, 57 (76%) realizam tratamento invasivo em lesões cariosas crônicas. Todos os Odontopediatras que responderam a entrevista realizam tratamento invasivo em lesão de cárie aguda extensa. Não foram realizados cruzamentos com o tratamento do caso clínico 2 porque todos os odontopediatras, que responderam, adotaram abordagem invasiva. Houve associação estatisticamente significante entre o local de trabalho e o tratamento da lesão cariosa crônica (p = 0,019; Tabela 3). A análise dos resíduos ajustados revela que, em comparação com
Rev. ABO Nac. - Vol.uma 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009 218 Medeiros, Eliane Batista de et al. Tratamento das lesões cariosas em dentina de molares decíduos: pesquisa entre odontopediatras
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
o previsto pela hipótese de homogeneidade, houve uma menor proporção de tratamento invasivo entre os odontopediatras que tem ambos os tipos de trabalho. Não houve associação estatisticamente significante entre as seguintes variáveis: tempo de graduação (p = 0,936), o título em Odontopediatria (p = 0,165), a faculdade de graduação (p = 0,704) e o tratamento da cárie crônica. DISCUSSÃO
Sabe-se que para o tratamento adequado de uma doença é fundamental o estabelecimento de seu correto diagnóstico. No entanto, apesar de a cárie dentária ser uma doença com um padrão de ocorrência alto e existirem vários métodos diagnósticos disponíveis, ainda hoje é frequente a variação entre os cirurgiões-dentistas para a mesma lesão15-16. Em um estudo com metodologia similar, realizado no Macapá-AP, apenas 28,1% dos 96 clínicos gerais que atendiam crianças, diagnosticaram a cárie crônica, porém 98,9% souberam diagnosticar a lesão de cárie aguda15. Na pesquisa atual, foi diagnosticado por 50,7% dos odontopediatras como cárie crônica o caso clínico 1 e 42,7% como cárie aguda o caso clínico 2 (Tabelas 1 e 2). Na presente pesquisa, não houve diferença significante entre o tempo de formado e o tratamento eleito pelos odontopediatras para a cárie oclusal crônica, o que está de acordo com outros resultados11, 15. Entre os critérios clínicos utilizados para o diagnóstico e a remoção do tecido cariado, a cor e a consistência da lesão cariosa são utilizados com sucesso5,8, seguido da sintomatologia e a atividade como ótimos indicadores do estado pulpar4, 10. Os autores supracitados consideram esses critérios seguros para o estabelecimento da atividade cariosa e subsequente planejamento do tratamento. Um dado interessante foi que, 76% dos odontopediatras indicaram para a lesão de cárie crônica o mesmo tratamento da cárie aguda, isto é, o invasivo. Existem vários estudos clínicos demonstrando que, para o controle da doen-
219
Rev. ABO Nac.
DIAGNÓSTICO
N
%
Cárie/cárie profunda Cárie ativa/aguda Cárie inativa/crônica Cárie com comprometimento pulpar Cárie crônica com comprometimento pulpar Não respondeu
18 5 33 13 5 1
24,0 6,7 44,0 17,3 6,7 1,3
TOTAL
75
100,0
DIAGNÓSTICO
N
%
Cárie/cárie profunda Cárie ativa/aguda Pulpite Cárie com comprometimento pulpar Cárie aguda com comprometimento pulpar Não respondeu
11 23 6 25 9 1
14,7 30,7 8,0 33,3 12,0 1,3
TOTAL
75
100,0
Tabela 1 - Relação do diagnóstico do caso clínico 1
Tabela 2 - Relação do diagnóstico do caso clínico 2
Tratamento da cárie crônica Trabalho Público Privado Ambos Total
Não invasivo
Invasivo
Total
5 (13,5%) 5 (20,0%) 6 (54,5%) 16 (21,9%)
32 (86,5%) 20 (80,0%) 5 (45,5%) 57 (78,1%)
37 (100,0%) 25 (100,0%) 11 (100,0%) 73* (100,0%)
* Dois odontopediatras não responderam ao tratamento da cárie crônica Tabela 3 - Distribuição dos odontopediatras entrevistados, segundo o local de trabalho e o tratamento da cárie crônica
ça cárie, dependendo do seu estágio, não se faz necessário o uso de procedimentos invasivos. Assim, não se danifica os odontoblastos, os responsáveis pela formação da melhor barreira de proteção pulpar, melhor do qualquer material restaurador1- 2. Resultados semelhantes foram encontrados por Silva15 (2002), quando 74% dos clínicos gerais da cidade do Macapá realizaram procedimentos invasivos em caso de lesão cariosa com dentina secundária irregular. Neste trabalho, houve uma menor proporção de indicação de tratamento invasivo para a cárie crônica por parte dos odontopediatras que trabalham no setor públi-
co e privado, que foi estatisticamente significante, seguido dos profissionais que apenas trabalham no setor privado, sendo mais invasivos os profissionais que trabalham apenas no setor público (Tabela 3). No Brasil, e principalmente na região Nordeste, onde foi realizada a atual pesquisa, a cárie encontra-se polarizada, havendo uma diferença entre os pacientes que freqüentam o atendimento público e o privado, sendo os primeiros geralmente com baixo status socioeconômico e com uma alta prevalência de cárie14. Na Suíça, os cirurgiões-dentistas que atendem no setor público geralmente atendem crian-
Rev.deABO - Vol. das 17 nº 4 - Agosto/setembro Medeiros, Eliane Batista et al.Nac. Tratamento lesões cariosas em dentina2009 de molares decíduos: uma pesquisa entre odontopediatras
219
220
Rev. ABO Nac.
ças apresentando poucas lesões de cárie, todavia Mejàre et al.11. (1999) encontraram o inverso, os cirurgiões-dentistas do setor privado indicaram um tratamento restaurador mais cedo para as lesões proximais que os do setor público. Os resultados desse trabalho servem como um alerta, pois os odontopediatras que possuem uma formação voltada à prevenção, apesar de diagnosticarem uma lesão como inativa, continuam a executar um tratamento não conservador que trará, certamente danos maiores, se não, a necessidade de um tratamento endodôntico. Em relação ao tratamento do caso clínico 2, todos os odontopediatras responderam que fariam um tratamento invasivo. Existem vários métodos para cronificar uma lesão de cárie aguda, e deste modo, evitar o tratamento endodôntico, entre eles, encontram-se a técnica do preparo escalonado/gradativo2, 8, o uso de flúor e da clorexidina e o controle dos fatores etiológicos da doença13. Contudo, não se aplicam à cárie aguda desse estudo, visto que esta já apresenta uma grande destruição coronária, com um extenso comprometimento pulpar, portanto, indicativa de um tratamento endodôntico. A atitude terapêutica dos odontopediatras da cidade do Recife é, preferencialmente, a remoção total da lesão cariosa, independente de sua atividade, até que se chegue a uma dentina “sadia”, conduta apoiada por alguns estudos3,6. Todavia, muito ainda deve ser estudado, e principalmente divulgado, no intuito de minimizar o sobretratamento, que além de comprometer o tecido dentário sadio e aumentar os custos, não promove a melhoria da saúde bucal das crianças.
CONCLUSÕES
Com base nos resultados obtidos, podese concluir que: 1. O dente que apresentava dentina de reparação (caso clínico 1) e o dente que apresentava lesão de cárie aguda extensa (caso clínico 2) receberam o diagnóstico de cárie inativa/crônica e de cárie com comprometimento pulpar, respectivamente, pela maioria dos odontopediatras. 2. O tratamento invasivo foi recomendado pela maioria dos odontopediatras para o dente com lesão de cárie crônica e por todos os odontopediatras que responderam para o dente com lesão de cárie aguda extensa. 3. Entre as variáveis estudadas em relação ao tratamento do dente com lesão de cárie crônica, houve uma menor proporção de tratamento invasivo entre os odontopediatras que trabalhavam no setor público e privado simultaneamente. AGRADECIMENTOS
Ao CNPQ por ter concedido a bolsa de pesquisa possibilitando o desenvolvimento deste trabalho. REFERÊNCIAS 1. About I, Murray PE, Franquin J.-C, Remusat M, Smith AJ. The effect of cavity restoration variables on odontoblast cell numbers and dental repair. J Dent. 2001;29(2):109-17. 2. Bjorndal L. Dentin caries: progression and clinical management. Oper Dent. 2002; 27(3):211-7. 3. Christensen GJ. Lesões iniciais de cárie: quando restaurar? J Am Dent Assoc Brasil. 2001;4:43-5. 4. Di Nicoló R, Rocha JC, Becker JBM, Ramos CJ. Correlação dos sintomas clínicos e a reação histológica pulpar de molares decíduos cariados. Rev Fac Odontol Univ Passo Fundo. 2001;6 (2):29-32.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
5. Fejerskov O. Concepts of dental caries and their consequences for understanding the disease. Community Dent Oral Epidemiol. 1997;25(1):5-12. 6. Hasselgren G, Calev D. Caries and dentin: myths & consequences. N Y State Dent J. 1999;65(6):32-3. 7. Levine RS. The differential inorganic composition of dentine within active and arrested carious lesions. Caries Res. 1973;7 (3):245-60. 8. Maltz M, Oliveira EF, Fontanella V, Bianchi R. A clinical, microbiologic, and radiographic study of deep caries lesions after incomplete caries removal. Quintessence Int. 2002;33(2):151-9. 9. Medeiros EB, Menezes J, Rosenblatt A. Clinical evaluation of atraumatic restorations in primary molars: a comparison between two glass ionomer cement. J Dent Child. 2006;73:91-7. 10. Medeiros EB, Rosenblatt A. Considerações atuais sobre cárie crônica. RGO (Porto Alegre). 2007;55(2):203-8. 11. Mejàre I, Sundberg H, Espelid I, Tveit B. Caries assessment and restorative treatment thresholds reported by Swedish dentists. Acta Odontol Scand. 1999;57(3):149-54. 12. Miller WA. Layering in dentin caries as demonstrated by localization of dyes [Master Dissertation] Illinois: University of Illinois; 1959. 13. Nyvad B, Fejerskov O. Assessing the stage of caries lesion activity on the basis of clinical and microbiological examination. Community Dent Oral Epidemiol. 1997;25 (1):69-75. 14. Pinto VG. Saúde bucal coletiva. 4 ª ed. São Paulo: Santos; 2000. 15. Silva AH L. Diagnóstico e tratamento da dentina secundária escurecida em molares decíduos [Monografia de Especialização em Odontopediatria] Recife: Faculdade de Odontologia de Pernambuco, Universidade de Pernambuco; 2002. 16. Silva BB, Maltz M, Franco F. Diagnóstico e tratamento da cárie de superfície oclusal: variação entre examinadores. Rev Assoc Paul Cir Dent. 1994;48(1):1231-4. 17. Young MA, Massler M. Some physical and chemical characteristics of carious dentine. Br Dent J. 1963;115(10):406-12.
Rev. ABO Nac. - Vol.uma 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009 220 Medeiros, Eliane Batista de et al. Tratamento das lesões cariosas em dentina de molares decíduos: pesquisa entre odontopediatras
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Rev. ABO Nac.
221
Artigo original
Avaliação da alteração dimensional de modelos de gesso obtidos de moldes de alginato desinfetados com soluções de mamona Dimensional alteration of gypsum casts obtained by disinfected alginate impressions with castor oil derived solutions Palavras-chave: Materiais para moldagem odontológica, Sulfato de cálcio. Desinfecção. Óleo de rícino. Key words: Dental impression materials, Calcium sulfato. Disinfection. Castor oil.
Iara Augusta Orsi* Fabíola Rejane Zanin** Carla Moreto Santos***
RESUMO
Introdução - O objetivo desse estudo foi avaliar a alteração dimensional de modelos totais confeccionados com dois tipos de gesso após desinfecção dos moldes de alginato com soluções derivadas de óleo de mamona. Material e Método - Para simular o arco superior foi confeccionado um modelo mestre em resina acrílica termopolimerizável, com quatro parafusos sextavados de aço inoxidável; dois posicionados na região de prémolar e dois, na região de molar, simulando elementos dentais. A partir desse modelo foram obtidas moldagens com moldeiras individuais de resina acrílica e alginato (Hydrogum). Para cada grupo foram confeccionados 10 moldes, sendo cinco modelados com gesso tipo IV (Durone) e cinco com gesso modificado por resina (Tuff Rock). Os moldes foram submetidos a diferentes tratamentos de acordo com o seu grupo. Grupo Controle - sem tratamento; Grupo A - desinfecção com hipoclorito de sódio a 1%; Grupo B - desinfecção com solução de óleo de mamona (Perioquil); Grupo C - desinfecção com solução de óleo de mamona (Poliquil Crost). Para verificar a alteração dimensional, os modelos foram posicionados no microscópio de dupla coordenada e realizadas mensurações entre preparos nas posições: anterior (prépré), posterior (molar-molar) e duas laterais (molar-pré). Resultados - Os resultados foram submetidos à ANOVA (Tukey) e mostraram que os modelos obtidos a partir do gesso Tuff Rock apresentaram contração dimensional estatisticamente menor (p<0,01) (0,058%) que aqueles obtidos a partir de gesso Durone (0,295%). Conclusão - Concluise que os modelos confeccionados com gesso Tuff Rock apresentaram menor contração dimensional e que as diferentes soluções desinfetantes não geraram alterações dimensionais significantes nos modelos de gesso. ABSTRACT
* Professora Associada do Departamento de Materiais Dentários e Prótese, Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo (FORP-USP). E-mail: iaraorsi@forp. usp.br ** Mestre em Odontologia- Área de Concentração Reabilitação Oral da FORP-USP. E-mail: zanin.fabiola@gmail.com *** Doutora em Odontologia- Área de Concentração Reabilitação Oral da FORP-USP. E-mail: carlamoreto@forp.usp.br
Introduction - This study was conducted to evaluate the dimensional alteration of total models made of two kinds of dental stone, after disinfection of alginate impressions with different solutions derived from castor oil. Material and Method - On a master model of heat-polymerizing acrylic resin prepared to simulate the superior ach, four hexagonal screws were mounted simulating the dental elements, disposed in the premolar and molar regions, respectively. Impressions of this model were obtained with custom trays made of acrylic resin and alginate (Hydrogum). Ten impressions, five of them modeled in type IV-dental stone (Durone), and the other five in resin-modified dental stone (Tuff Rock), were used in each experimental group. The treatments were: Group A – disinfection with 1% sodium hypochlorite; Group B – disinfection with castor
ABO Nac. - Vol. 17dimensional nº 4 - Agosto/setembro Orsi, Iara Augusta etRev. al. Avaliação da alteração de modelos de2009 gesso obtidos de moldes de alginato desinfetados com soluções de mamona
221
222
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
oil solution (Perioquil); Group C: disinfection with castor oil solution (Poliquil Crost), and the control group. The models were observed under a double-coordinate microscope to verify their dimensional alteration, and the measurements were done in anterior positions (premolar-premolar), in posterior positions (molar-molar) and in two lateral positions (molar-pre). The results were analyzed with ANOVA (Tukey). Results - These results showed that Tuff Rock die stone contracted significant less (p<0,01) (0,058%) than Durone die stone (0,295%). Conclusion - Tuff Rock casts suffered less dimensional changes than Durone casts. The disinfection conditions caused no significant dimensional changes casts.
INTRODUÇÃO
A preocupação com a transmissão de microrganismos patogênicos e doenças infecciosas no consultório odontológico aumentou significantemente nos últimos anos. Isso resultou em um esforço contínuo para identificar e eliminar as vias de transmissão e contaminação cruzada para hepatites A e B, tuberculose, herpes, e Aids6,8-9,19,22. Os moldes odontológicos são contaminados por saliva, biofilme dentário, e às vezes sangue, representando um foco potencial para transmissão de microrganismos nos modelos de gesso 7,10,14,17. O alginato é o material mais utilizado em Odontologia e devido à sua natureza hidrofílica, é o material de moldagem que retém o maior número de bactérias16. Para evitar a contaminação da equipe do consultório e laboratório odontológicos, tem sido recomendado que os moldes sejam desinfetados imediatamente após a sua remoção da cavidade bucal1. A eficácia do desinfetante depende do período de ação do agente sobre a superfície do molde e da concentração do produto. O procedimento de desinfecção não deve afetar adversamente a precisão dimensional ou detalhes superficiais do molde, contudo, a composição e concentração do desinfetante, o período de exposição12-13 e a compatibilidade dos vários desinfetantes com os materiais específicos, podem afetar as propriedades dos materiais de moldagem15. A instabilidade dimensional do hidrocolóide irreversível impõe limitações na duração do procedimento e na escolha do agente desinfetante3. Para hidrocolóides irreversíveis a American Dental Associa-
tion1 (1996), recomenda borrifar o agente desinfetante sobre o molde e armazená-lo em um saco plástico fechado, por 10 minutos. A desinfecção por imersão desses materiais causa distorções, devido à capacidade do alginato em absorver água 18,21,23. A desinfecção com spray de hipoclorito de sódio a 1% tem sido usada com hidrocolóide irreversível, porque propicia pequena alteração dimensional dos moldes18,20. Estudos foram realizados combinando diversos tipos de material de moldagem e de agentes desinfetantes, para a avaliação das alterações dimensionais que o desinfetante poderia gerar sobre o molde, e consequentemente sobre os modelos de gesso2,5-6,16,18,20. Soluções derivadas do óleo de mamona com propriedades antimicrobianas foram estudadas 11, mas não há na literatura, estudos dos seus efeitos sobre a estabilidade dimensional dos moldes de alginato. O objetivo desse estudo foi avaliar a alteração dimensional de modelos totais confeccionados com dois tipos de gesso, após a desinfecção de moldes de alginato com soluções derivadas do óleo de mamona e hipoclorito de sódio. MATERIAL E MÉTODO Preparo dos modelos
Um modelo mestre foi confeccionado em resina acrílica termopolimerizável para simular a arcada superior. Quatro parafusos sextavados de aço inoxidável foram posicionados nesse modelo representando elementos dentais, dois parafusos foram posicionados na região dos primeiros molares superiores e dois na região dos pré-molares. Todas as superfícies oclusais
estavam localizadas em um mesmo plano (Figura 1). Para a realização das moldagens foram confeccionadas moldeiras individuais, com espaço interno de 3,0 mm e perfurações, para reter mecanicamente o alginato. O hidrocolóide irreversível (Hydrogum, Zhermak, Badia Polesine - Rovigo - Itália) foi proporcionado e espatulado manualmente de acordo com as instruções do fabricante. Após a manipulação, o alginato era inserido na moldeira individual e esta, assentada sobre o modelo mestre. Após a geleificação do alginato, o molde era removido, enxaguado em água corrente e o excesso de água retirado com jatos de ar da seringa tríplice. A seguir os moldes foram divididos em quatro grupos, de acordo com os agentes químicos utilizados: Grupo I – Controle (sem tratamento), Grupo II – Hipoclorito de sódio a 1% (Rioquímica, São José do Rio Preto, Brasil), Grupo III – Perioquil (Poliquil, Araraquara, Brasil) e, Grupo IV – Poliquil Crost (Poliquil, Araraquara, Brasil). Os moldes eram borrifados com os agentes químicos determinados para cada grupo, e armazenados em sacos plásticos fechados por 10 minutos. Decorrido esse período, eram enxaguados em água corrente para a remoção do desinfetante e o excesso de água removido com jatos de ar. O grupo controle não recebeu tratamento com solução desinfetante, era apenas enxaguado em água. Foram obtidos 10 moldes para cada grupo, sendo cinco modelados com gesso Durone (Dentsply, Petrópolis-RJ, Brasil) e cinco com gesso Tuff Rock fórmula 44 (Talladium do Brasil, Curitiba-PR, Brasil). Os moldes foram mantidos em umidificador até a presa final
Orsi, Iara Augusta moldes de Nac. alginato desinfetados soluções de mamona ABO - Vol. 17 nº 4 -com Agosto/setembro 2009 222 et al. Avaliação da alteração dimensional de modelos de gesso obtidos deRev.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Fig. 1 - Modelo mestre em resina termopolimerizável
dos gessos tipos IV e III, usados nas regiões dos dentes e base, respectivamente. Vinte e quatro horas após a confecção, os modelos foram recortados e numerados para identificação. Mensuração dos modelos
Para verificar a alteração dimensional, os modelos foram posicionados no microscópio de dupla coordenada (Carl-Zeiss, Jena, Alemanha) e realizadas mensurações nas regiões: anterior (pré-molar a prémolar, 2-3), posterior (molar a molar, 41), e duas mensurações laterais na região de pré-molar a molar (1-2 e 3-4) (Figura 2). Entre as duas mensurações laterais foi calculada a média para a obtenção de uma única medida lateral. Foram realizadas três mensurações de cada região e a média desses valores foi utilizada no cálculo da alteração dimensional. Os valores da porcentagem de alteração dimensional (contração ou expansão) das regiões mensuradas nos modelos desinfetados em relação ao controle, empregados na análise estatística foram obtidos por meio da fórmula: D1 – D0
x 100
D0 D1 = medida do modelo após desinfecção do molde.
223
Rev. ABO Nac.
Fig. 2 - Esquema representativo das regiões mensuradas no modelo mestre
D0 = medida do modelo controle (molde sem desinfecção). RESULTADOS
Os testes estatísticos preliminares evidenciaram que a amostra era normal e homogênea, sendo empregada a Análise de Variância (Tabela 1). A Análise de Variância (Tabela 1) evidenciou que os modelos obtidos a partir do gesso Tuff Rock apresentaram contração dimensional estatisticamente menor (p<0,01) (0,058%) que aqueles obtidos a partir de gesso Durone (0,295%). Não houve diferença estatisticamente significante (p>0,05) entre, os fatores, regiões dos modelos e soluções desinfetantes, analisadas. DISCUSSÃO
A desinfecção de moldes deve ser uma prática rotineira para controle de infecção no consultório e laboratório odontológicos, pois vários estudos comprovaram a transferência de microrganismos da cavidade bucal para materiais de moldagem 7,14. Novas opções de soluções desinfetantes têm sido introduzidas no mercado, como Perioquil e Poliquil Crost, que são derivadas da planta tropical Ricinus comunis, também conhecida como mamona. A solução Perioquil é um agente irri-
gante periodontal com atividade bactericida e bacteriostática e a solução Poliquil Crost é um desinfetante hospitalar. Outras soluções à base de óleo de mamona vêm sendo utilizadas na desinfecção de canais radiculares e mostraram atividade antimicrobiana satisfatória com capacidade de dissolução de biofilme11. De acordo com os resultados, não houve alteração dimensional significante entre as diferentes regiões mensuradas nos modelos obtidos após desinfecção de moldes de alginato com spray de soluções desinfetantes. A análise das médias dos valores percentuais de alteração dimensional das regiões avaliadas evidenciou que a região posterior foi a que apresentou menor alteração dimensional, contração de 0,07%, enquanto as regiões laterais e anterior apresentaram contrações médias de 0,24% e 0,21%, respectivamente, mas sem diferença estatisticamente significante entre elas. Tan et al. 20 (1993), também obtiveram, em seu estudo, menores valores de alteração dimensional na região posterior dos modelos. Esse resultado pode ser explicado pela dinâmica que existe no momento em que o molde é removido da cavidade bucal. O cabo fixado na região anterior da moldeira propicia maior concentração de forças nesta área no momento em que o molde está sendo removido da
ABO Nac. - Vol. 17dimensional nº 4 - Agosto/setembro Orsi, Iara Augusta etRev. al. Avaliação da alteração de modelos de2009 gesso obtidos de moldes de alginato desinfetados com soluções de mamona
223
224
Rev. ABO Nac.
Fonte de variação Soma de Quadr Entre regiões (r) Entre gessos (g) Entre soluções (s) Interação r x g Interação s x r Interação s x g Interação s x r x g Resíduo Variação total
G.L.
Quadr. Médios
2 1 2 2 4 2 4 72 89
0,2334 1,2690 0,2305 0,7803 0,4823 0,1280 0,355 0,1352
0,4668 1,2690 0,4609 1,5606 1,9292 0,2560 0,1421 9,7347 15,8195
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
(F) Prob. (H0)% 1,73 9,39 1,70 5,77 3,57 0,95 0,26
18,3392 ns 0,3399 * 18,7283 ns 0,5038 * 1,0446 ** 39,4883 ns 9,9857 ns
* significante ao nível de 1%; ** significante ao nível de 5%; ns = não significante; Tabela 1 – Resultado da Análise de Variância da porcentagem de alteração dimensional
cavidade bucal; bem como nas regiões laterais do molde, onde ocorre a flexão da moldeira no deslocamento da região anterior para a posterior. A região que sofre o menor deslocamento e tensão de forças é a posterior, pois é nesse local que termina o movimento de remoção do molde da cavidade bucal. Essas flexões e deslocamentos impostos aos moldes geram pequenas diferenças nos modelos de gesso, o que, no entanto, não causam implicações clínicas relevantes. Os gessos resinados e gessos tipo IV convencionais, apresentam expansão de presa4, é provável, que todos os modelos, tanto os do grupo controle como os dos grupos tratados com desinfetante tenham sofrido expansão de presa em relação ao modelo mestre. O tratamento desinfetante pode ter contribuído para que a expansão de presa nos modelos, obtidos a partir de moldes desinfetados, fosse menor. Por isso, os modelos desinfetados apresentaram contração dimensional em relação aos modelos controle, pois não se expandiram na mesma proporção dos modelos controles, influenciados pelo tratamento desinfetante. O gesso Tuff Rock gerou modelos com menor alteração dimensional, contração média de 0,058%, que os modelos obtidos com gesso Durone, com contração média de 0,295%. Isso se deve ao fato da menor quantidade de água utilizada na manipulação de gessos reforçados por resina, ocorrendo assim, menor expansão
higroscópica do gesso. Não houve diferença estatisticamente significante (p>0,05) na ação dos diferentes agentes químicos sobre os modelos tratados com soluções desinfetantes em relação aos modelos controle (Tabela 1), contudo avaliando as porcentagens de alteração dimensional, a solução Poliquil Crost foi a que causou menor alteração (contração média de 0,09%), seguida pela solução Perioquil (0,16%) e hipoclorito de sódio a 1% (0,27%). Para o procedimento de desinfecção ser considerado adequado, além da reduzida alteração dimensional devem ser consideradas, a qualidade da superfície do modelo e a reprodução de detalhes. Apesar da avaliação da qualidade de superfície não ter sido o objetivo desse estudo, observou-se que a solução Poliquil Crost, apesar de causar pequena alteração dimensional, gerou uma superfície rugosa nos modelos de gesso. Isso pode ser explicado pela apresentação concentrada desse agente químico, sendo mais agressivo em seu tratamento desinfetante, destruindo parte da estrutura superficial do molde de alginato. No entanto, por ser mais viscoso, colabora para que o fenômeno de embebição e sinérese, presente nas propriedades dos alginatos, ocorra com menor intensidade, devido à menor concentração de água em seu volume. O molde em alginato não sofre tanta embebição e assim, há menor alteração dimensional dos modelos de gesso.
Estudos futuros devem ser realizados para que outros fatores de avaliação de modelos possam ser analisados, determinando a possibilidade de utilização clínica das soluções desinfetantes à base de óleo de mamona. O hipoclorito de sódio a 1 % é ainda uma solução praticável e utilizada nos consultórios odontológicos em forma de spray para a desinfecção dos moldes de alginato18,21. CONCLUSÕES
A partir dos resultados conclui-se que: 1) Não houve alteração dimensional estatisticamente significante entre as diferentes regiões mensuradas nos modelos de gesso, demonstrando que as diferentes regiões de um mesmo modelo comportamse de maneira semelhante frente à ação dos agentes desinfetantes sobre os moldes. 2) Os modelos confeccionados com gesso resinado Tuff Rock apresentaram menor contração dimensional que os modelos de gesso Durone. 3) As diferentes soluções desinfetantes causaram alterações dimensionais estatisticamente semelhantes entre si nos modelos de gesso. Porém a solução Poliquil Crost apesar de propiciar menor média de alteração dimensional nos modelos, provocou maior alteração superficial nos modelos, portanto, inaceitável para trabalhos protéticos. REFERÊNCIAS 1. American Dental Association. Council on Scientific Affairs and ADA Council on Dental Practice. Infection control recommendations for the dental office and the dental laboratory. J Am Dent Assoc. 1996;127(5):672-80. 2. Bergman B, Bergman M, Olsson S. Alginate impression materials, dimensional stability and surface detail sharpness following treatment with disinfection solutions. Swed Dent J. 1985;9(6): 255-62. 3. Craig GC. Restorative dental materials. St. Louis: Mosby;1989. 4. Duke P, Moore K, Haug SP, Andres CJ. Study of the physical properties of type IV gypsum, resin-containing, and epoxy die materials. J Prosthet Dent. 2000;83(4 ):466-473. 5. Flanagan DA, Palenik CJ, Setcos JC, Miller CH. Antimicrobial activities of dental impression materials. Dent Mater. 1998; 14(6):399-404.
Orsi, Iara Augusta moldes de alginato desinfetados soluções de mamona ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 -com Agosto/setembro 2009 224 et al. Avaliação da alteração dimensional de modelos de gesso obtidos deRev.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
6. Holtan JR, Olin PS, Rudney JD. Dimensional stability of a polyvinylsiloxane impression material following ethylene oxide and steam autoclave sterilization. J Prosthet Dent. 1991;65(4):519-24. 7. Jennings KJ, Samaranayake LP. The persistence of microorganisms on impression materials following disinfection. Int J Prosthodont. 1991;4:(4):382-87. 8. Johnson GH, Chllis KD, Gordon GE, Lepe X. Dimensional stability and detail reprocuction of irreversible hydrocolloid and elastomeric impressions disinfected by immersion. J. Prosthet Dent. 1998;79(4): 446-53. 9. Klein RS, Phelan JA, Freeman K, Schable C, Friedland GH, Triger N et al. Low occupational risk of human immunodeficiency virus infection among dental professionals. N Engl J Med. 1988;jan 14; 318(2):86-90. 10. Kugel G, Perry RD, Ferrari M, Lalicata P. Disinfection and communication practices: a survey of U.S. dental laboratories. J Am Dent Assoc. 2000;131(6):786-92. 11. Leonardo MR, Silva LAB, Tanomaru Filho M, Bonifácio KC, Ito IY. In vitro evaluation
225
Rev. ABO Nac.
of the antimicrobial activity of a castor oilbased irrigant. J Endod. 2001;27(12):717-9. 12. Lepe X, Johnson GH. Accuracy of polyether and addition slicone after long-term immersion disinfection. J Prosthet Dent. 1997;78(3):245-9. 13. Lepe X, Johnson GH, Berg JC. Surface characteristics of polyether and addition silicone impression materials after longterm disinfection. J Prosthet Dent. 1995; 74(2):181-6. 14. Leung RL, Schonfeld SE. Gypsum casts as a potential source of microbial crosscontamination. J. Prosthet Dent. 1983;49 (2):210-1. 15. Milward PJ, Phil M, Walters MG. The effect of disinfection and a wetting agent on the wettability of addition-polymerized silicone impression materials. J Prosthet Dent. 2001;86 (2):165-7. 16. Poulos JG, Antonoff LR. Disinfection of impressions – methods and effects on accuracy. N Y State Dent J. 1997;63(6):34-6. 17. Rowe AH, Forrest JO. Dental impressions: the probality of contamination and a method of disinfection. Br Dent J. 1978;145(6):184-6. 18. Rueggeberg FA, Beall FE, Kelly MT, Schuster
GS.Sodium hypochlorite disinfection of irreversible hydrocolloid impression material. J Prosthet Dent. 1992;67(5): 628-31. 19. Sabatini BM. Don´t let it happen to you – precaution against hepatitis B and other infectious diseases. Trends Tech Contemp Dent Lab.1984;1(2):32-3. 20. Tan HK, Hooper PM, Buttar IA, Wolfaardt JF. Effects of disinfecting irreversible hydrocolloid impressions on the resultant gypsum casts. Part II – Dimensional changes. J Prosthet Dent. 1993;70(6):532-7. 21. Tan HK, Wolfaardt JF, Hooper PM, Busby B. Effects of disinfecting irreversible hydrocolloid impressions on the resultant gypsum casts: Part I – Surface quality. J Prosthet Dent. 1993;69(3):250-7. 22. Tomita H, Minagi S, Akagawa Y, Isuru H. Prevention of acquired immunodeficiency syndrome and hepatitis B. Part IV: The effect of impression material on glutaraldehyde solution. J Prosthet Dent. 1990;64 (5):573-7. 23. Tullner JB, Commette JA, Moon PC. Linear dimensional changes in dental impressions after immersion in disinfectant solutions. J Prosthet Dent. 1988;60(6):725-8.
Orsi, Iara Augusta etRev. al. Avaliação da alteração de modelos de2009 gesso obtidos de moldes de alginato desinfetados com soluções de mamona ABO Nac. - Vol. 17dimensional nº 4 - Agosto/setembro
225
226
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Artigo original
Condições de acessibilidade para usuários cadeirantes em Unidades Básicas de Saúde do município de Linhares (ES)* Health BasicUnits access conditions for wheelchair handicap from Linhares city (Espirito Santo State) Palavras-chave: Estruturas de acesso. Cadeiras de rodas. Pessoas com deficiência. Key words: Architectural accessibility. Wheelchairs. Disabled persons.
Mardilei Canal Rigotti** Ludmilla Awad Barcellos*** Maria Helena Monteiro de Barros Miotto**** Margareth Pandolfi*****
RESUMO
Introdução -Este estudo se propõe a fazer uma análise das condições de acessibilidade para os pacientes em cadeira de rodas nas Unidades Básicas de Saúde (UBSs) do município de Linhares (ES). Material e Métodos - Com um roteiro estruturado, verificou-se a adequação do estacionamento, acesso principal, área de circulação, sanitários, vão livre da porta e área dos consultórios odontológicos, à norma NBR 9050/ 2004 e RDC 50/2002. Resultados - Os dados coletados, nas 23 UBSs demonstraram que 100% das UBSs não atenderam plenamente à norma NBR 9050/2004. Conclusão - As barreiras arquitetônicas encontradas nas UBSs do município de Linhares limitaram o acesso de pessoas em cadeiras de rodas, ferindo os direitos do cidadão que utiliza cadeira de rodas e os princípios do SUS. ABSTRACT
Introduction - This study aimed to make an analysis of the access conditions in 23 Health Basic Units of Linhares city, Espírito Santo state, for patients that use wheelchairs. Material and Methods - Through a structuralized script, data was collected to verify the adequacy of the following itens: parking, main access, area of circulation, sanitary, door area, and dental offices based on the rules NBR 9050/2004 and RDC 50/2002. Results - In all the Units the norm was not fully respected. Conclusion - The barriers found in the architectural structure in the Health Basic Units in Linhares, limit the access of the handicapped patients, wounding the rights for wheelchairs users and the principles of Brazilian Health System INTRODUÇÃO
Resumo da Monografia para obtenção do título de Especialista em Saúde Coletiva pela ABO/ES. Especialista em Saúde Coletiva. ** *** Mestre em Saúde Coletiva. Professora do Curso de Especialização Saúde Coletiva da ABO/ES. E-mail: ludawad@oi.com.br **** Professora Adjunta da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). Doutoranda em Saúde Coletiva na Universidade de Pernambuco (UPE). E-mail: mhmiotto@terra.com.br *****Professora do Curso de Especialização Saúde Coletiva da ABO/ES. Doutoranda em Saúde Coletiva na UPE. *
A história da humanidade revela, desde os tempos mais remotos, a existência de pessoas portadoras de deficiência, com relatos sobre suas dificuldades na vida cotidiana13. De acordo com o Programa de Ação Mundial para as Pessoas com Deficiência, da Organização das Nações Unidas (ONU), atualmente, há no mundo um número estimado de 500 milhões de pessoas deficientes19. No Brasil, aproximadamente, 24,5 milhões de pessoas, ou 14,5% da população total, apresentam algum tipo de incapacidade ou deficiência6. A sociedade deve superar os paradigmas
da mera afirmação da igualdade de todos perante a lei, e agir, efetivamente, para que a igualdade substancial de participação política, econômica e profissional de todos, garanta também a fruição das benesses sociais do acesso ao lazer, à cultura, à educação, à saúde e à moradia. São as chamadas ações afirmativas em favor das minorias que, até o presente, não tiveram sequer acesso à oportunidade de acesso à cidadania. Quanto às pessoas com deficiência, estamos superando o viés assistencialista e caridosamente excludente, para possibilitar-lhes a inclusão efetiva. Assim, essas pessoas passarão a ser sujeito do próprio destino, e não mais meros benefi-
ABOBásicas Nac. - de Vol. 17 nº - Agosto/setembro Rigotti,226 Mardilei Canal et al. Condições de acessibilidade para usuários cadeirantes emRev. Unidades Saúde do 4município de Linhares2009 (ES)
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
ciários de políticas de assistência social14. A acessibilidade é condição prévia para a inclusão social. É um direito básico que garante a não discriminação do cidadão em função da sua idade ou das suas necessidades especiais2,17. A proporção de pessoas portadoras de deficiência aumenta com a idade, passando de 4,3% nas crianças até 14 anos para 54% do total das pessoas com idade superior a 65 anos. À medida que a estrutura da população está mais envelhecida, a proporção de portadores de deficiência aumenta, surgindo um novo elenco de demandas para atender às necessidades específicas desse grupo2. Na maioria dos países, pelo menos uma em cada dez pessoas tem uma deficiência física, mental ou sensorial. Muito frequentemente, essas pessoas são obrigadas a viver em condições de desvantagem, devido a barreiras físicas e sociais existentes na sociedade, que impedem a sua participação plena19. É fundamental garantir que a deficiência não gere incapacidade e que esta não resulte em desvantagem11. Se a exclusão e a segregação das pessoas portadoras de deficiência são vinculadas à existência de obstáculos, remover barreiras ou cuidar para que elas não venham a existir é tratar da inclusão social e consolidar os direitos humanos. Muitas pessoas deficientes ficam excluídas de uma participação ativa na sociedade, em razão de obstáculos materiais: portas demasiadamente estreitas para permitirem a passagem de uma cadeira de rodas, escadas e degraus inacessíveis em edifícios12. Barreira arquitetônica, urbanística ou ambiental é definida como qualquer elemento natural, instalado ou edificado, que impeça a aproximação, transferência ou circulação no espaço, mobiliário ou equipamento urbano3. A maioria dos ambientes construídos, apresenta barreiras visíveis, entendidas como a falta de acessibilidade dos espaços20. O Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999, garante acesso da pessoa portadora de deficiência aos estabelecimentos de saúde públicos e privados4. Cada estabelecimento assistencial de saúde construído ou reformado deve estar em
227
Rev. ABO Nac.
perfeita consonância com as normas9. A construção, ampliação ou reforma de edifícios públicos ou privados destinados ao uso coletivo deverão ser executadas de modo que sejam, ou se tornem, acessíveis às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida 18. Na maioria das sociedades, a atenção aos portadores de deficiência é excludente, ineficiente e assistencialista. Na Odontologia, essa prática tem se mostrado mutiladora, realizando atendimentos sob anestesia geral de forma sistemática. Além das dificuldades e obstáculos criados, o indivíduo deficiente sofre, ainda, o estigma e rejeição, que dificultam ou impossibilitam a sua integração à sociedade1. Diante de todos os avanços, em relação à oferta de serviços para melhorar a qualidade de vida do paciente portador de necessidades especiais, a saúde bucal também deve estar acessível a todos. Isso se deve ao comprometimento do governo com a redução das desigualdades e com a construção de uma política de inclusão social7. Os centros de especialidades odontológicas estão preparados para oferecer à população, serviços especializados e atendimento a portadores de necessidades especiais. Os profissionais da atenção básica são responsáveis pelo primeiro atendimento ao paciente, encaminhando aos centros especializados apenas os casos mais complexos8. Além disso, a Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde assegura ao cidadão o direito básico ao ingresso digno nos sistemas de saúde. A garantia à acessibilidade implica o fim das barreiras arquitetônicas e de comunicabilidade, oferecendo condições de atendimento adequadas, especialmente às pessoas que vivem com deficiências, idosos e gestantes10. A Lei nº. 7.405, de 11 de novembro de 1985, aborda a obrigação de colocar o símbolo internacional de acesso nos locais e serviços que permitam a utilização e acesso de pessoas deficientes5. Já a Lei nº. 7.853, de 24 de outubro de 1989, determina que os deficientes devem ter igualdade de oportunidades, justiça social, respeito à dignidade e outros direitos contidos na constituição, como garan-
tia de acesso aos estabelecimentos para a pessoa portadora de deficiência5. A Lei nº. 10.048, de 8 de novembro de 2000, prioriza o atendimento às pessoas portadoras de deficiência, nas repartições públicas e nas empresas que prestam serviço público. Sendo assim, os sanitários e os edifícios públicos têm a obrigação de facilitar o acesso para as pessoas portadoras de deficiências5. Em 2004, o Brasil foi eleito, pela International Disability Rights Monitor, como um dos cinco países mais inclusivos das Américas. Ainda que o Brasil possua uma legislação avançada, abrangente e moderna, do ponto de vista científicotecnológico, existe ainda uma grande dificuldade em implementá-la. Apesar de a sociedade civil estar cada vez mais mobilizada, consciente de seus direitos e realizando o controle social, a efetivação da acessibilidade não depende unicamente de mudanças estruturais, mas primordialmente de uma mudança cultural15. “O nosso problema é a discrepância entre o que foi dito e escrito e aquilo que é, verdadeiramente, assegurado ao cidadão. Existe, no Brasil, um abismo entre o direito vigente e o direito vivido” 21. No entanto todo mundo deve ter condições de usar o ambiente construído de maneira independente e igual17. Miotto16(2006) realizou uma etnografia institucional utilizando observações, interações e conversas com os participantes de um programa de transporte de usuários de cadeira de roda na Grande Vitória/ES. Os cadeirantes que utilizavam o programa percebiam que o serviço era insuficiente devido à grande demanda, mas se sentiam gratificados, pois eram bem atendidos. O objetivo desta pesquisa foi avaliar as condições de acessibilidade das Unidades Básicas de Saúde (UBSs) do município de Linhares que prestam assistência odontológica às pessoas que utilizam, temporária ou permanentemente, cadeira de rodas para se locomoverem. MATERIAL E MÉTODOS
O município de Linhares possui 27 UBSs, sendo quatorze localizadas na área
Rev. ABO Nac. - de Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009 em Unidades Básicas de Saúde do município de Linhares (ES) Rigotti, Mardilei Canal et al. Condições acessibilidade para usuários cadeirantes
227
228
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Fonte: Associação brasileira de Normas Técnicas, 2004
Fonte: Associação brasileira de Normas Técnicas, 2004
Rev. ABO Nac.
Fig. 2 - Sala de espera
Fonte: Associação brasileira de Normas Técnicas, 2004
Fonte: Associação brasileira de Normas Técnicas, 2004
Fig. 1 - Símbolo internacional de acesso para o estacionamento
Fig. 3 – Largura do corredor
Fig. 4 – Transferência lateral
urbana e treze na área rural. Este estudo avaliou as 23 unidades que ofereciam atendimento odontológico, treze urbanas e dez rurais, no período de novembro de 2006 a janeiro de 2007. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Associação Brasileira de Odontologia, Seção ES. A avaliação não quantifica o nível do desvio numérico em relação ao estabelecido pela norma (NBR 9050/2004), apenas mostra se há adequação dos itens às normas. Foram avaliadas as variáveis relativas às barreiras arquitetônicas encontradas no estacionamento, no acesso principal à edificação, na área de circulação, nos
sanitários e na dimensão da área do consultório odontológico. Para a coleta dos dados, foi utilizado um roteiro estruturado e, embora não quantificados os valores, foi usada uma trena profissional de 20 metros, da marca Starrett, para as medições necessárias, a fim de comparar os dados encontrados em relação aos parâmetros estabelecidos pela norma. Conforme a NBR 9050/2004, os critérios e parâmetros técnicos a serem observados nas áreas analisadas neste estudo, para acesso da pessoa em cadeira de rodas (PCR) foram: estacionamento, porta de entrada, sala de espera, sanitário, circulação interna e consultório dentário3.
As vagas para portadores de deficiência, quando presentes, devem ser sinalizadas com símbolo internacional de acesso (Figura 1) e o percurso entre o estacionamento de veículos e a(s) entrada(s) principal(is) deve compor uma rota acessível sem desníveis de qualquer natureza. Desníveis superiores a 5mm até 15mm devem ser tratados em forma de rampa que devem ter inclinação entre 6,25% e 8,33% com largura mínima de 1,20m. Os pisos devem ter superfície regular, firme, estável e antiderrapante, que não provoque trepidação em dispositivos com rodas. Todo desnível acima de 15mm deve ser considerado como degrau.
Rigotti, Mardilei Canal et al. Condições de acessibilidade para usuários cadeirantes emRev. Unidades Saúde do4município de Linhares2009 (ES) ABOBásicas Nac. - de Vol. 17 nº - Agosto/setembro 228
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
As portas deverão possuir vão livre de, no mínimo, 0,80m e altura de 2,10m. Devem ter condições de serem abertas com um único movimento e suas maçanetas devem ser do tipo alavanca instalada a uma altura de 0,90m a 1,10m. Na sala de espera, ao lado dos assentos fixos em rotas acessíveis, deve ser garantido um Módulo de Referência (0,80m x 1,20m) para que a cadeira de roda não interfira na faixa livre de circulação (Figura 2). O bebedouro acessível deve possuir altura livre inferior de no mínimo 0,73m do piso, podendo avançar sob o bebedouro até no máximo 0,50m. Os corredores para passagem de uma cadeira de rodas e uma pessoa necessita ter de 1,20m a 1,50m (Figura 3). As portas dos sanitários devem ter um puxador horizontal localizado a uma distância de 10cm da face onde se encontra a dobradiça (Figura 4). O espaço para manobras e a área de transferência e aproximação para bacias sanitárias deve ter um mínimo de 1,10m x 0,80m e permitir a utilização frontal ou lateralmente à peça. As dimensões mínimas requeridas para a manobra são de 1,50m x 1,70m. A área de abertura da porta não deve interferir na área de transferência, devendo ter sua abertura para o lado de fora do box (Figura 4). A análise do consultório odontológico foi baseada na RDC 50, Resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que estabelece 9,0m² como dimensão mínima para um consultório odontológico9. RESULTADOS
Os resultados deste estudo englobam dados de 23 UBSs do município de Linhares, avaliadas em seus aspectos arquitetônicos, em áreas onde a não observação da norma de acessibilidade compromete o acesso da PCR na utilização dos serviços prestado pela UBS. Em todas as UBSs (100%), o estacionamento, embora não exclusivo, fica próximo à entrada principal, mesmo insuficiente para garantir o acesso (Tabela 1). A segunda barreira visível foi obser-
229
Rev. ABO Nac.
Tabela 1. Avaliação do estacionamento das UBSs do município de Linhares/ES
Item Vaga para PCR Nivelamento de piso Proximidade à entrada da USB Caminho percorrido acessível
Sim
Não
Nº
%
Nº
%
0 6 23 9
0,0 26,1 100,0 39,1
23 17 0 14
100,0 73,9 0,0 60,9
Tabela 2. Avaliação do acesso da porta principal das UBSs do município de Linhares/ES
Tipo de acesso Nivelado Rampa Degrau
Sim
Não
Nº
%
Nº
%
8 5 10
34,8 21,7 43,5
15 18 13
65,2 78,3 56,5
Tabela 3. Avaliação da rampa de acesso das UBSs do município de Linhares/ES
Item Largura para PCR Inclinação para PCR Corrimão Empunhadura, acabamento, dimensão
Sim
Não
Nº
%
Nº
%
5 2 2 2
100,0 40,0 40,0 100,0
0 3 3 0
0,0 60,0 60,0 0,0
Tabela 4. Avaliação do vão da porta de acesso e vão das portas internas das UBSs do município de Linhares/ES
Item Porta principal acessível Portas internas acessíveis Todas Algumas Nenhuma
Sim Nº 21
vada em dez UBSs (Tabela 2). Das cinco rampas (100%) analisadas, somente duas permitiam acesso (Tabela 3). Em 17 UBSs (73,9%), apesar de a porta principal permitir o acesso da PCR, foram encontradas portas nos ambientes internos que não atendiam à norma. Das 23 unidades analisadas, apenas quatro UBSs (17,4%) possuíam todas as portas com o vão livre acessível (Tabela 4). Na Tabela 5, foram observadas novas barreiras visíveis dificultando o acesso ao tratamento odontológico.
Número ‘4 17 0
Não %
Nº
%
91,3
2
8,7 Percentual 17,4 73,9 100,0
Os corredores das UBSs também constituíram barreira ao acesso. Vinte e duas UBSs (100%) não possuem condições adequadas para a utilização dos sanitários, e somente sete UBSs permitem a entrada das PCRs (Tabelas 7 e 8). Três UBSs (13,0%) não disponibilizam espaço para que a cadeira de rodas faça um giro de 180º; três UBSs (13,0%) não permitem a passagem da cadeira de rodas através da porta do consultório, por possuir porta com vão livre inferior a 0,80m (Tabela 9).
Rigotti, Mardilei Canal et al. Condições acessibilidade para usuários cadeirantes Rev. ABO Nac. - de Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009 em Unidades Básicas de Saúde do município de Linhares (ES)
229
230
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Tabela 5. Avaliação da sala de espera das UBSs do município de Linhares/ES
Sim
Item Espaço para acomodação e circulação Balcão na recepção Altura satisfatória Bebedouro Permite boa aproximação
Não
Nº
%
Nº
%
15 14 1 11 8
65,2 60,9 7,1 47,8 72,7
8 9 13 12 3
34,8 39,1 92,9 52,2 27,3
Tabela 6. Avaliação dos corredores das UBSs do município de Linhares/ES
Sim
Item Largura do corredor acessível a PCR
Não
Nº
%
Nº
%
17
73,9
6
26,1
Tabela 7. Avaliação dos sanitários das 22 UBSs do município de Linhares/ES
Sim
Item Porta com vão livre de 0,80m Barras nas portas Barras na lateral e no fundo da bacia sanitária Descarga acessível Espaços para manobras Piso antiderrapante
Não
Nº
%
Nº
%
7 0 2 11 9 9
31,8 0,0 9,1 50,0 40,9 40,9
15 22 20 11 13 13
68,2 100,0 90,9 50,0 59,1 59,1
Tabela 8. Avaliação dos sanitários das sete UBSs do município de Linhares/ES que possuem porta com vão livre de 0,80m
Sim
Item Barras nas portas Barras na lateral e no fundo da bacia sanitária Descarga acessível Espaços para manobras Piso antiderrapante
Não
Nº
%
Nº
%
0 2 7 6 6
0,0 28,5 100,0 85,7 85,7
07 5 0 1 1
100,0 71,5 0,0 14,3 14,3
Tabela 9. Avaliação do consultório odontológico das UBSs do município de Linhares/ES
Sim
Item Espaço para girar a cadeira em 180º Porta acessível a PCR DISCUSSÃO
A realidade encontrada nas UBSs de Linhares revela a importância de eliminação de barreiras que, além de comprometer o acesso ao cadeirante também compromete sua utilização pela população que
Não
Nº
%
Nº
%
20 20
87,0 87,0
3 3
13,0 13,0
tem sua expectativa de vida aumentada nos últimos anos, de acordo com dados epidemiológicos. Com a idade, tem aumentado a proporção de pessoas portadoras de deficiência, passando de 4,3% nas crianças até 14
anos, para 54% do total das pessoas com idade superior a 65 anos2. Na maioria dos países está aumentando o número de pessoas idosas e essa população tende a desenvolver limitações; sendo assim, as barreiras físicas levam essas pessoas a viverem em condições de desvantagem19. A transição demográfica traz, como consequência, mudanças sociais, culturais e epidemiológicas que o País não está preparado para enfrentar12. O local do estacionamento apresentou limitação do acesso para o cadeirante nas UBs de Linhares. O princípio da igualdade de direitos entre pessoas com e sem deficiência significa que as necessidades de todo indivíduo são de igual importância, e que todas as políticas referentes à deficiência devem assegurar o acesso das pessoas deficientes a todos os serviços da comunidade4,19, pois elas devem ter condições de usar o ambiente construído de maneira independente e igual17. As UBSs que limitam o acesso do cadeirante estão excluindo o cidadão deficiente de acessar o serviço de saúde, portanto, remover barreiras ou cuidar para que elas não venham a existir, é tratar da inclusão social e consolidar os direitos humanos12. Muitas pessoas deficientes ficam excluídas de uma participação ativa na sociedade, em razão de obstáculos materiais: portas demasiadamente estreitas para permitirem a passagem de uma cadeira de rodas, escadas e degraus inacessíveis em edifícios, como constatado neste estudo. A simples remoção de um tapete, uma porta com vão adequado, corredores largos3, favorecem o acesso das pessoas com limitações físicas, o que repercute positivamente20. Barreiras visíveis são todos os impedimentos concretos, entendidos como a falta de acessibilidade dos espaços. A acessibilidade é condição básica para a inclusão social2,17. As barreiras invisíveis se constituem na forma como as pessoas são vistas pela sociedade20. Fonseca19 (2006) acredita que somente com a superação do viés assistencialista ocorrerá a inclusão efetiva. Por sua vez Miotto16 (2007) observou que os cadeirantes que utilizavam o
ABOBásicas Nac. - de Vol. 17 nº - Agosto/setembro Rigotti,230 Mardilei Canal et al. Condições de acessibilidade para usuários cadeirantes emRev. Unidades Saúde do 4município de Linhares2009 (ES)
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
programa, mesmo com a percepção de que o serviço era insuficiente para atender à demanda, se sentiam gratificados pelo bom atendimento recebido, o que coloca o usuário como mero beneficiário de uma política assistencialista. A maioria das UBSs de Linhares não atende à Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde10, que assegura ao cidadão o direito básico ao ingresso digno nos sistemas de saúde, sejam eles públicos, sejam privados, e garante acessibilidade, o que implica no fim das barreiras arquitetônicas e de comunicabilidade, oferecendo condições de atendimento adequadas, especialmente às pessoas que vivem com deficiências, idosos e gestantes. Na maioria das sociedades, a atenção aos portadores de deficiência é excludente, ineficiente e assistencialista. Além das dificuldades e obstáculos, o indivíduo deficiente sofre, ainda, o estigma da rejeição, o que dificulta ou impossibilita a sua integração à sociedade1. Historicamente, a Odontologia tem executado uma prática mutiladora. Não se pode continuar caminhando na contramão das políticas de humanização do SUS. Com o “Programa Brasil Sorridente”, lançado em 2004, o Governo Federal criou uma política de saúde bucal para a população garantindo acesso e uma atenção integral7. Scheffer21 (2007) pontua de forma contundente a discrepância entre o que diz a legislação e o que verdadeiramente ocorre na prática. Quanto aos direitos do cidadão, afirma que há um abismo separando o direito vigente e o direito vivido, confirmado pelos resultados encontrados neste estudo. CONCLUSÃO
As 23 UBSs do município de Linhares analisadas neste estudo apresentam algum tipo de barreira arquitetônica, comprometendo a utilização do serviço. Dessa forma, ao limitarem o acesso dos pacientes em cadeira de rodas, ferem os princípios de equidade e universalidade do SUS.
231
Rev. ABO Nac.
REFERÊNCIAS 1. Abreu, MHNG, Castilho, LS, Resende VLS. Assistência odontológica a indivíduos portadores de deficiências: o caso da associação mineira de reabilitação e escola estadual “João Moreira Salles”.Arq Odontol. 2001; 37(2):153-61. 2. Amigos Metroviários dos Excepcionais. Jornal dos Amigos Metroviários dos excepcionais. Acessibilidade reflete qualidade de vida. Tatuapé, São Paulo, SP, Brasil, 2007. [acesso 5 jan 2007]. Disponível em: http://www. amesp.org.br/noticias/shtml. 3. Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 9050, de maio 2004. Estabelece critérios e parâmetros técnicos a serem observados quando do projeto, construção, instalação e adaptação de edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos às condições de acessibilidade. 2004. [acesso 19 jul]. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/sedh/ct/ CORDE/dpdh/corde/ABNT/NBR90503105 2004.pdf >. 4. Brasil. Decreto nº. 3298, de 20 de dezembro de 1999. Dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e dá outras providências. [acesso 20 jul 2006]. Disponível em: <http://www.mec.gov. br/seesp/pdf/dec3298.pdf>. 5. Brasil. Ministério da Justiça. CORDE – Coordena doria Nacional Para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Legislação Federal Básica sobre acessibilidade. Brasília, 2005. Acesso 24 jan 2007. Disponível em: <http://www.mj.gov.br/sedh/ct/conade/conferencia/legislacao3.htm#Legislacao>. 6. Brasil. Ministério da Justiça. SICORDE – Sistema Nacional de Informações sobre deficiência. CORDE – Coordenadoria Nacional para a integração da Pessoa Portadora de Deficiência. Brasil, censo 2000. [acesso 18 lul 2006]. Disponível em: <http://www.mj. gov.br/sedh/ct/corde/dpdh/sicorde/censo2000. aspDUÇÃO>. 7. Brasil L. Ministério da Saúde. Brasil Sorridente. 2004. [acesso 15 abr 2006]. Disponível em: <http://dtr2004.saude.gov.br/dab/ saudebucal/brasil_sorridente.php>. 8. Brasil. Ministério da Saúde. Centros de especialidades. 2004. [acesso 15 abr 2006].Disponível em: <http://dtr2004.saude.gov.br/ dab/saudebucal/especialidades.php>. 9. Brasil. Ministério da Saúde. Normas para projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saúde – revogada pela Portaria GM/ 554, de 19 de março de 2002, e substituída pela Resolução RDC nº 50, de 21 de fevereiro de 2002. [acesso 20 jul 2006]. Disponível em: <http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2002/
50_02rdc.pdf>. 10. Brasil. Ministério da Saúde. Portaria MS/GM nº 675, de 30 de março de 2006. Aprova carta dos Direitos dos Usuários da Saúde, que consolida os direitos e deveres do exercício da cidadania na saúde em todo o País. Brasília, 2006. [acesso 17 jul 2006]. Disponível em: <http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/ pdf/cartilha_integra_direitos_2006.pdf >. 11. Carvalho, LR. Ergonomia e o trabalho do portador de necessidade motora específica: o caso do cadeirante. 2001. [Dissertação de Mestrado] Florianópolis: Faculdade de Engenharia da Universidade Federal de Santa Catarina; 2001. 12. Fagundes SMS; Scarp MJ. Barreiras arquitetônicas em Hospital de Olhos. Rev Adm Saúde. 2002;5(17):19-26. 13. Ferreira LAM. A inclusão da pessoa portadora de deficiência e o Ministério Público. [acesso 16 abr 2006]. Disponível em: http://www. mj.gov.br/sedh/ct/corde/dpdh/sicorde/ mp_e_ppd.doc. 14. Fonseca RTM. A sociedade inclusiva e a cidadania das pessoas com deficiência. [acesso 16 abr 2006]. Disponível em: http://www. mj.gov.br/sedh/ct/corde/dpdh/sicorde/ Brasil.doc . 15. Maior I, Costa G, Lima, N. Acessibilidade no Brasil: uma visão histórica. [acesso 16 abr 2006]. Disponível em: http://www.mj.gov.br/ sedh/ct/CONADE/acessibilidade_visao_his torica.doc. 16. Miotto MBM. A lógica da satisfação nas organizações: um estudo de caso. [mono grafia]. Vitoria: Curso de Ciências Sociais: Universidade Federal do Espírito Santo; 2006. 17. Nicholl ARJ, Boueri Filho JJ. O ambiente que promove a inclusão: conceitos de acessibilidade e usabilidade. Rev Assentamentos Hu man. 2001;3(2):49-60. 18. Oliveira RFU, Silva RN, Machado Júnior N. As condições de acessibilidade e adequação, para pacientes em cadeiras de rodas, em clinicas de fisioterapia na cidade de Goiânia. [acesso 17 jul 2006]. Disponível em: <www. fisioweb.com.br>. 19. Organização das Nações Unidas. Programa de Ação Mundial para as pessoas com deficiência. Resolução nº 37/52, de 3 de dezembro de 1982. [acesso 17 jul 2006]. Disponível em: http://www.cedipod.org.br/w6pam.htm. 20. Prado ARA. Ambientes acessíveis. Trabalho apresentado no 1º Seminário Nacional “A Pessoa Portadora de Deficiência no Mundo do Trabalho”. 1997. [acesso 5 maio 2006]. Disponível em: http://www.entreamigos. com.br/textos/acessibi/acessib.htm. 21. Scheffer M. Um ano depois, muito a cumprir. Rev Radis. 2007;54:8-9.
Rev. ABO Nac. - de Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009 em Unidades Básicas de Saúde do município de Linhares (ES) Rigotti, Mardilei Canal et al. Condições acessibilidade para usuários cadeirantes
231
232
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Artigo original
Estudo da articulação temporomandibular por meio de ressonância magnética Magnetic resonance image study of the temporomandibular joint Palavras-chave: Articulação temporomandibular. Imagem por ressonância magnética. Transtornos da articulação temporomandibular. Key words: Temporomandibular joint. Magnetic resonance imaging. Temporomandibular joint disorders.
Fabio Ritto* Marcelo Daniel Brito Faria**
RESUMO
Introdução - Desordens temporomandibulares (DTM) são geralmente ocasionadas pela relação anormal entre a posição do disco e do côndilo. No entanto, apesar de uma relação anormal a articulação pode encontrar um equilíbrio e não apresentar sintomas. Tratamentos odontológicos podem quebrar este equilíbrio dando início aos sintomas articulares. Este estudo teve como objetivo determinar a prevalência de DTM por meio de ressonância magnética no período de 1998 a 2006. Materiais e Métodos - Sessenta e cinco imagens de ressonância magnética da articulação temporomandibular de oito homens e 28 mulheres, com queixas de dor na articulação, foram realizadas. As imagens foram adquiridas em T1 e T2, e analisadas no plano sagital para avaliação da ocorrência de deslocamento anterior do disco articular, assim como a ocorrência ou não de redução do disco. Qui-quadrado com correção de Yates foi utilizado para avaliar o deslocamento em relação a sexo, enquanto o teste do Qui-quadrado foi aplicado para análise do deslocamento uni e bilateral. Porcentagem foi utilizada para avaliar a redução do disco. Os resultados foram considerados significativos se P<0.05. Resultados - Apesar do número de mulheres com sintomas de desordem temporomandibular ter sido 3,5 vezes maior que o de homens, não houve diferenças estatisticamente significativas entre as categorias estudadas. Conclusão - Dentre os pacientes analisados nenhum grupo específico pôde ser caracterizado como mais propenso a apresentar deslocamento anterior do disco articular. Apesar disso, o maior número de mulheres apresentando sintomas de desordem temporomandibular sugere a necessidade de mais pesquisas para estabelecer um grupo de pacientes com predisposição a desordens temporomandibulares. ABSTRACT
* Mestrando em Cirurgia da Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (FO-UERJ). E-mail: fabioritto@ cirurgiamaxilo facial.com **Professor Adjunto de Radiologia da FO-UERJ. Email: marcelo@maxilloscan.com.br
232
Introduction - Temporomandibular joint disorders (TMD) are usually caused by abnormal relations between disc and condyle. However, even under an abnormal relation, the joint may reach equilibrium and the patient may not present signs or symptoms. Dental treatments can break this equilibrium, giving rise to patient complains. The purpose of this study was to determine the prevalence of DTM through magnetic resonance imaging analysis from 1998 to 2006. Material and Methods - Sixty-five magnetic resonance images of the temporomandibular joint of 8 men and 28 women who claimed of pain in the articulation were produced. Image analysis included assessment of anterior disc displacement as well as disc reduction in sagittal plane. T1 weighted and T2 weighted fast spin-eco sequences were acquired. Chi-square test with Yates correction was used to analyze disc displacement regarding gender, while Chi-Square test was used to analyze the presence of uni or bilateral displacement. Percentage was used to analyze the proportion of disc reduction. The results were considered significant if P<.05. Results - Even though the number of women with symptoms of temporomandibular
Rev. ABO Nac.por - Vol. 17 de nº 4ressonância - Agosto/setembro 2009 Ritto, Fabio et al. Estudo da articulação temporomandibular meio magnética
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
233
Rev. ABO Nac.
disorder was 3.5 times greater than that of men, there was no statistically significant difference between prevalence of the analyzed categories (P>.05). Conclusion - Among the symptomatic patients analyzed, no specific group could be characterized as being more vulnerable to have anterior disc displacement. In spite of these findings, the higher number of women with symptoms of pain in the temporomandibular joint shows that there is a need for further research aiming to find patients prone to temporomandibular disorder.
INTRODUÇÃO
Distúrbios internos da articulação temporomandibular (ATM) são doenças progressivas e degenerativas, marcadas por alterações morfológicas e estruturais da ATM e da anatomia relacionada e ela. A relação anatômica normal entre os componentes intra-articulares está alterada2. O deslocamento anterior do disco já foi apontado como a desordem temporomandibular (DTM) mais comum3,7,10,12,14. De acordo com Katzberg et al.6 (1996) isto ocorre porque a direção anterior é a linha de menor resistência ao movimento do disco, enquanto as superfícies medial e lateral são suportadas mais firmemente por seus ligamentos, e o deslocamento posterior é muito menos provável de ocorrer, uma vez que a posição normal do disco é anterior ao côndilo. Sintomas de DTM como dor, estalido, e limitação de abertura, são em geral causados por uma relação anormal entre a posição do disco e o côndilo. No entanto, nem todos os sintomas resultam de distúrbios internos da articulação13. Além disso, segundo Cholitgul et al.1 (1997), o deslocamento do disco pode ser observado tanto em indivíduos sintomáticos como assintomáticos. Indicações para aquisição de imagens da ATM de pacientes com distúrbios internos incluem falha em tratamentos conservadores, progressão de sintomas ou sintomas atípicos, e análises pré-operatórias.13 Diferentes técnicas de imagem foram utilizadas para estudar a ATM. Radiografias e tomografias permitem análise da amplitude dos movimentos articulares, sem permitir avaliação precisa dos componentes de tecido mole da articulação. Já a imagem por ressonância magnética (IRM) permite avaliação eficaz de tecidos duros e moles da ATM, sem o uso de radiação ionizante.
Por estes motivos a IRM foi apontada com a técnica “padrão ouro” para esta análise das articulações temporomandibulares2-4010,13. O objetivo deste estudo foi acessar a prevalência de deslocamento anterior de disco em ATMs de diferentes indivíduos. Com esta análise almeja-se encontrar um grupo específico de indivíduos mais propensos a desordens temporomandibulares, para neste grupo evitar procedimentos que possam levar a alterações no equilíbrio da ATM. MATERIAIS E MÉTODOS
Este estudo analisou 65 imagens de ATMs de 36 pacientes sintomáticos (oito homens e 28 mulheres) que foram encaminhados para o serviço de Imaginologia, em virtude de dores na articulação. A média de idade dos homens foi de 33,1 anos (mínimo de 15 e máximo de 52), e a média das mulheres foi de 37,3 anos (mínimo 15 e máximo 65). Estes pacientes já haviam sido tratados por métodos conservadores para a DTM, mas os sintomas persistiram. Embora imagens bilaterais de ressonância magnética tenham sido produzidas para todos os pacientes, sete imagens apresentaram alterações estruturais em componentes da articulação. Uma vez que estas alterações não permitiram uma análise acurada da relação disco-côndilo, tais imagens não foram incluídas no estudo. As imagens foram adquiridas através de um aparelho de ressonância magnética aberto com 0.3 Tesla (T) (Hitachi, Tokyo, Japan) utilizando uma bobina para superfície da ATM com receptor. Os pacientes foram posicionados com o plano sagital mediano paralelo à mesa do equipamento, e uma linha da órbita ao meato acústico externo perpendicular à mesa. Todos os pacientes foram submetidos a imagens no plano sagital. Tomadas em T1 e T2 foram obtidas. As imagens foram interpretadas
por dois observadores, um cirurgião-dentista e um radiologista. Cada articulação foi avaliada no plano sagital nas posições de boca aberta e boca fechada. As imagens de boca aberta foram realizadas em máxima abertura, enquanto que as de boca fechada foram realizadas com o paciente em máxima intercuspidação. A posição normal do disco foi considerada quando, em fechamento, a banda posterior do disco localizava-se acima do ápice da cabeça condilar (posição de 12 horas ±10º) e, na posição de abertura, o disco permanecia interposto entre os componentes ósseos, movendo-se anteriormente de forma sincronizada4,8 (Figura 1). O deslocamento anterior do disco foi considerado quando, em fechamento, a banda posterior do disco estava anterior à cabeça condilar na secção sagital. Caso o disco fosse capturado pelo côndilo durante a abertura, e esta relação se aproximasse do normal, o deslocamento anterior era classificado de deslocamento com redução (Figuras 2 e 3). Já, se o disco deslocado anteriormente permanecesse comprimido durante o movimento de abertura, o deslocamento era classificado de deslocamento sem redução4 (Figura 4). Para analisar o deslocamento do disco em relação ao sexo, o teste de Qui-quadrado com correção de Yates foi utilizado. O teste Qui-quadrado foi utilizado para analisar a ocorrência de deslocamentos uni e bilaterais. P<0,05 foi considerado significativo. Finalmente, foi utilizada porcentagem para avaliar a proporção de redução do disco. RESULTADOS
Apesar do número de mulheres encaminhadas para o serviço de Imaginologia ter sido 3,5 vezes maior que o número de homens, não houve diferença significativa entre homens e mulheres
ABOdaNac. - Vol. 17 temporomandibular nº 4 - Agosto/setembropor 2009 Ritto, Fabio et al.Rev. Estudo articulação meio de ressonância magnética
233
234
Rev. ABO Nac.
Fig.1 - Fechamento com disco bem posicionado
Fig. 2 - Fechamento com deslocamento anterior do disco
Fig. 3 - Abertura com redução do disco
Fig. 4 - Abertura sem redução do disco
em relação ao deslocamento anterior do disco (P=0,9634) (Gráfico 1). Nenhum grupo demonstrou qualquer diferença significativa na distribuição da patologia uni e bilateral (P=0,9327) (Gráfico 2). Avaliando-se a redução do disco, foi observado que 41 (63%) das 65 ATMs avaliadas apresentaram deslocamento do disco. Em 28 casos (43% dos 65 e 68% dos 41) o disco retornou a sua posição original
quando o paciente abriu a boca, mas em 13 casos (20% dos 65 e 32% dos 41) o disco não apresentou redução, permanecendo anterior ao côndilo, estando o paciente com a boca aberta ou fechada.
234
DISCUSSÃO
Analisando os resultados obtidos, nenhum grupo específico de pacientes pode ser apontado como mais propenso ao des-
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
locamento anterior do disco articular. Pôde ser observado, no entanto, que o sexo feminino é mais sintomático que o masculino, uma vez que a relação de mulheres para homens encaminhados para exame da ATM foi de 3,5. Este valor está muito próximo do encontrado por Cholitgul et al.1 (1997) de 4 para 1. Além disso, nenhuma diferença significativa pôde ser encontrada entre os sexos ou entre os deslocamentos uni e bilaterais. Este achado vai de encontro com os estudos de Katzberg et al.6 (1996) e Matsuda et al.9 (1994). Por outro lado, Milano et al.10 (2000) apontaram o deslocamento bilateral do disco como mais comum, apesar dos sinais e sintomas clínicos terem ocorrido unilateralmente em maior proporção. Embora possa ser difícil aceitar tal ocorrência, os autores colocam que, como não é possível separar funcionalmente as duas articulações, cedo ou tarde a disfunção mecânica acometerá a outra articulação. Em relação à redução do disco, foi observado que na maior parte dos deslocamentos (68%) houve redução, enquanto 32% não apresentaram redução. Em contrapartida, Foucart et al.4 (1998) apontaram o deslocamento anterior do disco sem redução como o deslocamento mais comum dentre as desordens internas da ATM. De acordo com Eberhard et al.2 (2000) as alterações mais marcantes dos tecidos moles e duros foram encontradas em pacientes com deslocamento anterior do disco sem redução. Cholitgul et al.1 (2000) argumentam que o deslocamento anterior sem redução é, provavelmente, uma condição mais intimamente relacionada à osteoartrose do que o deslocamento anterior sem redução. Segundo Milano et al,4 apenas o deslocamento do disco, não pode mais ser considerado causa primária de dores na ATM. O deslocamento do disco é atualmente tido como um fator predisponente que aumenta os riscos de sinais e sintomas14. Em concordância, Emshoff et al.3 (2002) observaram que a ausência clínica de DTM foi associada a uma alta taxa de distúrbios internos (55,9%). Além disso, os autores não encontraram relação significativa en-
Rev. ABO Nac.por - Vol. 17 nº - Agosto/setembro 2009 Ritto, Fabio et al. Estudo da articulação temporomandibular meio de4ressonância magnética
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Gráfico 1 - Comparação do deslocamento anterior do disco articular entre os sexos feminino e masculino através do teste Qui-quadrado com correção de Yates
tre a ocorrência de dor na ATM e o diagnóstico de distúrbios internos através de ressonância magnética. Tentar distinguir um grupo específico de pacientes com predisposição a DTM é uma meta que deve ser perseguida. Mais estudos de longo prazo, utilizando a ressonância magnética, com uma amostra maior de pacientes, e que incluam tanto pacientes sintomáticos quanto assintomáticos, são necessários.
2.
3.
4.
CONCLUSÃO
Conclui-se que, nenhum paciente pôde ser caracterizado como sendo mais propenso a apresentar deslocamento anterior do disco. Não obstante, semelhante ao encontrado em outros estudos, pôde ser observado maior prevalência de queixas de distúrbios da articulação temporomandibular no sexo feminino.
5.
REFERÊNCIAS
7.
1. Cholitgul W, Nishiyama H, Sasai T, Uchiyama Y, Fuchihata H, Rohlin M. Clinical and magnetic resonance imaging findings in
235
Rev. ABO Nac.
6.
Gráfico 2 - Comparação entre o acometimento uni ou bilateral do deslocamento anterior do disco articular através do teste Quiquadrado
temporomandibular joint disc displacement. Dentomaxillofac Radiol 1997;26:183-8. Eberhard D, Bantleon HP, Steger W. Functional magnetic resonance imaging of temporomandibular joint disorders. Eur J Orthod. 2000;22:489-97. Emshoff R, Rudisch A, Innerhoger K, Brandlmaire I. Magnetic resonance imaging findings of internal derangement in temporomandibular joints without a clinical diagnosis of temporomandibular disorder. J Oral Rehab. 2002;29:516-22. Foucart JM, Carpentier P, Pajoni D, Bonnet RM, Pharaboz C. MR of 732 TMJs: anterior, rotational, partial and sideways disc displacements. Eur J Radiol. 1998;28:86-94. Isberg A, Stenstrom B, Isacsson G. Frequency of bilateral temporomandibular joint disk displacement in patients with unilateral symptoms: a 5-year follow-up of the asymptomatic joint, a clinical and arthrotomographic study. Dentomaxillofac Radiol. 1991;20:73-6. Katzberg RW, Westsson PL, Tallents RH, Drake CM. Anatomic disorders of the temporomandibular joint disc in asymptomatic subjects. J Oral Maxillofac Surg. 1996;54:147-53. Kerstens HJ, Golding RP, van der Kwast WM. Magnetic resonance imaging of partial temporomandibular joint disc displacement. J Oral Maxillofac Surg. 1989;47:25-9.
8. Kurita H, Ohtsuka A, Koabyashi H, Kurashina K. Is the morphology of the articular eminence of the temporomandibular joint a predisposing factor for disc displacement? Dentomaxillofac Radiol. 2000;29:159-62. 9. Matsuda S, Yoshimura Y, Lin Y. Magnetic resonance imaging assessment of the temporomandibular joint disk displacement. Int J Oral Maxillofac Surg. 1994;23:266-70. 10. Milano V, Desiate A, Belllino R, Garofalo T. Magnetic resonance imaging of temporomandibular disorders: classification, prevalence and interpretation of disc displacement and deformation. Dentomaxillofac Radiol. 2000;29:352-61. 11. Murakami S, Takahashi A, Nishiyama H, Fujishita M, Fuchihata H. Magnetic resonance evaluation of the temporomandibular joint disc position and configuration. Dentomaxillofac Radiol. 1993;22:205-7. 12. Palacios E, Valvassori EG, Shannon M, Charles FR. Magnetic resonance of the temporomandibular joint. New York: Thieme Medical Publishers; 1990. p.75-121. 13. Styles C, Whyte A. MRI in the assessment of internal derangement and pain within the temporomandibular joint: a pictorial essay. Br J Oral Maxillofac Surg. 2002;40:220-8. 14. Westsson PL, Larheim TA, Tanaka H. Posterior disc displacement in the temporomandibular joint joint disc displacement. J Oral Maxillofac Surg. 1998;56:1266-73.
ABOda Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro por 2009meio de ressonância magnética Ritto, Fabio et al.Rev. Estudo articulação temporomandibular
235
236
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Artigo original
Prevalência das lesões orofaciais em casos de maus-tratos infantojuvenis na cidade de São Luís (Maranhão) Prevalence of the lesions orofacial in cases of maltreatments infanto-juvenile in São Luís’ city (Maranhão) Palavras-chave: Traumatismos maxilofaciais. Violência doméstica. Maus-tratos infantis. Adolescente. Keys words: Maxillofacial injuries. Domestic violence. Child abuse. Adolescent.
Rubenice Amaral da Silva* Amanda Pereira Palitó** Maria Carmen Fontoura Nogueira da Cruz***
RESUMO
Introdução - O presente trabalho tem por objetivo verificar a prevalência de lesões orofaciais resultante de maus-tratos em crianças e adolescentes, considerando a faixa etária e o sexo, o grau de parentesco do agressor com a vítima, a região mais afetada e o tipo de lesão mais frequente. Materiais e Métodos - Foi realizado um levantamento dos processos dos casos de maus-tratos nos arquivos do Instituto Médico Legal – IML – e da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente – DPCA – do município de São Luís (Maranhão), no período de janeiro a dezembro de 2007, onde foram encontrados 107 casos de maus-tratos. Resultados - Os resultados permitiram concluir que as vítimas de maus-tratos, em sua maioria, são do sexo masculino e de idade compreendida entre 15 e 17 anos. O pai é o maior executor dos casos de violência física, atingindo mais a área frontal, com uma maior frequência de lesões tipo escoriação seguida em ordem decrescente da equimose e edema. Conclusão - Conclui-se, portanto, que os cirurgiõesdentistas devem estar atentos e orientados quanto ao reconhecimento dos principais sinais clínicos dos casos de maus-tratos contra crianças e adolescentes para assim, notificá-los às autoridades competentes sobre tais ocorrências. ABSTRACT
Doutoranda em Biotecnologia pela Rede Nordeste de Biotecnologia (Renorbio). Professora Adjunto IV do Departamento de Odontologia II da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). ** Cirurgiã-dentista pela UFMA. *** Doutora em Patologia Oral pelo Programa de Pós-Graduação em Patologia Oral da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Professora Adjunto III do Departamento de Odontologia II da UFMA. E-mail: ma.carmen@uol. com.br *
Introduction - The present work has for objective to verify the prevalence of lesions orofacial resulting of maltreatments in children and adolescents, considering the age group and the sex, the degree of the aggressor’s relationship with the victim, the most affected area and the type of more frequent lesion. Materials and Methods - Arising of the processes of the cases of maltreatments was accomplished in the files of the Legal Medical Institute - IML - and of the Police station of Protection to the Child and the Adolescent - DPCA - of the municipal district of São Luís (Maranhão), in the period of January to December of 2006, where they were found 107 cases of maltreatments. Results - The results allowed ending that the victims of maltreatments, in your majority, are of the masculine sex and of age understood between 15 and 17 years. The father is the largest executioner of the cases of physical violence, reaching more the front area, with a larger frequency of lesions type followed excoriation in decreasing order of the ecchymosis and edema. Conclusion - Therefore, the dentists should be attentive and guided with relationship to the principal clinical signs of the cases of ill-treatments recognition against children and adolescents for like this, to notify them to the competent authorities on such occurrences.
Rev. ABOinfantojuvenil Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009 Silva, na cidade de São Luís (Maranhão) 236 Rubenice Amaral da et al. Prevalência das lesões orofaciais em casos de maus-tratos
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
INTRODUÇÃO
Os maus-tratos infantis configuram-se como ações ou omissões contra menores de idade que sofrem habitual ou ocasionalmente, violências físicas, emocionais ou ambas, de forma intencional, constituindo-se como agressores os pais, tutores, familiares, amigos ou pessoas responsáveis por eles6. Esta problemática gera discussão em toda sociedade, contudo, parece ser ainda carregada de um sentimento de negação por parte das vítimas e do agente agressor10-11. Os maus-tratos podem ser divididos em físicos, sexuais, psicológicos e negligência, sendo o abuso sexual provavelmente, a forma de maus-tratos cujo diagnóstico se torna difícil, uma vez que muitos casos deixam de ser relatados por outros membros da família7. O abuso físico é a forma de agressão à criança mais reconhecida, com quadros clínicos de traumas físicos ou falta de desenvolvimento, quando a explicação da injúria não é consistente com o tipo e severidade das lesões observadas2. Em relação às lesões resultantes do abuso físico, mais da metade ocorrem na região da cabeça, boca e pescoço, áreas diretamente relacionadas aos cuidados dos cirurgiõesdentistas2. De uma forma geral, os profissionais têm dado pouca atenção à violência contra a criança, seja por omissão ou desconhecimento de causa17. Todavia, no caso dos cirurgiões-dentistas, quando bem orientados estes podem ser os primeiros profissionais de saúde a suspeitar que uma criança foi vítima de maus-tratos20-21. O diagnóstico baseia-se no reconhecimento de indicadores comportamentais e dos sinais e sintomas físicos comuns às crianças abusadas e negligenciadas2, sendo os mais comuns as marcas de estrangulamento e de mordida; hemorragias na retina; calvície irregular devido a puxões de cabelo; feridas nas comissuras labiais e contusões no palato; fraturas dentárias, nariz, mandíbula, ossos malar e zigomático; lacerações dos freios lingual, labial e da língua; equimoses nas bochechas, nádegas, costas e parte posterior das coxas; desvio de abertura bucal; existência de vários ferimentos em diversos estágios de cicatrização e queimaduras de terceiro grau; orelhas traumatizadas e lesões inco-
237
Rev. ABO Nac.
Tabela 1. Distribuição dos casos de maus-tratos infanto-juvenis, segundo a idade e o sexo. São Luís (MA) - 2007
Faixa etária 0 – 05 06-10 11-14 15-17 Total
Sexo
p*
Masculino
Feminino
03 (2,8%) 06 (5,6%) 15 (14%) 38 (35,5%) 62 (57,9%)
08 (7,5%) 02 (1,9%) 17 (15,9%) 18 (16,8%) 45 (42,1%)
0,0284
* Teste do Qui-quadrado Fonte: Instituto Médico Legal e da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente
muns na pele; menor sensibilidade à dor, reação imprópria aos estímulos, comportamento tímido e desatento3-7,,13,16,22. Segundo as recomendações da Abrapia1 (1997), o procedimento a ser adotado pelos profissionais de saúde diante de suspeita de maus-tratos em crianças e adolescentes, consta de notificação, através de ofício, aos Conselhos Tutelares ou, na falta desses, comunicação ao Juizado da Infância e Juventude; notificação da ocorrência à autoridade policial e solicitação de guia de encaminhamento da criança a exame de corpo de delito. Em vista da possibilidade de contato que os cirurgiões-dentistas têm com vítimas de maus-tratos e aliada à total ausência de dados sobre a ocorrência de lesões orofaciais decorrentes dessa natureza para a cidade de São Luís, MA, realizou-se este trabalho a fim de determinar o perfil das vítimas de tais lesões contra crianças e adolescentes, considerando-se a faixa etária e o sexo, o grau de parentesco do agressor com a vítima, a região mais afetada e o tipo de lesão mais frequente. Dessa forma, pretendemos fornecer informações que possibilitem a identificação de situações de maus-tratos no âmbito odontológico, que despertem o cirurgião-dentista para tal problema e assim, o profissional possa notificar as autoridades competentes sobre tais ocorrências. MATERIAIS E MÉTODOS
Para atender às exigências éticas e científicas fundamentais da Resolução 196/96 (Normas de Pesquisa envolvendo Seres Humanos) do Conselho Nacional de Saúde, o referido projeto foi submetido ao Comitê de
Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão sob o número 33104-649/2007 e aprovado de acordo com o parecer 407/2007, em 20.07.2007. Para a realização deste trabalho foi feito um estudo retrospectivo, transversal e descritivo dos processos dos casos de maustratos em crianças e adolescentes encontrados nos arquivos do Instituto Médico-Legal – IML – e na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente – DPCA – do município de São Luís, MA, no período de janeiro a dezembro de 2006, após autorização dos respectivos órgãos através do termo de consentimento livre e esclarecido. A coleta dos dados feita a partir de fichas individuais, considerando-se as variáveis, faixa etária e sexo, grau de parentesco do agressor com a vítima, região mais afetada e tipo de lesão mais frequente. RESULTADOS
Os dados coletados dos arquivos do Instituto Médico Legal e da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente, no período de janeiro a dezembro de 2006, foram analisados, sendo identificadas 107 vítimas de maus-tratos físicos. Destas, observa-se que a faixa etária compreendida entre 15 a 17 anos apresentou maior frequência de agressão, ou seja, 52,3% dos casos, sendo 35,5% do sexo masculino e 16,8% do sexo feminino, havendo uma relação de dependência entre a faixa etária e o sexo (Tabela 1). Os dados do vínculo do agressor com a vítima mostram que o pai é o responsável pela maioria dos casos (47,7%), seguido por outros indivíduos conhecidos da família
Rev. Nac. - Vol.das 17 lesões nº 4 - orofaciais Agosto/setembro Silva, Rubenice Amaral da ABO et al. Prevalência em casos2009 de maus-tratos infantojuvenil na cidade de São Luís (Maranhão)
237
238
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Tabela 2. Distribuição das lesões orofaciais dos casos de maus-tratos infanto-juvenis, segundo a localização. São Luís (MA) - 2007
Região Orofacial Labial Orbitária Malar Mucosa jugal Nasal Bucinadora Frontal Cervical Processo alveolar Mentoniana Masseteriana Superciliar Zigomática Palpebral Total
p* n
%
19 17 21 03 13 15 28 13 01 05 07 03 07 17 169
11,2 10,1 12,4 1,8 7,7 8,9 16,6 7,7 0,6 3,0 4,1 1,8 4,1 10,1 100
0,0001
* Teste do Qui-quadrado Fonte: Instituto Médico Legal e da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente
Tabela 3. Distribuição das lesões orofaciais dos casos de maus-tratos infanto-juvenis, segundo o tipo de lesão. São Luís (MA) - 2007
Tipo da lesão
p*
Equimose Escoriação Edema Ferida contusa Trauma dentário Hematoma Hemorragia conjuntiva Compressão Total
n
%
32 50 31 18 01 20 03 01 169
20,5 32,1 19,9 11,5 0,6 12,8 1,9 0,6 100
0,0001
* Teste do Qui-quadrado Fonte: Instituto Médico Legal e da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (38,3%) e pela mãe (7,5%). A Tabela 2 mostra outro dado observado em nossa pesquisa, no qual se percebe que 100% dos casos de violência física apresentam lesões orofaciais, sendo demonstrada uma diversidade das regiões orofaciais onde as lesões foram encontradas, sendo a região frontal (16,6%) a mais acometida, seguida pela região malar (12,4%) e região labial (11,2%), demonstrando uma diferença esta-
tisticamente diferente entre as diversas regiões orofaciais. Considerando o tipo de lesão encontrada, observa-se na tabela 3 que os tipos mais frequentes foram a escoriação em 32,1% dos casos, seguida da equimose e do edema com 20,5% e 19,9% dos casos, respectivamente. Desse modo, pode-se verificar uma diferença estatisticamente significante entre os diversos tipos de lesões.
DISCUSSÃO
Maus-tratos infantis é um termo-diagnóstico que descreve uma variedade de comportamentos que se estendem desde uma disciplina severa até a tortura repetitiva e intencional. Trata-se de um fenômeno complexo resultante de uma combinação de fatores individuais, familiares e sociais5,8 , havendo a necessidade de esclarecimento da responsabilidade ética e legal do cirurgião-dentista, bem como a obrigação de denúncia de casos de maus-tratos contra a criança e o adolescente12. Nossos dados revelam que a faixa etária de maior ocorrência de casos de maus-tratos foi compreendida entre 15 a 17 anos e a de menor ocorrência, entre 6 e 10 anos, resultados que coincidem com os de Monteiro15 (2004). Por outro lado, divergem dos dados encontrados por Carvalho et al.4 (2001), onde a faixa etária mais expressiva foi entre 11 e 15 anos, sendo as crianças de 0 a 5 anos menos atingidas, com apenas 9% dos casos. Enquanto que Vieira et al.21 (1998) mostraram que 55,9% das vítimas estavam na faixa etária menor de 6 anos e 39,4% com menos de 2 anos de idade. Chaves et al. 9 (2003) em seu estudo, relataram que o maior número de casos de maus-tratos infantis apresentavam idades de 0 a 3 (22%) e 4 a 7 (35,6%) anos de idade. Em relação ao sexo das vítimas, os meninos apresentaram um número maior de casos de maus-tratos, ou seja, 57,9%, dados estes diferentes dos observados por Vieira et al.21 (1998), Carvalho et al.4 (2001) e Monteiro15 (2004), nos quais o sexo feminino foi o mais acometido. Analisando o vínculo do agressor com a vítima, percebemos que o pai foi o responsável pela maioria dos casos de agressão, o que coincide com os registros de Monteiro15 (2004). Por outro lado, Chaves et al.9 (2003) citam a mãe como principal agressor. Sugere-se assim, haver uma relação entre a idade da vítima e o vínculo do seu agressor, pois, nos casos onde a mãe foi quem mais agrediu, percebe-se que as vítimas apresentavam as faixas etárias menores, ou seja, idades de maior dependência materna. Quando prevalece a agressão por parte do pai, as vítimas tendem a apresentar faixas etárias mais elevadas, nas quais a presença da figura paterna
Rev. ABOinfantojuvenil Nac. - Vol. 17 4 - Agosto/setembro 2009 238 Rubenice Amaral da et al. Prevalência das lesões orofaciais em casos de maus-tratos Silva, na nº cidade de São Luís (Maranhão)
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
se faz mais presente e, muitas vezes, com o consentimento da própria mãe na efetivação dos maus-tratos. A detecção deste perfil é um importante coadjuvante no diagnóstico dos vitimados de maus-tratos e pode ser considerado pelo profissional no momento da anamnese14,18-19. Os maus-tratos podem ser divididos em físicos, sexuais, psicológicos e negligência. Essas categorias se superpõem, pois todas as formas de maus-tratos apresentam componentes emocionais sendo o abuso sexual também categoria de maus-tratos físicos7. Um aspecto marcante em nossa pesquisa é que 100% dos casos de violência física contra crianças e adolescentes apresentavam lesões orofaciais, nas mais diversas regiões anatômicas. Vale ressaltar que nos casos em que houver suspeita de violência, os exames extra e intrabucal devem ser realizados de forma cuidadosa e completa, no sentido de possibilitar a obtenção do maior número de informações, permitindo o correto diagnóstico8. Ao se analisar os dados referentes aos tipos de lesões orofaciais, verifica-se que as mais frequentes foram, a escoriação, a equimose e o edema. Dados estes também observados em pesquisa realizada por Silveira et al.19 (2005). Dentre as injúrias envolvendo a face, as contusões e equimoses representam 66% das lesões e as abrasões e lacerações correspondem a 28%. De acordo com os autores, os danos às estruturas intrabucais mais frequentes são: contusões e equimoses (43%) e abrasões e lacerações (29%). Quanto ao trauma dentário, ele ocorre em 29% das injúrias4. Os mais diversos tipos de lesões encontradas sugerem que a violência física em crianças e adolescentes é a forma de maustratos de fácil identificação por parte do cirurgião-dentista, em especial do odontopediatra, os quais, ao identificá-las e considerando a inconsistência da história narrada pelos pais ou acompanhantes, poderão suspeitar que estão diante de um caso de maus-tratos e assim notificá-lo às autoridades competentes. Consequentemente, a comunidade odon-
239
Rev. ABO Nac.
tológica, por ocupar uma posição única no reconhecimento de maus-tratos, deve ser alertada e conscientizada sobre sua fundamental importância no combate ao abuso e negligência infantis6,13. Torna-se imprescindível que o cirurgião-dentista seja capacitado a: diagnosticar as situações de violência envolvendo menores de idade; fornecer os cuidados dentários emergenciais necessários; e bem como, notificar e encaminhar às autoridades competentes tais ocorrências2. CONCLUSÃO
De acordo com a metodologia empregada e frente aos resultados obtidos, é possível concluir que as vítimas de maus-tratos, em sua maioria, são do sexo masculino e com idade compreendida entre 15 e 17 anos, sendo o pai o maior executor dos casos de violência física, atingindo mais a área frontal, com maior frequência de lesões tipo escoriação, seguida em ordem decrescente da equimose e do edema. Portanto, os cirurgiões-dentistas devem estar atentos e orientados quanto ao reconhecimento dos principais sinais clínicos dos casos de maus-tratos contra crianças e adolescentes para assim, poderem notificar tais ocorrências às autoridades competentes. REFERÊNCIAS 1. Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e à Adolescência (Abrapia). Guia de orientação para profissionais da saúde. 2ª ed. Rio de Janeiro: Petrópolis; 1997. 2. Alves PM, Cavalcanti AL. Diagnóstico do abuso infantil no ambiente odontológico. Uma revisão de literatura. Publ UEPG Ciênc Biol Saúde. 2003;9(3/4):29-35. 3. Becker, DB, Needleman HL, Kotelchuck M. Child abuse and dentistry: orofacial trauma and its recognition by dentists. J Am Dent Assoc. 1978;97(1):244. Carvalho ACR, Garrido LC, Barros SG, Alves AC. Abuso e negligência: estudo na delegacia de repressão aos crimes contra a criança e ao adolescente. J Bras Odontopediatr Odontol Bebê. 2001;4(18):117-23. 5. Carvalho C. Diagnóstico: abuso infantil. Rev Bras Odontol. 2002;59(3):180-3. 6. Cavalcanti AL. Abuso infantil: protocolo de atendimento odontológico. Rev Bras Odontol. 2001;58(6):378-80. 7. Cavalcanti AL, Valença AMG, Duarte RC. O odontopediatra diante de maus-tratos infantis:
diagnóstico e conduta. J Bras Odontopediatr Odontol Bebê. 2000;3(16):451-5. 8. Chaim LAF. Odontologia versus criança maltratada. Rev Assoc Paul Cir Dent. 1995;49:142-4. 9. Chaves AMB, Ferreira SH, Moreira PVL, Sousa AS, Rosenblatt A. Avaliação dos fatores relacionados aos maus-tratos a crianças e adolescentes. J Bras Odontopediatr Odontol Bebê. 2003;6(32):303-9. 10. Eisentein E. Temas de infectologia pediátrica; doenças sexualmente transmissíveis em crianças e adolescentes. Pediatr Atual. 1993;6(2):24-37. 11. Fischer DG, McDonald WL. Characteristics of intrafamilial and extrafamilial child sexual abuse. Child Abuse Negl. 1998;22(9): 915-29. 12. Garcia AFG, Menezes VA. Maus-tratos infantis: percepção e responsabilidade do cirurgião-dentista Rev Odonto Ciênc. 2008 23 (1):3539. 13. Gurgel CAS, Carvalho ACR, Barros SG, Alves AC. Maus-tratos contra criança: atitudes e percepções do cirurgião-dentista. Pesqui Odontopediatr Clin Integr. 2001;1(2):23-8. 14. Jessee SA. Child abuse and neglect: implications for the dental profession. Tex Dent J. 1999;116(2):40-6. 15. Monteiro EC. Contribuição ao estudo sobre maus-tratos em crianças e adolescentes e suas manifestações orofaciais [Dissertação de Mestrado]. São Luis: Universidade Federal do Maranhão; 2004. 16. Moura DPS, Toledo AO, Bezerra ACB. Reconhecimento de crianças vítimas de maustratos – responsabilidade do odontopediatra. J Bras Odontopediatr Odontol Bebê. 2000; 3(14):318-22. 17. Pires ALD, Miyazaki MCDS. Maus-tratos contra crianças e adolescentes: revisão de literatura para profissionais de saúde. Arq Ciênc Saúde. 2005;12(1):42-9. 18. Santos JF, Cavalcanti AL, Nunes KS, Silva EC. Primary identification of an abused child in dental office: a case report. J Indian Soc Pedod Prev Dent. 2007;6:191-3. 19. Silveira JLC, Mayrink S, Oliveira Neto OB. Maus-tratos na infância e adolescência: casuística, conhecimento e prática dos cirurgiões-dentistas de Blumenau-SC. Pesqui Bras Odontopediatr Clín Integr. 2005;5(2):119-26. 20. Skifos PM. Does the dentist have and ethical duty to report child abuse and neglect? J Am Dent Assoc.1996;127(6):521-3. 21. Vieira AR, Modesto A, Abreu VI. Avaliação dos casos de abuso infantil do Hospital Municipal Souza Aguiar (Rio de Janeiro) e sua relação com o cirurgião-dentista. Pediatr Atual.1998;11(1/2):21-32. 22. Welbury RR, Murphy JM. The dental practitioner’s role in protecting children from abuse 2. The orofacial signs of abuse. Br Dent J. 184(2):61-5.
Rev.daABO - Vol. das 17 nº 4 - Agosto/setembro Silva, Rubenice Amaral et al. Nac. Prevalência lesões orofaciais em casos2009 de maus-tratos infantojuvenil na cidade de São Luís (Maranhão)
239
240
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Relato de caso
Língua geográfica mimetizando uma candidíase - Relato de Caso Geographic tongue mimicking a candidiasis – Case Report Palavras-chave: Glossite migratória benigna. Candidíase bucal. Key words: Glossitis, benign migratory. Candidiasis oral.
Maria do Socorro Aragão* Ricardo Lombardi Farias** Eduardo Dias-Ribeiro*** Andréa Sarmento Queiroga**** Juliana Mariano Massuia****
RESUMO
A língua geográfica é uma condição benigna que preocupa o paciente por apresentar aspecto clínico variável, exibindo períodos de exacerbações e remissões, podendo manifestar-se mimetizando uma candidíase oral. Os autores relatam, neste trabalho, um caso de língua geográfica que foi erroneamente diagnosticada e tratada como candidíase, não tendo sido, deste modo, possível obter uma resposta positiva, no que concerne às manifestações apresentadas pela condição real. O diagnóstico de língua geográfica foi baseado na anamnese e através de um exame clínico acurado. Nenhum tratamento foi instituído, contudo, a paciente recebeu instruções pertinentes ao caso, bem como, está sendo acompanhada, desde a época do diagnóstico. ABSTRACT
The geographic tongue is a condition benign that cause preoccupation to the patient and present multiple clinic features, displaying exacerbation and remission stages, mimicking a candidiasis. The authors present a clinic case of geographic tongue that was confuse with candidiasis, had been received treatment without success. The diagnostic of geographic tongue was supported by accurate anamnesis and clinic examination. None treatment was done, nevertheless the patient received the pertaining instructions to the case, as well as she is being accompanied, since the diagnostic. INTRODUÇÃO
Doutora em Patologia Oral pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Professora da Disciplina de Patologia Bucal da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). ** Doutor em Ortodontia pela Faculdade de Odontologia de Araraquara, Universidade Estadual Paulista (Unesp). Professor da Disciplina de Ortodontia da UFPB. *** Mestrando em Estomatologia pela Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo. **** Alunas do Curso de Graduação em Odontologia da UFPB. *
240
A língua geográfica ou eritema migratório é uma condição de natureza benigna que produz inquietação ao seu portador devido ao aspecto clínico variável, com períodos de exacerbações e remissões7. Estudos epidemiológicos mostram uma variação na prevalência da língua geográfica entre 0,2 e 5% 1,3,10,14 . Estudo realizado por Pugliese et al.13 (1972) em crianças entre 7 e 12 anos demonstrou uma prevalência de língua geográfica isoladamente em 5,22% da população, e a associação entre língua geográfica e língua fissurada foi observada em 1,34% das crianças. Baldani2 (2001) examinando 200 crianças na faixa etária entre 0 e 24 meses, verificou que 5,00% dos bebês apresentavam língua geográfica. A associação da língua geográfica com a língua fissurada tem sido rela-
tada em estudos prévios3,5,13-14. Este achado sugere a hipótese de que a língua fissurada possa representar uma sequela da língua geográfica, considerando-se a prevalência da língua geográfica em pessoas jovens e a língua fissurada em mais velhos. Embora sua etiologia e patogênese permaneçam obscuras8, tem sido proposta sua associação ao estresse emocional ou a uma forma atópica de alergia9. Outras hipóteses mencionam uma origem genética4-5 com modo de transmissão poligênica5, associação com doenças sistêmicas, tais como, a psoríase e a diabete mellitus6-8, além de uma possível relação com a origem da população afetada3. Segundo Neville et al.12 (2004), a variação nos aspectos clínicos das lesões de língua geográfica observada em mulheres que usam contraceptivos orais, sugere a participação de
Rev. ABO Nac. - Vol. 17uma nº 4candidíase - Agosto/setembro Aragão, Maria do Socorro et al. Língua geográfica mimetizando - Relato de2009 Caso
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
fatores hormonais em sua etiopatogenia Conforme relatos de Neville et al.12 (2004) as mulheres são mais afetadas do que os homens em uma proporção de 2:1. Massucato e Rubira-Bullen11 (1998) e Baldani2 (2001) observaram que a língua geográfica em indivíduos do sexo masculino apresentava uma prevalência equivalente a 9,9% e 6,48%, respectivamente. A língua geográfica pode ser identificada em pessoas de diversas faixas etárias de idade. Avaliando bebês com idades entre 0 e 24 meses, Baldani2 (2001) observou uma ocorrência maior nas crianças cuja faixa etária encontrava-se entre 13 e 24 meses (8,57%). As lesões acometem preferencialmente a face dorsal e/ou bordas laterais da língua. Na fase ativa, observaram-se múltiplas áreas eritematosas bem-demarcadas, parcialmente circundadas por bordas amarelo-esbranquiçadas, circinadas e ligeiramente elevadas, apresentando períodos de exacerbações e remissões. Para Neville et al.12 (2004) a condição é comumente assintomática, embora, nas lesões ativas, possam ser relatadas sensação de ardência ou sensibilidade a alimentos quentes ou condimentados. Frequentemente observase língua fissurada em pacientes portadores de língua geográfica3,7,10-11. No diagnóstico diferencial da língua geográfica deve-se considerar a candidíase ou a eritroplasia. Tratamento para língua geográfica é comumente dispensável. Porém, o paciente deverá ser conscientizado sobre o caráter benigno da condição, bem como, orientado para práticas de higiene oral, especificamente da língua, e evitar alimentos quentes ou condimentados, durante a fase ativa das lesões. Em face do exposto, no que concerne à prevalência da língua geográfica na população, bem como, à dificuldade, por vezes observada, de se fazer um diagnóstico diferencial desta condição com algumas patologias, quais sejam, a candidíase e a eritroplasia que apresentam prognósticos diferentes, além da necessidade do uso de medidas terapêuticas adequadas, propusemo-nos apresentar este caso clínico, fazendo algumas considerações importantes sobre a língua geográfica.
241
Rev. ABO Nac.
Fig. 1 - Lesões eritematosas bem-demarcadas, circundadas por bordas amareloesbranquiçada, localizadas na ponta e bordas laterais da língua
RELATO DO CASO
Paciente do sexo feminino, leucoderma, 45 anos, procurou a Disciplina de Patologia Bucal da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), apresentando lesões eritematosas bem-delimitadas, circundadas por bordas amarelo-esbranquiçadas, situadas no dorso e regiões laterais da língua (Figura 1), com queixa de discreta ardência nas áreas afetadas e nos locais onde posteriormente surgiam as lesões, quando ingeria alguns tipos de alimentos (não esclarecidos pela portadora), desaparecendo a sintomatologia após a instalação das mesmas. Durante a anamnese, a paciente relatou que se encontrava sob forte estresse emocional. Por outro lado, foram descartadas as hipóteses de atopia, fatores genéticos ou hereditários, além de terapia contraceptiva oral, atuando como possíveis fatores desencadeantes da condição. Os relatos da paciente sobre o uso de inúmeros medicamentos antifúngicos, sem obtenção de uma resposta positiva, em momentos anteriores, além da realização de um cuidadoso exame clínico, eliminaram as hipóteses de candidíase ou eritroplasia, concluindo-se, portanto, tratar-se de língua geográfica, sem necessidade da execução de uma biópsia. A paciente recebeu informações sobre a natureza benigna deste tipo de língua, ao mesmo tempo em que foi orientada para executar uma boa higiene bucal,
Rev. ABO Nac. - geográfica Vol. 17 nºmimetizando 4 - Agosto/setembro 2009 - Relato de Caso Aragão, Maria do Socorro et al. Língua uma candidíase
principalmente da língua, e evitar alimentos quentes e picantes durante a fase ativa das lesões. Além disso, foi instruída para voltar e/ou informar, quando houvesse reincidência das lesões. Nos últimos doze meses de acompanhamento, a paciente relatou a ocorrência de períodos (não determinados, porém, sempre relacionados com fases de estresse emocional) de exacerbações (Figura 2) e remissões das lesões, bem como, afirmou ter seguido as instruções que recebera no momento do diagnóstico. DISCUSSÃO
A história relatada pelo paciente portador de língua geográfica é o fator mais importante no estabelecimento do diagnóstico. A queixa principal, o tempo de evolução do problema e algumas informações sobre a história médica e antecedentes pessoais, além de exame clínico bucal acurado, poderão contribuir para se estabelecer o diagnóstico. Entretanto, algumas vezes, o diagnóstico pode ser difícil, principalmente pelas semelhanças clínicas que a língua geográfica apresenta com outras condições, tais como, a candidíase e a eritroplasia. Neste caso, o estresse emocional foi o único fator possível de ser correlacionado com o surgimento das lesões, mediante a realização da anamnese e do exame clínico intrabucal. Este achado condiz com a opinião de Laskin et al.9 (2003). No que concerne ao fator sexo, o caso
241
242
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
AGRADECIMENTOS
Nossos sinceros agradecimentos à Doutora Rita de Cássia Cavalcanti Gonçalves pela presteza e valiosa colaboração dadas a este trabalho. REFERÊNCIAS
Fig. 2 - Exacerbação das lesões de língua geográfica, exibindo características clínicas peculiares, doze meses após o diagnóstico
apresentado corroborou os relatos de Neville et al.12 (2004), tendo em vista tratar-se de uma mulher, contrapondo-se, no entanto, aos achados de Massucato e Rubira-Bullen11 (1998), e Baldani2 (2001) que encontraram uma prevalência deste tipo de língua em indivíduos do sexo masculino. Com relação à idade, a literatura pertinente menciona que a língua geográfica pode acometer pessoas de diversas faixas etárias. Neste caso, a paciente tinha 45 anos de idade quando começaram a surgir as primeiras lesões, período em que foi procurar solução para o problema. Enquanto que Massucato e RubiraBulen11 (1998) relatam uma prevalência na faixa etária entre 10 e 12 anos, Baldani2 (2001) observou uma ocorrência maior em crianças com idades variando entre 13 e 24 meses. Quanto à localização, as lesões observadas neste relato condizem com o sítio de preferência deste tipo de alteração lingual, que é o terço anterior da face dorsal e bordas laterais da língua. Os aspectos clínicos apresentados pelas lesões, incluindo discreta ardência, mencionada pela paciente, corroboram os dados da literatura consultada. Entretanto, neste caso não foi observada associação desta condição com a língua fissurada conforme relatos de Gonzaga et al.7 (1995), Gonzaga et al.8 (1996), Massucata e RubiraBullen11 (1998), e Neville et al.12 (2004).
242
Seguindo as orientações descritas na literatura pertinente, nenhum tratamento foi instituído à paciente do presente caso, em face da história relatada e do exame clínico terem sido compatíveis com o diagnóstico clínico de língua geográfica. Também não houve necessidade da realização de uma biópsia Apenas recomendou-se que a paciente evitasse alguns agentes (alimentos) que poderiam causar a exacerbação dos sintomas. CONCLUSÃO
Não obstante a língua geográfica representar uma condição comum que acomete preferencialmente o dorso e bordas laterais da língua, é de fundamental importância a realização de um diagnóstico diferencial entre outras condições como, por exemplo, a candidíase, que, embora apresente algumas similaridades clínicas com a língua geográfica, necessita de tratamento e possui prognóstico diferente. Este fato pôde ser constatado no presente caso, quando a paciente recebeu, anteriormente ao nosso atendimento, um tratamento à base de drogas antifúngicas, reforçando, portanto, a teoria da semelhança clínica desta condição com a candidíase. Do exposto, depreende-se que há necessidade de uma anamnese detalhada e uma melhor avaliação clínica nos casos suspeitos de língua geográfica.
1. Assimakopulos D, Patrikakos G, Fotika C, Elisaf M. Benign migratory glossitis or geographic tongue: an enigmatic oral lesion. Am J Med. 2002;113(9):751-5. 2. Baldani MH. Prevalência de alterações bucais em crianças atendidas nas clínicas de bebês públicas de Ponta Grossa – PR, Brasil. Pesqui Odontol Bras. 2001;15(4):302-7. 3. Chosack A, Zadic D, Eidelman E. The prevalence of scrotal tongue and geographic tongue in 70,359 Israeli schoolchildren. Community Dent Oral Epidemiol. 1974; 2(5):253-7. 4. Crispim ASS, Sampaio MCC. Língua geográfica: avaliação clínica e micológica. Rev ABO Nac. 1999;7(2):86-9. 5. Eidelman E, Chosack A, Cohen T. Scrotal tongue and geographic tongue polygenic and associated traits. Oral Surg. Oral Med Pathol. 1976;42(5):591-6. 6. Gonzaga HFS, Consolaro A. Língua geográfica. Pode ser uma forma frusta de psoríase? RGO (Porto Alegre). 1993;41(4):204-6. 7. Gonzaga HFS, Gonzaga LHS, Costa CAS. Aspectos epidemiológicos e etiológicos na língua geográfica. Rev Odontol UNESP. 1995;24(1):169-77. 8. Gonzaga HFS, Torres EA, Alchorne MMA, Gerbase-Delima M. Both psoriasis and benign migratory glossitis are associated with HLACw6. Br J Dermatol. 1996;135(3):368-70. 9. Laskin DM, Giglio JA, Rippert ET. Differential diagnosis of tongue lesions. Quintessence Int. 2003;34(5):331-42. 10. Loffredo LCM, Machado JAC. Prevalência da língua geográfica, língua fissurada e glossite rombóide mediana, em escolares de Ibaté-SP, no ano de 1980. Rev. Odontol UNESP. 1983;12(½):71-5. 11. Massucato SEM, Rubira IRF. Levantamento dos aspectos clínicos do dorso lingual em escolares do Município de Araraquara –SP. Rev Fac Odontol Univ Fed Bahia. 1998;17(1-2):6-10. 12. Neville BW, Damm DD, Allen CM, Bouquot JE. Patologia oral & maxilofacial. 2.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;2004. 13. Pugliese WS, Araújo VC, Birman EG, Araújo NS. Prevalência da língua geográfica, língua fissurada, língua pilosa e da glossite mediana rômbica em escolares do município de São Paulo. Rev Facul Odontol Univ São Paulo. 1972;10(2):139-42. 14. Voros-Balog T, Vincze N, Banoczy J. Prevalence of tongue lesions in Hungarian children. Oral Dis. 2003;9(2):139-42.
ABO Nac. - Vol. 17 nº candidíase 4 - Agosto/setembro Aragão, Maria do Socorro et al. LínguaRev. geográfica mimetizando uma - Relato de2009 Caso
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
243
Rev. ABO Nac.
Revisão
Conduta frente a lesões na face decorrentes de mordida humana ou de animal doméstico Management of human and pet animals bite injuries to the face Palavras-chave: Mordeduras humanas. Mordeduras e picadas. Traumatismos faciais. Key words: Bites, human. Bites and Sting.; Facial injuries.
Jônatas Caldeira Esteves* Nilesh Joriel Moniz** Ronaldo Rodrigues de Freitas†
RESUMO
Os ferimentos causados por mordidas humanas e de animais domésticos são ocorrências comuns nos serviços de pronto-atendimento dos hospitais. Particularmente em crianças, a face é a área mais atingida. Desta forma, é comum que cirurgiões bucomaxilofaciais sejam solicitados a avaliar e tratar tais ferimentos. Neste trabalho, realizou-se uma revisão de literatura concernente à incidência, fisiopatológica, aspectos microbiológicos, atendimento inicial e manejo cirúrgico desses ferimentos. O objetivo deste trabalho é fornecer orientação para o tratamento apropriado dos ferimentos devidos a mordidas. ABSTRACT
Human and animal bites are common occurrences at urgency attention room. Particularly in children, the face is the most affected area of the body. Therefore, is common the requirement of the maxillofacial surgeon to evaluate and treat this lesions. A literature review was undertaken concerning the following aspects: incidence physiopathology, microbiological aspects, initial therapy and surgical management of these wounds. The aim of this paper is to give guidelines to appropriately handle bite wounds.
INTRODUÇÃO
* Aluno de aprimoramento em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. E-mail: joantasce@hotmail.com ** Assistente do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. E-mail: nilesh_cir_bm @yahoo.com † Chefe do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Os ferimentos causados por mordidas humanas e de animais são de ocorrência relativamente comum nos serviços de atendimentos emergenciais e apresentam variados graus de severidade. Segundo Palácio et al.20 (2005), 50% destes acidentes deixam cicatrizes permanentes na vítima, e cerca de 1 a 5% necessitam hospitalização. De todos os animais, os cães são os responsáveis pelo maior número de agressões, cerca de 80 a 90% de todos os casos11. Nos Estados Unidos, estima-se que 2% da população tenha sido vítima de mordidas de cães numa fase precoce da vida, resultando a média de 914 ocorrências por dia, em serviços de urgência15.
No Brasil, apesar da escassez de trabalhos na literatura referentes ao assunto, Del Ciampo et al.4 (2000) encontraram uma casuística de 412 acidentes causados por cães, num levantamento realizado em uma Unidade Básica de Saúde de Ribeirão Preto-SP, no período de janeiro de 1993 a dezembro de 1997; e, de semelhante forma, seus dados corroboram as prevalências de sexo, idade e local do corpo acometidos, encontrados em demais trabalhos da literatura mundial. Neste contexto, cabe também ao cirurgião bucomaxilofacial a tarefa de avaliar e tratar, dentre outros tipos de traumatismos, as lesões por mordidas na face, as quais requerem cuidados especiais durante o tratamento. Diante disso, este trabalho
Rev.etABO Nac. -frente Vol. 17 nº 4 -naAgosto/setembro 2009 Esteves, Jônatas Caldeira al. Conduta a lesões face decorrentes de mordida humana ou de animal doméstico
243
244
Rev. ABO Nac.
tem como objetivo realizar uma revisão da literatura sobre os conceitos de abordagem do paciente vítima de mordidas humanas e de animais domésticos na face. REVISÃO DE LITERATURA Incidência e fisiopatologia das mordidas
A literatura aponta crianças com idade entre 5 a 9 anos como vítimas em 70% dos casos . Na grande maioria, do gênero masculino, agredidas por cães do convívio familiar. As lesões na cabeça e pescoço predominam neste grupo de pacientes, ocorrendo em cerca de 70 a 85% dos casos, pois a baixa estatura deste grupo favorece o ataque. Na face, os lábios, nariz, bochecha e orelhas são os locais mais acometidos20,4,7,22. Por outro lado, as mordidas humanas, segundo Marrs et al.16 (1979) e Donkor e Bankas5 (1997), constituem a terceira mais comum entre as mordidas de mamíferos; no entanto, são menos relatadas, uma vez que as circunstâncias que podem estar envolvidas na agressão, como abusos físicos ou sexuais, principalmente a crianças, inibem a vítima ou o responsável a procurar um pronto atendimento27,19. Kelly et al.14 (1996) afirmaram que mais da metade dos casos são resultado de agressões físicas, principalmente brigas entre adolescentes e adultos jovens, do gênero masculino. A anatomia da dentição dos mamíferos é capaz de produzir lesões variadas nos tecidos da vítima, as quais podem assumir um aspecto cortante, por ação dos incisivos; perfurante, por ação dos caninos; macerante, por ação dos pré-molares e molares; e avulsivo, pela ação conjunta dos dentes no desgarramento forçado da pele. Dentre estes padrões de lesão, as feridas perfurantes possuem alta propensão à infecção, as macerantes resultam em variado grau de desvitalização tecidual e as avulsivas podem produzir danos com cicatrizes permanentes, pela perda de substância tecidual11,23,28. Manejo inicial
É evidente que a maioria das feridas por mordidas humanas e de animais são
244
classificadas como traumatismos de danos locais, que dificilmente colocam em risco imediato a vida da vítima; entretanto, alguns ataques mais violentos, como os causados por animais treinados ou mesmo selvagens, podem causar lesões mais graves em estruturas importantes18,13 , como os grandes vasos do pescoço, estruturas nervosas, esôfago, laringe ou base de crânio18, o que requer cuidados específicos em nível hospitalar. Estando o paciente numa condição sistêmica estável, o primeiro passo consiste em uma anamnese completa, que envolve informações sobre o modo, tempo, local e circunstâncias envolvidas na agressão, que em mordidas humanas, requer um interesse especial quanto à suspeita de agressão física ou abuso sexual, principalmente em crianças. Dados referentes à história médica pregressa do paciente, como a presença de doenças imunossupressoras e quadro de vacinação, principalmente contra raiva e tétano; a procedência e a vacinação do animal agressor também devem ser colhidos19,23. Uma vez tomadas todas as informações sobre o paciente e a história do trauma, segue-se a avaliação através de um minucioso exame físico, onde se procura observar a presença ou ausência de edema, sinais ou sintomas infecção, linfadenopatia, esmagamento ou desvitalização tecidual, bem como presença de ferimentos puntiformes ou articulares, que possuem grande propensão à infecção11. É neste estágio que o profissional analisa a extensão do dano e o aspecto da ferida. Na face, as feridas avulsivas no lábio são comuns, e nestes casos, é importante conhecer se a estrutura avulsionada foi recuperada e se está em condições para a reimplantação. Estruturas especializadas como o ducto parotídeo, sistema nasolacrimal, nervo facial e globo ocular, devem ser avaliados quanto a sua integridade18. Wilberg e Pang30 (1983) enfatizaram a necessidade de um cuidadoso exame em crianças, que segundo ele, por não possuírem um crânio completamente mineralizado, frente a ferimentos puntiformes por mordidas de cães, podem apresentar
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
lesões intracranianas que poderiam passar despercebidas em exame superficial. Microbiologia
Todos os ferimentos por mordidas são contaminados e as bactérias presentes nas feridas são um reflexo direto da microbiota oral do agressor, o que no caso de mamíferos, assume um caráter polimicrobiano misto29,24. Em mordidas por animais, a Pasteurella multocida é a bactéria mais comumente isolada, causando de 50 a 90% das infecções por mordidas de cães e gatos, respectivamente29,10. O controle ou a prevenção de uma infecção por Pasteurella é de especial importância em mordidas por animais, uma vez que se caracteriza por uma infecção de rápida disseminação com surgimento de sintomatologia já nas primeiras 24 horas, sendo ainda associada à formação de abscessos, osteomielite, endocardite, meningite e sepse, com uma taxa de óbito de 31%11. O risco de infecção aumenta consideravelmente em pacientes com cirrose, diabetes, artrite reumatóide, ou sob uso de medicamentos imunossupressores21. As mordidas humanas, segundo Morgan19 (2005), transferem maior número de bactérias à vítima do que as de cães ou gatos, já que a boca de humanos possui número maior bactérias residentes, dentre as quais, algumas produtoras de betalactamase, o que difere das bactérias infectantes das mordidas por animais, que raramente produzem betalactamase 11,14. Para Kelly et al.14 (1996) a maior diferença de micro-organismos encontrados em feridas provocadas por humanos e animais consiste na presença de Eikenella corrodens, na ausência de P. multocida e na maior incidência de organismos produtores de betalactamase em mordidas humanas. Um grande número de anaeróbios também está presente nas feridas de mordidas humanas14,29, sendo isolados em cerca de 50% das infecções14. Antibioticoterapia
O caráter polimicrobiano misto das feridas por mordidas conduz à necessidade de um controle ou prevenção de um processo infeccioso. Segundo Smith et
Rev. ABO Nac. Vol. 17humana nº 4 - Agosto/setembro 2009 Esteves, Jônatas Caldeira et al. Conduta frente a lesões na face decorrentes de -mordida ou de animal doméstico
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
al.24 (2000), o agente antimicrobiano deve ser dirigido principalmente contra S. aureus, P multocida, Streptococcus sp. e anaeróbios em mordidas de cães e gatos. Em mordidas humanas deve abranger gram-positivos e anaeróbios, (ok) incluindo Eikenella corrodens, com pequena ênfase para Pasteurella multocida e boa cobertura contra produtores de betalactamase. O uso de amoxicilina com clavulanato de potássio em monoterapia é citado como um regime antibiótico empírico, porém eficaz contra ferimentos de mordidas, em virtude de sua ampla cobertura de espécies18,21,22. Outros regimes terapêuticos incluem clindamicina associada à ciprofloxacina, dicloxacilina com penicilina, tetraciclina, sulfametazol/trimetoprima, segunda ou terceira geração de cefalosporina 11,8 e cloranfenicol 12. Monoterapia com dicloxacilina, cefalosporina de primeira geração, clindamicina e eritromicina deve ser evitada em mordidas de cães e gatos devido à pobre eficácia in vitro contra P. multocoda8. O uso profilático de antibióticos, apesar de ainda controverso em meio aos autores quanto a sua efetividade, estaria indicado para pacientes ou feridas com alta possibilidade de desenvolver infecção, como aquelas com maceração tecidual, presença de edema, envolvimento ósseo ou articular (ou próximos a eles), feridas perfurativas e comunicações orocutâneas11. Wolff31 (1998) ainda indicou a profilaxia para feridas com mais de 3 horas pósagressão, em pacientes idosos, imunodeprimidos, alcoólatras, diabéticos, vítimas de mordidas humanas ou de gatos e todas as mordidas na face que tenham recebido sutura primária. O curso da administração profilática do antibiótico varia de cinco3 a sete dias5. Feridas com infecção instalada, onde o paciente já apresenta sinais e sintomas do processo infeccioso, devem ser tratadas com antibiótico, o qual deve ser continuado por 48 horas após a total remissão dos sinais e sintomas da infecção, podendo se estender desde 14 dias em casos de celulite, até meses como no caso de osteomielite11. A indicação de tratamento hospitalar
245
Rev. ABO Nac.
Anamnese
Circunstâncias envolvidas na agressão, História médica do paciente (presença de doenças imunossupressoras), Tempo decorrido desde o ataque, Imunização do animal contra raiva Imunização do paciente contra tétano e raiva.
Exame físico
Característica da ferida (macerativa, perfurativa, lacerativa ou avulsiva) Grau de contaminação, Presença de fraturas ósseas e danos a estruturas especializadas da face.
Microbiologia
Característica polimicrobiana mista Cães e Gatos: bactéria mais frequente: Pasteurella multocida, rara a presença de produtores de betalactamase. Humanos: Streptococcus sp., anaeróbios e produtores de betalactamase
Antibiótico
Antibiótico de primeira escolha: Amoxicilina + Cavulanato de potássio Profilaxia antibiótica: Indicado a pacientes ou feridas de alto risco para infecção - 5 a 7 dias. Terapia antibiótica: Indicado para feridas clinicamente infectadas - 7 a 14 dias, estendendo-se de acordo com a severidade do processo.
Manejo cirúrgico
Irrigação copiosa Debridamento* Sutura* Reconstrução
Profilaxia contra tétano
Para pacientes com vacinação incompleta ou aqueles com mais de cinco anos desde a última dose, conforme as recomendações do Ministério da Saúde.
Profilaxia contra raiva
Para todas as mordidas de cães e gatos na face, aplicadas conforme a condição clínica do animal agressor que é mantido sob observa ção durante dez dias, como preconizado pelo Ministério da Saúde através da Fundação Nacional de Saúde.
* exceto em feridas puntiformes Quadro 1: Sinopse dos conceitos de abordagem das lesões por mordidas humanas e de animais domésticos na face
deve ser considerada em paciente com doenças sistêmicas imunossupressoras23, manifestações sistêmicas de infecção, casos de celulite severa11,19,23, propagação rápida do processo infeccioso, ou ferimento em articulações, ossos, tendões11,19 ou nervos11 , e para pacientes considerados incompetentes para o tratamento em regime domiciliar11,19. Manejo cirúrgico
O tratamento cirúrgico de mordidas humanas e animais consiste na limpeza da ferida através de irrigação, debridamento
e reparo do dano causado através de sutura ou reconstrução do defeito. Dentre as soluções disponíveis para a irrigação de feridas, o soro fisiológico é a mais indicada11,23,24,31; entretanto, outras soluções com poder bactericida ou antiviral, como clorexidina, hexaclorofeno, PVPI, mercúrio e álcool também são citadas17. Apesar disso, Morgan et al.17 (1996), afirma que feridas da região maxilofacial não devem ser irrigadas com tais soluções, devido à possível toxicidade levada às estruturas especializadas da face como olho, nariz e ouvido, bem como lesão ao
Rev.etABO Nac. - frente Vol. 17 nº 4 - na Agosto/setembro Esteves, Jônatas Caldeira al. Conduta a lesões face decorrentes 2009 de mordida humana ou de animal doméstico
245
246
Rev. ABO Nac.
próprio tecido cutâneo. Goldstein11 (1992) e Callaham2 (1988), acrescentaram que além do risco de toxicidade, estas substâncias não oferecem vantagens quando comparadas ao soro fisiológico. A irrigação sob pressão é um recurso que auxilia no processo de limpeza do ferimento. O uso de uma seringa de 20 ml acoplada a um cateter venoso de 18 ou 20 G possibilita esta manobra, e permite ainda que a ponta do cateter seja inserida em ferimentos puntiformes fazendo com que a solução atinja as porções mais profundas destas feridas11,23. O debridamento do tecido necrótico e dos corpos estranhos aderidos ao tecido, é essencial, porém deve ser realizado com cautela, uma vez que sua remoção excessiva leva ao aumento das dimensões da ferida e, consequentemente, da cicatriz, o que é muito relevante em feridas faciais7,5. Feridas puntiformes não devem ser debridadas11,19,18. O fechamento primário sem tensão, com uso de sutura interna após cuidadoso debridamento e copiosa irrigação, é indicado principalmente em ferimentos de face que não possuam sinais de infecção5,23,18,31. Segundo Goldstein11 (1992), os fatores que realçam os resultados destes procedimentos nas feridas de face (ou em outras partes da cabeça) podem incluir um abundante suprimento sanguíneo provido pelas anastomoses entre vasos bilaterais da face, associado aos cuidados locais com a ferida (irrigação e debridamento) e à profilaxia antibiótica. Devido à falta de estudos prospectivos que ofereçam parâmetros de manejo científico do fechamento da ferida, são geralmente aplicados padrões locais de cuidados em cada serviço. Consequentemente, alguns profissionais optam, por deixar a ferida aberta, podendo aproximar as bordas através de microporagem, realizando o fechamento primário e/ou reconstrução, posteriormente27,2,1,26. A reconstrução primária, seja com retalho microcirúrgico ou enxerto de pele, também gera dúvidas. Para cirurgiões que optam em abordagem estética futura, geralmente a ferida é deixada aberta durante
246
a cicatrização e uma posterior abordagem plástica é realizada visando a correção do defeito2,1. Por outro lado, Donkor e Bankas5 (1997), Wolff31 (1998) e Morgan et al.18 (1995), indicaram a sutura e reconstrução primária diante de um adequado manejo cirúrgico-medicamentoso inicial de uma ferida sem sinais de infecção, especialmente na face. Já Stierman et al.27 (2003) e Stafanopoulos et al.25 (2005), adotam uma postura intermediária, afirmando que é prudente que se espere um período de 24 a 48 horas de início do tratamento (limpeza e antibiótico) para a sutura ou reconstrução do defeito. É de consenso geral que não se deve realizar sutura ou reconstrução primária em feridas clinicamente infectadas, que devem ser deixadas abertas e reparadas após a resolução do processo infeccioso. Como regra, todo abscesso formado deve ser drenado e feridas puntiformes devem sempre ser deixadas abertas23,18,1. Imunização contra tétano e raiva
Em ferimentos por mordida, a profilaxia contra tétano está indicada para pacientes com vacinação incompleta ou aqueles com mais de cinco anos desde a última dose, sendo que em casos de vacinação incerta ou aqueles que receberam menos de três doses, está indicada a administração tanto de soro quanto da vacina. Os demais casos com vacinação completa há mais de cinco anos recebem apenas a vacina6. A profilaxia contra raiva é indicada para todas as mordidas de cães e gatos na face. O animal é colocado em observação por um período de dez dias, e a vítima, recebe três doses da vacina nos dias 0, 2 e 4. Estando sadio o animal no quinto dia, interrompe-se a vacinação e prossegue-se a observação até o décimo dia. Se comprovada a ausência de infecção do animal, o caso termina no décimo dia. Se porém o animal adoecer, morrer ou desaparecer, é administrado o soro anti-rábico em dose única (nas margens da lesão e o restante por via intramuscular) com mais uma dose diária da vacina até que se completem 10 dias, seguidas de três doses de reforço, no
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
10º, 20º e 30º dia. Em casos de animais desaparecidos ou comprovadamente raivosos no momento do ataque, a conduta segue o protocolo de soro anti-rábico, 10 doses de vacina (nos 10 primeiros dias após o ataque) seguidas das três doses de reforço no 10º, 20º e 30º dia6. O Quadro 1 apresenta um resumo do tratamento das lesões por mordidas humanas e de animais domésticos na face. CONCLUSÃO
A revisão da literatura permite concluir que há uma carência de trabalhos nacionais referentes ao assunto, e por consequência, os cirurgiões-dentistas em atividade nos prontos-socorros estão pouco preparados para atuar diante de tal situação. REFERÊNCIAS 1. Agrawal K, Mishra S, Panda KN. Primary reconstruction of major human bite wound of the face. Plast Reconstr Surg. 1992;90(3):394-8. 2. Callaham M. Controversies in antibiotic choices for bite wounds. Ann Emerg Med. 1988;(12):1321-30 3. Callaham M. Prophylatic antibiotics in common dog bite wound: a controlled study. Ann Emerg Med. 1980;9(8):410-14. 4. Del Ciampo LA, Ricco RG, Almeida CAN, Bonilha LRCM. Acidentes com animais domésticos na infância e adolescência. Pediatria 2000;22(4):319-24. 5. Donkor P, Bankas DO. A study of primary closure of human bite injuries to the face. J Oral Maxillofac Surg 1997;(55):479-81. 6. Fundação Nacional de Saúde. Manual de normas de vacinação. 3 ed. Brasília: Ministério da Saúde; 2001. 7. Gallart RM, Tollado MG, Argibay SI, Muñoz JL, Piñeiro EP, Nieto DV. Mordeduras de perro. Análisis de 654 casos en 10 años. An Esp Pediatr. 2002;56(5):425-9. 8. Goldstein EJ, Citron DM. Comparative susceptibilities of 173 aerobic and anaerobic bite wound isolates to sparfloxacin, temafloxacin, clarithromycin, and older agents. Antimicrob Agents Chemother. 1993;37(5):1150-3. 9. Goldstein EJ, Nesbit CA, Citron DM. Comparative in vitro activities of azithromycin, Bay y 3118, levofloxacin, sparfloxacin, and 11 other oral antimicrobial agents against 194 aerobic and anaerobic bite wound isolates. Antimicrob Agents Chemother. 1995;39(5):1097-100. 10. Goldstein EJC, Citron DM, Fine-Gold SM.
Rev. ABO Nac. Vol. 17humana nº 4 - Agosto/setembro 2009 Esteves, Jônatas Caldeira et al. Conduta frente a lesões na face decorrentes de -mordida ou de animal doméstico
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Dog bite wound and infection: a prospective clinical study. Ann Emerg Med. 1980;(9): 508-12. 11. Goldstein EJC. Bite wounds and infection. Clin Infect Dis. 1992;(14):633-40. 12. Gomes CM, Ribeiro-Filho L, Geron AM, Mitre AI, Figueira ERR, Arap S. Genital trauma due to animal bites. J Urol. 2000; (165):80-83. 13. Hutson HR, Anglen D, Pineda GV, Flynn CJ, Russell MA, McKeith JJ. Law enforcement K-9 dog bites: Injuries, complications, and trends. Ann Emerg Med. 1997; 29(5):637-42. 14. Kelly IP, Cunney RJ, Smyth EG, Calville J. The management of human bite injuries of the hand. Injury. 1996;27(7):481-4. 15. Lewis K, Stiles M. Management of cat and dog bites. Am Fam Physician. 1995;52(2): 479-85. 16. Marrs JS, Beck AM, Lugo JA. An epidemiologic study of the human bite, Public Health Rap. 1979;94(6):514-21. 17. Morgan JP, Haug RH, Kosman JW. A comprehensive review of antimicrobial skin preparations for the maxillofacial region. J
247
Rev. ABO Nac.
Oral Maxillofac Surg. 1996;54(1):89-94. 18. Morgan JP, Haug RH, Murphy MT. Management of facial dog bite injuries. J Oral Maxillofac Sur. 1995;(53) 435-41. 19. Morgan M. Hospital management of and human bites. J Hosp Infect. 2005;(61):1-10. 20. Palacio J, León M, García-Belenguer S. Aspectos epidemiológicos de las mordeduras caninas. Gac Sanit 2005;19(1):50-8. 21. Pears C, Gahrn-Hansen B, Frederiksen W. Capnocytophaga canimorsus septicemia in Denmark: review of 39 cases. Clin Infect Dis. 1996;23(1):71-5. 22. Peters V, Sottiaws M, Appelboom J, Kahn A. Posttraumatic stress disorders after dog bite in children. J Pediatr. 2004;144(1):121-2. 23. Ruskin JD, Laney TJ, Wendt SV, Markin RS. Treatment of mammalian bite wound of the maxillofacial region. J Oral Maxillofac Dis. 1992;14:633-40. 24. Smith PF, Meadowcroft AM, May DB. Treating mammalian bite wounds. J Clin Farm Ther. 2000;(25):85-99. 25. Stafanopoulos PK, Tarantzopoulos AD. Facial bite wounds: management update. Int J Oral Maxillofac Surg. 2005;34:464-72.
26. Stafanopoulos PK, Tarantzopoulos AD. Facial bite wounds: management update. Int J Oral Maxillofac Surg. 2005;34:464-72. 27. Stierman KL, Lloyd KM, De Luca-Pytell DM, Phillips LG, Calhoun KH. Treatment and out come of human bites in the head and neck. Otolaryngol Head Neck Surg. 2003;128(6):795-801. 28. Talan DA, Abrahamian FM, Moran GJ, Citron DM, Tan JO, Goldstein EJC. Clinical presentation and bacteriologic analysis of infected human bites in patients presenting to emergency departments. CID. 2003; (3):37. 29. Talan DA, Citron DM, Abrahamian FM, Moran GJ, Goldstein EJ. Bacteriologic analysis of infected dog and cat bites. Emergency Medicine Animal Bite infection Study Group.N Engl J Med. 1999; 340 (2):85-92. 30. Wilberger JE Jr, Pag D. Craniocerebral injuries from dog bites. JAMA. 1983; 249 (19):2685-8. 31. Wolff KD. Management of animal bite injuries of the face: experience with 94 patiens. J Oral Maxillofac Surg. 1998;56(7): 838-43.
Esteves, Jônatas Caldeira et al.Nac. Conduta frente a lesões na face decorrentes de mordida humana ou de animal doméstico Rev. ABO - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
247
248
Rev. ABO Nac.
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Revisão
A utilização do óxido nitroso e oxigênio na Implantodontia Nitrous oxide and oxygen use in Implantology Palavras-chave: Implantes dentários. Óxido nitroso/uso terapêutico. Anestesia por inalação. Analgesia. Sedação consciente. Key words: Dental implants. Nitrous oxide/therapeutic use. Anesthesia, inhalation. Analgesia. Conscions sedation.
Evandro Tonial Andreolla* Edivaldo Romano Coro** Geninho Thomé*** Ana Cláudia Moreira Melo**** Ivete Aparecida de Mattias Sartori*****
RESUMO
A Odontologia atual vem se destacando de forma cada vez mais promissora no que diz respeito à modernidade, avanço tecnológico e preocupação com o bem estar da população. A Implantodontia é considerada atualmente como uma área promissora e inovadora na odontologia, porém, para sua realização, intervenções cirúrgicas são necessárias, o que agrava o temor dos pacientes frente a esse tratamento. Na busca em aumentar o conforto do paciente, a aplicação da técnica de utilização de analgesia inalatória com óxido nitroso e oxigênio durante as intervenções cirúrgicas com a finalidade de instalação de implantes começou a ser utilizada na Odontologia. Como se trata de algo “novo” este trabalho, através de uma revisão de literatura, comenta a viabilidade de sua utilização e pontos positivos e negativos de sua prática na Implantodontia. ABSTRACT
Nowadays, Dentistry is achieving promising status in relation to technological advance and care about population well-being. Implantology is also considered a promising and inovative area in Dentistry, but surgical procedures are required and many patients feel afraid about this treatment. Trying to solve this problem, we will review the use of inalatory analgesy with nitrous oxide oxygen sedation during oral surgical procedures of implant positioning. So, as it is something “new” the positive and negative points of this technique will be commented in relation to implantology.
INTRODUÇÃO
Aluno do Curso de Especialização em Implantodontia da Universidade Tuiuti do Paraná/ Instituto Latino-Americano de Pesquisa e Ensino Odontológico (UTP/Ilapeo). Especialista em Implantodontia pela ABO/ ** Ponta Grossa. Professor do Curso de Especialização em Implantodontia da UTP/Ilapeo. *** Doutorando em Implantodontia pela São Leopoldo Mandic. Coordenador do Curso de Especialização da UTP/Ilapeo. **** Doutora em Ortodontia pela Faculdade de Odontologia de Araraquara, Universidade Estadual Paulista. Professora dos Cursos de Especialização do Ilapeo/Curitiba. E-mail: amelo@ilapeo.sm.br ***** Doutora em Reabilitação Oral pela Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo. Professora dos cursos de Especialização do Ilapeo/Curitiba. *
248
Pesquisas recentes demonstraram que o tratamento odontológico é o segundo maior temor da população em geral, superado apenas pelo medo de falar em público. Isso porque na prática odontológica são realizados mais procedimentos com potencial de provocar dor que na Medicina3. Por outro lado, como a anestesia local é um recurso relativamente novo na área de saúde, tendo surgimento datado em 1940, os procedimentos odontológicos eram, até então, tratados com sensibilidade dolorosa, o que gerava uma rejeição ao tratamento, passando esse sentimento de “medo” de geração para geração3. Frente a esta realidade, é nosso dever buscar alternativas para minimizar o desconforto do
paciente durante os procedimentos odontológicos como, por exemplo, utilizando recursos de analgesia. A Implantodontia é considerada atualmente como uma área promissora e inovadora na Odontologia, porém, para sua realização, intervenções cirúrgicas são necessárias. Sob esse aspecto, realizou-se uma revisão na literatura sobre a utilização da técnica de analgesia inalatória com óxido nitroso e oxigênio durante as intervenções cirúrgicas. REVISÃO DA LITERATURA
O óxido nitroso (N2O), também conhecido por protóxido de azoto, gás hilariante, dióxido de Nitrogênio, entre outros, foi descoberto, assim como o Oxigê-
ABO Nac. - Vol.nitroso 17 nºe4oxigênio - Agosto/setembro 2009 Andreolla, Evandro Tonial et al.Rev. A utilização do óxido na Implantodontia
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
nio, pelo inglês Joseph Prisley, entre 1771 e 1777. Em 1789, Humprey Davy, inalou óxido nitroso puro para aliviar uma dor de dente. Impressionado com os resultados, realizou e publicou seus experimentos em 18005-6. Décadas mais tarde, após muitas experiências fora da área médica, o químico Gardner Quincy Colton fazia demonstrações públicas de inalação do N2O ou “gás do riso”. Numa de suas exibições, o cirurgião-dentista Horace Wells ficou impressionado com a demonstração e intrigado, perguntou a Colton se seria possível extrair-lhe um dente sob o efeito do gás. Usando N2O a 100% a extração foi realizada e o comentário após foi o de uma sensação “não maior que uma alfinetada” 5-6. Entusiasmado com o efeito do gás, começou a utilizá-lo para extrações. Em 1845, Wells numa demonstração para médicos e estudantes em Boston, na tentativa de remover um dente o paciente pulou da cadeira, dando a entender que foi pela dor. Hoje se sabe que vários fatores influenciaram no resultado negativo, desde o rudimento da técnica, falta de ambiente necessário e até o fato do N2O ser um sedativo e não analgésico. Porém isto resultou num descrédito por parte dos médicos sobre qualquer poder analgésico ou utilização do N2O para intervenções cirúrgicas. Somente após sua morte, a American Dental Association (ADA) reconheceu oficialmente Horace Wells como o descobridor da anestesia em 18645-6. Entre 1864 e 1897, Colton documentou 193.000 casos sem fatalidade, fazendo com que ressurgisse a utilização do N2O. Em 1868 Edmund Andrews sugeriu a adição de 20% de oxigênio à mistura, argumentando que o sangue não era apropriadamente oxigenado com N2O puro. A partir desta data surgiram vários avanços como o acondicionamento dos gases em cilindros, o primeiro aparelho de administração criado por Paul Bert, complicadas câmaras hiperbáricas desenvolvidas por médicos como a Coche Mobile do Dr. Fontaine em 1880, até os dias atuais, quando se tem um maior conhecimento dos efeitos do N2O, técnicas e protocolos de administração, além de equipamentos modernos que garantem
249
Rev. ABO Nac.
segurança e tranquilidade para a realização da técnica5-6. Porém, apesar de descoberto há muitos anos e de ser muito utilizado atualmente por cirurgiões-dentistas em países da Europa, Japão, Dinamarca e EUA, onde aproximadamente 56% dos clínicos gerais, 85% dos cirurgiões bucomaxilofaciais, 70% dos periodontistas e mais de 87% dos odontopediatras fazerem uso do óxido nitroso em suas práticas clínicas56,10 , no Brasil são poucos os que empregam em seus consultórios, pois sua utilização só foi regulamentada através da resolução 051/2004 do Conselho Federal de Odontologia brasileiro3. Indicações
O N2O não bloqueia toda a dor e pode ser usado em combinação com anestesia local para muitos procedimentos dentários. É mais efetivo no bloqueio da percepção da dor em tecidos moles e pode ser suficiente, por si só, para eliminar desconforto moderado1-3,5-6,11. A sedação consciente por N2O/O2 altera a percepção do tempo, fazendo com que pareça passar muito rápido. Alguns pacientes experimentam uma amnésia suave de detalhes nas consultas dentárias. Com um relax consciente e a cooperação do paciente, os tratamentos dentários se tornaram menos estressantes para pacientes e clínicos, igualmente3,11. Pesquisa realizada por Zacny et al.12, em 2002, sobre a ansiedade pré-operatória frente ao tratamento odontológico e a mudança de humor durante a inalação do N2O/O2, sugeriu, que o N2O, relativamente não invasivo e barato, não somente reduz a euforia nos pacientes com elevado nível de ansiedade pré-cirúrgica, mas também eleva o humor para um grau semelhante ao dos pacientes que não são ansiosos. Outra grande indicação para o uso do N2O/O2 é para pacientes com doenças de alto risco, como a complicações isquêmicas (diminuição ou ausência de sangue em um determinado órgão), que podem se beneficiar do enriquecimento do oxigênio proporcionado pelo uso do N2O/O2. Afinal, um paciente recebendo uma concentração
Rev. ABO - Vol.do 17óxido nº 4 -nitroso Agosto/setembro Andreolla, Evandro Tonial et al. ANac. utilização e oxigênio na2009 Implantodontia
de 50/50, os 50% de O2 serão melhor que os 20,9% de O2 disponível no meio ambiente onde vivemos11. Pacientes com doença cardiovascular e cerebrovascular também são excelentes candidatos para sedação com N2O. Hipotensão e arritmia cardíaca não são contraindicações específicas para o uso da técnica11. Disesa et al.4 (1987), num relato onde utilizaram N2O para controle da pressão sanguínea após cirurgia da artéria coronária, concluíram que em pacientes com hemodinâmica e função ventricular normal, a administração de N2O para sua sedação e efeitos anti-hipertensivos é segura no período pós-operatório e pode ser útil, especialmente em pacientes que são candidatos a retirada precoce dos tubos de ventilação (extubação). No que diz respeito à pressão arterial, pode-se dizer que as alterações são ínfimas e desprezíveis se comparadas a alterações fisiológicas importantes com a administração de N2O/O26. Os pacientes com doenças respiratórias exigem uma avaliação cuidadosa. Ele pode ser usado com sucesso em pacientes com asma brônquica, especialmente se os ataques são relacionados ao estresse. Ao contrário de muitos outros gases anestésicos, o N2O não é irritante para a mucosa bronquial e é recomendado para pacientes que seriam beneficiados com o O2 enriquecido11. Sabendo-se que o N2O não é biotransformado no corpo e entra e sai nas trocas gasosas dos pulmões (apenas 0,004% é metabolizado pelas bactérias anaeróbias do intestino, pseudômonas, transformando-o em nitrogênio), seu uso também não é contraindicado para disfunção hepática, renal, ou para pacientes com diabetes5-6. Por fim, não há nenhuma alergia conhecida provocada pelo N2O11. Efeitos colaterais
Estudo realizado por Lichtor et al.7, em 2004, sobre a sonolência restante após sedação com N2O, concluiu que nenhum aumento de sono foi encontrado uma hora ou mais após a sedação com N2O, não havendo, após esse período, nenhuma evi-
249
250
Rev. ABO Nac.
dência que contraindicasse o desenvolvimento de atividades normais. Quando comparado a outros sedativos, apresenta algumas vantagens importantes: não induz a depressão respiratória, o que na maioria dos medicamentos via oral pode ocorrer, conforme a dosagem e suscetibilidade do paciente; os pacientes permanecem conscientes, podendo cooperar e seguir orientações; tem um início tão rápido que o efeito máximo pode ser conseguido em minutos e esse nível pode ser fácil e prontamente modificado; a recuperação é rápida e completa, permitindo atividades normais após o tratamento, ressalva apenas para pacientes que após extensas e pesadas doses experimentem confusões mentais ou dores de cabeça; o processo de sedação, dosagem e condução da sedação se dão de maneira muito mais previsível e controlada pelo profissional se compararmos a outras técnicas de sedação3,11. Contraindicações
A principal contraindicação são as doenças pulmonares obstrutivas crônicas, isto é, enfisema e bronquite crônica, que dependem de um nível baixo de oxigênio no sangue para estimular a respiração. Deve ser lembrado que o uso do N2O com O2 eleva a saturação de oxigênio no sangue, removendo o estímulo, podendo resultar em apnéia11. Obstrução crônica ou estados infecciosos agudos no sistema respiratório também podem contraindicar a técnica (resfriados e alergias, por exemplo), bem como a respiração bucal6,11. Uma característica do N2O é que ele se difunde em qualquer cavidade do corpo que contenha ar, geralmente substituindo o nitrogênio. Por isso, é contraindicado para pacientes com um histórico de ouvido médio, problemas na membrana timpânica ou bloqueio dos Tubos de Eustáquio. Seguindo a mesma linha, bloqueio ou congestionamento no seio maxilar, também agudo ou crônico, podem submeter o paciente à maior pressão e desconforto. A dilatação gastrointestinal é outra possibilidade. Este pode ser um fator em pacientes que vomitam quando fortes concentrações são administradas. Também pode ser
250
um motivo para contraindicar o uso em pacientes com obstrução intestinal6,11. Pessoas com personalidade compulsiva que não gostam de sentir a “Perda do controle” são mais passíveis de perceber a sedação com N2O/O2 como uma experiência desagradável. Pacientes com claustrofobia podem ver o tamponamento do nariz com certo desconforto e recusarem a sedação11. O N2O produz uma variedade de efeitos subjetivos, incluindo alguns que são característicos de drogas psicodélicas, assim como o bom-humor, euforia, mudança no corpo e imagem, alteração de percepção de tempo e um experimento de sonho, um estado de devaneio elevado. Alguns reclamam experimentar uma sensação desagradável de inquietação, náusea e vômito; outros podem reagir tirando a máscara do nariz, exigindo terminar a sessão e buscar outras alternativas. Nem todos os pacientes respondem positivamente ao gás. Um bom indício de rejeição ao N2O/O2 poderia ajudar o cirurgiãodentista a avaliar melhor a opção apropriada para o tratamento 8. Apesar de atravessar a barreira placentária, não se tem evidências, até hoje, de teratogenia provocada pelo uso de N2O/ O2. Na gestante (principalmente no primeiro trimestre), a utilização de qualquer fármaco deve ser avaliada de acordo com o risco-benefício que este trará à mesma e ao feto6,11. Alguns estudos mostram que a exposição crônica, ao N2O, ou seja, sem adequado aparato para remoção dos gases expirados pelo paciente a nível ambulatorial, do pessoal auxiliar e do cirurgião-dentista, pode produzir aumento da probabilidade de abortos espontâneos e até infertilidade6,11. O uso prolongado de N2O em seres humanos e animais provoca oxidação do cobalto da vitamina B12. Por resultado disso, se dá a inativação da enzima metionina sintetase, que requer vitamina B12 na sua fórmula completamente reduzida para agir com sua coenzima. A inativação desta enzima determina uma série de alterações bioquímicas, entre elas, a interferência com a síntese do DNA,
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
interferindo na produção de leucócitos e eritrócitos na medula óssea. Como consequência, pode-se observar entidades patológicas que se assemelham à anemia perniciosa, com hematopoiese megaloblástica e neuropatia subaguda. Porém, estas alterações não puderam ser vistas através do uso clínico habitual do N2O5,6. Em abril de 1994, o Instituto Nacional para Segurança Ocupacional e Saúde (NIOSH) divulgou o seguinte alerta: “Profissionais expostos ao N2O podem sofrer efeitos danosos” 11. A relação em partes por milhão (ppm) em consultórios odontológicos e centros cirúrgicos tem como limites aceitos na atmosfera para o N2O em 50ppm5. No trabalho publicado por Quarnstrom9 (2003) sobre experiências em laboratório com ratos expostos a 400ppm durante 6 horas por 25 semanas, o autor relatou que houve menos ganho de peso, mas não houve alterações histopatológicas nos principais órgãos (cérebro, coração, rins, fígado, ovário, testículos) e medula óssea. Todavia, os trabalhos de exposição nociva ao N2O estão relacionados fundamentalmente ao uso profissional, podendo apresentar nos indivíduos: depressão da medula óssea, do sistema retículoendotelial, a síntese da metionina inibida, leucopenia, anemia megaloblástica e imunodepressão5. Sistemas de limpeza corretamente funcionando, podem reduzir a concentração de N2O em mais de 70%, porém altas concentrações têm geralmente sido encontradas ainda com sistemas de limpeza scavenings. Todavia, existem algumas precauções que podem ser tomadas, como, usar um sistema auxiliar de exaustão, melhorar o sistema de circulação de ar, manutenção adequada dos equipamentos, entre outras11. DISCUSSÃO
Como se pode observar, o uso do N2O vem datado de vários séculos. Apesar de seu efeito ansiolítico e baixo poder anestésico e amnésico, ainda não se conhece ao certo os mecanismos responsáveis pela ação das drogas anestésicas inalatórias5-6. Todavia, faz-se necessário responder este questionamento de forma efetiva para acabar com as dúvidas
ABO Nac. - Vol.nitroso 17 nºe4oxigênio - Agosto/setembro 2009 Andreolla, Evandro Tonial et al.Rev. A utilização do óxido na Implantodontia
Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
que eventualmente possam surgir sobre a segurança da utilização do N2O6. Sendo o profissional habilitado para realizar a sedação com N2O/O2, a técnica é bastante simples; basta observar os cuidados pertinentes à mesma que esta se torna bastante efetiva e segura. Deve-se salientar que para tal, a correta indicação, uma boa anamnese e o domínio da técnica são condições imprescindíveis para o sucesso e satisfação do paciente. Revisando as indicações e contraindicações do óxido nitroso e oxigênio, na sedação consciente, a escala parece ter uma forte inclinação promissora em favor dos benefícios para muitos pacientes. O “equilíbrio” não está claro para os profissionais. Trabalhar com um paciente relaxado e cooperativo, sem ansiedade e desconforto é um grande benefício. Cientes de ambos os lados da equação, a seleção previdente do paciente e os cuidados com o uso do N2O pode conduzir à melhor saída para todos 11. E na Implantodontia? Frente a tudo o que foi exposto, pode-se observar que a sedação com N2O/O2 aplica-se de forma eficaz em todas as áreas da Odontologia. A sua real função é reduzir ou eliminar, se possível for, o medo do paciente odontofóbico. Estando a Implantodontia ligada intimamente com a área cirúrgica, o que causa ainda maior temor aos pacientes, a sedação com N2O/O2 se apresenta como um meio bastante eficaz de auxílio e con-
251
Rev. ABO Nac.
trole da ansiedade do paciente. Além dos benefícios já mencionados da sedação com N2O, especificamente relacionado à Implantodontia, tem-se um controle de sangramento mais eficaz. O N2O provoca venodilatação cutânea, que pode estar associada a efeitos sedativos. Em contrapartida, aumenta a responsividade da musculatura lisa vascular à adrenalina. Isto pode ser evidenciado quando se aplica anestésico local com vasoconstritor. O controle hemorrágico se dá de forma mais efetiva6. Além disso, pela capacidade de potencializar uma segunda droga, o N2O faz com que uma menor quantidade de anestésico seja necessária para realizar as intervenções cirúrgicas. A maior desvantagem da sedação com N2O/O2 na Implantodontia diz respeito ao equipamento. A máscara nasal dificulta o acesso à região anterior da maxila e as mangueiras dificultam a movimentação da cabeça do paciente, às vezes necessária para um melhor acesso e visualização do campo cirúrgico. Todavia, novos equipamentos e máscaras estão sendo lançados e acredita-se que em breve estes “problemas” estarão solucionados. CONCLUSÃO
Após analisar os aspectos históricos, técnicos e ponderar sobre os efeitos positivos e negativos, os autores consideram de grande valia a sedação com Óxido Nitroso e Oxigênio para a Implantodontia.
Rev. ABO Nac. - Vol. do 17 óxido nº 4 -nitroso Agosto/setembro Andreolla, Evandro Tonial et al. A utilização e oxigênio na2009 Implantodontia
REFERÊNCIAS 1. Berge TI. Acceptance and effects of nitrous oxide oxygen sedation oral surgical procedures. Acta Odontol Scand. 1999;57 (4):201-6. 2. Ciarelli JA. A utilização do óxido nitroso em odontologia [Dissertação de Mestrado]. São Paulo: Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo, 1995. 3. Camargo J, Salvador JC, Furtado C. Sedação Inalatória com óxido nitroso e oxigênio em Odontologia. Classe Odontol. 2004;1(1):42-5. 4. Disesa VJ, Mark JB, Gold JP, Kidwell F, Shemin RJ, Collins JJ et al. Nitrous oxide for blood pressure control after coronary artery surgery: a dose-response hemodynamic study in postoperative patients. Ann Thorac Surg. 1987;44(2):189-91. 5. Falqueiro JM. Analgesia inalatória por óxido nitroso/oxigênio. São Paulo: Santos; 2005. 6. Fanganiello M. Analgesia inalatória por óxido nitroso e hidrogênio. São Paulo: Artes Médicas. 2004. 7. Lichtor JL, Lane BS, Zimmerman MB. Residual sleepiness after N2O sedation: a randomized control trial. BMC Anesthesiol. 2004;12(4):1-5. 8. Peretz B, Katz J, Zilburg I, Shemet J. Response to nitrous-oxide and oxygen among dental phobic patients. Int Dent J. 1998;48(1):17-23. 9. Quarnstrom F. Nitrous oxide safety. Dent Today. 2003;22(9):12. 10. Ranali J, Volpato M C, Ramacciato, JC. Sedação em implante dental. Implant News 2005;2(2):174-81. 11. Stach DJ. Nitrous oxide sedation: understanding the benefits and risks. Am J Dent. 1995;8(1):47-50. 12. Zacny JP, Hurst RJ, Graham L, Janiszewski DJ. Preoperative anxiety and mood changes during nitrous oxide inhalation. J Am Dental Assoc. 2002;133(1):82-8.
251
252
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nยบ 4 - Agosto/setembro 2009
P ○
○
○
A
○
○
○
○
I
○
○
○
○
N ○
○
○
○
E ○
○
○
○
L ○
Highlights
FDI’2009
Brasil: 5 vezes vitorioso em Cingapura Graças à atuação internacional da ABO, o Brasil acaba de assumir a Presidência da FDI, com a posse de Roberto Vianna, e mais dois importantes postos da entidade odontológica mundial: no Conselho, com a reeleição de Norberto Lubiana, e na Comissão de Ciências, com a eleição de Cláudio Fernandes. Também com o apoio da ABO foi eleito o sucessor de Roberto Vianna na Presidência daqui a dois anos: o português Orlando Monteiro da Silva, presidente da Ordem dos Médicos Dentistas de Portugal (OMD). Os cargos foram assumidos durante o FDI’2009, realizado entre os últimos dias 2 e 5 de setembro, em Cingapura, quando também foi dado início à contagem regressiva para o FDI’2010, que terá Salvador (BA) como sede do Congresso Mundial 177 eleitores, delegados da FDI que representam 134 paísesmembros vindos de todas as regiões do planeta, que somam 1 milhão de cirurgiões-dentistas. E em Cingapura, recebeu o tradicional colar da FDI das mãos de seu antecessor Burton Conrod (Canadá).
Fernandes na Comissão de Ciências América Latina (Adolfo Rodríguez), Portugal (Orlando Monteiro) e Brasil (Roberto Vianna e Norberto Lubiana) unidos
Roberto Vianna na Presidência Após dois anos de intensa atuação como presidente eleito, tomou posse na Presidência da FDI o cirurgião-dentista carioca Roberto Vianna, assessor internacional da ABO Nacional, entidade que esteve à frente de toda a campanha que culminou, em 2007, durante o Congresso Mundial da FDI em Dubai, na eleição do primeiro latino-americano para o posto máximo da Odontologia mundial. O trabalho da ABO
tem o reconhecimento do novo presidente da FDI. “É uma honra e uma alegria ocupar este cargo, mas sem a ABO o Brasil não conseguiria chegar à posição em que estou. Por isso, posso dizer que é um honra ainda maior para toda a Rede ABO que um brasileiro ocupe tal posto. Agradeço a liderança de Norberto Lubiana.” Vianna fora eleito, em 2007, com 122 votos – 69% do total de
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Outro dos mais cobiçados e disputados postos da FDI também foi conquistado pelo Brasil, com a eleição do cirurgião-dentista carioca Cláudio Fernandes para a Comissão de Ciências da entidade. Ele é também o coordenador científico do FDI’2010, em Salvador (Bahia).
Presidente eleito tem apoio da ABO Nos próximos anos, a FDI vai falar como nunca em português. Além dos três importantes postos assumidos por brasileiros na entidade, o português Orlando
253
P ○
○
○
A
○
○
○
○
I
○
○
○
○
N ○
○
○
○
E ○
○
○
○
L ○
Highlights
Brasil reeleito para o Conselho O mesmo reconhecimento mundial da força política da Odontologia brasileira levou à reeleição de Lubiana para o Conselho da FDI, com o apoio em bloco de todos os 21 países que compõem a Federação Odontológica Latino-americana (Fola). Lubiana ocupa o cargo desde 2006, quando foi eleito no Congresso Mundial da FDI em Shenzhen, na China.
Monteiro da Silva, presidente da Ordem dos Médicos Dentistas de Portugal (OMD) e candidato apoiado pela ABO e Fola, foi escolhido sucessor do recémempossado presidente da Federação, Roberto Vianna.
FDI’ 2010 Em Cingapura, também foi dado início à contagem regressiva para o Congresso Anual de 2010, que será sediado em Salva-
dor (BA). O prestígio internacional de que desfruta a ABO foi responsável pela escolha da cidade, por unanimidade, em 2007, no Congresso Mundial da FDI em Dubai, nos Emirados Árabes. O evento deve trazer seis mil cirurgiões-dentistas estrangeiros para o Brasil – que, somados aos brasileiros esperados, formarão o maior público dos eventos realizados pela Federação: mais de 15 mil participantes. Também em Cingapura aconteceu a típica cerimônia de passagem da bandeira da FDI ao Brasil, simbolizando que até setembro do próximo ano o País é a sede oficial do Congresso Mundial.
ABO global Durante o FDI’2009, a ABO foi reverenciada em diversas ocasiões pelo lançamento da Iniciativa Global Anticárie no País, com a Conferência do Rio, durante o 19º CIORJ, em julho último. O fato de o Brasil ter sediado, em parceria FDI/ABO, a primeira de uma série de conferências mundiais sobre o tema
Parlamento Mundial: Brasil tem a maior delegação entre os 134 países
254
representa um marco histórico para a Odontologia nacional. E cada vez mais cirurgiõesdentistas estrangeiros têm se voltado para o exercício científico e clínico da Odontologia no Brasil. A UniABO, maior rede de educação odontológica continuada do País, tem recebido profissionais de diversos países, em busca de atualização qualificada e intercâmbio de conhecimentos. A ABO/DF conta com três cirurgiãs-dentistas de Moçambique entre seus alunos – uma delas, em curso da Regional Taguatinga. A ABO/MS está em negociação com o Equador e a Bolívia para proporcionar mais intercâmbios e ampliar ainda mais a visibilidade da Odontologia brasileira internacionalmente.
Meta cumprida “Esta e outras grandes conquistas que a ABO e, por consequência, a Odontologia brasileira têm acumulado internacionalmente são fruto de um árduo esforço em nome da promoção da saúde bucal sem fronteiras”, explicou Lubiana. Para ele, todas essas conquistas fazem ecoar no mundo a voz dos mais de 220 mil cirurgiões-dentistas em atuação no País. “Trata-se do resultado de quatro anos de intenso trabalho, pautado pelo planejamento estratégico desenvolvido pelo Conselho Executivo Nacional (CEN) e pelo Conselho Deliberativo Nacional (CDN) da ABO, sempre com a valorização do cirurgião-dentista brasileiro e a promoção da saúde bucal em mente. Trabalho que tem demandado dedicação quase que exclusiva à defesa da Odontologia nacional, mas que tem feito o Brasil ficar cada vez maior no mapa da Odontologia mundial”, comemora.
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
A ○
○
○
G
○
○
○
○
E
○
○
○
○
N ○
○
○
○
D ○
○
○
○
A ○
Dental Calendar
N
A
C
I
O
N
A
L
OUTUBRO ABO Alagoas
SETEMBRO ABO Rio Grande do Norte 6º Congresso Alagoano de Odontologia 8 a 10 de outubro Maceió - AL Informação: (82) 3235.1008 aboal@aboal.org.br www.aboal.org.br 3º Congresso Internacional de Odontologia, 11º Congresso de Odontologia do Rio Grande do 3 a 6 de setembro Natal - RN Informação: (+84) 3222.3812 congresso@aborn.org.br www.aborn.org.br
ABO Santa Catarina
2
0
0
9
ABO Mato Grosso do Sul
2º Congresso Internacional de Odontologia do Mato Grosso do Sul 29 a 31 de outubro Campo Grande - MS Informação: (+67) 3383.3842 aboms@terra.com.br www.aboms.org.br
10º CIOPAR adiado devido à Gripe H1N1 DEZEMBRO ABO Paraná
ABO Goiás 4º Congresso Internacional de Santa Catarina 21 a 24 de outubro Florianópolis Informação: (+48) 3248.7101 abosc@abosc.com.br www.ciosc.com.br 15º Congresso Internacional de Odontologia de Goiás 23 a 26 de setembro Goiâna - GO Informação: (+62) 3236.3100 abo@abo-go.com.br www.abo-go.com.br
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
10º Congresso Internacional de Odontologia do Paraná 2 - 4 de dezembro Curitiba - PR Informação: (+ 41) 3028.5800 secretaria@abop.org.br www.ciopar.org.br
255
A ○
○
○
G
○
○
○
○
E ○
○
○
○
N ○
○
○
○
D ○
○
○
○
A ○
Dental Calendar
I N T E R N A C I O N A L
FDI’2009 - Cingapura
2
0
0
9
Roma (Itália)
ADA’2009 – Honolulu-Havaí
2 a 5 de setembro Congresso Mundial da Federação Dentária Internacional - FDI’2009 Local: Cingapura (Cingapura) Informações: www.fdiworldental.org Fortaleza (Brasil)
Acordo com ABO permite participação de todos os CDs brasileiros em condições especiais 30 de setembro a 4 de outubro 150ª Annual Session – ADA Local: Havaí (Honolulu) Informações: www.ada.org
The Mediterranean Bridging Congress Academia Internacional de Odontologia & Associação Italiana de Odontologia 6 a 8 de novembro de 2009 Local: Roma (Itália) Informações: www.adint.org/ meetings-reservations.htm 2
0
1
0
Istambul (Turquia) 16 e 17 de outubro 4º Congresso Internacional da Academia de Inplantodontia Guiada por Computador Local: Istambul - Turquia Informações: www.tpidakademi.com/tpid
Lisboa (Portugal) International Congress on Cleft Lip and Palate and Related Craniofacial Anomalies 10 a 13 de setembro de 2009 Local: Fortaleza (Brasil) Informações: www.cleft2009.org.br
256
FDI’2010 – Salvador-Bahia (Brasil) 2 a 5 de setembro Congresso Mundial da Federação Dentária Internacional – FDI’2010 Local: Salvador (Brasil) Informações: www.fdiwordental.org
XVIII Congresso da Ordem dos Médicos Dentistas de Portugal (OMD) 5 a 7 de novembro de 2009 Local: Lisboa (Portugal) Informações: www.omd.pt
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nº 4 - Agosto/setembro 2009
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nยบ 4 - Agosto/setembro 2009
257
258
Rev. ABO Nac. - Vol. 17 nยบ 4 - Agosto/setembro 2009