Incorporando a saúde e os direitos reprodutivos a uma perspectiva transformadora de desenvolvimento

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Incorporando a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos a uma perspectiva transformadora de desenvolvimento: lições extraídas das metas e indicadores dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) Alicia Ely Yamina, Vanessa M Boulangerb a Professora de Saúde Global, Escola de Saúde Pública de Harvard, Diretora do Programa de Direito à Saúde de Mulheres e Crianças do Centro de Saúde e Direitos Humanos François-Xavier Bagnoud (FXB), Universidade de Harvard, Boston, MA, EUA. b Coordenadora do Programa de Direito à Saúde de Mulheres e Crianças do Centro FXB, Universidade de Harvard, Boston, MA, EUA.

Resumo: Esse artigo explora as consequências esperadas e não esperadas da escolha do ODM 5 – junto com suas metas e indicadores - como um objetivo global, ampliando a análise e situando-a no contexto do modelo de desenvolvimento proposto pelos ODMs. Na década passada, à medida que os ODMs ocuparam o centro do palco do desenvolvimento e à medida em que evoluía a sua aplicação, os objetivos foram inapropriadamente convertidos em metas nacionais de planejamento. Essa conversão foi particularmente evidente no caso do ODM 5, ao reduzir o escopo de políticas e programas e produzir um enorme impacto no discurso sobre o desenvolvimento, reestruturando o campo de ação em termos de organização e disseminação de conhecimento, em uma demonstração clara da presença de valores normativos no processo de definição de metas e indicadores, que está longe de ser neutro. Pensando adiante, portanto, não parece adequado propor um quadro para os ODM+ baseado nessa mesma estrutura. A saúde e os direitos sexuais e reprodutivos devem ser reinseridos no debate global, utilizando-se o desenvolvimento para empoderar mulheres e populações marginalizadas e para combater desigualdades estruturais, o que é fundamental para mudanças sociais sustentáveis. Um novo marco referencial para o desenvolvimento deve incluir uma forte narrativa de transformação social na qual as metas e indicadores associados aos objetivos certamente cumprem um papel, mas não dominam nem restringem os objetivos mais amplos de fazer avançar a justiça social, política e de gênero. Palavra chave: Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, saúde sexual e reprodutiva, direitos humanos, desenvolvimento humano, programas e políticas de saúde Já é bem conhecida a história da redução dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) ao campo relativamente apolítico da saúde materna, reduzindo a ampla agenda da saúde e direitos sexuais e reprodutivos estabelecida durante a Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD) e a Quarta Conferência Mundial sobre Mulheres (Beijing)1-5. Após as primeiras incursões iniciadas em Viena em 1993, onde os direitos das mulheres foram declarados direitos humanos, o movimento das mulheres alcançou um sucesso extraordinário, e até mesmo inédito, avançando a agenda progressiva na CIPD e usando esse avanço como base para construir uma agenda ampla na Conferência em Beijing1,2,6,7. A revolta imediata gerada por esses avanços evidenciou a ferocidade da contestação contra o direito básico das mulheres de controlarem seus próprios corpos e transformarem suas vidas3-5. Consequentemente, a Declaração do Milênio, adotada por 189 Membros da ONU e frequentemente descrita como um documento

“centrado nas pessoas” com o objetivo de incorporar questões sobre o desenvolvimento humano, não continha uma única referência à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos8-9. Em contrapartida, os ODMs, construídos por meio de um processo tecnocrático e hierarquizado como um guia de implementação da Declaração do Milênio, incluíam apenas um Objetivo relacionado à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos - o ODM 5, que é um apelo para a melhoria da saúde materna4,5,10. Por outro lado, são menos conhecidas as consequências normativas e empíricas da escolha do objetivos, metas e indicadores do ODM 5 e a relação entre os acontecimentos envolvendo a ODM 5 e a perspectiva de desenvolvimento da agenda do Milênio como um todo. Desde o seu estabelecimento, em 2001, os ODMs tornaram-se o modelo internacional para a cooperação global11. Apesar concebidos para refletir o empenho da Declaração do Milênio com a erradicação da pobreza mundial, os ODMs terminaram por contribuir apenas com

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Doi: (do artigo original) 10.1016/S0968-8080(13)42727-1

www.grupocurumim.org.br/site/revista/qrs8.pdf


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uma pequena dose de desenvolvimento humano à contínua organização neoliberal do mundo12-13. Além disso, o reducionismo dos ODMs e, mais especificamente, a forma como os objetivos, metas e indicadores dominaram a agenda, produziram um impacto complicado sobre o discurso e as práticas de desenvolvimento, não apenas em relação à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos, mas também no que diz respeito a outras questões sociais complexas. Pensar o lugar da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos nos marcos futuros do desenvolvimento, requer que se considere não apenas as aspirações políticas de progresso global, mas também as implicações acarretadas pela estruturação da agenda de desenvolvimento em torno de metas, como aconteceu com os ODMs. Esse artigo explora as consequências intencionais e não intencionais relacionadas à escolha do ODM 5 como objetivo global, juntamente com o apelo da Meta 5A para a redução das taxas de mortalidade materna (TMM) em 75% em relação às taxas de 1990 e a adição tardia da Meta 5B e seus indicadores sobre o acesso universal à saúde reprodutiva. A fim de situar as consequências dos ODMs para a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos em um contexto mais amplo, utilizamos dados de um estudo do Power of Numbers Project14. Trataremos primeiramente do contexto político no qual os ODMs foram concebidos e da conversão inadequada dos objetivos globais em metas de planejamento nacionais. No caso da ODM 5, a escolha da meta e do indicador principal – a razão de mortalidade materna - agravou as consequências negativas dessa conversão. Em seguida, exploramos as ambiguidades em torno do aclamado sucesso dos ODMs em atrair atenção e investimentos para a “saúde reprodutiva”, destacando que o aumento dos investimentos foi direcionado apenas a um subgrupo de problemas, enquanto outras áreas cruciais foram deliberadamente excluídas ou ignoradas, negligenciando-se a questão da equidade. Serão destacadas, então, as consequências não intencionais da ODM 5 em termos dos seus efeitos sobre políticas/planejamento e conhecimento/discurso, examinando-se também a ampla tecnocracia e o planejamento limitado que emergiram como parte dos esforços para alcançar os resultados do ODM 5 e a mudança de um discurso sobre a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos para um discurso sobre saúde materna neonatal e infantil (PMNCH). Finalmente, consideraremos, a partir da perspectiva dos direitos humanos, as lições retiradas das metas e indicadores do ODM 5,

e dos ODMs em geral, que devem guiar as considerações sobre qualquer agenda de desenvolvimento futura e os debates atuais sobre a definição de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, dado que os ODMs expiram em 2015.

Processo de construção e aplicação dos ODMs: implicações do ODM 5 Os ODMs introduziram um novo modelo de desenvolvimento que de acordo com o consenso geral tem alcançado grande sucesso11-15. Esse modelo apresenta uma intricada estrutura de objetivos, metas e indicadores, na qual os objetivos foram concebidos para serem normativos e ambiciosos, as metas deveriam atribuir fins quantitativos e prazos a cada objetivo e os indicadores representariam os dados a serem usados para monitorar o avanço das metas. Os objetivos divulgados junto com a Declaração do Milênio em 2000 foram convertidos em ODMs e publicados pela primeira vez em 2001 no documento “Road Map”, inicialmente concebido apenas para facilitar os relatórios de progresso7. Os ODMs foram projetados como objetivos globais para sinalizar a prioridade conferida a áreas negligenciadas11. John Ruggie, o maior responsável pela construção da Declaração do Milênio, alega que a lista de objetivos precisava ser simples e marcante para atrair atenção e consenso16. Michael Doyle, autor do documento “Road Map”, pretendia reproduzir o mesmo impacto em investimentos alcançado pelos países da OCDE com as metas atreladas a prazos dos Objetivos Internacionais de Desenvolvimento de 199616. A simplicidade e o reducionismo dos ODMs eram vistos como fundamentais para alavancar esses objetivos ao patamar de instrumentos globais de comunicação. Tratava-se, no entanto, de objetivos completamente inapropriados para a complexidade do planejamento no nível nacional. Mas os ODMs foram rapidamente aplicados exatamente nesse contexto, isto é, como um manual técnico de alocação/distribuição de recursos e de elaboração de políticas16-17. Na realidade, à medida que, na última década, os ODMs ocupavam o centro do palco de debates sobre desenvolvimento, foram também observadas mudanças na sua interpretação e utilização. O relatório do Secretario Geral da ONU de 2005, “Por uma maior liberdade: a caminho do desenvolvimento, segurança e direitos humanos para todos”, discute explicitamente o papel dos objetivos como metas de planejamento nacional18. O relatório “Investindo em desenvolvimento”, 47


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também publicado em 2005, desviou ainda mais a finalidade dos ODMs ao definir processos a nível nacional e recomendações para se alcançar “as metas quantitativas previstas pelos ODMs”19. Alguns países desenvolveram suas próprias metas de planejamento e passaram por um processo de adaptação nacional dos ODMs20. No entanto, especialmente em países altamente dependentes da ajuda externa, o que inclui praticamente todos os países com altas taxas de morbimortalidade materna, onde os doadores apresentaram resistência à adaptação e apropriação nacional, os objetivos globais deixaram de ser vistos como medidas de referência do progresso alcançado e passaram a conduzir o planejamento das políticas21,22. A Razão de Mortalidade Materna (RMM) é um dos principais indicadores de saúde materna, o que pode ser adequado para atrair a atenção para uma prioridade há muito tempo negligenciada, mas é um indicador inadequado para avaliar a efetividade de estratégias e intervenções no nível nacional. Consequentemente, a conversão das metas - de instrumentos globais de mobilização para instrumentos nacionais de planejamento - ocorreu principalmente a expensas do ODM 5. Devido à falta de investimento em sistemas de informação de eventos vitais, a produção das estimativas dos resultados dependiam grandemente da modelagem estatística. Devido à baixa qualidade e disponibilidade de dados, assim como à baixa incidência de ocorrências no nível populacional, grande parte dessas estimativas apresentam grandes intervalos de confiança, gerando resultados incompletos e dificultando a interpretação da variação de tendências. Mesmo naquela época, os estatísticos envolvidos na seleção dos indicadores para os ODMs reconheceram a necessidade de complementar as TMMs com indicadores de processo para avaliar o ODM 5ª23,24. A assistência obstétrica de emergência, reconhecida mundialmente como fundamental para salvar a vida das mulheres e o único indicador principal de saúde materna ligado ao funcionamento dos serviços de saúde, foi descartada, dando lugar à assistência qualificada durante o parto, em grande medida pela ausência de dados que respaldassem os argumentos a favor desse indicador5. Na maioria dos países com altas taxas de morbimortalidade materna, dados completos sobre a assistência obstétrica de emergência ainda não são coletados no nível nacional. Entretanto, a assistência qualificada durante o parto também é problemática como indicador devido aos métodos de pesquisa usados para registrar as taxas no nível nacional, o que dificulta a 48

comparação entre diferentes contextos25. Na ausência de registros essenciais e adequados, muitos países com altas taxas contaram apenas com métodos menos diretos e menos efetivos para monitorar a mortalidade materna. O Plano Nacional para Acelerar a Redução da Mortalidade Materna, Neonatal e Infantil, da Tanzânia, usou dados do Sistema de Informações de Saúde, dos relatórios anuais de Saúde Reprodutiva e da Saúde Infantil e do IDH, além de outras pesquisas locais e de instituições de saúde, a fim de monitorar as taxas de morbimortalidade no país. As muitas falhas dos dados são reconhecidas abertamente, inclusive aquelas referentes ao “registro incompleto e incorreto, definição adequada do contexto, gestão de dados, fonte de informação e métodos de previsão”26. Nem as RMMs nem a assistência qualificada durante o parto incluem as taxas de fecundidade ou as necessidades de saúde sexual e reprodutiva. A Meta 5B foi incorporada apenas em 2005, após um intenso lobby encabeçado pelo UNFPA e outras instituições, e seus indicadores só foram introduzidos em 2007. A Meta 5B preconiza o “acesso universal à saúde reprodutiva até 2015” e quatro indicadores da cobertura dos serviços de saúde (uso de contraceptivos, gravidez na adolescência, cobertura do pré-natal e necessidades não atendidas de planejamento familiar) foram incluídos na lista oficial dos ODMs27,28. A combinação de indicadores pode ser vista como um esforço em direção à percepção da autonomia das mulheres no controle da sua vida reprodutiva, mas ainda são problemáticos. O indicador “Necessidades não atendidas de planejamento familiar”, por exemplo, baseia-se em pesquisas realizadas com mulheres casadas, excluindo meninas e mulheres que não estão em um relacionamento29. O ODM 5B foi adotado apesar da forte oposição política do governo Bush e de outros governos, e recebeu pouca prioridade até 2012, quando a questão da contracepção, ou do “planejamento familiar”*, ressurgiu no debate global30.

Atraindo investimento e atenção: questões em destaque e questões negligenciadas O objetivo amplo dos ODMs era atrair investimentos globais e não há dúvidas que a cooperação * Essa terminologia é problemática já que muitas pessoas tem

necessidades contraceptivas fora do contexto de “planejar uma família”. Usamos esse termo aqui apenas em referência à Cúpula de Londres sobre o Planejamento Familiar de 2012 e à Iniciativa de Planejamento Familiar de 2010.


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internacional para a saúde aumentou vertiginosamente durante esse período. Em 2008, a saúde materna, neonatal e infantil (SMNI) recebeu apenas metade dos investimentos destinados ao HIV/Aids, mas os recursos da cooperação oficial ao desenvolvimento (COD) oficial para as ações em SMNI passaram de 2.56 bilhões de dólares em 2003 para 6.48 bilhões em 20103133. A COD para atividades ligadas à SMNI nos 74 países prioritários aumentou de 1.96 bilhões de dólares em 2003 para 3.46 bilhões em 2006 e para 4.99 bilhões em 2010. Dos 3.46 bilhões de dólares desembolsados em 2006 para SMNI nestes países, 68% foram gastos em saúde infantil e 32% em saúde materna e neonatal31. Entre 2003 e 2010, a COD para a “saúde reprodutiva” (assistência ao pré-natal, parto e puerpério, infertilidade, aborto inseguro e ações pela maternidade segura) passou de 305 para 863 milhões de dólares (Gráfico 1)34. O aumento significativo de recursos para o setor saúde, de 0,144 bilhões de dólares em 2000 para 1.234 bilhões em 2009, porém, ainda não alcançou o planejamento e os programas específicos e verticais35. Gradualmente, algumas áreas da saúde reprodutiva receberam maior atenção e financiamento durante a vigência dos ODMs, mas esse não foi o caso, pelo menos até 2010, de contracepção, ou “planejamento familiar”. De fato, entre 2000 e 2007, Nguyen et al. declarou que os aportes financeiros para o planejamento familiar foram reduzidos em termos absolutos de 518 para 462 milhões e, em termos proporcionais, de 30% para 5% do

total da “assistência à população” (contraceptivos; serviços básicos de saúde reprodutiva, que inclui saúde materna, aborto, informação, educação e comunicação sobre saúde reprodutiva, entre outros serviços; infecções sexualmente transmissíveis, HIV/AIDS; e pesquisa básica, dados e análises das políticas de população e desenvolvimento)36. A ausência de investimentos adequados em contracepção, entretanto, não pode ser inteiramente atribuída à falta de atenção dada pelos ODMs à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos37-38. A retirada do financiamento da UNFPA por parte do governo americano, por exemplo, também contribuiu de maneira drástica com essa situação. A ausência de doadores adequados e, consequentemente, de financiamento para a contracepção foi devastadora especialmente no que se refere aos seus efeitos para a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres39. Um estudo de 2013, por exemplo, que analisou a prevalência de uso de contraceptivos de 1990 a 2013, concluiu que dos 26 países com as taxas mais baixas de prevalência em 1990 (menos de 10%), o crescimento absoluto dessa taxa até 2010 foi menor do que 10% em 16 países africanos. Em 2010, as necessidades não atendidas de planejamento familiar na África permaneciam praticamente no mesmo patamar de 199039. A Cúpula de Planejamento Familiar de Londres (2012) comprometeu-se com novos planos substanciais de ajuda, inclusive por parte da Fundação Bill e Melinda Gates. Entretanto, o documento final da Conferência da ONU de Desenvolvimento

Gráfico 1: Total dos compromissos oficiais bilaterais: atenção básica, HIV/Aids, saúde reprodutiva, planejamento familiar 6000

Em milhões de dólares 2010

5000

Atenção básica Saúde reprodutiva Controle do DST e do HIV/AIDS Planejamento familiar

4000 3000 2000 1000 0 1995 1997 1999 2001 2003 2005 2007 2009

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Sustentável, a Rio+20, assim como o discurso governamental e acadêmico, sugerem que o real motivo para o retorno dos debates sobre “planejamento familiar” e uso de contraceptivos está ligado ao “desenvolvimento sustentável” e ao crescimento econômico e não às questões de saúde e direitos sexuais e reprodutivos40-43. Outras questões, como o fato de 13% das mortes maternas no contexto global poderem ser combatidas com acesso a serviços de aborto seguro e acessíveis, foram explicitamente excluídas do financiamento destinado à redução da mortalidade materna5-44. Seria correto afirmar que a responsabilidade por essa exclusão está na influência dos doadores, a visão religiosa conservadora contra o aborto e a pouca disposição ou impossibilidade de muitos governos do sul para desafiar essas forças45. Há ganhos significativos relativos ao direito ao aborto graças à ação das instituições internacionais de monitoramento dos direitos humanos e eixos de resistência no campo jurídico e das mobilização social, mas, certamente também há alguns retrocessos38,46. Além disso, deve-se destacar muitas outras questões tratadas pela CIPD e em Beijing que transcendem as intervenções do setor de saúde como, por exemplo, a violência de gênero, e que não foram incluídas na agenda ODM, sendo afastadas do centro dos debates globais48. Foi apenas em 2003 que a Comissão sobre o Status das Mulheres, em conjunto com o Painel de Alto Nível sobre a Agenda de Desenvolvimento pós-2015 e o Secretário Geral da ONU, apresentou relatórios que destacavam firmemente a necessidade de se tratar a violência de gênero como violação dos direitos humanos e de tornar a sua erradicação uma prioridade no contexto do desenvolvimento global48-50.

Avanços agregados e desigualdades persistentes O propalado sucesso do ODM em reduzir a mortalidade materna em 47% - de 543,000 para 287,00051 - também encobre desigualdades e possíveis padrões de discriminação que são fundamentais do ponto de vista da perspectiva dos direitos humanos. Países que alcançaram progressos consideráveis em reduzir as desigualdades na saúde reprodutiva, como a Tailândia, o fizeram através de investimentos substanciais e contínuos nos serviços de saúde52. Mas uma vez que as metas dos ODM têm um foco em avanços agregados e não nas desigualdades, muitos países, visando uma boa avaliação, optaram por não abordar populações marginalizadas ou remotas, focando suas 50

ações em grandes áreas urbanas e periurbanas com o objetivo de alcançar o melhor custo-benefício em termos de investimentos na saúde e na reprodução53-54. De maneira geral, os ODMs foram criticados pelo foco em avanços agregados, sem considerar as questões de equidade. O Power of Numbers Project identificou negligências quanto à equidade em questões relacionadas à água e saneamento e à educação e sobrevivência infantil. Unterhalter, por exemplo, argumenta que a falha em abordar a equidade no acesso ao ensino básico (objetivo 2), perpetua a marginalização de crianças que pertencem à classes socioeconômicas mais baixas e a grupos étnicos subordinados, que, em geral, vivem em áreas não alcançadas pelos programas de desenvolvimento social55. A desagregação dos dados é vital para se detectar as disparidades nacionais e entre países, identificando-se possíveis padrões de discriminação entre as populações. No caso do ODM 5, a desagregação das RMMs exacerba os problemas discutidos acima relacionados à interpretação dos dados devido à pequena dimensão da amostra e ao grande intervalo de confiança23. Assim, a narrativa otimista da Índia sobre os declínios da RMM, por exemplo, perde força quando se analisa cada estado de forma separada ou a renda de cada área, a despeito da disponibilidade e qualidade dos dados56. Apesar disso, se a escolha das RMMs involuntariamente encobriu os impactos dos ODMs na igualdade, eles foram alarmantemente evidenciados por meio dos dados relativos à assistência ao parto de qualidade. Um estudo comparativo publicado em 2012 contendo 12 intervenções SMNI em 54 países, demonstrou que a assistência ao parto de qualidade foi o indicador que melhor refletia a disparidade, estando sujeito à variações significativas associadas à distribuição geográfica e à renda. Nos 54 países analisados, a proporção de partos assistidos com qualidade foi de 54%, nas zonas mais pobres, porém, essa proporção foi de apenas 32% e nas zonas com rendas mais altas chegava à 84%57.

Programas verticais, objetivos de curto prazo e nichos programáticos Várias análises sobre o progresso dos ODMs, a partir do Road Map, demonstram que foram poucos os impactos positivos nos serviços destinados às mulheres58. Uma das razões para isso é o planejamento vertical e a ausência de programas nacionais multissetoriais que, invariavelmente, obstaculizam os avanços em direção a uma abordagem


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mais ampla dos serviços de saúde materna e neonatal e de saúde sexual e reprodutiva58. A própria estrutura dos ODMs, focada em resultados quantificáveis, encoraja o planejamento vertical e de curto prazo. Conexões entre os ODMs não foram previstas, nem mesmo entre os da área da saúde. No caso do HIV/Aids, os movimentos defenderam a retirada deste tema da área de saúde e direitos sexuais e reprodutivos, alegando “excepcionalidade” e ameaças à segurança nacional, o que também ocasionou enormes consequências para o financiamento e planejamento durante os processos de elaboração dos ODMs59-61. O foco nos resultados de curto prazo, e não em mudanças sistemáticas, pode ter exacerbado uma tendência do financiamento para a saúde associada ao apelo e à promessa de “maior responsabilização”, dominada pelas abordagens focadas na “gestão orientada para resultados” e na relação “custo-beneficio”62. Os Documentos de Estratégias para a Redução da Pobreza do Banco Mundial promoveram os financiamentos focados em resultados e evidências sugerem que após a introdução dos ODMs, muitos desses documentos foram simplesmente modificados para incluir as metas dos ODM como objetivos consensuais e metas de planejamento, sem qualquer adaptação às condições e prioridades locais63. Em lugar de questões macroeconômicas abrangentes como, por exemplo, o acesso das mulheres a recursos e ao trabalho formal, o que ganhou espaço na última década foram medidas paliativas como transferência de renda e distribuição de cupons†, especialmente no campo da saúde reprodutiva. De fato, essas ações apenas oferecem às mulheres recursos imediatos para uma “escolha” pré-selecionada quanto à assistência à saúde reprodutiva, em lugar de promover o empoderamento econômico, necessário para a igualdade de gênero e para produzir impactos sobre a saúde sexual e reprodutiva. Apesar da popularidade desses programas entre as agências de cooperação e as organizações internacionais, com algumas exceções na América Latina, há alguns estudos bastante críticos a esses programas utilizando-se diferentes metodologias64. Os ODMs baseiam-se em uma noção de desenvolvimento focada em intervenções especificas e †

Nota da editora brasileira: os programas de cupom do Banco Mundial tem sido implementados especialmente na África e na Ásia e consistem na distribuição de um ‘pacote’ de cupons de desconto para o acesso a serviços de saúde reprodutiva, com o objetivo de ampliar o acesso das mulheres aos serviços e criar mercado para os setores público e privado de saúde.

resultados concretos, contrastando claramente os documentos das conferências internacionais dos anos 90 que reconhecem a interdependência dos avanços em diferentes campos sociais e econômicos e a necessidade de dar relevância à liberdade civil e política. Essas conferências foram marcantes exatamente pela sua abordagem interssetorial1,2,6. Não só a CIPD e a Conferência de Beijing, mas a Cúpula Mundial das Crianças (Nova Iorque), a Conferência de Educação de Jomtien, ambas em 1990, a ECO-92 no Rio, a Cúpula Social Mundial sobre Desenvolvimento Social (Copenhagem, 1994), a Cúpula Mundial da Fome (Roma, 1996) e a Conferência sobre Assentamentos Humanos (Istambul, 1996) também reconheceram explicitamente a natureza intercultural das questões sociais complexas que abordaram e quase todas destacaram a importância da igualdade de gênero para o desenvolvimento (essa questão acabou sendo reduzida ao ODM 3, avaliado por meio da igualdade de gênero na educação e só posteriormente é que foram incluídas medidas de avaliação da participação política das mulheres). Apesar dos ODMs pretenderem expressar o modelo de desenvolvimento “centrado nas pessoas” presente na Declaração do Milênio, na realidade acabaram representando um retorno às abordagens restritas de desenvolvimento dos anos 80, nas quais saúde e educação eram vistas como necessidades básicas e não como direitos62. Segundo o Power of Numbers Project, o ODM 5 não foi a única área afetada por essa mudança no modelo de desenvolvimento. Ao analisar o ODM 1 (sobre a fome), Fukuda-Parr e Orr demonstram que os ODMs incentivaram medidas de distribuição de alimentos e suplementos nutricionais para alcançar resultados de curto prazo, em lugar de propor as medidas estruturais propostas pela Conferência Mundial sobre a Fome (1996), que tratou a segurança alimentar como direito humano65. De maneira similar, Unterhalter demonstra que o ODM da educação reduziu a amplitude da agenda “Educação para todos”, aprovada em Jomtien, à educação básica universal, excluindo as questões relativas à igualdade, qualidade e gênero, entre outras, e substituindo-as por resultados quantificáveis de curto prazo55. Cohen aponta que o Objetivo 7 (Meta 7D - alcançar melhorias significativas na vida de pelo menos 100 milhões de habitantes de favelas) reduziu os objetivos econômicos, sociais, de gestão e do meio-ambiente consensuados na Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos Humanos (1996) ao cálculo do número 51


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de casas e banheiros, fracassando redondamente em abordar os desafios estruturais decorrentes da urbanização, como a mudança climática, o crescimento econômico e a geração de empregos66. Sen e Mukherjee destacaram que os ODMs trataram apenas de um dos 13 pontos de ação pela igualdade de gênero propostos pela Conferência de Beijing67.

Da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos para a saúde materna, neonatal e infantil? Os ODMs não apenas promoveram o reducionismo das políticas e do planejamento, mas também produziram um enorme impacto no debate sobre o desenvolvimento, claramente evidenciado pelo ODM 5, que impulsionou uma reestruturação do campo em termos de investimentos, políticas, planejamento, organização e disseminação do conhecimento. Em 2005, quando os ODMs já ditavam as políticas de cooperação internacional, havia também a compreensão crescente de que, para se alcançar os ODMs 4 e 5, seria contraproducente ampliar os esforços ligados à SMNI, superdimensionados pela própria estrutura dos ODMs19. Uma das principais iniciativas para lidar com essa fragmentação foi a Parceria para a Saúde Materna, Neonatal e Infantil e a abordagem do “continuum da assistência”, que tinha como objetivo aproximar as comunidades de pesquisa e de prática. Esse modelo não era novidade, mas acabou por aproximar unidades de saúde de diferentes níveis, assim como fortaleceu os vínculos entre as intervenções antes e durante a gravidez e as intervenções do pós-parto até o inicio da infância. Ainda que esse modelo não tenha corrigido a fragmentação no nível nacional, em alguns países altamente dependentes da ajuda externa a Parceria para Saúde Materna, Neonatal e Infantil foi um instrumento importante para consolidar essa abordagem como o caminho a ser seguido na Estratégia Global sobre a Saúde das Mulheres e Crianças do Secretário Geral da ONU (2010)68. Ao destacar o papel da mulher como mães, a abordagem do continuum da assistência refletiu e também contribuiu para a mudança significativa dos ODMs, que colocou no centro da agenda o papel da mulher como mãe e cuidadora de crianças e não como cidadã autônoma e sujeito de direitos. Essa foi a maior mudança na concepção da saúde e direitos sexuais e reprodutivos trazida pela CIPD, e depois reafirmada em Beijing, reconhecendo as mulheres como propulsoras da mudança social e 52

sujeitos de direitos, demandando ações multissetoriais que vão além do setor saúde e envolvem o ciclo completo de vida da mulher, não se limitando à gravidez. Essa primeira agenda visava modificar as relações de poder no nível macro, isto é, os modelos econômicos que produzem a feminização da pobreza, indo até os níveis micro da violência nas relações íntimas – e, por isso, atraiu uma forte oposição política69. O foco na saúde materna excluiu do discurso hegemônico o debate sobre o lugar social das mulheres e muitas outras questões - como a violência de gênero e as diferentes expressões da identidade de gênero – também desapareceram das pesquisas e dos debates. Isso se refletiu nos programas de algumas das principais conferências mundiais desse período, como as Conferências sobre Parto e Saúde Materna, que receberam milhões de dólares e atraíram atenção com e edição especial do periódico Lancet, e terminou por também contribuir para essa mudança. Apesar desses desdobramentos, é importantíssimo destacar que os movimentos de mulheres do campo da saúde continuaram pressionando e defendendo uma agenda ampla durante os anos 2000s, como foi evidenciado pela incorporação do ODM 5B - apesar da enorme resistência política -, pela defesa dos paradigmas da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos nos contextos nacionais e internacional e pelo encontro de Langkawi em 2010. Recentemente, a construção de redes de ativistas de saúde e direitos sexuais e reprodutivos para a agenda de desenvolvimento pós-2015 e o documento do Consenso de Montevidéu, que surgiu da análise regional da CIPD+20 na America Latina, representam indicadores promissores de um movimento político firme em relação à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos no contexto do desenvolvimento15,47,49,69,70.

Implicações para a elaboração da próxima agenda de desenvolvimento Atualmente, a atenção mundial volta-se para a elaboração da agenda de desenvolvimento pós-2015, que incluirá um novo conjunto de objetivos – os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e outros-, que também envolverão metas e indicadores42,49. Ativistas da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos continuam a demandar a incorporação das questões mais abrangentes na agenda pós-2015, de modo articulado com o processo da CIPD+20. Entretanto, pouca atenção tem sido dada à estrutura desse futuro marco do desenvolvimento


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e suas implicações para a saúde e para os direitos sexuais e reprodutivos. A análise do ODM 5 e os resultados do Power of Numbers Project sugerem que se deve trazer à cena os dilemas ligados à elaboração de objetivos e metas derivados dos critérios usados na concepção dos ODMs.

Estipulando objetivos universais e interrelacionados É absolutamente essencial que a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos estejam presentes em todos os objetivos e conectados ao gênero e à justiça econômica no futuro marco referencial para o desenvolvimento. Saúde e direitos sexuais e reprodutivos são relevantes para muitos dos prováveis objetivos da agenda pós-2015 de desenvolvimento: não apenas no campo da saúde, mas também para os objetivos que se referem ao emprego (e às atividades não remuneradas exercidas por mulheres), à educação, nutrição e segurança alimentar, governança democrática, mudanças climáticas, acesso à água e ao saneamento. Saúde e direitos sexuais e reprodutivos estão essencialmente ligados à pobreza e às desigualdades, especialmente à desigualdade de gênero. Além disso, a interrelação entre todos os direitos deve ser contemplada por todos os objetivos. A saúde e os direitos sexuais e reprodutivos também ilustram a importância de um conjunto universal de objetivos71. Questões como a violência de gênero afetam países com diferentes níveis de desenvolvimento. Além disso, o acesso universal à informação ampla, integrada e de qualidade sobre saúde sexual e reprodutiva, à educação e à serviços também revelam as disparidades existentes entre países e no interior dos mesmos. Em um estudo para o Power of Numbers Project, Sumner e Gentilini destacam que 72% da população pobre mundial vive em países de renda média, o que demonstra a necessidade urgente de abordar a igualdade e os padrões nacionais de discriminação na futura agenda para o desenvolvimento72.

Traçando metas diferentes Um lição importante a ser retirada dos ODMs é a necessidade da implementação gradual de metas referentes a cada nível de desenvolvimento, como feito anteriormente nas Conferências das Nações Unidas, evidenciando-se as especificidades de cada país e não colocando em posição de desvantagem aqueles que ainda estão longe de alcançar um determinado objetivo. É essencial que o processo de definição das metas quantitativas conte

com a participação dos governos nacionais, para que fundamentem de forma rigorosa e se apropriem das metas, utilizando-se a comparação com países semelhantes do ponto de vista demográfico e econômico para conceituá-las de forma realista. A abordagem proposta pelos Comitês de Monitoramento dos Tratados de Direitos Humanos é um bom exemplo da relação entre a definição da normativa internacional e o processo subsequente de análise comparativa no âmbito nacional, através do qual é possível, e adequado, responsabilizar os governos pelos resultados.

Selecionando indicadores para os direitos humanos No marco dos direitos humanos, alguns indicadores não são e não devem ser quantitativos. Uma meta que invoca o “reconhecimento universal dos direitos sexuais e reprodutivos”, por exemplo, depende necessariamente de indicadores relacionados ao marco jurídico e político. O fato de não serem quantitativos não significa que não podem ser alcançados em um determinado período, durante o qual congrega esforços políticos e institucionais. A força Tarefa de Alto Nível da CIPD, por exemplo, recomenda a imediata “criminalização da violência sexual e o fim da impunidade para os perpetradores, a eliminação do casamento precoce e forçado e da mutilação genital no período de uma geração”73. Olhando para o futuro, é essencial que indicadores quantitativos sejam desagregados para revelar possíveis padrões de discriminação. Como já reconhecido por diversas frontes, a disponibilidade de dados não pode definir automaticamente a seleção dos indicadores, como aconteceu com os ODMs74. Investimentos em sistemas de informação são essenciais para a produção de dados que permitem o monitoramento de muitas questões de saúde sexual e reprodutiva, mas também de questões como o casamento infantil. Além disso, os indicadores devem ser relevantes para a elaboração de novas políticas e sensíveis às intervenções políticas5. Isso requer indicadores de processos e de resultados, como a assistência obstétrica de emergência. Em relação aos direitos humanos, indicadores são usados para avaliar o comprometimento de cada país com as obrigações internacionais e sem essas medidas seria impossível assegurar que os governos adotam “medidas apropriadas” e de caráter não discriminatório, como é exigido pela normativa dos direitos humanos. 53


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Conclusões Muitas lições podem ser extraídas dos processos envolvendo a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos nos ODMs. É evidente que os avanços na saúde e direitos sexuais e reprodutivos exigem mudanças na arquitetura econômica mundial e nos mecanismos institucionais globais, afetando uma grande gama de questões, desde os financiamento para o desenvolvimento até acordos comerciais, uma vez que as mudanças na ajuda externa e nos acordos econômicos globais afetam profundamente a saúde e os direitos sexuais e reprodutivos. Nesse artigo, descrevemos os efeitos da ênfase dos ODMs em metas e indicadores quantificáveis de curto prazo que acabaram definindo objetivos sociais. Clareza e simplicidade foram os pontos fortes dos ODMs que atraíram reconhecimento, mas a redução da agenda do desenvolvimento a um “conjunto de objetivos” não foi um processo neutro e excluiu muitas dimensões criticas de todos os objetivos. De maneira similar, como demonstrou o Power of Numbers Project, as metas quantificáveis, enquanto conceitos complexos de comunicação, eram outro ponto forte dos ODMs, mas o foco exclusivo nelas pode ter desviado a atenção política das questões estruturas de direitos humanos, que demandam mudanças jurídicas, institucionais e políticas que, por suas vez, não podem ser medidas quantitativamente. Metas concretas e focadas em resultados demonstraram ser eficientes para produzir consensos sobre os ODMs como referências de desenvolvimento, mas acarretaram intervenções de curto prazo que não tocaram nas raízes de problemas como a mortalidade materna e muito menos da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos, pensados de maneira mais abrangente. Dentro dos ODMs, a preocupação em

atender necessidades básicas fortaleceu o apoio financeiro a iniciativas globais e nacionais de saúde, que investiram em planejamento vertical e hierárquico. Isso representou o afastamento do discurso de desenvolvimento dos anos 90, que incorporava questões sobre mudança social e alterações das relações de poder. Além disso, o modelo de desenvolvimento baseado em direitos prevê um processo que envolve as pessoas não apenas como destinatárias passivas do progresso, mas como sujeitos de direitos que podem manifestar suas apreensões, reivindicar seus direitos e participar ativamente da transformação de estruturas e instituições que perpetuam sua submissão. Defendemos que a hegemonia das abordagens restritas à saúde materna, como resultado dos ODMs, deve ser interpretada no contexto da mudança dos paradigmas de desenvolvimento que ocorreu na primeira década dos anos 2000. Trazer de volta para o discurso global as questões de saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos representa o eterno desafio de usar o desenvolvimento como arma para empoderar mulheres e populações marginalizadas e para abordar desigualdades estruturais fundamentais para a mudança social sustentável. Aprendemos com os ODMs que o processo de definição de metas não é neutro, mas envolve valores e normas, que produzem efeitos políticos e de planejamento de longo alcance. Assim, não é adequado que o futuro marco referencial do ODM+ baseie-se nessa estrutura. Um novo paradigma de desenvolvimento deve incorporar uma forte narrativa de transformação social, inclusive em relação à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos, na qual metas e indicadores devem ter seu lugar, mas não devem comandar e nem restringir os propósitos abrangentes de se avançar na justiça social, política e de gênero.

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AE Yamin, VM Boulanger. / Questões de Saúde Reprodutiva 2015; 8: 46-57

Résumé Cet article examine les conséquences prévues ou non du choix de l’OMD 5 comme objectif mondial, conjointement avec ses cibles et indicateurs respectifs, et place l’évolution de l’OMD 5, et plus largement de la santé et des droits sexuels et génésiques, dans le contexte du modèle de développement qui a été encodé dans les OMD. Ces dix dernières années, à mesure que les OMD occupaient une place de plus en plus centrale dans le développement et que leur utilisation évoluait, il est regrettable qu’ils aient cessé d’être des objectifs mondiaux pour devenir des cibles de la planification nationale. Cette transformation a été particulièrement néfaste dans le cas de l’OMD 5. Elle a non seulement restreint les politiques et la programmation, mais a eu d’importantes répercussions sur le discours du développement lui-même : elle a transformé ce domaine du point de vue de l’organisation et de la diffusion des connaissances, et a montré que la définition des cibles et des indicateurs n’est pas neutre et qu’elle véhicule des valeurs normatives. S’agissant de l’avenir, il n’est pas judicieux de proposer un cadre des OMD+ reposant sur la même structure. La santé et les droits sexuels et génésiques doivent être replacés dans le discours mondial, utilisant le développement pour autonomiser les femmes et les populations marginalisées, et corriger les inégalités structurelles, ce qui est fondamental pour un changement social durable. Le nouveau cadre de développement devrait inclure une solide description de la transformation sociale dans laquelle des cibles et des indicateurs adéquats jouent un rôle, mais sans dépasser ni circonscrire les buts plus larges du progrès de la justice sociale et politique et de l’égalité des sexes.

Resumen En este artículo se examinan las consecuencias deseadas y no deseadas de la selección del ODM 5 como meta mundial, así como sus respectivas metas e indicadores, y se pone en el contexto del modelo de desarrollo codificado en los ODM lo que sucedió con el ODM 5 y con la salud y los derechos sexuales y reproductivos en general. En la última década, a medida que los ODM cobraron cada vez más importancia en desarrollo y su uso evolucionó, inapropiadamente pasaron de ser metas mundiales a ser metas nacionales de planificación. Esta conversión fue perjudicial en el caso del ODM 5 en particular. No solo creó un estrechamiento con relación a las políticas y los programas, sino que también tuvo un gran impacto en el discurso del desarrollo en sí, ya que reestructuró el campo en términos de la organización y difusión de conocimientos y recalcó que el proceso de establecer metas e indicadores dista mucho de ser neutral pero codifica valores normativos. Con miras hacia el futuro, no es adecuado proponer un marco de ODM+ basado en la misma estructura. La salud y los derechos sexuales y reproductivos deben incluirse nuevamente en el discurso mundial, utilizando el desarrollo para empoderar a las mujeres y a las poblaciones marginadas, así como para abordar las desigualdades estructurales que son fundamentales para el cambio social sostenido. El nuevo marco de desarrollo debe incluir una narrativa influyente sobre la transformación social en la cual las metas y los indicadores adaptados al propósito desempeñen un papel, pero no superen ni limiten los objetivos generales de promover la justicia social, política y de género.

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