Os legados do número cinco

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Os Legados do Número Cinco Tradução: Lorien RJ (Cherles Belem, Jadson Júnior, Johhn Delli, Ane Souza, Gabriela Gatti)

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Os Legados do Número Cinco Tradução: Lorien RJ (Cherles Belem, Jadson Júnior, Johhn Delli, Ane Souza, Gabriela Gatti)

Capítulo 1 2


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- Os mogs estão aqui. Meus olhos se abrem enquanto eu sou empurrado, na esperança de que aquela frase fosse de um sonho ruim. Mas não é. - Eles estão aqui – Rey cochicha novamente enquanto atravessa o chão de nossa pequena cabana onde estou dormindo sob uma pilha de cobertores. Estou sob o chão em segundos. Oscilações da lanterna movida a luz solar de Rey balançam em minha face e me cegam. Recuo e ele a desliga, deixando-me em completa escuridão. Enquanto ele me empurra para fora de casa, tudo que posso ver é um pequeno faixo de luz prata passando pela janela. - Fuja! – Sua voz soa com urgência e medo. – Eu os segurarei. Vai, vai, vai! Começo a procurar por ar, mas não o encontro onde estava antes. Não posso ver nada: meus olhos ainda queimam por causa da lanterna. - Rey... - Não – Ele me corta de algum lugar do escuro. – Se você não for agora, estamos ambos mortos. Há um barulho perto da cabana, seguido de algum som – ou alguém batendo contra a frente da porta. Rey solta um grito de dor, mas dentra da cabana eu ainda não consigo enxergar nada a não ser escuridão nos meus olhos. Sei que existe uma barra de metal atrás da porta, mas ela não vai aguentar por muito tempo. Está mais para uma exibição do que qualquer outra coisa. Se alguém realmente quisesse entrar em nossa cabana, poderia simplesmente soprar a nossa frágil parede de madeira. E se são os Mogs... Não há tempo para pensar, somente para reagir. É a mim que eles querem. Tenho que achar algum lugar seguro. Tiro um pedaço de pano que me serve de uma cortina improvisada e lanço-me através da janela. Aterrisso com um “plop” em uma poça de lama, despejos e coisas que não quero nem imaginar o que são – estou no chiqueiro. Um único pensamento soa pela minha mente: “Vou morrer. Um garoto de treze anos de idade coberto de merda de porcos numa ilha no meio do nada”. A vida é tão injusta. Os porcos relincham – porque atrapalhei seu sono – e isso me traz de volta ao momento. Antigos regimes de treinamento e palestras tomam conta do meu cérebro e estou novamente em movimento, checando meus flancos para saber se algum mog já conseguiu chegar à parte de tras da cabana. Começo a pensar sobre o que seu plano de ação deve ser. Se os Mogs já soubessem que eu estava na ilha, eu já teria sido cercado. Não, deve ser um dos mensageiros que tropeçou em nós por acaso. Talvez ele tivesse 3


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tempo de se comunicar com os outros, ou não. Seja qual for o caso, tenho que sair da linha de fogo. Rey abaterá o mensageiro. Ele vai ficar bem. Pelo menos é o que digo para mim mesmo, tentando ignorar o quão frágil Rey ficou ultimamente. Ele tem que ficar bem. Ele sempre fica. Continuo pela floresta atrás de nossa cabana. Meus pés afundam na areia, numa tentativa da ilha de me atrazar. Estou vestido somente de shorts atléticos escuros. Os ramos e arbustos ao meu redor arranham minha arca e minha barriga. Já fiz esse tipo de coisa antes, uma vez, no Canadá. Em seguida, os casacos e alguns sacos me sobrecarregam. Mas tive um pouco mais de cuidado. Agora, no meio da noite quente do Caribe, sinto-me sobrecarregado pela falta de resistência. Enquanto sigo pela floresta densa, penso em todas as manhãs que eu devia ter passado correndo pela praia, ou passeado pela floresta, mas na verdade eu estava jogando paciência ou simplesmente relaxando. Fazendo o que eu realmente queria fazer, como desenhar na areia. Chegando com histórias curtas contadas por figuras feitas de vara. Rey sempre disse que eu não deveria, na verdade, escrever nada. E que qualquer notícia ou notas que eu escrevi poderia ser encontrada e utilizada como prova de quem eu sou. Mas escrever e desenhar na areia era temporário. Quando a maré subia, minhas histórias se iam. Mesmo só fazendo isso, eu suava e quando voltava para me encontrar com Rey, fingia estar exausto. Ele comentava sobre o momento da minha corrida imaginária e depois tratava de me dar um rico almoço como uma recompensa. Rey é um mestre em relação a demandar coisas para fazer, mas seus pulmões estão ruins e ele sempre acreditou que eu estava fazendo o treinamento que ele me mandava fazer. Ele não tinha razão para não acreditar que eu levava nossa situação a sério. Não era apenas evitar ter que trabalhar pra caramba no calor que me impediu de treinar. Era aquela monotonia toda que eu odiava. Corrida, levantamentos, alongamentos, mira, e então se repetia tudo dia sim, dia não. E mais, estamos vivendo no meio de lugar nenhum. Nossa ilha não se encontra em nenhum mapa. Eu pensava que os Mogs nunca nos encontrariam. Agora estou com medo de que estão vindo para me caçar. Eu bufo enquanto corro. Estou totalmente despreparado para este ataque. Aquelas manhãs que eu espreguiçava na praia me deixarão morto. Não leva muito tempo para que haja um ponto no meu lado tão dolorido que eu acho que é possível que eu estoure algum tipo de órgão interno. Estou sem ar, e o ar úmido parece querer me sufocar. Minhas mãos agarram em galhos baixos enquanto eu faço o meu caminho através de uma espessa folhagem verde. O fundo dos meus pés raspa contra membros caídos e conchas afiadas como navalhas. Em poucos minutos, a copa acima de mim é tão densa que apenas feixes de luz da lua brilham através dela. A selva deu caminho para uma floresta tropical completa.

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“Estou sozinho no meio da escuridão de uma floresta tropical enquanto monstros alienígenas me perseguem. ” Paro ofegante e segurando meu lado. Nossa ilha é pequena, mas estou somente talvez um quinto a frente do que estava antes. Do outro lado da ilha, um pequeno caiaque está me esperando, juntamente com um pacote de suprimentos e equipamentos de primeiros socorros. A embarcação de fuga de última chance, algo que vai me deixar na escuridão da noite e desaparecer no oceano. Mas isso parece tão distante agora, com meus pulmões gritando para mim e meus pés descalços sangrando. Eu me inclino contra uma árvore, tentando recuperar o fôlego. Algo skitters através do chão da floresta a poucos metros de distância de mim e eu pulo, mas é apenas um dos pequenos lagartos verdes que anda pela ilha. Ainda assim, meu coração bate. Minha cabeça está tonta. “Os Mogadorianos estão aqui. Eu vou morrer. ” Eu não posso imaginar o que Rey está fazendo na cabana. Quantos Mogs estão aqui? De quantos ele pode cuidar? Espero que eu esteja certo, e é apenas um único batedor. Eu percebo que eu não ouvi nenhum tiro. Isso é um bom sinal, ou significa que os bastardos chegaram a ele antes que ele fosse capaz de disparar um único? “Continue indo”, eu digo a mim mesmo, e, em seguida, começar de novo. Minhas panturrilhas estão queimando e meus pulmões parecem que estão prestes a rachar toda vez que eu inspiro. Eu tropeço, batendo no chão duro e perdendo o pouco fôlego que eu tinha dentro de mim. Em algum lugar atrás de mim, eu posso ouvir o movimento nas árvores. Eu olho ao redor. Sem uma visão clara do céu, eu não posso nem dizer em que direção eu vou mais. Eu estou totalmente ferrado. Eu tenho que fazer alguma coisa. Eu abandono o plano de atravessar a ilha. Eu não estou em nenhuma forma de fazê-lo. Por um momento, penso em enterrar-me, talvez encontrar algum lugar para me esconder até que eu pudesse escapar pela floresta, mas, em seguida, penso em todas as aranhas e formigas do tamanho de punhos e cobras que poderiam estar à espera de mim, e imagino um olheiro Mogadoriano pisando em mim por acidente. Então eu coloco a cabeça no lugar. Reunindo toda a força que eu tenho, eu uso algumas vinhas resistentes mão após mão para me puxar e me coloco em um galho baixo de uma árvore próxima. Tudo o que posso pensar são os muitos diferentes tipos de animais que Rey me disse que o Mogs podem comandar, os quais gostariam nada mais do que me separar em partes. Por que não temos bestas gigantes para lutar por nós?

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Meus braços tremem durante o tempo que passo sobre o galho. A madeira range sob o meu peso enquanto eu olho para a escuridão, na esperança de que uma ou outra vez nada vai sair dela. Isso eu posso apenas esperar. Que tudo isso irá embora. Não tem como dizer quanto tempo se passou. Se eu tivesse sido mais calmo ou não tivesse sido tomado assim de surpresa, eu poderia ter lembrado de pegar o meu relógio no caminho para fora da janela. É estranho. O tempo pareceu sempre não significar nada aqui na ilha, mas agora ele é tudo. Quanto tempo antes de mais deles chegarem? Quantos segundos antes deles me acharem? Tento controlar a minha tremedeira e meu estômago de embrulhar – entre a corrida, meu medo, o cheiro dos porcos ficou agarrado em mim numa expessa camada de lodo, estou a ponto de vomitar. Talvez essa camada de fezes me ajude na camuflagem, pelo menos. Não é um forro de prata muito tranquilizador. Finalmente, uma silhueta aparece através da escuridão. Eu fico mais próximo da árvore. A figura tem aparência humana. Talvez até um pouco curvado, apoiado em uma bengala enquanto ele passa pela fraca luz da lua. Ele está vestindo uma blusa de linho azul, calsas de cor caqui e tênis que devem ter sido brancos em algum tempo. Sua barba é branca, rajada de preto e seu cabelo quase prata. Reconheço-o imediatamente. Claro, Rey. Ele usa algo, está enrolado em um pedaço de pano. Eu começo a chama-lo, mas ele já está olhando fixamente em mim, os lábios trêmulos, como se ele estivesse lutando, a cada impulso, a não gritar. Ele simplesmete fica ali. O silêncio se estende no ar seco entre nós. Finalmente, eu o quebro. - Bem, você o pegou? Rey não responde imediatamente, somente olha para os lados, ficando no chão. - Do que você se esqueceu? - Sua voz soa como um leve guizo. - O que? – Pergunto, minha respiração diminui. Ele joga sua parcela no chão. Parte do pano cai para trás, e eu posso ver um canto familiar. - A arca? – Pergunto. Minha Arca Lórica. A coisa mais sagrada que possuo. O tesouro na verdade ainda não posso ver. O recipiente supostamente detém a minha herança e as ferramentas para reconstruir meu planeta natal, e eu não posso nem olhar dentro até Rey achar que eu estou pronto para qualquer coisa que aquilo signifique. - A arca. – Rey acena com a cabeça. 6


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Começo a descer a árvore. Pulo da metade da árvore e aterrizo no chão. - Nós deveríamos continuar indo, certo? – Pergunto. Minhas palavras estão emboladas agora, minha língua tropeçando nas letras enquanto eu tento dizer um milhão de coisas ao mesmo tempo. – Você não tem armas? Ou nossa comida? Onde nós estamos indo agora? Não deveríamos... - Sua arca é a segunda coisa mais importante que você tem que proteger do que sua própria vida. Foi burrice deixá-la. Da próxima vez, é sua prioridade mante-la a salvo. - O que você está... - Você só correu um quinto da floresta – Ele fala, ignorando-me. Sua voz está ficando mais alta e cheia de raiva. – Eu não queria acreditar, mas acredito que esta seja a prova. Você não tem feito seu treinamento. Você tem mentido para mim sobre ele todo dia. - Rey... - Eu já sabia disso. – Ele parece triste agora. – Eu poderia dizer somente ao olhar para você. Minha mente começa a funcionar, tento entender porque ainda estamos aqui. Porque ele está preocupado com meu treinamento, quando poderia existir uma completa frota de Mogs no caminho para nós. A não ser que... - Não têm mogs aqui. – Digo, discretamente. Rey somente meche a cabeça e olha para o chão. Isto era um teste. Não, pior do que isso: Isso era Rey tentando me capturar na minha mentira. E até mesmo, sim, eu tecnicamente não tenho sido completamente honesto sobre meu regime de treinamento. Eu não acredito que Rey foi capaz de me assustar assim. - Você está brincando comigo? – Diferente de Rey, não tenho poder de manter minha raiva com minha voz fina. – Eu estava correndo pela minha vida. Achei que iria morrer. - A morte é a menor de suas preocupações por enquanto. – Ele diz apontando para meu tornozelo. Debaixo da camada de lama e merda está uma marca vermelha feia que apareceu há poucos dias. Uma marca que está começando a encrostar, e em breve se transformará em uma cicatriz. A marca que – graças a um estranho feitiço – me avisa que mais um de meus amigos Gardes foi morto. Dois está morta. Três e Quatro são tudo que ficam entre mim e a morte. Eu sou o número Cinco. 7


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Eu rapidamente me sinto burro por pensar que poderia ser morto. É claro que eu não estava. Números Três e Quatro tem que morrer antes para que eu possa morrer. Eu deveria estar com medo por ser capturado e torturado por informação. Não que Rey me conte alguma coisa. Então percebo sobre o que tudo isso se trata. Toda vez que uma cicatriz aparece, é como se Rey tomasse um tapa. Ele tem ficado cada vez mais doente nos últimos dias, e não estou nem longe do forte que ele queria que eu estivesse. Eu não desenvolvi nenhum dos poderes mágicos que eu deveria ter. Nenhum de nós pode fazer uma boa luta. Este é o porquê de estarmos nesta ilha estúpida, escondidos. Os olhos de Rey que fitavam o chão agora fitam os meus, observando-me por um longo momento. Então ele olha para a arca. - Leve-a de volta. – Ele diz. Então ele se arrasta para a escuridão, deixando-me ao fraco luar, olhando para a bolsa que contém minha arca. Não estávamos sob ataque. Foi apenas um teste. Não vou morrer na ilha. Pelo menos não hoje. Pego minha Arca, abraço-a a mim, deixando suas quinas próximas ao meu estômago. Paro diante da escuridão que Rey desapareceu e neste momento só existe um sentimento em mim. Nem medo ou remorso, ou até mesmo vergonha de ter sido descoberto. É o sentimento de que a única pessoa que eu tenho neste mundo me traiu.

Capítulo 2 O sol nasce enquanto eu me lavo no oceano e penso no Canadá, o primeiro lugar que eu lembro de viver aqui na terra. Eu realmente gostava do Canadá. No Canadá nós comíamos tortinhas de manteiga e batatas fritas cobertas de molho e bolinhas elásticas de queijo, tudo servido de carrinhos na beira das estradas. Mesmo quando era verão lá não era tão quente. Eu aprendi um pouco de Francês. Rey não gostava do frio, mas eu gostava. Ele era Albert no Canadá, um nome que ele tinha escolhido depois de ver Alberta em um mapa, pensando que isso iria fazê-lo soar mais como um local. " Velho Al" ele chamou a si mesmo algumas vezes falando com atendentes ou caixas. Eu sempre achei que era engraçado quando ele se fazia de idiota e fingia ser meu avô em horas como essa, usando palavras como "trombadinha" que ele pegou da TV. Ninguém questionou o velho gentil e seu neto.

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Eu era Cody então. Eu gostava de ser o Cody. Eu era uma pessoa, não só o cinco. A noite, Rey iria me contar sobre Lorien e os Mogadorianos e os outros gardes Meus parentes espirituais espalhados ao redor do mundo- e como um dia nós traríamos um retorno glorioso ao nosso planeta natal. Naquela época, tudo parecia um conto de fadas. Todos os Aliens e poderes e outros mundos não passavam de estórias para fazer eu cumprir minhas tarefas. Não se limpou? Lorien não tinha a menor chance. Esqueceu de escovar os dentes? Os Mogs vão te pegar com certeza. E então eles realmente vieram. Nós vínhamos vivendo perto de Montreal por seis meses -talvez o ano todoquando Rey descobriu que eles estavam vindo por nós. Eu ainda não sei como. Tudo que sei é que de repente eu estava correndo através do bosque atrás da nossa pequena cabana enquanto alguns Mogadorianos me rastrearam. Eu tinha seis anos de idade, com medo fora de juízo. Eventualmente eu tinha me escondido atrás de uma árvore. Pensei que eu era um caso perdido até que Rey apareceu, tirando os mogs com uma pá quebrada e uma espingarda que ele tinha comprado no mercado negro. Ele sempre foi bom com ferramentas. "Albert..." Eu disse da árvore. Nós sempre nos chamávamos por nossos nomes falsos, nunca sabendo quem estava ouvindo. "Eles já foram?" "Albert está morto" Rey tinha dito. Eu sabia o que ele queria dizer, mesmo sendo tão novo. Eu senti isso no meu intestino. Isso significava que nós não estávamos salvos. Isso significava que nós não poderíamos ficar lá, naquele lugar que eu gostava tanto. Então nós nos pusemos em movimento, e não paramos por um longo tempo. Rey foi Aaron depois daquilo, seguido por Andy, Jeffrey, e então James. Eu fui Zach, Carson, e então Bolt, qual fora meu último nome que eu escolhi antes de Rey começar a escolhê-los. Talvez eu esteja esquecendo alguns - tudo parece ter sido á tanto tempo. Eu sei que eu era Carson quando a tosse do Rey apareceu pela primeira vez, junto com os buracos escuros em baixo dos olhos. Nós estávamos acampando nos Appaachians. Ele pensou que era o frio que o estava fazendo ficar doente, então começamos nos mover para o sul, fazendo nosso caminho através dos Estados Unidos e em direção a um clima mais quente. Finalmente- Depois de alguns passeios de barco que o Rey arranjou para nós Montamos acampamento em Martinique, onde ficamos por um tempo. Mas a tosse do Rey só piorou. Ele continuou me dizendo que estava se sentindo melhor, mas em algum ponto eu parei de acreditar nele. Eu sempre fui o melhor mentiroso. Quando criança, eu pensei em mentiras como pequenas histórias ou jogos. Ás vezes pessoas que nos deparávamos iriam fazer perguntas- Onde estavam os meus pais? 9


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Onde eu nasci? - e eu só tinha que começar a falar, criando histórias elaboradas para o Rey e eu. Ter segredos significa que você mente muito. Não porque você é mal ou uma pessoa má ou algo parecido, mas por necessidade. Na realidade, Rey me treinou para mentir sobre as corridas matinais e caminhadas. Faço uma nota mental para dizer isto a ele mais tarde. Ás vezes eu me pergunto se o Rey é louco. Tipo, e se ele só for um cara velho confuso que me roubou de uma casa amorosa e normal e que tudo isso de aliens é simplesmente inventado? Talvez ele me deu drogas ou fez uma lavagem cerebral em mim com memórias falsas de um lugar que pode não existir. Toda minha vida ouvi sobre Lorien, mas a única prova que eu tenho de que algo sobre isso seja verdade é alguns caras de aparência estranha que vieram atrás de mim no Canadá. Bem, isso mais as duas cicatrizes que apareceram como mágica no meu tornozelo e uma arca que supostamente abriga todo tipo de tesouros. Uma arca que não se abre não importa o quanto você tente. -Eu sei, porque eu tentei cerca de um milhão de vezes para descobrir o que está dentro ao longo dos anos. O tesouro de Lorien. Claro. Muita coisa boa está fazendo aqui no meio do nada. Eu não me importo com a praia, sério. Quero dizer, eu entendo porque as pessoas vão lá nas férias. Quando chegamos no Caribe, nós ficamos nos maiores e mais populosos resorts, só vivendo nas margens. Nós assistimos os turistas chegarem todos os anos, suas roupas de praia novíssimas um desfile de brilhantes cores enquanto eles tomavam drinques em cocos gigantes e abacaxis que não eram nativos da ilha (não que eles soubessem). Mas quando Um morreu- quando a aquela primeira cicatriz se formou no meu tornozeloRey surtou. Eu tinha nove anos e foi como se o último fio o mantendo sobre o controle estalou, e ele entrou em modo de sobrevivência total. Sem mais pessoas. Nós tínhamos uma vida completamente fora da grade. E então ele creditou qualquer que sejam as posses que tínhamos, comprou alguns suprimentos e um pequeno veleiro, e saiu para encontrar o lugar mais deserto e esquecido por Deus que podia. Foram-se os restaurantes e ar-condicionado. Sem TV, vídeo games ou banhos quentes. Só uma praia e uma cabana. Não sei o tipo de acordo Rey teve que fazer para achar essa ilha, mas eu vou dar a ele uma coisa- ela deve ser muito bem escondida. Algumas vezes por ano pessoas atracam na ilha por engano, mas Rey sempre se livra deles rapidamente. E é aqui que estou agora. Me lavando no oceano. Uma nuvem escura forma em volta do meu corpo enquanto eu esfrego a merda de porco fora na água clara do litoral. Isso é o que o futuro guarda para o grande número cinco, umas das sete pessoas mais importantes deixadas no planeta. Isso não é justo.

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Eu me lembro de assistir velhos filmes de kung fu na TV a cabo antes de virmos para cá. Os personagens principais estavam sempre indo para os topos das montanhas para treinar com mestres antigos que lhes ensinavam a lançar estrelas ninjas e matar pessoas com pauzinhos e coisas do tipo. Quando o Um morreu e Rey nos mudou para a ilha, ele me disse que ele não era mais meu avô que ele fingia ser, mas meu professor. Eu seria seu discípulo. Eu fiquei animado com isso n momento. Eu achei que eu iria viver um daqueles filmes ou algo parecido. E no princípio, eu fiz o treinamento- Rey podia caminhar e se mover bem, naquele tempo, então nós praticávamos movimento de artes rudimentares. Mas logo ele estava dormindo a maior parte do dia acreditando que eu estava fazendo tudo que ele me dizia para fazer. A vida na ilha acabou por ser em nada como nos antigos filmes. Neles, só levava uma montagem de cinco minutos para o estudante virar o mestre. Na ilha, o treino era brutal, sem fim, e acima de tudo, monótono. Eu costumava sonhar em ser levado para longe. Que a Garde iria aparecer e um dia me dizer que eles estavam procurando por mim, e que eles me levariam para seu clube no espaço ou algo assim. Mas pelo que sei, os outros Gardes não se importam nenhum pouco comigo. "Cinco!" Rey chama da costa. Aqui, onde não há ninguém, não há nenhum ponto em fingir ser o que não somos. "O que?" Grito de volta, ainda bravo sobre essa manhã. "Venha aqui," ele diz. Eu olho para cima para ver ele acenando em direção à cabana. Em vez de ouvilo, eu caio de costas, me deixando flutuar na água quente enquanto o sol se arrasta mais alto no horizonte. "Cinco, vem-" Mas seu grito é interrompido por um acesso de tosse. Por alguma razão, isso só aumenta minha irritação. Eu sou um dos nove Gardes última esperança de Lorien - E é esse que eles me mandam para me proteger? Sem seus poderes e magias, ele era o melhor que podiam fazer para mantê-lo seguro? Um sistema mágico de numeração e um Cêpan doente para cuidar de mim. Muito obrigado. Um pensamento terrível sobe em minha mente, e mesmo eu tentando ignorá-lo, está lá, me provocando, fazendo eu me odiar não somente por tê-lo, mas por pensar que pode ser verdade: O Rey que deveria me proteger já tinha morrido há muito tempo. Antes de ficar doente. Quando nós ainda estávamos no Canadá, com o ar frio e a comida quente. Quando eu era só uma pequena criança.

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Eu odeio esse sentimento. - a amargura que ás vezes aparece quando estou triste com o Rey. Não é culpa dele estar doente. Eu sei disso. Mas ele é a única pessoa que eu tenho para ficar bravo. A tosse continua. Eu racho, e estou indo para a costa, dedos cavando na areia. Eu balanço meu cabelo castanho para tentar seca-lo. Faz um longo tempo desde que tive um corte de cabelo decente, e meu cabelo esta longo e emaranhado contra meu pescoço. Eu pego um coco que está caído de um coqueiro conforme eu passo por ele. Nós podemos quebra-lo e ter a carne doce com café da manhã. Se eu for mesmo ter café da manhã. Rey sem dúvida vai mastigar minha bunda e me provavelmente me enviar para a floresta para viver sozinho por uns dias para me ensinar uma lição sobre mentir. Ele está respirando normalmente de novo quando chego até ele. "Você não deveria estar aqui fora." Eu digo. " Você deveria star descansando." Ele me ignora e leva um machado para fora. Atrás dele, eu posso ouvir os porcos ficando loucos por alguma coisa. Eles parecem assustados. Esse é o dar-e-receber de nossa relação: Nenhum de nós faz as coisas que o outro diz que deve ser feito. "Para que isso?" Eu pergunto, hesitando em saber. Ele provavelmente vai me obrigar a cortar lenha ou alguma coisa para compensar essa manhã. Tenho certeza que ele também que ele iria gostar de um pedido de desculpas, mas eu vou esperar até que eu não esteja mais bravo com toda a coisa de "Diga para o Cinco que os aliens estão aqui para matar ele". "Para nos proteger," Diz Rey, empurrando o machado para mais perto de mim. "Eu te mimei por muito tempo, agora tenho medo que seja tarde demais. Meu rosto se enruga quando coloco o coco debaixo do braço e pego a ferramenta. Os porcos ainda estão enlouquecendo no chiqueiro. "O que está acontecendo?" Eu pergunto lentamente, De repente estou com medo que ele me mande matar um dos porcos. Tipo, Eu sou totalmente a favor de comê-los, eu só não quero ter que mata-los eu mesmo. Rey acena em direção ao chiqueiro. Os porcos estão correndo em volta, bufando com raiva. Se eles pudessem gritar, aposto que é isso que estariam fazendo. E então eu vejo o porquê. Eles estão nos dizendo que algo se infiltrou em sua casa. Que eles estão em perigo. Do outro lado do chiqueiro há uma extensão de escamas e músculos enrolada. Uma serpente. Um bote. Bastardos desagradáveis com o costume de fazer suas casas um pouco perto demais de humanos. Uma vez, em Martinique, eu vi um menino por volta de treze anos -da minha idade, agora- que estava sendo carregado em uma maca para o hospital. Ele estava sofrendo com uma picada. Bem, sofrendo pode não ser a palavra certa. Ele estava inconsciente, e a parte de baixo de sua perna esquerda 12


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do joelho ao pé era uma bagunça de verde e preto, como se ele tivesse sido mordido por um zumbi oi algo do tipo. Foi a única lição que eu precisei para prestar atenção em coisas rastejando quando andando pela floresta. Não é a primeira vez que eu vejo uma na ilha. Geralmente Rey cuida de qualquer uma que pensa em chegar perto de nós. "Mate," Diz Rey. Eu encaro a cobra enrolada. A última coisa que eu quero é me aproximar dela. Não que eu seja covarde. Eu só não quero terminar perdendo um membro. E outra coisa: Eu nunca matei nada antes. Nada maior do que uma aranha ou um dos mosquitos gigantes que nos afligem aqui. "Por quê? " "Você precisa," Rey diz. "Se você não matar, ela vi matar um dos porcos. Ou nós. De qualquer jeito, nós vamos ter mais problemas do que o necessário. "Eu... Eu não posso. Eu quero dizer..." Mas eu não tinha nenhum argumento para dizer. Meus dedos se desenrolam do machado que estou segurando e ele cai na areia da praia. O coco cai ao lado, e eu percebo que estou tremendo. "Você faz." Rey murmura alguma coisa sob sua respiração. "Você deveria me manter fora de perigo ", eu argumento, tentando melhorar a situação. "Quero dizer, isso é que é o seu trabalho, né? " "Meu trabalho é ajudá-lo a se preparar para o que está por vir ", diz Rey, arrebatando a ferramenta do chão com muita rapidez. "Se você não pode matar uma simples cobra, o que você vai fazer se os Mogs te descobrirem e você se encontrar contra o inimigo real, em? Um que pode pensar e compreendê-lo. Um que foi treinado para matá-lo? O que você vai fazer quando for só você e ninguém mais- " Seu discurso é interrompido por outro acesso de tosse, e Rey enterra o rosto na sua manga esfarrapada de sua camisa de linho azul. Quando ele finalmente para, ele cospe sangue no chão. Sangue. Ele fala suavemente, mas para si mesmo do que para mim. "Talvez eu devia ter gastado mais tempo te ensinando a lutar do que ao em vez de escondendo. Eu pensei que eu poderia escondê-lo afastado até que você fosse mais forte. Mas eu falhei em me certificar que você se desenvolveu como eu deveria. A outra Garde... Eles provavelmente já têm seu primeiro legado agora. Provavelmente mestres de todos os tipos de armas e combates." "Se esconda bem o bastante, e nunca terá que lutar" Eu digo, repetindo uma de suas preferidas lições. Eu estou tentando o fazer feliz agora, mas eu só continuo pensando sobre o fato que ele está tossindo sangue.

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Isso é ruim. Isso é o que sempre acontece nos filmes algumas cenas antes do personagem morrer. Eu ignoro e continuo falando. "Nós podemos começar a a fazer mais treinamento de luta de novo. Eu vou fazer, eu prometo. Eu vou ficar bom nisso." Rey não responde, só balança a cabeça um pouco e se afasta. Os porcos guincham mais alto. A serpente está em pé e pronta para atacar agora, advertindo os animais e os humanos ao seu redor, seu corpo balançando ligeiramente no ar como um S. "Eu estou com medo de ter falhado com você como Cêpan," Rey diz. Ele segura uma mão e agarra meu ombro, apertando uma vez. Ele sorri, mas é triste, longe de alguma expressão. Quando ele começou a parecer tão velho? Rey vira e joga o machado om um movimento de braço. Ele navega pelo ar, girando horizontalmente. A lâmina bate na cobra alguns centímetros abaixo de sua cabeça, e então entra na lateral de nosso pequeno barraco. Os porcos vão para o lado mais afastado do chiqueiro enquanto a serpente se contorce freneticamente no chão, seus nervos trabalhando a última de suas forças. Rey apenas continua andando, curvado, com um bambear nos pés. Eu não respondo ao comentário do Rey. Eu não acho que ele esperava que eu o fizesse. Em vez disso, eu penso no que ele disse antes sobre como a Garde provavelmente estaria mais desenvolvida do que eu. Muito mais preparada para o futuro. Eu me sinto como uma decepção. Mas então, parte disso é culpa dele, também, certo? Não sou só eu. A culpa não é minha. O último lugar que quero estar é na cabana com ele agora -ou em qualquer perto daquela cobra no nosso quintal- então eu pego o coco e um velho guarda-sol que está encostado no barraco e vou em direção à praia, para onde as árvores não dão chance para nada além de areia e água azul cristalina. Sento perto da borda da água e enterro a sombrinha gigante ali ao meu lado. Eu queimo facilmente, mesmo depois de alguns anos vivendo em trópicos. Eu não estou destinado a este tipo de ambiente. Eu deveria estar em outro lugar. Rey parece ter decidido que se nós estamos fora de vista e escondidos, nós nunca teremos que lutar. O que é uma boa coisa, desde que eu não ache que algum de nós tem alguma chance contra os Mogs. O que também significa que não podemos sair, Estou preso aqui, Com Rey. E os porcos. E uma floresta cheia de cobras mortas, aranhas e Deus sabe o que mais.

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Eu cavo pequenas valas na areia com meus calcanhares e afundo meus pés na terra macia, esfriando em baixo, e encaro as duas cicatrizes no meu tornozelo. Eu sei que o Rey está certo. Se os Mogs aparecessem eu estaria indefeso. Eu teria que contar com ele para lutar por mim. Eu sou um Garde que falhou, com um Cêpan frágil. Mais uma vez, eu não posso deixar de pensar que Lorien tenha brincado comigo em tudo isso. Certamente esta não era a forma que os Anciões imaginaram tudo. No bolso da minha bermuda, eu encontro uma pequena bola de borracha vermelha que eu tenho há muito tempo -o tipo que você encontra por vinte e cinco centavos em uma loja de brinquedos. Eu a deixo rolar sobre minha mão, através dos nós dos meus dedos, entre meus dedos, de novo e de novo. Um pequeno de astúcia no truque-dasmãos. Eu não deveria estar aqui. O pensamento flutua pela minha cabeça novamente. Eu encaro o pequeno veleiro que está amarrado em um pequeno poste na praia. Seria tão fácil apenas entrar dentro dele. Desamarrar, e flutuar até a próxima civilização. Martinique não é tão longe, se eu me lembro bem. Eles têm restaurantes, chuveiros quentes e festivais lá. Feiras de rua cheias de jogos e todo tipo de comida que você poderia querer. Não muito longe. Seria tão fácil. Eu encaro o coco enquanto eu me torno mais e mais frustrado com o estado da minha vida. Minha mão direita enrola-se em um punho ao meu lado, tremendo. Um choque de energia corre através de mim, algo que eu nunca senti antes. Os cabelos na parte de trás do meu pescoço ficam em pé. O coco explode. Por um segundo eu estou atordoado, então só olho para as minhas mãos. Eu acabei de fazer isso?

Capítulo 3 Há um nome para o poder que eu tenho: Telecinese. É o primeiro dos meus Legados – meus dons especiais. Eu sei disso porque Rey me contou a anos que esse dia iria chegar. Eu quase parei de acreditar nele, mas aqui está. Eu posso sentir a energia se guiando pelas minhas veias. Eu posso sentir o poder. É muito bom. Com apenas a explosão de uma parte de uma fruta, eu de repente tenho um novo modelo de vida. Eu vejo um futuro que não inclui essa ilha. Eu posso mover coisas com minha mente, eu posso derrubar um inimigo – um exército inteiro. As pessoas irão prestar atenção em mim. Talvez até me temerem. E Rey – ele nunca mais vai olhar para mim com um olhar de desapontamento novamente. Ele saberá que não falhou como Cêpan. 15


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Eu não conto a ele sobre o coco ou sobre a minha nova habilidade. Eu mantenho segredo, praticando no meu tempo livre. Eu vou ficar bom nisso, e então vou mostrar a ele como sou capaz de arrancar uma árvore do chão pelas raízes e jogando-a contra nossa cabana. Ou algo do tipo. Alguma coisa grande para mostrar a ele que não precisamos mais ficar na ilha. Que eu estou pronto para sair daqui e voltar para o mundo real, porque eu estarei capaz de lutar contra os Mogs se eles aparecerem. Estou cansado desse sol horrível e da umidade. Dessa ilha. Eu vou mostrar a ele. Ele vai nos levar a outro lugar. Eu começo com cocos. Eles são leves e fáceis de quebrar, e eu os racho ao meio com meu poder. Eu deixo os pequenos maduros flutuarem perto da minha boca e bebo a água doce que há dentro. Então eu os arremesso para o oceano, onde eles voam pelo ar misturando-se com o céu antes deles caírem na água salgada no horizonte. O único problema é que Rey está verificando se eu estou mesmo correndo a quilometragem que eu deveria estar. Ele começou a aparecer em lugares aleatórios da ilha, com cronometro na mão, tendo certeza de que estou me movimentando – ou pelo menos andando com mais velocidade. Felizmente, isso parece tirar muita energia dele, porque ele passa o resto do dia numa soneca profunda. O momento perfeito para eu aprimorar meu novo poder super fodástico. Eu mudo de cocos para pedras e troncos caídos. No fim da ilha do lado oposto da nossa cabana, eu transporto um pedaço de madeira grande contra a maré, com nada mais do que a força de vontade. Os objetos mais largos e pesados são um pouco mais difíceis de manusear no começo, mas eu estou aprimorando isso também. Construindo meus músculos telecinéticos. Não me sinto bem assim há meses. No dia em que eu decidi contar a Rey sobre meu Legado, nuvens grandes e negras começaram a se formar no oceano. Eu sei o que isso quer dizer: A temporada de chuva está se aproximando, e não vai haver mais nada além de chuva nos próximos meses. Eu paro na metade da minha corrida matutina e treino mais um pouco meu Legado. Eu pego um galho no chão, e arremesso os cocos no ar, tentando fazer uma versão gigante de baseball. Eu não sei quanto tempo passou até eu realmente acertar um coco. Não é o home run que eu estava esperando – o coco e o galho morto se quebram, o que faz com que a água e os fiapos do galho chovam em cima de mim – mas a destruição é incrivelmente satisfatória. É então que eu percebo que o sol está mais alto do que eu esperava, e eu me pergunto quando tempo eu fiquei aqui. Meu rosto está queimado – eu posso senti-lo arder enquanto volto para a cabana – e meu estômago está enjoado. Eu espero que Rey já tenha esquentado o almoço. Eu vejo primeiro seu cabelo grisalho. Está praticamente reluzindo a luz do sol. Ele está de bruços na areia, justamente na próxima curva da trilha. Meu coração para. Eu grito seu nome enquanto corro até ele, cada vez mais alto até minha garganta arder. Não, eu penso enquanto corro. E merda. Essas duas palavras se repetem na minha mente cada vez que chego mais perto, tentando descobrir porque ele está caído e se ele ainda se movimenta. Eu praticamente escorrego ao lado dele na areia, levantando uma pequena nuvem ao nosso redor. Eu o viro. Há areia em um dos lados do rosto dele. “Rey! Rey, acorde! Você pode me ouvir, Rey?” Seu peito está subindo e descendo, mas bem devagar. Eu paro de falar a tempo de ouvir sua respiração, que é úmida e superficial. Eu me pergunto há quanto tempo ele está aqui – para começar, porque ele está tão longe da cabana – mas é óbvio. Ele estava fora para ter certeza de que eu estava treinando. Ou tentando descobrir porque eu estava demorando. Procurando por mim. É minha culpa ele estar assim. 16


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Ele é muito pesado para eu pegá-lo com meu corpo, mas eu posso usar meu Legado. Eu corro ao seu lado enquanto o corpo flutua no ar, levitado pela minha telecinese. Ele ficaria tão orgulhoso de ver o que estou fazendo agora. Se ele ao menos acordasse. Eu passei as últimas semanas aprimorando meu Legado e pensando que eu poderia sobreviver a qualquer coisa agora que meu primeiro dom se manifestou, mas se Rey morrer eu não sei o que fazer. Toda vez que eu me imaginei abandonando ele e saindo dessa ilha por conta própria, eu sempre soube lá no fundo que eu nunca faria isso. Mesmo doente e frágil Rey é tudo o que eu tenho no mundo, nesse planeta que tecnicamente nem é meu lar. Quando chegamos à cabana, estou frenético. Dentro não há muita coisa. Nós dormimos em redes, mas a dele é mais elevada como uma cama normal. Eu o sento, e então tropeço ao redor, tentando descobrir o que posso fazer para ajudá-lo. Há a alguns barris de água. Eu encho um copo e levo até ele, mas é claro, ele não está acordado para beber. Eu jogo um pouco no rosto dele, mas eu estou com medo de que a água de todo o copo entre no seu nariz e desça até os pulmões. Ele não se move. Então eu sento em uma cadeira e espero. Olhando para ele. Desejando que ele abra os olhos e me dê uma bronca por ter demorado demais. Então iremos fazer o almoço e depois eu irei mostrá-lo que eu posso levitar troncos de árvores, e cocos da selva, apenas com o pensamento. E ele ficará feliz. Uma eternidade passou até ele dizer meu nome. É tão baixo, que se eu não tivesse sentado ao seu lado, com meus olhos colados nele provavelmente eu não teria ouvido. “Cinco”, Rey diz de novo, mas é interrompido por uma tosse. “Aguente firme”, eu digo e pego a lanterna, reencho o copo de água e levo até ele, mas ele nega. “Eu estava procurando você”, ele diz. Sua voz é tão fraca que ele parece pouco coerente, como se ele tivesse falando com alguém que está longe. “Eu sei”, eu respondo. “Quero que você preste atenção”, ele diz, e eu discordo com a mão. Ele precisa beber um pouco de água e descansar, e então eu ouvirei o que ele tem a dizer mais tarde. “Tenho todo tempo do mundo para te ouvir quando você melhorar. Não tenho nada mais a fazer aqui a não ser te ouvir” Seus olhos me observam, mas também olham por dentro de mim, como se ele quisesse focar meu rosto. “Os Gardes ainda estão escondidos”, ele diz calmamente, ignorando o que eu disse. “Se você for procurá-los, irá se expor para os Mogadorianos. Você estará seguro aqui. Sozinho. Até você ficar mais forte” “Rey, está tudo bem agora. Vai ficar tudo bem. Olha, há algo que eu tenho que te mostrar” Ele chacoalha a cabeça uma vez, e mesmo estando fraco, me faz parar e ouvir. Sua expressão é tão solene, o que eu posso fazer além de parar e ouvir? “Meu trabalho era protegê-lo” – ele continua. “Eu sei que eu não ensinei a você tudo o que eu deveria, mas... eu tentei. Eu tentei fazer o meu melhor, mas meu corpo não aceitou esse mundo” “Não”, eu suspiro. Eu finalmente estou no que parece ser o nosso fim. Há uma coisa tão antinatural ao acordar de manhã cedo e ver que Rey não está mais aqui, que ele se foi. Não fora de casa, na praia ou no bote, mas em lugar nenhum. Para sempre. Eu posso provavelmente contar nos dedos as manhãs que eu acordei sem ele estar

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em casa. Sua ausência é inconcebível. Não conta. De repente eu penso em todas as vezes que eu desejei ter outro Cêpan, ou sair da ilha e me odiar. Eu começo a chorar, lágrimas de sal caindo no chão. Rey começa a ofegar, e eu levanto minha cadeira caindo pra trás, sentindo-me tão impotente enquanto olho pra ele. “Apenas me diga, o que eu faço para te ajudar? O que eu faço? ” Ele começa a tossir de uma forma que parece que nunca vai acabar. Sangue espirra da sua boca. “O que eu faço? – eu repito - O que eu faço? ” Finalmente ele fala desta vez tão baixo que eu tenho que me ajoelhar perto dele para ouvir. “Mantenha-se vivo” – ele diz. Seus olhos parecem mais lúcidos agora e sua mão alcança meu antebraço. “Cinco, não siga os Lorienos nesta guerra até estar preparado. Confie nos seus instintos” – ele inala de novo, muito devagar. “Quando a hora chegar, confie em você mesmo. Você é o futuro. Faça o que for preciso para sobreviver” Sua respiração agita um pouco e então para. E então não há mais nada. Seu peito não sobe. Seus olhos não abrem. Tudo está quieto. “Rey?” – eu pergunto com calma, e então mais alto quando ele não responde, na esperança de que ele apenas não me ouvira. Nada. Ele se foi. Meu cérebro é inundado por pensamentos. Tudo o que eu consigo pensar são nas vezes em que eu o desobedeci, ou o xinguei – mesmo que fosse só por pensamento. Estou cheio de arrependimento. Estou sozinho. Eu corro pra fora. É a única coisa que eu posso fazer. Estou pouco me importando se a chuva está me encharcando, sinalizando o começo de temporada chuvosa. Meu corpo arrepia, mesmo com a água da chuva morna. A pequena ilha de repente parece enorme e cheia de perigos. Pensamentos aleatórios continuam a aparecer na minha mente: Você tem que fazer algo com o corpo dele. Ele nunca soube o quão forte seu poder telecinético está. Todas as coisas que ele fez nessa ilha agora são suas – enquanto eu caio de joelhos. Há trovões distantes e os porcos começam a gritar. Tudo isso é demais para mim. Sozinho, exceto por um monte de porcos. Demora um pouco até que eu retomo minha respiração e se sento. Meus olhos recaem sobre as cicatrizes no meu tornozelo. O símbolo da Número Dois. Eu quase sorrio. Havia nove de nós, e agora só restou sete e somos nós que supostamente devemos derrotar os Mogadorianos. Um exército inteiro de aliens. E então eles nos enviaram à Terra com protetores frágeis e nos espalhou através do globo. Esperando o que? Que pelo menos um de nós sobreviveria? A chuva cai forte sobre mim. Eu sinto como se minha cabeça fosse explodir – como se algo quisesse sair de dentro de mim. Eu grito de algum lugar dentro de mim. As duas palmeiras mais próximas de mim se soltam do chão com o poder do meu Legado.

Capítulo 4 Enterro Rey na floresta.

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Eu queria jogá-lo na água – colocá-lo num veleiro e empurrá-lo. Lembro-me de ver isso em um filme de Vikings uma vez, e Rey me ensinou os básicos sobre velejar. Mas fiquei com medo de que as correntes o trouxessem de volta à praia. Que eu acordasse de manhã e visse seu corpo molhado na costa, os olhos picados por aves marinhas e o corpo murcho e irregular. Eu não poderia ver aquilo. Enterrá-lo pareceu a única solução. Não podia deixá-lo de fora para virar comida de lagartos pequenos e verdes. Então encontro um lugar onde há um espaço de terra suficiente – depois de alguns arbustos serem retirados – e comecei a cavar com uma pá. Cavar seu túmulo é a coisa mais difícil que já fiz em um bom tempo. Em diferentes circunstâncias, eu brincaria que essa foi a última risada de Rey – conseguindo finalmente fazer eu trabalhar em alguma coisa. Mas sinto muita falta dele para fazer isso. A chuva não facilita. Pra cada porção de lama que eu tiro com a minha pá, o dobro reenche o buraco em rios marrons. Antes mesmo de eu perceber que estava fazendo isso, estou socando a terra com meu mais novo poder, revestindo meu casaco, meu corpo e meu rosto com barro. Uso minha telecinese para cavar o resto do buraco e retirar a lama que caía. E então, uma vez que seu corpo já está no fundo do buraco, solto toda a lama e deixo a terra e a água caírem sobre ele. Seu corpo é coberto quase que instantaneamente. Ele se foi. Eu sigo em frente, sozinho na minha ilha, através do tempo úmido. Rey me ensinou bem – como sobreviver fora da ilha – mesmo que eu não tenha percebido o que ele estava fazendo na época. Eu sei que plantas comer, e como manter a cabana seca por dentro enquanto a chuva continua a se despejar sobre mim dia após dia. Eu continuo a correr, e treinar – mais do que eu jamais fiz quando Rey estava vivo. Eu continuo pensando que alguém aparecerá. Se as mortes dos Gardes queimam em minha perna, será que acontece o mesmo com os Cêpans? Será que aparecerá a marca de Rey no guardião Lórico de Três? Ou de Quatro? Será que algum deles virá aqui e me encontrará e me dirá o que fazer a seguir? Mas ninguém aparece. Depois de semanas – talvez até meses – de espera para que algo acontecesse, eu descubro o que tenho que fazer. Rey me disse para ficar na ilha até que estivesse forte o bastante, mas ele não sabia de meu poder. Eu estou forte agora. Além do mais, ele também me disse para sobreviver, e se vou fazer isso, tenho que sair daqui. Se eu ficar, ficarei louco. Tecnicamente posso fazer o que eu quiser. Estou livre. Não tem ninguém cuidando de mim. Estou sozinho.

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Posso ir aonde eu quiser. Martinique. Foi a última ilha que visitamos. Eu não me importo de ir pra lá. E é perto. Ou pelo menos, parecia perto quando velejamos pra lá. No dia em que a chuva finalmente parou de desabar, eu agi. Eu esvaziei a mochila de Rey e a enchi com alguns suprimentos. Coloco-a no veleiro, junto a todos os cocos que consigo encontrar e vários canteiros de água. Uma vez que eu estou numa grande ilha... Bom, terei tempo de sobra no mar para descobrir o que fazer em seguida. Talvez eu tente rastrear a Garde. Talvez eu descubra um caminho de volta ao Canadá e para aquele lar que eu tanto gostava quando era criança. Jogo minha mochila no barco, junto de minha Arca Lórica. Pego o grande chapéu de palha de Rey para proteger meu rosto do sol. Não há um andar inferior no barco, então estarei exposto o tempo todo enquanto estiver no mar. A última coisa que faço é quebrar a cerca dos porcos. Faço isso com uma pequena ajuda de minha telecinese. Eles ficarão bem, eu digo a mim mesmo enquanto eles atravessam os pedaços da cerca relutantes até a praia. Eles vão se deliciar com todos aqueles lagartos que vivem correndo pela ilha. Faço algumas tentativas até conseguir colocar as duas velas em cima do pequeno barco. E demoro ainda mais para conseguir ler o mapa que encontrei dentro dele. Não há uma marcação de nossa ilha no mapa, mas estou certo de que Rey sempre disse que estávamos apenas a leste de Martinique. Há uma bússola e um telescópio na gaveta também – todas as coisas que um marinheiro amador poderia precisar. Quero sair imediatamente, mas tenho que esperar pela maré cheia, o que significa que tenho que sentar e repensar a minha decisão até lá. Finalmente, o oceano alcança o barco e uso meu poder para empurrá-lo para a água. Então trabalho ajustando as velas na direção que preciso que elas estejam. Desde o tempo que peguei o curso está quase escuro. A lua e as estrelas estão encobertas pelas nuvens. Eu mal consigo enxergar nossa ilha quando me viro para trás para uma última vista. Eu navego, mesmo sabendo que não tem ninguém para me ver. - Adeus Rey. Eu e o barco velejamos pela noite escura. Acordo confuso, incerto de onde estou primeiramente. Eu pretendia ficar acordado durante toda a noite – ao meu ver, eu não deveria ter demorado esse tanto para chegar a Martinique – mas depois de trabalhar com as velas e usar tanto meu poder, eu devo ter desmaiado no fundo de madeira do barco.

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O sol da manhã brilha sobre mim. Em breve estará queimando minha pele. O barco balança. Caio de joelhos esperando ver terra... Mas não há nada. Somente um vasto oceano. Tão azul quanto os olhos podem ver. Tento permanecer calmo, mas o pânico está fazendo meu coração bater contra minhas costelas. Em tempo algum o mapa esteve fora da minha frente, junto ao deck. Estou velejando a leste, na direção do sol nascente, o que significa que ainda estou indo na direção certa. Só não acertei Martinique ainda. Não estou me movendo na velocidade a qual achei que estava. Ou eu passei a ilha durante a noite. Eu percebo que é possível que eu estivesse errado e que nossa pequena ilha não era onde eu achava que era. Eu poderia estar em qualquer lugar. Poderia não existir nada entre mim e a minha frente até a África. África. Entro em pânico. Não tem como eu estar indo em direção a África. Não acredito que Rey não tinha nenhum tipo de GPS. Ou talvez até tivesse um que eu não sabia que existia. Um que estivesse em casa. Na cabana da praia. Um lugar agora que parece muito mais atrativo do que era ontem à noite. Eu fico olhando para o mapa por um longo tempo enquanto eu devoro um pouco da carne que eu trouxe comigo. No final, eu tiro a bússola e ponho-me navegando ao nortenoroeste. Pelo menos dessa forma eu serei obrigado a acertar algumas ilhas. Certo? Depois de procurar em vão por um vislumbre de terra com o telescópio, eu me inclino para trás contra o convés e pego a bola de borracha vermelha do bolso da minha bermuda. Passando-a sobre as costas dos nós dos meus dedos, acho um baralho na minha bolsa. “Tudo vai ficar bem”, digo para mim mesmo enquanto embaralho as cartas e começo a colocá-las fora da pilha. “Só precisa se manter ocupado, ou ficará maluco antes de alcançar alguma terra. ” O que é toda essa coisa inútil? Era o meu quarto dia no barco antes de eu descobrir que podia abrir minha arca. Rey sempre disse que era algo que tínhamos que abrir juntos. E não me veio à mente de que eu teria de fazer isso sozinho, agora que ele se foi. Um monte de pedras brilhantes, itens inúteis para o futuro brilham à luz do sol. Eu tinha esperança de que haveria um sistema de filtragem de água magicamente esperando por mim, mas parece que estou sem sorte. O que é preocupante, porque eu já comi todos os cocos, e o resto dos meus suprimentos estão começando a ficar perigosamente escassas. 21


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Parece que a Arca é apenas preenchida com bugigangas de uma loja de dólar. Meus dedos passam sobre um pequeno instrumento parecido com uma flauta preta. Eu vasculho mais algumas coisas e tiro uma longa luva. Eu deslizo-a, puxando-a todo o caminho da minha mão até meu antebraço. Quando eu flexiono o pulso, uma lâmina dispara. Ela passa a um centímetro de me acertar no olho, toda a lâmina de prata quase um metro de comprimento. Estou muito cansado para retroceder. “Ótimo. Se eu não morrer de desidratação, pelo menos terei isso. ” Tremo só de pensar nisso. Tudo isso é inútil. Ou, pelo menos, nenhuma das coisas veio com um manual de instruções. Eu coloco tudo de volta para dentro, exceto a luva-faca. Eu posso praticar com isso. Só no caso. O Arca volta para minha mochila, e eu tomo o resto da água do recipiente. Então eu uso a minha telecinese para empurrar o barco mais longe, mais rápido pela água, na esperança de que estou indo na direção certa. Aposto que os outros Gardes têm coisa melhor em suas Arcas. Ou, os Cêpans deles estão lá para explicar-lhes o que eles devem fazer com elas. Já imaginei muitas vezes como são os outros Gardes, ou que estão fazendo, ou se os Cêpans deles os mantêm escondidos do mundo nos cantos mais remotos do planeta. Mas, pela primeira vez, pergunto-me se sou o único que ainda está faltando. Seria possível os outros Gardes estarem todos juntos em algum lugar, lutando, ou treinando uns com os outros, perguntando-se onde eu estou? Será que eles se importariam? Rey me manteve escondido porque ele temia que viessem até mim lutando? Para ter certeza de me manter vivo? Tudo que tenho são perguntas, e a única resposta que recebo é o sol queimando acima de mim. Minha língua parece inchada e áspera na minha boca. Eu não faço xixi a um bom tempo, o que eu acho que é provavelmente um sinal muito ruim. Nem sequer estou a suar mais. É noite, mas ainda deveria estar suando. Tanta coisa que posso fazer nesse mundo, sozinho. É a sétima noite que passo no mar. É a noite que devo morrer. Tão longe, Cinco. Só uma semana para ficar completamente fodido por desobedecer os últimos desejos de Rey. Será que é possível que eu morra? Rey me falou que o feitiço me deixaria a salvo da morte enquanto o Garde antes de mim ainda estivesse vivo – então ser capturado seria o que eu realmente deveria temer -, mas isso funciona com a fome e a desidratação e 22


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exposição aos efeitos do clima? Porque eu não quero ser uma espécie de morto-vivo, como uma múmia que se secou nas margens de Cuba um mês daqui pra frente. Meus lábios estão rachados e descascando, mas minha língua não está salivando para que eu possa molhá-los. Eu mal posso me mover – sinto-me tão cansado – mas aproximo minha mochila de mim, pegando-a, passando meus braços por suas alças. Posso sentir a Arca Lórica dentro dela. Todo meu corpo dói e eu mal consigo manter meus olhos abertos. Há uma estranha cócega no meu peito, e eu me pergunto se é algum tipo de morte - se é isso que Rey sentiu antes de morrer. Ela aumenta, até que todo o meu corpo se sente vivo, queimando. “Então é isso que é morrer. É de mais para o feitiço lórico.” Fecho meus olhos e abraço minha mochila. Eu penso se meu símbolo acabará queimando nos calcanhares dos outros Gardes, mesmo morrendo fora de ordem. “Estou morrendo fora de ordem”. Recuso-me a ter este como meu último pensamento. Abro meus olhos e respiro fundo então o ar passa pela minha garganta. Não estou no barco. O barco continua lá, mas está a muitos pés de mim. Estou flutuando através das poucas nuvens do céu noturno, segurando ainda minha mochila. Penso por um momento se todos os gardes pairam no espaço quando eles morrem. Talvez isso seja parte do plano estúpido que me fez viver meio do nada. Com meu Cêpan doente. Os meus lábios ressecados enrolam para baixo gesticulando enquanto digo minhas últimas palavras. - Foda-se Lorien. Então com um tiro eu voo com o vento batendo contra minha face. Estou voando.

Capítulo 5 Eu não sei como eu estou fazendo – ou onde estou encontrando energia pra isso, mas eu estou planando pelo ar. O sentimento é diferente da telecinese, como se estivesse vindo de outro lugar dentro de mim. Eu sinto como se eu estivesse em algum tipo de transe quando eu me atiro dentre as nuvens, focado apenas em achar algum lugar para pousar que não seja água. Não demora muito até eu ver terra. Eu me imagino lá, e como um passe de mágica estou descendo, e pouso com um solavanco na praia, formando uma pequena vala na areia. Estou muito exausto para reagir corretamente ao fato de que eu estava voando pelo ar. Apenas me pergunto onde estou e espero não ter sido visto por ninguém. Não tive essa sorte. Uma corredora já está ao meu lado antes que eu possa sair da vala que foi feita pelo meu corpo. “Santo Deus, o que acont-” 23


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Eu devo parecer terrível, porque quando ela olha melhor para mim, ela para no meio da sentença. “Água”, eu resmungo, minha garganta parece estar cheia de areia. Ela tira uma garrafa do seu cinto de treino e me entrega. Eu aperto a garrafa com o liquido na minha boca, mal parando para saboreá-lo. Meus olhos estão secos e ardendo, mas a água continua vindo, então eu continuo engolindo. “Calma, calma” – a mulher diz – “há muito mais” Eu olho a volta com cuidado. Estou numa praia, mas não a reconheço. Já é o pôr do sol, ou um pouco antes – há muita pouca luz aqui fora. Minha mente gira. “Onde estou? ” – aqui não se parece com nenhum lugar que eu me lembre de Martinique. “Parque Lummus”, a mulher responde, ela olha menos preocupada comigo agora e mais confusa. Os olhos dela continuam olhando para o mar na direção em que vim. “Não, qual ilha é essa? ” Seu rosto enruga. “Aqui é a Praia do Sul, Miami” Miami? “Onde você mora? ” – ela pergunta. “Houve um acidente? Precisamos pedir ajuda? Como você – quer dizer, pareceu que estava voando”. Sou rápido para dizer que não. “Não houve acidente”, eu digo entre soluços. “Não preciso de ajuda. Não ligue para ninguém”. Algumas pessoas se juntaram a nosso redor, e começam a perguntar se está tudo bem. Depois de tomar o resto da água, eu tento me levantar, mas minhas pernas estão bambas. “Não, não e não”, a mulher diz. “Fique ai, você precisa de mais água” Ela olha pra cima para o punhado de gente que está nos cercando e alguém oferece a ela uma garrafa com um líquido verde brilhante. “Perfeito”, ela diz, me entregando. “Beba isso, pois será bom para você e irá te ajudar com seus eletrólitos” Eu hesito por um momento antes de começar a beber o doce liquido. Meu coração começa a bater, como se tivesse parado por alguns minutos. Uma coisa vem a minha mente e eu olho ao redor. Eu ainda estou vestindo a luva com a bainha de lâmina, mas eu não vejo mais nada na praia. “Minha mochila...” eu digo, começando a ficar frenético. A Arca pode não ter nada que eu ache que poderia ajudar, mas Rey falou sobre ela como se fosse a última esperança de Lorien – mais do que eu e o resto da Garde. Não posso perde-la de maneira alguma. É a única coisa que eu tenho. A alguns metros de distância, eu vejo um cara pegando minha mochila. Ele joga para trás a aba e começa a puxar a Arca Lórica. “Hey! ” – eu grito no tom mais baixo que posso. Antes de pensar no que eu estou fazendo, eu aponto minha mão e sinto uma faísca de energia telecinética. A mochila e Arca voa das mãos do rapaz e vêm até as minhas. Ele está petrificado, mas para os outros parece que ele a jogou para mim. Eu a coloco nas costas. Alguém tira uma foto minha com o celular. “Hey!” – a mulher ao meu lado se levanta, parecendo irritada. “O que você está tentando fazer, cara? Essa criança obviamente passou por alguma coisa e você quer tirar fotos dele?” “Eu pensei que precisaríamos de fotos para contar a história”, o fotografo diz. “Se for algo “grande”, precisamos documentar” 24


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Eles começam a argumentar. Eu levanto e começo a correr. “Hey!”, alguém está gritando atrás de mim – a mulher, provavelmente – mas eu não olho para trás. Eu apenas abaixo minha cabeça e fui pelo o caminho mais curto para os arbustos e árvores mais próximas. Qualquer coisa que me cubra. Minhas pernas parecem gelatina e minha cabeça lateja, mas eu continuo até eu não ouvir a voz de mais ninguém gritando atrás de mim. Faz tanto tempo desde que eu estive numa civilização real que eu quase esqueci como funciona. Ao pegar minha mochila, eu faço tudo errado. Eu quase derrubo algumas pessoas quando eu passo com olhando por cima do ombro. Eu consigo ouvir trechos de xingamentos ao que passo. “Olha por onde anda, seu...” “...punk condenado! Eu deveria...” “... que diabos pensa que está fazendo?...” Mas eu ignoro todas elas. Correndo, de repente desesperadamente para sair de perto das pessoas e do resto do mundo. Eu chego a outro parque, gramados e árvores exuberantes, com alguns grandes arbustos. É pra onde eu vou. O sol está nascendo, e as pessoas já estão começando a lotar a praia a quilômetros de distância, mas eu me aninho nos arbustos até eu estar fora de visão, o quanto eu puder. Meu corpo dói. Meus lábios rachados ardem. Mas pelo menos eu tenho um pouco de água. A voz de Rey canta na minha cabeça, como se fosse um fantasma me provocando. Eu sei exatamente o que ele diria. Isso é o que você queria, não é? Você saiu da sua ilhazinha. Você teve o que pediu. Seja bem vindo novamente ao mundo real. Eu solto um gemido. É tudo o que posso fazer com a força que tenho. Então eu fecho meus olhos e me deslizo para a escuridão. Quando eu acordo, o sol está começando a se pôr. Eu dormi o dia todo, mas estou melhor por isso. Eu ainda estou fraco ao que fico de pé, mas eu não sinto que vou cair imediatamente. O que eu realmente sinto é fome. Tanta fome que meu estômago fica com cólicas só de pensar em comida. Tenho que encontrar algo para comer. Eu vejo tudo o que eu tenho no meu estoque – uma camisa branca suja, bermudas, uma sandália que está quase se desmontando, e uma mochila que guarda uma Arca alienígena. Não é muita coisa, mas eu também tenho poderes telecinéticos. E o voo. Eu me pergunto brevemente se o voo tem algo a ver com a telecinese ou se é algo diferente, a parte. Estou ansioso para tentar novamente, mas meu estômago está embrulhado e eu sei que eu não vou conseguir fazer nada a menos que eu consiga alguma comida pra mim. Eu acho uma fonte de água no parque e bebo até eu sentir que vou explodir, mas isso não ajuda muito com a fome. A uma distância próxima, há prédios e luzes, e eu sigo nessa direção. Se há luz, provavelmente há pessoas. E se há pessoas, provavelmente há comida. Não demora muito até um aroma doce invadir meu nariz. Me lembra a comida que eu comia no Carnaval do Caribe, antes de irmos para a ilha. Eu sigo por dentre algumas ruas, ao que os prédios se tornam cada vez maiores, e as luzes mais brilhantes, e eu fico nas sombras o máximo que eu posso. Pessoas passam por mim, mas eles nem me notam. De fato, parece que eles estão tentando me evitar propositalmente – provavelmente porque eu pareço um sem teto, e a 25


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última coisa que eles querem é ter a noite arruinada por falar com uma criança desamparada. Perfeito. E então eu encontro: uma rua de feira ou carnaval, não sei como chamam em Miami. A rua está bloqueada e cheia de pessoas, mas o mais importante está equipado com trailers de comidas, e algumas bancas que parecem estar vendendo crepes, burritos e tacos. Parece que todo o sangue do meu corpo subiu para minha cabeça. Pessoas. Em todos os lugares. Depois de tanto tempo naquela ilha isolada, é intimidador ver a multidão. Se acalme, eu digo a mim mesmo. Faça uma coisa por vez. Eu me sento num degrau de uma escada que leva a outro pequeno parque – e começo a rever minhas opções. Eu poderia usar meus poderes para levitar um taco até mim, mas as barracas são pequenas e a comida é vigiada. Além disso, Rey sempre cozinhou para nós, então eu não tenho ideia do que seja a metade das coisas que eu vejo. Eu percebo o quão despreparado eu estou para estar de volta ao mundo real. Eu deveria ter planejado algo melhor. Eu pensei que chegaria a Martinique com um bote – alguma coisa para negociar. Eu não tenho dinheiro algum. Nem um centavo. Apenas minha Arca. E os meus Legados. Meu estômago se embrulha novamente de fome e eu percebo o que eu terei de fazer: roubar. Usar minha telecinese para pegar dinheiro de alguém. Em algum lugar atrás da minha cabeça um alerta dispara – isso é um abuso do seu Legado! – mas eu ignoro. Estou faminto. Eu me preocuparei em repagar a pessoa mais tarde. Meus olhos escaneiam a multidão. Há um grupo de pessoas paradas aqui perto. Eles estão bem vestidos com ternos, vestidos e sapatos polidos. Eles definitivamente parecem que poderiam ter o luxo de perder alguns dólares. Me custa várias tentativas – nas primeiras tentativas eu puxo a carteira de alguém, e eles colocam a mão no bolso para ter certeza de que ainda está lá – mas eventualmente, uma carteira de couro desliza para fora, e eu rapidamente a jogo entre os arbustos. Eu não me mexo ainda, e conto até cem de trás pra frente para ter certeza que o cara não percebeu que sua carteira sumiu. Numa sugestão, meu estômago faz um barulho horrível no momento em que digo “um”. Eu ando casualmente até os arbustos e recolho a carteira do homem. Ela tem dinheiro, e eu sorrio, depois coloco as notas no meu bolso, e então sigo para as tendas de comida. Eu paro na primeira que vejo. É algum tipo de comida cubana, e eu acabo com um sanduíche gorduroso de carne de porco e queijo que escorre por toda minha mão quando eu mordo. É a melhor coisa que eu já provei. Quando acaba, eu mudo pros tacos, e então sorvete. Meu estômago se enche rápido, mas eu continuo comendo. Estou na metade do meu sorvete quando eu percebo que há alguém me observando. Um policial. Eu ando casualmente, e ele nada casualmente me segue de longe. Eu olho de ombros o suficiente para ver que ele digitou algo no seu celular, seus olhos sempre em mim. É possível que ele pense que eu sou um problema pelo jeito que estou vestido, mas é igualmente possível que depois que eu saí correndo da praia de manhã, quem quer que tenha tirado a foto minha reportou para a polícia. Eu não posso ter essa chance. Eu pego um atalho para a rua ao lado. Assim que viro a esquina, eu começo a correr. A última coisa que eu preciso é de um policial me fazendo perguntas, ou me reportar, ou pior, me levar de custódia. E então eu teria que fazer uma cena e usar meus poderes e provavelmente alertar metade do exército Mogadorianos sobre minha presença. Não, eu apenas tenho que dar o fora. Eu imediatamente me arrependo de ter comido tanto. 26


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Dentro do meu estômago parece que há uma pilha de tijolos, e eu sinto que vou vomitar depois de apenas algumas quadras correndo. Pelo ombro, eu vejo que o oficial ainda está atrás de mim. Quando eu me abaixo em um beco, eu ouço seus passos se virarem para algum lugar atrás de mim. Vai, vai, vai. Eu grito a mim mesmo dentro da minha cabeça. E eu estou correndo o mais rápido que posso pelos becos através de uma rua lateral de um enorme edifício e passando por algumas cercas, e então... O beco é sem saída e estou ferrado. Ou pelo menos, eu vou ficar ferrado se eu não descobrir como usar essa coisa de voar. Não é como se eu soubesse como fazer acontecer. Eu olho para o telhado dez andares acima de mim. Eu tenho que subir até lá. Então eu firmo todos os meus músculos e me impulso para cima, e de repente, eu não estou apenas flutuando, mas estou sendo atirado pelo ar. Eu passo do telhado do prédio enquanto meu coração bate, e por um momento eu posso ver o oceano sem fim. Então eu tento me acalmar e gentilmente flutuar para baixo em direção ao telhado. Eu pouso com um pequeno baque, mas não é tão ruim para minha segunda tentativa de tentar sair do ar. Certamente melhor do que se chocar contra a praia. Eu sou basicamente um super-herói alienígena. Eu espreito da beirada do edifício. O policial está olhando do beco, confuso. Duas pessoas logo se juntam a ele, porém apenas um está com uniforme. O outro apenas veste um terno, pelo que vejo. Eles estão muito longe para fazer alguma coisa. Depois de procurar por alguns minutos, eles desaparecem. Eu me abaixo e me inclino contra os tijolos da altura da minha cintura no telhado. Eu posso dormir aqui hoje. A temperatura está legal, e eu duvido que alguém irá me incomodar. Eu tiro o dinheiro restante do meu bolso e conto. Não é muito, mas dá para sobreviver pelos próximos dias enquanto eu descubro o que fazer. E então estou estranhamente aliviado por encontrar a velha bola de borracha vermelha no meu bolso também. Eu olho as estrelas enquanto eu rolo ela pelos meus dedos. É meio estranho elas serem as mesmas estrelas que eu via da ilha. Quando eu olho para o céu, é como se eu nunca tivesse saído. Pela milésima vez na minha vida, eu me pergunto se alguma das estrelas que vejo são os sóis de Lorien. Quando estávamos correndo, se mudando do Canadá após aquele Mog ter nos encontrado fora de Montreal, sempre dormimos em turnos. Era como chamávamos, pelo menos. Normalmente, Rey ficava a noite inteira me vigiando. Meu turno era apenas algumas horas pela manhã, enquanto Rey tomava banho ou buscava algo para gente comer. Mesmo na nossa cabana, eu acho que algumas vezes ele ficava metade da noite acordado perto da porta se ele sentisse que algo poderia acontecer. Eu sempre ria como se fosse paranoia, mas agora, sozinho no telhado de um prédio de uma cidade que eu nunca estive, eu desejo nada mais do que alguém para cuidar de mim.

Capítulo 6 Eu faço de uma casa pra mim South Beach. Eu não tenho um teto sobre mim ou coisa do tipo, mas eu tenho o suficiente na pequena área que eu começo a sentir que eu conheço. Clubes, restaurantes, e hotéis bordam a praia, e da calçada eu posso ver dentro deles, posso ver outros mundos que parecem tão diferentes do que eu cresci que eles são totalmente alienígenas para mim. Há luzes e bandas e pessoas que saem dançando para a rua. Em Martinique eu vi carnavais e festivais que tinham dançarinos, mas nunca vi coisa igual a isso – Rey sempre teve certeza

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que eu estava dentro de casa depois do anoitecer. Mas agora, sozinho, estou livre para perambular. Eu penso em ir para o Canadá, mas ainda estou fraco da última viagem. Além disso, eu preciso praticar a droga do Legado de voar antes mesmo de eu pensar em voar por aí, que parece ser a coisa mais fácil para evitar qualquer pista da patrulha marítima ou da polícia. No começo foi difícil pra eu voar – sem adrenalina ou estar perto de morrer, eu não consigo encontrar de onde o poder vem. Mas depois de uma ou duas semanas eu estou melhor. Primeiramente eu levito do chão alguns centímetros, e então vou subindo no ar o máximo que posso antes de eu enlouquecer e começar a cair de volta para o chão. Algumas vezes, quando está muito escuro, eu voo sobre o oceano, baixo o suficiente para que ninguém possa me ver, voando dentre as boias. Estou ficando bom nisso. Os telhados servem de cama para mim de noite. Eles são mais seguros do que dormir na praia ou em becos. Durante o dia, eu realmente fico bom em pegar carteiras com minha telecinese, e eu paro de me sentir mal sobre isso depois de uma segunda ou terceira vez. Estou sobrevivendo. Se eu for ir mesmo para o Canadá – ou qualquer outro lugar – eu vou precisar de muito dinheiro e suplementos. E há incontáveis alvos andando, entrando e saindo de lojas caras e luxuosas pela ilha toda. Eu compro um novo conjunto de roupas – jeans para esconder as cicatrizes de Um e Dois no meu tornozelo – e tenho mais algumas camisas novas dentro da mochila. Com minha camiseta nova e um monte de dinheiro no bolso, eu sou apenas mais um garoto em Miami cujos pais deram a ele uma mesada generosa. Eu tomo muito cuidado com os meus poderes. Eles poderiam facilmente me entregar. Eles e minha estranha e pesada Arca, qual eu carrego comigo a qualquer lugar que eu vou. Eu penso nos outros Garde um pouco. Sobre como talvez rastreá-los e tentar encontra-los. Mas como eu poderia tentar fazer isso? Postar “procurado” em blogs ou coisa assim? Por tudo que eu sei eles podem estar em cabanas na África ou Indonésia ou Antártica. E se não estiverem – se estiverem juntos... bem, nenhum deles nunca vieram me encontrar. Então eu penso neles cada vez menos. Toda vez que eu descubro algo novo na cidade, parte de mim xinga o Rey. Poderíamos estar fazendo isso há muito tempo ao invés de ficarmos presos no meio do nada. Eu passo meus dias explorando e jogando ou lendo livros na praia – fazendo todas essas coisas que eu não tive a chance de fazer na nossa ilha onde não havia livrarias nem loja de eletrônicos. Eu sinto que eu poderia ficar jogando vídeo game ou assistindo filmes provavelmente para sempre. Eu devoraria todas as histórias. Eu queria poder criá-las sozinho. Eu estou recuperando o tempo perdido. Eu sei o que o Rey diria. Ele me chamaria de preguiçoso. Ele falaria sobre formigas e gafanhotos. Mas eu me recuso a me sentir mal sobre viver minha vida uma vez ao invés de me esconder como um covarde. É quase tudo tão fácil aqui. Eu me sinto confortável. Talvez até despreocupado. E é assim que ela me encontra. Normalmente todas as carteiras que eu roubo vão direto para minha mochila, e eu as confiro mais tarde quando está escuro e eu não estou em um lugar lotado. Mas eu estou com fome e com pouco dinheiro e acabo encostando-me a uma palmeira num lugar legal, e quieto da praia. Estou vasculhando meu redor quando ela fala comigo. “Você está pedindo para ser preso, certo?”

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Eu hesito e me viro, puxando minha mochila para mais perto de mim enquanto eu olho bem para a pessoa da qual essa voz alta, e rouca veio. Ela parece que é um pouco mais velha que eu, com a pele muito bronzeada, e cabelos pretos brilhantes que estão presos para trás num rabo de cavalo. Ela está usando uma maquiagem preta no olho e um top cinza com shorts jeans. Gaguejo o começo de algumas palavras e tropeço nos meus pés. Ela sorri um pouco. “Não se preocupe”, ela diz, dando de ombros. “Tenho motivos suficientes para evitar os policiais”. Ela me encara com seus olhos castanhos, esperando que eu diga alguma coisa, mas eu não sei o que fazer. Eu tenho evitado pessoas o tempo todo desde que cheguei aqui – velhos hábitos – e ninguém nunca saíram da sua rotina para falar comigo. Mas essa garota parece... legal. “Okay, então você não fala muito?” – ela pergunta. “Como é seu nome?” Eu abro minha boca, e então paro. É uma pergunta simples, mas é claro que eu não tenho repostas. Pelo menos não tenho uma que posso dar a ela com verdade. Então eu penso em uma pessoa que eu gostei de ser. “Cody” – eu finalmente digo. O nome que usei no Canadá. “Cody”, ela repete. “É bom te conhecer finalmente. Eu sou Emma”. Merda. O que ela quer dizer com “finalmente”? Eu olho para ela, analisando-a, procurando por sinais que ela talvez possa ser uma Mog – preparado para lutar ou voar no momento em que eu perceber isso. “Ah, por favor, eu tenho visto você andando por aí. É impossível não notar. Estou surpresa que os policias não tenham te pegado ainda. Você parece totalmente suspeito quando está na espreita. É louco como você chega tão perto das pessoas para roubá-las”. Oh. Bem, a boa notícia é que, aparentemente, ela não percebeu que eu sou capaz de roubar carteiras por causa do meu Legado. A má notícia é que, aparentemente eu não sou tão discreto como pensei que era. “Sem ofensa,” ela diz, estreitando os olhos para mim. “Você não fala muito, né?” “Eu acho que não”, eu digo. Eu realmente não havia pensado nisso antes. “Eu costumava falar muito quando eu era criança e então só sobrou eu e o...” eu não sei como acabar a frase – percebi que já disse mais do que deveria. Com sorte, Emma apenas assente. “Está trabalhando para alguém?” – ela pergunta. “Não, estou sozinho”, eu digo. Então estou confuso sobre o que ela está perguntando. “Espera, o que quer dizer?” Estúpido. Eu não sei por que, mas estou perdendo o controle. Eu não disse nada de importante para ela – não disse nada sobre meu passado – mas não há motivo pra eu dizer qualquer coisa para ela. Ela apenas sorri e aponta para minha mochila. “Me compre uma arepa e talvez eu te conte” Se Rey estivesse aqui, estaríamos fugindo. Indo embora. Eu não teria nem tido a chance de conversar com Emma. Mas assim que eu imagino a voz de Rey gritando para mim para pedir licença e me perder na multidão e depois me mudar para a ilha inabitada e isolada mais próxima, ele na verdade não está aqui. Além disso, eu não tenho falado com pessoas há muito tempo. Não realmente. Talvez eu aprenda algo útil. E se alguma coisa der errada e ela me levar para uma armadilha ou coisa assim, eu tenho poderes telecinéticos e a habilidade de voar. Eu sou praticamente intocável. “Tudo bem”, eu digo, forçando um sorriso. “O que é uma arepa?”

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Ela me leva para uma pequena barraca de comida na praia e eu peço duas arepas. Quando o dono me diz que custarão seis dólares, Emma diz alguma coisa em espanhol e o dono franze as sobrancelhas. “Três dólares”, ele diz, me dando dois pratos de dourados que brilham a luz do sol. Eu pago e nós saímos dali. A praia está de um lado, e um rol de hotéis no outro. “O que foi aquilo?” – eu pergunto. Eu mordo minha arepa, que se torna uma das coisas mais gostosas que eu já comi – bolo de milho recheado com queijo derretido – estou no céu. “Apenas impedindo aquele cara de te explorar”, Emma diz. “Ele pensou que você fosse um turista”. “O que disse a ele?” “Apenas que eu sabia que ele estava te cobrando mais do que devia”, ela faz uma pausa. “Talvez eu tenha mencionado o nome do meu irmão. Ele é tipo um valentão daqui”. “O que quer dizer?” “Vamos apenas dizer que se você estivesse roubando carteiras para alguém, esse alguém provavelmente seria ele”. “O que, ele é tipo... um gangster?” – Assim que as palavras saem eu percebo o quão tolas elas soam, mas minha mente imediatamente se voltou para um filme que eu vi um dia antes quando eu passei quase o dia todo num cinema. Queijos começam a sair da minha boca para o prato dourado na minha mão. “Algo assim” – Emma olha para mim e sorri. Eu me sinto estúpido, como um garoto ingênuo. “Então, você trabalha pra ele?” – eu não consigo imagina-la com as personagens do filme. Ela é muito nova, obviamente, mas também muito amigável. “Essa é a parte na qual um carro preto aparece e eu sou capturado e mantido refém ou algo assim?” “Eu provavelmente escolheria uma pessoa que não estivesse roubando carteira se eu quisesse sequestrar alguém por dinheiro” – ela diz com um pequeno sorriso. “Não, eu não trabalho para meu irmão. Eu não sou como ele. Não falo com ele, na verdade. Além disso, a última coisa que eu quero é alguém me dizendo o que eu posso ou não posso fazer. Especialmente se essa pessoa for estúpida como meu irmão”. Eu sorrio, genuinamente. Eu posso imaginar de onde ela vem. “Além disso”, ela continua, “ele pensa que eu sou muito nova e que não quer que eu me envolva”. Ela deixa escapar um longo suspiro entre uma mordida e outra. Sua boca está quase cheia quando ela fala de novo. “Então, de onde você é?” “Por que você está falando comigo?” – eu pergunto, ignorando a pergunta. Ela parece um pouco confusa. “Eu quero dizer, por que você veio falar comigo na praia?” “Eu queria uma arepa”. “Claro”. “Okay. Eu te vi por aqui e sabia o que estava fazendo. Eu pensei que você usava alguns pontos. Eu pensei também que talvez você pudesse ser meu amigo da praia. Estou cansada de trabalhar sozinha”. “Trabalhar?” – eu pergunto. “O que quer dizer?” Ela para no meio da calçada, sorri e puxa uma carteira de couro preta. A primeira carteira que eu roubei – a que eu guardo meu dinheiro agora. Minha mão vai até meu bolso e confirma o que eu já sei. De alguma forma ela conseguiu pegar minha carteira. Eu não senti nada. “Nem todos são tão fáceis como você” – ela diz com um sorriso malicioso no rosto. “Eu posso te dar uma mão se quiser”. “Você quer que eu roube carteiras para você?” 30


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“Comigo”. Eu hesito. Andar por aí e conversar com Emma é uma coisa, mas eu praticamente posso ouvir Rey gritando comigo e me dizendo para não chegar perto ou fazer amigos com ninguém além dele. Mas ela obviamente não é um Mog. “Vamos lá”, ela diz, percebendo minha relutância. “Olhe, eu não sei de onde você é, mas está claro que você não está familiarizado com esse lugar como deveria, pois você estava quase comprando comida de rua por seis dólares, mesmo ela sendo deliciosa. Vamos nos encontrar novamente e entrar em alguns problemas. Estou tão entediada neste verão. É por isso que eu fui falar com você”. Suas últimas palavras me estabilizam. Ela me viu, veio até mim na praia. O mínimo que posso fazer é considerar andar com ela um pouco mais. “Claro”, eu digo. Sua cara se ilumina um pouco. “Ótimo”. Ela pega seu celular e faz uma careta para a tela. “Merda, tenho que ir. Qual é seu número?” “Eu não tenho um”, eu digo, acanhado. “O que quer dizer com –” ela começa. Então sua expressão muda. “Bem, me encontre na praia amanhã. Mesmo lugar que eu te encontrei hoje. Eu vou estar lá à tarde”. Eu assinto. “Tá, ok”. Ela solta mais um sorriso e entrega minha carteira. Eu a observo, descoordenado. Assim que eu a tenho de volta no meu bolso, ela já está a alguns metros de mim, desaparecendo na multidão. Santo Deus, eu penso. Acabei de fazer uma amiga? O que acontece é que eu não tenho certeza, já que nunca tive um amigo antes na minha vida além de Rey. Como é que eu posso salvar um planeta invadido por uma espécie hostil se eu nem sei como interagir com outras pessoas?” Meus pensamentos voltam para a Garde. E se eu não me juntar a eles?

Capítulo 7 Ao invés de esperar por Emma no local em que ela me encontrou ontem, eu espero meia praia mais longe, andando lentamente entre alguns banheiros e algumas plantas. Assim eu vou saber caso ela apareça com uma tropa de Mogs ou coisa do tipo – apesar de eu achar que ela não fará isso. Estou apenas tentando ser cauteloso. E eu não quero que ela me pegue de surpresa de novo. Emma aparece no começo da tarde. Ela procura a volta por mim antes dela encolher os ombros e se sentar embaixo da palmeira onde ela me encontrou. Ela espera por um tempo – uns vinte minutos, talvez – enquanto eu tento dizer a mim mesmo para começar a andar. É estranho eu me sentir nervoso desse jeito. Isso é novo para mim, se encontrar com alguém. Me encontrar com alguém novo. É estranho. Quando ela se levanta dando a impressão de que vai embora, eu ranjo meus dentes e vou até ela.

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“Hey!” – ela diz com um sorriso que aparece quando ela me vê. “Achei que você ia me dar um bolo”. “Desculpe”, eu digo, colocando minhas mãos dentro dos bolsos. “Eu, uh, perdi a hora”. “Sem problemas. Está um dia lindo, vamos ficar aqui por algum tempo”. E então sentamos e começamos a conversar. Ou melhor, ela fala e eu respondo as suas perguntas o mais vagamente que eu consigo – ou com mentiras. De onde eu sou? Daqui. Onde eu moro? Não muito longe da praia. E sobre meus pais ou família? Eles moram aqui e ali. Eles viajam muito. Eu fico sozinho. Emma não me pressiona sobre nada, o que me faz me sentir mal por todas as mentiras que eu digo a ela – que eu tenho uma casa para ir dormir à noite e uma família amável em algum lugar. É fácil conversar com ela de uma maneira que nunca consegui conversar com Rey. Muito porque ela fala bastante dela mesma, e tudo o que ela diz e novo para mim. Algumas vezes ela desliza para o espanhol e soa bonitinho que eu nem digo a ela que não posso entender o que está dizendo. Emma não é a pessoa que ela disse que era quando nos conhecemos, tão segura e inteligente. Enquanto ela fala eu percebo as lacunas. Seu irmão parece ser algum tipo de criminoso – que eu acho ser verdade – mas ela é apenas uma garota rebelde que ficou boa em tirar as coisas dos outros, procurando por uma nova aventura no verão. Emma de fato tem uma família amável em casa a qual ela pode voltar todo dia a noite. Mas pelo que eu posso dizer ela está faminta para fazer parte de alguma coisa, de sentir o perigo. É engraçado: eu nunca pensei que as pessoas iriam sair a procura de perigo. Eu acho que quando você passa sua vida toda se escondendo de tudo para impedir alguma coisa aconteça, coisas como essas perdem a emoção. Mesmo assim, quando ela sugere para sairmos por ai para pegar algumas carteiras, eu aceito. Eu vejo isso como um jogo, ou treinamento. Mentir. Se esconder. Ser discreto. Tudo isso são as coisas em que Rey tecnicamente aprova porque elas são habilidades que me ajudam a me esconder dos Mogs. Certo? Eu descubro muito rápido que não sou um bom ladrão quando não estou usando meus Legados. Eu só tive que ser seguido uma vez pelas ruas de South Beach para descobrir isso. Emma não consegue desvendar como eu consegui correr tão rápido e não ser pego, mas eu apenas dou de ombros. Meu papel se torna o da distração. Eu sou a pessoa que para e pergunta informações ou direções. Nisso eu sou bom: eu basicamente tenho que inventar histórias ou mentiras. E antes de eu perceber nós temos um sistema bom que está faturando muito dinheiro. Pelo menos, o suficiente pois estou quase sem fome ou querendo mais, e ainda sobra um pouco para eu guardar na minha reserva para o Canadá. Somos bons no que 32


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fazemos. Nós fizemos um acordo – tipo um pacto Robin Hood. Nós roubamos apenas daqueles que parecem que podem se dar ao luxo de perder alguns dólares. Eles são fáceis de serem notados, entrando e saindo de lojas famosas ou hotéis. Nossos alvos são turistas, não pessoas que parecem ser daqui. Nós nos vemos muito. Depois de uma semana de ter conhecido Emma, mais ou menos, eu a pergunto o porquê dela gostar de quebrar as regras, e de roubar as pessoas. Eu deduzo isso pelo fato de que ela provavelmente vem de uma família suficiente boa, a qual ela poderia simplesmente pedir dinheiro aos pais, ou coisa assim. “Respeito”, ela me diz enquanto ela joga a carteira de alguma mulher, agora vazia, em um lata de lixo na praia. “É isso o que eu quero. É disso que precisamos. Quando as pessoas te respeitam, você pode fazer qualquer coisa. É assim que você fica realmente poderoso em uma cidade como essa. Seu nome tem que significar alguma coisa para as pessoas”. Estou louco para dizer pra ela que meu nome significa alguma coisa. Para um monte de pessoas. Eu sou um redentor. E um alvo. Porém quanto mais tempo eu fico com Emma, menos essas coisas parecem me pressionar, e o Canadá fica cada vez mais distante. Com ela eu sou apenas uma criança chupando sorvete e comida de rua todos os dias, passando as tardes entrando escondido em teatros e cinemas e relaxando na praia ao entardecer. Depois de algumas semanas Emma e eu realmente ganhamos uma reputação pelas praias – pelo menos o suficiente para que o irmão de Emma ouvisse sobre nós e dizer a ela para interromper isso antes que entre em encrencas maiores. Eu posso dizer que os moradores locais mudaram a forma que eles pensam de mim quando olham para nós quando passamos por eles. Alguns com respeito. Outros com uma pitada de medo. Todos eles com o conhecimento sobre quem somos e o que podemos fazer. É boa a sensação de ser reconhecido.

Eu carrego minha Arca comigo onde quer que eu vou, tenho medo de deixa-la escondida em algum lugar. É tudo o que eu tenho da ilha, e de Rey, ambos muito longe agora. De noite, eu durmo com ela abraçada a mim. É nesses momentos entre dormir e acordar que eu encontro meus pensamentos impelindo no meu destino e do resto da Garde, na guerra que certamente nos espera no futuro. Eu sonho que nunca terei que ser o Cinco de novo. Que eu posso fazer o que eu quiser, não mais preso pelo destino ao que fui forçado pelos Anciões de Lorien. Mas eu sei que é uma coisa da qual eu não posso escapar. Não inteiramente. Mesmo que eu lute ao lado da Garde – sete superpoderosos soltados que nunca se

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conheceram, tentando derrotar um exército inteiro – ou os Mogs vão matar todos nós e dominar a Terra também. Eu queria que houvesse outra maneira: uma terceira opção que eu não consigo pensar agora. Mas para a minha vida eu não consigo pensar em nada. Portanto, eu devo aproveitar minha vida nesse planeta enquanto posso. Em uma noite dessas, eu encontro o alvo perfeito. Emma e eu estamos atrás de um hotel luxuoso que fica de costas para a praia, dividindo o que conseguimos durante o dia. Está escuro, e as únicas pessoas que nos incomodam são uns corredores noturnos que passam por nós acenando com a cabeça. Em seus trinta anos ou mais e bem vestido com uma camisa de botão preta nítida, calças cinzas e sapatos pretos reluzentes são impróprios para uma caminhada na praia – mesmo se ele estiver na calçada. Seu cabelo preto penteado para trás e sua pele acentuadamente pálida, significando que é muito provável que ele não é de Miami. E o mais importante, ele está sozinho. Perfeito. Ele está praticamente nos pedindo para roubar sua carteira. Eu olho para Emma, que me dá um sorriso malicioso que eu já conheço. “Qual vai ser a história?” – ela pergunta. “Nós perdemos nosso gato”, ela diz. “É preto como a noite e estamos procurando há horas”. Ela sorri e acena, se afastando de mim. É isso o que fazemos. Eu fico com a parte da história e ela com o “trabalho pesado”. Assim que o homem se aproxima, seus olhos observam nós dois mas ele não presta muita atenção. Quando ele passa por Emma, eu entro no seu caminho. Emma se posiciona atrás dele. “Hey, senhor. Você viu um gato preto correndo por aqui? Nós estivemos tentando –” – o homem se move rápido – mais rápido do que eu imaginaria – e num piscar de olhos ele pega Emma atrás dele, seu braço torcido por ele. Uma carteira de couro vermelha cai das mãos dela na calçada. O homem aperta seus dedos, e Emma cai na areia com um gemido. Ela deixa sair um monte de xingamentos em espanhol. Droga. Eu ando para a frente, mas ele alcança sua mão em mim, e há um comando em sua presença que me faz parar. Eu não sei o que fazer. Ele fala com Emma em espanhol, dizendo alguma coisa que faz com que seus olhos se arregalem. Ela murmura para ele, e o mesmo responde. Sua voz é baixa e suave. Há uma expressão de reconhecimento que aparece no rosto de Emma. Claramente ela está ligando os pontos que eu não entendo, e eu começo a sentir como se eu estivesse completamente no escuro sobre o que está de fato acontecendo na minha frente. 34


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Tudo o que eu sei é que eu tenho apenas uma amiga nesse mundo, e ela está no chão na frente de um homem quem ela obviamente está com medo. Então quando ele se aproxima dela, não evito a reação. Eu o mando aos tropeços para trás com minha telecinesia. O ataque não é forte – mais um vacilo do meu Legado – mas serve para pôr uma distância entre nós. O homem parece surpreso por um momento, e então ele estreita seus olhos para mim. Eu respiro fundo e cerro meus pulsos. “Cody, o que é que você...” – Emma parece confusa. “Escute, eu sei quem é esse cara. Mais ou menos”. O homem se abaixa devagar, as mãos em sua frente, e pega sua carteira do chão. Ele tira dois cartões dela. Ele os joga no chão. “Se vocês estiverem procurando por serviço, liguem para esse número” – ele diz. Então, como se fosse normal, ele joga uma nota de cinquenta dólares também. E então ele passa por nós e vai embora. Como se ele não se importasse com o mundo. Há alguma coisa sobre ele que permanece no ar e parece fazer dele intocável. Quando ele está longe, eu viro para Emma. “Você está bem?” – eu pergunto, preocupado. “Você não tem ideia de quem seja aquele cara, não é?” – Emma pergunta, seus olhos nas costas do homem. “Não. Quem?” Emma pega os dois cartões e me entrega um. É branco, com nada mais do que um número de telefone em preto no centro. “O nome dele é Ethan”, ela diz. “Eu ouvi meu irmão falar sobre ele ultimamente. Ele é algum tipo de cara importante que está mexendo coma cidade agora. Sabe o que isso significa?” – ela olha para eu, mas eu apenas assinto. Ela sorri. “Ele é o nosso ingresso para o próximo nível”.

Capítulo 8 EMMA LIGA. Ela não fala com Ethan, mas a pessoa que atende parece saber quem somos. Isso me deixa nervoso, mas é apenas um nome falso que eles sabem. Ethan, aparentemente, está em extrema necessidade de entregadores – pessoas que levam pacotes e documentos pela cidade para ele. Não era exatamente e o que Emma tinha em mente quando ela telefonou, mas ela concorda se ele empregar nós dois. “Eu pensei que você não queria alguém te dizendo o que fazer”, eu digo, quando ela desliga o celular. “Eu não quero”, ela diz, franzindo as sobrancelhas. “Mas estou ficando cansada de pegar carteiras todos os dias, você não está?” Na verdade não, eu penso, mas eu apenas dou de ombros. “Então, o que vai ser, você vai usar sua maneira mandona para dominar um ladrão?” – eu pergunto, sorrindo. 35


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Ela me dá um soco no braço e ri. Fomos chamados para nossas atribuições. Usualmente temos que pegar pacotes e envelopes em específicos estabelecimentos e leva-los a outros que ficam do outro lado da cidade. Emma odeia, mas eu não me importo. Eu aproveito para conhecer partes da cidade que eu nunca pensei que existissem. Lojas de Voodo na Pequena Haiti, e lustres pendurados nas vitrines da Design District. Algumas vezes temos que nos separar para completar o serviço. Mas na maioria das vezes trabalhamos juntos pela cidade. Um dia quando estava sozinho, encontro Ethan de novo. Ele está sentado no canto de um banco grande de uma lanchonete. Eu tenho um pacote para ele. O lugar é caro, ou pelo menos, é mais caro do que no lugar que eu estou acostumado a comer. Ele sorri quando me vê, mostrando seus dentes brancos perfeitos. “E aí vem meu melhor empregado”, ele diz, apontando para o outro lado do banco. “Por favor, sente-se”. “Obrigado, uh...” – eu percebo que não sei como chama-lo. “Por favor, me chame de Ethan”. “Ethan”, eu assinto. Eu me sento no banco, colocando minha mochila nos meus pés. Antes que eu possa dizer algo a mais, comidas começam a chegar: pratos e mais pratos com ---- e frango assado, macarrão e molho. Ethan me encoraja a comer o tanto que eu quiser, e eu praticamente enterro a comida na minha boca. Ethan fala enquanto eu como: “Eu normalmente não sujo minhas mãos com pequenas gangues nessa cidade”, ele diz, cortando alguma coisa no seu prato, “mas notícias vieram até mim. De pessoas da rua. De tiras. Quando alguém interessado aparece, eu fico sabendo. E você e sua amiga são pessoas definitivamente interessantes. Você tinha uma parceria sólida antes de vir até mim. Me diga, o que te levou a ser um batedor de carteiras? Por que faz isso?” “Sobrevivência”. Ethan sorri. Ele gesticula pra mim com seu garfo. “Você tem mais ou menos uns quatorze anos, certo?” Eu concordo. Ele continua. “Eu vivi nas ruas quando tinha sua idade. Isso me fez me tornar um ladrão muito bom e me fez crescer rápido. Mas não é uma vida fácil. E é perigosa. Meu irmão não conseguiu”. Seu tom de voz diminui. Eu congelo. É meio que inapropriado continuar comendo enquanto ele fala do seu irmão morto, então eu me sento lá com um enorme pedaço de queijo escondido em uma das minhas bochechas enquanto ele fala. “Eu tive que procurar por ele por dias até eu encontrá-lo. Outra gangue havia... bem, não é importante. Não quero te assustar. O importante é que, vejo muito dele em você. É estranho, sério. Acho que ele teria sobrevivido se tivesse suas habilidades”. Eu fico tenso. Pelo que Ethan sabe, minhas habilidades incluem entregar pacotes e roubar carteiras. Eu penso no dia em que encontramos ele na praia e eu estupidamente o empurrei com minha telecinesia. Ele descobriu o que era? Não, eu digo. Ele provavelmente acha que foi o vento. Como ele poderia saber? “Uh, claro”, eu digo. “Sinto muito ouvir sobre seu irmão”. “Isso é passado,” ele diz. “Mas você – você é futuro”. Os lábios de Ethan se transformam em um sorriso. “Me diga mais sobre você”, ele diz. E então eu começo falar. Nada sobre Lorien ou sobre a ilha, apenas coisas que eu gosto. Arepas, jogos, filmes, livros. E Ethan parece fascinado. Descubro que ele é fã de filmes. Ele começa a falar de uma lista de filmes que eu deveria ter visto quando de

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repente eu me pego pensando como eu vim parar em um restaurante luxuoso de Miami falando sobre filmes com um cara criminoso de alto padrão. O que Rey diria? Eu queria que ele estivesse aqui. Eu queria que ele me visse como eu estou me dando bem. O quão importante estou me tornando. Emma sempre está faminta por mais, querendo maiores serviços arriscados. Eventualmente, pegamos um. Ethan quer que um monte de armazéns tenham escutas para ouvir competidores ou algo assim. Como de costume, não fazemos perguntas. Emma e eu devemos entrar lá escondidos à noite, quando os prédios estão vazios e plantar alguns pequenos aparelhos que Ethan nos forneceu. É uma tarefa extremamente fácil. Então é claro que tudo dá errado. Emma e eu nos separamos para realizarmos o serviço, e estou a meia distância dela plantando as escutas em um pequeno armazém cheio de barbantes e mais barbantes, caixas em prateleiras quando uma dúzia de caras aparecem. Se eu estivesse em um filme de super-herói, eles seriam os capangas esteriopitizados. “Uh”, eu digo, enquanto eles se formam um círculo ao meu redor. “Oi. Eu só estava procurando algum lugar para dormir essa noite. Eu já estou indo e –” “Ethan te mandou aqui, não mandou?” – um deles pergunta. “Ethan?” – eu pergunto – “Quem é esse?’ O homem me responde com um soco. Rapidamente o treinamento rudimentar corpo-a-corpo a qual Rey me treinou vem à mente, mas eu estou enferrujado e eu nunca fui bom nisso. E de repente há um monte deles. Eu me esquivo de alguns socos, até que um soco me atinge no intestino e eu me dobro. E então estou no chão, chutes vindo de todas as direções, minha visão fica turva quando o calcanhar de alguém acerta minha nuca. Eles não podem me matar, há ainda três Gardes entre eu e a morte – mas eles podem me quebrar. Me incapacitar. Me mandar para a UTI ou me sequestrar. Eu tenho apenas uma chance de sair disso. Energia telecinética emerge de todo o meu corpo mandando todos os agressores para trás. Eu não dou chance a ninguém para se recomporem. Eu uso meu Legado para jogá-los de uma parede a outra, levitando eles no ar e então jogando eles contra o concreto. Eu continuo surrando eles com meu Legado de um jeito que nunca imaginei. É estranho o jeito que ele vem naturalmente para mim, essa destruição. Eu percebo que eu esqueci de usar minha telecinese tão frequentemente, como eu usava na minha ilha ou quando estava começando a roubar carteiras. Corpos voam pelo lugar todo, batendo contra prateleiras e luzes, até que alguém chama meu nome e eu congelo. Emma. Eu viro para vê-la parada em uma das portas, com sua silhueta iluminada pela lua. Ela não faz nenhum movimento para vir até mim. Há um olhar no rosto de Emma que eu nunca vi antes. Seus olhos estão arregalados, o branco se destacando na escuridão. Suas mãos tremem. Ela está aterrorizada. A minha volta, todos caem no chão, fazendo barulho. “Emma”, eu digo, dando um passo à frente. Ela dá um passo para trás. “O que é você? Como você –” ela diz. Seus olhos miram para um dos corpos no chão, atrás de mim. “Marcus?’, ela diz. E então ela corre até ele, e ele não responde enquanto ela chacoalha seu corpo, e lágrimas começam a sair de seus olhos. Me leva um momento para perceber porque o nome Marcus me é familiar, então percebo. Eu não reconheci o nome imediatamente porque ela normalmente o chama de irmão. Marcus parece estar vivo mas 37


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sua perna está torcida e eu sei que está quebrada. Ele provavelmente fraturou algumas costelas enquanto estava no ar, também. O que eu fiz? “Me desculpa, eu - “– eu digo, mas sou interrompido pelo olhar de Emma, de ódio. “Seu monstro”, ela diz. “Sua aberração do inferno. Você está possuído? Como fez isso?” Eu dou um passo à frente mas ela se levanta, um cano que estava em uma das prateleiras que eu derrubei estão nas mãos dela. “Emma...” “Não se atreva a dar mais nenhum passo”. Ela meche a cabeça, ou talvez esteja tremendo – é difícil de dizer. Aos seus pés, seu irmão diz alguma coisa inaudível. Eu dou um passo à frente. “Deixe-me ajuda-la” Então ela se vira. O cano se bate contra minha cabeça e tudo fica preto

Quando eu acordo estou num carro. Um carro muito maneiro, com bancos de couro cinza e com um monte de TVs. Um homem de terno dirige. Estou no banco de passageiros de trás. Ethan está do meu lado. “Seja bem vindo de volta para o mundo dos vivos”, ele diz. Minha cabeça está latejando. Levanto meus dedos para encontrar uma faixa latejante no meu crânio. “Emma...” eu murmuro. “Foi uma bela batida. Você provavelmente entrou em estado de choque. Eu posso ligar para um dos meus médicos para eles te examinarem se você estiver com tontura”. “Onde ela está?” “Ela ficou pra trás. Aparentemente um dos homens era seu irmão. Ela ligou para pedir ajuda. Eu cheguei o mais rápido que eu pude, quando recebi a notícia de que havia um problema e te peguei. Não queria que você se machucasse mais ou fosse preso”. Eu assinto com minha cabeça, mas isso só a faz doer mais. A dor dificulta quando eu tento juntar as partes para lembrar do que aconteceu. Cem partes diferentes do meu corpo doem. Minha camiseta branca está vermelha de sangue. Minha Arca Lórica... meu coração dispara quando penso nela. Eu olho ao redor do carro. Minha mochila está aos meus pés. Eu procuro por ela, freneticamente abrindo a mochila. A Arca ainda está a aqui. Eu me tranquilizo. Ethan continua. “Então, você tem alguns truques embaixo da manga que não se importou em me contar. Não tenho dúvidas de que vocês foram muito bem no trabalho que eu havia dado” “Ela não sabia”, eu digo. Eu me arrependo das palavras imediatamente. Elas acidentalmente confirmam a verdade – que eu tenho poderes. Que eu sou diferente. Mas ele já sabe disso. Ele viu o que fiz claramente como Emma viu. “Isso explica a reação dela”. Ela me chamou de monstro. Pensei que fosse minha amiga. Eu olho pela janela, incerto de onde estamos indo. Talvez eu devesse abrir a janela e voar pela noite. Encontrar algum lugar para ir. Começar de novo. Talvez esteja na hora de eu voltar para o Canadá. 38


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Uma pergunta se forma na minha cabeça dolorida: é assim que minha vida vai ser agora? Me mudar de lugar a lugar, se saber o que estou fazendo? Não há maneiras de encontrar os outros Garde. Duvido que eles me encontrem. Não sei nem se estão procurando por mim. Eu poderia causar uma cena ou mostrar meus poderes, mas provavelmente eu seria morto pelos Mogadorianos antes mesmo da Garde sair do esconderijo. Eu queria que houvesse outra maneira. “O que você era dela? Parceiro? Amigo? Mais do que amigo?” Eu estudo a pergunta na minha cabeça por um momento, tentando ver onde ele quer chegar. “Amigos”, eu digo, “quer dizer, acho que éramos”. “Um amigo não reagiria do jeito que ela reagiu, Cody”, ele diz, se inclinado no seu banco. “Um amigo não teria dado as costas para você; eu odeio ter que te dizer isso, mas eu acho que é possível que Emma estivesse aproveitando de você o máximo que ela poderia. Te usando”. Eu começo a protestar, mas ele levanta a mão, me impedindo de falar. "Sabe o que você é para mim?" Eu balanço minha cabeça lentamente. "Um empregado?" – eu pergunto. "Potencial", diz Ethan. "O poder bruto. Eu não sou um idiota. Eu conheço o talento quando o vejo, e eu respeito isso. Eu estive em todo o mundo. Eu já vi algumas coisas muito loucas, inexplicáveis no meu dia, coisas que você não acreditaria mesmo que eu fiz um juramento sobre tudo o que é querido e santo. Já vi homens na Indonésia que pode dizer -lhe os seus segredos mais sombrios. Mulheres no Caribe, que pode ressuscitar animais. Nada me surpreende. Você não tem que me dizer sobre si mesmo ou a sua história. Mas você não tem que esconder nada. Eu nunca vou olhar para você como se você fosse uma aberração. Qualquer que seja o poder ou dons que você tem, significa que você é mais forte do que a maioria das pessoas, certo? Significa que você é alguém que está se defendendo, para sobreviver. E é por isso que você está aqui agora." Ele aponta para trás e para frente entre nós. "Temos muito a oferecer um ao outro. Se trabalhássemos juntos, seríamos imbatíveis." "E quanto a Emma?" - murmuro. "Emma tem uma família. Seu irmão tolo, sim, mas os pais e uma casa também. Você, por outro lado, está sozinho, não é?" "O que faz você pensar isso?" "Cody, eu corro um navio muito apertado quando se trata de meu negócio. Eu faço uma verificação completa de todos com quem trabalho. Você, meu filho, tem sido uma anomalia." Ocorre-me que ele não parecia chocado com tudo o que aconteceu. Meus poderes, ou o abandono de Emma. "Você está me seguindo". "Você precisa trabalhar em sua discrição". Ethan empurra seu cabelo escuro para trás das orelhas. "Isso é algo que eu posso lhe ensinar. E a partir da aparência dele, você poderia usar um pouco de combate corpo-a-corpo treinando bem. Mas o mais importante é a capacidade que parece que você tem. Você pode mover as coisas em torno de apenas agitando as mãos. " "Telecinese", eu digo. O que estou fazendo? Eu deveria saltar para fora do carro e desaparecer na escuridão. Mas Ethan já sabe. E de repente eu percebi que ele é o único amigo que eu tenho agora. A forma como Emma olhou para mim, eu sei que não vou voltar para ela 39


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agora. Eu ficaria surpreso se ela falasse comigo novamente. Além disso, toda essa conversa de treinamento, talvez esta é realmente uma coisa muito boa. Ethan é obviamente um homem poderoso. Se ele pode me treinar para ser como ele, eu posso usar isso mais tarde. Quer dizer, eu sempre poderei sair, certo?". “Pessoas como eu e você são diferentes, Cody", diz Ethan. "Você é especial. Eu sabia no momento em que te conheci na praia. Você é poderoso, mas eu posso ajudá-lo a tornar-se alguém que as pessoas realmente admirem e respeitem Gostaria disso?" "Sim", eu digo. Eu nem sequer realmente tenho que pensar sobre isso. "Bom", ele diz com um sorriso. "Nós temos um futuro brilhante pela frente." O motorista se volta para um imponente portão de ferro forjado. Ele se abre em dois, expondo uma longa entrada principal até uma casa que parece algo saído de um filme sobre milionários de Hollywood. "Que lugar é esse?" - eu pergunto. "O seu novo lar."

Capítulo 9 É um pouco estranho como o tempo passa rápido depois que Ethan apareceu. Eu digo a mim mesmo que vou ir embora a um ou dois dias, e então semanas passam como nada. Eu continuo pensando: “Eu vou ir embora amanhã”, mas é sempre amanhã e nunca hoje, e eu fico. Não são mais precisos assaltos nem bolsas roubadas. Eu vivo na luxuria. Com um lugar como o de Ethan é difícil imaginar voltar a dormir em telhados ou em uma cabana. A casa dele tem tudo o que você poderia querer. Uma biblioteca, um salão de jogos, vista da praia – tem até um pequeno cinema no porão, que é onde eu passo a maior parte do meu tempo. Tudo é trancado e destrancado com um pequeno cartão de acesso que eu carrego por todo lado na carteira luxuosa que Ethan me comprou. Há um grupo de funcionários que limpa tudo para nós. E há um cozinheiro. Um cozinheiro. Ele é provavelmente a pessoa que eu mais gosto na casa. Depois de Ethan, que assiste filmes comigo quase toda noite. Eu tenho que me lembrar de que Rey me queira a salvo. O que poderia ser mais salvo do que uma casa como a de Ethan? Um acordo. Ethan me deu um quarto maior que nossa cabana inteira na ilha. Eu praticamente tenho todo o segundo andar pra mim. Tudo o que eu possivelmente poderia querer. Coisas que eu nem sabia que eu precisava. Nunca tivemos fio dental na ilha, muito menos computadores. Eu uso a internet para tentar achar qualquer coisa sobre a Garde – qualquer notícia ou posts de blogs que eu encontrar que talvez possa me levar a eles – mas toda vez que eu acho que estou chegando perto, a internet vira uma parede de concreto. Eu recebo uma mensagem de erro do navegador dizendo que o link está quebrado ou que o site está com problemas. Eu acho que os outros Cêpans fazem isso, para encobrir seus passos. Se Rey fosse vivo e tivéssemos internet, certeza que ele estaria deletando coisas que eu postasse também, ou invadindo os sites de notícias pela internet.

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É isso, ou a Garde está com muito medo para fazer alguma coisa do que ficar sentado esperando que alguma coisa aconteça para que eles possam reagir. Ethan não é assim. Ethan é como o Cêpan dos sonhos. Tudo o que eu quiser, ele me dá. E qualquer coisa que ele quiser fazer, ele faz. “Tudo lá fora pode ser seu”, ele diz pelo menos uma vez por dia, e quando ele diz soa com razão. Faz sentido. Qual a melhor maneira de ostentar de força e poder do que ser capaz de ter tudo o que quiser quando quiser? Ethan renuncia a corrida e a musculação, invés disso, ele foca nos meus Legados. Eu digo a ele que não sei de onde eles vêm, e ele diz que não importa – tudo o que importa é que temos que usá-los agora. E ele me treina, alguns dias a precisão de minha telecinese, e outros dias a força. Voar se torna cada vez mais fácil, até o ponto em que posso decolar apenas com um pensamento. Seus funcionários são bem pagos e não se atreveriam a dizer nada sobre o que veem. E ele me assegura que ele definitivamente não está contando a ninguém sobre o que eu faço. Eu sou sua arma secreta. Ele tem coisas incríveis planejadas pro meu futuro. Quando eu estiver preparado. É um futuro que eu estou curioso para descobrir. Ethan acredita em poder. Acho que ele é obsecado com isso. Não é difícil ver o quão feliz ele fica quando ele nos leva em um restaurante fino ou em alguma butique incrivelmente cara e os empregados e garçons o tratam como um deus que veio para a Terra para pedir um filé mignon. Eu vejo. Eu me sinto assim, também, quando estou com ele. A emoção de ser observado, de ser invejado. É viciante. Mas a inveja e o dinheiro não são os únicos aspectos de poder que o Ethan dá valor. Seus negócios requerem admiração. Não é uma coisa que eu sou bom.

Alguns meses depois do incidente no armazém, um dia após o almoço, andamos por uma parte do centro Miami que é cheia de outdoors e luzes. Ethan veste seu terno escuro casual e eu uma camisa e jeans que custam tanto que provavelmente compraria a ilha toda na qual eu vivi com Rey. Foi-se o meu cabelo marrom longo, emaranhado. Eu me pergunto como sobrevive tanto tempo com todo aquele cabelo na minha cabeça. Como de costume, eu fico de olho na Emma. Eu não sei se eu realmente a quero ver novamente, mas eu não quero entrar em sua rua de surpresa. A última coisa que eu preciso é de outro choque. Nós passamos por um punhado de crianças um pouco menores que eu sentadas do lado de fora de uma cafeteria – dois garotos e duas garotas. Eu não percebo o cachorro 41


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nos seus pés até ele latir para mim, e eu pulo pra trás, assustado, quase empurrando Ethan para o meio da rua. Eles caem na gargalhada. Uma das garotas pede desculpas e puxa o cachorro pra trás. “Que idiota medroso” – um dos garotos resmunga para o amigo. “O que foi isso?” – Ethan pergunta se aproximando da mesa deles. Eu posso ver que todos eles estão olhando desconfortavelmente. “Nada”, o garoto diz. “Você ouviu do que ele te chamou?” – Ethan me pergunta. Eu reconheço o tom na voz dele. Ele mudou para o modo professor, preparado para ensinar uma lição importante. – “Sim...” – eu digo. “E você é um idiota?” “Hey, cara” – a garota diz. “Desculpe-nos, ele não teve a intenção. Ele é um retardado”. Ethan a ignora. Invés disso, ele fala comigo. “O garoto te desrespeitou” “Acho que sim” – eu dou de ombros. Ethan olha ao redor por alguns segundos. Estamos do lado da loja. Não há muitas pessoas na rua. Ninguém perto de nós, pelo menos. “Então mostre a ele como te respeitar” O garoto da mesa se levanta. Ele tem duas vezes o meu peso, e é mais alto que Ethan. “Venha” – o garoto diz. Eu olho pra Ethan hesitante. “Você tem que começar com o pé da cadeira e alimentar sua força”, Ethan diz baixinho. Ele se vira de encontro aos meus olhos. “Se você não ensinar a eles que é mais forte do que eles, eles nunca terão medo de você. É hora da ação”. Eu concordo com ele. “Olhe,” – o garoto diz – “Eu disse - ” Eu levanto minha mão em frente de mim, e de repente o garoto é empurrado voando três metros pra trás, se colidindo com a parede da cafeteria. Ele começa a xingar e tenta 42


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se mover freneticamente, mas eu tirei os pés dele do chão. Ele não tem chances. Eu estou no controle. Os outros na mesa suspiram e começam a ficar loucos. “A garota pegou um telefone”, Ethan diz calmamente. Com minha outra mão eu uso meu Legado para arrancar o telefone de seus dedos e o jogo no chão. O visor se estilhaça. “O garoto vai sair correndo” Um dos outros garotos da mesa está indo em direção da entrada da loja. Eu tiro suas pernas do chão, com um movimento do meu pulso. “Há alguém atrás de você” Eu viro para trás, com as duas mãos livres, pronto para lutar. Mas não há ninguém. Eu viro para Ethan. Ele sorri. “Perfeição”, ele diz. Então ele dá uma rápida olhada em volta. “Devemos ir agora”. Eu derrubo o garoto no chão. Ele está tremendo e suspirando por ar enquanto nós saímos como se nada tivesse acontecido. Os seus amigos se juntam a ele. Meu coração está pulando no meu peito. Eu me sinto tonto e estranhamente satisfeito. Eu não evito o sorriso. “Você parece agradecido com sigo mesmo”, Ethan diz, “como é a sensação?” “Maravilhosa”, eu digo. Eu me senti maravilhado.

Um ano após estar com Ethan – próximo a esse dia – eu sou acordado no meio da noite. Meu tornozelo está em chamas. Eu uivo batendo e derrubando metade das coisas do criado mudo, tentando encontrar o abajur. Mesmo depois que ele está ligado, eu sei o que a queimadura significa. Morte. Mais um se foi. Um símbolo circular, vermelhíssimo, apareceu na minha perna acima dos outros semelhantes. Três está morto. Esse símbolo é a coisa mais perto de uma lápide que ele ou ela terá. Outro Garde sacrificado pela causa Lórica. Apenas uma pessoa resta entre eu e

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a morte agora, se o que Rey me disse sobre a ordem em que temos que ser mortos for verdade. O Número Quatro. Eu cambaleio ao descer da cama, estremecendo um pouco a cada vez que eu coloco o peso sobre o meu tornozelo. E é mais pesado que normalmente. Depois de um ano de refeições fartas que são servidas na casa de Ethan toda vez que eu tenho fome, eu não pareço nada com o garoto magricela de pele queimada que morava na ilha. Eu sou um tanque agora. Sólido. Talvez um pouco fofinho. Definitivamente maior do que eu parecia ano passado. Estive focando muito mais nos meus Legados ultimamente do que em manter meu corpo em forma. A morte de Três me pega realmente de surpresa. Eu não me esqueci necessariamente de Lorien e da Garde, mas sem o Rey me dizendo sobre eles toda hora, tudo isso passou a viver na minha subconsciência. Eu passei muito tempo ultimamente vivendo com Ethan que a Garde se tornou uma história. Eu me esqueci de que eles são pessoas de verdade. Eu tentei ignorar o fato de que talvez eu possa acabar sendo o próximo número na lista da Morte. Mais um motivo pelas mentiras, eu acho. Mas elas são contadas apenas pra mim. Minha mente finalmente está acompanhando a fraqueza do meu corpo, e eu começo a pensar em todas as complicações que o novo desenvolvimento pode trazer. Talvez a morte de Quatro não esteja distante. Tem sempre a chance de que Três e Quatro poderiam estar juntos. Eu sempre imagino os outros Gardes trabalhando junto sem mim. Eu ando pelo quarto estabilizando minha respiração, esperando que outra cicatriz queime a minha perna. Mas depois de alguns minutos nada acontece. Ainda assim, se outra cicatriz aparecer, significa que serei o próximo. Serei o mais novo grande alvo. Eu, e todos que estiverem ao meu redor. Eu paro de andar. Eu poderia ir embora agora mesmo. Ethan nunca seria inteligente o bastante para perceber o que está acontecendo. Eu poderia voar para uma cidade diferente. Para um país diferente. Finalmente para o Canadá – apenas um pouco mais tarde do que eu planejara. Mas eu não quero ficar sozinho novamente. Talvez Ethan queira ir comigo. Para alguém que não gosta de grupos de pessoas, a ideia de não ter ninguém em quem eu possa confiar me assusta. Mesmo assim, os Mogs podem me rastrear até ele novamente. Não estivemos necessariamente preocupados em esconder meus poderes. Eu me sinto tão estúpido de repente. Mesmo que a sensação de mostrar minha superioridade para pessoas como aqueles idiotas da cafeteria, eu nunca deveria ter deixado me levar pelo que Ethan diz. Eu tenho que contar a ele o que está havendo. É o que eu posso fazer para retribuir o que ele tem me feito, pelo menos. Assim que eu saio do meu quarto, eu quase posso 44


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ouvir a voz de Rey na minha cabeça. Não diga a ninguém quem você é. Não diga a ninguém o que você sabe. Sigilo é sua maior arma. Mas Rey não está exatamente aqui agora, e o mundo não tem sido o labirinto de medo e perigo que ele sempre me disse que era. Eu estou em Miami há um ano e eu não ouvi nada mais do que um sussurro sobre o mundo “Lorien”. Se Rey estivesse vivo, nós provavelmente estaríamos pescando caracóis do mar com varas de bambus, suando e morrendo de fome no meio de uma ilha. Não, eu tenho que contar a Ethan. Talvez ele possa ajudar de alguma forma. Ele é inteligente e rico – talvez ele tenha alguma casa superprotegida militarmente a qual ele possa me levar – ou armas. Talvez ele conheça alguns militares que possam bombardear com Mogadore. Ou outra coisa. Eu ando pela casa escura. A fechadura da porta do quarto de Ethan está rachada, mas ele não está lá dentro. Nem no banheiro, ou no closet. Ele não está aqui. Ele se foi. Meu coração começa a bater mais rápido. Eles já vieram. Eles o pegaram. É tarde demais, e eu estou fudido. Então eu percebo a cama de Ethan. Ainda está feita. Ele não foi dormir ainda. Talvez ele esteja ainda acordado. Eu desço as escadas cautelosamente, procurando por luzes na cozinha, mas não há. Estou prestes a ir pra fora quando ouço as notas mais fracas da música que flutua pelo ar de algum lugar distante dentro da casa. Uma nota alta, e então se acaba. Na ponta dos pés pelos cômodos, eu descubro de onde está vindo. A porta da sala de estudos particular de Ethan – o quarto o qual eu não devo entrar – está quebrada. Não pode ser. Eu estive pela casa toda, o ano inteiro, e essa é a única sala o qual meu cartão de acesso não funciona. Eu tentei abrir a fechadura com minha telecinese um dia quando Ethan estava fora, sem sorte. Sempre foi impenetrável. Até agora, eu suponho. Eu empurro a porta só mais um pouco e fico surpreso com o peso dela. A coisa deve ser feita de metal ou algo do tipo. Eu espio. Há uma parede cheia de livros dentro em um dos lados, mas a maior parte das paredes está coberta com gráficos e mapas. Uma mesa circular bem grande no meio da sala tem um mapa com pinos e bandeiras espalhadas por ele. Ethan está sentado na sua estação de trabalho. Há três – não, com aquilo quatro – monitores de computador ligados a um par de torres de PC, e um laptop aberto no lado. A música vem de caixas de som espalhas e escondidas pela sala, o volume está um pouco acima de um sussurro. Beethoven, eu acho, e eu só sei disso porque Ethan me arrastou para uma sinfonia uma vez, onde tinha várias pessoas tocando violinos, eu acho. 45


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Ethan está de costas para mim, mas eu posso ouvi-lo. Ele está falando com alguém, parece que é uma ligação em vídeo. Eu quase posso ver a pessoa na tela. Meu corpo se congela. “Pessoa” talvez seja a palavra errada. A figura na tela tem cabelo preto, penteado para trás, com algumas outras marcas pretas – manchas de nascença? – tatuagens? – espreitando nas laterais. Seus olhos são orbes pretos. Os lados de seu nariz estão brilhando como carne, como guelras monstruosas destacando-se contra sua pele pálida. Eu já vi rostos assim antes. Apenas uma vez. No Canadá. Um Mogadoriano. Antes que eu possa ligar os pontos em minha cabeça em relação ao que está acontecendo, Ethan fala. “E quanto ao Número Quatro, vocês sabem a onde ele está?” Minha cabeça dói. O que está havendo? “Temos algumas pistas” – O Mog diz, expondo seus dentes cinza. “Não deve demorar agora, é apenas uma questão de tempo para que ele se mostre agora que o Número Três foi morto. Tivemos pistas na Flórida, mas tudo parece apontar para sua responsabilidade”. Não, não, não, nada disto está certo. “Provavelmente, sim”. Ethan concorda. “Nenhum de nossos olhos em Miami reportou algo, pelo menos”. A responsabilidade dele. O Mog falava de mim. Meu coração dispara pela minha garganta. Eles sabem a onde estou. Ethan trabalha pra eles? Ele é um deles? “E o Número Cinco?” – o Mog bastardo pergunta. “Eu presumo que o treinamento dele segue o planejado” – Minhas mãos tremem. “Ele permanece bem”, Ethan diz. Ele inclina a cabeça um pouco para o lado. “De fato, ele está aqui agora.” Um pequeno gemido escapa da minha boca. “Terei de te ligar novamente”, Ethan diz, apertando algo no teclado. O Mog desaparece. E eu também. Tenho que sair dessa casa. O que quer que esteja acontecendo, meu disfarce foi descoberto, e eu não posso me dar o luxo de ficar por aqui para descobrir mais coisas. Eu me atiro na porta da frente, mas está trancada. Meu cartão de acesso está no meu quarto, 46


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mas eu tenho a suspeita de que ele não vai funcionar. Eu me dirijo para a porta dos fundos, a que desliza que dá no pátio, a que nunca está trancada – mas que não vai mover. Eu pego uma cadeira próxima e a jogo contra o vidro, e acho que usei a força certa para estraçalha-lo. Invés disso, a cadeira apenas se quebra. De repente, a casa parece uma grande prisão. “A prova de bala”, Ethan diz atrás de mim. Eu viro pra trás, erguendo meus punhos, pronto para socar ele ou para usar minha telecinese contra ele. Ele apenas para ali desarmado com as mãos em sua frente, as mangas de sua camisa branca enroladas no cotovelo. “Se explique!” – eu grito com uma fúria que eu nem sabia que existia em mim. Estou cheio de adrenalina agora. “Olhe, não há motivos para lutarmos. Eu não quero isso, e ambos sabemos que não há chance alguma de eu tentar vencer você –” – ele dá um passo pra frente eu o mando pra trás, em direção ao sofá cinza na sala de estar, e ele cai sobre a mesa de centro de vidro. Quando ele olha pra cima, ele parece estranhamente agradecido. “Eu mereci isso”. “Se explique!”, eu digo de novo. Não é tão alto, mas é intenso. O que ele fez? O que eu fiz? Ethan se levanta devagar e se senta no braço do sofá. Ele tira um pedaço de vidro da sua mão, estremecendo ligeiramente. “Tudo bem”, ele diz. “Vamos ser honestos um com o outro pelo menos uma vez” Eu concordo. Ele respira fundo, e começa a falar. “Eu não sou um ladrão ou um playboy criminoso ou algo do tipo. Não originalmente, pelo menos. Isso foi apenas um disfarce que criei para mim. Temos tantos laços com as pessoas que andam por essa cidade – tanto os criminosos como os policiais – que foi fácil me implantar aqui”. “Como foi que você me encontrou?” – é tudo o que eu consigo falar. “Você voou para a costa ano passado. Aquilo que fez chamou a atenção. Talvez não pela mídia ou pela polícia, mas as pessoas falam. E nós estávamos ouvindo”. “Quem é você? Você não se parece com um Mog”. “O que sabe sobre os Recepcionistas?”

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Essa palavra me traz memórias de Rey falando. Uma imagem de nós no Canadá aparece como um flash na minha mente, eu deitado na cama e meu Cêpan me contando sobre a nossa fuga de Lorien. Ethan apenas continua falando. “Os Recepcionistas foram humanos que receberam os Cêpans quando chegaram pela primeira vez na Terra. Eles ajudaram na transição da Garde para a vida aqui. Algo assim”. Garde. Cêpan. É tão estranho ouvir essas palavras saindo da boca de Ethan – palavras que eu mantive escondidas por tanto tempo. “Certo”, eu digo. “O que isso tem a ver com você?” “Era pra eu ser um deles”. “Você é um Recepcionista?” “Eu fazia parte da mensagem desse homem chamado Malcolm Goode... você sabe essa parte não interessa. O que interessa é que eu previ o futuro. Eu conheço poder – conheço potencial – quando eu vejo. Essa parte de mim é verdadeira. E eu pude ver que não haveria maneira do esquadrão de crianças de Lorien sonhar em derrotar o exército Mogadoriano. Então quando os Mogadorianos vieram à Terra a procura de vocês, eu fiz um acordo com eles. Em troca do meu serviço, eu seria poupado. O futuro da Terra pertence aos Mogs, e quando eles tomarem o poder eles irão se lembrar de que eu os ajudei”. Ele soluça um pouco, e quando ele fala de novo é mais pra ele do que pra mim. “Eu fiz a escolha certa. Os Recepcionistas não tiveram uma vida boa desde então”. “Você me vendeu para sobreviver”, eu digo quietamente, voltando para a porta. Meus olhos observam lá fora. De repente eu percebo o que isso significa. “Eles estão aqui para me matar, não estão?” “Wow, wow”, Ethan diz, levantando suas mãos novamente, uma delas sangrando por causa do corte. “Você não entendeu. Eu não estou ajudando ele para entregar você para que o matem. Eles não querem te machucar. Eu estou ajudando eles treinando você. Você vai mandar aqui, Cody. Os Mogadorianos querem uma aliança com você”. Fico de boca aberta. “O que?!” – eu pergunto estupidamente, mas é a única coisa que eu consigo falar agora. “Os Gardes não têm chance” – Ethan diz. “Você ganhou outra cicatriz, certo? Agora restam seis de vocês. Os Mogadorianos têm um exército gigante – bolas, eles têm mundos a sua disposição. Você realmente acha que Lorien possui alguma ameaça? A Terra poderia vencê-los?” Eu não respondo. Apenas fico parado tentando entender tudo o que está havendo. “Por que eu?” 48


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“Eles têm outros. Número Nove está sobre a custódia deles agora mesmo – mas ele não tem personalidade de liderança. Eu sei, porque eu o conheci. Você é o único que tem. O poder e a fome. Tudo isso – essa casa, os empregados, eu te treinando – tudo foi feito pra você. Para te tornar mais forte”. “Vocês têm o Nove?” – minha mente corre. Por muito tempo a Garde tem sido histórias e cicatrizes – é realmente um choque ouvir que Ethan conheceu um deles. “Sim”, Ethan diz. “Você não gostaria dele. Ele é arrogante e estúpido. Um garoto bonito. E você sabe onde ele e o Cêpan dele estavam enquanto você estava na praia tentando sobrevive? Em um apartamento gigante em Chicago. Vivendo na luxuria. A vida que você deveria estar levando – e tem levado desde está a meus cuidados”. O último ano da minha vida foi uma mentira. Não me senti caçado por eles durante um ano – quando na verdade eu estava aos cuidados deles. “Mas...” – eu enrolo as palavras – “Rey... meu destino...” “Seu destino é o que você faz dele” – Ethan diz. Ele dá um tapinha em algo no bolso da calça e eu posso ouvir um clique metálico na porta atrás de mim. “Você está livre para ir se quiser, mas pense no que isso significaria. Três estão mortos. O resto de vocês vai morrer com o tempo. Você pode morrer com eles, por alguma luta herdada, uma luta que você foi forçado a participar, ou você pode viver como um rei. Os Mogs te darão a Terra. Eles o darão o que quiser. Você cresceu pensando neles com o seu inimigo, mas isso é porque foi criado assim. É uma forma estranha de lavagem cerebral. Tente pôr as coisas na perspectiva. Os Mogs não são seus inimigos. Eles são sua chance de sobrevivência”. Não. Antes que Ethan possa dizer algo a mais, eu uso minha telecinese para abrir a porta atrás de mim, e subo para o céu. Por um momento, me preocupo se algo vai me acertar, armas ou lasers escondidos nas árvores na propriedade de Ethan – mas nada me impede de ir embora. Eu voo sobre a água, baixo o suficiente para que ninguém me veja. A Garde. Ethan. Minha mente está uma bagunça e eu não consigo pensar direito. Não ajuda estar cercado apenas pelo oceano agora, o que me traz lembranças da canoa de Rey e de ficar perdido no mar aberto, perto da morte. Como pode ser possível todas as coisas que eu fiz estarem erradas? Eu voo de volta para meu ponto de partida – a quilômetros de distância da casa de Ethan – para eu tentar me acalmar e pensar racionalmente. Eu pouso no prédio mais alto de Miami, e vou para a beira do telhado. E ali eu sento, e tento dar sentido as coisas. Tudo na minha vida após eu ter caído na praia de Miami pode ter sido planejada pelos Mogs. Bem, quase tudo. Deve ter demorado um pouco para os boatos sobre mim

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terem se espalhado. Tudo após ter conhecido Ethan na praia pode ter sido planejado, porém coisas antes disso talvez não. Como Emma. Ela sabia sobre mim? Era ela uma isca para que eu chegasse até Ethan? Ela fazia parte do plano deles? Por algum motivo, as respostas para estas perguntas vagam na minha mente. Quando ela me chamou de monstro, foi porque ela realmente achou que eu era um, ou ela disse porque foi ordenada a dizer? Eu pego a pequena bola de borracha do meu bolso e a rolo na palma da minha mão. É a única coisa que me restou do passado... Isso e... Merda. Minha Arca Lórica está no meu quarto na casa de Ethan. Claro que eu esqueci. Eu sou um completo idiota. Rey ficaria furioso se ele estivesse vivo e soubesse que eu a esqueci como fiz no ataque falso dos Mogs na ilha. Mas Rey não está aqui. Não foi nem um Mogadoriano que o matou. Foi esse planeta. Ou o próprio corpo dele. Rey não está aqui. Ninguém está. É apenas eu. Estou sozinho de novo. Meus pensamentos voam para os outros Gardes. Os Mogs têm o Nove. O que significa que que só restam cinco de nós livres e vivos. Cinco de nós contra o mundo. Contra vários mundos Eu me pergunto de Ethan pode estar certo. Talvez o último plano de Lorien de encantar um bando de crianças pequenas e depois manda-los para outro planeta nunca teve esperança de sucesso. Nós nunca pudemos questionar o que foi tudo isso ou se queríamos participar ou não. Ninguém nos perguntou se queríamos ser os escolhidos. Eu de repente me lembro de um file que assisti com Emma antes de tudo acabar – um filme de terror que rimos ao invés de ficarmos assustados. Havia uma ilha habitada por um culto e um homem estava preso lá. Ele e o resto da audiência sabia que as pessoas do culto eram loucas, mas esses não sabiam. Eles faziam parte do culto a vida toda e não sabiam que eles mesmos eram os caras malvados. Será essa minha história também? Queria que Rey estivesse aqui para dar sentido as coisas. Ele já está desaparecendo da minha memória. E as coisas vivas que eu me lembro são suas regras, ou seu desapontamento, ou sua tentativa de treinamento. E suas últimas palavras: Faça o que for preciso para sobreviver. Eu fico no telhado a noite toda. Já de manhã, eu não sabia qual seria meu próximo passo. E mesmo sabendo que eu não deveria – que provavelmente está sendo vigiada – eu vou para a praça onde eu conheci Emma. Eu fui até a barraca onde eu compre nossos 50


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lanches. O dono demora um pouco para me reconhecer pelo fato dos quilinhos a mais e do novo corte de cabelo. Quando finalmente me reconhece, se assusta. “Você viu Emma por aí?” Ele move a cabeça um pouco. “Ela foi embora” “O quer dizer com isso?” – eu pergunto. Meu coração se acelera. E se os Mogs mataram ela... “Sua família se mudou há alguns meses atrás. O irmão dela ficou internado no hospital por um tempo, mas quando ele finalmente saiu, eles queria recomeçar em outro lugar. Sua pele está ficando pálida. Penso que os Mogs apareceram atrás de mim, ou algo do tipo, mas então percebo que sou eu. Emma, ou os outros moradores devem terlhe dito o que ela viu. Sobre a aberração que eu era. O homem passa sua mão sobre sua testa e peito. Ele continua falando, mas eu saio andando. Eu vago sem rumo, a frustração invadindo meu corpo. Quatro outros Garde estão livres, mas estão escondidos, distantes. Provavelmente vivendo no luxo e aproveitando a vida como Nove. E aqui eu estou sozinho de novo. Esquecido. Começando de novo. Alguma coisa borbulha dentro de mim. Eu bato meu punho contra uma parede de tijolos de uma loja ao meu lado. E então, alguma coisa estranha começa a acontecer. Meu corpo muda. Eu posso senti-lo ficar rígido e pesado. Minha pele fica seca e quebradiço. Eu dou alguns passos para trás da parede e paro em um semáforo na rua. Eu entrelaço meus dedos nele para me equilibrar – porque estou tonto – e o agarro. O metal amassa sob meu toque. A pele muda novamente. Se torna cinzenta e brilhante. Eu tropeço pra frente, pulso acelerado. Eu me inclino sobre a vitrine de uma loja. E novamente eu mudo. Eu levanto minha mão. Eu posso ver através dela. Vidro. Eu me tornei vidro. Primeiramente eu penso que estou morrendo – talvez eu tenha sido envenenado de alguma forma. Mas cada passo que eu dou e cada material diferente que eu toco, se torna mais claro o que está acontecendo. Estou me transformando nas coisas em que toco. Minhas mãos tremem. Meus olhos aumentam e ficam secos. Tudo o que eu posso fazer é respirar com calma e diminuir o passo. Já está quase amanhecendo, e não muitas pessoas ao redor, mas isso vai mudar. Logo, haverá multidões por todos os lados. O que quer que esteja acontecendo comigo, eu não posso ficar na vista. Tenho que ir para algum lugar seguro. Um abrigo.

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Eu não quero ficar sozinho. Há apenas uma pessoa que eu conheço que pode me ajudar. Apenas uma pessoa, por hora. De alguma maneira eu consigo me tornar em um humano novamente, e então estou no ar, voando mais rápido do que jamais voei, sem se preocupar enquanto voo por cima da cidade. Quando eu caio na praia de volta na propriedade de Ethan, uma das empregadas me vê e corre lá para dentro. Eu tento ficar em pé na praia, mas eu estou desmoronando – não, desmoronado não, estou caindo ao que minhas pernas se desintegram, quebrando e me tornando em pequenas partes de areia. Estou virando areia. Eu grito quando começo a entrar em colapso comigo mesmo. O que está havendo? Eu me pergunto freneticamente. E então, outro pensamento, mais tenso me ocorre. Eu vou morrer como um monte de areia numa praia. “Cody!” – alguém grita. É o Ethan. A empregada deve tê-lo chamado. Meu tronco está desmoronando agora. Eu tento gritar para Ethan mas a única coisa que escapa da minha garganta é um ruído seco. Eu estico o braço mas ele já está começando a se desintegrar. Ele corre em minha direção, agarrando a minha mão da melhor maneira possível, mas a maior parte dela escapa pelos dedos dele. Parte de mim toca o relógio dele e começo a me solidificar de novo, desta vez em um dourado brilhante, o resto do meu corpo segue o padrão. Meu coração pula no meu peito, e por um momento, parece o som de um metal, batendo contra uma caixa de metal. Isso faz com que eu enlouqueça mais ainda, e eu não consigo respirar direito. “Se acalme...” – Ethan diz – “Isso é...” – ele luta para encontrar a palavra certa. “Eu acho que você está desenvolvendo novos poderes ou algo do tipo”. “Se acalme? Ele tá zuando?” “Respire, Cody” – ele diz. Eu quase grito pra ele “você sabe que esse não é meu nome”, mas eu me controlo. A empregada volta. Ela entrega uma pequena bolsa preta para Ethan. Ele diz alguma coisa pra ele que eu não ouço enquanto continuo tendo o ataque de pânico para acabar com todos os ataques de pânico. Ele pega um pequeno frasco da bolsa. Ele o divide em dois e coloca na minha cara. “O que –” – eu começo. “É apenas uma coisa para te ajudar a relaxar” – ele diz. Um tipo de fumaça branca sai do frasco e eu começo a me sentir tonto e drogado. “Aqui vai você” – ele completa. 52


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Ele segura minha mão para me ajudar a ficar de pé, e eu não sei se é a fumaça estranha ou se eu realmente virei humano novamente – em carne e osso – e não parecendo um robô de metal dourado. Antes de eu ter certeza, é difícil pensar em algo – até de sentir alguma coisa – e tudo o que eu vejo se torna preto.

Quando eu acordo, eu espero estar trancado de alguma forma, mas estou apenas deitado em cima da cama. A janela está até aberta. Minha mochila está ao meu lado e minha Arca Lórica ainda está aqui. Ethan está sentado em uma cadeira no pé da cama. “Boa tarde”, ele diz. Sua voz está hesitante, como se ele não soubesse como agir. Ou como eu vou reagir. Eu olho em volta, colocando a alça da minha mochila nos braços. “O que você me deu?” – eu pergunto, pensando na fumaça branca duvidosa. “Nada ofensivo”, ele diz, “apenas um tranquilizante. Eu temia que você machucasse a si mesmo se não parasse de se transformar”. Meu coração começou a bater furiosamente quando eu me lembrei da sensação de se desintegrar na praia. “Não”, Ethan diz com seu maior tom de autoridade. “Se acalme, respire devagar. Você não quer começar a mudar de forma novamente”. Eu balanço a cabeça, tentando me focar em respirar lentamente. Há um resíduo da droga estranha. Eu me sinto focado e em alerta, mas relaxado. As sobrancelhas de Ethan são juntas. Ou ele está genuinamente preocupado comigo ou ele é realmente um grande ator. Eu não sei qual é o caso a essa altura. Ele coloca os braços para os lados. “Tenho certeza que você tem um monte de perguntas” – ele diz, “somos apenas eu e você” “Como se eu devesse acreditar em você” “É importante para eles que você vá de pura vontade própria. Isso faz sentido. Os Mogadorianos não querem alguém que eles forçaram a se juntar a eles. Eles querem alguém que queira fazer parte da causa deles”. “De boa vontade?” – eu murmuro. “É assim que você chama todas as mentiras que me contou?” Ethan franze as sobrancelhas. Eu aperto as alças da mochila. Eu posso sair pela janela em instantes se for necessário. Mas a maior parte de mim realmente quer conversar com Ethan, para

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descobrir porque ele fez essas coisas. Para responder todas as perguntas que estão gritando na minha mente. “Emma fazia parte disso?” “Emma”, Ethan diz com um olhar franzino. “Não, ela não sabia de nada que estava acontecendo. O homem que te atacou no armazém era parte disso, mas eu realmente não tive ideia de que o irmão dela era um deles. Eu acredito que a família dela teve de se mudar para Tampa desde que você chegou aqui. Continuamos a observa-los. Eu posso trazer ela aqui se você quiser”. “Não quero”, eu digo. Tudo isso concretaria o ódio que ela sente por mim – ela me chamando de aberração – foi de verdade. Ela não era realmente minha amiga. Eu me pergunto se é assim como os humanos reagem a Legados e superpoderes como os meus. “Você encontrou Emma sozinho. Tudo o que eu fiz foi cutucar você. Deus, tudo o que eu fiz foi aparecer na praia e te dar uma oportunidade. Você veio para nós. Você apenas não sabia quem éramos”. Ele se inclina um pouco. “Pense um pouco. Os lorienos nunca deram a você a chance que estamos dando. Eles colocaram um feitiço em você e te mandou para longe. Eles te disseram quem você deveria ser. O que estou lhe oferecendo é diferente. Uma maneira melhor” “E quanto aos outros Gardes?” Eles sentem um calafrio. “Talvez eles aprendem a ver o certo também” “E se eu for embora?” “Eu não vou te impedir”, Ethan diz, parecendo falar muito sério. “A última coisa que eu quero é ver você se machucando. Mas se você sair eu não vou poder protegelo novamente. Se você negar esta oferta, você se torna o inimigo. Você não estará salvo aqui. Você deve ter descoberto já, que essa não é a minha casa. Os Mogadorianos a preparam para isso”. “Se eu sair, você terá falhado na sua missão, né?” – eu pergunto. Ethan assente. Eu sei o que isso significa. Eu ouvi histórias suficientes sobre a crueldade dos Mogadorianos para saber que eles não toleram falhas. Se eu sair, posso considerar Ethan um homem morto. Eu olho pra ele. Tudo aconteceu tão rápido. Tudo mudou tão rápido. “Eu conheço você, Cinco” – Ethan diz. “Como você gosta de sentir que está no controle e de ser respeitado. Você pode sentir isso para sempre quando estiver governando com os Mogs. Eu vi o poder deles. É incrível. E eles querem que você faça parte disso. Eles querem que você troque de lado, que seja um deles”. 54


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“Tudo lá fora pode ser seu” – eu digo, citando uma das frases de Ethan. “Tudo mesmo”, ele diz. Eu fecho os meus olhos. É muita coisa para mim. Mas o que Ethan diz faz sentido. Pelo menos, a maioria. Os Anciões me deixaram com um homem velho para me proteger. Os Mogs me treinaram e me deram tudo o que eu quis. Me preparam. Eles são os que me mostraram respeito em toda a minha vida. São eles que podem me manter vivo. Eu penso nos outros Gardes, na vida fácil que eles provavelmente tiveram. Com Cêpans competentes. Lares em cidades. Algum dia no futuro eles vão tipo, olhar para mim e me dizer que eu traí eles. Mas quem sabe? Talvez eles vejam o motivo. Se eu apenas pudesse falar com eles, talvez eles começariam a ver as coisas diferentes. Por que devemos ser caçados como animais quando podemos governar? Os humanos não têm poderes como os nossos. Eles acham que nós somos aberrações. Monstros. Nós poderíamos mostrar a eles nosso potencial quando estivermos juntos. “Okay”, eu digo lentamente. “O que fazemos agora?” O alívio toma as afeições de Ethan, e o seu sorriso aparece radiante novamente, o que só conheci agora. “Eu vou contar a eles”, ele diz. “Junte suas coisas. Eles vão querer conversar com você o mais rápido possível” Eu assinto, e vou para meu quarto. “Hey”, Ethan se vira para mim antes de sair. “Estou orgulhoso de você. Está fazendo a coisa certa. Você está sendo esperto. Este é o maior significado” Eu me movo rapidamente. Tenho controle do meu corpo, mas parece que há alguém controlando ele. Eu me pergunto se estou em choque. É assim que chamam na TV quando alguém está em uma situação louca como essa. “Estamos indo para o norte”, Ethan grita lá de baixo. “Pegue casacos” Eu pego alguns casacos de inverno do meu guarda-roupas – coisas que Ethan comprou pra mim que eu nunca tive motivo para usar. Então eu desço. Eu pauso e me viro. Eu pego minha mochila e minha Arca Lórica, e coloco na cama. Todas as coisas inúteis ainda estão aqui. Eu passo meus dedos sobre os itens antes de pegar a espada escondida. Serei esperto em manter isso à vista, caso entrarmos em problemas. Eu deslizo o bracelete sobre minha mão e pulso, e então visto uma luva. Apenas para precaução caso entrarmos em problemas. A um barulho estranho vindo da janela. Eu olho para fora e vejo um helicóptero preto pousando no jardim aberto do quintal.

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Capítulo 10 Já estamos dentro do helicóptero há muito tempo. É pequeno, porém rápido. Eu não sei quem é o piloto e eu não pergunto. Tudo o que eu sei é que temos que vestir esses de ouvidos enormes com rádios construídos por dentro, e essa é a única maneira de nós três – eu, Ethan e o piloto – podemos nos comunicar. Ninguém fala nada, e eu acho melhor assim. Estou muito ocupado tentando manter a calma, me focando nas gramas e ruas que passam abaixo de mim. Fingindo que os carros e caminhões são brinquedos. Ethan continua sorrindo, como se ele tivesse ganhado na loteria. Eu imagino que os Mogs vão recompensá-lo de alguma maneira por ter conseguido me recrutar. Eu começo a lembrar de tudo o que ele fez e falou no último ano, mas eu tenho que parar. Toda vez que eu começo a fazer isso, eu começo a me questionar. Então, eu apenas começo a observar as nuvens e as cidades e pastos que passam rápido abaixo de nós, tentando não pensar no que vai acontecer daqui a pouco. Eu respiro fundo, e mantenho minhas mãos juntas, tentando não enlouquecer pelo fato de que estou a caminho da Central Mogadoriana. Por alguma razão eu acho que eles vão me levar para algum tipo de nave alienígena, ou para alguma mansão antiga Gótica, mas nós pousamos em um prédio grande e estéril. Ainda está escuro aqui fora, mas pelo que eu posso ver, o lugar parece um escritório enorme – nem se parece com o tipo de QG que eu pensei que os Mogs estariam usando. Homens com ternos pretos nos recebem na porta. Eles parecem humanos o suficiente – cumprimentam com a cabeça – quase uma reverência – a mim quando nós aproximamos. Eu tento não tremer, o que necessita muito esforço. Tudo é novo e diferente e assustador, e por alguns momentos tudo o que eu quero é estar sentado na praia na minha pequena ilha, mesmo que, nesse ponto, eu não conseguiria encontrá-la se eu tentasse. “Seja bem-vindo, senhor” – ambos dizem. Já dentro, somos escoltados por um serviço de recepção ao redor da segurança. Eu percebo um letreiro na parede enquanto passamos: Investigação Federal de Bureau. “Isso é como uma instalação governamental?” – eu sussurro a Ethan. “Eu te disse”, ele responde. “Eles estão de olho em tudo. Eles têm recursos em qualquer lugar” Ele pisca pra mim, embora esse fato seja tão impressionante quanto inquietante. Estou começando a ver o quão inútil foi toda a movimentação escondida. Nós continuamos por mais alguns halls, descemos um lance de escada, e fomos ao que parece ser um subsolo. Finalmente, chegamos a duas portas, uma ao lado da outra. “Você nessa aqui” – um dos homens diz me apontando a primeira porta. Então ele se vira para Ethan. “Você nessa outra”.

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“Espere,” eu digo, dando um passo pra frente. Eles não podem nos separar. Eu não quero estar sozinho aqui. O pânico começa a tomar conta de mim. Eu posso sentir minha pele começar a mudar, assumindo as propriedades das alças da minha mochila, de couro e suave. “Por que não podemos –“ “Está tudo bem”, Ethan diz com o tom de voz mais calmo que pode. E funciona, porque começo a me acalmar. “Eles apenas querem conversar com você. É provavelmente uma classificação de informação. Está tudo ok, você é o VIP, não se preocupe” Eu assinto relutantemente. Ethan desaparece na porta em que foi lhe apontado. Eu paro no vão de entrada por alguns segundos antes de um dos homens limpar a garganta. Eu lanço um olhar irritante a ele e então entro. É o tipo de sala que eu reconheço por ter assistido muitos filmes criminais da TV a cabo no ano passado. Está vazio, exceto por uma lâmpada balançando, poucas cadeiras, e uma mesa de metal grande no centro da sala que parece que poderia se duplicar como uma mesa de cirurgia. Uma sala de interrogação. Eu engulo seco. “Por favor, se sente”, alguém diz. Eu me viro e vejo o Mogadoriano que Ethan estava conversando no vídeo conferência secreta ontem à noite. Seu cabelo preto brilhante reflete a luz oscilante, olhos negros brilhando. Seus lábios se espalham pelos seus dentes cinza. Ele tem quatro metros de altura, pelo menos. “Estávamos aguardando você, Cinco”, ele continua sua voz rica e baixa enquanto ele se aproxima de uma das cadeiras. Eu hesito, e então me sento. O Mog senta-se a minha frente. Eu estou sentado perto de um Mogadoriano. De repente, começo a me lembrar de todas as histórias que Rey me contou. Como os Mogadorianos invadiram, e sobre todos os terrores que eles levaram a nosso planeta. Você pensaria que e eles são monstros – porém esse cara é definitivamente assustador e intimidante, ele não se parece muito diferente de mim, considerando os fatos. Ainda assim, é difícil pra mim manter meus dedos quietos em cima da mesa. Eu coloco minhas mãos pra trás, cruzando meus braços. É então que eu sinto a Luva Lórica e sua espada. Rey sempre me diz que se eu fosse pego eu seria torturado. Se isso tudo – um setor inteiro para tentar me torturar – eu serei rápido o bastante para usar a espada e escapar? Destruindo o Mog ou a mim mesmo? “Estamos muito satisfeitos com sua decisão de se juntar a nos, jovem lorieno” – o Mog diz. “Eu não tenho muitas escolhas se eu quiser viver” – eu digo.

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“Um garoto inteligente. Eu sempre soube que estaríamos certo em apostar em você. Se mais da sua espécie fosse capaz de ver a verdadeira extensão da nossa força e da inevitabilidade das leis Mogadorianas, poderiam ter sido salvas muitas das baixas” “Você esteve em contato com os outros?” – eu pergunto. “De certa maneira” “Qual é o seu plano? Você vai ir atrás de Quatro agora?” “Baseado no feitiço que protege todos vocês, isso faria sentido”, o Mog diz, sorrindo amplamente, expondo os dentes horríveis mais uma vez. “Claro que o feitiço tem seus limites. Quantas vezes você acha que ele vai funcionar até finalmente falhar? Temos tantos soldados e olheiros dispostos a testar a longevidade da magia, o prazer de morrer em nome de garantir o nosso futuro” Ele vai tentar me matar, eu penso. Em um instante, eu tiro uma das luvas e coloco uma das mãos na mesa. Acontece como um instinto. Eu não tenho treinando meu mais novo Legado, mas eu arrisco. Claro que, minha pele se torna prateada ao que eu absorvo as propriedades do metal. Isso deve me comprar algum tempo se ele for tentar me matar. O Mogadoriano sorri. “Ah, não se preocupe. Temos outros a quem podemos testar a teoria. Não é obvio agora que temos preparado um futuro mais brilhante pra você? “Você tem outro Garde aqui?” – eu ouvi Ethan dizer que Nove estava mantido em cativeiro. A ideia de encontrar outro do meu planeta aqui faz meu pulso aumentar. Eu não quero fazê-lo. Não agora, pelo menos. Eu não poderia conhecer eles como alguém que os traiu. Não até eu ficar mais forte, até que eu tenha minha cabeça no lugar e que tenha algum sentido nela. “No devido tempo, você aprenderá todas as maneiras que temos assegurado ao nosso sucesso de extermínio da Garde. Mas não podemos sair contando pra você todos os nossos segredos agora, podemos? Não se você estiver planejando se virar contra nós e voltar para o lado da Garde. Você deve provar sua lealdade para nós antes de continuarmos”. Eu hesito, e me concentro em minha respiração. Acalmando-me. Meu corpo volta ao normal, e eu coloco as palmas da minha mão sobre a mesa a minha frente. “Um Legado muito útil”, o Mogadoriano diz, “Ethan não o mencionou nos seus relatórios” “É novo”, eu digo, “muito recente” Ele apenas assente.

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Os Legados do Número Cinco Tradução: Lorien RJ (Cherles Belem, Jadson Júnior, Johhn Delli, Ane Souza, Gabriela Gatti)

“Nós podemos te ajudar com isso. Com todas as suas habilidades. Com o tempo em que vamos treiná-lo, você será um dos mais fortes jogadores do nosso time. Não há nenhum lugar nesse planeta que valerá a pena você governar” Alguma coisa desperta em mim. A memória de um lugar. Um destino o qual eu nunca escolhi. “Canadá”, eu digo. “Desculpe-me?” “Canadá. Eu gostaria de governar o Canadá”. O Mogadoriano parece confuso por alguns momentos, e então sorri. “O que acha de governar toda a América do Norte? Para começar” Eu movo a cabeça. Não sei outro jeito de me expressar quando sou oferecido a governar um continente. “Mas primeiro, sua lealdade,” ele continua, “esse é o tipo de acordo que geralmente é selado com sangue” Sangue? “O que você quer que eu faça?” O Mogadoriano vira a sua cabeça, indicando a sala de Ethan. “Ele tem nos servido bem” “O quê? – eu pergunto. Ethan? Meu estômago se embrulha. Claro que isso não significa o que eu acho que significa – que ele quer que eu mate a única pessoa que eu tenho no mundo. Minha voz ameaça a tremer. “Não, não, caro garoto. Não estamos pedindo para que você machuque Ethan. Aquele humano tem nos servido bem. E cumprimos nossos acordos. Eu simplesmente quis dizer que Ethan passou pelos mesmos testes que você terá que passar no futuro para provar suas intenções para nós. Sua lealdade a ele é louvável, mas teremos que deixar você resolver” Eu exalo longamente. O Mog coloca uma pasta sobre a mesa. “Haverá um sacrifício para nós. Não imediatamente, mas quando estiver preparado. Quando terminarmos o seu treinamento, e ajudado a você a destrancar todo o seu potencial. Há uma foto do seu alvo aqui”. Ele desliza a pasta sobre a mesa. “Você gostaria de ver quem é?”

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Os Legados do Número Cinco Tradução: Lorien RJ (Cherles Belem, Jadson Júnior, Johhn Delli, Ane Souza, Gabriela Gatti)

Eu não toco o documento. “Estamos te oferecendo o mundo, Cinco. Prove a si mesmo, e nós faremos de você um deus nesse planeta. Se você está disposto a se juntar a nós, é assim que tem que ser. Não apenas como a prova de sua lealdade, mas a prova de que você vai agir de acordo com as Leis de Mogadore. Há muito para vir. Não temos lugar para os mais sensíveis” E se eu não fazer, ele provavelmente vai me prender em uma cela e me torturar. Ethan também. Isso ele não diz, mas eu sei que é verdade. Por um momento esse cenário me parece estranhamente familiar. Minha mente tem flashbacks da nossa cabana na ilha. Os porcos agindo descontroladamente, praticamente gritando no seu chiqueiro. A cobra amedrontada, levantada à meia altura do chão, como uma mola, pronta para atacar. Rey me dizendo para matá-la antes que ela nos machuque. Era a cobra ou nós. Teria de ser daquela maneira. As memórias parecem tão distantes. Tão longe. Eu simplesmente fiquei parado ali, sem querer fazer nada. Esperando que tudo desse certo de alguma maneira – que o perigo ia ir embora sozinho. Mas não é assim que o mundo funciona. Não adianta ficar sentado esperando o perigo vir até mim. Pelo menos com os Mogs, eu vou conhecer o perigo. Eu serei o perigo. Faça o que for preciso para se manter vivo. As últimas palavras de Rey para mim. “Tudo bem”, eu digo. Minha voz treme um pouco, e eu tento controlá-la enquanto continuo: “Se isso é preciso para que eu prove minha aliança” O Mog sorri. Eu olho para a pasta. Eu não preciso abri-la, mas eu percebo que – como muitas outras coisas na minha vida – é um teste. Para ver se eu tenho estômago para o que vai vir. Eu vou ter que me acostumar com esse tipo de coisa. Ficar mais forte. Os Mogs não vão me mimar – disso eu não tenho dúvidas. Eles são implacáveis e poderosos. É nisso que eu tenho que me tornar. Eu respiro fundo, e abro a pasta.

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