Diario de campo mesquita

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Comunidade Quilombola Mesquita Caixa Postal 237 – CEP 72880-990 Cidade Ocidental - GO Informações: Associação Renovadora do Quilombo Mesquita

Sandra Pereira Braga: tel (61) 9839 1938 sandrabragatur@gmail.com Célia (61) 9934-9374 Quilombo Mesquita 31-5 a 04-06-13 Tivemos que fazer um concentrado, pois na semana todo mundo trabalha ou tem escola. Mas deu pra entrevistar os personagens principais ou mais ativos, – pegamos uma reunião do quilombo, devolução da oficina – “sonhos do quilombo” – ou uma oficina onde aos participantes se colocou a questão- o que você pretende que seja ou aconteça a este quilombo no futuro? – entrevistamos a liderança, alguns dos mais velhos, fizemos roda de jovens, e das pessoas que trabalham no viveiro e na associação, -e até entrevistamos uma pessoa que é contraria a tudo isso de quilombo. – uma entrega de produtos dos produtores (PAA) e a recolhida pelas entidades e escolas, - – visitamos a escola e o posto de saúde do quilombo, Também conversamos com representantes das Secretarias da Educação e da Assistência Social da Cidade Ocidental. 31/maio- em Brasília. 01/06 Reunião breve com Sandra Pereira Braga, da Associação Renovadora do Quilombo Mesquita e Isis Albuquerque, diretora do Grupo Teatral Prof. Zilda Dias, que tem sede em Brasília. Isis acompanha Sandra nas batalhas com os quilombolas – foi Delegada na 1ª. E 2ª. Conferencia de Cultura para a igualdade social, participa da CONAQ (Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas), da Rede Mocambo e da Federação de umbanda, terreiros Isis, fala da dificuldade que os negros quilombolas tem dificuldade para se assumirem. E também reclama de quem procura (estudantes e pesquisadores) os quilombos vem com a expectativa de encontrar ainda as pessoas vivendo em casa de pau a pique, e sem qualquer atualização com a realidade presente. Lembra que aos negros foram tirados da escravidão, mas não lhes deram oportunidades de cidadania. O negro continua ainda com essa visão diminuída, alguns superam isso e se afirmam. Isis tem trabalhado com a inclusão pela arte nos quilombos, e tem um grupo de atividades. Conta que em uma das oficinas alguém lhe perguntou “quem é esse rapaz na sua camiseta? (...) (era Zumbi) Você pode trazer esse Zumbi aqui, pois eu não conheço” – isso dentro de uma oficina em um quilombo. Ninguém sabia a história de Zumbi. Precisamos organizar formação sobre isso!


Diz que na CONAQ estamos com uma questão séria – a falta de estimulo aos jovens, embora tenham crescido dentro desse movimento por igualdade racial, que se sentem desanimados pela demora, pelas perseguições que sofrem os quilombos. Ida ao Quilombo Mesquita No quilombo estava agendada uma Reunião com as pessoas participantes da Associação Renovadora do Quilombo Mesquita. O encontro nesta Associação constou principalmente da exposição dos resultados da oficina que houve com integrantes do quilombo– “linha dos sonhos do quilombo” – ou uma oficina onde aos participantes se colocou a questão- o que cada um quer seja ou aconteça a este quilombo no futuro? Com a exposição dos desejos mais enfatizados na oficina ocorre também um grande debate entre os presentes. Entre as prioridades definidas na oficina ‘linha dos sonhos do quilombo’ se destacam: a) Festas. Propõem uma festa junina, em 13 de julho, com motivações quilombolas, com comidas típicas e celebração do reconhecimento do quilombo, que completa sete anos Pretendem celebrar com as histórias dos idosos, memorial de fotos, vídeo do quilombo, implantação de coleta seletiva de resíduos, trabalhos da questão ambiental, preparação das placas identificadoras do quilombo. E em agosto tem a Festa Folias de Na. Sra. da Abadia, b) Construção do galpão destinado a abrigar os produtos que vem para o programa do PAA. Na área comunitária. Segundo Sandra, o Sr. Emanuel, um amigo do quilombo que comprou um terreno e doou para a área comunitária, que consta de uma casa com dois cômodos, cozinha, onde organizam o recebimento dos produtos dos moradores destinados ao programa do PAA. Tem também um espaço do viveiro de mudas e áreas externas plantadas. Há um projeto de ampliação da construção dessa área com um galpão para facilitar a organização da entrega do produto, e também em promover uma escola para os quilombolas jovens e adultos com cursos de formação, além de cursos de costura, artesanatos, etc. c) Reforma da igreja pequena que foi construída pelos velhos Alípio, Malaquias, vovô Dito, Telvino, Sinfrônio, Jacinto, Zé Grilo, em mutirões – a proposta é de fazer uma força tarefa também em mutirão pra recuperar a igreja. Uma igreja originária foi construída pelos mais velhos, e no mesmo terreno há uma igreja católica maior d) Reforma do casarão, preservação. A proposta é de tombamento do povoado, da igreja e algumas casas, como herança do povo do Congo. Informam que quanto à preservação cultural – Existe o dinheiro no Ministério da Cultura, destinado a tombamentos da cidade, preservação do patrimônio e da memória, através do IFAM que é independente. Tem que saber como enviar os projetos.


Em todos os discursos há sempre a fala dos moradores que são contra a titulação do quilombo. E nessa reunião todos falam contra essas pessoas, que não conhecem a história do seu povo, dos preconceitos sociais e também dos direitos a que tem direito. Uma das falas foi de Edson Gomes, arquiteto, casado com uma mulher do quilombo, vive em Valparaíso e colabora com o quilombo. Trabalha também junto ao projeto Bartô, Projeto Rio São Bartolomeu Vivo, para onde também vão algumas pessoas do quilombo. Dialoga com Sandra que fala do documento de reconhecimento e que anuncia que vai providenciar copias e distribuir para cada um dos quilombolas; e também anuncia que agora saiu um decreto de que os quilombolas tem direito de cursar uma faculdade que escolha. Edson faz uma grande intervenção sobre os direitos dos quilombolas e da necessidade de se organizar melhor enquanto quilombo. Diz que pesquisou a origem de algumas pessoas do quilombo, em particular a sua esposa, que vieram do Congo – e como esse povo chegou até ali; nesse lugar tinha muitos indígenas, que sobreviviam, criavam as suas ferramentas. Depois fala do Zumbi, e dos muitos quilombos que houve pelo país todo. Também descreve a luta de Mandela em África do Sul. Lê muito sobre a cultura negra. Dá uma força para a atividade de todos em buscar melhorias. Sandra fala que quando se candidatou como vereadora, houve gente do quilombo que recebeu propina para ser contra. Sandra Braga expondo sobre o quilombo de Mesquita: 86 famílias que seguraram a propriedade e no total 785 famílias registradas quilombolas pelo INCRA, que estão fora e terão direito de voltar. “Então 86 famílias garantiram a existência do quilombo”. E sobre as Lei e diretos do quilombo “nós não fizemos nada para ganhar isso, que foi herança dos nossos mais velhos. Mas agora está dito pela lei que temos esse direito”. Contam que houve vários enganos sobre a posse da terra, exemplo, o pai do Edson trocou as terras por um relógio, em outro lugar do estado. Outros trocaram por roupas, ou por dividas em armazéns. Alguém conta que JK quando veio pra fundar Brasília – veio na região, resolveu sair pra uma comunidade, visitou o Mesquita. Ai que ele conheceu a marmelada do local. Há ainda exposição de várias ideias de desenvolver – artesanato, de oficinas sobre as produções, o Telecentro – ainda não tem, estão buscando e também uma rádio comunitária para o quilombo. Dia 02-06-2013 1- Filmagem – depoimentos de Sandra Pereira Braga. 2- Filmagem de Sr. João Antonio Pereira / dois netos (Augusto Souza Braga, e Walison). Sr Antonio fala também sobre a marmelada – e o processo de como fazer, como plantar, podar e fazer mudas e fertilizar (com fertilizantes naturais), formar o pomar. Todo o processo feito manualmente, desde o plantio e sem agrotóxico. Sr. João diz “temos orgulho de ser quilombola e fazer esse produto”.


Faz um histórico de como chegaram os pés de marmelo que veio de Portugal... e depois alguém trouxe mudas até Santa Luzia, e que chegou ao quilombo. Na época do seu bisavô. Pai Benedito Antonio produzia e levava pra Trindade caminhões de marmelada pra vender. Finalmente, conta que o que acabou com o marmelo foi a plantação de soja, que traz uma doença para os pés de marmelo. Hoje o único lugar que tem essa plantação é no Quilombo de Mesquita. 3- Roda de conversa com jovens do quilombo Presentes: Wellington, 14 anos, Manuel, 14 anos e Felipe Pereira, 16 anos, estão ambos na 8ª. série da escola no Mesquita, Walison, 16 anos, e Larissa, 15 anos, ambos fazem o 1º. ano do ensino médio em Brasília, junto com a Natália, (eles viajam todos os dias). Uma constante de todos os jovens foi a afirmação de seu orgulho em ser quilombola. Pensam que terão que sair para estudar e que o seu futuro dependerá do seu esforço, e nesse sentido pensam em fazer medicina, veterinária, mas ainda será um processo de decisão. Danilo Magalhães: Neto do Sr. Malaquias Magalhães, chegou durante as entrevistas e contou que vinha da Argentina, onde representou o quilombo num curso de formação para militantes de base da Via Campesina. Estava muito eufórico com o aprendizado e com a possibilidade de travar conhecimento com jovens de toda a América Latina. Nelci Magalhães Pimentel, filha do Sr. Atalicio dos Santos Pimentel, que veio da Bahia, com o avô Malaquias Magalhães. Concluiu o ensino médio em Taubaté, e tem se dedicado à comunidade. Representa o movimento quilombola e a CONAC, também foi para o curso na Argentina, que considerou marcante. Entrevista do sr. Mauro, 87 anos. Sr. Mauro diz que nasceu na região, com a família muito pobre. O fazendeiro Dito Melo o pegou pra criar com idade de dois anos. E de lá saiu aos 27 anos para casar. Cresceu como subordinado, cuidando da fazenda onde trabalhou duramente durante todos esses anos. Casou com uma moça do quilombo e passou a plantar a meia. E diz que todo mundo plantava ‘a meia’ com fazendeiros da região. Sr. Mauro é muito animado e contou várias histórias. Ele é um dos plantadores de marmelo e produtor de marmelada do quilombo. Contou também toda a história da chegada do cultivo de marmelo até o quilombo. Diz que Mesquita era uma fazenda, do capitão português Paulo Mesquita que fugiu de Portugal de onde foi expulso. Diz que o sr. Machado adquiriu terras na região, mas o sr. Toninho Melo tirou as terras. Muito consciente na afirmação dos direitos do quilombo, diz que falta informações e também mais educação. Depois de várias histórias o Sr. Mauro pegou sua bicicleta e foi pra casa pedalando. Os trabalhadores do viveiro – José Roberto, Divino e Sandra


Sr. José Roberto Teixeira Braga, aposentado, é um dos que dá muita força aos trabalhos da associação e as atividades do viveiro e das mudas para reflorestamento, além de socorrer muitos moradores quando precisa levar algum doente até o hospital em Cidade Ocidental. É muito atuante em colaboração ao quilombo e diz que tem orgulho em ser quilombola. Diz que passou um tempo duro pra sobreviver e que aprendeu muitos remédios com as ervas e raízes. Citou as ervas mama-cadela e velamo branco. Conta que teve gente que veio do hospital desenganado e foi curado aqui no quilombo. O Sr. Roberto tem áreas de terra mais ou menos espalhadas – uma parte perto de sua casa onde planta; outra parte de suas terras não chega água porque na vazante, o córrego foi desviado pelo fazendeiro o que deixou sem água os demais moradores. O sr. Roberto, dono de um carro sempre em condições de vida no quilombo, foi quem gentilmente colaborou com o transporte da equipe de pesquisa pela região. Ao que somos muito gratos. Entrevista com Divino Xavier da Silva. Filho de João Xavier da Silva e Maria Pereira Dutra (falecida) nasceu e viveu no quilombo, e só saiu no tempo de servir quartel. Trabalha na cidade, mas volta todos os dias para o quilombo. Já trabalhou também em Brasília. Conta que antes quando adoeciam iam de carroça, bangûe. Diz que tem morador que não aceita ser quilombola, porque não sabe o que é uma tradição de um povo. Conhece outros quilombos onde os negros conseguem viver do que plantam. Tem uma área pequena no quilombo e pensa que com a regularização poderá ter uma área maior pra poder plantar. Entrevista com Célia Pereira Braga. Célia tem em casa um viveiro de plantas do cerrado e agora plantas ornamentais. Associa-se à Rede Bartô, que colabora na comercialização de plantas ornamentais, e trabalha aos sábados para a Fundação Banco do Brasil em permacultura e proteção do Rio São Bartolomeu, de Planaltina. Joaquim de Jesus Vieira, não é quilombola, e veio há uns dois anos quando arrendou e comprou uma chácara. Todavia trabalha com os produtores e colabora com a Associação. Dia 03-06-13 Registro do processo de entrega dos produtores na área comunitária. (as fotos dizem mais do que as palavras sobre sua produção) Eles tem uma lista de produtores cuja produção é pesada e anotada pela secretária da Rede Terra com colaboração de várias pessoas do quilombo. Para essa entrega ao PAA, existe uma lista de produtos que são demandados e cada produtor tem uma quota de até R$ 4.800,00/ano. Para o PENAI, são produtos diferenciados e lista mais restrita, pois destina-se à merenda escolar, e os produtores podem entregar até o valor de R$ 20 mil ao ano. Entrevistas com produtores quilombolas. Dia 04/06/13 Entrevista ao sr. Constâncio Pereira Braga, 86 anos, pai do sr. José Roberto.


Sr. Constâncio é filho de Benedito Braga e Da. Vitalina. Teve oito filhos, mais dois que morreram. Plantou durante muito tempo ‘a meia’ com fazendeiros da região. Atualmente planta mandioca, milho e verduras. Faz doce de leite e farinha, que vende. Conta que Luziânia foi um grande garimpo, que tem mais de 400 anos. O quilombo foi formado quando um bocado de negros fugiram do garimpo onde eram muito maltratados. Alguns foram mortos, outros fugiram, e entre esses alguns vieram para o quilombo. Diz que entre Cristalina e Omai tem quilombo criador de gado. O sr. Constâncio toca violão. Quando junta um bocado de gente da família gosta de tocar e dançar. Acha que antes eram melhores as festas, pois reunia só os vizinhos. Agora vem muita gente de fora. A entrevista foi interrompida por sua filha Jailma, que queria impedir conversa com ele, negou que fossem feitas fotos e gravação, e diz que o sr. Constâncio não lembra nada de escravo. Da. Jailma é uma dos moradores que são contra o processo quilombola, embora ela mesma produza alimentos que destina às trocas do PAA. – Entrevista com o Sr. Cesar Alves Rodrigues e Da. Teresa Teixeira Magalhães (esposa), e também intervenções do Sr. José Roberto Teixeira Braga. O Sr. Cesar nasceu em Luziânia, e conta que sua mãe ‘perdeu o juízo e seu pai morreu com 42 anos. Ele foi criado pela tia que morava na Fazenda Xavier (de Ana Antonio Benedito). A tia e sua família foram roubados de terra, e a tia e tios acabaram ficando como empregados da fazenda, onde ele também trabalhou até crescer. Da. Tereza é filha de Modesto Teixeira Magalhães e da. Josefina Maria de Jesus, que nasceu em Minas Gerais. Moram no Mesquita, em terras que veio do inventário da família de Da. Tereza, que a seu ver não foi muito bom. Sr. Cesar conta que a família que comprou a fazenda, aproveitou quando o pai estava mal no hospital e trouxe o cartório pra roubar as terras e acabou submetendo a sua tia como empregada Lá onde foi criado, a sua tia ficou na fazenda como empregado. Daí quando a sua tia foi pra casa de outro camarada, irmão dela, e outro tio que casou com uma mulher de Luziânia, e minha tia foi pra lá e criou meus irmãos. “Fui entender porque a Ana Antonio Benedito (sua tia) foi lá pra longe”. Conta que por ali houve muitos roubos de terra. O Sr. Cesar afirma e gosta de ser quilombola e inclusive foi um dos que foram visitar outros quilombos – e conta o que conheceu no quilombo de Cavalcante Considera que muitos não querem a demarcação das terras porque a partir disso não poderão mais vender as terras. O que o Sr. Cesar acha ótimo. ‘pois enquanto se tem a terra se tem como viver. Vender é uma ilusão – recebe algum dinheiro que logo se acaba’ O Sr. Cesar parece buscar constantemente novas informações e pensar sobre elas. Em um momento diz “Muita gente me já perguntou até que ano que estudei. Eu respondo “eu nunca parei”... Dia 05/06/13 Visita à Secretaria de Educação de Cidade Ocidental Sra. Lindinalva Rego dos Santos, chefe do depto de ensino fundamental. Falou das dificuldades da merenda (por direito em dobro para o quilombo) por problemas da gestão anterior. PAA- plano de Ação Articulada com a previsão das escolas dentro deste programa.


Visita à Secretaria de Promoção Social, de Cidade Ocidental. Fomos atendidos pela Sra. Francisca Eliete Bezerra Gomes, assessora. Cita que a secretaria tem apoiado a comunidade do Mesquita, as entidades afro e comunidades afrodescendentes. Projeto de cesta básica para a família e a implantação de CRAS – Centro de Atendimento à Saúde no quilombo.


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