InformANDES - Junho de 2017

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InformANDES SINDICATO NACIONAL DOS DOCENTES DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR - ANDES-SN

Informativo Nº 71 Brasília (DF) Junho de 2017

Função do Estado no capitalismo

Para barrar as contrarreformas

Impacto das armas “não letais”

Crise política no Brasil explicita o

Depois de levar mais de 150 mil

O uso, cada vez mais excessivo, de

papel do Estado burguês, sob tutela do

manifestantes à Brasília, centrais

armamentos “não letais” para reprimir

setor financeiro e produtivo, na defesa

sindicais intensificam mobilização e

manifestações tem impacto nocivo à

do Capital 6 e 7

chamam nova Greve Geral 8 a 10

saúde da população 11 a 13


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Editorial

Depois do Ocupe Brasília, uma nova Greve Geral!

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em os mais otimistas esperavam que o dia 24 de maio fosse tão vitorioso. Com mais de 150 mil trabalhadores e trabalhadoras, estudantes e ativistas, a grande marcha do #OcupeBrasília mostrou a ascensão da mobilização da classe trabalhadora, tanto no aspecto qualitativo quanto quantitativo. Organizada pelas centrais sindicais e movimentos sociais, a despeito da violenta repressão da polícia do Distrito Federal e da Força Nacional e da absurda criminalização feita pela mídia burguesa, a marcha elevou o patamar da luta de classe, contribuindo, de forma significativa, para a alteração da correlação de forças a favor dos trabalhadores e trabalhadoras. O aumento da pressão sobre o governo foi potencializado com as recentes delações dos donos da JBS, que atingiram o ex-presidente do PSDB, Aécio Neves, resultando no seu afastamento do Senado, e o ilegítimo presidente Michel Temer, acusado pela Procuradoria Geral da República de delitos de corrupção, obstrução da justiça e participação em organização criminosa. Mesmo depois da absolvição da chapa Dilma-Temer pelo Tribunal Superior Eleitoral, uma demonstração de cumplicidade do judiciário com a ilicitude praticada no sistema político brasileiro, o ilegítimo governo Temer está cada vez mais fragilizado e a possibilidade de sua queda aumenta a

cada dia, mesmo com as articulações da sua base aliada no Congresso, também envolvida em uma série de escândalos de corrupção, assim como boa parte da oposição. Nesse cenário, em que a conjuntura se acelera e escancara uma crise política entre as frações da burguesia, junto a uma forte crise econômica, os setores aliados ao capital e da oposição, cientes da fragilidade do governo, apresentam alternativas institucionais, que possam acomodar seus interesses imediatos, a fim de estabilizar o sistema político. Assim, diante dos desdobramentos da conjuntura e pelo papel e função que exercem, os movimentos sindical e social devem fortalecer as lutas contra a agenda regressiva em curso e em defesa dos direitos, inclusive se pronunciando e se posicionando sobre a crise institucional que ora se desdobra no Brasil. É importante que as forças do trabalho reafirmem a crítica às limitações das atuais regras da institucionalidade em nosso país, ao mesmo tempo em que realcem a imperiosa necessidade de não aceitação de qualquer tipo de substituição da presidência da República por via indireta. Nesse sentido, a última reunião dos setores das IFES e IEES-IMES do ANDES-SN, realizada no dia 8 de junho, repudiou veementemente qualquer tentativa de eleições indiretas, manobradas pelo Congresso Nacional e pelas elites brasileiras.

A aposta central de nossa luta deve continuar sendo barrar as contrarreformas por meio da mobilização popular e da Greve Geral – o que vai além das regras institucionais vigentes. A defesa do Fora Temer, a rejeição do projeto de conciliação de classes e as lutas contra as reformas e retirada de direitos devem estar nas ruas, junto com as bandeiras das eleições, sejam as “diretas, já!” ou as “eleições gerais com novas regras”, sem, porém, rebaixar nossa luta ao exclusivo âmbito institucional, gerenciado pelas regras e interesses dos grupos econômicos. Diante disso, a construção da nova Greve Geral, no dia 30 de junho, mais um passo no processo de lutas e reorganização da classe, exigirá de nossa categoria um esforço ainda maior do que o empreendido até aqui. Devemos nos empenhar em construir plenárias locais, municipais e estaduais para a construção da Greve Geral, participando de todas as atividades de rua, denunciando o projeto da burguesia de retirada de direitos e reforçando, nas ruas e na luta, a unidade da classe.

Greve Geral para barrar as contrarreformas Trabalhista e da Previdência! Não ao projeto de conciliação de classe! Nenhum direito a menos! Construir a unidade nas ruas! Fora Temer!

EXPEDIENTE O Informandes é uma publicação do ANDES-SN // site: www.andes.org.br // e-mail: imprensa@andes.org.br Diretor responsável: Giovanni Frizzo // Redação: Bruna Yunes Drt-DF 9045, Mathias Rodrigues MTb 10126, Renata Maffezoli Mtb 37322 Edição: Renata Maffezoli // Diagramação: Renata Fernandes Drt-DF 13743


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62º Conad

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Niterói sedia 62º Conad

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próxima edição do Conad estará inserida dentro de um novo contexto: as mobilizações crescentes da população brasileira para barrar as contrarreformas da Previdência e Trabalhista no Brasil. O 62° Conad terá como tema central “Avançar na unidade e reorganização da classe trabalhadora: em defesa da educação pública e nenhum direito a menos!" e será realizado de 13 a 16 de julho em Niterói (RJ). Segundo Gustavo Gomes, presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal Fluminense (Aduff - Seção Sindical do ANDES-SN) e membro da comissão organizadora do 62º Conad, a realização do encontro se dará em uma complexa conjuntura de intensificação de retirada dos direitos sociais, previdenciários, trabalhistas e, também, em um momento em que a classe trabalhadora brasileira se reencontra nas ruas em oposição às contrarreformas e ao governo de Michel Temer. “A força dos movimentos de mulheres, das grandes manifestações ocorridas nos últimos meses, do Ocupe Brasília e das greves gerais vai impulsionar a participação e o debate dos docentes em Niterói para que possamos atualizar nossa agenda de lutas”, disse Gomes. O presidente da Aduff-SSind ressaltou ainda a importância em fortalecer a unidade entre os trabalhadores, entre movimentos sindicais e sociais, para avançar na luta contra os ataque postos. “Será a unidade dos docentes com os demais segmentos da classe trabalhadora que garantirá nossa vitória e a manutenção dos direitos sociais duramente conquistados. O 62° Conad será de extrema relevância para essa construção”, destacou.

Niterói Com quase 500 mil habitantes, essa é a terceira vez que Niterói e, consequentemente, a Aduff-SSind recebe eventos nacionais do ANDES-SN. O primeiro ocorreu em 1985, no XXII Conad, e o segundo em 1994, no 29° Congresso. A escolha da cidade fluminense aconteceu durante o último encontro dos docentes, realizado em Boa Vista (RR), em 2016. Além da conjuntura nacional, o presidente da seção sindical do ANDES-SN pontuou a importância do momento histórico em que será realizado o 62° Conad, tendo em

Luiz Fernando Nabuco

Encontro acontece de 13 a 16 de julho, na Universidade Federal Fluminense

Docentes da UFF pedalam por Niterói em manifestação durante a greve de 2015

vista o centenário da Revolução Russa e às vésperas da Aduff-SSind completar 40 anos de sua fundação. “É uma satisfação sediar novamente um evento do nosso Sindicato Nacional e receber centenas de professores de todo o país em uma estrutura compatível com a importância do nosso momento político, de datas históricas tão importantes, e dos debates que serão realizados no Conad”, comentou Gomes. Conforme vem ocorrendo desde o 35º Congresso, realizado em Curitiba (PR) em janeiro de 2016, será garantido espaço

de recreação infantil. “O espaço para as crianças é indispensável para viabilizar a participação de pais e, principalmente, mães no Congresso. Esperamos contar com uma grande presença dos docentes de todo Brasil”, completou. Os docentes e as seções sindicais, que ainda não enviaram as contribuições ao Caderno de Textos do 62º Conad, têm até o dia 26 de junho para enviá-las ao Anexo ao Caderno, que será publicado no dia 30 de junho. O Caderno de Texto e o Anexo são importantes ferramentas para os debates que ocorrerão no encontro.

Revolta das Barcas A Revolta das Barcas foi um levante popular ocorrido em 22 de maio de 1959, contra o serviço hidroviário na cidade de Niterói, na época, capital do estado do Rio de Janeiro. No dia anterior ao levante, o Sindicato dos Marítimos e Operários Navais entrou em greve reivindicando melhores condições de trabalho para os cerca de 4 mil trabalhadores do Grupo Carreteiro, concessionário da época, e mais investimento no serviço prestado a população. A Força Naval, encarregada de administrar provisoriamente as viagens entre as cidades, agiu com truculência alimentando o nervosismo dos usuários, que atiraram pedras contra os fuzileiros que responderam com rajadas de metralhadoras. O conflito teve seis mortes e 118 feridos. A estação, as barcas e a residência da família de empresários, que administrava o serviço, foram incendiadas pela população. A Revolta das Barcas resultou na estatização do serviço.


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Movimento Docente

Aduepb SSind Apug SSind Luiz Fernando Nabuco

paralisação de 24 horas no dia 30 de maio, quando os docentes chamaram atenção da sociedade para a importância da destinação de, no mínimo, 7% da Receita Líquida de Impostos (RLI) para o orçamento anual das Ueba; e aumento salarial de 30,5%, entre outras medidas. Em São Paulo, o Fórum das Seis – que reúne as seções sindicais do ANDES-SN e os sindicatos dos técnico-administrativos da USP, Unesp e Unicamp -, conquistou uma audiência pública na Alesp no dia 15 de maio em que expuseram a crise enfrentada pelas instituições, que perderam nos últimos três anos, mais de R$1 bilhão. Ao final da audiência, um documento foi enviado ao governador, deputados, Ministério Público e reitorias. O Fórum das seis segue em luta também para reverter a proposta de “reajuste zero”apresentada pelo Cruesp – conselho dos reitores. No Rio de Janeiro, docentes, técnico-administrativos e estudantes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) acamparam em frente ao Palácio da Guanabara - sede do governo fluminense - em protesto contra os atrasos de pagamentos de salários e bolsas e contra a falta de recursos para a universidade. Docentes da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) e da Fundação Centro Universitário Estadual da Zona Oeste (Uezo) também realizaram manifestações contra o desmonte das instituições. Caroline de Araújo Lima, 1ª vice-presidente da Regional Nordeste III do Sindicato Nacional e da coordenação do Setor das Iees/Imes, ressalta que a Semana Nacional de Lutas Unificadas foi importante, pois ocorreu, em vários estados, durante o encaminhamento, às assembleias legislativas, do projeto de lei de diretrizes orçamentárias (LDO), que prevê os recursos que serão repassados para as instituições. "Essas ações demonstram a disposição de luta dos docentes das instituições Estaduais e Municipais aos ataques coordenados nacionalmente contra as universidades. A semana em defesa das Instituições de Ensino Superior nos Estados e Municípios demarcou a força do movimento docente em defesa das universidades e na ocupação das ruas para barrar as contrarreformas da Previdência e Trabalhista, a Lei das Terceirizações e pelo Fora Temer!", avaliou.

Aduneb SSind

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Setor das Instituições Estaduais e Municipais de Ensino (Setor das Iees/Imes) do ANDES-SN organizou uma vitoriosa Semana Nacional de Lutas Unificadas de 15 a 19 de maio. A mobilização foi marcada pela organização do Ocupe Brasília, que reuniu mais de 150 mil pessoas no dia 24 de maio. Nos estados e municípios, também foram realizadas ações em defesa da garantia e a ampliação do financiamento público para as universidades estaduais e municipais e contra a apropriação do fundo público pelo capital privado, contra gestões antidemocráticas, precarização e o sucateamento das Iees/Imes. Em Tocantins, os docentes do Centro Universitário de Gurupi (Unirg) obtiveram uma grande vitória. Após muita pressão e intenso diálogo, em reuniões, com o prefeito de Gurupi, Laurez Moreira (PSB), a Câmara Municipal aprovou um projeto de recomposição salarial das perdas dos servidores da Fundação e Centro Universitário Unirg, em 6,29%. Na Paraíba, os docentes da Universidade Estadual da Paraíba (Uepb), em greve desde 12 de abril, em unidade com os técnico-administrativos, participaram de duas audiências públicas no dia 18 de maio, na assembleia legislativa, quando expuseram a necessidade de assegurar recursos à Uepb para o próximo ano e denunciaram que a redução orçamentária de 2016 resultou em demissões de professores substitutos, no cancelamento da chamada de novos estudantes de graduação e em cortes que atacam diretamente a assistência estudantil e as condições de pesquisa e extensão da instituição. Já no Paraná, os docentes estão mobilizados contra o governo Beto Richa (PSDB) e contra os novos ataques, que vão desde o fim do regime de dedicação exclusiva (Tide) à adesão ao Meta 4, sistema de gestão que controla todos os procedimentos financeiros das universidades. Coincidentemente, as universidades que não aderiram ao programa sofreram cortes nos seus respectivos orçamentos por parte do governo do Paraná. Os docentes das universidades estaduais da Bahia realizaram uma semana de mobilização nas Estaduais, de 29 de maio a 2 de junho, culminando com a exitosa

Aduepb SSind

Docentes das Iees/Imes intensificam luta no mês de maio


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Movimento Docente

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Atividades locais mobilizam docentes em torno das pautas nacionais

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urante todo o mês de maio e início de junho, as Regionais Norte II, Nordeste I, II e III, Rio Grande do Sul e Sul e, ainda, o Grupo de Trabalho de Política Agrária, Urbana e Ambiental (Gtpaua) do Sindicato Nacional realizaram encontros em diversas cidades do país para debater a conjuntura político-social do Brasil, as mobilizações de resistência para barrar as contrarreformas da Previdência e Trabalhista e, ainda, as resoluções aprovadas no 36º Congresso do ANDES-SN, realizado no início do ano em Cuiabá (MT). Nos dias 12 e 13 de maio, em Belém (PA), a Regional Norte II do Sindicato Nacional fez seu encontro, com a temática “Ações da luta docente contra a Reforma da Previdência”. Na ocasião, foram realizadas as palestras “Reorganizar a classe trabalhadora na luta contra a retirada de direitos, na perspectiva da Greve Geral”, com a presidente do Sindicato Nacional, Eblin Farage; e “Trabalho docente no contexto da Reforma da Previdência”, com a professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisadora de assuntos relacionados à Previdência Social, Sara Granemann. Representantes da secretaria Regional Nordeste III do ANDES-SN participaram no dia 16 de maio, em Santa Maria da Vitória (BA), de um debate com os docentes da Universidade Federal do Sudoeste da Bahia (Ufob) sobre as contrarreformas da Previdência e Trabalhista, bem como os demais ataques contra os direitos sociais em curso. Já as seções sindicais que compõem a

Regional Nordeste I do Sindicato Nacional se reuniram, nos dias 17 e 18 de maio, em Picos, no Piauí. No encontro, foi pautado o tema “A luta dos trabalhadores contra a contrarreforma da Previdência”, que contou com a participação do advogado Leandro Madureira, membro da Assessoria Jurídica Nacional (AJN) do ANDES-SN, e da presidente do Sindicato Nacional. Ainda no mês de maio, dia 19, em João Pessoa (PB), foi realizado o 3º Encontro Regional Nordeste II, com debate sobre “Conjuntura e Contrarreformas: Desafios para o Movimento Docente’’, com Alexandre Galvão Carvalho, secretário-geral do ANDES-SN. Os participantes também discutiram acerca das resoluções do último congresso do ANDES-SN. No sul do país, respondendo à demanda dos docentes das instituições de ensino superior do Paraná, a Regional Sul do ANDES-SN realizou palestras, de 22 a 24 de maio, em diversos campi da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e da Universidade Estadual de Maringá (UEM), abordando a contrarreforma da Previdência e seus impactos. As palestras foram ministradas por Marcelo Trindade, assessor jurídico da Regional Sul e da Sinduft-PR-SSind Também no Paraná, a Regional Sul organizou no dia 7 de junho, em conjunto com a Seção Sindical dos Docentes da UEPG (Sinduepg SSind), o seminário “Autonomia e Financiamento das Universidades Estaduais do Paraná: a agenda regressiva do governo Beto Richa”, que contou com a presença de represen-

tantes das seções sindicais das estaduais paranaenses para debater estratégias de enfrentamento à política de desmonte da Educação Superior Pública no estado. Nos dias 16 e 17 deste mês, foi realizado o Encontro da Regional Nordeste III, no campus da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), localizado em Delmiro Golveia. Com a temática “Movimento Docente contra as Reformas: Greve Geral e Reorganização da Classe Trabalhadora!”, o evento atualizou o debate sobre a Greve Geral, convocada pelas Centrais Sindicais para 30 de junho, e as contrarreformas em tramitação no Congresso Nacional. Alexandre Galvão Carvalho avalia que as atividades realizadas pelo ANDES-SN foram fundamentais para discutir com os docentes as estratégias de luta para barrar os ataques locais e nacionais e, também, para avaliar as mobilizações que já ocorreram. “Os encontros e atividades das Regionais, dos Grupos de Trabalho e das seções sindicais do ANDES-SN têm um papel fundamental neste momento, porque eles espraiam as ações de luta e mobilização que o Sindicato Nacional tem levado a cabo. E, obviamente, esses espaços de discussão – que fazem com que a base entenda melhor o sentido destas lutas e a importância de articulação com outros setores da classe trabalhadora -, contribuem para aumentar o processo de mobilização”, explicou o diretor do Sindicato Nacional, que ressaltou, ainda, que os encontros foram de extrema importância para o protagonismo do ANDESSN no dia 24 de maio, no Ocupe Brasília.

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Seminário do GTPAUA no RS A Regional Rio Grande do Sul do ANDES-SN e demais seções sindicais gaúchas do Sindicato Nacional - em unidade com o Gtpaua, que promoveu o evento -, organizou nos dias 5 e 6 de junho, em São Lourenço do Sul (RS), o “Seminário Regional Sobre os Impactos dos Projetos de Mineração”. A cidade de São Lourenço do Sul está localizada na Bacia do Rio Camaquã, que se encontra ameaçada por um projeto de mineração de chumbo, zinco e cobre. O evento contou com a participação de cerca de 400 pessoas de diversos estados, entre docentes, estudantes, técnico-administrativos, representantes de movimentos sociais, das comunidades indígenas, trabalhadores rurais, ciganos, prefeitos, vereadores, assessores políticos e, também, moradores da região.


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Mundo do Trabalho

Crise política explicita a função do Estado no capitalismo

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reservar o capitalismo. Esse é o objetivo das elites dominantes, que defendem há séculos o modelo econômico e, através do controle do Estado, sob tutela do setor produtivo e financeiro, ditam leis, políticas públicas, decisões judiciais, desonerações fiscais e priorizando interesses de lucratividade de poucos ao invés dos direitos sociais de muitos. No Brasil, os últimos acontecimentos políticos e econômicos explicitaram o vínculo entre o Capital e o poder político, evidenciando a forma como o Estado, num modelo capitalista, é subordinado à burguesia. As recentes denúncias de corrupção e financiamento de campanhas eleitorais, em troca de “favores” econômicos envolvendo as três esferas de poder, demonstraram ainda o lado mais perverso dessa relação. Em nome da “governabilidade” e do “equilíbrio” financeiro foram realizadas privatizações, cortes de recursos em áreas essenciais para a população brasileira - como Educação e Saúde -, e diversos ataques aos direitos dos trabalhadores. Tais medidas tiveram por objetivo, entre outros, continuar pagando, aos banqueiros e rentistas, os juros e amortização da dívida pública brasileira, que consome quase metade do orçamento total da União. Somando-se a isso, o ajuste fiscal realizado no final de 2014, e nos anos seguintes, jogou o país em um círculo vicioso em que os próprios cortes nos gastos públicos induziram à redução do crescimento, provocando nova queda da arrecadação, que, por sua vez, exigiu novos cortes de gastos.

Estado: instância de poder político da burguesia Tramitando no Congresso Nacional, as contrarreformas da Previdência e Trabalhista também são um bom exemplo do papel do Estado como representante dos interesses da burguesia. Enquanto debatem a mudanças nas regras da Previdência Social, deputados federais e senadores estão associados a empresas que devem R$ 372 milhões ao INSS, de acordo com o levantamento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). No total, 73 deputados e 13 senadores - ou seja, um em cada sete

congressistas -, estão ligados a grupos devedores da Previdência. O presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) no Senado, que concluiu no dia 6 de junho a primeira fase de discussões e análises da contrarreforma Trabalhista, é o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), dono de companhias em diferentes áreas, com um patrimônio estimado em aproximadamente R$ 400 milhões e investimentos em diversos bancos, dentro e fora do país, e que se beneficiará diretamente da destruição dos direitos dos funcionários de suas empresas. Outro exemplo é o PL 6442/2016, do deputado Nilson Leitão (PSDB/MT), que altera a legislação específica para os trabalhadores rurais, beneficiando parlamentares ligados ao agronegócio que, muitas vezes, se utilizam de formas análogas ao trabalho escravo em seus latifúndios.Como representantes políticos dos interesses econômicos do Capital, a grande maioria dos parlamentares, governantes (presidentes, governadores e prefeitos) e até mesmo juízes de tribunais superiores utilizam-se dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário para viabilizar medidas prejudiciais a grande maioria da população em favor dos interesses privados, seja na forma legal ou mesmo através da corrupção, que é inerente ao capitalismo. “A corrupção é uma das filhas dessa intimidade empresarial com o que considera ser o "seu" Estado. Se é importante denunciar e conter a corrupção, não basta atacar a ponta do iceberg, mas o seu

conjunto”, avalia Virgínia Fontes, historiadora e professora da Universidade Federal Fluminense. Para a docente, o interesse e envolvimento de parlamentares com os projetos e propostas de lei apenas evidenciam que o Estado brasileiro é tomado pelo grande empresariado, resultado de séculos de dominação com início na colonização portuguesa, perpassando a escravidão, e aprofundado no processo de implantação do capitalismo no Brasil, com excessivo peso das classes dominantes na configuração do Estado. “Este é um processo ainda pouco analisado substantivamente na literatura brasileira, que tende a absolver os capitalistas e a considerar o Estado como o responsável. O Estado que aí está foi desenhado e é ocupado pelo grande empresariado, e não apenas no Legislativo ou através do financiamento de campanhas. Os donos


Mundo do Trabalho diretos de grandes empresas participam de conselhos nos ministérios, indicam nomes de ministros, etc. Mas não se limita a isso sua participação. Através de associações setoriais empresariais, formulam políticas específicas e participam, mais uma vez, dos espaços públicos onde se definem as políticas, além de acompanharem por dentro do Estado a sua implementação, isso tudo para além do financiamento direto a determinados candidatos ou partidos”, detalha. Virgínia ressalta que, desde a década de 1980, através de uma infinidade de entidades sem fins lucrativos, aprofundaram-se as "parcerias público-privadas" para as áreas de serviços públicos. Tais entidades formulam políticas públicas, educam parlamentares e grandes setores do Executivo (funcionários de ministérios), definem currículos universitários e, em muitos casos, implementam diretamente tais políticas, através de acordos que envolvem recursos públicos. “Esses acordos ocorrem nas prefeituras, nos estados e na União. Nada disso passou por eleições ou por discussões programáticas de políticas com a participação ou intervenção popular. O voto popular vem sendo sistematicamente ignorado por quase todas as entidades empresariais”, avalia.

Xeque-Mate Da mesma forma que a burguesia define os seus representantes na Presidência da República, também os descarta quando estes não conseguem realizar as medidas que o Capital deseja e na velocidade que as querem. É fato que o Estado burguês não é um todo homogêneo, e as disputas entre suas frações acabam impondo situações por vezes drásticas. Assim o foi no processo de impeachment de Dilma Roussef e agora com o governo atual. O recente envolvimento de Michel Temer nas denúncias investigadas na operação Lava Jato, desgastaram ainda mais o governo, que hoje tem altíssimo índice de rejeição, dificultando a tramitação das contrarreformas. Mesmo com maioria no Congresso Nacional, o presidente ainda não conseguiu retirar direitos na velocidade que o empresariado esperava. Para Osvaldo Coggiola, professor de História da Universidade de São Paulo, a pior das hipóteses seria a permanência de Michel Temer na presidência. Entretanto, para o docente, nenhuma das possíveis saídas institucionais – entre elas, renúncia de Temer, impeachment, eleição indireta -, evitaria a continuidade das condições

caóticas que sufocam o país. “O resultado do julgamento no TSE salvou o governo momentaneamente, mas, por outro lado, deu mais força à Greve Geral do dia 30 de junho e serviu para animar outras saídas, não só as judiciais em curso, mas, sobretudo, a política das ruas. Está na hora de lutar por uma Assembleia

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Constituinte de refundação da República, livre, soberana e democrática, sem cláusulas de proscrição e sem Congresso biônico dos corruptos do grande capital, e pela defesa de um programa anti-imperialista e classista de salvação do país através da unidade socialista da América Latina”, completa o docente.

Judiciário empresarial Um dos exemplos da relação entre os poderes do Estado e o Capital pode ser exemplificada através de recentes notícias divulgadas por veículos de imprensa brasileiros envolvendo o Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e um de seus sócios – o ministro do STF e atual presidente do TSE – Gilmar Mendes. No início do ano, a Folha de São Paulo noticiou que, de acordo com o Portal Transparência, os repasses do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para o IDP aumentaram 1.766% entre 2014 e 2016, saindo de R$ 75 mil para R$ 1,4 milhão. Para estabelecer uma comparação, o grupo Anhanguera Educacional, um dos maiores participantes do programa, passou por um aumento de 13% no mesmo período. O jornal também denunciou, recentemente, que o grupo J&F, holding da família Batista – cujas delações à Lava Jato envolvem Michel Temer, destinou nos últimos dois anos R$ 2,1 milhões em patrocínio a eventos do IDP. De acordo com a Folha de S. Paulo, consultado pelo jornal, o Instituto afirmou que devolveu R$ 650 mil da quantia total em 29 de maio, depois da revelação do acordo de delação premiada de executivos da JBS. Segundo a reportagem, a entidade de Direito comentou que, por conta de cláusula relacionada à conduta ética e moral, por parte do patrocinador, rescindiu o contrato assinado em 11 de junho de 2015 com a holding.


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Matéria Central

Trabalhadores intensificam mobilização e preparam Greve Geral em 30 de junho

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dia 24 de Maio de 2017 ficou marcado na história da luta dos trabalhadores brasileiros. Pouco menos de um mês depois da primeira Greve Geral do país em décadas, entidades sindicais e movimentos sociais ocuparam as ruas de Brasília (DF) para protestar contra a Lei das Terceirizações e as contrarreformas Trabalhista e da Previdência, além de pedir a saída do presidente Michel Temer. As mais de 150 mil pessoas presentes no Ocupe Brasília fizeram da manifestação a maior da capital federal, nos últimos dez anos. A concentração começou logo cedo, em frente ao Estádio Nacional

Mané Garrincha. No final da manhã, algumas entidades sindicais já se dirigiam à Esplanada dos Ministérios. Mas, foi horas depois, que todos os manifestantes se aproximaram do Congresso Nacional, onde uma barreira policial impedia o acesso ao espelho d’água do Congresso Nacional e à Praça dos Três Poderes. Na Esplanada, os manifestantes foram recebidos por uma dura repressão policial, comandada pelo governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB). Foram horas de ataques, com bombas, balas de borracha e gás lacrimogêneo, atirados, inclusive, de um helicóptero que sobrevoava a manifestação. O saldo foi de 49 feridos, alguns em estado grave, como o caso de dois estudantes, um com a mão dilacerada e outro que quase perdeu a visão após ser ferido com um estilhaço de bomba. Ainda foram registradas 8 detenções, incluindo estudantes. Alguns policiais usaram armas de fogo contra os trabalhadores. Carlos Cirilo, servidor público estadual de Minas Gerais aposentado, foi baleado no rosto por arma de fogo e estava internado

no Hospital de Base, na capital federal. Parentes de Carlos denunciaram a abordagem de duas pessoas, que foram ao hospital dizendo serem policiais e pediram que ele assinasse documentos. A Associação Sindical dos Trabalhadores de Minas Gerais (Asthemg), sindicato ao qual ele é filiado, achou melhor, por questões de segurança, transferi-lo para Belo Horizonte, o que ocorreu no dia 8 de junho. Eblin Farage avaliou positivamente a manifestação, esperando que o Ocupe Brasília seja um estímulo para manter os trabalhadores brasileiros na rua até a derrota dos projetos de ajuste fiscal e a queda de Michel Temer do poder. “Foi uma manifestação muito positiva. Superou as nossas expectativas de quantitativo de trabalhadores presentes, que era de 100 mil. Colocamos 150 mil pessoas nas ruas, foi uma das maiores marchas da história de Brasília. Foi uma vitória a construção unitária entre as centrais sindicais, assim como a Greve Geral de 28 de abril. É mais uma prova de que quando queremos fazer coisas de forma


Matéria Central unitária, temos ótimos resultados. Esse deve ser o caminho para derrubarmos o Temer, barrar as contrarreformas e reverter os projetos que já foram aprovados e retiraram direitos dos trabalhadores”, afirmou a docente. “Os trabalhadores e trabalhadoras que vieram a Brasília persistiram até o final da manifestação, sob forte ataque da polícia do governo do DF. Temos que seguir ocupando as ruas”, completou Eblin.

Forças Armadas na rua Não satisfeito com a repressão realizada pela Polícia Militar (PM) do Distrito Federal, o presidente Michel Temer decretou a “Garantia de Lei e de Ordem” em todo o Distrito Federal até o dia 31 de maio. Temer se valeu da Lei Complementar nº 97/1999 e do artigo 84 da Constituição Federal para colocar as Forças Armadas nas ruas. Segundo o jornal Correio Braziliense, 1200 militares do Exército, Marinha e Aeronáutica rapidamente se apresentaram na Esplanada dos Ministérios para ajudar a polícia de Rollemberg a reprimir a manifestação. No dia seguinte, Temer revogou o decreto. A medida só havia sido utilizada duas vezes por governos civis, por José Sarney em 1986 para conter uma manifestação contra o Plano Cruzado – também na Esplanada dos Ministérios - e por Dilma Rousseff, no Leilão do Campo de Libra em 2013, no estado do Rio de Janeiro.

Nova Greve Geral Em reunião realizada em São Paulo (SP), no dia 5 de junho, as centrais sindicais decidiram convocar uma nova Greve Geral, para o dia 30 de junho. A paralisação de 24 horas integra o calendário definido pelas Centrais de intensificação das lutas para barrar as contrarreformas da Previdência e Trabalhista, pela revogação da Lei da Terceirização e pelo Fora Temer. Foi decidido também por um Dia Nacional de Mobilização em 20 de junho, com atos e panfletagens nos estados. A CSP-Conlutas defendeu a necessidade de realização de uma Greve Geral de 48 horas, mas não houve acordo entre as demais centrais. Eblin Farage, presidente do ANDES-SN, ressalta que a mobilização dos trabalhadores é a única saída possível para barrar e reverter a retirada de direitos sociais e trabalhistas que está sendo imposta aos trabalhadores. “Desde 2015, a aposta do ANDES-SN tem sido na construção da Greve Geral, por entender que apenas a mobilização dos trabalhadores é capaz

de reverter esse quadro nacional de contrarreformas. A partir do final de 2016, a mobilização popular se intensificou e, em 2017, conseguimos fazer grandes atividades de rua, como o ato de 24 de maio, quando mais de 150 mil trabalhadores ocuparam Brasília”, destaca. A presidente do Sindicato Nacional completa que a primeira Greve Geral desse ano, em 28 de abril, foi muito importante, e avaliada de forma muito positiva. “Mas é necessário que essa segunda greve seja ainda maior. Que a gente intensifique todos nossos esforços para construir a paralisação a partir das bases, dos comitês em defesa da Educação, dos Comitês contra as reformas, dos Fóruns estaduais e municipais, de todos os espaços coletivos que existem nas universidades, nos municípios e nos estados, para que possamos, no dia 30, fazer uma greve ainda maior do que foi no dia 28 de abril. Essa é a única saída possível para que a gente possa de fato barrar as contra reformas e derrubar o Michel Temer”, conclama. Em 28 de abril, atendendo ao chamado das Centrais, cerca de 40 milhões de trabalhadores, das mais diversas categorias, pararam o país na primeira Greve Geral desde 1989. A expectativa, agora, é que a Greve Geral de 30 de junho cresça em quantidade e qualidade de mobilização, demonstrando ao governo e ao Congresso

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que a população brasileira não aceita a retirada de seus direitos.

Análise de conjuntura Uma reunião conjunta do Setor das Instituições Federais de Ensino (Setor das Ifes) e do Setor das Instituições Estaduais e Municipais de Ensino (Setor das Iees/ Imes) do Sindicato Nacional, realizada em 8 de junho na cidade de São Paulo (SP) divulgou uma nota para armar a luta dos docentes durante o período de construção da Greve Geral de 30 de junho. A nota afirma que “Mesmo reconhecendo as limitações impostas pelas regras atuais da institucionalidade, é inadmissível aceitar qualquer tipo de substituição da presidência da república por via indireta. Nesse sentido, repudiamos qualquer tentativa de eleições indiretas manobradas pelo congresso nacional e pelas elites”, apontam os docentes no documento. “A pauta do(a)s professore(a)s e das demais categorias de trabalhadore(a)s não se restringe a mudança do presidente da república, já que as contrarreformas são aprovadas no âmbito do congresso nacional, por deputados(as) e senadores(as), em sua ampla maioria denunciado(a)s em processos de corrupção. Por isso, nossa luta deve ser pelo Fora Temer e todos os corruptos do congresso nacional, por meio do povo na rua e da construção da Greve Geral”, completa a nota.


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Matéria Central

Docentes de norte a sul ocupam BrasIlia contra a retirada de direitos Gean Santana (Adufs/Ba-SSind) O ato superou as nossas expectativas, e é muito bom quando somos surpreendidos positivamente. Cerca de 150 mil pessoas na rua não é qualquer coisa. Foi um dos maiores atos da história de Brasília, e isso demonstra que a classe trabalhadora está em ascenso. Fizemos uma grande Greve Geral e uma grande manifestação em Brasília. O próprio governo do DF e a Polícia não estavam preparados para receber tantas pessoas na manifestação. O ato foi vitorioso, e, apesar de algumas entidades e centrais pedirem para que o ato recuasse, os manifestantes seguiram avançando, passando por cima das direções mais burocráticas, o que mostra grande vontade de lutar. Reginaldo Araújo (Adufmat-SSind) A Greve Geral de 28 de abril e o Ocupe Brasília colocam a classe trabalhadora como protagonista nesse momento do país, e é importante ressaltar que esse momento nos obriga a disputar narrativas. Realizamos essas manifestações para dizer que não queremos nenhum direito a menos, e esses direitos estão sendo retirados cotidianamente a partir do Congresso Nacional. Outra disputa de narrativa é de modelo de ato. A violência da polícia tem sido desproporcional em todos os estados, e em Brasília isso tem

tido uma dimensão assustadora. Temos que dialogar com nossa base que, o que é chamado de vandalismo é, para nós, um processo político que acaba sendo uma resposta à violência policial. Se a polícia for violenta, é normal que as pessoas respondam da mesma maneira. O presidente Temer chegou a chamar o Exército para a rua, e isso demonstra a falta de compreensão do que é um ato democrático. Regina Ávila (SSind do ANDES-SN na UFSC) O 24 de maio foi um dia histórico para a classe trabalhadora. Há muito tempo a gente não conseguia reunir essa quantidade de pessoas em um ato de unidade entre as centrais sindicais e os movimentos sociais, resultado de uma construção que estamos tendo desde o início das contrarreformas e da retirada de direitos. Conseguimos mostrar que não há absolutamente nenhum acordo com os projetos desse governo, e também mostrar o quanto a mídia deturpa o processo de organização dos trabalhadores. A expectativa é que a gente avance. O ‘desgoverno’ Temer chegou a chamar as Forças Armadas, e admitiu que não foi possível prever um ato tão grande. Isso deve servir como exemplo para a continuação da luta, seguindo apostando na unidade e construindo uma nova Greve Geral em 30 de junho.

Mariana Trotta (Adufrj-SSind) O que nos levou à manifestação em Brasília foi a revolta com essas contrarreformas que estão em curso, a Trabalhista e a Previdenciária, que estão espoliando nossos direitos. A gente entende que esse governo ilegítimo não pode continuar no poder, e por isso lutamos pelo Fora Temer, contra as reformas em curso e contra a espoliação de direitos da classe trabalhadora. Rosimê Meguins (Adufpa-SSind) O que nos levou à Brasília foi a certeza de que apenas a unidade e a ação podem fazer que a situação em que vivemos seja transformada. 23 ônibus saíram de Belém, com diversas categorias. Tínhamos a convicção dessa ação, em unidade com todas as centrais sindicais, e de que só a luta firme pode impedir a retirada de nossos direitos, além de derrubar esse governo ilegítimo. A repressão ocorreu, como sempre, de forma muito violenta, mas perceber a resistência de trabalhadores e jovens que ali permaneceram, aumenta a convicção de que somos capazes de ampliar a reação e a organização, e que ainda veremos, em breve, a revogação das medidas já aprovadas e impedir a aprovação das contrarreformas. Acredito que o povo sairá vitorioso.


Repressão

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O impacto nocivo das armas "não letais" O uso cada vez mais excessívo dos armamentos tidos como "não letais" causa danos à saúde de manifestantes e população geral, podendo levar à morte

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cena é cada vez mais comum: uma manifestação popular se aproxima de seu destino e, rapidamente, a polícia local começa a repressão. Balas de borracha, gás lacrimogêneo e de pimenta, bombas sônicas e de gás, algumas vezes jogadas de helicópteros. Ao final do ato, contam-se os feridos. Usados indiscriminadamente para reprimir manifestantes, bombas de gás, sprays de pimenta, entre outros, têm impacto nocivo e, muitas vezes, permanente na saúde dos manifestantes e daqueles que estejam próximos aos atos, como trabalhadores, vendedores ambulantes e moradores. O fato das armas utilizadas pelas forças policiais serem chamadas de “não-letais”, entretanto, desvia o foco das graves consequências que a repressão pode causar à saúde dos manifestantes, quase como se, por não usar armas de fogo, a polícia tivesse salvo-conduto para atacar livremente. Sirliane Paiva, 2ª vice-presidente da Regional Nordeste I do ANDES-SN, é docente de enfermagem da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e frequentemente atua nas equipes de saúde do Sindicato Nacional nas manifestações em Brasília. Para ela, o conceito de “armas não letais” é equivocado. “Eu não considero que “arma não letal” seja uma terminologia correta para esses instrumentos de repressão utilizados pela polícia. São armas de menor letalidade, mas que podem provocar, sim, mortes”, afirma a docente. Segundo Sirliane, as consequências físicas do uso de armas químicas (como gases e bombas) estão diretamente relacionadas a dois fatores: a concentração e o tempo da exposição. “Às vezes, a concentração não é tão elevada, mas o manifestante fica exposto por bastante tempo, e isso aumenta a possibilidade de contaminação. Em outros casos, o tempo pode ser menor, mas a concentração é grande, como quando a polícia ataca os carros de som com gases”, cita, lembrando também que a predisposição a doenças respiratórias ou cardíacas pode ser um fator complicador para os

manifestantes expostos a esse tipo de armamento. “Os impactos imediatos das armas de menor letalidade podem ser muito danosos. E, de forma tardia, também há efeitos. Há comprovação de estudos de que os gases, por exemplo, afetam o meio ambiente. Também existe comprovação de que a exposição repetida aos efeitos desses gases podem causar diversas doenças, inclusive câncer em vias respiratórias”, completa Sirliane Paiva.

Vítimas do armamento “não letal” Desde as Jornadas de Junho de 2013, diversos casos de feridos em manifestações, relacionados ao uso de armamentos tido como não letais, vieram à tona, com muitos manifestantes tendo sequelas permanentes. Um dos exemplos mais emblemáticos é o do fotógrafo Sérgio Andrade da Silva, que perdeu a visão de um olho ao ser alvejado por uma bala de borracha, durante a cobertura de uma manifestação em São Paulo. O caso de Sérgio foi a julgamento, e ele foi considerado, ironicamente, culpado. A defesa do governo do Estado de São Paulo argumentou, entre outras coisas, que ele não precisava de dois olhos para fotografar. Em entrevista ao p o r t al J o r nalis t as Livres, a estudan te Déborah Fabri, da Universidade Federal do ABC (UFABC), contou como perdeu parte da visão em uma manifestação no ano de 2016, na

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Repressão

Luiz da Luz/Aquivo Pessoal

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Estudante Mateus Ferreira da Silva é gravemente ferido durante manifestação em Goiânia (GO)

capital paulista. “Eu já tinha ido em umas cinco manifestações. A gente começou a ouvir bomba lá atrás, e cada vez mais rápido, muito alto o barulho, e cada vez mais perto dos nossos ouvidos. Eu virei para trás, vi meu amigo. Foi a última pessoa que esse olho viu. Aí dei dois passos e uma bomba caiu em cima de mim. Na hora, eu não sentia essa parte do olho, sentia tudo afundado, e só pensei que meu olho tinha explodido. Tentamos chamar Samu, Uber, táxi, mas não conseguimos. Dois professores me acolheram e me levaram para um hospital específico de olhos”, relata a estudante, uma das muitas pessoas que tiveram danos permanentes à saúde e condição física por conta da repressão policial às manifestações populares no Brasil nos

Balas de Borracha – Quando disparadas a curta distância (menos de 30m) podem ter a mesma capacidade de penetração na pele e serem tão letais quanto às munições convencionais. Gases – Causam problemas dermatológicos e respiratórios. Os cartuchos, quando disparados por lançadores, podem causar ferimentos traumáticos, entre eles a perda de visão por ruptura do glóbulo ocular. Bombas – Podem lançar fragmentos ao explodir, o que pode provocar fraturas e amputações. Cassetete – Pode causar fraturas e traumatismo craniano. * Definição da ONG Médicos Pelos Direitos Humanos

ONG internacional critica uso de “armas não letais” Quem corrobora com essa posição

Dificuldade para socorrer manifestantes feridos Sirliane Paiva, 2ª vice-presidente da Regional Nordeste I do ANDES-SN, também crítica os empecilhos que as forças policiais colocam aos socorristas durante as manifestações. Para a docente, muitas vezes é armada uma tocaia para os manifestantes, já que esses são proibidos de utilizar equipamentos de segurança e, wanderlei pozzebom_SJPDF

Armas e suas consequências

últimos anos. Outro caso que chamou a atenção da sociedade foi a agressão sofrida pelo estudante Mateus Ferreira da Silva em uma manifestação em Goiânia (GO) no início de maio desse ano. Mateus sofreu traumatismo craniano e diversas fraturas por conta de agressões com um cassetete, que chegou a quebrar tamanha a força utilizada pelo policial. Depois de semanas internado, o estudante teve alta e se recupera bem. O policial, que já havia sido denunciado outras quatro vezes por agressão, foi afastado das ruas pela PM goiana.

é a ONG internacional Médicos Pelos Direitos Humanos (PHR, em inglês) que, em 2016, divulgou na Suíça o relatório “As consequências para a saúde das armas de controle de multidão”. Segundo a organização, a proliferação, sem regulação nem treinamento, monitoramento e responsabilização adequados, levou a “um uso disseminado e rotineiro destas armas, resultando em ferimentos, sequelas e mortes”. O estudo que deu origem ao documento foi realizado em nove países de diversos continentes, entre eles a Argentina, e os resultados são alarmantes. De 1925 manifestantes atingidos por bala de borracha, 53 morreram e 294 tiveram sequelas físicas. Já dos 5131 manifestantes expostos a gás lacrimogêneo e a outros gases, houve 2 mortos e 70 vítimas tiveram sequelas físicas permanentes. Para a organização não-governamental “Médicos Pelos Direitos Humanos”, é preocupante a lacuna na regulação do uso desse tipo de armamento, somada ao crescimento das empresas privadas que produzem essas armas e à falta de treinamento dos policiais.


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Mídia Ninja

Repressão

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Durante ato da Greve Geral, em 28 de abril, a PM do Rio de Janeiro atacou, novamente, os manifestantes com gás lacrimogênio e balas de borracha

ao mesmo tempo, de serem socorridos. “Na manifestação Ocupe Brasília, em 24 de maio, quando cheguei à Esplanada, procurei o comandante da barreira policial para me identificar com o material de saúde, e me disseram que eu não poderia passar com o material. Então respondi que até em guerra os trabalhadores da saúde tem livre acesso, e só assim fui liberada. Eles também não permitem entrada de ambulâncias”, critica a docente, que lembra que até os jornalistas têm,

sucessivamente, seu direito de utilizar equipamentos de segurança cerceado. Para a diretora do Sindicato Nacional é necessário construir uma campanha contra o uso de armamento de menor letalidade em manifestações. Sirliane ressalta ainda a necessidade de que se garanta o direito à utilização de equipamento de segurança por parte dos manifestantes e direito ao livre trabalho de socorristas durante os conflitos. “Em qualquer lugar do mundo, os

O ANDES-SN solicitou oficialmente ao Governo do Distrito Federal a descrição dos gastos com armamento “não letal” durante a manifestação Ocupe Brasília, em 24 de maio. A assessoria de imprensa do governo inicialmente respondeu listando apenas o prejuízo causado pela manifestação ao patrimônio público. Em seguida, após novo questionamento, a assessoria de imprensa do Governo do Distrito Federal respondeu que a Polícia Militar (PM) não divulga esses dados por questões de “estratégia de operação”, e que somente uma solicitação por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) seria respondida, e dento do prazo legal, que é de vinte dias prorrogados por mais dez. A rádio CBN divulgou, em dezembro de 2016, que a PM do DF destinou R$ 4 milhões em uma licitação para compra de armamento “não letal” para conter manifestações. O valor é muito superior ao divulgado como “prejuízo” ao patri-

mônio público durante a manifestação Ocupe Brasília. Segundo o governo do DF, a depredação de patrimônio público no dia 24 de maio custou pouco mais de R$ 183 mil. A Câmara dos Deputados também abriu processo de compra de armamento “não letal” após o dia 24 de maio. De acordo com o portal G1, as compras são realizadas “sempre que necessário” para repor os estoques da Polícia Legislativa. No orçamento de pouco mais de R$ 135 mil estão incluídos: 84 sprays de agente lacrimogêneo CS de 125 gramas, 72 sprays de agente lacrimogêneo CS de 450 gramas, 144 sprays de espuma pimenta OC de 125 gramas e 54 sprays de espuma pimenta OC de 450 gramas. O valor unitário das armas varia de R$ 199 a R$ 559. Não foi realizada licitação porque, segundo a Câmara, apenas um fabricante cumpre os requisitos necessários.

Wanderlei pozzebom_SJPDF

Polícia do DF se nega a divulgar gastos com repressão

trabalhadores da saúde tem que ter livre acesso aos feridos. Em uma manifestação, em novembro [em Brasília], eu estava socorrendo uma docente que foi agredida brutalmente, com uma borrifada de spray na cara. Eu estava identificada como socorrista, mas a polícia me deu uma cacetada nas costas. Eles agridem durante o procedimento de socorro, é uma tocaia literalmente. Eles batem nos manifestantes, não permitem socorro, e ainda agridem os socorristas”, completa.


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Entrevista

Povo peruano luta contra os impactos da mineração Ana Maria Llamoctanta Edquen é presidente de base dos Círculos de Mulheres Camponesas do povoado de El Tambo, no Peru. No povoado está localizada a Mina de Ouro de Yanacocha, maior da América do Sul e segunda maior do mundo, que é operada por um consórcio que inclui uma empresa estadunidense, uma peruana e um órgão do Banco Mundial. A Frente em Defesa da Vida e do Meio Ambiente junto com outros movimentos sociais peruanos lutam, há anos, contra os impactos da atividade de mineração na região, entre os quais está a contaminação por metais

pesados. Ana Maria participou, no dia 5 de junho, do Seminário Regional Sobre os Impactos dos Projetos de Mineração, organizado pelo Grupo de Trabalho de Política Agrária, Urbana e Ambiental (Gtpaua) do ANDES-SN, na cidade de São Lourenço do Sul (RS) na Bacia do Rio Camaquã, uma das raras áreas ainda preservadas do bioma Pampa, mas que se encontra ameaçada por um projeto de mineração de chumbo, zinco e cobre. Na ocasião, ela concedeu entrevista à equipe de jornalismo da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal de Santa Maria (Sedufsm - SSind), que reproduzimos abaixo. Quando foi formada e qual o objetivo da Frente em Defesa da Vida e do Meio Ambiente que existe no Peru?

Ana Maria: Surgiu em 2011, no mês de outubro. Elegemos um comitê de defesa dos interesses de nosso povo, para defender nossos direitos de povos originários. Fui eleita coordenadora, pelo comitê de mulheres, da região que agrega 26 povoados. Minha função é fazer com que, junto com o comitê de defesa dos homens, as mulheres também

saiam para lutar. Como mulheres, sentimos mais tristeza pela situação da água, porque, desde a hora em que levantamos, temos que utilizar a água.

Em termos de ações práticas, como tem atuado a frente? Como é a experiência de resistência? AM: Na Frente de Defesa todos fazemos

rondas, inclusive os professores. A ronda é cuidar da ordem, da delinquência, da prostituição. Os problemas das comunidades são solucionados pelos “ronderos”, além da ajuda mútua. A ronda é caracterizada por sempre cuidar do nosso povo. Na luta, a ronda atua em grupos, em turnos de oito dias, em média. Participam quatro mulheres e cerca de trinta ou quarenta homens apenas da minha comunidade. O nosso povo, em 26 comunidades, tem quase 20 mil habitantes. Fazemos turnos por comunidades, envolvemos de 500 a 800 pessoas.

Como foi a repressão estatal à luta de vocês contra a mineração?

AM: Estávamos defendendo nossos direitos. Íamos às lagunas e o governo enviava a polícia. Diziam “vocês não podem estar aí porque não compraram”, e nos tiravam à força. Nós enfrentamos, e aí ocorreu a morte de um companheiro. Mataram quatro pessoas em outro povoado. O governo dizia para irem em frente, e a polícia nos baleava. Houve muitos feridos. Isso nos indignou muito como camponeses e como ronderos. Depois disso, intensificamos a resistência, e eles não tinham como nos parar, porque a cada dia mais gente se somava à luta. Morreram apenas homens, foram cinco no total, de dois povoados diferentes. Entre eles, havia um jovem estudante que estava saindo do colégio. A polícia chegou por cima, de helicóptero, e também invadiu a praça do nosso povoado. Fizemos, então, uma mobilização contra essa invasão à nossa praça, mas eles estavam ali, se achando os donos do povoado. O enfrentamento matou esse jovem e deixou muitos feridos, algumas pessoas que agora só podem andar de cadeira de rodas, outras que perderam a visão por conta da repressão. É uma grande tristeza, mas nos deu muita força para seguir lutando.

Você pode nos contar um pouco sobre as crianças contaminadas


Entrevista pela mineração?

AM: Nós seguimos lutando e, em 2014,

E quais são os sintomas dessas crianças?

AM: Essas crianças já não iam à escola, porque não podiam caminhar se não fosse com cadeira de rodas. O governo dizia que estavam desnutridos, que não cresciam porque não tinham comida suficiente. Mas nós sabíamos muito bem que estavam escondendo o problema. O governo sempre fez isso conosco, com nossa água, com nossas crianças. Além disso, as mineradoras muitas vezes pagam as pessoas por seu silêncio em relação a esses problemas.

Qual foi a importância da luta de vocês para conseguir barrar momentaneamente novos projetos de mineração?

AM: A organização coletiva, para nós, é muito importante. Levamos desde antes, no sangue, a organização. Eu conheço a organização coletiva desde que nasci, de rondas e tudo mais. E não perdemos isso, felizmente. As mulheres estão tomando cada vez mais a frente da organização, porque a polícia começou a levar presos os homens, ou apenas para torturar. Então as mulheres começaram a liderar as manifestações, e ir na frente, deixando os homens para trás. Até agora, não atiraram em nós, nem bateram.

E quais foram as principais mobilizações que vocês realizaram contra a mineração?

A tradição de organização coletiva e de luta vem de antes do combate à mineração?

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AM: Antes de 1914, os assentados sempre nos tratavam mal. Faziam homens e mulheres trabalharem demais, nos tratavam como escravos. O pobre trabalhava sempre para os milionários. Quando não o faziam, eram mandados embora. E nós nos caracterizamos por defender nossas terras, por resistir desde muito tempo aos maus tratos que sempre nos fizeram passar.

E o que você pode dizer para o povo do Brasil em relação à luta contra a mineração?

AM: Se mantenham em unidade, trabalhem em conjunto, porque se não for dessa maneira, não podemos fazer nada. *Entrevista concedida a Fritz Nunes e Ivan Lautert (Sedufsm SSind) Tradução: ANDES-SN

Fotos: Fritz Nunes/Sedufsm SSind

a água chegava turva na nossa província. A gente começou a procurar água em outros lugares, porque já não se podia beber aquela água. E, nós sabemos, temos a experiência, do que a mineração faz naquela região. Os rios ficam muito vermelhos ou amarelos, e nós fomos ao governo federal reclamar. Em 2012, já havia sido constatado oficialmente que havia 47 crianças com chumbo no sangue por conta da contaminação da água, mas o governo havia escondido esses dados. Indignados, montamos uma comissão e viajamos até Lima [capital do Peru], batemos na porta do governo, fizemos manifestação, mas o governo nos ignorou. Regressamos novamente, fizemos pesquisas em laboratórios, muita gente nos ajudou. O governo havia dito que o problema das crianças era natural, que não cresciam porque eram pequenos. Mas sabíamos que não era verdade. Crianças de 14 anos que não crescem e não engordam. O governo escondeu todos os dados para que não protestássemos.

AM: Realizamos uma Marcha da Água, parte caminhando, parte em carro. Em nove dias chegamos até Lima. No caminho, passamos de povo em povo, de cidade em cidade, agregando as pessoas à manifestação. Em Lima, enchemos de gente a Praça San Martín com um comício. O governo não gostou nem um pouco, mas não podia nos tirar de lá, porque éramos milhares de pessoas. Essa marcha é muito importante para nós. Convido vocês do Brasil a irem lá conhecer nossa realidade, saber pelo quê estamos lutando e resistindo. Nossa luta é muito importante, porque a água vai até o Pacífico. São lagunas muito bonitas. Como camponesa, os convido a visitar.

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Internacional

artista desconhecido/internet

Os sovietes e a atualidade do poder dos trabalhadores

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m 2017, a Revolução Russa completa cem anos. E, ainda que, ao longo dos anos, algumas de suas importantes conquistas foram perdidas ou esquecidas, há muito na sociedade contemporânea que surgiu a partir do maior processo de transformação política do século XX. Da jornada de trabalho de oito horas diárias e o avanço nas pautas das mulheres à descriminalização da homoafetividade, os bolcheviques deixaram à humanidade um amplo leque de direitos como legado. E um dos mais importantes é a experiência de organização do poder popular por fora do Estado, por meio de conselhos populares, lá chamados de sovietes. Luis Eduardo Acosta, 1º vice-presidente do ANDES-SN e um dos coordenadores do Grupo de Trabalho de Política de Formação Sindical (GTPFS) do Sindicato Nacional, avalia que um problema central das revoluções no mundo é, justamente, a questão da construção do poder por fora do Estado. “Um dos legados da Revolução Russa está no fato de que uma revolução que pretenda superar o capitalismo não pode ser construída unicamente a partir do poder do Estado burguês”, afirma. “Os trabalhadores aprenderam que a máquina do Estado burguês não pode ser

aproveitada, que ela precisa ser destruída, e que é necessário construir outro tipo de organização para que se possa realizar as tarefas revolucionárias. Essa é a experiência que aconteceu na Revolução Russa: os trabalhadores, camponeses e soldados criaram, de forma espontânea, esses organismos de poder que são os sovietes. E não foi uma criação pensada em um gabinete, resultou da luta”, completa o docente. Os sovietes surgiram na Revolução Russa em 1905, como conselhos populares que reuniam trabalhadores das diversas fábricas de uma reunião. Em 1917, voltaram a ter peso na sociedade, e foram fundamentais para a derrubada do czarismo e, posteriormente, do breve regime burguês instalado na Rússia. Os sovietes apresentavam sua democracia operária como alternativa ao poder dominante e construindo greves e reivindicações populares, passaram a ocupar um vácuo de poder. Em pouco tempo, de meros espaços de deliberação sobre as lutas econômicas mais imediatas, os sovietes passaram a atuar politicamente de forma mais ampla, realizando tarefas em áreas como saúde, segurança pública, etc. “Na Rússia, aconteceu o fenômeno do

dualismo de poder, de um lado estava a burguesia, e do outro lado estavam os trabalhadores, que construíram outro organismo de poder. Num dado momento esses dois organismos se confrontaram, porque não podiam permanecer muito tempo coexistindo”, comenta Luis Eduardo Acosta. Em outubro de 1917, quando os trabalhadores tomaram o poder, a palavra de ordem “Todo Poder aos Sovietes” levou a organização popular por fora do Estado burguês a um novo patamar. A partir de então, até 1936, foi um Congresso de Sovietes que dirigiu politicamente a recém-formada União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, na mais profunda e democrática experiência de poder dos trabalhadores da história da humanidade. Para Acosta, a mudança de liderança do regime, com a chegada de Joseph Stalin ao poder, ajudou a corromper essa experiência de organização política. “Demonstrou-se que os sovietes podem ser corrompidos depois. De fato o poder soviético se corrompeu, e se transformou em um aparato muito parecido com o aparato de Estado burguês, desviou-se para o Stalinismo, com todas as consequências catastróficas que isso trouxe”, critica o diretor do ANDES-SN.


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